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Especial Potências Mundiais . Nesta edição podes contar com artigos sobre EUA com destaque para a Presidência Obama, Também para contra- balançar, está presente a Rússia com as actuais questões de rearmamento. No meio destas duas está a União Europeia, hoje, após vinte anos desde a queda do Muro de Berlim, é composta por 27 Estados-membros. Para finalizar este Especial evidencia-sea entrada da República Popular da China na Organização Mundial de Comércio. pág. 8 a 12 VOLUME IX M M UNDU S S NERIFE/AAC Barack Obama Será o “Novo Salvador”? Direito Humano à Água? Após o 5º Fórum Mundial da Água (Istambul, Março de 2009) a dúvida acer- ca de o ser Humano ter ou não o direito a usufruir como direito básico deste bem essencial mantém-se: um impasse devido às implicações políticas, éticas e económi- cas da questão, não chegando a uma con- clusão específica. A Emergência de uma Identidade Global Num mundo cada vez mais interligado e com as fronteiras entre os Estados cada vez mais ténues e menos significativas, poder-se-á pôr em causa uma identidade única no planeta Terra e, quem sabe, a cri- ação de um Estado único. Índice Destaque......................................................................2 Internacional..............................................................3 Internacional...........................................................4-5 Economia....................................................................6 Especial Potências Mundiais..........................8 a 12 Sociedade..................................................................14 Nerife...................................................................13 e16 Cultura .....................................................................15 Putin: o ex-namora- do ciumento? As últimas acções do agora Primeiro- Ministro russo relembram as típicas relações amorosas: Putin procura hoje controlar os “amores” dos seus antigos “Estados-satélites”. A realpolitik no seu melhor, demonstrando que a geopolítica ainda persiste. D.R. JUnHO DE 2009 pág.9 pág.7 pág.4 CULTURA .Este é o Mundus, o recuperado Mundus. Um Mundus sem espaço cultural estaria incompleto. Deste modo, apresentamo-vos as mais recentes novidades musicais, todas em português para aguçar a nossa capacidade criativa: Boato de JP Simões; Only Time Will Tell de Sean Riley & The Slowriders; e ainda Tasca Beat (O Sonho Português) dos O’QueStrada. E como estamos a chegar ao Verão, nada como ter à mão as novidades dos festivais deste ano! pág. 15

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EspecialPotências Mundiais

.Nesta edição podes contar com artigossobre EUA com destaque para aPresidência Obama, Também para contra-balançar, está presente a Rússia com asactuais questões de rearmamento. Nomeio destas duas está a União Europeia,hoje, após vinte anos desde a queda doMuro de Berlim, é composta por 27Estados-membros. Para finalizar esteEspecial evidencia-sea entrada daRepública Popular da China na OrganizaçãoMundial de Comércio.

pág. 8 a 12

VoLuMe IX

MMUNDUSSNERIFE/AAC

Barack ObamaSerá o “Novo Salvador”?

Direito Humano àÁgua?

Após o 5º Fórum Mundial da Água(Istambul, Março de 2009) a dúvida acer-ca de o ser Humano ter ou não o direito ausufruir como direito básico deste bemessencial mantém-se: um impasse devidoàs implicações políticas, éticas e económi-cas da questão, não chegando a uma con-clusão específica.

A Emergência deuma Identidade Global

Num mundo cada vez mais interligado ecom as fronteiras entre os Estados cadavez mais ténues e menos significativas,poder-se-á pôr em causa uma identidadeúnica no planeta Terra e, quem sabe, a cri-ação de um Estado único.

ÍndiceDestaque......................................................................2Internacional..............................................................3Internacional...........................................................4-5Economia....................................................................6Especial Potências Mundiais..........................8 a 12Sociedade..................................................................14Nerife...................................................................13 e16Cultura .....................................................................15

Putin: o ex-namora-do ciumento?

As últimas acções do agora Primeiro-Ministro russo relembram as típicasrelações amorosas: Putin procura hojecontrolar os “amores” dos seus antigos“Estados-satélites”. A realpolitik no seumelhor, demonstrando que a geopolíticaainda persiste.

D.R.

Junho de 2009

pág.9pág.7pág.4

CULTURA.Este é o Mundus, o recuperado Mundus.Um Mundus sem espaço cultural estariaincompleto. Deste modo, apresentamo-vosas mais recentes novidades musicais,todas em português para aguçar a nossacapacidade criativa: Boato de JP Simões;Only Time Will Tell de Sean Riley & TheSlowriders; e ainda Tasca Beat (O SonhoPortuguês) dos O’QueStrada.E como estamos a chegar ao Verão, nadacomo ter à mão as novidades dos festivaisdeste ano!

pág. 15

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Europeia, Japão e Noruega, depararam-se com uma situação que poderia tomar pro-porções ainda maiores, apelaram aos rebeldesque abandonassem as armas para discu-tir um fim das hostilidades com o governo.

“Ausência de guerra não significa paz”, a situ-ação vivida neste momento preocupa a ONU,segundo dados desta organização, estima-se queentre 30 a 80 mil civis se encontram encurrala-dos numa faixa estreita, cercada por água e que aúnica organização autorizada a actuar em ter-

ritório, a Cruz Vermelha, tenha sido obrigada ainterromper a ajuda humanitária, deixado à suasorte todos aqueles que necessitavam. DesdeJaneiro até agora mais de 8 mil civis foram mor-tos, a captura do “cabecilha” dos LTTE é o princi-pal troféu para o exército cingalês.

Tenhamos a noção de que a distinção entre opovo ruandês, Hutus e Tutsi, foi edificada pelo del-egado colonialista belga, que com artimanhas,começou a favorecer um grupo em detrimento dooutro, acção essa que levou à agudização de ten-sões, invejas e ressentimentos recalcados, quemais cedo ou mais tarde acabariam por eclodir.Tal como no Sri Lanka, o delegado britânicoinstigou ao conflito e às tensões étnicas, o exter-mínio da minoria Tâmil pode ser comparada, emcerta medida, ao extermínio da minoria Tutsi, noRuanda.

Arundhati Roy, uma escritora activista denun-cia a “capa” democrática na qual o Governo cine-galês se refugia, para poder desculpar a atitudegenocida para com o povo Tâmil. Designa estaguerra de racista, uma das provas disso foi arotulagem do povo Tâmil como terroristas e pos-síveis ameaças à paz de um país democrático. Osilêncio da Índia perante esta situação revolta aescritora.

Perante toda esta realidade e depois da inter-secção de dois casos similares, resta saber se aprometida acção mais firme perante crimesgraves contra a Humanidade e que, teoricamente,hoje deveria ter sido assumido por todos, como a“Responsabilidade de Proteger” se pode aplicarefectivamente, ou não passará apenas duma teo-ria. Tendo sido essa responsabilidade que falhouno Ruanda e assim permitiu que se cometesse umgenocídio, hoje a falha é perpetuada também noSri Lanka, do mesmo modo. A mudança da con-sciência internacional, desde 1994, de acordo comum slogan bastante imperativo, “Never Again’”,terá sido transposta efectivamente do papel?

O contraste da beleza de uma ilha tão exóticae fantástica a par com um conflito étnico comsimetrias na terra árida e quente de África.

Adriana Figueiredo

EditorialE eis que chegamos a meados de 2009 e, final-mente foi possível ressuscitar o Jornal Mundus.Nascido no ano lectivo 2004/2005 e que conta jácom mais de meia-duzia de edições todas elasmarcantes e esta, esperemos nós, também não vaifugir à excepção. Para nós enquanto núcleo deestudantes desta licenciatura, é um orgulho ver denovo o Mundus a ser editado para os estudantes efeito pelos próprios estudantes. Claro que nãopodemos esquecer todo o apoio do núcleo dedocentes, que apesar das suas agendas preenchi-das, não recusaram o convite para contribuírempara esta edição. A todos os que se uniram emvolta deste projecto o nosso muito obrigado, sema vossa ajuda esta tarefa não teria sido possível. Com os exames à porta e mais um ano lectivo-quase ultrapassado, chega a época de fazer umaavaliação sobre este mesmo período, comdestaque para as actividades organizadas pelonúcleo: Recepção ao Caloiro, Barraca da Latada,Co-organização juntamente com o CIPRIC do MUN-FEUC 2008 e da 2ª SIMUE, Conferências, Ciclos deCinema, actividades desportivas, apoio pedagógi-co, etc. Todas as actividades realizadas, duranteeste ano lectivo, tinham como objectivo a partici-pação dos estudantes, pois, tal como foi escritoneste mesmo espaço numa edição anterior, emJunho de 2006 “Um núcleo sem a participação dacomunidade estudantil é um projecto sem alma econteúdo…”, dando exemplos caricatos, é comouma Manifestação da CGTP ou UGT sem trabal-hadores reivindicativos, um 25 de Abril semcravos vermelhos, como uma Queima sem QuimBarreiros. O NERIFE/AAC é como se fosse um tel-hado que precisa dos pilares para se erguer esuster e, neste caso, os pilares são todos os, estu-dantes desta “pequena” licenciatura, mas que vaidemonstrando o seu valor fruto do seu suor e dotrabalho apresentado ao longo dos últimos meses. Nessa saudosa antecessora edição de Junho de2006, as palavras-chave ditas aos estudanteseram mobilização e participação. Agora pensamosque devem ser acrescentadas o empenho e a per-severança. É importante aliar a união e aassiduidade a estes dois conceitos. Acreditar nofuturo, nunca desistir, acreditando que tudo é pos-sível. É esta a mensagem que deixamos para asgerações futuras deste núcleo. Cabe a todos nós,estudantes da licenciatura de RelaçõesInternacionais, deixar o nosso contributo paramanter vivo o espírito desta Academia e assim darvida a Coimbra. Participem!!!

NERIFE/AAC

PÁGINA 2MUNDUS DESTAQUEDESTAQUE

MUNDUSMUNDUSMail: [email protected] Telf: 239790500Morada: Faculdade de Economia, Avª Dias da Silva,165, 3004-512 CoimbraTiragem: 250 exemplares

Sri Lanka e Ruanda - Simetrias

"Ajudem-nos a salvar os Tâmeis!"Podia-se ler num dos muitos cartazes erguidosna manifestação, que teve como palco principal.Paris, no passado mês de Abril.

A comunidade Tâmil, residente na capitalfrancesa, vestiu-se com as cores dos Tigres paraa Libertação do Eelam Tâmil (LTTE, sigla eminglês).

Apelavam à Comunidade Internacional paraque se focasse no genocídio do povo Tâmil no SriLanka. Estima-se que mais de 70 mil pessoasmorreram na guerra civil, designada já de

"catástrofe humana inimaginável". A conscien-cialização da Comunidade Internacional alastrou-se também à Grã-Bretanha, Suíça e Noruega,onde várias manifestações tiveram lugar.

A guerra civil no Sri Lanka, travada há mais de26 anos, segue toda uma corrente em muitosemelhante ao caso ruandês, desde obombardeamento de hospitais e igrejas, onde ossobreviventes se refugiavam, bem como asbarreiras impostas às organizações interna-cionais no território. Um dos melhores exemplos,é o caso do navio Green Ocean, que levava ajudahumanitária para os civis, não ter conseguidochegar à costa nordeste do país, devido aos con-frontos directos no território. Um outro navio, doPrograma Alimentar Mundial, encontrou tambémdificuldades em penetrar na zona do conflito,atrasando a entrega de bens de primeira neces-sidade.

Similarmente, para sensibilizar a populaçãomundial acerca da situação no Ruanda, escrever-am-se centenas de blogs, desenvolveram-se pro-jectos que apelaram à sensibilidade dos maisdesinteressados e desinformados, para umacatástrofe humanitária bastante impressionante.Também em prol do Sri Lanka se têm desenvolvi-do uma série de acções que promovem toda adivulgação de uma realidade similar.

A vaga de refugiados, designadamente, dopovo Tutsi e Hutus moderados que tentaram

escapar, invadindo o Burundi e o Uganda,entre outros países fronteiriços, tal como a fugado povo Tâmil para a Índia e para o ocidente. Osabusos e as violações de direitos humanos forampautadas em ambos os casos, tanto os rebeldescomo o Exército cingalês são acusados de abusosdos direitos humanos por organizações como aAmnistia Internacional, como no Ruanda os Hutuschacinavam sem dó nem piedade o povo Tutsi.Todo um rasto de devastação, de hospitais impro-visados, crianças mal nutridas e uma onda imen-sa de refugiados, que tentam a todo o custo sal-var-se. Em 1994 era assim no Ruanda e hoje éassim no Sri Lanka.

As origens do conflito remontam ao ano de1948, aquando da sua independênciaface à Grã-Bretanha. A partir destadata, começaram as tensões entre amaioria cingalesa, maioritariamente budista ea comunidade Tâmil, formada por hinduístas ecatólicos romanos. Tal como no caso ruandês,também no Sri Lanka a ex-colónia foi a principalresponsável pela agudização dos ódios e das inve-jas entre povos. Em 1972 deu-se a criação dosTigres de Libertação da Pátria Tâmil (LTTE), quedesde então reclamam a criação de um EstadoTâmil.

A tentativa de um acordo de paz, entre oGoverno e os rebeldes, tinha como objectivos,

primeiramente, o apaziguamento das relações,bem como a troca de prisioneiros de guerra, nodesenrolar da cordialidade previa-se também oabandono da reivindicação de um Estado separa-do para os Tâmeis. Porém, a rodada de negoci-ações culminou no abandono destas em 2003 enovamente em 2006. Entre 2006 e 2008, os doislados começaram-se a acusar mutuamente dedesobediência ao cessar-fogo, enquanto o paísvoltava ao estado de guerra civil. Desde então, ashostilidades no nordeste do Sri Lanka aumen-taram, ameaçando a vida de milhares de civis quevivem em regiões dominadas pelos rebeldes.

Em Fevereiro de 2009, os principais medi-adores do conflito, Estados Unidos, União

“Ausência de guerra não significapaz”, a situação vivida neste momentopreocupa a ONU, segundo dados destaorganização, estima-se que entre 30 a80 mil civis se encontram encurrala-

dos...”

“...resta saber se a prometidaacção mais firme perante crimesgraves contra a Humanidade e que,teoricamente, hoje deveria ter sido

assumido por todos, como a“Responsabilidade de Proteger” sepode aplicar efectivamente, ou nãopassará apenas duma teoria.”

“A guerra civil no Sri Lanka, trava-da há mais de 26 anos, segue toda umacorrente em muito semelhante ao casoruandês, desde o bombardeamento dehospitais e igrejas, onde os sobre-viventes se refugiavam, bem como asbarreiras impostas às organizações

internacionais no território.”

D.R.

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A leitura do título acima suscitará aalgumas pessoas a seguinte questão: para quê umartigo sobre o futuro do Haiti num jornal derelações internacionais? Na verdade, o Haiti é umpaís sem qualquer peso no sistema internacional,afigurando-se por isso o tema pouco pertinente, anão ser pelo facto de nesse país se viver uma situ-ação de crise humanitária e dos direitos humanose a sua defesa serem parte integrante dasrelações internacionais contemporâneas.

O Haiti, primeira República negra do mundo, aoconquistar a sua independência da França em1804, tem conhecido uma história política que setraduz numa sucessão ininterrupta de golpes econtra-golpes (tendo ocorrido trinta e três golpesde Estado no período de cerca de duzentos anosde independência), num processo de oscilaçãocontínua entre tentações de tirania e tentativas dedemocracia. O Haiti é um dos países mais corrup-tos do mundo, frequentemente apresentado comoexemplo do conceito de Estado frágil.

Em tempos a mais rica colónia francesa, oHaiti é actualmente o país mais pobre do conti-nente americano e um dos mais pobres do mundo,vivendo mais de metade da sua população abaixodo limiar da pobreza, e é frequentemente fustiga-do por catástrofes naturais que contribuem paraa composição de um cenário aterrador. Desde1993 o Haiti recebeu sete missões de paz, a últimadas quais é a Missão da Organização das NaçõesUnidas de Estabilização no Haiti (MINUSTAH) inici-ada em 2004. As principais funções da Missãopassavam genericamente pela assistência aoEstado na promoção de programas de desarma-mento, pelo restabelecimento do Estado deDireito, pelo controlo e pela promoção e pro-tecção dos direitos humanos.

Após os incidentes envolvendo a presidência

de Jean-Bertrand Aristide (na primeira metade dadécada de noventa) verifica-se uma divisão inter-na que dificulta ainda mais um governo efectivo efomenta a situação de insegurança e violênciaestruturais, que as débeis instituições não con-seguem controlar, e que tende a aumentar, per-ante a ausência de perspectivas de melhoramen-tos ao nível político e de desenvolvimento sócio-económico.

Essa visão pessimista está também presentena maioria da bibliografia publicada sobre o país,que depende essencialmente (em cerca de 80%)de doadores externos para a construção da paz econsecução da estabilidade no território. A últimaconferência dos doadores realizou-se nos diastreze e catorze do passado mês de Abril emWashington D.C., colocando em cima da mesa adiscussão das possibilidades de progresso doHaiti, após um ano em que a subida dos preços dosalimentos, resultado da situação económica inter-nacional, levou a manifestações por parte da pop-ulação que acabaram por culminar na destitu-

ição do Primeiro-Ministro pelo Senado. Aesta situação acresceu a destruição provocadapor quatro furacões que devastaram o territóriono mesmo período.

Relacionada com as catástrofes naturais, asituação ambiental no Haiti é bastante precária,sendo o país marcado pela desflorestação, erosãodos solos, perda de biodiversidade ou degradaçãodo ecossistema marinho, entre outros problemas,que provocam actualmente um grande número de“refugiados ambientais” no seio da populaçãohaitiana.

Os aspectos acima referidos são apenasalguns da extensa lista que se pode elaborar acer-ca dos factores que convergem para uma situaçãode crise que parece inelutável. Outros que sepoderiam incluir são, por exemplo, a elevadaincidência de HIV-Sida, o tráfico de armas e dedroga, a taxa de analfabetismo dos adultos (queronda os 50%), a taxa de desemprego de cerca de60%, a ausência de condições básicas de sanea-mento, uma densidade populacional demasiadoelevada nas cidades que propicia as condições devida lastimáveis que estarão certamente na basede uma Esperança Média de Vida situada noscinquenta e três anos, inferior à dos países vizin-hos.

Todos estes indicadores se mantêm, nãodando sinal de evolução positiva do país, apesar daajuda fornecida pelos doadores da comunidadeinternacional, o que nos leva a questionar a causada ineficiência destas acções e nos remete para aquestão do papel desempenhado pela populaçãohaitiana na construção de um Estado que possaexercer de facto as suas funções enquanto tal.

A consciência de que apenas com a colabo-ração da população poderão os países ver a suaajuda ao Haiti surtir resultados, é um aspecto queparece ainda não estar a ser devidamente tido emconta pelos actores internacionais. A situação noHaiti é peculiar, nomeadamente porque não exis-tem milícias armadas em confronto, ou movimen-tos de libertação nacional, mas apenas gangs queprovocam a insegurança que as forças policiaisincipientes e ainda em fase de treino parecem nãoconseguir evitar.

Alguns autores referem que seria expectável,perante a dimensão da pobreza no país, que osníveis de violência fossem maiores. Segundo esteraciocínio, é comum a opinião de que o maiordesafio que se coloca ao Haiti, com o apoio indis-pensável dos actores externos, é o de levar a cabouma transformação estrutural da sua economia,que permita uma saída do ciclo vicioso de pobrezaextrema e crise humanitária em que se encontramergulhado há anos, sendo contudo necessária,para esse efeito, a capacidade de implementaçãopolítica.A leitura do título acima suscitará a algu-mas pessoas a seguinte questão: para quê umartigo sobre o futuro do Haiti num jornal derelações internacionais? Na verdade, o Haiti é umpaís sem qualquer peso no sistema internacional,afigurando-se por isso o tema pouco pertinente, anão ser pelo facto de nesse país se viver uma situ-ação de crise humanitária e dos direitos humanose a sua defesa serem parte integrante dasrelações internacionais contemporâneas.

O Haiti, primeira República negra do mundo, aoconquistar a sua independência da França em1804, tem conhecido uma história política que setraduz numa sucessão ininterrupta de golpes e

contra-golpes (tendo ocorrido trinta etrês golpes de Estado no período de cerca deduzentos anos de independência), num processode oscilação contínua entre tentações de tirania etentativas de democracia. O Haiti é um dos paísesmais corruptos do mundo, frequentemente apre-sentado como exemplo do conceito de Estadofrágil.

Em tempos a mais rica colónia francesa, oHaiti é actualmente o país mais pobre do conti-nente americano e um dos mais pobres do mundo,vivendo mais de metade da sua população abaixo

do limiar da pobreza, e é frequentemente fustiga-do por catástrofes naturais que contribuem paraa composição de um cenário aterrador. Desde1993 o Haiti recebeu sete missões de paz, a últimadas quais é a Missão da Organização das NaçõesUnidas de Estabilização no Haiti (MINUSTAH) inici-ada em 2004. As principais funções da Missãopassavam genericamente pela assistência aoEstado na promoção de programas de desarma-mento, pelo restabelecimento do Estado deDireito, pelo controlo e pela promoção e pro-tecção dos direitos humanos.

Após os incidentes envolvendo a presidênciade Jean-Bertrand Aristide (na primeira metade dadécada de noventa) verifica-se uma divisão inter-na que dificulta ainda mais um governo efectivo efomenta a situação de insegurança e violênciaestruturais, que as débeis instituições não con-seguem controlar, e que tende a aumentar, per-ante a ausência de perspectivas de melhoramen-tos ao nível político e de desenvolvimento sócio-económico.

Essa visão pessimista está também presentena maioria da bibliografia publicada sobre o país,que depende essencialmente (em cerca de 80%)de doadores externos para a construção da paz econsecução da estabilidade no território. A últimaconferência dos doadores realizou-se nos diastreze e catorze do passado mês de Abril emWashington D.C., colocando em cima da mesa adiscussão das possibilidades de progresso doHaiti, após um ano em que a subida dos preços dosalimentos, resultado da situação económica inter-nacional, levou a manifestações por parte da pop-ulação que acabaram por culminar na destituiçãodo Primeiro-Ministro pelo Senado. A esta situaçãoacresceu a destruição provocada por quatrofuracões que devastaram o território no mesmoperíodo.

Relacionada com as catástrofes naturais, asituação ambiental no Haiti é bastante precária,sendo o país marcado pela desflorestação, erosãodos solos, perda de biodiversidade ou degradaçãodo ecossistema marinho, entre outros problemas,que provocam actualmente um grande número de“refugiados ambientais” no seio da população

haitiana.Os aspectos acima referidos são apenas

alguns da extensa lista que se pode elaborar acer-ca dos factores que convergem para uma situ-ação de crise que parece inelutável. Outros que sepoderiam incluir são, por exemplo, a elevadaincidência de HIV-Sida, o tráfico de armas e dedroga, a taxa de analfabetismo dos adultos (queronda os 50%), a taxa de desemprego de cerca de60%, a ausência de condições básicas de sanea-mento, uma densidade populacional demasiadoelevada nas cidades que propicia as condições devida lastimáveis que estarão certamente na basede uma Esperança Média de Vida situada noscinquenta e três anos, inferior à dos países vizin-hos.

Todos estes indicadores se mantêm, nãodando sinal de evolução positiva do país, apesarda ajuda fornecida pelos doadores da comunidadeinternacional, o que nos leva a questionar a causada ineficiência destas acções e nos remete para aquestão do papel desempenhado pela populaçãohaitiana na construção de um Estado que possaexercer de facto as suas funções enquanto tal.

A consciência de que apenas com a colabo-ração da população poderão os países ver a suaajuda ao Haiti surtir resultados, é um aspecto queparece ainda não estar a ser devidamente tido emconta pelos actores internacionais. A situação noHaiti é peculiar, nomeadamente porque não exis-tem milícias armadas em confronto, ou movimen-tos de libertação nacional, mas apenas gangs queprovocam a insegurança que as forças policiaisincipientes e ainda em fase de treino parecem nãoconseguir evitar.

Alguns autores referem que seria expectável,perante a dimensão da pobreza no país, que osníveis de violência fossem maiores. Segundo esteraciocínio, é comum a opinião de que o maiordesafio que se coloca ao Haiti, com o apoio indis-pensável dos actores externos, é o de levar a cabouma transformação estrutural da sua economia,que permita uma saída do ciclo vicioso de pobrezaextrema e crise humanitária em que se encontramergulhado há anos, sendo contudo necessária,para esse efeito, a capacidade de implementaçãopolítica.

No passado dia 19 de Abril tiveram lugar aseleições para o Senado, cuja segunda volta serárealizada no próximo mês. O partido do ex-Presidente Aristide terá boicotado as eleições,que tiveram uma adesão mínima, de cerca de 10%na capital e aproximadamente 3% no restanteterritório. Este é mais um episódio que vem des-credibilizar as possibilidades de progresso políti-co do país.

Para o futuro, as expectativas são colocadasno desempenho da missão das Nações Unidas noHaiti – MINUSTAH – que deve, para além dasacções que constituem o seu âmbito de inter-venção, promover espaços de debate entre asociedade civil e as instituições estatais de formaa permitir reflexões conjuntas sobre as questõesmais prementes e as formas de lhes dar respos-ta. Este tipo de acção enquadra-se numa lógicamais abrangente de empowerment da populaçãohaitiana, que deverá ser desenvolvida, sob pena dese perpetuar a intervenção estrangeira no paíssem resultados efectivos.

Ana Catarina Silva

Haiti: possibilidades de futuro?INTERNACIONALINTERNACIONAL

“... o maior desafio que se coloca aoHaiti, com o apoio indispensável dosactores externos, é o de levar a cabouma transformação estrutural da suaeconomia, que permita uma saída dociclo vicioso de pobreza extrema e

crise humanitária...”

D.R.

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PÁGINA 4MUNDUS INTERNACIONALINTERNACIONAL

Actualmente, o debate sobre a con-sagração, ou não, de um direito humano à água eao saneamento básico encontra-se na agendainternacional. Parece algo paradoxal, uma vez queo direito à vida está devidamente consagrado e,sem água, um ser humano apenas consegue viver,no máximo, uma semana. Exactamente por isso, osenso comum esperaria que ou a questão nãofosse colocada ou, ao sê-lo, fosse consensual erapidamente resolvida com a consagração explíci-ta e inequívoca desse direito.

No entanto, a realidade tem-se revelado bas-tante mais complexa. Num braço-de-ferro semân-tico entre ‘direito humano à água’, ‘direito básicoà água’ e ‘necessidade humana básica’, qualquerleitor/a menos atento/a fica perdido/a na dis-cussão. Ninguém nega o óbvio, mas diferentespartes apresentam-se irredutíveis quanto à lin-guagem a ser utilizada para consagrar esse dire-ito. As razões prendem-se com as implicações éti-cas, políticas e económicas decorrentes da con-sagração desse direito.

O 5º. Forum Mundial da Água, que teve lugarem Março, em Istambul, foi marcado por esta dis-cussão, ensombrando assim os resultados finais.O Forum deste ano foi dedicado à procura de‘pontes de entendimento’ que permitam superar aescassez de água, rumo à sustentabilidade. EsteForum distinguiu-se dos anteriores pelo númerode participantes sem precedentes, mas também

pela forma como foi organizado. Por umlado, nos últimos dois anos procedeu-se a umadiscussão política multi-nível sobre os diferentestemas que resultaram no programa do Forum emIstambul. Por outro, os actores convidados aintervir incluiram nesta edição representantes deautoridades locais de diferentes partes do mundo,bem como representantes parlamentares dediferentes países. Pretendeu-se assim alargar adiscussão ao maior número possível de pessoas,mas também englobar na discussão decisorespolíticos de naturezas e níveis distintos, numesforço concertado de sensibilização e educação.

As implicações éticas da consagração de umdireito humano à água e ao saneamento prendem-se obviamente com o direito à vida, a uma vida

digna e saudável. Ao nível nacional, estaquestão tem sido resolvida com a implementaçãode um princípio de solidariedade nacional eabastecimento universal. Até à década de 1990, osgovernos de qualquer país democrático assumiama responsabilidade de investir e expandir a rede

de cobertura de água canalizada e saneamentobásico a todo o território nacional e a toda a pop-ulação nele residente. Durante este período, aquestão do direito humano à água e ao saneamen-to básico não foi colocada, pois fazia parte dopacote de responsabilidades de um estado moder-no legítimo, democrático e de providência.

Com a adopção generalizada do paradigmaeconómico neo-liberal, onde o estado é parte doproblema, o mercado é a solução, e o objectivodeve ser a eficiência, assiste-se a uma alteraçãoradical das políticas governamentais em matériahídrica: criam-se parcerias público-privadas parao investimento no sector, emitem-se licenças paraa exploração comercial de recursos hídricos porparte de empresas privadas, e aplicam-se princí-pios de gestão focados na eficiência económicados serviços de captação, abastecimento e trata-mento de água. Ao nível nacional, as implicaçõesforam imediatas: cobrança pela água, muitasvezes com preços incomportáveis, e criação denovas instituições de gestão ao nível das baciashidrográficas. A solidariedade nacional passa adepender de investimentos privados e o abasteci-mento universal é posto em causa, devido à taxade retorno dos investimentos necessários para ogarantir.

É nesta encruzilhada entre a prática pública degovernação da água e a mercantilização damesma que surge a necessidade de se discutir aconsagração de um direito humano à água e aosaneamento básico. Esta discussão ganhou ímpetocom a ‘guerra da água’ em Cochabamba (Bolívia)em 1999 e a contestação, um pouco por todo o

mundo, principalmente nos grandes cen-tros urbanos, contra a subida vertiginosa dospreços da água e contra o corte do abastecimen-to de água por falta de pagamento. É neste climade contestação que a defesa pelo direito à águaganha força, levando a que o Alto Comissário dasNações Unidas para os Direitos Humanos nomeieem 2008 uma especialista independente paraestudar, durante três anos, as obrigações dosdireitos humanos associadas ao acesso a águapotável e ao saneamento. As questões fundamen-tais da consagração deste direito estão obvia-mente relacionadas com as implicações políticas eeconómicas da sua adopção. Ao nível nacional, osopositores à consagração deste direito apontam afalta de fundos financeiros para satisfazerem asua garantia. Os defensores, por seu lado, alegamque só a consagração do direito humano à água eao saneamento obrigará os governos aassumirem (novamente) a responsabilidade peloabastecimento universal.

Ao nível internacional, a questão é bastantemais complexa. Os países ricos em água tememque a consagração de um direito humano à águalhes crie obrigações acrescidas em termos dapartilha dos seus recursos hídricos com outrospaíses mais necessitados. Até à década de 1990,cada governo tinha soberania absoluta sobre osrecursos hídricos do seu país e uma soberaniarelativa no que dizia respeito aos recursos hídri-cos internacionalmente compartilhados. Váriospaíses temem que a consagração do direitohumano à água crie direitos a países, populações,actores não integrados nas bacias nacionais e/ouinternacionais, retirando-lhes soberania sobre

aqueles recursos.Independentemente da situação actual em

torno desta discussão, vários países têm adopta-do legislação que consagra o direito humano àágua, e várias autoridades locais têm criado medi-das de apoio às famílias que defrontam dificul-dades para pagar os serviços de água.Paralelamente a este movimento institucional ejurídico, existe uma contribuição científica quedefende que 40 litros de água por dia por pessoaé o razoável para a sobrevivência humana.Consequentemente, e independentemente daclasse social em que se está inserido/a, defende-se que esta quantidade seja facultada gratuita-mente a cada ser humano e que a partir dessemontante se deixe, então, o mercado funcionar.

O 5º. Forum Mundial da Água pode ter termi-nado sem acordo sobre a consagração ou não deum direito humano à água, mas contribuiu deforma inegável para a divulgação generalizada datemática e para manter a questão na agendainternacional dos próximos anos.

Paula Duarte Lopes

Direito Humano à Água?

“A solidariedade nacional passa a depen-der de investimentos privados e o abasteci-mento universal é posto em causa, devido à

taxa de retorno dos investimentosnecessários para o garantir.”

“Os países ricos em água temem que aconsagração de um direito humano à águalhes crie obrigações acrescidas em termosda partilha dos seus recursos hídricos com

outros países mais necessitados.”

"Ninguém nega o óbvio, mas diferentespartes apresentam-se irredutíveis quanto àlinguagem a ser utilizada para consagraresse direito. As razões prendem-se com asimplicações éticas, políticas e económicasdecorrentes da consagração desse direito."

D.R.

D.R.

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passam fronteiras, a consequenteimposição de limites às soberanias nacionais e autilização do ambiente como impulsionador dodireito de ingerência internacional nestas.Despertou-se, igualmente, a consciência de que aprotecção ambiental viria a influenciar temas dediscussão global como o comércio livre, a circu-lação de capitais, bem como aconteceu umamudança na filosofia de instituições, como o BancoMundial, que se tornou um agente promotor depolíticas ambientais nos países em desenvolvi-

mento.O Protocolo de Quioto inicia o quarto ciclo e

representa um compromisso legal e económico àescala mundial, vinculando todos os países indus-trializados a gerir e a controlar as emissões dosgases gerados do efeito de estufa. Este Protocolointegrou mecanismos de mercado como instru-mentos de minimização dos impactes económicosdo esforço de redução de emissões nas econo-mias dos países desenvolvidos. Os efeitos políticose económicos da implementação de Quioto senti-dos nas negociações e na fase experimental dosmecanismos de mercado colocam-no na ordem dodia e influenciam a evolução da política ambientaldo mundo. As posições entre blocos económico-políticos com afinidades de interesses foram-sefixando, com repercussões geoestratégicas emdiversas frentes.

No século XXI, o “século do ambiente”, sãovárias as dificuldades com que a comunidadeinternacional se debate. Em primeiro lugar,destaque-se as discussões em torno da ratifi-cação do Protocolo de Quioto que demonstra, deforma dramática, o isolacionismo ambiental dosEstados Unidos da América. A superpotênciaamericana, ao não assumir as suas responsabili-dades ambientais, tem abdicado do papel de lider-ança planetária, na matriz daquilo que se poderiadesignar “hegemonia benévola”.

Paralelamente, outra das dificuldades apon-tadas prende-se com o ponto de saturação eesgotamento que parece ter atingido asConvenções-Quadro. Na verdade, o seu cumpri-mento não tem apresentado resultados satis-fatórios de modo a responder às ameaças ambi-entais mais preocupantes. Esta situação deriva,em parte, do tempo excessivo para ratificação deConvenções, enquanto os meios de punição aosinfractores revelam-se desajustados. É tambémde salientar a grande assimetria entre o desen-volvimento científico e a inércia dos sistemaspolíticos que, por sua vez, advém da diferenteapreciação do “princípio de precaução”, elementofundamental na diplomacia ambiental.

No entanto, apesar destas dificuldades, asConvenções continuam a ser a única garantiacapaz de zelar pelo ambiente. A União Europeia(UE) tem na sua incumbência, a responsabilidadede formular o quadro mundial de referência comvista ao combate das emissões de gases comefeito de estufa. Depois de 2012, torna-se pre-

PÁGINA 5MUNDUS INTERNACIONALINTERNACIONAL

Desde a Cimeira do Rio em 1992 atéaos dias de hoje, as políticas ambientais conhece-ram uma evolução notável. A Humanidade tem,hoje, consciência do cariz global das grandesquestões ambientais e a protecção ambiental e ovalor do ambiente como património do planeta edos seus habitantes foram reconhecidos numâmbito global sem precedentes.

Foi durante a Revolução Industrial que foramcriadas as primeiras legislações destinadas acombater alguns efeitos ambientais resultantesda actividade económica, bem como, na mesmaaltura, assiste-se à formação da associação AlkaliInspectorate que visava combater a poluiçãoatmosférica resultante da combustão de carvão.Mais tarde, em 1908, surgem as primeiras pre-ocupações quanto ao esgotamento de recursos deinteresse estratégico, como sejam o carvão, o

petróleo e o gás natural, expressos nas actas dasConferências de Governadores de Estados dosEstados Unidos da América.

Desde a implosão da Guerra Fria que se temverificado um aumento exponencial de teoriassobre o papel do ambiente, com vista à recon-strução internacional e na recomposição dasrelações entre o Estado e a sociedade civil.Contudo, o primeiro marco remonta a 1962, quan-do Rachel Carson publica a obra “Silent Spring”que despertou a consciência dos cientistas epolíticos para o movimento ecológico. Foi desdeentão que emergiu o conceito de diplomacia ambi-ental e a política ambiental começou a ganharsérios contornos desde então até à actualidade eestá dividida em quatro ciclos.

O primeiro ciclo, iniciado em 1962,perdura até à eclosão da Guerra de Yom Kippur,em Outubro de 1973. Para além das crisespetrolíferas, a década de 70 ficou marcada pelaconstrução das primeiras infra-estruturas comfins ambientais, bem como pelo nascimento, nosEstados Unidos da América e no Japão, dasprimeiras leis-quadro e ministérios de cariz ambi-ental. De destacar, que em Portugal foi fundada,em 1971, a Comissão Nacional do Ambiente, sob aégide de José Cunha, alguns meses depois dePortugal fomentar a sua primeira política hídrica.Na década de 70, as questões ambientais ganhamum cunho internacional, da qual é prova aConferência das Nações Unidas sobre AmbienteHumano em Estocolmo.

O segundo ciclo teve o seu inicio, quando, em1973, o partido alemão Die Grünen reivindica a

ecologia política. Apesar de algum recuo na agen-da ambiental, em 1982, é assinada da Convençãodas Nações Unidas sobre Direito do Mar. A ter-ceira fase da política do ambiente estende-se de1983 até 1997, data da assinatura do Protocolo deQuioto. Na verdade, é nesta fase que se dá umnovo ímpeto na legislação ambiental interna einternacional. No inicio da década de 90, quasetodos os países desenvolvidos já têm ministériosdo ambiente e, após a Conferência do Rio deJaneiro, uma panóplia de Estados desenvolveuplanos nacionais de política ambiental.

Na Conferência do Rio, alteraram-se váriasbases das relações internacionais, como o lança-mento de Convenções-Quadro no âmbito da ONU, aaceitação de que os problemas ambientais ultra-

mente um novo Protocolo de Quioto maisambicioso e apenas a UE tem mostrado condiçõesde relembrar os Estados Unidos das suas respon-sabilidades, envolvendo, de igual modo, as potên-cias emergentes, como sejam a China, a Índia e oBrasil.

O Programa das Nações Unidas para oAmbiente publicou, em 2002, um relatório no qualdenuncia as principais fragilidades, com o intuitode se chegar a um modelo de desenvolvimentosustentável. Nesse relatório, destacam-se asprincipais dificuldades que fragilizam ahumanidade, como sejam a barreira ambiental, abarreira política, a barreira da vulnerabilidade e abarreira dos estilos de vida.

A barreira ambiental remete para a clivagem,cada vez mais visível, entre os países desenvolvi-dos e os países em desenvolvimento, no que con-cerne às tendências de evolução da degradaçãoambiental nos seus territórios soberanos. Se, porum lado, as políticas públicas ambientais têm per-mitido, nas últimas décadas, alguns avanços naEuropa e nos Estados Unidos, por outro lado, emvários países do Sul os recursos ambientais têmsido arruinados a um ritmo avassalador. Acresceainda, e já no âmbito da barreira política, quemuitos dos países em vias de desenvolvimentosofrem dos avultados custos de injustiça social epobreza, reflectidos pela ineficácia dos seus sis-temas administrativos que, de um modo geral,estão associados à falta de legitimidade

democrática e a escândalos de corrupção. Para além disto, o contraste nos diferentes

níveis de exposição aos riscos ambientais e tec-nológicos exorbita a mera delimitação de fron-teiras, estendendo-se ao interior das sociedadese conduzindo a problemas de tensão social e deinjustiça ambiental. Por último, mas não menosimportante, ressalve-se os padrões de vida. Defacto, torna-se inconcebível mobilizar ahumanidade numa luta comum pela sustentabili-dade, quando milhares de milhões de sereshumanos vivem abaixo do limiar da pobreza.

Actualmente, tem-se acentuado o abismoentre os países desenvolvidos e os em vias dedesenvolvimento. A globalização dos problemasambientais não reduz a necessidade das agendasnacionais em debatê-los. Na verdade, os proble-mas ambientais são uma forte competência dosgovernos nacionais e, de acordo com o principioda subsidiariedade, devem estar, ainda que par-cialmente, numa escala regional.

De facto, é em torno dessa globalização que sedelineiam os principais desafios que exigem acapacidade de construir instituições que mel-horem os sistemas de governação. A políticainternacional de ambiente tem que ser encaradapor todas as potências como uma necessidade ful-cral, a fim de evitar o colapso e promover odesenvolvimento sustentável.

Vasco Batista

A evolução das políticas ambientais

“De facto, torna-se inconcebível mobilizara humanidade numa luta comum pela sus-tentabilidade, quando milhares de milhões deseres humanos vivem abaixo do limiar da

pobreza.”

“A superpotência americana, ao nãoassumir as suas responsabilidades ambien-tais, tem abdicado do papel de liderança plan-etária, na matriz daquilo que se poderia des-

ignar “hegemonia benévola”.”

D.R.

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Instabilidade… Incerteza… etc. etc.Muitas mais palavras seria ainda necessário invo-car — até perfazer 1000 palavras — para mesmoassim ficarmos muito provavelmente na ignorân-cia sobre o que significa, e sobre o que nos trazesta crise actual.

Porquê? 1. As crises económicas fizeram sempre parte

da realidade vivida pelas sociedades humanas: sãopois anteriores à própria existência das modernaseconomias de mercado ou, se preferirmos, dosmodernos capitalismos. Todavia, pela suanatureza as crises económicas anteriores àModernidade redundavam em Fomes — por insufi-ciència das quantidades produzidas relativamenteao que era necessário para satisfazer as necessi-dades das populações… em geral: eram crisesagrárias.

2. Com a Modernidade apareceram as crisesde sobreprodução — e foram crises comerciais,financeiras ou financeiras e comerciais a geraruma diminuição dos níveis de produção e de activi-dade com custos sociais elevadíssimos que podi-am levar também à “Fome no meio de uma poten-cial Abundância”.

3. Keynes percebeu bem a natureza desteparadoxo da Modernidade e por isso — acompan-hado pelo trabalho crítico de um grupo de entãojovens economistas — reveu todas as suas con-cepções teóricas e “partiu” para uma nova teoria

que o pudesse explicar: a Teoria Geral doEmprego, do Juro e da Moeda, publicada em 1936.

4. Não foi a Teoria Geral que, no entanto, levouo Mundo a sair da Depressão: foram políticas deefeitos lentos — o New Deal da AdministraçãoRoosevelt nos E.U.A., já em curso ainda antes dapublicação da Teoria Geral de Keynes —, e por fima II Guerra Mundial. A Teoria Geral de Keynes inspi-rará sobretudo as políticas do pós-guerra, sobre-tudo a partir da década de 1950. E foi muito impor-tante sem dúvida, apesar dos desvios deste “key-nesianismo” relativamente à genuína mensagemde Keynes.

5. Cuidado pois com as expectaivas ditas decurto-prazo: a Crise pode estar para durar e ter-se-ão de ensaiar políticas capazes de promover,mesmo que lentamente, os efeitos desejados: istoé, capazes de estabelecer níveis de emprego e derendimento compatíveis com as nossas expectati-vas. Contudo…

6. Será que estamos mesmo em crise — crise-Crise – ou estaremos em “recessão técnica”?

Estaremos perante uma Depressão idêntica à dadécada de 1930 ou estaremos para já a enfrentaruma turbulência provocada por colapsos finan-ceiros superáveis?

7. De momento, quer optimistas profissionaisquer políticos profissionais insistem em “injectar”ânimo e, em-terra-de-cegos, vêem LUZ… ao-fundo-do-túnel. Assumindo pelo menos um opti-mismo da vontade, pensemos por instantes noseguinte:

8. As modernas economias de mercado e amoderna Economia-Mundo são antes de mais“organismos” sensíveia. Sim, “organismos”, e não“mecanismos”. Dependem de complexas inter-acções entre a esfera financeira e a esfera realdos sistemas económicos locais (nacionais) e osda Economia-Mundo que entretanto criámos:Historicamente. E muito em particular, nos anosque se aceleram desde a década de 1980 aos nos-sos dias: pois “alargámos” os Mercados do PóloNorte ao Pólo Sul e até construímos graças a issoCidades modernas nos desertos (veja-se o casodo Dubai), e metrópoles de muitos milhões dehabitantes em pouco mais de uma década (veja-sealguns casos na República Popular da China). Paraisso dispusémos de diferentes recursos queforam reunidos através da acção dos diferentesmercados: mas não foram mercados “abstrac-tos”, “impessoais” e “concorrenciais”. Muitasvezes foram mercados globais, sem dúvida, masque resultaram de decisões políticas de fundo quese inspiraram numa ideologia que se impôs empouco tempo e que levava a acreditar que aquiloque tinha acontecido na década de 1930 nãovoltaria a acontecer. Tínhamos finalmente chega-do à concretização daquilo que para os economis-tas de há duzentos anos a esta parte tinha sidoapenas Projecto ou “Utopia”.

9. Mas… Mas… esta Prosperidade que pareciaestar “definitivamente” instalada mascarava — equantas máscaras ainda persistem e não quere-mos acreditar que são isso mesmo: apenas más-caras — duras e objectivas realidades. Podem ler:Não, esta Crise não é psicológica e não bastará,como há dias sugeria o Senhor Silvio Berlusconi,presidente do Conselho de Ministros italiano, queos “empresários” voltem a gastar mais dinheiroem marketing e publicidade (os cortes nestadespesas parece que rondam os 40 % relativa-mente ao ano transacto em Itália) para que tudovolte à normalidade: Isto é, aos níveis de consumo,de investimento, de despesa privada e pública,anteriores e , consequentemente o PIB volte a sero que foi, o que era, o que costumava ser…

Porquê?Não esperem muitos pormenores nas cerca de

menos de 300 palavras que nos sobram. Mas ten-temos…

10. Após se verem os efeitos das medidas quevisaram — urbi et orbi — sanear os problemasfinanceiros, veremos — mais para o Outono — seo sistema financeiro e bancário não nos reservaainda grandes surpresas, por causa da opacidadeque se criou nas duas últimas décadas: o bankingshadow system não foi superado, pode haver sur-presas!

11. O colapso dos níveis de produçãoindustrial — crescente a partir do início deste ano— causa preocupações que não desaparecempelo facto de os stocks aparentementecomeçarem a diminuir. O efeito da quebra da pro-dução industrial na própria situação financeirapode vir a ser óbvio nos próximos meses. Òbviotambém será o nível do desemprego: nestemomento a rondar os 10% da população activa—na Europa e nos E.U.A —, pode disparar e local-mente — em Espanha, por exemplo — atingir val-ores que se aproximem dos níveis que se veri-ficaram durante a Grande Depressão.

12. Quanto aos factores que nos preocupavamhá um ano atrás — muito particularmente os quese relacionavam com a progressão do preço doscombustíveis poderão reaparecer: o aumento dopreço do petróleo, embora condicionado por fac-tores especulativos em 2008, assentava emrazões de fundo, estruturais: estas reaparecerãoindependentemente do andamento dos níveis daoferta (determinada largamente por decisões daO.P.E.P) e da procura, influenciada pela recessão(ou Depressão); o preço de certas commoditiesligadas à agro-indústria também poderá conhecerandamentos semelhantes aos do preço dopetróleo. Deixemos de lado o andamento dos mer-cados bolsistas, provavelmete errático. Não nossobressaltemos demasiado se surgir algumacrise cambial. Porque dependerá isto do…

13. …Progresso da concertação internacionalno âmbito do G-8 e G-20: a próxima cimeira arealizar em L’Aquila (três dias em formato degeometria variável: G-8, G-14 e G-20+1+1, isto é,+Espanha e +União Africana) poderá ser funda-mental para preparar um momento das grandesdecisões que decerto poderão impor-se nareunião do Outono desta mesma instância: o prob-lema de reforma do S.M.I e particularmente asdecisões que alterarão no curto-prazo aspectosfulcrais do sistema de reserva global, como dese-ja a República Popular da China, não poderãoesperar muito mais tempo.

14. A urgência que a realidade dos factos e dascircunstâncias poderá suscitar não pode contudocolidir com uma desejável abordagem lúcida dosproblemas; a busca de soluções não poderá sercosmética e apenas virada para uma eventualoperação de imagem: o Mundo espera genuínasalterações no modo de funcionamento dos sis-temas políticos e económico-financeiros para quea Crise seja “aproveitada”. Isto é, para que sejaocasião para uma viragem. Oxalá, se perceba pelomenos como o momento exige decisõesinadiáveis, em nome de um elementar direito daHumanidade à sobrevivência com dignidade e paraesconjurar um retorno a uma qualquer forma debarbárie.

Joaquim Feio

A Crise: em cerca de 1000 palavras

"… não, esta Crise não é psicológica e nãobastará […] que os “empresários” voltem agastar mais dinheiro em marketing e publici-dade […] para que tudo volte à normalidade...”

“...a Crise pode estar para durar e ter-se-ão de ensaiar políticas capazes de promover,mesmo que lentamente, os efeitos desejados:isto é, capazes de estabelecer níveis de

emprego e de rendimento compatíveis com asnossas expectativas."

D.R.

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PÁGINA 7MUNDUS INTERNACIONALINTERNACIONAL

A política de condicionalidades parao apoio ao desenvolvimento, na maior parte dospaíses em que foi aplicada, tem vindo a compro-var a sua eficácia relativa ou, pior, a geral ausên-cia de bons resultados tanto no sentido do desen-volvimento real e quanto apenas ao crescimentoeconómico, o que parece ser o principal foco emuitas vezes o fim das políticas de ajuda externaneste âmbito.

A Primeira Geração de condicionalidadesbaseia-se apenas em pressupostos liberais deabertura de mercado, liberalização do comércio,retirada do Estado das acções económicas, altastaxas de juros, dívidas infindáveis, privatizaçõesem massa, menores gastos públicos, etc. A prin-cipal expressão disso era a política do BancoMundial, na década de 1980, de colocar comocondição aos seus préstimos ajustes sectoriais emesmo estruturais, sendo grande parte dos fun-dos emprestados direccionados para este fim.

Já na Segunda Geração de condicionalidades,com uma revisão de consciência acerca dosDireitos Humanos, democracia ou mesmo cor-rupção, decorrem-se interferências em assuntospolíticos, estabelecendo-se um modelo de “boagovernação”, que promoveria a democraciasobretudo para menor actuação do Estado emassuntos económicos, e reveria em certa medidaa posição sobre as políticas sociais. Mantém-se,todavia, do paradigma neoliberal em que sebaseia o sistema económico dos principaisEstados doadores.

Segundo o Relatório sobre a Pobreza daOXFAM (1995), o modelo liberal continua em vigor,já que os doadores usariam os Programas deAjustamento Estrutural para “obrigar governos aimporem taxas a serviços básicos como a edu-

cação primária, o acesso à saúde, a

desvalorizarem a moeda nacional, a esta-belecerem taxas de juros ditadas pelo FMI, arealizarem privatizações e liberalização dos mer-cados…” (tradução da autora). Isto tudo mesmocom a crescente constatação do erro na visão doSul como uma entidade uniforme.

O incumprimento das condicionalidadesimpostas pelos doadores tem várias exemplifi-cações, entre elas, o caso de países comoZimbabué que, mesmo com constantes violaçõesde Direitos Humanos, negação do direito ao desen-volvimento, direitos políticos, etc, continua a rece-ber apoio financeiro directo através do governo.Nem mesmo soluções como as smart sanctions –

que afectam directamente os responsáveis poressas violações e não a população de forma geral– foram ainda implementadas.

As sanções gerais iriam pôr em causa a con-tinuidade da entrada de fundos que garantiriam opagamento da dívida e a manutenção das trocascomerciais com vantagens, colocando em risco arelação alcançada entre doadores e recipientestanto em termos políticos como económicos.

Por outro lado, a grande maioria dos paísesAfricanos e alguns da América Latina, além deafundados em dívidas externas, seguem com baixoÍndice de Desenvolvimento Humano e alto Índice dePobreza Humana, mesmo depois de décadasseguindo planos estrangeiros de apoio ao desen-

volvimento. Exemplos disso podem ser

observados em dados do próprio BancoMundial, que demonstra o declínio sofrido porpaíses da América Latina e África que cumpriramas condições que lhes foram colocadas (2005).

Segundo mesmos dados do Banco Mundial,entre 1990 e 1993, mais de 13.4 biliões de dólaresforam transferidos de África para seus credores,quatro vezes mais do que o gasto em saúde e edu-cação juntas. E ainda assim, o pagamento da dívi-da não estaria a seguir as metas estabelecidas.

Para exemplificação, além de tudo, damanutenção dos modelos de condicionalidade,dois dos focos dados no “Guia de implementaçãoda Boa Governação” do Governo Australiano(2000) referente à economia, são a dinamizaçãodo sector privado, a economia aberta baseada nomercado e a implementação de normas sociaisque respeitem o direito de propriedade para ofuncionamento dos mercados. Ainda, a Agenda deDoha para o Desenvolvimento (Julho/2008) apre-senta princípios como “apoio para o comércio”,ainda baseada na abertura do comércio, reduçãodo nível máximo de protecção e redução do apoiodoméstico à agricultura. Além disso, os credoresestão envolvidos de forma demasiadamente intru-siva nesses países em nome da “eficiência daajuda”.

Ravi Kanbur (2000) cita análises que con-cluem não haver ligação entre a entrada de apoiofinanceiro e o crescimento de indicadores dedesenvolvimento per capita. As premissas são asrelações entre apoio financeiro, crescimento e“um bom quadro de políticas macroeconómicas”.Segundo Bunside, citado por Kanbur, a conclusãoestá nessas relações, já que o apoio financeironão iria para países com o requerido “bomquadro de políticas”, e no fato de que este apoio

financeiro tampouco induz a esses

Condicionalismos como entraves na cooperação para oDesenvolvimento

Emergência tanto significa acto deemergir como caso de urgência. É com estes doissignificados em mente que escrevo este artigo. Oque me motiva a escrevê-lo é a observação de umfenómeno que, principalmente na ultima década,se intensificou: a globalização cultural. Não queroaqui reflectir sobre a globalização económica e noaumento da interdependência comercial entre ospaíses, não que isso não seja relevante, apenasnão é o foco desta observação.

O que possibilita um país manter-se íntegro?Apesar das diferenças culturais, por exemplo,entre o norte e o sul de Portugal, uma mesma lín-gua, uma história comum e costumes em comum,legitimam um mesmo Estado para o território. Adiferença existente entre essas regiões não é tão

grande a ponto de as influir à separação.Há um certo tempo, no sul do Brasil existia

uma região que usava o espanhol ao invés do por-tuguês. Essa e outras diferenças culminaram naseparação desse território. Nascia o Uruguai. Portanto, pequenas diferenças culturais não resul-

tam na necessidade de auto-determi-nação separada, mas grandes diferenças cultur-ais sim. A identidade de um povo é fundamentalpara a sua soberania.

O mundo mudou?O surgimento de blocos regionais é um fenó-

meno no sentido inverso. Regiões com línguas,histórias e costumes diferentes, por necessidadeou interesse, criam instrumentos de cooperaçãoque de alguma maneira reduz a soberania de cadaEstado-membro. Ao invés de separação, osEstados caminham em direcção à integração. Aredução das distâncias, os avanços tecnológicosnos transportes e nas comunicações, aumentarammuito o intercâmbio entre países. Essa interacçãofaz com que seja crescente a percepção de que,apesar das diferenças culturais, não somos tãodiferentes assim. Na década de 60 do século pas-sado, com a influência da ida do homem ao espaço,as primeiras fotos do nosso planeta e asdescobertas da física quântica, surge a consciên-cia ecológica e os movimentos verdes. Estabelece-se a noção de que somos todos interdependentes.Para além dos debates acirrados sobre a veraci-dade do efeito estufa, podemos concordar com umfacto: o sistema de produção actual, põe ahumanidade em direcção ao auto-aniquilamento,uma vez que não é sustentável. Os recursos são

finitos. (Ver vídeo “História das coisas”no Google).

Acto de emergir Principalmente na últimadécada vemos um fenómeno inteiramente novo.Jovens de diversas partes do mundo, apesar de

línguas e religiões diferentes, usam o mesmo tipode roupa, ouvem a mesma música, comem asmesmas coisas, têm as mesmas aflições e, cadavez mais, utilizam o mundo virtual, seja para par-ticipar nas redes sociais, estudar ou para diverti-mento. Emerge uma espécie de identidade global.A nova geração de seres humanos, independente-mente do país, é menos diferente culturalmenteentre si do que há 10 ou 20 anos atrás. Parece-

me, por tanto, crescente a possibilidadede respeito às culturas diferentes e à cooper-ação.

Caso de urgência Um problema se apresentaa esta nova geração: a necessidade óbvia deencontrar soluções aos problemas de sus-tentabilidade planetária através da cooperação.De alguma maneira é urgente a necessidade deenxergar que, para além das diferenças étnicas eculturais, somos humanos, terráqueos e interde-pendentes. Percebermos que há mais semel-hanças do que diferenças, possibilitará que convi-vamos mais pacificamente. Possibilitará queunamos, mais facilmente, esforços para resolverproblemas comuns.

Consequências O crescimento da identidadeglobal, com certeza resultará num novo modelode Estado. Povos com pequenas diferenças cul-turais podem viver num mesmo Estado.

Gostaria de concluir essa reflexão deixandoalgumas perguntas aos meus colegas de curso:Quais são as possibilidades do surgimento de umEstado único? Quais os problemas e soluções queisso traria? Será que um dia alguém dirá: minhapatria é meu planeta?

Bruno Bartulic

A emergência de uma identidade global

quadros.Através dessas análises evidencia-se o facto

de que os condicionalismos hoje seguem os mes-mos padrões liberais já criticados. A “SegundaGeração” de condições compõe-se apenas dis-tracções às críticas contra o enfoque excessivo,sem bases e comprovadamente ineficaz no cresci-mento económico para direccionamento geral aodesenvolvimento, cuja esfera de justiça social ficadeclaradamente para “longo-termo”.

Ao invés de se abranger os condicionalismos, oque deveria ser aperfeiçoado é o estímulo à justiçano que se trata de crimes como a violação dosdireitos humanos – não esquecendo, é claro, dire-itos económicos, sociais e culturais e o direito aodesenvolvimento – através de mecanismos region-ais já existentes, como no caso da ComissãoAfricana para os Direitos Humanos, a OEA, ou, nocaso da Ásia, que ainda não possui um mecanismoregional para o assunto, através do próprioConselho para os Direitos Humanos das NaçõesUnidas, cessando as intervenções externas bilat-erais, em sua maioria inquisitórias.

O desenvolvimento interno de políticas públicasmais eficazes deveria ser substituído pelasimposições externas vigentes de reformas e aber-turas económicas maioritariamente insusten-táveis. Novas formas de cooperação devem serdesenvolvidas de forma mais abrangente, horizon-tal e prática, reconhecendo-se a responsabilidadede toda a comunidade internacional por extremosde subdesenvolvimento presentes em diferentescenários, tanto de “Sul” quanto de “Norte”.

Moara Crivelente

“O sistema de produção actual, põea humanidade em direcção ao auto-

aniquilamento...”

“...países como Zimbabué que, mesmocom constantes violações de Direitos

Humanos, negação do direito ao desenvolvi-mento, direitos políticos, etc, continua a rece-ber apoio financeiro directo através do gov-

erno.”

D.R.

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programa será operacionalizado é con-troverso. Se os planos anteriores num contexto decrescimento acelerado eram questionáveis, agoraa situação tornou-se bastante mais complexa.Tanto que os EUA estão menos preocupados com aretórica armamentista do que com o discursoanti-OTAN, que perpetua a imagem do “inimigo”que a organização vem tentando diluir. Num climade desanuviamento onde o “reset” nas relaçõestem sido defendido, esta postura russa pode ser

fonte de alguma crispação. De acordo com oporta-voz do Pentágono, Geoff Morrell, a Rússia“tem todo o direito de desenvolver capacidadesrobustas de auto-defesa”. Enquanto os níveis dediálogo se mantiveram, não há razões para enten-der esta postura como hostil. E, de facto, tal comoos Europeus e norte-americanos modernizam osseus arsenais militares, também os russos opodem fazer. Por outro lado, tem sido levantada aquestão de que a demonização da OTAN no contex-to actual é desfavorável à Rússia, que tem benefi-ciado do seu apoio no Afeganistão.

Em suma, a questão do rearmamento russo eda reforma militar não é nem nova nem uma sur-presa no contexto actual. A necessidade de reca-pacitação militar russa é conhecida, bem como assuas dificuldades de concretização. Por outrolado, a manutenção de relações harmoniosasentre elites políticas e militares é essencial, e faceàs dificuldades actuais que assumem um crescen-do claro na vida política russa, o anúncio feito pelopresidente Medvedev com todos os contornosretóricos associados, é claramente mais umamedida para consumo interno do que um sinal dealarme face a uma Rússia revisionista, apesar deconsubstanciar os princípios de afirmação prag-mática da sua política externa.

Maria Raquel Freire

ativa face à expansão da OTAN, especial-mente no que diz respeito aos seus planos deadmissão da Ucrânia e Geórgia, bem como àaproximação da infraestrutura militar da OTAN àsfronteiras russas”, Medvedev maximiza o momen-to e procura a sua capitalização a nível domésti-co. O Ministro da Defesa, Anatoly Serdyukov,define a situação politico-militar como sendomarcada pelo “desejo de liderança global e deexpansão da presença militar dos EUA e aliados

em regiões adjacentes à Rússia”. Esta visa, no seuentendimento, acesso a recursos naturais nospaíses da CEI, funcionando numa lógica de somanula relativamente ao posicionamento da Rússiana área. Estes comentários prendem-se directa-mente com o alargamento da OTAN aos dois esta-dos da ex-Jugoslávia e a um discurso que per-manece inflamado relativamente à possíveladesão da Geórgia e da Ucrânia. Além do mais, aRússia entende que face à instabilidade nas suasfronteiras, à ameaça do terrorismo trnasna-cional, e às vulnerabilidades que se tornaramclaras aquando da guerra dos cinco dias naGeórgia em Agosto de 2008, o momento é dereforma e remilitarização. De acordo comMedvedev, “as tentativas de alargamento dainfraestrutura militar da OTAN não param. Tudoisso apela a uma modernização qualitativa dasnossas forças armadas e da sua imagem. Istoenvolve a melhoria na preparação para o com-bate, e primariamente forças nucleares estratég-icas”. Um esforço enorme não só em termosfinanceiros, mas também tecnológicos – segundoo analista russo Viktor Litovkin, a Rússia precisade sistemas de apoio a combate (armas de pre-cisão, reconhecimento, navegação, comunicação,sistemas de guia), mais do que unidades de bom-bardeamento –, e aqui se levanta a questão daeventual cooperação militar com o ocidente.

As despesas com defesa na Rússia aumen-taram cinco vezes desde 2001. Contudo, dada acrise internacional e as dificuldades económico-financeiras que a Rússia enfrenta, como este

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Sabias Que...O papel das etnias nos conflitosda PeriferiaA violência presente em todas as comunidadesmulticulturais, os conflitos tanto armadoscomo potenciais inerentes a essas comu-nidades expressam-se de formas variadas,trazendo a debates complexos o papel dasdiferenças identitárias nesses processos.Os conflitos étnicos e religiosos têm já um<longo histórico de violências, principalmentefatais. Segundo Jack Goody (Bitter Icons,2001), é para isso de fundamental importânciao papel dos líderes que usam de discursosincitadores, ressaltando as diferenças étnicase religiosas de acordo com interesses ter-ciários, mobilizando e legitimando o uso da vio-lência. Para Amartya Sen (Identidade eViolência, 2006), “a violência é fomentada pelaimposição de identidades únicas e beliger-antes a pessoas crédulas e é definida porhábeis artesãos do terror”. Baseando-se emsimbologias várias, esses discursos impossi-bilitam a coexistência e o diálogo, aprofundan-do o uso da violência por motivos que acharamna etnia e na religião fundos mais fortes decoesão e mobilização. A perpetuação dos conflitos religiosos na“periferia”, de acordo com MarkJuergensmeyer (Religious radicalism andpolitical violence, 2000), deve-se também aofacto de os combatentes aceitarem a possibil-idade de a vitória ser alcançada apenas nasgerações futuras. Espiritualizando a violência,a religião deu ao terrorismo um poder signi-ficativo, sendo o contrário também verdade. Dão-se, assim, buscas desorientadas, como asencontradas no trabalho de Chaim Kaufmann,por resolução a conflitos já confusos, ou seja:divisões territoriais e a busca pelo domíniodos recursos naturais, por exemplo, sãotransformadas por líderes legitimadores emgenocídios baseados em identidade, na con-cepção dos mobilizados.

Moara Crivelente

O Conceito de Segurança Nacional(2000) e a Doutrina Militar (1993, actualizada em2000), são os documentos fundamentais que reg-ulam as questões militares na Federação Russa.De acordo com o conceito estratégico de segu-rança nacional, a capacidade de dissuasão vaipara além do tradicional enfoque no nuclear, sub-linhando a necessidade de poder militar suficientepara enfrentar qualquer agressão, mas que simul-taneamente não inspire receio nos estados vizin-hos. Reforça ainda a primazia do uso de meios nãomilitares, e a necessidade de flexibilidade deresposta, em particular face a conflitos armadosregionais que possam afectar a segurança russa.Por fim, além da adesão às normas do direitointernacional, sublinha o seu carácter defensivo. Éentendido que o poder nuclear deve ser comple-mentado por outros meios, inovadores e adequa-dos ao novo contexto internacional. Para esteefeito, o reforço das armas convencionais eequipamento tecnologicamente avançado énecessário.

Neste sentido, a revisão da doutrina militarrussa foi iniciada oficiosamente em 2007. Na novaversão, os orçamentos serão robustecidos; man-tém-se a retórica anti-ocidental; e as dicotomiassegurança militar/não-militar, interna/externa,são ultrapassadas com a adopção de um entendi-mento abrangente e holístico de segurança.Contudo, quando o novo documento será oficial-mente adoptado permanece incerto, dada a actualdiscordância entre as elites políticas e militares.

Tradicionalmente, as doutrinas militares são pro-postas pelos militares, e estes estão actualmentea fazer pressão no sentido de adopção do novodocumento. Existe também o procedimento habit-ual de se trabalhar na política de segurança deforma coordenada com a doutrina militar, o quetambém adiciona aos problemas nos meandrosdas elites políticas e militares. Contudo, já emFevereiro de 2007 o então presidente VladimirPutin tinha deixado claro que o projecto estava emestudo. E, na actual situação socio-económica, aelite política não deixará de assegurar a satis-fação dos militares, pelo que as novas medidassão, em ampla escala, essencialmente para con-sumo interno.

Na Cimeira comemorativa dos 60 anos daAliança Atlântica (Abril de 2009), o SecretárioGeral Jaap de Hoop Cheffer deu as boas vindas àAlbânia e Croácia, demonstrando, nas suaspalavras, que “as portas permanecem abertas,um testemunho do compromisso para com umaEuropa livre”. Em Março de 2009, o presidenterusso Dmitry Medvedev avançava com o anúnciode um programa de rearmamento militar, a par deacusações do envolvimento da Organização doTratado do Atlântico Norte (OTAN) no espaço daantiga União Soviética. No alinhamento do con-ceito de política externa de 2008, que reforça aideia de que a “Rússia mantém uma atitude neg-

Nada de novo a leste: rearmamento,remilitarização e reforma militar na Rússia

ESPECIAL - POTÊNCIAS MUNDIAISESPECIAL - POTÊNCIAS MUNDIAIS

D.R.

“…o poder nuclear deve ser comple-mentado por outros meios, inovadorese adequados ao novo contexto interna-

cional.”

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Primeiro-Ministro, “o ex-namorado ciu-mento”, que vai atrás do seu antigo amor, con-trolando a sua vida e o seu futuro, numa brilhantemanifestação de realpolitik. Ou não estivesseainda na nossa lembrança o confronto entre aFederação Russa e a Ucrânia, no que concerne aodesejo deste último estado de aderir à NATO.

E por que razão a Rússia não tem qualquerpudor em fazer uso de uma política externa clara-mente realista? Porque a Europa prefere nemsequer imaginar o “regresso a um conflito envol-vendo uma grande potência e irá até onde for pre-ciso para o evitar” e “nem os Estados Unidosestão desejosos de se voltarem para a Rússia, tãoabsorvidos estão no Médio Oriente”, nas palavrasde Kagan. A própria visita de Hillary Clinton, emMarço de 2009, à Federação Russa (já com Putina desempenhar as funções de Primeiro-Ministro)ficou marcada por uma vontade de “reiniciar” asrelações entre os dois países, numa tentativa delimpar o que fora deixado por George W. Bush nosanteriores mandatos, mesmo apesar da gaffecometida na tradução de uma palavra.

Em suma, Vladimir Putin ficará para sempremarcado como o líder que, enquanto Presidente(Maio de 2000 - Maio de 2008), e enquantoPrimeiro-Ministro (actualmente), conseguiutornar o Estado Russo numa grande potência,após a grave crise que atravessou a todos osníveis, como consequência do colapso do Bloco deLeste. Citando a Professora Raquel Freire, “aRússia parece gradualmente assumir um papel demaior saliência no cenário internacional, comreflexo nas suas políticas crescentementeassertivas e de alinhamentos estratégicos”(Relações Internacionais, 2008). Basicamente,num mundo globalizado, onde a palavra de ordemé “geoeconomia”, o actual Primeiro-MinistroRusso provou que o conceito de “geopolítica” nãoestá morto no panorama das RelaçõesInternacionais e que, pelo contrário, poderárenascer mais forte e eficaz que nunca.

João Augusto Figueiredo

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Quando, em 2001, o então PresidenteRusso Vladimir Putin visitou o Quartel-General daNATO, em Bruxelas, e se referiu a este enquanto“Dum Sovietov” (“Casa dos Sovietes”, tal era aprofusão de antigas repúblicas soviéticas ali pre-sentes), o mundo compreendeu que a Rússia man-tinha uma posição de desconfiança face aoOcidente, em geral, e aos Estados Unidos, em par-ticular.

Desde a implosão da União Soviética que aUnião Europeia tem sido um apetitoso chamarizpara os antigos estados do Pacto de Varsóvia,olhando para aquela instituição como uma luz aofundo do túnel. Os recentes alargamentos têm,contudo, arrastado consigo uma cada vez maior“indigestão” por parte da Federação Russa, deter-minada a manter o seu poderio geopolítico noLeste Europeu. A União Europeia, contudo, sabedisso, razão pela qual opta por uma política exter-na muito cautelosa face ao Estado Russo, optandopor uma abordagem cuja palavra-chave é “coop-eração”. Nas palavras de Robert Kagan, “muitoseuropeus ocidentais já se lamentam de teremtrazido os países de Leste para a União e nãodesejam procurar mais confrontações com aRússia com a admissão de estados como aGeórgia e a Ucrânia”. Além disso, e continuando acitar o referido autor, a Europa sabe que “nãoestá, nem institucional nem temperamentalmente,preparada para entrar no tipo de jogos geopolíti-cos no exterior próximo da Rússia que a Rússia

está desejosa de jogar” (O Regresso daHistória e o Fim dos Sonhos, 2008).

Diz o povo que “não é com vinagre que seapanham moscas”, mas a verdade é que o “vina-gre” pode impedir que as “moscas” cheguem ao“açúcar”. Por outras palavras, enquanto a Europaacena às ex-repúblicas soviéticas com ideias deestabilidade, desenvolvimento, um verdadeiromodelo para o mundo, Putin não hesita em recor-rer a outras formas de poder. Ainda nos está namemória a invasão da Geórgia, o corte dosfornecimentos de gás à Ucrânia e à Moldova, asconstantes ameaças de cessação de fornecimen-to de petróleo, e tantos outros episódios que tãobem caracterizam a vontade da Rússia de se afir-mar no contexto internacional. O mundo precisade gás e de petróleo, e Putin sabe disso. O própriopresidente Sarkozy afirmou num seu discurso, emAgosto de 2007, que “a Rússia está a impor o seuregresso à cena mundial jogando os seus trunfos,nomeadamente petróleo e gás, com uma certabrutalidade”.

Portanto, e vou agora passar a explicar, porque razão denomino Putin como “o ex-namoradociumento”? A resposta é simples: quantos de nósnão assistimos ao fim de uma relação amorosa,onde ambas as partes “litigantes” declaram quevão seguir as suas vidas, apenas para ficarempresos na vida do outro, tentando controlar assuas acções e os próprios gostos? Por já terassistido várias vezes a situações destas, a meuver, a Rússia tem uma acção parecida face aosseus ex-estados satélites. Citando Nicole J.Jackson, “aquando da independência [Russa] emDezembro de 1991, a política externa Russa eracaracterizada por uma dominação unilateral deideias liberais e pró-ocidentais”; além disso,“mesmo antes do colapso da União Soviética,políticos reformistas dominaram o governo daRepública Russa e desposaram os princípios pró-

mercado, característicos da sociedadeocidental”, ainda durante a presidência deGorbachev (Russian Foreign Policy and the CIS,2003). Portanto, após permitir que os ex-satélitesda URSS saíssem da sua área de influência, muitograças à acção de Boris Ieltsin, a FederaçãoRussa tem vindo, agora, a querer controlar os“amores” destes mesmos estados. No fundo, Putinfoi, enquanto Presidente, e é-o, enquanto

Putin: o ex-namorado ciumento?

“…o anúncio feito pelo presi-dente Medvedev com todos os con-tornos retóricos associados, é clara-mente mais uma medida para consumointerno do que um sinal de alarme face

a uma Rússia revisionista…”

“…o anúncio feito pelo presi-dente Medvedev com todos os con-tornos retóricos associados, é clara-mente mais uma medida para consumointerno do que um sinal de alarme face

a uma Rússia revisionista…”

João Figueiredo

D.R.

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Os desafios da Presidência ObamaPÁGINA 10

MUNDUS ESPECIAL - POTÊNCIAS MUNDIAISESPECIAL - POTÊNCIAS MUNDIAIS

A ânsia, de uma intensidade inédita,por uma viragem interna e externa do desempen-ho da Administração norte-americana, que mar-cou todo o segundo mandato de George W. Bush,desaguou numa eleição de altíssimo valor simbóli-co cujo eco planetário foi muito mais fundo do quea simples glamourização holywoodesca da políticaamericana.

No plano interno, esperam-se de Barak Obamaduas coisas essenciais. A primeira é um retorno àcultura de liberdade e de salvaguarda dos direitoscívicos que foi dilacerada pela obsessão hiper-

securitizadora da Administração Bush. À luz dediplomas como o Patriot Act, instalou-se nasociedade norte-americana uma dinâmica deerosão dos direitos e uma cultura de suspeiçãoque legitimou uma inversão de ordem entre o quedevia ser a regra (as liberdades) e o que sesupunha ser excepção (a sua compressão paraatender às necessidades de segurança). O encer-ramento da revisitação bushiana da caça àsbruxas mccarthista (desta vez não como “caçaaos vermelhos” mas na versão mais actualizadade “caça aos terroristas”) é sentida como umimperativo de equilíbrio social pela maioria queelegeu este presidente.

A segunda tarefa interna essencial esperadade Obama é evidentemente a abertura de avenidaspara uma rápida saída da crise económica esocial. Não uma saída qualquer, embora a angús-tia generalizada não advogue juízos demasiada-mente criteriosos sobre a questão. Mas Obama foieleito em nome da urgência de uma alternativa àlonga hegemonia experimentada pelo modelo detrickle-down, ou seja, daquela visão da economiana qual a prioridade é o tratamento favorável dopico da pirâmide social com a expectativa de queisso permita que vá “pingando” alguma riquezapara a base da pirâmide e para as zonas intermé-dias. Esse modelo ruiu em todas as suas

dimensões – da fiscalidade à abrangên-cia (ou falta dela…) dos serviços públicos, desig-nadamente em matéria de saúde e de segurançasocial. A resposta da Adminstração Bush à devas-tação social provocada pelo furacão Katrina, comuma selectividade verdadeiramente darwinistados mais pobres nas políticas públicas de reani-mação do tecido social e com uma onda de priva-tizações oportunista, trouxe à superfície a insus-tentabilidade (para além da injustiça…) deste mod-elo. O que Obama vier a decidir para redinamizara economia dos Estados Unidos para além dainjecção de capital no sector bancário ou no sec-tor automóvel e o que vier a assumir como obri-gação indeclinável de protecção social por partedo Estado será um teste decisivo ao seu empenhoem seguir caminhos alternativos que atendam àfragilidade de camadas sociais cada vez maisamplas.

No plano externo, este arranque da novaAdministração é feito em torno do peso dos sinais.A três níveis. O primeiro é o da respeitabilidadedos Estados Unidos enquanto potência pautadapelo primado da decência na sua acção externa.

Obama deu o melhor dos sinais ao anun-ciar o encerramento de Guantanamo no primeirodia do seu mandato. Todavia, em clara cedência àspressões conservadoras, aquele que criticou osjulgamentos por comissões militares ad hoc como“um rotundo fracasso” decidiu mantê-los e nãoregressar às exigências mínimas de um Estado deDireito. A relutância de uma grande parte dasociedade americana em aceitar a recepção dos

detidos em Guantanamo nos estabelecimentos pri-sionais dos Estados Unidos e as declarações decomplacência do director da CIA relativamente àspráticas de tortura legitimadas pela anteriorAdministração indiciam retrocessos críticos emrelação à ruptura necessária com o afundamentodo país na depreciação dos direitos humanoscomo seu princípio de política. As atitudes que

tomar em relação ao TPI e à Comissão deDireitos Humanos da ONU serão testes igualmentedecisivos.

O segundo nível é o da aposta no multilateral-ismo como abordagem dos grandes desafiosglobais. No combate às alterações climáticascomo no comércio internacional ou no relaciona-mento regional (por exemplo no quadro do conti-nente americano no seu todo), Obama parece darsinais de enveredar por um assumido corte com ounilateralismo isolacionista do seu antecessor. Aseguir com toda a atenção.

Last but not the least, a paz e a guerra. Obamafoi eleito em nome do fim da guerra contra oIraque, como expressão maior de uma estratégiade espasmo imperial seguida por Bush. A retiradado Iraque prevê-se lenta e turbulenta. E se Bush seperdeu nas areias do Iraque, Obama pode perder-se nas montanhas do Afeganistão. O investimentoda nova Adminstração no pacote AfPak(Afeganistão e Paquistão), na perspectiva dedesenvolver uma guerra preventiva de outro tipocontra a Al Qaeda está a mostrar preocupantesfragilidades. As duas linhas principais do plano –reforço do contingente militar no terreno e nego-ciação de alianças com sectores moderados dostaliban – estão ambas a mostrar-se ineficazes. Aprimeira porque, desde há três anos, se vem evi-denciando uma correlação inesperada entreaumento do número de tropas e aumento da insta-bilidade e da violência. A segunda porque as lider-anças locais e grupais revelam uma extrema volu-bilidade, mudando de aliados preferenciais aosabor de vantagens materiais momentâneas, nãodando qualquer garantia de estabilidade numarelação de alinhamento negociada.

A ânsia generalizada por uma mudança fundanas políticas domésticas e internacionais dosEstados Unidos foi, ela mesma, o mais forte dossinais. Obama não pode defraudar essa expectati-va no altar do business as usual, ainda que o venhaa disfarçar com uma retórica sedutora. É o mundo,e não só os Estados Unidos, que o requer.

José Manuel Pureza

“Obama não pode defraudar essaexpectativa no altar do business as usual,ainda que o venha a disfarçar com umaretórica sedutora. É o mundo, e não só os

Estados Unidos, que o requer.”

“As duas linhas principais doplano [o pacote AfPak]– reforço do contin-gente militar no terreno e negociação de

alianças com sectores moderados dos taliban– estão ambas a mostrar-se ineficazes.”

D.R.

D.R.

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Dois anos e dois dias após ter nasci-do, aconteceu um dos acontecimentos mais mar-cantes do século XX. A 9 Novembro de 1989 o Murode Berlim era derrubado, contudo só alguns anosmais tarde, compreendi exactamente o que setinha passado naquele dia e a dimensão históricaassociada a este.

Hoje pretendo reflectir sobre o impacto daqueda do Muro de Berlim na Europa, especialmentea sua influência na futura entidade supranacionalque se tornou a União Europeia. Agora felizmentepara todos os cidadãos europeus, passados vinteanos, vivemos numa Europa sem divisões, sem os“jogos de poder” das duas superpotências daGuerra Fria. A União Europeia (UE) tem actual-mente vinte e sete Estados-membros e estende-seao longo do “velho continente”. Porém, devemo-nos questionar sobre como estaríamos a viverhoje, se naquele dia aquele Muro em Berlim nãotivesse sido derrubado. Como é que a UE e, tam-bém a ordem internacional, estariam instituídasneste momento?

Há 20 anos atrás…Nas transmissões televisivas da época viram-

se os festejos e os sorrisos dos habitantes deBerlim que finalmente puderam encontrar, famil-iares, amigos, conhecidos etc. que outroraestavam separados por uma parede e aramefarpado, mas naquela noite tornaram-se todos“vizinhos do lado”. As demonstrações de afectovisíveis indicavam que todos eles acreditavam queo futuro daí em diante teria de ser obviamenteuma ruptura com o passado. O Muro caiu! Estaexpressão orgulhosamente celebrada por alemãese europeus iria permitir à UE e à Alemanha tornar-se no que é hoje.

Em cima do muro centenas de alemães cele-bravam efusivamente a mensagem de GünterSchabowski que permitia aos alemães passaremlivremente e sem visto as fronteiras. Diziam osalemães que agora eram o povo mais feliz domundo. Todavia nunca se esquecendo dos terríveisdados apontados pelo Centro de Pesquisa deHistória Contemporânea, segundo o qual 134 víti-mas, 99 das quais assassinadas, morreram aotentarem atravessar a parede de betão e aramefarpado que separava a parte Oriental daOcidental ao longo dos seus 38 anos de existência.Alemanha Ocidental e Oriental estiveram sepa-radas pelo Muro desde 1961, mas naquela noiteimpulsionou-se o processo de reunificação daAlemanha, processo que acabaria por ser dadocomo oficialmente concluído a 3 de Outubro de1990. A divisão da Alemanha dissolvia-se, sendocriada a unificada República Federal da Alemanha.

Deste modo, iniciava-se uma nova era para aEuropa. Tal como a Alemanha, a UE uniu-se emvolta dos valores democráticos, reconhecendo asdiferenças, respeitando as várias culturas,cooperando na ajuda a quem precisa. Afinal esta-va-se a fazer jus ao lema europeu, “Unidos naDiversidade” que haveria de ser escolhido no ano2000.

A construção europeia após 1989, para-lelismos com a reunificação alemã

Desde 1989 ocorreram três dos seis alarga-mentos. No momento da queda da “Cortina deFerro” a Comunidade Europeia era composta pordoze membros que defendiam em conjunto a paz ea segurança no espaço europeu, e desde 1951 asmatérias-primas outrora utilizadas na guerra

eram agora objecto de cooperação eunião entre os Estados-membros. Após a queda doMuro de Berlim, a Europa deixa de estar dividida eimediatamente, a Comunidade Europeia tentaalargar o seu espírito de união, agindo cada vezmais numa esfera colectiva em cada vez maismatérias, o seu objectivo era difundir o espírito deunião a todos os níveis: económico, político, sociale judicial. Tal como aconteceu com a Alemanha, aUE optou por reunificar o Ocidente com o Lestenum ambiente marcado pelo progresso económicoe social. A UE não podia ficar centrada unicamenteno Ocidente e começou, aos poucos e poucos, aintegrar os países da Europa Central e Oriental.

Se observarmos a cronologia da construçãoeuropeia podemos denotar que depois de 1989começa a constituir-se uma identidade europeiacada vez mais ambiciosa. É na década de 90 que aUE atinge os seus grandes sucessos institucionaise que a levaram a tornar-se numa grande potên-cia mundial a vários níveis. Com a queda do Murode Berlim e a consequente reunificação alemã,toda a situação política na Europa se transforma.Igualmente neste período após sucessivas políti-cas Alemanha vai transformando-se numa grandepotência internacional.

Logo em Dezembro de 1991, o ConselhoEuropeu adopta um dos tratados históricos, noqual estariam estabelecidas as linhas orientado-ras de uma política externa e de segurançacomum, fomentava-se o aumento da cooperação

nos assuntos internos e judiciais, bem como a for-mação de uma união económica monetária, da qualse previa a possibilidade de uma moeda única paratodos os membros. Estavam assim criadas asprincipais bases da União Europeia, instituída peloTratado de Maastricht.

Com este tratado, previa-se um mercadoúnico, o primeiro grande passo para tornar a UEum gigante económico. Com isto, a partir deJaneiro de 1993, havia um espaço de livre concor-rência capaz de assegurar às empresas dosEstados membros um lugar de destaque nos mer-cados mundiais. Foi este o primeiro passo parafomentar o crescimento de várias entidadesnacionais e multinacionais no espaço europeu e,estes ganhos também eram repercutidos a nívelsocial, pois assim ao melhorar a condiçãoeconómica das entidades empregadoras, estaspoderiam apostar na melhoria das condições soci-ais dos seus trabalhadores.

Pode traçar-se também uma certa simetriaentre o Tratado de Maastricht e o Acordo Oficialpara a Reunificação Alemã. O primeiro estabeleciaas directrizes europeias e como funcionaria aUnião, principalmente em matérias económicas. O

segundo permitiu, tal como Maastricht,desenvolver a união entre dois Estados, até entãoseparados, mas que em conjunto e fundidos numsó obtiveram um grande crescimento económicoque permitiu um claro desenvolvimento social.Hoje a UE é a terceira potência económica mundi-al e a Alemanha é uma das principais potênciaseconómicas na Europa e ambas tem grandes pre-ocupações sociais para com os seus habitantes.

Pouco tempo depois a UE passava a contarcom quinze membros. Este alargamento assemel-ha-se às políticas alemãs no período pós-reunifi-cação. A Alemanha um pouco a medo apostavanuma política de normalização, desenvolvendo-se,igualmente como a UE, em termos económicos,mas sendo consideradas pouco ambiciosas emtermos políticos.

Em 2004 ocorre um alargamento histórico naconstrução europeia. A UE e a Alemanha, nestafase, desejavam ser consideradas potênciassimultaneamente económicas e políticas. Oprocesso de crescimento alemão requereuesforços e não foi um processo brusco, foi levan-do tempo como o processo de adesão destes dezmembros, que se iniciou em 1998 e, neste mesmoano, Gerhard Schroder tornava-se ChancelerAlemão. O programa político europeu e alemãoeram ambiciosos. A UE preparava-se para ter amoeda única a circular pelos seus Estados-mem-bros. A Alemanha tenta projectar-se interna-cionalmente e tornar-se numa “civilian power”.

Foram os alargamentos de 2004 e 2007 achave do sucesso para o futuro da EU porque final-mente se alargaria a quase todo o espaço do con-tinente europeu, espalhando os valores da democ-racia por estes territórios anteriormente domina-dos pelo poder soviético e pelo autoritarismo doPacto de Varsóvia. Para os candidatos a membropoderiam ver internamente consolidados os val-ores democráticos e aspirar a um crescimentoeconómico que nunca conseguiriam obter deforma isolada. De forma igual a Alemanha contoucom o apoio dos Aliados que orientavam em con-junto a Alemanha Ocidental.

Sem dúvida nenhuma que a queda da “Cortinade Ferro” contribuiu para que a União Europeia e,também particularmente a Alemanha, obtivessemo sucesso no campo social, económico e políticodurante toda a década de 1990 e nos inícios doséculo XXI. Em 2004 a UE, apostando na diversi-dade cultural, alcança um alargamento históricocom dez países a entrarem de uma vez só, e pos-teriormente concluído em 2007 com a adesão daBulgária e da Roménia alcançando um universo de500 milhões de cidadãos. Também a Alemanha eracada vez mais preponderante nas políticaseuropeias, fruto da sua numerosa população.

Ultrapassando os desafios, vencendo osreceios

Muitos esperavam que este alargamento fossecriar muitos problemas para a UE, pois seria umrisco incorporar todos estes países do Centro eLeste Europeu, sendo a sua situação interna vistacomo sinónimo de instabilidade podendo perturbara ordem institucional comunitária. Contudo, hojepodemos afirmar que este desafio permitiu umreforço claro da posição global da UE, poisalargou-se o espaço comunitário ao longo da faixade “território em transição”, após deixarem deestar sob influência soviética. Em termoseconómicos e políticos estes países demon-

straram um enorme esforço paracumprir com todos os requisitos colocados parauma adesão.

A UE necessitava de abandonar o cliché de sero “clube de Estados” do Ocidente Europeu, o seufuturo passava por alargar o seu território,abranger toda aquela população, que ansiava portornar-se, finalmente, reconhecida comoeuropeia. Alargar o fomento da democracia e dapaz e aumentar a diversidade cultural por todo ocontinente Europeu foi a aposta ideal para agoraestarmos a viver numa UE adequada para o sécu-lo XXI. Ajudar e integrar estes países permitiuaumentar a voz da UE externamente, com os 27membros a UE, representa quase toda a Europa,uma Europa transversal que se estende doMediterrâneo ao Báltico e da Suécia até ao Chipre.

Hoje estamos perante uma União que se querpreparada para a realidade do século XXI, onde emLisboa, no ano 2000, elaborou uma nova estraté-gia de fomento de emprego, modernização deeconomia e uma rede de coesão social. Vivemosnuma Europa baseada no conhecimento.

Com o Tratado de Lisboa, em 2007, deseja-sedar uma maior projecção internacional à UE, comos Estados-membros a falarem externamente auma só voz, pois ainda há quem descreva que a UEcomo um anão no aspecto político. Há então umavontade muito grande de contrariar esta opinião edemonstrar, com este Tratado, que a UE é umapotência mundial em todos os campos: económico,político e social.

A UE, neste momento, como fez há vinte anosatrás, tenta desafiar mais uma vez os seus limitesgeográficos e políticos, agora que não existemtantas barreiras na Europa como havia até 1989 e,onde os Estados se apercebem cada vez mais quetem de agir colectivamente na União, pois sóassim conseguirão atingir os seus objectivos. A UEparece “não fechar as portas” a novos alarga-mentos a Ocidente, onde Croácia, Turquia e aAntiga República Jugoslava da Macedónia já sãomesmo candidatos a membros da UE enquanto aAlbânia, a Bósnia e Herzegovina, Kosovo,Montenegro e Sérvia são potenciais candidatos.

Todos estes países são um dos desafios para ofuturo da UE, esta continua a apostar forte no seuenvolvimento com a Europa Oriental. Por um ladoprocura a estabilização dos Balcãs Ocidentais,apoiando financeiramente estes países para queobtenham as condições necessárias para integrara Comunidade Europeia. Por outro lado procura,através da política de vizinhança, manter relaçõesde cooperação com aqueles que não podem serconsiderados, para já candidatos. Esta cooper-ação tem sido dividida ora para Sul com os paísesDo Norte de Africa, ora para Oriente com relaçõesprivilegiadas com os países do Cáucaso. Destemodo, a UE pretende maximizar este ideal do seulema através das relações com os países vizinhose fomentando a cooperação, justificando assim acriação de uma Parceria Oriental, anunciada narecente Cimeira UE-Rússia 2009, apoiando a pros-peridade e a estabilidade regional. Esta parceriademonstra que, apesar das tensões relativas aofornecimento de energia entre Rússia e UE,incluindo também a Ucrânia, os países do Cáucasopodem contar com o apoio da UE.

João Ferreira

20 Anos de União Europeia após a queda da “Cortina de Ferro”

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D.R.

Page 12: New MUNDUS - Universidade de Coimbra · 2018. 6. 12. · tos, a captura do “cabecilha” dos LTTE é o princi-pal troféu para o exército cingalês. Tenhamos a noção de que a

balança comercial da União Europeia (UE)com a RPC, é exemplo disso, sendo a indústria têx-til e de vestuário uma das mais afectadas.Terceira economia mundial e o maior produtor detêxtil e vestuário desde 1994, a China é o maiorfornecedor de têxteis da UE.

O mercado mundial do têxtil e vestuário eraregulado por acordos internacionais que contrari-avam os princípios do sistema multilateral,nomeadamente o Short Term ArrangementRegarding Cotton Textiles e o Long TermAgreement Regarding International Trade inCotton Textiles, assinado em 1962 sob os auspíciosdo GATT, impondo limitações ao comércio do algo-dão. Renegociado várias vezes, este acordo foisubstituído em 1974 pelo Acordo Multi-Fibras(AMF), que estendeu as restrições de comércio àlã e às fibras sintéticas. O AMF contrariava osprincípios do GATT por várias razões: 1) violava oprincípio da nação mais favorecida; 2) estabeleciarestrições quantitativas em vez de tarifárias; 3)discriminava contra países em desenvolvimento;4) não era um acordo transparente. Renegociadopor quatro vezes, o AMF expirou em 1994, dandolugar ao Acordo sobre os Têxteis e Vestuário, queentrou em vigor com o estabelecimento da OMCem 1995, estabelecendo um regime transitórioentre o AMF e a integração plena dos têxteis e ves-tuário no sistema multilateral. O período de dezanos previsto neste acordo para a transição, emvez de dar lugar a uma abertura gradual dos mer-cados, permitiu que quase metade dos produtosdeste sector mantivessem quotas restritivas

A China (na altura República da China)foi um dos 23 países signatários do GATT (AcordoGeral sobre Pautas Aduaneiras e Comércio) em1948. Disputava-se então em território chinês aguerra civil entre nacionalistas, no poder, e comu-nistas. Com a vitória destes e a instauração daRepública Popular da China (RPC) em 1949, aRepública da China, liderada pelos nacionalistas,refugiou-se na ilha de Taiwan. Pouco depois, Taipé,na altura o legítimo representante da China aosolhos dos países ocidentais, anunciou a saída daRepública da China do GATT. No entanto, a partir de1971, a RPC passou a representar a China nasNações Unidas em detrimento de Taiwan e, em1986, no âmbito da política de abertura ao exteri-or introduzida por Deng Xiaoping, pediu formal-mente para entrar no GATT.

A adesão da RPC ao GATT envolvia problemaspolíticos, já que esta fazia duas reivindicações: queo estatuto da China, enquanto membro fundadordo GATT, não fosse afectado pela retirada deTaiwan em 1950; e que as negociações para aentrada de Taipé não fossem concluídas antes da

entrada de Pequim. Além disso, do ponto de vistaeconómico, tornava-se contraditório integrar umpaís comunista numa instituição vocacionada paraeconomias de mercado. O diálogo foi suspenso emvárias ocasiões e as negociações para adesão daRPC ao GATT e, desde 1995, à OMC, prolongaram-se durante quinze anos. Ao longo deste processo,a China demonstrou várias vezes estar disposta afazer cedências, nomeadamente em Novembro de1999, aquando da assinatura de um acordo

comercial bilateral com os EstadosUnidos, passo decisivo para obter o apoio ameri-cano para conclusão das negociações. Assim, a 11de Dezembro de 2001, a RPC tornou-se no 143ºmembro da Organização.

A adesão de um país à OMC baseia-se em trêspilares: concessões no acesso ao mercado dasmercadorias e serviços; cumprimento das regrasda organização; e implementação do acordo. Emrelação aos dois primeiros pilares, Pequim com-prometeu-se a eliminar gradualmente os obstácu-los ao livre comércio. O cumprimento do terceiropilar tem levantado mais preocupações, devido àscaracterísticas específicas do regime e do merca-do chinês, e à dimensão das alterações a imple-mentar. Estas alterações, indispensáveis pararespeitar a legislação e princípios da OMC, têmtido um impacto bastante negativo na China, pois asupressão das barreiras alfandegárias ameaçamuitas das suas empresas estatais. Muitas destasempresas são mantidas artificialmente peloGoverno chinês por forma a evitar a escalada dodesemprego e prevenir eventuais manifestaçõesde descontentamento, numa sociedade em que osistema de segurança social não está autonomiza-do das entidades patronais.

Não obstante as desvantagens que a adesão àOMC lhe trouxe do ponto de vista interno, a Chinaé o país em desenvolvimento que mais beneficia daliberalização do comércio, já que a maioria dassuas exportações são produtos manufacturados,enquanto que os outros exportam sobretudomatérias primas e produtos primários, sujeitos atarifas mais elevadas. A entrada na OMC tem-lhepermitido atrair mais Investimento DirectoEstrangeiro, uma vez que a uniformização dos pro-cedimentos jurídicos gera um clima de maior con-fiança aos investidores, e tem-lhe facilitado aentrada noutros mercados. O desequilíbrio da

até 1 de Janeiro 2005.O fim de quarenta anos de proteccionismo

abriu as portas ao declínio estrutural da indústriatêxtil e de vestuário na UE, Estados Unidos eCanadá. Em Portugal, este foi o sector que maissofreu com a entrada da China na OMC, a par dossectores do calçado e de componentes paraautomóveis e artigos eléctricos e electrónicos.Todas estas indústrias recorrem a mão-de-obraintensiva e ao fabrico em série, sendo directa-mente ameaçadas por produtos provenientes deum país que impõe salários e direitos sociais

muito inferiores aos praticados na UE. O sistemamultilateral não foi concebido a pensar na ascen-são da China; convém não esquecer que o períodotransitório para a liberalização dos têxteis foiacordado em 1994 e a RPC só entrou na OMC em2001. Os Estados-membros da Organizaçãoacabaram por decidir integrar Pequim no sistema,com o intuito de forçar os dirigentes chineses arespeitar as normas internacionais e prevendo umimpacto positivo geral a longo prazo, nomeada-mente o crescimento do Produto Interno Brutomundial. Mas este processo trouxe à Europamuitos custos a curto prazo. O impacto negativona indústria têxtil é, apenas, um exemplo.

Carmen Amado Mendes

A Entrada da China na Organização Mundial do ComércioPÁGINA 12

MUNDUS ESPECIAL - POTÊNCIAS MUNDIAISESPECIAL - POTÊNCIAS MUNDIAIS

“...do ponto de vista económico,tornava-se contraditório integrar um país

comunista numa instituição vocacionada paraeconomias de mercado.”

“O cumprimento […] [da imple-mentação] tem levantado mais preocupações,devido às características específicas doregime e do mercado chinês, e à dimensão

das alterações a implementar”"

“O sistema multilateral não foiconcebido a pensar na ascensão da China […]o período transitório para a liberalização dostêxteis foi acordado em 1994 e a RPC só

entrou na OMC em 2001.”

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ais.Durante a última vintena de anos parecia que

a maior parte das fronteiras deixara de existir. Ospaíses da OCDE foram permissivos com a entradade mão-de-obra barata e os fluxos migratórios

foram intensificando-se ao longo do tempo semninguém saber muito bem onde se encontra osinal de STOP!

Actualmente o El Dorado consegue ver-separa lá de muros de 5metros de altura, aramefarpado e patrulhados pelo exército: esta é a real-idade onde a os fluxos migratórios são impos-síveis de calcular, como por exemplo México-EUAou Magrebe-Espanha.

Sinceramente não sei onde é a fronteira eespero nunca ter de a atravessar pois parece difí-cil como o diabo.

Celso Simões

PÁGINA 14MUNDUS SOCIEDADESOCIEDADE

Portugal - MUN 2008 - Universidade do MinhoComo qualquer outra simulação, o Portugal

Model of United Nations, tem o mérito de con-seguir juntar um sem número de participantesque, de uma forma altamente pedagógica, podemusufruir de uma experiência única, no âmbito datemática do evento. Na área da Ciência Política edas Relações Internacionais, este tipo de simu-lações e organizações, ganha ainda maiorrelevância e importância, pois permite aos estu-

dantes, colocar os conhecimentos adquiridos noâmbito das suas unidades curriculares, em práti-ca. Ao mesmo tempo, os participantes tomamconsciência, através da proximidade com umarealidade muito mais “palpável”, do modo comofuncionam os organismos da instituição que asimulação pretende “experimentar”.

Mas a riqueza do PT MUN não se limita à apli-cação de saberes ou a um conhecimento mais

aprofundado da instituição “Nações

Unidas”. Esta simulação assume umcarácter muito maior e mais abrangente, por setratar de um evento singular, realizado em espaçonacional e aberto a todos aqueles que nele quis-erem participar. O PT MUN é um espaço onde atroca de opiniões, experiências, conhecimento e ocontacto com os outros se assume como uma dassuas grandes características, a nosso ver, umacaracterística bastante importante. É este con-tacto e a possibilidade de unir estudantes de todoo país num único “fórum”, que torna este espaçotão rico e possibilita, no final da sua realização,que todos os responsáveis pela sua organização eparticipantes do mesmo, se sintam mais “cresci-dos”, mais conhecedores, mais sabedores e maisconscientes da importância que este tipo de

experiências tem na nossa formação.Para concluir, queremos dizer ainda, que o PT

MUN 2008 foi especial para a Universidade doMinho e para o CECRI (Centro de Estudos do Cursode Relações Internacionais da Universidade doMinho), assim como para o curso de RelaçõesInternacionais, porque trouxe, pela primeira vez, arealização deste evento para o Minho. Aliás,podemos dizer que ao nível do CECRI, se tratou doprimeiro grande evento que a nossa direcção(eleita para exercer durante um ano) teve de orga-nizar. Foi importante, também, porque permitiuuma maior descentralização na forma como esteevento se estrutura ou organiza, atraindo para si,públicos que de outro modo não estariam tãoabertos à participação no mesmo. A verdade é

que o PT MUN 2008 se revelou um suces-so, aliás, como todos o esperávamos, demonstran-do a necessidade de continuar a apostar neste tipode projectos.

Cabe agora ás gerações futuras (porque nóssomos finalistas), tomarem em suas mãos todoeste fórum de oportunidades e conhecimentos,para que, especialmente, na área da CiênciaPolítica e das Relações Internacionais se consigadesenvolver uma cooperação e convivência inter-universitária ainda maior.

Saudações AcadémicasFrancisco Dias Ferreira e

Licínia Alves

Trabalho num supermercado e tenhovisto nos últimos anos com interesse uma gradualevolução nas pessoas que imigraram para o nossoPortugal. Antigamente só via homens com as mãosgastas e calças ainda com borras de cimento,

acabados de sair das obras a comprar bens deprimeira necessidade – leia-se todos os génerosde álcool. À noite iam sempre ao caixote do lixo daloja (lugar hoje dominado pela etnia cigana) ver oque era deitado fora porque tudo se recupera e areciclagem começa nos desperdícios alimentares.

Actualmente atendo as famílias destes nossosimigrantes. São as esposas que vieram a medomas agora falam fluentemente a nossa língua eocupam qualquer posição pois são multi-fun-cionais. Os filhos que frequentam as nossas esco-las e que são melhores alunos da sua turma. E sãoos patriarcas, que lutaram para que a sua famíliativesse uma oportunidade num lugar melhor.

Todos os anos milhões de pessoas atravessamuma linha fronteiriça que divide a desilusão da

esperança. Acontece um pouco por todoo mundo e estes movimentos migratórios foramum dos motores do crescimento económicomundial nas últimas décadas.

Estes homens e mulheres que tiveram a cor-agem – ou a necessidade – de deixar uma vidapara trás começam a ser alvo de retaliações nospaíses que os acolheram. O elevado desemprego eo degradar das condições sociais levam a que aspessoas se revoltem contra quem lhe roubou oemprego, “quem é estrangeiro e não mereceestar neste país”. Parece incrível como emsociedades supostamente modernas, no séc. XXIconsegue existir tal xenofobismo e desprezo.

The BorderMuito do trabalho que os imigrantes ocu-

param nos países desenvolvidos foram essencial-mente posições que os residentes nacionaisacham “indesejáveis” e para o bem e para o mal,estas pessoas ajudaram imensas economias aconstruírem-se a si próprias.

Claro que o movimento de xenofobismo e dis-criminação parte da mesma necessidade que fezos imigrantes serem-no – necessidade de sobre-vivência. A globalização abraçou a imigraçãocomo parte integrante de um enorme processo deconstrução económica e social, e agora quesofreu uma gripe as sociedades têm de se vacinarcontra os perigos epidémicos financeiros e soci-

“A globalização abraçou a imi-gração como parte integrante de um enormeprocesso de construção económica e social, eagora que sofreu uma gripe as sociedadestêm de se vacinar contra os perigos epidémi-

cos financeiros e sociais.”

“Todos os anos milhões de pessoas atrav-essam uma linha fronteiriça que divide a

desilusão da esperança. Acontece um poucopor todo o mundo e estes movimentos

migratórios foram um dos motores do cresci-mento económico mundial nas últimas

décadas.”

“É este contacto e a possibilidadede unir estudantes de todo o país num único“fórum”, que torna este espaço tão rico epossibilita, no final da sua realização, que

todos os responsáveis pela sua organização eparticipantes do mesmo, se sintam mais“crescidos”, mais conhecedores, mais

sabedores e mais conscientes da importânciaque este tipo de experiências tem na nossa

formação.”

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Boato é título do primeiro álbum ao vivode JP Simões e foi gravado em Novembro do anopassado.Numa espécie de antologia da carreira do músico,reúne registos dos Belle Chase Hotel, Quinteto Tati,do projecto Ópera do Falhado e do disco de estreiaa solo 1970, aos quais ainda se juntam 12 temasinéditos. JP Simões justifica esta junção como umaforma de transição para algo completamentediferente que, diz, anseia fazer em breve.O álbum conta ainda com as colaborações deLuanda Cozetti (dos Couple Coffe) num dueto e deManuel João Vieira numa faixa extra, e claro, dohabitual parceiro Sérgio Costa no piano.Disco editado e primeiro single em rotação: SeanRiley & The Slowriders apresentam Only TimeWill Tell, o segundo álbum, com Houses and Wivescomo apresentação.Depois do inspirado álbum de estreia Farewell em2007, os Coimbrenses Sean Riley & The Slowridersregressam diferentes mas não irreconhecíveis,

CULTURACULTURA

M Ú S C A

Leituras...como a história do “match au noir” ou do

“buveur menteur”) e com deliciosas reflexõesfilosóficas que fazem suspender a respiração(como a que é feita relativamente a Alexandria – p.170, Editora: “livres de poche”). Tudo com o objec-tivo primordial de demonstrar como o algodão,desde que despertou o interesse de Alexandre oGrande, move o mundo e é movido por ele. Umaexcelente forma de fazer ver ao leitor o que é amundialização (fenómeno mais antigo do queparece!) e as implicações que esta tem. ErikOrsenna mostra de forma subtil o carácter para-digmático de um mundo cada vez mais movido pelo“salivar capitalista”. Fios de aranha que melhorama qualidade do algodão ou propriedades dasmedusas que detectam a presença de explosivossão o expoente máximo de uma tecnologia “global-izada” que pode contribuir para a construção deum mundo melhor. Porém, outra realidade é tam-bém salientada pelo autor. A degradação ambien-tal inerente ao “crescimento”, como é o caso domar de Aral (descrito na viagem ao Uzbequistão).Uma visão de carros e camiões enquanto pessoas(EUA e Mali), ou temor das mulheres Tatares deKazan, às quais nenhum francês escapa, fazemdeste livro um “must-read”, uma obra-prima dosnossos tempos engrandecida pela genialidade comque os instrumentos descritivos são utilizados.

Pedro Godinho

Umaviagem aospaíses doalgodão naspalavras deErik Orsenna

com novos sons e especialmente com aincorporação de um novo elemento na banda – obaterista Filipe Rocha. Releva neste álbum umaexpansão da banda e dos seus sons que incorpo-ra um formato mais rock, sem nunca perder devista o country e o blues tipicamente norte-amer-icanos.O novo registo conta com vários convidados,entre eles Pedro Vidal, Filipa Cortesão, FaithGospel Choir e Paulo Furtado, vocalista dosWraygunn.O’QueStrada, o grupo de João Lima (guitarraportuguesa), Pablo (contra-bacia), Zeto Feijão(guitarra e voz), Miranda (voz) e Donatello Brida(acordeão), tem finalmente nas lojas o seu esper-ado album de estreia – Tasca Beat (O SonhoPortuguês). Formados há já sete anos em Almada, é precisa-mente há sete anos que andam a espalhar a festapor onde passam. Com pedaços de braguesas,cavaquinhos, acordeões, metais, folclore, tango,música de romaria, fado ao desafio, canções emportuguês, brasileiro, crioulo, espanhol, francês einglês, criam uma música miscigenada apelidada(talvez de forma diminuta) de fado dos subúrbios. A consagração de um dos grupos mais comunica-tivos da história da música em Portugal.

Catarina Faria

Ao depararmo-nos pela primeira vez com otítulo da obra “Voyages aux pays du Cotton”, apergunta é legítima: “Que interesse terá estelivro?”. Basta começar a ler para que a pergun-ta encontre uma resposta imediata: apaixonante.Erik Orsenna consegue cativar o mais céptico dosleitores através de uma visão absolutamenteoriginal do mundo em que vivemos, conduzida poruma simples (todavia complexa!) viagem aosprincipais países produtores de algodão. O leitorfaz simultaneamente uma viagem no tempo e umaviagem a realidades totalmente diferentes envol-vendo uma única matéria-prima, o algodão, ou o“ouro branco” como frequentemente é apelidadona obra. Matéria-prima que, podendo já não o serhoje em dia devido a profundas manipulaçõesgenéticas, continua a mover os 5 continentes(contando América do Sul e América do Nortecomo dois, como refere Orsenna) e a sustentarmilhões de seres humanos. Uma obra densa ecompleta, repleta de referências históricas emitológicas, bem como excelentes instrumentosdescritivos da realidade actual das regiões per-corridas. Uma visão extraordinária do multicul-turalismo patente em cada uma das sociedadesem que o algodão é sempre “o melhor do mundo”.Passando pelos “aprendizes de camionista” noMali, pelos viajantes no Brasil, pela “cidade dasmeias” na China (Datang), ou pelo pequeno aglom-erado populacional de White Face nos EstadosUnidos, o leitor é confrontado com pequenashistórias excelentes (por vezes hilariantes(!)),

IRoteiro Musical de

VerãoFestivais de Verão, o ano 2009 prom-ete!!!Em Oeiras, mais propriamente no PasseioMarítimo de Algés, no dia 9 de Julho vão-seecoar os “riffs metaleiros” de bandas comoMetallica, Slipknot ou Machine Head. Nosrestantes dias o cartaz marca-se pela diversi-dade contando com os Placebo que regres-sam a Portugal para apresentar o seu novoálbum. Para animação da noite vão tambémcontribuir os Prodigy. No último dia do Aliveespera-se muito dos Dave Matthews Band,que já prometeram não desiludir os fãs poden-do chegar a actuar mais que duas horas emeia. Vão partilhar ainda o palco com ChrisCornell, ex-SoundGarden e vocalista dosAudioslave, e também pelos muito empol-gantes Black Eyed Peas. Destaque tambémpara o Palco Super Bock que irá contar aolongo destes três dias com os TV On TheRadio, Crystal Castles, The Tings Tings ouLos Campesinos!. Dias depois arranca o Super Bock Super Rockno Porto e em Lisboa e onde os festivaleirosvão poder ver e ouvir Depeche Mode, Duffy,The Killers, Mando Diao, Nouvelle Vagueentre outros. Em Lisboa o palco será noEstádio do Restelo e na invicta será no Estádiodo Bessa. Rumo ao Norte, entre 16 e 18 de Julho em Gaiarealiza-se mais uma vez o Marés Vivas que naedição deste ano deslumbra com Guano Apes,Kaiser Chiefs, Lamb, Jason Mraz, Keane eScorpions.Entre finais de Julho e inícios de Agosto, asrotas podem convergir entre o Minho e a planí-cie alentejana. Nas margens do Tabuãodecorre o Festival Paredes de Coura que játem confirmada a presença no dia 29 de JulhoPatrick Wolf, e um dia depois, oriundos deGlasgow, actuam os Franz Ferdinand que divi-dem o palco com os Supergrass. Nos dias demúsica em Coura espera-se o aguardado con-certo de Nine Inch Nails e Peaches e BlodRed Shoes. Recentemente foi anunciadoJarvis Cocker e Howling Bells no dia 1 deAgosto.Já na Zambujeira do Mar, vão apresentar-selogo no dia 6 os The National. Madcon no diaseguinte e por fim Lily Allen e Basement Jaxxno dia 9 de Agosto. Para concluir o calendáriofestivaleiro temos a ressuscitação do Festivalda Ilha do Ermal, que no regresso tambémaposta numas datas de Inverno.Com tanta variedade e qualidade, resta aosestudantes que depois dos exames comecem acontar os trocos, pôr a mochila a costa etraçar o destino no mapa de grandes nomes

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