O COMPROMISSO DE TODOS POR UM ENVELHECIMENTO DIGNO … · promover e assegurar o envelhecimento...
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O COMPROMISSO DE TODOS POR UM ENVELHECIMENTO DIGNO NO ESTADO DO CEARÁ.
*Isabel Cristina de Pontes Lima 1
RESUMO
Como garantir o envelhecimento digno em uma sociedade cujos valores simbólicos de identidade constroem uma trama para mecanismos de defesa na busca da jovialidade e negação do envelhecimento? Este questionamento concorre para inusitados desafios concernentes ao olhar que Estado e Sociedade direcionam à pessoa idosa no Ceará. Defendemos o pressuposto de que é a partir desses olhares, que se constroem e (re)constroem as tramas que permeiam as relações intergeracionais e acabam por determinar nuances para a intervenção governamental na gestão de políticas públicas direcionadas a esse segmento populacional. Esta discussão se delineia com o objetivo de apresentar aspectos significativos da realidade presente no Ceará e, a partir desse contexto, ressaltar a decisão política assumida pelo governo do Estado para o enfrentamento desta problemática. Trata-se de um artigo de revisão, metodologicamente formulado em temáticas interdependentes e complementares, cujos achados convergem para sugerir que apesar de todas as restrições sociais, econômicas e culturais vigentes, promover e assegurar o envelhecimento digno é, antes de tudo, um dever do Estado cujo cumprimento se revela possível a partir da articulação das políticas públicas voltadas à satisfação das necessidades dessa população, pela via da garantia de seus direitos.
Palavras-chave: Envelhecimento, Dignidade, Ceará Acessível.
1 O Envelhecimento Sob Múltiplos Enfoques
Uma abordagem sobre envelhecimento e tudo o mais que envolve vida, tempo
e morte, inclui necessariamente a compreensão dos valores, estigmas e sistemas sociais,
políticos e econômicos que delineiam a história de diferentes sociedades humanas
fomentadas em suas representações simbólicas e culturais.
A característica humana de ser, estar e agir no mundo adquire contornos
1 Isabel Cristina de Pontes Lima - Assistente Social, (UECE) Mestre em Planejamento e Gestão de Politicas Públicas (UECE), Assessora Técnica do Gabinete da Primeira Dama do Estado do Ceará – Programa Ceará Acessível.
diferenciados dependendo das condições concretas em que a vida se insere. A maneira
como as pessoas agem para adequar a natureza aos seus interesses de sobrevivência
influi de modo decisivo na construção das representações mentais que balizam e
explicam a realidade.
Na antiguidade, os seres perfeitos tornavam-se modelos ou paradigmas
inteligíveis, imitados pela arte e cultura de seu tempo, “Os gregos,valorizavam muito o
jovem de corpo belo, educado pela ginástica e pela dança para tornar-se um guerreiro”
(Platão, in Chauí, 1995). Em tais circunstâncias, as arenas de lutas onde se digladiavam
os “Spartacus”, eram sólidas construções monumentais em arquitetura delineada para o
teatro competitivo, onde a força e a habilidade no manuseio das armas era a virtude que
merecia o aplauso da política. Fundava-se nas sociedades grega e romana, as origens dos
conflitos imperativos de valores que ao longo do tempo foram sendo disseminados,
concorrendo para a segregação de pessoas idosas.
Mais tarde, acreditava-se que para se chegar à velhice era necessário uma
série de atributos relacionados à sorte, à graça divina ou a outros fatores sobrenaturais.
Com o passar do tempo, as crenças forjadas em poderes místicos não se sustentaram e a
ciência veio manifestar-se como a explicação mais confiável dos fatores inexoráveis e
naturais da vida, e o homem moderno passou a contar com um universo de informações
sobre os determinantes de como envelhecer melhor.
Ultrapassados os constrangimentos enfrentados pelas lutas universais com
vistas à garantia dos direitos humanos, novas formulações científicas, filosóficas, éticas e
legais passaram a compor a agenda pública em matéria de relevância.
Pautando-se no pressuposto de que “as pessoas vão se constituindo como
sujeitos nas sucessivas interações e nos diversos espaços discursivos”, Bakhting (1997)
sugere que a imagem pública de cada pessoa se constroi a partir dos “olhos dos outros”.
Nessa perspectiva, há sempre o inacabado em cada ser. A partir do “excedente de
visão”, ou seja, do olhar dos outros, cada pessoa é, em si mesma, incompleta e cada um
só existe nas relações com os outros. Como as relações são infinitas, não se tem nunca
um sujeito absoluto. Cada pessoa é sempre resultado de um passado e uma expectativa
do que pode vir a ser no futuro.
“No mundo moderno, associamos a velhice e, logo, os velhos e as velhas à
ausência de sinais positivos ou à sua perda, como a saúde, a capacidade de produzir, o
vigor sexual, a beleza e a força física e mental. E mais que isso, fazemos a ligação entre
as imagens da velhice e da morte” (Barros, 2006, p.46)
Mesmo com as recentes campanhas públicas voltadas a disseminação de uma
nova imagem da velhice, persiste o peso negativo que culturalmente foi associado a
condição do envelhecimento nas sociedades ocidentais, portanto, essa etapa da vida,
assim como os demais momentos do seu curso são leituras culturais sobre a natureza
humana.
A partir da compreensão dos direitos humanos e da concepção de cidadania
fundamentada no reconhecimento das diferenças e no acesso de todos à participação
política e social, o mundo transforma suas premissas e, nessa trajetória, a segregação
das pessoas idosas passa a ser negada e coibida. Nesse novo tempo, se delineiam os
caminhos para a acessibilidade de pessoas idosas em todos os espaços por onde a vida
transita. Para tanto, é urgente superar a perspectiva linear das políticas públicas e
sugerir um olhar multifocal que viabilize pensar inclusões, convivências de ideais, e
novas reflexões para que se promova, de fato, a garantia dos direitos das pessoas idosas.
Sem a compreensão dos impactos provocados pelo desenvolvimento demográfico na vida
das sociedades, todas as concepções teóricas e legais perdem significado.
A classificação de envelhecimento, particularmente adotada pela
Organização Mundial da Saúde, norteia a legislação brasileira na utilização do critério
etário para definir se uma pessoa é idosa ou não. Entretanto, ao processo de
envelhecimento concorrem, além dos aspectos biológicos e fisiológicos, outras variáveis,
tais como a hereditariedade, o estado emocional e as condições sócioeconômicas e
culturais. A rigor, é a partir da conjugação dessas variáveis que o envelhecimento
transparece de modo singular, em cada indivíduo (Telles e Groisman, 2010, p.1).
Diante da realidade do envelhecimento populacional, o crescimento
demográfico analisado a partir da linha do tempo de vida assume destaque na agenda
política internacional porque o aumento da expectativa de vida, associado à tendência da
queda nas taxas de fertilidade passam a produzir aumento significativo no quantitativo
de pessoas com 60 anos ou mais. No Brasil, o envelhecimento demográfico vem se
efetivando de modo acelerado:
Um indicador que mostra o processo de envelhecimento da população brasileira é o índice de envelhecimento (divisão do numero de idosos pelo de crianças) Em 1980, existiam cerca de 16 idosos para cada 100 criança. Em 2000, essa relação era de quase 30 idosos para cada criança (IBGE,2000). Para 2040, estima-se que a população idosa (65 anos ou mais) alcançará um patamar de 18% superior ao de crianças (0 a 14 anos) e em 2050, esta relação poderá ser de 172,7 idosos para cada 100 crianças (TELLES E GROISMAN, 2010, p.2).
Esses indicadores revelam a transformação do perfil etário da população
brasileira, evidenciando também o crescimento do número de idosos com idade superior
a 80 anos. Essa realidade concorre para aumentar a contingência de doenças,
complicações e fragilidades que implicam em limitações funcionais para essas pessoas
individualmente e para o planejamento dos gastos públicos em geral. É necessário então,
adequar o orçamento, com vistas à execução de políticas públicas direcionadas às
demandas advindas desse contingente, especialmente àquelas provenientes das áreas da
saúde, previdência e assistência social. Alem desses indicadores, estudos efetivados pela
Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (CEPAL) em relação ao peso
relativo da população idosa em cada país da referida região identificam três situações:
Uma primeira, onde os países atingiram percentuais mais elevados, caracterizando um processo de envelhecimento mais avançado, como: Uruguai, com 17,3%; Cuba, 15,4%; Argentina, 13,8% e Chile, 11,5%. A segunda mostra um grupo intermediário, com percentuais variando entre 6% e 8%, e uma terceira onde o processo de envelhecimento se encontra bem menos acentuado, como nos casos da Nicarágua e Haiti; com percentuais de 4,8% e 5,8% respectivamente2.
A longevidade da população brasileira se insere no “ranking” do grupo
intermediário, entretanto, sua importância em termos absolutos se afirma pelo fato de
representar mais de 1/3 da população deste grupo etário na região, seguido pelo México,
Argentina e Colômbia, que também assumem relevância neste cenário. O fenômeno do
envelhecimento, analisado com base nas projeções da Organização das Nações Unidas
(ONU) para 2025, coloca o Brasil na 6ª posição entre os países com a maior população
idosa do mundo.
2Brasil. IBGE, Síntese dos Indicadores Sociais uma Análise da Condição de Vida da População Brasileira, 2007
Todos os estudos mais recentes confirmam que no Brasil, o processo de
envelhecimento populacional mostra-se acelerado e essa realidade deve ser
compreendida também sob diferentes enfoques. A distribuição da população idosa, por
classe de rendimento médio domiciliar percapta, em 2006, identifica que 12,4% viviam
com rendimento de até ½ salário mínimo, o que converge para situação de pobreza. No
subgrupo de 65 anos ou mais, essa proporção cai para 10,9%, o que sugere a eficácia das
políticas públicas destinadas a esse segmento como é o caso da Política de Assistência
Social, por meio do Programa de Benefício de Prestação Continuada e da Previdência
Social, cujo peso revela-se significativo para o orçamento das famílias, especialmente nas
áreas rurais. No Nordeste, estas proporções se revelaram bem mais elevadas, 23,5%
para o caso das pessoas de 60 anos ou mais de idade e 20,8% entre os de 65 anos ou
mais, o que concorre para refletir o padrão de vida da região3.
Tal realidade se expressa no Estado do Ceará onde a população com mais de
60 anos é de 881.000 idosos. Esse contingente tem crescido a uma taxa geométrica de
3,23% no período de 1996 a 2007. Entre eles, 63,3% são chefes de família; 37,3%
trabalham e 62,7% são inativos; 71% residem em áreas urbanas e 29% em zona rural.
Excluindo a região metropolitana, constata-se que há uma concentração de 65% dessas
pessoas residindo no interior do Estado4.
“Nas camadas pobres o idoso tanto pode ser um empecilho para a
família como pode ser a única fonte de renda (em forma de
aposentadoria ou pensão). Há famílias, principalmente nos
municípios mais pobres, em que os idosos mantêm as despesas
familiares e são valorizados como um dos poucos consumidores
locais com renda fixa.” (Goldman, 2006, p.57)
Longevidade e envelhecimento são conceitos correlacionados, na medida em
que comportam aspectos relativos à qualidade da duração do tempo de vida.
Evidentemente, a longevidade contribui para o envelhecimento e este é inegavelmente
influenciado pela redução da fecundidade que altera a base da pirâmide etária.
Outro aspecto da longevidade está associado ao gênero. Essa característica
foi demonstrada por Pearl, cujos estudos sugerem que as mulheres têm uma nítida
3 Ib Id., 2007.4 Brasil, IBGE, PNAD/2005.
vantagem biológica sobre os homens. Outro fator observado é que na juventude todos os
indivíduos abaixo do peso médio, têm uma mortalidade maior. Por outro lado, todo o
excesso de peso significa maior mortalidade em indivíduos acima de 40 anos de idade.5
A longevidade está também relacionada positivamente com o status social e
econômico favorável e com o trabalho intelectual (profissões, etc) em oposição ao
trabalho manual, embora a questão da influência relativa de fatores genéticos,
determinando simultaneamente ocupações de baixo nível e uma constituição medíocre,
por um lado, e as desvantagens ambientais de ocupações manuais, por outro lado, não
tenham sido minuciosamente explorados.
A análise dos aspectos econômicos, biológicos, culturais, psicológicos e sociais,
relativos ao fenômeno do envelhecimento, se perde nas diferentes formulações teóricas se
a condição da qualidade de vida das pessoas passa ao acaso, sem uma formulação de
políticas públicas centradas principalmente para o contingente de idosos empobrecidos.
A condição de vida da pessoa idosa apresenta diferenças significativas a
depender de sua auto-estima, afetividade familiar, sociabilidade e conquistas legais, o
que difere no sentimento individual e também no coletivo, dependendo da história de
vida de cada um e da realidade histórica da sociedade em que a pessoa idosa vive.
Novos são os desafios colocados para as políticas púbicas em geral. No caso
específico da saúde pública, o quadro sugere a necessidade de investimentos na
qualidade do atendimento para as gerações presentes em ações preventivas, estudos e
pesquisas imunológicas, em paralelo ao planejamento estratégico, com visão de longo
prazo onde a qualificação de profissionais em gerontologia/geriatria seja estimulada
concomitante aos investimentos na farmacologia, fisioterapia, dentre outros ramos do
conhecimento científico.
O olhar focado no futuro não pode descuidar do presente, porque é agora que
se constroem as condições objetivas para o envelhecimento digno e isso implica soluções
integradas em políticas transversais, onde a saúde se articule à educação, à
infraestrutura, ao esporte, ao trabalho, à seguridade social, lazer, dentre outras, para
que de fato, vistos como seres inteiros, a população envelheça com dignidade.
5 PEARL, J. op cit TRIPICCHIO Adalberto (in) www.redepsi.com.br. capturado em 06/05/2010.
No plano do Direito, o intuito de preservar a dignidade do envelhecimento
está referendado no Estatuto do Idoso (Lei N°10.741/03). Tal diploma assegura em seu
Artigo 2° que devem ser garantidas todas as oportunidades e facilidades de saúde física e
mental, seu aperfeiçoamento moral, intelectual espiritual e social em condições de
liberdade e dignidade. Para além da garantia dos direitos, o Estatuto do Idoso revela
uma forte preocupação com a mudança dos velhos paradigmas. A partir de sua
disseminação, novos comportamentos vão sendo assimilados e a visão preconceituosa e
estigmatizante direcionada à pessoa idosa, fomentada por uma sociedade que ainda se
deixa persuadir pela fantasia da eterna juventude, vai gradativamente cedendo lugar a
uma nova compreensão sobre a evolução natural da vida e de seus determinantes.
Reescrever a história parece uma tarefa urgente e necessária. As gerações
presentes devem ser convocadas a pensar novos esquemas simbólicos do imaginário
sobre as diferentes fases da vida. Nesse caminhar, a própria existência como um todo
deve ser repensada. As representações negativas, cultivadas no passado e ainda
exploradas no presente, não favorecem a conquista da dignidade e, por isso mesmo, os
aspectos culturais são emblemáticos da necessidade de uma nova ordem social.
Diante de tamanhos desafios, ultrapassar o campo do discurso para a vida
prática, impõe a concepção de políticas públicas de caráter emancipatório, como
também exige superar a distância entre estado e sociedade. Sujeito, coletividades e suas
instâncias representativas no embate democrático precisam estar aliançadas, com poder
e autonomia preservados para enunciar demandas e balizar a disponibilidade de ofertas
de serviços essenciais à garantia dos direitos da população. Esse entendimento deve
justificar e orientar o debate contemporâneo no campo das políticas públicas para a
garantia dos direitos das pessoas idosas. Tal compreensão deve efetivar-se em práticas
cotidianas, capazes de corresponder á complexidade dos processos relacionados ao
envelhecimento, porque suas peculiaridades concorrem para exigências múltiplas de
caráter transversal. Nesse aspecto,o exercício do controle social é determinante.
Após a Constituição Federal de 1988 as práticas e mecanismos de
participação e controle social, no campo da gestão de políticas públicas de garantias de
direitos das pessoas idosas, tornaram-se temas recorrentes dos enunciados valorativos da
dignidade e da igualdade e por sua via, da democracia. A institucionalização do discurso
legal, no entanto, ainda não alcançou o êxito postulado porque o Brasil ainda não
superou os extremos das desigualdades, do mesmo modo que a noção de
transversalidade e controle social ainda se mostram vagas, sustentadas em proposições
gerais ou inespecíficas, o que não garante nem autoriza a efetividade de suas práticas.
A equidade, entendida como o provimento dos serviços para o atendimento
das necessidades da pessoa idosa exige participação ampliada, o que não se dá por acaso,
mas de modo qualificado para a intervenção nas diferentes instâncias responsáveis pela
formulação execução e avaliação de políticas públicas. Nessa lógica, os Conselhos se
configuram como espaços por excelência. A universalidade dos direitos de acesso à
serviços e benefícios essenciais requer a renovação permanente de iniciativas que visem
assegurá-los, tal como idealizados constitucionalmente. Do mesmo modo que a legislação
complementar de garantia dos direitos da pessoa idosa, não se efetiva sem que os atores
sociais, integrantes deste grupo etário, vocalizem suas demandas provocando respostas
positivas do estado em particular, e da sociedade em geral.
No caso específico do Estado do Ceará, o mapeamento dos Conselhos nos 184
municípios revela lacunas que precisam ser superadas. A inexistência, o despreparo dos
conselheiros, a falta de condições objetivas para o seu funcionamento ou sua
irregularidade comprometem o alcance da justiça social e da equidade.
Quando, por outra via, se pensa nas responsabilidades governamentais com a
garantia dos direitos da pessoa idosa, um primeiro impasse se coloca para essencial
superação: a dignidade da pessoa humana não se garante pela via de ações
desintegradas. É urgente superar o distanciamento entre instâncias governamentais e
promover a intersetorialidade entre políticas públicas, concebidas como estratégia
essencial para garantir a universalização dos direitos em relação objetiva com o
equacionamento do gasto público para a concretude na cobertura do atendimento às
necessidades da pessoa idosa em respeito a sua dignidade.
A realidade contemporânea autoriza o repensar de estratégias diferenciadas
com vistas ao enfrentamento da dinâmica da realidade, tal como esta se apresenta. Assim
compreendendo, essa Conferência anuncia uma discussão inovadora, onde os conceitos
de envelhecimento e de dignidade são colocados para além dos fundamentos teóricos que
norteiam a compreensão humana de seus postulados. Convoca, portanto, a sociedade
cearense como um todo a compartilhar saberes, vivências e responsabilidades com o hoje
e com o futuro
3 Dignidade da pessoa humana
Para os objetivos deste artigo, convém discutir o conceito de “dignidade da
pessoa humana”, o que implica, inicialmente, sua compreensão no percurso das noções
filosóficas valorativas seguindo-se para o campo do direito. A partir de então retoma-se a
questão inicial, que abre o debate em torno do tema desta Conferência, levando-se em
conta a dignidade da pessoa idosa.
Interessa, portanto, que a conceituação de pessoa humana seja a mais
abrangente possível, porque esse conteúdo não se esfacela em pedaços balizados pela
noção etária, racial ou de gênero. Essa compreensão é assim concebida de modo
intencional, para deixar bem evidente a sua contraposição cultural e simbólica ao
conceito de igualdade, contido na legislação presente.
O conceito de dignidade da pessoa humana tem sua evolução histórica
assinalada em momentos simbólicos de diferentes sociedades, a exemplo das marcas
deixadas pelo Cristianismo, depois em seus valores (re)significados pelo Iluminismo
Humanista, mais tarde reformulados na obra de Emmanuel Kant, conteúdo repensado
após os horrores da Segunda Grande Guerra Mundial, para, enfim, ser balizado pela
mais recente fase, inscrita no plano do Direito Internacional.
O Cristianismo fez emergir uma concepção de ser humano totalmente
estranha à compreensão difundida na Antiguidade. A partir de então, todos os seres da
espécie humana são filhos de Deus e compartilham da mesma dignidade. Essa
compreensão foi tomada como objeto de estudo de muitos pensadores cristãos da Idade
Média e hoje se evidencia na doutrina social da Igreja (Avila,1993).
Uma visão laica do mundo medieval emergiu com o Iluminismo em seus
postulados humanistas, que viam o homem como o centro e a medida de todas as coisas.
A partir de então, foram definidos os direitos individuais do homem e defendidos
perante o Estado. Consagraram-se, por essa via, importantes instrumentos balizadores
do poder como as constituições, as declarações de direitos pautadas pela igualdade e a
definição da lei como expressão da vontade geral.
Do ponto de vista filosófico, a dignidade humana concebida por Kant (1724-
1804), assume conteúdo valorativo maior em sua perspectiva de “ser o homem um fim
em si mesmo, dotado de dignidade ontológica, devendo o Estado orientar-se para
atendê-lo em seus interesses individuais e condições materiais indispensáveis ao exercício
da sua liberdade”. Entretanto, por seu conteúdo filosófico valorativo, a dignidade
humana assim concebida, não foi incorporada ao ordenamento jurídico inaugurado a
partir da Revolução Francesa.
Somente depois dos horrores da Segunda Grande Guerra mundial e das
repercussões derivadas dos regimes nazistas e fascistas é que o Direito Internacional
assumiu a concepção de dignidade humana como valor e princípio fundamental. Nessa
lógica, os valores de dignidade e igualdade fundamentam o expresso no artigo 22, da
Declaração Universal dos Direitos do Homem, aprovada em 10 de dezembro de 1948
pela Assembleia Geral das Nações Unidas, nela estando consagrado que:
Todo homem, como membro da sociedade tem direito à seguridade social e à realização, pelo esforço nacional, pela cooperação internacional e de acordo com a organização e recursos de cada Estado, dos direitos econômicos, sociais, culturais, indispensáveis à sua dignidade e ao livre desenvolvimento de sua personalidade.
Com o fim da Guerra Fria ( no início dos anos de 1990 pelos acordos do
desarmamento nuclear consolidado pelo Pacto de Varsóvia em1991) os temas sociais
assumem relevância na agenda internacional favorecendo a concepção de que “as
pessoas devem ser objeto último e o centro de qualquer estratégia” (Rubarth, 1999,
p.17). A partir de então, a dimensão humana passou a compor diferentes estudos
postulados pelos mais diversos organismos internacionais, cujo conteúdo reivindicava a
reformulação de políticas públicas tendo seus ajustes econômicos orientados, no sentido
de levarem em conta a defesa da dimensão humana em contraponto a outros interesses
do capital.
Aqui é oportuno lembrar que a dignidade tutelada tem duas vertentes
fundamentais muito objetivas: primeiro, a intolerância pública à degradação do ser
humano, o que remete à esfera moral de seu conceito, e segundo, o direito de todo ser
humano a uma existência material mínima, o que corresponde às esferas política e
econômica, contidas no conceito de dignidade.
Do ponto de vista jurídico, a dignidade da pessoa humana é referendada em
seu caráter de valor, de princípio ou de direito fundamental. “O conteúdo jurídico da
dignidade se relaciona aos chamados direitos fundamentais ou humanos. Isto é, terá
respeitada sua dignidade o indivíduo cujos direitos fundamentais forem observados e
realizados, ainda que a dignidade não se esgote neles”. (Barcelos, 2002, p.110).
A doutrina jurídica brasileira consagra a dignidade da pessoa humana como
ordenamento e fundamento último dos direitos políticos econômicos e sociais. No atual
contexto histórico nacional, a dignidade da pessoa humana assume, em paralelo com a
igualdade, papel central na ordem jurídica, representando o censo valorativo
internacional, cujo conteúdo é fonte de aprimoramento contínuo, derivado das lutas
sociais e conquistas legais em todo o mundo, balizando medidas de proteção social com
vistas à preservação da dignidade da pessoa humana.
Os postulados que orientam e justificam a compreensão da dignidade da
pessoa humana no atual contexto histórico brasileiro, estão referendados na perspectiva
de que o “ser humano não pode ser desinserido das condições de vida que usufrui, e, na
mesma época, anseia-se pela sua constante melhoria e, em caso de desníveis e disfunções
pela sua transformação” (Miranda, 2000, p.192).
Assim considerando, a Constituição Federal de 1988, consagra, em seu artigo
1°, inciso III, como um dos fundamentos da República Federativa do Brasil, a dignidade
da pessoa humana. Em outros dispositivos complementares, compromete-se com a
redução das desigualdades (artigo 3°, inciso III) e com a repulsa à discriminação (artigo
3°, inciso IV), além de vincular o Estado brasileiro com a busca pela justiça social e com
o bem-estar social da população em geral (artigos 170 e 193). Tais determinantes
assumem forte viés promocional, direcionado essencialmente pela busca da igualdade
material, o que se delineia mais expressivamente no campo dos direitos
socioassistenciais, por meio de prestações positivas do Estado, que visam o equilíbrio das
condições socioeconômicas dos indivíduos.
“Na verdade, o princípio da dignidade da pessoa humana é o fundamento último da igualdade, razão pela qual o Estado deve se incubir da garantir a todos os mínimos vitais. Tal princípio impõe que se estabeleça um parâmetro irrenunciável para a sobrevivência de uma pessoa e das possibilidades do sistema articulado pelo Estado para esse propósito” (Melo,2007,p.113)
Nessa lógica, a satisfação das necessidades básicas em termos de igualdade
assumida pelo Estado em seus compromissos constitucionais de garantia de direitos do
cidadão promove, no campo das políticas públicas de saúde e educação, a universalidade
do atendimento. No caso da assistência social, esse direito é balizado por um recorte, vez
que é conferido “a quem dela necessitar”, isso porque, a dignidade da pessoa humana
impõe ao Estado, piso mínimo de sobrevivência a ser assegurado, na medida das
necessidades das pessoas e das possibilidades do sistema articulado pelo Estado para
esse fim.
A equidade, por seu turno, é termo jurídico que sugere o princípio
fundamental do Direito ao evocar a realização da dignidade e da justiça. Um Pais
desigual e excludente não promove equidade entre seus cidadãos em geral, muito menos
a dignidade da pessoa idosa em particular. Essa compreensão é de grande pertinência à
perspectiva da transversalidade entre políticas públicas e ao exercício do controle social.
Há que se ter presente ainda, que os preceitos legais se transformam em
letras mortas quando a sociedade permanece alienada de suas conquistas
emancipatórias. Não basta que o Estado esteja imbuído da vontade política de
concretizar garantia de direitos de dignidade humana e adote medidas concretas de
proteção social para reduzir e corrigir desigualdades. Para além do compromisso e
responsabilidade do Estado, a sociedade precisa se lançar na dinâmica da vida ativa, no
exercício do controle social, pelas instâncias representativas dos interesses coletivos, a
exemplo dos Conselhos de Direitos dentre outros, e na participação direta nas arenas de
lutas, onde a democracia concorre para a afirmação da dignidade da pessoa humana,
alargando assim, os espaços para a sonhada igualdade entre os homens.
4 Ceará Acessível: em que sentido?
Pensar o envelhecimento digno, a partir da lógica estrutural e burocrática em
que se delineiam as políticas públicas no Brasil é um desafio considerável pela própria
cultura gerencial de estilo, segmentado em um racionalismo que divide
responsabilidades e desconsidera que o sujeito de suas ações se insere numa realidade
complexa e é nela que sua vida requer o desencadear de acessos que lhe permitam
transitar numa dinâmica de realizações essenciais ao seu empoderamento e
representação cidadã.
A noção de envelhecimento digno, em seu conteúdo plural, convergiu para o
delineamento do Programa Ceará Acessível, cuja representação simbólica pode ser
compreendida no seguinte modelo:
Figura I
Assim concebido e idealizado, o Programa articula políticas públicas em suas
instâncias operacionais e representativas no que concerne ao controle social, a exemplo
dos conselhos estadual e municipais de direitos da pessoa idosa dentre outras, a exemplo
de fóruns, associações e movimentos sociais.
Vale destacar que no decorrer do biênio 2009-2010, um planejamento
estratégico para a gestão dessas políticas foi efetivado, tendo por fundamento os dados
da realidade local, subsidiados por estudos e pesquisas norteadores da decisão política
concretizada no Programa Ceará Acessivel, cuja organicidade articula ações
transversais em diferentes Secretarias Estaduais, cujos desempenhos financeiros
apresentam-se no quadro II que se segue:
Quadro I
RESUMO FINANCEIRO GERAL – POR PROGRAMA/ Pessoa Idosa/ 076Valor 2007
(A)Valor 2008
(B)Valor 2009
(C)Valor 2010
(D)Valor Total(A+B+C+D)
DPG 0,00 0,00 0,00 31.754,00 31.754,00SECUL
T0,00 0,00 50.000,00 50.000,00 100.000,00
SSPDS 0,00 161.550,00 179.467,77 574.147,84 915.165,61FEAS 2.944.004,82 3.002.804,70 2.804.197,23 5.912.627,05 14.663.633,
80SEDUC 0,00 0,00 188.454,00 606.720,00 795.174,00SECITECE
0,00 0,00 0,00 43.477,56 43.477,56
SESPORTE
30.000,00 30.000,00 30.000,00 30.000,00 120.000,00
FUNDEJ
0,00 0,00 50.000,00 50.000,00 100.000,00
TOTAL GERA
L
2.974.004,82 3.194.354,70 3.302.119,00 7.298.726,45 16.769.204,97
Fonte: Governo do Estado do Ceará/ SEPLAG, 2010.
A leitura dos dados contidos neste quadro revelam que a Política Estadual em
Defesa dos Direitos da Pessoa Idosa, nos últimos quatros anos, apresenta significativo
crescimento. Em 2007, apenas duas secretarias estaduais destinavam em seus
orçamentos recursos específicos para a execução de projetos e/ou benefícios nas áreas de
Assistência Social e Esporte Já em 2010, observa-se uma evolução pelo
comprometimento de oito setoriais envolvidas com as ações do Programa Ceará
Acessível, destinadas à esse segmento.
Como resultante das articulações efetivadas pelo Ceará Acessível, a
participação das diversas secretarias estaduais foi efetivando-se e hoje é mais
significativa, apresentando um crescimento financeiro ao longo dos quatro anos,
conforme dados do quadro II, a seguir.
Quadro II
Evolução Qualitativa de Recursos Públicos
P145%e
Pessoa IdPppppppppppppppppppppposaPolíticas de Garantia dos
Direitos
Ano 2007 Ano 2010 Total
2007 - 2010 2.974.004,82 R$ 16.769.204,99 R$ 67.117.601,33
Fonte: Governo do Estado do Ceará, Programa Ceará Acessível, 2010.
O Ceará Acessível, no entanto, não se limita a esse quadro de referências.
Outras ações e investimentos foram desenvolvidos paralelamente por essas secretarias
estaduais e seus resultados estão apresentados ao longo deste artigo. Sobretudo, importa
destacar que se começa a desdobrar políticas conjuntas em sinergias impulsionadoras da
rota de acessibilidade que gradativamente alargam-se para todo o Estado.
Contemporaneamente cresce a compreensão de que o desenvolvimento de
uma sociedade deve ser avaliado pela determinação de incorporar, valorizar e estimular
a mais ampla participação política, econômica, produtiva, cultural e social dos seus
cidadãos e prioritariamente daqueles que ultrapassam a fase dos 60 anos e têm
perspectivas amplas de chegarem aos 90 ou 100 anos de idade.
No Ceará, onde a população idosa vem crescendo, tal como se observa no
País e em quase todo o mundo, a preocupação com a garantia dos direitos dessa
população está evidenciada ,na lógica gerencial assumida, na articulação intersetorial e
na perspectiva da transversalidade das políticas públicas, com vistas à garantia dos
direitos desses cidadãos, como se passa a destacar.
4.1 Assistência Social
Uma visão social inovadora sobre a condição de vida de pessoas idosas foi
inaugurada no Brasil pela Constituição Federal de 1988 e pela Lei Orgânica da
Assistência Social de 1993, pautada na dimensão ética de incluir os segmentos
vulneráveis numa visão de Proteção Social que supõe conhecer os riscos a que estão
sujeitos e as possibilidades de enfrentá-los.
A Assistência Social, efetivada como garantia de direitos de pessoas idosas no
Ceará, considera três vertentes de proteção social: os idosos e suas circunstâncias e
dentre eles, seu núcleo de apoio primeiro, isto é, sua família; a proteção social exige a
capacidade de maior aproximação possível ao cotidiano de vida das pessoas idosas, pois
é nele que os riscos e vulnerabilidades se constituem; e por último, o direito ao
abrigamento para aqueles que tiveram seus laços familiares rompidos, em situação
efetiva de Proteção Social de Alta Complexidade, pelas próprias condições que
determinam irrevogavelmente tal abrigamento.
. Proteção Social Básica
Programa de Atendimento à Pessoa Idosa Resultados (2007 – 2010)
Terceira Idade Cidadã Financiamento de Projetos e Serviços
Municipais voltados às famílias de
Pessoas Idosas, através de concurso por
Edital Público.
Edital 2010/1: 47 Projetos e
Selecionados
Edital 2010/2: 05 Projetos Selecionados
Beneficiados: 5.395 idososVALOR TOTAL: R$
1.000.000,00
A Proteção Social Básica direcionada às Pessoas Idosas previne agravos que
possam vir a provocar o rompimento dos vínculos familiares e sociais dos usuários. Visa
a garantia de direitos, o desenvolvimento de mecanismos para a inclusão social, a
aquisição de oportunidades e a participação e o desenvolvimento da autonomia das
pessoas idosas a partir de suas necessidades e potencialidades, prevenindo situações de
risco e o isolamento.
O Estado do Ceará, em seus 184 municípios exige um planejamento de ações
onde a participação de redes socioassistenciais seja uma realidade como estratégia capaz
de permitir o acesso aos idosos residentes nos distritos mais longínquos.
A territorialização dos Centros de Referência da Assistência Social (CRAS) se
constitui oportunidade, por excelência, para a inclusão das pessoas idosas nos mais
diferentes serviços e benefícios socioassistenciais.
As ações de Proteção Social Básica previnem o confinamento de idosos;
identificam situações de dependência; colaboram com redes inclusivas no território;
previnem o abrigamento institucional e promovem sua inclusão social; sensibilizam
grupos comunitários sobre direitos e necessidades de inclusão das pessoas idosas,
disseminando novas ideias com vistas à desconstruir mitos e preconceitos; desenvolve
estratégias para estimular e potencializar recursos das pessoas idosas e suas famílias;
estimulam a participação cidadã; contribuem para resgatar e/ou preservar a integridade
e a melhoria da qualidade de vida dos idosos viabilizando a construção de espaços
inclusivos.
Os 52 Projetos Municipais, aprovados pelo projeto Terceira Idade Cidadã,
estão referendados por ações de Proteção Social Básica e concorreram para o
fortalecimento da Política de Assistência Social no âmbito municipal. Como
complementaridade são concomitantemente desenvolvidas as seguintes ações:
Programa de Atendimento à Pessoa
IdosaResultados (2007 – 2010)
Terceira Idade Cidadã – Ações Complementares
.
IV Jornada GerontológicaValor: R$ 39.920,00
Curso de Memória e SocializaçãoValor: R$ 34.570,00
Apoio ao Conselho Estadual dos Direitos dos Idosos - CEDI/CE e Conselhos Municipais Valor: R$ 14.346,00
Grupos de Convivência Valor: R$ 60.250,00
Capacitação – Multiplicadores Sociais de Atenção à Pessoa Idosa. 3 Módulos com 120h/a.Valor: R$ 45.000,00
Disseminação da Política do Idoso e Monitoramento de Projetos Municipais Valor: R$ 105.814,00TOTAL GERAL: R$ 300.000,00
. Proteção Social Especial
Programa de Atendimento à Pessoa Idosa Resultados (2007 – 2010)- Abrigo de Idosos
- Idoso Sujeito Pleno
Abrigo para 105 Idosos (Construção,
Reforma e Aquisição de Equipamentos)
Valor: R$ 2.861.902,00
Manutenção do Abrigo para 105 Idosos.
Valor: 1.700.000,00
Como já se fez referência, a ampliação da expectativa de vida e a redução da
mortalidade convergem para uma maior longevidade da população. Simultâneos, esses
indicadores desafiam o Sistema de Garantia de Direitos da Pessoa Idosa, impondo a
necessidade de ações intersetoriais para a efetivação desses direitos. O Estatuto do Idoso
ao estabelecer garantias fundamentais a essa população, destaca a obrigação da família,
da sociedade, da comunidade e do Poder Público em assegurar à pessoa idosa, com
absoluta prioridade a efetivação do direito à vida, à saúde, à educação, à cultura, ao
esporte, ao lazer, ao trabalho, à cidadania, à liberdade, à dignidade, ao respeito, à não-
discriminação e a convivência familiar e comunitária.
Entretanto, a violência contra a Pessoa Idosa é uma realidade
multidimensional e quando se manifesta é relatada com muito sofrimento pela ruptura
das expectativas de afetividade entre familiares. A violência intrafamiliar compreende
tanto maus tratos físicos, quanto psicológicos, além da negligência e, em sua face mais
perversa, o abandono.
A ênfase da Política de Assistência Social na Proteção Especial prioriza a
reestruturação dos serviços de abrigamento aos Idosos que por uma série de fatores não
contam mais com a proteção e o cuidado de suas famílias. Os serviços de Proteção
Especial têm estreita interface com o sistema de garantias de direitos exigindo muitas
vezes, uma gestão mais complexa e compartilhada com o Poder Judiciário, Ministério
Público e outros órgãos e ações do Executivo.
Um abrigo constitui-se, portanto, num serviço de Proteção Social Especial de
alta complexidade. Garante proteção integral – moradia, alimentação, higienização e
trabalho protegido para idosos sem referências familiares e/ou em situação de ameaça
necessitando do afastamento de seu núcleo familiar de violência. (violência institucional)
Para cumprir os determinantes legais destinados a Pessoas Idosas que
vivenciam tais situações de risco e vulnerabilidade, a Secretaria do Trabalho e
Desenvolvimento Social (STDS) mantém o Abrigo de Idosos, situado na Avenida Olavo
Bilac, 1280 – Álvaro Weyne – Fortaleza, numa área física de 8.539,59 m², cujas
instalações passam por construção e reforma física, além de (re)estruturação gerencial
em seus aspectos técnicos para o aprimoramento da qualidade dos serviços
disponibilizados aos seus abrigados. A obra que se processa, encontra-se em estágio
avançado com perspectiva de conclusão em maio de 2011.
4.2 Cidades
Programa de Atendimento à Pessoa Idosa Resultados (2007 – 2010)Projeto Costa Oeste Residencial Dom Helder Câmara
Das 864 unidades construídas, 78 destinadas para pessoas idosas
Residencial Alves de LimaDas 310 unidades construídas, 27 unidades para a pessoa idosa
Residencial Oscar AraripeDas 110 unidades construídas, 13 destinadas a pessoas idosas
Residencial Leonel Brizola68 unidades construídas, das quais, 07 destinadas a pessoas idosas.
A Secretaria das Cidades, em seu Programa Habitacional, tem reservado
unidades adaptadas para pessoas idosas, além de desenvolver trabalho social junto à
população beneficiada pelos projetos habitacionais sob sua responsabilidade. Tais
iniciativas correspondem à garantia de direitos de pessoas idosas a habitação digna,
postulados pela legislação vigente.
4.3 Ciência, Tecnologia e Educação Superior
Programa de Atendimento à Pessoa Idosa Resultados (2007 – 2010)Inclusão Digital da Pessoa Idosa Valor: R$ 43.477,56
No processo de modernização tecnológica, os papeis sociais tradicionais
foram, aos poucos, sendo modificados. A inclusão digital de pessoas idosas se insere na
agenda do Programa Ceará Acessível como mais uma conquista porque garante o
manejo de equipamentos tecnológicos indispensáveis à vida cotidiana com liberdade e
autonomia.
O acesso à comunicação pela via da Internet é um direito contemporâneo que
perpassa todas as gerações. A vinculação de pessoas de todo o mundo em redes de
relacionamentos virtuais é uma realidade e se inscreve numa nova forma de ser, agir e
estar no mundo.
Além do utilitarismo puro e simples que a inclusão digital de pessoas idosas
possa almejar, está implícito em sua prática o acesso desses cidadãos ao conhecimento
em sentido amplo pelas possibilidades que se abrem frente ao manejo da tecnologia da
informática .É com esse entendimento que o Ceará Acessível transita pela via da Ciência
e da Tecnologia, formando coalizões cada vez mais articuladas para efetivar direitos de
pessoas idosas.
4.4 Cultura
Programa de Atendimento à Pessoa Idosa Resultados (2007 – 2010)
Memórias Centenárias do Ceará Livro em fase de editoraçãoValor: R$ 50.000,00
O livro “Memórias Centenárias do Ceará”, em sua versão 2010, utiliza-se da
metodologia de entrevistas para a composição de histórias de vida e é protagonizado por
quatro idosos de relevante participação no meio cultural cearense: José Claúdio de
Oliveira; Orlys Gurgel; Sinésio Cabral e Valdemar Caracas.
José Cláudio de Oliveira, escritor, entrevistado por Nirez, aos 83 anos de
idade, indagado sobre seus planos para o futuro afirmou: “Eu estou no futuro [...] tenho
um livro novo na cabeça, mas a máquina de escrever não existe mais [...] hoje é tudo no
computador, a máquina de escrever caiu mesmo”.
Orlys Gurgel, com 82 anos, conta como enfrentou os preconceitos da
sociedade cearense, relembrando fatos de sua juventude, há mais de 60 anos. Foi a
primeira mulher radialista. Em sua entrevista revela: “Eu queria um palco, queria
aparecer. Ai me identifiquei com o Rádio. Na minha época era muito difícil, porque o
tabu era esse: moça de família não trabalha em Rádio, mas eu provei que trabalha, tive
dignidade, e ainda hoje tenho.
Sinésio Cabral é a terceira personalidade em destaque. Poeta, 95 anos,
entrevistado por Sânzio, conta sua história de vida e entre suas lembranças, um versinho
de sua autoria ilustra breve passagem neste artigo:
“Não anda fora dos trilhosnem mesmo, por tentaçãoquem tem mãe dos seus filhos bem dentro do coração”
Por último, Valdemar Caracas, aos 103 anos de idade, poeta e líder dos
ferroviários, em sua lucidez, faz questão de deixar no livro o registro de sua última
vontade: “[...] neste espaço de chão foi sepultado o líder ferroviário Valdemar Cabral
Caracas” e acrescenta: “[...] eu quero é ir junto com os caboclos que me ajudaram a
viver e me respeitaram”.
4.5 Educação
Programa de Atendimento à Pessoa Idosa Resultados (2007 – 2010)Cursos de Alfabetização para a Pessoa Idosa
Apoio às Ações dos Docentes e Discentes
Projeto Eterno Aprendiz (Alfabetização de Idosos com Inclusão Digital)
Encontro para Formação de Professores (PAPI)
Seminário Estadual para Troca de Experiências com Carga Horária de 18h/dia
13.574 idosos em 151 municípios
Laboratório de Informática com 20 turmas no interior e 10 na capital
Realizado
Realizado
Valor: R$ 616.720,00
A implementação do Programa Brasil Alfabetizado no Ceará conta com a
adesão de 156 municípios, os quais firmaram convênio com o Ministério da Educação.
Os demais, (38 municípios), que não aderiram ao Programa Federal tiveram Planos de
Trabalho elaborados pela Secretaria de Educação do Estado e sua execução efetivou-se
mediante parceria com o Movimento dos Trabalhadores Rurais e Sem Terra – MST,
Central Única dos Trabalhadores – CUT e Ministério da Pesca e Agricultura – MPA. Tal
iniciativa resultou na alfabetização de 44.170 (Quarenta e Quatro Mil Cento e Setenta)
idosos.
A implantação do Programa de Atendimento à Pessoa Idosa – PAPI,
representou significativa conquista por oportunizar o resgate do tempo e de
oportunidades de educação formal para idosos em situação de analfabetismo.
O PAPI foi criado com o objetivo de promover a alfabetização de pessoas com
idade igual ou superior a 60 anos, com apoio de recurso digital, tendo promovido a
inclusão de 450 (Quatrocentos e Cinquenta) idosos no mundo das novas tecnologias.
Para tanto, investiu na formação de educadores com programa pedagógico voltado para
o alcance dos resultados almejados, como também na qualificação tecnológica desses
profissionais para o manejo dos computadores utilizados como ferramentas para a
alfabetização de idosos e inclusão digital.
4.6 Esporte
Programa de Atendimento à Pessoa Idosa Resultados (2007 – 2010)
Jogos da Felizidade
Projetos para Pessoas Idosas
Metas:
- 1.000 idosos participando de ginástica em Vilas Olímpicas e 585 idosos inseridos nos Jogos da FelicidadeValor: R$ 120.000,00
R$ 100.000,00
Total Geral: R$ 220.000,00
O esporte e o lazer como impulsionadores para a atividade física lúdica
colaboram para a melhoria da qualidade de vida de pessoas idosas. Os Jogos da
Felizidade movimentam de forma prática o envelhecimento ativo em seus determinantes
sociais e legais, de saúde pública. É exercício de inclusão social e acessibilidade pela
preservação da viabilidade física e emocional de pessoas idosas.
O Projeto Felizidade nessa gestão assistiu a 1.162 (hum mil cento e sessenta e
dois) idosos participantes de atividades físicas, recreativas, socioesportivas e culturais.
Pela via da prática esportiva, o Ceará Acessível vislumbra a cultura do
envelhecimento saudável, onde os obstáculos podem ser transponíveis pela via do direito
à vida saudável e ativa.
A dimensão transversal do Ceará Acessível propicia a busca pela autonomia
coletiva de pessoas idosas. Seus direitos estão formalizados. Usufruir de vida ativa é
prerrogativa de cada ser humano e nessa compreensão, a articulação entre políticas
públicas precisa se mover em espiral, num convite permanente para que pessoas idosas
participem ativamente da dinâmica local de sua própria casa, de seu bairro e de sua
cidade.
4.7 Saúde
A agenda do Governo do Estado do Ceará, voltada para a implementação de
políticas públicas na área da saúde, converge para a descentralização e universalização
do atendimento conforme dinamizado pelo Sistema Único da Saúde (SUS), cujas ações
se voltam para atenção ás demandas da população cearense em geral.
De modo específico o Programa Ceará Acessível inseriu no MAPP e em sua
Matriz GPR, ações complementares voltadas á garantia dos direitos de pessoas idosas a
partir do ano de 2009, com destaque para os projetos/atividades conforme quadro a
seguir:
Programa de Atendimento à Pessoa Idosa Resultados (2009 – 2010).Programa Saúde da Família-PSF
.Seminários sobre temas de interesse das pessoas idosas ( Demência, osteoporose, maus tratos, prevenção de quedas)
Seminário sobre envelhecimento e saúde da pessoa idosa
. Capacitação para Cuidadores de Idosos em domicílios e em unidades de saúde.
Incremento de 99.030 idosos cadastrados e atendidos pelo PSF. Seminários desenvolvidos nas Regiões do Aracati, Brejo Santo, Camocim, Canindé, Crato, Crateús, Fortaleza, Iço, Iguatú, Juazeiro, Maracanaú, Quixadá, Russas, Tauá e Tianguá, com a participação de 440 profissionais para otimizar o atendimento á pessoa idosa.. Realizado em Fortaleza com a participação de 350 profissionais das equipes do PSF.. 50 pessoas capacitadas.
Total Geral R$176.009,87
Esses indicadores, associados ao desempenho das ações globais, efetivadas no
âmbito da política da saúde no Ceará, conferem o reconhecimento do direito do cidadão
e a responsabilização do estado com a garantia de respostas às demandas da pessoa
idosa. Nesse sentido, destaca-se que as ações do SUS são monitoradas por indicadores
diversos, onde os dados epidemiológicos registram conquistas na redução do
quantitativo de óbitos materno-infantil, dado que repercute nos indicadores de
longevidade no Estado
As informações do SAI/SUS, relativas ao número de consultas médicas e
serviços ambulatoriais são anualmente crescentes (2.359.497 em 2010). Do mesmo modo,
os exames clínicos especializados relacionados aos diagnósticos em laboratórios clínicos
(anatomia patológica, citopatologia, radiologia, ultrasonografia, tomografia, ressonância
magnética, medicina nuclear, endoscopia, radiologia intervencionista, dentre outras).
4.8 Segurança Pública e Defesa Social
Programa de Atendimento à Pessoa Idosa Resultados (2007 – 2010)
Construção de Quadra Coberta
Projeto Saúde, Bombeiros e Sociedade
Alambrado de Proteção e Segurança para a Quadra Coberta da Terceira Idade do Corpo de Bombeiros
Quadra coberta construídaValor: R$ 341.017,77
300 núcleos em funcionamento em Fortaleza e RMF e 14 municípios atendem a 60 mil idososValor: R$ 521.723,02
Valor: R$ 52.424,82
O rompimento com o modelo histórico do sistema policial no Ceará vem se
efetivando, em especial com a criação do Ronda do Quarteirão e pelo trabalho do Corpo
de Bombeiros, através do Projeto Saúde, Bombeiros e Sociedade que se realiza em
praças e demais espaços públicos, reunindo pessoas idosas para a prática de exercícios
físicos.
Trata-se de experiência exitosa disseminada pelos bairros de Fortaleza e
cidades do interior do Estado. Sua prática redefine e amplia o conceito de segurança
pública, que converge para a afirmativa da capacidade de policiais e bombeiros
assumirem a missão de proteger a sociedade de todas as formas de violência, garantindo-
lhes acesso ao lazer e à prática de esportes, contribuindo significativamente para a
sociabilidade, autoestima e consequente melhoria da qualidade de vida de seus
participantes.
4.9 Turismo
Programa de Atendimento à Pessoa Idosa Resultados (2007 – 2010)
Clube da Melhor Idade Concessão de diárias e passagens
(Nacional e Internacional)
A qualidade de vida para pessoas idosas é uma premissa que se estende
também às possibilidades de fazer turismo. Nessa perspectiva, algumas garantias legais
estão estabelecidas a exemplo do Passe Livre, que lhes assegura gratuidade nos
transportes coletivos urbanos (ônibus, metrô) a partir dos 65 anos de idade. Nos
coletivos municipais, 10% dos assentos são reservados aos idosos e tais assentos
apresentam placas indicativas.
Para viagens entre Estados (transporte interestadual) os idosos com renda
inferior a 2 (dois) salários mínimos têm direito à gratuidade na passagem, com limite de
2 (duas) vagas por veículo. Caso as vagas tenham sido preenchidas, o idoso tem direito à
redução de 50% no valor da compra da passagem.
Coerente com a garantia de tais direitos, a Secretaria do Turismo vem
desenvolvendo o Projeto Clube da Melhor Idade, disponibilizando a concessão de
passagens aéreas e diárias em hotéis para que pessoas idosas do Clube possam participar
de eventos (reuniões, Congresso Luso/Brasileiro em Lisboa, Congresso Regional em São
Luís – MA; Reunião Nacional em Brasília) oportunidade em que divulgam os pontos
turísticos e o artesanato do Estado do Ceará.
Vale ressaltar ainda, o apoio à Ouvidoria do Estado para criação e
manutenção da Ouvidoria do Idoso. E, em apoio às ações da Secretaria do Trabalho e
Desenvolvimento Social (STDS), promoveu-se o incentivo e articulações para a
realização do projeto Fortalecimento Institucional em suas etapas de capacitação de
Conselheiros Municipais dos Direitos do idoso com o apoio da STDS e do Portal
Inclusivo em articulação com a Secretaria do Planejamento e Gestão e a Empresa de
Tecnologia da Informação do Estado do Ceará (ETICE), o que está consolidado num
mecanismo destinado a comunicação virtual das políticas públicas direcionadas a idosos
no Ceará.
Sem o intuito de relatar atividades cotidianas efetivadas até então, deixa-se,
aqui, uma breve síntese do que foi possível empreender, até agora, no sentido da
articulação de políticas públicas para a garantia dos direitos de idosos no Ceará.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Afinal, diante do exposto, como garantir o envelhecimento digno em uma
sociedade cujos valores simbólicos de identidade constroem uma trama para
mecanismos de defesa na busca da jovialidade?
Nos limites deste artigo seria precipitado apontar caminhos como verdades
últimas, entretanto, algumas pistas podem balizar o consenso em torno dos rumos que se
deve perseguir para a busca de respostas positivas às dificuldades presentes.
Como já foi identificado por Silva (2008), uma época histórica se caracteriza
principalmente por um sistema de ideias, sistema de técnicas e institucionalidade.6 Essa
mudança, postulada no campo das políticas públicas destinadas às pessoas idosas, exige
o direcionamento do olhar multifocal para suas mais diferentes condições de existência
digna. Tais condições mudam quando se transformam, de forma qualitativa e
simultânea, as relações institucionais em sua dinâmica de respostas às demandas da
população.
Já não se discute se o envelhecimento da população é projeção consistente. A
realidade confirma esse fato. O que está em discussão é como garantir o envelhecimento
6 SILVA , José de Souza. A mudança de época e o contexto global cambiante. Implicações para a mudança institucional em organizações de desenvolvimento. (mimeo), 2008
com dignidade, mas também não se pode pensar o futuro desconsiderando o hoje.
A realidade contemporânea é excludente, injusta e perversa em condições
objetivas de vida para expressiva maioria das pessoas idosas, seja pelas limitações
econômicas, sociais ou culturais que vivenciam.
A experiência na gestão de políticas públicas, voltadas à garantia dos direitos
de pessoas idosas, autoriza a compreensão de que operadas isoladamente se mostram
reducionistas e questionáveis no alcance de seus objetivos. Do mesmo modo, é
compreensível que o controle social por parte dos Conselhos, efetivado no campo da
participação ativa no planejamento, monitoramento e avaliação dessas políticas, ainda
deixa muito a desejar. Assim sendo, o envelhecimento digno das gerações presentes está
seriamente comprometido, o que não desanima vislumbrar um futuro diferente, onde
todas as barreiras atitudinais excludentes tenham sido superadas pelo esforço coletivo
para a transformação da realidade
Articular saberes, esforços e vontades parece ser um caminho possível à
gradativa mudança cultural que, hoje fomentada pela perspectiva consumista do
descartável, valoriza o que é novo em detrimento do que é velho. Nessa lógica, coisas e
pessoas são colocadas sob a mesma ótica. Seres coisificados perdem sua identidade e,
quando muito, são transformados em mero elementos de cálculos estatísticos, ao passo
que suas projeções adquirem visibilidade.
Muito mais que aparato legal de garantia de direitos, fala-se aqui de
mudança nos modos de ser, pensar e agir de uma sociedade inteira, não somente de
pessoas idosas. Para que esse ideal adquira concretude toda a coletividade precisa estar
consciente dos limites e possibilidades presentes.
No que diz respeito ás responsabilidades do Estado do Ceará, está em curso
uma articulação permanente entre as políticas públicas, voltadas à garantia dos direitos
das pessoas idosas. Embora recente, o Programa Ceará Acessível já extrapola seu estágio
de concepção filosófica e organizacional e, aos poucos, adquire visibilidade pela
pertinência da vontade política de transformar o quadro da realidade local.
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