NEUROCISTICERCOSE: FORMA PSÍQUICA E DEMÊNCIA · A282n Neurocisticercose: forma psíquica e...

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MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO UNIVERSIDADE FEDERAL DE GOIÁS INSTITUTO DE PATOLOGIA TROPICAL E SAÚDE PÚBLICA ALUSKA CRUVINEL AGUIAR NEUROCISTICERCOSE: FORMA PSÍQUICA E DEMÊNCIA ORIENTADOR: Prof Dr. Leonardo Ferreira Caixeta DISSERTAÇÃO DE MESTRADO Goiânia- GO, 2007

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  • MINISTRIO DA EDUCAO UNIVERSIDADE FEDERAL DE GOIS INSTITUTO DE PATOLOGIA TROPICAL E SADE PBLICA ALUSKA CRUVINEL AGUIAR

    NEUROCISTICERCOSE: FORMA PSQUICA E DEMNCIA ORIENTADOR: Prof Dr. Leonardo Ferreira Caixeta

    DISSERTAO DE MESTRADO Goinia- GO, 2007

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    UNIVERSIDADE FEDERAL DE GOIS INSTITUTO DE PATOLOGIA TROPICAL E SADE PBLICA PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM MEDICINA TROPICAL

    ALUSKA CRUVINEL AGUIAR

    NEUROCISTICERCOSE: FORMA PSQUICA E DEMNCIA

    ORIENTADOR: Prof Dr. Leonardo Ferreira Caixeta

    Dissertao apresentada ao programa de ps-graduao de Medicina Tropical e Sade Pblica da Universidade Federal de Gois, como requisito parcial obteno do grau de mestre em Medicina Tropical, na rea de concentrao: Doenas Infecto- Parasitrias Esse trabalho no recebeu auxlio financeiro

    Goinia-GO, 2007

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    Dados Internacionais de Catalogao-na-Publicao (CIP)

    (GPT/BC/UFG)

    Aguiar, Aluska Cruvinel . A282n Neurocisticercose: forma psquica e demncia / Aluska Cruvinel Aguiar. Goinia, 2007. 73f. : il. ; figs., tabs. Orientador: Leonardo Ferreira Caixeta. Dissertao (Mestrado) Universidade Federal de Gois, Instituto de Patologia Tropical e Sade Pblica, 2007. Bibliografia : f.57-67. Inclui lista de abreviaturas. Anexos.

    1. Cisticercose Demncia 2. Neurocisticercose 3. Forma psquica 4. Neuroimagem 5. Depresso 6. Demncia 7. Psicose 8. Crebro Doenas I. Caixe- ta, Leonardo Ferreira II. Universidade Federal de Gois, Instituto de Patologia Tropical e Sade Pbli- ca III. Ttulo. CDU: 576.89:616.894

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    Nossas ddivas so traidoras e nos fazem

    perder o bem que poderamos conquistar, se no fosse o medo de tentar.

    William Shakespeare

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    A meus pais Jair e Neusa pelo incentivo e o exemplo. Aos meus queridos Durben, Dairom e Rodrigo pelo amor recproco que nos une.

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    AGRADECIMENTOS Agradeo ao Hospital de Doenas Tropicais, ao Hospital das Clnicas e ao meu orientador prof Leonardo F. Caixeta, pela oportunidade.

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    ABSTRACT

    Neurocysticercosis is the most common cause of CNS infection by Taenia solium

    larvae phase. Its psychic profile can present through a large series of neuropsychiatry

    symptoms. The aim of this study is to characterize the cognitive and behavioral

    manifestations of NCC psychic profiles, to assess the most prevalent of NCC psychic

    profiles and to make the correlation of the clinic and imaging aspects of the injuries.

    Seventy six patients with neurocysticercosis were analyzed by standardized

    diagnostic tests: Neuropsychiatric Inventory, Functional Activities Questionnaire (QAVD)

    Pfeffer), Mini Mental State Exam (MMSE). These tests were intendend to separate the

    psychics profile of NCC. Regarding to the physic symptoms, the anxiety was the most

    frequently found abnormality (53%); followed by anger symptoms (46%), and dysphoria

    (41%). It was not found patients without their psychic profile with deliriums,

    hallucinations, disinhibition, euphoria and aberrant motor behavior. Psychomotor agitation

    was common in patients with dementia and NCC.

    The most frequently clinical manifestation was the epilepsy, which amounted to

    67% of the sample. The second most prevalent clinical profile was the psychic one found in

    53% of the patients. The diagnosed psychic profiles showed by DSM-IV were: Depressive

    Disorder (20%), Anxiety Disorder (14.5%), Dementia (9.2%), Psychotic Disorder (5.3%),

    Organic Personality Disorder (2.6%) and Maniac Disorder (1.3%).

    The NCC was considered active in 30% of the cases and inactive in 70% of them.

    The sample presents 6.6%of asymptomatic patients. Injuries over the right frontal lobe and

    basal ganglia present a meaningful risk of psychic profile of NCC.

    This study sustains that neuropsychiatric disturbances are frequent on patients with

    neurocysticercosis, mainly represented by depression. The psychic profile was

    meaningfully related to the variables: restrictions on Functional Activities, neuroimaging

    with injuries on the right frontal lobes and on basal ganglia.

    Key-words: Neurocysticercosis. Psychic profile. Neuroimaging. Depression.

    Dementia. Psychosis.

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    Resumo

    Neurocisticercose (NCC) a causa mais comum de infeco do SNC pelo estgio

    larvrio da Taenia solium. A sua forma psquica pode se apresentar atravs de um amplo

    leque de sintomas neuropsiquitricos. O objetivo do estudo caracterizar as manifestaes

    cognitivas e comportamentais da forma psquica da NCC, estimar a prevalncia da forma

    psquica da NCC e fazer a correlao clnico-imagenolgica das leses.

    Foram analisados 76 pacientes com neurocisticercose por instrumentos diagnsticos

    estandardizados a fim de separar a forma psquica da NCC: o Inventrio Neuropsiquitrico

    (NPI), questionrio de atividades da vida diria (QAVD - Pfeffer) e Mini-Exame do Estado

    Mental (MEEM). Com relao aos sintomas psquicos, a ansiedade foi a anormalidade mais

    encontrada (53%), seguida de irritabilidade (46%) e disforia/depresso (41%). No foram

    encontrados pacientes sem a forma psquica com delrios, alucinaes, desinibio, elao

    do humor e comportamento motor aberrante. Nos pacientes com apresentao de demncia,

    a a agitao psicomotora foi comum.

    A epilepsia foi a manifestao clnica mais encontrada perfazendo 67% da amostra.

    A segunda forma clnica mais prevalente foi a psquica em 53% dos pacientes. As

    apresentaes da forma psquica diagnosticadas pelo DSM-IV foram: Transtorno

    Depressivo (20%), Transtorno de Ansiedade (14,5%), Demncia (9,2%), Transtorno

    Psictico (5,3 %), Personalidade Orgnica (2,6%) e Transtorno Maniforme (1,3%).

    A NCC foi considerada ativa em 30% dos casos e inativa em 70%. A amostra

    contm 6,6% de pacientes assintomticos. Leses nos lobos frontal direito e gnglios da

    base a direita apresentam um risco significativo de forma psquica da NCC.

    Esse estudo confirma que distrbios neuropsiquitricos so freqentes em pacientes

    com neurocisticercose, principalmente depresso. A forma psquica foi relacionada

    significativamente com as variveis: restries nas atividades de vida diria, neuroimagem

    com leses nos lobos frontal direito e nos gnglios da base.

    Palavras-chave: Neurocisticercose. Forma psquica. Neuroimagem. Depresso. Demncia. Psicose.

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    Lista de Abreviaturas NCC -neurocisticercose TCC -tomografia computadorizada de crnio RM - ressonncia magntica INP -inventrio neuropsiquitrico MEEM - mini-exame do estado mental QAVD Questionrio de atividades da vida diria DVP derivao Ventrculo - Peritoneal FE frontal Esquerda FD frontal Direita TE temporal esquerdo TD temporal direito PE parietal esquerdo PD parietal direito OE occipital esquerdo OD occipital direito GBE - gnglio da base esquerdo GBD gnglio da base direito

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    1- INTRODUO ................................................................................................................ 12

    1.1 Ciclo biolgico ........................................................................................................... 12

    1.2- Fisiopatologia ........................................................................................................... 13

    1.3 Epidemiologia............................................................................................................. 15

    1.4 Diagnstico................................................................................................................ 18 1.4.1 - Critrios Diagnsticos :..................................................................................... 18 1.4.2 Patologia ........................................................................................................... 21 1.4.3.- Neuroimagem.................................................................................................... 21 1.4.4-Sorologia ............................................................................................................. 23 1.4.5Eletroencefalograma (EEG) ............................................................................... 24

    1.5 Formas clnicas .......................................................................................................... 24 1.5.1. Assintomtica ..................................................................................................... 25 1.5.2 Forma Espinal................................................................................................... 26 1.5.3 Forma Cefalia .................................................................................................... 26 1.5.5 .Forma Vascular .................................................................................................. 28 1.5.6.- Forma de Hidrocefalia....................................................................................... 28 1.5.7.- Forma Encefaltica ............................................................................................ 28 1.5.8. Forma Movimentos Involuntrios Anormais .................................................. 29 1.5.9 Forma Paresia Motora Pura ............................................................................... 29 1.5.10 -Forma Ocular................................................................................................... 29 1.5.11 - Forma psquica ................................................................................................ 29

    1.6 - Diagnstico diferencial ............................................................................................ 32 1.6.1 Diagnstico diferencial da forma psquica .......................................................... 32

    1.7 - Tratamento ............................................................................................................... 32

    1.8 Justificativa................................................................................................................. 35

    2 -OBJETIVOS .................................................................................................................... 36

    3- MATERIAL E MTODOS ............................................................................................. 37

    MATERIAL ....................................................................................................................... 37

    MTODOS ....................................................................................................................... 39

    4 RESULTADOS .............................................................................................................. 41

    5 DISCUSSO.................................................................................................................. 51

    6 - CONCLUSES............................................................................................................... 56

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    7 - REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS............................................................................ 57

    8- ANEXO............................................................................................................................ 68

    Anexo1 - Mini Exame do Estado Mental MEEM ....................................................... 68

    Anexo 2 - -Inventrio Neuropsiquitrico.......................................................................... 69

    Anexo 3- Questionrio de Atividades de Vida Diria ...................................................... 70

    Anexo 4 Termo de Consentimento Livre e Esclarecido................................................. 72

    Anexo 5 - TabelaForma Psquica relacionada idade, sexo, escolaridade e ndices psicomtricos: MEEM, INP e Pfeffer ............................................................................... 74

    Anexo 6 -Tabela Forma No Psquica relacionada idade, sexo, escolaridade e ndices psicomtricos: MEEM, INP e Pfeffer ............................................................................... 79

    Anexo 7-Tabela Achados radiolgicos da forma psquica............................................ 81

    Anexo 8 Tabela Achados radiolgicos da forma no psquica.................................... 83

  • 1- INTRODUO

    A neurocisticercose (NCC) globalmente uma das mais importantes infeces

    neuroparasitrias (Schneider et al, 2002), principalmente em pases em desenvolvimento na

    Amrica Latina, sia e frica, onde as condies de transmisso so favorveis (Fleury et

    al, 2003). considerada um marcador biolgico do subdesenvolvimento socioeconmico,

    das condies sanitrias precrias (Carpio, 2002).

    NCC ainda a maior causa de epilepsia sintomtica nos pases em desenvolvimento

    (Terra-Bustamante et al, 2005). Alm disso, NCC tem outros sintomas pouco

    diagnosticados, mas tambm freqentes, como a forma psquica.

    1.1 Ciclo biolgico

    A tenase e a cisticercose so duas morbidades distintas, causadas pelo

    mesmo agente etiolgico, em fases diferentes (Barbosa et al, 2000). A tenase adquirida

    pela ingesto de carne crua, ou mal cozida de sunos contendo o cisticerco de Taenia solium

    (Nash et al, 2004). Esse cisticerco evolui para formas adultas no intestino delgado humano

    (Schneider et al, 2002). O verme adulto ataca a mucosa jejunal pelo esclex (Botero et al,

    1993). Um verme adulto pode ficar no seu hospedeiro por mais de 20 anos induzindo

    sintomatologia mnima (Flisser, 1991). Ovos ou progltides so excretados nas fezes por

    humanos carreadores do verme adulto continuamente (White, 2000). Progltides proximais

    so imaturas e transformam-se em segmentos maduros, as distais tornam-se grvidas e

    contem em torno de 60.000 ovos cada (Flisser, 1991).

    A cisticercose humana a infeco causada pelo estgio larvrio da T. solium

    (Nieto, 1982). Nessa situao o homem se torna hospedeiro intermedirio de forma

    acidental (Del Bruto, 1988). O hospedeiro intermedirio natural seria o suno (Prasad et al,

    2006). A larva de T. solium pode infectar ainda o co, o gato, macaco e o urso (Barbosa et

    al, 2000). O homem o nico hospedeiro definitivo conhecido (Akira et al, 2003).

    Cisticercose deve ser vista como uma doena transmitida de pessoa para pessoa, sendo o

    papel dos sunos de perpetuar a tenase (Garcia e Del Bruto, 2005).

    A cisticercose ocorrer pela heteroinfeco quando o homem ingerir gua ou

    alimentos contaminados com ovos de Taenia solium. Autoinfeco externa ocorre quando o

    indivduo, com tenase intestinal, levar ovos do nus para a boca (Carpio, 2002). Precrias

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    condies sanitrias facilitam esse tipo de transmisso (Barbosa et al, 2000). Aps a

    ingesto, os ovos so digeridos pelo suco gstrico e liberam os hexacantos que penetram na

    circulao sistmica (Silva-Vergara et al, 1998). O cisticerco tem uma tendncia marcante

    de alojar-se nos olhos, msculos e no sistema nervoso central (SNC) (Sotelo et al, 1985). A

    neurocisticercose ocorre pela infeco do Sistema Nervoso Central (Fleury et al, 2003).

    Uma vez no crebro, o embrio hexacanto se desenvolve na larva secundria: o cisticerco

    aps um perodo de dois meses (Flisser et al, 1997). A viabilidade da larva foi estimada em

    4 a 5 anos (Psarros et al, 2003).

    Em um ambiente domiciliar, um portador do verme adulto de T. solium representa

    uma importante fonte de infeco e disseminao de cisticercose (Barbosa et al, 2000). Os

    ovos de T.solium podem ficar nas mos no lavadas de pessoas portadoras da doena, o que

    se torna particularmente perigoso em caso de pessoas que trabalham manuseando comida

    (Schneider et al, 2002). O ciclo de vida inclue o humano carreador de tenase, os ovos

    livres e os sunos com cisticercose (Flisser, 1991).

    1.2- Fisiopatologia

    A neurocisticercose uma parasitose com natureza multifatorial, em particular pela

    sua heterogeneidade clnica e biolgica (Ramirez-Bermudez et al, 2005). H evidncias de

    variabilidade pela susceptibilidade do hospedeiro e do parasita. Akira (2003) descreve

    gentipos diferentes de T. solium, com diferenas marcantes nas seqncias de DNA entre

    as amostras colhidas na frica e Amrica.

    O mecanismo pelo qual as parasitoses tropicais alcanam o crebro a via

    hematognica. A forma intraparenquimatosa da neurocisticercose seria causada pela

    embolizao arterial para o crebro (Bittencourt et al, 1996). Entretanto, a histria natural

    do cisticerco no SNC ainda no est completamente compreendida (Carpio, 2002). Sobre as

    infeces macias pairam muitas dvidas adicionais. Poderiam resultar da ingesto nica de

    uma quantidade grande de ovos, progltides, ou de uma fonte permanente de infeco

    (Garcia et al, 1999).

    A forma extraparenquimatosa provavelmente resultado da exsudao de ovos pelo

    plexo coride. A possibilidade dos ovos chegarem ao lquor por fluxo venoso retrgrado

    improvvel (Bittencourt et al, 1996). Na localizao subaracnide, ou intraventricular, o

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    processo de evoluo diferente do curso clnico usual, permanecendo o parasito no

    estgio vesicular (Carpio, 2002).

    Os cisticercos so classificados, de acordo com a sua fase evolutiva, em etapas :

    vesicular, vesicular coloidal, granular nodular e nodular calcificada (Lino et al, 2002). Cada

    estgio tem mudanas especficas no parasita e parnquima cerebral (Patel et al, 2006).

    referido que no SNC a sobrevida mdia dos cisticercos de trs a seis anos e a calcificao

    da larva ocorre aps 10 anos, mas h evidncias de que esse tempo necessrio seja varivel

    (Vianna et al, 1990). Pouco conhecido sobre as razes da tolerncia imune inicial e quais

    antgenos so responsveis pela intensificao da reao inflamatria (Pitella, 1997). Um

    dos mecanismos propostos seria que os parasitas secretam inibidor de serina proteinase,

    chamado de taeniaestatina que inibem, em modelos experimentais a ativao do

    complemento, a ativao linfocitria e a produo de citocinas (White, 2000).

    Na fase vesicular, o hospedeiro tende a mostrar uma tolerncia imune, sem reao

    inflamatria (Carpio, 2002). A membrana do parasita transparente contendo lquido e a

    larva invaginada em seu interior (Lino et al, 2002). Infiltrado inflamatrio

    linfoplasmocitrio discreto e poucos eosinfilos podem ou no serem vistos ao redor do

    cisticerco (Pitella, 1997). O dimetro mdio do cisto de 8-10mm, com extremos de 4-

    20mm ou mais. Cistos maiores so identificados nos ventrculos onde podem assumir

    formas racemosas, com vesculas gigantes, sem esclex (Carpio, 2002).

    A prxima etapa, vesicular coloidal, caracteriza-se por necrose da larva e a vescula

    parece mais espessa e com lquido turvo ou fracamente gelatinoso (Lino et al, 2002). O

    esclex mostra sinais de degenerao. O parnquima cerebral exibe sinais de reao

    inflamatria intensa (Patel et al, 2006). A reao inflamatria que se desenvolve ao redor

    do cisticerco principalmente causada pelos linfcitos, plasmcitos e eosinfilos a

    responsvel pela eventual destruio do parasita (Del Bruto et al, 1988).

    A degradao dos cistos correlaciona-se com o incio das manifestaes clnicas, em

    funo do edema dos tecidos adjacentes e da ruptura da barreira hemato-enceflica (BHE),

    surgindo reaes locais e distncia (Forlenza et al, 1998). A reao inflamatria peri-

    lesional parece no causar dano especfico aos neurnios. Essa afirmao baseada no

    conhecimento sobre a Enolase Especfica dos neurnios (EEN). No lquor e soro de

    pacientes com NCC (forma ativa) e cistos em degenerao ela no difere dos controles

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    normais (Lima et al, 2006). Lembrando que a EEN um marcador neuronal especfico, ela

    poderia negligenciar outras clulas, como as gliais. Lima et al (2006) no conseguiram

    demonstrar evidncias de danos aos astrcitos associados com cistos em degenerao na

    NCC, utilizando um marcador glial, o S100B, no lquor.

    A terceira etapa a granular nodular, na qual a vescula tende a reduzir o seu

    tamanho, tornando seu contedo semi-slido , o esclex transformado em um grnulo

    mineralizado (Lino et al, 2002). A sua presena indica cisto prvio destrudo pelo

    hospedeiro (Sotelo et al, 1985). Na ltima etapa, nodular calcificada, os constituintes do

    parasita no so identificados. Apenas um ndulo mineralizado e slido (Lino et al, 2002).

    O parnquima cerebral mostra gliose intensa (Patel et al, 2006).

    1.3 Epidemiologia

    A NCC reconhecida como sendo a doena parasitria mais freqente e importante

    do SNC e endmica em vrios continentes (Del Bruto et al, 1988; Romn, 2003). Entre 5

    e 40% dos adultos carreadores de T solium desenvolvem cisticercose (Carpio, 2002).

    Segundo a OMS, calcula-se que haja no mundo uns dois milhes e meio de pessoas

    portadoras de tenase (Romn, 2003). Menos de 10% dos pacientes de NCC so portadores

    da Taenia solium no momento do diagnstico de cisticercose, apesar de histria de tenase

    intestinal ser obtida em 25% desses pacientes (Garcia et al, 1999).

    Neurocisticercose a primeira causa de epilepsia de incio tardio (aps os 25 anos)

    em pases endmicos (Romn, 2003, Fleury et al, 2003). Trs quartos dos 50 milhes de

    pacientes com epilepsia no mundo vivem nos pases em desenvolvimento (Terra-

    Bustamante et al, 2005). De acordo com a comisso de Enfermidades Tropicais da Liga

    Internacional Contra Epilepsia, a prevalncia de epilepsia ajustada para idade em pases em

    desenvolvimento de 10 a 15 casos por mil habitantes, e em pases desenvolvidos de 2-

    6/1000 habitantes (Romn, 2003). NCC corresponde a mais de 50% desses casos de

    epilepsia (Rosenfeld, 2003). Nos pases em desenvolvimento a prevalncia de epilepsia

    praticamente o dobro da prevalncia em pases desenvolvidos. Na sua maior parte, esses

    ndices se devem neurocisticercose (Romn, 2003). Estudos populacionais em reas

    endmicas mostram que 10-18% dos indivduos assintomticos tm achados na TCC

    sugestivos de neurocisticercose, principalmente calcificaes cerebrais (Velasco et al,

  • 16

    2006). O aumento dramtico no diagnstico da NCC aps 1977 provavelmente pela

    introduo da TCC e RM (Botero et al, 1993)

    Endmica em pases em desenvolvimento, incluindo China, ndia, Amrica Latina e

    frica, NCC tambm endmica em grupos que esto crescendo nos pases desenvolvidos,

    especialmente o grande nmero de imigrantes e viajantes (Schneider et al, 2002)

    (Rosenfeld, 2003; Levav et al, 1995). T. solium endmica na amrica Latina, e mais

    recentemente publicaes tm mostrado que a prevalncia de T. solium na sia e frica

    to alta quanto, ou at maior que na Amrica Latina. Na Europa, T. solium foi virtualmente

    erradicada (Akira et al, 2003).

    Em pases desenvolvidos, os clnicos devem considerar informaes

    epidemiolgicas como viagens recentes a pases endmicos, local de nascimento e

    residncia para o diagnstico de NCC (Carpio, 2002). Nos EUA, nas regies com

    imigrao mais freqente proveniente da Amrica Latina (Califrnia, Texas e Estados do

    sul) esto as reas com maiores incidncias de NCC. Entretanto, pessoas portadoras de

    tenase que manuseiam comida, com as mos contaminadas com ovos de Taenia, podem

    estender a contaminao s pessoas sem outras possveis fontes de infeco (Schneider et

    al, 2002). A prevalncia de NCC de 2,8% na comunidade hispnica da Califrnia, EUA

    (DeGiorgio et al, 2005).

    NCC representa a terceira maior causa de admisses em hospitais neurolgicos no

    Mxico, e visto em 1.3-3.1% das autopsias feitas no Hospital Geral do Mxico (Fleury et

    al, 2003). No Mxico, prevalncia de neurocisticercose baseada em achados de TCC de

    9,1%, o que confirma a magnitude do problema no Mxico e traz a necessidade de

    promover medidas de controle (Fleury et al, 2003).

    No foi encontrada diferena na prevalncia relacionada ao gnero, em populao

    assintomtica. Formas multicsticas tm sido relatadas mais freqentemente em mulheres

    (Fleury et al, 2003). No Brasil h um maior comprometimento do sexo masculino pela

    NCC (Agapejev, 2003). Predomina em pacientes jovens, em plena fase produtiva, sendo

    mais rara nos extremos de idade (Chagas et al, 2003). Tem predomnio entre 11 e 35anos

    (Takayanagui e Leite, 2001). A baixa prevalncia de NCC em crianas j foi descrita e de

    muito interesse, j que pode indicar resistncia infeco no incio da vida (Fleury et al,

    2003). Os pacientes apresentam baixo nvel educacional o que pode ser relacionado

  • 17

    diretamente com a piora dos nveis scio-econmicos e conseqentes aumento no risco de

    infeces parasitrias (Terra- Bustamante et al, 2005).

    considerado um grave problema de sade pblica no apenas por sua alta

    prevalncia, mas tambm porque em muitas situaes trata-se de uma doena grave,

    repercutindo de forma importante na qualidade de vida do indivduo e na sua interao com

    seu meio social, sendo seu impacto scio-econmico representativo, uma vez que, nas

    formas graves de neurocisticercose, pode haver incapacitao para a vida de forma geral e

    para o trabalho de forma particular, dentro do contexto da morbi-mortalidade associada a

    esta parasitose. (Flisser, 1988). Dentre os pacientes com NCC, 75% esto em idade

    produtiva e esto freqentemente incapazes de trabalhar logo aps o incio dos sintomas

    (Flisser, 1991).

    O prejuzo econmico em regies endmicas no se restringe aos pacientes e seus

    custos. A carne dos animais parasitados no pode ser comercializada e consumida, pelo

    menos em locais onde h controle sanitrio. Em Lagamares-Mg, em 34,2% das casas havia

    antecedente de tenase e 11,4% das casas possuam criao de sunos (Silva-Vergara et al,

    1995). Fator determinante na perpetuao do elo epidemiolgico tenase-cisticercose nas

    reas endmicas seria a criao de sunos, alm dos portadores crnicos de tenase (Silva-

    Vergara et al, 1998).

    Embora o Ministrio da Sade recomende (portaria 1100, de 24/05/1996) a

    implantao da notificao compulsria do complexo tenase/cisticercose, apenas os

    Estados de Santa Catarina, Paran, Minas Gerais e Mato Grosso do Sul, e a localidade de

    Ribeiro Preto(SP) implantaram programas de combate e controle da tenase/cisticercose. O

    descaso quanto a essa recomendao constitui elemento importante para que os dados sobre

    incidncia e prevalncia no Brasil mantenham-se subestimados (Agapejev, 2003). No

    Brasil, a cisticercose encontrada com elevada frequncia nos estados de So Paulo, Minas

    Gerais, Paran e Gois (Chimelli et al, 1998). Agapejev (2003) descreve procedncia rural

    em 56% dos pacientes com NCC no Brasil. Entre aqueles com formas graves, a

    procedncia urbana foi mais freqente (Agapejev, 2003).

    A prevalncia dessa neuroparasitose no Brasil no est definida (Agapejev, 2003).

    Em Minas Gerais, em populao de pacientes com epilepsia, foi encontrada prevalncia de

    1,9% de cisticercose (Silva-Vergara et al, 1994). A neurocisticercose est presente na

  • 18

    Paraba (Nordeste brasileiro) com uma manifestao clnica de convulso presente em 90%

    dos pacientes analisados (Chagas et al, 2003). E em Braslia, 6,7% dos pacientes

    examinados em amostra hospitalar eram portadores de neurocisticercose (Vianna et al,

    1990). A NCC tem uma incidncia em comunidades indgenas brasileiras alta, com mdia

    de 42,9% (Agapejev, 2003). Em Ribeiro Preto, o coeficiente de prevalncia da NCC foi de

    54 casos/1000000 habitantes. A NCC foi considerada ativa em 21% dos casos

    (Takayanagui et al, 1996). E, em estudo posterior em necropsias na cidade de Ribeiro

    Preto- SP, o coeficiente de prevalncia da NCC foi 67 casos/ 100.000 casos (Chimelli et al,

    1998). Em Uberaba (MG), avaliando necropsias verificou-se a ocorrncia de cisticercose

    em 3,3% dos indivduos (Lino et al, 1999). Em Uberlndia (MG) a anlise dos laudos de

    necropsias revelou 1,4% de cisticercose (Costa-Cruz et al, 1995).

    1.4 Diagnstico

    1.4.1 - Critrios Diagnsticos :

    Devido dificuldade de diagnstico observada em muitos casos, Del Bruto et al

    (2001) propuseram um conjunto de critrios para o diagnstico da doena, com base em

    dados clnicos objetivos, e em dados de neuroimagem, imunolgicos e epidemiolgicos.

    Esses critrios esto subdivididos em quatro categorias estratificadas de acordo com sua

    fora diagnstica (Quadro 1), e o grau de certeza do diagnstico depende da combinao

    dos critrios presentes (Quadro 2).

    Quadro 1 - Critrios diagnsticos propostos para a Neurocisticercose por Del Bruto

    et al, 2001

    Categorias de critrio Critrios ABSOLUTO 1.Demonstrao histolgica do parasita

    atravs da bipsia de leso enceflica ou da medula espinhal 2. Leses csticas mostrando esclex na TC ou RM 3. Visualizao direta atravs da fundoscopia dos parasitas abaixo da retina

    MAIORES 1. Leses altamente sugestivas de

  • 19

    neurocisticercose nos estudos de neuroimagem*

    2. Positividade dos testes

    imunolgicos para anticorpos anticisticercos**

    3. Resoluo de leses csticas

    intracranianas aps terapia com albendazol ou praziquantel

    4. Resoluo espontnea de pequenas

    leses solitrias contrastadas*** MENORES 1. Leses compatveis com

    Neurocisticercose nos estudos de neuroimagem#

    2. Manifestaes clnicas

    sugestivas de Neurocisticercose +

    3. ELISA do LCR positivo para

    deteco de anticorpos anticisticercos ou antgenos cisticercticos

    4. Cisticercose fora do SNC

    EPIDEMIOLGICOS 1. Evidncia de contato do hospedeiro com a infeco de Taenia solium

    2. Indivduos provenientes ou

    residentes em rea endmica para cisticercose

    3. Histria de viagens freqentes para

    reas endmicas da doena *TC ou RM evidenciando leses csticas sem esclex, leses captantes, ou

    tpicas calcificaes do parnquima enceflico.

    **Ensaio de imunoeletroforese ligada a enzima usando extratos purificados de

    antgenos de Taenia solium, como desenvolvido pelos Centros para o Controle e

    Preveno de doenas (Atlanta-EUA)

  • 20

    *** Leses solitrias com anel de contraste medindo menos que 20mm de

    dimetro em pacientes que se apresentam com convulses, exame neurolgico

    normal e sem evidncia de doena sistmica ativa.

    #TC ou RM mostrando hidrocefalia ou contrastao normal das leptomeninges e

    mielogramas mostrando mltiplos defeitos de preenchimento na coluna do meio

    contrastante.

    + convulses, sinais neurolgicos focais, hipertenso intracraniana e demncia.

    ELISA enzyme-linked imunosorbent assay

    Quadro 2 Grau de certeza diagnstica para neurocisticercose Grau de certeza diagnstica

    Definitivo -presena de um critrio absoluto

    -presena de dois critrios maiores, um

    menor e outro epidemiolgico

    Provvel _Presena de um critrio maior, dois

    critrios menores e outro epidemiolgico

    _Presena de trs critrios menores e um

    critrio epidemiolgico

    Del Bruto et al, 2001

    A presena de calcificaes supratentoriais slidas, com dimetro entre 1-10 mm, na

    ausncia de outras doenas, devem ser consideradas como altamente sugestivas de

    neurocisticercose (Velasco et al , 2006). Com relao aos granulomas solitrios, Rajshekhar

    (1997) prope uma tabela com outros critrios diagnsticos para facilitar a sua abordagem.

    Quadro 3 Critrio diagnstico para granuloma cisticerco solitrio

    Clnico

    Convulses (parciais ou generalizadas)

    Sem achados de presso intracraniana aumentada persistentemente

    Sem histria de dficit neurolgico progressivo

    Sem evidncia de doena sistmica ativa

    TCC

  • 21

    TC mostra leso solitria captante de contraste

    Leso menor que 20mm na dimenso mxima

    Edema pode ou no estar presente, mas no grave o bastante para produzir desvio

    de estruturas da linha mdia. Rajshekhar: Acta Neurol Scand 1997, 96(2):76-81

    1.4.2 Patologia

    O diagnstico de NCC apenas em base clnica difcil porque sinais e sintomas no

    so especficos. A confirmao patolgica atravs da bipsia ou da autpsia seria o mtodo

    padro-ouro, no fosse necessrio mtodos invasivos para a sua realizao (Carpio, 2002).

    1.4.3.- Neuroimagem

    A TCC e a RM so as principais ferramentas no diagnstico da NCC e podem ser

    tomados como o padro-ouro (Carpio, 2002). Antes da tomografia computadorizada (TCC)

    estar disponvel, o diagnstico de NCC era muito restrito e os mtodos diagnsticos

    convencionais eram insuficientes (Minguetti e Ferreira, 1983). A introduo da TCC

    aumentou a acurcia clnica e formas especficas da doena, bem como formas

    assintomticas, agora podem ser identificadas (Sotelo et al, 1985).

    Na NCC parenquimatosa, os achados da TCC e RM dependem do estgio do cisticerco.

    Cada estgio apresenta alteraes especficas no parasita e parnquima cerebral (Patel et al,

    2006).

    Quando cistos viveis (ou estgio vesicular), aparecem como leses redondas na TCC,

    hipodensas, sem realce com contraste (Rosendeld, 2003). Nessa fase, o esclex pode ser

    visto em at um tero dos casos na TCC (Bittencourt et al, 1996). Na RM, leses

    hipointensas (densidade similar ao lquor) sem edema, ou realce com contraste,

    correspondem a cistos viveis (Creasy e Alarcon, 1994; Rosenfeld, 2003) A demonstrao

    de leses csticas viveis com ndulo mural (esclex invaginado) uma imagem tpica da

    NCC (Carpio, 2002).

    Os cistos em degenerao (ou estgio coloidal), aparecem como leses com realce

    focal anelar ao contraste e edema peri-lesional na TCC (Rosenfeld, 2003). No estgio de

    granuloma, aparece um ndulo hiperintenso que apresenta realce aps injeo de contraste

  • 22

    (Patel et al, 2006). Rajshekhar (1997) descreveu critrios para distinguir granuloma

    cisticerco de outras causas (quadro 3). Entre os pacientes com convulses e TC com leso <

    20mm no dimetro, o granuloma cisticerco foi presumivelmente diagnosticado naqueles

    sem evidncia de hipertenso intracraniana e desvio da linha mdia, ou doena sistmica

    ativa. Entre 215 pacientes, apenas 2 apresentavam outra doena.

    As calcificaes surgem na TCC como ndulos hiperdensos (Rosenfeld, 2003) Em

    raros relatos, ocorrem edemas peri-lesionais recorrentes, aps calcificao (Psarros et al,

    2003). Ndulos calcificados correspondem fase residual. (Creasy e Alarcon, 1994). Em

    outras doenas infecciosas, a ocorrncia de calcificaes puntiformes mltiplas, ou nicas,

    so infrequentes (Nash et al, 2004).

    Os achados de TCC e RM na NCC subaracnidea incluem hidrocefalia,

    contrastao anormal das leptomeninges na base do crnio, ou cistos subaracnides.

    Cisticercos ventriculares aparecem na neuroimagem como leses csticas que distorcem a

    anatomia do sistema ventricular e causando hidrocefalia assimtrica (Rosenfeld, 2003).

    Quando cistos so extra-parenquimatosos, eles tendem a crescer irregularmente e provocar

    mais reao inflamatria. Cistos gigantes desenvolvem em reas em que h mais espao,

    como a fissura silviana ou as cisternas liquricas da base e comportam-se como tumores

    benignos (Garcia e Del Bruto, 2005).

    Na encefalite por NCC, a TCC no contrastada mostra edema cerebral intenso e

    difuso e ventrculos colapsados ou pequenos. Injetando-se contraste, surgem imagens

    anelares ou hiperintensas disseminadas pelo parnquima (Carpio, 2002).

    Freqentemente so revelados mais cistos na RM do que na TCC e h maior

    resoluo para detectar-se o esclex (Bittencourt et al, 1996). RM tambm melhor do que

    a TCC para ver leses na base do crnio, cistos no tronco cerebral, cistos intraventriculares

    e leses espinais, entretanto RM menos sensvel para deteco de pequenas calcificaes

    (Rosenfeld, 2003).

    Atualmente, de acordo com a literatura, em 97% dos casos o diagnstico de certeza

    pode ser obtido pela correlao clnico-radiolgica. Embora o LCR seja importante para o

    diagnstico, poder numa primeira amostra ser normal em 20% dos casos (Chagas et al,

    2003).

  • 23

    Um quarto dos pacientes com NCC no complicada tem leses nos gnglios da

    base, principalmente no putmen e ncleo caudado, chegando a 60% dos pacientes com

    leses mltiplas. Mas a expresso clnica dessas leses rara (Cosentino et al, 2002). Os

    cistos intraventriculares so raros (0,7%); a localizao mais comum no quarto ventrculo

    (Sotelo et al, 1985).

    A angiografia, em casos de NCC subaracnidea, evidencia em at 53% dos casos

    arterite cerebral. O envolvimento seria de artrias de mdio calibre, principalmente a artria

    cerebral mdia (Barinagarrementeria e Cantu, 1998).

    1.4.4-Sorologia

    A maioria dos testes sorolgicos tem valor limitado devido baixa sensibilidade e

    especificidade (Rosenfeld, 2003). O diagnstico laboratorial de NCC baseado na deteco

    dos anticorpos anticisticerco no soro ou no lquor por fixao de complemento (FC),

    hemaglutinao indireta (HIA), imunofluorescncia indireta (IFA), imunoglobulina G

    (IgG), ou testes de imunoabsoro enzima IgM (ELISAs) (Bitencourt et al,1996). As

    tcnicas de fixao de complemento e imunoeletroforese so muito pouco sensveis, por

    isso foram abandonadas (Romn, 2003). Esses testes so mais sensveis com lquor e seria

    importante testes simultneos no soro e lquor (Bitencourt et al, 1996).

    O padro-ouro em estudos de soroprevalncia seria a avaliao de bandas por

    imunoeletrotransferncia enzimtica (EITB). Esse mtodo mais sensvel para testar o soro

    do que o lquor (Rosenfeld, 2003). Apresenta uma especificidade de 100% e sensibilidade

    de 98% em casos com duas ou mais leses e de 60 e 80% em casos de uma s leso

    (Romn, 2003). Limitaes desse diagnstico incluem diminuio marcante da

    sensibilidade em pacientes com leses parenquimatosas nicas ou calcificaes. Falsos

    positivos podem ocorrer com cistos extraneurais e/ou exposio sem infeco ativa

    (Rosenfeld, 2003). H de se considerar que, na maioria das reas endmicas, mais de 10%

    da populao geral soropositivo, mas essa proporo pode chegar a 25% em algumas

    reas (Montano et al, 2005; Velasco et al, 2006).

    A maioria dos indivduos com leso calcificada nica tem sorologia negativa.

    Anticorpos desaparecem meses ou anos aps a morte do parasita (Montano et al, 2005).

    Alm disso, 18% dos pacientes com cistos na TC tm imunofluorescncia (IFAs) e ensaio

  • 24

    imunoenzimtico (ELISA) negativos (Bitencourt et al, 1996). Muitos desses pacientes com

    cistos parenquimatosos s mostrariam alteraes no lquor se o cisticerco fizesse contato

    fsico com o espao subaracnideo ou se fosse uma forma combinada de NCC (Sotelo et al,

    1985).

    Em anlise de 38 pacientes, Forlenza (1997) encontrou sinais de inflamao na

    anlise do lquor em 45,9% da sua amostra, dentre os quais 29.9 % possuam testes

    anticorpos positivos. Nenhuma anormalidade foi detectada nos 54,1% restantes (Forlenza et

    al, 1997). A ausncia de inflamao no lquor pode ter duas explicaes: os cisticercos

    esto ativos, mas no em contato com o espao subaracnideo, ou a NCC no est ativa

    (Sotelo et al, 1985). Os achados no exame do lquido cefalorraquiano na populao de rea

    endmica de Lagamar-MG foi anormal em 43,6% por ensaio imunoenzimtico (ELISA) ou

    por reao de imunofluorescncia indireta (RIFI). Em 41,9% a proteinorraquia se mostrou

    aumentada e em 4,8% o achado de eosinfilos (Silva-Vergara et al, 1994)

    Entre outras dificuldades, que estudos sobre anormalidades liquricas regularmente

    excluem pacientes com grande nmero de cistos em degenerao (encefalite cisticerctica),

    na qual a puno lombar contra-indicada devido ao edema cerebral (Lima et al, 2006).

    1.4.5Eletroencefalograma (EEG)

    O EEG mostra baixa relao com os sintomas clnicos e com as leses de NCC

    neuroimagem (Carpio, 2002).

    1.5 Formas clnicas

    A histria natural da NCC e a evoluo clnica no so completamente

    compreendidas porque grande percentagem das infeces de NCC permanece assintomtica

    ou inativa e no diagnosticada (Fleury et al, 2003). Alm disso, a cisticercose humana

    caracteriza-se por no apresentar um quadro clnico exclusivo (Vianna et al, 1990).

    Assim, antes de 1970, o diagnstico era raramente feito antes da morte. Com o

    desenvolvimento da TC e da RM, a freqncia do diagnstico e a compreenso da doena

    tm aumentado (Schneider et al, 2002).

  • 25

    A Neurocisticercose uma doena cujas manifestaes clnicas so pleomrficas

    (Cantu e Barinagarrementeria, 1996) e geralmente inespecficas. Isso se deve,

    principalmente, ao fato de no haver um stio enceflico de instalao predileta de

    cisticercos, podendo os mesmos compor uma diversidade de sndromes clnicas

    neurolgicas puras (sndrome de hipertenso intracraniana, sndrome epilptica, sndrome

    menngea, sndrome psquica) ou mistas (composies variadas entre as sndromes puras

    referidas, p. ex. epilpticas e psquicas ou hidroceflicas e psquicas, etc.) de acordo com o

    nmero de parasitas que atingem o SNC, sua dimenso e localizao, sua fase de

    desenvolvimento e a reao inflamatria desencadeada no contexto de interaes entre

    parasita e o hospedeiro (Takayanagui e Jardim, 1983).

    Pode se classificar suas apresentaes clnicas principais em: a) forma hipertensiva

    b) forma epilptica c) forma meningtica; d) forma psquica e e) forma mista ou combinada,

    de acordo com a sndrome neurolgica dominante (Trelles e Trelles, 1978). Dentre estas, a

    forma psquica, apesar de reconhecida desde meados do sculo XIX, encontra-se descrita

    de modo apenas parcial (Tavares Jr et al, 1994).

    Neurocisticercose disseminada sistmica na ndia visto com convulses

    freqentes, demncia, pseudohipertrofia, sinais neurolgicas focais e, freqentemente,

    hipertenso intracraniana (Bittencourt et al, 1996). Ao redor de 50% dos pacientes

    apresentam duas ou mais formas combinadas de NCC (Sotelo et al, 1985).

    1.5.1. Assintomtica

    Estudos epidemiolgicos mostram taxas de 9,1% de pessoas aparentemente normais

    com leses calcificadas e completamente assintomticas (Fleury et al, 2003). Constitui um

    dos achados mais intrigantes da NCC a alta proporo desses pacientes (Carpio, 2002).

    O cisticerco pode permanecer vivel no SNC por vrios anos, na forma vesicular.

    Nessa fase, o parasita modula a resposta imune do hospedeiro e raramente causa sintomas.

    O cisticerco torna-se comumente sintomtico quando entra em fase degenerativa associada

    com resposta inflamatria do hospedeiro (Lima et al, 2006).

  • 26

    1.5.2 Forma Espinal

    O envolvimento espinal ocorre quando h um envolvimento cerebral concomitante

    (Schneider et al, 2002). Cisticercose espinal pode ser classificada como vertebral,

    extradural, intradural, ou intramedular (Mohanty et al, 1997).

    Envolvimento espinal relatado em 1,2% a 5,8% dos pacientes com NCC (Torabi et

    al, 2004; Mohanty et al, 1997). O envolvimento intramedular muito menos comum que a

    doena extramedular leptomenngea (Sawhney et al, 1998; Torabi et al, 2004). Mohanty

    (1997) encontrou em reviso de literatura, 36 casos de cisticercose intramedular. Dos cistos

    intramedulares relatados, 56% so localizados no cordo torcico, devido ao fluxo

    sanguneo maior nessa topografia (Sawhney et al, 1998)

    As manifestaes clnicas da NCC intramedular incluem dor, paraparesia,

    espasticidade, incontinncia do intestino e bexiga, disfuno sexual (Torabi et al, 2004).

    Mais de 50% dos pacientes com NCC intramedular tm evidncia de infeco por T

    solium em outro local. As leses so usualmente solitrias, apesar de cistos conglomerados

    poderem ser observados (Torabi et al, 2004).

    1.5.3 Forma Cefalia

    Cefalia um sintoma comum encontrado em pacientes com NCC em reas

    endmicas, mas representa um achado no especfico (Schneider et al,2002)

    A presena de leses por NCC bem relacionada a pacientes com cefalia crnica

    sem sinais de hipertenso intracraniana (Rajshekhar, 2000) e tambm a pacientes com

    hipertenso intracraninana, principalmente na localizao extraparenquimatosa (Patel et al,

    2006; Carpio, 2002).

    1.5.4 Forma Epilptica

    Usando mtodos de imagem, sabe-se que 50 a 70% dos pacientes com NCC

    apresentam convulses (Romn, 2003). Em at 92% dos pacientes com leses

    intraparenquimatosas, a convulso o sintoma presente. Alm disso, em casos com

    envolvimento misto intra e extraparenquimatoso, 74% dos pacientes tm convulses

  • 27

    (Bittencourt et al, 1996). Epilepsia ento a apresentao mais comum da NCC. H trs

    possibilidades para a relao entre NCC e epilepsia: a cisticercose como a causa de

    epilepsia focal, duas doenas independentes e patologia dupla (Nash et al, 2004).

    As convulses generalizadas, ou convulses parciais com generalizao secundria

    parecem ser as mais presentes (Carpio, 2002). Estado epilptico parcial pode ocorrer. A

    presena de dficits neurolgicos focais aps as convulses (paralisia de Todd) foi relatada

    em 16% de algumas amostras (Bittencourt et al, 1996). A semiologia das convulses pode

    ser varivel. Por exemplo, convulses motoras focais podem alternar entre lado direito e

    esquerdo (Bittencourt et al, 1996).

    Uma leso nica com realce ao contraste, ou hiperintensa nos exames de imagem

    um achado comum em pacientes com convulses de incio recente nos pases

    subdesenvolvidos (Carpio, 2002). Entre 5 e 20% de todos os casos com epilepsia na ndia

    tem sido demonstrado ter leso nica, pequena, superficial, com realce ao contraste na

    tomografia computadorizada (Bittencourt et al, 1996).

    Vrios mecanismos so postulados para as convulses da Neurocisticercose. Na

    forma sintomtica aguda, a causa seria a reao inflamatria causada pelos cistos em

    degenerao no crtex e subcrtex, ou pela compresso dos cistos viveis no parnquima

    (Carpio, 2002). Os mecanismos da forma calcificada crnica so mais obscuros. Leso

    direta do tecido cerebral associado com granulomas calcificados; eles poderiam causar

    gliose ao redor do foco originando atividade epilptica (Michele, 2004).

    Especula-se que o edema peri-lesional de leses calcificadas seria uma reao

    inflamatria do hospedeiro persistente, provocada por antgenos das leses (Carpio, 2002).

    Algumas leses calcificadas poderiam ter esclex que periodicamente liberariam tais

    antgenos parasitrios. Outra hiptese, seria a toxicidade por clcio que formaria uma

    matrix insolvel podendo liberar antgenos incorporados em algumas ocasies (Michele,

    2004).

    Terra-Bustamante (2005) sugere que leses NCC calcificadas no agravam

    significativamente os dficits cognitivos observados em pacientes com Epilepsia do Lobo

    Temporal com esclerose hipocampal refratria. A performance cognitiva de pacientes com

    esclerose mesial temporal, com ou sem Neurocisticercose, em testes neuropsicolgicos, foi

    igual (Terra-Bustamante et al, 2005).

  • 28

    1.5.5 .Forma Vascular

    Vrios relatos, durante os ltimos anos, vm enfatizando a relao entre acidente

    vascular cerebral (AVC) isqumico e neurocisticercose (Cantu et al, 1996). A incidncia de

    AVC varia de 2 a 11.8% (Sawhney et al, 1998). Complicaes cerebrovasculares da NCC

    incluem infarto cerebral, ataques isqumicos transitrios e hemorragia cerebral

    (Barinagarrementeria e Cantu, 1998). O mecanismo relacionado, nos eventos isqumicos,

    seria a arterite cerebral (Barinagarrementeria e Cantu, 1998), e cistos subaracnides

    principalmente nas cisternas basais (Cantu et al, 1996). Na hemorragia cerebral, os

    mecanismos possveis seriam a ruptura de um aneurisma mictico, a eroso de um cisto em

    degenerao para dentro de um vaso cerebral, ou hemorragia por vasculite (Sawnhey et al,

    1998).

    1.5.6.- Forma de Hidrocefalia

    NCC ventricular produz sintomas quando o cisticerco obstrui o fluxo do

    lquido cerobroespinal (Schneider et al, 2002). A hidrocefalia aguda obstrutiva ocorre pela

    presena de cistos intraventriculares, no terceiro ou quarto ventrculo (Sawhney et al,

    1998). Essa apresentao clnica uma forma muito rara em crianas (Carpio, 2002).

    A hidrocefalia crnica na NCC, sem evidncias de inflamao no lquor, em alguns

    casos seria por fibrose menngea (Sotelo et al, 1985), em outros devidos a aracnoidite

    (causa mais freqente) (Sawhney et al, 1998; Carpio, 2002). A hidrocefalia comunicante

    desenvolve-se em at 25% dos casos de neurocisticercose devido a aracnoidite ou fibrose

    menngea (Sawhney et al, 1998).

    1.5.7.- Forma Encefaltica

    Uma forma encefaltica da neurocisticercose ocorre principalmente em crianas e

    mulheres jovens (Carpio, 2002) e o resultado dos cistos intraparenquimatosos pequenos

    largamente disseminados. Os pacientes com esta forma de doena tm convulses

    freqentes e hipertenso intracraniana aguda (Bittencourt et al, 1996). A hipertenso

  • 29

    intracraniana foi encontrada em formas miliares dos cistos parenquimatosos com edema

    cerebral difuso (Sotelo et al, 1985).

    1.5.8. Forma Movimentos Involuntrios Anormais

    Patel (2006) descreve caso de parkinsonismo, com face em mscara, diminuio do

    piscamento, tremor de repouso em ambas as mos, postura e marcha tpicos. Havia

    cisticercos em vrios estgios, localizados em ambos hemisfrios incluindo gnglios da

    base.

    Distonia unilateral um achado no usual de convulses parciais complexas,

    podendo ocorrer em pacientes com a forma epilptica da neurocisticercose (Sawhney et al,

    1998; Patel et al, 2006).

    1.5.9 Forma Paresia Motora Pura

    A hemiparesia motora pura uma manifestao clnica incomum (Sawnhey et al,

    1998). E tais dficits neurolgicos focais, quando ocorrem, so geralmente transitrios, em

    perodo de poucos dias, ou semanas (Carpio, 2002).

    1.5.10 -Forma Ocular

    Sawhney (1998) relata um caso de papilite, sem hipertenso intracraninana em

    paciente com neurocisticercose. O autor salienta que na presena de elevada presso

    intracraniana j so relatados vrios casos. Garcia (1999) descreve paciente com cegueira

    por acometimento da retina por cisticerco.

    1.5.11 - Forma psquica

    A forma psquica da Neurocisticercose pode se apresentar atravs de um amplo leque

    de sintomas neuropsiquitricos que podem ser isolados ou constituir sndromes completas.

    Depende no somente da rea envolvida no SNC, como tambm da susceptibilidade do

    paciente (Schneider et al, 2002). Entre os sintomas isolados, poderemos encontrar:

  • 30

    confuso mental, dismnesia grave, alucinaes, delrios, sintomas depressivos e ansiosos,

    (Forlenza et al, 1997), surto psictico agudo (Malhotra et al, 1998) e demncia (Cendes e

    Caixeta, 1986; Carpio, 2002; Schneider et al, 2002).

    Agarwal (2001) descreve em paciente com NCC, a presena de mutismo, desleixo

    pessoal e incontinncia emocional. Cendes (1986) relata caso de paciente diagnosticado

    como esquizofrnico, com TCC apresentando calcificaes disseminadas. Sotelo (1985)

    encontra episdios psicticos em 4,7% dos pacientes e outros distrbios do comportamento

    em 2,7%.

    Bastos (1953) assinalava que preponderava na forma psquica da NCC sintomas de

    decadncia mental, desordens da memria e a instabilidade do humor. Wadia (1998)

    descreveu trs pacientes com NCC apresentando convulses incontrolveis, demncia

    progressiva e relativa pobreza de sinais neurolgicos localizatrios. J os relatos em

    Sandyk (1987) e Rosselli (1988) apresentam casos com forma demencial isolada

    progressiva, nos quais foi demonstrado Neurocisticercose disseminada em ambos. A

    demncia respondeu ao tratamento com antiparasitrios. Patel (2006) relata paciente com

    dificuldades na vida diria, acalculia, dficit na memria de evocao, MEEM com 17

    pontos, apresentando granulomas mltiplos de NCC RM. Tal paciente apresentou

    melhora cognitiva significativa com o tratamento antiedematoso. Levav (1995) traz

    resultados sobre prejuzo de funes do comportamento que incluem aspectos do controle

    inibitrio, habilidades motora e visual em adultos e adolescentes com neurocisticercose.

    Verna (2004) descreve caso de homem com perda aguda de habilidade para leitura

    sem agrafia, uma forma de alexia pura. RM com leso nica captando contraste em anel na

    rea occipital esquerda, compatvel com NCC. Aps o tratamento com albendazol houve

    recuperao integral da funo. Monedo (1997) faz relato de um caso de sndrome

    maniforme secundria a neurocisticercose.

    Forlenza (1997) encontrou manifestaes psiquitricas leves a moderadas em 65,8%

    da sua amostra. Desses, nenhum com apresentao esquizofreniforme tpica, apesar dos

    sintomas psicticos estarem presentes em 10,5% dos casos. Depresso e perda de interesse

    e concentrao estavam presentes em 60,5% dos casos (Forlenza et al, 1997). Em Forlenza

    et al (1998) nenhuma associao foi encontrada entre depresso e presena de epilepsia,

    mas a ocorrncia de depresso correlacionou-se positivamente com atividade da doena.

  • 31

    Os distrbios psquicos constituram o primeiro sintoma em 8% dos pacientes com

    quadro psiquitricos bem estabelecidos como depresso (53-59% dos pacientes), demncia

    e esquizofrenia, ou manifestaes vagas e mal definidas, freqentemente associadas a

    alteraes sensoriais e de percepo (Agapejev, 2003). Takayanagui descreve distrbios

    psquicos em 6,4% dos pacientes em Ribeiro Preto por notificao de casos (Takayanagui

    et al, 1996).

    Apesar de ser citada como a apresentao mais comum da forma psquica da

    Neurocisticercose, a prevalncia da demncia neurocisticerctica ainda no est bem

    definida, pois apresenta amplas variaes na dependncia do estudo considerado. Como

    exemplo desta heterogeneidade, temos que Nitrini et al (1995) no detectaram casos de

    demncia cuja etiologia tenha sido Neurocisticercose numa amostra de 100 pacientes

    portadores de demncia num servio de Neurologia no Brasil, porm, na ndia, Jha (2002)

    constatou que 8% da sua amostra de 124 pacientes portadores de demncia possuam

    etiologia neurocisticerctica. Schneider (2002) ressalta que outras demncias degenerativas

    so mais comuns, mas em pacientes jovens, com incio agudo e histria de origem

    endmica e convulses h maior chance de ser NCC .

    Ramirez-Bermudez (2005) encontrou em amostra de 90 pacientes com

    neurocisticercose, que 15,5% apresentavam demncia de acordo com os critrios do DSM-

    IV. Aps acompanhamento por 06 meses, 78,5 % desses pacientes j no mais preenchiam

    critrio para demncia, apesar de permanecer com alguma alterao cognitiva (Ramirez-

    Bermudez et al, 2005). Schneider (2002) cita que 8% dos pacientes com neurocisticercose

    apresentam psicose ou demncia e os sintomas usualmente so relacionados hidrocefalia.

  • 32

    1.6 - Diagnstico diferencial

    NCC comumente parte do diagnstico diferencial da maioria das desordens

    neurolgicas. As manifestaes clnicas so pleomrficas, dependendo do nmero, tamanho

    e topografia das leses, resposta imune e inflamatria do hospedeiro (Sotelo et al, 1985).

    1.6.1 Diagnstico diferencial da forma psquica

    O diagnstico diferencial da forma psquica da Neurocisticercose com doenas

    degenerativas (primrias ou secundrias) do SNC pode se revestir de dificuldades, at

    porque essas ltimas tm alta prevalncia (Caixeta, 2004b). Prova disto que alguns relatos

    de caso descrevem como a Neurocisticercose pode imitar sintomas de outras formas de

    demncia, sendo ento confundida com as seguintes nosologias: doena de Alzheimer

    (Sandyk et al, 1987, Tavares, 1990), demncia frontotemporal (Hoppe e Rubach, 1980),

    neurossfilis (Santos Filho, 1966).

    Os psiquiatras devem estar atentos para os aspectos neuropsiquitricos das doenas

    infecciosas clssicas como NCC, neurossfilis, HIV, PANDAS (desordem neuropsiquitrica

    autoimune peditrica associada infeco estreptocccica) (Schneider et al, 2002). H

    ainda relatos de NCC mimetizando esquizofrenia (Cendes e Caixeta, 1986), psicose

    puerperal (Schneider et al, 2002) e primeiro episdio de surto esquizofrnico (Johnstone et

    al, 1987). Psicose aguda tem sido descrita em pacientes com infeces especficas como

    infeces por Epstein-Barr vrus, meningoencefalite e neurocisticercose (Malhotra et al,

    1998).

    Em quase todos os casos, a dificuldade diagnstica pode ser superada com auxlio

    dos exames de neuroimagem, TCC e/ou RM, que evidenciam leses do SNC compatveis

    com o diagnstico de Neurocisticercose.

    1.7 - Tratamento

    H apenas um tipo de NCC categorizada no tratamento como classe de evidncia I

    (cistos em degenerao e que captam contraste) para o qual no foi recomendado

    tratamento antiparasitrio (Carpio, 2002). Todos os outros tipos de NCC foram

  • 33

    categorizados com nveis de evidncia classe II ou III, conforme quadro 4 (Garcia et al,

    2002).

    Em termos de tratamento, o praziquantel (50-100mg/kg/dia por 15 ou mais dias) e

    albendazol (15mg/kg/dia com o mximo de 800mg dados por 8 ou mais dias) so efetivos

    contra cisticercos (Rosenfeld, 2003). Albendazol a droga de escolha porque tem um efeito

    antiparasitrio maior, tem maior penetrao no lquor e mais barata (Psarros et al, 2003).

    Tem 20% mais atividade cisticida que o praziquantel; quando administrada com

    dexametasona, nveis plasmticos de albendazol aumentam, mas o de praziquantel reduz,

    alm do albendazol ser menos txico (Rosenfeld, 2003).

    Um aumento temporrio do edema peri-lesional ocorre durante o tratamento, j que

    o parasita morrendo no pode mais escapar das defesas do hospedeiro. Por essa razo

    associa-se o glucocorticide ao antiparasitrio (Psarros et al, 2003).

    Drogas cisticidas devem ser usadas com cautela em pacientes com cistos

    subaracnides gigantes devido reao inflamatria desenvolvida no hospedeiro em

    resposta destruio dos parasitas, podendo levar ocluso de vasos leptomenngeos.

    (Garcia & Del Bruto, 2005).

    Interveno neurocirrgica deve ser considerada para hidrocefalia requerendo

    derivao intraventricular, cistos racemosos nas cisternas basais, ou cistos em localizao

    intraventricular (Carpio, 2002).

    Quadro 4 Proposies para o tratamento da neurocisticercose com base nos dados da

    literatura e no nvel de qualidade de evidncia (Garcia et al, 2002)

  • 34

    Tipo da Doena Intensidade da Infeco

    Tratamento Necessrio Nvel de Evidncia

    Cistos parenquimatosos -Cistos viveis -Leses hipercaptantes (cistos em degenerao) -Cisticercos calcificados

    Leve (1 a 5 cistos) Moderada (+ de 5 cistos) Intensa (+ de 100 cistos) Leve/moderada Intensa (encefalite cisticerctica) Qualquer nmero

    a) Parasiticida com corticosterides b) Parasiticida; corticosterides apenas se ocorrerem efeitos colaterais c) Sem parasiticida; seguimento com imagem Consenso: parasiticida com corticosterides a) Parasiticida com altas doses de corticosterides b) Corticoterapia crnica; seguimento com imagem a) Sem parasiticida; seguimento com neuroimagem b) Parasiticida com corticosterides c) Parasiticidas, corticosterides apenas se ocorrerem efeitos colaterais Consenso: sem parasiticida, corticosterides em altas doses e diurticos osmticos Consenso: sem parasiticida

    II-3 II-3 II-3 II-3 III III I II-3 II-3 III

    Cistos extraparenquimatosos -cistos ventriculares -cistos subaracnides - Hidrocefalia sem cistos

    Consenso: remoo endoscpica Se no h endoscpio

    a) DVP e tratamento parasiticida

    b) Cirurgia aberta

    Consenso: parasiticida com corticosterides; DVP se houver hidrocefalia Consenso: DVP; sem parasiticida

    III III III II-3 III

    Cistos raquidianos Consenso: cirrgico III

  • 35

    1.8 Justificativa

    Diante do exposto, fica claro que a forma psquica da Neurocisticercose necessita de

    maiores investigaes sobre a sua prevalncia (que muito varivel e mesmo contraditria

    por depender de variveis j mencionadas nesta reviso; alm disso, no Estado de Gois

    existem poucos dados a este respeito), sua fenomenologia e sua patofisiologia relacionada

    s apresentaes possveis.

    Assim o conceito de demncia associada Neurocisticercose encontra-se ainda mal

    elaborado, carecendo de maior nmero de estudos para a elucidao de questes pendentes

    sobre: 1) os elementos clnicos, laboratoriais, neuropatolgicos e neuroimagem especficos,

    marcadores ou pelo menos sinalizadores do processo demencial vinculado

    Neurocisticercose; 2) as reais prevalncia e incidncia da Demncia Neurocisticerctica. As

    dificuldades na estruturao do conceito de demncia Neurocisticerctica devem-se

    fundamentalmente confuso e falta de preciso terminolgica e conceitual para descrever

    o processo demencial nos estudos disponveis e a carncia de trabalhos que enderecem

    especificamente a sndrome demencial nesta parasitose.

    O assunto em pauta um tema de relevncia porque trata-se de uma demncia

    muito comum (ainda que subdiagnosticada), passvel de preveno atravs de medidas

    sanitrias que aplicados a tenase, previnem a NCC, e conseqentemente suas

    complicaes.

  • 36

    2 -OBJETIVOS

    Avaliao de variveis demogrficas de uma amostra goiana de pacientes

    portadores de NCC

    Identificar as manifestaes comportamentais da forma psquica da

    Neurocisticercose em Gois, atravs do uso de instrumentos diagnsticos

    estandardizados e escalas comportamentais consagradas.

    Relacionar o padro de alteraes comportamentais na neurocisticercose com o

    padro topogrfico das leses nos exames de neuroimagem (Tomografia

    Computadorizada de Crnio e/ou Ressonncia Magntica ).

    Caracterizar os padres de dficits cognitivos na demncia causada pela

    Neurocisticercose atravs do uso de instrumentos diagnsticos estandardizados e

    testes cognitivos de uso consagrado e associ-los aos achados de neuroimagem

    (Tomografia Computadorizada de Crnio e RM).

    Estimar a prevalncia da forma psquica da Neurocisticercose em relao s outras

    formas da doena.

    Estimar a prevalncia de demncia nos pacientes portadores de Neurocisticercose,

    na forma psquica.

  • 37

    3- MATERIAL E MTODOS

    MATERIAL

    Estudo prospectivo desenvolvido junto ao Departamento de Medicina Tropical, e

    Dermatologia, nas enfermarias e ambulatrios do Hospital de Doenas Tropicais (HDT) e

    Hospital das Clnicas da UFG.

    O delineamento desse estudo de prevalncia permite medir a freqncia da

    ocorrncia do evento (forma psquica), na populao de pacientes com neurocisticercose,

    em um perodo de tempo determinado.

    Foram avaliados uma amostra de adultos portadores de Neurocisticercose. Oitenta e

    dois (82) pacientes consecutivos, entre 18 e 72 anos de idade, no selecionados

    previamente, atendidos no Hospital de Doenas Tropicais, e no Hospital das Clnicas, pelo

    servio de neurologia, no perodo de 03/ 2004 at 07/ 2006.

    Os pacientes com a forma ativa vesicular da neurocisticercose (14 pacientes)

    receberam albendazol 15mg/kg/dia, dose padro. Pacientes com outras condies mdicas,

    como HIV, ou neurolgicas no decorrentes da Neurocisticercose, ou psiquitricas prvias

    foram excludos, assim como alcolatras e usurios de substncias ilcitas. Ao todo seis (6)

    pacientes excludos, restando um quantitativo de setenta e seis (76) pacientes que foram

    includos no estudo.

    Todos os pacientes com diagnstico provvel ou definitivo de NCC de acordo com

    os critrios de Del Bruto (2001).O diagnstico foi baseado em achados de neuroimagem

    aliados sintomatologia clnica e epidemiologia positiva , j que Gois uma rea de alta

    endemicidade para NCC (Chimelli et al, 1998).

    Os pacientes com leses calcificadas pontuais foram considerados portadores de

    Neurocisticercose, baseado na alta prevalncia de NCC na nossa regio e em vrios

    critrios para diferenciar as leses de NCC de infeces por tuberculose ou fngicas

    (Rajshekhar e Chandy, 1997). Nenhum dos nossos pacientes apresentava evidncia dessas

    infeces em outras partes do corpo, nem foram tratados com medicaes antituberculosas

    ou antifngicas.

  • 38

    O Comit de tica e Pesquisa do HDT autorizou o projeto em questo com

    Protocolo de n 013/20023. Todos pacientes foram submetidos a um termo de

    consentimento informado assinado pelos pacientes, ou familiares responsveis.

  • 39

    MTODOS

    Os pacientes foram submetidos s seguintes modalidades de avaliao:

    1 Avaliao da escolaridade e idade

    2 Avaliao cognitiva, utilizando-se o Mini-Exame do Estado Mental (MEEM)

    (Folstein et al, 1975; Engelhardt et al, 2003) e o Questionrio de Atividades da vida diria

    (QAVD) (Pfeffer et al, 1982).

    MEEM com pontos de corte diferenciados segundo o nvel de instruo (13 para

    analfabetos, 18 para aqueles com at 8 anos de escolaridade e 24 para aqueles com

    mais de oito anos) (Bertolucci et al, 1994).

    3- Avaliao comportamental, utilizando-se um instrumento psicomtrico

    estandardizado para entrevista e diagnstico psiquitrico, o INP (Inventrio

    Neuropsiquitrico) (Cummings, 1994; Cummings, 1997).

    O inventrio neuropsiquitrico uma ferramenta par avaliar a psicopatologia

    em pacientes com desordens neurolgicas. Uma questo de varredura avalia cada

    uma dos domnios do NPI - delrios, alucinaes, agitao psicomotora, depresso,

    ansiedade, euforia, apatia, desinibio, irritao, comportamento motor aberrante.

    Duas questes sobre os sintomas neurovegetativos, incluindo alteraes no apetite e

    no sono fazem parte do questionrio. Se a pergunta do rastreamento positiva,

    ento outras perguntas so feitas e avaliadas a freqncia (de 1 a 4, 4 sendo o mais

    freqente) e a gravidade (de 1 a 3, 3 como o mais grave) do comportamento. Para a

    anlise, obtm-se um ndice multiplicando a freqncia e a gravidade de cada

    domnio (de 1 a 12). Colhem-se os pontos para cada domnio e para todo o

    instrumento (Cummings et al, 1994).

    A validade e a confiabilidade do instrumento foram demonstradas

    (Cumming et al, 1994). H vrias pesquisas com o INP, em demncia vascular,

    traumatismo cerebral, no idoso no demenciado, na encefalopatia do HIV, apatia,

    depresso nas doenas neurolgicas (Cummings, 1997). E ainda na Demncia

    Semntica (Rosen et al, 2006) e na Doena de Parkinson (Aarsland et al, 2007).

  • 40

    4- Avaliao funcional, utilizando-se, utilizando-se a Escala de Atividades da vida

    diria (QAVD) (PFEFER et al, 1982), como auxlio definio do diagnstico de

    demncia .

    5- Avaliao de neuroimagem estrutural, realizando Tomografia Computadorizada

    cerebral em todos os pacientes, como auxlio definio diagnstica de

    Neurocisticercose e para definir o padro anatmico das leses e da forma de

    demncia (cortical, subcortical, localizada, difusa, etc), bem como correlacion-los

    com alteraes cognitivas e comportamentais detectadas. Cabe ressaltar que este

    exame feito de rotina pelo SUS para pacientes com suspeita de Neurocisticercose

    e portanto no acarretou qualquer nus para os pacientes. RM crnio foi realizada

    em alguns pacientes com leses csticas.

    6 - Critrios diagnsticos do DSM-IV, aplicados aos pacientes com possvel doena

    mental segundo as entrevistas acima (Associao Americana de Psiquiatria, 1994).

    7- Estatstica descritiva foi aplicada para avaliar as apresentaes da forma psquica

    (mdia, desvio-padro, freqncia). O odds ratio e respectivos intervalos de 95% de

    confiana (IC 95%) foram calculados para avaliar a associao entre variveis

    potenciais de risco e NCC. Testes estatsticos no-paramtricos foram utilizados

    para comparar os grupos de pacientes da forma-psquica e no psquica (Qui-

    quadrado para tabelas 2x2, ou teste exato de Fischer, quando diante de limitaes

    numricas para o uso do primeiro). Valores de p menores que 5% foram

    considerados estatisticamente significativos. A anlise de dados foi realizada atravs

    do programa Epi Info, verso 6.04 (CDC 2001).

  • 41

    4 RESULTADOS Caracterizao da amostra:

    Todos os 76 pacientes so brasileiros e residentes em Gois. H uma predominncia

    do sexo feminino: 63% da amostra (tabela 2). Entretanto, pacientes com sexo masculino

    tiveram um risco 1,86 maior de apresentarem a forma psquica quando comparados com o

    sexo feminino, mas no significativo (p=0,1) (tabela 5).

    A amostra apresenta baixos nveis educacionais (66 % tm menos de 8 anos de

    escolaridade). Esse grupo apresenta um risco 2 vezes maior de apresentar a forma psquica

    quando comparados ao grupo com maior escolaridade (> ou igual a 8 anos), entretanto no

    significativo (p = 0,1) (Tabela 5).

    A idade dos pacientes variou de 18 a 72 anos (mdia: 38,3 anos, desvio padro: 13,8

    anos). Pacientes idosos (>60 anos) na amostra geral no tiveram risco aumentado de

    apresentarem a forma psquica em relao aos mais jovens (IC: 0,01- 1,12)(tabela 5).

    A NCC foi considerada inativa, forma calcificada ou hidrocefalia sem sinais de

    inflamao, em 53 (70 %) casos e ativa em 23 (30 %) casos (14 vesculas e 9 cistos em

    degenerao). Na forma psquica, existem 12 pacientes com a forma ativa na neuroimagem.

    Na forma no psquica, existem 11 pacientes. Entretanto, pacientes com a forma ativa da

    NCC no apresentaram risco maior de apresentarem a forma psquica quando comparados

    com os pacientes com a forma inativa da NCC (OR:0,97; IC 95%: 0,4-2,6) (tabela 5).

    Ambos hemisfrios foram igualmente afetados, incluindo leses em todas as reas

    corticais e subcorticais (tabela 1). Leses parenquimatosas foram geralmente mltiplas e

    muitas em diferentes estgios de evoluo. A amostra contm 6,6% de pacientes

    assintomticos, todos com forma inativa calcificada.

    Tabela 1 Distribuio das leses parenquimatosas segundo as regies cerebrais

    acometidas: nmero de pacientes com leses nas respectivas localizaes

    Hemisfrio Direito Hemisfrio Esquerdo

    Lobo Frontal 28 24

    Lobo Temporal 29 26

    Lobo Parietal 29 33

  • 42

    Lobo Occipital 14 20

    Gnglios da Base 10 15

    N 110 118

    Tabela 2 Variveis demogrficas (n=76) e escalas padronizadas de avaliao

    cognitiva, funcional e comportamental

    Idade anos (mdia) 38 (18 72)

    Sexo Homens 28 37%

    Mulheres 48 63%

    Escolaridade 0-3anos 23 30 %

    4-7 anos 27 36 %

    8 ou mais anos 26 34 %

    Escala de Atividades da 0 60 79%

    Vida Diria > 0 16 21%

    (MEEM) Mini-Exame 0-20 11 15%

    do estado Mental 21-30 65 85%

    (NPI) Inventrio 0-9 34 47 %

    Neuropsiquitrico 10-29 30 39%

    > ou igual 30 12 16%

    MEEM. Com relao amostra geral de 76 pacientes, a distribuio dos escores do MEEM

    variaram de 9 a 30. A avaliao pelo Mini-Exame do estado mental tem 85% da amostra

    entre 21-30 pontos (grupo com cognio preservada) (Tabela 2). O subgrupo de pacientes

    com demncia tem as mais baixas pontuaes no MEEM (mdia: 13; dp: 2,6), j que tal

    questionrio avalia cognio

    QAVD- Avaliao pelo questionrio de atividades da vida diria tem 79% da amostra com

    zero pontos (sem restries nas atividades da vida diria) (tabela 2). Portanto, pacientes

    com pontuaes na escala de atividades da vida diria (Pfeffer) maior que zero, tem um

    risco de pelo menos 5,3 maior de apresentar a forma psquica, quando comparados com os

    pacientes com pontuao igual a zero (IC95%: 1,3-20,5; p= 0,009) (tabela 5). No subgrupo

  • 43

    de pacientes com demncia, encontramos os maiores valores de Pfeffer (md 19, dp: 8), j

    que esse questionrio importante para auxiliar no diagnstico de demncia.

    INP .A avaliao pelo INP tem 45% da amostra entre 0 e 9 pontos (grupo sem ou

    com poucas alteraes em domnios psiquitricos), variando os seus valores de 0 a 110

    (tabela 2). O subgrupo de pacientes com demncia e os pacientes com transtorno psictico

    tm os maiores valores de INP. A elevao dos escores do INP devem ser considerados

    como evidncia importante da presena de psicopatologia (tabela 4).

    O INP avaliando os sintomas dos 76 pacientes com NCC, sem considerar

    intensidade ou freqncia, revela 53% de sintomas ansiosos (40), seguida por irritabilidade

    em 46% (35) e disforia 41% (31), agitao psicomotora 32%(24), apatia 24% (18), delrios

    15% (12), alucinaes 13% (10), desinibio 5% (4), comportamento motor aberrante 4%

    (3) e elao do humor 3% (2) .

    Avaliando os domnios do INP, nos 40 pacientes da forma psquica, os sintomas

    ansiosos foram os mais encontrados (70% dos pacientes), seguida por irritabilidade e

    disforia (65% cada), agitao psicomotora (57%), apatia (37%), delrios (30%), alucinaes

    (25%), desinibio (10%), comportamento motor aberrante (7%) e elao do humor (5%)

    (tabela 3). Relacionando o INP, com o MEEM, notamos que cinco anormalidades

    neuropsiquitricas aumentarem com a gravidade da demncia na NCC : a agitao

    psicomotora, os delrios, as alucinaes, a desinibio e o comportamento motor aberrante.

    Houve uma reduo de sintomas de ansiedade nos pacientes com demncia e NCC. A

    tabela 3 mostra as porcentagens dos pacientes nos diferentes estgios de cognio, com

    sintomas neuropsiquitricos.

    No grupo de pacientes com NCC, sem a forma psquica, no foram encontrados

    pacientes com pontuao nos domnios de delrios, alucinaes, desinibio, elao do

    humor e comportamento motor aberrante no INP. Os respectivos domnios de disforia,

    ansiedade, apatia e irritabilidade apresentaram baixa pontuao no grupo de forma no

    psquica. Apatia no um sintoma encontrado nos controles normais do NPI (Cummings et

    al, 1994). Nos pacientes dessa amostra, a apatia justifica-se pelo uso de drogas

    anticonvulsivantes em dois pacientes com epilepsia e um com forma de parkinsonismo e

    uso de drogas anticonvulsivantes.

  • 44

    Tabela 3 Porcentagem dos 40 pacientes com a forma psquica de NCC apresentando

    diferentes pontuaes MEEM que exibem sintomas neuropsiquitricos no INP

    Sintomas MEEM 30-21 MEEM 20-11 MEEM 10-0 Total

    n=31 n=7 n=2 n=40

    Ansiedade (80%) 25 (43%) 3 (0%) 0 (70%)

    Irritabilidade (61%)19 (100%)7 (0%) 0 (65%)

    Disforia (50%) 20 (71%) 5 (50%) 1 (65%)

    Agitao (45%) 14 (100%) 7 (100%) 2 (57%)

    Apatia (32%) 11 (43%) 3 (50%) 1 (37%)

    Delrios (19%) 6 (71%)5 (50%) 1 (30%)

    Alucinaes (19%) 6 (43%) 3 (50%)1 (25%)

    Desinibio (3%) 2 (14%) 1 (50%) 1 (10%)

    CM* (0%)/ 0 (28%) 2 (50%) 1 ( 7%)

    Elao (7%) 2 (0%) 0 (0%) 0 ( 5%)

    MEEM 10-0 demncia grave, 20-11 demncia moderada, 30-21 normais a demncia leve

    CMA* comportamento motor aberrante

    Tabela 4- Avaliao da mdia e desvio padro e percentagem da escolaridade, idade, sexo e

    questionrios de avaliao cognitiva entre a forma psquica e no-psquica.

    MEEM Pfeffer INP Idade

    mdia

    Sexo

    Mascu-

    Lino

    Sexo

    Femi-

    nino

    Escolaridade

    Forma

    No-

    Psquica

    md:26

    dp:3,5

    md: 1

    dp:3

    md:3

    dp: 3

    md:39

    dp: 16

    54% 44% Md: 7

    Dp:5

    Forma

    Psquica

    md:24

    dp:6

    md: 4

    dp: 8

    md:26

    dp: 19

    md:37

    dp:12

    46%

    56% md:5

    dp: 4

  • 45

    Tabela 5 Avaliao estatstica das variveis idade, escolaridade, sexo, qualidade de vida nas formas psquicas e no-psquicas Forma no-Psquica Forma Psquica Sexo Masculino Sexo Feminino

    16 20

    12 28

    Odds:1,86 IC: 0,7- 4,7 Teste X2 p= 0,1

    Idade < 60 a Idade > ou = 60 a

    30 6

    39 1

    Odds: 0,12 IC: 0,01-1,12 Teste Exato Fischer P = 0,04

    Leses Ativas Leses Inativas

    25 11

    28 12

    Odds: 0,97 IC: 0,37 - 2,6 Teste X2 p=0,48

    Escolaridade > ou = 8 anos Escolaridade < 8a

    12 24

    8 32

    Odds: 2,0 IC: 0,7-5,6 Teste X2 p= 0,1

    Pfeffer =zero Pfeffer > 0

    33 3

    27 13

    Odds: 5,30 IC: 1,3-20,5 p= 0,009 Teste Exato Fischer

  • 46

    Neuroimagem

    Pacientes com leses no lobo frontal direito tiveram um risco 4,6 maior de apresentarem a forma psquica, quando comparados com pacientes sem leses da NCC no lobo frontal direito, o que estatisticamente significativo (p = 0,0016). E ainda pacientes com leses nos gnglios da base a direita tiveram um risco 10,1maior de apresentarem a forma psquica, quando comparados com pacientes sem leses da NCC nos gnglios da base a direita, o que foi significativo (p =0,01). As demais topografias no apresentaram relao estatisticamente significativa com a forma psquica da Neurocisticercose (tabela 6).

    Tabela 6 Comparao entre topografia das leses ativas e inativas entre a forma psquica e no psquica nos 76 pacientes Topografia Presena de

    Leses Forma No -Psquica

    Forma Psquica

    OR, p, teste utilizado

    Frontal Esquerdo

    Ausente Presente

    28 8

    24 16

    OR: 2,3 IC: 0,85-6,4 Teste X2 p=0,052

    Frontal - Direito

    Ausente Presente

    29 7

    19 21

    Odds ratio: 4,6 IC: 1,6- 12,8 Teste X2 p= 0,0016

    Temporal Esquerdo

    Ausente Presente

    26 10

    21 19

    Odds ratio: 2,3 IC: 0,9-6,1 Teste X2 p= 0,04

    Temporal Direito

    Ausente Presente

    26 10

    24 16

    Odds ratio: 1,7 IC: 0,66 - 4,55 Teste X2 p=

    Parietal Esquerdo

    Ausente Presente

    18 18

    25 15

    Odds ratio: 0,6 IC: 0,2 1,49 Teste X2 p= 0,14

    Parietal Direito Ausente Presente

    23 13

    24 16

    Odds ratio: 1,18 IC: 0,47 2,98 Teste X2 p= 0,37

    Occipital Esquerdo

    Ausente Presente

    26 10

    30 10

    Odds ratio: 0,86 IC: 0,3 2,4 Teste X2 p= 0,4

    Occipital Direito

    Ausente Presente

    30 6

    32 8

    Odds ratio: 1,25 IC:0,39- 4 Teste X2 p= 0,36

    Gnglio Base Esquerda

    Ausente Presente

    30 6

    31 9

    Odds ratio: 1,4 IC: 0,4- 4,6 Teste X2 p= 0,36

    Gnglio Base Direita

    Ausente Presente

    35 1

    31 9

    Odds ratio: 10,1 IC: 1,2- 84 p=0,01 Teste Exato Fischer

  • 47

    Formas Clnicas. A forma clnica mais freqentemente encontrada foi epilptica, quer seja

    isolada, ou associada, tendo surgido em 51 pacientes (67%). A forma psquica foi

    identificada em 40 (53%) pacientes. Pacientes com apresentao de cefalia, pura ou

    associada, em 33 pacientes (43%). Trs (4%) com hidrocefalia. Com mais de uma forma

    clnica associada foram 46 pacientes (60%) (Tabela 7). A forma psquica foi identificada

    em 40 (53%) pacientes.

    Um paciente (1,3%) com a forma de parkinsonismo. Apresentava leses ativas

    bilaterais e derivao ventrculo peritoneal por hidrocefalia Ao exame clnico, face em

    mscara, fala hipofnica e montona, marcha parkinsoniana, hipertonia global, com

    tremores de repouso em ambas as mos e acentuadas pela ao, alteraes no equilbrio,

    movimentos sacdicos dos olhos lentificados com diminuio do piscamento. No

    apresentava alteraes de sensibilidade, pares cranianos ou reflexos tendinosos.

    Apresentava apatia, sem humor deprimido. Foi tratado com levodopaterapia, e apresentou

    piora acentuada do parkinsonismo com o incio do tratamento com albendazol para a NCC.

    No acompanhamento houve remisso completa dos sintomas e encontra-se assintomtico,

    sem necessidade de medicaes.

    Tabela 7 Manifestaes clnicas e atividade na neurocisticercose em 76 pacientes

    nFormas Clnicas Ativa Inativa Total Porcentagem

    Epilepsia 7 8 15 19,7%

    Epilepsia com Cefalia................................. 0 5 5 6,6%

    Epilepsia com forma psquica....................... 7 13 20 26,3%

    Epilepsia com cefalia e forma psquica....... 4 7 11 14,5%

    Hidrocefalia com cefalia 1 1 2 2,6%

    Parkinsonismo.com Hidrocefalia ............... 1 0 1 1,3%

    Cefalia . 2 6 8 10,5%

    Cefalia com forma psquica . 1 6 7 9,2%

    Forma Psquica isolada 0 2 2 2,6%

    Assintomticos. 0 5 5 6,6%

    Total 23 53 76 100%

  • 48

    Grfico 1 - Forma Psquica da NCC

    0%

    5%

    10%

    15%

    20%

    25%

    DepressoAnsiedadeDemnciaPsicosePers OrgnicaTr Maniforme

    As subformas foram categorizadas de acordo com o DSM-IV (grfico 1). Sete

    pacientes (9,2%) apresentaram-se com Demncia. Apresenta-se com idade mdia de 45

    anos (dp:12); 71% de mulheres, escolaridade mdia de 1,3 anos (dp:2), Pfeffer com mdia

    de 19 (dp:8); INP com mdia de 48 anos (dp:32); MEEM md: 13 (dp: 2,6).

    Temos que 6 (86%) tm formas inativas da NCC e um com forma ativa (figura 1a e

    1b). Nenhum apresenta hidrocefalia. Na topografia das leses, dos sete com diagnstico de

    demncia, seis tm leses em lobos frontais e temporais bilateralmente. O outro paciente

    pode ser classificado como pseudodemncia depressiva e apresenta leses calcificadas

    apenas em hemisfrio direito. Cinco pacientes com demncia so analfabetos (71%) e seis

    dos sete (86%) pacientes com demncia tm epilepsia.

    Figura 1a e 1b- TCC com mltiplas vesculas em paciente com subforma de demncia

    Entre os sintomas psquicos, no houve paciente com apresentao tpica de

    esquizofrenia, mas Transtorno Psictico estava presente em quatro casos (5,3%). So dois

    pacientes com a forma inativa, TCC mostrando mais de 20 calcificaes, e dois com a

  • 49

    forma ativa, um com colide e outro com vescula (figura 2a e 2b). Nenhum com

    hidrocefalia, ou hipertenso intracraniana. Idade mdia de 37 anos (dp:8); escolaridade

    mdia :4 (dp:3); Pfeffer mdia: 6 (dp:5); INP mdia: 36 (dp:16); MEEM mdia:24 (dp:4).

    Figura 2a e 2b- TCC com mltiplas vesculas em paciente com subforma psictica

    Transtorno Maniforme em um paciente (1,3%). A neuroimagem tem colide no

    lobo frontal esquerdo, que no acompanhamento apresentou resoluo espontnea (figura 3a

    e 3b) (tabela 8).

    Figura 3a- TCC com colide frontal esquerdo em paciente com subforma maniforme e 2-b TCC com

    vescula frontal direita em paciente com subforma psictica

    Transtorno Depressivo ocorreu em 15 pacientes, incluindo 01 paciente com

    diagnstico de Depresso com sintomas Psicticos (20 %). Desses, 33% apresentavam

    forma ativa (tabela 8). Esse grupo de pacientes com mdia de idade de 39 anos (dp: 12),

    80% de sexo feminino, escolaridade mdia: 4 (dp: 3), apresenta MEEM com mdia 26

    (dp:4); Pfeffer mdia:1( dp:3); INP mdia:21 (dp 7).

  • 50

    Transtorno de Ansiedade em 11 pacientes (14,5%), com mdia de idade 33 (dp:12),

    escolaridade mdia de 07 anos (dp: 4); com 64% de mulheres. Dos pacientes, 18% tem

    forma ativa da doena (tabela 6). O grupo tem MEEM com mdia:27 pontos (dp : 3),

    Pfeffer mdia:0; INP: mdia:17 (dp:7).

    Personalidade Orgnica em 2 pacientes (2,6%) (tabela 8).

    Pacientes com forma psquica isolada foram 2 (Demncia e Ansiedade).

    Tabela 8 Manifestaes das subformas psquicas e atividade na neurocisticercose (40 pacientes)

    nFormas Clnicas Ativa Inativa Total Porcentagem

    Depresso 5 10 15 20%

    Ansiedade 2 9 11 15%

    Demncia 1 6 7 9 %

    Transtorno Psictico 2 2 4 5 %

    Personalidade Orgnica 1 1 2 3 %

    Transtorno Maniforme 1 0 1 1%

    Total 12 28 40 53%

  • 5 DISCUSSO Poucas publicaes consideraram a forma psquica da NCC e, em sua grande

    maioria, sem instrumentos apropriados para identificar os sintomas neuropsiquitricos leves

    e a cognio. A prevalncia da demncia na NCC, apesar de ser citada como uma

    apresentao comum, ainda no estava bem definida, com amplas variaes na decorrncia

    do estudo considerado. Ns descrevemos sintomas neuropsiquitricos em amostra goiana

    de pacientes com NCC.

    Esse estudo confirma que manifestaes psiquitricas so comuns em NCC, com

    53% de forma psquica em uma amostra de pacientes da neurologia. Nota-se que, com

    avaliao dos sintomas pelo inventrio neuropsiquitrico, a grande maioria dos pacientes

    apresentam sintomas. A ansiedade foi a anormalidade psiquitrica mais encontrada nesse

    grupo (53%), seguida de irritabilidade (46%) e disforia (41 % cada). Os sintomas de

    desinibio, comportamento motor aberrante e elao do humor foram os menos

    encontrados, e no foram identificados nos pacientes sem a forma psquica.

    chamativa a alta proporo de pacientes com diagnstico de transtorno depressivo

    (20%) e transtorno de ansiedade (15%) pelos critrios do DSM-IV. Foi tambm o principal

    achado clnico no estudo de Forlenza (1998). Entre os pacientes da nossa amostra, com

    depresso, o percentual de forma ativa (33%) no se destaca da amostra total (30%).

    Avaliando a amostra de 76 pacientes, a atividade da NCC no representou um risco para a

    forma psquica. Atividade de doena possivelmente relacionada com desordens orgnicas

    do humor em outras patologias (Forlenza et al, 1997). Na neurocisticercose, esse dado no

    foi comprovado no presente estudo.

    Na amostra estudada, os pacientes com demncia (9,2%) so em sua grande maioria

    analfabetos (71%) e/ou tm epilepsia (86%), o que torna seu crebro mais