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NOVOS USOS PARA GRANDES ÁREAS INDUSTRIAIS: PATRIMÔNIO HISTÓRICO E CONTEXTO CONTEMPORÂNEO PEREIRA, EDUARDO CARLOS 1. Escritório de arquitetura Eduardo Carlos Pereira Rua Francisco Carlos Pereira Netto, 12, Jundiaí SP. CEP 13.215-465 [email protected] RESUMO A CICA, Companhia Industrial de Conservas Alimentícias, de Jundiaí SP, foi considerada o maior conjunto industrial da América Latina, chegando a ter 167 mil metros quadrados de área construída e influenciando profundamente o desenvolvimento da cidade, em seus aspectos econômicos, sociais e de cultura de consumo em massa. A empresa foi fundada em 1941 por imigrantes italianos que identificaram a necessidade de produzir aqui alimentos característicos da Itália. As famílias fundadoras, Bonfiglioli, Messina e Guerrazzi, com capital e interesse para expandir a indústria, em 1951, contaram com o parentesco de Vasco Venchiarutti, prefeito na época e arquiteto de importantes obras na cidade, para a modernização da empresa. Essas influências em rede, como as oligarquias que aconteceram na implantação da ferrovia no estado de São Paulo, em 1887 (Pereira, 2007), garantiram o êxito e expansão das vendas para toda a América Latina. O relevo do sítio, propício para a instalação de indústria com galpões horizontalizados, contava com o benefício das águas do Rio Guapeva, com nascente na Serra do Japi (preservada pelo CONDEPHAAT e UNESCO). Esse conjunto de fatores era essencial na época para a industrialização de alimentos e consequente despejo de resíduos. Sua localização estratégica, a 3,0 km da estação ferroviária e a 2,3 km da rodovia Anhanguera, priorizava o novo sistema rodovialista que se alavancava juntamente com a crescente indústria do transporte rodoviário, em substituição ao parque ferroviário e desenvolvimentista de Jundiaí. O remanescente complexo industrial em processo de estudo histórico e técnico é composto por 10 galpões, com 62.287,78 metros quadrados de área construída. A fachada principal, voltada para a Rua Cica, possui 374,00 metros de extensão. A compatibilização dos novos usos do empreendimento comercial pretendido, preservando a história dos edifícios, é um esforço permanente. O objetivo é encontrar o melhor uso contemporâneo para esses edifícios, recuperar a vida dos galpões, da economia e conservar o patrimônio, resgatando o sentimento de pertencimento da CICA nos jundiaienses, assim como tiveram os milhares de funcionários que passaram por lá. Pretende-se apresentar nesse seminário o procedimento com todo o roteiro e os meios do levantamento técnico/histórico, de identificação dos materiais originais e das patologias dos edifícios. Os métodos para pesquisa são os mesmos adotados em 1977, “Casas Rurais de Imigrantes Italianos”, atualizados para os nossos dias, demonstrando um excelente e seguro caminho para essa etapa de pesquisa histórica, para se obter, através de consultas aos documentos, fotografias, projetos e depoimentos: o registro da memória. Arquivos estudados: Coleção de periódicos de Vasco Venchiarutti, Centro de Memória de Jundiaí, processos antigos na Secretaria de Obras, depoimentos do arquiteto Luciano Christi. O resultado do trabalho é um importante registro documental, métrico,

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NOVOS USOS PARA GRANDES ÁREAS INDUSTRIAIS: PATRIMÔNIO HISTÓRICO E CONTEXTO CONTEMPORÂNEO

PEREIRA, EDUARDO CARLOS

1. Escritório de arquitetura Eduardo Carlos Pereira

Rua Francisco Carlos Pereira Netto, 12, Jundiaí – SP. CEP 13.215-465 [email protected]

RESUMO A CICA, Companhia Industrial de Conservas Alimentícias, de Jundiaí – SP, foi considerada o maior conjunto industrial da América Latina, chegando a ter 167 mil metros quadrados de área construída e influenciando profundamente o desenvolvimento da cidade, em seus aspectos econômicos, sociais e de cultura de consumo em massa. A empresa foi fundada em 1941 por imigrantes italianos que identificaram a necessidade de produzir aqui alimentos característicos da Itália. As famílias fundadoras, Bonfiglioli, Messina e Guerrazzi, com capital e interesse para expandir a indústria, em 1951, contaram com o parentesco de Vasco Venchiarutti, prefeito na época e arquiteto de importantes obras na cidade, para a modernização da empresa. Essas influências em rede, como as oligarquias que aconteceram na implantação da ferrovia no estado de São Paulo, em 1887 (Pereira, 2007), garantiram o êxito e expansão das vendas para toda a América Latina. O relevo do sítio, propício para a instalação de indústria com galpões horizontalizados, contava com o benefício das águas do Rio Guapeva, com nascente na Serra do Japi (preservada pelo CONDEPHAAT e UNESCO). Esse conjunto de fatores era essencial na época para a industrialização de alimentos e consequente despejo de resíduos. Sua localização estratégica, a 3,0 km da estação ferroviária e a 2,3 km da rodovia Anhanguera, priorizava o novo sistema rodovialista que se alavancava juntamente com a crescente indústria do transporte rodoviário, em substituição ao parque ferroviário e desenvolvimentista de Jundiaí. O remanescente complexo industrial em processo de estudo histórico e técnico é composto por 10 galpões, com 62.287,78 metros quadrados de área construída. A fachada principal, voltada para a Rua Cica, possui 374,00 metros de extensão. A compatibilização dos novos usos do empreendimento comercial pretendido, preservando a história dos edifícios, é um esforço permanente. O objetivo é encontrar o melhor uso contemporâneo para esses edifícios, recuperar a vida dos galpões, da economia e conservar o patrimônio, resgatando o sentimento de pertencimento da CICA nos jundiaienses, assim como tiveram os milhares de funcionários que passaram por lá. Pretende-se apresentar nesse seminário o procedimento com todo o roteiro e os meios do levantamento técnico/histórico, de identificação dos materiais originais e das patologias dos edifícios. Os métodos para pesquisa são os mesmos adotados em 1977, “Casas Rurais de Imigrantes Italianos”, atualizados para os nossos dias, demonstrando um excelente e seguro caminho para essa etapa de pesquisa histórica, para se obter, através de consultas aos documentos, fotografias, projetos e depoimentos: o registro da memória. Arquivos estudados: Coleção de periódicos de Vasco Venchiarutti, Centro de Memória de Jundiaí, processos antigos na Secretaria de Obras, depoimentos do arquiteto Luciano Christi. O resultado do trabalho é um importante registro documental, métrico,

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histórico e fotográfico, que permitirá estudos mais amplos nas áreas da produção e evolução da indústria alimentícia, agro indústria, arquitetura industrial, urbanismo, história da inovação, planejamento em rede e imigração italiana. Até o momento foram produzidas diversas pranchas de levantamento cadastral de tamanhos variados, com relatório de análise detalhado, parte desse trabalho apresentado no Conselho de Patrimônio Histórico de Jundiaí.

Palavras-chave: Arquitetura industrial; Cica; Patrimônio industrial moderno.

Introdução

O contexto da evolução urbana de São Paulo contou com a imigração de italianos (1887)

que habitaram a nova terra e se tornaram brasileiros. As ferrovias existentes na época

instrumentalizaram a implantação estratégica dos Núcleos Coloniais, a qual Jundiaí estava

inserida (PEREIRA, 2007).

A cidade, localizada a 45 km da capital São Paulo, recebeu alto número de imigrantes e

desenvolveu trabalho livre com colonização espontânea e redução do preço dos transportes.

Impulsionou a economia voltada à agricultura e os processos industriais. Foi o local ideal

para o investimento de empreendedores da época em loteamentos e fundação de

empresas.

Entre tantas reflexões acadêmicas, farto material de referência se dispõe para um trabalho

de identificação de bem patrimonial moderno inserido exemplarmente no que foi a expansão

e implantação rodovialista de novas indústrias em São Paulo nas décadas de 1940 e 1950.

A Via Anhanguera oferecia novos lugares, em terrenos ideais para a instalação e expansão

de modernas indústrias.

A CICA, Companhia Industrial de Conservas Alimentícias, foi instalada em 1941, em

Jundiaí, por imigrantes italianos, que sentiram a necessidade de produzir alimentos

tradicionais da Itália, dando origem a essa grande empresa voltada basicamente ao extrato

de tomate. As famílias fundadoras contaram com o parentesco de Vasco Venchiarutti (1920-

1980), prefeito na época e arquiteto de importantes obras na cidade, para a modernização

da empresa, que havia sido inicialmente projetada pelo pai de Vasco, Giacomo Venchiarutti

(1894-1976).

A proximidade da CICA com a rodovia, duplicada em 1948, foi um importante fator de

desenvolvimento e logístico, de acordo com a nova ordem de fazer a distribuição dos

produtos por rodovias substituindo o transporte ferroviário.

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Seguindo o desenvolvimento industrial e econômico, a CICA foi considerada o maior

conjunto industrial da América Latina, chegando a ter 167 mil metros quadrados de área

construída e mais de 3500 funcionários.

O relevo do sítio, propício para a instalação de indústria com galpões horizontalizados,

contava com o benefício das águas do Rio Guapeva, com nascente na Serra do Japi. O rio

corta ao meio a área industrial e serviu para todas as funções necessárias para a produção,

no uso para abastecimento e como despejo dos resíduos em suas águas.

A implantação da CICA é distribuída por grandes galpões industriais horizontalizados, que

totalizam atualmente 62.287,78 m² dispostos em um terreno de 96.482,55m². As áreas dos

galpões variam de 2.183,75 a 10.652,65 metros quadrados. A fachada principal, voltada

para a Rua Cica, possui 374,00 metros de extensão.

Figura 1 - Implantação da CICA no contexto urbano de Jundiaí

Fonte: Acervo do Autor, 2014

O complexo agroindustrial CICA é patrimônio histórico moderno e está em estudo para

tombamento parcial pelo município, qualquer intervenção a ser realizada nos edifícios deve

ser aprovada pelo COMPAC, Conselho Municipal do Patrimônio Cultural de Jundiaí.

As recentes publicações sobre patrimônio industrial em São Paulo, artigos, críticas e teses

mostraram contundentemente o panorama do mercado imobiliário diante do mau uso do

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“bem patrimonial industrial”, da ocupação abusiva de empreendimentos que sobrepõem

interesses econômicos individuais aos valores culturais dessas áreas industriais sucateadas.

Na Via Dutra isso também acontece, é celebre e atrativa a fábrica Duchen, com projeto de

Oscar Niemeyer. Desprotegida, foi irremediavelmente demolida.

Rufinoni (2013) afirma que o fato de sítios industriais possuírem extensas áreas, por um

lado, dificulta sua apreensão sobre as especificidades de conjunto e, por outro, aguça o

interesse na implementação de novas construções. Confirmamos que, atualmente, o

remanescente industrial da CICA está sem uso, ocupando considerável espaço

instransponível e sem atividades, impedindo a dinâmica do tecido urbano de Jundiaí (o que

traz prejuízos sociais e financeiros). Sua estrutura obsolescente apresenta crescentes

patologias construtivas devido à falta de manutenção das antigas instalações e traduz o

abandono ao patrimônio histórico/cultural e o progressivo esquecimento do local pela

população, em especial pelas novas gerações.

Rem Koolhaas (2015) fala sobre o seu projeto do Museu Prada, em Milão, de 2015, com

ironia, “o enésimo projeto em fábricas abandonadas”. Lina Bo Bardi afirmou em visita

técnica à obra do SESC Pompéia, nos anos 80, que: “se continuarem a fazer o que ela fez,

a cidade de São Paulo ganharia um monte de cacarecos”. Ambos, cada um em seu tempo,

desqualificam a continuidade de projetos para novos usos em indústrias obsolescentes,

porém acreditamos que é correto e desejável dar uso responsável para essas estruturas,

que fazem parte da cidade e contam a história social e econômica.

As demolições devem ser justificadas, e outros paradigmas atendidos. As questões

ambientais estão em patamar tão importante como as de patrimônio cultural. O Le Monde

(2012, p.16) trata disso com alarde:

“Sempre que possível, vale mil vezes mais a pena reabilitar do que demolir. Em termos de

emissão de gases, não há a menor dúvida disso” – Holger Wallbaum, professor da Escola

Politécnica de Zurique.

Assim, Philippe Bovet continua a matéria:

A demolição-reconstrução muitas vezes parece o único horizonte das políticas urbanas. Mas arrasar quarteirões sem considerar sua renovação gera tantos problemas sociais como ambientais [...] A destruição de um imóvel é questionável por duas razões. Em primeiro lugar, as pessoas sentem-se ligadas à identidade de seu bairro, preferindo mudanças progressivas a transformações radicais. Em segundo lugar, a demolição acarreta o desaparecimento de um capital de “energia incorporada” quase comparável ao estoque de gás carbônico perdido num incêndio florestal.

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Este trabalho aborda esses problemas complexos e busca um caminho para a manutenção

do bem.

Preservação e Novo Uso

O objetivo é encontrar o melhor uso contemporâneo para esses edifícios, adaptando-os às

novas atividades econômicas, recuperar a vida dos galpões, reintroduzindo essa área na

cidade, aquecer a economia com a geração de empregos. Conservar o patrimônio. Resgatar

o sentimento de pertencimento da CICA nos jundiaienses, assim como tiveram os milhares

de funcionários que passaram por lá. Assim priorizamos a identificação dos valores culturais

e arquitetônicos do complexo industrial.

Normatizar a intervenção arquitetônica através de plano diretor específico para a área, com

diferentes graus de intervenção, visando tornar a área ativa e benéfica para a população. O

plano irá auxiliar o Conselho Municipal de Patrimônio Cultural – COMPAC - e a Secretaria

de Planejamento de Jundiaí.

Esse trabalho mostra o procedimento científico com o roteiro do levantamento

técnico/histórico de identificação dos materiais originais e das patologias dos edifícios,

sejam por meio de relatórios, desenhos, documentos e fotografias que viabilizarão a

eficiência dos projetos e resultados.

O projeto deve se integrar ao Parque Guapeva, da Prefeitura Municipal de Jundiaí, trazendo

à sua área os conceitos e usos do parque, assim como a recuperação do Rio Guapeva.

É necessário o diálogo franco entre o novo e o existente, deixando claramente perceptível

suas diferenças, sem perder a unidade (ICOMOS, 1964).

Procedimentos

Levantamento histórico

Os métodos para pesquisa são os mesmos adotados em “Casas Rurais de Imigrantes

Italianos” (PEREIRA, 1977), atualizados para os nossos dias, demonstrando um excelente e

seguro caminho para essa etapa de pesquisa histórica, através de consultas aos

documentos, fotografias, projetos e depoimentos: o registro da memória. Consistiu em

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estudar a coleção de periódicos de Vasco Venchiarutti, consultar o Centro de Memória de

Jundiaí, processos antigos nos arquivos mortos da Prefeitura Municipal de Jundiaí e

depoimentos de pessoas vivas que tenham a memória do lugar.

Sintetizar as informações em pranchas e relatórios, mapeando a cronologia e as etapas de

construção do complexo industrial, entre adaptações, transformações e ampliações dos

edifícios.

Figura 2 - Maquete de Vasco Venchiarutti para ampliação da indústria, na década de 1950 Fonte: Centro de Memória de Jundiaí

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Figura 3 - Foto aérea da CICA, na década de 1960 Fonte: Centro de Memória de Jundiaí

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Levantamento cadastral

Levantamento fotográfico atual.

Apesar da existência de equipamentos de

tecnologia de ponta para escaneamento das

fachadas, nesse trabalho, foi realizada a

medição com trena eletrônica de todos os

elementos arquitetônicos em comprimento,

largura e altura.

Desenho à mão, in loco, com cotas

levantadas.

Figura 4 - Reprodução dos desenhos feitos à mão, em software especializado, com auxílio do levantamento topográfico (para localizar as cotas de pé-direito), fotografias (para detalhamento dos sistemas construtivos) e dos projetos antigos pesquisados. Fonte: Acervo do Autor, 2015.

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A priori Restauração

Norteados pelos princípios da Carta de Veneza (ICOMOS,1964), os procedimentos

contemporâneos de restauração em bens modernos são considerados para a elaboração de

uma proposta maior, elencada no planejamento de área e edifícios do complexo industrial

da CICA, conforme Anexo - “Plano Diretor Específico” – disponível nas ultimas paginas

deste trabalho, que, entre outras recomendações importantes, pretendem lastrar a

elaboração futura de um Guia do Patrimônio Histórico de Jundiaí.

Identificar e mapear as patologias em corte e planta. Indicar as maneiras de intervenção nos

edifícios a partir do estado de conservação dos elementos construtivos dos mesmos.

Apresentar os trabalhos técnicos de conservação do patrimônio e restauração dos edifícios

que serão mantidos e/ou ajustados aos novos usos e às novas intervenções;

Instalação de escritório técnico nas áreas de restauração;

Prospecção pictórica dos diversos edifícios em suas diversas etapas; Solicitar ao Instituto de

Pesquisa e Tecnologia – IPT -, se necessário, análise de composição de argamassas para

identificar revestimentos especiais.

Resultados

O trabalho, aqui demonstrado, trata-se de uma parte de outro maior, desenvolvido, até o

momento, em forma de cinco pranchas de apresentação ao COMPAC de Jundiaí, além de

quinze pranchas de levantamento cadastral do complexo industrial (em escala 1:200 e

detalhamentos em escala adequada); de um relatório de análise desse levantamento com

identificação dos materiais, valores arquitetônicos, cronologia das edificações, e outro, de

patologias das edificações, que será utilizado no processo de restauração; de considerável

acervo iconográfico e centenas de exemplares do estado atual das construções. Sendo

que, o “Plano Diretor Específico” (Anexo, paginas 25, 26 e 27) da área foi realizado com

base nas intenções de projeto e nas informações geradas com tais levantamentos.

A partir desta produção, foi possível também compreender o espaço físico atual, em relação

à tipologia e morfologia do entorno, permeabilidade no tecido urbano, acessos e fluxos. E o

detalhamento de elementos arquitetônicos e a identificação dos materiais foram

documentados. As patologias foram identificadas e mapeadas. O arquivo produzido servirá

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de base de dados para o projeto de intervenção arquitetônica com mudança ou adequação

de uso, baseado nos valores históricos, culturais e arquitetônicos, promovendo a valorização

dos lugares antigos remanescentes e atendendo as necessidades do entorno urbano,

direcionando o uso pleno para a imensa área construída.

Neste estudo, notória e destacada é a participação do arquiteto Vasco Venchiarutti na

produção do espaço e êxito do empreendimento, na extensa ocupação, em contínuo

processo de construção e ampliação dos galpões, nos emblemáticos símbolos “Torre da

CICA” e “Casa Bonfiglioli”, como também no urbanismo peculiar da cidade.

Cronologia das Edificações

Figura 5 - Planta cronológica das construções da CICA Fonte: Acervo do Autor, 2015

A identificação das etapas de construções da CICA foi fundamental para analisar,

comprovar ou corrigir os valores históricos e arquitetônicos de cada uma das construções:

De 1941 a 1945 (em Verde), as construções são de Giacomo Venchiarutti, contendo parte

da residência e parte do primeiro pavilhão da pioneira fábrica de extrato de tomate. O

terreno já possuía uma olaria em funcionamento, que identifica a presença italiana no bairro.

Este perfil plano era ideal para a implantação de galpões industriais.

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De 1945 a 1950 (em Vermelho), é possível reconhecer uma continuidade da nova

construção em relação à pré-existente, tanto nos materiais escolhidos como nas questões

estéticas e de modulação, criando assim uma sensação de unidade do novo pavilhão,

prevista por Giacomo Venchiarutti, já considerando a expansão industrial da CICA.

De 1950 a 1970 (em Amarelo), foi construída a Torre da CICA, projeto de Vasco

Venchiarutti. Importante elemento arquitetônico no contexto urbano, se tornando referência

e símbolo da prosperidade da empresa e da cidade. O desenvolvimento industrial e

econômico da empresa gerou a demanda por novos galpões industriais, criando assim o

complexo industrial CICA. Foram criadas passagens de um lado do rio para o outro, e a

expansão fez com que o rio Guapeva fosse utilizado tanto como abastecimento de água

como para despejo de resíduos.

A partir de 1970 (em Azul), já não aparece o remanescente de antiga olaria. Construções e

interferências foram acrescentadas, mantendo-se conformadas assim até nossos dias.

Análise geral

Para efeito de uso gráfico técnico do levantamento para qualquer fim, foram executados os

serviços de levantamento de toda a parte física arquitetônica das construções, levantamento

das aberturas de portas e caixilhos das construções representados nas plantas, elevações e

cortes, levantamento das alturas das construções, representado nas plantas, elevações e

cortes, tabela de caixilhos indicando dimensões e quantitativo.

As cotas de nível foram obtidas a partir do levantamento plani-altimétrico, realizado em

05/03/2014. Pelo levantamento, são identificadas variações na cota de nível interna dos

galpões. O pé direito, medido no local, foi estipulado a partir de um ponto médio do nível do

piso. O levantamento foi realizado com trena eletrônica manual. Dessa forma pode haver

variações mínimas nas medidas apresentadas, em desenho, em relação ao local. A

numeração dos galpões permanece a mesma do projeto aprovado na Prefeitura, em

12/08/05.

A partir do levantamento, foi possível identificar os elementos mais presentes no complexo,

que criam a identidade do lugar, gerando análise geral da CICA:

A maioria dos galpões tem cobertura de telhas de fibrocimento, a exceção dos dois volumes

do galpão 06c, com telhas francesas de barro. As circulações e as marquises são cobertas

por telhas metálicas. Os volumes das coberturas devem ser mantidos. O projeto pode

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permitir a substituição das telhas. Originalmente, as coberturas dos galpões 04, alguns

trechos do galpão 05, os volumes do galpão 06c e o Bloco III foram projetados e executados

para receberem telhas francesas. A cobertura de ligação entre os galpões 06 e 08/Bloco III,

destacada em amarelo, é a mais precária entre as coberturas levantadas, podendo ser

justificada pela necessidade de ligação entre galpões, mas com uma solução de projeto e

execução muito precária, sugerimos uma intervenção contemporânea.

É desejável a manutenção de todas as estruturas das coberturas dos galpões, à exceção

dos galpões de ligação entre os principais. A partir do levantamento das datas de execução,

as tesouras mais antigas são de madeira com lanternim. As estruturas subsequentes são

arcos metálicos ou de madeira treliçada. As tesouras existentes deverão ser preservadas,

retirando os pontos que se encontram deterioradas e substituindo-as por novas madeiras

aparafusadas na parte íntegra da tesoura. O restante do madeiramento do telhado deverá

receber tratamento anticupim e as terças precisam ser avaliadas para eventuais

substituições.

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Figura 6 - Tipologias das coberturas dos diferentes galpões da CICA. Sem escala. Fonte: Acervo do Autor, 2015

Os rufos, contra-rufos e as calhas são de chapa galvanizada e serão avaliados no estudo de

patologias.

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Os tubos de queda de águas pluviais são de chapa galvanizada, ou PVC, em sua maioria.

Os caixilhos são basculantes de ferro e vidro. De maneira convencional, para a época.

Os mecanismos das portas funcionam através de sistema de manivelas que realizam a

abertura e fechamento de portas metálicas, identificados em alguns lugares precisam ser

mantidos e restaurados.

Contra piso de concreto com espessuras para tráfego de peso. É necessário avaliar onde

deve ser removido e refeito, e onde pode ser mantido.

Alvenaria de vedação de tijolos maciços revestidos em argamassa de cal e areia, em traço

1:4

Todos os edifícios possuem barra de tinta alaranjada, cuja composição e coloração

precisam ser analisadas para procedimento de restauração. São elementos originais do

complexo CICA e reforçam o caráter industrial e histórico do empreendimento. As paredes,

na cor terracota látex, ou similar, foram originalmente pintadas à cal e a prospecção deverá

trazer a cor original e a composição inicial da cal. As outras paredes pintadas em látex

cobriram as tintas e tratamentos originais da cal.

As molduras constituem-se de pingadeiras, peitoris e arremates nas platibandas. Em laranja

oxidado, estão presentes na maioria dos edifícios, necessitam ser mantidas. A moldura

do edifício de 4 pavimentos é de pastilha jatobá, em cor que precisa ser prospectada.

Enquanto no restante prevalece a moldura com pintura. É característica do projeto de

Vasco Venchiarutti.

As tubulações originais, em ferro galvanizado, nas mais diversas dimensões de seção,

necessitam, mesmo sem serem identificadas as funções, serem mantidas nas cores

originais para manter as características industriais, necessárias para o funcionamento da

agroindústria.

Todos os elementos originais de comunicação visual devem ser reestabelecidos, sendo

eles, as placas de identificação de cada um dos galpões, o nome da CICA nas platibandas

dos galpões que tinham o nome na fachada, o nome da CICA nas coberturas dos galpões, o

nome da CICA na torre.

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Análise específica

Para exemplificar a análise específica de cada

galpão, utilizaremos o Bloco III (Figura 7, ao lado)

que segundo a planta cronológica, é o ponto de

partida do antigo complexo agro industrial.

Esse bloco possui características de desenho

diversas dos galpões da CICA analisados. Os

outros galpões, de uma maneira geral, possuem

grandes arcos ou treliças de madeira para

vencerem grandes vãos, não têm saliências nas

fachadas, possuem formato regular, composto na

maioria das vezes por retângulos. A combinação

desses elementos faz com que esses galpões

tenham identidade industrial, visando apenas a

funcionalidade voltada para a produção.

O projeto do Bloco III tem elementos arquitetônicos

com valores históricos determinantes. Demonstra

qualidade na relação espacial em função da

complexidade do telhado exigido. Esse espaço é

resultado da forte inclinação das telhas francesas,

das águas furtadas para atenderem os desenhos

da fachada e lanternins em alguns trechos.

Composto por 77 tesouras de peroba, formando

um espaço de grandeza excepcional.

O movimento resultante da modulação na fachada

faz com que o olhar do observador seja

interrompido em intervalos regulares, dando

dinâmica à perspectiva. A Rua Cica é o principal

acesso aos usuários que virão para o novo

empreendimento comercial pela Via Anhanguera.

Esses módulos da fachada apresentam

ornamentos significativos de época e devem ser

prospectados e restaurados

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Torre da CICA

Figura 8 - Perspectiva de Vasco Venchiarutti do projeto da Torre da CICA, 1951 Fonte: Acervo do autor

A partir do pedido dos proprietários para Vasco Venchiarutti fazer uma torre "como as de

Bologna", os mesmos pretendiam estabelecer a conexão de Jundiaí com aquela cidade.

Assim, marca a presença italiana em Jundiaí, contemplando nesse projeto a referência à

Bologna e à produção da indústria de extrato de tomate.

Trata-se de fato, um monumento à lata de extrato de tomate, propaganda monumental para

o tempo, que traduzia no projeto a ousadia e a modernidade da industrialização de

conservas em lata. Com isso antecipa, em pelo menos dez anos, à PopArt americana, com

Andy Warhol, e em trinta e cinco anos ao pós modernismo na arquitetura americana,

amplamente debatido e difundido no Brasil e no mundo. Sobre a lata, ele insere o logo CICA

que, por sua vez, também é extremamente moderno por se tratar de um desenho

concretista, como de fato era a vanguarda daquele tempo (1951).

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Casa Bonfiglioli

Conforme a planta cronológica das etapas de construção da CICA, a casa da família

Bonfiglioli foi a primeira construção realizada naquele complexo industrial. na data de 1942.

A residência mantém as características originais do período da construção, típico de

arquitetura vinculada à indústria e da residencial burguesa da década de 40. A residência,

com projeto arquitetônico de Giacomo e, posteriormente, de Vasco Venchiarutti, possui área

de 510 m².

Figura 9 - Primeiras construções da CICA: Parte da casa Bonfiglioli, parte do primeiro galpão e chaminé. 1942. Fonte: Centro de Memória de Jundiaí

O primeiro projeto da casa, feita por Giacomo Venchiarutti, de 1942, era bem menor do que

a casa conhecida hoje. No pavimento térreo havia uma cozinha, uma copa, um dormitório

para empregadas e uma sala de jantar. No pavimento superior havia quatro quartos, um

banheiro e um terraço.

A reforma posterior aumentou consideravelmente a área da residência. No pavimento térreo

foram aumentados a cozinha, a copa e o terraço frontal, além de serem construídos uma

grande sala, um quarto, banheiros, um hall e um generoso terraço posterior. A área do

pavimento passou para 310 m². No pavimento superior, um dos quartos foi aumentado,

outro ganhou um terraço e os outros dois deram lugar à uma grande sala, foi criado um

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corredor que dá acesso à dois quartos e um banheiro mais recentes. O pavimento passou a

ter 200 m².

Figura 10 - Elevação atual da Casa, obtido através de levantamento. Fonte: Acervo do autor

Outros projetos, que foram referências para o da Casa Bonfiglioli, realizados pouco tempo

antes da sua concepção e presentes nos periódicos Acrópole (1941) e AU (1938 e 1940), do

acervo pessoal de Vasco Venchiarutti são as residências Campinas, do arquiteto Mario

Penteado, residência do Conde Francesco Matarazzo, do arquiteto Marcello Piacentini,

residência Dr. Aluizio Camará, do escritório Buffardi & Carvalho, Centro Cultural Americano

do Rio de Janeiro, de Giulio Cellini, entre outros. É possível identificar os tantos elementos

que se reproduzem na Casa Bonfiglioli, como as varandas de entrada a casa, os terraços

superiores, os beirais em estuque e o desenho das persianas.

A casa da família Bonfiglioli está na relação de bens do Inventário de Proteção do

Patrimônio Artístico e Cultural - IPPAC - de Jundiaí – aprovada pelo COMPAC, e possui

grau 1 de proteção, destinado aos bens móveis ou imóveis que possuem reconhecida

importância histórica ou elevada qualidade arquitetônica.

Uma das características marcantes ainda preservadas da casa é o painel de azulejo pintado

à mão, por Carlos Mancini, no ano de 1957, localizado na varanda posterior. Além de todos

esses elementos citados no IPPAC, alguns outros podem ser considerados bens agregados

e de valor histórico, são eles: o brasão da CICA; o outro painel pintado por Carlos Mancini,

com a imagem do Santo Antônio, e o portão social, que possui desenho moderno e

serralheria artística de qualidade com evidente denotação de status.

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Memorial descritivo da Casa Bonfiglioli

Pisos Internos: No pavimento térreo, o Hall de entrada, a Sala de Jantar e a Copa estão

cobertos por carpete, sendo necessária a prospecção do piso original. Na Cozinha e no WC

03, o piso é de ladrilhos hidráulicos estampados. Na Rouparia, Hall, Sala 02 e Quarto 04, o

piso é de parquet de madeira. No Depósito, WC 04 e Terraço Posterior, foi instalado piso

cerâmico esmaltado. Já no pavimento superior, os terraços e o WC 01 são de ladrilhos

hidráulicos estampados. O WC 02 é revestido por pastilhas. O restante dos cômodos está

com carpete, sendo necessária a prospecção do piso original.

Piso Externo: cerâmica da antiga Sacoman Fraires, localizada no então Núcleo colonial da

Glória, hoje Vila Mariana, Cambuci e Ipiranga, na cidade de São Paulo, que produzia telhas

francesas desde o séc. XIX. Nesta casa aparecem como os últimos remanescentes dessa

produção de piso cerâmico vermelho, pouco conhecido atualmente. (Pg. 19 – Pereira E. C.)

Paredes: Externas de um tijolo e internas com ½ tijolo. Rebocadas com argamassa de cal e

areia com traço de 1:4

Caixilhos: De ferro. Com pinturas diferentes das originais

Balaustre: Peças artísticas pré-moldadas em cimento, produzidas pela marmoraria África ou

Graziane.

Telhado: Telhas tipo Francesa, com armadura de peroba serrada.

Forros: Estuque sobre laje.

Calhas e condutores: Devem ser em chapa galvanizada, no lugar das calhas e condutores

de PVC

Alicerces: Profundidade mínima de 40 cm, espessura de 45 e 30 cm, respectivamente para

paredes de um tijolo e de meio tijolo.

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Identificação de patologias

Para exemplificar os métodos de identificação e mapeamento das patologias realizados na

CICA, utilizaremos a Casa Bonfiglioli. As patologias encontradas foram umidade nos forros

(em Azul), desplacamento de massa e tinta (em Verde), trincas e fissuras (em Roxo),

forro/estuque/telhas faltantes (em Vermelho), conforme Figura 11, abaixo.

Todos os ambientes da residência foram analisados individualmente com as respectivas

fotografias das patologias locadas, gerando relatório específico, que será utilizado nos

trabalhos de restauração.

Figura 11 - Planta de patologias do pavimento superior Fonte: Acervo do Autor, 2015.

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Conceitos em desenvolvimento

Originalmente, o empreendimento estava sendo planejado para funcionar com lojas âncoras

e grande quantidade de lojas menores. Porém, um grande número de lojas resultaria em

compartimentação dos grandes ambientes industriais, e seria necessária considerável

intervenção construtiva e a percepção do espaço como um todo seria prejudicada.

Sendo assim, foi estipulado um conceito de receber grandes lojas, o que manteria o caráter

longilíneo dos galpões sem a necessidade de severas transformações nos edifícios

históricos.

Diversos estudos já foram realizados e analisados. A adequação ao novo uso e a definição

do programa de necessidades é um esforço permanente e não deve ser tratado como algo

simples a se resolver, já que essa considerável área construída dentro do tecido urbano da

cidade irá influenciar definitivamente a vida de milhares de pessoas.

Com todas essas considerações, serão norteados sucessivamente os usos em todos os

galpões.

Se a reabilitação de edifícios ainda não se tornou norma, é sem dúvida porque, desde sua formação, os arquitetos aprendem a valorizar o novo, achando que só por meio dele poderão se expressar. Trabalhar sobre o que já existe é a penas fazer a manutenção do trabalho do outro, o que pode frustrar alguns egos (BOVET, 2012)

Exemplos de novos usos

Loja Telhanorte

Parte das edificações do antigo complexo agro industrial CICA já teve readequação do

espaço para nova atividade. Galpões que estavam sem atividade foram ocupados pela loja

de materiais de construção Telhanorte.

Estas instalações funcionam desde 2012, com sucesso no aspecto econômico, tanto na

parte de vendas da loja como na rentabilidade do proprietário; no aspecto patrimonial, pois é

nítido o aspecto fabril do ambiente. Sendo que os antigos elementos estão restaurados e à

vista. E, no aspecto social, já que a loja representa significativo equipamento de serviço para

a cidade.

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Figura 12 - Loja Telhanorte, em funcionamento, 2013 Fonte: Acervo do autor

GIGA Atacadista

O atacadista GIGA ocupará o Galpão 01, com cerca de 5595,00m², e o edifício onde é o

refeitório, com área aproximada de 1485,85m², totalizando 7080,85m², não havendo

nenhum acréscimo de área, apenas adequação técnica das docas para o novo uso. Seu

volume original será mantido.

Seu novo uso comercial trará benefícios à cidade, que terá significativa oferta por empregos;

ao território, que passará a ser mais permeável e visitado; e ao edifício, que após o

fechamento da fábrica deixará de ser obsoleto e passará a ser mais um equipamento

disponível para a população usar e fruir.

A portaria de serviços existente, na Rua Zuferey, continuará sendo utilizada para carga e

descarga de produtos nas docas, da mesma maneira que já era utilizada no momento em

que a CICA parou de funcionar. As alterações necessárias são decorrentes de atualização e

eficiência do processo do atacadista.

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O GIGA estará em contato imediato com um conjunto habitacional e outras residências

unifamiliares do entorno. Sendo que, nesta Rua já existe uma continuidade de instalações

comerciais, o que valida ainda mais a necessidade do novo empreendimento.

Referências Bibliográficas

BARDI, Lina Bo. Entrevista em visita técnica ao SESC Pompéia, 1980

CASTRIOTA, Leonardo Barci. Patrimônio cultural: conceitos, políticas, instrumentos.

São Paulo: Annablume; Belo Horizonte: IEDS, 2009.

DEAN, Warren. A industrialização de São Paulo (1880-1945). CAJADO, Octavio Mendes

(tradução). São Paulo: Difel, 1983.

IPHAN. Cartas Patrimoniais [Caderno de Documentos n° 3]. Brasília: IPHAN, 1995

KATINSKY, Julio Roberto et alli. Restauro da Faculdade de Medicina da USP: estudos,

projetos e resultados. São Paulo: CD.G Casa de Soluções Editora, 2013.

PEREIRA, Eduardo Carlos. Núcleos Coloniais e Construções Rurais. São Paulo: Estúdio

RO, 2006.

RUFINONI, Manoela Rossetini. Preservação e restauro urbano: intervenções em sítios

históricos industriais. São Paulo: Fap – Unifesp: Edusp, 2013.

VARGAS, Heliana Comin; ARAUJO, Cristina Pereira de. Arquitetura e mercado

imobiliário/organizadoras. Barueri, SP: Manole, 2014.

Periódicos: Jornais e Revistas

ACRÓPOLE. Revistas. São Paulo: FAU-USP. 1941.

AU. Revistas. São Paulo: Pini. 1938 e 1940.

BOVET, Phillipe. Arquitetos, não derrubem nada. Revista Le Monde Diplomatique Brasil,

Junho de 2012.

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Meio Eletrônico

ICOMOS. Carta de Veneza. Maio/1964. Disponível em:

http://portal.iphan.gov.br/uploads/ckfinder/arquivos/Carta%20de%20Veneza%201964.pdf -

Acesso em 13/Outubro de 2015.

KOOLHAAS, Rem. Rem Koolhaas fala sobre a Prada: preservação, arte e arquitetura.

Disponível em www.archdaily.com.br/br/772622. Acesso em 13/Outubro de 2015.

Ficha Técnica

Concepção

Arq. Eduardo Carlos Pereira

Apoio Técnico

Arq. Fernando de Andrade Dias

Instituições Consultadas

Prefeitura Municipal de Jundiaí

Secretaria de Cultura de Jundiaí

Secretaria de Obras de Jundiaí

Arquivos Particulares

Eduardo Carlos Pereira

João Borin

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Revisão

Maria Alice Gaiotto

Depoimentos

Luciano Christi

Agradecimentos

Sr. Antônio Jorge

Anexo Plano Diretor Específico O objetivo primeiro é a preservação do patrimônio histórico adaptando-o à nova atividade

econômica proposta, passando do uso agroindustrial para uso urbano, seguindo a premissa

de tornar a área ativa e de fruição para a população. Estas diretrizes dão um caminho de

remanejamento espacial do conjunto industrial CICA, adequando os antigos edifícios ao

novo uso.

Como premissa, é necessário que os projetos contemplem diálogo franco entre o novo e o

antigo, deixando claramente perceptíveis suas diferenças.

O projeto deve se integrar ao projeto do Parque Guapeva, da Secretaria de Planejamento e

Meio Ambiente da Prefeitura Municipal de Jundiaí, trazendo à sua área os conceitos e usos

do parque, assim como a recuperação do Rio Guapeva.

Diretrizes Específicas

1 Realizar levantamento topográfico e cadastral das áreas dos edifícios antigos

identificando as patologias;

2. Apresentar os trabalhos técnicos de conservação do patrimônio e restauração dos

edifícios que serão mantidos e/ou ajustados aos novos usos e as novas intervenções;

3. Prospecção pictórica dos diversos edifícios em suas diversas etapas;

4. Instalação de escritório técnico nas áreas de restauração;

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5. A reforma e restauração da torre da CICA terá ênfase em recuperar o totem

iluminado como originalmente foi, com as letras CICA na vertical que serão efetivamente o

marco indicativo do complexo CICA;

6. Observar nas fotos de 1959 a presença das chaminés, referência que pode ser

usada para caixas d’água verticais cilíndricas.

7. Preservar e destacar o remanescente da chaminé.

8. Valorizar as coberturas a partir do tempo de construção de cada galpão

9. Indicar as maneiras de intervenção nos edifícios a partir de diagnóstico do estado de

conservação dos elementos construtivos dos edifícios, sendo eles cobertura, estrutura,

alvenaria, caixilhos e revestimentos.

10. Solicitar ao IPT, se necessário, análise de composição de argamassas para

identificar revestimentos especiais.

11. Nos edifícios industriais, todas as instalações novas de uso moderno deverão estar

claramente expostas (“Le Corbusier”)

12. Estudar áreas culturais e da memória dos usos dos prédios, da historia da indústria,

bem como definição do local de exposição permanente deste acervo, com tratamento

museológico e técnico; Essa contra partida terá projeto especifico e se pretende usar os

incentivos de Lei;

13. Para orientação dos trabalhos culturais é necessário o levantamento dos

documentos e testemunhos ainda dispersos em arquivos particulares no arquivo do estado,

na prefeitura municipal de Jundiaí, FIESP e SESI.

14. Edifícios recentes e anexos novos dificultam leitura integral do bem a ser preservado.

Serão indicados para supressão.

15. O complexo CICA foi construído por diversas etapas ao longo do tempo, devido à

necessidade de expansão e modernização da indústria. Sendo assim a diretriz é de que as

novas edificações estabeleçam relações de desenho e modulação com o antigo, porém

manter caráter contemporâneo.

16. Propor aos novos edifícios gabaritos equivalentes aos volumes antigos, mantendo

equilíbrio visual entre eles.

17. Nos novos edifícios, expor o menor número possível de elementos, sem competir

com o desenho do patrimônio preservado.

18. As novas intervenções precisam propor uma solução formal que denotam a

contemporaneidade e simplicidade dos materiais. Esses materiais serão os distintores dos

edifícios antigos e atuais, para facilitar a leitura dos diversos edifícios preservados.

19. Os edifícios novos devem plugar-se aos antigos através da criação de espaços

públicos de integração, formando um elemento novo construído e impondo uma ordem

espacial ao conjunto.

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20. A viabilização do novo empreendimento pode implicar em algumas demolições no

complexo industrial, a fim de adequar os novos usos aos edifícios existentes. A partir do

levantamento e de pesquisas do histórico da CICA, o critério adotado é de demolir as

construções mais novas, as que alteram os volumes principais e as próximas ao rio, para

promover a ligação ao Parque Guapeva.

21. É importante ressaltar que a atual área impermeabilizada é de aproximadamente

80% do terreno, contras partida serão contempladas para minimizar o efeito desta extensa

impermeabilização.

22. Identificar as interferências externas e identificar os impactos gerados pelos novos

usos a serem estudados no RIT, Relatório de Impacto do Trânsito, e EIV, Estudo de Impacto

de Vizinhança.

23. Adequar e definir claramente as entradas pelas diversas ruas, melhores circulações

de pedestres, serviços, estacionamentos, vagas especiais, baias para ônibus, taxis, van e

transportes oferecidos pelo outlet, equacionando todos conflitos de fluxo.

24. Criação de alamedas de serviços, logística, alimentação, banheiros, suportes

administrativos e segurança;

25. Acréscimo e atualização de elevadores e equipamentos (com projeto de climatização

e iluminação), novos fechamentos e normas de instalação das lojas;

26. Definição e desenho técnico dos equipamentos de ar condicionado ou exaustão.

Essas interferências alterarão significativamente os bens que afetarão sua configuração

tanto externa como internamente.

27. Promover acessibilidade universal a todas as pessoas com deficiência em todos os

espaços dos projetos novos e antigos.

28. Serão indicados consultores, profissionais habilitados, cada um em sua

especialidade, com seus respectivos CAU e CREA, para cada fase dos trabalhos a serem

apresentados no decorrer das aprovações.

29. Ficha técnica também assim como as aprovações e seus aprovadores deverão estar

presentes durante todas as obras na fachada.

30. Todas as bibliografias e referências serão apresentadas junto com o projeto.