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A PlU\NCBETA, O CANTEIRO E A DURABILIDADE 00 CONSTRut00 1 "Ac.lLedi:tei~elL nec.e~~ã.lLio :tlta:talt de ~ua valtiedade (do~ ma:teltiaMJ, de ~ua~ dinelLen:te~ plLopltiedade~ e do~ divelt~o~ u~o~ que dele~ ~e podem nazelL na c.on~:tlLução do~ edinXc.io~, palta que quando e~~a~ pltoplLiedade~ ~ejam c.onhec.ida~ pelo~ que queltem ediôic.alL não c.ome:tam elLlLo~e po~~am plLovelt-~e do~ ma:teltiai~ ap:to~ e aplLopltia- do~ palta ~ua~ c.on6:tlLuç~e~." M. Vitruvio Livro 11 Cap.II RESUMO OenvelheciJoento precoce da arquitetu- ra roodemacEve-se, basicanente, ao cEScx:nhec:imento da ciência ete01olo- gia dos materiais cE CXJI'lStrução, a Ícmnação superficial dos aIqUitetos e engenheiros na mti. versiéIacE de massa, ã cisão projeto-obra e ã insignificância dos investimentos empesquisa no nosso pais. Esttrlos mais :reoontes sd::>:re CCIl- servação/:restauração têm oonduzido a una maior preocupação sobre os proble- mas da durabilidade dos materiais de cx:nstrução, cE maneira geral, rep:re- sentanéb una im:msa ccntribuição para aurentar a longeviéIacEdo nr::x:Emo cx:nstruIdo. Ap:resentam-sealguns fenô- menos cE d9gradação muito estudados na cx:nservação/:restauração, qtE podemle- var-nos a una :reflexao mais aprofunda- da do uso cE materiais no roc:m:mto da cEcisão cE utilizá-los judicios.:mmte, quer no projeto, qtEr na obra. * Arquiteto, Professor da Faculdade de Arquitetura da UFBa e·Coordenador do Núcleo de Tecnologia da Preservação e da Restauração - Nl'PR(FAUBa/SPHAN) RUA,Salvador,v.2,n.3,p.II~-131,1989

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A PlU\NCBETA, O CANTEIRO E A

DURABILIDADE 00 CONSTRut001

"Ac.lLedi:tei~elL nec.e~~ã.lLio :tlta:taltde ~ua valtiedade (do~ ma:teltiaMJ,de ~ua~ dinelLen:te~ plLopltiedade~e do~ divelt~o~ u~o~ que dele~ ~epodem nazelL na c.on~:tlLução do~edinXc.io~, palta que quando e~~a~pltoplLiedade~ ~ejam c.onhec.ida~pelo~ que queltem ediôic.alL nãoc.ome:tamelLlLo~ e po~~am plLovelt-~edo~ ma:teltiai~ ap:to~ e aplLopltia-do~ palta ~ua~ c.on6:tlLuç~e~."

M. VitruvioLivro 11 Cap.II

RESUMOOenvelheciJoento precoce da arquitetu-ra roodema cEve-se, basicanente, aocEScx:nhec:imentoda ciência ete01olo-gia dos materiais cE CXJI'lStrução, aÍcmnação superficial dos aIqUitetos eengenheiros na mti.versiéIacE de massa,ãcisão projeto-obra e ã insignificânciados investimentos empesquisa no nossopais. Esttrlos mais :reoontes sd::>:reCCIl-servação/:restauração têm oonduzido auna maior preocupação sobre os proble-mas da durabilidade dos materiais decx:nstrução, cE maneira geral, rep:re-sentanéb una im:msa ccntribuição paraaurentar a longeviéIacEdo nr::x:Emocx:nstruIdo. Ap:resentam-se alguns fenô-menos cE d9gradação muito estudados nacx:nservação/:restauração, qtE podemle-var-nos a una :reflexao mais aprofunda-da do uso cE materiais no roc:m:mto dacEcisão cE utilizá-los judicios.:mmte,quer no projeto, qtEr na obra.

* Arquiteto, Professor da Faculdade de Arquiteturada UFBa e·Coordenador do Núcleo de Tecnologia daPreservação e da Restauração - Nl'PR(FAUBa/SPHAN)•

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Se nos permitido fosse delinear um quadro do exer-cicio profissional da arquitetura no Brasil, porcerto destacaríamos que, embora nos caibam muitoslouvores e o reconhecimento da comunidade interna-cional, frutos da criatividade dos que tiveram oprivilégio de nascer nesta terra mestiça, a nossaformação ainda continua padecendo do que podería-mos designar como "síndrome do Padre Eterno". Umdos sintomas é a falsa sensação de podermos exer-cer a criação de maneira onipotente, sem barreirasou limites, não importando os materiais dos quaislançamos mão, a tecnologia do seu emprego e asleis físicas que regem as estruturas. Esta atitu-de, a rigor, é uma superação da própria onipotên-cia do "Arquiteto do Universo", que soube pela in-finita sabedoria respeitar, na sua criação, asleis físicas e cósmicas, que regem todas as coi-sas, do átomo às galáxias.

Não é necessário ser arguto observador para poderverificar o envelhecimento anômalo da nossa arqui-teturamoderna,em um arco de tempo relativamentecurto, condições de efemeridade que são um desser-viço à sociedade, fadada a pagar o ônus do despre-paro dos criadores do fabricado, que em certos ca-sos tangenciam os limites da leviandade. Dentro damesma linha de discurso, nem seria necessário des-tacar os prejuízos de ordem estética ao acervoconstruido e os arranhões que sofre a ética pro-fissional: Não está na nossa cogitação aprofundar-mos reflexões sobre o momento histórico da nossacultura no qual aconteceu o que podertamos denomi-nar de "grande cisma" entre o projeto e o cantei-ro, entre a arte da arquitetura e a tecnologia dasRUA,Salvador,v.2,n.3,p.117-l3l,1989

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Tal argumento já toi objeto das nossas ponderaçõesem outras oportunidades2• As nossas meditaçõesbuscam entender o fato de nao termos assumido naprojetação da arquitetura, embora já tenhamos pal-milhado dois seculos de Revolução Industrial, aconsciência da necessidade da preparação tecnol6-gica dos seus operadores - os arquitetos ~ aías-tando o estigma que marca estes conhecimentos nasua formação.

Para infcio da argumentação, e necessário subli~nhar que o ato da criação da arquitetura nao e umprocesso puramente poetico e intuitivo, com pince-ladas da experiência visiva das coisas que noscercam e dos nossos condicionamentos sociais. Acriação responsável, especialmente no caso da ar-quitetura, que entre todas as expressões da artee a mais submissa às condições materiais, deve~sefundamentar em pressupostos tecnológicos a seremusados consciente e subconscientemente, produtode boa formação mental dos profissionais. Cabelembrar aqui uma afirmativa de Perret nas suascontribuições â teoria da arquitetura: "Tlc.n-i.c.a.,pe~ma.nente homena.gem 6e-i.ta. a na.tu~eza., a.t-i.mentoe.6.6enc.-i.a.t da. -i.ma.g-i.na.ç.iio,tíonte autênt-i.c.a. de -i.l1.6p-i.-

~a.ç.ão, p~ec.e, de toda..6 a. ma.-i..6etí-i.c.a.z, tZngua. 'ma.-te~' de todo c.~-i.a.do~. Têc.n-i.c.a.tía.ta.da.po~ poeta. no.6c.onduz a a.~qu-i.tetu~a.,,3.

o ato de projetar, pois, implica uma conjugação devetores criativos e tecnicos, inseparãveis, cujadicotomia trará certamente resultados indesej~s.RUA,Salvador,v.2,n.3,p.ll7~l3l;l989

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Dentro da mesma linha de associação não se poderãjamais prescindir, no processo da atividade cien-tlfica e tecnológica, da criatividade e da intui~ção.

Seria bom tamb~m que ficasse bem-çlara a fronteiraentre a sems'ntica dos termos tecnolo<]iae "tecno-logismo", p=nnitéllll'"ilea expressão. Deve-se entenderaquela como produto da indagação cientffica s~ria,dentro de uma metodologia especIfica de abordageme estudo, e este não sendo mais que reles modismo,cujas propostas, às vezes revestidas do ~tdtu~ de"pedra filosofal", não resistem a uma análise ci~entífica mais aprofundada. As soluções "tecnolo-<]istas" são incapazes de suportar a ação do uso oudo tempo, dentro de limites razoáveis, quando naosão verdadeiros desastres tendo presente, eviden-temente, que nada ê eterno.

Diante da estropiada tectônica que povoa as nossascidades, de construções fadadas à degradação e aoenvelhecimento precoces ou já senis, ê necessáriorefletirmos um pouco nas nossas universidades eorganizações profissionais, para encontrarmos asformas de ensino adequadas às novas gerações, afim de que não continuemos a corar de vergonhadiante da qualidade de edif!cios legada pelos an-tigos, mesmo em uma ~poca onde os recursos tecno-lógicos eram menores e os estudos científicos so-bre os materiais ainda inexistentes.

Em linhas gerais, seria lícito relacionarproblemas de mais direta identificação,ã formação profissional ou a fenômenosRUA,Salvador,v.2,n.3,p.117-13l,1989

algunsrelativosconjuntu-

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rais, que têm a ver com a qualidade e a durabili-dade dos edit!cios entre nós:

a) Formação superficial dos arquitetos (e tambémde engenheiros) sobre as reais qualidades e defei-tos dos materiais e seu judicioso emprego na cons-trução.

b) Divórcio do exercício profissional da arquite-tura da intimidade com os canteiros de obras.

c) Aplicação pouco criteriosa de novos materiaissem os testes adequados e sem o conhecimento decomo estes se comportam diante do Uso e qual a suaprovável longevidade.

d) Pouco incentivo e pouca disposição para a pes-quisa aplicada, para melhor conhecimento das ca-racterísticas dos diversos materiais.

e) Falta de boas normas de qualidade para corretaespecificação nos projetos e a não-observação dasexistentes.

Temos vislwnbrado o encaminhamento parcial do pro-blema na formação projetual dos arquitetos no cam-po especIfico da conservação/restauração. O conta-to prolongado e diário com os problemas do compor-tamento, ao longo do tempo, dos materiais e dasestruturas, suas mazelas e agentes agressivos aserem considerados são, de certa forma, fatoresativadores intelectuais da necessidade de conhecerbem melhor a ciência e a tecnologia desenvolvidasna construção. Esta atividade, cujo exercício é tãogratificante, pelo diálogo que nos é possível es-tabelecer com a criação dos nossos antigos, exer-RUA,Salvador,v.2,n.3,p.117-l3l,1989

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cita a difícil arte de recriar sobre estruturasexistentes, permitindo patentear a incapacidade deprojetarmos sem apoio de uma metodologia científi-ca e de conhecimentos tecnol6gicos,que nos propi-ciem a ori"entação correta dos nossos projetos deintervenção, tanto a n!vel de edifício isolado,quanto a nível de centro histórico. Neste caso, aspropostas representadas nas duas dimensões de umdesenho ou mesmo nas três dimensoes reduzidas deuma maquete não ultrapassam muito mais do que ametade das decisões finais executadas. Em resumo,a projeção tem inIcio na prancheta e continua natecnologia do canteiro com sucessivas adequaçoesdas hipóteses iniciais.

o projeto de um edif!cio novo, sem as restriçoesimpostas por um antigo organismo arquitetõnicoconstruído, que merece ser respeitado total ouparcialmente, permite um maior número de decisõesde prancheta, mas só mesmo quem nunca tentou exe-cutar o que projetou ou o que outros projetarampode ter a veleidade de pensar que os seus "tra-ços" sao integralmente aproveitados na obra: Nestafalta de diálogo entre prancheta e canteiro, oproblema que se nos afigura de maior gravidade é odesconhecimento dos materiais, suas reais possibi-lidades, defeitos, virtudes, como tirar deles amelhor pe~ôa~man~e dentro das condiçoes ecológi-cas incidentes ou como detendê-los da agressivida-de do meio ambiente. Achamos que não existem duvi-das de que a responsabilidade inalienável de defi-nir com clareza os materiais no projeto e na obraé, decididamente, do arquiteto, de maneira espe-cial os materiais que fazem parte do acabamento doRUA,Salvador,v.2,n.3,p,ll7-l31,l989

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Lamentavelmente, entre n6s pouco ou quase nada temsido feito para remediar o inconveniente. Mesmo naEuropa, onde a legislação e o cumprimento de nor-mas são muito mais severos, a intensificação dosestudos aprofundados dos materiais não ~ de grandeantiguidade. Ultimamente a RILEM (R~union Interna-tionale des Laboratoires d'Essais et de Eecherchesur les Mat~riaux et les Construction),·incentivadapelos seus associados, especialmente pelos que sededicam ã defesa dos bens culturais, tem promovidointensamente as pesquisas de longevidade dos mate-riais de construção e a eficgcia dos tratamentosque possam aumentar a sua durabilidade,

Destacamos, mais uma vez, a contribuição dos espe-cialistas da conservação/restauração, cuja inquie-tude e, não poucas vezes, perplexidade diante dosfenômenos da degradação dos edifícios os tem lan-çado à indagação científica ou ã busca, nas ciên-cias das diversas áreas do conhecimento, dasrespostas aos problemas imensos que estão em suasmãos. Falar de longevidade dos materiais ê falarda longevidade da arquitetura. Para não ficarmosem um discurso de constatação de problemas e la-mentações, vamos tentar abrir uma pequena janelapara sistematizar o conhecimento dos estudos queconsideramos serem fundamentais para o exercícioda projetação responsável,

Auguramos que as nossas preocupações, que sabemosserem comparticipadas por grande número de cole-RUA,Salvador,v.2,n.3,p.117-131,1989

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gas, consigam produzir a devida motivação para abusca do preenchimento desta lacuna de formação nodomínio didático das escolas e da formação pessoalque nos cabe aprimorar dia a dia.

Os materiais porosos da construção dos edifíciossão, ~ mister que se conheça, os mais sujeitos aosfenômenos da degradação. Temos encontrado, amiGde,problemas de uso equivocado dos mesmos, nas moder-nas construções, coisa que pouco aconteceria se oarquiteto detivesse um conhecimento razoável dassuas reais qualidades e possibilidades, da maneirae do local corretos de protegê-Ios ao aplicá-Ios.Isto se refere, dentre outras coisas, ao uso doconcreto aparente, argamassa de acabamento, mate~riais cerâmicos de revestimento de muros e pisos,pedras de revestimento, etc., etc. Â guisa deilustração, exemplificaríamos que, entre os mate-riais líticos, poucos sabem que os granitõides ãbase de sodalita - pedras belíssimas, raras e dealto custo - são muito duros e, conseqüentemente,resistentes ao desgaste, mas muito sujeitos aoataque químico, o que tem provocado enormes dissa-bores para arquitetos e clientes, quando usadosinadequadamente.

Entre os fenômenos de degradação a serem conside-rados no julgamento das características de um ma-terial, antes da decisão projetual de utilizá-Ios,particularmente para os materiais porosos, seriabom apontar:

a) Tensões superficiais de cristalização provoca-das pelo aumento de volume dos sais, que se cris-RUA,Salvador,v.2,n.3,p.117~131,1989

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talizam nos poros superficiais, criando o fenômenoda eflorescência ou, nos nfveis imediatamente ~-xo da superfície, provocando subeflorescência. Es-tes sais, que migram atrav~s da porosidade da pe-dra sob forma de solução salina, têm fontes dealimentação as mais variadas. Tal fenômeno é res-ponsável pela "lepra" ou escamaçao até mesmo demateriais de grande resistência como os granitos.

b) Outros materiais existem que, por defeitos con-'gêp.itosde fabricação ou por constituiçao químicae/ou mineralógica, apresentam componentes solúveisou passíveis de lixiviação, produtores de degrada-ção, direta ou indiretamente. Variantes deste pro-blema podem ser encontradas nos materiais com com-ponentes argilosos, não transformados, que podemnão somente ser corroídos pela água, como tambémapresentar fenômenos de expansão e retração na es-trutura, com danos à sua integridade.

c) O gelo/degelo é um fenômeno semelhante ao fenô-meno da cristalização salina, no que tange aosseus efeitos. As causas, porêm, são diversas e es-tão nas fortes quedas de temperatura fazendo aágua congelar nos poros do material provocando o~t~e~~ interno. Nas condições brasileiras de climatal fenâmeno é de importância secundaríssima, es-pecialmente para nós que habitamos na Bahia: Mere-cem, por~m, alguma consideração para os profissio-nais que atuam nos estados do Sul, nos locais ondea temperatura costuma alcançar níveis abaixode oOe.

d) O ataque 'biológico pode ser dividido emRUA, Salvador ,v.2 ,n.3,p.117-,131,1989

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grandes ramos, a depender dos agentes causadores.Um destes ramos é ocupado pelos seres vivos (plan-tas ou microorganismos), cuja boa observação nãose pode fazer ã vista desarmada, mas sim com a mi-croscopia.' ° outro reúne as plantas superiores,cu-ja proliferação tem ação destrutiva através docrescimento de ra!zes e caules, a provocar tensoesapreciáveis nos materiais, quando se infiltram nosmacroporos, fissuras e juntas. As gameleiras, en-tre nós, malgrado seus atributos mrsti~co-religio-sos, estão entre as espécies mais destrutivas.

Os fenômenos mais complexos de entendimento resi-dem na primeira das categorias referidas, cujosagentes são os fungos, algas, líquens (simbiose defungos e algas) e bactérias. ° dano principal,alémdos danos de ordem estética da mudança de cor eescurecimento das superfícies, vem dos agentesagressivos originários do seu metabolismo. Exem-plificamos: os tiobacilos são capazes de produ-zir H2S04 (ácido sulfúrico), que decompõe os car-bonatos. As bactérias do ciclo do nitrogênio saocapazes de produzir HN03 (ácido nítrico), que podedecompor, também, diversos elementos dos materiaisde construção. Fungos, líquens e algas podem criaro ácido oxálico, igualmente agressivo.

Deve-se juntar aos inconvenientes de ordem de des-gaste do material o aspecto desolador dos edifí-cios, espec'ialmente nos concretos aparentes, cujalimpeza e tratamentos não são tarefas das mais fá-ceis.

e) A variação de temperatura, com conseqüente di-RUA,Salvador,v.2,n.3,p.117-131,1989

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127latação e retração dos materiais, deve ser consi-derada sob dois aspectos: Os fatores acidentaisprovocados por sinistros de fogo, cuja e.xtinção aágua provoca violentas retrações diferenciadas (sefossem uniformes o problema seria muito menor) ,comfortes roturas cujo controle nos foge, a não serno cuidado necessário à segurança do edifício du-rante o projeto. O outro fatorª a dilatação natu-ral, que podem sofrer os materiais sob a ação docalor solar, capaz de produzir efeitos evidente-mente mais limitados do que um incêndio. Neste ca-~o pode haver, inclusive, o arrancamento de revesti-mentos e rotura das peças por falta de juntas deexpansao no assentamento ou fixação inadequada.

O conhecimento destas tensões é fundamental paraque se recomendem cuidados especiais no assen~a~mento e dimensionamento das unidades de revesti-mento.

f) O ~t~e~~ mecânico oriundo das condições de tra-balho de um material pode ser agente de seu enve-lhecimento prematuro e da sua falência. Sem quererapelar para os temas herméticos do ~t~e6~ c.oJrJto~-i.ondas armaduras de concreto, de responsabilidade daengenharia estrutural, nem mesmo para a velha leide Hook, que explicaria cientificamente o fenômeno,queremos nos ater ao simples fato de que os mate-riais, sob ação excessiva de cargas, apresentaminicialmente microfissuras, que se transformam de-pois em macrofissuras, degradando-os e facilitandooutras formas de degradação. A ação violenta detrabalho ou manuseio deles ao serem extraídos,cor-tados, fabricados, aplicados ou mesmo transporta-RUA,Salvador,v.2,n.3,p.117-131,1989

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dos é causadora de problemas de durabilidade. esobejamente conhecida a fragilidade dos mármoresextraídos das jazidas com explosivos ou trabalha-dos com instrumentos inadequados.

g) ° momentoso problema da ecologia faz do estudoda degradação química por agentes poluentes um dostemas fundamentais e complexos nos estudos sobre avida das construções. Ao ataque natural propiciadopela dissolução das águas de chuva e o H2C03 (áci-do carbônico), que sempre existiu na natureza, masde efeito muit!ssimo lento, a nossa sociedade in-dustrial adicionou a ação de uma s~rie de poluen-tes, entre os quais destacamos o anidrido sulfuro-so (5°2), que se origina principalmente da combus-tão de hidrocarbonetos. Dela se forma o H2S04(áci-do sulf6rico), capaz de provocar severos danos emtudo que possa sofrer ataque ácido.

Dentro dos problemas ecológicos estão as vibra-ções, que são fatores a serem considerados na du-rabilidade e conservação dos edifícios de maneirageral.

h) ° vandalismo, filho direto da incivilidade,que,diga-se de passagem, 'não é privilégiO do TerceiroMundo, merece figurar no elenco das nossas consi-derações. Materiais resistentes onde houver pos-sibilidade de uso abusivo, polido onde incide asUJe1ra ou haja possibilidade de pichação, acaba-mento agressivo que possa permitir limpeza violen-ta através de jateamento, tratamento com vernizesreversíveis, etc. são alguns cuidados que pesam nadefinição da projetação.RUA,Salvador,v.2,n.3,p.l17-l3l,l989

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Eis que relacionamos, superficialmente, alguns ~blemas cujo aprofundarnento deve ser afrontado porquem pretende projetar a arquitetura. A relação,porêm, não p!ra por aí, entrando pela oxidação ecorrosão dos metais, alterações de cor pela açãodas radiações I.V. e U.V., oxidação com mudança decor e tom, decomposição de pol!rneros, inªrcia tér-mica dos materiais e tantos outros temas.

Mesmo sem nos aprofundarmos nos estudos das equa-ções de forças da capilaridade, nem cogitarmos das"pontes de hidrogênio", que propiciam a atraçãodos líquidos sobre as superfícies, é muito fAcilreconhecer que poucos fenâmenos de degradação naodependem direta ou indiretamente da água. Saber,assim, administrar ou evitar os seus efeitos atra-vés da correta proposta de impermeabilização, detratamentos hidrorrepelentes e principalmente ~ris dos elementos de arquitetura a serem criadosno projeto, fazendo parte da concepção geral daforma,é responsabilidade inalienável do arquiteto.Os antigos sabiam muito bem disto, e eloqÜentesexemplos são encontrados ao longo de toda a histó-ria da arquitetura. Egípcios, mesopotâmicos, japo-neses, romanos, todos eles, e tarnb~m os nossos an-tigos colonizadores brindaram-nos com um repertó-rio vasto de soluções inteligentes e de grande va-lor estético. ~ também do passado que nos vem oinequívoco apelo ~ necessidade de adquirirmos maisintimidade com os materiais da arquitetura. O maisvelho tratado de arquitetura que nos chegou é cer-tamente o de Vitruvio Polio, cujo conteOdo é umtestemunho preciso da formação profissional dosRUA,Salvador,v.2,n.3,p.117-131,1989

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antigos. Se dedica o livro primeiro aos preâmbulose ao conceito de arquitetura e de formação do ar-quiteto, que, diga-se de passagem, era coisa muitoserl.a, no livro segundo discorre com grande compe-tência sobre os materiais clássicos da epoca: pe-dras, adobes, tijolos, cal, puzzQlana, madeira eassim por diante. Não ê sem motivo que, somente nolivro terceiro, trata dos problemas de deh~gn comocomposl.çao e medida dos templos e problemas corre-latos, que são referidos nos livros subseqüentes.

Se hoje os conhecimentos científicos e tecnológi-cos são bem maiores, como também maiores são asagressões sobre o construído, não há como aceitaro nosso afastamento das responsabilidades de assu-mirmos com competência, através do projeto conse-qüente, os problemas da longevidade da construção.

NOTAS1. Palestra proferida como convidado do 111 Encon-

tro Nacional de Ensino de Projeto, promovidopela FAUFRGS em setembro de 1987.

2. Cf. Olive~ra, Alguns momentos da atividade •••3. Perret,p.47.

AMOROSO, G.G., FASSINA, Vasco. Stone decay andconservation. Amsterdam: Elsevier, 1983.

LAZZARINI; Lorenzo. La pulitura dei materiali la-pidei da costruzione escultura, Padova: CEDAM,1981.

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Padova: CEDAM, 1986.OLIVEIRA, MArio Mendonça de. Alguns momentos da

atividade projetual do arquiteto na cultura domundo ocidental. In: II Encontro Nacional sobreEnsino do Projeto Arquitet8nico, 1986, PortoAlegre. Anais. Porto Alegre: FAUFRGS, 1986. v.l.

____ .Roteiros de aulas. Salvador, 1984. Mes.-trado em Arquitetura e Urbanismo da FAUFBa.

PERRET, Auguste. Contributo a una teoria dell'ar-chitettura. In: ROGERS, Ernesto N. ArchitettideI movimento moderno - Auguste Perret. Milano:Il Balcone, 1955.

TORRACA, Giorgio. Porous buildin2 mate~ials. Roma:ICCROM, 1982.