O artesão que expõe peças de bambu e escreve poemas · As plantas são coletadas em um terre-...

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4 vida, experiência, negócios PERSONAGENS Paulo Roberto Correa Eidt tem 61 anos e faz arte com bambu há 35. O corte ocorre apenas quando a lua está na fase minguante. “Eu corto só nessa época, por- que daí não caruncha, o bambu não pega cupim”, explica detalhadamente o artista. As plantas são coletadas em um terre- no no bairro Teresópolis, em Porto Alegre. Paulo enche o caminhão com material e vai para casa criar suas peças. No início, “Arte do Vagabundo” era como nomeava o seu trabalho. Vagabundo, porque sofria muito preconceito das pessoas por vender a sua arte, por viver de arte. Resolveu, então, utilizar a crítica para divulgar suas invenções. Conhecido como Queixinho, ele faz ca- deiras, cortinas, vasos, lustres, luminárias, entre outros objetos. Paulo expõe perto da entrada da Feira do Livro de Porto Alegre, na rua Sete de Setembro, de segunda a sexta-feira, praticamente o dia inteiro. “Eu não paro de trabalhar. Queria colocar minhas artes na internet, mas não tenho tempo.” Quando não tem Feira do Livro, vende suas obras na Rua da Praia. Paulo, que aprendeu marcenaria com seu pai, achou interessante quando conheceu cadeiras feitas de madeira e pensou em criar com bambu. “Minha escola foi lá em Canela”, lembra ele, que também vendia muito na cidade. “Quando eu colocava minhas artes nas feiras, arrebentava a boca do balão”, conta, com muitas risadas. O gasto com a matéria-prima é baixo. O essencial, que é o bambu, vem da natureza, e ele apenas gasta com a gasolina do caminhão para transportar o que corta. Os arames usados para montar as peças custam cerca de R$ 15,00 o quilo. O gás, utilizado no maçarico para queimar o bambu, lhe sai R$ 70,00, e dura cerca de três meses. O quilo do verniz, R$ 12,00. Com esses materiais, Paulo pro- duz de 50 a 60 cadeiras por mês. O lucro, quando consegue vender muitas peças, chega a R$ 2,5 mil. O artista viajou por muitos lugares: Cassino, Lajeado, Estrela, Canasvieiras e outras cidades. Morou em Santa Cruz do Sul, onde teve um relacio- namento e um ilho, Lucas de Melo Eidt. No dia 2 de fevereiro deste ano, o menino morreu devido a um tumor no cérebro. Quando Lucas icou doente, Paulo resolveu deixar o trabalho de lado. Por cerca de dois anos, não produziu nenhum material. Quis icar ao lado do ilho. Paulo, que sempre sustentou a casa e a família com as artes que vendia, resolveu voltar a trabalhar após perder Lucas e se separar. Se mudou para Porto Alegre, onde mora em uma casa alugada. “Meu sonho agora é juntar dinheiro e ajeitar o lugar onde meu ilho está enterrado”, airma. O senhor de cabelos brancos, alto e com quatro dedos da mão esquerda pela metade, muito romântico e brincalhão - como ele mesmo se descreve - também escreve poemas. Começou a criar textos quando teve sua primeira decepção amo- rosa, e foi a solução que achou para desa- bafar. “Hoje estou sozinho, mas sinto falta de uma companhia. Só que não tenho mais idade para me machucar”, contou o arte- são. Quando morou em Canela, inscreveu seus poemas e ganhou o primeiro lugar do prêmio Laje de Pedra por cinco anos con- secutivos. Os amputa balho, e uma au dedos c um pan fez um diz não artes de Nes pointer irá ensi bambu para um planos der sua acompa de bam O p ra, é co R$ 80,0 custa R Lustre folhas d parecem R$ 150 importâ pode m O artesão que expõe peças de bambu e escreve poemas A história de Paulo Eidt é de superação em diversos aspectos BRUNA FERNANDES UniRitter Paulo Roberto Correa Eidt tem 61 anos e faz arte com bambu há 35; quando a Feira do Livro termina, ele sai da Sete de Setembro e expõe seus produtos na Rua da Praia A E S C D S Q P M F P S C C D

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vida, experiência, negóciosPERSONAGENS

Paulo Roberto Correa Eidt tem 61 anos e faz arte com bambu há 35. O corte ocorre apenas quando a lua está na fase minguante. “Eu corto só nessa época, por-que daí não caruncha, o bambu não pega cupim”, explica detalhadamente o artista.

As plantas são coletadas em um terre-no no bairro Teresópolis, em Porto Alegre. Paulo enche o caminhão com material e vai para casa criar suas peças. No início, “Arte do Vagabundo” era como nomeava o seu trabalho. Vagabundo, porque sofria muito preconceito das pessoas por vender a sua arte, por viver de arte. Resolveu, então, utilizar a crítica para divulgar suas invenções.

Conhecido como Queixinho, ele faz ca-deiras, cortinas, vasos, lustres, luminárias, entre outros objetos. Paulo expõe perto da entrada da Feira do Livro de Porto Alegre, na rua Sete de Setembro, de segunda a sexta-feira, praticamente o dia inteiro.

“Eu não paro de trabalhar. Queria colocar minhas artes na internet, mas não tenho tempo.”

Quando não tem Feira do Livro, vende suas obras na Rua da Praia. Paulo, que aprendeu marcenaria com seu pai, achou interessante quando conheceu cadeiras feitas de madeira e pensou em criar com bambu. “Minha escola foi lá em Canela”, lembra ele, que também vendia muito na cidade.

“Quando eu colocava minhas artes nas feiras, arrebentava a boca do balão”, conta, com muitas risadas. O gasto com a matéria-prima é baixo. O essencial, que é o bambu, vem da natureza, e ele apenas gasta com a gasolina do caminhão para transportar o que corta. Os arames usados para montar as peças custam cerca de R$ 15,00 o quilo.

O gás, utilizado no maçarico para queimar o bambu, lhe sai R$ 70,00, e dura cerca de três meses. O quilo do verniz, R$ 12,00. Com esses materiais, Paulo pro-duz de 50 a 60 cadeiras por mês. O lucro, quando consegue vender muitas peças, chega a R$ 2,5 mil. O artista viajou por muitos lugares: Cassino, Lajeado, Estrela, Canasvieiras e outras cidades. Morou em Santa Cruz do Sul, onde teve um relacio-namento e um ilho, Lucas de Melo Eidt.

No dia 2 de fevereiro deste ano, o menino morreu devido a um tumor no cérebro. Quando Lucas icou doente, Paulo resolveu deixar o trabalho de lado. Por cerca de dois anos, não produziu nenhum material. Quis icar ao lado do ilho.

Paulo, que sempre sustentou a casa e a família com as artes que vendia, resolveu voltar a trabalhar após perder Lucas e se separar. Se mudou para Porto Alegre, onde mora em uma casa alugada. “Meu sonho agora é juntar dinheiro e ajeitar o lugar onde meu ilho está enterrado”, airma.

O senhor de cabelos brancos, alto e com quatro dedos da mão esquerda pela metade, muito romântico e brincalhão - como ele mesmo se descreve - também escreve poemas. Começou a criar textos quando teve sua primeira decepção amo-rosa, e foi a solução que achou para desa-bafar.

“Hoje estou sozinho, mas sinto falta de uma companhia. Só que não tenho mais idade para me machucar”, contou o arte-são. Quando morou em Canela, inscreveu seus poemas e ganhou o primeiro lugar do prêmio Laje de Pedra por cinco anos con-secutivos.

Os dedos da mão esquerda foram amputados devido um acidente de tra-balho, em 1981, quando trabalhava em uma autopeça. “A prensa esmagou e meus dedos caíram na hora. Enrolei a mão em um pano e fui para o hospital. O médico fez um ótimo trabalho”, lembra Paulo, que diz não ter nenhum problema em fazer as artes devido a sua condição.

Neste ano, expôs suas artes na Ex-pointer e ganhou um segundo trabalho: irá ensinar professoras a criar peças com bambu. Viajará em março do ano que vem para uma cidade no interior do Estado. Os planos para conhecer novos lugares e ven-der suas peças são muitos. O sonho que o acompanha é de morar em uma casa toda de bambu, feita por ele mesmo, claro.

O preço dos itens variam. Para a cadei-ra, é cobrado R$ 100,00 (se levar duas, sai R$ 80,00 cada). A cadeira espreguiçadeira custa R$ 250,00. Cortina, R$ 200,00. Lustre (feito de bambu, galhos secos, folhas de árvore e “casa de caramujo” - que parecem conchas), R$ 150,00. Luminária, R$ 150,00. Vasos e tochas, R$ 30,00. A importância da arte na sua vida não se pode mensurar.

O artesão que expõe peças de bambu e escreve poemasA história de Paulo Eidt é de superação em diversos aspectos

BRUNA FERNANDESUniRitter

Paulo Roberto Correa Eidt tem 61 anos e faz arte com bambu há 35; quando a Feira do Livro termina, ele sai da Sete de Setembro e expõe seus produtos na Rua da Praia

Arte Eu QueroEu posso Eu faço arteSou artesão gaúchoCom muito orgulhoDesta Terra onde o MinuanoSopra tão forteQuanto o amorPela arteMeu nome é minha marcaFaço as coisas boasPara decorar seus laresSe tiveres que tratarCom um artesão, primeiroConsulte a experiênciaDepois a razão

Poema escrito por Paulo Eidt

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5Jornal do Comércio | Porto Alegre, Quinta-feira, 10 de novembro de 2016

Os dedos da mão esquerda foram amputados devido um acidente de tra-balho, em 1981, quando trabalhava em uma autopeça. “A prensa esmagou e meus dedos caíram na hora. Enrolei a mão em um pano e fui para o hospital. O médico fez um ótimo trabalho”, lembra Paulo, que diz não ter nenhum problema em fazer as artes devido a sua condição.

Neste ano, expôs suas artes na Ex-pointer e ganhou um segundo trabalho: irá ensinar professoras a criar peças com bambu. Viajará em março do ano que vem para uma cidade no interior do Estado. Os planos para conhecer novos lugares e ven-der suas peças são muitos. O sonho que o acompanha é de morar em uma casa toda de bambu, feita por ele mesmo, claro.

O preço dos itens variam. Para a cadei-ra, é cobrado R$ 100,00 (se levar duas, sai R$ 80,00 cada). A cadeira espreguiçadeira custa R$ 250,00. Cortina, R$ 200,00. Lustre (feito de bambu, galhos secos, folhas de árvore e “casa de caramujo” - que parecem conchas), R$ 150,00. Luminária, R$ 150,00. Vasos e tochas, R$ 30,00. A importância da arte na sua vida não se pode mensurar.

BRUNA FERNANDES/ESPECIAL/JC

A artista argentina Anabella López participou da Feira do Livro no dia 31 de outubro, em uma agenda voltada ao público infantil, juvenil e docente. Na atividade, contou a história de sua obra vencedora do prêmio Jabuti de 2015 na categoria Ilustração Infantil, A Força da Palmeira. No ano passado, Ana-bella virou uma referência em empreendedorismo no ramo, ao fundar, em conjunto com a ilustradora brasileira Rosinha Campos, a Usina de Imagens, no Recife.

O projeto é o primeiro curso de formação de ilustradores do Brasil, em que Anabella acumula as funções de professora e de coordenadora.

A artista é natural de Buenos

Aires, ilha de pais separados e de família simples. Sua mãe era faxineira e seu pai, comerciante.

A partir de suas notas e do rótulo de boa aluna, a jovem era tida como uma “esperança da família”, mas a escolha pela faculdade de Design Gráico teve um baque negativo em casa inicialmente.

Para cursar a faculdade, pre-cisou ajudar na renda familiar. Trabalhava oito horas por dia e, à noite, frequentava a Universi-dade de Buenos Aires.

Quando questionada sobre as razões pelas quais seguiu em frente, a autora diz que “tinha a certeza de que ia chegar onde queria”. Desde o início de sua carreira no mundo gráico, Anabella atingiu conquistas pes-soais.

Através da indicação de uma professora, conseguiu um em-

prego numa das maiores e mais concorridas agências de design da Argentina.

Mesmo com pouco tempo para estudar, logo após estar formada, entrou para o meio acadêmico como docente, aos 22 anos, na mesma universida-de onde havia estudado. A ilus-tradora airma que o essencial para os artistas alcançarem seus objetivos é criatividade, força e trabalho.

“Criatividade é o que salva a América Latina. Procurar uma outra solução, sair pela tangente. Depois, força. Muita força. Acreditar no que se quer fazer e se manter irme. E, por último, trabalho. Eu não acre-dito tanto no talento. Você tem que estudar, ler, não se pode ser artista sem ler sempre o dobro”, considera ela.

Sua vinda para o Brasil

Artista argentina se destaca no ramo da ilustraçãoARTHUR GROHSUFPel

Arte Eu QueroEu posso Eu faço arteSou artesão gaúchoCom muito orgulhoDesta Terra onde o MinuanoSopra tão forteQuanto o amorPela arteMeu nome é minha marcaFaço as coisas boasPara decorar seus laresSe tiveres que tratarCom um artesão, primeiroConsulte a experiênciaDepois a razão

Poema escrito por Paulo Eidt

Quem passa pela Praça da Alfândega nota a presença das bancas de artesãos, localizadas na rua Cassiano Nascimento. São 42 estandes, que funcionam das 10h às 18h. Em época de Feira do Livro, os expositores convivem com as tendas de li-vros.

O evento gera circulação de um público diferente. Este fato é visto como positivo para os co-merciantes. A artesã e presiden-te da Associação dos Artesãos da Praça da Alfândega (Artefan), Leci Beatriz Soares, airma que a Feira do Livro aproxima os expositores das pessoas que, em dias normais, não frequen-tariam os quiosques. “A gente acaba conquistando um público para o ano todo, que pode não levar nada durante a feira, mas que tende a voltar em outros momentos”, ressalta Leci, que trabalha na praça desde 1986.

Antes de se alocarem em

deinitivo na rua Cassiano Nas-cimento, os artesãos ocuparam diversos espaços ao redor da Praça da Alfândega. Era preciso que se deslocassem no período em que a Feira do Livro ocorria. Nesta época, os estandes em que trabalhavam eram precá-rios, com uma estrutura coberta por lonas. Em seu estande, entre roupas personalizadas com a técnica tie dye, incensos, pedras e iltros dos sonhos, Leci comemora esta conquista. “É um sonho realizado. Saímos da favela para um condomínio”, brinca a artesã. Ela lembra, po-rém, que a crise econômica em que vive o Brasil também relete nas vendas dos expositores da Alfândega. Além da diminuição do espaço físico da própria Feira do Livro, ela sentiu uma redução de cerca de 50% de circulação de público durante o evento.

O artesão Rogério Pereira, que comercializa artigos de tradição gaúcha, concorda com Leci, mas diz que a Feira do Livro sempre gera expectativa

Circulação de pessoas tem impacto positivo para artesãos da região

CARLA ZANETT/ESPECIAL/JC

Rogério Pereira produz cuias de chimarrão personalizadas

otimista para todos que ganham a vida na praça. Entre os objetos oferecidos por Rogério estão cuias de chimarrão, mateiras, garrafas térmicas, além de chaveiros, imãs de geladeira e gauchinhos para enfeitar o chimarrão. “Tenho produtos que agradam tanto a população local quanto a de fora”, garante Rogério. Filho de artesãos, ele

trabalha na praça há 15 anos.“Durante a feira, em de-

terminados dias, como os ins de semana, as minhas vendas costumam dobrar, o meu lucro chega a 100%”, comemora o ex-positor. Por meio de sua banca na Alfândega, o artesão também irma parcerias com empresas e lojas. “Tenho encomendas de produtos diferenciados”, destaca.

LUIS VENTURA/DIVULGAÇÃO/JC

Anabella López criou a Usina das Imagens, no Recife

começou com trabalhos de ilus-tração através da editora Pallas, a qual havia chamado Anabella para trabalhar na obra A Menina Que Perdeu As Cores, em 2013. A partir daí, ela começou a expandir sua experiência como ilustradora nas terras brasileiras e hoje conta com mais de 15 participações em obras com suas ilustrações. A Força da Palmeira foi sua primeira totalmente auto-ral no Brasil.

CARLA ZANETTUlbra