Naufrágio

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NAUFRÁGIO Livre adaptação de A TEMPESTADE

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Adaptação d" Tempestade - Shakeaspeare

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Page 1: Naufrágio

NAUFRÁGIOLivre adaptação de A TEMPESTADE

Page 2: Naufrágio

Antônio e o rei Alonso roubam o ducado de Próspero, que sobrevive ao naufrágio por milagre e pela ajuda do conselheiro Gonzalo. Próspero permanece anos exilado em uma ilha e planeja uma vingança contra seu irmão, o rei Alonso. Os nobres Antônio e Sebastião quando chegam à ilha veem a oportunidade de matar o rei Alonso e ficar com a coroa. Da mesma forma, o mordomo e o bufão planejam com Caliban matar Próspero e reinar sobre a ilha.

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PERSONAGENS

De Milão:

PRÓSPERO, legítimo duque de Milão

ANTÔNIO, irmão de Próspero, duque usurpador de

Milão

MIRANDA, filha de Próspero

De Nápoles:

ALONSO, rei de Nápoles

FERNANDO, príncipe e filho de Alonso

Da ilha:

CALIBAN, filho da bruxa Sicorax, que é escravizado por

Próspero.

ARIEL, um espírito do ar.

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Escuro. Cena da Tempestade. Todos estarão no escuro com galhos de bambu com algumas folhas. Apenas Ariel sob a luz com uma bacia de água e uma barco de papel. As marcas em negritos são sons bucais ou falas, as não-negrito são ações sonoras.

DJALMA MICHELLE PRADO

VENTO SUAVE GALHOS SUAVE

GALHOS SUAVE

CHOCALHOS

Nhem-nhem-nhemNhem-nhem ô xorodôNhem-nhem-nhemNhem-nhem ô xorodôÉ o mar, é o marFé-fé xorodô

VENTO

GALHOS

VENTO

GALHOS

CHOCALHOS

Nhem-nhem-nhemNhem-nhem ô xorodôNhem-nhem-nhemNhem-nhem ô xorodôÉ o mar, é o marFé-fé xorodô

VENTO FORTE

GALHOS FORTE

VENTO FORTE

GALHOS FORTE

Nhem-nhem-nhemNhem-nhem ô xorodôNhem-nhem-nhemNhem-nhem ô xorodôÉ o mar, é o marFé-fé xorodô

VENTO VENTO

VENTO SUAVE GALHOS SUAVE

GALHOS SUAVE

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ANDERSON CEZAR ANDRÉ

GALHOS SUAVE Como Ariel, observa um o barco de papel na bacia VENTO SUAVE

Era assim: o que quiser que tenha, tinha. Tinha arrebol? Tinha. Rouxinol? Tinha. Luar do sertão, palmeira imperial, girassol, tinha.

Começa a brincar suavemente com o barco de papel na bacia. VENTO

GALHOS FORTE CHEGANDO A ROMPER ALGUNS GALHOS

Também tinha temporal, barranco, às vezes lamaçal, o diabo! Depois bananeira, até cachoeira, mutuca, boto, urubu, horizonte, pedra, pau, trigo, joio, cactos, raios, estrela cadente, Incandescências.

Começa a brincar mais agressivamente com o barco de papel na bacia e por fim o rasga /amassa.

VENTO FORTE

CONGAS

Não tenha medo. A ilha é cheia de sons, música e mil ruídos, que não fazem mal e encantam os ouvidos. Às vezes, mil instrumentos e vozes suaves cantam para eu dormir. E em meus sonhos, os céus se abrem e despejam tesouros sobre mim. E, quando acordo, choro para dormir de novo e sonhar outra vez.

Dança livre VENTO

GALHOS SUAVE Dança livre e sai de cena VENTO SUAVE

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Os barulhos de tempestade vão sumindo e começa-se a ouvir o som de vento e pássaros, Miranda chega desesperada por te visto o naufrágio. Corre até o pai.

MIRANDA – Pai querido, o que fez? Vi o navio afundar inteiro, de uma vez. Sofri com os que vi sofrer.

PRÓSPERO – Calma, calma, minha filha. Ninguém sofreu um só arranhão: Foi tudo magia que eu preparei para vingar a traição. Anos atrás, eu era duque de Milão, e confiei todo o governo às mãos de Antônio, meu irmão, que, traiçoeiro e vil, se juntou ao rei Alonso para me tirar do poder. E, em noite escura, Eu e você – que tinha apenas 3 anos – fomos abandonados em um barco, sem água e sem comida, para morrer.

MIRANDA – Eu não me lembro de nada. Como nos salvamos?

PRÓSPERO – Gonzalo, amigo fiel, escondido de todos, nos levou água, livros e alimentos.Por sorte, querida filha, sãos e salvos chegamos à ilha. Mas chega de perguntas. Vejo que está com sono.

Próspero faz um gesto de magia sobre a cabeça de Miranda. Ouve-se uma música suave, e ela adormece. Entra Ariel, um espírito bom, que serve a Próspero.

ARIEL – Salve, meu grande mestre. Salve, meu grande senhor. Sei voar, sei nadar, e no fogo penetrar. As vossas ordens todas eu vou rápido executar.

PRÓSPERO – Você fez a tempestade, exatamente, como eu ordenei?

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ARIEL – Sim, mestre. Criei fogo, fiz o mar levantar. E, com medo enorme, marinheiros e nobres se jogaram ao mar. Mas estão todos vivos, como o senhor ordenou: O príncipe Fernando,deixei sozinho, pensando que o rei, seu pai, se afogou. E o rei Alonso, do outro lado, anda triste e amuado imaginando que o filho morreu.

PRÓSPERO – Muito bem, fiel servidor! Agora, mais tarefas para você.

ARIEL – Mais tarefas? Quero a minha liberdade!

PRÓSPERO – Ainda não chegou a hora! Já se esqueceu de que eu o salvei Dos feitiços de Sicorax, A bruxa má de olho azul? E que ela o prendeu numa árvore, E que, quando morreu, Você ficou preso para sempre?

ARIEL – Perdão, meu mestre, Perdão, meu nobre senhor. Pode ordenar, Não vou mais reclamar.

PRÓSPERO – Obedeça e logo, logo, A liberdade vai ter. Agora, vista este manto, Fique invisível a todo e qualquer olhar. Vá depressa se trocar.

Sai Ariel, Prospero acorda Miranda.

PRÓSPERO – Querida filha, acorde. Vamos ver meu escravo, Caliban.

MIRANDA – Pai, não quero ir. Ele é um vilão Que eu não consigo Nem olhar.

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PRÓSPERO – É um monstrengo de terra, Tartaruga muito esquisita, Sapo feio e venenoso. Mas nos traz lenha E acende o nosso fogo.

Vão a caverna de Caliban

PRÓSPERO – Caliban?!

(silêncio)

PRÓSPERO – Caliban, escravo! Responda!

CALIBAN – Já tem muita lenha cortada! Fora daqui!

PRÓSPERO – Vem cá, tartaruga! Rápido!

Caliban resmunga

PRÓSPERO – Depressa, monstro de lama!

CALIBAN – (praguejando) Que caia sobre vocês Orvalho tão venenoso Que fiquem cobertos de feridas!

PRÓSPERO – Só por isso, esta noite, Ouriços vão andar pelo seu corpo, Você vai ter cãibras e sofrer muitas dores, Vai ter pesadelos e sonhar horrores.

CALIBAN – Está na hora do meu jantar. Não quero trabalhar. Esta ilha é minha, Herdada de minha mãe, Sicorax. Quando você aqui chegou, Gostava de mim, E me ensinou o nome Da luz grande que queima no céu de dia, E da luz pequena que queima no céu à noite. E eu mostrei para você toda a ilha: Onde encontrar água fresca e terra boa. Que todos os feitiços de Sicorax – Besouros,

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sapos, morcegos – Caiam sobre você! Eu sou seu único súdito, Eu, que antes era meu próprio rei.

MIRANDA – Monstro mentiroso! Tive pena de você, E o ensinei a falar, Quando você só sabia grunhir.

PRÓSPERO – Você atacou minha filha! Merecia mais que a prisão nesta caverna.

CALIBAN – Você me ensinou a falar, E, agora, eu sei praguejar! Que a peste caia sobre você Por me ensinar a sua língua!

PRÓSPERO – Fora daqui, filho de bruxa! Vá buscar lenha! Rápido! Ou quer sentir dores pelo corpo todo?

CALIBAN – Não, por favor. Vou obedecer.

PRÓSPERO – Vá, escravo!

Ariel dança para Fernando

VOZ DE PRÓSPERO COMO UM LADAINHA - É doce morrer no marNas ondas verdes do mar (2x)

O barco partiu de noite foiMadrugada não voltouO marinheiro bonitoSereia do mar levou

É doce morrer no marNas ondas verdes do mar (2x)

Nas ondas verdes do mar meu bemEle se foi afogar

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Fez seu trono de reiNo colo de Iemanjá

FERNANDO – De onde vem essa música? Da terra? Do céu? Do ar? A música me lembra meu pai. Vou segui-la.

Fernando segue Ariel e vê Miranda. A música vai sumindo enquanto os dois conversam. Ariel some.

MIRANDA – Será um deus? É tão bonito!

FERNANDO – Ó maravilha! Será humana ou divina?

MIRANDA – Não sou maravilha, senhor. Sou apenas uma moça.

FERNANDO – Ela fala a minha língua! Eu sou Fernando, rei de Nápoles.

PRÓSPERO – O que diria o rei de Nápoles, Se o ouvisse falar? Você rouba o nome do rei, vem aqui para me roubar?

FERNANDO – Deixe-me explicar, senhor. O rei era meu pai E morreu na tempestade.

PRÓSPERO – Mentira! Você veio aqui me roubar! Agora será meu escravo! Para mim vai trabalhar!

FERNANDO – Antes, vai precisar me vencer.

PRÓSPERO – Guarde a espada, traidor! Com um só gesto do meu bastão, Eu faço fraca a sua mão.

MIRANDA – Pai, compaixão!

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PRÓSPERO – Silêncio, minha filha! Ele é um ladrão de ilha! (para Fernando) Siga-me, traidor, és agora meu prisioneiro.

FERNANDO – (para Miranda) ...e ainda mais prisioneiro desse doce olhar... Vou, já não tenho forças para lutar.

Em outro ponto da ilha o Rei Alonso caminha com Antônio.

ANTÔNIO – Senhor, alegre-se. Nós nos salvamos. É um milagre! REI ALONSO – Deixe-me em paz, por favor. Perdi meu filho. É imensa a minha dor. ANTÔNIO – Senhor, ele pode estar vivo.REI ALONSO – Não. Ele se afogou. Por favor, não tente me consolar. Sinto um cansaço esquisito, Meus olhos estão pesados... ANTÔNIO – Durma, senhor. Eu e Sebastião Vamos proteger o seu sono.

Entra Ariel dançando. Ponto de Oxum. O Rei adormece.

ANTÔNIO – Estranho. caíu no sono Como por magia... Deve ser o clima. Mas por que não estou com sono? Estou bem acordado. E mais acordada ainda Está minha ambição. Roubei o poder de Próspero, meu irmão, Aliando-me a Alonso, com traição. E hoje eu sou duque de Milão. virei duque de Milão, com a morte do príncipe e do rei vou virar rei de Nápoles.

Saca a espada.

ARIEL – Enquanto dorme tranqüilo, A traição está acordada. Se quer viver, Acorda, acorda.

O rei grita, ainda de olhos fechados, como se estivesse tendo um pesadelo e em seguida desperta.

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REI ALONSO – O que houve? Por que a espada puxada? Sonhei que estavam me matando.

ANTÔNIO – (disfarça) Ouvi um ruído horrível. Parecia um leão, Ou vários leões, Ou um touro louco... O senhor não ouviu nada?

REI ALONSO – Não ouvi nada. Apenas um sussurro esquisito, Uma música no meu ouvido. Então, acordei assustado.

ANTÔNIO – Foi um barulhão de dar medo. Parecia um terremoto. É melhor irmos embora, Vamos, rápido, agora!

REI ALONSO – Vamos! Vamos procurar meu filho. Se ele está vivo, corre perigo. E nós precisamos de abrigo.

Aparece Próspero jogando búzios numa peneira. Como se assistisse a tudo do no fundo do obejto. Fernando carrega um feixe de lenha.Volta. Carrega outro feixe. Miranda o encontra.

FERNANDO – O trabalho é pesado, mas, quando vejo o seu rosto, me esqueço do fardo. Tudo fica leve.

MIRANDA – Oh! Não trabalhe tanto! Eu ajudo a levar lenha. Meu pai agora está lendo. Descanse por um momento.

FERNANDO – Não, anjo precioso. Não me canso se posso vê-la e ouvir seu tom precioso. Qual o seu nome?

MIRANDA – Miranda.

FERNANDO – Admirável Miranda! Já conheci muitas moças, Mas nenhuma tão amável, Perfeita e incomparável.

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MIRANDA – Eu não me lembro de ter visto Outro rosto humano, A não ser o de meu pai, E agora o seu, meu bom amigo. E não posso imaginar Outro homem mais perfeito.

FERNANDO – Miranda, eu sou um príncipe, ou talvez já seja até rei. Mas agüento este serviço escravo só para vê-la.

MIRANDA – Então me ama?

FERNANDO – Mais que tudo no mundo! (ajoelha) Quer casar comigo?

MIRANDA – Aqui está minha mão e nela ponho meu coração.

PRÓSPERO – (fala para sí) Estão perdidamente apaixonados. Fico feliz pelos dois. (começa a ser ouvido pelo casal) Se eu o tratei com dureza, Foi para conhecer com certeza O que há em seu coração. Está livre. Agora tem sua recompensa: Minha filha e minha bênção.

FERNANDO – Obrigado, senhor. Ela vale todos os sofrimentos Pelos quais, sorrindo, passei.

PRÓSPERO – Para o noivado comemorar, Seres misteriosos vão dançar.

Entram espíritos e realizam uma dança para os noivos, oferecendo aos dois trigo, uvas, flores e outros presentes. Fernando e Miranda assistem, encantados. De repente, Próspero, interrompe o espetáculo

PRÓSPERO – (de novo para sí) Quase me esqueci Do plano de Caliban para me matar. Agora, chega! Saiam, espíritos!

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FERNANDO – Por que seu pai terminou a peça Com tanta raiva e tanta pressa?

MIRANDA – Nunca o vi agir dessa maneira.

PRÓSPERO – Parecem espantados, queridos filhos. Alegrem-se. Nossa peça acabou, E os espíritos que por aqui passaram Eram apenas ar, não mais que ar. E assim como essa peça Teve um fim, Um dia, o globo inteiro, Sim, tudo o que está à nossa volta, Também vai sumir, Sem deixar rastro. Nós somos feitos da matéria dos sonhos E a nossa vida Está envolta em um sono. Perdoem meu estranho comportamento. Vou caminhar um pouco, estou nervoso. Entrem na caverna e descansem por um momento.

PRÓSPERO – (para si) Preciso aos meus livros retornar E com meus inimigos acabar. (Continua a jogar os búzios na peneira. Aparecem o Rei e Antônio)

REI ALONSO – Como estou cansado! Não consigo dar nem mais um passo.

ANTÔNIO – Também estou exausto. Vamos sentar. Não adianta mais procurar.

REI ALONSO – Mas que figuras são essas?

ANTÔNIO – São fantoches vivos!

ANTÔNIO – Se eu contasse isso em Nápoles, Será que acreditariam? Devem ser habitantes da ilha. São monstruosos, mas delicados. Sumiram, desapareceram no ar!

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Ouve-se uma música e entram figuras estranhas, trazendo uma mesa com um banquete. Dançam ao redor da mesa e, com gestos, convidam o rei e os outros para comer

ANTÔNIO – Mas deixaram a comida. Estou com uma fome...

REI ALONSO – Vou comer, mesmo que pela última vez.

Aparece Ariel em forma de Harpia.

ARIEL – Pecadores expulsaram Próspero de Milão, Abandonando-o com sua filha ao mar. Agora, o mar os puniu: Roubou do rei Alonso, o filho. Vocês vão enlouquecer, A comida vai desaparecer. (a comida some) No arrependimento está à salvação Próspero precisa lhes dar o perdão.

REI ALONSO – Ouvi as ondas, os ventos e os trovões Falarem do meu crime, Repetindo o nome de Próspero. Falaram do meu filho morto. Com ele, no fundo do mar, Quero me deitar.

ANTÔNIO – Vou derrotar esses seres horríveis.

(espada em punho. Trovões e relâmpagos. A nobreza fica enlouquecida)

ANTÔNIO – Eu vou junto

Próspero comenta a situação do Rei e Antônio, assistindo a tudo na peneira e fala brevemente que Caliban, Trínculo e Estefan estão tentando matá-lo para tomar o domínio sobre a ilha.

PRÓSPERO – Ariel, apareça!

ARIEL – Que deseja, poderoso mestre?

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PRÓSPERO – Onde estão Caliban e os seus comparsas?

ARIEL – Senhor, beberam tanto Que ficaram corajosos.

Querem matar o senhor E agora estão vindo para cá.

PRÓSPERO – Ariel, vamos preparar uma armadilha Para apanhar os moleques. Traga roupas brilhantes E as pendure nesta corda.

ARIEL – Vou já!

PRÓSPERO – Agora, invisíveis, vamos observar.

CALIBAN – Por favor, pisem de leve, Próspero não pode acordar. Ali está a caverna. É só entrar, E Próspero matar.

CALIBAN – Deixem as roupas pra lá.

CALIBAN – Por que perdem tempo Com roupas que são só lixo? Próspero vai acordar E, com certeza, nos castigar.

CALIBAN – Não quero nada. Perdemos tempo com esses cacos. Se Próspero acordar Nos transforma em macacos.

PRÓSPERO – Que espíritos sob a forma de cães Persigam Caliban e seus comparsas. Que meus duendes lhes deem fisgadas Mordidas, arranhões e alfinetadas. (Ouvem-se latidos e barulho)

Todos os meus inimigos Estão sob o meu poder. Que horas são?

ARIEL – Seis horas, mestre, A hora em que o senhor disse Que acabariam os feitiços.

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PRÓSPERO – Onde estão o rei e seus companheiros?

ARIEL – No bosque, enfeitiçados. Tanto o rei quanto Sebastião e Antônio estão loucos. O nobre Gonzalo chora. Se eu fosse humano, Teria pena deles.

PRÓSPERO – Se você, que é apenas ar, Tem tanta pena da dor humana, Então eu, que sou da mesma espécie, Terei também piedade deles, Que cometeram crimes, é verdade, Mas sofrem agora, arrependidos. Vou perdoá-los. Pois o perdão é mais nobre que a vingança. Quebre o encantamento, Ariel, Vá libertá-los, Faça com que recuperem a razão. Todos terão minha compaixão.

ARIEL – Vou buscá-los, senhor.

PRÓSPERO – Estão imobilizados por minha magia. Essa música vai curá-los. (Canta. Ariel sai. Próspero faz um círculo no chão. Ariel volta com Alonso e os outros, que ainda estão enfeitiçados. Todos entram no círculo feito por Próspero ) Desperte. Alonso, que me tomou o poder num golpe junto com meu irmão, Acorde. E Antônio, meu sangue e minha carne, Que cedeu à ambição, E roubou o meu ducado, Olhe nos meus olhos. Todos têm o meu perdão.

(Aos poucos vão recobrando a consciência)

PRÓSPERO – Boas-vindas a todos. Sou Próspero, O antigo duque de Milão. Não me reconhecem? Nobre amigo Gonzalo, Que me salvou a vida, Deixe-me aqui abraçá-lo.

REI ALONSO – Próspero, eu lhe peço perdão Pelo mal que causei a você e à sua filha. E lhe concedo de volta o seu ducado. Nós naufragamos e viemos dar nesta ilha. Meu filho Fernando, o príncipe, morreu afogado.

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Próspero veste seu antigo manto de duque de Milão e sua coroa

PRÓSPERO – Sinto muito, senhor.

REI ALONSO – Nada pode me consolar.

PRÓSPERO – Senhor, eu tive uma perda igual.

REI ALONSO – Perdeu sua filha? Quem dera estivessem agora em Nápoles, Vivos e reinando como rei e rainha... Quando perdeu a sua filha?

PRÓSPERO – Na última tempestade, senhor. Mas, por favor, entrem em minha caverna, Que é meu único palácio. São bem-vindos. E, agora, rei Alonso, Por ter me devolvido o poder, Vai receber um presente precioso.

(Fernando Próspero abre a cortina da caverna e todos vêem Fernando e Miranda jogando xadrez Fernando vê seu pai. Os dois se abraçam)

REI ALONSO – Um milagre! Meu filho! Como se salvou?

MIRANDA – Oh! Maravilha! Quantos humanos vejo aqui! Como é bela a natureza humana! Ó, admirável mundo novo Que tem tão nobres habitantes!

PRÓSPERO – É um mundo novo para você.

REI ALONSO – Quem é essa jovem, meu filho?

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FERNANDO – Meu bom pai, Quando pensei que estivesse morto, Pedi a mão dessa moça em casamento. Ela é filha do duque de Milão.

REI ALONSO – Serei para ela um segundo pai. Sei que é estranho um pai Pedir perdão à própria filha. Perdão, minha filha.

PRÓSPERO – Eu, que fiz tantos encantos, Agora renuncio à magia, Quebro a minha varinha, E volto a ser só homem. Esqueci a vingança Aprendi o perdão. Senhor, vamos esquecer As lembranças tristes do passado. Peço agora que os céus Derramem bênçãos sobre estes jovens.

REI ALONSO – Amém, bom Próspero! Duque de Milão foi de Milão expulso, E agora sua filha reinará em Nápoles. Alegria, senhores. O duque, Próspero, tem de volta o seu ducado. Nesta ilha perdida, nós perdemos a razão E encontramos o arrependimento e o perdão.

FERNANDO – Vejam, meu pedido se realizou. O piloto não morreu afogado! Ele foi feito para a forca, como eu previa! E, então, piloto, o que tem a dizer? PILOTO – Que estamos felizes por ter encontrado O rei e os nobres sãos e salvos. E que o navio, Que eu pensava destruído, Está novinho em folha E pronto para partir.

REI ALONSO – Mas como conseguiram se salvar?

PILOTO – Não sei, senhor. Apenas me lembro Que fomos acordados Por estranhos barulhos, rugidos horríveis. Vimos, então, o navio em perfeito estado. E, como num sonho, Fomos trazidos para cá.

ARIEL – (para Próspero) Fiz tudo como o senhor ordenou, mestre.

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PRÓSPERO – Meu bravo espírito! Em breve, estará livre. Agora, vá, me traga Caliban.

REI ALONSO – Esta ilha é mágica, E toda essa história Desafia a nossa razão.

PRÓSPERO – Meu soberano, não procure explicação. Na hora certa, com calma, eu conto Como tudo aconteceu. Senhor, não faltam, ainda, Dois homens da comitiva?

(Volta Ariel latindo para Caliban)

CALIBAN – (vendo os nobres) Que belos espíritos! E como está bem-vestido o meu amo! Tenho medo que me castigue.

REI ALONSO – Que coisas são essas, Antônio?

ANTÔNIO – Um deles parece um peixe. Podemos vendê-lo no mercado E ainda ganhar algum trocado.

REI ALONSO – É a coisa mais estranha que eu já vi.

PRÓSPERO – Esse monstro das trevas estava tentando meu roubar, Planejou com os outros me matar. Estéfano e Trínculo, que estão vestidos com as roupas roubadas.

CALIBAN – Ai, ai, vou ser beliscado até a morte.

REI ALONSO – Aquele não é Estéfano, o mordomo? E aquele não é Trínculo, o bufão? Mas como ficaram tão bêbados?

PRÓSPERO – Queria ser rei da ilha, moleque? Já para a minha caverna, Caliban! Ponha as roupas no lugar, Deixe tudo bem-arrumado, Se quiser ser perdoado.

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CALIBAN – Já vou, senhor. E de hoje em diante Serei bom e obediente.

PRÓSPERO – Convido os nobres e vossa alteza A descansar em minha caverna. Lá, eu contarei minha história E todos os perigos por que passei. Amanhã, partimos para Nápoles, Onde será o casamento De Fernando e Miranda. (Rindo) para nossa viagem, Mares calmos e velas velozes. Entrem, senhores. Ariel, deixo tudo ao seu cuidado, Está livre, espírito! Obrigado.

FIM