Nathalia Sene Garieri_a+

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UNICENTRO, Guarapuava/PR – 17 e 18 de junho de 2010 O Valor Ideológico na Propaganda de Cerveja 1 Nathália Sene GARIERI/ Licenciada em História Universidade Estadual de Maringá/Paraná Aline Rafaela Portílio LEMES Universidade Estadual de Maringá/Paraná Aline Aparecida SILVA Universidade Estadual de Maringá/Paraná Samuel Douglas Farias COSTA Universidade Estadual de Maringá/Paraná RESUMO A propaganda ocupa um largo espaço nos veículos de comunicação de massa, sendo um componente de promoção do marketing. É uma forma de apresentação de produtos, idéias ou serviços, cujos objetivos principais são informar, persuadir e lembrar. O que se consome ao comprar determinado produto? Fato é que não consumimos apenas o produto em si. Prova disso são os diversos significados vendidos pela propaganda. Ela tanto reflete valores de determinada sociedade, como os propaga. Ao consumirmos um produto compramos toda uma carga ideológica junto dele. O presente artigo buscará analisar a carga ideológica veiculada nas propagandas de cervejas, o consumo das relações machistas de dominação incluídos na bebida. PALAVRAS-CHAVE: Propaganda de cerveja; Ideologia; Machismo; Análise do discurso. Por meio da propaganda, as empresas ofertam produtos e serviços, com o objeti- vo de obter e manter clientes, estimulando-os a consumir tais bens. A propaganda ocu- pa grande espaço nos veículos de comunicação em massa e se constitui da apresentação de produtos, idéias ou serviços, cujos objetivos principais são informar, persuadir e lem- brar. Como todo fruto da realização humana, a propaganda está inserida em determi- nada sociedade. Ela é um discurso, portanto é reveladora de valores e imaginários da so- 1 Trabalho apresentado no GT História da Publicidade e Comunicação Institucional , componente do I Encontro Paraná/Santa Catarina de História da Mídia. 1

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  • UNICENTRO, Guarapuava/PR 17 e 18 de junho de 2010

    O Valor Ideolgico na Propaganda de Cerveja1

    Nathlia Sene GARIERI/ Licenciada em HistriaUniversidade Estadual de Maring/ParanAline Rafaela Portlio LEMESUniversidade Estadual de Maring/ParanAline Aparecida SILVAUniversidade Estadual de Maring/ParanSamuel Douglas Farias COSTAUniversidade Estadual de Maring/Paran

    RESUMOA propaganda ocupa um largo espao nos veculos de comunicao de massa, sendo um componente de promoo do marketing. uma forma de apresentao de produtos, idias ou servios, cujos objetivos principais so informar, persuadir e lembrar. O que se consome ao comprar determinado produto? Fato que no consumimos apenas o produto em si. Prova disso so os diversos significados vendidos pela propaganda. Ela tanto reflete valores de determinada sociedade, como os propaga. Ao consumirmos um produto compramos toda uma carga ideolgica junto dele. O presente artigo buscar analisar a carga ideolgica veiculada nas propagandas de cervejas, o consumo das relaes machistas de dominao includos na bebida.

    PALAVRAS-CHAVE: Propaganda de cerveja; Ideologia; Machismo; Anlise do discurso.

    Por meio da propaganda, as empresas ofertam produtos e servios, com o objeti-

    vo de obter e manter clientes, estimulando-os a consumir tais bens. A propaganda ocu-

    pa grande espao nos veculos de comunicao em massa e se constitui da apresentao

    de produtos, idias ou servios, cujos objetivos principais so informar, persuadir e lem-

    brar.

    Como todo fruto da realizao humana, a propaganda est inserida em determi-

    nada sociedade. Ela um discurso, portanto reveladora de valores e imaginrios da so-

    1 Trabalho apresentado no GT Histria da Publicidade e Comunicao Institucional, componente do I Encontro Paran/Santa Catarina de Histria da Mdia.

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    ciedade que a produziu e recebeu. Alm disso, por meio de seus mecanismos e na busca

    de atingir uma grande massa, contribui para a reproduo e reafirmao de determina-

    das idias. Embora busque representar contedos propcios, que j existam no meio,

    para a aceitao do produto que est a vender, a propaganda serve como uma ferramenta

    de afirmao dos mesmos.

    Segundo Brando (1993), a lngua uma espcie de invariantes que pressupe

    questes de produes possveis em um determinado momento histrico. Dessa manei-

    ra, podemos consider-la como uma condio de possibilidades de discurso. A anlise

    do discurso fundamental para que possamos entender ao certo o que um comercial, di-

    recionado ou no a um pblico, quer realmente transmitir; ou seja, quais so as inten-

    es ideolgicas de uma propaganda.

    O que buscaremos analisar no presente artigo como funciona a discusso de

    gnero dentro da propaganda, em particular a questo do machismo na propaganda de

    cerveja. Para esse aspecto Saffioti afirma:

    A identidade social da mulher, assim como a do homem, construda atravs da atribuio de distintos papis, que a sociedade espera ver cumpridos pelas diferentes categorias de sexo. A sociedade delimita, com bastante preciso, os campos em que pode operar a mulher, da mesma forma como escolhe os terrenos em que pode atuar o homem. (SAFFIOTI, 1987, p. 8)

    Em todos os espaos da sociedade, vemos reproduzir-se comportamentos e valo-

    res comuns a ela. Tais passam a ser encarados como concebidos naturalmente so na-

    turalizados; esquece-se toda a carga cultural socialmente construda. Papis tradicional-

    mente atribudos, construes que se realizam ao longo da Histria, passam a ser enca-

    rado como naturalmente determinados daquela maneira.

    A questo do gnero no diferente. Histrica e culturalmente se definiram pa-

    dres de comportamento e papis caractersticos dos homens e das mulheres uma

    questo que vai alm do papel biolgico do macho e da fmea. Atribui-se a mulher o es-

    pao domstico, a necessidade de cuidar da casa e da famlia, embora hoje com o ad-

    vento da mulher no mercado de trabalho ela tenha ganhado certa liberdade.

    A sociedade investe muito na naturalizao deste processo. Isto : tenta fazer crer que a atribuio do espao domstico mulher decorre a sua capacidade de ser me. De acordo com este pensamento, natu-ral que a mulher se dedique aos afazeres domsticos, a compreendida a socializao dos filhos, como natural sua capacidade de conceber e dar luz. (SAFFIOTI, 1987, p. 9)

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    Sabe-se que o imaginrio de uma sociedade evolui de maneira muito lenta. Em-

    bora a mulher, recentemente, tenha conquistado seu espao no mercado de trabalho e

    ganhado certa independncia em relao ao homem, o modelo tradicional da famlia pa-

    triarcal continua a permanecer nas idias como o natural. A mulher continua sendo re-

    presentada, na maioria das vezes, como responsvel pela satisfao do marido e dos fi-

    lhos.

    Quando representada nos anncios publicitrios, a mulher hoje aparece como

    aquela que trabalha fora. Ou seja, adquiriu liberdade. No entanto, ainda lhe so atribu-

    dos os papis relacionados ao cuidado do espao domstico: Isso o que Gledhill

    (1988) chama de negociao na produo miditica, que notvel na questo da cons-

    truo dos tipos femininos: recorre-se tanto a modelos tradicionais, como a mulheres

    modernas, trabalhadoras, independentes (ALMEIDA, 2003, p. 262). O espao domsti-

    co continua sendo atributo da mulher; seu dever de zelar pelo bem do marido e dos fi-

    lhos.

    Em relao ao relatrio de Clarice Herzog Tabus e Preconceitos: uma reviso

    na abordagem2, Heloisa Buarque de Almeida comenta:

    Parece-me que este relatrio de Clarice Herzog compartilha de uma viso comum da indstria e do meio publicitrio que considera tais produtos modernizantes e liberadores porque auxiliam e facilitam as tarefas domsticas, mas nunca se discute a diviso tradicional destas tarefas como fez o movimento feminista. Menos ainda refletem so-bre o apelo emocional que associa ser boa dona de casa, moderna e prtica ao efeito da famlia feliz. Tais produtos so de fato facilitado-res das tarefas domsticas, mas o que questiono aqui sua constante associao ao universo feminino. (2003, p. 279)

    Em relao a propaganda de cerveja, a tradicional representao da mulher cla-

    ra: ela est ali para satisfazer o homem. Aparece em papis secundrios, sempre subor-

    dinada a um papel masculino.

    A propaganda analisada a da Kaiser3, que mostra o controle de qualidade da

    produo da cerveja, o porqu dela ser to gostosa. A propaganda mostra mulheres

    sensuais, com pouca roupa, brancas e em sua maioria loiras. Na propaganda se torna

    2 HERZOG, Clarice. Tabus e preconceitos: uma reviso na abordagem. In: SEMINRIO INTERNACIONAL DE MARKETING DA MULHER (MEIO & MENSAGEM), Anais... nov. 1898. 3 Data original da campanha: 31/08/2007. Disponvel em: http://www.youtube.com/watch?v=V4BgVE-Y5is. Acesso em 06/05/2010.

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    claro que o vendido no a cerveja, e sim a mulher. O consumo da bebida representa o

    homem, subjugando as mulheres, consumindo-as, tendo poder sobre elas.

    Essa propaganda da Kaiser, uma que usamos como exemplo, mostra claro que o

    que vende no apenas a cerveja, e sim h o consumo de toda uma ideologia. Clara-

    mente direcionada ao pblico masculino, ela afirma e propaga os ideais da mulher sujei-

    ta ao homem, pronta para satisfazer suas necessidades tudo isso pra voc, como diz

    a prpria propaganda.

    A busca de satisfao do pblico em relao a propaganda, faz com que a perso-

    nalidade da mulher seja vulnervel a qualquer situao, sobretudo a de submisso ao

    sexo oposto. Pode-se perceber que nesta propaganda, a da Kaiser, o esteretipo de mu-

    lher criado a da mulher que satisfaz o desejo do homem e que nunca o contradiz, es-

    tando 24 horas a sua disposio, inclusive trabalhando em uma fbrica de cerveja para

    satisfaz-lo, como mostra a propaganda.

    O homem ao consumir a cerveja Kaiser estaria, na verdade, consumindo as belas

    mulheres, todas subordinadas a seu desejo. A propaganda vende sonhos, aspiraes.

    Wernick (1991) lembra que a estrutura bsica da mensagem publicit-ria consiste na associao entre o produto e um segundo nvel, seu sig-nificado, ou qual significado o anncio (ou toda a histria de suas campanhas) constri para o produto (a imagem da marca ou perso-nalidade do produto de que tratam os manuais de publicidade). O passo central deste processo uma associao entre mercadoria e sen-tido que se enraza, e todos os significados se confundem com o pr-prio produto. O objeto em si, sem sentidos agregados, j no existe mais ele e seus sentidos tornam-se uma s entidade. (ALMEIDA, 2003, p. 259)

    O que se vende uma idia, um estilo de vida. A publicidade cria no consumidor

    um desejo de ser como o personagem da propaganda, consumir o produto significa ten-

    tar atingir sua aspirao. com este imaginrio ideal que a publicidade mais trabalha

    em termos de oferecer junto com os produtos pequenas doses de felicidade (ALMEI-

    DA, 2003, p. 289).

    Ao analisarmos discursiva e minuciosamente uma propaganda percebemos que

    vrios aspectos que eram desconsiderados como importantes na interpretao de cada

    detalhe, acabaram norteando a anlise para que chegssemos a concluso de que h uma

    grande desvalorizao feminina

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    http://www.google.com.br/search?hl=pt-BR&client=firefox-a&rls=org.mozilla:pt-BR:official&ei=zVjgS475FcmQuAfc5o3LBg&sa=X&oi=spell&resnum=0&ct=result&cd=1&ved=0CAUQBSgA&q=estere%C3%B3tipo&spell=1

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    A propaganda se utiliza de valores e idias existentes na sociedade para vender

    seu produto. No entanto, ao se utilizar de tais valores, contribui para reforar e propagar

    os mesmos:

    Para acoplar imagens e significados aos produtos, a publicidade recor-re aos valores sociais em questo, pelo menos aqueles que julga serem os dos provveis consumidores do produto [...] Porm, isso no signi-fica que a publicidade apenas reflete tais construes simblicas, pois trata-se de uma via de mo dupla: no s o anncio se utiliza de certa ideologia, mas certamente tambm aceita estes valores e, ao represen-t-los, os naturaliza e refora. (p. 260, 261)

    A mulher na propaganda ou idealizada como a dona de casa perfeita, pronta e

    flexvel para qualquer situao e sempre submissa ao seu marido, principalmente, dedi-

    cada a agrad-lo acima de tudo. Percebemos como a propaganda alm de se utilizar dos

    valores machistas presentes na sociedade, os refora. Refora o papel da mulher como

    inferior ao homem, como responsvel pela casa e, principalmente, pronta para satisfazer

    os desejos masculinos, independente de sua vontade. O homem, ao beber uma Kaiser,

    consome o seu ideal de poder e dominao.

    REFERNCIAS

    ALMEIDA, Heloisa Buarque de. Telenovela, consumo e gnero: muitas mais

    coisas. Bauru, SP: EDUSC, 2003.

    BRANDO, Helena Nagamine. Introduo Anlise do Discurso. 2a. ed. Campinas:

    Unicamp, 1993.

    SAFFIOTI, Heleieth I.B. O poder do macho. So Paulo: Moderna, 1987.

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