1AXA 2009 Competências para as Carreiras de Sucesso 2009 Patrícia Lenine.
NORONHA, Ricardo - Lenine Em Portugal. a Corrente Marxista-leninista e Os Escritos Do “Camarada...
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7/17/2019 NORONHA, Ricardo - Lenine Em Portugal. a Corrente Marxista-leninista e Os Escritos Do “Camarada Campos”
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Lenine em Portugal: a corrente marxista-leninista e os escritos do “camarada
Campos”
Ricardo Noronha
"Pretende-se com esta comunicação passar em revista os escritos produzidos por Francisco Martins Rodrigues, no contexto do seu abandono do PCP e da criação dacorrente marxista-leninista em Portugal. A abordagem crítica dos seus textos – queinauguraram o campo teórico da extrema-esquerda em Portugal – procurará identificaras causas da sua dissidência e os principais eixos de análise e reflexão acerca da
formação social portuguesa e da luta contra a ditadura no contexto dos anos 60." Leiaesta comunicação apresentada por Ricardo Noronha ao Congresso I nternacional Karl
Marx , no painel Histór ia do Comunismo em Portugal .Lenine em Portugal: a corrente marxista-leninista e os escritos do “camarada
Campos”
Resumo
Pretende-se com esta comunicação passar em revista os escritos produzidos por Francisco Martins Rodrigues, no contexto do seu abandono do PCP e da criação dacorrente marxista-leninista em Portugal. A abordagem crítica dos seus textos – queinauguraram o campo teórico da extrema-esquerda em Portugal – procurará identificaras causas da sua dissidência e os principais eixos de análise e reflexão acerca da
formação social portuguesa e da luta contra a ditadura no contexto dos anos 60.Salientaremos como elementos fundamentais desses documentos a interpretação dahistória do movimento operário português e da resistência ao Estado Novo, acaracterização da economia e da sociedade portuguesa e a formulação de uma estratégia
de combate político alternativa à do PCP. Procurar-se-á sublinhar em que medida aanálise dos ciclos de radicalização da luta social e política, o posicionamento sobre aquestão colonial e a definição das etapas e tarefas da «Revolução Portuguesa» serviramde referência teórica fundadora para o conjunto da extrema-esquerda portuguesa nosanos posteriores à sua prisão (1966) e contribuíram para a radicalização da oposiçaoao regime. Será objecto de particular análise a resposta ensaiada pelo PCP – nomeadamente através dos escritos do seu Secretário-Geral Álvaro Cunhal – aoaparecimento e crescimento de agrupamentos políticos situados à sua esquerda.
Escrito entre os finais de 1963 e os inícios de 1964, «Luta pacífica e luta armada no nossomovimento» foi o texto fundador do movimento, onde «Campos» condensou e clarificou
o essencial das críticas que formulara em diversas ocasiões nos anos anteriores,
geralmente por carta enviada ao C.C., à linha política do PCP. Interessa sublinhar a
influência deste texto que, reeditado em 1974, circularia até ao 25 de Abril, de forma
restrita e clandestina, pelos militantes m-l’s.
O seu tema central, a abordagem da possibilidade e necessidade de encetar acções de luta
armada contra o regime salazarista, é atravessado por duas questões fundamentais para a
compreensão do que está em causa. São argumentos, mas também, pela forma queassumem, temas de reflexão teórica habitualmente ausentes dos debates internos no PCP.
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O primeiro é uma referência histórica sem a qual os argumentos de «Campos» careceriam
de fundamento ou base de sustentação. Tratava-se do «ciclo de lutas de 1958-62», que
assinalara a vulnerabilidade do Estado Novo, mas também a sua capacidade de
sobrevivência, funcionando como uma experiência política repleta de lições. O ciclo de
lutas em causa ia desde as eleições presidenciais de 1958 às greves de 1962 nos campos
do Sul, passando pelos vários choques violentos entre as forças policiais e manifestantes
(desde os comícios de apoio a Humberto Delgado até às manifestações de 1 e 8 de Maio
de 1962, realizadas em Lisboa) e ao alargamento da base social de luta contra o regime,
evidenciado na crise académica de 1962. A dar a tónica decisiva a todos esses
acontecimentos, o início da Guerra Colonial em Fevereiro de 1961 (ataque à prisão de
Luanda) e a gorada sublevação do Quartel de Beja, em 1962, haviam colocado o
movimento anti-fascista português perante uma série de novos problemas.
A estratégia do PCP, desde a «reorganização» dos anos 40, assentava no desenvolvimentode lutas de massas com base em reivindicações económicas parciais e na sua confluência
em lutas superiores, de maiores dimensões e com objectivos explicitamente políticos, que
levassem a um “levantamento nacional” com a participação de sectores democráticos
das forças armadas e a neutralidade dos sectores intermédios. Tratava-se de uma linha
política que procurava assegurar ao PCP, através da sua influência social, um lugar central
na oposição ao regime e que consistia, fundamentalmente, em conduzir os movimentos e
lutas sociais tendo como horizonte a negociação com as restantes forças da oposição -
nomeadamente os liberais e republicanos (que no início dos anos 60 se haviam organizado
num Directório Democrático e Social e cuja influência junto de alguns sectores de oficiais
das Forças Armadas permitia imaginar uma solução deste tipo).
Este tipo de horizonte estratégico havia demonstrado a sua inadequação precisamente no
decorrer do ciclo de lutas de 1958-62, ao deixar um movimento popular amplo, combativo
e radicalizado na expectativa - relativamente às conjuras mais ou menos palacianas
levadas a cabo por algumas altas patentes militares (nomeadamente a“conspiração da
Sé” em 1959 e o golpe militar do General Botelho Moniz em 1961) - e dependente da
hesitação, temor e moderação das elites liberais. Temos assim que a interpretação
histórica do «ciclo de lutas» e do impasse em que este resultara conduzia «Campos» à
necessidade de formular uma estratégia alternativa, que identificava no seio da Oposiçãodemocrática diferentes classes sociais, posicionamentos políticos conflituais e por vezes
até antagónicos.
Tratava-se de identificar um «centro de gravidade do Movimento», protagonizado
pelos sectores sociais de vanguarda – os mais combativos, radicalizados e reprimidos – e
pelo seu comportamento político, do qual o Partido devia ser o intérprete e porta-voz, ao
invés de o nivelar pelas posições políticas mais recuadas com o propósito de garantir a
máxima unidade e a participação mais ampla.
Se a contradição entre os dois campos sociais no interior da Oposição democrática ao
regime parecia a Francisco Martins Rodrigues um factor de paralização da dinâmica
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popular, a redução da estratégia para o derrubamento do fascismo à defesa da mais ampla
unidade tornara-se um impasse em que o PCP se havia deixado aprisionar. A única
maneira de desenredar este nó górdio seria a formulação de uma estratégia autónoma, em
que o movimento popular adquirisse a sua própria força de ataque e deixasse de depender
de altas patentes militares para a preparação de uma insurreição contra o regime. "Omovimento revolucionário tinha o seu crescimento próprio, acumulava a sua experiência
própria, formava a sua «personalidade própria», e o papel do partido não era de modonenhum o de «fabricar» um movimento revolucionário, mas o de o conduzir àvitória.” (p.30).
"Campos" definia como tarefas imediatas do partido a teorização e propaganda a favor
do uso da violência e a criação de núcleos armados como base do futuro exército popular.
Perante a capacidade de sobrevivência da ditadura aos vários momentos legais ou semi-
legais até aí ensaiados pela Oposição Democrática (greves, manifestações, marchas de
luta, petições, eleições) sublinhava a necessidade de subordinar a utilização das formaslegais de luta a um processo geral de radicalização da classe operária e dos sectores
populares, passando das formas mais recuadas até ao confronto violento, iniciando a luta
armada contra a ditadura, protagonizada por pequenos focos de guerrilha provenientes e
ligados aos movimentos de massas, embrião e preparação da futura insurreição popular.
Ao caracterizar a ditadura como um sofisticado e extenso aparelho de repressão e
vigilância do movimento operário e popular, considerava que esta se esforçara “por não
precipitar de modo nenhum a passagem às formas extremas de luta, por manter a luta declasses em limites controláveis”, tornando-se “mestre na arte das falsas concessões, na
capacidade de manobra, no avanço e recuo conforme as circunstâncias.”
Resultando “da extrema agudização atingida pela luta de classes em Portugal, da
radicalização revolucionária do proletariado e das grandes massas oprimidas quedefrontam um aparelho repressivo gigantesco”, a questão da violência era considerada o
definitivo separador das águas entre reformistas e revolucionários. A sua recusa seria a
renúncia da hegemonia do proletariado na luta contra a ditadura, cuja queda ficaria
dependente de um levantamento militar, do qual resultaria uma mera recomposição liberal
do estado burguês.
Ao reivindicar para o proletariado uma independência política e uma estratégia própriacorrespondente à sua centralidade na luta contra o regime, as formulações teóricas
de «Revolução Popular» abriam um novo horizonte estratégico - implicando uma
releitura da história portuguesa e um esforço de interpretação sociológica capaz de
caracterizar o papel histórico do Estado Novo inscrevendo o seu funcionamento na
formação social portuguesa e nos conflitos sociais que a atravessavam.
Desse ponto de vista, o salazarismo não era um retrocesso face ao período republicano,
mas uma necessidade histórica da burguesia portuguesa, na consolidação de um processo
de acumulação às custas da classe operária e do proletariado rural, assente num mercado
protegido e na sobre-exploração dos recursos e mão-de-obra das colónias.
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O Salazarismo não era um parêntesis histórico, uma anomalia, ou um regresso ao antigo
regime, mas uma articulação de múltiplos interesses de classe, hierarquizados desde o
sector financeiro e industrial até à burguesia liberal, no seio da qual existiam contradições
mas, de modo algum, antagonismos fundamentais (como os que opunham o capital ao
trabalho). Numa fórmula lapidar:“«Salazarismo» quer dizer simplesmente capitalismo
português.”(1)
As suas explosivas contradições seriam as de um capitalismo desenvolvido, ainda que
semi-periférico e subordinado ao capital imperialista, e não as de um país submerso por
uma escura noite fascista. Desvendava-se deste modo a roupagem ideológica com que se
cobria o salazarismo e que a restante oposição aceitava e incorporava como os elementos
estruturantes do combate político - fazendo-o girar à volta do épico confronto entre
progresso e conservadorismo, entre verdadeiros patriotas e vendidos aos interesses
estrangeiros, entre oposição e situação.
O CMLP pelo contrário, formulava a sua estratégia a partir do conjunto das contradições
contidas na formação social portuguesa: a alta concentração operária nas cinturas
industriais de Lisboa e Porto, a combatividade e número do proletariado rural nos campos
do sul, a extrema pobreza dos camponeses pobres do centro e norte do país, a amplitude
da revolta dos povos colonizados e o impacto da luta armada dos movimentos de
libertação nacional.
Contra o que chamava a “modernização do poder da burguesia” e a passagem a “um
capitalismo moderno”, o CMLP antecipa uma revolução popular assente na subversão da
ordem burguesa.
O desenvolvimento capitalista em Portugal havia feito da cintura industrial de Lisboa um
elo fraco da cadeia imperialista, devido à grande concentração industrial, baixos salários
e uma aristocracia operária quase inexistente. A ditadura fazia de todas as reivindicações
um crime e de cada protesto um confronto, politizando inevitavelmente todas as lutas
económicas e fortalecendo o ódio da classe operária, tornando-a favorável à insurreição.
O espaço para a intervenção e planeamento legal das lutas tornava-se uma luta
permanente pela legalidade que paralisava frequentemente as massas e expunhainutilmente a sua vanguarda: “O SN é uma repartição pública como outra qualquer (pior
ainda que as outras, porque emprega bufos da PIDE, está geralmente encerrada e osdesfalques se sucedem). O operário fala do “sindicato” como fala do bordel ou da
esquadra da polícia.” (“Isolar e aniquilar os «sindicatos» fascistas”, nº6, Dezembro
1965).
A única via verdadeiramente revolucionária, perante a ausência de qualquer liberdade real
de organização e luta da classe operária, seria a formação de comités sindicais clandestino
à margem da estrutura corporativa, única maneira da classe operária se organizar de forma
autónoma e protegida da repressão para tornar a sua luta económica numa luta política,
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insurrecional.
Na óptica da revolução popular, desempenhava um papel central a formação de uma
aliança entre a classe operária e o campesinato, teorizada no artigo “O abandono da
aliança operário-camponesa” (nº1, Outubro de 1964), onde se procurava elaborar uma
caracterização marxista das classes sociais dos campos e da luta de classes que as opunha
e ligava umas às outras. Distinguindo a existência de 700 000 pequenas explorações
familiares, a par de 500 000 famílias expropriadas de terras que compunham o
«proletariado rural e de cerca de 150 000 famílias de camponeses médios e ricos que
compõem a «pequena-burguesia camponesa», o artigo sublinhava as implicações
políticas destas diferentes condições sociais, nomeadamente no que respeitava à luta
contra os grandes latifundiártios e rendeiros capitalistas. A aliança operário-camponesa,
assentaria no proletariado rural que, juntamente com os camponeses pobres
(independentes ou jornaleiros sazonais), formava 9/10 da população dos campos. A sua
formação implicava a disputa da influência da burguesia liberal e dos camponeses maisabastados sobre os camponeses pobres, através do seu domínio dos grémios e associações
camponesas e da importância social dos médicos, advogados e outras profissões liberais
no plano local. A tarefa dos militantes comunistas seria contribuir para a mobilização dos
camponeses pobres, para a sua emancipação ideológica e para compreensão dos seus
interesses próprios, formando comités camponeses e criando focos de agitação nos
campos, tendo como eixo central da sua intervenção a propaganda de uma reforma agrária
que expropriasse os grandes proprietários, abolisse as dívidas, todo o tipo de rendas e
obrigações, permitindo a concessão de crédito por um novo estado popular e o
crescimento da produção agrícola.
Defendendo a sabotagem e o boicote do esforço de guerra, a par da deserção organizada
de massas antes do embarque, o CMLP procurou ainda, num artigo intitulado "Oscomunistas e a questão colonial" (nº6, Dezembro 1965), atacar não apenas o chauvinismo
da propaganda salazarista, como aquele outro chauvinismo latente e subtil, difuso nas
fileiras democráticas: “Ao longo dos séculos, formou-se e sedimentou uma ideologiaimperialista que se recebe na escola, na imprensa, na vida diária, que penetra por todaa parte sem sequer ser notada. A cada passo se podem ouvir a pessoas progressistasconceitos imperialistas. E o facto de Portugal ser um país dependente do imperialismo
estrangeiro ainda mais contribuiu naturalmente para exacerbar esse chauvinismoimperialista , como uma forma de compensação para as humilhações sofridas”.
Dominada pela hegemonia da burguesia liberal, a oposição ao regime seria incapaz de
apoiar os movimentos de libertação colonial de modo consequente. Começando por
demonstrar que os lucros dos bancos portugueses controlados pelos grandes grupos
económicos e a penetração do capital estrangeiro na economia portuguesa haviam
aumentado com a guerra (nalguns casos duplicado ou até triplicado), o artigo sublinhava
que o colonialismo português não era uma invenção recente do regime, mas o resultado
de 500 anos de história. Por via dos seus inúmeros interesses e investimentos nas colónias,
todas as camadas da burguesia eram colonialistas, incluindo as que se agrupavam no
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campo liberal e anti-fascista sob palavras de ordem democráticas e civilizadoras,
procurando acautelar os interesses económicos portugueses no processo de independência
das colónias e preparando o terreno para novas formas de colonialismo e subordinação.
A formação de um amplo e combativo movimento anti-colonialista, expressão da
solidariedade e identidade de interesses entre o proletariado metropolitano e os povos
colonizados, dependia pois da velocidade com que mais e mais sectores sociais se
emancipassem desse chauvinismo - último refúgio da tutela burguesa sobre o movimento
operário e popular - e exprimindo a sua oposição, não apenas à guerra colonial, mas ao
próprio sistema colonial.
A existência e o trabalho do CMLP, influenciou a formação mais tardia de s outros grupos
M-L e inspirou parte da sua actuação. A sua crítica foi a primeira tentativa de elaborar
uma leitura do marxismo-leninismo alternativa à do PCP, adaptada às condições da luta
contra a ditadura, extraindo de cada acontecimento as lições políticas fundamentais,introduzindo uma nova concepção teórica, um olhar diferente sobre a história do
movimento operário português. Debruçando-se sobre as contradições sociais
fundamentais que a ditadura continha e acumulava, identificando nelas uma força
dialéctica capaz de inscrever a questão social no centro da luta política, o CMLP
antecipou alguns aspectos da revolução portuguesa. Ao antecipar a queda da ditadura
como um possível abalo da ordem capitalista em Portugal, uma crise de poder desde a
produção industrial à propriedade fundiária, desde a escola às instituições políticas, que
o proletariado deveria aproveitar para afirmar a sua linha política independente e os seus
interesses específicos enquanto classe, a corrente «marxista-leninista» contribuiu para a
radicalização do confronto entre a oposição e o regime na fase final da ditadura e rasgou
um horizonte histórico para a revolução que viria a ser “o último palco leninista da
europa”.
(1) «Luta de classes ou “unidade de todos os portugueses honrados”», ibidem, pp.63-85
Ricardo Noronha
Doutorando em História pela FCSH-UNL, Bolseiro de investigação da FCT
No intuito de divulgar as comunicações que foram apresentadas aoCongressoI nternacional Karl M arx temos vindo a publicar aquelas que os autores nos foramentregando. Esperamos que a publicação desta estimule outros intervenientes aenviarem-nos as suas. Estamos gratos ao Ricardo Noronha por nos ter facultado a suacomunicação.