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MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
5ª Câmara de Coordenação e Revisão – Combate à Corrupção
Comissão de Assessoramento Permanente em Leniência e Colaboração Premiada
NOTA TÉCNICA Nº 1/2020 - 5ª CCR 1
NOTA TÉCNICA Nº 1/2020 - 5ª CCR
Nota técnica da 5ª Câmara de Coordenação e Revisão do
Ministério Público Federal, através de sua Comissão
Permanente de Assessoramento em Leniência e Colaboração
Premiada, sobre Termos de Adesões ou Subscrições de pessoas
físicas1 em Acordos de Leniência, celebrados pelo MPF, nos
termos da Lei nº 12.846 e da Lei nº 8.429, no domínio da
improbidade administrativa.
I – Introdução; II – Da criação dos Termos de Adesão de pessoas físicas em Acordos de
Leniência celebrados entre MPF e pessoas jurídicas colaboradoras no âmbito do Sistema
Brasileiro Anticorrupção; III – A adesão de Pessoas Físicas ao Acordo de Leniência
como exigência de Programa de Leniência consistente e eficaz; IV - Celebração de
Acordo de Leniência, adesão e princípio constitucional da Independência Funcional dos
membros do Ministério Público Federal; V - Celebração de Acordo de Leniência, adesão
e princípio constitucional da Unidade do Ministério Público Federal; VI - Celebração de
Acordo de Leniência, adesão e princípio constitucional da Indivisibilidade do Ministério
Público Federal; VII - Celebração de Acordo de Leniência, adesão e atribuições da 5ª
Câmara de Coordenação e Revisão; VIII – Acordos de leniência celebrados com pessoas
jurídicas e adesão de pessoas físicas, com repercussões criminais; VIII.1 - Competência
do juízo criminal de homologação do Acordo de Leniência com Adesão ou com
possibilidade posterior de Adesão (Acordo-quadro). VIII.2 – Acordo de Leniência, adesão
de pessoas físicas e Isonomia da concessão de benefícios; IX - Alteração da Lei nº
8.429/1992 pela Lei nº 13.964/2019 (“Pacote anti-crime”); X – Conclusões. Referências
bibliográficas.
I – Introdução
A Egrégia 5ª Câmara de Coordenação e Revisão do Ministério Público Federal tem a
atribuição de promover a integração e coordenação da atividade dos Membros do MPF, no campo
1 Salienta-se que a expressão “Termo de Adesão ou Subscrição de pessoas físicas” se refere às pessoas físicas prepostas,
dirigentes ou acionistas das empresas colaboradoras que aderem ao Acordo de Leniência firmado pela referida
empresa. As adesões de Membros do Ministério Público Federal ou de Membros de Ministérios Públicos Estaduais ao
Acordo de Leniência serão tratadas como “Termo de Aquiescência”, para fins de diferenciação.
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temático de suas atribuições legais, que se concentra na formulação e execução de políticas e
diretrizes institucionais no enfrentamento da corrupção, conforme as normas do Sistema Brasileiro
Anticorrupção, constituído por diversas normas (Constituição e leis), e exigido por compromissos
internacionais assumidos pelo Brasil em Convenções Internacionais contra a Corrupção (OCDE,
OEA e ONU).
A presente Nota Técnica versa sobre Termos de Adesões ou Subscrições de pessoas
físicas em Acordos de Leniência, celebrados pelo MPF. Há necessidade de que sejam estabelecidos
os fundamentos sobre relevantes aspectos do regime jurídico aplicável a estes instrumentos
negociais dentro da execução da Política de Leniência do MPF, norteada pelos valores da coerência
e unidade institucional, no campo da celebração de Acordos de Leniência, no domínio da
improbidade administrativa, conformados pelas Leis nº 8.429/1992 (doravante, Lei Geral de
Improbidade Administrativa - LGIA) e Lei nº 12.846/2013 (doravante, Lei de Improbidade das
Pessoas Jurídicas - LIPJ, comumente referida como “Lei Anticorrupção”).
A Nota concentrará seu conteúdo em pontos relevantes. Visa compreender a celebração
de Adesões no contexto da atividade ministerial investigativa, destacando: (i) o histórico da criação
dos Termos de Adesão de pessoas físicas em Acordos de Leniência celebrados entre MPF e pessoas
jurídicas colaboradoras, no exercício de suas competências constitucionais de tutela do patrimônio
público e social, no âmbito do Sistema Brasileiro Anticorrupção; (ii) a definição da Adesão ou
Subscrição de pessoas físicas ao Acordo de Leniência como exigência de Programa de Leniência
inerente a política pública anticorrupção consistente e eficaz; (iii) o princípio constitucional da
independência funcional dos Membros do MPF e Adesões; (iv) o princípio constitucional da
unidade e da indivisibilidade do MPF e Adesões. Em segunda etapa, acentua a relevância das
atribuições da 5ª Câmara de Coordenação e Revisão na matéria tratada. Em terceiro, traz
orientações sobre Acordos de leniência celebrados com pessoas jurídicas e adesão de pessoas
físicas, com repercussões criminais, exigindo uma abordagem geral sobre a competência
jurisdicional de homologação desta forma de Acordo de Leniência, e sobre a diretriz de resguardar a
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isonomia da concessão de benefícios nestas modalidades de leniência. Por fim, a Nota sublinha a
admissibilidade das Adesões em vista da alteração da Lei nº 8.429/1992 pela Lei nº 13.964/2019
(denominado “Pacote Anti-crime”). Ao final, são sintetizadas conclusões, com registro de
indicações bibliográficas constantes do texto.
A presente Nota Técnica visa ao aperfeiçoamento da atividade institucional de Membros
do MPF, sob a coordenação da 5ª CCR. Deverá ser considerada para situações que irrompam após a
sua devida aprovação e publicação, preservando-se a validade e eficácia de todos os atos anteriores,
na esteira do que determina o artigo 30 da LINDB, pelo qual “as autoridades públicas devem atuar
para aumentar a segurança jurídica na aplicação das normas, inclusive por meio de regulamentos,
súmulas administrativas e respostas a consultas.”
II – Da criação dos Termos de Adesão de pessoas físicas em Acordos de Leniência celebrados
entre MPF e pessoas jurídicas colaboradoras no âmbito do Sistema Brasileiro Anticorrupção.
Desde 2013, o Sistema Brasileiro Anticorrupção sofreu verdadeira transformação com a
disciplina legal dos acordos de colaboração premiada, no âmbito criminal (Lei nº 12.850/2013,
alterada recentemente pela Lei nº 13.964/2019), e dos Acordos de Leniência, no âmbito cível (Lei
nº 12.846/2013). Ocorre que, na denominada “Lei Anticorrupção”, mesmo dispondo sobre a
tipificação de condutas com inegável repercussão criminal, a Lei nº 12.846/2013 apenas fez
referência às pessoas jurídicas como sujeitos colaboradores e aptos a celebrar Acordos de Leniência,
no bojo do sistema de responsabilização de pessoas jurídicas pela prática de atos de improbidade
administrativa.
Em face desta limitação subjetiva, há necessidade de estabelecer orientações sobre a
possibilidade jurídica de extensão de benefícios legais para pessoas físicas, acionistas, cotistas,
sócios, administradores, gerentes, empregados, prepostos etc., no contexto de colaboração
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pretendida ou avençada com pessoas jurídicas, com o fim de assegurar maior previsibilidade sobre a
situação jurídica das pessoas físicas colaboradoras, engendrando maior segurança jurídica ao
vínculo de cooperação necessário e instrumental para levar adiante o enfrentamento da corrupção,
nos diversos casos que demandam a atuação ministerial.
A necessidade prática de implementação do novo instituto legal (Acordo de Leniência)
pelo Ministério Público Federal, no exercício de suas atribuições cíveis no enfrentamento
sistemático da corrupção, e a crescente complexidade das práticas corruptivas sistêmicas e
endêmicas evidenciadas no seio do aparelho estatal brasileiro, conduziu o MPF a procurar soluções
sobre o tratamento a ser dispensado às pessoas físicas. Este problema mostrou-se incontestável no
curso da “Operação Lava Jato”, na medida de seus desdobramentos.
A solução foi a criação da possibilidade de celebração de Termos de Adesão ou
Subscrição de pessoas físicas ao Acordo de Leniência.
A Nota Técnica nº 01/2017, exarada pela 5º Câmara de Combate à Corrupção do
Ministério Público Federal, dispunha sobre a necessidade de extensão subjetiva da negociação e da
abertura à via colaborativa às pessoas físicas, nos Acordos de Leniência. Senão vejamos:
“A extensão subjetiva da negociação às pessoas físicas, para incluí-las nas
tratativas acertadas com a pessoa jurídica, envolvida ou beneficiada pelas
práticas ilícitas e qualificada para a colaboração, mostra-se relevante e útil,
conforme o caso. Embora possa integrar estratégia adotada pela(s) parte(s)
em cada caso, tal elastecimento move-se por razões de ordem prática e
jurídica. Reafirme-se aqui, por oportuno, o que já exposto quanto à
configuração do Ministério Público enquanto legitimado exclusivo da ação
penal pública.
Primeiramente, referida extensão subjetiva da negociação projeta uma
efetivação concreta do direito à ampla defesa. É certo que a custódia de
documentação referente a transações e pagamentos espúrios imputados a
pessoas jurídicas pertence à pessoa jurídica responsável; no entanto, a
efetivação física e concreta dos ilícitos, no mundo material, em benefício da
pessoa jurídica, ocorre com a imprescindível atuação de pessoas físicas,
como acionistas, executivos, empregados, prepostos ou contratados, os
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quais igualmente detêm conhecimento de detalhes e informações em função
da prática concreta dos atos ilícitos. Portanto, quando for o caso, em
homenagem à ampla defesa – na projeção da dignidade da pessoa humana
que a fundamenta – deve-se no mesmo processo de negociação,
simultaneamente, considerar os benefícios cabíveis em função de
colaborações da pessoa jurídica e pessoa física, o que redundará, do ponto
de vista formal, na celebração de acordo de leniência, no plano civil; e de
delação ou colaboração premiada, no campo penal.
Se assim não for, pode-se limitar o exercício da defesa em matéria criminal
de pessoas físicas envolvidas nos ilícitos, muitas vezes influenciadas em sua
conduta pela organização empresarial infratora a que serviram, a partir da
relação jurídica com ela mantida. Afigura-se injusto permitir à empresa, que
auferiu ganhos relevantes com as práticas lesivas, obter vantagens por
acionar os instrumentos cooperativos de defesa aceitos pelo sistema
jurídico, mas impedir pessoas naturais, que também serviram ao ente moral
e envolvidas nos ilícitos, de se valerem de meio similar em relação ao
mesmo conjunto fático infracional.”
Entretanto, além da necessidade de incorporação formal das pessoas físicas ao processo
de leniência, dada a sua esfera nacional de atuação, a realidade prática apresentou ao MPF (cujos
órgãos de execução possuem atribuições em todo o território brasileiro) outro problema, decorrente
da revelação, em sede de Acordo de Leniência, de fatos ocorridos em diversas localidades no País,
por diversas pessoas, dificultando a celebração de Acordos, que resultassem em solução coerente e
unitária, seja do ponto de vista institucional, seja do ponto de vista dos colaboradores (pessoas
jurídicas e pessoas físicas).
A solução foi construir garantias em prol da previsibilidade das consequências do
Acordo para as partes (pessoas físicas e jurídicas), preconizando igual Termo de Aquiescência por
parte de Membros do Parquet não celebrantes, com o fim de legitimar o uso de elementos de
prova ofertados pelas partes signatárias (pessoas jurídicas e pessoas físicas). Este condicionamento
da utilização das provas na atividade de investigação ministerial desde o início se revelou um meio
adequado, necessário e proporcional para tutela do interesse público anticorrupção, uma das
contrapartidas à renúncia pelos colaboradores ao direito ao silêncio e à não autoincriminação,
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garantias constitucionais em vigor.
Passados mais de seis anos da promulgação da “Lei Anticorrupção”, observa-se que o
MPF adotou diversas soluções, todas visando conferir sistematicidade e harmonia às suas atuações
civil e criminal, ambas amplamente legitimadas pela Constituição Federal e legislação
anticorrupção brasileira. Todas as soluções passaram pela necessária homologação da 5ª Câmara de
Coordenação e Revisão do MPF, com competência específica em matéria de combate à corrupção.
E, na atualidade, relativamente aos acordos não sigilosos, podem ser visualizados e acessadas no
sítio criado para a divulgação oficial dos Acordos de Leniência homologados até a presente data.
Em 2014, no Acordo de Leniência SOG e Outros, homologado em 01.12.2014, as
pessoas físicas (prepostos, dirigentes ou acionistas que venham a assinar o Termo de Leniência)
foram consideradas partes signatárias do Acordo. Há previsão de posterior subscrição do Acordo,
sendo estabelecido que “os signatários são individualmente responsáveis pelas obrigações
assumidas e pelas declarações feitas com relação ao ACORDO DE LENIÊNCIA, e o
descumprimento das obrigações e/ou qualquer declaração falsa por parte de um dos Signatários
não deverá implicar responsabilidade ou descumprimento pelos demais Signatários, nem de
qualquer modo afetar os direitos dos demais Signatários do Acordo de Leniência.” (Cláusula 10,
§2º). Dentre esses Direitos, destacam-se os benefícios legais acordados.
Em 2015, no Acordo de Leniência Camargo Corrêa, homologado em 24.08.2015,
não houve pessoa física celebrante, mas igualmente foi prevista a subscrição posterior do Acordo
por prepostos ou acionistas da Colaboradora, aplicando-se-lhes os mesmos deveres, reservando-se o
MPF a avaliar as condições para adesão, fixando no Acordo prazo contado da sua homologação
judicial (Cláusula 10ª). O Colegiado da 5ª CCR, na ocasião, deliberou por não homologar a
possibilidade de desistência de ação, contida na cláusula 8ª, parágrafo 4º. A complexidade do
referido Acordo está diretamente relacionada com a extensão dos ilícitos por ele abrangidos,
relacionados com a Operação Lava Jato.
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Em 2015, no Acordo de Leniência Carioca, homologado em 20.10.2015, houve a
reprodução dos parâmetros seguidos no Acordo anterior. O Colegiado da 5ª CCR observou, na
deliberação, que o Acordo não impedia a propositura de ação de improbidade por fatos que não
constavam no Anexo ou não fossem revelados no prazo estipulado no Acordo.
Em 2016, no Acordo de Leniência Andrade Gutierrez, homologado em 30.03.2016,
foram adotadas as mesmas cláusulas permissivas da subscrição de pessoas físicas (cláusula 10),
estabelecendo prazo. Dada a complexidade do caso e a prática de atos ilícitos em diversas
localidades no território nacional. Houve previsão de “gestionar aos promotores naturais a sua
adesão a este acordo de leniência”, sendo que, “em caso de negativa de adesão a este acordo de
leniência pelos promotores naturais, nos termos do parágrafo anterior, as provas produzidas nesta
leniência não poderão ser utilizadas em desfavor da COLABORADORA, sendo permitida sua
utilização em relação a terceiros.” (cláusula In, parágrafos 2º e 3º). A complexidade do referido
Acordo está diretamente relacionada com a extensão dos ilícitos por ele abrangidos, relacionados
com a Operação Lava Jato.
Em 2016, no Acordo de Leniência Signus, homologado em 23.11.2016, a prática do
MPF demonstra que também se preservou a cláusula de subscrição ou adesão como medida que só
deveria ser utilizada se adequada, necessária e proporcional às circunstâncias justificadoras do
Acordo de Leniência. Nesta ocasião, as pessoas físicas foram identificadas no processo de
negociação e já celebraram o Acordo como partes signatárias.
Em 2016, no Acordo de Leniência Braskem, homologado em 15.12.2016, houve
adequado desdobramento da disciplina contratual sobre a subscrição ou adesão, nos termos das
Cláusulas 3ª, 4ª e 5ª. Merecem destaque: (i) a abrangência da categoria de pessoas físicas
“aderentes’ (prepostos, empregados, administradores, dirigentes, terceiros contratados, incluindo
fornecedores de bens e prestadores de serviços, desligados ou não, da pessoa jurídica colaboradora;
(ii) a abrangência da categoria de ilícitos abarcados pela adesão, estatuindo-se uma diversidade de
condutas ilícitas conexas ou correlatas às condutas objeto de investigação no Parquet; (iii) a
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abrangência de condutas a serem relevadas pelos aderentes dentro das circunstâncias descritas nos
anexos, bem como condutas descobertas em investigação interna, mesmo não conexas ou correlatas;
(iv) a processualização da forma como fatos não conexos serão informados ao MPF perante
membros com atribuição para investigação, não assinantes do Acordo; (v) as consequências da não
adesão de membros do Parquet não assinantes do Acordo; (vi) a disciplina sobre recusa de adesão
de Membro do Parquet, sobre fato contido em Anexo no qual se descrevem outros, os quais são de
atribuição de outro membro do Parquet; (vii) o dever dos aderentes complementar elementos
contidos nos anexos do Acordo, necessários para a investigação das infrações; (viii) os limites de
proteção conferidos à Colaboradora e aderentes; (ix) a processualização interna do encaminhamento
no MPF de Anexos, contendo fatos ilícitos que não são da atribuição dos Membros assinantes,
exigindo-se a adesão aos termos do Acordo, sob pena de devolução; (x) as condições a serem
avaliadas pelo MPF para avaliação de cada adesão.
O Acordo de Leniência Braskem também consigna item próprio para Manifestação de
Adesão (item VII), composto da cláusula 10ª. Nela está previsto prazo para colaboradora entregar
ao MPF manifestação de intenção de Adesão. Do mesmo modo, qualquer preposto poderá solicitar a
adesão ao MPF. Há previsão de decisão fundamentada para rejeição da adesão requerida. E foi
prevista cláusula geral, habilitando o MPF a formular exigências extraordinárias e não previstas no
Acordo, como condição de aceitação da Adesão. A complexidade do referido Acordo está
diretamente relacionada com a extensão dos ilícitos por ele abrangidos, relacionados com a
Operação Lava Jato.
Homologado na mesma data, o Acordo de Leniência Odebrecht também trouxe a
disciplina dos aspectos acima referidos, adotando os mesmos parâmetros na celebração da leniência.
A complexidade do referido Acordo está diretamente relacionada com a extensão dos ilícitos por ele
abrangidos, relacionados com a Operação Lava Jato.
Homologado igualmente em 15.12.2016, no Acordo de Leniência ROLLS-ROYCE,
observa-se que não houve a participação de pessoas físicas, nem tampouco a possibilidade de
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adesão destas no curso da execução do Acordo firmado.
Importante salientar, neste histórico, que, em agosto de 2017, a 5a Câmara de
Coordenação e Revisão do MPF aprovou a Orientação 5ª CCR nº 01/2017, sobre acordos de
leniência, chancelando expressamente a legitimidade da subscrição ou adesão de pessoas físicas
nesta temática, conforme item 7.2, bem como de adesão de “por parte de outros órgãos do
Ministério Público Federal, de outros Ministérios Públicos ou de outros órgãos e instituições
públicas mediante o compromisso de respeitarem os termos do acordo ao qual estão aderindo”, nos
termos do item 7.7”.
Em 2017, o Acordo de Leniência J&F, homologado em 24.08.2017, foi celebrado
entre o MPF e a pessoa jurídica colaboradora, contendo disciplina similar sobre a adesão de pessoas
físicas (Cláusula XIX – Manifestação de Adesão). A complexidade do referido Acordo está
diretamente relacionada com a extensão dos ilícitos por eles abrangidos, relacionados com as
Operações Greenfield, Sépsis, Cui Bono, e Carne Fraca.
Em 2018, a 2ª e 5ª Câmaras de Coordenação e Revisão do Ministério Público
Federal aprovaram a Orientação Conjunta nº 01, de 24.05.2018, tendo por objeto a colaboração
premiada. Conforme o seu item 24, a regulamentação da Adesão é cláusula necessária do Acordo.
No mesmo exercício, no Acordo de Leniência Keppel, relacionado com a Operação
Lava Jato, homologado em 05.04.2018, não foi prevista a adesão de pessoas físicas, tendo sido
celebrado exclusivamente com a pessoa jurídica colaboradora; na mesma linha, o Acordo de
Leniência Camargo Corrêa, homologado em 27.11.2018.
Também merece destaque que, no Acordo de Leniência Getinge/Maquet, homologado
em 17.05.2018, houve a adoção dos parâmetros seguidos desde os Acordos homologados no final
de 2016, relacionados com a Operação Lava Jato, acima destacados. No mesmo sentido, o Acordo
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de Leniência Andrade Gutierrez, homologado em 21.05.2018; o Acordo de Leniência Dräger,
homologado em 27.09.2018; o Acordo de Leniência Cia Bozano, homologado em 06.12.2018.
A celebração de Acordo de Leniência no Ministério Público Federal com a possibilidade
de subscrição ou adesão de pessoas físicas pode ser considerada prática institucional consolidada,
indispensável para o atendimento do interesse público anticorrupção, no cumprimento das
atribuições constitucionais do Parquet. Esta Adesão constitui instrumento bilateral para assegurar a
efetividade e desenvolvimento da colaboração, prestada por pessoas jurídicas (e pessoas físicas
relacionadas com a mesma), em contexto legal (Lei nº8.429 e Lei 12.846) que não se explicita a
proteção e benefício das últimas neste domínio punitivo civil, e que nada dispõe sobre a forma de
procedimentalizar o desdobramento da cooperação.
Como bem assimilado na experiência institucional do Parquet Federal, assim se
estabelece não raro o objeto do Acordo de Leniência:
“O interesse público é atendido com o presente acordo de leniência, tendo
em vista a necessidade de (i) conferir efetividade á persecução criminal e
cível de outras pessoas físicas e jurídicas suspeitas e ampliar e aprofundar
as investigações em torno de crimes contra a Administração, contra o
Sistema Financeiro nacional, crimes de lavagem de dinheiro e crimes
contra a Ordem Econômica e Tributaria, entre outros, inclusive no que diz
respeito á repercussão desses ilícitos penais na esfera cível, administrativa
e disciplinar, (ii) preservar a própria existência da empresa e a
continuidade de suas atividades, o que, apesar dos ilícitos confessados,
encontra justificativa em obter os valores necessários à reparação dos
ilícitos perpetrados; e (iii) assegurar a adequação e efetividade das
práticas de integridade da empresa, prevenindo a ocorrência de ilícitos e
privilegiando em grau máximo a ética e transparência na condução de seus
negócios.”
Em 2019, consolidou-se esta assimilação institucional do Acordo de Leniência como
instrumento de obtenção de provas para responsabilização cível e penal, com a previsão de
benefícios legais, adequados, necessários e proporcionais aos objetivos perseguidos em cada caso
concreto.
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A adesão foi adotada no Acordo de Leniência A.G. INVESTIMENTOS, homologado
em 25.04.2019; no Acordo de Leniência RODONORTE; no Acordo de Leniência CR
ALMEIDA/SANTA BÁRBARA, homologados em 28.06.2019; no Acordo de Leniência
EIL/ECS/ECOVIA/ECOCATARATAS, homologado em 05.09.2019, e no Acordo de Leniência
PURUNÃ. De outro lado, não foi adotada no Acordo de Leniência GRANEBERT, homologado
em 11.04.2019 e no Acordo de Leniência TECHNIP, homologado em 24.07.2019.
Este histórico demonstra que, no âmbito do MPF, houve a busca incessante de superar
um incontestável desincentivo aos Acordos de Leniência, que estava na ausência de extensão dos
benefícios do acordo às pessoas físicas, coautoras de atos ilícitos, mas que também se dispõem a
colaborar na esfera civil. Com efeito, a ausência ou não previsão de extensão dos efeitos da
leniência à esfera penal, cível e outras esferas administrativas são fatores que pesam
fundamentalmente na análise custo-benefício que os coautores (pessoas jurídicas e físicas) de atos
de corrupção realizam antes de apresentarem pedidos de participação no programa de leniência.2 A
doutrina registra sérios empecilhos que podem ser gerados sem esta extensão, incluindo
colaborações desprovidas de participação de pessoas físicas essenciais para desbaratar a corrupção,
até o potencial conflito de interesse entre pessoa jurídica e pessoas físicas que tenham praticados
atos ilícitos, que não encontram amparo legal expresso para integrar o mesmo processo de
negociação e colaboração.3 Afastar a pessoa física da legitimidade de celebrar Acordos de leniência
é não raro nulificar a eficiência que se preconiza com a admissão do próprio instituto em matéria
anticorrupção.4
Este acúmulo de experiência institucional na celebração de Acordos de Leniência, com
previsão de benefícios para pessoas jurídicas (e pessoas físicas relacionadas com estas), no âmbito
2 FIDALGO, Carolina Barros; CANETTI, Rafaela Coutinho. Os acordos de leniência na lei de combate à corrupção.
In: SOUZA, Jorge Munhos, QUEIROZ, Ronaldo Pinheiro de (ccord). Lei Anticorrupção. Salvador: Editora
Juspodivm, 2015, p. 275 e 276.
3 CUNHA, Rogério Sanches; SOUZA, Renee. Lei anticorrupção empresarial. Salvador; Editora Juspodivm: 2017, p.
131.
4 MACHADO, Pedro Antônio de Oliveira. Acordo de Leniência & Lei de Improbidade Administrativa. Curitiba;
Juruá, 2017, p. 186.
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cível, reconhece a possibilidade ampla de escopo da avença celebrada por Membro do Parquet
(lotado em determinada unidade institucional com demarcada e prévia atribuição territorial), para
abranger delação de fatos ilícitos diversos (no tempo e no espaço). Nesta linha, busca-se legitimar a
obtenção de informações úteis sobre a ocorrência de diversos ilícitos praticados por diferentes
agentes públicos e terceiros, em diferentes locais, no território nacional. Com isto, logra-se na
medida necessária, oferecer e assegurar previsibilidade jurídica aos colaboradores (pessoas jurídicas
e físicas a elas relacionadas), vinculados a determinado Acordo, em consonância com o princípio
constitucional da segurança jurídica, atinente à cláusula constitucional do Estado de Direito (artigo
1º, CF).
Certo, porém, que esse perfil institucional conferido ao processo de negociação e
celebração dos Acordos de Leniência, não deixaria de suscitar questões jurídicas relevantes. Dentre
elas, (i) a indispensável harmonização do modus operandi com a compreensão do princípio
constitucional da independência funcional, da unidade e da indivisibilidade; (ii) consequências
jurídicas da Adesão, relativamente à situação jurídica da pessoa física aderente; (iii) quando
agregando repercussão criminal (benefícios criminais), a fixação da competência do Juízo Criminal
para processar e apreciar a homologação do Acordo de Leniência com Adesões, e homologação de
Adesões posteriores; e (iv) a inarredável isonomia sancionatória a incidir sobre a fixação de
benefícios e/ou obrigações, para as pessoas físicas colaboradoras (aderentes).
III – A Adesão de Pessoas Físicas ao Acordo de Leniência como exigência de Programa de
Leniência consistente e eficaz.
Segundo Amanda Athayde, entende-se por Acordo de Leniência o acordo celebrado
entre uma autoridade pública investigadora e um agente privado (seja este uma pessoa jurídica ou
física), por meio do qual a autoridade concede a extinção ou o abrandamento da penalidade
aplicável ao agente, recebendo, em troca, provas e colaboração material e processual ao longo das
investigações. Leniência é brandura no exercício da atividade de apuração e sancionamento de
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ilícitos. 5
O Programa de Leniência, por sua vez, consiste no arcabouço jurídico que provê
incentivos da autoridade pública investigadora para que os agentes privados (pessoas jurídicas e
físicas) a procurem para a negociação dos referidos Acordos de Leniência. Sem um Programa de
Leniência consistente ou muito bem delineado e estruturado, a celebração isolada ou pontual de
Acordos perde muito em sua funcionalidade sistêmica.6 Todas as Instituições que possuem
legitimidade para celebrar acordos de leniência devem formular uma política pública consistente de
Estado, com os traços de permanência e sistematicidade.
Outra excelente caracterização do Acordo de Leniência é apresentada por Thiago
Marrara: “a leniência : (i) constitui acordo de direito administrativo, diferentemente da delação
premiada, regida pelo direito penal; (ii) integra um processo administrativo punitivo, convivendo
com a via unilateral de decisão estatal, ao contrário dos acordos de cessação de prática ou de
ajustamento de conduta que, frequentemente, deflagram efeito substitutivo do processo; (iii)
pressupõe um comportamento pretensamente ilícito, ainda em curso ou já cessado, e sempre
desenvolvido em coautoria e (iv) exige que a Administração Pública não detenha condições de, por
si só, desenvolver com sucesso as atividades instrutórias no curso do processo administrativo
sancionador.”7
O Acordo de Leniência, ora tratado nesta Nota Técnica, está inscrito na Lei nº
12.846/2013, integrante do Direito Administrativo Sancionador Anticorrupção. No âmbito
ministerial, se procedimentaliza através de inquérito civil público específico, com escopo
determinado, instaurado sob sigilo. Por meio do ajuste se outorgam benefícios legais aos
colaboradores, mas igualmente se delibera sobre sanções aplicáveis aos colaboradores, em razão
5 ATHAYDE, Amanda. Manual dos Acordos de Leniência no Brasil: teoria e prática – CADE, BC, CVM, CGU,
AGU, TCU, MP. 1. Reimpressão – Belo Horizonte: Fórum, 2019, p. 25.
6 Ibidem.
7 MARRARA, Thiago. Comentários ao artigo 16. In; DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella; MARRARA, Thiago.
(Coord). Lei anticorrupção Comentada. Belo horizonte: Fórum, 2018, p. 189.
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dos ilícitos descritos. Engendram, assim, elementos para propositura de ações civis públicas de
improbidade. E, fundamentalmente, são legitimados pela dificuldade de obtenção célere de
elementos de prova sobre práticas de corrupção, conforme a natureza dos atos de corrupção
revelados no processo. Práticas de corrupção são marcadamente caracterizadas por ocultamento,
clandestinidade e fraude, na violação que ensejam aos parâmetros de integridade que devem nortear
as relações com a organização do Estado.
É certo que os fatos objeto da delação de pessoas jurídicas (e pessoas físicas)
colaboradoras já podem ser objeto de algum processo administrativo de apuração, no âmbito do
Ministério Público, ou mesmo em outra instituição do Estado (a própria Administração Pública
lesada, estruturas de controle interno, estrutura de controle externo, atividade policial, órgãos e
autarquias reguladores independentes etc.), não se descartando a possibilidade de atividade de
investigação em outro Estado (a depender do critério de extraterritorialidade aplicável). Mas
também é fato que, em sua vastíssima aplicação, como demonstra a experiência, os Acordos de
Leniência acabam efetivamente por trazer ao conhecimento do MPF a existência de fatos novos, ou
de relevante a elementos de prova novos sobre fatos investigados. Em qualquer caso, o Acordo deve
alavancar substancialmente o poder de investigação do Parquet sobre fatos expostos, para o fim de
promover as ações punitivas devidas, como pressuposto de sua legitimidade. Certamente, no
contexto infracional, as pessoas colaboradoras são detentoras de informações sobre as investigações
em curso (se houver).
As justificativas para a instituição de um programa estatal que concede tais benefícios
em sede de acordo são, pelo menos, 7 (sete): a detecção de práticas ilícitas; a obtenção de provas; a
eficiência e a efetividade investigativa; a cessação da infração; a sanção dos demais infratores; a
reparação e o ressarcimento dos danos; e a dissuasão de práticas ilícitas futuras8.
No Direito Administrativo Sancionador, confiança, boa-fé e retidão são essenciais para
8 ATHAYDE, Amanda. Manual dos Acordos de Leniência no Brasil: teoria e prática – CADE, BC, CVM, CGU,
AGU, TCU, MP. 1. Reimpressão – Belo Horizonte: Fórum, 2019, p. 30.
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a movimentação e a aplicação dos instrumentos jurídicos que compõem o Programa. Como bem
anota Thiago Marrara, “a credibilidade do programa de leniência provém da comprovação
histórica da seriedade, do profissionalismo, da boa-fé e da respeitabilidade das entidades, dos
órgãos e das autoridades competentes.”9
Não há menor dúvida da gravidade das sanções que são reduzidas no contexto da Lei nº
12.846/2013 com a celebração do Acordo de Leniência: a multa, que pode corresponder a 0,1 a 20%
do faturamento bruto do exercício anterior à instauração do processo no MPF; a publicação
extraordinária da decisão condenatória, que, se levada a efeito, afeta substancialmente a
credibilidade e reputação da pessoa jurídica infratora no setor de atividade em que atua; e a
interdição de direitos, identificada na proibição de receber incentivos, subsídios, subvenções,
doações ou empréstimos de órgãos ou entidades públicas e de instituições financeiras públicas ou
controladas pelo poder público, pelo prazo mínimo de 1 (um) e máximo de 5 (cinco) anos. Esta
última sanção, se levada a efeito, pode engendrar um estrangulamento no desempenho da atividade
econômica da pessoa jurídica, que dependa financeiramente de entidades públicas e de instituições
financeiras públicas ou controladas pelo Poder Público.
Havendo a prática de atos lesivos, descritos no artigo 5º, as sanções estabelecidas em lei
são gravíssimas. Todavia, não são um fim em si mesmo. São instrumentais para a tutela do interesse
público anticorrupção. Com sua compostura legal, ostentam forte aptidão dissuasória, de evitar os
ilícitos. Neste contexto, conforme o modelo sancionador, há forte estímulo para que a pessoa
jurídica procure as autoridades públicas para delatar o ilícito, e inicie o processo de expor e divulgar
o ilícito, em regime de cooperação e colaboração.
Sob a ótica investigativa, os Acordos de Leniência são, em essência, uma forma de
obtenção de informações e elementos de prova sobre ilícitos (autoria e materialidade) realizados em
conluio e cuja persecução autônoma pelo Estado se mostre altamente custosa ou mesmo impossível,
9 MARRARA, op. cit., p. 190.
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pelos traços recorrentes de práticas corruptivas. Pedro Antônio de Oliveira Machado o qualifica
como “técnica especial de investigação para facilitação de coleta de provas em ilícitos de difícil
apuração”.10 Kleber Bispo dos Santos observa que “o fim comum da administração pública e da
pessoa jurídica proponente é a elucidação dos ilícitos buscando a detecção de autoria e
materialidade.”11
Ainda, de acordo com Rafaela Coutinho Canetti, “a contribuição de particulares
inseridos no contexto da atividade ilícita, fornecendo os dados necessários para a investigação da
conduta delitiva, por esses motivos, pode ser, na prática, a única forma possível de repressão a
determinados ilícitos associativos”12. Desse modo, faz-se necessária a criação de um sistema de
incentivos que seja eficaz, de sorte a impulsionar o infrator (pessoa jurídicas e pessoas físicas
relacionadas com a empresa) a colaborar com as autoridades, na delação. Quando a ilicitude se
desenvolve em organizações, a possibilidade de delatar e obter significativo benefício cria
condições objetivas de ruptura do elo do infrator delator com os demais responsáveis na cadeia
organizacional da prática deletéria da corrupção.
Os programas de leniência, quando bem formulados, vão além de meros instrumentos
de obtenção de provas para consistir, também, e principalmente, em ferramenta de dissuasão da
própria prática do ilícito, em três frentes: (i) a criação de desconfianças recíprocas que tornem
insustentável a associação para o cometimento de infrações; (ii) o incremento da atividade
sancionadora estatal; e (iii) a prevenção quanto à reincidência (reformação dos mesmos cartéis ou
organizações), considerando-se a traição inerente à celebração do acordo.13
Esta reflexão merece atenção no sistema brasileiro anticorrupção, em vista da
10 MACHADO, Pedro Antônio de Oliveira. Acordo de Leniência & Lei de Improbidade Administrativa. Curitiba;
Juruá, 2017, p. 179.
11 SANTOS, Kleber Bispo dos. Acordo de leniência na lei de improbidade administrativa e na lei anticorrupção.
Lumen Juris: rio de Janeiro, 2018, p. 88.
12 CANETTI, Rafaela Coutinho. Acordo de leniência: fundamentos do instituto e os problemas de seu transplante ao
ordenamento jurídico brasileiro. 1. Reimpressão – Belo Horizonte: Fórum, 2018, p. 17.
13 Ibidem, p. 29.
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formatação jurídica estabelecida no texto da Lei nº 12.846/2013. Admitido o Acordo de Leniência,
exclusivamente com pessoas jurídicas, dadas as condições empresariais brasileiras, logo haveria
necessidade de aperfeiçoamento do modelo normativo, com a possível inclusão de pessoas físicas,
que, relacionadas com a pessoa jurídica, queiram colaborar e obter benefícios legais decorrentes
desta colaboração. A experiência mostra que não raro as pessoas jurídicas demandam esta extensão
subjetiva do regime legal, para assegurar meios relevantes de efetividade da delação apresentada.
Por estas razões, a Orientação nº 7/2017 da 5ª Câmara de Coordenação e Revisão prevê
que pessoas físicas ligadas à pessoa jurídica colaboradora possam aderir aos termos do Acordo de
Leniência:
7.2.- DESCRIÇÃO DAS PARTES
• tratando-se de grupo de empresas, deverá haver anexo identificando
cada uma dela.
• se for o caso, previsão da possibilidade de adesão ao acordo,
durante prazo específico, por parte de empresas do grupo, diretores,
empregados e prepostos da empresa envolvidos nas práticas objeto do
acordo de leniência, mediante assinatura dos respectivos termos e posterior
aceitação pelo membro oficiante. (Grifou-se)
Em igual sentido, há que se mencionar a existência de previsão da possibilidade de
celebração de Termos de Adesão Individual ao Acordo de Leniência, com repercussões criminais,
nos termos da Orientação Conjunta 2ª/5ª CCRs nº 01/2018, que versa sobre acordos de Colaboração
Premiada, no bojo da Lei nº 12.850/2013, que versa sobre as organizações criminosas. 14
A possibilidade de adesão individual ao Acordo de Leniência por pessoa física
vinculada à empresa colaboradora serve para ampliar significativamente o conhecimento
investigatório dos fatos ilícitos abarcados pelo acordo, ou, mesmo, outros nele não divulgados e que
14 Conforme o artigo 1º, § 1º da Lei nº 12.850, considera-se organização criminosa a associação de 4 (quatro) ou mais
pessoas estruturalmente ordenada e caracterizada pela divisão de tarefas, ainda que informalmente, com objetivo de
obter, direta ou indiretamente, vantagem de qualquer natureza, mediante a prática de infrações penais cujas penas
máximas sejam superiores a 4 (quatro) anos, ou que sejam de caráter transnacional.
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sejam de conhecimento de aderentes que voluntariamente os divulguem, contribuindo para
efetividade do Direito Administrativo Sancionador e do Direito Penal, atendendo às finalidades do
Programa de Leniência.
De fato, o Acordo de Leniência supõe uma delimitação de fatos ilícitos, que podem ser
(fatos conhecidos) ou não ser (fatos novos) de ciência do membro do MPF responsável pelo caso (o
Procurador natural), seja no momento da instauração do ICP, seja na tramitação, seja mesmo na
deliberação final com a celebração do acordo. É impossível assegurar que o membro do MPF tenha
a totalidade das informações sobre a apuração dos fatos, e cabe, sobretudo, à pessoa jurídica
colaboradora e pessoas físicas, com boa fé, indicar se os fatos divulgados estão sendo investigados
em alguma Instituição. Por outro lado, é impossível pretender fechar o escopo do acordo aos fatos
nele contemplados, na medida em que, na execução dos acordos, outros ilícitos podem ser levados a
conhecimento do MPF (v.g. no depoimento de certa pessoa física aderente), na busca de conferir
maior atratividade e efetividade à colaboração. Aqui haverá “fatos novos”, para o efeito do escopo
da leniência. Relativamente a estes fatos, igualmente poderão ser fatos já conhecidos ou não
conhecidos, devendo o MPF e pessoa jurídica colaboradora buscar todos as informações existentes
sobre estes novos fatos, para qualificá-los de forma correta na execução do Acordo.
O Acordo de Leniência cumpre a função regulamentar ao estabelecer o procedimento e
a organização necessários para o recebimento destas informações mediante Adesões, e não raro
estabelece prazos para o processamento destas manifestações adesivas e de encaminhamento de
elementos de prova sobre os ilícitos delatados, com o fim de estabilizar o campo objetivo (factual) e
subjetivo (proponentes-aderentes) da colaboração. Quanto maior a complexidade da prática de
corrupção desvelada, maior a necessidade de detalhamento destas regras de estrutura no bojo do
Acordo de Leniência.
Para incentivar a colaboração das pessoas físicas ligadas à empresa com o processo
investigatório e as consequentes descobertas e cessação de ilícitos associativos ou corporativos, o
sistema de benefícios pode se estender, inclusive, à esfera criminal, pois, diversamente dos atos
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ilícitos praticados pela pessoa jurídica colaboradora, as tipificações das condutas ilícitas de pessoas
físicas envolvidas ensejam diversas responsabilizações pessoais, nas esferas penal, civil,
administrativa e por ato de improbidade administrativa. Sobre problemas relevantes em Acordos
com repercussão criminal, esta Nota os trata em item próprio.
Não há nenhum impedimento legal para que, no bojo do Acordo de Leniência, sejam
admitidas pessoas físicas colaboradoras, para efeitos cíveis e criminais, em formas estruturadas para
incentivar colaborações sucessivas, explorando a potencialidade do instituto consensual. Deste
modo, o Acordo de Leniência pode limitar-se a estipular as condições de subscrição ou adesão,
sendo certo que restará ao Termo de Adesão a ser celebrado com cada Aderente, a pactuação
concreta dos benefícios legais, tanto na esfera cível quanto na esfera penal (se houver repercussão
criminal).
O Termo de Adesão constitui um desdobramento do Acordo de Leniência originário,
firmado, por conseguinte, com os mesmos fundamentos jurídicos deste, com processualização mais
célere, já que inserido no marco de negociação já estabelecida e acordo prévio já formalizado
(Acordo-quadro), ao qual busca dar continuidade e maior abrangência. Assim como o Acordo de
Leniência originário com a pessoa jurídica, também se submeterão à devida homologação junto à 5ª
CCR, como órgão superior de coordenação e revisão no MPF.
O Acordo de Leniência se constitui em instrumento técnico-jurídico pelo qual o
Ministério Público Federal e as pessoas jurídicas (e pessoas físicas relacionadas com as mesmas)
colaboradoras dispõem, consensualmente, sobre o exercício da postulação sancionatória do Parquet,
em face do reconhecimento da prática de “atos lesivos” (artigo 5º da Lei nº 12.846/2013) e atos de
improbidade administrativa (artigos 9º, 10, 10-A e 11 da Lei nº 8.429/1992 e legislação
extravagante), e a oferta de benefícios sancionatórios – isenção ou atenuação de sanções legais -,
tendo como pressuposto o recebimento de informações e provas úteis sobre autoria e materialidade
de ilícitos, incrementando a atividade de investigação estatal do Parquet, formalizando relação
jurídica bilateral ou convencional pautada na juridicidade, cooperação, boa-fé, isonomia,
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impessoalidade, moralidade, razoabilidade, proporcionalidade, devido processo legal, com o fim de
tutelar o interesse público anticorrupção em cada caso.
O Acordo de Leniência é uma categoria singular de consensualidade no exercício da
atividade de investigação ou de apuração dos ilícitos tipificados nas citadas Leis (LGIA e LIPJ), e
busca assegurar, de um lado, a eficiência e eficácia na utilização de recursos institucionais de
Estado, na investigação e persecução de ilícitos, com o fim de tutelar a organização do Estado
contra práticas de corrupção (interesse público anticorrupção); de outro lado, constitui forma
específica de cooperação das pessoas jurídicas (e pessoas físicas relacionadas com as mesmas),
todas responsáveis (cf. art. 1º, p. único da LAC e artigo 2º e 3ºda LGIA), como forma legítima de
defesa, incentivando-as a promover a efetividade do cumprimento das leis e da conformidade de
suas condutas, no exercício de suas atividades sociais, no campo econômico e social.
A Adesão confere às pessoas físicas aderentes os deveres e obrigações próprios da
condição estatutária de colaboradores, mas também lhes proporcionam os direitos e garantias
inerentes a esta condição legal, exigindo que as autoridades celebrantes do Acordo de Leniência e
Termos de Adesão observem esta válida expansão subjetiva do ajuste, conduzindo-se em plena
harmonia com o conteúdo do Acordo, em face de todos os colaboradores, sob a égide de todos os
princípios de direito público acima sublinhados, que estão na raiz da legalidade de suas atividades
funcionais.
Os aderentes estão obrigados à colaboração, da qual advenha um ou mais dos seguintes
resultados, bem sublinhados na Lei nº 12.850, quais sejam: I - a identificação dos demais coautores
e partícipes (incluindo, beneficiários diretos ou indiretos) dos atos de corrupção; II - a revelação da
estrutura hierárquica e da divisão de tarefas da organização que está envolvida na corrupção,
revelando o modus operandi corruptivo; III - a prevenção de novas práticas de corrupção pelos
infratores; IV - a recuperação total ou parcial do produto ou do proveito dos atos de corrupção
delatados.
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Os aderentes estão obrigados a cessar sua participação nos ilícitos revelados na Adesão.
Devem admitir sua participação no ilícito (quando for o caso) e cooperar plena e permanentemente
com as investigações e o inquérito civil público, comparecendo, sob suas expensas, sempre que
solicitada, a todos os atos processuais, até seu encerramento, incluindo a fase da execução do
Acordo de Leniência e Adesão.
Os aderentes estão obrigados a propiciar de forma célere informações e documentos
dotados de veracidade (conteúdo e forma) e licitude (origem) sobre os ilícitos delatados, habilitando
o MPF a tomar as providências jurídicas, urgentes ou não, que as circunstâncias concretas o
exigirem no cumprimento de sua atribuição.
Os aderentes estão obrigados a ressarcir os danos causados pelos ilícitos delatados que
foram responsáveis pela sua ocorrência. Todavia, o Acordo de Leniência e Adesão não estão
condicionados, por lei, ao ressarcimento integral dos danos, de sorte que pagamentos de valores
indenizatórios podem ser objeto de negociação, com o caráter de quitação parcial deste dever legal
de reparação civil.
Celebrados o Acordo de Leniência e Adesão, e cumpridos os termos da avença, os
aderentes ostentarão direito público subjetivo aos benefícios legais pactuados, encontrando-se o
MPF submetido ao cumprimento fiel do que foi acordado, em contrapartida da colaboração
realizada. Estabelecidas as obrigações do MPF no acordo de Leniência, os aderentes possuem
direitos públicos subjetivos de exigir o seu cumprimento, nos exatos termos das prescrições
perfilhadas no ajuste.
A estratégia ministerial de adoção de Acordos de Leniência com Adesões de pessoas
físicas, por determinado Membro do MPF (de forma isolada ou em conjunto com outros membros,
em contexto ou não de Força-Tarefa), implica a possibilidade de delação de diversos ilícitos pelos
colaboradores, na celebração e execução do acordo, como já pontuado, traz à baila o princípio da
independência funcional.
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De fato, no sistema tradicional de atuação de apuração de atos de improbidade, sem
adoção de mecanismos consensuais, a apuração dos fatos ilícitos, no domínio da improbidade (Lei
nº 8.429 e Lei nº 12.846) governam-se pelas regras de competência, fundadas em disposição
expressa da Lei nº 7.347/1985 (art. 2º). Com a introdução de mecanismo consensual de colaboração
com premiação legal, altera-se esta forma de cumprimento da lei, já que os colaboradores, em uma
negociação, podem confidenciar inúmeros ilícitos de quem conhecimento, ou de que participaram,
em diversos lugares. A consensualidade abre a possibilidade de obtenção de narrativas delituais
significativas, que, em seu conjunto, legitimam o próprio processo negocial, em vista de seus
resultados. Todavia, esta nova forma de atuação consensual pode gerar atritos com os princípios da
independência funcional, e necessita ser amparada nos princípios da unidade e da indivisibilidade
da atuação do Parquet.
IV – Celebração de Acordo de Leniência e Adesão e princípio constitucional da Independência
Funcional dos membros do Ministério Público Federal.
A legitimidade de celebração de Acordos de Leniência com pessoas jurídicas e Adesão
de pessoas físicas, abarcando a esfera cível, abrangendo uma diversidade de fatos ilícitos, ocorridos
em diferentes localidades com participação de diversas pessoas, traz à baila relevantes questões
institucionais para o Ministério Público Federal.
É importante recordar que a ação de improbidade, com fulcro na Lei nº 8.429/1992 (art.
17) e na Lei nº 12.846 (art. 19), constitui espécie de ação civil pública, disciplinada pela Lei nº
7.347/1985. Diferente das primeiras, a LACP traz disposição específica sobre a competência
jurisdicional. Nos termos do art. 2º, as ações previstas nesta Lei serão propostas no foro do local
onde ocorrer o dano, cujo juízo terá competência funcional para processar e julgar a causa. Fatos
ilícitos que ensejam a prática de improbidade são investigados por Membros da MPF, em Unidades
da Instituição, conforme esta diretriz legal. A depender do “local onde ocorrer o dano”, há indicação
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do foro federal competente, e, assim, da unidade do MPF competente. Dentro da unidade, por
distribuição objetiva, se identifica o Membro do Parquet Federa que atuará na investigação dos
fatos, mediante investigação própria em inquérito civil público (art. 8º, §1º LACP e Art. 129, III
CF).
A primeira diz respeito à harmonização dos princípios constitucionais da independência
funcional e da unidade. Membro do Ministério Público Federal firmará o Acordo de Leniência,
recebendo informações úteis sobre fatos ilícitos cuja investigação pode estar na atribuição de outro
Membro do Parquet, promovendo a negociação de benefícios legais em favor dos colaboradores.
Nessas condições, aparentemente, exsurge uma restrição à independência funcional do segundo
membro, que terá somente a faculdade de Adesão ao Acordo, ou de processar a Adesão nos termos
do Acordo-quadro, visando a obtenção dos elementos úteis de prova de ilícitos lastreada no Acordo.
Dependendo da complexidade ou abrangência dos ilícitos, certamente haverá mais de um Membro
do MPF que não terá participado do processo originário de celebração, e cuja independência
poderia ser invocada para negar eficácia ao conteúdo do Acordo travado.
Este ponto é deveras relevante, porque os fatos objeto de uma leniência podem ou não
serem objeto de investigações em curso, em unidades diversas daquela em que se processa
originariamente o Acordo de Leniência. E não se pode tolerar que o Acordo de Leniência, quando
requerido pelos interessados, enseje à pessoa jurídica responsável a escolha livre de quem deverá
processar a tratativa e celebrar o acordo no âmbito do MPF. A colaboração já supõe a boa-fé, desde
o seu nascedouro, sendo uma boa prática o encaminhamento da postulação, nestas situações, para a
5ª CCR, para avaliação e encaminhamento devido.
A Constituição Federal estabelece o princípio constitucional da independência
funcional. Nos termos do seu artigo 127, o Ministério Público é instituição permanente, essencial à
função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático
e dos interesses sociais e individuais indisponíveis. Dentre os princípios institucionais do Ministério
Público, está a independência funcional. Este princípio é basilar ao exercício das funções
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institucionais constitucionais, dentre as quais, destacamos a de promover, privativamente, a ação
penal pública, na forma da lei (artigo 129, inciso I), a de zelar pelo efetivo respeito dos Poderes
Públicos e dos serviços de relevância pública aos direitos assegurados na Constituição, promovendo
as medidas necessárias a sua garantia (inciso II), e de promover o inquérito civil e a ação civil
pública, para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses
difusos e coletivos (inciso III). A independência funcional está reiterada no artigo 4º da Lei
Complementar nº 75/1993, que dispõe sobre o Estatuto do Ministério Público da União.
Como anota Clever Vasconcelos. “Não se pode descurar que a autonomia funcional
tem por escopo máximo garantir o livre exercício da atividade-fim do membro do Ministério
Público. A inexistência de hierarquia atinente à liberdade de convicção visa garantir a maior
efetividade no desempenho de suas funções constitucionais.”15 Hugo Nigro Mazzilli diferencia a
autonomia funcional da independência funcional, afirmando que a primeira é atributo da instituição
do Ministério Público, ou seja, “consiste na liberdade que tem de exercer o seu oficio em face de
outros órgãos do Estado, subordinando-se apenas à Constituição e às leis”, ao passo que a
independência funcional é atributo dos órgãos e agentes do Ministério Público, “a liberdade que
cada um destes tem de exercer suas funções em face de outros órgãos ou agentes da mesma
instituição, subordinando-se por igual à Constituição e às leis.” 16
Entende-se que a habilitação normativa conferida pela Lei nº 12.846/2013 (extensível
ao domínio da improbidade capitaneado pela LGIA) dentro do Sistema Brasileiro Anticorrupção,
relativamente à celebração de Acordos de Leniência com a fisionomia acima exposta, não coloca
em xeque a independência funcional dos Membros do Ministério Público Federal, que venham a
atuar na execução de Acordo anteriormente celebrado por outro Membro, seja quando lhe cabe
apenas dar continuidade às investigações dos fatos delatados, seja quando o Acordo-quadro lhe
autoriza a negociação de Adesões, para fins cíveis (e criminais).
15 VASCONCELOS, Clever. Ministério Público na Constituição Federal. 2ª ed. São Paulo: Atlas, 2013, p. 78.
16 MAZZILLI, Hugro Nigro. Princípios institucionais do Ministério Público Brasileiro. In: FARIAS, Cristiano Chaves
de et al. (Coord). Temas atuais do Ministério Público. 6ª ed. Salvador: Editora Juspodivm, 2016, p. 218.
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A Adesão de outro Membro ao Acordo e Adesão originários permanece voluntária – não
obrigatória – e sua relevância está na possibilidade legal de utilização dos elementos de prova
obtidos como decorrência do Acordo de Leniência, mesmo que incida sobre fatos ilícitos ocorridos
no âmbito da atribuição funcional do Membro não celebrante. Com a avaliação da relevância dos
elementos de prova produzidos, caberá ao Membro pronunciar-se pela Adesão ou não. Com efeito,
pode ocorrer que os fatos relacionados com o objeto do Acordo já estejam sob apuração ministerial,
inclusive sigilosa, e os próprios elementos oferecidos não alterem substancialmente o conjunto
probatório já amealhado, indicando a desnecessidade ou inconveniência da Adesão.
Também não é ofensiva à independência do Membro do MPF não celebrante, que
proceda à formalização do Termo de Aquiescência, em havendo esta possibilidade e definição
prévia de parâmetros de benefícios passíveis de concessão no Acordo de Leniência originário
(Acordo-Quadro). Tal como na hipótese anterior, esta Adesão habilitará o uso de elementos de
prova, cuja obtenção é reconduzível ao ajuste originário.
A independência funcional não é atingida, em nenhum dos casos, porque o acordo
originário é amparado na legalidade da forma como foi processualizado o Acordo de Leniência
celebrado. Ao cumprir o Acordo e suas balizas de Adesão, estará, em rigor, o Membro não
celebrante tão somente cumprindo a lei vigente, tal como aplicada no caso concreto da colaboração.
A independência funcional não é violada.
É fundamental que se apure de forma cuidadosa o Membro do MPF que deverá
conduzir as tratativas e celebrar o Acordo de Leniência, sobremodo quando há indicações ou
informações de que fatos nelas consignado já estão sendo objeto de investigações conduzidas em
outras unidades por outros Membros da Instituição. Na aplicação das regras de competência e
fixação do Procurador natural do acordo, a 5ª Câmara de Coordenação e Revisão, em sua atividade
de articulação, integração e coordenação, possui papel destacado para dissipar dúvidas e para
esclarecer situações em que, em razão dos fatos, determinado Acordo de Leniência pode referir-se a
procedimentos extrajudiciais e, mesmo, judiciais, em curso.
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A Lei nº 12.846/2013 não traz nenhuma disciplina sobre homologação de Acordos de
Leniência, mas somente cuida de indicar quais as autoridades nos âmbitos dos Poderes Executivo,
Legislativo e Judiciário com atribuição de celebrar o Acordo. Mesmo que admitida legalmente a
exclusão de sanção a cargo do Poder Judiciário (no caso, a sanção do artigo 19, inciso IV), a Lei
Anticorrupção não tratou de homologação igualmente no capítulo destinado à responsabilização
judicial (Capítulo VI). Tampouco a Lei nº 8.429 tratou do assunto, mesmo após a alteração
proveniente do “Pacote Anti-crime”.
No caso de Acordos de Leniência celebrados pelo Ministério Público Federal,
consolidou-se a exigência de homologação perante a 5ª Câmara de Coordenação e Revisão do MPF,
conforme indica a Orientação 5ª CCR nº 07/2017. Verbis:
14) Assinado o acordo, o procedimento administrativo no qual estiver
juntado deverá ser encaminhado à 5ª CCR, para homologação, por meio do
Sistema Único, garantindo-se o necessário sigilo; 14.1.- Os anexos somente
deverão ser encaminhados caso a Câmara os solicite, por ocasião da
apreciação do acordo; 14.2.- No momento do encaminhamento dos autos à
5ª CCR, deverão ser feitos, nos autos, os esclarecimentos que se entender
necessários sobre os termos do acordo, inclusive sobre a forma de cálculo
dos valores e multas acordadas
A 5ª Câmara de Coordenação e Revisão pode e deve exercer uma função essencial na
delimitação da competência para instaurar, processar e deliberar sobre acordos no domínio da
improbidade administrativa, evitando atuações desarticuladas e sobrepostas de Membros do MPF na
matéria.
São inegáveis os avanços na forma de estruturação de Câmaras do MPF, na sua atuação
em defesa do interesse público anticorrupção.
Paralelamente às alterações positivas na ordenação de procedimentos essenciais na
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atuação finalística na área cível, com a implementação das novas regras sobre o inquérito civil
público, outro avanço na temática anticorrupção no Parquet se verifica no dever de reconfigurar
órgãos estruturais da Instituição e especializá-los na acareação da corrupção, atribuindo-lhes
singularidade temática, no desiderato de que a ação institucional eleve o grau de unidade e de
coordenação intrainstitucional e interinstitucional na matéria. Este avanço foi bem representado no
MPF pela criação de Câmara de Coordenação e Revisão dedicada ao Combate à Corrupção.
Dentro da composição orgânica do MPF, as Câmaras de Coordenação e Revisão são
unidades previstas no artigo 43, inciso IV, da Lei Complementar nº 75/1993. Constituem os órgãos
setoriais de coordenação, de integração e de revisão do exercício funcional na instituição (art. 58).
São organizadas por função ou por matéria, através de ato normativo (art. 59). O Estatuto Legal do
MPU lhes consigna as seguintes atribuições, dentre outras, para : inciso I - promover a integração e
a coordenação dos órgãos institucionais que atuem em ofícios ligados ao setor de sua competência,
observado o princípio da independência funcional; inciso II - manter intercâmbio com órgãos ou
entidades que atuem em áreas afins (artigo 62).
Em se tratando de enfretamento da corrupção, com o MPF sendo o titular privativo da
ação penal pública (artigo 129, inciso I, da CF), e legitimado à promoção da tutela do patrimônio
público e social (art. 129, inciso III, da CF), a atuação integrada e coordenação na temática da
corrupção constitui uma exigência de eficiência e efetividade no planejamento, organização,
execução e controle (revisão) da forma institucional de agir e interagir neste campo.
Ao longo dos 31 anos da atual Constituição, o MPF avançou, vencendo este desafio, na
estruturação de suas CCRs, instituindo CCR temática para o Combate à Corrupção, através da
Resolução nº 148, de 01.04.2014, do seu Conselho Superior, alterando a Resolução CSMPF nº
20/1996. Este ato normativo reformulou a pertinência temática das Câmaras, sendo que a 5ª CCR
tornou-se especializada. No modelo organizacional anterior, este Colegiado se delimitava pela
temática da Proteção do Patrimônio Público e Social. No novo modelo, incumbe-lhe atuar nas
hipóteses do artigo 2º, §5º. Restou, pois, bem caracterizado o aspecto sancionatório cível e criminal
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na área de pertinência temática, unificando neste patamar organizacional a atuação nacional do
MPF. A 5ª CCR teve aprovado o seu regimento interno pela Resolução CSMPF nº 171, de
06.09.2016.
A Resolução CSMPF nº 20 explicita ainda atividades de coordenação, integração e
revisão, merecendo destaque a expedição de orientações, sem caráter vinculante, com vistas a
manter a uniformidade do exercício funcional. Esta Nota Técnica integra este esforço institucional.
Com a nova estrutura cameral em funcionamento, segue-se o desafio de
aperfeiçoamento progressivo da atividade de coordenação, integração e revisão da atuação
funcional dos Membros do MPF, com o ganho derivado da especialização temática. Há, pois, a
imprescindível e contínua tarefa de propiciar cada vez mais uniformidade interpretativa da
aplicação da legislação geral e especial do domínio da improbidade, que resulte eficiência e
segurança jurídica.
É nesta vertente de sua atuação (atividade de coordenação, integração e revisão), que a
5ª Câmara de Coordenação e Revisão pode bem delimitar situações passíveis de amplas
controvérsias internas, na fixação do Membro do MPF competente para conduzir o processo de
negociação e celebração de Acordo de Leniência com Adesões, assegurando a independência
funcional dos membros do MPF, e, concomitantemente, dando cumprimento ao princípio da
unidade e da indivisibilidade que estão constitucionalmente estabelecidos (art. 127, da CF).
Este papel institucional também deriva de outra característica do sistema de
responsabilização pela prática de atos de improbidade administrativa, no Direito Administrativo
Sancionador Brasileiro. Recorde-se que a legitimação ativa para a proposição de ações civis
públicas sancionatórias é concorrente e disjuntiva, conforme artigo 17 da LGIA e artigo 19 da LIPJ
(“Lei Anticorrupção”). Analisando-se os demais entes legitimados (Administração Direta e Indireta
de todos os Poderes da União, dos Estados, dos Municípios e do Distrito Federal), constata-se uma
centralização no exercício desta postulação. No que atina ao plano federal, esta centralização ocorre
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ao nível da Advocacia-Geral da União, e, quanto às empresas estatais, nos órgãos de advocacia
pública que estão alocados em sua estrutura interna. Analisando-se a Lei nº 12.846, a designada
“responsabilização administrativa” (artigo 6º) também segue esta diretriz centralizadora
É com este aparelho administrativo marcado pela centralidade que o MPF se depara e se
relaciona em sua atividade de investigação de atos ilícitos passíveis de sancionamento, através de
ações civis públicas cuja legitimação ativa a Constituição e as leis anticorrupção citadas asseguram.
Neste contexto, torna-se fundamental a atuação da 5ª CCR no âmbito do MPF.
Como visto acima, compete à 5ª Câmara de Coordenação e Revisão em Combate à
Corrupção a atribuição de manter intercâmbio com órgãos ou entidades que atuem em áreas afins
(artigo 62, inciso II, LC nº 75/1993). O desafio do intercâmbio visando a coordenação
interinstitucional na defrontação da corrupção (em sentido amplo), está na ordem do dia. Não é
possível admitir que Instituições de Estado, previstas na Constituição, criadas e regulamentadas por
lei, que tenham atribuições relacionadas à prevenção e repressão de ilícitos que agridem a probidade
administrativa, deixem de interagir, e atuem de forma isolada em campo no qual o predomínio de
organizações criminosas (cf. Lei nº 12.850/2013) cresce de forma exponencial, exigindo esforço
comum, organizado, ordenado e coordenado do Estado, na defesa dos valores constitucionais.
O MPF, através da CCR especializada, deve seguir na solução deste gigantesco desafio,
com todas as infinitas possibilidades de ação que ele suscita ou reclama. O exercício da atividade
de coordenação, integração e revisão na fixação de Procurador natural para processar, deliberar,
celebrar e acompanhar o Acordo de Leniência com Adesões é relevantíssimo, considerando a
necessidade de assegurar atuação articulada nos casos concretos, viabilizando a atividade cameral
perante as demais Instituições que estão legitimadas a atuar no domínio da improbidade, inclusive
celebrando Acordos de Leniência.
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V – Celebração de Acordo de Leniência, adesão e princípio constitucional da Unidade do
Ministério Público Federal.
Como bem anota Hugo Nigro Mazzilli, “o promotor tem independência funcional para
tomar as decisões que a lei pôs em suas mãos; não para recusar cumprimento à deliberação
tomada por outro órgão a quem a lei atribuiu à manifestação da instituição no caso concreto.”17
Firmada, de forma válida, a atribuição de determinado Membro do Ministério Público
Federal para celebração de Acordo de Leniência com Adesões, nos termos das normas vigentes no
Sistema Brasileiro Anticorrupção, caberá a este Membro conduzir, na sua integralidade, o processo
de instauração, negociação, formalização, celebração, homologação, incluindo eventual e posterior
alteração, e de extinção do Acordo. O processo de execução do Acordo dependerá da complexidade
dos fatos abrangidos pelo escopo da leniência, inclusive da possibilidade de adesões no curso do
cumprimento do Acordo.
A projeção desta atuação funcional – dos efeitos do ato jurídico bilateral aperfeiçoado –
ocorre perante terceiros e a própria Instituição do Parquet, e está resguardada pelo princípio
constitucional da unidade do Ministério Público.
A Constituição Federal assegura ao Ministério Público o princípio da unidade, nos
termos do artigo 127, parágrafo 1º da Constituição Federal. Nos termos do artigo 128, o Ministério
Público abrange: I - o Ministério Público da União, que compreende: a) o Ministério Público
Federal; b) o Ministério Público do Trabalho; c) o Ministério Público Militar; d) o Ministério
Público do Distrito Federal e Territórios; II - os Ministérios Públicos dos Estados. A Constituição é
explícita, na sua dicção: o Ministério Público (no singular) abrange18 duas ramificações. Todos os
17 MAZZILLI, Hugo Nigro. Regime jurídico do Ministério público. 8a ed. São paulo; Saraiva, 2014, p. 141.
18 Abranger significa, dentre outros, conter, abarcar, englobar, incluir, compreender, trazer, encerrar, albergar, acolher,
incorporar.
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seus membros exercem o mesmo ofício, qual seja o de ministério público, formando uma só
Instituição.19
A unidade do Ministério Público está muito bem retratada por Hugo Nigro Mazzilli,
quando assim se pronuncia: “A unidade do Ministério Público enquanto instituição existe. Podemos
dizer que ele é uma organização nacional destinada a um fim social, e isso vale para todos e cada
um de seus ramos. Esse fim é o zelo dos interesses sociais, todos, e dos interesses individuais,
quando indisponíveis – é o que faz quando combate o crime e a improbidade administrativa, ou
quando defende o meio ambiente e os incapazes. (…) Consideradas as autonomias, temos unidade
em cada Ministério Público. ”20
Esta unidade de atuação institucional, reportada ao enfrentamento da prática da
corrupção, no atual momento histórico – em que este fenômeno se tornou sistêmico e endêmico no
aparelho e funções estatais no cenário nacional e internacional – torna-se fundamental na temática
da celebração de Acordos de Leniência, como instrumentos de uma política consistente, congruente,
efetiva, justa e proporcional, para prevenir, dissuadir e reprimir atos e práticas corruptivas.
Na celebração do Acordo, o Membro do Parquet é o cristalizador e articulador desta
unidade institucional para o caso concreto, cabendo-lhe, com independência funcional, realizar as
tratativas necessárias para o cumprimento fiel da disciplina legal do Acordo de Leniência,
atualmente inscrita no artigo 16 da Lei nº 12.846/2013. Atuando dentro das balizas da lei, o Acordo
celebrado e homologado veiculará a unidade institucional não apenas perante os colaboradores
(pessoas jurídicas e pessoas físicas relacionadas com a mesma), mas também perante outros
Membros da Instituição, igualmente perante terceiros, não sendo dado a nenhum outro Membro do
MPF rejeitar a validade e eficácia do Acordo, no momento da sua execução.
Essa fundamentação demonstra o exato espaço de convivência da independência
19 VASCONCELOS, Clever. Ministério Público na Constituição Federal. 2ª ed. São Paulo: Atlas, 2013, p. 72.
20 MAZZILLI, Regime Jurídico do Ministério Público, 8a ed., São Paulo; Saraiva, 2014, p. 141.
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funcional e da unidade institucional na matéria, sujeita a recorrentes equívocos, e, ao final,
demonstra que a unicidade do Acordo de Leniência é solução adequada e logicamente compatível
com a independência funcional dos Membros e com a unidade da Instituição.
Entretanto, é possível que ocorram inconsistências na celebração de Acordos de
Leniência, que abarcam fatos ilícitos cuja investigação já está em curso ou, mesmo, cujas medidas
judiciais cabíveis já foram tomadas, sob a condução de membros do MPF, no exercício regular de
suas atribuições. Nestes casos, não há menor dúvida de que os membros não celebrantes, cuja
atuação funcional é invalidamente afetada, podem questionar a celebração do Acordo,
especificamente no tocante aos aspectos que envolvem suas respectivas atribuições funcionais,
devendo a 5ª CCR resolver esta forma de litígio, determinando as devidas correções no processo de
celebração da leniência.
Na mesma linha, não se pode ignorar situações legítimas de não Adesão institucional
pelos Membros não celebrantes a determinado Acordo de Leniência com Adesões de pessoas
físicas, possibilidade que, obviamente, não pode chancelar o mero arbítrio do Membro como
justificativa para esta recusa. Será possível a não aderência institucional, em face de circunstâncias
objetivas que a embasem.
VI – Celebração de Acordo de Leniência, adesão e princípio constitucional da Indivisibilidade
do Ministério Público Federal.
Segundo o princípio da indivisibilidade, sempre que se manifesta um Membro do
Ministério Público, está se manifestando o Ministério Público21. O denominado princípio da
indivisibilidade demarca o caráter orgânico da atuação dos Membros do Ministério Público.
21 NUNES JÚNIOR, Flávio Martins Alves. Curso de direito constitucional. 2. ed. São Paulo: Thomson Reuters Brasil,
2018.
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Restrigindo-se ao MPF, cada Procurador da República, Procurador Regional da República,
Subprocurador-Geral da República, são todos titulares de ofícios componentes do Ministério
Público Federal, e funcionam apenas como membros da Instituição, para a qual convergem todos os
efeitos de sua atuação funcional. Ao agirem, imputa-se, sob a ótica jurídica, a conduta funcional ao
Ministério Público Federal; exerce-se o Ofício encartado na composição orgânica da Instituição.
Não sofre divisão o elo existente entre a ação do Membro e a ação institucional. A indivisibilidade
ressalta esta característica relevante de impessoalidade sobre a produção jurídica ministerial.
A indivisibilidade revela que, mesmo alterada a titularidade subjetiva do ofício,
permanece este como elo inquebrantável de apresentação da Instituição na sua atividade
extrajudicial e judicial. A indivisibilidade também não se opõe a formação de forças-tarefa no
cumprimento das atribuições constitucionais dos ofícios componentes da Instituição. Nenhuma
forma legítima de trabalho conjunto fragmenta o elo acima destacado, mas servem tão somente para
elevar o grau de eficiência na atuação ministerial, pela possibilidade de congregação de esforços
institucionais.
Esta conceituação da indivisibilidade só vem a reforçar a possibilidade da celebração de
Acordo de Leniência com Adesão, com recurso à adesão institucional por outros Membros não
celebrantes do Parquet, em situação em que o Acordo traz, em seu bojo, elementos de prova
relevantes ou úteis de diversos fatos, conexos ou não (sob o ponto de vista das normas processuais
penais ou civis), para a atividade funcional de investigação ou apuração, na seara cível (e criminal),
da órbita de atribuição do Membro.
O Acordo, válido e eficaz, é solução a ser resguardada pelo Membro celebrante e por
todos os demais componentes da Instituição, pela revelação institucional (impessoal e indivisível),
no caso concreto, da aferição do cumprimento da lei e do atendimento ao interesse público.
Ao concentrar e formalizar a manifestação da Instituição no caso concreto, o Acordo
terá de realizar a mais ampla apreciação dos fatos e dos elementos de corroboração e de provas, em
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face das informações existentes e disponíveis na Instituição. É uma característica do processo de
celebração e negociação a integração e confrontação de todos os fatos conhecidos, pela Instituição,
nos processos extrajudiciais e judiciais, cíveis e criminais, atinentes aos fatos. Isto é uma das
facetas da indivisibilidade. O membro celebrante deverá se posicionar como o Ministério Público, e,
dentro das possibilidades institucionais, encontrar e ter ciência da situação da Instituição no caso
concreto. Também é dever da pessoa jurídica colaboradora e pessoas físicas aderentes apontar todas
as investigações em curso – de inequívoco conhecimento prévio das mesmas – sobre os fatos
abarcados pelo acordo, sob pena de manifesta má-fé, impeditiva da colaboração válida.
Esta condução indivisível da Leniência, no plano da Instituição, é forma indelével de
conferir segurança jurídica ao acordo, dentro da órbita institucionalizada do Parquet.
A colaboração de pessoas jurídicas e adesão de pessoas físicas envolvem não raros riscos diversos
para quem coopera. A indivisibilidade irradia confiabilidade e segurança ao processo de negociação.
Torna conhecida a face do negociador, que cumpre este dever-poder em nome do MPF.
Qualquer acréscimo de confiabilidade e previsibilidade na Leniência, a Instituição será uma das
maiores beneficiarias, porque significará maior efetividade na sua atuação.
Vale, por fim, recordar que a atuação dos membros celebrantes está submetida, como visto, a
processo de homologação por órgão de coordenação e revisão superior (no caso, a 5ª CCR/MPF), e,
neste sentido, a Acordo homologado será irremissivelmente a solução do MPF para o caso
apreciado.
O Acordo de Leniência com Adesão, por conseguinte, não ofende, sob qualquer aspecto,
o princípio da indivisibilidade. Ao contrário, a indivisibilidade é fundamental na estruturação de
Programa de Leniência no âmbito do MPF, vez que oferece à atuação funcional do Parquet
negociador a voz do MPF para dar com definitividade e unidade institucional a solução adequada,
justa e proporcional em face da delimitação dos fatos envolvidos.
Dispõe a Orientação Conjunta nº 01/2018, da 2ª e da 5ª Câmaras de Coordenação e
Revisão do Ministério Público Federal, em seu item 23:
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“No caso de os fatos narrados envolverem a atribuição de outros Membros do
Ministério Público Federal (atuações em órgãos judiciais diversos), o Membro
então oficiante deverá, observada a conveniência e especificidades do caso
concreto, alternativamente:
23.1. convidar o(s) Membro(s) com atribuição concorrente para participar das
tratativas de formalização do acordo; ou
23.2. submeter o caso à CCR do MPF, de acordo com a temática respectiva, para
os fins do art. 62, I e VI, da Lei Complementar nº 75/93; ou
23.3. firmar o acordo e submetê-lo, posteriormente à homologação, aos demais
Procuradores naturais, que poderão aceitar e aderir aos respectivos termos, caso em
que receberão todas as provas produzidas, ou recusá-los, com a devolução de todas
as provas e informações ao colaborador, sob a perspectiva dos princípios da
confiança e da boa-fé, que devem reger as tratativas, a pactuação e o
compartilhamento da prova.”
A correta leitura da unidade e da indivisibilidade ganham destaque para a adequada
compreensão das obrigações assumidas pelo MPF, como compromissos decorrentes de Acordo de
Leniência com Adesões. A Orientação nº 07/2017, da 5ª Câmara de Coordenação e Revisão, estipula
em seu item 7.6 as obrigações do Ministério Público Federal, da seguinte forma:
7.6. COMPROMISSOS DO MPF
• realizar gestões junto a outras autoridades e entidades públicas buscando sua
adesão ao Acordo de Leniência ou a formalização de seus próprios acordos, desde
que compatíveis com o do MPF;
• estipular benefícios e, se for o caso, não propor qualquer ação de natureza
cível ou sancionatória, inclusive ações de improbidade administrativa, pelos fatos
ou condutas revelados em decorrência do Acordo de Leniência, contra a
COLABORADORA, enquanto cumpridas integralmente as cláusulas estabelecidas
no Acordo;
• dentre os benefícios, se for o caso, requerer a suspensão de ações que já
tiverem sido propostas ou requerer a prolação de decisão com efeitos meramente
declaratórios;
• defender perante terceiros a validade e eficácia de todos os termos e
condições do acordo.
Em havendo qualquer conduta funcional de Membro do Parquet que possa implicar o
descumprimento do Acordo de Leniência, incumbe ao Membro celebrante promover a defesa do
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Acordo, no âmbito do próprio MPF, e, igualmente, perante terceiros, assegurando o cumprimento
fiel do que foi pactuado com o MPF.
VII – Celebração de Acordo de Leniência, adesão e atribuições da 5ª Câmara de Coordenação
e Revisão.
A Constituição Federal estabelece que lei complementar da União estabelecerá a
organização, as atribuições e o estatuto do Ministério Público da União (artigo 127, §5º). O Estatuto
do Ministério Público da União foi aprovado pela Lei Complementar nº 75/1993. Conforme o
Estatuto, foram instituídas as Câmaras de Coordenação e Revisão no âmbito do MPF (artigos 58 a
62).
As Câmaras de Coordenação e Revisão do Ministério Público Federal são os órgãos
setoriais de coordenação, de integração e de revisão do exercício funcional na Instituição (art. 58).
Nos termos do artigo 62, compete às Câmaras de Coordenação e Revisão: I - promover a integração
e a coordenação dos órgãos institucionais que atuem em ofícios ligados ao setor de sua
competência, observado o princípio da independência funcional; (...) VI - resolver sobre a
distribuição especial de inquéritos, feitos e procedimentos, quando a matéria, por sua natureza ou
relevância, assim o exigir; VII - decidir os conflitos de atribuições entre os órgãos do Ministério
Público Federal.22 Sobre as CCRs, assim esclarece Bruno Amaral:
(...) Os órgãos estão estruturados com a finalidade de incrementar a integração e a
coordenação entre as diversas unidades do MPF, promovendo intercâmbio com
órgãos ou entidades afins e enviando informações técnicas aos órgãos que atuam
em matérias relacionadas a cada um dos setores. Além dessas funções, estão
incumbidos de tarefas diretamente relacionadas à distribuição do serviço interno,
na resolução de conflitos de atribuições entre membros da organização e análise de
arquivamentos de membros do MPF, excetuando os casos em que a competência
originária seja do Procurador-Geral da República. Em síntese, buscam conciliar o
22 MAZZILLI, Hugo Nigro. Introdução ao Ministério Público – 9. ed., São Paulo: Saraiva, 2015, p. 262-263.
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princípio da independência funcional com os princípios da indivisibilidade e
da unidade de atuação do MPF. Se a independência de cada um dos membros da
organização deixa margem para ações discricionárias, dentro da amplitude do texto
legal, e inclusive optando por determinadas prioridades no desempenho das
funções, os órgãos têm, assim, o objetivo não apenas de fornecer auxílio técnico,
mas também de estabelecer algumas diretrizes e promover determinados temas
como prioritários.” 23 (grifos nossos)
A Lei nº 12.846/2013 não traz nenhuma disciplina sobre homologação de Acordos de
Leniência, mas somente cuida de indicar quais as autoridades no âmbito dos Poderes Executivo,
Legislativo e Judiciário ostentam atribuição de celebrar o Acordo. Mesmo que admitida legalmente
a exclusão de sanção legal a cargo do Poder Judiciário (no caso, a sanção do artigo 19, inciso IV),
em ação civil pública com legitimidade reconhecida ao Ministério Público, a Lei Anticorrupção não
tratou de homologação judicial da leniência, nem mesmo no capítulo destinado à responsabilização
judicial (Capítulo VI).
No caso de Acordos de Leniência celebrados pelo Ministério Público Federal,
consolidou-se a sua homologação perante a 5ª Câmara de Coordenação e Revisão do MPF,
conforme indica a Orientação 5ª CCR nº 07/2017. verbis:
“14) Assinado o acordo, o procedimento administrativo no qual estiver juntado
deverá ser encaminhado à 5ª CCR, para homologação, por meio do Sistema Único,
garantindo-se o necessário sigilo. 14.1.- Os anexos somente deverão ser
encaminhados caso a Câmara os solicite, por ocasião da apreciação do acordo.
14.2.- No momento do encaminhamento dos autos à 5ª CCR, deverão ser feitos,
nos autos, os esclarecimentos que se entender necessários sobre os termos do
acordo, inclusive sobre a forma de cálculo dos valores e multas acordadas”.
A celebração de Acordo de Leniência, com pessoas jurídicas e pessoas físicas, com
23 MACHADO, Bruno Amaral. Ministério Público – Organização, representações e trajetórias. Curitiba: Juruá, 2007,
p. 177.
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repercussões cíveis (e criminais), está submetida à Deliberação deste Colegiado, no exercício
regular de sua atividade de coordenação, de integração e de revisão da atuação funcional dos
Membros do Ministério Público Federal. As atribuições da CCR são fundamentais para assegurar
processo de celebração de leniência, de forma coordenada e integrada no âmbito da Instituição. E
ganham maior destaque ainda nas situações em que a pessoa jurídica colaboradora e pessoas físicas
colaboradoras (signatárias ou aderentes) trazem ao conhecimento do Membro celebrante fatos
ilícitos novos (fatos sem investigação), conexos ou não, fatos que estão inseridos na atribuição
funcional cível (e/ou criminal) de outros Membros do MPF, para os fins de corroborar a utilidade do
Acordo visando a concessão de melhores benefícios ao fim e ao cabo da negociação.
O que motiva colaboradores (pessoa jurídicas e pessoas físicas) a acrescentar fatos além
daqueles com possibilidade imediata de persecução, no âmbito da atividade sancionadora
ministerial? A razão está em potencialmente receber benefícios maiores. Neste processo, a narrativa
de fatos novos (fatos sem investigação) é apresentada perante o Membro do MPF com atribuição
originária para celebração, que pode e deve criar os incentivos para a informação de fatos novos,
além dos fatos já abrangidos pela proposta ou termos do Acordo original. O benefício para o Estado
está em que se desvelam ilícitos que outros órgãos com atribuição jamais teriam conhecimento.
Para os colaboradores, certo de que o silêncio sobre os fatos poderia ocorrer, a vantagem está no
acréscimo de benefícios.
A Orientação Conjunta 2ª/5ª CCRs/MPF nº 01/2018 consigna disciplina específica para
situações em que os colaboradores (pessoas físicas) levem ao conhecimento do Membro do
Ministério Público Federal fatos novos que estejam no campo de atribuição funcional e territorial de
outros membros da Instituição. Confira-se:
“22. No acordo de colaboração premiada, o colaborador deve narrar todos os fatos
ilícitos em relação aos quais concorreu. (...)
23. No caso de os fatos narrados envolverem a atribuição de outros Membros do
Ministério Público Federal (atuações em órgãos judiciais diversos), o Membro
então oficiante deverá, observada a conveniência e especificidades do caso
concreto, alternativamente:
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23.1. convidar o(s) Membro(s) com atribuição concorrente para participar das
tratativas de formalização do acordo; ou
23.2. submeter o caso à CCR do MPF, de acordo com a temática respectiva, para
os fins do art. 62, I e VI, da Lei Complementar nº 75/93; ou
23.3. firmar o acordo e submetê-lo, posteriormente à homologação, aos
demais Procuradores naturais, que poderão aceitar e aderir aos respectivos termos,
caso em que receberão todas as provas produzidas, ou recusá-los, com a devolução
de todas as provas e informações ao colaborador, sob a perspectiva dos princípios
da confiança e da boa-fé, que devem reger as tratativas, a pactuação e o
compartilhamento da prova;
23.4. encaminhar os autos ao Membro que tiver atribuição concorrente, a fim de
que seja analisado o interesse na celebração do acordo de forma integral, não sendo
impeditiva à celebração do acordo, no entanto, a recusa ou a falta de
interesse, devidamente declaradas, ocasião em que o acordo não contemplará os
fatos recusados.”
O Ministério Público Federal, através das duas Câmaras especializadas em matéria
criminal e temática anticorrupção, reconhece a legitimidade expressa da celebração de acordos de
colaboração (o que se espraia no tratamento normativo dos Acordos de Leniência com pessoas
jurídicas e físicas, com efeitos criminais), com a disciplina da Adesão (item 23.3).
Neste caso, a 5ª CCR procederá à homologação do Acordo de Leniência com Adesões.
Os fatos de competência do Membro celebrante permanecerão sob sua investigação, e os demais
serão objeto de encaminhamento e distribuição regular para a unidade competente. Todavia, isso
não significa que o Acordo de Leniência e suas Adesões sejam ineficazes. Os Acordos
permanecerão íntegros, uma vez homologados, mas ocorrerá apenas a posterior distribuição
funcional para apuração dos fatos, conforme as regras de competência.
Com efeito, não se deve confundir atribuição de celebração de Acordo de Leniência
com Adesões, com atribuição de investigação cível (ou criminal) de fatos ilícitos descritos em seus
anexos. Estas atribuições podem coincidir, mas a prática anticorrupção do MPF não raro demonstra
a não reunião destas atribuições, em face da validade de Celebração de Acordos de Leniência com
Adesão, em que se processam fatos novos e sem conexão.
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Também será no processo de homologação que o Colegiado da Câmara poderá se
debruçar e impedir situações em que se caracteriza escolha proposital de Membros pelos
colaboradores (pessoas jurídicas e pessoas físicas, signatárias ou aderentes), mediante expediente
para subtrair a legítima atribuição de Membros eventualmente não favoráveis ao Acordo,
incorrendo em verdadeira sabotagem do Programa de Leniência no campo do MPF. Na sua
atividade de coordenação, de integração e de revisão, a 5ª Câmara de Coordenação e Revisão
exercerá papel fundamental para verificação da legalidade de todo o processo administrativo de
leniência.
Com a homologação perante a 5ª CCR, já se poderá proceder ao adequado
direcionamento da execução do Acordo de Leniência, em termos de distribuição funcional de
atribuições, para os fatos subjacentes ao Acordo de Leniência, em sua integralidade.
Incumbe ao Membro celebrante do Acordo de Leniência acompanhar a execução, de
modo a avaliar a utilidade e efetividade da colaboração, incluindo aquela formalizada através de
Adesões, e cuja execução será de atribuição de outros Membros do MPF, em havendo um Acordo-
quadro. A efetividade do Acordo merece avaliação à luz dos resultados obtidos com a atuação
funcional de todos os demais Membros, que, aderindo ou processando Adesões, utilizam os
elementos de prova, nos termos homologados.
VIII – Acordos de Leniência celebrados com pessoas jurídicas e adesão de pessoas físicas, com
repercussões criminais.
Nos itens precedentes, firmou-se a legitimidade da celebração, na esfera cível, de
Acordos de Leniência com pessoas jurídicas (e pessoas físicas a elas relacionadas), como
instrumento relevante da atuação do MPF na tutela do interesse público anticorrupção, no domínio
da improbidade administrativa.
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Ocorre que não raro as condutas ilícitas de pessoas físicas são enquadráveis como
crimes, seja no âmbito do Código Penal (crimes contra a Administração Pública etc.), seja no
âmbito de legislação criminal extravagante (crimes licitatórios, crimes comuns de Prefeitos, crimes
de lavagem de dinheiro etc.). As condutas ilícitas recebem a qualificação dos diversos sistemas de
responsabilização acolhidos no ordenamento brasileiro. O Sistema Brasileiro Anticorrupção é
composto, dentre outros, pelo sistema penal anticorrupção e pelo sistema de direito administrativo
sancionador anticorrupção.
Certamente, a colaboração de pessoas físicas por Adesões enseja o problema de como
assegurar proteção à pessoa física colaboradora, no âmbito criminal, outorgando-lhe benefícios em
razão da delação de práticas criminosas, incluindo situações próprias de colaboração premiada,
previstas na Lei nº 12.850/2013 (alterada pela Lei nº 13.964).
O ordenamento jurídico brasileiro se submete ao princípio da independência das
instâncias civil e criminal. Todavia, não é possível pretender que certo colaborador preste efetiva e
eficaz cooperação no desvelamento da prática de ilícitos (o que inclui práticas criminosas), se o
MPF não oferecer segurança jurídica, sob os dois prismas de possível punição, a que está
constitucionalmente legitimado a perseguir (pretensão punitiva penal e pretensão punitiva pela
prática de atos de improbidade administrativa). Mesmo que, processados e julgados em esferas
distintas de jurisdição, as pessoas físicas colaboradoras buscam proteção e previsibilidade das
consequências punitivas da delação.
O MPF tem adotado a técnica de celebração de Acordos de Leniência, com pessoas
jurídicas colaboradoras e pessoas físicas a elas relacionadas, atribuindo repercussões sancionatórias
cíveis e criminais. Esta prática, sob o ponto de vista criminal, é um enorme desafio institucional. O
novo regramento das colaborações premiadas encontra-se assim estabelecido na Lei nº 12.850/2013
(com as alterações da Lei nº 13.964/2019), em seus artigos 3º-A ao artigo 7º.
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Este regramento de Direito Penal e Direito Processual Penal deverá ser observado,
relativamente às Adesões de pessoas físicas, quando celebradas no contexto de Acordos de
Leniência, caso sejam negociadas com efeitos jurídicos criminais, e, por conseguinte, extravasando
os efeitos do domínio da improbidade administrativa.
De todo modo, os maiores desafios com esta forma estratégica de atuação mista
(celebração de acordos com pessoas jurídicas e pessoas físicas, com efeitos cíveis e criminais),
concentram-se no aspecto da delimitação da competência jurisdicional para homologação de
Adesões inseridas no Acordo de Leniência, bem como da competência jurisdicional para
homologação de Adesões posteriores dentro do Acordo-quadro originário já homologado. A Lei nº
12.850/2013 (com modificações da Lei nº 13.964/2019) não trata desta temática, mas apenas
disciplina o exercício da competência jurisdicional (artigo 4º).
Outro relevante aspecto na utilização desta estratégia de atuação ministerial repousa na
forma de cumprimento do princípio constitucional da isonomia na oferta e concessão de benefícios,
cíveis e criminais, às pessoas jurídicas colaboradas. Neste aspecto, a Lei nº 12.850/2013 (com
modificações da Lei nº 13.964/2019) dispõe que “em qualquer caso, a concessão de benefício levará
em conta a personalidade do colaborador, a natureza, as circunstâncias, a gravidade e a repercussão
social do fato criminoso e a eficácia da colaboração” (artigo 4º, §1º), prestigiando a
individualização que é uma das facetas do princípio da isonomia, ambas garantias fundamentais na
Lei Fundamental.
VIII.1 - Competência do juízo criminal de homologação do Acordo de Leniência com Adesão
ou com possibilidade posterior de Adesão (Acordo-quadro).
No caso de Acordos de Leniência com Adesões, com repercussões na esfera cível e
criminal, exsurge o problema de verificação e fixação do Juiz Criminal competente para
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homologação do Acordo.
Sobre a natureza da homologação judicial nesta temática, a jurisprudência do Supremo
Tribunal Federal assentou que:
“4. A colaboração premiada é um negócio jurídico processual, uma vez que, além
de ser qualificada expressamente pela lei como “meio de obtenção de prova”, seu
objeto é a cooperação do imputado para a investigação e para o processo criminal,
atividade de natureza processual, ainda que se agregue a esse negócio jurídico o
efeito substancial (de direito material) concernente à sanção premial a ser atribuída
a essa colaboração. 5. A homologação judicial do acordo de colaboração, por
consistir em exercício de atividade de delibação, limita-se a aferir a
regularidade, a voluntariedade e a legalidade do acordo, não havendo
qualquer juízo de valor a respeito das declarações do colaborador.” (STF, HC
127483 / PR, Relator Min. DIAS TOFFOLI, Julgamento em 27/08/2015, Tribunal
Pleno, votação unânime, Publicação Dje-021, div. 03-02-2016, pub. 04-02-2016)
O Supremo Tribunal Federal também já teve oportunidade para se manifestar sobre a
possibilidade por Juiz Criminal de homologação de colaborações premiadas, com inclusão de fatos
não sujeitos à competência do órgão homologador. Veja-se:
SEGUNDO AGRAVO REGIMENTAL NA PETIÇÃO. ACORDO DE
COLABORAÇÃO PREMIADA. HOMOLOGAÇÃO. COMPETÊNCIA.
PREVENÇÃO. DELIBERAÇÃO ACERCA DOS TERMOS DE DEPOIMENTO
NÃO CONEXOS. ENVIO DE TERMOS PARA AUTORIDADE JUDICIÁRIA
COMPETENTE. ATRIBUIÇÃO DO JUÍZO HOMOLOGATÓRIO. RECURSO
INTERNO DESPROVIDO. 1. O juízo que homologa o acordo de colaboração
premiada não é, necessariamente, competente para o processamento de todos
os fatos relatados no âmbito das declarações dos colaboradores (INQ-QO
4.130, Rel. Min. DIAS TOFFOLI, DJe de 3.2.2016). Existindo, nada obstante,
dentre esses episódios, ao menos um em que se verifique a presença de conexão
com objeto de feito previamente distribuído, adequada é a observância da regra
prevista no art. 79, caput, do Código de Processo Penal, a demandar a distribuição
por prevenção, nos exatos termos do art. 69, caput , do Regimento Interno da Corte
Suprema. 2. Os fatos dos quais não há notícia de participação de autoridade
detentora de foro por prerrogativa nesta Suprema Corte, além daqueles em
que não se observa qualquer relação de conexidade com investigações ou ações
penais em curso, devem ser encaminhados para tratamento adequado perante
a autoridade jurisdicional competente. 3. Agravo regimental desprovido. (STF,
Pet 6714 AgR-segundo / DF, Relator Min. EDSON FACHIN, Julgamento em
15/09/2017, Segunda Turma, votação unânime, Publicação Dje-219, DIV. 26-09-
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2017 PUB. 27-09-2017)
Em face desta jurisprudência – que, em nosso entendimento, não foi alterada pela
dicção do novo artigo 3º, §3º da Lei nº 13.964 – a competência judicial criminal para homologação
de Adesões inseridas em Acordo de Leniência deve ocorrer conforme as regras de competência
previstas na legislação processual penal.
O Código de Processo Final estabelece, como regras fundamentais, na matéria, que A
competência será, de regra, determinada pelo lugar em que se consumar a infração, ou, no caso de
tentativa, pelo lugar em que for praticado o último ato de execução (art. 70 – Competência pelo
lugar da infração). Na sequência, preceitua que “não sendo conhecido o lugar da infração, a
competência regular-se-á pelo domicílio ou residência do réu” (art. 72 – competência pelo domicílio
ou residência do réu). Complementa o CPP, com a disposição contida no artigo 74, pelo qual “A
competência pela natureza da infração será regulada pelas leis de organização judiciária, salvo a
competência privativa do Tribunal do Júri (art. 74 – Competência pela natureza da infração).
A matéria da competência jurisdicional se desdobra no tratamento conferido à
competência por distribuição, cuja regra geral estabelece que “a precedência da distribuição fixará a
competência quando, na mesma circunscrição judiciária, houver mais de um juiz igualmente
competente” (art. 75). Há disciplina processual criminal própria para os casos de conexão ou
continência (artigo 76 e 77 e 78). Por fim, o CPP estatui sobre a “competência por prevenção”, no
artigo 83, segundo o qual “verificar-se-á a competência por prevenção toda vez que, concorrendo
dois ou mais juízes igualmente competentes ou com jurisdição cumulativa, um deles tiver
antecedido aos outros na prática de algum ato do processo ou de medida a este relativa, ainda que
anterior ao oferecimento da denúncia ou da queixa (arts. 70, § 3o, 71, 72, § 2o, e 78, II, c).”.
Sobre homologação em colaborações premiadas, a matéria foi objeto de apreciação na
Questão de Ordem no Inquérito nº 4.130 (Min. Rel. Dias Toffoli, julgamento 23.09.2015, DJe
03.02.2016), da qual pedimos vênia para destacar os seguintes trechos, que interessam à definição
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do juízo criminal com atribuição de homologação de Acordos de Leniência com Adesões, com
efeitos cíveis e criminais:
(…) 3. A colaboração premiada, como meio de obtenção de prova, não
constitui critério de determinação, de modificação ou de concentração de
competência.
4. A competência para processar e julgar os crimes delatados pelo colaborador
que não sejam conexos com os fatos objeto da investigação matriz dependerá
do local em que consumados, de sua natureza e da condição das pessoas
incriminadas (prerrogativa de foro). (...)
6. A prevenção, essencialmente, não é um critério primário de determinação
da competência, mas sim de sua concentração, razão por que, inicialmente,
devem ser observadas as regras ordinárias de determinação da competência,
tanto ratione loci (art. 70, CPP) quanto ratione materiae.
7. Nos casos de infrações conexas, praticadas em locais diversos, hão de ser
observadas as regras de determinação do foro prevalente previstas no art. 78 do
Código de Processo Penal, uma vez que a conexão e a continência importam em
unidade de processo e julgamento.
8. A prevenção, nos termos do art. 78, II, c, do Código de Processo Penal,
constitui critério residual de aferição da competência.
9. Não haverá prorrogação da competência do juiz processante - alargando-a para
que conheça de uma causa para a qual, isoladamente, não seria competente -, se
não estiverem presentes i) uma das hipóteses de conexão ou de continência (arts.
76 e 77, CPP) e ii) uma das hipóteses do art. 78, II, do Código de Processo Penal.
(...)”
O entendimento exposto neste Acórdão segue a diretriz de diferenciar a competência
para homologar o Acordo e a competência para processar e julgar os crimes objeto da delação. Está
muito claro que a competência de homologação não atrai, por si só, a competência para processo e
julgamento de crimes desvelados no curso da colaboração. Deste modo, inexistindo conexão ou
continência, a competência para homologação de Acordos com Adesões com relevância criminal
segue regularmente as normas processuais penais.
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Outro problema é a atribuição de homologação de novas Adesões que venham a ser
celebradas como desdobramento do Acordo de Leniência com Adesão originário, tenha (acordo-
quadro) ou não, este Acordo cláusulas genéricas sobre o processamento e concessão de benefícios.
Como solução recomendável, temos que na competência para homologação de Adesão
de pessoas físicas ao Acordo de Leniência, para fins criminais, com base em precedentes
jurisprudenciais do Supremo Tribunal Federal, deverão ser tomados os juízos competentes para
cada um dos conjuntos de eventos retratados nos anexos, sem prejuízo da adoção de regras de
prevenção e de conexão, com a priorização, nesse caso, do Juiz Criminal da Homologação da
colaboração premiada originária.
Sob o ponto de vista processual penal, não haverá maior controvérsia nesta solução,
quando estiverem preenchidas as hipóteses de conexão intersubjetiva, teleológica ou
instrumental entre os ilícitos abarcados pelo Acordo de Leniência (com Adesões) originário e os
ilícitos das Adesões posteriores.
Dúvida será suscitada no caso de fatos sem conexão/continência, objeto de Adesões
posteriores, que poderiam em tese ensejar a homologação mediante livre distribuição, perante
outros Juízos criminais, considerando apenas a delimitação dos fatos ilícitos novos.
Na prática da execução de Acordos de Leniência com Adesões posteriores, com
narrativas de fatos ilícitos novos, tem-se observado que a pessoa jurídica colaboradora, cumprindo
obrigações assumidas no Acordo, tem dado continuidade às investigações internas corporativas, em
cujos relatórios finais se demonstra a ocorrência de ilícitos diversos daqueles abrangidos pelo
Acordo e suas Adesões homologadas.
É recomendável reconhecimento de forma especial de conexão instrumental. O não
reconhecimento da conexão, para efeito de homologação das Adesões posteriores, tem ocasionado o
que se denomina pulverização da colaboração, retirando não raro a apreciação das colaborações
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posteriores do contexto das colaborações originárias ou precedentes.
Há, pois, interesse em se reconhecer não só a atribuição do Membro celebrante para dar
continuidade ao processo de execução da leniência, com novas Adesões, como também a atribuição
do juízo criminal de homologação das Adesões inseridas em Acordo de Leniência, para processar e
homologar as novas Adesões, pela configuração de conexão instrumental, entre o processo anterior
de colaboração e os demais processos derivados de novas Adesões colaborativas.
A competência jurisdicional do Juízo que homologou as Adesões inseridas em Acordo
de Leniência deveria estender-se à homologação das Adesões posteriores, em vista de conexão
probatória. Este Juízo deveria possuir ampla competência para decidir acerca das questões relativas
às adesões do Acordo de Leniência, e, por igual razão, acerca das questões subjacentes a novos
Termos de Adesão, que são desdobramentos do contexto colaborativo inaugural ou precedente.
A crescente complexidade da prática de atos de corrupção não pode servir de esteio para
evitar a conexão, destacadamente, a instrumental, na medida em que os acordos (acordo originário e
adesões derivadas) são construídos em face de determinado marco contextual, em face do qual
deveres, ônus, obrigações e benefícios legais foram avaliados, negociados, delimitados e
cristalizados no modelo negocial de atuação institucional.
VIII.2 – Acordo de Leniência, adesão de pessoas físicas e isonomia da concessão de benefícios.
Afigura-se imprescindível à eficiência do Programa de Leniência que os colaboradores
(sejam pessoas jurídicas e físicas) possuam a garantia de obter uma situação jurídica mais favorável
do que aquela em que estejam colocados os agentes não colaboradores. No entanto, essa
desigualdade jurídica deve ser configurada entre aqueles que optaram pela colaboração e aqueles
que não o fizeram. Entre os colaboradores deve haver tratamento isonômico e proporcional, na
concessão de benefícios, tendo em vista as circunstâncias de cada colaborador, elementos de
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corroboração apresentados, fatos ilícitos descortinados, e utilidade para as investigações, visando a
efetividade da persecução ministerial, seja no domínio punitivo civil ou no domínio criminal.
Entende-se que o tratamento jurídico diverso conferido a sujeitos colaboradores e
sujeitos não colaboradores encontra amparo no princípio constitucional da isonomia (artigo 5º,
caput, da CF). Estes sujeitos não estão em situação de igualdade jurídica. Como bem assinala
Frederico Valdez Pereira:
“Em relação ao tratamento distinto entre sujeitos colaboradores e não
colaboradores, é possível perceber já na simples constatação do fenômeno as
razões pelas quais não há identificação substancial na situação daquele que
direciona a contraconduta pós-delitiva em oposição aos interesses da organização
criminosa da qual fazia parte, agregando na busca de esclarecimentos dos crimes e
de evitação de novas potenciais agressões ao bem jurídico tutelado, além de
manifestar comportamento tendente a amenizar o juízo de periculosidade e indicar
melhores possibilidade de reinserção social, e o agente com posição oposta de
constância ao pactum scelleris.”24
No âmbito criminal, encontram-se previstos, no artigo 4º da Lei nº 12.850/2013, os
benefícios de perdão judicial, redução em até 2/3 (dois terços) da pena privativa de liberdade, ou de
substituição dela por pena restritiva de direitos, em favor daquele que tenha colaborado efetiva e
voluntariamente com a investigação e com o processo criminal, desde que dessa colaboração
advenha um ou mais dos seguintes resultados: I - a identificação dos demais coautores e partícipes
da organização criminosa e das infrações penais por eles praticadas; II - a revelação da estrutura
hierárquica e da divisão de tarefas da organização criminosa; III - a prevenção de infrações penais
decorrentes das atividades da organização criminosa; IV - a recuperação total ou parcial do produto
ou do proveito das infrações penais praticadas pela organização criminosa; V - a localização de
eventual vítima com a sua integridade física preservada (artigo 4º).
24 PEREIRA, Frederico Valdez. Delação premiada. 3ª ed., Curitiba: Editora Juruá, 2016, p. 73.
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O tratamento isonômico e proporcional está agasalhado no mandamento legal, pelo
qual, em qualquer caso, a concessão do benefício levará em conta a personalidade do colaborador, a
natureza, as circunstâncias, a gravidade e a repercussão social do fato criminoso e a eficácia da
colaboração, constante do parágrafo 1º do artigo 4º.
Andrey Borges de Mendonça25 bem observa que a colaboração premiada poderá ensejar
a concessão de benefícios previstos em lei, como também benefícios não previstos em lei, na medida
em que a lei não disciplinou à exaustão o poder de negociação das partes, assim como a
possibilidade e os limites de negociação sobre benefícios processuais. O autor desconstrói, com
rigor, os argumentos contrários a esta ampla margem de decisão ou de negociação, afirmando que
não contraria o princípio da legalidade, já que se trata de ajuste em favor do sujeito ou indivíduo;
que não se sustenta ver na colaboração estímulo para acordos falsos, já que este tipo de conduta
viciada não exsurge apenas nesta forma consensual de atuação, e a maior concessão ou não de
benefícios não influencia diretamente a maior ou menor chance de haver acordos contaminados pela
falsidade; que a colaboração premiada não viola a garantia da individualização da pena a ser
assegurada pelo Poder Judiciário, vez que a colaboração premiada também realiza esta
individualização, e o Poder Judiciário possui atribuição essencial no controle da sua formação
(através da homologação) e de sua execução.
Em cumprimento à referida norma, o Acordo de Leniência com Adesões com
repercussão penal – caso em que tais repercussões podem ser tratadas com pessoas físicas
signatárias do ajuste, ou, posteriormente, através de outras Adesões - pode estabelecer parâmetros
de concessão de benefícios, considerando o contexto global dos ilícitos a serem revelados e dos
objetivos a que está preordenada a colaboração com a pessoa jurídica e pessoas físicas, que deverão
ser observados no desdobramento do processo de colaboração, por ocasião de novas Adesões.
25 MENDONÇA, Andrey Borges de. Os benefícios possíveis na colaboração premiada; entre a legalidade e a
autonomia de vontade. In: MOURA, Maria Thereza de Assis; BOTTINI, Pierpaolo Cruz. Colaboração Premiada.
São Paulo: RT, 2017. p. 53-104.
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A previsão de parâmetros de concessão de benefícios para pessoas físicas aderentes, no
texto do Acordo de Leniência com Adesões, serve para aumentar o grau de previsibilidade dos
sujeitos colaboradores, na decisão individual a ser tomada. Haverá um “Acordo-quadro”, referencial
da forma como a Instituição do Parquet deverá ou poderá conduzir os desdobramentos da execução
da leniência, relativamente às pessoas físicas. É uma forma de disciplinar os benefícios para o
contexto da específica situação objeto da colaboração, através da identificação de benefícios e seus
condicionamentos, propiciando maior segurança jurídica e isonomia no processamento das Adesões.
A aprovação destas “condições gerais” ou “diretrizes básicas” servirão como forma de
regulamentação de cada situação individual que ingressará no marco da colaboração.
Cabe reproduzir que estas cláusulas de benefícios do Acordo de Leniência devem
observar as limitações materiais próprias da colaboração premiada. Na lição de Andrey Borges de
Mendonça:
“Sobre os eventuais limites materiais aos benefícios a serem concedidos, podem ser
sumarizados os seguintes, de maneira não exaustiva: (i) o benefício não pode ser
expressamente vedado por lei; (ii) deve haver relativa cobertura legal, permitindo a
analogia, embora sejam possíveis adaptações ao caso concreto; (iii) o objeto do
acordo deve ser líc ito e moralmente aceitável; (iv) deve respeitar os direitos
fundamentais e a dignidade da pessoa humana; (v) deve haver razoabilidade na
concessão do benefício (adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido
estrito); (vi) deve haver legitimidade do Ministério Público para conceder o
benefício. De qualquer sorte, apenas a análise do caso concreto, com suas
particularidades, que permitirá ao Poder Judiciário verificar a legalidade do
benefício concedido.”26
Estabelecidas no Acordo de Leniência (Acordo-quadro), por Membro do MPF com
atribuições regulares, as condições gerais inscrevem-se como diretrizes da celebração das
posteriores adesões, devendo ser avaliadas por outros Membros do MPF não celebrantes, no
exercício das suas funções na conformação deste instituto relevante de justiça negociada.
26 Ibidem, p. 104.
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IX – Alteração da Lei nº 8.429/1992 pela Lei nº 13.964/2019 (“Pacote anti-crime”).
A Lei de Improbidade Administrativa foi alterada pela Lei nº 13.964/2019, que alterou a
redação do parágrafo 1º do artigo 17, bem como incluiu o parágrafo 10-A, no elenco do referido
dispositivo. Pela redação originária, estabelecia-se que era vedada a transação, acordo ou
conciliação nas ações de que trata o caput. Com a nova redação, “as ações de que trata este artigo
admitem a celebração de acordo de não persecução cível, nos termos desta Lei”. Seguindo a
mesma diretriz de consensualidade, foi aprovada nova regra, estabelecendo que “Havendo a
possibilidade de solução consensual, poderão as partes requerer ao juiz a interrupção do prazo
para a contestação, por prazo não superior a 90 (noventa) dias”.
As novas disposições da LGIA - em cujo domínio estão inseridas as infrações e sanções
da Lei nº 12.846/2013 – agasalham um novo tratamento normativo para os acordos no campo da
improbidade administrativa. Mesmo tendo sido vetado o artigo 17-A, do Projeto de Lei aprovado,
restou positivada a possibilidade jurídica de celebração de acordos no campo da improbidade
administrativa, seguindo-se a diretriz já constante da Lei nº 12.846/2013, quando admitiu a
celebração de Acordo de Leniência, em seu artigo 16.
Com as novas disposições, pode-se afirmar que os termos de adesões de pessoas físicas
a Acordos de Leniência estão ora amparados em expresso permissivo legal, que não faz distinção
entre os possíveis celebrantes de acordos no domínio da improbidade (pessoas físicas ou pessoas
jurídicas).
Mesmo a intensa controvérsia que as novas disposições ensejam na aplicação da norma,
ambas corroboram a legitimidade da admissão das adesões a acordos de leniência consagrados para
pessoas jurídicas, considerando que esta forma de consensualidade atende aos objetivos das novas
disposições legais da LGIA, como já atendia à lógica da Lei Anticorrupção.
Por fim, esta interpretação também se coaduna com o tratamento conferido à
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cooperação pela Convenção Internacional contra a Corrupção – Convenção de Mérida, internalizada
no Direito Brasileiro (Decreto nº 5.687/2006), em seu artigo 37, verbis:
Artigo 37
Cooperação com as autoridades encarregadas de fazer cumprir a lei
1. Cada Estado Parte adotará as medidas apropriadas para restabelecer as pessoas que
participem ou que tenham participado na prática dos delitos qualificados de acordo com a
presente Convenção que proporcionem às autoridades competentes informação útil com
fins investigativos e probatórios e as que lhes prestem ajuda efetiva e concreta que possa
contribuir a privar os criminosos do produto do delito, assim como recuperar esse produto.
2. Cada Estado Parte considerará a possibilidade de prever, em casos apropriados, a
mitigação de pena de toda pessoa acusada que preste cooperação substancial à investigação
ou ao indiciamento dos delitos qualificados de acordo com a presente Convenção.
3. Cada Estado parte considerará a possibilidade de prever, em conformidade com os
princípios fundamentais de sua legislação interna, a concessão de imunidade judicial a toda
pessoa que preste cooperação substancial na investigação ou no indiciamento dos delitos
qualificados de acordo com a presente Convenção.
4. A proteção dessas pessoas será, mutatis mutandis, a prevista no Artigo 32 da presente
Convenção.
5. Quando as pessoas mencionadas no parágrafo 1 do presente Artigo se encontrem em um
Estado Parte e possam prestar cooperação substancial às autoridades competentes de outro
Estado Parte, os Estados Partes interessados poderão considerar a possibilidade de celebrar
acordos ou tratados, em conformidade com sua legislação interna, a respeito da eventual
concessão, por esse Estrado Parte, do trato previsto nos parágrafos 2 e 3 do presente Artigo.
Interessante perceber que a consensualidade prevista no domínio da “penalização
e aplicação da lei”, está direcionada para meios que “proporcionem às autoridades competentes
informação útil com fins investigativos e probatórios e as que lhes prestem ajuda efetiva e concreta
que possa contribuir a privar os criminosos do produto do delito, assim como recuperar esse
produto”, bem como meios que habilitem “em casos apropriados, a mitigação de pena de toda
pessoa acusada que preste cooperação substancial à investigação ou ao indiciamento dos delitos
qualificados de acordo com a presente Convenção”. A celebração de Acordos de Leniência com
Adesões, conforme o perfil descrito na presente Nota Técnica, está alinhado com estes objetivos
convencionais, de tutela do interesse público anticorrupção, e deve ser o norte de interpretação da
consensualidade aberta no domínio da improbidade administrativa, nos termos da Lei nº
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13.964/2019, para que efetivamente se torne uma medida “anti-crime” efetiva.
X – Conclusões
1. Em síntese, a criação da possibilidade de subscrição ou adesão de pessoas físicas ao
Acordo de Leniência surgiu da necessidade prática de harmonizar a atuação civil (e criminal) do
MPF no combate a práticas de corrupção, que já se mostra consolidada e indispensável ao
atendimento do interesse público.
2. Referida adesão de pessoas físicas ao Acordo de Leniência é instrumento
indispensável para um Programa de Leniência consistente e eficaz. Embora não haja previsão legal
expressa na Lei nº 12.846/2013, nem mesmo na nova redação da Lei nº 8.429/1992, há que se
ressaltar a sua previsão na Orientação nº 7/2017, da 5ª Câmara de Coordenação e Revisão do
Ministério Público Federal, assim como a inexistência de impedimento legal para esta prática
institucional, que visa a garantir efetividade máxima da cooperação objeto da leniência.
3. Não há ofensa ao princípio constitucional da independência funcional na celebração
de Acordos de Adesão ao Acordo de Leniência celebrado anteriormente por outro Membro do
Ministério Público Federal, respeitando-se as suas balizas gerais, uma vez que o acordo inicial é
amparado na legalidade. A qualquer tempo, a adesão de outro Membro do MPF permanece
voluntária, com possibilidade legal de utilização dos elementos de prova obtidos, sobre fatos
abrangidos pelo acordo.
4. O princípio constitucional da unidade do Ministério Público mostra-se fundamental
na temática da celebração de Acordos de Leniência, pois convive com a independência funcional a
fim de garantir não só a unicidade e a racionalidade do Acordo, mas também os efeitos perante
colaboradores, os próprios Membros do Ministério Público Federal não celebrantes, e terceiros.
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5. O princípio constitucional da indivisibilidade do Ministério Público é fundamental na
estruturação do Programa de Leniência no âmbito do Ministério Público Federal, porquanto oferece
à atuação funcional do Membro negociador a voz do MPF para dar com definitividade e unidade
institucional a solução adequada, justa e proporcional em face da delimitação dos fatos abrangidos
pelo acordo.
6. A 5ª Câmara de Coordenação e Revisão do Ministério Público Federal, cuja
competência está destacada no artigo 58 da Lei Complementar nº 75/1993, tem atribuição
homologatória e de verificação da legalidade de todo o processo administrativo do Acordo de
Leniência, incluindo a homologação de Adesões.
7. Na competência para homologação de Adesão de pessoas físicas ao Acordo de
Leniência, para fins criminais, com base em precedentes jurisprudenciais do Supremo Tribunal
Federal, deverão ser tomados os juízos competentes para cada um dos conjuntos de eventos
retratados nos anexos, sem prejuízo da adoção de regras de prevenção, com a priorização, nesse
caso, do Juiz Criminal da Homologação da colaboração premiada originária.
8. Entre os colaboradores deve haver tratamento isonômico e proporcional, na
concessão de benefícios, tendo em vista as circunstâncias de cada colaborador, elementos de
corroboração apresentados, fatos ilícitos descortinados e abrangidos pelo acordo, e utilidade para as
investigações, visando a efetividade da persecução ministerial, cível ou criminal.
9. A previsão no Acordo de Leniência de parâmetros de concessão de benefícios para
novas pessoas físicas aderentes propicia maior segurança jurídica e isonomia no processamento das
adesões posteriores.
10. Demonstrada a possibilidade de estipulação de cláusulas balizadoras de adesões
individuais, para efeitos cíveis e criminais, também é importante destacar que sua observância em
cada caso concreto deve ser avaliada pelo membro do MPF, que atua no desdobramento do processo
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de colaboração.
11. As Adesões de pessoas físicas a Acordos de Leniência, legalmente previstos para
pessoas jurídicas, atendem, de forma plena, aos objetivos legais, tanto os cristalizados na Lei nº
12.846/2013 (Lei Anticorrupção), quanto os depreendidos pelas novas regras da Lei nº13.964/2019
que alteraram a Lei Geral de Improbidade Administrativa (Lei nº 8.429/1992).
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