No Mundo Estrela - BOOKSMILE · 2020. 2. 18. · a usar magia negra — disse o veado. —...
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No Mundo Estrela
Milhões de estrelas pequeninas brilhavam no céu
negro como veludo, projetando uma luz cintilante
sobre as montanhas e vales, florestas e lagos. Num
bosque, quatro dos animais mais sábios do Mundo
Estrela reuniram -se em volta de uma lagoa da floresta
— uma coruja, um lobo, um veado e um texugo.
As penas e o pelo deles brilhavam com a poeira
estelar, e os seus olhos eram de um profundo azul-
-índigo.
— Como é que estão os quatro jovens Animais
Estrela que viajaram para o mundo dos humanos
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à procura de possíveis Amigos Estrela? — quis
saber o texugo.
— Já lá vão uns três meses desde que eles e as
suas Amigas Estrela travaram a velhinha que estava
a usar magia negra — disse o veado.
— Efetivamente. — A Caçadora, a coruja, tocou
na lagoa com a ponta da sua asa e a água tremelu-
ziu. — E a paz regressou a Westcombe.
Surgiu uma imagem na água. Mostrava uma bela
aldeia de Devon, com casinhas de pedra, telhados de
colmo e ruas estreitas.
— A pessoa que usava magia negra esqueceu
tudo sobre magia e as Amigas Estrela têm usado a
corrente de magia para ajudar as pessoas — revelou
a Caçadora. — A cada boa ação que fazem a corrente
fortalece.
— Podemos ver os animais e as suas Amigas
Estrela? — perguntou o lobo, ansioso.
A Caçadora anuiu e varreu a lagoa com a asa.
A imagem mudou, mostrando quatro raparigas e
quatro animais a correr para uma clareira num bos-
que. As raparigas riam e os animais — uma raposa,
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um esquilo, uma corça e uma gata -selvagem — sal-
titavam ao lado delas.
Atrás das raparigas, uma pequena cascata derra-
mava água sobre pedras cinzentas e fluía num ribeiro
que corria por entre as árvores até ao mar. Era início
de primavera e o ribeiro estava mais cheio, devido à
água da chuva.
— Maia, Ionie, Sita e Lottie — disse o lobo, baixi-
nho, olhando para cada uma das raparigas.
A Maia, que tinha cabelo louro escuro e uma franja
de lado, corria atrás da jovem raposa, enquanto a
Ionie pisava uma mancha de sombra com a gata-
-selvagem ao seu lado. Desapareceram e reaparece-
ram do outro lado da clareira. A Sita, que tinha cabelo
comprido e escuro, e uns gentis olhos castanhos,
avistou algo na relva e correu nessa direção, para
averiguar o que era. Agachando -se, apanhou um
passarinho que tinha caído do seu ninho. Chamou
a Lottie, que pegou no pequeno pássaro. Enfiando -o
num bolso do seu casaco, balançou -se para uma
árvore e trepou até ao ninho, com o Zimbro, o esquilo
vermelho, junto a si.
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— Parecem muito felizes — comentou, animado,
o texugo.
Mas, enquanto os animais observavam, come-
çou a redemoinhar sobre a imagem uma nuvem
sombria.
O veado bateu com as patas no chão.
— O que significa esta escuridão, Caçadora?
A coruja parecia preocupada.
— Acho que é um aviso de que se aproxima mais
mal na direção de Westcombe.
— Tão depressa? — comentou o texugo.
A Caçadora assentiu.
— A clareira é um lugar de passagem entre o
nosso mundo e o mundo dos humanos, o que a
torna numa zona de magia muito forte. As pessoas
que querem usar magia para fazer o mal são sempre
atraídas até lá.
O lobo deu voltas ao redor da lagoa.
— Quem me dera poder ajudar.
— Mas não podemos — frisou a Caçadora, com
uma expressão de tristeza nos seus olhos redondos.
— Já tivemos o nosso tempo no mundo humano.
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Cabe aos jovens Animais Estrela e às suas Amigas
Estrela derrotar esta nova ameaça.
— Mas que ameaça é? — questionou o veado.
— Não faço ideia — respondeu a Caçadora, mi-
rando a água. — Vamos ver com atenção.
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Capítulo Um
A Maia tocou no pelo tom de ferrugem da Giesta.
— Apanhei -te!
A raposa soltou um latido de excitação quando a
Maia desatou a correr. A rapariga sentia a magia
a percorrer -lhe o corpo. Quando se ligava à corrente
que fluía entre o mundo humano e o Mundo Estrela,
tal como a Giesta lhe ensinara, conseguia fazer todo
o tipo de coisas espantosas — ver o passado, ter vis-
lumbres do futuro e observar coisas que se passavam
noutros lugares. Agora, socorria -se da magia para ver
onde a Giesta ia a seguir, de modo a poder desviar -se
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do caminho dela. Moveu -se para a esquerda, viu -a a
começar a saltar naquela direção e esquivou -se no
último segundo, mas a Giesta já conhecia muito bem
os seus truques. Deu a volta no ar e acertou no peito
dela com as patas dianteiras, derrubando -a.
— Agora apanhei -te eu, Maia! — exclamou a
Giesta. Ela fez rebolar a raposa, fazendo -lhe cócegas
no pelo claro e raso da sua barriga. A Giesta guin-
chou de prazer, com a sua cauda felpuda a agitar -se
de lado para lado.
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A Maia sentiu um afluxo de felicidade. Ela adorava
ser uma Amiga Estrela! Ser capaz de praticar magia
com as suas três melhores amigas e os respetivos
Animais Estrela era espetacular. As raparigas tinham
todas capacidades mágicas diferentes. A Lottie era
capaz de usar magia para ser incrivelmente veloz
e ágil; a Ionie conseguia viajar para outros locais
através das sombras, além de criar ilusões e ser
uma Fala Espírito; a Sita tinha o dom de apaziguar
e curar, e também a incrível capacidade de dar or-
dens a quem quer que fosse — felizmente para si,
este era um poder que não usava com frequência.
— Ei, pessoal! — chamou a Lottie, soando um
pouco ansiosa. — Venham aqui um momento.
— Saltou para descer da árvore.
— Puseste -o de novo no seu ninho? — perguntou
a Maia, aproximando -se com a Giesta.
A Lotti e assentiu com a cabeça.
— O passarinho está bem, mas reparei em algo
estranho enquanto o punha no ninho.
Os seus olhos castanho -claros revelaram preo-
cupação. O Zimbro saltou da árvore e aterrou com
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leveza no ombro dela. As suas patinhas brincaram
com as pontas do seu cabelo escuro.
— O que se passa? — perguntou a Ionie, apare-
cendo na porção de sombra ao lado da Lottie, com a
Azeda junto dela.
— As árvores já não têm rebentos verdes — disse
a Lottie.
— Isso é esquisito — comentou a Ionie. — Há
botões de folhas nas árvores junto à janela do meu
quarto e até flores na cerejeira do nosso jardim da
frente. Porque é que ainda não haverá rebentos por
aqui?
O Zimbro baixou -se e levantou -se no ombro da
Lottie, com a sua cauda vermelha a tremelicar de
ansiedade.
— Não é bem ainda não haver, só que os rebentos
estão a ficar castanhos. Há uma semana eram verdes,
mas agora estão todos a murchar.
A Maia percebeu que havia outra coisa estranha.
— Por norma, há flores primaveris nesta zona, em
fevereiro. Eu vinha aqui com a minha avó apanhar
narcisos e galantos.
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— Na semana passada ainda havia vários galantos
— frisou a Sita. — Vi um ratinho junto a uns.
Foi até ao limite da clareira.
— Sim! Aqui! — Agachou -se e a seguir olhou para
trás por cima do ombro, baralhada. — Morreram.
As outras correram para junto dela. Os galantos
junto aos pés da Sita estavam murchos.
— Isto não é nada bom — afirmou a Azeda, dando
voltas em torno do amontoado de galantos casta-
nhos e murchos, com os seus bigodes a estremecer.
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— As árvores e as plantas não morrem assim no
início da primavera. Desconfio de que anda por aqui
magia negra.
— Achas que anda alguém a conjurar Sombras?
— questionou a Sita, incomodada.
As Sombras eram espíritos malignos que viviam
no Mundo das Trevas. Podiam ser conjuradas a partir
das sombras pela magia negra e, de seguida, fechadas
em objetos do dia a dia. Quando esses objetos eram
postos nas casas das pessoas, as Sombras criavam
sofrimento e caos. Enquanto Amigas Estrela, cabia
às raparigas trabalhar com os seus Animais Estrela
para enviar as Sombras de volta para o seu próprio
mundo. Até agora, as raparigas tinham lutado contra
uma Sombra Espelho, que tornara a irmã mais velha
da Maia muito invejosa em relação à sua melhor
amiga; uma Sombra Desejo, que concretizava desejos
de maneiras horríveis; e quatro Sombras Medo, presas
em homenzinhos elásticos amarelos que aterroriza-
ram as pessoas.
— Se anda alguém a conjurar Sombras, vamos
pôr fim a isso — disse a Ionie, com determinação.
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A Maia foi percorrida por um forte arrepio. Ape-
sar de ser perigoso combater Sombras, era também
muito excitante.
— A tua coragem é notável — referiu a Azeda à
Ionie. — Só que não sinto aqui o cheiro de nenhuma
Sombra.
— Nem eu — concordou a Faia, com as suas nari-
nas delicadas a vibrarem. Alguns Animais Estrela,
como a Azeda e a Faia, tinham um talento especial
para cheirar as Sombras quando estas estavam ou
tinham estado por perto.
— Então o que se passa? — questionou a Lottie,
olhando ao redor.
— Não te esqueças de que a magia negra não
serve só para invocar Sombras — disse o Zimbro.
— Sim, a tia Mabel usou -a para fazer aquele glo-
bo de neve horrível — recordou a Maia, afagando a
Giesta e pensando na velhota que andara a praticar
magia negra. Prendera a Giesta e a Faia num globo
de cristal. A Maia nunca iria esquecer como se sentira
ao pensar que nunca mais veria a Giesta. Fora o pior
momento da sua vida.
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— Pois foi. Vocês, meninas, usam a corrente da
Magia Estrela quando fazem magia, mas algumas
pessoas usam a magia que existe dentro dos cristais ou
das plantas — constatou a Azeda. — Muita gente que
usa plantas faz o bem, mas outros executam magia
negra muito poderosa ao retirarem força da vida de
plantas e árvores, deixando -as a morrer. — A Azeda
tocou com o focinho nos galantos mortos. — Pode
explicar o que se passa aqui na clareira.
— Como é que podemos descobrir o que se passa?
— questionou a Maia.
A Giesta pôs as patas nos joelhos dela.
— Podias usar a tua magia para ver se aconteceu
algo de estranho aqui na semana passada.
— Força, Maia — incitou a Ionie.
A Maia sentou -se no toco de uma árvore. Retirando
um pequeno espelho do bolso do casaco, olhou para
ele. Precisava de uma superfície brilhante se preten-
dia usar a magia para olhar para o passado ou para
o futuro. Encaixando -o nas suas mãos, abriu a sua
mente à corrente. A magia rodopiou até ela, cintilando
e provocando -lhe um formigueiro nas veias.
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— Mostra -me se alguém andou a usar magia negra
aqui na clareira — pediu ela.
A superfície do espelho embaciou por um mo-
mento e depois formou -se uma imagem. A Maia era
a única que a conseguia ver e, portanto, descreveu -a
em voz alta.
— Estou a ver a clareira à noite — disse ela. — Vem
alguém para a clareira. Usa um casaco comprido e es-
curo, com capuz. É uma mulher, acho eu. — A figura
no espelho olhou em volta e a seguir encaminhou -se
apressadamente para o centro da clareira, onde usou
o líquido de uma pequena garrafa para traçar um
círculo no chão à sua volta. O círculo iluminou -se
com uma suave luz verde. A pessoa fechou a garrafa
com uma rolha e então pousou uma taça de prata no
centro do círculo. Endireitou -se, deixando entrever
um vislumbre de cabelo louro.
— Ela fez um risco à sua volta com uma espécie
de poção — disse a Maia. — E agora está a pousar
folhas numa taça de metal. — Viu a mulher a ace-
nar uma mão sobre a taça e a murmurar algumas
palavras. — Parece que está a fazer alguma espécie
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de feitiço… — Arquejou quando a mulher elevou os
braços no ar. Os ramos das árvores pareceram ser
puxados na sua direção, como se atraídos por uma
força invisível. O vento varreu a clareira, abanando o
casaco em redor das suas pernas. A mulher uniu os
dedos e, de repente, explodiram folhas das árvores,
voando alto, em direção ao céu. O vento parou e os
ramos das árvores cederam, com
os botões a secarem.
À volta daquela mulher,
as folhas flutuaram len-
tamente até ao chão,
como se fossem uns
confettis tristes.
— O que é que vês?
— perguntou a Ionie
com impaciência.
A Maia contou -lhes rapi-
damente tudo o que vira.
— Agora, está a pegar na taça.
As folhas trans formaram -se num líquido. É escuro…
quase preto. — Observou enquanto a mulher o vertia
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para uma garrafa vazia que retirara do bolso, para
de seguida sair do círculo. A luz desapareceu e ela
afastou -se rapidamente. — Foi -se embora — disse a
Maia calmamente.
A Azeda bufou.
— Tal como eu desconfiava, parece que andou
aqui alguém a fazer magia negra.
— Mas para quê? — questionou a Faia.
— E quem é essa mulher? — perguntou a Giesta.
— Vou ver se a magia me mostra — afirmou a
Maia. Voltou a olhar para o espelho. — Mostra -me
o rosto da pessoa que estava a praticar magia negra
— pediu, esperançosa.
A figura encapuzada voltou a aparecer no espelho,
mas com um rosto indistinto. A Maia abanou a cabeça.
— Deve estar a usar um feitiço de bloqueio para
se esconder de quem a possa espiar.
— Temos de descobrir quem ela é — declarou a
Lottie.
— E pará -la! — reforçou a Ionie.
Nesse preciso instante, tocou o telemóvel da Maia,
assus tando -as. Ela olhou para o ecrã.
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