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1 Novo Paradigma Brasileiro no Setor de Bebidas: o caso AmBev Autoria: Lilian Cristina Anefalos, Carolina Torres Graça, Maria Cecília Sobral Resumo: Este trabalho de pesquisa teve como principal objetivo compreender como está ocorrendo o processo de ajustamento da AmBev no curto prazo, frente às determinações do CADE e imposições do negócio, além de analisar quais as conseqüências que poderão ocorrer na cadeia como um todo num período de tempo mais longo em decorrência da criação dessa Holding. Vários ajustes foram efetuados nessa nova empresa, obtidos pelo remodelamento da cadeia de suprimentos, com reflexos diretos em todas as etapas de produção e distribuição dos produtos comercializados pela empresa. 1. INTRODUÇÃO O objetivo do presente trabalho é comparar as antigas cadeias de suprimentos da Brahma e Antarctica com a estrutura da atual da AmBev. Para isso são explorados os aspectos que fizeram com que, apesar da desmobilização de ativos, essa nova empresa aumentasse sua participação no mercado e ganhasse eficiência produtiva e econômica. Em 1° de julho de 1999, foi anunciada a criação da AmBev, a maior empresa de bebidas do Brasil e a quarta maior cervejaria do mundo. A empresa foi resultado da criação de Holding nacionais: Companhia Antarctica Paulista – Indústria de Bebidas e Conexos (Antarctica) e Companhia Cervejaria Brahma (Brahma). O caso suscitou interesse da mídia e debates acalorados em razão da concentração de poder de mercado de bebida na mão de uma só empresa, que representava 70% do mercado de cervejas e 17% do mercado de refrigerantes. A negociação com a Brahma surgiu como uma oportunidade de negócio, pois havia o risco das empresas virem a ter seus ativos desvalorizados se não fosse criada a Holding. Embora as duas empresas fossem de capital aberto, a Brahma tinha estrutura mais aberta que Antarctica, o que gerou a necessidade de “negociar” ações com acionistas. De acordo com Edson Carlos de Marchi, atual diretor de Planejamento da AmBev, em entrevista concedida à equipe de pesquisa, pretendia-se “Criar uma empresa substancialmente cara para não ser assediada no futuro por uma empresa internacional”. O processo de criação da Holding foi sigiloso e durou vinte e dois dias. A rapidez do processo é explicada pelo fato dos documentos terem sido preparados para o processo anterior com a Miller, com a qual a Antarctica também tentou se associar. De acordo com declarações da AmBev, dentre os principais motivadores para a sua criação, destacam-se: criar uma das maiores empresas de bebidas do mundo;criar empresa brasileira capaz de ser competitiva, inclusive líder, no mercado global; reduzir custos e preços através de economias conjuntas de escala e das sinergias das duas empresas; obter ganhos em produtividade, logística e administração; ter maior capacidade de investimentos em tecnologia no desenvolvimento de novos produtos. Para aprovação do ato de criação da AmBev, esse caso foi submetido ao Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE). Um dos principais argumentos para justificar a criação da Holding dessas empresas foi que haveria ganhos operacionais da ordem de 14% com a criação da AmBev e, conseqüente, aumento de bem estar econômico da população. O órgão impôs algumas restrições à nova empresa, como o fechamento de unidades e também exigiu que a nova empresa consolidasse sua estratégia de multinacional brasileira no setor de bebidas. A criação da Holding foi anunciada em 1° julho 1999, o CADE autorizou-a oficialmente no primeiro semestre de 2000 e promulgou o seu parecer final em 30 de março de 2001. Um dos primeiros e grandes desafios da nova empresa foi a reestruturação interna a fim de eliminar a grande sobreposição de cargos, de atividades e de mercados que havia entre as

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Novo Paradigma Brasileiro no Setor de Bebidas: o caso AmBev Autoria: Lilian Cristina Anefalos, Carolina Torres Graça, Maria Cecília Sobral Resumo: Este trabalho de pesquisa teve como principal objetivo compreender como está ocorrendo o processo de ajustamento da AmBev no curto prazo, frente às determinações do CADE e imposições do negócio, além de analisar quais as conseqüências que poderão ocorrer na cadeia como um todo num período de tempo mais longo em decorrência da criação dessa Holding. Vários ajustes foram efetuados nessa nova empresa, obtidos pelo remodelamento da cadeia de suprimentos, com reflexos diretos em todas as etapas de produção e distribuição dos produtos comercializados pela empresa. 1. INTRODUÇÃO

O objetivo do presente trabalho é comparar as antigas cadeias de suprimentos da Brahma e Antarctica com a estrutura da atual da AmBev. Para isso são explorados os aspectos que fizeram com que, apesar da desmobilização de ativos, essa nova empresa aumentasse sua participação no mercado e ganhasse eficiência produtiva e econômica.

Em 1° de julho de 1999, foi anunciada a criação da AmBev, a maior empresa de bebidas do Brasil e a quarta maior cervejaria do mundo. A empresa foi resultado da criação de Holding nacionais: Companhia Antarctica Paulista – Indústria de Bebidas e Conexos (Antarctica) e Companhia Cervejaria Brahma (Brahma).

O caso suscitou interesse da mídia e debates acalorados em razão da concentração de poder de mercado de bebida na mão de uma só empresa, que representava 70% do mercado de cervejas e 17% do mercado de refrigerantes.

A negociação com a Brahma surgiu como uma oportunidade de negócio, pois havia o risco das empresas virem a ter seus ativos desvalorizados se não fosse criada a Holding. Embora as duas empresas fossem de capital aberto, a Brahma tinha estrutura mais aberta que Antarctica, o que gerou a necessidade de “negociar” ações com acionistas. De acordo com Edson Carlos de Marchi, atual diretor de Planejamento da AmBev, em entrevista concedida à equipe de pesquisa, pretendia-se “Criar uma empresa substancialmente cara para não ser assediada no futuro por uma empresa internacional”.

O processo de criação da Holding foi sigiloso e durou vinte e dois dias. A rapidez do processo é explicada pelo fato dos documentos terem sido preparados para o processo anterior com a Miller, com a qual a Antarctica também tentou se associar.

De acordo com declarações da AmBev, dentre os principais motivadores para a sua criação, destacam-se: criar uma das maiores empresas de bebidas do mundo;criar empresa brasileira capaz de ser competitiva, inclusive líder, no mercado global; reduzir custos e preços através de economias conjuntas de escala e das sinergias das duas empresas; obter ganhos em produtividade, logística e administração; ter maior capacidade de investimentos em tecnologia no desenvolvimento de novos produtos.

Para aprovação do ato de criação da AmBev, esse caso foi submetido ao Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE). Um dos principais argumentos para justificar a criação da Holding dessas empresas foi que haveria ganhos operacionais da ordem de 14% com a criação da AmBev e, conseqüente, aumento de bem estar econômico da população. O órgão impôs algumas restrições à nova empresa, como o fechamento de unidades e também exigiu que a nova empresa consolidasse sua estratégia de multinacional brasileira no setor de bebidas. A criação da Holding foi anunciada em 1° julho 1999, o CADE autorizou-a oficialmente no primeiro semestre de 2000 e promulgou o seu parecer final em 30 de março de 2001. Um dos primeiros e grandes desafios da nova empresa foi a reestruturação interna a fim de eliminar a grande sobreposição de cargos, de atividades e de mercados que havia entre as

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antigas concorrentes. Além disso, também pretendia garantir o menor custo de produção; capturar ganhos de sinergia com a criação da Holding das duas empresas; aprimorar constantemente a distribuição, mantendo inclusive estruturas independentes de distribuição, competindo entre si e buscando alcançar o equilíbrio entre distribuição direta e revenda; crescer em “share de valor”, que está relacionado à participação das marcas no faturamento do setor. 2. MÉTODO DE PESQUISA

O trabalho foi resultado de um estudo de caso qualitativo e descritivo realizado em uma empresa líder de mercado do setor de bebidas, a AmBev, constituído de três etapas: levantamento de dados primários realizado através de entrevistas estruturadas e não disfarçadas (Boyd e Westfall, 1984)1; levantamento de dados secundários sobre o mercado de bebidas, políticas do CADE, referencial teórico sobre a cadeia de suprimentos e consulta a informações disponíveis em órgãos governamentais; análise crítica do processo de criação da Holding e os impactos na cadeia de suprimentos bem como suas principais implicações nos negócios da empresa e comparação com o referencial teórico utilizado na pesquisa.

3. CONTEXTUALIZAÇÃO DA AMBEV NO MERCADO DE BEBIDAS A AmBev nasceu com o objetivo de promover a consolidação de uma expressiva fatia da indústria de bebidas nos países do continente americano através de associações e de parcerias para novos projetos, tirando partido dos avanços já visíveis em países vizinhos.

Antes da criação da Holding havia 44 fábricas com capacidade instalada de 122 milhões de hectolitros/ano; unidades industriais em 18 estados do Brasil, além de Argentina, Uruguai e Venezuela; 17500 empregados; 700 distribuidores; 24 centros de distribuição; 1 milhão de pontos de venda.

Os números que alicerçam a criação da AmBev são significativos. A empresa nasceu com mais de 30 mil acionistas. As vendas domésticas das duas companhias totalizaram, em 1998, R$ 10,3 bilhões, equivalentes a mais de US$ 8,5 bilhões. Foram fabricados 8,9 bilhões de litros de bebida, sendo 6,4 bilhões de litros de cervejas e 2,5 bilhões de litros de refrigerantes, águas, chás e isotônicos.

No processo de criação da Holding foram considerados 12 itens para compor o ganho de produtividade das empresas. Dentre eles a empresa teve como meta obter um ganho de sinergia de US$ 500 milhões no prazo de dois anos, a partir de 31 de março de 2000 – data oficial da Holding entre Brahma e Antarctica, e manter o compartilhamento da rede de distribuição com a Bavária, que foi adquirida pela Molson, empresa canadense, como item do acordo para a criação da AmBev.

A criação da Holding da Brahma e da Antarctica é tipicamente horizontal, pois as empresas pertencem ao mesmo setor, ou seja, competem no mesmo mercado de produtos (bebidas).

A maior parte dos jornais e revistas da época denominou como combinação a junção da Antarctica com a Brahma, dando origem à AmBev. Entretanto, o que ocorreu realmente foi a formação de uma empresa Holding.

Além de se destacar que a AmBev deve se tornar uma empresa multinacional brasileira após a criação da Holding, outro ponto a ser enfatizado diz respeito ao número de players que permaneceram no mercado de cerveja – total de quatro, por determinação do CADE, para estimular a concorrência entre as empresas. 3.1.Descrição do Mercado de Bebidas2

De acordo com a AmBev, os produtos da Antarctica e da Brahma têm muitas características em comum, como as técnicas de produção, envase e distribuição e a comercialização, feitas por idênticos canais de distribuição.

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No entanto, há diferenciações entre as marcas, com atributos que levam o consumidor a fazer sua opção. Para atraí-los, são necessários grandes investimentos em publicidade, marketing e promoção, visando a consolidação da imagem do produto no mercado.

A Brahma e a Antarctica são líderes no setor nacional de cervejas, comercializando 46 marcas, sendo “Antarctica”, “Brahma” e “Skol” as mais conhecidas. Essas empresas atuam também em outros segmentos, como refrigerantes, chás, águas e isotônicos, cujas vendas estão em expansão em todo o mundo. Entretanto, em nenhum desses segmentos a Antarctica ou a Brahma detinham a liderança das vendas.

O mercado brasileiro de bebidas está dividido da seguinte forma: águas: o grupo Edson Queiroz, líder de vendas do setor, detém apenas 20% do mercado

nacional. Do total comercializado, 54% são controlados por pequenos produtores. As participações da Antarctica e da Brahma nesse segmento eram pequenas, e a criação da Holding não acarretou um aumento significativo da concentração do mercado; Chás: a Parmalat é líder nesse mercado e detém 43% de sua participação. A Brahma

produzia chás, mas como a Antarctica não atuava nesse mercado, não houve um aumento de concentração após a criação da AmBev; Isotônicos: a Brahma produzia isotônico, mas a Antarctica não, portanto a criação da nova

empresa não alterou os níveis concorrenciais desse segmento; Sucos: a liderança é da Parmalat, com 39% do mercado. A Antarctica fabricava uma linha

de néctares, mas a Brahma não produzia sucos, portanto a combinação não alterou a concentração do mercado; Refrigerantes: a soma das participações detidas pela Brahma (incluindo a Pepsi-Cola) e

pela Antarctica resultava em um market share de 18,4%. A liderança é da Coca-Cola, com 48,9% de participação. Nesse segmento, a criação da Holding trouxe um pequeno aumento no índice de concentração, mas isso acirrará ainda mais a competição com a Coca-Cola. Além disso, a criação da AmBev vai proporcionar as condições necessárias para a internacionalização do guaraná; Cervejas: o mercado encontra-se distribuído entre quatro produtores de grande porte: Skol

(27% de market share), Antarctica (23,3%), Brahma (21,8%) e Kaiser (14,3%), segundo AC Nielsen (jun/jul 99). 3.1.1. Mercado de cervejas

Ao se analisar o market share da AmBev, tem-se a impressão que há demasiada concentração de mercado nesse segmento (72,1%), mas alguns fatores devem ser também considerados. Em primeiro lugar, a AmBev não se propõe a eliminar ou mesmo diminuir a concorrência entre a Brahma e a Antarctica. A Antarctica, a Brahma e a Skol são mantidas como divisões empresariais autônomas e independentes, lutando pela preferência do consumidor.

Em segundo lugar, o consumidor não é muito fiel às marcas de cerveja. O preço é um dos fatores mais determinantes na escolha do produto. Essa infidelidade às marcas torna muito pequena a capacidade dos produtores de cerveja de ditar aumentos de preços. De acordo com a pesquisa da Marplan Brasil (citada por VASQUES, 2000), apenas 34% dos consumidores chegam aos pontos de venda para comprar cerveja de uma marca já definida.

Em terceiro lugar, o poder de imposição de preços é limitado pelo fato da cerveja estar longe de ser considerada um produto essencial. Um produtor só vende em larga escala com preços reduzidos, caso contrário o consumidor deixa de comprar a cerveja para atender a necessidades mais elementares.

Uma das segmentações de mercado é a diferenciação entre: High end: cervejas premium, que diferem das demais em preço, 20- 40% superior em

função de sua melhor qualidade e quantidade de matéria-prima. Ex: Bohemia; Standard: Ex: Brahma, Antarctica e Skol;

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Low end: Ex: Kaiser e Schincariol, que diferem do nível standard em função de preços inferiores.

Quanto à elasticidade da demanda por cerveja, observa-se que é baixa a substituição de cerveja por outros tipos de bebidas alcóolicas e não-alcóolicas. Já a elasticidade cruzada entre cervejas de diferentes tipos é alta. Em relação à substituição de uma marca por outra, observa-se que, no mercado de garrafas, apenas a Antarctica e a Brahma são produtos substitutos. No mercado de latas, Kaiser, Skol, Antarctica e Brahma aparecem como substitutos.

A forma de cerveja mais consumida no Brasil é comercializada em embalagens retornáveis e resfriada, ou seja, consumo em bares, restaurantes e outros locais de consumo imediato. Em 1999, este “modal” correspondeu a 30% do mercado de cerveja nacional.

A importação de cervejas é inexpressiva em função da carga tributária de importação (23%) e ao alto custo adicionado ao produto, em razão do transporte e das preferências do consumidor nacional por embalagens do tipo retornável.

As projeções feitas pela Secretaria de Acompanhamento Econômico (SEAE, 1999) indicam que a demanda por cerveja em 2001 é inferior à capacidade instalada de produção, indicando ociosidade no setor (36% em 1999), segundo Banco Nacional de Desenvolvimento - BNDES. 3.1.2. Mercado de refrigerantes

O mercado de refrigerantes, diferentemente do de cervejas, é bastante segmentado e com grandes expressões regionais. A empresa de maior atuação no Brasil é a Coca Cola, que detém 50% do mercado e comercializa as marcas Coca Cola, Fanta, Sprite e Taí. Em seguida está a AmBev, com 17% do mercado. Num terceiro patamar, estão as tubaínas com 33% de market share em 1999. Este mercado tem apresentado mudanças significativas no decorrer da última década, sendo as principais: Crescente e agressivo aumento da participação da tubaínas atuando em nível regional; Aumento da utilização de embalagens de poliéster tereftálico (PET), cujo custo de

fabricação é bastante inferior às demais embalagens; Aumento das vendas através de supermercados.

O raio econômico eficiente para transporte de refrigerante é de 400 Km, segundo dados da AmBev e da Coca Cola. Além do aumento de custo do produto final, o refrigerante tem sua qualidade comprometida se transportado a raios mais longos, com perda de estabilidade e de gás.

Estudos realizados pela Comissão Federal de Comércio Americana e da Comissão de Concorrência e Consumo da Austrália indicam que refrigerantes são de difícil substituição por outros produtos, mas refrigerantes, independentemente do sabor, são bons substitutos entre si.

Assim como no mercado de cervejas, a importação de refrigerantes é inexpressiva e existe capacidade ociosa na indústria. Mesmo no segmento high end, a tendência é de aumento da capacidade ociosa em virtude da expansão das tubaínas. 3.2. Carteira de Produtos

Antes da criação da Holding, as participações de mercado de cerveja da Antarctica e Brahma eram, respectivamente, 25,4 e 48,1%. De acordo com SEAE (1999), ambas produziam cerveja, refrigerante, água e malte; os chás e isotônicos eram gerados apenas pela Brahma e só a Antarctica produzia sucos.

De maneira geral, o faturamento da AmBev está associado da seguinte maneira: 75% à venda de cerveja, 20% a refrigerantes e 5% à água e isotônicos. Atualmente os principais produtos comercializados pela AmBev são descritos a seguir. As principais marcas de cerveja da AmBev são: Bohemia - marca premium – cujo preço é mais alto que as outras marcas, direcionada a um consumidor de maior poder aquisitivo; Skol – preferida por um público mais jovem; Antarctica – consumida mais por um

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público mais velho; Brahma – para consumidores de todas as faixas etárias; Miller; Krauss – cerveja de marca estrangeira com receita importada, onde a AmBev possui apenas contrato de produção e distribuição do produto, tal qual é feito com a Pepsi; Polar – marca só vendida no Rio Grande do Sul. Com relação aos refrigerantes existem as marcas Brahma, Antarctica e Pepsi3.

Quanto à água, há perspectivas de aumento na sua produção e nas suas vendas, com vistas à ampliação do mercado nos próximos anos. Há três fábricas de água da AmBev no Brasil: Bahia (exclusiva de água), Paraná (água e refrigerante) e São Paulo (Jaguariúna – mista).

A marca de isotônica da AmBev é Marathom. Seu processo de produção distingue-se dos demais produtos, pois há cuidados especiais com a assepsia e com as condições ambientais (temperatura, por exemplo), para manter a estabilidade do produto. Há apenas uma fábrica em Paulínea, onde também há produção de refrigerantes.

O processo de produção do chá Lipton é semelhante ao do refrigerante. É produzido em associação da AmBev com a Unilever, que também fornece o xarope do refrigerante Brahma. Sua fábrica localiza-se em Jundiaí, onde também são produzidos refrigerantes. 3.3. Fatores Básicos para o Estabelecimento das Empresas no Mercado de Cervejas Dentre os principais fatores que devem ser considerados pelas empresas para se inserirem no mercado de cervejas, destacam-se: embalagens, rede de distribuição, marcas e transporte. 3.3.1. Embalagens

Ao longo dos anos o mercado de latas de cerveja no Brasil tem crescido significativamente, atingindo em 2000, 26,8% do total comercializado, ganhando mercado inclusive em relação ao vidro retornável, que reduziu muito a sua participação desde 1990, conforme pode ser visualizado no Quadro 2. Quadro 2 - Brasil: Market Share das Embalagens de Cerveja – 1990 a 2000 (%) Embalagem 1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998* 1999* 2000* Lata 2,4 2,2 3,5 7,9 8,0 11,6 16,2 17,1 26,8 26,8 26,8 Vidro One-Way 0,4 0,4 0,2 0,6 1,1 2,1 1,9 3,3 7,0 7,0 7,7 Demais vidros 6,2 6,3 5,0 3,6 2,6 2,9 2,1 2,7 3,0 3,0 3,0 Vidro retornável 91 91,1 91,3 87,9 88,3 83,4 79,8 76,9 67,7 63,2 62,5 (*) Estimativas Fonte: SEAE (1999)

De maneira geral, tem-se que as embalagens retornáveis (das cervejas Brahma e Antarctica) representam 70% do mercado, e o restante compreende as latas, chop e vidros descartáveis. Ao comparar essa divisão com a Skol, observa-se que 60% dessa marca são comercializados em embalagens de latas. A lata é composta por alumínio, que é uma commodity, e segue os preços internacionais (com cotação em dólar).

A AmBev compra latas de dois fornecedores, a partir de contratos de um ano, e concentra 60% do mercado de latas. O PET, vidro e a lata são utilizados como embalagens para refrigerantes. Para as cervejas são utilizados os vidros retornáveis, descartáveis (long neck) e a lata.

Em termos de custo de produção, a embalagem retornável chega a 50% do total, enquanto a lata 75%, por volta de R$ 0,40 a 0,50 por unidade. A mão-de-obra representa apenas 5% do custo total e o malte, 5%.

Como a garrafa é um ativo imobilizado da empresa, a sua quebra constitui-se num custo alto para a empresa, pois se reflete na perda de ativos (calcula-se que há perda de R$ 2,00 por hectolitro pela quebra de garrafas), sendo um dos principais fatores para a grande redução de sua comercialização ao longo dos anos.

Quanto aos tipos de linhas existentes em cada fábrica, deve-se destacar que em todas há linhas de vidro, sendo que há poucas fábricas com linhas de vidros descartáveis (inclusive

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em menor quantidade do que as linhas de latas). Nas fábricas de refrigerantes todas produzem PET4. No mercado de cerveja há utilização expressiva de embalagens retornáveis, condicionando as fábricas a serem próximas dos consumidores, existindo em quase todos os estados brasileiros, com exceção do Amapá, Roraima, Rondônia, Acre, Alagoas, Pará, Mato Grosso do Sul e Tocantins. 3.3.2. Rede de Distribuição

A AmBev tem consciência de que o “desafio é a distribuição”, segundo palavras de Edson Carlos de Marchi. Segundo ele, é difícil criar rede de distribuição para produtos maduros, como é o caso do mercado de refrigerantes, uma vez que o processo de expansão é lento e trabalhoso, devendo-se se iniciar a partir de uma estratégia regionalizada e com o tempo consolidar o produto no mercado mais amplo.

As despesas com distribuição envolvem os seguintes itens: veículos, sistemas de logística, aluguel de armazéns, equipamento para manuseio de carga e acesso aos pontos de venda.

Os pontos de venda de produtos em embalagem retornável e a frio, via de regra, têm contrato de exclusividade com marcas já estabelecidas no mercado. Em 1999, o número de estabelecimentos desta categoria totalizava aproximadamente um milhão de pontos de venda dispersos em todo o país (SEAE, 1999). Estes contratos têm duração média de cinco anos e o objetivo é proteger a marca contra o problema do free-riding5. Portanto, a capilaridade do mercado, os contratos de exclusividade com distribuidores e com os pontos de venda atuam como uma barreira à entrada de novas cervejarias na rede logística, pois refletem alto risco para uma rede de distribuição com nova marca que deseje entrar no mercado. 3.3.3. Marca

Dado que as diferenças entre marcas de um mesmo tipo de cerveja são mínimas, quase imperceptíveis, a diferenciação pela marca é fator de vital importância para a concorrência no setor, principalmente no setor de high end, visto que o maior atrativo do nível low end é o preço.

De acordo com Arthur Barrioneuve, ex-conselheiro do CADE (citado em CADE, 1999) as marcas líderes no mercado de cerveja tiveram a seguinte parcela do faturamento líquido anual sobre os gastos com propaganda no período de 1989-1996: Brahma (2,9%), Skol (2,6%), Antarctica (3,3%) e Kaiser, (5,8%).

Como mostra do acirramento da concorrência entre as marcas, a AmBev investiu em 2001 R$330 milhões para promoção da cerveja Bohemia, a fim de conquistar mais consumidores no mercado premium. Em 2000 esse segmento correspondeu a apenas 2% do total comercializado, correspondendo a uma receita de R$ 11 bilhões (Agestado, 2001c). 3.3.4. Transporte

O transporte é o principal fator para delimitação do mercado geográfico de bebidas, porque o frete tem participação expressiva na composição no preço final do produto ao consumidor. Ao considerar a relação entre distância percorrida e aumento de custo por hectolitro transportado, o abastecimento de cerveja a distâncias superiores a 500 Km envolve variações no preço superiores a 10% no caso da AmBev. Para Schincariol e Kaiser, o raio econômico é de 600 Km e 350 Km, respectivamente.

Em razão do maior consumo de cerveja ser sob a forma de vidro retornável e dado o raio econômico, há necessidade de haver fábricas próximas aos maiores centros de consumo. Contudo, em situações especiais, se o tamanho do mercado não comportar a instalação de uma fábrica de escala mínima eficiente, a cerveja pode ser transportada a longas distâncias, mesmo com o risco de haver perda na qualidade do produto. No caso particular da AmBev, para abastecer o mercado na região Norte, a cerveja é transportada por raio de até 1500 Km da fábrica de Manaus.

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4. REMODELAMENTO DA CADEIA DE SUPRIMENTOS Neste item serão abordados aspectos específicos de cada um dos elos das cadeias de

suprimentos de cerveja e de refrigerantes (fornecedores de insumos, fábricas e distribuidores), a fim de confrontar as mudanças ocorridas com a AmBev antes e depois da criação da Holding.

Com a criação da nova empresa, era necessário efetuar o planejamento estratégico da mesma para o longo prazo. Neste contexto foram identificadas as oportunidades de localização e capacidades das unidades fabris, modais de transporte, sinergia em compras etc. Segundo Ballou (2001), “o planejamento estratégico opera com dados que são freqüentemente imprecisos e incompletos. Os dados podem ser estimados pela média, e os planos são normalmente considerados bons se estiverem razoavelmente próximos do ótimo”. No Quadro 3 estão assinaladas as principais decisões objeto de análise nos estudos preparatórios para a criação da AmBev. Quadro 3 - Exemplos de tomada de decisões estratégicas, táticas e operacionais

Tipo de decisão

Estratégica Tática Nível de decisão

Operacional

Localização Número de locais, Tamanho e localização

Posicionamento de estoques

Roteirização, aceleração e despacho

Transportes Seleção de modais Sazonalidade do mix de serviço

Quantidades e tempo de reabastecimento

Compras Políticas Contratação, seleção de fornecedor

Liberação de pedidos

Armazena-gem

Layout, seleção de local Escolha sazonal de espaço

Serviços ao cliente

Estabelecimento de padrões Preenchimento de pedidos

Fonte: Ballou (2001)

No remodelamento da AmBev buscou-se a minimização de custos, o que está em linha com Fisher (1997), pois como se trata de produtos funcionais o ideal é que a cadeia de suprimentos seja eficiente, com custos baixos (ver Quadro 4). Quadro 4 - Eficiência versus Responsividade.

Itens Processo eficiente Processo responsivo Propósito principal abastecer a demanda previsível ao

mínimo custo responder rapidamente a demanda imprevisível para minimizar falta de estoque, descontos forçados e estoques obsoletos.

Foco na manufatura manter alta taxa de utilização dos recursos

desenvolver buffers de capacidade

Estratégia de estoques gerar ciclos altos e minimizar estoques na cadeia

desenvolver buffers de estoque e partes ou produtos acabados

foco no lead time encurtar lead time até não afetar custos

investir agressivamente para reduzir lead time

Enfoque para escolher fornecedores

selecionar principalmente por custo e qualidade

selecionar principalmente por velocidade, flexibilidade e qualidade.

estratégia de projeto de produto

maximizar desempenho e minimizar custo

utilizar projeto modular para postergar diferenciação o quanto for possível

Fonte: Fisher (1997). De acordo com Chopra e Meindl (2001), para que possa haver cadeias de

suprimentos mais responsivas e eficientes algumas decisões podem ser tomadas quanto: ao ciclo (para ciclos maiores há custos maiores dos estoques; para ciclos menores há custo para pedidos mais freqüentes de produtos); à segurança (em função de demandas incertas, as empresas tendem a ter estoques de segurança para satisfazer a procuras inesperadas por seus produtos – nessas condições as empresas podem incorrer em custos de ter estoque em excesso ou em custos de perder vendas por não terem estoques em quantidade suficiente para atender

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a demanda); à sazonalidade (neste caso se as empresas tiverem demandas muito variáveis ao longo do tempo, o custo de alterar a taxa de produção é muito elevado, levando-a a decidir por taxa de produção continua e com menor incremento, optando por ter estoques nos períodos de baixa demanda); trade-off entre responsividade e eficiência (em geral, a cadeia terá maior proximidade com o cliente se houver aumento nos estoques). Além dos estoques, o transporte também possui uma atuação importante na cadeia de suprimentos, pois quanto maior for a demora nas entregas, a empresa será mais responsiva e menos eficiente, pois terá estoques maiores. Para que a empresa possa aumentar esses dois componentes (responsividade e eficiência) uma das alternativas seria tomar decisão ótima através da combinação certa de estoques e de transporte. Para que as empresas obtenham maior eficiência na locação dos produtos, as instalações devem ser centralizadas, com ganhos em economia de escala. Neste caso, porém poderia haver menor responsividade em função da distância entre a produção e o local de armazenamento.

As decisões sobre a localização das instalações devem levar em conta os seguintes componentes: locação (para optar entre centralizar ou não os produtos, deve-se considerar, entre outros, fatores macroeconômicos e estratégicos, qualidade e custo dos trabalhadores, custo das instalações, disponibilidade de infraestrutura, proximidade dos clientes, entre outros); capacidade da instalação (quanto maior, maior será a flexibilidade da empresa, porém com custos maiores ocasionará redução em sua eficiência).

Dentre os integrantes da cadeia, a informação constitui-se num dos principais responsáveis pelo seu desempenho, especialmente em decorrência do aumento da importância da tecnologia da informação. Apesar não possuir presença física afeta toda a cadeia de suprimentos, podendo reduzir custos e melhorar a responsividade dentro de uma cadeia (Chopra e Meindl, 2001). 4.1. Aquisição de Matérias-Primas

Após a criação da Holding foi adotada a centralização das compras de insumos (localizada no Centro Empresarial, em São Paulo), antes de ter sido feito o planejamento das fábricas. Esse procedimento foi adotado a fim de obter economia de escala, com o intuito de negociar preços mais baixos e quantidades maiores já no início das atividades da nova empresa. 4.1.1. Malte

Antes da criação da Holding, o fornecimento de malte ocorria por meio de importação (grande maioria), de produção verticalizada nas empresas e de suprimento por empresas nacionais independentes.

Após a criação da AmBev, esses procedimentos não foram alterados inicialmente porque o malte importado não pode ser substituído por similar nacional, visto que a qualidade da cevada produzida sob clima temperado é superior às produzidas em regiões subtropicais. Além disso, as maltarias brasileiras são, em sua grande maioria, integradas verticalmente e servem à indústria da mesma cadeia, logo não há grande opção de compra do insumo no mercado nacional. Por outro lado, o malte importado também não pode substituir na sua totalidade o malte nacional porque a compra de matéria-prima nacional é obrigatória à indústria cervejeira a fim de tentar reduzir o déficit da balança comercial. Assim, para fabricar o produto em território nacional é feito um blend, onde se mistura malte do Brasil, europeu, argentino e canadense.

Atualmente, os principais fornecedores de malte são: Europa, Canadá e Uruguai, correspondendo a 75% do malte total utilizado pela empresa; Maltarias próprias, localizadas no Rio Grande do Sul (Brahma), Argentina (Brahma), Uruguai6 e Jaguaré (Antarctica), que atendem de 15 a 20% das necessidades da empresa após a criação da Holding; Maltaria independente, localizada no estado do Paraná, que fabrica 5% do volume total consumido pela empresa.

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Por intermédio da Cooperativa Agromalte, tem havido fomento ao plantio de cevada no Paraná e Rio Grande do Sul, através da garantia de compra da safra.

Como o malte é, em sua grande maioria, importado de outros países por navio, a empresa recebe entrega de três em três meses (cujo volume pedido se intensifica a partir do mês de setembro). Em geral, são firmados contratos de fornecimento de um ano de duração.

A compra conjunta de malte foi um dos principais benefícios da criação da Holding em função da economia de escala na importação, pois houve diluição nos custos de frete e burocráticos, a partir da aquisição de volume significativamente maior desse produto.

Quanto à logística do produto importado, os insumos são retirados no porto a cargo da AmBev por meio de empresas de transporte terceirizadas. 4.1.2. Açúcar

Antes da criação da Holding, havia políticas distintas quanto ao procedimento de compra. A Antarctica adotava a compra regional de açúcar líquido ou cristal o que permitia ganhos com a negociação regional de produto e de frete. Já na Brahma, o processo de compra era já centralizado. O resultado da criação da Holding foi a centralização da compra de açúcar pela central de compras de São Paulo, acompanhado de entregas diretas nas unidades. Os fornecedores mais freqüentes do insumo são: para fábricas de Cuiabá e Manaus fornecedor é a Usina Itamarati, com sede em Mato Grosso, fábrica de São Paulo fornecedores Guarani, Barra e Dulcini (açúcar líquido), fábricas do Nordeste fornecedores de Alagoas e Pernambuco. 4.1.3. Gás carbônico

Antes da criação da Holding, a Antarctica era comprador líquido de gás carbônico da White Martins. Por sua vez, a Brahma, por ter maior escala de produção de cerveja, beneficiava parte do CO2 liberado no processo de fermentação e utilizava o mesmo gás como insumo à indústria de refrigerantes, contudo, parte do gás carbônico não utilizado era liberado no ambiente. Após a criação da Holding, a AmBev criou o programa de auto-suficiência de CO2 aproveitando melhor a liberação de gás proveniente da fermentação e subseqüente incorporação ao refrigerante. O CO2 co-gerado é 50% mais barato que a matéria-prima adquirida no mercado, já considerando investimentos e fretes necessários. Logo, o aproveitamento do CO2 é uma das grandes sinergias da criação da Holding entre Antarctica e Brahma. 4.1.4. Embalagem (PET, vidro, lata)

Antes da criação da Holding, os fornecedores de lata e vidro da Antarctica e Brahma eram comuns. Uma prática que está sendo implementada na nova empresa é a atividade de trade de alumínio para fornecer opção de compra de matéria-prima ao fabricante de latas a preços mais competitivos e, em troca, a lata custa mais menos para a AmBev.

Foi estratégia similar que possibilitou a rápida expansão da Miller no mercado americano. Entretanto, a eficiência de tal estratégia no Brasil está bastante associada às flutuações cambiais no mercado nacional.

Em relação às embalagens PET, após a criação da Holding, foram realizados investimentos em sopradores (equipamento empregado na transformação de pastilhas de resina em embalagem plástica no formato que se encontra no mercado). 4.1.5. Rótulo

Como a Antarctica era uma fundação de empregados antes da criação da Holding, havia atividades que também contemplavam o lado social. Em São Paulo havia uma escola com curso técnico de gráfica, que deu origem a um parque gráfico, onde eram feitos os rótulos. Após a criação da Holding, essa fundação, que representa 20% do capital da AmBev, passou a atender 80% da demanda da empresa na fabricação de rótulos. O restante dos rótulos é adquirido de uma empresa com sede na cidade do Rio de Janeiro.

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4.2. Manufatura Antes de 30 de março de 2000, a Antarctica tinha 18 estruturas de manufatura e a

Brahma, 25. Ao fim do processo de consolidação, restaram 34 unidades em função ou de venda de ativos junto com a marca Bavária, ou encerramento de atividades por sobreposição de áreas de influência (exposto com mais detalhes no item 4.3), sendo que a decisão de quais fábricas deveriam ser fechadas foi uma das primeiras e maiores providências após a criação da AmBev7. 4.3. Critérios para Seleção das Unidades Pertencentes à Rede AmBev

Após o processo de criação da Holding foi realizado planejamento para otimização das fábricas, a fim de estabelecer a localização e escala de produção ótima de cada uma delas e descartar as que não estivessem dentro das metas da nova empresa AmBev.

Os passos para montagem de um modelo de otimização foram: (1) avaliação de cada fábrica quanto a custos fixos e de oportunidade do terreno ou instalação e à capacidade de produção8; (2) estudo dos custos de frete9 entre os fornecedores, fábrica e centros consumidores; (3) análise dos Incentivos fiscais fornecidos pelo estado e prefeitura sobre a localização das unidades; (4) elaboração do custo variável médio para produção de cerveja em cada modalidade de embalagem.

A decisão por utilizar o custo variável médio por tipo de embalagem de cerveja é o ponto mais interessante e peculiar deste modelo de otimização. As razões para elaboração da premissa de que todas as fábricas eram capazes de operar sob o mesmo custo variável é que: primeira, todas as unidades possuíam o mesmo nível tecnológico, diferindo apenas em escala; segunda, os custos variáveis de produção entre Brahma e Antarctica eram diferentes em razão dos seus respectivos processos de fabricação, gerando impactos distintos no custo total - a cerveja Antarctica passava por processo de fermentação mais longo que a cerveja Brahma, e o processo da Skol também tinha suas particularidades com relação à quantidade e tipos de insumos empregados.

Em virtude da política de compras de cada uma das empresas mães, o custo de aquisição de matérias-primas diferia de uma unidade para outra. Portanto, além de haver capacidade potencial similar entre elas para operarem sob mesmos custos variáveis, um dos objetivos da criação da Holding era que todas elas passassem a operar de modo “cruzado”, ou seja, que em uma mesma manufatura fosse possível produzir as três marcas de cerveja - Brahma, Antarctica e Skol.

É importante ressaltar que, apesar de ter sido considerado o custo de oportunidade do terreno, o único caso em que esse dado foi relevante foi para a escolha da unidade situada na cidade de São Paulo, em função da valorização de terrenos de grandes dimensões junto à Marginal Pinheiros.

O critério para escolha das unidades foi, basicamente, a resposta do modelo de otimização, ou seja, foi uma escolha quantitativa. Em alguns casos, o resultado do modelo quantitativo é revisto sob crivo qualitativo que considera, entre outros fatores, perecibilidade da matéria-prima e custo de transporte; custo e qualidade da mão-de-obra; pressão social contra o fechamento da unidade; gastos com água e energia elétrica; quanto perguntados sobre estes critérios, os entrevistados afirmaram que tais variáveis qualitativas não foram consideradas na análise. 4.4. Software para Redesenho da Cadeia de Suprimentos

Para dar suporte ao processo de criação da Holding, foi empregado o software Synquest Supply Chain Designer Engine. Trata-se de um programa computacional que possibilita construir o desenho atual da cadeia de suprimentos de uma empresa (com seus diversos níveis: fornecedor, fabricante, distribuidor, varejista, cliente) e, através de cenários, projetar os ganhos a partir de alterações nesta configuração, que podem ser calculados a partir

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de duas funções objetivo: minimização dos custos da cadeia e maximização da rentabilidade das operações da cadeia.

O software possui um algoritmo de programação linear (CPLEX) e, através deste programa, foi possível otimizar a infra-estrutura disponível de modo a: (a) reduzir custos fixos através do fechamento de fábricas para melhor aproveitamento da capacidade instalada e eliminação de futuros investimentos desnecessários nas fábricas fechadas; (b) reduzir custos de frete com revisão da malha, pois todas as unidades produzem as três marcas, assim clientes não exclusivos aprovisionam-se de Antarctica, Brahma e Skol em uma única viagem. Além disso, há diminuição da necessidade de transporte de produtos entre fábricas; (c) capturar incentivos fiscais dados às fábricas, produtos e embalagens, além de administrar eventuais restrições existentes em cada um dos contratos de Incentivos Fiscais Estaduais.

Em razão do fechamento de unidades, aquelas que permaneceram na rede AmBev tiveram sua capacidade ociosa diminuída. As maiores fábricas de cerveja estão localizadas na região sudeste, especificamente no Rio de Janeiro (que possui capacidade para 12 milhões de hectolitros10 – dos quais nove milhões são efetivamente produzidos) e Jacareí (que possui capacidade para 9 milhões de hectolitros – dos quais oito milhões são efetivamente produzidos). As demais possuem perfil semelhante, com capacidade de aproximadamente três milhões de hectolitros. Cabe ressaltar que a unidade de Jundiaí teve sua produção aumentada em 2 milhões de hectolitros em função do fechamento da unidade de São Paulo.

Houve também, a padronização das fábricas quanto a diversos procedimentos. Por exemplo, o escritório da fábrica passou a ter compra centralizada de insumos. Foram feitos investimentos de adequação aos padrões desejados, como é o caso do inspetor eletrônico, que era adotado apenas pela Brahma para o controle do volume do líquido das bebidas, e aprimoramento da área de controle ambiental por meio da ampliação da capacidade das estações de tratamento de água e efluentes, uma vez que as fábricas passaram a ter que utilizar capacidade maior de operação do que comportava as suas estações. 4.5. Produção de Xarope Composto para Fabricação de Refrigerantes

Conforme discutido anteriormente, a primeira etapa de produção de refrigerantes é centralizada em uma única unidade, que produz a essência do xarope, que serve de base à diluição. Na Brahma, e a composição da essência e adição de aditivos era feita em uma única fábrica, em Manaus, devido ao ganho fiscal (basicamente IPI e ICMS). Já na Antarctica a essência era produzida em São Paulo e os outros aditivos eram adicionados ao processo no momento da diluição do xarope em cada uma das fábricas. Após a criação da Holding, o processo que prevaleceu foi aquele adotado pela Brahma, bem como, a unidade de Manaus, que é agora responsável pela produção de essência para toda a rede AmBev. 4.6. Qualidade, Pesquisa e Desenvolvimento

Tanto a Brahma quanto a Antarctica tinham área de qualidade antes da criação da Holding das empresas.Atualmente, a grande maioria das fábricas utiliza ISO 9001, e apenas uma delas adota a ISO 14000. Há um setor de P&D, relacionado ao desenvolvimento do processo e do produto, para avaliar novas embalagens, por exemplo, e, também um setor para assegurar a qualidade, ou seja, para avaliar as falhas do processo, principalmente por meio da reclamação do consumidor, quanto à padronização, degustação, embalagem, volume e quantidade do líquido, entre outros. 4.7. Distribuição

Assim como acontecia na Antarctica e Brahma, a maior parte da produção de cerveja é destinada ao mercado interno. Apenas 5% são exportados para Europa, Bolívia (cuja garrafa é diferenciada, com procedência da cerveja de Cuiabá), Paraguai (cerveja em lata – Urufino, cujas características são idênticas à da cerveja Brahma, que é exportada a partir de Agudos). Na América do Sul, em geral, as garrafas são de 970 ml com embalagem e rótulo distintos do

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que é vendido internamente. O custo de distribuição própria é conhecido e o de terceiros é estimado com base em tabela padrão. 4.7.1. Distribuidores Terceirizados

Antes da criação da Holding das empresas a cadeia de distribuição apresentava-se muito pulverizada e basicamente gerenciada por terceiros. Havia 800 revendedores da Brahma e 500 da Antarctica. Atualmente existem 400 revendedores na AmBev.

Os contratos de distribuição eram do tipo perpetuidade por ser uma forma de alinhar os incentivos dos agentes. Estes tipos de contrato favoreciam investimentos específicos e vigoravam a mais de 100 anos nos EUA. Contudo, com o aumento da capacidade de monitoramento pelo principal, esses contratos tornaram-se um entrave à cadeia de bebidas porque muitos distribuidores eram ineficientes e impediam que bons atuassem no mercado. Assim, as empresas, embrionariamente na Brahma e mais acentuadamente na AmBev, passaram a negociar estes contratos intermediando a aquisição de distribuidores menos eficientes pelos mais eficientes, prestando assistência (consultoria) à administração de negócios menos lucrativos e, até mesmo, comprando ativos de distribuidores à margem do processo. A conseqüência desta consolidação é que a força de distribuição da AmBev tornou-se mais eficiente, agressiva e cada agente trabalha com escala maior.

Mapeando-se as competências e tecnologias envolvidas no seu processo de distribuição, a AmBev pode fazer as escolhas corretas, minimizando seus custos de transação. Segundo Williamson (1985), o que se deve buscar é a Fronteira de Eficiência, isto é, a escolha do que deve ser feito internamente ou adquirido no mercado.

A AmBev tem decidido em algumas situações passar a fazer a distribuição dos seus produtos ao invés de contar com distribuição terceirizada, o que está condizente com o objetivo de minimizar os custos de transação, minimizando os custos globais de operação do negócio, conforme exposto por Williamson (1985).

O processo de consolidação de distribuidores é, obrigatoriamente, lento porque existe uma seqüência de aquisições. É preciso que a eficiência e a escala cresçam simultaneamente. Em um processo demasiadamente apressado, podem emergir gigantes ineficientes, fato que prejudicaria o trabalho da nova rede de distribuição. Além disso, a parte que dispõe de seus ativos deve sair satisfeita do negócio, caso contrário, pode encerrar seu contrato com AmBev e iniciar outro com a concorrência, o que seria extremamente indesejado.

Para amenizar os impactos durante a fase de transição, foi criado um sistema diferenciado de remuneração de distribuidores grandes e pequenos e ajustada à estrutura de custos dos mesmos. Contudo, não é possível manter esta política perpetuamente porque estimula a ineficiência, devendo se encerrar em breve. Hoje, os novos contratos que estão sendo firmados na AmBev já prevêem cláusulas de sucessão.

É interessante ressaltar que cada distribuidor antes da criação da Holding, trabalhava com produtos da Brahma ou da Antarctica. No contexto atual, esta regra não é mais válida para refrigerantes. No entanto, a estratégia permanece válida para as marcas de cerveja: Antarctica ou Brahma ou Skol, pois se objetiva garantir a coexistência das três marcas no mercado. Caso contrário, o distribuidor teria interesse em adquirir apenas o produto que lhe garantisse a maior margem e as outras dois marcas sucumbiriam, deixando nichos de mercados a serem atendidos por empresas concorrentes. 4.7.2. Problema de Alinhamento de Estratégias na Cadeia Produtiva

A remuneração do distribuidor é uma porcentagem do valor faturado. Logo, é de seu interesse vender produtos de maior valor agregado. O mercado de latas, por sua vez, tem maior valor agregado, conseqüentemente é o mercado que o distribuidor tem interesse em desenvolver. Pelo lado da indústria, a lata é uma embalagem mais cara, chegando a custar cerca de 70% do produto. Para não aumentar demasiadamente o preço do produto final, a

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indústria é pressionada a diminuir sua margem. Logo, “o melhor dos mundos para o distribuidor, é o pior dos mundos para a fábrica”, segundo Edson Carlos de Marchi. 4.7.3. Distribuição Própria

A implementação de revendas próprias foi um plano iniciado na extinta Brahma. Esta possuía distribuidoras próprias para revendas em mercados chaves, nos estados de Minas Gerais, Rio Grande do Sul, Rio de Janeiro e São Paulo. A lógica da revenda própria é atender a grandes clientes como supermercados e cadeias de restaurantes sem necessitar da presença do intermediário, com conseqüente diminuição dos custos de transação. Esta nova oportunidade de negócio para a indústria de bebida surgiu em função do aumento do mercado de cerveja e refrigerantes no Brasil. O volume de líquido comercializado pelos supermercados, por exemplo, teve expansão recente. Este fato significa, aos olhos do revendedor, que não existe concorrência entre distribuição própria e terceirizada. Isto é, seu portfólio de clientes não se alterou. Esta é a lógica que explica o convívio pacífico entre “potenciais” concorrentes. Hoje, a revenda própria corresponde a 30-35% das vendas, mas o objetivo é expandir sua atividade para até 50%.

Um possível caso de concorrência entre as duas estratégias é o de pequenos varejistas de bebidas que se aprovisionam em promoções de supermercados. Como as grandes redes negociam imensos volumes com a AmBev, conseguem bons descontos e são capazes de ofertar o produto mais em conta que o distribuidor. Portanto, a estratégia da AmBev para conciliar interesses de ambas as partes é estimular o bar/restaurante a formar estoques antes da promoção no supermercado. Assim o distribuidor terceirizado não perde sua venda e a rede de distribuição pode atrair clientes finais com descontos promocionais.

O atendimento de grandes clientes pode ocorrer sem contratos formais, tal como ocorre com hipermercados, ou então através de contratos, como acontece com os clientes chave institucionais, como as companhias aéreas e Mac Donald's.

A revenda terceirizada compra e retira a mercadoria diretamente da fábrica, não tendo qualquer relação com a revenda própria. Muito embora, existam planos de companhia de criar centros de distribuição intermediários que facilitem o transporte para o cliente institucional, bem como para a revenda terceirizada.

Em casos excepcionais há revendas terceirizadas que atendem grandes clientes, mas esta transação é característica de cidades de menor porte.

Produtos como cerveja, refrigerante, Lipton, Marathon e água entram na mesma rede de distribuição. O suco do McDonalds é produzido pela AmBev, mas tem cadeia de distribuição particular. 4.8. Software para Gestão

Para a gestão administrativa da empresa, foi adotado o SAP que atualmente é adotado por 95% das cervejarias do mundo. Como a Antarctica já o utilizava, foi necessário apenas redesenhá-lo para atender as novas necessidades da empresa. A Brahma usava o software Magnum Datasul.

Na área de logística também se optou pelo software utilizado pela Antarctica, o Synquest, para gerenciamento estratégico (que diz respeito a apenas um dos três módulos existentes no programa). A Brahma possuía gerenciamento apenas em nível tático, com um software especificamente desenvolvido para ela. Ainda está em estudos a implantação do sistema de gestão de transporte para monitorar a roteirização e determinar os lotes econômicos, entre outros. Para a gestão de recursos humanos a AmBev adquiriu apenas o módulo de gestão do software Peoplesoft. 4.9. Recursos Humanos

Após a criação da Holding, poucas fábricas foram fechadas, mas houve reestruturação interna e enxugamento do quadro de funcionários porque havia dualidade de cargos, principalmente de gerentes e diretores. A fim de amenizar essa situação constou das

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recomendações do CADE que a AmBev assistisse aos demitidos oferecendo treinamento, recolocação no mercado de trabalho, fornecendo cestas básicas e seguro saúde. 4.10. Ganhos já Obtidos com a Criação da AmBev

Os principais benefícios provenientes da criação da Holding até o momento foram os seguintes: ganho de mercado de refrigerantes da ordem de 2 a 3% (não foram verificados ganhos de mercado para as cervejas11) e ganhos operacionais.

Os maiores ganhos com redução nos custos de fábrica estão relacionados ao processo de produção, principalmente com o melhor aproveitamento da energia, da água e da mão-de-obra. No ano de 2000 verificou-se na AmBev redução da ordem de 1% no custo da matéria-prima e de 10% de mão-de-obra. No entanto, houve um aumento de 9% no custo das embalagens.

A empresa já está fortalecendo as suas operações com a Argentina e Venezuela no mercado de cerveja. No final de 2000 foram compradas duas cervejarias no Uruguai e em 2001 foi adquirida uma no Paraguai. Apesar disso não há expectativas de aumento do mercado de cervejas para 2002. De acordo com o Sindicerv (citado em Agestado, 2001b), o principal fator que pode estar desestimulando esse segmento é a cobrança de elevada carga tributária no Brasil (61% do faturamento do setor é destinado ao pagamento de impostos, ICMS, IPI e Cofins), sendo que corresponde à maior arrecadação da economia (5,1%), acima inclusive de tabaco e automóveis.

Com relação aos refrigerantes já está sendo exportado o xarope de Pepsi e há também a produção de guaraná Antarctica numa franqueada da Pepsi em Portugal. Estão sendo realizadas negociações com outros países (entre eles, os EUA), mas ainda não foi fechado nenhum acordo.

Houve a introdução de duas linhas de latas nas fábricas de São Paulo e Jaguariúna e na fábrica de refrigerantes em Teresina e de linha de vidro retornável no Rio Grande do Sul, com relação aos investimentos efetuados pela AmBev.

Após a criação da Holding das empresas houve redução relativa de gastos com propaganda e marketing e um direcionamento do seu investimento para os novos produtos, principalmente em relação ao guaraná (Sukita, por exemplo), uma vez que o mercado de cerveja está consolidado. Além disso, houve aumento no investimento em marketing do guaraná Antarctica e diminuição do guaraná Brahma.

Houve também uma alteração nas agências contratadas para realizar essas atividades, prevalecendo as que eram utilizadas pela Brahma (Pastore, F. Nasca, entre outras) e não a DM9 (adotada pela Antarctica). Além disso, cada marca passou a ter uma gerência exclusiva.

5. CONCLUSÕES O estudo de caso da empresa multinacional brasileira AmBev mostrou-se muito enriquecedor, pois foi resultado de um processo de negociações tanto entre as empresas, como com o CADE, a fim de estabelecer diretrizes a curto e médio prazo para que se viabilizasse essa criação da Holding entre as empresas Brahma e Antarctica. Apesar de estar atuando há praticamente dois anos no mercado, a AmBev teve que se estruturar rapidamente para que não perdesse o market share que as duas empresas já haviam conquistado e também teve que direcionar melhor seus investimentos para expandir suas marcas no mercado interno e se inserir no exterior, como é o caso da marca premium Bohemia, que teve investimentos significativos em marketing em 2001.

Dentro do processo de reestruturação há alguns pontos positivos que devem ser ressaltados, destacando-se: ganho em escala, principalmente na relação com fornecedores, com conseqüente redução nos preços dos insumos em função do maior volume transacionado, e distribuidores dos produtos, com alteração das relações, com perspectivas positivas na implementação de revendas próprias, mais diretamente relacionada aos consumidores;

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produção cruzada, permitindo o melhor aproveitamento das fábricas, pois atualmente todas têm condições de produzir qualquer uma das marcas, Antarctica, Brahma e Skol, com possibilidade de reduzir a ociosidade das máquinas. Outro aspecto interessante a acrescentar diz respeito aos parâmetros utilizados pela AmBev para fazer a sinergia entre as duas empresas, a fim de minimizar os riscos e desperdícios advindos das duas estruturas combinadas. Primeiramente, ao enxugar o número total de unidades de fábrica em todo o Brasil, procurou-se otimizar a localização de cada uma delas, descartando apenas as que não atendiam aos requisitos econômicos exigidos pela nova empresa. Em relação aos softwares de gerenciamento da cadeia produtiva, procurou-se utilizar os que já estavam instalados em pelo menos uma das empresas, optando-se pelos mais aperfeiçoados ou mais próximos dos padrões internacionais, apenas adaptando-os para a nova estrutura, reduzindo assim seus custos nessa área.

No entanto, a consolidação de seus produtos exige um investimento contínuo, principalmente, pois há, tanto no mercado interno quanto no externo, empresas concorrentes de grande porte, e destas há grandes players no segmento de cervejas. Por outro lado, para os consumidores é interessante que haja esse acirramento competitivo, com empenho cada vez maior em diversificação dos produtos e melhoria de sua qualidade.

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1 Os temas abordados nas entrevistas foram divididos em: o ambiente antes da criação da Holding das duas empresas, os impactos na cadeia de suprimentos, ferramenta de apoio à decisão utilizada para avaliar a criação da Holding, influência do CADE no processo. Todas as entrevistas foram realizadas nas dependências da FEA/USP. Os profissionais da AmBev entrevistados foram: Edson Carlos de Marchi, diretor de Planejamento Estratégico da Companhia de Bebidas das Américas (AmBev); Marcelo Ferreira, departamento de Planejamento Estratégico da Companhia de Bebidas das Américas (AmBev). 2 As informações referentes aos processos de fabricação de refrigerante e cerveja foram suprimidas do texto devido ao limite de páginas para submissão do artigo. 1 A AmBev detém as etapas de produção, distribuição, venda e controle de qualidade do refrigerante; o marketing é feito pela própria empresa Pepsi. 2 partir da compra da resina, há nas fábricas as etapas de injeção e depois soprador. 3 Os agentes não têm incentivos para investir na consolidação da marca em caso de investimentos realizados por outras empresas, por não serem passíveis de exclusividade. 4A compra da Cerveceria y Malteria Paysandu, no Uruguai, foi a única mudança que ocorreu após a criação da Holding. 5De acordo com Agestado (2001a), as fábricas de Manaus, Cuiabá, Ribeirão Preto, Camaçari, Getúlio Vargas, Simões Filho e 5 unidades produtoras da Bavária foram fechadas por imposição do CADE; As de Belém e de São Paulo tiveram sobreposição na produção de refrigerante entre as fábricas da Antarctica e Brahma. 6A capacidade de produção utilizada como referência para o sistema de otimização foi a do ano de 1999 (com dados até setembro desse ano e com projeções de demanda para os três meses restantes) e correspondeu ao mix potencial das fábricas, uma vez que o processo de produção de cerveja Antarctica levava em torno de 18 dias e da Brahma, 15 dias, portanto, obtendo-se lead time de 15-16 dias. 7Neste caso deve-se considerar as distâncias entre as fábricas e os centros de distribuição, uma vez que, por exemplo, a cerveja pode ser transportada até aproximadamente 1500 km sem que a qualidade do produto seja afetada. No caso dos refrigerantes em embalagens de PET, acima de 500 km há perda de gás e estabilidade, no entanto, essa distância não foi considerada para otimizar a localização das fábricas. Como essa otimização ficou restrita ao nível estratégico, visando apenas com a abertura e fechamento das fábricas, outras variáveis não foram consideradas na análise, como o nível de serviço, que foi inserido no custo de frete e os seus problemas específicos foram resolvidos dentro do custo operacional. 81 hectolitro eqüivale a 100 litros. 9Apesar disso foi comentado que no final de 2000 houve crescimento de 6% no mercado de cerveja e de 10% no de refrigerantes.