O Banco de Desenvolvimento dos BRICS: Por que o novo banco dos BRICS deve adotar uma agenda para...

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Os líderes dos cinco países dos BRICS – Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul – vão se reunir em Fortaleza, Brasil, em julho de 2014, para realizar sua sétima rodada de discussões. Embora o interesse mundial pelas atividades do bloco esteja bem aquém dos níveis de entusiasmo do período entre 2009 e 2012, há muita expectativa com relação ao anúncio de sua primeira iniciativa institucional de grande vulto – um novo banco de desenvolvimento, até agora conhecido como Banco de Desenvolvimento dos BRICS. Em 2013, na quinta reunião de cúpula realizada em Durban, África do Sul, os BRICS anunciaram a intenção de lançar o banco no ano seguinte – com pouca informação revelada à comunidade global a não ser a concordância em ter como foco a “mobilização de recursos para projetos de infraestrutura e desenvolvimento sustentável nos países dos BRICS e em outras economias emergentes e países em desenvolvimento”, de modo a “complementar os esforços atuais de instituições financeiras multilaterais e regionais para o crescimento e o desenvolvimento globais”. A expectativa é de que o banco propicie nova fonte de financiamento para as economias em desenvolvimento e emergentes cujas necessidades de desenvolvimento não estão sendo atualmente supridas pelas instituições financeiras existentes. Espera-se que o Banco dos BRICS ajude a corrigir esse descompasso não apenas ao canalizar os recursos disponíveis nos países membros, mas também de outros países de renda média e de doadores em potencial, como as nações ricas em petróleo. Entre as mais nobres ambições do banco está o desenvolvimento de um mercado de divisas entre os membros do bloco com medidas adotadas para promover facilidade de conversão do real, do rublo, da rúpia, do renminbi e do rande, permitindo assim uma diversificação de reservas cambiais. A criação de uma moeda de reserva dos BRICS, capaz de desafiar a atual dependência do dólar como a única moeda de reserva e de galgar posição equiparada à dos Direitos Especiais de Saque (DES) do FMI, é um cenário previsto pelos entusiastas da possibilidade de os BRICS colocarem em cheque o sistema financeiro atual. É essencial que os BRICS se comprometam a não limitar essa iniciativa que carrega sua marca às noções tradicionais de banco de desenvolvimento e trabalhem para definir e detalhar uma agenda inovadora para a nova instituição.

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OXFAM POLICY PAPER – Sumário 11 DE JULHO DE 2014

O BANCO DE DESENVOLVIMENTO DOS BRICS

Por que o novo banco dos BRICS deve adotar uma agenda para erradicar a pobreza?

Os líderes dos cinco países dos BRICS – Brasil, Rússia, Índia, China e África

do Sul – vão se reunir em Fortaleza, Brasil, em julho de 2014, para realizar sua sétima rodada de discussões. Embora o interesse mundial pelas atividades do

bloco esteja bem aquém dos níveis de entusiasmo do período entre 2009 e

2012, há muita expectativa com relação ao anúncio de sua primeira iniciativa

institucional de grande vulto – um novo banco de desenvolvimento, até agora

conhecido como Banco de Desenvolvimento dos BRICS.

Em 2013, na quinta reunião de cúpula realizada em Durban, África do Sul, os

BRICS anunciaram a intenção de lançar o banco no ano seguinte – com pouca

informação revelada à comunidade global a não ser a concordância em ter

como foco a “mobilização de recursos para projetos de infraestrutura e

desenvolvimento sustentável nos países dos BRICS e em outras economias

emergentes e países em desenvolvimento”, de modo a “complementar os esforços atuais de instituições financeiras multilaterais e regionais para o

crescimento e o desenvolvimento globais”. A expectativa é de que o banco

propicie nova fonte de financiamento para as economias em desenvolvimento

e emergentes cujas necessidades de desenvolvimento não estão sendo

atualmente supridas pelas instituições financeiras existentes. Espera-se que o

Banco dos BRICS ajude a corrigir esse descompasso não apenas ao canalizar

os recursos disponíveis nos países membros, mas também de outros países

de renda média e de doadores em potencial, como as nações ricas em petróleo.

Entre as mais nobres ambições do banco está o desenvolvimento de um

mercado de divisas entre os membros do bloco com medidas adotadas para

promover facilidade de conversão do real, do rublo, da rúpia, do renminbi e do

rande, permitindo assim uma diversificação de reservas cambiais. A criação de uma moeda de reserva dos BRICS, capaz de desafiar a atual dependência do

dólar como a única moeda de reserva e de galgar posição equiparada à dos

Direitos Especiais de Saque (DES) do FMI, é um cenário previsto pelos

entusiastas da possibilidade de os BRICS colocarem em cheque o sistema

financeiro atual.

É essencial que os BRICS se comprometam a não limitar essa iniciativa que

carrega sua marca às noções tradicionais de banco de desenvolvimento e

trabalhem para definir e detalhar uma agenda inovadora para a nova

instituição.

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As recomendações da Oxfam para o trabalho do Banco de Desenvolvimento

dos BRICS, portanto, incluem o seguinte:

I - O novo Banco é uma oportunidade para os BRICS demonstrarem liderança na agenda de desenvolvimento sustentável

À medida que o mundo se prepara para adotar um novo modelo global de

desenvolvimento, os BRICS têm a oportunidade de assumir liderança conceitual e operacional na importantíssima agenda de ‘desenvolvimento

sustentável’, cujo apelo surgiu principalmente durante as discussões

realizadas na Rio+20 de 2012, no Brasil. O Banco dos BRICS deve adotar uma

visão de ‘desenvolvimento sustentável’ voltada para o fim da privação(do

direito de acesso a serviços essenciais) e a construção de capacidades

humanas, dando ao mesmo tempo atenção ao uso responsável dos recursos

naturais em todo o planeta. Um compromisso com o desenvolvimento

sustentável requer que o Banco dos BRICS vá além de uma abordagem

voltada para o mercado e assuma uma abordagem com ênfase nos aspectos

sociais, ambientais e econômicos do desenvolvimento em todos os seus

projetos. As atividades do banco precisam ser concebidas para apoiar padrões

sustentáveis de consumo e produção, assim como estratégias de crescimento inclusivas e transformadoras. Embora o desenvolvimento de infraestrutura

tenha sido declarado explicitamente como área de foco do Banco dos BRICS,

é importante garantir que seus investimentos atendam antes de tudo aos

interesses das comunidades economicamente desfavorecidas e que seus

projetos não repitam a trajetória social e ambientalmente prejudicial que o

mundo em desenvolvimento tem visto e sofrido no contexto tradicional dos

empréstimos internacionais.

II - O novo banco pode ser uma plataforma para globalizar os esforços liderados pelos BRICS para por fim à pobreza e reduzir a desigualdade, com foco especial em igualdade de gênero e direitos das mulheres

O novo banco de desenvolvimento deve demonstrar o o entendimento de que

nos dias de hoje, a desigualdade é uma grande barreira ao crescimento. Para

fazer a diferença, é fundamental que o novo banco se concentre no combate à

exclusão social, na luta pela igualdade de gênero e no atendimento aos direitos

e às necessidades dos grupos mais marginalizados e vulneráveis da

sociedade. A instituição bancária precisa reconhecer o acesso a serviços

essenciais – incluindo saúde, educação, água e saneamento – como

estratégia para promover maior igualdade de oportunidades e fomentar o

crescimento econômico. No nível macro, isso implica trabalhar para por fim à

desigualdade extrema de modo que a riqueza, as oportunidades e os bens sejam divididos com justiça dentro dos países e entre eles. Mais capacidade de

mobilização de receita interna, mais transparência fiscal e sistemas de

prestação de contas fazem parte integral dos desafios para acabar com a

desigualdade extrema.

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A Oxfam recomenda que o novo banco de desenvolvimento adote entre seus

objetivos o compromisso de combater as desigualdades que excluem

mulheres adultas e jovens e limitam suas oportunidades de participação

econômica, social e política. O Banco dos BRICS deve incluir em seu mandato

a troca de conhecimentos e recursos para a promoção de reformas em

legislações e instituições discriminatórias, ações voltadas para atender às

necessidades específicas das mulheres no que diz respeito à saúde e à

educação e eliminação das barreiras ao acesso das mulheres ao mercado de

trabalho de qualidade.

III - Os países dos BRICS devem ter uma política explícita sobre cooperação internacional calcada no debate público e apoiada por fortes recursos institucionais Apesar de reivindicar uma agenda de reformas e democratização na arena

internacional, o trabalho dos BRICS é marcado por uma ausência quase

absoluta de discussão pública sobre posições e estratégias. É urgentemente

necessário que os países do bloco garantam que política externa se

transforme em política pública. No contexto da proposta do Banco, o desafio é

harmonizar as abordagens sobre cooperação internacional e investimentos entre os países do bloco, assegurando ao mesmo tempo que o compromisso

da cooperação Sul-Sul e as normas globais de direitos humanos, justiça social

e ambiental sejam acordados e o seu cumprimento efetivamente verificado no

processo. As estruturas de cooperação e desenvolvimento regionais – tais

como Consenso e Posição Africana sobre Eficácia do Desenvolvimento e

Posição Comum Africana sobre a Agenda do Desenvolvimento Pós-2015 –

devem também ser reconhecidas e integradas a esse contexto. Além disso, o

Banco propostodeve obrigar que os países membros se comprometam a

desenvolver capacidades institucionais competentes e coerentes entre si. Uma

diretriz comum para orientar objetivos e resultados operacionais, assim como

mecanismos bem estabelecidos para planejamento, análise e intercâmbio de

lições, conhecimentos especializados e inovações são essenciais para que o Banco dos BRICS opere de maneira eficaz e sustentável.

IV - O novo banco de desenvolvimento deve adotar uma estrutura de governança radicalmente democrática

Uma vez que a ideia do novo banco de desenvolvimento surgiu como reação

aos sistemas de poder e recursos desiguais nas instituições de Bretton Woods,

esperamos que os países dos BRICS representem ‘a mudança' ao

implementar as estruturas de governança e filiação para o Banco dos BRICS.

Os argumentos têm sido fortes para a opção de contribuições pequenas e

iguais como ponto de partida para a base de capital do novo banco. Isso permitiria ao novo banco mobilizar a participação de outros doadores

potenciais no mundo em desenvolvimento e prepararia o caminho para uma

distribuição mais igualitária de votos e poderes de decisão – inclusive a adoção

da prática de ‘um país, um voto’ e a eleição do presidente por meio do

Conselho de Administração.

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O banco deve ser um exemplo de liderança fornecido pelos cinco países para

mobilizar recursos financeiros novos e democraticamente geridos para o

desenvolvimento no hemisfério Sul.

V - O Banco dos BRICS precisa garantir salvaguardas ambientais e sociais; estabelecer mecanismos para troca de informações, prestação de contas e reparação A criação de um sistema composto e obrigatório de salvaguardas sociais e

ambientais não só é necessária como fundamental no contexto do Banco de

Desenvolvimento dos BRICS. Práticas acordadas globalmente com relação à

proteção e à sustentabilidade dos recursos ambientais e dos direitos das

comunidades – entre elas as que são diretamente afetadas por atividades

específicas e as indiretamente afetadas por mudanças na macro-política – são

um importante ponto de referência nesse contexto. O engajamento efetivo das

partes interessadas nestas decisões é um desafio importante para o Banco

dos BRICS. Além de aprender com os Fóruns Abertos do Banco Asiático de

Desenvolvimento, assim como com as audiências públicas das Organizações

da Sociedade Civil e o fórum de políticas do Banco Mundial, o Banco dos

BRICS precisa estabelecer um processo contínuo de troca de informações e consultas à sociedade civil e a outras partes interessadas em todos os

aspectos internos e externos de suas operações.

Transparência com relação ao papel e às atividades do setor privado é um

aspecto fundamental da agenda de prestação de contas. Atualmente, as

informações sobre a extensão e o impacto das atividades empresariais

relacionadas aos BRICS em outras regiões são extremamente limitadas, e um

forte aparato para garantir transparência quanto às atividades e aos

investimentos do setor privado faz-se essencial. Isso deve incluir

considerações sobre um esforço independente para monitorar e acompanhar

os investimentos privados na agricultura e no setor extrativo por meio de coleta

de informações de base na África, no Leste Europeu e na América Latina.

Representando a mudança

O lançamento de um novo banco de desenvolvimento é uma ideia não apenas

promissora como fundamental no contexto dos distúrbios políticos e

econômicos que surgiram desde a crise financeira de 2008. A transição para um mundo multipolar, economicamente frágil e politicamente instável tem sido

acompanhada de uma nova geração de desafios econômicos que inclui

combater a crescente desigualdade, enfrentar os desafios demográficos,

equilibrar a sustentabilidade ambiental com o crescimento econômico e

promover a paz e a estabilidade – questões estas que requerem pensamento

e abordagens radicalmente novos e mudanças fundamentais no modo como

os países do Norte e do Sul têm se relacionado tradicionalmente. Apesar do

ceticismo quanto às competências e os interesses dentro do bloco dos BRICS,

o novo banco de desenvolvimento oferece o primeiro aparato institucional para

que as economias emergentes superem suas limitações específicas e

construam uma agenda mais holística e até mesmo radical para o

desenvolvimento.

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© Oxfam International Julho de 2014

Este documento foi redigido por Lysa John.

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