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O Sermão de Santo António aos Peixes foi proferido na cidade de São Luís do Maranhão em 1654, na sequência de uma disputa com os colonos portugueses no Brasil. O Sermão de Santo António aos Peixes constitui um documento da surpreendente imaginação, habilidade oratória e poder satírico doPadre António Vieira, que toma vários peixes (o roncador, o pegador, o voador e o polvo) como símbolos dos vícios daqueles colonos. Com uma construção literária e argumentativa notável, o sermão pretende louvar algumas virtudes humanas e, principalmente, censurar com severidade os vícios dos colonos. Este sermão (alegórico) foi pregado três dias antes de Padre António Vieira embarcar ocultamente (a furto) para Portugal, para obter uma legislação justa para os índios. Todo o sermão é uma alegoria, porque os peixes são uma metáfora dos homens. Capítulo I[editar | editar código-fonte] Exórdio: No capítulo I fica-se a conhecer o conceito predicável (VOS ESTIS SAL TERRAE),"Vós Sois o Sal da Terra". Este conceito vai ser encaminhador para todo o sermão (alegórico). O sal representa a palavra de Deus e terra significa os Homens que habitam na terra. O efeito do Sal é preservar o bem e impedir a corrupção. Padre António Vieira faz ainda referência a Cristo Senhor para reforçar e dar credibilidade às suas palavras. Capítulo II[editar | editar código-fonte] Exposição e confirmação: Temos os louvores aos peixes em geral: bons ouvintes, obedientes, tranquilos, devotos e prudentes Capítulo III[editar | editar código-fonte] Vos, diz Chriſto Senhor noſſo, fallando com os Prègadores, ſois o ſal da terra: & chama-lhe ſal da terra, porque quer que façaõ na terra, o que faz o ſal. O effeito do ſal he impedir a corrupção, mas quando a terra ſe vê taõ corrupta como eſtá a noſſa, havendo tantos nella, que tem officio de ſal, qual ſerá, ou qual pòde ſer a cauſa deſta corrupção? Ou he porque o ſal naõ ſalga, ou porque a terra ſe não deyxa ſalgar.Sermão de Santo Antonio aos Peixes (1654)

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O Sermão de Santo António aos Peixes foi proferido na cidade de São Luís do

Maranhão em 1654, na sequência de uma disputa com os

colonos portugueses no Brasil.

O Sermão de Santo António aos Peixes constitui um documento da surpreendente

imaginação, habilidade oratória e poder satírico doPadre António Vieira, que toma

vários peixes (o roncador, o pegador, o voador e o polvo) como símbolos dos vícios

daqueles colonos.

Com uma construção literária e argumentativa notável, o sermão pretende louvar

algumas virtudes humanas e, principalmente, censurar com severidade os vícios

dos colonos. Este sermão (alegórico) foi pregado três dias antes de Padre António

Vieira embarcar ocultamente (a furto) para Portugal, para obter uma legislação justa

para os índios.

Todo o sermão é uma alegoria, porque os peixes são uma metáfora dos homens.

Capítulo I[editar | editar código-fonte]

Exórdio: No capítulo I fica-se a conhecer o conceito predicável (VOS ESTIS SAL

TERRAE),"Vós Sois o Sal da Terra". Este conceito vai ser encaminhador para todo o

sermão (alegórico). O sal representa a palavra de Deus e terra significa os Homens

que habitam na terra. O efeito do Sal é preservar o bem e impedir a corrupção. Padre

António Vieira faz ainda referência a Cristo Senhor para reforçar e dar credibilidade às

suas palavras.

Capítulo II[editar | editar código-fonte]

Exposição e confirmação:

Temos os louvores aos peixes em geral: bons ouvintes, obedientes, tranquilos,

devotos e prudentes

Capítulo III[editar | editar código-fonte]

“Vos, diz Chriſto Senhor noſſo, fallando com os Prègadores, ſois o ſal da terra: & chama-lhe ſal da

terra, porque quer que façaõ na terra, o que faz o ſal. O effeito do ſal he impedir a corrupção,

mas quando a terra ſe vê taõ corrupta como eſtá a noſſa, havendo tantos nella, que tem officio de

ſal, qual ſerá, ou qual pòde ſer a cauſa deſta corrupção? Ou he porque o ſal naõ ſalga, ou porque

a terra ſe não deyxa ſalgar.”

— Sermão de Santo Antonio aos Peixes (1654)

Peixe de Tobias

Cura a cegueira

"(...) sendo o pai de Tobias cego, aplicando-lhe o filho aos olhos um pequeno

do fel, cobrou inteiramente a vista;"

Expulsa os demónios

"(...) tendo um demónio chamado Asmodeu morto sete maridos a Sara, casou

com ela o mesmo Tobias; e queimando na casa parte do coração, fugiu dali o

demónio e nunca mais tornou;"

Rémora

Um peixe pequeno mas tem muita força. Representa a força da palavra de

Santo Antonio.

A fraqueza e nada com que luz

"(...) se se pega ao leme de uma nau da índia (...) a prende e amarra mais que

as mesmas âncoras, sem se poder mover, nem ir por diante."

"Oh se houvera uma rémora na terra, que tivesse tanta força como a do mar,

que menos perigos haveria na vida, e que menos naufrágios no mundo!"

"(...) a virtude da rémora, a qual, pegada ao leme da nau, é freio da nau e leme

do leme"

Apenas é comparável à língua de Santo António, que serve

de guia às pessoas.

Torpedo

Peixe que faz descargas eléctricas para se defender. Representa a

conversão.

Faz abanar, faz passar a dout, o bom e a virgindade do

Espírito Santo

"Está o pescador com a cana na mão, o anzol no fundo e a bóia sobre a água,

e em lhe picando na isca o torpedo, começa a lhe tremer o braço. Pode haver

maior, mais breve e mais admirável efeito? De maneira que, num momento,

passa a virtude do peixezinho, da boca ao anzol, do anzol, à linha, da linha à

cana e da cana ao braço do pescador"

Faz t(r)emer os pe(s)cadores

Quatro Olhos

Vê para cima e para baixo. Representa a capacidade de

distinguir o bem do mal (céu/inferno).

A Vigilância, providência

"Esta é a pregação que me fez aquele peixezinho, ensinando-me que, se tenho

fé e uso da razão, só devo olhar direitamente para cima, e só direitamente para

baixo: para cima, considerando que há Céu, e para baixo, lembrando-me que

há Inferno" (Senão por amor a Deus (cima), então, por repúdio ao inferno

(baixo))

Capítulo V[editar | editar código-fonte]

Neste capítulo faz-se repreensões aos peixes em

particular, que representam os diversos defeitos humanos:

- Os Roncadores: Soberba, Orgulho.

Muita arrogância, pouca firmeza.

- Os Pegadores: Parasitas.

Vivem na dependência dos grandes, morrem com eles.

- Os Voadores: Presunção, Ambição.

Foram criados peixes e não aves

- O Polvo: Traição.

Ataca sempre de emboscada porque se disfarça,

comparado a Judas

Pregado em São Luís do Maranhão, a 13 de Junho de 1654, três dias antes de se embarcar ocultamente para o Reino. Revela fina ironia, riqueza nas sugestões alegóricas e agudo senso de observação sobre os vícios e vaidades do Homem, comparando-o através de alegorias, aos peixes.                 Critica a prepotência dos grandes que, como peixes, vivem do sacrifício de muitos pequenos, os quais "engolem" e "devoram". O alvo são os colonos do Maranhão, que no Brasil são grandes, mas em Portugal "acham outros maiores que os comam, também, a eles."                Censura os soberbos (=rocandores), os pregadores (=parasitas); os ambiciosos(=voadores); os hipócritas e traidores (= polvos).                "O polvo com aquele seu cabelo na cabeça, parece um monge; com aqueles seus ralos estendidos, parece uma estrela; com aquele não ter osso nem espinha, parece a mesma brandura, a mesma mansidão. E debaixo dessa aparência tão modesta ou dessa hipocrisia tão santa, testemunham constantemente (...) que o dito polvo é o maior traidor do mar."                É muito conhecido o exórdio deste sermão, que permite estabelecer  a unidade

e a circularidade do argumento, que volta sempre o ponto inicial, o conceito predicável: "Vós sois o sal da terra",Vos estis sal terrae. S. Mateus, V, l3.

Exórdio - Capítulo 1

Neste primeiro capítulo, mais conhecido por exórdio (a introdução), o Padre António Vieira expõe o tema e as questões centrais que vai defender, bem como o plano estrutural do seu sermão.

Vieira, a partir do conceito predicável “Vós sois o sal da terra”, em analogia com “Santo António [que] foi sal da terra e foi sal do mar”, visa criticar a humanidade que está cada vez mais corrupta. Quando ele sugere que a culpa se encontra no sal refere-se aos pregadores que proferem uma coisa e depois agem de outra forma, ou então afirma que a culpa se encontra na terra, referindo-se assim aos ouvintes uma vez que estes não ligam às palavras da verdadeira doutrina.

Visto que o Padre António Vieira não obtinha os efeitos desejados da sua pregação decidiu deixar de pregar aos homens e preferiu antes dirigir-se aos peixes, tal como Santo António já o fizera.

No princípio Vieira vai realçar e apreciar as virtudes dos peixes, mas em seguida irá apontar-lhes os defeitos de modo a tentar corrigi-los.

Síntese:Neste capítulo, Vieira critica a humanidade, que está cada vez mais

corrupta, e os pregadores que, havendo tantos, não conseguem alcançar os seus objetivos. Utiliza as expressões “sal” para os pregadores e “terra” para os ouvintes. Exceção para Santo António, que Vieira admira bastante e do qual aborda a história ocorrida com este em Arimino, onde pregava aos hereges e foi alvo da tentativa de apedrejamento por parte destes.

Exposição

Capítulo II – Louvor das virtudes dos peixes, em geralNeste capítulo serão criticados os homens por analogia com os

peixes, como está expresso nesta passagem irónica: “Ao menos têm os peixes duas boas qualidades de ouvintes: ouvem e não falam”. Vieira deixa bem claro que este sermão é uma alegoria, referindo-se frequentemente aos homens. Os peixes ora serão, metaforicamente, os índios ora os colonos.

Neste capítulo, pois, o pregador pretende repreender os vícios dos homens, opostos às virtudes dos peixes.

Louvor das virtudes, em geral :- “ouvem e não falam”;

- “vós fostes os primeiros que Deus criou”;

- “e nas provisões [...] os primeiros nomeados foram os peixes”;

- “entre todos os animais do mundo, os peixes são os mais e os maiores”;

- “aquela obediência, com que chamados acudistes todos pela honra de vosso Criador e Senhor”;

- “aquela ordem, quietação e atenção com que ouvistes a palavra de Deus da boca do seu servo António. [...] Os homens perseguindo a António [...] e no mesmo tempo os peixes [...] acudindo a sua voz, atentos e suspensos às suas palavras, escutando com silêncio [...] o que não entendiam."

- “só eles entre todos os animais se não domam nem domesticam”

Síntese:Vieira inicia a exposição com uma pergunta retórica: “Enfim, que

havemos de pregar hoje aos peixes?” e de seguida indica a estrutura do sermão: “dividirei, peixes, o vosso Sermão em dois pontos: no primeiro louvar-vos-ei as vossas atitudes, no segundo repreender-vos-ei os vossos vícios” (ll. 23-24).

O resto do capítulo é abordado por Vieira com as virtudes gerais dos peixes.

Capítulo III – Louvor das virtudes dos peixes, em particularNo capítulo III (considerado por alguns, o 1º momento

da confirmação), Vieira continua a elogiar os peixes, mas desta vez os seus louvores aos peixes são individualizados, visam peixes em particular.

Vieira utiliza quatro tipo de peixes para comprovar a relação entre o homem e o divino.

O Santo Peixe de Tobias, peixe bíblico, grande em tamanho, possui nas suas entranhas um fel que cura da cegueira e um coração que expulsa os demónios («o fel era bom para curar da cegueira», «o coração para lançar fora os demónios» ); representa as virtudes interiores, a bondade, e o poder purificador da palavra de Deus.

A Rémora, peixe tão pequeno no corpo e tão grande na força e no poder, quando se prende a um navio tem força razoável para a segurar ou determinar o seu rumo («se se pega ao leme de uma nau da Índia […] a

prende e a amarra mais que as mesma âncoras, sem se poder mover, nem ir por diante.»); expressa a força ou o poder da palavra dos pregadores: a língua de S. António era uma rémora na terra – tinha força para dominar as paixões humanas como a soberba, a vingança, a cobiça e a sensualidade (as quatro naus do sermão).

O Torpedo origina descargas elétricas que acabam por fazer oscilar o braço do pecador («Está o pescador com a cana na mão, o anzol no fundo e a boia sobre a água, e em lhe picando na isca o torpedo, começa a lhe tremer o braço. Pode haver maior, mais breve e mais admirável efeito?»); simboliza o poder da palavra de Deus, em converter, em fazer o ser humano arrepender-se.

O Quatro-olhos contém dois pares de olhos, uns para cima e outros para baixo («e como têm inimigos no mar e inimigos no ar, dobrou-lhes a natureza as sentinelas e deu-lhes dois olhos, que direitamente olhassem para cima, para se vigiarem das aves, e outros dois que direitamente olhassem para baixo, para se vigiarem dos peixes.»); simbolizam a visão, a iluminação: o cristão tem o dever de tirar os olhos da vaidade terrena, olhando para o céu, e sem esquecer o inferno.

SínteseTodos estes elogios que o Padre António Vieira tece aos peixes são o

contraponto dos defeitos dos homens, evidenciando assim os vícios destes.

Os quatro peixes, o Santo Peixe de Tobias, a rémora, o torpedo e o quatro-olhos possuem características que na sua totalidade se podem identificar com as principais virtudes de Santo António.

Capítulo IV – Repreensão dos vícios dos peixes, em geralNeste capítulo, Vieira repreende os peixes em geral, criticando neles

comportamentos condenáveis nos homens.

O pregador confirma a tese de que os homens se comem uns aos outros, dando o exemplo dos peixes.

- «[...] é que vos comedes uns aos outros.»

- «Não só vos comeis uns aos outros, senão que os grandes comem os pequenos.»

- «Se os pequenos comeram os grandes, bastara um grande para muitos pequenos; mas como os grandes comem os pequenos, não bastam cem pequenos, nem mil, para um só grande.»

Capítulo V – Repreensão dos vícios dos peixes, em particularNeste capítulo do sermão, o pregador censura quatro criaturas

marinhas em particular; estas simbolizam os pecados ou vícios humanos condenáveis.

Os Roncadores, peixes pequenos e que emitem um som grave, são sempre facilmente pescados e apesar de serem pequenos têm muita língua («É possível que sendo vós uns peixinhos tão pequenos, haveis de ser as roncas do mar?»). Representam a arrogância e o orgulhoso. Encontramos esse comportamento em personagens como S. Pedro, Golias, Caifás e Pilatos, em contraste com Santo António que tinha saber e poder, mas não se vangloriava.

Os Pegadores, pequenos e que se fixam a peixes grandes ou ao leme dos navios («Pegadores se chamam estes de que agora falo, e com grande propriedade, porque sendo pequenos, não só se chegam a outros maiores, mas de tal sorte se lhes pegam aos costados, que jamais os desferram.»). Representam o oportunismo, o parasitismo social e a subserviência. Uma vez que vivem na dependência dos grandes e morrem com eles, Vieira argumenta que os grandes morrem porque comeram, os pequenos morrem sem terem comido. Na humanidade, encontramos os seguidores de Herodes. Santo António «pegou-se» apenas a Cristo e seguiu-O.

Os Voadores, peixes de grandes barbatanas que saltam para fora de água como se voassem. Representam o defeito da presunção e da ambição desmedida e desse modo, porque não se contentam com o seu elemento, são pescados como peixes e caçados como aves («Dizei-me, voadores, não vos fez Deus para peixes? Pois porque vos meteis a ser aves? [...] Contentai-vos com o mar e com nadar, e não queirais voar, pois sois peixes.») . Simão Mago e Ícaro exemplificam-no entre os homens. Por contraste, Santo António tinha sabedoria e poder, mas não se vangloriou.

O Polvo, detentor de um «capelo», tentáculos, um corpo mole e podendo camuflar-se, é considerado um hipócrita e traidor pois utiliza a capacidade mimética (varia a sua coloração e a sua forma, de acordo com o meio em que se encontra) para atacar os peixes desprevenidos («E debaixo desta aparência tão modesta, ou desta hipocrisia tão santa [...] o dito polvo é o maior traidor do mar.»).Entre os homens, encontramo-lo em Judas. Mais

uma vez, por contraste, Santo António foi sincero e verdadeiro - nunca enganou.

O sermão é,pois, todo ele feito de alegorias, simbolizando os vícios dos colonos do Brasil ("peixes grandes que comem os pequenos") em vários peixes: o roncador (o orgulhoso), voador (o ambicioso), pegador (o parasita) e o polvo (o traidor, mais traidor que o próprio Judas).

  

Peroração – capítulo VI

Neste capítulo, mais conhecido por peroração ou conclusão, o pregador visa um desfecho forte, de modo a impressionar o auditório e levá-lo a pôr em prática os conselhos recebidos.

O Orador diz não ter atingido o fim para que Deus o criou, ter inveja dos peixes e estar a ofender a Deus. Em contraste, encontram-se os peixes que atingem o fim para que foram criados e não ofendem a Deus.

Características Gerais: ⧩ Busca de nova expressão de vida; ⧩ Conflitos: profano / sagrado; Homem / Deus; pecado / perdão; corpo / alma; matéria / espírito; ⧩ Procura da grandiosidade harmoniosa; ⧩ A variedade e o movimento na ideia espacial, por oposição à conceção estática e fechada da arte renascentista; ⧩ Conjugação da escultura com a arquitetura; ⧩ A paixão e os quadros expressivos e teatrais, com admiráveis combinações de cores; ⧩ A maravilha e o espanto;

   

Características da Literatura 

⧩ Continuidade e permanência de alguma temática e estruturas quinhentistas; ⧩ Temas fúteis e de reflexão moral, evasão ou busca da espiritualidade; ⧩ Arquitetura rebuscada, cheia de ornamentos; ⧩ Estilo rítmico e movimentado, cheio de cores poéticas ( o vermelho dos rubis, da

púrpura e das rosas; o verde das esmeraldas ou o azul do mar, do céu e das safiras…); ⧩ A alusão e os subentendidos; ⧩ As metáforas, as hipérboles e as antíteses… ⧩ A poesia como arte da palavra; ⧩ O cultismo e o Conceptismo;

  No que respeita a estes dois últimos conceitos deve-se entender por:  

Cultismo 

 conceptismo

 ⧩ Culto da forma; ⧩ Sobreposição de ornamentos; ⧩ Complexidade formal; ⧩ Rebuscamento literário; ⧩ Riqueza vocabular; ⧩ Escassez temática; ⧩ Uso exagerado dos recursos de retórica e de pensamento; ⧩ Abuso de jogos de palavras, de imagens e de construções;

⧩ Jogos de conceitos; ⧩ Enigmas e malabarismos intelectuais; ⧩ Construção mental e alegoria analógica (que correlaciona realidade e pensamento); ⧩ Elegância da subtileza;

    Vida e obra de Padre António Vieira 

De família modesta e neto de uma mestiça, António Vieira nasceu em Lisboa, em 1608. Partiu, juntamente com os pais, para o Brasil com seis anos de idade. Estudou no colégio dos Jesuítas, em Salvador da Baía, e em 1623 iniciou o noviciado na Companhia de Jesus. Propondo-se missionar entre os ameríndios e os escravos negros, estudou tupi-guarani e quimbundo. Foi ordenado sacerdote aos vinte e sete anos. Em 1641, sendo já um pregador prestigiado, regressou a Portugal e ao serviço do rei D. João IV envolveu-se diretamente na atividade política. 

Em 1652, Vieira partiu de novo para o Brasil, onde se deparou com revolta dos colonos contra a proteção da Companhia de Jesus aos Índios. A 13 de junho de 1654, o Padre António Vieira pregou o Sermão de Santo António (aos peixes), em S. Luís do Maranhão, partindo de seguida, para Portugal, em busca de “remédio para a salvação dos Índios”. 

Em 1661, foi expulso do Maranhão, bem como os restantes jesuítas, embarcando à força para Lisboa. Em 1665, Vieira foi preso pela Inquisição, sob a acusação de heresia, por acreditar nas profecias do Bandarra e vaticinar a ressurreição de D. João IV (falecido em 1656) para finalizar a concretização do sonho do Quinto Império. Apesar de todas as tentativas de defesa, foi condenado à reclusão numa casa jesuítica, em Coimbra e foi proibido de pregar. Amnistiado em 1668, partiu para Roma, onde triunfou como diplomata e pregador, nomeadamente junto da rainha Cristina da Suécia, que vivia então em Roma, e junto da própria Cúria Papal, onde moveu influências contra a Inquisição, à qual a santa Sé pediu contas sobre o modo como estavam a ser julgados os cristãos-novos. Morreu em 1697, com oitenta e nove anos de idade, dos quais cinquenta e um foram vividos em terras brasileiras. Principais obras: Sermões (oratória, prosa); Cartas (epistolografia); Esperanças de Portugal, Quinto Império do Mundo, Primeira e Segunda Vidas de El-Rei D. João IV (discurso profético); História do Futuro. Livro ante-primeiro (discurso profético); Clavis Prophetarum(discurso profético); Defesa perante o Tribunal do Santo Ofício (oratória). Nota: para uma melhor compreensão sugere-se o visionamento do filme “Palavra e Utopia”( 2000) de Manoel de Oliveira    Contexto Histórico/ Crítica Social Padre António Vieira atravessou quase integralmente um século muito fustigado por várias catástrofes e rasgado por grandes inovações. (…) Foi um período que nasceu assistindo a uma certa supremacia do mundo ibérico e que definhou dominado pela emergente Holanda, porventura a grande potência económica do tempo, pela França de Luís XIV, e pela Inglaterra. No plano dos códigos estéticos foi o século do Barroco, tendência que se infiltrou nas artes plásticas, na música na literatura, no vestuário, nos comportamentos cortesãos, nas formas de religiosidade e que se pautou por ser mais sensitiva do que racional, mais desmesurada do que contida, mais metafórica do que realista, mais ondulante do que retilínea, mais colorida do que acromática, mais espetacular do que sóbria. Foi ainda o tempo da emergência do espírito científico e do método experimental, que provocaram avanços importantes no conhecimento do mundo físico em vários domínios, graças aos trabalhos e reflexões de Galileu, Bacon, Torricelli, Kepler, Descartes e, mais tarde, Newton. (…) Em Portugal, o século foi muito agitado do ponto de vista político. Até 1640 perpetuou-se o domínio filipino da coroa portuguesa, situação herdada do século anterior, na sequência do fracasso de Alcácer-Quibir, que conduzira à conquista da coroa por parte de Filipe II de Espanha, em 1580. No 1º de dezembro de 1640, um golpe palaciano que provocou pouco sangue, repunha na mão de portugueses os destinos da monarquia e D. João IV, o primeiro rei da Casa de Bragança, assumiu o poder. (…) 

Este clima de perturbação política foi acompanhado por crescentes dificuldades económicas. (…) A dominação castelhana da coroa havia ainda legitimado ataques holandeses, franceses e ingleses, a muitos dos territórios portugueses, no Oriente, África e Brasil, ataques que se prolongaram alguns anos após a Restauração, provocando um agravamento da economia. Por outro lado, a perseguição movida pela Inquisição aos cristãos-novos, que neste século assumiu particular violência, tinha como consequência a fuga de muitos deles para o estrangeiro, transportando consigo avultados capitais. (…) Culturalmente, o período não foi de grande brilho, tendo visto empalidecer o fulgor que as Artes e Letras haviam alcançado na época do Renascimento e do Maneirismo, pese embora a pujança que a arquitetura religiosa de traça barroca assumirá, sobretudo na parte final do século, bem como a vasta produção lírica muito consumida e divulgada em algumas academias literárias então nascentes, e ainda a abundante produção parenética, talvez o género mais produtivo e apreciado no campo cultural português de então. (…) A censura, sobretudo a inquisitorial, limitava a abertura de Portugal às correntes que no estrangeiro faziam triunfar o saber científico, conhecimento aqui divulgado por poucos e habitualmente com atraso. Foi este tempo em que Vieira viveu. 

José Pedro Paiva, “António Vieira, o Percurso Biográfico”, Biblioteca Nacional, 1997    Objetivos do Sermão O sermão, o texto de que hoje dispomos, é apenas uma das partes que compunham o espetáculo teatral da pregação, onde intervinham outras unidades significativas como o espaço cénico, a iluminação, a marcação, os gestos, as entoações. A própria arquitetura barroca adotou o modelo jesuítico de igreja-salão, sem naves laterais para que o púlpito pudesse ser visto. O Sermão de Santo António aos Peixes é todo ele feito de alegorias, simbolizando os vícios dos colonos do Brasil (“peixes grandes que comem os pequenos”) em vários peixes – roncador (o orgulhoso), voador (o ambicioso), pegador (o parasita) e o polvo (o traidor, mais traidor que o próprio Judas).  Vejamos agora um esquema-síntese do Sermão de Santo António aos Peixes: 

     O estilo de Padre António Vieira O estilo de Padre António Vieira remete para uma vertente medieval que assenta na alegoria, mas também para processos conceptistas que o celebraram como um tecelão barroco, cheio de perícia em desfiar os textos bíblicos, para compor um texto novo. No entanto, Padre António Vieira tece este discurso velho, moldando-o às suas ideias, brincando com as palavras. Desta forma, nos seus sermões convivem o conceptismo e o cultismo da arte barroca, na técnica do docere, do delectare e do movere. Para esse desempenho usou:

os polissíndetos; os assíndetos; as sinédoques; as comparações; as anástrofes; as exclamações; os trocadilhos; os paralelismos anafóricos; as antíteses; a anáfora;

Capítulo IExórdio ou Introdução: exposição do plano a desenvolver e das ideias a defender (ll.1-59).

Conceito Predicável: texto bíblico que serve de tema e que irá ser desenvolvido de acordo

com a intenção e o objectivo do autor "Vos estis sal terrae".

Invocação: pedido de auxílio divino (ll.60-61).

As simetrias evidenciam e são um exemplo da estruturação do sermão um exercício mental

da grande lógica, que permitem aos ouvintes atingirem mais facilmente o objectivo da

mensagem nas respostas à justificação do facto de a terra estar corrompida e na resposta ao

que se há-de fazer ao sal que não salga e à terra que se não deixa salgar.

Para atingir a inteligência dos ouvintes, o orador usa argumentos lógicos, sucessivas

interrogações retóricas e a autoridade dos exemplos de Cristo, Santo António e da Bíblia.

Para atingir o coração dos ouvintes, usa interjeições e exclamações.

Ao relatar o que fez Santo António quando foi perseguido em Arimino usa frases curtas

(Deixa as praças, vai-se às praias…), ritmo binário, anáforas, enumeração.

É evidente que os tipos de frase têm relação directa com a entoação. A frase interrogativa

termina num tom mais alto, a declarativa num tom mais baixo, etc.

O titulo do Sermão foi retirado do milagre ou lenda que se conta a respeito de Santo António.

Este terá sido mal recebido numa pregação em Arimino, mesmo perseguido, e ter-se-á

dirigido à praia e pregado o sermão aos peixes que o terão escutado atentamente,

contrastando com os homens.

O pregador invocou Nossa Senhora porque era habitual fazê-lo e ainda porque o nome Maria

quer dizer Senhora do mar; os ouvintes do sermão eram pescadores que A invocavam na

faina da pesca.

Capítulo IIO sermão é uma alegoria porque os peixes são metáfora dos homens, as suas virtudes são

por contraste metáfora dos defeitos dos homens e os seus vícios são directamente metáfora

dos vícios dos homens. 0 pregador fala aos peixes, mas quem escuta são os homens.

Os peixes ouvem e não falam. Os homens falam muito e ouvem pouco.

O pregador argumenta de forma muito lógica. Partindo de duas propriedades do sal, divide o

sermão em duas partes: o sal conserva o são, o pregador louva as virtudes dos peixes; o sal

preserva da corrupção, o pregador repreende os vícios dos peixes. Para que fique claro que

todo o sermão é uma alegoria, o pregador refere frequentemente os homens. Utiliza

articuladores do discurso (assim, pois…), interrogações retóricas, anáforas, gradações

crescentes, antíteses, etc. Demonstra as afirmações que faz tirando partido do contraste

entre o bem e o mal, referindo palavras de S. Basílio, de Cristo, de Moisés, de Aristóteles e de

St. Ambrósio, todas referidas aos louvores dos peixes. Confirma-as com vários exemplos: o

dilúvio, o de Santo António, o de Jonas e o dos animais que se domesticam.

Virtudes que dependem sobretudo de Deus

Virtudes naturais dos peixes

• foram as primeiras criaturas criadas por Deus

• foram as primeiras criaturas nomeadas pelo

homem

• são os mais numerosos e os maiores

• obediência, quietação, atenção, respeito e

devoção com que ouviram a pregação de Santo

António

• não se domam

• não se domesticam

• escaparam todos do dilúvio porque não tinham

pecado

Os peixes não foram castigados por Deus no dilúvio, sendo, por isso, exemplo para os

homens que pouco ouvem e falam muito, pouco respeito têm pela palavra de Deus.

Evidencia-se que os animais que convivem com os homens foram castigados, estão domados

e domesticados, sem liberdade.

Animais que se Animais que vivem

domesticam presos

cavalo, boi, bugio, leões, tigres, aves que se criam e

vivem com os homens, papagaio, rouxinol, açor,

aves de rapina

rouxinol, papagaio, açor, bugio, cão, boi, cavalo,

tigres e leões

O discurso é pregado; por isso, envolve toda a pessoa do orador. Os gestos, a mímica, a

posição do corpo - a linguagem não verbal - têm um lugar importante porque completam a

mensagem transmitida.

Alguns Recursos de Estilo

A antítese Céu/lnferno, que repete semanticamente a antítese bem/mal, está ligada quer

à divisão do Sermão em duas partes, quer às duas finalidades globais do mesmo.

A apóstrofe refere directamente o destinatário da mensagem e do pregador, aproximando

os dois pólos da comunicação: emissor e receptor.

A interrogação retórica como meio de convencer os ouvintes.

A personificação dos peixes associada à apóstrofe e às atitudes dos mesmos.

A gradação crescente na enumeração dos animais que vivem próximos dos homens mas

presos.

A comparação, "como peixes na água", tem o carácter de um provérbio que significa viver

livremente.

Santo António foi muito humilde, aceitando sem revolta o abandono a que foi votado por

todos, ele que conhecia a sua sabedoria. O pregador pretende condenar os homens que

possuem vícios opostos às virtudes dos peixes.

Capítulo IIIO peixe de Tobias A Rémora O Torpedo O Quatro-Olhos

Efeitos

• sarou a cegueira do pai de Tobias

• lançou fora os demónios

• pega-se ao leme de uma nau

• prende a nau e amarra-a

• faz tremer o braço do pescador

• não permite pescar

• defende-se dos peixes

• defende-se das aves

Comparação

peixe de Tobias Rémora Torpedo Quatro-Olhos

Santo António

• alumiava e curava as cegueiras dos ouvintes

• lançava os demónios fora de casa

Santo António

• a língua de S. António domou a fúria das paixões

humanas: Soberba, Vingança, Cobiça,

Sensualidade

Santo António

• 22 pescadores tremeram ouvindo as palavras de S. António e converteram-se

o pregador

• o peixe ensinou o pregador e olhar para o Céu (para

cima) e para o Inferno (para baixo)

O pregador usa o imperativo verbal, a repetição anafórica, a exclamação, a apóstrofe, a leve

ironia ("Mas ah sim, que me não lembrava! Eu não prego a vós, prego aos peixes!").

A língua de Santo António teve a força de dominar as paixões humanas, guiando a razão

pelos caminhos do bem; foi o freio do cavalo porque impediu tantas pessoas de caírem nas

mais variadas desgraças.

ImagensElementos

Nau Soberba Nau Vingança Nau Cobiça Nau Sensualidade

Vocabulário essencial:

• substantivos• adjectivos

• verbos

• velas, vento• inchadas• desfazer, rebentavam

• artilharia, bota-fogos• abocada, acesos

• corriam, queimariam

• gáveas• sobrecarregada,

aberta• incapaz de fugir

• cerração• enganados

• perder

Efeitos do poder da língua de S. António

mão no leme a sua língua detém a fúria

a sua língua detêm a cobiça

a sua língua contêm-nos

Finalidade das interrogações

Convencer os ouvintes

Comentário sobre cada imagem

Usadas sempre com a finalidade de chamar a atenção dos ouvintes para as várias tentações que precisam ser evitadas.

A língua de Santo António foi a rémora dos ouvintes enquanto estes ouviram; quando o não

ouvem, são atingidos por muitos naufrágios (desgraças morais).

Recursos estilísticos:

Anáforas: Ah homens… Ah moradores… Quantos, correndo… Quantos, embarcados…

Quantos, navegando… Quantos na nau… A interjeição visa atingir o coração dos ouvintes; a

repetição do pronome indefinido realiza uma enumeração.

Gradações: Nau Soberba, Nau Vingança, Nau Cobiça, Nau Sensualidade; "passa a virtude do

peixezinho, da boca ao anzol, do anzol à linha, da linha à cana e da cana ao braço do

pescador." O sentido é sempre uma intensificação para mais ou para menos.

Antíteses: mar/terra, para cima/para baixo, Céu/Inferno. Palavras de sentido oposto indicam

as duas direcções do sermão: peixes - homens, bem - mal.

Comparações: "… parecia um retrato maritimo de Santo António"; o peixe de Tobias, com

um burel e uma corda, era uma espécie de Santo António do mar: as suas virtudes eram

como as de Santo António. "… unidos como os dois vidros de um relógio de areia,": o peixe

Quatro-Olhos possuía grande visão e precisão.

Metáforas: "… águias, que são os linces do ar; os linces, que são as águias da terra":

sentido de rapidez e de visão excepcional.

Conclusão: os homens pescam muito e tremem pouco; 2ª. conclusão: "Se eu pregara aos

homens e tivera a língua de Santo António, eu os fizera tremer." (Deve salientar-se que o

verbo pescar é também metáfora de guerra; crítica aos holandeses.); 3ª. conclusão: "… se

tenho fé e uso da razão, só devo olhar direitamente para cima, e só direitamente para baixo".

Os peixes são o sustento dos membros de várias ordens religiosas. Há peixes para os ricos e

peixes para os pobres. Esta distinção tem por finalidade criticar a exploração dos ricos sobre

os pobres.

Capítulo IVPara comprovar a tese de que os homens se comem uns aos outros, o orador usa uma lógica

implacável, apelando para os conhecimentos dos ouvintes e dando exemplos concretos. Os

seus ouvintes sabiam a verdade do que ele afirmava, pois conheciam que os peixes se

comem uns aos outros, os maiores comem os mais pequenos. Além disso, cita

frequentemente a Sagrada Escritura, em que se apoia. Lendo hoje este capitulo, assim como

todo o Sermão, não se pode ficar indiferente à lógica da argumentação.

As conclusões são implacáveis, pois são fruto claríssimo dos argumentos usados.

O ritmo é variado: lento, rápido e muito rápido. Quando as frases são longas, o ritmo é

repousado; quando as frases são curtas, quando se usam sucessivas anáforas nessas frases,

o ritmo torna-se vivo, como acontece no exemplo do defunto e do réu. O discurso deste

sermão, como doutros, é semelhante ao ondular das águas do mar: revoltas e vivas,

espraiam-se depois pela areia como que espreguiçando-se. Uma das características

maravilhosas do discurso de Vieira é a mudança de ritmo, que prende facilmente os ouvintes.

A repetição da forma verbal "vedes", que deverá ser acompanhada de um gesto expressivo,

serve para criar na mente dos ouvintes (e dos leitores) um forte visualismo do espectáculo

descrito.

O uso dos deícticos demonstrativos tem por objectivo localizar os actos referidos, levando os

ouvintes a revê-los nos espaços onde acontecem. A substantivação do infinitivo verbal está

também ao serviço do visualismo. O verbo deixa de indicar acção limitada para se

transformar numa situação alargada.

Há uma passagem semelhante no momento em que o orador refere a necessidade de o bem

comum prevalecer sobre o apetite particular: "Não vedes que contra vós se emalham…".

O orador expõe a repreensão e depois comprova-a como fez com a primeira repreensão: dá o

exemplo dos peixes que caem tão facilmente no engodo da isca, passa em seguida para o

exemplo dos homens que enganam facilmente os indígenas e para a facilidade com que

estes se deixam enganar. A crítica à exploração dos negros é cerrada e implacável. Conclui,

respondendo à interrogação que fez, afirmando que os peixes são muito cegos e ignorantes e

apresenta, em contraste, o exemplo de Santo António, que nunca se deixou enganar pela

vaidade do mundo, fazendo-se pobre e simples, e assim pescou muitos para salvação.

Capítulo VPeixes Defeitos Argumentos Exemplos de homens

Os Roncadores soberba

orgulho

pequenos mas muita língua; facilmente pescados

os peixes grandes têm pouca língua

muita arrogância, pouca firmeza

Pedro

Golias

Caifás

Pilatos

Os Pegadores parasitismo vivem na dependência dos grandes, morrem com eles

os grandes morrem porque comeram, os pequenos

morrem sem terem comido

Toda a família da corte de Herodes

Adão e Eva

Os Voadores presunção

ambição

foram criados peixes e não aves

são pescados como peixes e caçados como aves

morrem queimados

Simão mago

O Polvo traição ataca sempre de emboscada porque se disfarça

Judas

Comparação entre os peixes e Santo António

Peixes Santo António

Os Roncadores: soberbos e orgulhosos, facilmente

pescados

tendo tanto saber e tanto poder, não se orgulhou

disso, antes se calou. Não foi abatido, mas a sua voz

ficou para sempre

Os Pegadores: parasitas, aduladores, pescados com

os grandes

pegou-se com Cristo a Deus e tornou-se imortal

Os Voadores: ambiciosos tnha duas asas: a

e presunçosos sabedoria natural e a sabedoria sobrenatural.

Não as usou por ambição; foi considerado leigo e sem

ciência, mas tornou-se sábio para sempre

O Polvo: traidor Foi o maior exemplo da candura, da sinceridade e

verdade, onde nunca houve mentira

Episódio do Polvo

Divisão em partes:

Introdução: a aparência do polvo "O polvo… mansidão" (ll.177-179).

Desenvolvimento: a realidade "E debaixo… pedra" (ll.179-187).

Conclusão: a consequência "E daqui… fá-lo prisioneiro" (ll.187-189).

Comparação: "Fizera… traidor" (ll.190-196).

A expressão "aparência tão modesta" traduz a aparente simplicidade e inocência do polvo,

que encobre uma terrível realidade. O orador usa a ironia. A expressão "hipocrisia tão santa"

contém em si um paradoxo: a hipocrisia nunca é santa; de novo, o orador usa uma fina e

penetrante ironia: o polvo apresenta um ar de santo, mas encobre uma cruel realidade. Tem

a máscara (que é o que quer dizer em grego hipócrita), o fingimento de inofensivo.

O mimetismo é o que o polvo usa para enganar: faz-se da cor do local ou dos objectos onde

se instala.

No camaleão, o mimetismo é um artifício de defesa contra os agressores, no polvo é um

artifício para atacar os peixes desacautelados.

O orador refere a lenda de Proteu para contrapor o mito à realidade: Proteu metamorfoseava-

se para se defender de quem o perseguia; o polvo, ao contrário, usa essa qualidade para

atacar.

Os deícticos demonstrativos implicam a linguagem gestual e têm por intenção criar o

visualismo na mente dos ouvintes (leitores). A anáfora, repetição da mesma palavra em

início de frase, insiste no mesmo visualismo.

Os verbos que se referem ao polvo estão no presente do indicativo, traduzindo uma

realidade permanente e imutável; a forma "vai passando" gerúndio perifrástico, acentua a

forma despreocupada dos outros peixes que lentamente passam pelo local onde se encontra

o traidor; os verbos que se referem a Judas estão no pretérito perfeito do indicativo porque

referem acções do passado. Há ainda o imperativo "Vê", que traduz uma interpelação directa

ao polvo, tornando o discurso mais vivo.

O polvo nunca ataca frontalmente, mas sempre à traição: primeiro, cria um engano, que

consiste em fazer-se das cores onde se encontra; depois, ataca os inocentes.

O texto deste capítulo segue a variedade de ritmos dos outros capítulos e apresenta os

mesmos recursos para conseguir tal objectivo. Basta atentar no parágrafo que começa

por "Rodeia a nau o tubarão… " e no texto referente ao polvo.

Elemento comum entre Judas e o polvo: a traição. Ambos foram vítimas deste defeito.

Elementos diferentes entre Judas e o polvo: Judas apenas abraçou Cristo, outros o

prenderam; o polvo abraça e prende. Judas atraiçoou Cristo à luz das lanternas; o polvo

escurece-se, roubando a luz para que os outros peixes não vejam as suas cores. A traição de

Judas é de grau inferior à do polvo.

Capítulo VIPeroração: conclusão com a utilização de um desfecho forte, capaz de impressionar o

auditório e levá-lo a pôr em prática os ensinamentos do pregador.

Animais/Peixes Peixes Homens

foram escolhidos para os

sacrifícios

estes podiam ir vivos para os

sacrifícios

ofereçam a Deus o ser sacrificado

ofereçam a Deus o sangue e a vida

não foram escolhidos para

os sacrifícios

só poderiam ir mortos. Deus não

quer que Lhe ofereçam coisa

morta

ofereçam a Deus não ser

sacrificados

ofereçam a Deus o respeito e a

obediência

os homens também chegam mortos ao altar porque vão em pecado mortal.

Assim, Deus não os quer.

O orador quer que os homens imitem os peixes, isto é, guardem respeito e obediência a

Deus. Numa palavra, pretende que os homens se convertam(metanóia).

Orador Peixes

tem inveja dos peixes

ofende a Deus com palavras

tem memória

ofende a Deus com o pensamento

• têm mais vantagens do que o pregador

• a sua bruteza é melhor do que a razão do orador

• não ofendem a Deus com a memória

• o seu instinto é melhor

ofende a Deus com a vontade

não atinge o fim para que Deus o criou

ofende a Deus

que o livre arbítrio do orador; não falam; não ofendem a Deus com o

pensamento; não ofendem a Deus com a vontade;

atingem sempre o fim para que Deus os criou

• não ofendem a Deus

As interrogações têm por objectivo atingirem preferencialmente a inteligência, enquanto as

exclamações visam mais o sentimento dos ouvintes. As repetições põem em realce o

paralelismo entre o orador e os peixes; as gradações intensificam um sentido.

A repetição do som /ai/ (11 vezes) cria uma atmosfera sonora cada vez mais intensa e

optimista; a repetição das palavras "Louvai" e "Deus" apontam para a finalidade global

do sermão: o louvor de Deus, que todos devem prestar. O verbo no imperativo realiza a

função apelativa da linguagem: depois de ter inventariado os louvores e os defeitos dos

peixes/homens, não poderia deixar de apelar aos ouvintes para que louvem a Deus. A

escolha do hinoBenedicite cumpre fielmente esse objectivo, encerrando o Sermão com um

tom festivo, adequado à comemoração de Santo António, cuja festa se celebrava. A

palavra Ámen significa "Assim seja", "que todos louvem a Deus". O quiasmo realizado na

colocação em ordem inversa das palavras glóriae graça sugere a transposição dos peixes

para os homens: já que os peixes não são capazes de nenhuma dessas virtudes, sejam-no os

homens. Sugere também uma mudança: a conversão (metanóia), porque só em graça os

homens podem dar glória a Deus.

DISCURSO POLÍTICO

É um texto no qual se defende uma tese com base em argumentos devidamente exemplificados.

ESTRUTURA:

Introdução – Tese.

Desenvolvimento – Argumentos positivos; Argumentos negativos ou contra-argumentos, falácias (no caso dos argumentos inválidos);

Conclusão – Síntese dos argumentos.

“Sermão de Santo António aos Peixes”, Padre António Vieira

Esta obra foi proferida na cidade de São Luís do Maranhão, no ano de 1654, no decorrer de uma disputa com os colonos portugueses no Brasil. O sermão constitui um documento da surpreendente imaginação, habilidade oratória e poder de satirização do Padre António Vieira, que toma vários peixes (o roncador, o pegador, o voador e o polvo) como símbolos dos vícios daqueles colonos.

Com uma construção literária e argumentativa fantástica, o sermão tem como objetivo louvar algumas virtudes do homem, mas principalmente censurar com severidade os vícios dos colonos.

Este sermão (alegórico) foi pregado três dias antes de Padre António Vieira embarcar ocultamente (a furto) para Portugal, para obter uma legislação justa para os índios.

O sermão foi pregado no dia 13 de Junho, Dia de Santo António.

Todo o sermão é uma alegoria, pois os peixes são a personificação dos homens.

NOTAS:Alegoria – Metáforas, comparações utilizadas para concretizar um pensamento ou uma realidade abstrata.

BARROCO:O “Sermão de Santo António aos Peixes” insere-se no Barroco (séc. XVII), que se caracteriza pela utilização de contrastes, pelo pessimismo, pela presença de impressões sensoriais, pela preocupação com a duração da vida, pela linguagem erudita e trabalhada e pela tentativa da conciliação entre a religião e o racional. O Barroco é associado a exageros quer na linguagem, quer na transmissão de ideias e pensamentos e quer também na arte.

ESTRUTURA DO SERMÃO:

NOTAS:Conceito predicável – Os conceitos predicáveis consistem em «figuras» ou alegorias pelas quais se pode realizar uma pretensa demonstração de fé, ou verdades morais, ou até juízos proféticos.

EXÓRDIO – Introdução, contém a tese inicial e o ponto de vista ao qual o autor pretende fazer aderir o leitor.

No exórdio, o orador expõe o plano que vai defender baseado num CONCEITO PREDICÁVEL extraído, normalmente, da Sagrada Escritura.

No sermão, o exórdio encontra-se presente no capítulo primeiro.

Na invocação, o orador invoca o auxílio divino para a exposição das ideias.

INVOCAÇÃO – Desenvolvimento ou Corpo, apresentam-se os argumentos para apoiar ou refutar a tese inicial.

EXPOSIÇÃO E CONFIRMAÇÃO – Desenvolvimento ou Corpo, apresentam-se os argumentos para apoiar ou refutar a tese inicial.

O orador expõe o tema através de alegorias, sentenças e exemplos.

- “Ao menos têm os peixes duas qualidades de ouvintes: ouvem e não falam (…).” (CRÍTICAS POSITIVAS EM GERAL)

- “Começando, pois, pelos vossos louvores.” (CRÍTICAS POSITIVAS)

- “Assim como ouvistes os vossos louvores, ouvi também agora as vossas repreensões.”(CRÍTICAS NEGATIVAS)

DESENVOLVIMENTO

PERORAÇÃO - CONCLUSÃO, o autor do texto sintetiza os argumentos fundamentais reafirmando a importância da tese.

NO SERMÃO, A INVOCAÇÃO E A EXPOSIÇÃO/CONFIRMAÇÃO ENCONTRAM-SE NO PRIMEIRO, SEGUNDO, TERCEIRO, QUARTO E QUINTO CAPÍTULO.

No sermão, o exórdio encontra-se presente no capítulo primeiro.

CAPÍTULO PRIMEIRO: Análise e resumo

Apresentação do tema, a partir do versículo de São Mateus, “Vós sois o sol da terra”, referente aos pregadores, cuja função é “salgar”, ou seja, pregar a boa doutrina, e verificando que a terra “se não deixa salgar”, porque se encontra dominada pela corrupção, Vieira vai pregar aos peixes, à maneira de Santo António, que a eles pregou, por não ter sido atendido pelos homens.

EXÓRDIO: Linhas 1-59

CONCEITO PREDICÁVEL: “Vos estis sal terrae” (Vós sois o sal da terra)

INVOCAÇÃO: Pedido de auxílio divino (Maria, Ave Maria) - Linhas 60-61

O capítulo começa com um conceito predicável (Vós sois o sal da terra, proferido por Cristo Senhor nosso aos seus pregadores), seguindo-se a descrição da corrupção que se faz viver na Terra. É nos explicada a função do sal (impedir a corrupção) e é feita uma referência clara aos padres e pregadores (aqueles que têm o ofício do sal). É nos então colocada a questão “qual a causa da

O orador recapitula o seu discurso e usa um desfecho vibrante para impressionar o auditório e para o exortar a pôr em prática os seus ensinamentos.

NO SERMÃO, A PERORAÇÃO ENCONTRA-SE NO SEXTO CAPÍTULO.

corrupção?”. Segue-se pois um trocadilho de questões, tais como: “Será a terra que não se deixa salgar (os ouvintes não querem ouvir), ou será que os pregadores não pregam a verdadeira doutrina? Ou porque os ouvintes a ouvem, mas não praticam o que lhes é ensinado, ou porque o pregador prega a si e não a Cristo. Ou ainda, que os ouvintes ouvem, mas não servem a Cristo, antes sim aos seus apetites.” A reflexão “Ainda mal” é um sarcasmo típico do estado de espiríto do orador.

É então explicado que, se o sal não salga a terra, é porque o pregador não prega a verdadeira doutrina e por isso deve ser lançado fora como um inútil e ser pisado por todos. E à terra que não se deixa salgar, deve-se seguir o exemplo de Santo António quando pregou contra os hereges em Itália: mudar de auditório.E é isto que faz o padre António, à semelhança de Santo António, mudando de auditório, escolhendo como ouvintes os peixes ao invés dos homens, que se recusam a ouvi-lo.

O pregador invoca no final Nossa Senhora porque era habitual fazê-lo nesta época, ainda mais porque Maria quer dizer Senhora do Mar.

PROPRIEDADESSal Pregadores

Conservar Evitar a

corrupção

Louvar o bem Impedir o

mal

Vieira sabe que o mal não está só do lado dos pregadores, os ouvintes também têm as suas culpas.

A terra está corrompida

Porque a terra não se deixa salgar

(ouvintes)

Porque o sal não salga(pregadores)

CAPÍTULO SEGUNDO: Análise e resumo

Qualidades dos peixes em geral; Qualidades de Ouvintes: Ouvem e não falam; Defeitos de Ouvintes: Não se deixam converter;

Os pregadores não pregam a verdadeira doutrina;

Os pregadores dizem uma coisa e fazem outra;

Os pregadores pregam-se a si mesmos e não a Cristo.

Os ouvintes não querem receber a verdadeira doutrina;

Os ouvintes querem imitar o que os pregadores fazem e não o que eles dizem;

Os ouvintes querem servir os seus apetites em vez de servir a Cristo.

MotivoMotivos

Aos ouvintesResposta de Santo António:muda-se o auditório

Aos pregadoresResposta de Cristo:desprezar os maus pregadores

O que se há-de fazer quando não cumprem as suas funções

QUALIDADES E VIRTUDES EM GERAL:

a) "ouvem e não falam"

b) "vós fostes os primeiros que Deus criou"

c) "e nas provisões (...) os primeiros nomeados foram os peixes"

d) "entre todos os animais do mundo, os peixes são os mais e os maiores"

e) "aquela obediência, com que chamados acudistes todos pela honra de vosso Criador e Senhor"

f) "aquela ordem, quietação e atenção com que ouvistes a palavra de Deus da boca do seu servo António. (...) Os homens perseguindo a António (...) e no mesmo tempo os peixes (...) acudindo a sua voz,

O capítulo começa com duas boas qualidades dos peixes em geral: são bons ouvintes porque ouvem e não falam. Só há uma coisa que pode desmotivar um pregador, que é por não se poder converter os peixes. Mas essa dor, segundo o orador, é tão habitual e ordinária que já nem dói (aqui esta dor refere-se claramente ao fato de não ser possível converter os homens que pecam e que não têm Deus no seu coração. Por essa razão essa dor é tão ordinária, já é conhecida e já foi sentida noutras ocasiões). Por isso, o padre decide não falar em Céu ou Inferno, pois assim o sermão será menos triste, visto que as ações dos homens levam-no sempre a relembrar-se destes dois fins.

É então explicado aos peixes a função do sal. Ou as duas: conservar o são e preservá-lo para que não se corrompa. Estas duas propriedades faziam parte do Santo António também. É então dito aos peixes que o sermão será dividido em dois pontos, sendo que no primeiro serão louvados as virtudes dos mesmos, em geral e em particular e no segundo serão repreendidos os vícios dos mesmos, em geral e em particular.

São então descritas as qualidades dos peixes em geral, que se encontram resumidas e representadas no quadro que se segue:

QUALIDADES E VIRTUDES EM GERAL:

a) "ouvem e não falam"

b) "vós fostes os primeiros que Deus criou"

c) "e nas provisões (...) os primeiros nomeados foram os peixes"

d) "entre todos os animais do mundo, os peixes são os mais e os maiores"

e) "aquela obediência, com que chamados acudistes todos pela honra de vosso Criador e Senhor"

f) "aquela ordem, quietação e atenção com que ouvistes a palavra de Deus da boca do seu servo António. (...) Os homens perseguindo a António (...) e no mesmo tempo os peixes (...) acudindo a sua voz,

São obedientes (obediência), ouvem e não falam."aquela obediência, com que chamados acudistes todos pela honra de vosso Criador e Senhor"

"ouvem e não falam"

Foram os primeiros animais a serem criados."vós fostes os primeiros que Deus criou”

São os mais numerosos e os mais volumosos.

CAPÍTULO TERCEIRO: Análise e resumoQualidades dos peixes em particular;História do Santo Peixe de Tobias;Outros peixes louvados pelas suas características;

O capítulo inicia-se com o padre António a explicar que vai agora falar sobre as qualidades particulares dos peixes. Para isso conta a história do santo Peixe de Tobias , a partir de um episódio bíblico. Este peixe é dito como verdadeiramente grande nas virtudes interiores (entranhas), às quais consiste a verdadeira grandeza. Ia Tobias caminhando com o anjo Rafael quando lhe investe um peixe que o queria tragar. Tobias abre então as entranhas desse peixe, aconselhado pelo anjo que lhe diz que elas lhe servirão muito, pois o fel cura a cegueira e o coração espanta os demónios. Então o fel é usado para curar o pai de Tobias, que era até então cego. O coração foi queimado na sua casa, para espantar o demónio Asmodeu, que nunca mais tornou a voltar. O peixe de Tobias é novamente descrito como tendo um bom coração e sendo o seu fel de muito proveito. É certo que este peixe foi vestido de burel e atado a uma corda, que mais se pareceu com um retrato marítimo de Santo António (comparação clara às virtudes deste peixe e às virtudes deste homem).

Só havia uma diferença entre Santo António e este peixe: o peixe abria a boca contra quem se lavava e Santo António abria a sua contra os que não se queriam lavar.

São obedientes (obediência), ouvem e não falam."aquela obediência, com que chamados acudistes todos pela honra de vosso Criador e Senhor"

"ouvem e não falam"

Foram os primeiros animais a serem criados."vós fostes os primeiros que Deus criou”

São os mais numerosos e os mais volumosos.

Peixe Virtudes Efeitos Comparação RazõesPeixedeTobias

O fel sara a cegueira

O coração afasta os demónios

Sarou a cegueira do pai de Tobias

Lançou fora os demónios da sua casa.

Santo António

Abria a boca contra os hereges

Alumiava e curava a cegueira

Lançava os demónios

Rémora Pequena no corpo

Grande na força e no poder

Pega-se ao leme de uma nau

Impede que ela avance

Santo António

A língua de Santo António domou as paixões humanas

Torpedo Produz energia

Faz tremer o braço do pescador

Impede que o pesquem

Santo António

A língua de Santo António domou as paixões humanas

Quatro- -Olhos

Dois olhos olham para cima

Dois olhos olham para baixo

Defende-se dos peixes

Defende-se das aves

Pregador O peixe ensinou o pregador a olhar para cima (céu) e para baixo (inferno)

QUATRO-OLHOSTORPEDO

RÉMORA

CAPÍTULO QUARTO: Análise e resumoDefeitos dos peixes em geral;Comparação entre os peixes e os homens;Críticas e repreensões a estes defeitos;

O capítulo tem como principal objetivo repreender fortemente o pior defeito dos peixes, que é o de se comerem uns aos outros, e vivos ainda por cima. Apesar da circunstância, se os pequenos comessem os grandes, apenas um chegaria para muitos, mas são os grandes que comem os pequenos, sendo precisos vários destes para os alimentar. Sendo os peixes criados no mesmo elemento, cidadãos da mesma pátria e irmãos, se se comem uns aos outros estão a cometer um pecado atroz. O padre mostra os peixes o quão abominável isso é, pedindo-lhes que olhem para a cidade, onde se pode ver que os homens procuram saber como se hão de comer uns aos outros. “Ao morto, come o herdeiro, como o testamenteiro, come o legatário, o médico, o sangrador, a víuva, o coveiro, o que tange os sinos, o que lhe canta e o que o enterra. Enfim, ainda o pobre defunto o não comeu a terra (chão) e por toda a terra (pessoas) já foi comido.”

Ainda se os homens se comessem depois de mortos, pareceria menos horroroso, mas comem-se vivos!

Ainda neste capítulo, o padre pede aos peixes que lhe digam se não haverá outro meio de se sustentarem. Comerem-se uns aos outros não é estatuto da natureza, mas sim verocidade e sevícia (violência, pecado físico).

No Capítulo IV são feitas as repreensões gerais aos peixes. A primeira e grave condenação é o facto de se comerem uns aos outros e, sobretudo, os maiores comerem os mais pequenos.

(ANTROPOFAGIA SOCIAL – HOMEM COME-SE AOS SEUS SEMELHANTES)

Surge, mais uma vez, uma autoridade bíblica: Santo Agostinho. Através dele, Vieira constrói um paralelismo invertido:

Santo Agostinho Santo António

Pregava aos Homens

Exemplificava nos peixes

Pregava aos peixes

Exemplificava nos Homens

Matos e sertão Cidade

“Cuidais que só os Taquias se comem uns aos outros…”

“… muito maior açoute é o de cá, muito mais se comem os brancos.”

Vedes:

“Todo aquele bulir todo aquele andar todo aquele concorrer aquele correr e cruzar aquele subir e descer aquele centrar e sair”

“Olhai, peixes, lá do mar para a terra.”

São referidos dois exemplos: um de uma pessoa que morreu, outro de um réu no julgamento. No primeiro caso, existe uma forte crítica à exploração dos negócios que envolvem os mortos e, no segundo, ao sistema judicial. Em ambas as situações é evidente o paralelismo anafórico a nível lexical e que nos dá a imagem de um grande “banquete” em torno de uma pobre vítima.

Em forma de síntese: os Homens são como peixes que se comem uns aos outros, devoram e engolem um povo.

Neste momento é claro e direto o ataque feito aos colonos que exploram os índios, de uma forma completamente desumana.

CAPÍTULO QUINTO: Análise e resumoDefeitos dos peixes em particular;Defeitos do voador e do polvo;Defeitos dos roncador e do pegador;

O padre António queixa-se então dos peixes voadores, que querem ser aves (ambição e presunção), mas que Deus assim os fez peixes. Estes peixes queriam tanto ser aves que Deus os sujeitou tanto aos perigos das aves como dos peixes. A isto o padre recorre a um provérbio, para lembrar aos peixes para se contentarem com a sua natureza e com o seu elemento (água e não o ar): “Quem quer mais do que lhe convém, perde o que quer e o que tem. Quem pode nadar e quer voar, tempo virá em que não voe nem nade.” O padre ainda aconselha aos peixes a nadarem para o fundo, em alguma cova, e que fiquem por lá pois assim estarão protegidos e mais seguros.

“Pois tudo aquilo é andarem buscando os Homens como hão de comer, e

“Pois tudo aquilo é andarem buscando os Homens como hão de comer, e como se hão de

comer”

O nosso padre António fala então do polvo, com o seu capelo na cabeça (comparado a um monge), com os seus raios estendidos (comparado a uma estrela), com a ausência do osso e da espinha (comparado a brandura e a mansidão, ilusão); Este é considerado pelos Doutores da Igreja Latina e Grega o maior traidor do mar. Consiste a sua traição em se vestir e pintar das mesmas cores a que está pegado, para caçar a sua presa. É comparado ao camaleão, mas este usa a camuflagem para gala e o polvo para a malícia, e também comparado a Proteu, mas este último usava a profecia e o disfarce para fugir àqueles que lhe queriam mal; Finalmente, é comparado a Judas, mas é tomado como mais traidor que o que traiu Cristo, pois esse executou a sua sentença à claras e fazia dos braços sinal, mas o polvo executa a sentença às escuras e faz dos braços faz as cordas. Por isso, Judas é menos traidor que o polvo.

Finalmente, o padre afirma ter acabado os louvores e as repreensões ao seu auditório, relembrando os ofícios do sal e aconselhando os peixes a não se apegarem aos perigos da riqueza e da matéria.

PEIXES SIMBOLIZAM CARACTERÍSTICAS DE SANTO ANTÓNIORoncadores

Arrogância e orgulho

Era detentor do saber e do poder e não se vangloriava por isso

Pegadores Parasitismo e adulação

Pegou-se somente a Cristo

Voadores Ambição e presunção

Tinha asas (sabedoria) e não as usou para exibição do ser valor

Polvos Traição Esteve sempre afastado da traição, sempre houve verdade e sinceridade

VOADOR

RONCADORDescrição do polvo Comparação

CAPÍTULO SEXTO: Análise e resumoDá-se a peroração;Retoma dos argumentos utilizados, apelo aos ouvintes para que respeitem, venerem e louvem a Deus.Louvor a Deus.

Neste último capítulo, o padre António despede-se dos peixes, dizendo que eles não podem ser sacrificados a Deus pois não chegam vivos aos altares e que o seu fim é satisfazer o homem. Pede-lhe que dêem graças por não poder ofender a Deus e pede que o respeitem e lhe louvem. Que louvem a Deus por muitas coisas que ele lhos livrou. Como este auditório não é capaz de graça e glória, o seu sermão não termina em glória e em graça.

Estrutura do texto argumentativo

capeloraiosausência de ossos (realidade)

mongeestrela

branduras/mansidão (ilusão)

Conclusão: “o maior traidor do mar”

Porquê? Muda de cor

Consequência: engana inocentes e distraídos

limos = verdeareia = brancalodo = pardo

pedra = cor de pedra

Sabendo que as últimas palavras são as que ficam mais presentes no espírito dos ouvintes, o orador pretende com elas mover o auditório. Os dois principais aspetos que ele pretende salientar são: Os peixes estão acima dos outros animais. Os peixes estão acima do pregador e este sente um pouco de inveja pois apresenta um retrato dele próprio como pecador.

Exórdio Apresentação do tema e captação da atenção do auditório

Narração (Exposição) Narração/explanação dos factos

Confirmação (problematização, levantar os problemas)

Defesa da tese com argumentos

Peroração (discurso final em que se recomenda qualquer coisa)

Resumo do que foi dito e apelo à adesão dos ouvintes

Sermão de Santo António aos Peixes

Porquê o nome deste sermão dado por Padre António Vieira?

-Homenagem ao Sto. António (pregado no dia de Santo António)

-Segue o exemplo do sermão de Santo António (aos peixes)

-Tal como Sto. António tenta converter os hereges (expulsem os demónios dentro de si), também Padre António Vieira tenta fazer isso com os colonos portugueses no Brasil.

Objetivos:

-Pretende agitar as consciências (abrir os olhos), conduzir à reflexão.

-Pretende evitar o mal e preservar o bem (sal que tenta salgar)

Estrutura do Sermão de Santo António aos peixes

1. Exórdio - capítulo.I

Exórdio: Funcionalidade das perguntas retóricas, recursos expressivos, processo do distinguo e relevância das narrativas

A partir do conceito predicável "vós sois o sal da terra": "Santo António foi sal da terra e foi sal do mar."

A razão pela qual ele nos fala da corrupção no capitulo I (Exórdio) (e nós concordamos), é porque existem várias razões para tal.

Causas Responsáveis pela corrupção

Pregadores <<sal>> (conservar o bem) Ouvintes <<terra>>

“Sal””Sal que não salga”

Falsa doutrina “ Não pregam a verdadeira doutrina”

“Terra” “Terra não deixa salgar”

Recusa da verdadeira doutrina “ou não querem receber”

Palavras = comportamento ”Dizem uma coisa e fazem outra”

Imitação de comportamentos incorretos “imitar o que eles fazem”

Vaidade dos pregadores (“Se pregam a si”) Egocentrismo, satisfação das vontades (“Servem a seus apetites”)

Síntese:

Neste capítulo, Padre António Vieira critica a humanidade, que está cada vez mais corrupta, e os pregadores, que havendo tantos, não conseguem alcançar os seus objetivos. Utiliza as expressões “sal” para os pregadores e “terra” para os ouvintos. Exceção para Santo António, de quem Padre António Vieira admira bastante e aborda a história sucedida por este em Arimino, onde prega aos hereges e é tentativa de apedrejamento por parte deste anticristos.

2-Exposição-capitulo II

“Ao menos têm os peixes duas boas qualidades de ouvintes: ouvem e não falam” Ironia que crítica os Homens.

-Os peixes neste capitulo, metaforicamente, são os Índios.

Louvores em Geral dos peixes:

- "ouvem e não falam"

- "vós fostes os primeiros que Deus criou"

- "e nas provisões (...) os primeiros nomeados foram os peixes"

- "entre todos os animais do mundo, os peixes são os mais e os maiores"

- "aquela obediência, com que chamados acudistes todos pela honra de vosso Criador e Senhor"

- "aquela ordem, quietação e atencão com que ouvistes a palavra de Deus da boca do seu servo António. (...) Os homens perseguindo a António (...) e no mesmo tempo os peixes (...) acudindo a sua voz, atentos e suspensos às suas palavras, escutando com silêncio (...) o que não entendiam."

-"só eles entre todos os animais se não domam nem domesticam"

Síntese:

Padre António Vieira inicia a exposição com uma pergunta retórica “Que haveremos de pregar hoje aos peixes?” Depois indica a estrutura do sermão “dividirei, peixes, o vosso sermão em dois pontos: no primeiro louvar-vos-ei as vossas atitudes, no segundo repreender-vos-ei os vossos vícios”. O resto do capitulo é abordado por António Vieira com as virtudes dos peixes, dizendo que eram queridos de Deus, se este não gostasse de peixes de peixes não tinha criado tantos, há muitos animais grandes, mas o maior é um peixe (Baleia)… Continuando com palavras características deles: quietos, atentos…

3-Louvores em Particular capitulo III(1º momento da confirmação)

Santo Peixe de Tobias

-Peixe bíblico: equivalente a pregador/função pregador

-Grande em tamanho e das virtudes interiores

Virtudes:

- o fel sara a cegueira "o fel era bom para curar da cegueira

- o coração lança fora os demónios; "o coração para lançar fora os demónios"

Virtudes em relação a Sto António:

-coração: bom coração

-fel: palavras amargas ditas por Sto António, tentando influenciar a audiência, dizendo que nada está bem, ou as atitudes destes.

Rémora

-Espécie Natural, com qualidade que seria útil aos homens

- Tão pequeno no corpo e tão grande na força e no poder;

-Tem uma espécie de ventosa (trava a ambição dos homens)

Virtudes:

-trava o leme das naus (barcos poderosos da época dos descobrimentos)

Virtudes em relação a Sto António:

-Palavras de Santo António, que pretendem travar os vícios.

Quatro naus abordadas:

-soberbavaidade

-vingançabatalha, artilharia apontada

-cobiça

-sensualidade

Torpedo

-Espécie Natural, com qualidade que seria útil aos homens

-Metaforicamente funciona como o aviso por parte de Sto António nas suas pregações

-É um peixe modesto, não se exibe

Virtudes:

-faz tremer

Virtudes em relação a Sto António:

-Palavras de Santo António fazem tremer

Quatro Olhos

-Espécie natural, equivalente a pregador

- dois olhos voltados para cima para se vigiarem das aves;

- dois olhos voltados para baixo para se vigiarem dos peixes.

Virtudes:

-Está atento

Virtudes em relação a Sto António:

-O Santo está atento a todos os vícios e tentações

Louvores em particular:

Os quatro peixes, Santo peixe de Tobias, rémora, torpedo e quatro-olhos, possuem características que na sua totalidade se vêm a identificar com as principais características de Santo António.

1 – Contextualização de Padre António Vieira

Barroco – arte de deslumbrar e impressionar; culto da forma, como reação ao século XVI (classicismo).

Características do Barroco na Literatura:

- Continuidade da temática do séc. XVI: bucolismo, petrarquismo, amor platónico

- Permanência das características da estrutura externa das composições classicistas

- Reação ao séc. XVI: reflexão moral, evasão, busca dos prazeres espirituais, futilidade de muitos temas

- Preocupação em provocar o espanto, surpreender e aturdir o espírito à força dos ornamentos e burilamentos; arquitetura rebuscada

- Estilo rítmico e movimentado, cheio de cores poéticas: o vermelho dos rubis, da púrpura e das rosas; o verde das esmeraldas ou o azul do mar, do céu e das safiras; o branco dos lírios, das

Cultismo

- Culto da forma e sobreposição de ornamentos

- Complexidade formal e rebuscamento literário, com sacrifício da clareza do conteúdo

- Riqueza vocabular e alusão

- Uso exagerado das metáforas, das hipérboles, dos paradoxos, mas também das perífrases, das hipálages, das sinédoques, das anáforas, dos trocadilhos, dos hipérbatos, etc.

- Abuso de jogos de palavras, de imagens e de construções

Conceptismo

- Jogo dos conceitos

- Enigmas e malabarismos intelectuais

- Construção mental e alegoria analógica (que correlaciona realidade e pensamento)

- Elegância da subtileza

Conceito Predicável – citação da Bíblia a partir da qual se constrói o sermão. No sermão de Santo António aos Peixes, este é “Vos estis sal terrae”.

Partes do Sermão: - Exórdio (introdução)

- Exposição e Confirmação (desenvolvimento)

- Peroração (conclusão)

“Vós sois o sal da terra” disse Cristo aos pregadores. Santo António, tendo também ele “ofício de sal” e, não estando a sua doutrina a ser seguida pelo seu auditório, decide virar-se para o mar e falar para os peixes. O Padre António Vieira, sentindo que se estava a passar a mesma situação em São Luís de Maranhão, decide imitar o Santo.

Capítulo II

Peixes: - Qualidades: ouvem e não falam

- Defeitos (vícios): não se deixam converter (“nunca pior auditório”)

- “Vós fostes as primeiras criaturas que Deus criou”

Louvores - “Os primeiros nomeados foram os peixes”

- “São os mais (…) e os maiores”

Virtudes:

- Obediência

- Ordem

- Quietação

- Atenção

- Têm o “uso sem a razão”

- Não se domam nem domesticam

Capítulo III – Louvores aos peixes, em particular

Peixe de Tobias Rémora Torpedo Quatro-olhos

VIRTUDES

- O fel sara a cegueira.

- O coração lança fora os demónios.

- Pequena no corpo.

- Grande na força e no poder.

- Energia. - Dois olhos olham p/cima

- Dois olhos olham p/baixo.

EFEITOS

- Curou a cegueira do pai de Tobias.

- Lançou fora os demónios de sua

casa.

- Pega-se ao leme de uma nau.

- Impede que ela avance.

- Faz tremer o braço do pescador.

- Impede que o pesquem.

- Defende-se dos outros peixes.

- Defende-se das aves.

COMPARAÇÃO

Sto. António

- Abria a boca contra os hereges.

- Curava a cegueira.

- Lançava fora os demónios.

Sto. António

- A língua de Sto. António domou as paixões humanas.

Sto. António

- 22 pescadores tremeram ao ouvir as

palavras de Sto. António e

converteram-se.

Pregador

- O peixe ensinou o pregador a olhar para

cima (Céu) e para baixo (Inferno).

Capítulo IV – Repreensões aos peixes, em geral

1ª Repreensão: Os peixes “comem-se” uns aos outros – Os homens “comem-se” uns aos outros.

Apelo à observação (exemplifica os homens):

VEDES todo aquele:

- Bulir

- Andar

- Concorrer

- Cruzar

- Subir/Descer

- Entrar/Sair

ALGUÉM MORREU

comem-no:

- os herdeiros

- os testamenteiros

- os legatários

Conclusão: “ainda o pobre defunto o não comeu a terra, e já o tem comido toda a terra”

ALGUM RÉU EM JULGAMENTO

come-o:

- o meirinho

- o carcereiro

- o escrivão

Conclusão: “ainda não está executado nem sentenciado, e já está comido”

tudo aquilo é “andarem buscando os homens como hão de comer e como se hão de comer”.

Amplificação:

- Os peixes/homens comem-se uns aos outros.

- Os peixes/homens comem os mais pequenos

- Comem não só o povo mas a sua plebe

- Não só os comem, mas engolem-nos e devoram-nos

- Os grandes comem os pequenos como pão

- Comem-se os mortos

- Comem-se os vivos

2ª Repreensão

A ignorância dos peixes/A ignorância e cegueira dos homens

Peixes: “…um pedaço de pano cortado e aberto (…) em o vendo o peixe, arremete cego a ele e fica preso e boqueando, até que (…) acaba por morrer.”

Homens: “Quem pesca as vidas a todos os homens do Maranhão, e com quê? Um homem do mar com uns retalhos de pano.” (vaidade)

1. INTRODUÇÃO – CAPÍTULO I- Contêm a TESE inicial, o ponto de vista ao qual o autor pretende fazer aderir o leitor.

1.1. EXÓRDIO – o orador apresenta o plano (como se vai organizar o sermão), que vai defender baseado num CONCEITO PREDICÁVEL, extraído da Sagrada Escritura. Tenta captar a atenção do auditório.

CONCEITO PREDICÁVEL – “Vos estis sal terrae” – “Vós sois o sal da terra

PREGADORES “SAL” OUVINTES “TERRA”

“SAL NÃO SALGA”Falsa doutrina “ Não pregam a verdadeira doutrina”

“TERRA NÃO SE DEIXA SALGAR”Recusa da verdadeira doutrina “(…) ouvintes, sendo verdadeira a doutrina que lhes dão, a não querem receber”

VÓS SOIS O SAL

Pregadores

= Doutrina

CONSERVA PURIFICA

Aqueles que já estão

convertidos

Converter os corruptos, hereges

OFÍCIO DE

OUVINTES

AUDITÓRI

Palavras = comportamento: ”Dizem uma coisa e fazem outra”

Imitação de comportamentos incorretos “querem antes imitar o que eles fazem, que fazer o que dizem”

Vaidade dos pregadores (“Se pregam a si e não a Cristo”)

Egocentrismo, satisfação das vontades (“em vez de servir a Cristo, servem a seus apetites”)

1.2. INVOCAÇÃO – orador invoca auxílio divino para pedir bênçãos/auxílio para levar a bom termo a sua missão de orador e fazer uma boa exposição das ideias

Invocação à Virgem Maria – “Maria, quer dizer, Domina Maria: “Senhora do Mar”; e posto que o assunto seja tão desusado, espero que não me falte com a costumada graça. Ave Maria”

1.3. Recursos o QUESTÕES RETÓRICAS:

Efeito rítmico Retardamento da solução para aguçar a curiosidade Induz à reflexão Captar a atenção do auditório - “CAPTATIO BENEVOLENTIA”

o ARGUMENTO DE AUTORIDADE – solução de Cristo para os pregadores que não pregam a verdadeira doutrina

o ALEGORIA – figura de estilo que consiste na apresentação de metáforas ou comparações que servem para concretizar um pensamento ou uma realidade abstrata. (sal – doutrina, terra – ouvintes/auditório

o ANÁFORA, METÁFORA, REPETIÇÃO…

2. DESENVOLVIMENTO (Exposição – CAPÍTULO II, IV; Confirmação – CAPÍTULO III, V)

"(...) para que procedamos com alguma clareza, dividirei, peixes, o vosso sermão em dois pontos: no primeiro louvar-vos-ei as vossas atitudes, no segundo repreender-vos-ei os vossos vícios.

2.1. CAPÍTULO II – LOUVOR DAS VIRTUDES EM GERAL (1.º momento da Exposição)

o O sermão → ALEGORIA: os peixes são metáfora dos homens, as suas virtudes são por contraste metáfora dos defeitos dos homens e os seus vícios são diretamente metáfora dos vícios dos homens.

o Os peixes ouvem e não falam. Os homens falam muito e ouvem pouco, têm pouco respeito pela palavra de Deus.

o Divide o sermão em duas partes: o sal conserva, o pregador louva as virtudes dos peixes; o sal preserva da corrupção, o pregador repreende os vícios dos peixes.

o Devem manter-se longe dos Homens pois caso contrário sofrerão consequências. Mostra-se que aqueles que convivem com os homens foram castigados, estão domados e domesticados, sem liberdade.

Virtudes que dependem sobretudo de Deus Virtudes naturais dos peixes

• foram as primeiras criaturas criadas por Deus

• não se domam

• foram as primeiras criaturas nomeadas pelo homem• são os mais numerosos e os maiores• obediência, quietação, atenção, respeito e devoção com que ouviram a pregação de Santo António

• não se domesticam

• escaparam todos do dilúvio porque não tinham pecado

2.1.1.Recursoso IRONIA - “Nunca pior auditório. Ao menos têm os peixes duas boas qualidades de ouvintes:

ouvem e não falam”o A ANTÍTESE Céu/lnferno, bem/mal, está ligada quer à divisão do Sermão em duas partes,

quer às duas finalidades globais do mesmo.o A APÓSTROFE refere diretamente o destinatário da mensagem e do pregador,

aproximando o emissor e recetor.o A GRADAÇÃO CRESCENTE na enumeração dos animais que vivem próximos dos homens

mas presos.o A COMPARAÇÃO, "como peixes na água", tem o caráter de um provérbio que significa viver

livremente.o Utiliza articuladores do discurso (assim, pois…)o INTERROGAÇÕES RETÓRICAS, ANÁFORAS

2.2. CAPÍTULO III – LOUVORES EM PARTICULAR (1.º momento da Confirmação)

Peixe de Tobias Rémora Torpedo Quatro-olhos

VIRTUDES

- O fel sara a cegueira.

- O coração lança fora os demónios.

- Pequena no corpo.

- Grande na força e no poder.

- Energia. - Dois olhos olham p/cima

- Dois olhos olham p/baixo.

EFEITOS

- Curou a cegueira do pai de Tobias.

- Lançou fora os demónios de sua

casa.

- Pega-se ao leme de uma nau.

- Impede que ela avance.

- Faz tremer o braço do pescador.

- Impede que o pesquem.

- Defende-se dos outros peixes.

- Defende-se das aves.

COMPARAÇÃO

Sto. António

- Abria a boca contra os hereges.

- Curava a cegueira.

- Lançava fora os demónios.

Sto. António

- A língua de Sto. António domou as paixões humanas.

Sto. António

- 22 pescadores tremeram ao ouvir as

palavras de Sto. António e

converteram-se.

Pregador

- O peixe ensinou o pregador a olhar para

cima (Céu) e para baixo (Inferno).

2.2.1.Recursos:

o Anáforas: Ah homens… Ah moradores… Quantos, correndo… Quantos, embarcados… Quantos, navegando… Quantos na nau… A interjeição visa atingir o coração dos ouvintes; a repetição do pronome indefinido realiza uma enumeração.

o Gradações: Nau Soberba, Nau Vingança, Nau Cobiça, Nau Sensualidade; "passa a virtude do peixezinho, da boca ao anzol, do anzol à linha, da linha à cana e da cana ao braço do pescador." O sentido é sempre uma intensificação para mais ou para menos.

o Antíteses: mar/terra, para cima/para baixo, Céu/Inferno. Palavras de sentido oposto indicam as duas direções do sermão: peixes - homens, bem - mal.

o Comparações: "… parecia um retrato maritimo de Santo António"; o peixe de Tobias, com um burel e uma corda, era uma espécie de Santo António do mar: as suas virtudes eram como as de Santo António. "… unidos como os dois vidros de um relógio de areia,": o peixe Quatro-Olhos possuía grande visão e precisão.

o Metáforas: "… águias, que são os linces do ar; os linces, que são as águias da terra": sentido de rapidez e de visão excecional.

o Ironia: "Mas ah sim, que me não lembrava! Eu não prego a vós, prego aos peixes!"

2.3. CAPÍTULO IV – REPREENSÕES EM GERAL - (2.º momento da Exposição)"Antes, porém, que vos vades, assim como ouvistes os vossos louvores, ouvi também agora as vossas repreensões."

1ª Repreensão: Os peixes “comem-se” uns aos outros – Os homens “comem-se” uns aos outros. – “VÓS COMEIS UNS AOS OUTROS”

o Os peixes/homens comem-se uns aos outros.o Os peixes/homens maiores comem os mais pequenoso Comem não só o povo mas a sua plebeo Não só os comem, mas engolem-nos e devoram-nos

2ª Repreensão: A ignorância dos peixes/A ignorância e cegueira dos homens – “NOTÁVEL IGNORÂNCIA E CEGUEIRA”

2.4. CAPÍTULO V – REPREENSÕES EM PARTICULAR - (2.º momento da Confirmação)

Peixes Defeitos Argumentos Exemplos de homens

Os Roncadores soberba

orgulho

pequenos mas muita língua; facilmente pescados

os peixes grandes têm pouca língua

muita arrogância, pouca firmeza

Pedro

Golias

Caifás

Pilatos

Os Pegadores parasitismo vivem na dependência dos grandes, morrem com eles

Toda a família da corte de Herodes

os grandes morrem porque comeram, os pequenos morrem sem terem comido

Adão e Eva

Os Voadores presunção

ambição

foram criados peixes e não aves

são pescados como peixes e caçados como aves

morrem queimados

Simão mago

O Polvo traição ataca sempre de emboscada porque se disfarça

Judas

2.4.1.Comparação entre os peixes e Santo António

Peixes Santo António

Os Roncadores: soberbos e orgulhosos, facilmente pescados

tendo tanto saber e tanto poder, não se orgulhou disso, antes se calou. Não foi abatido, mas a sua voz ficou para sempre

Os Pegadores: parasitas, aduladores, pescados com os grandes

pegou-se com Cristo a Deus e tornou-se imortal

Os Voadores: ambiciosos e presunçosos tnha duas asas: a sabedoria natural e a sabedoria sobrenatural. Não as usou por ambição; foi considerado leigo e sem ciência, mas tornou-se sábio para sempre

O Polvo: traidor Foi o maior exemplo da candura, da sinceridade e verdade, onde nunca houve mentira

3. CONCLUSÃO (Peroração) – CAPÍTULO VI

"Com esta última advertência vos despido, ou me despido de vós, meus peixes. E para que vades consolados do sermão, que não sei quando ouvireis outro, quero-vos aliviar de uma desconsolação mui antiga, com que todos ficastes desde o tempo em que se publicou o Levítico."

Peroração: conclusão com a utilização de um desfecho forte, capaz de impressionar o auditório e levá-lo a pôr em prática os ensinamentos do pregador.

Animais/Peixes Peixes Homensforam escolhidos para os sacrifícios

estes podiam ir vivos para os sacrifícios

ofereçam a Deus o ser sacrificado

ofereçam a Deus o sangue e a vida

não foram escolhidos para os sacrifícios

só poderiam ir mortos. Deus não quer que Lhe ofereçam coisa morta

ofereçam a Deus não ser sacrificados

ofereçam a Deus o respeito e a obediência

os homens também chegam mortos ao altar porque vão em pecado mortal. Assim, Deus não os quer.

Orador Peixes

tem inveja dos peixes ofende a Deus com palavras tem memória ofende a Deus com o pensamento ofende a Deus com a vontade não atinge o fim para que Deus o

criou ofende a Deus

• têm mais vantagens do que o pregador• a sua bruteza é melhor do que a razão do orador• não ofendem a Deus com a memória• o seu instinto é melhor que o livre arbítrio do orador; não falam; não ofendem a Deus com o pensamento; não ofendem a Deus com a vontade; atingem sempre o fim para que Deus os criou• não ofendem a Deus

4. SÍNTESE RECURSOS ESTILÍSTICO

o Apostrofes: Estes e outros louvores, estas e outras excelências de vossa geração e grandeza vos pudera dizer, ó peixes...""Ah moradores do Maranhão...""Esta é a língua, peixes, do vosso grande pregador (...)""Peixes, contente-se cada um com o seu elemento.""Oh alma de António, que só vós tivestes asas e voastes sem perigo (...)""Vê, peixe aleivoso e vil, qual é a tua maldade (...)"

o Antíteses:Tanto pescar e tão pouco tremer!""No mar, pescam as canas, na terra pescam as varas (...)""(...) deu-lhes dois olhos, que direitamente olhassem para cima (...) e outros dois que direitamente olhassem para baixo (...)""A natureza deu-te a água, tu não quiseste senão o ar (...)""(...) traçou a traição às escuras, mas executou-a muito às claras.""(...) António (...) o mais puro exemplar da candura, da sinceridade e da verdade, onde nunca houve dolo, fingimento ou engano."

"Oh que boa doutrina era esta para a terra, se eu não pregara para o mar!"

o Comparações:Certo que se a este peixe o vestiram de burel e o ataram com uma corda, parecia um retrato marítimo de Santo António.""O que é a baleia entre os peixes, era o gigante Golias entre os homens.""(...) com aquele seu capelo na cabeça, parece um monge;com aqueles seus raios estendidos, parece uma estrela;com aquele não ter osso nem espinha, parece a mesma brandura (...)""As cores, que no camaleão são gala, no polvo são malícia (...)""(...) e o salteador, que está de emboscada (...) lança-lhe os braços de repente, e fá-lo prisioneiro. Fizera mais Judas?""Vê, peixe aleivoso e vil, qual é a tua maldade, pois Judas em tua comparação já é menos traidor

o Paralelismos e Anáforas:Ou é porque o sal não salga, e os pregadores...;ou porque a terra se não deixa salgar, e os ouvintes...Ou é porque o sal não salga, e os pregadores...;ou porque a terra se não deixa salgar, e os ouvintes...Ou é porque o sal não salga, e os pregadores...;ou porque a terra se não deixa salgar, e os ouvintes...""Deixa as praças, vai-se às praias;deixa a terra, vai-se ao mar...""Quantos, correndo fortuna na Nau Soberba (...), se a língua de António, como rémora (...)Quantos, embarcados na Nau Vingança (...), se a rémora da língua de António (...)Quantos, navegando na Nau Cobiça (...), se a língua de António (...)Quantos, na Nau Sensualidade (...), se a rémora da língua de António (...)""(...) com aquele seu capelo na cabeça, parece um monge;com aqueles seus raios estendidos, parece uma estrela;com aquele não ter osso nem espinha, parece a mesma brandura (...)""Se está nos limos, faz-se verde;se está na areia, faz-se branco;se está no lodo, faz-se pardo (...)"

o Enumeração:No mar, pescam as canas, na terra pescam as varas (e tanta sorte de varas); pescam as ginetas, pescam as bengalas, pescam os bastões e até os cetros pescam (...)""(...) que também nelas há falsidades, enganos, fingimentos, embustes, ciladas e muito maiores e mais perniciosas traições.""Eu falo, mas vós não ofendeis a Deus com palavras; eu lembro-me, mas não ofendeis a Deus com a memória; eu discorro, mas vós não ofendeis a Deus com o entendimento; eu quero, mas vós não ofendeis a Deus com a vontade."

o Metáforas"Esta é a língua, peixes, do vosso grande pregador, que também foi rémora vossa, enquanto o ouvistes; e porque agora está muda (...) se veem e choram na terra tantos naufrágios.""(...) pois às águias, que são os linces do ar (...) e aos linces que são as águias da terra (...)""(...) onde permite Deus que estejam vivendo em cegueira tantos milhares de gentes há tantos séculos?!"" (...) vestir ou pintar as mesmas cores (...)"

"(...) e o polvo dos próprios braços faz as cordas

o Paradoxos:a terra e o mar tudo era mar.""E debaixo desta aparência tão modesta, ou desta hipocrisia tão santa (...) o dito polvo é o maior traidor do mar.""hipocrisia tão santa"

o TrocadilhosOs homens tiveram entranhas para deitar Jonas ao mar, e o peixe recolheu nas entranhas a Jonas, para o levar vivo à terra.""E porque nem aqui o deixavam os que o tinham deixado, primeiro deixou Lisboa, depois Coimbra, e finalmente Portugal.""(...) o peixe abriu a boca contra quem se lavava, e Santo António abria a sua contra os que se não queriam lavar."

o Interrogações retóricasqual será, ou qual pode ser, a causa desta corrupção?""Não é tudo isto verdade?""(...) que se há de fazer a este sal, e que se há de fazer a esta terra?""Que faria neste caso o ânimo generoso do grande António? (...) Que faria logo? Retirar-se-ia? Calar-se-ia? Dissimularia? Daria tempo ao tempo?""(...) onde permite Deus que estejam vivendo em cegueira tantos milhares de gentes há tantos séculos?!"

o Ironia Mas ah sim, que me não lembrava! Eu não prego a vós, prego aos peixes.""E debaixo desta aparência tão modesta, ou desta hipocrisia tão santa (...) o dito polvo é o maior traidor do mar."