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. Câmpus de Presidente Prudente Curso de Graduação em Geografia (Licenciatura e Bacharelado) Convênio UNESP/INCRA/Pronera O AVANÇO DA CITRICULTURA E OS CONFLITOS FUNDIÁRIOS NA REGIÃO DE AVARÉ-SP: UMA ANÁLISE GEOGRÁFICA DA DISPUTA PELO TERRITÓRIO. AVELINO RODRIGUES DE OLIVEIRA Monografia apresentada ao Curso Especial de Graduação em Geografia (Licenciatura e Bacharelado), do Convênio UNESP/INCRA/Pronera, para a obtenção do título de Licenciado e Bacharel em Geografia. Orientador: Everaldo Santos Melazzo Monitor: Sidney Cássio Todescato Leal Presidente Prudente 2011

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Câmpus de Presidente Prudente Curso de Graduação em Geografia (Licenciatura e Bacharelado)

Convênio UNESP/INCRA/Pronera

O AVANÇO DA CITRICULTURA E OS CONFLITOS

FUNDIÁRIOS NA REGIÃO DE AVARÉ-SP:

UMA ANÁLISE GEOGRÁFICA DA DISPUTA PELO

TERRITÓRIO.

AVELINO RODRIGUES DE OLIVEIRA

Monografia apresentada ao Curso Especial de Graduação em Geografia (Licenciatura e Bacharelado), do Convênio UNESP/INCRA/Pronera, para a obtenção do título de Licenciado e Bacharel em Geografia.

Orientador: Everaldo Santos Melazzo

Monitor: Sidney Cássio Todescato Leal

Presidente Prudente

2011

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O AVANÇO DA CITRICULTURA E OS CONFLITOS

FUNDIÁRIOS NA REGIÃO DE AVARÉ-SP:

UMA ANÁLISE GEOGRÁFICA DA DISPUTA PELO

TERRITÓRIO.

AVELINO RODRIGUES DE OLIVEIRA

Trabalho de monografia apresentado ao Conselho do curso de Geografia da Faculdade de Ciências e Tecnologia, campus de Presidente Prudente da Universidade Estadual Paulista, para obtenção do título de Licenciado e Bacharel em Geografia.

Orientador: Everaldo Santos Melazzo

Presidente Prudente, novembro de 2011

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Avelino Rodrigues de Oliveira

O AVANÇO DA CITRICULTURA E OS CONFLITOS

FUNDIÁRIOS NA REGIÃO DE AVARÉ-SP:

UMA ANÁLISE GEOGRÁFICA DA DISPUTA PELO

TERRITÓRIO

Monografia apresentada como pré-requisito para obtenção do título de Bacharel em Geografia da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, submetida à aprovação da banca examinadora composta pelos seguintes membros:

Prof. Dr. Everaldo Santos Melazzo

Presidente Prudente, novembro de 2011

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DEDICATÓRIA

Dedico a minha querida mãe, Araci Joaquim de Oliveira, camponesa, analfabeta, que sempre incentivou seus nove filhos a estudar. Em memória.

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AGRADECIMENTOS

Ao MST, pela oportunidade e confiança.

A ex-companheira Ana, pelo apoio e cuidado com nossos filhos.

A Alexandre e Ana Carolina, meus queridos filhos, pela tolerância de minha ausência.

Ao meu orientador, professor Dr. Everaldo Mellazo, pela valiosa ajuda e paciência.

Ao monitor Sidney e a todos os monitores que contribuíram com a nossa turma pela atenção

dedicada.

A Escola Florestan Fernandes e toda brigada permanente, pelo companheirismo ao longo

destas cinco etapas.

A militante, pedagoga Rosimeire Pan D’Arco, pela dedicada ajuda.

A todos os dirigentes regionais e militantes do MST de Iaras, pelo apoio e confiança.

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“O passado não reconhece o seu lugar: esta

sempre presente.”

Mario Quintana

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Resumo

No inicio do século XIX, entre os anos 1909-1911 o governo Federal adquiriu aproximadamente

cinqüenta mil hectares de terra nos municípios de Águas de Santa Barbara, Avaré, Agudos e

Lençóis Paulista para promover a colonização de imigrantes estrangeiros. Como o projeto não foi

totalmente efetivado, a partir da década de trinta estas terras foram sendo griladas e exploradas por

agropecuaristas e pela indústria da silvicultura. Porém, a partir do ano de 1995, o MST (Movimento

dos Trabalhadores Sem Terra) chegou a esta região para questionar a apropriação destas áreas

publicas. Nesta trajetória de luta política e jurídica o Estado retomou mais de oito mil ha,

destinando-os para assentamentos de Reforma Agrária.

Esta disputa entre trabalhadores sem terra, Estado e grileiros vem se acirrando nos últimos tempos

com a entrada de um novo agente econômico na disputa, a indústria citricultora Cutrale que ocupa

dois mil setecentos e um há na referida área publica, comprovadamente confirmada através de

estudos topográficos e decisão judicial.

A monocultura da laranja pode ser estudada sobre varias óticas, da reestruturação produtiva,

econômica e social. Neste trabalho destacaremos a ocupação das terras publicas Federal sob a ótica

dos movimentos sociais. Assim, configura-se a disputa pelo território entre o campesinato

representado pelo MST e o agronegócio da citricultura representado pela empresa Cutrale. A

contradição entre os interesses dos sujeitos sociais em questão vem causando permanentes conflitos.

Este trabalho tem o objetivo de denunciar a ocupação de terras publicas por empresas privadas e

afirmar a vigilância do movimento social MST em defesa de um dos principais recursos da

natureza, a terra, apontando a necessidade de defesa da reforma agrária.

Palavras-chave: Território; Agronegócio; Campesinato; Citricultura.

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Resúmen

En princípios del siglo XIX, entre los años 1909-1911 el gobierno federal adquirió alrededor

de cincuenta mil hectares de tierra en los municipios de Aguas de Santa Barbara, Avare,

Agudos y Leçóis Paulista para promover su colonización con la mano de obra de

inmigrantes extranjeros. Como el proyecto no se ha realizado plenamente, a partir de los

años treinta, estas tierras han sido ilegalmente ocupadas y explotadas por los ganaderos y la

industria forestal. Sin embargo, desde el año 1995, el MST (Movimiento de Trabajadores

Rurales Sin Tierra) llegaron a esta región cuestionando la apropiación de estos espacios

públicos. En este camino de la lucha política y juridica el Estado consiguió retener más de

ocho mil hectáreas y los está destinando diseñado para los asentamientos de reforma agraria.

Este conflicto entre los trabajadores sin tierras, el Estado y los ocupantes ilegales de la tierra

se ha intensificado en los últimos tiempos con la entrada de un nuevo agente económico,

Cutrale, industria de los cítricos que ocupa dos mil setecientos y uno hectáreas de tierras

públicas, como se ha demostrado através de estudios topográficos y la decisión judicial.

El monocultivo de la naranja se puede estudiar desde varios puntos de vista: la

reestructuración de la producción, el desarrollo económico y social. Este estudio pone de

relieve la ocupación de tierras públicas federales, desde la perspectiva de los movimientos

sociales. Así, establece la batalla por el territorio entre los campesinos representados por el

MST y la empresa de cítricos agroindustrial representada por Cutrale. La contradicción entre

los intereses de los sujetos sociales en cuestión ha causado conflictos permanentes.

Este documento tiene por objeto denunciar la ocupación de suelo público por la empresas de

Cutrale y la vigilancia de los movimientos sociales en defensa de la tierra y de la reforma

agraria.

Palavras-claves: Asentamiento; Territorio; Agronegocios;Campesinato.

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Lista de Figuras

Figura 01 Municípios Integrantes do Escritório de Desenvolvimento Rural de Avaré 40

Figura 02 Núcleo Colonial Monção 41

Figura 03 Imagem aérea de um dos pomares da Cutrale 44

Figura 04 Porteira da Sede da Fazenda Santo Henrique 47

Lista de Gráficos

Gráfico 01 Evolução da Citricultura da Laranja (Em Pés) no EDR de Avaré de 1990 a 1995 37

Gráfico 02 Evolução da Citricultura da Laranja (Em Pés) no EDR de Avaré de 1996 a 2002 38

Gráfico 03 Evolução da Citricultura da Laranja (Em Pés) no EDR de Avaré de 2003 a 2010 39

Lista de Mapas

Mapa 01 Percentual sobre Valor Total da Produção de Laranja do Estado de São Paulo: 1995

31

Mapa 02 Percentual sobre Valor Total da Produção de Laranja do Estado de São Paulo: 2007

31

Mapa 03 Variação da Área Colhida de Laranja

32

Mapa 04 Área Colhida em Hectares e Variação Relativa: 1990-2007 33

Lista de Tabelas

Tabela 01 Evolução da citricultura da laranja em pés no EDR de Avaré – 1990 a 1995 36

Tabela 02 Evolução da citricultura da laranja em pés no EDR de Avaré – 1996 a 2002 37

Tabela 03 Evolução da citricultura da laranja em pés no EDR de Avaré – 2003 a 2010 38

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Sumário

Introdução......................................................................................................................................... 10

1. DESENVOLVIMENTO CAPITALISTA NO CAMPO BRASILEIRO E LUTAS PELA TERRA .............................................................................................................................................. 12

1.1 Principais interpretações do desenvolvimento capitalista no campo brasileiro. .................. 12

1.2. As lutas pela terra no Brasil ..................................................................................................... 17

2. O AGRONEGÓCIO E A EVOLUÇÃO DA CITRICULTURA BRASILEIRA ................... 25

2.1 Agronegócio: origem e características ..................................................................................... 25

2.2. A citricultura no Brasil ............................................................................................................. 26

3. A CITRICULTURA NO EDR DE AVARÉ: DISPUTA TERRITORIAL ............................ 36

3.1 Evolução da Citricultura no EDR de Avaré no período de 1990 a 2010............................... 36

3.2 O MST em Iaras e a disputa territorial ................................................................................... 39

4. TERRITÓRIO EM DISPUTA .................................................................................................... 44

CONSIDERAÇÕES FINAIS .......................................................................................................... 49

Bibliografia ....................................................................................................................................... 50

Sites Consultados.............................................................................................................................. 51

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Introdução

No dia 20 de novembro de 1995 data em que o MST fez a primeira ocupação no município

de Iaras estabeleceu-se a partir daquele momento a disputa pelo território. Com aproximadamente

trezentas famílias oriundas da periferia das cidades de Sumaré, Limeira, Campinas e Americana

iniciou-se um prolongado período de lutas, baseado nas contraditórias maneiras de organização da

produção, do trabalho e do território defendidas pelo agronegócio em oposição ao trabalho

camponês.

Considero de semelhante importância o mês de Janeiro de 2007, quando ingressei no curso

de geografia da UNESP onde comecei a ter os primeiros contatos com a ciência geográfica, seus

conceitos e categorias e que fazem parte das interpretações dos autores utilizados neste trabalho.

O presente trabalho buscou analisar de forma seletiva as diferentes interpretações do

desenvolvimento do capitalismo no campo brasileiro, baseado nas teses de alguns autores

selecioandos: José Grazino da Silva, José de Souza Martins, Aberto Passos Guimarães, Bernardo

Mançano Fernandes, Ricardo Abramovay e Ariovaldo Umbelino de Oliveira, considerando como

importante as formulações teóricas, mas também as diferentes interpretações políticas engendradas

neste debate.

Abordamos a luta pela terra no Brasil levando em consideração o que a história classificou

de Movimentos Messiânicos: Canudos e Contestado. Destacamos a atuação das ligas camponesas e

depois a formação do MST no Brasil, e posteriormente, no Estado de São Paulo. Destacamos

também a atuação do MST em Iaras e sua atuação em defesa do resgate das terras públicas

existentes naquela região para fins de reforma agrária, que foram griladas por grandes empresas

ligadas ao agronegócio.

Ao relacionar a atuação do MST na região buscamos compreender a importância da luta na

formação dos territórios e a transformação dos espaços geográficos a partir do movimento do

conjunto de ações exercidas pelos sujeitos históricos em determinadas épocas e lugares.

Analisamos a implantação da citricultura no Brasil, sua espacialização no Estado de São

Paulo em determinados períodos e os conflitos gerados entre as indústrias processadoras e os

citricultores capitalistas e camponeses.

Destacamos, ainda, a implantação da citricultura no EDR de Avaré, sua evolução na escala

temporal entre os anos de 1990 e 2010. Durante este período enfatizamos os conflitos entre o

movimento social MST contra os grileiros de terras da União.

Buscamos entender o enfrentamento com a empresa Cutrale na disputa pelo território.

Relacionamos a atuação dos meios de comunicação e consideramos sua atuação como parcial, não

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noticiando a realidade dos fatos. No desenvolvimento dos episódios destacamos a atuação do

Estado, do poder executivo, legislativo e judiciário.

Ao abordarmos o enfrentamento do movimento social contra empresas que utilizam terras

públicas para ampliarem seus domínios territoriais, enfatizamos a defesa do patrimônio público e a

defesa da reforma agrária, não tendo assim uma posição contemporizadora com uma das principais

mazelas da sociedade brasileira, que vem a ser a concentração da propriedade da terra e a

apropriação indébita de terras públicas.

Adiantando uma das conclusões desse trabalho podemos afirmar, que por mais que as forças

hegemônicas do capitalismo, que insistem na tese de que existe apenas um caminho e modelo de

desenvolvimento, a análise do território de sua produção e de sua disputa indicam o contrário.

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1. DESENVOLVIMENTO CAPITALISTA NO CAMPO BRASILEIRO E LUTAS PELA TERRA

As formas pelas quais se desenvolveram o capitalismo no campo brasileiro desde os

primórdios, baseado nas teses dos autores que traremos a seguir, configuram o não enfrentamento

das questões fundiárias e consequentemente a necessidade de luta pela terra. Partindo desse

pressuposto que apresentaremos concepções abordadas por estes autores. Justifica-se a escolha

desde a perspectiva acadêmica, política e social.

Pontuar o que consideramos os principais movimentos de luta pela terra no Brasil

contribuem para a reflexão da dinâmica capitalista no campo brasileiro.

1.1 Principais interpretações do desenvolvimento capitalista no campo brasileiro.

Estudar a permanência do não enfrentamento das questões fundiárias e das profundas causas

da não democratização do acesso à terra no Brasil não é tarefa fácil. Porém, estudar tais questões ao

longo do processo do desenvolvimento do capitalismo no campo brasileiro é essencial para

compreender os mais marcantes traços de nossa formação sócio-espacial, que historicamente teve

como principal característica a concentração da propriedade da terra. Por mais de três séculos este

modelo subjugou a força de trabalho através da mão de obra escrava e manteve a produção de

monocultura direcionada a exportação.

Assim este capítulo tem o objetivo de analisar diferentes interpretações do campo brasileiro,

baseado nas teses defendidas pelos seguintes autores: Alberto Passos Guimarães, Ricardo

Abramovay, Bernardo Mançano Fernandes, José de Souza Martins, José Graziano da Silva,

Ariovaldo Umbelino de Oliveira.

É inegável que são vários os autores que tratam de tal problemática, porém sua leitura e

análise exigem que sejam conhecidas suas diferentes perspectivas teóricas e, por que não, também

políticas. Assim, a seleção dos autores foi realizada considerando a capacidade explicativa, os

pressupostos teóricos e a abrangência dos conceitos utilizados para a efetivação da investigação e

explicação dos objetivos do estudo, mas também para mostrar as divergências nas interpretações.

A utilização dos pressupostos teóricos dos autores relacionados será feita de forma seletiva,

levando em consideração, principalmente, que este debate sobre a questão agrária brasileira se deu

mais intensamente entre as décadas de 1960 e 1980.

Estes autores foram selecionados também por representarem outras interpretações, não

apenas acadêmicas, mas também do papel social engendrado por esta dinâmica entre a integração

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capitalista e a disputa pela terra na lógica camponesa, entre os latifundiários, o Estado e os

camponeses.

Alberto Passos Guimarães um dos principais pensadores brasileiro a se dedicar à análise do

campo, tomou como ponto de partida a origem feudal do desenvolvimento do campo. Nas suas

palavras:

A ordem feudal vigente da sociedade portuguesa de 1500 tinha sua base interna no monopólio territorial. E como a terra era, então, indiscutivelmente o principal e mais importante dos meios de produção, a classe que possuía sobre ela o domínio absoluto estava habilitada a sobrepor as demais classes o seu poderio, por todos os meios de coação econômica e notadamente extra-econômica. (GUIMARÃES, 1968, p. 28).

Ou seja, a interpretação do autor sugere a necessidade do desenvolvimento das forças

produtivas capitalistas de maneira a implantar relações de assalariamento, transformando terra e

trabalho (mão-de-obra) em mercadorias. Somente assim, seria possível superar o estagio anterior

(feudal) e introduzir o desenvolvimento capitalista no campo. Este debate ensejava a compreensão

de que a produção no campo teria características feudais, a serem superadas pelo próprio

desenvolvimento do capital e baseava e influenciava as teses defendidas pelo PCB (Partido

Comunista Brasileiro), que, nas suas formulações teóricas, defendia a tática de fazer uma aliança

com a burguesia nacional.

Esta aliança promoveria a “revolução democrática libertadora”, segundo o autor. E o agente

dessa revolução seria a mais ampla frente democrática de libertação nacional. Esta frente teria sua

composição formada por frações de classe oriundas, seja do próprio campesinato, seja por

trabalhadores urbano-industriais, também poderia ser ampliada por profissionais liberais, médios

industriais e comerciantes e de todos que se sentissem prejudicados pela concorrência americana

que era considerada uma política imperialista (MARTINS, 1981).

Outro ponto de vista é trabalhado na obra de Martins para quem existe uma grande

contradição entre terra e outros meios de produção. Mesmo a terra sendo transformada em

mercadoria, meio de produção, tem suas particularidades por se tratar de um produto da natureza e

não produto do trabalho humano. Segundo o autor:

A propriedade da terra não é exatamente um empecilho à expansão do capital no campo; ela é fundamentalmente uma das contradições do capitalismo, movimento, transformação e possibilidade de transformação. Os que ficaram na análise do imediato do aparente que viram na propriedade fundiária um empecilho à expansão das relações capitalistas, não perceberam que esse empecilho nascia de dentro dessas mesmas relações que o nascimento dessas relações, em determinados setores da produção, já é suficiente para que o capital realize aí como mais valia que lhe pertence todo o excedente produzido no conjunto da

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sociedade. Por isso, é muito importante discernir entre produção do capital e reprodução capitalista do capital. (p.170)

Esta contradição, portanto, não impede que existam relações sociais de produção não

capitalistas engendradas no modo capitalista de produção, pois, tais contradições são inerentes à

reprodução do capital. Decorre deste entendimento a necessidade do capital transformar a terra em

mercadoria e as relações de trabalho em trabalho assalariado para garantir sua reprodução

permanente.

Reconhecendo a dinâmica acima descrita, Oliveira (1986) destaca que o campo oferece

diferentes maneiras de organização do trabalho e de produção, sendo um setor atípico do ponto de

vista da homogeneização das relações capitalistas de produção. Em suas palavras:

Na agricultura, para que esta relação ocorra é necessário que o capitalista compre ou arrende a terra, que é o principal meio de produção no campo. É preciso também que compre os demais meios de produção, as máquinas, as ferramentas, os insumos etc. É por isso que o capitalista contrata o trabalhador livre de todos os meios de produção, inclusive da terra, e em troca lhe paga um salário em dinheiro, com o qual ele compra tudo o que necessita para continuar a ser trabalhador e vender sua força de trabalho ao capitalista. Como sabemos muitos são os setores e lugares onde essa relação de produção aparece no campo. Em geral domina aqueles setores onde o processo produtivo necessita de pouco tempo de trabalho, como é o caso da pecuária de corte e do reflorestamento, por exemplo, ou aqueles em que o avanço tecnológico permite uma redução do tempo de produção em relação ao tempo de trabalho, como é o exemplo da avicultura, da pecuária estabulada etc. E aparece mesmo naqueles setores onde existe a possibilidade de obter renda da terra particularmente, como é o caso da citricultura, da cultura da soja, do café etc. No entanto, como já demonstramos, ela não se expandiu em todos os setores da atividade agropecuária, ou seja, o próprio capitalismo desenvolveu mecanismos de subordinação da renda de terra, de modo a permitir a criação e recriação das relações não-capitalistas de produção no campo. (p. 65)

Nesse sentido é que existem diferentes formas, estratégias e mecanismos do capital se

relacionar com a propriedade fundiária e que em alguns momentos é possível observar que o capital

contrapõe a propriedade, mas que em outros momentos o capital articula-se à propriedade. Ou seja,

o capital busca valorizar-se também através da propriedade privada da terra, através das rendas que

ela gera.

Como afirma Oliveira (1986), desta maneira, a terra contribui na produção e reprodução do

capital de formas distintas, por exemplo: proporcionando a renda diferencial, que é relacionada com

as desiguais fertilidades do solo, sua localização e os investimentos para melhorar a sua

produtividade; a renda absoluta que deriva do monopólio da terra por uma classe, ou fração de

classe que tendo o monopólio da produção, condiciona os preços dos produtos, obtendo um lucro

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extraordinário extraído do conjunto da sociedade e a renda de monopólio, que é relacionada a

qualidades especiais de alguns produtos, sendo que sua aquisição corresponde ao objeto de desejo e

não ao trabalho social necessário a sua produção, ou seja, que permite auferir preços de monopólio.

Dessa forma, podemos entender que a presença significativa da produção da agricultura

camponesa é a materialidade do próprio desenvolvimento contraditório do capital. Assim sendo, a

expansão do modo capitalista de produção engendra relação não-capitalista igual e

contraditoriamente necessária a sua reprodução, o que acontece de forma desigual e combinada

(OLIVEIRA, 1986).

Segundo Silva (2004) houve um processo muito rápido e profundo de modernização

capitalista, entendida aqui como evolução das forças produtivas para níveis cada vez mais elevados

de produção material, na agricultura brasileira. O resultado de tal processo redundou em uma

profunda diferenciação dos agentes sociais presentes no campo e se deu em função de novas

relações de trabalho, da inserção de novos produtos (principalmente no mercado internacional), por

articulações de diferentes níveis e tipos entre o Estado e os agentes hegemônicos e pela

concentração da propriedade que, em conjunto, possibilitarão a evolução dos complexos rurais1 para

os complexos agroindustriais. Nas suas palavras:

O desenvolvimento do capitalismo na agricultura é corrida. O que eu estou dizendo é que nesta corrida nem todos partiram do mesmo ponto; partiram de pontos diferentes; alguns estavam mais à frente do que os outros e pior do que isto, além de já partirem em vantagem, alguns partiram de moto, outros de avião e alguns partiram a pé. Ao longo desse processo, desses 30 anos de caminhada, foi ficando pela estrada a grande maioria daqueles que partiram a pé, dos que partiram com tração animal, dos que partiram com o trabalho da família, dos que partiram sem créditos, dos que partiram etc; etc; etc. Ou seja, esse processo foi profundamente excludente de modo também que a modernização foi um processo brutal de concentração da produção, de concentração de renda e de geração de outro lado da sua face de miséria. O desenvolvimento capitalista se fez gerando profundas riquezas, concentrando riquezas e concentrando do outro lado miséria. ( p. 139).

A produção agrícola na forma de complexo rural tinha como principal característica a

autonomia em relação a indústria, pois no interior das propriedades construíam-se moradias e

ferramentas, criava-se e domava-se animais para tração e produzia-se quase todos os gêneros

alimentícios necessários às reproduções animais e humana. Pelo contrário, a implantação dos

complexos industriais na agricultura criaram a inter-relação integrada por critérios dependentes no

processo produtivo, primeiro e fundamental passo para a subordinação da agricultura à indústria

(SILVA, 2004).

1 Complexo rural significa a passagem do sistema de produção artesanal para o sistema de base manufatureira.

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Um ponto de vista semelhante a Silva (2004), no que se refere a integração da agricultura,

pode ser encontrado em Abramovay (2004), que analisa as transformações no campo brasileiro,

dando ênfase ao contexto intelectual, político e em sua evolução temporal, contextos a partir dos

quais aconteceram as transformações. Segundo o autor:

Para quem está envolvido com a discussão da reforma agrária este knock out da pequena produção foi gravíssimo. Um dos argumentos básicos da reforma agrária residia justamente no peso dos pequenos dos produtores na ofertas de produtos agrícolas e de alimentos. Pois bem tanto trabalho de Paulo Renato de Souza, como o de Sandroni, o de Sergio Silva e depois os de Graziano da Silva (1987) procuravam demonstrar que estavam ultrapassados um dos argumentos essenciais em torno das quais se dava a própria luta pela reforma agrária. Notem que o argumento dos anos 1970 mostrando o peso da pequena produção, era diferente daquele de 1960: não só a agricultura não era mais obstáculo ao desenvolvimento capitalista, mais, ao contrario, ela continha um elemento estratégico para este desenvolvimento, que era a oferta de produtos alimentares a baixos preços. No inicio dos anos 1980 é isso que desaba. O artigo de Graziano da Silva (1987) procura mostrar exatamente isto: o peso da pequena produção na oferta de alimentos é importante porem declinante. Mais que isso, o que Graziano procurou mostrar é que a medida que a pequena produção perdia a importância na oferta agrícola a própria justificativa econômica da reforma agrária perdia o sentido: não era preciso reforma agrária para elevar a produção alimentar. O problema alimentar brasileiro perdia toda a relação com a questão agrária para se transformar exclusivamente numa questão de renda. (p. 99).

No entanto, ambos os pesquisadores concordam com o fracasso das propostas de reforma

agrária e apontam, entre outros motivos, a fragilidade na organização dos trabalhadores, em

particular, os camponeses e, ao mesmo tempo, a capacidade organizativa da burguesia agrária na

defesa de seus interesses.

Mesmo comparando-a em diferentes épocas, a agricultura brasileira sempre teve uma alta

concentração da propriedade da terra. Portanto, a luta pela reforma agrária se justifica não apenas

pela necessidade de produção de alimentos, mas também pela desconcentração da produção, da

propriedade da terra e da renda.

Analisando o desenvolvimento do capitalismo no campo no período entre 1965 e 1985,

Fernandes (1999) relata a política agrícola implementada pelos militares em que o Estado, através

de incentivos fiscais, subsidiou grandes grupos econômicos nacionais e internacionais na

implantação de projetos agroindustriais e agrominerais. Segundo este autor:

A lógica da militarização da questão agrária foi manter o controle do Estado sobre os conflitos por terra e sobre as terras devolutas. Para realizar essa estratégia, o poder central manteve a federalização dessas terras e do problema da terra. Nessa lógica, em 1982 o governo militar cria o Ministério Extraordinário Para Assuntos Fundiários (NEAF) convidando o general Danilo Venturini para continuar controlando um histórico problema nacional: a terra. Durante as duas décadas em que os governos militares estiveram no poder, garantiram a apropriação, por grandes grupos

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empresariais de imensas áreas de terra e também o aumento do número e da extensão dos latifúndios. Financiaram as mudanças na base técnica de produção com base nos incentivos criados e do crédito subsidiado pela sua política agrícola. Proporcionaram assim a modernização da agricultura e a territorialização do capital no campo. Do outro lado, reprimiram toda e qualquer luta e resistência à sua política. (p.39).

Decorre desse entendimento que o Estado brasileiro, e principalmente no período dos

governos militares, enquanto incentivadores da política agrícola contribuiu sobremaneira com a

concentração da propriedade da terra e consequentemente expropriação de camponeses e indígenas,

por exemplo na região norte do Brasil. Podemos assim constatar que em diferentes épocas as ações

do Estado, na maioria das vezes, estiveram em defesa da concentração da propriedade.

Como visto então em função da atuação do Estado, ao longo da história houve uma alta

concentração da propriedade da terra nas mãos de uma pequena fração de classe, os latifundiários.

Por isso a necessidade dos trabalhadores se organizarem enquanto fração de classes de expropriados

para lutar pela posse da terra enquanto meio de vida.

1.2. As lutas pela terra no Brasil

A luta pela terra no Brasil pode ser analisada dando enfoque a vários seguimentos teóricos,

políticos e ideológicos de interpretação. Assim, buscaremos destacar a história de resistência

exercida pelos camponeses e a formação de movimentos sociais do campo, compreendendo que um

marco que possibilitou o acirramento dos conflitos foi a criação da lei de terras em 1850.

Esta legislação tinha como característica principal a forma de aquisição da terra, em que a

única maneira de se tornar proprietário era através da compra. Nesta época, em que a economia era

baseada na mão-de-obra escrava, a lei eliminava a possibilidade desta fração de classe ser

proprietária de terra. Porém, é após o fim do regime escravista e com a proclamação da república

que se iniciam e organizam-se diferentes movimentos de luta pela terra (MARTINS, 1981).

Portanto, destacaremos, em primeiro lugar, o que a literatura denominou de movimentos

messiânicos2: A guerra de Canudos e do Contestado. Segundo Martins (1981) fortes disputas foram

materializadas pelos movimentos messiânicos e devido à sua opressão transformaram-se em

verdadeiras guerras civis.

Canudos se destacou pela liderança de Antonio Conselheiro e chegou a ter mais de trinta mil

habitantes. Estes foram combatidos e exterminados pelo exército brasileiro entre 1896 a 1897.

A guerra de Canudos constitui-se, portanto num desdobramento das disputas entre os coronéis sertanejos ou entre estes e o governo. A necessidade da

2 Movimento individual ou coletivo que acredita no surgimento de um enviado de Deus que trará aos homens justiça, paz e felicidade reorganizando a sociedade.

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derrota dos habitantes de Canudos passou a representar uma peça importante na disputa pelo poder federal entre militares e civis ligados aos interesses do café. Quatro expedições militares, às últimas das quais envolvendo mais de dez mil soldados, foram lançadas contra os sertanejos. As três primeiras foram severamente derrotadas, permitindo que os camponeses se armassem, resultando inclusive na morte de Moreira César. No primeiro momento a quarta expedição foi igualmente derrotada, sendo reforçada para garantir o esmagamento da população de Canudos. Ao combater os republicanos, isto é, os militares e fazendeiros, os sertanejos de Canudos tinham certeza de estar combatendo os inimigos dos trabalhadores, como deixa entender o texto do Conselheiro. (MARTINS, 1981, p.54-55).

Declara ainda o autor que outro momento de luta e resistência aconteceu no sul do país, nos

Estados do Paraná e Santa Catarina. Em função da concessão pelo Estado brasileiro de nove

quilômetros de terra às margens da área de futura construção da estrada de ferro São Paulo - Rio

Grande e com a expropriação das terras dos camponeses originou-se a Guerra do Contestado, no

período de 1912 a 1916.

O exército, as polícias estaduais e uma tropa de mil vaqueanos, espécies de jagunços sulistas a serviço dos fazendeiros, sofreram várias e amplas as derrotas no combate com os sertanejos. Na batalha de Taquaruçu os camponeses tomam armas e munições do inimigo. A guerra durou praticamente quatro anos, envolvendo mais de 20 mil camponeses, incluindo alguns fazendeiros que os apoiavam e que abandonando todos os seus bens se recolheram a redutos organizados pelos sertanejos. (p.56 -57).

Os dois movimentos de resistência dos camponeses tiveram em comum o objetivo de

chamar a atenção para a necessidade da terra enquanto meio de vida, tanto no norte como no sul do

país e permitem compreendermos a força empregada pelo Estado brasileiro contra a população mais

empobrecida. Esta violência, empregada desde o início do séc. XIX, tornou-se costumeira ao longo

de nossa história no combate às reivindicações populares.

Segundo Moraes (2006) é a partir do início da década de cinqüenta do século XX que

efetivamente emergem as lutas pela terra no Brasil de forma a questionar a concentração da terra e

as condições de pobreza e miséria vividas no campo brasileiro. Importante relembrar que as

iniciativas de organização dos trabalhadores do campo e da cidade eram orientadas pelo PCB

(Partido Comunista Brasileiro). Naquele contexto, foram criadas as Ligas Camponesas. As ligas

camponesas eram entidades de caráter civil com o objetivo de organizar os camponeses, baseadas

no cristianismo através de uma linguagem simples. Posteriormente transformaram-se em

organizações políticas de caráter reivindicatório que questionavam a concentração da propriedade

da terra.

Embora existisse no Brasil uma relativa liberdade sindical exercida pelo direito positivo

(Consolidação das Leis do Trabalho), que garantia a liberdade de organização sindical, na prática

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não era o que acontecia em relação aos trabalhadores rurais, em função da burocracia do Estado e

da relação política dos governos comprometidos com os latifundiários, alem da clara desigualdade

de forças políticas que pressionavam contra qualquer forma de organização do trabalhadores do

campo.

Com a atuação jurídica baseada no código civil que permitia a organização de associações

de caráter não apenas trabalhista, as Ligas Camponesas organizaram e mobilizaram grande número

de trabalhadores agrícolas em vários estados brasileiros.

Como afirma o autor citado, com a proscrição do Partido Comunista em 1947 e a violenta

repressão às organizações de trabalhadores, as Ligas Camponesas são atacadas nas suas estruturas

organizativas e metodológicas, ou seja, atingindo a sua tática de acumulação de forças que buscava

construir a aliança operário-camponesa. Embora com grande repressão do Estado, houve lutas de

resistência que marcaram os Movimentos Camponeses dessa época. Podemos destacar como as

mais importantes, a Guerrilha de Porecatu que começou em 1950, na margem esquerda do rio

Paranapanema que divide o estado de São Paulo e Paraná. Este conflito originou-se de um processo

de litígio entre posseiros e latifundiários que disputavam vastas áreas e novas fronteiras agrícolas no

norte do Paraná.

O levante contou com forte apoio do Partido Comunista de Londrina e Apucarana (PR),

Assis, Presidente Prudente, Martinópolis, Presidente Bernardes (SP), que na clandestinidade

organizavam suprimentos, como alimentos, armar e munições, medicamentos e dinheiro. Depois de

dois meses de atuação o Movimento dissolveu-se por constatar que não havia condições de

sobrevivência naquele momento do Movimento armado, segundo o mesmo autor.

Outro importante processo de luta e resistência foi o território de Trompas e Formoso3.

Instalados numa área de aproximadamente dez quilômetros quadrados os posseiros, sob a liderança

de José Porfírio, resistiram aos latifundiários. Em choques armados contra estes e as forças policiais

que os apoiavam, os camponeses resistiram e saíram vitoriosos, proclamando o território livre,

numa área localizada entre o rio Tocantins e seu afluente o rio Formoso no Estado de Goiás.

Sob orientação do Partido Comunista os camponeses organizaram-se em comitês políticos e

em Ligas Armadas. Esta forma de organização durou entre os anos de 1950 a 1962, data em que o

governador do Estado de Goiás desapropriou as terras e distribui em parcelas, liquidando assim o

litígio e a organização armada dos camponeses.

A partir da metade dos anos cinqüenta houve uma ascensão das lutas de massa e

consequentemente o re-ascenso das Ligas Camponesas. O principal motivo foi indubitavelmente a

ampliação das liberdades democráticas com a eleição do presidente Juscelino Kubistchek e seu vice

3 Ver: MORISSAWA. Mitsue. História da Luta pela Terra e o MST. São Paulo: Expressão Popular, 2001. 256p.

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João Goulart. Este é um período em que ocorre no Brasil considerável desenvolvimento industrial, a

partir do Plano de Metas e da entrada de capitais estrangeiros na economia brasileira

(MORISSAWA, 2001).

Ao mesmo tempo, temas considerados tabus como a fome, a Reforma Agrária, as riquezas

minerais, os problemas municipais, começam a ser tratados por diferentes agentes políticos de

diversas posições ideológicas para discutir os principais e mais conhecidos problemas

socioeconômicos que afetavam a sociedade brasileira. Neste contexto realizou-se o primeiro

Congresso de Camponeses em Pernambuco.

Com participação de três mil delegados, José dos Prazeres foi eleito presidente das Ligas

Camponesas, realizando uma grande passeata pelas ruas de Recife. A partir deste momento as Ligas

Camponesas saíram do isolamento e se expandiram para outros municípios.

Em concorrência pela organização dos trabalhadores rurais, segundo Moraes (2006), o ano

de 1963 foi o ano de avanço do sindicalismo rural brasileiro. Em suas palavras:

Aquelas iniciativas das organizações rurais sem a menor previsão nem controle do governo. No entanto, o governo sentia a necessidade de estender também ao campo a tutela que exercia sobre o movimento dos trabalhadores urbanos. Assim, a arrancada impetuosa do sindicalismo rural era questão de mais ou de menos dias. Com esse propósito, derrotado o regime parlamentarista no referendun de 04 de janeiro de 1963 o Partido Trabalhista Brasileiro em frente única com o Partido Comunista, tentou exercer grande pressão sobre o governo. No entanto, independentemente dessa pressão, o Ministério do Trabalho criou instrumento da sindicalização rural. Assim começou a grande motivação para fundar sindicatos dos trabalhadores rurais e (assalariados agrícolas) e de trabalhadores autônomos do campo (camponeses). (p. 59).

Segundo este autor, com a participação da igreja, dos sindicatos filiados à ULTAB (União

dos Lavradores e Trabalhadores agrícolas do Brasil), dos partidos políticos PTB e PCB, em

dezembro de 1963 acontece o congresso de fundação da CONTAG (Confederação Nacional dos

Trabalhadores na Agricultura), considerado pelo autor citado (e por outros) como o mais importante

acontecimento do campesinato brasileiro.

Uma parte da organização inicial das ligas, lideradas por Francisco Julião ficaram fora da

nova conformação organizativa que havia tomado o campesinato brasileiro no último semestre de

1963, exceto no estado de Pernambuco, onde o movimento era representado pela formação inicial

das ligas camponesas.

Após o golpe militar de 1964, as Ligas continuaram suas funções na clandestinidade.

[...] Segundo pode-se aferir o papel decisivo que as Ligas desempenharam nos principais fatos que ocorreram no inicio de 1964 em Pernambuco e na Paraíba; greves gerais no campo (em Pernambuco) choques armados entre camponeses de

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Miriri e a polícia da Paraíba; e a invasão do Engenho da Serra (em Pernambuco). (MORAES, 2006, p.61).

Buscaram organizar e formar lideranças que ajudariam no processo de politização no país,

como reconhece um líder do MST:

O MST considera-se um descendente, um seguidor das ligas camponesas e, neste sentido, da experiência vivida também de Julião e tantos outros líderes das ligas, como João Pedro Teixeira, José Porfírio, Clodomir, Elizabete Teixeira, o padre Alípio de Freitas e outros menos conhecidos. (STEDILE apud SANTIAGO, 2006, p. 185).

As Ligas ao seu tempo cumpriram um papel relevante para a história dos camponeses, que

seria tomado como exemplo para as lutas futuras.

Após o processo histórico de luta pela terra, entre os anos de 1955 e 1964, quando a

formação dos sindicatos rurais e a atuação da Ligas Camponesas organizaram muitas lutas no

campo, com o golpe militar de 31 de março e uma violenta perseguição aos dirigentes dessas lutas,

interrompe-se um ciclo de organização dos camponeses no Brasil (MORISSAWA, 2001).

No período pós 64, o Estado brasileiro inicia a criação das condições necessárias para o

desenvolvimento de uma política agrária, privilegiando as grandes empresas mediante

financiamentos e incentivos fiscais. Segundo Fernandes (1999):

Para entendermos a origem dessa política é preciso considerar que o golpe militar de 1964 teve entre outros objetivos a finalidade de isolar parcialmente, de um lado, o poder dos coronéis latifundistas e de outro, impedir totalmente o crescimento das lutas dos trabalhadores rurais, que vinham construindo suas formas de organização, sobretudo a partir de meados da década de cinqüenta. (p.32).

Dessa maneira, o Estado controlava as lutas sociais e evitava os conflitos por terra,

mantendo sob o julgo da força o controle sobre a ordem social e, em muitos momentos, tratando as

questões sociais como questões de polícia, como Martins apud Fernandes (1999):

[...] Assim, as desapropriações somente eram realizadas como tentativa de diminuir os conflitos, e durante o período de 1965 até 1981 foram realizadas em média, oito decretos de desapropriação por ano contra pelo menos setenta conflitos por terra ao ano”. (p.33).

Segundo Fernandes (1999), é em função desses conflitos entre a posse da terra por diferentes

grupos e comunidades que a utilizavam para sua sobrevivência e os interesses de usos empresariais

e capitalistas, acompanhados e registrados pelas CEBs (Comunidades Eclesiais de Base) que foram

sendo construídos lugares de discussão e conscientização para a construção de um espaço político

de confronto na luta pela terra. Importante ressaltar que ao longo da história os trabalhadores

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mesmo em condições adversas procuraram se organizar, adaptando e atualizando suas formas e

estratégias de luta, bem como construindo alianças com diferentes setores da sociedade. Neste

sentido, a igreja católica, enquanto espaço de sociabilidade, proporcionava a discussão da realidade

a partir da vivência individual e coletiva de seus membros.

Baseada na teologia da libertação que buscava fazer dos pobres um agente de transformação,

foram criadas pastorais e suas metodologias de trabalho com as pessoas que estavam à margem da

sociedade, visando sempre a transformação a partir do olhar do empobrecido. Muitos bispos se

manifestaram contra a violência e em defesa dos trabalhadores, com destaque especial para Dom

Pedro Casaldáliga, bispo de São Felix do Araguaia, no Estado do Mato Grosso (MARTINS, 1981;

FERNANDES, 1999).

Mediante essa pressão interna por assim dizer, vinda da teologia da libertação, os religiosos,

padres, bispos católicos, freiras assim como alguns pastores de igrejas protestantes históricas

(Luteranas e Metodistas) conseguiram se posicionar contra o latifúndio. Nisso a igreja católica se

baseava no princípio da seguridade dos direitos, apoiando toda e qualquer manifestação e

organização de setores sociais excluídos do processo político e econômico. (MARTINS, 1981;

FERNANDES, 1999).

A partir dessa preocupação da igreja com a questão agrária no Brasil, buscavam-se

alternativas para auxiliar e organizar o povo excluído de suas terras. Em parceria com algumas

igrejas protestantes históricas como Luteranas e Presbiterianas em 1975, a CPT (Comissão Pastoral

da Terra) foi criada para articular o trabalho das diversas regiões em favor dos direitos dos

trabalhadores (MARTINS, 1981; FERNANDES, 1999).

O trabalho pastoral da CPT ao discutir os problemas da humanidade na concepção ética,

política e social despertava a compreensão da realidade de exclusão, em que viviam os agricultores

pobres. Foi com a CPT que alguns agricultores expulsos de suas terras começaram a se organizar e

exigir o seu direito pela terra. A partir dessa necessidade nasce o Movimento dos Trabalhadores

Rurais Sem Terra (MST). Como nos lembra Stédile (1997):

Sempre tivemos vinculações com a CPT e com outros setores progressistas das chamadas igrejas cristãs históricas. A CPT teve um papel importante na fundação do Movimento e foi ela quem fez o primeiro trabalho de conscientização dos camponeses. De certa forma, o MST é um filhote da CPT. Dificilmente os camponeses teriam adquirido consciência se a CPT não tivesse feito aquele trabalho. A CPT lá nos primórdios de 1975 a 1984 ia para o interior fazer o trabalho de base e diziam assim: Deus só ajuda quem se organiza, não pensem que Deus vai ajudar vocês se ficarem só rezando... Isso motivou que os camponeses começassem a se organizar seja no sindicato, seja no partido político, seja no MST. No inicio a CPT tinha uma participação mais ativa nas ocupações de terra, porque os trabalhadores não tinham ainda suas organizações. A partir de 1984, surgiram outros movimentos também resultado desse trabalho. (Não paginado).

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Com o passar do tempo, o MST foi adquirindo sua própria maneira de se organizar e foi se

tornando independente da CPT, principalmente em relação às ocupações de terra. Mas a própria

experiência deste autor, bem como as análises de Stédile (2006) e Fernandes (1999) indicam que a

forma de respeito à cultura das diferentes manifestações regionais é uma herança dada pela CPT

que ainda é muito forte no Movimento.

A gestação do MST, como afirma Fernandes (1999), começou em 1979 quando aconteceu

um primeiro conflito importante por terra em plena ditadura militar, a ocupação da Fazenda Macali

em Ronda Alta no Rio Grande do Sul.

A partir da ocupação e resistência em Ronda Alta, várias lutas foram acontecendo

principalmente na região sul do país: em Santa Catarina, a ocupação, resistência e conquista da

fazenda Burro Branco e no Estado do Paraná, a ocupação da fazenda Anoni no município de

Marmeleiro, no ano de 1982.

Lutas pela terra também aconteciam em outras regiões do país. Em São Paulo, no município

de Andradina, em 1979, a luta pela terra começa na fazenda Primavera de 9.385 hectares, quando o

proprietário, para expulsar os camponeses arrendatários da terra, coloca o gado para destruir as

lavouras e contrata jagunços, gerando conflitos, que resultam em queima de casas de camponeses e

um trabalhador assassinado.

Na região sudoeste do estado de São Paulo nos municípios de Itapeva e Itaberá, a fazenda

Pirituba com 17.500 hectares foi ocupada três vezes, até que, com a eleição do governo Franco

Montoro em 1982, que se comprometeu com a regularização das terras devolutas, evitou-se o

agravamento do conflito e foi iniciado o processo de assentamento dos camponeses.

As conquistas pelos camponeses em Andradina, Itapeva e Itaberá desencadearam outras

lutas no Estado de São Paulo, como por exemplo em Sumaré, no Pontal do Paranapanema e em

todo Brasil, criando condições para formação do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra

(FERNANDES, 1999).

Ainda, segundo Fernandes (1999), as mobilizações e articulações políticas continuaram com

a promoção da CPT que, a partir de 1981 organiza um Encontro Regional Sul dos trabalhadores

rurais sem terra e um seminário de debates sobre a questão agrária em Goiânia, que constituíram as

bases da realização do 1º Encontro Nacional dos Sem Terra. Tanto no encontro regional sul, quanto

no seminário de Goiânia, os participantes oriundos de vários estados brasileiros e diretamente

envolvidos com distintas formas de lutas e resistência debateram a necessidade de criar um

Movimento de alcance nacional.

Depois dos eventos citados, criaram-se as condições objetivas e subjetivas, isto é, o acúmulo

de conhecimentos, troca de experiências, fortalecimento de alianças e estratégias que redundaram

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na realização do primeiro encontro nacional dos Sem Terra, em Cascavel, Estado do Paraná que deu

origem ao MST. O evento se deu nos dias 20, 21 e 22 de janeiro de 1984 e contou com a presença

de representantes de 12 estados: Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná, São Paulo, Mato

Grosso do Sul, Espírito Santo, Bahia, Pará, Goiás, Rondônia, Acre e Roraima. Também estavam

presentes representantes da ABRA (Associação Brasileira de Reforma Agrária), representantes da

CUT (Central Única dos Trabalhadores), representantes do CIMI (Comissão Indigenista

Missionária) e da Pastoral Operária de São Paulo. (MORISSAWA, 2001)

A diversidade de representação das entidades de trabalhadores buscava criar um Movimento

voltado a unificação das lutas dos sem terra em âmbito nacional. A partir da criação do trabalho de

construção e consolidação, entendendo que a luta pela Reforma agrária deveria estender-se por todo

território nacional, realiza-se em 1985 o 1° Congresso Nacional, reunindo em Curitiba, Paraná,

1600 delegados de todo o Brasil, com a palavra de ordem “Ocupação é a única solução”.

Dessa forma as lutas vão acontecendo em todo país e consolidando o Movimento.

Enquanto isso, a propriedade da terra que origina-se de uma forma concentradora, baseada

nas sesmarias, nas capitanias hereditárias e posteriormente na lei de terras de 1850, em que a única

maneira de tornar-se proprietário seria através da compra. Desta maneira a população escrava

mesmo depois da abolição da escravatura estava impossibilitada de obter a propriedade da terra, por

não ter recursos financeiros. Por isso a luta pela terra no Brasil se fez e continua se fazendo

necessária pela desconcentração e democratização da propriedade.

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2. O AGRONEGÓCIO E A EVOLUÇÃO DA CITRICULTURA BRASILEIRA Para abordarmos a evolução da citricultura brasileira, primeiramente nos baseamos em

conceitos formulados por Davis e Goldberg (1957), Delgado (1985) e Silva (1998), sobre o

agronegócio para, a partir daí, construir uma analise que possibilite compreender os conflitos

gerados nesse processo. Conflitos esses gerados entre citricultores capitalistas e camponeses e as

indústrias processadoras.

2.1 Agronegócio: origem e características

A primeira formulação do conceito de agronegócio (Agrobusines) é de Davis e Goldberg

(1957). Para os autores, o agronegócio corresponde a um complexo de sistemas interligados, que

compreende agricultura, indústria, mercado e finanças. Ou seja, trata-se de um processo de

integração de diferentes atividades que amplia capacidades produtivas, a concentração do capital e o

poder de mercado de empresas em grupos empresariais que adquirem capacidades cada vez maiores

de atuarem na escala internacional. Portanto, é um modelo de desenvolvimento econômico em que

as corporações transnacionais atuam em vários setores da economia de maneira concomitante.

Nesse sentido é possível identificar as vantagens comparativas das transnacionais do

agronegócio em todos os sistemas do complexo. No Brasil as formulações e análises

correspondentes ao agronegócio são observadas através dos trabalhos de vários autores que

caracterizaram o desenvolvimento capitalista na agricultura com a formação do CAIs (Complexo

Agroindustriais), ou seja, o momento da industrialização dos processos da produção rural, baseados

na industrialização de bens de produção a fabricação de máquinas e equipamentos de fertilizantes e

inseticidas.

Este processo de capitalização da agricultura brasileira representa uma mudança estrutural nas

articulações com o Estado e entre os diferentes segmentos econômicos do mercado, que passam a

estar organizados no sentido de ampliarem sua atuação. Segundo Delgado (1985)

Esse processo caracteriza-se fundamentalmente, pela implantação no Brasil de um setor industrial, produtor de bens de produção para a agricultura, paralelamente desenvolve-se ou moderniza em escala nacional um mercado para produtos industrializados de origem agropecuária, dando origem a formação simultânea de um sistema de agroindústria em parte dirigida para o mercado interno e em parte voltado para a exportação (p. 34-35)

Dessa maneira como afirma o autor as bases técnicas dos meios de produção agrícola se

modernizam estimulados pelos incentivos do Estado. Promovendo assim a reprodução ampliada do

capital no setor agrícola, que passa a integrar de maneira dependente a agricultura à indústria de

bens de capital e produtora de insumos.

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Como afirma Silva (1998) a industrialização da agricultura brasileira é relativamente

recente, uma vez que, é a partir de 1965 que acontece uma mudança qualitativa em suas bases

técnicas com a formação dos complexos agroindustriais com fortes incentivos de políticas

governamentais. Ainda segundo o autor:

O ponto culminante integração, todavia, só seria logrado no final dos anos setenta e inicio dos oitenta resultando numa verdadeira “orquestração de interesses” agrários, industriais e financeiros. Além de representar uma consolidação da integração técnica e financeira do CAIs, essa “orquestração de interesses” impôs profundas transformações nos planos de concentração e descentralização dos capitais aplicados no setor agropecuário. Bem como na propriedade da e no conteúdo das políticas. (p. 163)

Tais políticas públicas, que passariam a ser formuladas desde então, não apenas em relação a

ampliação do crédito, mas também gerando obstáculos ao avanço necessário da desconcentração da

propriedade fundiária e sua democratização. Dessa maneira podemos constatar a integração da

agricultura com indústria de insumos e de máquinas, ou seja, este processo aumenta a subordinação

do trabalho ao capital e transforma também relações intersetoriais entre os diferentes capitais que

desfrutam a apropriação dos excedentes gerados em cada etapa do processo de produção do valor.

Apesar das transformações técnicas patrocinadas pelo agronegócio as contradições inerentes

ao sistema de produção do agronegócio em relação a produção camponesa, os conflitos e as

disputas entre os opostos sistemas de produção, ou seja, entre o agronegócio e a agricultura familiar

emergem em várias escalas geográficas e sobre diferentes temas: Nas concepções diferentes sobre o

uso de transgênicos na inevitabilidade do processo nos moldes capitalistas, no uso do trabalho e na

condução dos processos de concentração e desconcentração da propriedade, bem como acesso aos

mercados, sejam eles nacionais ou internacionais.

2.2. A citricultura no Brasil

Buscaremos analisar neste sub-capítulo elementos relacionados à evolução da citricultura e

sua territorialização, para que através destes possamos compreender os conflitos gerados nesse

processo entre citricultores capitalistas e camponeses e as indústrias processadoras.

A trajetória da evolução da monocultura da laranja através da plantação de pomares para fins

comerciais inicia-se no Estado do Rio de Janeiro e, posteriormente, (pelos motivos apresentados a

seguir) alcança o Estado de São Paulo.

Segundo Borges (2004) o que pode ser abordado como surgimento da exploração comercial

da laranja no Brasil tem como referência o ano de 1886, quando se inicia sua produção, com o

objetivo de ser um produto de exportação.

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No início a exportação da fruta in natura, tinha como seu principal destino os países da

América do Sul, localizados na Bacia do rio da Prata, especificamente, suas capitais Montevidéu e

Buenos Aires.

Considera-se um segundo momento, o período da década de 1930 até o início da década de

1960, com a consolidação no Estado de São Paulo, favorecida por um conjunto de variáveis: O tipo

de solo, a topografia, o clima, a temperatura e a regularidade das chuvas. Os seguintes períodos

descritos pela autora são:

[...] do início do século XX até o final da década de 20 desse século; 2) a partir da década de 30 até o início da década de 60; 3) de 1963 ao final dos anos 80; 4) da década de 90 até o momento presente. (p. 99)

Além das condições edafoclimáticas4, outros fatores relevantes impulsionaram o

crescimento da produção de laranja no Estado de São Paulo: ser uma atividade alternativa a

produção de café que estava decadente nesta época em função da crise econômica de 1929, o

aumento da demanda interna por laranja, derivada da urbanização e pela utilização das estruturas

produtivas, como as linhas férreas, Sorocabana, Central, Araraquarense e Paulista que dinamizaram

o crescimento da produção e comercialização. Através desta estrutura que fora construída

anteriormente para escoamento da produção de café, sua utilização torna-se um fator importante,

econômico e social, para essa nova produção.

De acordo com Moreira e Moreira (1991) apud Borges (2004), outro aspecto a ser observado

ao longo destes períodos entre 1886 até 1985 foi a participação do Estado em benefício desta

atividade, o que se altera radicalmente a partir do fim do contrato padrão, que retira a presença do

Estado, como será visto mais a diante.

O governo do Estado de São Paulo sempre se mostrou próximo e favorável aos interesses

ligados à cultura e, posteriormente, ao processamento da laranja, através por exemplo, da criação

das estações experimentais de Limeira, Sorocaba e Taubaté, com apoio da ESALQ (Escola Superior

de Agricultura Luiz de Queiroz) e IAC (Instituto Agronômico de Campinas), com o objetivo de

fornecer orientações agronômicas e fito-genéticas entre os anos de 1927 a 1931.

Um momento de crise acontece em função da segunda guerra mundial, de 1938 a 1945, onde

as exportações destinadas a Europa caem drasticamente entre 1940 e 1945. A consequência da

perda do mercado internacional se dá pela alta na oferta da fruta no Brasil, o que provoca queda do

preço no mercado interno. Com a descapitalização dos produtores inviabiliza-se a manutenção do

4 Corresponde as condições geológicas, hidrográficas e climáticas.

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trato dos pomares e, conseqüentemente, a proliferação da doença tristeza5. A doença alterou a

dinâmica produtiva local e regional, onde se estruturavam os pomares, começando a partir de

Jacareí no Vale do Paraíba, causando a morte de 10 a 12 milhões de plantas.

Segundo Siffet Filho (1992, p.123) apud Borges (2004), a produção paulista sofreu uma

queda de 82% no período entre os anos de 1940 a 1950, sendo recuperada apenas pós 1960, em

função da retomada do mercado internacional e da demanda interna provocada pelo crescente

processo de urbanização. Como afirma o autor: “diante da crise o Estado se fez presente de modo a

incentivar a comercialização estabelecendo preço mínimo e cota de exportação e também através da

compra e revenda sem obtenção de lucro”.

Esta presença também se dá através dos institutos de pesquisa ESALQ e IAC, como já dito

anteriormente, com o objetivo de solucionar os problemas causados pela doença tristeza, ação que

obteve resultado positivo e que abriu frente para um novo período, em que a presença do estado se

fez de modo ainda mais incisivo. Através da Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado

de São Paulo, este passa a ter o poder concessionário e fiscalizador na produção de mudas como

forma de controle fito-sanitário. Com este conjunto de medidas, o Estado de São Paulo torna-se o

maior produtor da federação.

Esta evolução caracteriza uma nova fase produtiva descrita por Borges (2004) como sendo a

fase da expansão da indústria processadora, em que os produtores deixam de produzir para o

consumidor final e passam ser fornecedores de matéria-prima.

A forma como ocorreu a evolução da citricultura no Brasil e especificamente no estado de São Paulo neste período, serviu de base para o surgimento do agronegócio exportador de SLCC (suco de laranja concentrado e congelado) a partir da década de 60. A citricultura se expandiu e se estruturou com agricultores com características empresariais buscando rentabilidade com a atividade e, para tal, utilizando-se de estrutura de pesquisa e técnica fornecida pelo governo do estado de São Paulo. Essa estrutura viabilizou a superação de duas grandes crises fitossanitárias, a tristeza e cancro cítrico6. Cabe salientar que o desenvolvimento do negócio citrícola dependeu, neste período, de dois mercados: o interno, que crescera com a urbanização, e o externo, impulsionado pelo crescimento do mercado da fruta in natura. Assim, o produtor citrícola que atendeu a esses mercados, era produtor de um bem final de consumo. Nessa posição estava subordinado às oscilações de mercado da fruta in natura e aos problemas climáticos e fitossanitários. A atuação do estado, nesse período, ocorreu no sentido de minimizar os problemas econômicos e fitossanitários. A posição do produtor se modificou, rapidamente em apenas uma década com a implantação das empresas processadoras. Essa modificação constituiu o principal fator que marcou a passagem da citricultura para um novo período. (p.108)

5 Tristeza é um doença que atinge os plantios de laranja, é causada pelo vírus do gênero closterovirus (BORGES, 2004). 6 É uma doença bacteriana encontrada pela primeira vez em Presidente Prudente-SP, em 1957, proveniente de uma planta trazida do Japão (BORGES, 2004).

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Como destaca a autora, é a partir da década de 1960 que surgem os elementos decisivos que

demarcaram um novo ciclo na citricultura brasileira. A implantação das processadoras consolida,

assim, o agronegócio citrícola com a formação do complexo agroindustrial citrícola em que a

agricultura passa a depender das indústrias a montante e a jusante7. Como afirma Silva (1988):

[...] é a partir daí que se torna possível aprofundar o processo de modernização, com a industrialização da agricultura e a constituição dos vários cais (complexos agroindustriais). De outro no sentido de que apenas quando se estabelecem relações específicas para trás com a indústria de insumos e máquinas agrícolas é que se tem um cais completo. Ou seja, é apenas aí que se completa o tripé composto pela indústria para a agricultura e pela agricultura moderna em torno de uma determinada cadeia produtiva com vínculos específicos entre si. Com isso, garante-se uma dinâmica particular determinada endogenamente nesses complexos que contam no seu interior com grupos de interesses responsáveis pela formulação das demandas específicas junto ao Estado. (p. 86).

O setor processador é impulsionado segundo Borges (2004) nos anos de 1960 e 1970 por um

conjunto de fatores: a ocorrência de geadas na Flórida (EUA), maior produtor de laranja e SLCC

(suco de laranja congelado concentrado) a proximidade com as localidades de produção e o

aproveitamento, assim, da infra estrutura disponível em momentos anteriores.

As primeiras empresas processadoras são instaladas no início da década de 1960,

aproveitando as condições descritas pela autora no Estado de São Paulo, eram elas Avante e Citral

em Limeira, Citrobrasil em Bebedouro, Citrosuco em Matão, Cutrale em Araraquara, Frigorífico

Anglo em Barretos e a Sanderson em Bebedouro.

O crescimento da produção e industrialização da laranja aumenta a relação de dependência

do produtor com as processadoras, dessa forma ele deixa de ser um produtor para o mercado final e

passa a ser um fornecedor de matéria prima para a indústria. Ou seja, o produtor torna-se submisso

ao volume de produção e ao preço determinado pela processadora.

O crescimento observado no início da implantação das processadoras se alterou em função

da crise do petróleo entre 1973 e 1974 reduzindo as exportações. Neste contexto acontece a crise no

setor, provocando a falência da empresa Sanderson considerada a terceira maior empresa do

segmento processador.

Diante da crise do setor o Estado, por um lado, assume as tarefas de mediador da

concorrência entre os diferentes agentes econômicos, visando manter a capacidade econômico-

financeira destes, tendo em vista sua contribuição para a exportações brasileiras. Por lado, pune a

7 A agricultura passa a depender da indústria a jusante no processo de produção: Máquinas e equipamentos, insumos e defensivos e a montante no processo de armazenamento, industrialização e comercialização.

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empresa Citrosuco, pela prática de dumping8, fixando preços mínimos e cotas máximas de

exportação, proibindo-a de exportar até o final de 1974. Estas medidas favoreceram diretamente a

empresa Cutrale, propiciando a atuação praticamente isolada no mercado, aumentando assim a

dependência dos produtores e afetando toda cadeia produtiva que se vê cada vez mais em um

mercado oligopolizado9, com reflexos sobre os volumes produzidos, os preços praticados e a

dependência dos grandes agentes econômicos.

Em consequência da crise de 1974 começa a ologopolização do setor, pois as empresas de

porte menor foram vendidas: a Cargil comprou a Citrobrasil e a Avante, a Cutrale e a Citrosuco

assumiram a Sucorico, Citral e Tropisuco. Nesse novo ciclo a partir do inicio da década de 80,

embora estivesse ocorrendo retração nas atividades econômicas no Brasil, a citricultura conta com

elementos favoráveis a expansão. Sucessivas geadas nos pomares norte-americanos na Flórida em

1981, 1982 e 1983 o colocam no estágio de maior crescimento de sua história.

Dessa forma o setor age de maneira expansionista atingindo outras territorialidades no

Estado de São Paulo. Ou seja, é a concentração e centralização dos capitais que providenciam as

bases para que as empresas adquiriam capacidade de buscarem novas localização que configuram

novas territorialidades sócio-espaciais do capital.

A produção citrícola que antes se localizava principalmente na região norte do estado

começa a se deslocar para as regiões sul e central. Os elementos que contribuíram para esse

deslocamento foram o fim do contrato padrão, os problemas fitossanitários identificados nas regiões

onde tradicionalmente predominava a produção e a disponibilidade de terras a venda ou para

arrendamento, a preços baixos, nas regiões de expansão.

Com esta desregulamentação institucional, fim do contrato padrão, e o consequente aumento

das doenças fitossanitárias, os grandes produtores e a formação de pomares próprios das

processadoras são deslocados para a região sul do estado, entre os municípios de Avaré, Botucatu

chegando até Bauru. Importante destacar que o deslocamento espacial em busca por uma nova

territorialidade da laranja, tem o objetivo de afastar a incidência das doenças fitossanitárias, de

aumentar a formação dos pomares próprios, pois nesta região instalaram-se as processadoras

Cutrale, Ficher e Citrovita.

As figuras abaixo demonstram esse deslocamento espacial e ilustram o volume de produção

no ano de 1995 e 2007, nos diferentes municípios do Estado de São Paulo.

Podemos constatar que em 1995 a concentração se dava na região norte do estado e que em

2007 começa o deslocamento em direção a região central e sul do estado, segundo dados da

Fundação Sistema Estadual de Análise de Dados – SP.

8 É um preço de um produto comercializado com valor inferior ao custo de produção. 9 Processo onde o mercado é dominado por poucos concorrentes.

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Mapa 01: Percentual sobre Valor Total da Produção de Laranja do Estado de São Paulo: 1995

Fonte: SEADE, 2011

Mapa 02: Percentual sobre Valor Total da Produção de Laranja do Estado de São Paulo: 2007

Fonte: SEADE, 2011

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Em relação a produção por toneladas podemos observar que em 1990 não havia nenhuma

produção no município de Iaras. Em 2007 este município aparece conforme figura, produzindo

68.000 toneladas. Isso demonstra o deslocamento da produção e mais, situa o objeto de nossa

pesquisa.

Em relação às figuras seguintes que demonstram a área colhida podemos analisar que

embora diminuindo a quantidade de hectares ocupados com a produção acontece o aumento da

produtividade. Essa evidência reflete o estágio de desenvolvimento dessa monocultura.

Mapa 03: Variação da Área Colhida de Laranja

Fonte: SEADE, 2011

Além dos elementos já apontados outro está relacionado à ologopolização da produção

citrícola, a formação dos pomares próprios pelas empresas processadoras. Esta forma de

organização, concentrando a produção, elimina grande parte dos produtores de origem familiar,

excluindo assim, parte da produção camponesa desta atividade produtiva. Dessa maneira,

reconhecemos a já analisada dinâmica contraditória existente entre os dois sistemas de produção.

Como relata Fernandes e Welch (2008):

O sistema agrícola do agronegócio é distinto do sistema agrícola do campesinato. No sistema agrícola do agronegócio, a monocultura, o trabalho assalariado e a produção em grande escala são algumas das principais referências. No sistema agrícola camponês, a biodiversidade, a predominância do trabalho familiar e a produção em pequena escala são algumas das principais referências. Com esta

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leitura estamos afirmando que o sistema agrícola camponês não é parte do agronegócio, todavia como o capital controla a tecnologia, o conhecimento do mercado, as políticas agrícolas etc.; os camponeses estão subalternos. O campesinato pode produzir a partir do sistema agrícola do agronegócio, contanto, dentro dos limites próprios das propriedades camponesas, no que se refere à área e escala de produção. Evidente que a participação do campesinato no sistema agrícola do agronegócio é uma condição determinada pelo capital. (p.49).

Mapa 04: Área Colhida em Hectares e Variação Relativa: 1990-2007

Fonte: SEADE, 2011

Como afirmam os autores, há diferenças enormes entre o sistema de produção camponês e o

agronegócio. Enquanto a agronegócio usa a terra e dispõe do que há de mais avançado tecnicamente

para controlar o processo de produção, o sistema de produção camponês é baseado na mão de obra

familiar, não tendo os mesmos recursos, técnicos, financeiros e mercantis do sistema agrícola do

agronegócio, não sendo parte do mesmo, mas um integrante de maneira subalterna.

Todavia, os citricultores no Brasil têm buscado formas de resistência através das associações

de classe, compreendendo o agronegócio enquanto uma totalidade, ou seja, entendem a produção

camponesa como sendo uma parte do agronegócio e devendo, portanto, resistir às suas investidas de

dominação. No entanto, entendemos que sua capacidade de resistência e autonomia, via suas

entidades, pouco contribuiu para sua afirmação como agentes produtores autônomos, pois diante do

monopólio das indústrias processadoras, os citricultores camponeses viram diminuir, nos últimos

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tempos, de forma considerável não apenas o próprio número de produtores, mas também suas

capacidades produtivas e seu poder de negociação de preços.

Como destacamos, a participação do Estado modifica-se ao longo do tempo e em várias

etapas do processo produtivo da citricultura no Brasil, ora concedendo incentivos fiscais ou técnicos

para melhoramento genético ou no combate a doenças fitossanitárias, ora regulando os preços no

mercado nacional e internacional através de seus órgãos de controle, Cacex (Carteira de Comércio

Exterior do Banco do Brasil), SAA (Secretária de Agricultura e Abastecimento do Estado de São

Paulo). Estas estruturas estatais funcionavam como corpo técnico e de regulação jurídica.

Uma nova forma de regulação do setor citrícola, começa a partir de 1986 com a implantação

do contrato padrão10. Este contrato pressupunha a negociação direta entre a indústria processadora e

os produtores, eliminando dessa forma a participação regulatória do Estado. Desobrigam-se, assim,

as indústrias processadoras pelo trato dos pomares, pela colheita e pelo transporte das frutas.

Esta nova regulação acirra o conflito entre processadora e produtores, principalmente entre

os pequenos produtores vinculados a agricultura familiar camponesa. Diante da ausência do Estado

surge o conflito de representação dos produtores, dividindo-se em várias instituições. Assim,

segundo Borges (2004):

No caso dos produtores surgiu em 1988 a associação dos citricultores do estado de São Paulo (ACIESP) como um organismo de atuação regional diferentemente da Associtros que a partir de um dado momento, buscou também uma ação no âmbito regional com delegacias. Então a ACIESP cresceu devido à sua atenção localizada, focando os pequenos proprietários, a fim de lhes dar assistência econômica e técnica. No seu discurso transfere-se a idéia de desvinculação do Estado, da indústria e de qualquer instituição que não fosse vinculada apenas ao produtor citrícola. Então não se aproximava da Associtros, por não privilegiar os pequenos produtores, da Faesp, vinculado ao Estado e da Fundecitros, por ter participação da indústria e do Estado. Esta postura radical da Aciesp viria a prejudicar a sua sobrevivência e seu poder no mercado em um momento futuro. (p.126).

Como nos informa a autora, houve também quebra de unicidade nas associações entre as

empresas processadoras. Em consequência acontece a dissolução da Abrasucos e a formação da

Associação Nacional da Indústria Cítrica (ANIC) representando a Citrosuco, a Cargil, a Bascitros e

a Citropectina e depois a formação da Associação Brasileira dos Exportadores de Cítricos

(ABCitrus), respaldando as empresas do grupo Cutrale.

Durante a vigência do contrato padrão entre o final da década de 1980 e o início dos anos

1990 existia um grande debate em defesa da chamada política neoliberal. Esta formulação

pressupunha a total liberdade de mercado, a privatização das empresas estatais e a flexibilização das

leis trabalhistas. Este contexto, em que há diferença de interesses entre os produtores provenientes

10 Contrato que determina o valor da caixa de laranja, baseado na variação da bolsa de mercadorias de Chicago, nos EUA.

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de distintas escalas de produção, proporcionou a quebra de unidade de um setor bastante

heterogêneo, favorecendo as processadoras em função da organização oligopolista.

A assimetria entre os interesses do conjunto dos produtores e das processadoras culmina

com o fim do contrato padrão, no ano de 1995. Um dos motivos alegados pelas processadoras para

o rompimento do contrato padrão foi a queda da cotação internacional do preço da tonelada de suco,

transferindo assim os impactos depressivos para os produtores. O fim desta auto regulação também

foi corroborada pela atuação das entidades de classe, representantes dos citricultores, a Associtros e

Aciesp ao impetrarem junto a Secretaria de Direito Econômico (SDE) a acusação de prática de

cartel por doze empresas. Esta ação também questionava a compra de terras pelas processadoras

para formação de pomares próprios. Esta acusação originou processo no Conselho Administrativo

de Defesa Econômica (CADE) que culminou com a aprovação de um termo de compromisso para

encerrar práticas de cartel estabelecidas. Nesse sentido, segundo Paulilo (2000):

A intervenção do CADE foi pontual e o objetivo estratégico das Associações de interesse dos citricultores não foi realizado completamente, porque o Conselho não determinou uma nova política de preços e também não estabeleceu um novo contrato de fornecimento. O compromisso do CADE foi atuar unicamente no impedimento do cartel não interferindo no preço. Na questão de avanço dos pomares próprios ele não interveio, pois julgou-o não lesivo à concorrência. (2000, p. 116).

Entre os agentes vinculados a citricultura neste momento foi possível identificar os maiores

perdedores: os pequenos produtores de origem camponesa por não disporem de capital para a

manutenção do trato dos pomares, da colheita e do transporte das frutas; os trabalhadores rurais, que

perderam o contrato de trabalho no período de safras e consequentemente, como nos informa o

autor, aconteceu a proliferação das cooperativas de mão de obra rural, retirando assim os direitos

trabalhistas dos trabalhadores rurais como férias, descanso semanal remunerado, aviso prévio,

fundo de garantia por tempo de serviço, acidente de trabalho entre outros.

Uma situação totalmente diferente aconteceu em relação às indústrias processadoras, nas

quais os interesses são homogeneizados através de suas entidades de classe, aumentando a

discrepância entre o poder de negociação dos produtores e dos trabalhadores rurais.

As mudanças introduzidas pelo setor processador, com a verticalização da produção, a

formação de pomares próprios, a ampliação da auto capacidade financeira e tecnológica e, também,

a produção de laranja e de suco na Flórida pelas empresas do agronegócio que atuam no Brasil, são

estratégias de manutenção do monopólio11 desta atividade produtiva.

11 Privilégio concedido a uma companhia ou governo para venda de um determinado produto

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3. A CITRICULTURA NO EDR DE AVARÉ: DISPUTA TERRITORIAL

Pretendemos neste capítulo explicar através da identificação de tabelas e gráficos

elaborados pelo Instituto de Economia Agrícola (IEA) a evolução da monocultura da laranja na

região de Avaré, tendo como base a escala temporal a partir do ano de 1990 e sua territorialização.

Em função desta, analisaremos o comportamento dos agentes econômicos da cultura da laranja e os

conflitos entre os agentes desta nova organização econômica do uso do território.

Outra abordagem se refere ao uso de terras públicas por parte de empresa privada na

implantação dessa nova dinâmica de uso e ocupação do solo. Finalmente caracterizamos o

sujeito social MST na reivindicação das terras públicas para fins de Reforma Agrária e o

consequente conflito instalado diante da assimetria de interesses entre Movimento e empresa.

3.1 Evolução da Citricultura no EDR de Avaré no período de 1990 a 2010

Como relacionado em capítulo anterior, a monocultura da laranja no EDR de Avaré vai se

territorializando a partir dos anos de 1990.

Neste período, a citricultura sob a vigência do contrato padrão ampliava a plantação dos

pomares próprios. Entre as conseqüências desta ampliação, está a concentração da propriedade da

terra nas mãos das empresas processadoras. A tabela 01, mostra ano a ano o avanço das plantações

de laranja nesta região

Tabela 01 - Evolução da citricultura da laranja em pés no EDR de Avaré – 1990 a 1995

Anos 1990 1991 1992 1993 1994 1995

Pés Novos 342.000,00 447.500,00 403.500,00 399.000,00 301.640,00 1.223.000,00 Pés em

Produção 269.000,00 301.000,00 309.500,00 344.500,00 582.780,00 825.420,00

Fonte: Instituto de Economia Agrícola. Org.: OLIVEIRA, Avelino Rodrigues de (2011).

Se observarmos atentamente, percebemos que os números da primeira tabela demonstram o

aumento da plantação de laranja no período de 1990 a 1995. Este período apresenta como principal

característica, a plantação por grandes empresas. Podemos identificar que nesta região atuam as

empresas: Citrovita, Ficher e Cutrale. O crescente aumento do número de pés plantados entre 1990

a 1995, como nos informa o IEA, evidencia o crescimento desta monocultura.

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Gráfico 01: Evolução da Citricultura da Laranja (Em Pés) no EDR de Avaré de 1990 a 1995

Fonte: Instituto de Economia Agrícola. Org.: OLIVEIRA, Avelino Rodrigues de, 2011.

Sob a vigência do contrato padrão que regulou as relações institucionais entre produtores

capitalistas e camponeses nos anos de 1986 a 1995, as empresas processadoras aumentaram a

verticalização da produção com a formação dos pomares próprios entre 1990 a 1995. Assim, o

avanço da agricultura capitalista é materializada nesta região através do aumento da plantação de

laranja (apresentados na tabela 01 e gráfico 01).

O que poderemos considerar no próximo período, entre 1996 a 2002, será analisado pela

tabela 02 e o gráfico 02, buscando compreender o desenvolvimento desta monocultura neste

período.

Tabela 02 - Evolução da citricultura da laranja em pés no EDR de Avaré –1996 a 2002

Anos 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002

Pés Novos 410.000,00 20.000,00 511.100,00 455.200,00 445.200,00 442.200,00 219.200,00

Pés em Produção

1.394.420,00 1.459.420,00 1.316.420,00 1.396.420,00 1.387.500,00 1.361.000,00 1.953.751,00

Fonte: IEA. Org. OLIVEIRA, Avelino Rodrigues de, 2011.

Ao observar a tabela 02 e seu respectivo gráfico, constatamos uma grande queda na

plantação de novos pés no ano de 1997 em função das baixas expectativas dos produtores, dada a

valorização cambial, decorrente do Plano Real que vinha afetando negativamente as exportações e

uma certa instabilidade nos anos subseqüentes, até o ano de 2002. Neste período, com o fim do

contrato padrão, aconteceu o aumento das doenças fitossanitárias: cancro cítrico e amarelinho12

Segundo Paulillo apud Oliveira (1999). Neste período, entre os anos de 1996 a 1999 foram

erradicados mais de 18 milhões de pés de laranja. Podemos verificar que, por sua vez, os

12 Amarelinho ou clorose variegada do citro (cvc) essa doença foi identificada nos pomares norte e noroeste do estado de São Paulo e sul do triângulo mineiro em 1987.

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citricultores deixaram de produzir mais de 45 milhões de caixas de 40.8 Kg. de laranja. Assim,

observamos o aumento dos pés em produção, como nos mostra o gráfico 02 a seguir:

Gráfico 02: Evolução da Citricultura da Laranja (Em Pés) no EDR de Avaré de 1996 a 2002

Fonte: IEA. Org.: OLIVEIRA. Avelino Rodrigues de, 2011.

Entre os anos de 1996 a 2002, podemos observar, através do gráfico 02, uma diminuição na

formação de novos cultivares nos anos de 1997, 2001 e 2002.

Tabela 03. Evolução da citricultura da laranja em pés no EDR de Avaré – 2003 a 2010.

Anos 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010

Pés Novos 238.200,00 425.912,00 562.912,00 888.501,00 2.169.000,00 5.746.458,00 2.309.000,00 893.528,00

Pés em Produção

1.913.700,00 2.001.287,00 2.001.287,00 2.151.287,00 2.300.700,00 4.200.100,00 7.350.285,00 7.668.112,00

Fonte: IEA, org. OLIVEIRA, Avelino Rodrigues de, 2011.

No período entre os anos de 2002 a 2010, podemos constatar a evolucão na produção

(referente a tabela 03), consolidando o agronegocio citrícola no EDR de Avaré, promovido

principalmente pelas grandes empresas processadoras. Como nos mostra o gráfico 03:

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Gráfico 03: Evolução da Citricultura da Laranja (Em Pés) no EDR de Avaré de 2003 a 2010

Fonte: IEA. Org.: OLIVEIRA, Avelino Rodrigues de, 2011.

Como nos informam as tabelas e gráficos, formulados a partir dos dados fornecidos pelo

Instituto de Economia Agrícola, o número de pés em produção entre os anos de 1990 a 2010 foram

respectivamente de 825.420 e 7.768,112. Entre os anos de 2003 a 2010, analisando a tabela 03 e seu

respectivo gráfico, para compreender o desenvolvimento desta monocultura, neste periodo

constatamos uma queda a partir do ano de 2009 da plantação de novos pomares e um consequente

aumento na quantidade de pés em produção, resultado da plantação de anos anteriores

3.2 O MST em Iaras e a disputa territorial

Umas das principais características do agronegócio são: a concentração da propriedade da

terra, a homogeneização da produção, o uso de máquinas agrícolas e de produtos químicos.

Outra forma diferente de produzir corresponde ao sistema agrícola camponês que se

materializa na disputa pelo território entre o Movimento Social MST e a empresa citrícola Cutrale

na região de Iaras, EDR de Avaré.

O EDR de Avaré é uma divisão territorial institucionalizada pela SAA (Secretaria de

Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo), sendo formado por doze municípios: Águas

de Santa Barbára, Arandu, Avaré, Barão de Antonina, Cerqueira César, Coronel Macedo, Iaras, Itai,

Itaporanga, Mandurí, Paranapanema e Taquarituba13, de acordo com a figura abaixo.

13 <http://www.cati.sp.gov.br >

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Figura 01: Municípios Integrantes do Escritório de Desenvolvimento Rural de Avaré

Fonte: IBGE – Bases Cartográficas, 2005; CATI, 2011.

Compondo o EDR de Avaré o município de Iaras, tornou-se palco do conflito instalado na

disputa pelo território.

Iaras é um município do Estado de São Paulo, com pouco mais de seis mil habitantes.

Localiza-se na latitude 22º, 52’15” S e longitude 49º,09’46” W em uma altitude de 648 metros .

Possui uma área de 401,4 km² na região centro oeste do estado, às margens da rodovia Castelo

Branco, na altura do km 278.

O MST está atuando nesta região desde 1995 com o objetivo de pressionar o Estado pela

retomada das terras públicas pertencentes à União que foram adquiridas para instalar um projeto de

colonização denominado de Núcleo Colonial Monção, entre os anos de 1909 e 1911. Com a não

efetivação integral deste projeto estas terras foram sendo griladas ao longo do tempo, e tornaram-se

objeto de disputa entre o MST e aqueles que ocupam estas propriedades públicas.

Primeira ocupação de terra no município de Iaras se deu no dia 20 de novembro de 1995, e

área em disputa compreende aproximadamente 50.000 há.

O Núcleo Colonial Monção teve origem em 1908 com a aquisição por parte da União de

vários imóveis rurais na região, com o objetivo de receber imigrantes, pois a imigração era uma

política de Estado. Foram adquiridas as fazendas Santa Luzia, Capão Rico I, II, III, IV, V e VI,

Fazenda Capivara e sítio Sarandi, localizadas nos municípios de Iaras e Águas de Santa Bárbara, as

quais foram adquiridas mediante compras pela União.

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Figura 02: Núcleo Colonial Monção

Fazenda Santa Luzia

Sítio Sarandy

Fazenda Capão Rico

Fazenda Capivara

Fazenda Turvinho

Área de Estudo Fundiário Fazendas Geada, Forquilha e Salto

Área de Estudo Fundiário Fazenda São Domingos

Rio Turvo

Rio Claro

Rio Pardo

Rio Pardo

S. P.P. Prudente

Rod.Castelo Branco

Fonte: INCRA, 200714

As fazendas Turvinho, Salto, Geada, Forquilha, localizadas no município de Agudos foram

adjudicadas por dívidas em processo movido pela União contra a Cia Colonial São Paulo – Paraná,

tendo a emissão de posse ocorrida em 1909. Que de acordo com seu projeto deveriam seriam

destinadas ao processo de colonização de imigrantes.

Em partes do núcleo ocorreu a implantação de assentamento de colonos, principalmente nas

Fazendas Santa Luzia e Turvinho. Todavia, como o empreendimento não chegou a ser totalmente

desenvolvido, na década de 1960 a União procurou repassar para o governo estadual a área total da

gleba em questão, para instalação de um projeto de reflorestamento. Porém, o propósito não foi

totalmente efetivado de modo que o Estado, por meio do Instituto Florestal ocupou apenas uma

parte do núcleo formando a Fazenda Capão Bonito para o plantio de pinus. O restante da área, ao

longo dos anos foi indevidamente apropriada pelas empresas de silvicultura Ripasa, Lwart Lwarcel

com plantio de eucalipto para produção de celulose. E outra parte com exploração agropecuária.

Nesse contexto histórico15 origina-se a disputa pelo território em Iaras entre o campesinato

organizado pelo MST e o agronegócio. O grupo de aproximadamente 300 famílias, que fez a

14 Apresentação de um representante do Incra, Antonio Storel, em Bauru (2010), em ato de defesa pela Reforma Agrária na Câmara Municipal.

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primeira ocupação de terra em novembro de 1995, sofreu vários despejos, até que através de uma

medida concedida pela justiça federal denominada “Tutela provisória antecipada”16, 30% de uma

das fazendas vistoriadas em 1997, proporcionou o assentamento de 54 famílias. Depois dessa

primeira conquista a militância do MST em 1998 organizou o segundo acampamento na região,

denominado Madre Cristina17, nome que trazia o objetivo de homenagear e manter viva a luta e o

exemplo dessa lutadora.

Era um momento de grandes mobilizações em defesa da reforma agrária em todo Brasil. No

Estado de São Paulo, o MST organiza o acampamento Nova Canudos, que começa sua luta fazendo

a ocupação no município de Porto Feliz, na fazenda Engenho D`água com aproximadamente 1600

famílias oriundas das periferias das grandes cidades, excluídas do mercado de trabalho, que

vislumbravam no MST a possibilidade para reconquistar os seus meios de vida.

Esse acampamento percorreu vários municípios do estado, passando pelas cidades de

Anhambi, Piracicaba, Limeira. Nesse processo de luta, o acampamento sofreu três despejos, fez

manifestação na rodovia Castelo Branco que resultou em 9 prisões, mas também procurou negociar

o tempo todo com o governo, sendo convencido a mudar do acampamento que estava numa área

que pertencia ao Banco do Brasil, no município de Limeira para vir acampar em terras no município

de Iaras no núcleo Colonial Monção.

De acordo com uma funcionária do INCRA, Dona Maria de Oliveira18, estas famílias seriam

assentadas num prazo de 3 meses. Também fazia parte da negociação o fornecimento de cestas

básicas para os acampados, uma ambulância para socorrer emergência de saúde e programa de

capacitação dos trabalhadores, pois, parte destes acampados eram trabalhadores excluídos das

periferias das grandes cidades e alguns não tinham experiências com o trabalho na agricultura. Com

o não cumprimento da promessa por parte do governo, os trabalhadores foram abandonados à

própria sorte e muitas famílias desistiram da luta. Porém, outras revigoraram e se buscou incentivar

outros companheiros a somarem nesta luta, acolhendo o acampamento Lafayette de Oliveira que

havia sido despejado da região de Bauru e contribuindo com a formação dos acampamentos Santo

Dias, Maria Bonita, Padre Leo, Che Guevara em Iaras.

Com estratégia de espacialização19 (FERNANDES, 1999) os trabalhadores foram ocupando

os territórios, dividindo-se em núcleos, produzindo alimentos como: feijão, milho, mandioca, batata

15 Essas informações referentes ao município de Iaras são decorrentes do conhecimento pessoal do autor que vive, trabalha e milita nesta área desde o ano de 1995 16 Medida concedida pelo juiz por antecipação do julgamento do mérito do processo 17 Madre Cristina, religiosa da Congregação Nossa Senhora - Cônegas de Santo Agostinho, educadora e doutora em psicologia pela PUC – São Paulo. 18 Essas informações foram obtidas em reunião de negociação entre representantes do Incra e dirigentes do MST em 2001. 19 Formas pelas quais se cria e divulga espaços políticos. Exemplos: marchas e ocupações. Essas espacializações culminarão na territorialização que é a conquista do assentamento. Melhor colocar uma citação de Bernardo

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doce, criando animais como galinhas e porcos e algumas famílias tinham gado bovino. Neste novo

espaço o espírito de solidariedade fazia-se presente através da divisão dos alimentos produzidos e

principalmente do leite distribuído às famílias que tinham crianças. Desta forma, conseguiram

resistir por longos cinco anos, até a realização do segundo assentamento, com cento e cinquenta e

quatro famílias no ano de 2005.

Desde a chegada do MST em Iaras, os enfretamentos com os inimigos da reforma agrária

começaram, primeiramente com a indústria da silvicultura, que usava entre outras formas de

violência a contratação de seguranças armados (jagunços), para intimidar os trabalhadores

acampados. No mesmo sentido, os pecuaristas e a polícia local procuravam vincular todos os crimes

que aconteciam na região aos acampados.

Por último, o conflito pela disputa da terra nesta região ocorre entre o Movimento MST e

uma empresa do ramo da citricultura. Esta última, ao se apoderar de terras públicas na região,

também está utilizando métodos já empregados anteriormente como a perseguição policial para

forjar falsos depoimentos e produção de inquéritos, e utilização dos meios de comunicações locais e

de circulação nacional como forma de incriminar o Movimento que luta para retomar as terras

públicas, enquanto não ocorre sentenciamento judicial para devolução à União das terras públicas

que hoje estão sendo utilizadas por empresas privadas.

Compreender a realidade, neste momento, dada pela disputa territorial protagonizada pelo

MST e a empresa citrícola é um dos objetos deste trabalho, deste modo a investigação propõe

entender como se posicionam estes sujeitos. É, neste sentido, que abordaremos como se dá a

evolução, a territorialização e em que contexto este agronegócio torna-se elemento de conflito.

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4. TERRITÓRIO EM DISPUTA

Abordaremos neste capítulo os conflitos gerados entre a monocultura do agronegócio

citrícola e o movimento social MST no EDR de Avaré. Também destacaremos o comportamento do

Estado e parte dos meios de comunicação na análise e divulgação dos acontecimentos referente a

disputa pelo território.

Figura 03: Imagem aérea de um dos pomares da Cutrale

Fonte: <http://www.youtube.com>. Acessado em 22/09/2010

A ilustração apresentada nesta fotografia, extraida do <http://www.youtube.com.br>

apresenta parte da origem do conflito estabelecido entre os camponeses do Movimento Social MST

contra os grileiros de terras públicas da União, referentes ao núcleo colonial Monção localizado nos

municípios de Iaras, Águas de Santa Bárbara, Boribi, Lençóis Paulistas e Agudos.

Esta fotografia da plantação de laranjas da Cutrale representa uma forma do sitema de

produção do agronegócio, a homogeneidade da produção em grande escala. Também, o objetivo

desta imagem é demonstrar o conflito latente entre os camponeses e esta empresa enfatizando a

maneira que parte dos meios de comunicação noticiam os fatos e a forma que é tratado pelo Estado,

no sentido strito senso, o poder executivo, legislativo e judiciário.

Podemos constatar nos últimos anos um crescimento exponencial da agricultura capitalista

nesta região, entre o ramo das monoculturas, sendo que a mesma se verifica com a ampliação da

citricultura. Esse processo se intensifica a partir do ano de 1995, quando as empresas citrícolas

processadoras aumentavam a formação dos pomares próprios em função do fim do contrato padrão.

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É a partir deste contexto de ampliação da agricultura capitalista que o MST chega na região

e torna-se, em função da assimetria dos objetivos dos sujeitos antagônicos na disputa pelo território,

a principal força de enfrentamento ao agronegócio.

No período entre os anos de 1995 e 1999, o MST promoveu várias ocupações de terras na

região que culminaram com o primeiro assentamento no ano de 1999. Ao conquistar o

assentamento Zumbi dos Palmares com cinquenta e quatro famílias, aumenta-se a esperança dos

trabalhadores. E no ano 2000 chega na região o acampamento Nova Canudos com mais de

quatrocentas famílias. Com este contingente de acampados, o MST organiza várias lutas na região.

As mobilizações organizadas a partir do ano de 2000 tinham o objetivo de pressionar o governo

pela execução da reforma agrária, o poder judiciário contra a morosidade da justiça e em defesa da

retomada das terras públicas.

Neste contexto, temos no período entre 1995 a 2010, segundo o DATALUTA (Banco de

Dados da Luta pela Terra), registrados vinte e três ocupações de terras no município de Iaras, oito

ocupações no município de Borebi e onze ocupações no município de Agudos. Em função destas

lutas, o assentamento Zumbi dos Palmares, que inicialmente tinha cinqüenta e quatro famílias, em

2010 passou a contar com trezentas e trinta e nove famílias, ocupando uma área de oito mil e um

hectares. Também, foi conquistado o Assentamento Nova Vida com dezenove famílias e área de

duzentos e noventa e nove hectares. No município de Borebi foram assentadas cinqüenta famílias

em uma área de novecentos e oitenta e dois hectares. No município de Agudos foram assentadas

sessenta e nove famílias em uma área de mil e três hectares.

As conquistas do Movimento Social MST vão se territorializando e, consequentemente,

acirrando os conflitos entre ocupantes ilegais e os camponeses que lutam pela retomada das terras

públicas com o objetivo de transformá-las em assentamentos de Reforma Agrária.

Neste sentido, a concentração de terras no Brasil e a grilagem de terras são temas debatidos

por vários autores que estudaram e estudam a questão agrária. Este tema está relacionado a uma

herança de uma economia colonial latifundiária e que ao longo de mais de um século de república

esta realidade não se alterou, como já analisado. Portanto, a questão agrária no Brasil e a

reivindicação que fazem os movimentos sociais de luta pela terra são motivos de execração pública

e criminalização ideológica por parte dos mais influentes meios de comunicação brasileiros.

A primeira ocupação da fazenda Santo Henrique, onde atualmente está a plantação de

laranja da Cutrale, efetuada pelo MST, aconteceu no ano de 2001 e permaneceu até meados do ano

de 2003 aguardando uma decisão judicial ou uma possível negociação com o INCRA. Neste

interim, o INCRA concluiu não ser possível fazer a desapropriação baseada pelo interesse social por

que os documentos apresentados pelo supostos proprietários não tinham origem confiável em sua

cadeia dominial. Em função disso, o INCRA está aguardando até os dias atuais decisão com

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processo em andamento na justiça federal de Ourinhos. Todavia, no ano de 2005, a empresa Cutrale

comprou a referida fazenda dos supostos proprietários João Emiliano Sampaio e Maria Emiliano

Sampaio20 e plantou laranja em toda sua extensão, totalizando uma área de 2.701 hectares. Desta

maneira estabelece a disputa pelo território entre o MST e a empresa. Depois de confirmado pelo

INCRA que das cinco transcrições referentes à matrícula 4.118 da Fazenda Santo Henrique, três

delas reportam ao núcleo colonial Monção, o MST, pela segunda vez, ocupou aquela fazenda para

denunciar a apropriação de terras públicas por uma grande corporação empresarial do setor do

agronegócio.

No ano de 2008 com a presença de integrantes do Movimento de todas as regiões do Estado

de São Paulo onde o MST está organizado, pela terceira vez acontece a ocupação da Fazenda Santo

Henrique. A ocupação durou 09 dias e durante este período o Incra contesta a competência da

justiça comum e pede a transferência do processo de reintegração de posse para a justiça federal,

por se tratar de área da União, o que foi negado pela justiça comum na Comarcas de Lençóis

Paulista.

Novamente no ano de 2009 o MST volta a ocupar a referida fazenda com o objetivo de

denunciar a morosidade da justiça e a apropriação indevida de terras públicas por empresa privada.

Compreende-se que o conflito de interesses está para além da dicotomia entre camponeses X

latifundiário, sendo que parte dos meios de comunicação de maior circulação e audiencia do Brasil

noticiam os fatos de forma parcial sem abordar a complexidade de suas origens e insinuando

práticas criminosas. Como reportagem vinculada no Telejornal Bom Dia Brasil e comentada pelo

Jornalista Alexandre Garcia e transcrita por Caetano De´Carli no artigo intitulado “O caso das

laranjas e a questão agrária brasileira no século XXI: A invenção midiática de um desastre

nacional”.

A cena desse trator derrubando milhares de pés de laranjeiras é chocante. A laranja e seu suco são riquezas do país que pesam na balança comercial. Ajudam a estabilidade da moeda. E beneficiam em última análise o bolso do povo. O crime que está se vendo aí não é um crime contra o proprietário. É um crime contra o país. É de se perguntar quem comete este crime motorizado se ele não conta com a omissão, com o crime de responsabilidade, de quem insiste em classificar estes crimes como manifestações sociais. E não agem para coibir e punir quem ataca um dos setores que o país mais pode se orgulhar. Aquele que produz alimentos que gera riqueza para todos [...] eles não tem a lei na mão. É que a lei não age. Se eu entrar lá e fizer a mesma coisa com o trator vão me prender e me colocar numa camisa de força. Agora se no lugar desta camisa de força eu estiver vestindo uma camisa vermelha do MST não vai me acontecer nada porque ali eu sou movimento social. Sem personalidade jurídica, sem responsabilidade. (2010, p. 11)

Diante da divulgação massiva em todos os programas jornalísticos da Rede Globo, o Estado

sentiu-se na necessidade de dar uma resposta a sociedade. Em consequência desta divulgação o

20 Informação obtida junto ao Incra em processos de negociação por representantes do MST

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poder executivo, nas entrevistas do Presidente da República, do Ministro do Desenvolvimento

Agrário e do Ministro da Justiça condenaram, de forma veemente, a ação do MST, mas não fizeram

nenhuma referência para denunciar a empresa por ocupar terras públicas.

Neste contexto, a bancada ruralista no Congresso Nacional, capitaneada pelos deputados

Ronaldo Caiado, Onix Lorenzoni, Valdir Collato e Abelardo Lupion entre outros e com os

senadores Álvaro Dias, Cátia Abreu e outros protocolaram e reabriram a CPMI da Terra para

investigar o MST como forma de intimidar o Movimento e, ao mesmo tempo, chantagear o governo

que havia prometido regulamentar os índices de produtividade.

Os índices de produtividade correspondem à quantificação produtiva da agricultura

brasileira, sendo que a última atualização foi realizada no ano de 1976. Assim, pressupomos que,

com o aumento das técnicas agrícolas, a produtividade tenha aumentado ao longo destes 35 anos.

A correção dos índices de produtividade aumentaria sobremaneira o estoque de terras

destinadas a Reforma Agrária, sendo que o critério de desapropriação é baseado nas relações de

trabalho, na função social da terra e no índice de produtividade.

Em função da divulgação midiática dos adversários da Reforma Agrária, reabriram a CPMI

da Terra para investigar o MST e, consequentemente, inviabilizar o debate sobre a atualização dos

índices de produtividade.

Do ponto de vista do poder judiciário, o Ministério Público da Comarca de Lençóis Paulistas

ofereceu denúncia a mais de cinquenta pessoas e o judiciário determinou a prisão temporária que

após três dias se transformou em preventiva contra 22 membros do MST. Tais procedimentos

caracterizam a criminalização do Movimento através da omissão do poder executivo, da ação

investigadora do poder legislativo e da ação criminalizadora do poder judiciário.

Figura 04: Porteira da Sede da Fazenda Santo Henrique

Fonte: <http://www.youtube.com> Acessado em 22/09/2010

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Neste sentido, os conflitos gerados entre o Movimento Social MST e a empresa Cutrale se

tornaram inconciliáveis diante da assimetria de seus objetivos, pois enquanto a empresa concentra-

se na possibilidade de expansão de seus rendimentos, através da apropriação de terras públicas, os

camponeses reivindicam a retomada destas terras para a realização da reforma agrária que

possibilite sua reprodução.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

O presente trabalho teve como objetivo diagnosticar o avanço do agronegócio citrícola no

EDR de Avaré. Entender a dinâmica da evolução desta monocultura, sua territorialização e

conformação sócio espacial resultante desta expansão.

Contextualizamos de maneira seletiva as interpretações de diversos autores que analisaram e

analisam o desenvolvimento do capitalismo no campo brasileiro.

Afirmamos que a escolha destes autores foi no sentido de apresentar diferentes pressupostos

teóricos, mas também posições politicas explicitadas em relação a questão agrária.

Analisamos as lutas pela terra no Brasil, a partir das lutas messiânicas, canudos e contestado.

Em outro período, a formação das ligas camponesas e a formação do sindicalismo rural. Por último

a formação do MST a nivel nacional, sua formação no Estado de São Paulo e sua atuação na região

de Iaras, municipio que compoe o EDR de Avaré, obejto de estudo do presente trabalho.

Entre as preocupações abordadas por este trabalho, está a ocupação das terras públicas da

União por empresas privadas. Em função dessas ocupações existe uma disputa pelo território

materializada entre o Movimento Social - MST e a empresa Cutrale.

Esta disputa territorial tem provocado notícias nos meios de comunicação mais influentes do

país. Por isso, aumenta o acirramento do conflito onde as contradições do sistema de produção do

agronegócio e do sistema de produção camponesa apresentam identidades de classe. Desta maneira

a medida que os interesses das grandes corporações do setor citrícola exigem a territorialização em

novas áreas para produção e reprodução do capital de forma permanente, os interesses antagônicos

dos camponeses, representados pelo MST, baseados na democratização da propriedade da terra, no

combate ao uso dos agrotóxicos, na defesa do meio ambiente e na produção de policulturas

demonstram as diferentes concepções do uso do território. A partir da contradição dos interesses

que, os sujeitos sociais se organizam e expressam os objetivos individuais e coletivos dos seus

membros.

Acreditamos que ao analisar as formas de produção do agronegócio e a atuação do MST,

concluimos que os conflitos de classes e as correlações de forças políticas configuram as dinâmicas

socio espaciais e territoriais.

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