O Caminho Novo em seu papel de construtor do território das Minas Gerais

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    Relato do IV Encontro de Pesquisadores do Caminho Novo Congonhas, MG Maio 2013

    Nilza Cantoni e Joana Capella

    O Caminho Novo sob a perspectiva dos viajantes do sculo XIX

    Professora Edna Maria Resende, doutora em Histria, pesquisadora do Arquivo Histrico

    Municipal Professor Altair Jos Savassi, Barbacena, trabalhando na sua implantao e

    organizao desde o ano de 2000.

    Inicialmente a professora Edna declarou ter grande prazer

    em comparecer novamente ao Encontro de Pesquisadores do

    Caminho Novo, evento que viu nascer em Barbacena no ano de

    2010. Explicou que falaria sobre os relatos dos viajantes

    estrangeiros, considerados de leitura muito prazerosa, dos quais

    extraiu aspectos relacionados ao Caminho Novo, trilhado por eles

    no sculo XIX . Relatos de Viagem, ressaltou Edna Resende, foram

    produzidos antes do sculo XIX para a Amrica Portuguesa,

    predominantemente por portugueses em virtude de estrangeiros

    no terem autorizao para viajar pelo territrio brasileiro. Com a

    vinda da Corte em 1808, encerrou-se o perodo do exclusivismo portugus. Tendo D. Joo VI tomado

    a iniciativa de promover estudos sobre o Brasil, desencadeou-se um ciclo de viagens de estudos que

    representa um novo descobrimento do Brasil.

    A diretora do Arquivo Histrico barbacenense apresentou uma anlise detalhada sobre os

    relatos que consultou, destacando os seguintes aspectos:

    A perspectiva de se conhecer as potencialidades do pas atraiu cientistas (mineralogistas,

    botnicos, zologos, cartgrafos, etnlogos, gelogos), comerciantes, diplomatas,

    imigrantes, aventureiros, vidos por aventura, pesquisa, lazer e trabalho.

    Ao empreenderem as viagens, alm de ocuparem-se de suas pesquisas e interesses

    especficos, os viajantes preocuparam-se em relatar minuciosamente a experincia

    vivenciada, descrevendo suas observaes, registrando seus testemunhos, transmitindo suas

    impresses.

    O relato resultado da viagem. Era preciso viajar para conhecer e para escrever. O viajante,

    imbudo do esprito do Iluminismo, procura compreender racionalmente o mundo e a

    natureza. Inspirado no projeto totalizante de Humboldt, aspira a tudo conhecer, natureza e

    cultura, a tudo classificando, na perspectiva da taxonomia e do enciclopedismo.

    O relato de viagem multidimensional, sendo um texto capaz de conter muitos outros, de

    tudo poder abrigar. Resulta de um projeto e de um trajeto, expressando uma representao

    da sociedade visitada.

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    Essa representao marcada pelas motivaes da viagem (estudar e classificar a natureza,

    conhecer os recursos e potencialidades de novos mercados, colecionar espcies para museus,

    aventurar-se por locais desconhecidos) e pela cultura do observador, que moldar sua viso

    do outro.

    A narrativa de viagem traz a marca do confronto com a diferena.

    O viajante percebe o outro a partir de si e conhecendo o outro que ele conhece a si mesmo.

    Ento, identifica o diferente como extico.

    A falta de vivncia e o desconhecimento da populao local impedem o viajante de

    compreender adequadamente uma populao. Por outro lado, o fato de ser estrangeiro d a

    ele maior autonomia e distanciamento para observar situaes impossveis de serem

    apreendidas pelos habitantes da regio visitada.Relatos de viagem produzidos pelos viajantes que percorreram o Brasil durante o sculo XIX,

    constituem fontes indispensveis para os estudiosos do perodo, por darem conta de parte

    significativamente grande de nosso passado e por oferecerem uma verso j considerada

    quase consensual sobre a totalidade dos aspectos do Brasil no sculo XIX.

    Busca-se capturar os olhares dos viajantes sobre o Caminho Novo, ressaltando os aspectos

    que nos deram a conhecer.

    Saint-Hilaire diz: esbocei o quadro que me oferecia aos olhos ou necessrio dar a

    conhecer sobre a viagem, o caminho, a paisagem, os ranchos, vendas e comrcios, as

    fazendas e suas atividades, as povoaes com seus habitantes e seus costumes.

    Esses olhares revelam o dinamismo do Caminho Novo e sua importncia econmica e

    estratgica.

    Em geral, os viajantes que vinham para Minas partiam do Rio de Janeiro depois de terem

    providenciado as condies para a viagem (licenas, informaes, aparato material e

    humano).

    Cunha Matos, que empreende sua viagem em direo a Gois, em 1823, mostra os itens que

    deve levar um indivduo abastado: uma barraca, uma cantina etc. Se no for abastado, pelo

    menos uma rede para dormir livre da imensa quantidade de bichos que h nos ranchos e se

    introduzem nos ps.

    Ao colocarem-se a caminho, entra em cena o olhar atento do viajante, armado pela Histria

    Natural.

    H um encantamento com a paisagem, descrita como exuberante, maravilhosa, marcada

    pela noo do pitoresco.

    Ao deixar o Rio de Janeiro, Saint-Hilaire registra: Talvez cousa alguma no mundo se compare

    em beleza aos arredores do Rio de Janeiro. No vero o cu de um azul carregado, no

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    inverno a colorao enfraquece e apresenta esse azul claro que entre ns se admira nos belos

    dias de outono. L jamais a vegetao repousa, e, em todos os meses do ano, as matas e

    campos esto ornados de flores vistosas. Florestas virgens to velhas como o mundo exibem

    sua imponncia, quase s portas da cidade, e formam contraste encantador com o trabalho

    dos homens.

    Os viajantes impressionaram-se vivamente com a mata virgem, conforme destaca Spix e

    Martius:

    As matas densas, que existem como testemunho da fora criadora do Novo Continente na

    sua primitiva selvajaria, e ainda no profanadas pelo homem, chamam-se no Brasil mato

    virgem. Dentro dele, o viajante sente a frescura europeia, ao mesmo tempo avista um painel

    da mxima opulncia; vegetao eternamente nova impele as rvores para altura majestosae, no satisfeita de ter produzido esses gigantes velhssimos, a natureza enfeita cada tronco

    com uma nova criao de muitos parasitas verdes e floridos. Aqui e acol, (...) excepcionais e

    incomparveis se alteiam as esbeltas palmeiras com os topos ondulantes, ornamento das

    florestas, cuja beleza e majestade superam toda descrio.

    Floresta brasileira. Johson Heade, 1864 in BELUZZO, 2000, v. 3, p. 176

    Os viajantes no deixaram de notar ainda as roas (de milho, feijo, mandioca, cana) que

    margeavam o Caminho, como Cunha Matos: Segui pela estrada real ao lado de altos morros

    granticos, plantados de cafezeiros e vrios roados de milho e feijo, e algumas abboras.

    Tambm estavam atentos s mudanas na paisagem, como quando se deparavam com a

    regio dos campos. Aps dias mergulhados nas densas florestas, tal no era a satisfao dos

    viajantes ao se depararem subitamente com os campos.

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    Richard Burton tambm se deslumbrou: Parece desnecessrio dizer que nada pode haver de

    mais puro do que o ar desses campos; o prazer de respir-lo combate a monotonia de uma

    viagem em lombo de mula (...) No falta, tambm, aos campos a beleza da forma e do

    colorido. H grandeza em sua vasta continuidade, que se vai perdendo distncia.

    Campos Gerais, von Martius, in COSTA, Cartografia da Conquista do Territrio das Minas, 2004, p. 90

    Vista dos campos de Barbacena, Rugendas

    Ao executarem seus projeto de viagem, os viajantes vo construindo o trajeto, registrando o

    itinerrio, preocupados com o fato de que o itinerrio talvez tenha de ser visto por pessoas

    que hajam de fazer jornada.

    Os viajantes no se furtam de comentar sobre as condies da viagem e sobre a qualidade

    das estradas. Pohl reclama, ao subir montanha acima, que o caminho bastante cansativo.

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    Saint-Hilaire relata que o caminho vai, sem cessar, ora subindo, ora descendo, e as rampas

    so frequentemente rudes e muito fatigantes para os animais de carga. Alis, embora se

    atravesse continuamente florestas, o trajeto no , em absoluto, montono.

    Desde que saiu do Rio de Janeiro, Saint-Hilaire observou o intenso movimento do Caminho

    Novo: no deixamos de encontrar homens a p e a cavalo, e negros que conduziam

    cargueiros descarregados (...); rebanhos de bois, e varas de porcos, tocados por Mineiros,

    avanavam lentamente, fazendo voar turbilhes de p.

    Assim que deixavam o Rio de Janeiro, os viajantes chegavam ao arraial do Porto da Estrela,

    uma espcie de emprio de mercadorias vindas de Minas Gerais.

    Cunha Matos informa que no arraial h vrias lojas de fazendas secas e molhadas, grandes

    armazns de sal e muitos ranchos e armazns abertos e fechados, onde os viandantesrecolhem as suas fazendas.

    Porto da Estrela, Rugendas

    Tropa na Serra da Estrela in COSTA, Cartografia da Conquista do Territrio das Minas, 2004, p.86

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    Habitantes de Minas Gerais, Rugendas

    Tropa de negociantes, Rugendas

    Tropa na Serra dos rgos, Rugendas

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    Cunha Matos observa ainda a larga quantidade de mineiros que o comrcio chama a este

    arraial; o imenso nmero de bestas de sela e carga; a azfama e o alarido que aqui causam

    espanto queles que pela primeira vez chegam aos portos de embarque e desembarque dos

    gneros que vm e vo para as Minas Gerais.

    O ir e vir de mineiros era to intenso que Cunha Matos diz no ter ouvido, em toda sua

    jornada, nem canto de pssaros, nem vozes de animais selvagens, talvez por motivo da

    frequentssima passagem de tropas de mineiros, que vo e vm do Porto de Estrela e outros

    lugares.

    As rcuas (tropas) de mineiros, que transitavam to intensamente pelo Caminho Novo,

    transportavam, alm de boiadas e porcadas, sacos de milho, rolos de tecido de algodo e

    queijos.A viagem e a circulao pelo Caminho Novo eram viabilizadas pela estrutura dos pousos e

    ranchos. Alm de entrepostos fundamentais nesse sistema de circulao, os ranchos

    pontuavam o Caminho e ajudavam a demarc-lo, fixando o itinerrio.

    A cada intervalo de tempo, existem ranchos, assim descritos por Cunha Matos: Tem rancho

    grande ou barraco para os viandantes. Junto ao rancho existe uma taverna, que estava

    cheia de tropeiros e outros indivduos de todas as cores, empregados em diversos servios de

    jornada, e alguns cantavam e tocavam nas suas violas.

    Nos ranchos, ao parar para se refazer da jornada, o viajante encontrava abrigo, alimentos,

    pasto para os animais, lojas de ferrador e arreeiro para reparo nas tropas. Muitas vezes, eles

    reclamavam do alto preo das mercadorias e da sujeira das vendas e ranchos.

    Saint-Hilaire diz que o o viajante , em geral, no encontra nessa estrada o menor recurso. As

    vendas so a, verdade, bastante numerosas; algumas garrafas de aguardente de cana,

    algumas peas de vasilhame de barro, um pouco de fumo, porm constituem ordinariamente

    quase todo o sortimento dessa casa de negcio; uma felicidade quando se pode encontrar

    uma dzia de bananas ou uns queijos.

    Cunha Matos tambm descreve um rancho onde pernoitou: o rancho do Almeida aberto;

    tem uma venda imunda; o cheiro das cangalhas das bestas insuportvel; o alarido dos

    arrieiros ensurdece; e estou j conhecendo os incmodos que hei de sofrer na minha marcha.

    Apenas chegamos ao rancho, tratou-se de arranjar as cargas, dar gua e milho s bestas; um

    dos tocadores foi fazer a comida do tropeiro, a qual consistiu em feijo preto com pingo de

    toucinho, misturado de farinha de mandioca. Eu mandei fazer galinhas com arroz para mim

    (...) e feijo com toucinho para os pretos.

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    Cunha Matos continua: Aqui comeam as privaes. Na venda do rancho existia po,

    bolacha, queijo, doce de goiaba em tijolos, farinha de milho; no faltava aguardente, vinho e

    mais alguns gneros.

    Pouso de uma tropa, Rugendas

    Rancho, Thomas Hender, 1817 in COSTA, Cartografia da Conquista do Territrio das Minas, 2004, p. 94

    Os viajantes informam sobre a alimentao, no apenas nas vendas, ranchos e tropas, como

    da populao.

    Saint-Hilaire, enquanto herborizava nas matas, chega a uma plantao de milho e encontra

    uma choa de negros. Ao se aproximar, encontra um negro sentado no cho, comendo

    pedaos de tatu assado sobre carves; nesse momento mesmo ps alguns pedaos numa

    meia cabaa, acrescentou angu, e ofereceu-me da forma mais graciosa.

    Cunha Matos registrou os hbitos alimentares dos fazendeiros: Tenho observado que nas

    hortas das casas por onde passo h muitas bananeiras, couves algumas laranjeiras e

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    pessegueiros. As galinhas compram-se por estes stios a 480 ris; o feijo, farinha, toucinho e

    mais comestveis so pouco mais baratos que no Rio de Janeiro. Em todas as mesas tenho

    visto canjica de milho e couve picada.

    No Rancho de Paulo da Vrzea, localizado depois da Rocinha da Negra, Cunha Matos foi

    convidado para jantar pelo fazendeiro e descreve o cardpio oferecido: A comida consistia

    em muita carne de porco com feijo, carne de vaca e couve: carne de porco guisada coberta

    de talhadas de laranjas; e canjica de milho. Para os eclesisticos, e para mim e os meus

    companheiros de jornada, puseram vinho, po e doce, bons guardanapos e talheres de prata.

    Nesta casa principiei a ver o que ao depois observei constantemente no interior do Brasil, e

    vem a ser as talhadas de laranja sobre a carne, e o dar graas a Deus ao fim do jantar.

    Ao olhar as povoaes, sua populao, suas manifestaes culturais, os viajantes nomostram o mesmo encantamento relativo s paisagens naturais. Mais do que nunca a

    alteridade se explicita e as comparaes so inevitveis: quanto mais perto da sua cultura

    melhor.

    Desse modo, Saint-Hilaire, ao chegar vila de Barbacena, surpreende-se por no encontrar

    uma reunio miservel de choupanas, mas uma pequena cidade que pode rivalizar com

    todas as da Frana de igual populao, onde o ar que se respira (...) extremamente puro.

    Quando passou por Congonhas, Saint-Hilaire observou: no meio de uma praa alongada, se

    acha a igreja paroquial, notvel por seu tamanho. No morro que fica fronteiro ao que venho

    de falar v-se a igreja de Bom Jesus de Matosinhos, que goza de grande celebridade. Est

    visto que eu no deixaria Congonhas sem ir visitar a igreja de N. S. Bom Jesus de Matosinhos,

    que , para esta regio, como observa Luccock, o que para a Itlia a N. Sra. de Loreto.

    Diante dela [igreja] colocaram sobre os muros da escadaria e sobre os do terrao, esttuas de

    pedra representando os profetas. Essas esttuas no so obras primas, sem dvida; mas

    observa-se no modo pelo qual foram esculpidas qualquer cousa de grandioso, o que prova no

    artista um talento natural muito pronunciado.

    Por outro lado, a populao, especialmente escravos, forros e livres pobres, so vistos de

    forma preconceituosa.

    Cunha Matos afirma ser incomparvel o nmero de moas galhofeiras que povoam os

    ranchos desta vila [de Barbacena]; sitiam, combatem, vencem, e despojam os desgraados

    tropeiros, arreadores, tocadores, e os mesmos passageiros. Esta milcia de Vnus consta pela

    maior parte de raparigas pardas e pretas, que, durante a noite, em completa bacanlia, no

    saem dos infernais batuques com que divertem e limpam as algibeiras dos desgraados a

    quem pescam.

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    Por outro lado, a populao, especialmente escravos, forros e livres pobres, so vistos de

    forma preconceituosa.

    Cunha Matos afirma ser incomparvel o nmero de moas galhofeiras que povoam os

    ranchos desta vila [de Barbacena]; sitiam, combatem, vencem, e despojam os desgraados

    tropeiros, arreadores, tocadores, e os mesmos passageiros. Esta milcia de Vnus consta pela

    maior parte de raparigas pardas e pretas, que, durante a noite, em completa bacanlia, no

    saem dos infernais batuques com que divertem e limpam as algibeiras dos desgraados a

    quem pescam.

    Saint-Hilaire tambm no viu com bons olhos os costumes em Barbacena: Barbacena e

    clebre, entre os tropeiros, pela grande quantidade de mulatas prostitudas que a habitam, e

    entre cujas mos esses homens deixam o fruto do trabalho. Sem a menor cerimnia vemoferecer-se essas mulheres pelos albergues; muitas vezes os viajantes as convidam para

    jantar e com elas danam batuques, essas danas lbricas que, no o podemos dizer sem

    pejo, se tornaram nacionais na Provncia das Minas.

    Mesmo que o trajeto e a construo do relato sejam marcados projeto da viagem, o olhar dos

    viajantes, embora etnocntrico, nos d a conhecer sobre o Caminho Novo, sobre o itinerrio,

    a toponmia, as atividades comerciais e os negcios, sobre o cotidiano dos viajantes e da

    populao, contemplando seus hbitos e costumes. Enfim, o relato nos d uma

    representao da sociedade visitada.

    Ao seguirmos os viajantes, em suas andanas pelo Caminho Novo, e travarmos contato com

    as pessoas notcias e mercadorias que por ele circulavam, percebemos a importncia

    estratgica e estrutural do Caminho Novo, verdadeira espinha dorsal das Minas Gerais,

    sustentculo de uma rede que interliga e constri o territrio.

    Finalizando sua comunicao a professora Edna Resende apresentou a bibliografia:

    BELUZZO, Ana M. de M. O Brasil dos viajantes. 3. ed. So Paulo: Objetiva, 2000.

    BUNBURY, Charles James Fox. Viagem de um naturalista ingls ao Rio de Janeiro e Minas Gerais.

    Belo Horizonte: Itatiaia; Sao Paulo: Ed. da Universidade de Sao Paulo, 1981.

    BURTON, Richard. Viagem do Rio de Janeiro a Morro Velho. Belo Horizonte: Itatiaia; So Paulo: Ed.

    da Universidade de Sao Paulo, 1976.

    COSTA, Antnio G. (Org.). Cartografia da Conquista do Territrio das Minas. Belo Horizonte: UFMG,

    2004.

    LEITE, Ilka B. Antropologia de viagem. Belo Horizonte: Ed. UFMG, 1996.

    LEITE, Miriam M. Livros de viagem. Rio de Janeiro: Ed. UFRJ, 1997.

    LUCCOCK, John. Notas sobre o Rio de Janeiro e partes meridionais do Brasil . Belo Horizonte: Itatiaia;

    So Paulo, Ed. da Universidade de So Paulo, 1975.

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    Nilza Cantoni e Joana Capella

    MATOS, Raimundo Jos da Cunha. Itinerrio do Rio de Janeiro ao Par e Maranho, pelas provncias

    de Minas Gerais e Gois, (...) Belo Horizonte: ICAM, 2004

    POHL. Johann E. Viagem no interior do Brasil (1817-1821). Belo Horizonte: Itatiaia, 1976.

    RUGENDAS, Johann M. Viagem pitoresca atravs do Brasil. 8. ed. Belo Horizonte: Itatiaia; So Paulo:

    Ed. USP, 1979.

    SAINT-HILAIRE, August de. Viagem pelas provncias do Rio de Janeiro e Minas Gerais . Belo

    Horizonte: Itatiaia; So Paulo: Ed. da Universidade de So Paulo, 1975.

    SAINT-HILAIRE, Auguste de. Viagem pelo distrito dos diamantes e litoral do Brasil . Belo Horizonte:

    Itatiaia; So Paulo: Ed. da Universidade de So Paulo, 1974.

    SSSEKIND, Flora. O Brasil no longe daqui. So Paulo: Companhia das Letras, 1990