não faltasse o generoso solidarismo social. Um novo Brasil ...
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não faltasse o generoso solidarismo social. Um novo Brasil em que a
mestiçagem étnica afirma a presença do homem e sua verteria sobre o
meio (...) Ele não vê o mestiço amazônico como descrevera o nordestino
dos Sertões baiano, com incapacidade biológica fatal. Ao contrário,
proclama as virtudes físicas e morais daqueles “caboclos rijos do Purus,
que não são efeitos do meio, surgem a despeito do meio (TOCANTINS
apud BRAGA, 2002, p. 75)
É nesse primeiro segmento que o autor inclui um dos mais aclamados textos do
livro. O conto “Judas-Asvero" no qual se narra a história da malhação de Judas, realizada
em meio aos barracões dos seringais. É nesse texto que, em pleno uso da linguagem
literária, Euclides disserta sobre o homem renegado às paragens mais distantes e isoladas,
o escravo de si mesmo que se auto flagela “da ambição maldita que o levou à terra; e
desafronta-se da fraqueza moral que lhe parte os ímpetos da rebeldia, recalcando-o cada
vez mais no plano inferior da vida decaída onde a credulidade infantil o jungiu, escravo à
gleba empatanada dos traficantes, que o iludiram (CUNHA, 2006, p. 70)
Na segunda parte da obra, intitulada “Vários estudos”, tal como o próprio nome já
explicita, o autor conta sobre diversos aspectos físicos da Amazônia do princípio do século
passado. No terceiro capitulo, Euclides disserta sobre o tema “Da independência à
República” e relata fatos ligados à Amazônia, a terra sem história que era alvo de
constantes investidas civilizatórias.
Na quarta e última fração do livro, chega o trecho talvez mais complexo de toda a
obra. Intitulado “Estrelas indecifráveis”. O segmento é dedicado a uma extensa redação
sobre a o astro que guiou os três reis magos junto a Jesus. Para o pesquisador Luiz
Fernando Valente, o texto contido no capítulo é um retrato da escrita que unia ciência à
literatura (VALENTE, 2009).
O meio e o homem são contemplados detalhadamente, mas a temática “O conflito”
jamais chegou a ser escrita. Isso porque Euclides foi assassinado em 15 de agosto de 1909
pelo militar Dilermando de Assis (GALVÃO, 2010). Um mês após a morte de Euclides, o
livro que estava sendo editado em Portugal pela editora do Porto foi publicado (GALOTTI,
2006). Mas a ideia de Euclides era produzir um livro que, tal qual o célebre “Os sertões”,
vingasse a realidade dos seringueiros.
Pretendia sintetizar suas impressões da Amazônia em Um paraíso
perdido, título que evocaria o poeta inglês John Milton, de Paradise lost.
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Seria, em suas palavras, o seu "segundo livro vingador" (idem, ibidem,
p. 306). Queria integrar, como em Os sertões, uma ampla interpretação
histórico-cultural ao clamor por justiça social e pela modernização do
país. Sua morte repentina em 1909, em tiroteio com o amante de sua
mulher, Ana, interrompeu a redação do livro. (Ventura, 1998).
O desejo de Euclides não se tornou realidade. Ao invés disso, o que temos é uma
obra que, apesar de não ter obtido o prestígio de seu livro mais famoso, constitui-se um
marco na literatura produzida sobre a Amazônia. Um retrato que mistura definições
complexas, extenuantes e profundas a apontamentos pessoais, incompletos e etnocêntricos.
Djalma Batista, escritor, médico, membro da academia amazonense de letras e figura
constante na memória do povo nortista, definiu o livro euclidiano como uma espécie de
ápice dentre centenas de obras até então escritas sobre a Amazônia: “Os reveladores da
Amazônia – seus intérpretes contam-se por dezenas. Dentre todos, sobressai pelo seu porte
majestático um nome que ocupa a primeira plana nas letras nacionais: Euclides da Cunha”
(BATISTA, 1938 apud BRAGA, 2002, p. 70).
A representação da obra de Euclides por Djama não é unitária dentre a de outros
críticos sobre a produção de Euclides na Amazônia. Muito ao contrário disto, ela enfileira-
se ao lado de muitas outras.
A Amazônia era sempre representada com a mais falsa e ridícula
expressão, numa caricatura grotesca que, sobre ser imperfeita, não
mostrava os traços reveladores da sua inconfundível fisionomia
geográfica. Veio, por fim, o inimitável autor de À margem da História e,
procurando fugir ao engano das aparências, deu-nos da grande terra,
idéia tão concisa, que nos produziu o efeito de uma perturbadora
revelação. Pareceu-nos estar ilustrando uma região que desconhecíamos
completamente. (LADISLAU apud BRAGA, 2002, p. 70).
Explicitada a importância da obra literária, faz se necessário recorrer à entrevista
que Euclides da Cunha concedeu ao Jornal do Commercio em 1906. É mister ressaltar que
grande parte do que o escritor dissertou sobre a Amazônia ficou ofuscado pelo brilho de
outras obras, entretanto, “Os ensaios amazônicos são a face menos conhecida de sua obra.
Encontram-se dispersos em artigos e entrevistas de jornal, em crônicas e prefácios, em sua
correspondência” (VENTURA, 1998, p. 133).
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A entrevista concedida ao Jornal do Commercio
Inaugurado em 1º de outubro de 1827, o Jornal do Commercio é o mais antigo
jornal em circulação de toda a América latina (JORNAL DO COMMERCIO: quase dois
séculos de história, 2014). À época da primeira edição, o jornal era dirigido por Pierre
Plancher. A proposta do jornal sempre foi auxiliar e manter bem informada a população
em geral e ajudar em especial os ditos executivos e homens de negócios em seus
momentos de tomada de decisões.
O Jornal do Commercio surgiu tendo como foco a economia, com base
nas publicações Preços Correntes, Notícias Marítimas e Movimento de
Importação e Exportação editadas por Plancher desde sua chegada ao
Rio. Em pouco tempo, transformou-se em folha política e comercial, em
um momento em que a situação do País, que vivia então os primeiros
anos após a Independência, era inquietante. Pedro I, pressionado pelos
portugueses, ia fazendo concessões que poderiam prejudicar os
brasileiros e o Jornal do Commercio, assim, entrou em campo para
defender os interesses nacionais, uma característica que preservou ao
longo de sua história. (JORNAL DO COMMERCIO: quase dois séculos
de história, 2014).
A edição do dia 14 de janeiro de 1906, poucos dias pouco depois de Euclides ter
encerrado a missão de reconhecimento do alto Purus e voltado ao Rio de Janeiro, tinha
logo na página dois estampado “Na Amazônia” (fig.01). O jornal anunciava a conversa que
um repórter, que em nenhum momento da entrevista tem o nome citado, teria tido com o
recém- chegado das terras distantes.
A longa entrevista é precedida pela história que culminou na conversa entre
repórter e entrevistado. Conforme o jornal, Euclides foi interpelado pelo jornalista que
solicitou uma audiência com o viajante. Euclides aceitou de imediato e foi a um lugar mais
calmo juntamente com o repórter.
A primeira pergunta da entrevista foi "Qual sua impressão geral do Amazonas?".
Para a qual Euclides responde "Não creia numa impressão geral acerca do Amazonas. Ao
revés da admiração ou do entusiasmo, o que nos sobressalteia geralmente, no desembocar
do Dédalo florido do Tapajaru, aberto em cheio para o grande rio, é antes um
desapontamento" (CUNHA, Euclides. Na Amazônia, Rio de Janeiro, p. 2, 14 jan. 1906).
Ora, não é o mesmo começo da obra "À margem da história?". No livro, o texto se
inicia com "Ao revés da admiração ou do entusiasmo, o que nos sobressalteia geralmente,
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diante do Amazonas, no desembocar do dédalo florido do Tajapuru, aberto em cheio para o
grande rio, é antes um desapontamento" (CUNHA, 2002, p. 17).
O trecho é o primeiro de muitos idênticos. As semelhanças não se restringem a
igualdades nas palavras, pontos, vírgulas, parágrafos, que são todos idênticos. Parece que
da entrevista para o livro, houve pequenas alterações nas partes em que Euclides responde
a perguntas, tal como no trecho acima no qual houve uma alteração mínima na ordem da
afirmação do escritor.
Não convém reproduzir ambos os textos neste trabalho, mas é possível afirmar que
em média, 70% da entrevista está contida no livro e isso logo nas primeiras páginas.
As principais diferenças entre os textos estão na última parte da entrevista. Nesse
trecho bastante polêmico para a época, Euclides conta sobre a possibilidade de um conflito
armado entre seringueiros, seringalistas e peruanos invasores. No livro, não há menção a
essa parte. Logo, não seria esse o conflito reservado para o fim do livro que Euclides
jamais chegou a escrever?
Em 21 de janeiro 1906, Olavo Bilac comentando sobre um artigo de Euclides, fala
da falta de reverberações que um magnífico artigo teve. Ele complementa:
Há nesse artigo – que é um grito de alarma, e um aviso generoso dado
aos poderes públicos por uma alma reta e digna,- revelações que
horrorizam. Os homens, que se engajam para trabalhar nos seringais, são
escravos, verdadeiros escravos, tão dignos de compaixão como os que
outrora eram comprados e vendidos para trabalhar nas fazendas[...]
(BILAC apud GARCIA, 20013, p. 14)
O grito ao qual Bilac se refere diz respeito aos alertas que Euclides dá quando conta
a situação dos nordestinos, os homens que trabalham para escravizar-se, que já chegam
endividados à selva, que mal ganham o suficiente para se manterem de pé e buscar por
borracha.
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Figura 01. Edição do dia 14 de janeiro do Jornal do Commercio com a entrevista de Euclides
reproduzida na íntegra. Fonte: Jornal do Commercio.
Toda a entrevista publicada no Jornal do Commercio foi reproduzida na íntegra
pelo jornal amazonense “Correio do Norte” entre os dias 4, 5, 6, 7, 8 e 9 de maio. Nem um
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trecho foi cortado, e decerto a entrevista deve ter causado bastante desconforto entre os
seringalistas pois Euclides encerra-a dizendo:
Pois bem, o máximo das pretensões peruanas – e o meu parecer todo
individual – será traduzido geometricamente pela linha que interferir o
Purus na latitude média de ambos, 9°, 20’. É o máximo, insisto.
Conversei longamente com os nossos rudes patrícios daqueles rincões; e
sei que se insurgirão até mesmo contra nós – se aquiecermos num outro
parecer mais desfavorável que o deste juízo elementar, de Salomão. [...]
Imaginai aqueles 20000 “rifleiros”desencadeados em franca rebeldia -
intangíveis no embaralhado dos igarapés e na penumbra das matas...
Talvez, por sua vez, a exemplo dos “Boers”, eles possam espantar o
mundo”. (CUNHA, 1906, p. 2)
Colocada a força que as palavras ditas ao jornal possuem, é de se espantar que não
tenha havido nem uma espécie de censura ao contado pelo escritor. Outro fator no mínimo
curioso relativo à entrevista está na participação do repórter sem nome. Nas sete vezes em
que este desconhecido jornalista intervém, pouco, ou quase nada, interfere no curso da
conversa. Em dado momento chega a questionar se Euclides escreveria um livro com a tese
que desenvolveu durante a viagem. A essa pergunta, o escritor diz “Que farei, se m’o
permitir a engenharia errante e torturada”. Em tréplica o repórter aduz com “Mas que lhe
permitiu executar o recente encargo que lhe deram”.
O diálogo em muito lembra os dilemas pessoais que Euclides vivia. Engenheiro,
jornalista, escritor, diplomata, Euclides viva em conflito quanto às ocupações preferidas e
às quais era obrigado a exercer. Em diversas cartas escritas ao longo da vida, ele menciona
como sua engenharia errante o apartava da vida que sonhava levar. “Acho-me empregado
como engenheiro ajudante nas obras públicas daqui (São Paulo); não tenho entretanto
desejo de ser por muito tempo empregado público; aproveitarei a primeira oportunidade
que tiver para exercer a minha profissão” (CUNHA apud COSTA, 2013). E continua
“Continuo abraçado à minha engenharia e nas horas vagas – como a vida é difícil e é
preciso repartir a atividade, escrevo no Estado que não quer aceitar a minha colaboração
gratuitamente (CUNHA apud COSTA, 2013).
Grande conhecedor dos dilemas de Euclides, o repórter o questiona com
intervenções mínimas. Não extrai nenhuma informação que já não houvesse sido pensada
ou descrita em cartas. Além disso, vale ressaltar que na época não havia gravadores para
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facilitar o ofício de entrevistador. Portanto, teria o repórter anotado tudo com tanta
perfeição que o próprio Euclides optou por reproduzir tamanha parte do texto no seu livro?
Euclides e o Jornal do Commercio
Na época da publicação do texto, o diretor do jornal era José Carlos Rodrigues.
Curioso é lembrar que Euclides da Cunha e José Carlos Rodrigues, muito além de
colaboradores, eram amigos. A amizade nasceu em 1888 quando o ainda jovem militar
fazia o curso de Estado-maior e Engenharia Militar da Escola Militar. Euclides, à época
republicano ferrenho, cometeu um ato de indisciplina contra um superior monarquista.
Quando, em 1909, Euclides faleceu, o cortejo fúnebre passou por alguns lugares do
Rio de janeiro, dentre esses, a sede do jornal do commercio.
O cortejo seguiu até a porta do Jornal do Commercio, antes de demandar
do Aeroporto Santos Dumont, para homenagear o jornal que defendera o
ato de rebeldia em 1888 e do qual se tornara colaborador, a convite de
José Carlos Rodrigues. (VENÂNCIO, 2001)
Durante toda a vida, Euclides colaborou regularmente com o jornal. Após a visita
ao arraial de Canudos e algum tempo antes da publicação de “Os sertões”, o escritor
publicou diversos textos sobre a experiência adquirida como correspondente.
Já após a viagem à Amazônia, a entrevista foi uma das principais colaborações do ano de
1906, mas em 1907 Euclides publicou diversos trechos de livros nas páginas do jornal do
commercio.
Retomou, em 1907, os assuntos latino-americanos com uma série de
artigos no Jornal do Commercio, do Rio de Janeiro, reunidos no
livro Peru versus Bolívia, que logo foi traduzido para a língua espanhola.
Criticava as pretensões do Peru, que reivindicava parte da região do
Acre, incorporada ao território brasileiro e boliviano, e tomava partido
da Bolívia (VENTURA, 1998, p. 137).
Posto isso, o vínculo entre Euclides e o jornal ficam pulsantes. Mas muito além
disso, é bem sabido que Euclides, desde que chegou à Amazônia, preparava-se para
publicar em jornais as suas impressões acerca das solitárias paragens. Prova disso é a carta
enviada ao amigo, José Veríssimo, datada de 13 de janeiro de 1905, na qual o escritor, após
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contar acerca das primeiras impressões que a selva lhe causou, diz que “Mais tarde, e
talvez pela imprensa, direi a minha impressão integral” (BRAGA, 2002, p. 134).
A ideia de Amazônia nos signos euclidianos
Quando falamos em imagem geralmente a coisificamos. Transformamos a ideia em
algo que podemos ver e até segurar, como é o caso da fotografia. Porém, a imagem pode
ser considerada com um processo de consumo das ideias que povoam uma determinada
região. Nesse caso quando o leitor deste texto é levado a pensar em Amazônia a imagem
mental é construída por toda uma história anterior a ele. Para os amazônidas, ou para
aqueles que são de outras regiões, mas residem na Amazônia, essa construção mental é
influenciada por elementos que compõem o cenário cotidiano.
Contudo nosso trabalho possui em seu recorte temporal, as primeiras décadas do
sec. XX mais precisamente 1909. O leitor do livro “À marjem da historia”, seja no Brasil
ou em Portugal, onde o livro foi editado, fazia parte de uma elite cultural com poder
econômico e status social. O leitor do jornal estava em um patamar econômico diferente,
todavia o requisito básico era ser alfabetizado, pois o jornal poderia ser lido a qualquer
momento.
Ao dividirmos as classes consumidoras dos signos propostos por Euclides da Cunha
para descrever a Amazônia naquele momento histórico, consideramos o nível de
interpretação desses signos. A capacidade intelectual unida ao tempo de vida e
experiências empíricas dos leitores determinaram a construção da ideia de Amazônia que
experimentava a riqueza proporcionada pela comercialização da borracha e o projeto de
civilização proposto pela recém-criada República brasileira.
A Amazônia euclidiana era povoada por mestiços que buscavam na selva a
esperança de uma vida melhor. Euclides encontrou a usurpação do ideal paradisíaco. A
derrubada das árvores e a ostentação dos palácios. Erigidos aos moldes europeus os
casarões, teatros e palácios em Manaus e Belém evidenciaram a desvalorização da cultura
local para exibir o desejo de ser “civilizado”.
Ao leitor do livro foi apresentado um lugar onde o encontro das culturas foi
proporcionado ao som dos rios e igarapés, iluminado por filetes de luz que se esforçavam
para penetrar a densa mata que ocultava a esperança daqueles que buscavam o ouro
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branco. O projeto civilizador brasileiro se impunha com mais vigor a Amazônia euclidiana.
Era um lugar que inebriava os viajantes com os signos do paraíso há muito proclamado por
várias seitas e religiões, mas que exalava o odor da terra molhada pelo suor do trabalhador
que teimava em desconstruir a imagem que o ideal civilizador insistia em impor.
Para o leitor do jornal, a Amazônia ainda dispunha daquele mistério que poderia ser
desvendado, talvez pelo livro de Euclides. Mas as parcas informações contidas em apenas
uma página do jornal já confirmavam, em certo aspecto, a imagem de um lugar ainda a ser
explorado.
Se estamos inseridos em uma cultura visual e a imagem da Amazônia proposta por
Euclides reflete a esperança do letrado em descrever o lugar, representar o momento e dar
significado à vida daqueles ele lá encontrou, acreditamos que os signos euclidianos não
foram de todo desvelados, interpretados.
Muitos questionamentos surgem. E os principais dentre esses dizem respeito à
autoria e ao grande significado da publicação. Tendo em vista o plano de Euclides de
publicar um livro semelhante ao "Os Sertões", dividido nas três partes e contemplando o
meio, o homem e o conflito, não teria sido o fim da entrevista, a parte que justamente trata
da luta entre seringueiros, seringalistas e peruanos, o terceiro segmento planejado para a
obra "Á margem da história"?
Outra pergunta tão importante quanto à primeira, está relacionada à autoria da
entrevista publicada. Sabendo da amizade de Euclides com o diretor do veículo, e sua
constante colaboração com o jornal, a extensão da entrevista, a semelhança com o livro, a
perfeição na escrita, típica do letrado escritor, as perguntas que em muito lembram os
próprios questionamentos de Euclides, surge a dúvida: não teria sido o próprio Euclides o
autor da entrevista?
As hipóteses carecem de pesquisas cada vez mais aprofundadas, especializadas, e
por isso, este trabalho não pode fechar-se em si mesmo e, apesar de ter sido capaz de
proporcionar os questionamentos, não é capaz de solucioná-los.
Referências bibliográficas ARRUDA, Maria Olivia Garcia Ribeiro de Arruda. Uma entrevista de Euclides sobre a
Amazônia. In: Cultura Euclidiana. São José do Rio Pardo, 2013, p. 14-20.
BRAGA, Robério. Euclides da Cunha no Amazonas. Manaus: Editora Valer, 2002.
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COSTA, Nicola. Euclides da Cunha: autorretrato de um caboclo humanista e
idealista. 2013. Texto inédito.
CUNHA, Euclides da. À margem da história. São Paulo: Martin Claret, 2002.
CUNHA, Euclides. Na Amazônia. Jornal do Commmercio, Rio de Janeiro, 14, janeiro ,
1906, p. 2.
GALVÃO, Walnice Nogueira. Euclides da Cunha: Militante da República. São Paulo:
Expressão Popular, 2010.
GONDIM, Neide. A invenção da Amazônia. 2ª Ed. Manaus: Editora Valer, 2007.
VENTURA, Roberto.Visões do deserto: selva e sertão em Euclides da Cunha. In:
história, Ciências, Saúde Manguinhos. Vol. V (suplemento), 133-147 julho 1998.
Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0104-
59701998000400008&script=sci_arttext>. Acessado em 26 de janeiro de 2014.
VENÂNCIO, Alberto Filho. Ciclo Comemorativo do Centenário da Publicação de Os
Sertões. 2001. Disponível em
<http://www.euclidesdacunha.org.br/abl_minisites/cgi/cgilua.exe/sys/start.htm?UserActive
Template=euclidesdacunha&infoid=142&sid=69>. Acessado em 30 de janeiro de 2014.
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Façanhas políticas de Roraima em quadrinhos (HQ)
Michel Sales FEITOZA160
Resumo: Este projeto investiga o jornalismo em quadrinhos, compreendido como uma
manifestação particular que vincula uma prática jornalística tradicional a uma forma de
expressão artística. Concentrando-se no caráter jornalístico busca-se ampliar a
compreensão das características formais desse estilo de reportagem, propondo-se ao final
do trabalho,construir um livro HQ sobre a política de Roraima, especificando as grandes
façanhas ocorridas após a mudança do território para Estado. Analisam-se seis matérias
publicadas no jornal Folha de Boa Vista. Para chegar às conclusões apresentadas utilizou-
se a análise do discurso como pressuposto teórico e metodológico. A pesquisa bibliográfica
inicial sobre as narrativas de histórias em quadrinhos selecionou obras de autores como Joe
Sacco, e a parte exploratória, de natureza quantitativa, foi por pesquisa realizada no centro
de documentação do jornal Folha de Boa Vista. A justificativa de se desenvolver este
trabalho é verificar se os quadrinhos aproximam o leitor da notícia. Conclui-se que o
jornalismo em quadrinhos ainda carece de representatividade de mercado e maior
observação nas Universidades com incentivo a pesquisas.
Palavras Chave: Jornalismo - Política - Reportagem em Quadrinhos
As histórias em quadrinhos (doravante HQs) são uma mídia tradicionalmente
associada a fantasia, já que suas primeiras histórias são baseadas em temas como o culto ao
herói, a ficção científica, a aventura e o humor.
Neste trabalho, analisam-se seis matérias publicadas no jornal Folha de Boa Vista
que repercutiram nacionalmente envolvendo políticos de Roraima, sendo avaliadas as
matérias publicadas e as charges relativas ao tema, além de se transformar as matérias em
quadrinhos.Selecionados o caso Gafanhoto, a cassação de Flamarion Portela, Pedofilia,
Correios, Farra dos Combustíveis e o envolvimento do político Romero Jucá no Mensalão.
Dessa forma, o resultado é contextualizar os fatos e prover um novo saber didático.
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Jornalista formado pela Universidade Federal de Roraima
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Como problema da pesquisa questiona-se se é possível fazer com que o jornalismo
em quadrinho facilite a aproximação do leitor com a notícia. Como objetivo geral
pretende-se fazer um livro HQ sobre as façanhas políticas ocorridas após a mudança do
território para Estado. Como objetivos específicos sintetizam-se as matérias de forma
cronológica na HQ, mostrando uma forma de jornalismo alternativo para o público boa-
vistense; mesclam-se fatos históricos na convergência da reportagem política para os
quadrinhos e contextualizam-se os fatos de forma também a prover saber didático.
Elegeu-se, portanto, o discurso da reportagem em quadrinhos como objeto de
investigação. A pesquisa bibliográfica inicial sobre as narrativas de histórias em quadrinhos
selecionou obras de autores como Joe Sacco e a parte exploratória de natureza quantitativa
foi feita a partir de pesquisa no centro de documentação do jornal Folha de Boa Vista.
Portanto, esta é a justificativa de se desenvolver a pesquisa. Analisar a partir dos
resultados, mostrando como grandes reportagens podem ser transformadas em quadrinhos.
Para privilegiar em uma publicação tal aspecto, deve-se considerar, principalmente, a
carência de uma reflexão acadêmico-educacional nesse contexto, às críticas acerca da
linguagem política na arte dos quadrinhos. É necessário refletir sobre a política local, seus
grupos, alianças, formações, aspectos culturais e sua interligação com o jornalismo.
1. Jornalismo em quadrinhos
1.1 Tirinhas no Globo
Em 1895, Yellow Kid (fig. 11), de Richard Felton Outcault, faz sua estreia no jornal
The World, de Joseph Pulitzer, tornando-se uma publicação semanal, em 1896. A série
mostra um menino que mora numa favela e os dizeres são escritos no seu pão amarelo. O
uso da cor amarela foi um teste para experimentar a impressão em mais de uma cor e atrair
mais leitores. Daí vem o termo “jornalismo amarelo” (correspondente a nossa “imprensa
marrom”).
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Figura 1 - The Yellow Kid - o menino amarelo.
Fonte: mundo HQ (2008).
No cerne do movimento da contracultura, o jornalismo em quadrinhos ou
jornalismo gráfico nasce oficialmente em meados da década de 1960, quando teve lugar
um estilo de mobilização e contestação social utilizando novos meios de comunicação de
massa, através dos quadrinhos marginais ou alternativos, ressalvando que tal narrativa é
fruto do jornalismo cultural.
O Jornalismo em quadrinhos pode ser considerado uma plataforma com potencial
tanto à construção de uma estória imaginária, quanto ao relato ou a interpretação de fatos
diários. Assim como no Jornalismo tradicional, o de quadrinhos se baseia no principio
narrativo onde se responde as perguntas do lead (O quê? Como? Quando? Onde? Por quê?
Quem?).
Outros elementos da apuração jornalística também são encontrados no texto em
quadrinhos como na pesquisa histórica, a presença in loco do repórter, o relato de
testemunhas, a identificação de causas e motivos, a entrevista e até, na fotografia.
Uma figura de enorme referência nas HQs de tiras é o americano Stanley Martin
Lieber, mais conhecido como Stan Lee, escritor, roteirista, editor, publicitário, produtor e
empresário, mas que por seus desenhos de heróis complexos e humanos, impôs razões sem
limites à nona arte. Vasconcelos (2009) escreveu:
Guerrilheira da informação nos anos 60/70, quando os grandes jornais
aderem ou calam diante da ditadura, a imprensa alternativa dá suas