Narcotráfico e identidade midiática no documentário falcão meninos do tráfico
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ELIZABETH DO NASCIMENTO PEREIRA- R.A.307201240
NARCOTRÁFICO E IDENTIDADE MIDIÁTICA NO DOCUMENTÁRIO FALCÃO - MENINOS DO TRÁFICO
UNIVERSIDADE NOVE DE JULHO SÃO PAULO -2011
ELIZABETH DO NASCIMENTO PEREIRA- R.A.307201240
NARCOTRÁFICO E IDENTIDADE MIDIÁTICA NO DOCUMENTÁRIO FALCÃO - MENINOS DO TRÁFICO
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à Universidade Nove de Julho – UNINOVE, requisitado para a obtenção do título de bacharel em Comunicação Social – Jornalismo. Orientadora: Profª Luiza Cristina Lusvarghi
UNIVERSIDADE NOVE DE JULHO SÃO PAULO -2011
À memória de Valdemar do Nascimento Pereira, meu pai. Um homem que
lutou bravamente diante dos enigmas da vida, e que me ensinou diversos valores sociais
benevolentes. Pai, este trabalho é para o senhor, sou muito grata pelos seus ensinamentos e o
amarei eternamente. Mesmo que o senhor não esteja mais entre nós de forma física, uma
“sementinha” sua conquista o título de bacharel em Jornalismo.
AGRADECIMENTOS
A Deus primeiramente, por estar presente em todos os momentos da minha vida,
ajudando-me e dando-me forças para conquistar meus objetivos;
À minha professora do ensino fundamental, Maria Lúcia Rampasso. Uma mestra
muito especial que me ensinou como é benéfico e gratificante trilhar o rumo da vida
acadêmica;
Aos inúmeros docentes tive o privilégio de conhecer durante os quatros anos que
frequentei, a UNINOVE (Universidade Nove de Julho) e que me ensinaram, na teoria e na
prática, todos os itens necessários para exercer a profissão de jornalista. Em particular, sou
fã e eternamente grata aos mestres Ana Lúcia Tsutsui, Alvaro Bufarah Junior, Carla
Oliveira Tôzo, Carlos August Alfeld Rodrigues, Celina Lucas, Cilene Victor, José Amaral,
Margarida Maria Adamatti, Rafael Iwamoto Tozi, Luiza Cristina Lusvarghi e Robson de
Souza.
Agradeço de coração a todos esses magníficos professores que compartilharam seus
conhecimentos acadêmicos de forma sublime e excepcional.
“Se acabar o crime, acaba com a polícia (...).
Porque quem dá dinheiro pros “polícia” somos
nós”.
Enunciado de um agente do narcotráfico, no
decorrer do documentário “Falcão – Meninos do
Tráfico”.
RESUMO
O presente trabalho analisou o documentário “Falcão – Meninos do Tráfico” (2006),
produzido por Celso Athayde e MV Bill. Abordou aspectos referentes à biografia e as
atividades sociais desenvolvidas pela a organização não-governamental CUFA (Central Única
das Favelas). Ressaltemos que o projeto Falcão foi o primeiro trabalho audiovisual
desenvolvidos por esta Instituição.
Também mencionamos as atividades e manifestações desenvolvidas pelo Movimento
do Vídeo Popular no Brasil durante a década de 80. Manifestações que lutaram pela
democracia e a liberdade de expressão através dos grupos independentes do vídeo popular.
Abordaremos diversos projetos audiovisuais que apresentaram em suas obras aspectos
que estão inseridos nas comunidades carentes brasileiras.
Palavras-chave: Narcotráfico, Periferias, Audiovisual, Jovens.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO............................................................................................................... 08
CAPÍTULO 1 - PROJETO FALCÃO – MENINOS DO TRÁFICO............................ 10
1.1 CUFA “berço” do Projeto Falcão – Meninos do Tráfico........................................... 13
1.2 Movimento do Vídeo Popular no Brasil nos anos 80................................................. 15
CAPÍTULO 2 - COMO A FAVELA FOI E ESTÁ SENDO RETRATADA PELOS
MEIOS AUDIOVISUAIS............................................................................................... 22
2.1 A Periferia também tem Canais de Comunicação e Oficinas de
Projetos Audiovisuais....................................................................................................... 34
CAPÍTULO 3 - DOCUMENTÁRIO “FALCÃO”: ANALISADO POR
MEDIDAS E FORMATOS............................................................................................. 37
3.1 Contribuição Cultural.................................................................................................. 41
3.2 Analisando as narrativas do documentário “Falcão- Meninos do Tráfico” ............. 46
CONSIDERAÇÕES FINAIS.......................................................................................... 65
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS............................................................................ 69
8
INTRODUÇÃO
Este trabalho objetivou analisar a forma como o narcotráfico no Brasil (atualmente
visto como uma epidemia mundial) é retratado no documentário, “Falcão-Meninos do
tráfico”, produzido pelo rapper MV Bill em parceria com seu empresário Celso Athayde, e
pelo Centro de Audiovisual da CUFA (Central Única das Favelas). Esta produção foi
veiculada em 19 de Março de 2006 no programa dominical “Fantástico” da Rede Globo de
Televisão.
“Falcão” enfoca por diferentes ângulos, a influência do tráfico de drogas no cotidiano
de centenas de adolescentes e jovens do nosso país. Vale a pena ressaltar que os “falcões”
(adolescentes que trabalham no tráfico noturno) reconhecem o tráfico como uma forma de
sobrevivência financeira. Porém, identificam a atividade como um caminho sem glórias.
“Falcão” é um jargão utilizado para denominar os garotos que vigiam os postos de
comercialização de drogas, e que protegem os traficantes e as comunidades das possíveis
invasões durante o período noturno.
O documentário “Falcão - Meninos do Tráfico” deu voz à delinquência juvenil e
inaugurou novas formas de diálogo entre os movimentos sociais, a mídia, e as elites do país.
Entre o êxito político e a crítica, o filme produzido por MV Bill e Celso Athayde, fomentou
diversos debates entre estudiosos e pesquisadores da sociedade brasileira, cujo foco principal
foi centralizado na questão do menor marginalizado. Sendo assim, a obra “Falcão” possui
uma enorme colaboração para o crescimento e fortalecimento dos projetos sociais brasileiros.
O tema apresentado no documentário “Falcão” é de extrema importância, pelo fato de
ter trazido à tona uma nova imagem dos jovens que atuam no narcotráfico. Menores que por
diversas vezes são apresentados nos telejornais como uma ameaça aos demais cidadãos da
nossa sociedade. Isto é, este filme retrata o cotidiano dos jovens de baixa renda de uma forma
que o telejornalismo não “consegue”, ou não deseja “revelar”.
Para justificar alguns termos relatados neste trabalho, foi feita uma entrevista com a
Coordenadora da oficina de audiovisual da CUFA (Central Única das Favelas) no Rio de
Janeiro, Jossana Notes.
9
Do ponto de vista teórico, iremos utilizar os conceitos dos autores, Fernão Pessoa
Ramos, Bill Nichols, Esther Hamburguer, Jesús Martín Barbero, Luiz Fernando Santoro entre
outros.
No primeiro capítulo, serão apresentados os fatores que fazem parte do projeto Falcão
- dois livros e o documentário homônimo; a biografia e os projetos sociais desenvolvidos pela
a CUFA (Central Única das Favelas); e as manifestações que o movimento do Vídeo Popular
desempenhou no Brasil durante a década de 80.
No segundo capítulo, serão mostrados diversos trabalhos audiovisuais que abordaram
em suas artes, questões direcionadas às comunidades carentes. Para se tornar mais sucinta esta
seção do trabalho, selecionamos obras do Cinema Novo, Cinema da Retomada e produções
contemporâneas que se direcionam a este tema. E os aspectos direcionados ao festival
internacional de cinema promovido pela CUFA.
No terceiro capítulo, será feita uma análise do documentário “Falcão”, e todos os
elementos pertinentes a este filme. Para tanto, serão apreciadas as narrativas dos protagonistas
da obra, com o intuito de revelar quais pressupostos que estão introduzidos nestas entonações.
10
CAPÍTULO 1 - PROJETO FALCÃO – MENINOS DO TRÁFICO
O Projeto Falcão, produzido pelo rapper MV Bill e o produtor cultural Celso Athayde,
lançou em 2006, um conjunto de obras que engloba: o CD do MV Bill intitulado de “Falcão
O Bagulho É Doido”, o documentário “Falcão - Meninos do Tráfico” na versão DVD (Digital
Versatile Disc), o livro homônimo que relata em 272 páginas os bastidores das filmagens. E
devido a grande repercussão desta obra, foi lançado no ano passado (2010), no Centro
Esportivo e Cultural CUFA (Central Única das Favelas) do Rio de Janeiro, o livro na versão
de bolso do “Falcão - Meninos do Tráfico”.
As gravações que serviram de inspiração para o filme foram feitas entre os anos de
1998 a 2006, totalizando mais de duzentas horas de registros em vídeo gravados nas
comunidades carentes do Brasil.
Segundo Celso Athayde (2006), o objetivo principal do Projeto Falcão é de
conscientizar a sociedade sobre o problema do narcotráfico que está inserido no cotidiano de
inúmeros jovens carentes. Athayde afirma que,
... o Falcão não é um caso de polícia, não é uma denúncia, não é uma lamentação. Falcão é sobretudo uma chance que o Brasil vai ter para refletir sobre uma questão do ponto de vista de quem é o culpado e a vítima. Falcão é uma convocação para que a ordem das coisas seja definitivamente mudada (ATHAYDE apud MARQUES, 2010).1
Antes do documentário “Falcão – Meninos do Tráfico” ser comercializado nas lojas
de varejo, o filme foi exibido em 19 de Março de 2006 no programa dominical “Fantástico”
da Rede Globo de Televisão. Sua apresentação foi dividida em três blocos, sendo
interrompidos por apenas intervalos comerciais, totalizando cinquenta e oito minutos de
exibição em rede nacional.
“Falcão” converteu-se em um fenômeno midiático, pelo fato de ter sido veiculado em
horário nobre pela emissora televisiva Rede Globo, e posteriormente o documentário foi
reprisado na TV Câmara (25/03/2006), na Globo News (27/03/2006), entre outros veículos de
comunicação nacional.
1 Link: http:// www.soleis.com.br/artigos _crack.pdf. Acessado em 13/10/10, ás 14h55
11
Para Cacá Diegues (2010), “Falcão – Meninos do Tráfico” é um documentário que
conseguiu ultrapassar barreiras, e marcar sua posição de forma plausível na história da
cinematografia nacional.
...um filme feito “de dentro”, com pessoas das comunidades filmadas. Isso nunca tinha acontecido antes. É normal que, assim sendo, seu foco e seu impacto sejam diferentes do que já conhecíamos antes. O filme é um marco definitivo na história do audiovisual brasileiro, seja no cinema ou na televisão. Depois dele, nada mais será como antes (DIEGUES apud ALMADA, 2010).2
Na obra “Falcão” são introduzidos diferentes jovens que residem em comunidades
carentes, e enfrentam os mesmos problemas sociais. Sonham com uma vida digna, mas, ao
mesmo tempo, nada conseguem fazer para sair da situação marginalizada em que vivem.
Ao longo do filme, é retratado o cotidiano de meninos que estão envolvidos com o
tráfico de drogas, entrevistas com moradores das comunidades, e pequenos depoimentos do
rapper MV Bill.
Segundo Archimedes Marques (2009), durante o período das gravações do
documentário “Falcão”, dezesseis dos dezessete “falcões” (jovens que trabalham no tráfico
noturno) entrevistados faleceram, sendo que quatorze, em apenas um trimestre, foram vítimas
do meio violento em que eles viviam. Seus funerais também foram documentados, e o único
sobrevivente, Sergio Teixeira (menino que sonhava em ser palhaço), foi empregado pelos
produtores do documentário “Falcão”, Celso Athayde e MV Bill, mas, acabou retornando
para o mundo do crime, e foi posteriormente detido por furtar um celular e uma carteira.3
2 Link: http://racabrasil.uol.com. br/edicoes/101/artigo24920 -1.asp?o=r. Acessado em 27/10/2010, ás 23h45
Sergio foi preso em 2004 e condenado a cinco anos e quatro meses, após cumprir um ano e
sete meses em regime fechado, passou para o regime aberto, e começou a trabalhar durante o
dia no Centro Audiovisual da CUFA (Central Única das Favelas). No ano de 2009, ele se
formou no curso de Gastronomia da CUFA. A autora deste trabalho entrou em contato neste
ano (2011), com o produtor do filme, Celso Athayde que declarou que Sérgio está trabalhando
em um restaurante e se tornou chefe de família.
3 Não sabemos ao certo por quanto tempo que o Sergio trabalhou com os produtores do filme “Falcão”, e muito menos, qual foi o motivo que fez abandonar o emprego.
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O filme “Falcão” trata da cultura e dos problemas das favelas, temas que foram
excluídos da agenda da mídia monopolizada pelos grandes grupos de comunicação nacional.
Podemos mencionar, que após a década de 90 do século passado, o Cinema da
Retomada4
“Falcão - Meninos do Tráfico” possui um valor diferenciado por ser produzido por
cineastas, Celso Athayde e MV Bill, que são oriundos de comunidades carentes, militantes
sociais, e que promovem - por meio da CUFA (Central Única das Favelas) - inúmeros
projetos sociais em prol da inserção no campo profissional dos jovens que residem nas
comunidades carentes. Por este e diversos outros motivos, os produtores do documentário
mostram em sua obra a realidade das regiões periféricas com o olhar de moradores e
conhecedores dos diversos problemas apresentados no documentário. Além disso, os
produtores deste filme utilizaram seus próprios recursos financeiros para a elaboração desta
produção, que contou com a participação dos moradores das comunidades carentes. Ou seja,
não se beneficiaram de nenhum decreto de incentivo cultural (lei de audiovisual).
colaborou de forma gradativa para que os documentários que retratam as diversas
situações precárias de inúmeras periferias brasileiras conquistassem mais espaço na mídia,
trazendo á tona, uma realidade que o jornalismo não “costuma revelar” em seus noticiários.
Este tipo de produção audiovisual é muito importante, pois dá visibilidade a pessoas que não
possuem acesso direto à mídia, e por meio de produções audiovisuais delatam muitas
situações que necessitam da intervenção do Estado.
“Falcão - Meninos do Tráfico” conta com uma produção de setores diretamente vinculados a movimentação social, enraizadas nas favelas, com a CUFA (Central Única das Favelas). É, portanto, um filme não somente dirigido, mas também produzido, com recursos gerenciados de modo autônomo pelo campo popular. Trata-se de verdadeira exceção no cinema brasileiro: um documentário de grande audiência, feito por cineastas que vêm do povo, financiado com recursos próprios (RAMOS, 2008, p, 234).
Percebemos assim, que os documentários que retratam o cotidiano das comunidades
carentes podem proporcionar um novo olhar sobre as questões sociais que estão pendentes nas
4 O Cinema da Retomada se originou em meados dos anos 90 do século passado, através de dois mecanismos de incentivo à cultura: Lei Rouanet e a Lei de Audiovisual. Neste período as produções audiovisuais ganharam impulso, pelo decreto que entrou em vigor, o barateamento dos equipamentos cinematográficos, entre outros fatores. O marco inaugural do Cinema da Retomada foi o filme “Carlota Joaquina – Princesa do Brazil” (1995), de Carla Camurati.
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discussões do Planalto Central. E, além disso, o documentário “Falcão” serve como
referência e inspiração para que outros cineastas produzam filmes que abordem os inúmeros
problemas sociais.
Portanto, os produtores do documentário “Falcão - Meninos do Tráfico”, Celso
Athayde e MV Bill, deixam um exemplo nítido de que não é necessário cursar Universidade
para produzir projetos audiovisuais que colaborem a favor da democracia social, pois, o que
realmente prevalece é a força de vontade e a determinação em prol de um elemento que possa
contribuir de algum modo para o bem estar de todos.
1.1 CUFA “berço” do Projeto Falcão – Meninos do Tráfico
A CUFA (Central Única das Favelas) é uma organização não-governamental e
reconhecida no Brasil e no Exterior por seus trabalhos desenvolvidos na área social, esportiva
e cultural. Esta Instituição foi criada em 1.998, através dos seus fundadores: o rapper MV
Bill, em parceria com seu empresário e produtor musical, Celso Athayde, e a rapper Nega
Gizza (Giselle Gomes Souza). Além de serem anfitriões nesta organização, eles continuam
lutando pela inclusão social dos menos favorecidos da sociedade brasileira.
A primeira instalação da CUFA foi na comunidade Cidade de Deus - Rio de Janeiro, e
atualmente está presente em vinte e cinco Estados Brasileiros, e no Distrito Federal, e também
no exterior, em alguns países como Argentina, França, Espanha, Bolívia e Estados Unidos.
Cada unidade da CUFA desenvolve o seu próprio trabalho, porém, todas as sedes
priorizam as ações que envolvem a educação, esporte, cultura e a cidadania. Algumas
unidades promovem oficinas e cursos profissionalizantes de DJ, Break, Graffiti, Escolinha de
Basquete de Rua, Skate, Informática, Gastronomia, Teatro, Audiovisual, entre outros. Vale a
pena ressaltar que a equipe da CUFA é composta, em grande parte, por jovens oriundos de
comunidades carentes que se formaram nas oficinas de capacitação e profissionalização desta
Instituição, e por diversos profissionais renomados que ministram aulas e palestras de maneira
voluntária, entre esses profissionais podemos citar: a doutora em Comunicação, Ivana Bentes,
o antropólogo, Luis Eduardo Soares, o cineasta, Joel Zito Araujo, o diretor da Central Globo
de Comunicação, Luiz Erlanger e o ator Lázaro Ramos.
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De acordo com Nega Gizza (2009), os primeiros trabalhos que foram desempenhados
pela CUFA surgiram através de projetos audiovisuais.
As coisas começaram a acontecer depois que o videoclipe feito por nós, da música “Soldado do Morro” do MV Bill, foi premiado. Com o dinheiro do prêmio o Bill investiu em equipamentos: câmera, ilha de edição e tudo mais. A partir daí fomos nos organizando e fazendo novas produções como o documentário “Falcão – Meninos do Tráfico”. Depois vieram os cursos de capacitação em audiovisual e o apoio de quem acreditou nos nossos projetos. (GISSA apud CAPAVERDE, 2009).5
A oficina de audiovisual carioca da CUFA (Central Única das Favelas) está no
mercado há sete anos, já produziu mais de cinquenta trabalhos, e é administrada por diretores,
produtores e roteiristas, sendo que muito deles se formaram pela própria CUFA. Estes
profissionais são responsáveis pela criação e edição de filmes, documentários, videoclipes,
propagandas publicitárias e obras audiovisuais.
Além disso, o núcleo audiovisual da CUFA oferece palestras, atividades, cursos de
formação e capacitação profissional, para os jovens que residem nas comunidades carentes.
O departamento de capacitação profissional da CUFA conta com o apoio de diversas
Instituições, como o Ministério do Turismo e a Escola de Comunicação da Universidade
Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), e também com a colaboração de inúmeros profissionais
renomados como o cantor e compositor, Caetano Veloso, o cineasta, Cacá Diegues, a
produtora e Tereza Gonzales.
Os jovens carentes que estão integrados às oficinas e aos cursos audiovisuais da
CUFA (Central Única das Favelas) têm a oportunidade de aprender a manusear câmeras,
software para edição de vídeos e áudios, e também publicam suas matérias através do portal
TV CUFA, e participam da programação nas emissoras de rádios vinculadas ao projeto.
A Coordenadora da oficina de audiovisual da CUFA no Rio de Janeiro, Jossana Notes,
informou-nos em entrevista que o curso de audiovisual tem duração de um ano, e as aulas são
ministradas aos sábados no período das 09h00 às 16h00.
5Link: http://www.plurale.com.br/noticias-ler.php?cod_noticia=6103&origem=busca&%20filtro=ativar&q= Mui tas+ideias+na+cabe%E7a+e+uma+c%E2mera+na+m%%20E3o. Acessado em 12de Outubro de 2010, às 21h45.
15
Jossana também comentou durante a entrevista concedida que a CUFA já formou mais
de quatrocentos jovens, sendo que, muitos deles já estão no mercado cinematográfico
nacional. Só no ano passado (2010), cinquenta e três alunos concluíram com êxito o curso.
Os inúmeros projetos sociais promovidos pela a CUFA profissionalizam e educam
jovens carentes. Além disso, as funções desempenhadas pelos militantes sociais adeptos desta
organização colaboram para o desenvolvimento e fortalecimento da soberania social
Os inúmeros trabalhos realizados atualmente em prol da inclusão social tiveram sua
origem no Brasil, durante a década de 80, por meio das ações promovidas pelos militantes do
Movimento do Vídeo Popular inserido no país na década de 80.
1.2 Movimento do Vídeo Popular no Brasil nos anos 80
Na década de 80, iniciou-se no Brasil um movimento de fortalecimento do vídeo
popular. Esse processo foi desencadeado por partidos políticos de esquerda, sindicatos, grupos
sociais e organizações não-governamentais. O objetivo principal do movimento do vídeo
popular era de registrar suas ações como instrumento de reivindicação social.
Para Luiz Santoro (1989), o vídeo é uma ferramenta indispensável para os
movimentos populares.
O vídeo chega aos grupos e movimentos populares como mais um componente de luta e, por suas características técnicas, adapta-se bem a projetos de comunicação popular, têm os diferentes grupos sociais como público-alvo, prestando-se desde a simples exibição de programas pré – gravados até a produção de mensagens originais (SANTORO, 1989, p.60).
O termo vídeo Popular surgiu em um período de fortalecimento de movimentos
populares, e nesta fase o vídeo era uma recente tecnologia que estava acessível aos brasileiros.
Por este equipamento os grupos adeptos ao movimento do vídeo popular registravam suas
ações e manifestos.
Outra característica é a consolidação da televisão como veículo de comunicação de
massa, atingindo com tecnologia de ponta cerca de cem milhões de telespectadores. Porém, as
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emissoras televisivas estavam sob o comando de poucos empresários, que instituíam normas
internas de acordo com os ideais do governo que lhes autorizavam o uso da concessão
pública.
Com a transformação da sociedade em 1982, os movimentos populares - por meio de
grupos de videocomunicadores - passam a produzir vídeos de forma independente, e sem
nenhum vínculo com as emissoras televisivas.
De acordo com Santoro (1989), a partir do ano de 1982, iniciou-se - nos grandes
centros urbanos - uma manifestação dos adeptos ao movimento do vídeo popular, porém, este
fenômeno não foi exibido pela mídia televisiva.
Os videocomunicadores que não encontravam espaço nos meios de comunicação para
realizar seus trabalhos audiovisuais, optaram por produzir vídeos de forma independente.
Pois, seguindo este método eles driblavam as restrições impostas pelos grandes meios de
comunicação e continuavam fazendo seus trabalhos. Para Santoro (1989), ocorreu um,
... certo relaxamento do Estado, e surge uma censura interna às empresas dissimulada, mas ativa, que mostra a solidariedade dos proprietários com o regime que lhes outorga a concessão de um funcionamento e a submissão aos interesses econômicos. Essa censura interna tem um aspecto diretamente relacionado aos profissionais de comunicação que, em função da crise econômica e do alto índice de desemprego do setor, têm que submeter aos interesses dos proprietários das empresas de comunicação, limitando bastante sua atuação profissional. O vídeo emerge como um promissor espaço de trabalho complementar ao profissional de comunicação, por oferecer possibilidades de autuação às margens desses limites (SANTORO, 1989, p. 63).
Em 1983 foi realizado um curso de capacitação em vídeo para os grupos que atuavam
unidos aos movimentos populares. Esta ação foi promovida pelo Núcleo de Estudos da
Memória Popular do ABC, conjunto ao Centro de Pós-Graduação da Universidade Metodista
de São Bernardo do Campo. O objetivo central era de discutir a utilização do vídeo como
instrumento de animação cultural e intervenção social. Este primeiro projeto possibilitou a
reunião de diversos vídeos ligados aos movimentos populares. Além disso, a realização deste
curso comprovou a necessidade de desenvolver mais trabalhos com o intuito de colocar em
prática conceitos que foram abordados pelos treze grupos participantes. Sendo assim, ficou
fundamentada a organização de um projeto coletivo de documentação no CONCLAT
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(Congresso das Classes Trabalhadoras), que foi realizado no mês de agosto do mesmo ano, no
pavilhão da Companhia Cinematográfica Vera Cruz, em São Bernardo do Campo, reunindo
mais de cinco mil trabalhadores de todo país.
As ações promovidas no CONCLAT foram documentadas pelos seguintes grupos:
CEPIS (Centro de Educação Popular do Instituto Sedes Sapientiae), CEPASE (Centro de
Estudos Políticos e Assessoria Sócio-Econômica), CEPS - ABC (Centro de Estudos Políticos
e Sociais do ABC), Núcleo de Memórias Popular do ABC e os produtores Acylino Júnior e
Celso Maldos. E durante sua programação foi fundada a CUT (Central Única dos
Trabalhadores).
Entre os anos de 1984 a 1987 foram realizados quatro eventos do “Encontro Nacional
de Grupos Produtores de Vídeo no Movimento Popular”, com o intuito de trocar experiências,
realizar cursos de aperfeiçoamento nos campos artísticos, operacional, e exibir programas que
foram produzidos por vários grupos populares.
O I Encontro Nacional de Grupos Produtores de Vídeo do Movimento Popular - 1984,
promovido pela Universidade Metodista São Bernardo do Campo, reuniu mais de cem
pessoas que representaram quarenta grupos e entidades de todo país. Também neste evento,
ocorreram atividades como, oficinas de trabalhos audiovisuais, debates e apresentações de
vídeo do movimento popular.
Para Santoro (1989), o primeiro evento nacional que reuniu diversos profissionais
adeptos do movimento do vídeo popular consolidou o ponto de partida para que os partidários
deste movimento expusessem seus trabalhos e trocassem experiências. Através desta reunião,
o movimento do vídeo popular ganhou mais força para continuar atuando em prol da
democracia visual.
... a avaliação do I Encontro indica que foi inaugurado um novo estágio no trabalho daqueles que utilizam o vídeo nos movimentos populares, sobretudo evidenciando que a luta nesse campo não é isolada, que é cada vez maior o número de companheiros que apesar de desenvolverem atividades isoladamente, segundo seus próprios projetos, terão agora espaço e oportunidade de debaterem seus acertos e fracassos, de trocarem experiências com os outros grupos, que chegam às mesmas necessidades, por caminhos que muitas vezes não são muito comuns (SANTORO, 1989, p.67).
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Podemos mencionar que o primeiro congresso nacional dos produtores de Vídeo do
Movimento Popular, realizado em 1984, foi muito importante para os videocomunicadores,
pois através deste encontro foi possível dar sequência aos trabalhos audiovisuais, adquirir
financiamento para comprar novos equipamentos técnicos.
Em 1984 foi fundada ABVMP (Associação Brasileira de Vídeo no Movimento
Popular), uma organização que representava a política dos grupos de videocomunicadores.
O II Encontro Nacional de Grupos Produtores de Vídeo do Movimento Popular –
1985, organizado pela ABVMP, em São Paulo, contou com a participação do Departamento
de Jornalismo e Editoração da ECA-USP (Escola de Comunicações e Artes da Universidade
de São Paulo). Este evento durou quatro dias, reuniu mais de cento e cinquenta participantes.
E os temas centrais foram: “a linguagem do vídeo”, “distribuição de programas de vídeo”,
“Projetos da ABVMP”, e “Curso Básico de vídeo”.
A partir do segundo evento nacional dos videocomunicadores populares (1985),
realizado pela ABVMP, os vídeos populares conquistaram uma melhor consolidação e
desenvolvimento de seus projetos audiovisuais.
Em 1986, o Movimento do Vídeo Popular agregou novos colaboradores da área
sindical: TV dos Trabalhadores do Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo e Diadema,
TV dos Bancários de São Paulo, Sindicato dos Rodoviários do ABC e o SINTTEL (Sindicato
dos Trabalhadores em Telecomunicações de Minas Gerais e do Rio Grande do Sul), também
foram inseridos trabalhos de grupos ligados aos movimentos populares como: FASE
(Federação de Órgãos para Assistência Social e Educacional), CEDUP (Instituto Brasileiro de
Análises Sociais e Econômicas – Paraíba), ISER (Instituto de Estudos da Religião) - Rio de
Janeiro; e de atividades ligados a Igreja: Projeto Audiovisual da Diocese de Teixeira de
Freitas (BA) e SEPAC (Serviço à Pastoral da Comunicação); de produtores independentes
como Lilith Vídeo (SP), Veneta Vídeo (RJ), TV Bexiga, TV Moóka (SP), TV Maringá (RJ),
entre outros.
A partir de 1985 diversos festivais de cinema e vídeo existentes no país ofereceram
espaço para os produtores de vídeo popular apresentassem seus trabalhos. Um dos primeiros
eventos que os produtores de vídeo participaram foi o Fest Rio (Festival Internacional de
Cinema, TV e Vídeo do Rio de Janeiro), Jornada do Cinema da Bahia, Vídeo Brasil - São
Paulo, Rio Cine Festival - Rio de Janeiro.
19
O III Encontro Nacional de Grupos Produtores de Vídeo do Movimento Popular -
1986, realizado pela ABVMP (Associação Brasileira de Vídeo no Movimento Popular), em
São Paulo, abordou temas relacionados ao vídeo popular e a Constituinte, formação do
realizador de vídeo popular, e projetos da ABVMP.
No terceiro evento nacional dos videocomunicadores populares, promovido pela
ABVMP, foram ministrados cursos de capacitação para os videocomunicadores populares,
atividades relacionadas à metodologia de produção e exibição dos vídeos, aperfeiçoamento
tecno-operacional, formação de repertório, conceitos teóricos sobre comunicação e educação
popular.
Para Santoro (1989), o terceiro congresso realizado pela ABVMP (Associação
Brasileira de Vídeo no Movimento Popular) proporcionou ações que contribuíram para
qualificar profissionalmente os integrantes do Movimento do Vídeo Popular.
... a ABVMP visou desenvolver uma atividade que pudesse estimular e capacitar os grupos a experimentar, dentro dos princípios estabelecidos politicamente pelos movimentos nos quais se inserem. Isto é, cursos que fossem além da mera manipulação do equipamento e contemplassem outros aspectos que em bloco, determinassem a forma, o conteúdo e o uso desses vídeos (SANTORO, 1989, p.71).
Devido ao sucesso que o Movimento do Vídeo Popular conquistava no país em
meados da década de 80, a TV Gazeta concedeu gratuitamente no ano de 1986 um programa
diário de trinta minutos, chamado Ondas livres, para os produtores de vídeos populares
exibirem seus trabalhos. De acordo com Santoro (1989), este fato foi inédito para a televisão
brasileira.
No decorrer da década de 80, os videocomunicadores aderiram com mais facilidade
equipamentos com tecnologia digital para produzir vídeos de forma independente.
Os novos equipamentos, ilhas de edição analógicas substituídas pelas digitais, a chegada da televisão a cabo no país, e finalmente, da própria MTV, contribuíram o fenômeno como boom das produtoras (...). Fazer televisão, fora do circuito comercial, era o espírito predominante da década, o que fez surgir inúmeras experiências, fora do mercado. O baixo custo e a facilidade operacional incentivavam a independência, na produção (LUSVARGUI, 2007, p.59- 60).
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No final de 1986, ocorreu uma greve geral promovida pelas centrais dos trabalhadores.
Esse manifesto foi documentado em vídeo pelos grupos populares que estavam inseridos
neste movimento. A “TV dos Trabalhadores” coordenou, editou e distribuiu o programa final.
Segundo Santoro (1989), esta experiência foi fundamental para consolidar a articulação entre
grupos de vídeo em função de um trabalho comum.
Em 1987, a ABVMP (Associação Brasileira de Vídeo no Movimento Popular),
conseguiu adquirir equipamentos de pós-produção para realizar cópias de vídeos. E neste
mesmo ano iniciou o projeto de distribuição, locação, venda e organização de amostras de
vídeo, coligado ao CDI (Cinema Distribuição Independente); e realizou dois cursos de
capacitação em vídeo apoiados pela UNESCO (Organizações das Nações Unidas para a
Educação, a Ciência e a Cultura), para mais de cinquenta produtores de vídeo popular.
O IV Encontro Nacional de Grupos Produtores de Vídeo do Movimento Popular –
1987, realizado pela ABVMP, em São Paulo, apresentou como tema central: “Por que fazer
vídeo popular hoje?”. Neste evento foram levantadas diversas questões sobre o modo que os
grupos de vídeo inserem-se nos movimentos populares e as relações que se estabelecem com
as entidades que financiam seus trabalhos.
No final da década de 80, os grupos de vídeo não recebiam total apoio por parte das
lideranças populares, pois os mesmos estavam mais interessados em fatores políticos.
O problema da submissão enfrentado por grupos populares inibiu alguns projetos
produzidos por iniciativa própria, pois quem financiava os trabalhos era o movimento, e sem
ele os grupos não teriam condições próprias para executar seus afazeres.
Para solucionar os inúmeros problemas enfrentados pelos participantes do movimento
do vídeo popular chegou-se à conclusão que é necessário as lideranças populares se
sensibilizem e colaborem para superar estas questões. Ficou estabelecido que os
documentários e filmes de ficção são um método eficaz para abordar assuntos referentes aos
movimentos sociais, e neste campo audiovisual é possível estabelecer elementos que
privilegiem a “voz do povo” sobre os fatores socioeconômicos que são veiculados nos
grandes meios de comunicação. Mas, para o vídeo conquistar êxito é necessário que a
produção tenha uma estética favorável, elementos criativos e conteúdo de qualidade.
21
De acordo com Santoro (1989), as diversas manifestações que ocorreram em prol do
Movimento do Vídeo Popular no Brasil foram favoráveis para democratizar a liberdade de
expressão por meio de projetos audiovisuais.
O movimento de vídeo popular desenvolveu uma série de ações e projetos sociais que vão perfeitamente ao encontro das expectativas de democratização da comunicação, não como algo vinculado à contestação dos meios de comunicação de massa, mas como uma democratização num espaço próprio, definido pelo alcance e potencialidade do vídeo (SANTORO, 1989, p.109).
Sendo assim, o Movimento do Vídeo Popular no Brasil favoreceu de certo modo a
democracia social através de projetos audiovisuais. A partir deste manifesto popular surgiram
inúmeras Organizações não-governamentais que lutam em prol da soberania popular. Isto é,
atualmente diversas Instituições atuam por meio de vários projetos sociais para o bem estar
todos.
Dessa forma, as organizações sociais sem fins lucrativos exercem voluntariamente um
papel que deveria ser feito pelos órgãos governamentais da nossa nação. Através destes
trabalhos sociais, o Brasil vai conquistando em passos curtos uma “democracia plena”. Isto é,
entidades e cidadãos trabalham sem renumeração em prol do bem estar da nação, sendo que,
este ofício deveria ser executado pelo o Estado.
22
CAPÍTULO 2 - COMO A FAVELA FOI E ESTÁ SENDO RETRATADA
PELOS MEIOS AUDIOVISUAIS
Neste capítulo iremos abordar assuntos pertinentes às comunidades carentes que foram
e continuam sendo alvo de debates entre diversos meios de comunicação e tema para projetos
audiovisuais. Discorreremos sobre fatores direcionados à favela, violência urbana e o
narcotráfico, por meio de alguns documentários, filmes e produções televisivas que tratam
desta questão.
A origem das favelas deu-se no Brasil entre o final do século XIX e os primeiros anos
do século XX. Segundo o dicionário Aurélio, a palavra favela é classificada como conjuntos
de habitações populares em que a estrutura das residências são precária.
A primeira obra cinematográfica brasileira que retratou questões sociais e culturais
pertinentes aos morros cariocas foi “Favela dos meus amores” (1935), dirigido por Humberto
Mauro. Sheila Schvarzman (2004) relata que este filme quase foi censurado, pelo fato do seu
diretor ter “transgredido” as condutas sociais desta época. Isto é, Humberto introduziu em sua
obra inúmeras imagens que foram gravadas na comunidade carente, Vila Providência - RJ, e
contracenadas por atores negros que eram moradores desta comunidade. Sendo assim, a
censura militar classificou este filme como uma afronta social, e determinou que Humberto
fosse detido sobre suspeita de ser comunista. “Mostrar negros era coisa desses derrotistas que
queriam acabar com a boa imagem do país” (SCHVARZMAN, 2004, p.89). Durante a
averiguação Humberto teve que explicar o porquê que sua obra continha 60% das cenas
filmadas na favela, e contracenada por negros. Graças aos argumentos perspicazes de
Humberto a censura o libertou, e o mesmo pode lançar “Favela dos meus amores”.
Entre o final dos anos 1950 e o início da década de 60, foram lançados diversos filmes
que abordaram os contrastes sociais e culturais das periferias. Entre essas obras podemos citar
“Rio 40 Graus” (1955), “Rio Zona Norte” (1957), “Cinco Vezes Favelas” (1962).
No filme “Rio 40 graus” dirigido por Nelson Pereira dos Santos, a favela é
apresentada como um local tranquilo e aconchegante, onde reside a solidariedade e a poesia.
Os protagonistas desta obra são cinco meninos moradores do morro do Cabuçu situado na
cidade do Rio de Janeiro, que aos domingos comercializam amendoim em cinco pontos
23
turísticos cariocas, e ao entardecer participam e se divertem nos ensaios das Escolas de
Samba.
“Rio 40 Graus” foi censurado no ano de 1955, pelo coronel Geraldo de Menezes
Cortez, chefe da Segurança Pública, que considerou este filme como uma grande mentira,
alegando que à média da temperatura do Rio nunca chegou a 40 graus. Para Cleber Eduardo
(2005), esta obra foi classificada como marco zero das produções brasileiras modernas.
Outra obra importante do Cinema Novo6
A película “Cinco Vezes Favelas” (1962) produzida pelos cineastas Miguel Borges,
Joaquim Pedro de Andrade, Carlos Diegues, Marcos Farias e Leon Hirszman, é composta por
cinco curtas metragens que se coligam como um instrumento de intervenção social, perante a
desigualdade social brasileira da época. Os cinco elementos compostos no filme retratam as
favelas cariocas como uma expressão urbana visualmente plausível.
dirigido pelo cineasta Nelson Pereira dos
Santos é o filme “Rio Zona Norte” (1957), que narra a trajetória do compositor e sambista
carioca Espírito da Luz que tentou fazer sucesso com suas composições para oferecer melhor
condição de vida para sua namorada Adelaide, e o seu filho Norival. No decorrer da trama,
Espírito foi vítima do radialista Maurício, que se aproveitou de sua inocência e roubou suas
principais composições. O sambista passou os seus últimos dias no leito de um hospital, tendo
como visita apenas um admirador do seu talento.
Durante as décadas de 70 e 80, o cinema brasileiro passou por um momento
“delicado” e produziu poucos filmes que tratavam de assuntos ligados à favela. Porém, surgiu
nesta mesma época uma crescente demanda de filmes independentes ligados ao movimento
popular, como por exemplo, o documentário “Santa Marta” (1987) do cineasta Eduardo
Coutinho, que relata o cotidiano, cultura, racismo e a violência vividos diariamente pelos
moradores da comunidade Santa Marta, localizada na cidade do Rio de Janeiro.
Ressalte-se que, o documentário “Santa Marta, duas semanas no morro” não
encontrou espaço na mídia nacional da época (1987), porém logrou êxito em outros países,
sendo exibido no Festival de cinema de Cuba (1987) e vendido para duas emissoras
televisivas da Europa: a Channel Four da Inglaterra e para TV Espanhola.
6 O Cinema Novo foi um movimento cultural que surgiu em meados da década de 50 no Brasil com objetivo de criar uma identidade nacional, para as produções cinematográficas brasileiras
24
Segundo Consuelo Lins (2004), o documentário “Santa Marta” obteve, no final da
década de 80, grande repercussão nas comunidades de baixa renda carioca, entretanto, as
emissoras de televisão brasileira deste período negaram-se a veicular o documentário.
Desde então, é o filme de Coutinho mais exibido, o que mais repercussão tem dentro das favelas, o que suscita mais debates, (...) Coutinho fez um breve diagnóstico da situação dramática do documentário no Brasil a partir da impossibilidade de vender o Santa Marta: duas semanas no morro para a televisão. Na TV Bandeirantes, só passaria se tivesse patrocínio; na TV Globo disseram que não se interessavam, “porque era muito antropológico, e eles queriam coisas mais jornalísticas”. Essa resistência das emissoras de televisão a uma estética diferente é o que provoca “a inviabilidade econômica dos documentários” (LINS, 2004, p.73).
No final da década de 90, os temas referentes à representação das periferias começam
a protagonizar inúmeros projetos audiovisuais: documentários, filmes e programas
televisivos. Nas obras cinematográficas, um conjunto bastante expressivo de películas tem
abordado temas referentes às comunidades de baixa renda e o narcotráfico. Entre as diversas
produções audiovisuais lançadas neste período, apreciaremos algumas obras que apresentam
diferentes aspectos inseridos nas comunidades carentes brasileiras.
O documentário “Santo Forte” (1999), produzido pelo cineasta Eduardo Coutinho,
retrata diversas crenças religiosas tais como: católica, evangélica e umbanda que são seguidas
por alguns moradores da comunidade de baixa renda, Vila Parque da Cidade, situada na
cidade do Rio de Janeiro. Observemos, esta obra também inseriu diversas experiências e
vivências narradas pelos populares desta periferia.
A obra “Noticias de uma Guerra Particular” (1999), produzida por João Salles e Kátia
Lund, relata depoimentos do cotidiano de agentes de segurança pública, traficantes, e de
moradores da favela carioca Santa Marta. Este documentário fomentou grande repercussão
midiática no final da década de 90, sendo exibido em vários festivais de cinema, e nas
emissoras televisivas GNT e Globonews.
Um aspecto importante a observar é que o documentário “Noticias de uma Guerra
Particular” possui alguns contrastes semelhantes ao documentário “Falcão - Meninos do
Tráfico” (2006) que será analisado no próximo capítulo; o que diferencia ambas as obras é o
ponto averiguado sobre a questão do narcotráfico e da periferia.
25
No dia da virada do século (31 de Dezembro de 1999), o cineasta Eduardo Coutinho,
em conjunto com sua equipe, filmou os preparativos para festa do Reveillon entre os
moradores das comunidades Chapéu Mangueira e Babilônia, localizada na cidade do Rio de
Janeiro. As imagens e os depoimentos registrados em vídeo resultaram no documentário
“Babilônia 2000”.
À medida que os documentários buscam incorporar questões sobre as estruturas
sociais, oferecem oportunidade para o pronunciamento de diferentes cidadãos que residem nas
comunidades de baixa renda, a cinematografia exerce a função de democratizar o enunciado
aos sujeitos sociais. Sendo assim, as projeções audiovisuais contemporâneas estimulam um
“contato visual” entre os moradores das favelas e as demais camadas sociais.
De acordo com Bill Nichols (2005), os documentaristas que abordam em seus
trabalhos questões sociais, podem estimular,
(...) nossa compreensão sobre o que a realidade foi e o que poderá vir a ser. Esses filmes também transmitem verdades, se assim quisermos. Precisamos avaliar suas reivindicações e afirmações, seus pontos de vista e argumentos relativos ao mundo como o conhecemos, e decidir se merecem que acreditemos neles. Os documentários de representação social proporcionam novas visões de um mundo comum, para que as exploremos e compreendemos (NICHOLS, 2005, p. 26- 27).
Sendo assim, o campo documental contemporâneo exerce a função de trazer à tona
questões sociais, que por diversas vezes e fatores ficaram “adormecidas” nos debates e
discussões da sociedade.
Algumas obras de ficção - veiculadas no cinema contemporâneo e nas mídias
televisivas brasileiras - também fomentam em seus trabalhos fatores sociais. Sendo que,
inúmeras produções retratam aspectos que estão direcionados às comunidades de baixa renda,
mas por se tratar de películas de ficção, são agregadas algumas características que estão
inseridas no imaginário do espetacular, isto é, produções que fazem os espectadores
“vivenciarem” as imagens que são expostas, assim os mesmos podem sentirem-se “alegres”
ou “dramatizados” com a obra que acabaram de assistir.
No entanto, as favelas brasileiras conquistam de forma crescente espaço na mídia,
porém, é necessário analisar como está sendo feita a construção destas imagens e de seus
26
personagens, pois a partir deste conceito pode-se averiguar se tais produções colaboram para
democracia e a inclusão social das comunidades carentes, ou o trabalho simplesmente
transmite uma imagem negativa “legitimando” a pobreza e seus derivados que estão
instalados nesta classe social.
O longa-metragem “Cidade de Deus” (2002), produzido por Fernando Meireles, narra
a trajetória de vida de cinco personagens, Sandro Cenoura, Mané Galinha, Buscapé, Zé
Pequeno, Bene, Cabeleira e Dadinho, que residem na favela Cidade de Deus localizada na
cidade do Rio de Janeiro. Esta trama centraliza-se nos protagonistas Buscapé e Dadinho, que
são amigos de infância, porém cada um segue uma trilha de vida totalmente oposta uma da
outra, isto é, no decorrer do filme Dadinho passa a se chamar Zé Pequeno e opta por seguir o
caminho do crime, já o Buscapé prefere ter uma vida digna (longe dos crimes) e sonha em ser
fotógrafo; ao conquistar uma câmera fotográfica documenta o cotidiano da favela.
“Cidade de Deus” recebeu quatro indicações ao Oscar e conquistou diversos prêmios
em festivais no Brasil e no Exterior. O filme gerou polêmica, envolvendo a crítica e os
moradores do local que dão título ao filme. Esta discussão repercutiu também no exterior,
onde ficou conhecido como “favela situation”. No entanto, o morador da Cidade de Deus,
MV Bill (2003), alega ter se decepcionado com a forma que a comunidade em qual reside foi
retratada.
“Cidade de Deus” ganharia o Oscar, e a nossa Favela ganharia o Oscar da violência (...) o mundo inteiro vai saber que esse filme não trouxe nada de bom para a favela, nem benefício social, nem moral, nenhum benefício humano. O mundo vai saber que eles exploraram a imagem das crianças daqui da CDD (Cidade de Deus). O que vemos é o tamanho do estigma que elas vão ter que carregar pela vida só aumentou, só cresceu com este filme. Estereotiparam nossa gente e não deram nada em troca para essas pessoas. Pior estereotiparam como ficção e venderam como verdade (...) mas que humilhação pela qual estamos passando sirva de exemplo para outras comunidades que vivem na miséria. Se alguém transformar suas vidas num grande circo peça contrapartida, mesmo que seja um simples palhaço. Pois pelo menos alguma alegria estará garantida (BILL, 2003).7
O filme “Cidade de Deus”, além de ser repreendido por Bill, recebeu outras
“condenações”, e foi alvo de inúmeros debates entre estudiosos e críticos de cinema.
7 Link: http://revistaquem.globo.com/Revista/Quem/0,,EMI35165-9531,00-INTEGRA +DO+TEXTO +DE+MV + BILL+CONTRA+O+FILME+CIDADE+ DE + DEUS.html. Acessado em 20 de Abril de 2011, ás 12h15.
27
A obra “Uma Onda no Ar” (2002), produzida por Helvécio Ratton, conta a história de
quatro personagens, Jorge, Brau, Roque e Zequiel, que são amigos e moram em uma favela
situada na cidade de Belo Horizonte, ambos almejam criar uma emissora de rádio com a
programação direcionada exclusivamente para “a voz do morro”. Improvisando equipamentos
técnicos e sem um local fixo, a rádio Favela consegue operar na ilegalidade, no decorrer da
trajetória a emissora conquista inúmeros ouvintes. Devido ao sucesso crescente da rádio
Favela e pelo fato de não estar legalizada, seus idealizadores e colaboradores enfrentaram
diversas advertências, repressões pelos membros do Poder Público. Este filme recebeu
diversos prêmios em festivais de cinema do Brasil e do Exterior.
O filme “Uma Onda no Ar” retratou um problema crucial enfrentado por inúmeras
emissoras de rádios que operam de forma ilegal, conhecidas como “rádios pirata”. Pois, para
montar uma emissora radiofônica comunitária e operar na legalidade, é necessário apresentar
diversos requerimentos burocráticos que são exigidos pela ABERT (Agência Brasileira de
emissoras de Rádio e Televisão). Além disso, as rádios comunitárias regularizadas têm que
seguir à risca uma cartilha (regras) imposta por esse órgão governamental; como por exemplo,
as emissoras de rádios comunitárias não podem veicular programas policiais, devem utilizar
equipamentos homologados (equipamentos com o selo de qualidade do Ministério das
Comunicações), entre outros fatores8
“Uma Onda no Ar” foi inspirado na biografia da rádio Favela FM, fundada em 1981,
por um grupo de moradores da favela Aglomerado da Serra, situada na cidade de Belo
Horizonte – MG, durante quase duas décadas esta emissora operou na ilegalidade, sendo
fechada diversas vezes por policiais, mas, logo a seguir reaberta, ainda operando na
ilegalidade, isto é, assim que os policiais fechavam o estúdio, os colaboradores da rádio
Favela, mudavam para outro barraco, e assim continuavam a transmitir suas programações de
maneira não oficial. Em 1996, a rádio Favela, conseguiu alvará de funcionamento concedido
pela Prefeitura de Belo Horizonte. E, durante dois anos consecutivos esta emissora (1997 e
1998) recebeu duas condecorações pela ONU (Organização das Nações Unidas) por sua
. Se acaso uma emissora de rádio comunitária transgredir
as condutas impostas pela ABERT será penalizada por seu ato. Sendo assim, a legislação
atual dificulta a regulamentação das rádios comunitárias, e por este fato, diversas “rádios
pirata” continuam a exercer sua função de forma ilegal. O ideal para regulamentar todas as
rádios clandestinas seria uma legislação mais branda e menos burocrática.
8 Para mais informações sobre os requerimentos exigidos pela ABERT, consulte http://www.dhnet.org.br/dados/ cartilhas/ciber/br/radiotv.htm#tit_23
28
atuação no combate às drogas e à violência. No ano de 2000, a rádio Favela conseguiu
autorização do Ministério das Comunicações de Minas Gerais para operar como emissora
educativa.
A rádio Favela de Minas Gerais iniciou seu trabalho de forma clandestina e com a
força de vontade e determinação de seus produtores, a emissora conseguiu tornar-se
reconhecida como uma entidade cultural. Devido ao sucesso conquistado serviu de inspiração
para o filme “Uma Onda no Ar”. Podemos mencionar que o trabalho social conjunto deste
filme tende a favorecer a democratização de projetos sociais, e que também colabora para
fortalecer a imagem positiva das favelas brasileiras.
De acordo com Rosana Soares e Cíntia Liesenberg (2007), “Uma Onda no Ar” é uma
obra que mistura a fantasia da ficção e a arte da realidade, fazendo com que a favela não seja
apenas apresentada como um local que possui contrastes negativos (violência, pobreza,
drogas...), e sim um lugar onde há moradores que lutam para instalar projetos sociais que
beneficiem a todos que residem na comunidade. Além disso, elas fazem uma análise
comparativa entre os filmes “Uma Onda no Ar” e “Cidade de Deus”,
(...) é interessante notar, nesse filme (“Uma Onda no Ar”) são apresentadas as relações da favela como mais um lugar para se viver, sempre ressaltando as redes sociais ali presentes e as diversas formas de atuação de seus moradores. Ao contrário de “Cidade de Deus”, o filme “Uma Onda no Ar” evoca outras maneiras de se pensar o ambiente da favela, em que violência, tráfico e crime estão presentes, mas não de forma exclusiva (são um elemento entre outros elementos), o que se abre passagem para a criação de uma rádio naquele ambiente. Como ponto em comum nesses filmes além de serem de alguma forma baseados em fatos e dotados de estrutura referencial temos uma representação da sociedade brasileira que estabelece demarcações precisas entre centro e periferia, cidade e favela, riqueza e pobreza (LIESENBERG e SOARES, 2007, p.43).
A periferia também ganhou destaque nas produções televisivas através das séries,
“Turma do Gueto” apresentado pela Rede Record, e “Cidades dos Homens” pela Rede Globo.
“Turma do Gueto” (2002 - 2004), veiculada pela TV Record, conta a história do
cotidiano dos alunos e professores de uma escola Municipal localizada na periferia da cidade
de São Paulo e por meio de seus protagonistas, são apresentados diversos conflitos,
relacionamentos amorosos, violência urbana, tráfico de drogas e outros temas.
29
“Cidades dos Homens” (2002- 2005), transmitida pela TV Rede Globo, conta a
história de dois garotos, Laranjinha e Acerola, moradores de uma comunidade carente do Rio
de Janeiro. Os protagonistas desta obra lidam com situações típicas da adolescência,
vivenciam diversos problemas e alegrias entre os morros e o “asfalto” carioca. Nesta trama
são retratados os contrates das diferenças socioeconômicas, violência urbana, narcotráfico e
aspectos culturais das favelas. Esta série recebeu duas premiações, sendo uma nacional, em
2002 - prêmio de crítica da APCA (Associação Paulista dos Críticos de Arte), e outra na
França, em 2004 - prêmio de ouro do Festival Internacional de Programas Audiovisuais. Esta
série também inspirou a produção de um longa-metragem homônimo, dirigido por Paulo
Moreli, que foi lançado no cinema brasileiro em 2007.
As produções “Turma do Gueto” e “Cidades dos Homens” apresentam contrastes
semelhantes, isto é, exploraram elementos referentes à violência, narcotráfico e periferia,
porém, cada trama escolhe cidades e fatos diferentes, isto é, “Turma do Gueto” contracenada
em São Paulo, explora situações que ocorrem dentro e fora da escola que são vivenciadas
pelos seus personagens; e “Cidades dos Homens” contracenada no Rio de Janeiro, utiliza
elementos que são “típicos” dos jovens carentes que residem nos morros cariocas.
De acordo com Eugênio Bucci (2002), a série “Cidades dos Homens” é uma boa obra,
mas, à série “Turma do Gueto”, é uma:
(...) deficiência de fundo da TV contemporânea. Essa epidemia de realismo social na TV (um realismo socialista de mercado) muito raramente traz alguma contribuição artística. Quase sempre é apenas um fator de demagogia, ou de constrangimento, ou de oportunismo. Um fator de pobreza, pobreza de imaginação (BUCCI, 2002).9
Divergências à parte, as produções audiovisuais que retratam temas como as favelas e
questões sociais estão em constante desenvolvimento. Sendo assim, apresentamos produções
televisivas, filmes e documentários que foram veiculados na mídia nacional contemporânea.
Após exibir a série “Cidade dos Homens” (transmitida até 2005) a emissora Rede
Globo, exibiu quatro produções que abordam sob diferentes ângulos questões sociais como a
9 Link: http://www.observatoriodaimprensa.com.br/artigos/asp0412200298.htm. Acessado em 20 de Abril de 2010, às 12h 15.
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violência urbana, tráfico de drogas, e os contrastes culturais que estão inseridos nas
comunidades carentes brasileira. O programa de auditório “Central da Periferia” (2006) e o
quadro “Minha Periferia” (2006 - 2007) exibido pela revista eletrônica Fantástico,
apresentados por Regina Casé; veiculavam elementos culturais como a música e a dança, que
estão introduzidos no cotidiano das periferias. A minissérie “Antônia” (2006 - 2007) foi
inspirada no longa-metragem homônimo (2006), dirigido por Tata Amaral, esta trama
apresentou as dificuldades vividas por quatro protagonistas, Preta (Negra Li), Barbarah (Leila
Moreno), Mayah (Quelyna) e Lena (Cindy Mendes), que morava em Vila Brasilândia, um
bairro pobre e violento da periferia de São Paulo; ambas as personagens enfrentam diversas
dificuldades do cotidiano e lutam para conquistar sucesso com seu grupo de hip-hop.
No entanto, somente após quase duas décadas é que a emissora televisiva Rede Globo
aceitou transmitir um documentário que retrata um “grave” problema social brasileiro. Em
1987 a TV Globo negou-se a transmitir o documentário “Santa Marta - duas semanas no
morro”, fato que não ocorreu em 2006 quando veiculou o filme “Falcão – Meninos do
Tráfico”. No dia 19 de Marco de 2006, a revista eletrônica “Fantástico” (Globo) dedicou
exclusivamente sua programação para exibir a obra “Falcão”, dirigida por MV Bill e Celso
Athayde, esta produção apresenta o cotidiano dos jovens e adolescentes que trabalham para o
narcotráfico brasileiro. Articularemos mais sobre este documentário no próximo capítulo.
Em contrapartida, também podemos mencionar que as comunidades carentes e
questões sociais também adquiriram “hegemonia” nas “telinhas” cinematográficas
contemporâneas. O cinema brasileiro vem lançando nos últimos anos diversos filmes e
documentários que abordam o narcotráfico, periferia e a violência urbana. Entre as inúmeras
obras, citaremos aquelas que conquistaram mais repercussão no cinema brasileiro que são,
“Proibido Proibir” (2006), “Tropa de Elite” (2007), “Era uma vez” (2008), ”Show de bola”
(2008), “Última Parada 174” (2008), “Dançando com o Diabo” (2009), “Contratempo”
(2009), “Sonhos Roubados” (2010), “5x Favela – Agora por Nós Mesmos” (2010), “Tropa de
Elite 2” (2010), “Lixo Extraordinário” (2010).
É importante ressaltar que a cinematografia nacional moderna possui uma liberdade
(sem censura democrática) para expor inúmeros tipos de história, que seja desde um fato
trágico até o mais hilariante.
Entretanto, através das exibições do gênero de entretenimento as emissoras televisivas
brasileiras também procuram inserir-se no debate social e cultural promovido pelo cinema.
31
Segundo Marina Mello (2006), a televisão cede ao se prontificar em exibir projetos
audiovisuais que tratam das questões sociais, mas, de outro lado oculta a responsabilidade em
investigar e trazer à tona as possíveis soluções para este problema, ou melhor, não se
encarrega de questionar e cobrar dos responsáveis sobre as questões ligadas ao narcotráfico,
favela e violência urbana.
Podemos mencionar que a imagem da periferia vem passando por uma reciclagem,
isto é, às vezes retratada com uma imagem benéfica, outras com uma imagem maléfica. E,
além disso, os fatores que agregam o cotidiano das comunidades carentes são constantemente
retratados na mídia, através de filmes, minisséries e de reportagens jornalística.
Para Ivana Bentes (2007), o discurso televisivo assume uma postura contraditória, pelo
fato dos telejornais apresentarem os moradores das comunidades de baixa renda como
marginalizados através das reportagens que abordam a criminalidade e a violência, e ao
mesmo tempo na dramaturgia essa mesma população é retratada por uma imagem referente à
cultura popular tornando-se um “favelado legal”.
Existe um discurso celebratório da “periferia legal”, como se aquelas produções culturais fossem geração espontânea do nosso povo criativo (...). O perigo é a gente transformar pobreza em folclore ou em gênero cultural, naturalizar isso achar que “puxa, é legal ser pobre”. Aceitar essa domesticação do racismo, do preconceito, da desigualdade e criar o pobre criativo e feliz, mas fora da universidade, sem disputar emprego com os garotos de classe média. Enfim, o pobre “limpinho” do discurso higienista, pronto para consumir, sem um sobressalto ético, sem perceber a violência física e simbólica a qual esses jovens são submetidos (BENTES apud MELO, 2007, p.30).
No entanto, para Marcia Leite (2006), as comunidades carentes estão inseridas nos
meios de comunicação contemporâneas, porém, há um contraponto ao retratar os cidadãos de
baixa renda entre a cinematografia e os telejornais. Leite relata que perante a mídia as
periferias são:
Vistas em bloco, homogeneizadas. Quase sempre representadas como territórios de uma guerra que ameaça o asfalto. Nas telas do cinema, começam a emergir como realidades heterogêneas, internamente multifacetadas, polissêmicas e polifônicas (LEITE apud COLUCCI, 2006, p.99 - 100).
32
Ivana Bentes (2006) observa mais um aspecto sobre a questão da periferia apresentada
nos meios de comunicação televisivos. Para ela não é por generosidade que os produtores
televisivos abordam questões ligadas à periferia. Alega ainda que a televisão exerce um
comportamento “bipolar”, isto é, a TV inclui visualmente jovens carentes por meio de
campanhas publicitárias ou através de programas de entretenimento. Mas, em contrapartida,
ao mesmo tempo em que apresenta a periferia e seus derivados nestas produções, veicula em
seus telejornais a criminalidade e a violência desta mesma classe social.
Esses mesmos meninos que aparecem no Antônia (série televisiva) ou na Central da Periferia (programa televisivo), na hora do Jornal Nacional são mostrados como a causa da violência urbana. Faz-se um discurso de terror em torno desses grupos (BENTES apud CARIELLO, 2006) 10
,
No entanto, fica evidente que algumas emissoras televisivas brasileiras apresentam
através de seus telejornais a periferia com imagens maléficas (violência urbana,
criminalidade, tráfico de drogas...), o que acaba impondo aos cidadãos de baixo poder
aquisitivo e moradores das comunidades carentes a figura de marginais ou de transgressores
da conduta ética e social brasileira. Ao mesmo tempo, outros gêneros televisivos como o de
entretenimento e teleficção, retratam a favela e seus derivados com um contraste positivo, isto
é, veiculam elementos culturais populares instalados nas comunidades de baixa renda.
Podemos citar como exemplo um dos aspectos culturais mais conhecidos pelos quatros cantos
do país e no exterior, que são os ritmos musicais samba e o funk carioca. Sendo assim,
inúmeras produções televisivas que abordam assuntos pertinentes à periferia possuem dois
pesos e duas medidas, que podem ser interpretados de acordo com o grau psíquico de cada
telespectador, isto é, a teoria da comunicação, explica que cada indivíduo (receptor) capta
intelectualmente a uma determinada informação (mensagem) de acordo com seus bens
simbólicos, e esta mesma mensagem que foi veiculada na mídia (emissor) poderá ser
“consumida” segundo os preceitos e padrões culturais e sociais de cada cidadão.
Além das produções de entretenimento, o campo documental também retrata temas
ligados ao narcotráfico, favela e violência urbana. Sendo que os documentários podem
10 Link: http://www1.folha.uol.com.br/folha/ilustrada/ult90u66963.shtml. Acessado em 28 de Abril de 2011, ás 09h30.
33
proporcionar uma visão real (na maioria das vezes) e argumentos sobre estas questões sociais,
e para conquistar legitimação os documentaristas registram fatos com o intuito de assumir o
papel de representantes do público perante o tema que está sendo documentado.
De acordo com Bill Nichols (2005), o campo documental proporciona diversos tipos
de abordagens com os elementos que estão inseridos na realidade da sociedade. Através
destes trabalhos alguns documentários retratam questões em prol da democracia social.
A interpretação é uma questão de compreender como a forma ou organização do filme transmite significados e valores. A crença depende de como reagimos a esses significados e valores. Podemos acreditar das verdades das ficções, assim como nas das não – ficções (...). A crença é encorajada nos documentários, já que eles frequentemente visam exercer um impacto (...). A ficção talvez se contente em suspender a incredulidade (aceitar o mundo de forma plausível), mas a não – ficção com frequência quer instilar crença. É isso o que alinha o documentário com tradição retórica, na qual a eloquência tem um propósito estético e social. Do documentário, não tiramos apenas prazer, mas uma direção também (NICHOLS, 2005, p.27).
Dessa forma, o campo documental colabora para ratificar questões sociais abordadas
por alguns documentários, e, além disso, propicia aos espectadores uma “visão real” sobre os
fatos retratados.
Porém, não podemos desmerecer as obras de ficção contemporâneas que abordam
temas relacionados às questões sociais, pois esses filmes também colaboram para que estes
assuntos sejam fomentados entre os debates da população e acadêmicos.
Segundo Esther Hamburguer (2008), os filmes que abordam assuntos direcionados à
periferia, violência urbana e o narcotráfico, exibidos no cinema brasileiro contemporâneo,
fazem com que estes temas sejam alvo de debates entre a sociedade e estudiosos sociais, ao
contrário de alguns programas televisivos que somente apresentam o caso.
De uma forma ou de outra, esses filmes colocam o dedo em uma ferida que a televisão ignorava até o início dos anos 90, quando surge o Aqui, Agora, primeiro de uma série de telejornais vespertinos em chave sensacionalista. Mais recentemente nos anos 2000, e especialmente a partir de 2006, a TV absorve a temática em novelas e seriados na Globo e na Record, mas essa presença vem a reboque. Os programas repercutem pouco. Não geram discussão como acontece com os filmes que se dedicam ao assunto (HAMBURGUER, 2008, p. 555).
34
O cinema brasileiro colaborou e continua promovendo inúmeros debates sobre
diversas questões sociais que até “pouco tempo” eram tabus na sociedade. Sendo assim,
através de diversas obras, o avanço e fortalecimento de inúmeros elementos que envolvem a
democracia social vêm sendo exercitada no campo cinematográfico.
No entanto, podemos mencionar que a favela não é mais retratada exclusivamente
pelos grandes meios de comunicação nacional, pois em diversas comunidades carentes
brasileiras ONGs promovem trabalhos em núcleos de projetos audiovisuais e festivais de
curtas-metragens que veiculam filmes que foram produzidos dentro das periferias e pelos
próprios moradores.
2.1 A Periferia também tem Canais de Comunicação e Oficinas de Projetos Audiovisuais
Atualmente, diversas associações não-governamentais disponibilizam aos moradores
de comunidades carentes inúmeros trabalhos sociais. Entre eles, destacaremos os projetos
ligados a CUFA (Central Única das Favelas) - mais informações sobre esta organização estão
mencionadas no capítulo anterior.
O Núcleo Audiovisual da CUFA proporciona cursos profissionalizantes para os jovens
e adolescentes carentes aprenderem a manusear e operar equipamentos técnicos de vídeo,
produzir obras audiovisuais, sob a orientação de profissionais reconhecidos no campo
cinematográfico nacional
Devido ao sucesso conquistado pelos inúmeros trabalhos produzidos pela oficina
Audiovisual da CUFA. Esta organização promove desde 2007, o Cine Cufa, que é um festival
Internacional de Cinema, dedicado a trabalhos audiovisuais produzidos por moradores e
representantes de comunidades carentes do Brasil e do Exterior. O Cine Cufa tem como
objetivo principal a inclusão social e democratização a sétima arte.
O Cine Cufa é um evento que ocorre anualmente, e apresenta sessões de projetos
audiovisuais produzidos em diversos Estados brasileiro e de outros países (Estados Unidos,
México, França, Bolívia entre outros), e a cada edição homenageia um ícone de lutas em prol
da inclusão social das periferias e de movimentos sociais. Também realiza debates sobre
diversas questões sociais e cinematográficas com renomados profissionais do mercado
audiovisual como: Cacá Diegues, Rodrigo Felha, Rodrigo Pimentel e MV Bill.
35
Ressaltemos que as ações desempenhadas pelo Movimento do Vídeo Popular na
década de 80 foram o primórdio das Organizações não-governamentais que atuam em
projetos sociais no Brasil, pois o uso do vídeo como uma ferramenta de manifestação social
iniciara-se no Brasil através dos adeptos da militância do vídeo popular. Este movimento
visava conquistar espaço para veicular seus trabalhos audiovisuais perante os grandes meios
de comunicação, fato que acontece atualmente com as ONGs que lutam para conseguir
notoriedade dos projetos audiovisuais produzidos por jovens carentes.
Outro aspecto importante a ser lembrado é que de certo modo os inúmeros trabalhos
sociais desenvolvidos pela ONGs contemporâneas conseguem com mais “facilidade”
equipamentos técnicos, colaboração de profissionais renomados que atuam voluntariamente e
de Instituições que ajudam promover ações sociais. Ao contrário do que ocorreu na década de
80, os participantes do Movimento do Vídeo Popular passaram por diversas dificuldades
financeiras e censuras dos proprietários das empresas de comunicação. Mas, mesmo
enfrentando essas “barreiras”, os militantes deste movimento conseguiram fundar ABVMP
(Associação Brasileira de Vídeo no Movimento Popular), que desenvolvia - através de
eventos debates sobre temas relacionados ao vídeo popular - diversos cursos e atividades de
capacitação para os videocomunicadores populares, entre outros fatores que foram citados no
capítulo anterior. Dessa maneira, as conquistas obtidas pelas ONGs contemporâneas que
atuam em prol da democracia social são provenientes dos trabalhos desenvolvidos pelo
Movimento do Vídeo Popular da década de 80.
De acordo com Hermano Vianna (2007), a comunidade carente conquistou espaço e
liberdade para se auto apresentar culturalmente perante a mídia contemporânea. Ele afirma,
... não ter dúvida nenhuma: a novidade mais importante da cultura brasileira na última década foi o aparecimento da voz direta da periferia falando alto em todos os lugares do país. A periferia cansou de esperar a oportunidade que nunca chegava, e que viria de fora, do centro. A periferia não precisa mais de intermediários (aqueles que sempre falavam em seu nome) para estabelecer conexões com o resto do Brasil e com o resto do mundo. Antes, os políticos diziam: “Vamos levar cultura para a favela”. Agora é diferente: a favela responde: “Qualé, Mané! O que não falta aqui é cultura! Olha só o que o mundo tem a aprender com a gente!” (VIANNA, 2007).11
11 Link: http://revistaraiz.uol.com.br/portal/index.php?option=com_content&task=view&id= 220 Item id=180. Acessado em 28 de Abril de 2011, as 16h45.
36
Podemos estabelecer que o desenvolvimento e os méritos que as associações de
projetos sociais contemporâneas vêm conquistando são devido ao trabalho e a dedicação de
muitos militantes sociais. Em especial, podemos destacar que a CUFA (Central Única das
Favelas) já conquistou espaço e credibilidade perante a mídia, pois esta organização conta
com diversos projetos sociais. No campo comunicacional atua em programas radiofônicos
(em diversas emissoras de rádio espalhadas no Brasil e na web) um canal visual na web TV
CUFA, e, além disso, esta instituição começou a veicular no mês de maio deste ano (2011) o
programa Aglomerado, pela emissora televisiva TV Brasil. O Aglomerado é apresentado pelo
rapper MV Bill e a Nega Gizza (ambos são fundadores da CUFA) conta com um auditório,
recebe diversos convidados e artistas em entrevistas e números musicais. Este programa
também apresenta quadros e matérias que retratam questões sociais, educação, cultura,
esporte e outras questões envolvidas na cultura popular.
A periferia brasileira “sofreu” durante muitos anos o racismo, preconceito e a
negligência social diante dos meios de comunicação. Mas, com o esforço e a dedicação de
inúmeros projetos audiovisuais e ações sociais, este contraste está sendo modificado. Ainda
há muitos fatores a trabalhar para um melhor progresso da democracia social. Porém, os
primeiros passos já foram e continuam sendo dados pelos militantes sociais.
37
CAPÍTULO 3 - DOCUMENTÁRIO “FALCÃO” ANALISADO POR
MEDIDAS E FORMATOS
O documentário “Falcão – Meninos do Tráfico” (2006), produzido por Celso Athayde
e MV Bill, enfoca, por diferentes ângulos, a influência do tráfico de drogas no cotidiano de
adolescentes e jovens do nosso país. No documentário são apresentadas entrevistas com
moradores das comunidades carentes e depoimentos do rapper MV Bill.
Em 19 de Março de 2006, a emissora televisiva Rede Globo, por meio de sua revista
eletrônica “Fantástico”, veiculou o filme “Falcão”. Porém, a obra não foi reproduzida de
forma corrente, isto é, sua apresentação foi interrompida por intervalos comerciais, e por
enunciados dos apresentadores do programa, Glória Maria e Zeca Camargo em conjunto com
o diretor desta obra, MV Bill.
A cada bloco de exibição do documentário “Falcão”, os âncoras da revista eletrônica
“Fantástico”, Glória Maria e Zeca Camargo, esclareciam e situavam a filmagem, ao lado do
diretor do filme, MV Bill, que também se inseria ao debate. A Rede Globo responsabilizou-se
pela apresentação de cenas com imagem-câmera intensas, mas, o corte explicativo,
introduzido pelas vozes extras que antecederam cada bloco, foi um método para incorporar o
discurso dos personagens que utilizavam jargões (gírias) para se expressarem.
No decorrer do documentário “Falcão” foram exibidas uma série de imagens intensas
do cotidiano das comunidades de baixa renda, costuradas por voz em off, com conteúdo de
cenas fortes.
Para Fernão Ramos (2008), “a força das imagens parece ter carga suficiente para que
os diretores sintam-se a vontade em exibi-las numa sequência temática” (RAMOS, 2008,
p.231).
A exposição narrativa foi anexada no modo temático, com assuntos isolados ou
ilustrados por legendas, para informar o espectador do assunto que estava sendo tratado no
quadro apresentado. Em diversas tomadas deste documentário, os Falcões utilizaram um
linguajar informal (Gírias - como, por exemplo: “o arrego”, “X-9”, “fiel”...) que poderia ser
desconhecido por alguns apreciadores desta obra.
38
O diretor do filme, MV Bill, dialogava algumas vezes na narrativa, olhando
diretamente para o espectador e explicando as imagens que eram expostas. O rosto de MV
Bill foi um dos pouco que é apresentado em primeiro plano, sem que a imagem estivesse
borrada.
....as falas dos meninos do tráfico, seguindo a linha dominante no popular criminalizado, são ameaçadoras, revelando naturalidade com a proximidade do horror, presente nas camadas mais pobres da sociedade. O fato de a imagética típica do popular criminalizado do documentário brasileiro haver sido divulgada em rede nacional, domingo á noite, fornece um indício da força de sua presença no imaginário do Brasil contemporâneo (RAMOS, 2008, p, 232).
A obra “Falcão – Meninos do Tráfico” exibiu a condição de diversas comunidades
carentes brasileiras e não se limitou apenas em mostrar as particularidades dos morros do Rio
de Janeiro, embora, tenha semelhança ao modelo das favelas cariocas. O seu objetivo central
foi de expor os inúmeros problemas que são pertinentes às periferias de todo o país.
O que distingue o documentário “Falcão” dos demais que tratam de assuntos parciais
ou parecidos com este foi a forma como os produtores, MV Bill e Celso Athayde, foram
recebidos no local da gravação, e com qual olhar apreciaram o contraste da favela. Diferente
da imagem, eles se posicionaram como cineastas da classe média, e trabalharam com
naturalidade.
MV Bill apresenta em seu documentário outro ponto de vista, supõe uma concepção de luta entre duas perspectivas, a “de dentro”, no caso, dos jovens traficantes das comunidades, que estaria em oposição a uma perspectiva “de fora”, os cineastas das classes médias que historicamente inauguraram a reflexão cinematográfica sobre a violência nas periferias brasileiras. A perspectiva “de dentro”, por sua maior proximidade com a realidade a ser retratada, possuiria tanto um maior comprometimento com a verdade como uma maior legitimidade para documentá-la. Tal visão pressupõe a crença numa certa “verdade” e na maior capacidade de uns, aqueles que “vivem perto dessa realidade”, de apresentarem uma versão mais fidedigna da mesma (realidade). Por ter sido realizado por homens da comunidade, o documentário de MV Bill e Athayde, consequentemente, nos forneceria uma visão mais próxima da realidade (BENEDICKT, 2008, p.135).
MV Bill relatou no documentário “Falcão”, “que conquistou um grau de
confiabilidade dos entrevistados, e este trabalho só foi possível, pois eles acreditaram de
39
verdade o que nós estávamos fazendo poderia salvar e modificar a vida de algumas outras
pessoas” 12
No decorrer da apresentação da obra “Falcão”, é possível perceber que há sequências
inteiras em que só aparecem imagens artificialmente borradas ou cobertas por máscaras para
preservar o anonimato do entrevistado e o seu enunciado em voz em off também sofre
algumas alterações por motivos de segurança. Somente a fisionomia do MV Bill e a do ex -
criminoso Betinho não teve nenhuma alteração (borrões).
. É importante mencionar que o MV Bill e Celso Athayde são militantes sociais,
provindos de comunidades carentes e não são cineastas graduados, mas, em compensação
possuem um “alto grau” de conhecimento sobre os problemas sociais que estão enraizados nas
favelas brasileiras. Para Fernão Ramos (2008), o documentário “Falcão” tem uma pudicícia
com imagens pessoais que está ausente na produção de diretores de classe média.
...com rosto coberto, empresta uma espécie de confissão de culpa. Temos impressão de que todos são criminosos ou possuem contas a prestar, necessitando temer, daí o indispensável anonimato. Não estamos lidando com pessoas socialmente inseridas, que têm sua vida cotidiana na sociedade civil. Excluídos e perigosos, seu rosto nos é oculto: ameaçados, mas ameaçadores, “olham” e falam entre brechas, com raiva, para causar impacto em seu destinatário. A raiva popular é representada de modo mais nítido em Falcão que em outros documentários (RAMOS, 2008, p.235).
Adriana Benedickt (2008) apresenta outro ponto de vista sobre o uso dos borrões no
documentário “Falcão”, para ela a utilização dos borrões nas imagens é uma forma de
preservar a identidade dos protagonistas deste filme.
Tal procedimento se justifica em função de inúmeras razões: a proteção com relação principalmente à polícia (o tráfico, provavelmente, pela proximidade, deve poder identificar esses entrevistados); a proteção com relação à privacidade dos depoentes, e, principalmente, a marca de um estilo ou presença estética. O uso do borrão, além de dar proteção e marcar um estilo, demarca um universo comum a essas pessoas, unificando-os como membros de uma mesma comunidade, sujeita em maior ou menor grau aos mesmos riscos e perigos de criminalização, as chamadas “classes perigosas”. Uma população excluída do espaço público, sem acesso a serviços como saúde e educação, sem emprego estável, que é estigmatizada como potencialmente criminosa, e que, por residir nas favelas e periferias, vive em fogo cruzado, sujeita tanto à violência dos traficantes como à violência policial (BENEDICKT, 2008, p.130).
12 Transcrição de um enunciado do MV Bill durante o documentário Falcão-Meninos do Tráfico.
40
Além dos depoimentos e entrevista, também é exibido o grau de hierarquia que está
presente no narcotráfico. O “Falcão” (agente do narcotráfico) exibe seus equipamentos de
“trabalho” que são compostos por uma arma de grosso calibre para atuar na sua segurança e
do local, um radiocomunicador para informar aos seus parceiros (outros agentes do
narcotráfico), a movimentação de automóveis e pessoas na favela. Em sequência deste plano é
exibido a função do “vapor” (colaborador que comercializa a droga no varejo). E
posteriormente o “fogueteiro” o garoto que fica em um campo estratégico e solta foguetes
quando avista a chegada de policias ou de inimigos de outra facção, ele também é responsável
pela segurança do “vapor”.
Para Fernão Ramos (2008), o documentário “Falcão” exerce uma função educativa
desde o início, pois, o diretor, MV Bill, abre o filme e justifica sua existência ao enunciar “Eu
vivo no meio dessa realidade e resolvi filmar”.
Ressalte-se que todo documentarista tem o seu pré-conceito ao dar início a um
trabalho, podemos notar que o diretor do “Falcão - Meninos do Tráfico”, MV Bill, teve o
objetivo de educar e salientar aos espectadores como é “perigoso” o cotidiano dos agentes do
narcotráfico, e através de uma “terapia de choque” tornou visível quais os riscos e a sequelas
que esta opção de vida pode proporcionar.
O produtor do documentário “Falcão”, Mv Bill, teve o intuito de passar uma
mensagem educativa através desta obra, alertando que a vida do tráfico não compensa, pois, a
grande maioria dos “falcões” só tem três alternativas que são a detenção, a morte ou a
invalidez física. “E esta missão educativa só é possível, no documentário moderno, quando a
narrativa fala de dentro do corte popular” (RAMOS, 2008, p, 236).
Os produtores do documentário “Falcão - Meninos do Tráfico”, MV Bill e Celso
Athayde, também se preocuparam em exibir a verdadeira aparência situada nas comunidades
carentes, local onde a imagem da miséria e do descaso social são intensos. Espaço no qual
trabalhadores, crianças e idosos de baixa renda convivem com consumidores de drogas entre
as ruas escuras e ambientes sufocantes.
Em um determinado momento da apresentação do filme “Falcão” aparecem crianças
brincando inocentemente, cena inspirada na vida real. Na brincadeira de polícia e ladrão elas
atuam como se fizessem parte da rotina na criminalidade. Crianças encenando a vingança,
41
tortura e morte de um X9 (delator), pagamento de propina, simulação do consumo de drogas,
e para tornar mais real a brincadeira eles improvisam armas.
Na obra, também é notável em diversas tomadas a ausência da figura paterna. O pai é
referido pelos agentes do narcotráfico, como morto, ausente, bêbado ou espancador. Mas, a
figura materna é onipresente, é ela quem cria sozinha os filhos.
O Brasil é classificado como uma sociedade patriarcal, porém, no documentário
“Falcão - Meninos do Tráfico”, as periferias são retratadas como uma sociedade
predominante matriarcal. “O amor materno atravessa o filme com a dimensão de um resgate,
porto seguro no meio da exasperação do horror que a tudo permeia e deforma” (RAMOS,
2008, p, 238).
3.1 Contribuição Cultural
O documentário “Falcão” foi narrado com uma linguagem que busca se sobrepor à
política na cultura, sem se limitar a uma operação lógica, uma vez que insere saberes, sentires,
e resistências que a dialética desconhece. É como uma mistura de jargões vivenciados nas
comunidades carentes, representando como os enunciados desta localidade são pronunciados
em seu cotidiano.
“Falcão – Meninos do Tráfico” é talvez a expressão mais acabada e conhecida até agora de uma efervescência cultural inédita que acena com alguma mudança nas relações entre quem faz e quem consome música, moda, dança e cinema (HAMBURGUER, 2005, p.124).
A obra “Falcão” expõe uma cultura vivenciada nos guetos brasileiros, apresentando
quais as perspectivas de vida e os anseios desta população de baixa renda. O documentário
não só retrata o narcotráfico e seus agentes, mas também são exibidas pessoas que têm seu
trabalho digno e correspondem as normas éticas do capitalismo globalizado. Isto é, cidadãos
que atuam no mercado de trabalho realizando tarefas manuais, como por exemplo, o
cadeirante Betinho, que após ter vivido muitos anos na vida do crime, converteu o seu ganho
mensal a vender produtos varejistas nas ruas e avenidas da cidade do Rio de Janeiro, e por
42
este meio rentável conquistou bens duráveis e assim continua vivendo por meio desta
profissão.
De acordo com Barbero (2003), os meios de comunicações audiovisuais
contemporâneos (TV) optam por apresentar informações que são decodificadas por suas
considerações ideológicas, mercantis e padrões técnicos. Sendo assim, a emissora televisiva
Rede Globo, exibiu em sua revista eletrônica “Fantástico”, o documentário “Falcão”, porém,
para esta apresentação ser transmitida em rede nacional, ela passou pelo processo de edição e
manipulação das imagens, para posteriormente ser exibida para toda a nação e outros países
que veiculam esta programação.
Além disso, outro fator que fortaleceu para o documentário “Falcão” ser exposto no
programa “Fantástico” foi o fato de ser produzido por militantes sociais, como o rapper MV
Bill e outros integrantes da CUFA (Central Única das Favelas).
O diretor e apresentador do filme “Falcão- Meninos do Tráfico”, MV Bill, exerceu a
função de ser o mediador entre a conexão comunicacional das classes sociais brasileiras. Isto
é, o MV Bill foi um transmissor da mensagem provinda das comunidades carentes para as
demais camadas sociais. No entanto, não podemos esquecer que o mesmo reside em uma
comunidade de baixa renda, Cidade de Deus – RJ, e ao longo de sua trajetória tornou-se um
mensageiro da cultura popular do hip-hop.
O rapper MV Bill utilizou seu conhecimento dos problemas socioeconômicos e das
pequenas alegrias que a comunidade carente vivencia e apresentou em seu documentário,
“Falcão - Meninos do Tráfico”, o contraste da sociedade de baixa renda brasileira. Para
Barbero (2003), as associações e centros que dispõem de uma amplitude e uma atmosfera
capazes de congregar os migrantes, aos lhes oferecem um mínimo de representação frente às
autoridades e ao Estado. Associação que não se esgota no bairro, e que em muitos casos
articulam a percepção e a solução dos problemas locais a um projeto social mais amplo,
global.
Através do filme “Falcão” é possível verificar as características da vida cotidiana das
periferias e ter uma percepção sobre o mundo particular dos agentes do narcotráfico, isto é,
quais seus anseios e visão sobre a sua realidade.
Notemos que não são somente os criminosos residem nas favelas, muitos
trabalhadores habitam este local. “E desse modo a cultura aqui não é oficial, não transmite
43
informações boas e nem más, não é propriedade de ninguém, é um modo de ser, viver e
morrer” (BARBERO, 2003, p, 287). As imagens audiovisuais exibidas no documentário
“Falcão” são compostas por uma estética que não é decorativa como de um cartão postal, e
sim caracterizado pelo método da vida local.
As informações contidas na obra foram desenvolvidas pelo o emissor MV Bill, que
agregou na mensagem o seu pré-conceito e conhecimento dos fatos apresentados por imagens
e narrativas, e posteriormente passou ao receptor e ao espectador. Mas, o conceito finalizador
deste processo envolve a noção de conhecimento de cada cidadão que assistiu a este
documentário, isto é, o filme “Falcão” expôs uma mensagem, e a mesma foi reforçada por
meio dos enunciados do MV Bill.
Devemos observar que cada telespectador em particular consumiu a informação
segundo os seus conhecimentos e pré-conceitos, alguns se auto-reconheceram nas imagens
exibidas, outros tiveram outra concepção dos fatos que pode partir da sensibilização até se
sentirem horrorizados com as imagens. Sendo assim, cada sensação é muito particular de cada
ser. Como explica Barbero “Há uma concepção substancialista das classes sociais, como
entidades que repousam sobre si próprias, corresponde a uma visão do conflito social como
manifestação dos atributos dos atores”. (BARBERO, 2003, p, 296).
Segundo Barbero (2003), faz-se cultura enquanto não se pode fazer política, ou seja,
não faz sentindo continuar programando políticas que separem aquilo que acontece nas
massas populares, pois é fundamental para democracia apresentar o que permeia as camadas
populares. E a Cultura de Massa, já ciente de tal fato, já se agrega aos novos métodos de
produção, ou melhor, também veicula fragmentos culturais que até pouco tempo estavam
adormecidos nos guetos brasileiros. “Hoje notamos que a historicidade social é mais profunda
do que aquilo que nossos instrumentos teóricos permitem pensar e nossas estratégias políticas
permitem encaminhar” (LACLAU apud BARBERO, 2003, p, 300).
A conotação exposta no documentário “Falcão” pode levar a demonstrar uma maneira
de protesto em prol dos direitos sociais elementares. Algo que nos permita compreender os
diferentes modos de apropriação cultural dos diversos usos sociais do diálogo operantes nos
meios cinematográficos.
Ao analisar as informações expostas na obra “Falcão - Meninos do Tráfico”, é
necessário sintetizar que não se trata apenas de uma mera produção fictícia, e sim de uma
44
produção baseada em fatos reais que exprime uma luta pela democratização social. É também
um trabalho que questiona o Estado, qual é o valor social desta população e quais atributos
socioeconômicos eles merecem conceber.
Em um determinado momento do documentário é exibida a visão que os entrevistados
(agentes do narcotráfico) têm sobre os policiais, e os seus enunciados deixam nítido que eles
só reconhecem estes agentes de segurança pública como “terroristas” que só entram nas
comunidades de baixa renda para estabelecer o “terror”.
A emissora televisiva Rede Globo foi muito inteligente, pelo fato de ter usado o MV
Bill como se fosse um correspondente da favela um enunciador, um canal direto entre a favela
e o público, pois ele tem credibilidade.
Os âncoras deste programa, além de serem transmissores da informação, foram
interlocutores que interpelaram os principais enunciados apresentados no filme “Falcão”,
durante as entradas e saídas de bloco, e para justificar tais entonações agregaram os
enunciados do MV Bill que também estava presente no cenário. Isto é, Glória Maria e Zeca
Camargo utilizaram um tom coloquial simulando um diálogo com os telespectadores,
explicando a cada começo e fim de bloco o resumo das imagens exibidas do documentário, e
após suas narrativas, Glória Maria articulou-se com o convidado MV Bill, e debateu alguns
fatores que estavam inseridos neste filme.
A predominância do verbal na televisão se inscreve na necessidade de subordinar a lógica visual à lógica do contato, dado que é esta que articula o discurso televisivo sobre o eixo da relação estreita e a preeminência da palavra em culturas tão fortemente orais (BARBERO, 2003, p, 306).
Podemos observar que a grade de programação da Rede Globo padroniza seus
programas por gêneros, dias e horários de apresentação, de acordo com a forma de
rentabilidade que o gênero produz. Assim, o período que o programa “Fantástico” utilizou
para apresentar o documentário “Falcão” esteve inserido à estandardização, acompanhada
pelas diversas linguagens que estiveram situadas nos comentários dos convidados presentes e
nos enunciados do documentário. “Própria de uma estética em que o reconhecimento embasa
uma parte importante do prazer e é, em consequência, norma de valores dos bens simbólicos”
(SARLO apud BARBERO, 2003, p, 308).
45
A revista eletrônica “Fantástico” utiliza o gênero de entretenimento acompanhado por
notícias jornalísticas entre outros assuntos que estão sendo pautados nos meios de
comunicação contemporâneos. A partir destes elementos, este programa ativa a competência
cultural e ao seu modo comunica aos telespectadores quais informações que provavelmente
serão debatidas pela sociedade no decorrer da semana.
“Os gêneros televisivos que articulam narrativamente as serialidades constituem uma
mediação fundamental entre as lógicas do sistema produtivo e as do sistema de consumo”
(BARBERO, 2003, p, 311). Com a credibilidade e o aspecto de sempre trazer assuntos novos
ao público, o programa “Fantástico” exibiu um fato inédito na história da sua programação,
que foi a apresentação do documentário “Falcão - Meninos do Tráfico”.
Durante a exibição do filme “Falcão”, o “Fantástico” conseguiu marcar 38 pontos de
audiência no IBOPE (Instituto Brasileiro de Opinião Pública e Estatística), sendo que cada
ponto de audiência no IBOPE equivale a 49,5 mil domicílios na Grande São Paulo. E, além
disso, conquistaram duas premiações; no ano de 2006, o Prêmio Vladmir Herzog como
melhor documentário de TV; em 2007, o Prêmio do Rei da Espanha, um dos mais
conceituados do jornalismo internacional, na categoria televisão.
Não se pode saber ao certo quais as classes sociais que acompanharam a exibição do
documentário “Falcão- Meninos do Tráfico” exibido no programa “Fantástico”, só podemos
deduzir que alguns dos telespectadores utilizaram esta programação só para se informar sobre
o fato e foram buscar mais informações em outros meios de comunicação. Portanto, o
estabelecimento de qual o grau psíquico que esta informação agregou ao telespectador foi
invariável. Seria necessária uma análise detalhada com os conceitos de Freud, para expor
afirmações concretas sobre o assunto.
As imagens exibidas no filme “Falcão” não são fatos desconhecidos pela sociedade,
mas os cidadãos comuns só haviam visto este cenário nas reportagens policiais e nunca
através de um documentário exibido em rede nacional pela revista eletrônica “Fantástico”.
No drama do reconhecimento, o que move o enredo é sempre o desconhecimento de uma identidade e a luta contra as injustiças, as aparências, contra tudo o que se oculta e se disfarça: uma luta por se fazer reconhecer. (BARBERO, 2003, p, 317).
46
Os movimentos sociais, em particular a CUFA (Central Única das Favelas) promovem
debates e projetos em prol das culturas populares e do reconhecimento da sua própria cultura.
Isto é, esta organização é vinculada a diversos militantes sociais, sendo que alguns deles
vieram de uma sociabilidade negada, economicamente desvalorizada e politicamente
desconhecida, mas culturalmente viva, e unindo todas estas características, as classes
populares que estão envolvidas neste projeto se reconhecem nela.
Além de retratar os contrastes do cotidiano das favelas brasileiras, o documentário
“Falcão- Meninos do tráfico”, também inseriu a “voz do povo” na televisão, através dos
enunciados dos moradores de comunidades carentes. Segundo Jesús Barbero (2003), “... o que
faz a força da Cultura de Massa, e o que dá sentido a essas narrativas não se encontra apenas na
ideologia, mas também na cultura, na dinâmica profunda da memória e do imaginário” (BARBERO,
2003, p, 319).
Sendo assim, podemos propor que, de certo modo, a comunicação midiática auxilia na
democratização das reivindicações sociais, através de obras audiovisuais. Como aconteceu no
documentário “Falcão - Meninos do Tráfico”, um projeto que tinha por objetivo conscientizar
a sociedade sobre o cotidiano dos agentes do narcotráfico, e foi produzido por militantes
sociais, MV Bill e Celso Athayde, que possuem o reconhecimento e a admiração de grande
parte do público.
3.2 Analisando as narrativas do documentário “Falcão- Meninos do Tráfico”
Nesta seção, iremos analisar as narrativas dos personagens do documentário “Falcão -
Meninos do Tráfico” (2006), com o intuito de decifrar as mensagens que estão inseridas nesta
obra. Durante a apreciação, posicionaremos algumas análises narrativas e tecno –
documentárias através dos quadros que selecionamos, e que a partir deste momento,
denominaremos como “tomada”.
Antes de iniciar a análise do filme “Falcão”, apreciaremos o debate que ocorreu
inicialmente no primeiro bloco antes da apresentação. No estúdio da revista eletrônica
“Fantástico”, os apresentadores, Glória Maria e Zeca Camargo, e o diretor do filme “Falcão”,
MV Bill esclareceram alguns contrastes que aparentam ser polêmicos. Pois, os âncoras deste
programa posicionaram suas entonações de forma “maléfica” à figura do menor
47
marginalizado. Acreditamos que estes enunciados foram os mais significativos em
comparação aos outros dois que ocorreram durante as entradas e saídas de blocos.
No dia 19 de Março de 2006, durante a exibição do filme no “Fantástico” ocorreram
três paradas para os comerciais, e seus âncoras em conjunto ao produtor deste documentário,
MV Bill, situaram os telespectadores sobre temas pertinentes ao tema do filme. Os
apresentadores articularam sobre a situação na qual os garotos do tráfico estão inseridos, a
falta da figura paterna na vida destes meninos, e a recreação exercida por algumas crianças
que residem na periferia. Entre todas as narrativas dos apresentadores, o mais objurgado
ocorreu na abertura do primeiro bloco. Observemo-lo:
Tomada 1 – Zeca Camargo abre o programa “julgando” e “condenando” os meninos
do tráfico. Filmagem: cena interna, ótima iluminação, câmera em modo do zoom in, vai se
aproximando até enquadrar em primeiro plano a figura deste apresentador.
Sonora Zeca Camargo:
O retrato de uma geração perdida, você vai entrar agora no universo de jovens que
trabalham no tráfico de drogas, crianças ainda que carregam armas e morrem cedo demais.
Na tomada 2 - Glória Maria esclarece de forma resumida a trajetória da pré-produção
do filme “Falcão”. Filmagem: cena interna, ótima iluminação, câmera posicionada no
primeiro plano em direção a narrativa da apresentadora, e no decorrer do seu enunciado a
imagem vai sendo ampliada em zoom out para enquadrar em segundo plano a fisionomia de
Glória Maria e o rapper MV Bill.
Sonora Glória Maria:
Durante seis anos o cantor de rap MV Bill e o produtor Celso Athayde percorreram
comunidades pobres em todo o país, e registraram em 90 horas de fita a rotina, dia e noite
desses jovens sem futuro. O MV Bill está aqui com a gente e vai explicar como surgiu esta
ideia. Bill. Por que você resolveu fazer este documentário, Meninos do Tráfico?
Tomada 3 - o produtor do documentário “Falcão – Meninos do Tráfico”, MV Bill,
esclarece a Glória Maria quais foram os motivos que o levaram a fazer o filme. Filmagem:
cena interna, boa iluminação, a câmera centralizada em primeiro plano focada na fisionomia
do MV Bill, que posiciona o seu olhar de forma alternativa entre a câmera e a Glória Maria
que não está inclusa na imagem.
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Sonora MV Bill:
Bom, eu vivo perto desta realidade, eu vivo no meio dela, e eu sempre vi estes problemas
sendo analisados por antropólogos, sociólogos, especialistas, na área de segurança, que não
vivem esta realidade. A ideia é permitir que o país faça uma grande reflexão sobre um novo
ponto de vista, um novo olhar, que é a visão dos jovens que sempre são colocados como
culpados, e sempre são considerados como os grandes culpados de toda esta tragédia.
Tomada 4 - Glória Maria enuncia o começo do documentário “Falcão”. Filmagem:
cena interna, ótima iluminação, a câmera em modo zoom out sai do segundo plano que mostra
a imagem do MV Bill e Glória Maria, até se centralizar em primeiro plano apenas na imagem
da apresentadora que posiciona seu olhar em direção a câmera.
Sonora Glória Maria:
Bem, então está na hora. Vamos ver as imagens, e os depoimentos produzidos pela CUFA
(Central Única das Favelas), e editados pela a equipe do “Fantástico”, a partir de todo o
material gravado por MV Bill e Celso Athayde. Está começando “Falcão – Meninos do
Tráfico”.
Analisando as quatro tomadas - durante as duas primeiras sonoras podemos perceber
que as narrativas dos apresentadores da revista eletrônica “Fantástico”, Glória Maria e Zeca
Camargo utilizam um tom coloquial, e que “estigmatiza” a figura dos jovens carentes que
estão inseridos no mundo do tráfico, e, além disso, Zeca Camargo discrimina esses menores,
dando a entender, que eles não conquistaram nenhum tipo de êxito, e não terão uma segunda
oportunidade para se redimir e agir conforme as condutas éticas sociais, pois eles já estão com
os seus dias contados. No entanto, na terceira tomada, MV Bill ameniza a situação e explica
que o objetivo principal deste documentário é de apresentar o cotidiano desses adolescentes
de uma maneira particular, isto é, mostrar como esses garotos enxergam a sua própria
realidade e quais suas perspectivas de vida. De uma maneira geral, Bill almeja que cada
telespectador tire as suas próprias conclusões deste grave problema social. Podemos perceber
que MV Bill, utiliza um tom coloquial, que “humaniza” a questão desses jovens carentes, ao
contrário do enunciado “estigmatizado” dos apresentadores do programa. Na quarta tomada
nenhuma apreciação a ser feita, só a transcrevemos para formalizar todos os enunciados que
ocorreram neste bloco.
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Para Benedickt (2008), os produtores do documentário “Falcão - Meninos do
Tráfico”, MV Bill e Celso Athayde possuem um alto grau de conhecimento e competência
para tratar das questões que estão inseridas neste filme. Segunda ela, Bill apresenta uma visão
fidedigna em relação a este,
... fenômeno que merece ser compreendido dentro de uma outra ótica na qual os menores deixam de ser os únicos culpados. Passam a integrar nossa “comunidade imaginada” não mais como os “monstros”, que rompem com a harmonia e a coesão da vida social, mas como o elo mais frágil de uma das sociedades mais desiguais do planeta (BENEDICKT, 2008, p.128).
A partir de agora, iremos analisar os enunciados dos personagens do documentário.
Durante a descrição destas narrativas, tentaremos ao máximo ser autênticos durante a
transcrição das sonoras que foram enunciadas, isto é, transcreveremos frases que foram
pronunciadas com o português informal (gírias), falas compostas de erros ortográficos. Para
cada palavra que estará transcrita por gírias, colocaremos o seu significado formal entre
parênteses.
Acreditamos que todo o enunciado tem um significado material e um valor simbólico
que pode ser interpretado de acordo com o grau psíquico, cultural, e acadêmico. Ao estudar os
elementos que estão introduzidos nas entonações do documentário “Falcão”, podemos ter
uma melhor clareza sobre as questões que são apresentadas neste filme.
As relações sociais evoluem em função das infra-estruturas, depois a comunicação e a interação verbal evoluem no quadro das relações sociais, as formas dos atos da fala evoluem em consequência da interação verbal, e o processo de evolução reflete-se, enfim, na mudança das formas da língua (BAKHTIN/VOLOCHINOV apud CASTELLIANO, 2009, p.615).
Tomada 5 – MV Bill, abre o documentário “Falcão – Meninos do Tráfico” explicando
a concepção geral do filme. Filmagem: cena externa, imagens em segundo plano, câmera em
movimento (dentro de um automóvel), exibindo em curtos frames imagens do Planalto
Central, rodovias, e da favela, acompanhadas pelo fundo musical “O bagulho é Doido”- MV
Bill. Logo em seguida (ainda dentro do automóvel), a câmera posiciona-se em primeiro plano
para o rosto do MV Bill, que enuncia seu depoimento.
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Sonora MV Bill:
Tô, mostrando neste documentário a vida de pessoas que talvez nem façam parte de
estatísticas, talvez só virem estatísticas depois de mortos. E não estou mostrando de forma
glamourizada, que as pessoas vão assistir para aplaudir e achar que é tudo bonito, tudo belo.
Acho que estou tentando mostrar mais com uma visão de problema, e vendo como um
problema. Acho que ele precisa ser mostrado.
Neste momento, o depoimento de MV Bill é recortado para serem exibidos os
contrastes da periferia. Filmagem: cena externa, rostos dos personagens estão borrados,
iluminação é baixa, as imagens em segundo plano com algumas trepidações da câmera, fundo
sonoro: começa com um trecho musical de um funk, logo em seguida, MV Bill, continua
dando sua declaração.
Sonora MV Bill:
Aquilo que pode ser discutido e até resolvido, se continuar ficar ali escondido como sempre
ficou, as pessoas vão continuar ignorando. Ignorando quem vende, ignorando quem compra,
ignorando quem morre, quem mata.
Analisando a tomada 5 – os contrastes das comunidades carentes brasileira foram
exibidos de forma legítima. Local no qual onde há raros benefícios oferecidos pelo Estado, e
os moradores estão introduzidos em uma situação precária, isto é, uma região onde a lei do
mais forte prevalece. Mas, diante dessas imagens, MV Bill almeja que os telespectadores
reflitam sobre este “Brasil”, que por diversas vezes só esta presente nas matérias que retratam
assuntos sensacionalistas, e ausente nos debates que ocorrem no Planalto Central.
Para Adriana Benedickt (2008), o produtor do documentário “Falcão”, MV Bill
utilizou o termo “não – glamourizada”, pelo fato do filme “Cidade de Deus” (2002) ter
retratado de forma glamourizada os contrastes da periferia e do narcotráfico. Isto é, MV Bill
deseja apresentar em sua obra os problemas sociais que estão inseridos nas comunidades
carentes, com o intuito da sociedade (telespectadores) saber ao certo quais os verdadeiros
elementos que estão introduzidos no interior das favelas.
Segundo Jesús Barbero (1995), “os autores brasileiros têm trabalhado sobre a vida
cotidiana e vida urbana contemporânea, sobre a reorganização da experiência cotidiana na cidade,
produzindo textos – chaves para repensar o sentido atual da vida cotidiana” (BARBERO, 1995, p. 59).
51
Tomada 6 - de uma maneira geral, iremos descrever as funções exercidas pelos
agentes do narcotráfico. Diante deste quadro, são apresentados no documentário “Falcão –
Meninos do Tráfico”, imagens da movimentação noturna entre as vielas da favela (uma visão
da periferia durante o período noturno), e os ofícios desses jovens que estão inseridos neste
“submundo” (tráfico de drogas), os semblantes desses garotos estão borrados. MV Bill
entrevista os respectivos meninos do tráfico. A posição da câmera está centralizada de forma
invariável, isto é, primeiro, segundo e terceiro planos com algumas trepidações. Nem sempre
as falas estão sincronizadas com as imagens.
“Falcão” é a denominação dada aos meninos que têm a responsabilidade de fiscalizar
todo movimento que ocorre na favela durante o período noturno. Seus equipamentos de
trabalho são compostos por um radiocomunicador e uma arma de fogo. Filmagem: cena
externa, em primeiro plano, pouca iluminação, com a posição contra- plongée. O “falcão”
esclarece qual a finalidade do seu radiocomunicador.
Sonora “falcão”:
Isto aqui é um radiocomunicador para avisar os “amigos” (companheiros do narcotráfico),
para entrar em comunicação com os “amigos”.
“Vapor”: são garotos que comercializam drogas no varejo. Durante a apresentação da
função deste menino são exibidos papelotes de entorpecentes (maconha e cocaína).
Filmagem: cena externa, posição primeiro plano, o ângulo contra- plongée. Este agente do
narcotráfico afirma que as drogas não são benéficas, e para justificar seu enunciado exibi-se
um personagem drogando-se através de um cachimbo com crack; neste momento a câmera
foca este ato, porém, os olhos deste indivíduo estão borrados.
Sonora “vapor”:
O crack acaba com a pessoa totalmente, deforma a pessoa toda. A pessoa tá saudável
começa a usar, daqui a um mês tá magra, acabada, cara de velho. Isto aí destrói o cara.
Após este enunciado, o próprio “vapor” reconhece que é através do narcotráfico que
eles conseguem renda financeira.
Sonora do “vapor”:
... o crack prejudica tudo. Mas, é dele que nós “ganha” dinheiro.
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Podemos perceber através da sonora do “vapor”, que ele tem ciência do mal que as
drogas podem causar nas pessoas que utilizam estes entorpecentes.
“Fogueteiro”: é o garoto que fica em um campo estratégico, solta foguetes quando avista a
chegada de polícias ou de inimigos de outras facções, ele também é responsável por sua
própria segurança, e pela segurança do “vapor”. Filmagem: cena externa, imagem em
primeiro plano, boa iluminação. O “fogueteiro” explica para o MV Bill qual é a sua função no
narcotráfico.
Sonora “fogueteiro”:
Eu fico na contenção do ‘vapor’. Se os “home” (policiais) brotar (aparecer) ali, eu solto
fogos, corro, e eles (vapor) se “esconde”.
Quando o “vapor” não está munido do radiocomunicador, o “fogueteiro” solta outro
tipo de fogos de artifício, conhecido como 12 x 1, para avisar que os policiais estão invadindo
a comunidade.
Analisando a tomada 6 - podemos perceber que cada agente do narcotráfico
desempenha uma determinada função, e que ao mesmo tempo todos estão coligados dentro do
mesmo “circuito” (narcotráfico). Para evitar qualquer “tropeço” entre as comunicações, eles
possuem um plano “b”, que é justamente o 12x1, os fogos de artifício que são lançados para
avisar da chegada de perigo.
Este documentário esclarece que todos esses garotos vivem constantemente em uma
zona de perigo, isto é, a qualquer momento correm risco de morte. E os mesmo têm
conhecimento de quais são os efeitos maléficos que as drogas causam no organismo de um
viciado químico, contudo eles não possuem outro método rentável para sobreviver.
...esses meninos parecem encarcerados num aqui e agora que traça uma linha divisória bastante tênue entre a sobrevivência e a morte. São meninos que se encontram em um estado que dificilmente podemos chamar de vida, embora a morte não os tenha alcançado ainda (BENEDICKT, 2008, p. 132).
É importante ressaltar que alguns dos agentes do narcotráfico utilizam entorpecentes
com intuito de inibir o sono, cansaço, e conseguir cumprir o seu horário de trabalho, pois
qualquer descuido pode ser fatal, ou lhe ocasionar sérios problemas. Isto é, caso ocorra algum
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deslize, eles podem ser apanhados por políciais, ou serem castigados de forma brutal pelos
membros de outras facções criminosas.
Tomada 7 - um dos “falcões” ao ser entrevistado por MV Bill relata uma situação que
vivenciou ao ser capturado por um agente de segurança pública em um momento de
desatenção. Filmagem: cena externa, imagens borradas na altura da face, primeiro plano,
durante alguns frames ângulo na posição contra- plongée, baixa iluminação.
Sonora “falcão”:
Tava dormindo.
Sonora MV Bill:
Você já foi preso alguma vez?
Sonora “falcão”:
Rodei hoje (detido).
Sonora MV Bill:
Como assim?
Sonora “falcão”:
Fui caguetado (denunciado).
Sonora MV Bill:
Como é que foi?
Sonora “falcão”:
Os “cana” (policiais) bateu na treta (esconderijo) onde que eu tava, pô. Eu rodei (detido)
com uma carga de pó (cocaína) e uma de maconha. Os “cana” me esculacharam quase me
levaram de dura (preso), me bateram pra c*** (agrediram fisicamente). Os “cana” pega, os
“cana” machuca (...). Me acordaram dormindo. Fiquei devendo a eles R$ 500,00.
Sonora MV Bill:
Como assim?
Sonora “falcão”:
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Desenrolei (negócio) com eles (policiais) pra ficar devendo pro próximo plantão (um período
trabalhado para o tráfico), dar R$ 500,00 para eles.
Sonora MV Bill:
Então os canas (políciais) não são tão ruins assim.
Sonora “falcão”:
Quem?
Sonora MV Bill:
Polícia.
Sonora “falcão”:
Os “polícia” são “safado”. Se eles “vê” a arma na mão, eles “mata”, dá tiro pra acertar.
Sonora MV Bill:
Mas a partir do momento em que eles deixam você ir embora, na confiança, pra você dever
dinheiro, é porque eles também confiam em você...
Sonora “falcão”:
Isso aí é. Eu vou dar o dinheiro a eles. Trabalhar também sem dar dinheiro aos policiais não
dá.
Outros agentes do narcotráfico que foram entrevistados por, MV Bill, no decorrer do
documentário “Falcão – Meninos do Tráfico”, alegam que, para o ponto de tráfico continuar
ativo é necessário pagar certa quantia de dinheiro em espécie, porém, os valores são variáveis,
e esta transação financeira irá depender da negociação firmada entre eles (“falcões”) e os
representantes da segurança pública (políciais). No linguajar informal do narcotráfico este
fenômeno é classificado como pagamento de propina ou arrego.
A infração, segundo o direito da era clássica, além do dano que pode eventualmente produzir , além mesmo da regra que infringe, prejudica o direito que faz valer a lei: Mesmo supondo que não haja prejuízo nem injúria ao individuo, se foi cometida alguma coisa proibida por lei, é um delito que exige reparação, porque o direito do superior é violado e é injuriar a dignidade do seu caráter (FOUCAULT apud, CASTELLIANO 2009, p.618)
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Analisando a tomada 7 - o documentário “denunciou” - por meio de entrevistas com os
meninos do tráfico- as negociações financeiras que há entre os “falcões” e os agentes da
segurança pública. Podemos mencionar que estas negociações são os pontos “críticos”
menosprezados pelas as autoridades que regem a incorporação da segurança pública nacional.
Na obra “Falcão” os agentes do narcotráfico aparecem carregando armas de grosso de
calibre para se precaverem de possíveis confrontos com os integrantes de outras facções, ou,
de policiais. Podemos denotar que este armamento exerce simbólicamente uma segunda
função, favorecem - de certo modo - “status social e respeito” perante os moradores das
comunidades carentes, principalmente entre algumas garotas desta mesma localidade.
No decorrer do filme, um dos meninos do tráfico alega que eles (traficantes) zelam
pela segurança de todos que moram na periferia. Também realizam pequenas colaborações
financeiras para que os moradores desta localidade adquiram: botijão de gás, brinquedos
infantis, materiais escolares, entre outros. Mas, se acaso algum morador fizer uma denúncia
aos policiais sobre o narcotráfico, o mesmo será penalizado de forma severa.
Tomada 8 - MV Bill questiona uns dos “falcões” sobre suas atitudes com relação aos
demais moradores da comunidade carente. Filmagem: cena externa, imagens borradas na
altura da face do garoto, primeiro plano, pouca iluminação.
Sonora MV Bill:
Você não acha que é pouco?
Sonora “falcão”:
Pouco, o quê?
Sonora MV Bill:
Pra quem vende a desgraça (drogas), você não acha que é pouco ajudar uma ou duas
famílias a comprar gás?
Sonora “falcão”:
Ah, a gente ajuda a favela.
Sonora MV Bill:
E se eles te denunciarem?
Sonora “falcão”:
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Ai nós “vai” e “mata” mesmo.
Sonora MV Bill:
Mesmo que seja morador antigo? Você acha isto certo?
Sonora “falcão”:
Ninguém prejudica eles (moradores), por que eles “vai” prejudicar nós, também? Ficar só
ligado. Uma vacilação, nós “passa” fogo, uma suspeita de caguetação (entregar os falcãos
para os políciais), nós “passa” fogo.
Vale a pena ressaltar que, os jargões “cagueta”’ e “X-9” são utilizados no linguajar
informal do narcotráfico, e esta nomenclatura corresponde aos indivíduos que denunciam os
agentes do narcotráfico aos políciais.
Analisando a tomada 8 - o narcotráfico oferece muito pouco aos demais moradores da
periferia, e automaticamente os forçam a seguir a sua lei, pois caso contrário serão punidos de
forma incisiva. A entonação deste “falcão” é de total desrespeito com os habitantes das
periferias. Através desta entrevista, o documentário “Falcão – Meninos do tráfico” retratou
um dos lados mais perversos que há no mundo do narcotráfico, e por esta atividade estar
presente nas comunidades de baixa renda, os moradores desta região ficam a mercê desta
postura que não é nada social. Os habitantes das periferias onde o crime impera não têm a
quem recorrer para solucionar esta questão, ou melhor, até têm, mas somente na base teórica
(poder do Estado). Sendo assim, a lei do silêncio prevalece sobre esta região.
A ausência afirmativa do Estado na periferia ou, em outras palavras, sua forte presença eminentemente repressiva, corrupta, discriminatória e espoliativa – particularmente, mas não apenas, por intermédio da polícia – cria condições para a consolidação e a potencialização do poder criminoso [...]. Essa ‘confiança’ das periferias urbanas no banditismo organizado representa mais uma insatisfação geral direcionada à polícia e ao que ela representa do que um endosso às ações do crime e à sua forma de organização (SILVA apud CARNEIRO 2008).13
Tomada 9 - MV Bill questiona um dos “subagentes” (meninos que não atuam
diretamente no tráfico) do narcotráfico, sobre a origem das drogas (maconha e cocaína) que
13 Link: http://web.intranet.ess.ufrj.br /mono grafias/104059468.pdf. Acessado em 18 de Maio de 2011, as 18h45
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são vendidas nos pontos de tráfico, e o mesmo alega que as drogas são provenientes de países
como a Colômbia. Antes de chegarem ao consumidor final (dependente químico), as drogas
passam por uma linha de produção que se inicia no “cortador” que desfragmenta a maconha e
a cocaína, depois deste processo o “endolador”que pesa e amarra as embalagens de drogas, e
posteriormente o “vapor” que comercializa estes produtos para os dependentes químicos.
Um dos “subagentes” do narcotráfico alega que após o processo final na linha de
padronização dos entorpecentes, eles não têm nenhuma responsabilidade pelo o destino final
destes produtos.
MV Bill entrevistou também dois “endoladores” que estavam com suas faces
encapuzadas por uma camiseta. Filmagem: cena interna, boa iluminação, imagens em
movimento não sincrônicas às falas, primeiro plano.
Sonora Mv Bill:
Você usa o que você endola (drogas)?
Sonora “endolador” 1:
Não fumo, não cheiro e na bebo. Só bebo guaraná. Como tá vendo aí, sou um cara que nem
era pra estar aqui. Na realidade, nem era pra estar aqui. Mas é isso que o governante quer. É
ver nós aqui mesmo, porque ele não liga pra nada.
Sonora “endolador” 2:
Nós “tem” pouco estudo. Se bate tem até uns “amigo” que não estudou (são poucos
subagentes que terminaram o ensino fundamental). Então para nós “trabalhar” é f***
(difícil), tá ligado (esta ciente) que eles (o mercado de trabalho formal) “discrimina” nós a
vera (de verdade) mesmo. Então nosso único recurso é recorrer a isso aí, a boca de fumo
(narcotráfico). Para nos “sobreviver”, sustentar nossa família.
Sonora MV Bill:
Quando suas crianças (filhos) crescerem um pouco mais, o que você vai fazer para evitar que
o que você tá “endolando” agora chegue nas mãos deles?
Sonora “endolador” 2:
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Pô, cara, isso daí é uma pergunta que eu fico até meio assim. Se um dia eles (mercado de
trabalho formal) “der” oportunidade, eu pretendo sair dessa. Mas, por enquanto, minha vida
é assim daí mesmo. Daqui não saio, daqui que vem minha sobrevivência.
Analisando a tomada 9 – os “endoladores” alegam que não usam nenhum tipo de
entorpecentes, e desejam sair do narcotráfico, porém, não possuem qualificação profissional, e
não recebem nenhuma oportunidade ou incentivo governamental, para conquistar um trabalho
com carteira profissional assinada. A única maneira rentável é trabalhar para o tráfico de
drogas. Nesta parte do documentário “Falcão”, pressupomos que para qualquer pessoa atuar
no narcotráfico não precisa ter qualificação profissional e escolaridade básica. Por isso, os
cidadãos de baixa renda com pouco tirocínio se tornam presas “fáceis” para ingressarem no
mundo do tráfico.
É esta luta que legitima a atuação no tráfico para essas crianças que se sentem excluídas de qualquer atenção do poder público. Aos seus olhos, a criminalidade não aparece como uma escolha, mas surge como uma necessidade de sobrevivência. Os entrevistados não se veem como criminosos, e sim como desamparados. Muitos demonstram saber que não há futuro no tráfico, mas recorrem a ele por uma suposta falta de opção. Revelam ainda consciência de sua exclusão social e da desatenção do Estado (BENEDICKT, 2008, p.130).
No documentário também é retratada a ausência da figura paterna, e em alguns casos a
carência total da família na vida dos garotos do narcotráfico. Os adolescentes que não têm
nenhum vínculo familiar alegam - através de entrevistas e depoimentos dados ao MV Bill -
que desejariam ter uma família presente para não precisar roubar ou atuar no tráfico para
sobreviver, e, além disso, eles gostariam de viver em um ambiente familiar para terem apoio
moral e emocional. Os jovens que só contam com a figura maternal esclarecem que respeitam
muito suas mães, sentem falta de seus pais (geradores), e que trabalham para o narcotráfico
para colaborar na renda mensal de sua família. Muitos desses jovens que foram entrevistados
pelo MV Bill, referem-se à figura paterna em tom melancólico, afirmando que seus pais
(geradores) estão mortos, não chegaram a conhecê-los, ou abandonaram definitivamente a
família.
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Tomada 10 – MV Bill entrevista um dos jovens do narcotráfico que é órfão de pai e
mãe. Filmagem: cena externa, baixa iluminação, imagens em primeiro plano com a fisionomia
do menino borrada.
Sonora MV Bill:
Você tem um sonho?
Sonora “falcão”:
Meu sonho é conhecer um circo. Antes da minha mãe morrer, ela me prometeu que ia me
levar no circo do Beto Carreiro. Aquele circo bem grandão. Ela me prometeu eu me lembro
até hoje: “vou te levar, mané, vou te levar no circo” ... “eu vou esperar mãe, eu vou esperar,
mãe”. Nunca entrei em um circo, nunca.
Sonora do MV Bill:
Quando você pensa no futuro o que vem na tua cabeça?
Sonora “falcão”:
Quando eu sair da boca (ponto de tráfico)? Futuro? Eu quando sair da boca eu queria ser
palhaço. Se eu sair da boca agora, hoje? Amanhã eu vou procurar um curso. O curso que ia
fazer é um curso de circo. Desde pequenininho, desde pequenininho eu tenho vontade de ser
palhaço. Este é o meu sonho.
Analisando a tomada 11 – podemos perceber que alguns agentes do tráfico, também
sonham em ter uma profissão digna, porém, eles não têm “força” suficiente para ministrar e
seguir seus objetivos, isto é, sonham, mas, não têm ninguém que lhes apóie para conquistarem
o seu projeto de vida, sem nenhum tipo de apoio, entregam-se ao mundo do narcotráfico.
Durante a gravação, os produtores do documentário levaram este menino para assistir
um espetáculo circense.
O filme “Falcão” também exibiu o desabafo de uma personagem que pedia
constantemente para seu companheiro procurar um trabalho formal e abandonar a vida do
crime, pois eles tinham um filho para criar. As súplicas desta mãe foram em vão, seu marido
faleceu durante trocas de tiros em um assalto. Percebemos dessa forma que esta obra também
aborda histórias de personagens que estavam inseridos no mundo do crime, isto é, criminosos
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que roubam no “asfalto” (nas ruas e avenidas da cidade). Este documentário também mostrou
funerais de criminosos e de “falcãos” que vieram a falecer durante combates armados.
O documentário “Falcão” exibe brincadeiras de crianças interpretando o cotidiano dos
pontos de tráfico na favela, ou, em outras palavras, crianças brincando inocentemente
inspiradas na vida real. No passatempo quando brincam de polícia e ladrão eles atuam como
se fizessem parte da rotina na criminalidade. Crianças encenando a vingança, tortura e morte
de um X9 (delator), o pagamento de propina, a simulação de consumo e de vendas das drogas.
E para a recreação tornar-se mais autêntica, improvisam armas (de brinquedo) e entorpecentes
(folhas de eucaliptos). Enquanto o documentário “Falcão” retrata esta brincadeira de crianças,
ocorre um fundo sonoro de disparos de armas de fogo reais, Mv Bill, relata neste momento
que um personagem está sendo sentenciado, pelo fato de ter sido um X-9 (delator).
Tomada 12 – MV Bill entrevista Betinho, um ex- criminoso e paraplégico. Filmagem:
cenas externas e internas, imagens sem borrões, primeiro plano, curtos frames imagens em
movimento contra - plongée (Betinho passeando na sua cadeira de rodas nas ruas da
comunidade - segundo plano, zoom in, mostrando garotos com seus semblantes borrados,
trabalhando nos semáforos), boa iluminação.
Sonora Betinho:
Fiquei assim com 23 anos de idade, numa cadeira de rodas. Minha vida toda foi só crime,
cadeia pra caramba. Só na cadeira de roda eu tirei doze anos. Tem cinco anos que eu saí da
cadeia. Aí foi onde que um próprio polícia que uma vez me prendeu, eu tinha rodado com
umas cargas ele chegou pra mim e falou, “pô”, Betinho to cansado de te prender, da próxima
vez eu vou ter que te matar. Eu não quero te matar, e você não é mais útil na boca, você tá na
cadeira de rodas. Olha, eu tenho um sobrinho que trabalha no sinal, vendendo bala. Aí, você
podia arrumar uma bala e vender. Sai dessa do crime que você não vai arrumar nada. Você
não pode correr, não pode trocar (tiro) mais com ninguém. Aí foi onde eu caí na real. É uma
vida ingrata. Eu acho que o crime, se você for parar pra pensar legal, o crime é uma
profissão que você não tem fundo de garantia, décimo – terceiro, férias vencidas, você ainda
bota a tua vida em risco. Porque se você trabalha numa firma, você tem fundo de garantia
(...) pode pegar um atestado médico e faltar. Vida do crime é totalmente diferente. Você não
tem direito a nada e tu sabe que o futuro (...). Porque você não vê um vagabundo aposentado,
de conversível passando na linha amarela e os “home” (políciais) pára “ah, eu sou o ex –
Escadinha, da boca, mas me aposentei, to a vontade, to gastando o meu dinheiro”. Não vê. É
61
o crime. Hoje em dia que eu tenho alguma coisa, eu batalho, comprei minha casa
trabalhando graças a Deus. Dá pra “mim” me alimentar maneiro. Quer dizer, ainda pago
até a menina pra cuidar da minha casa.
Sonora MV Bill:
E no crime, tu conseguiu o quê?
Sonora Betinho;
Nada. Tu não consegue nada. Porque se você consegue no crime, que m vai desfrutar ou é
tua mulher ou é familiar. Porque você não desfruta (...) nada numa cadeia, né, “cumpade”?
No crime eu não arrumei nada. Arrumei o quê? Só prejuízo mesmo. Cadeira de roda.
Dezenove anos na cadeira de roda. Graças a Deus que eu tenho resignação porque no
começo foi f*** (difícil) mesmo. No começo eu tentei me matar, porque eu fui pra cadeia
novinho, né? Antigamente eu achava que malandragem era tu ser bandido. Hoje
malandragem é tu ser trabalhador. Porque você vê, o cara que é bandido o cara não tem
liberdade pra ir e “vim”. Você não vê um vagabundo com a namorada dele no shopping. Pô,
então é maneiro você vir do trabalho, pegar tua namorada e ir no shopping. Ficar a vontade.
Você não pode. Então ao meu ver era melhor a “menorzada” estudar, trabalhar. Porque, pô,
é uma vida ingrata. Uma vida ingrata pra caramba. Sofrimento brabo.
Sonora MV Bill:
Você acha que você vive num país justo?
Sonora Betinho:
Não. Não acho porque, eu vou ser sincero com você, cara, a criminalidade não acabaria,
mas melhoraria, se o salário fosse digno pra pessoa sobreviver.
Neste momento a entrevista com o Betinho é cortada. E o documentário “Falcão”
exibe MV Bill entrevistando dois “falcões” (um menino e uma menina), através do tom de
seus enunciados ambos não demonstram nenhum tipo de culpa sobre seus atos. Filmagem: 1º
do garoto - cena externa, imagens primeiro plano em movimento focando a arma que ele
carrega na cintura (imagens da cintura para baixo), baixa iluminação / 2º da garota – cena
externa, imagens primeiro plano focando a arma que ela segura abaixada em uma das suas
mãos (imagens da cintura para baixo) e por curtos frames imagens das trações de seu
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semblante meio borrado (imagem nítida mostrando apenas um globo ocular direito e logo em
seguida sua boca), boa iluminação.
Sonora MV Bill:
Como você sente em vender o mal para as pessoas?
Sonora “falcão” (menino):
Como é que eu me sinto? Pô, o pessoal compra porque gosta, compra porque quer.
Sonora MV Bill:
Você acha certo?
Sonora “falcão” (menina):
Achar certo ninguém acha, mas e agora? Só tem dois “caminho”. Um é o caminho do bem e
o do mal, fazer o quê? O do mal tá mais fácil, a gente caminha pro do mal.
Neste instante do filme “Falcão” retorna a narrativa de Betinho.
Sonora Betinho:
Acho que também nenhum vagabundo se arrepende. Ele só se arrepende porque no dia que
ele tiver um filho, ele não vai querer aquilo pro filho. Vagabundo nenhum quer que o filho
“vive” a vida que ele viveu. Não tem lógica. Quando o cara é bandido legal, o caro procura
que o filho dele “viver” longe daquilo que ele viveu. Aí, sim, eu me arrependeria sim, se eu
tivesse um filho e meu filho virasse vagabundo por causa de mim. Caramba, por causa de
mim, olha o meu filho. Qual, o exemplo que eu ia dar pra ele na cadeira de rodas? Eu na
cadeira de rodas, vendo o meu filho no crime, vou esperar o que dele? Esperar ele me ver
mais tarde eu indo na cadeia visitar ele? Ou no cemitério levando a flor pra ele? Ou então
assim na cadeira de roda?
Analisando a tomada 12- Betinho seguiu a vida do crime, até perceber que este ramo
não lhe traria nenhum tipo de beneficio, através deste depoimento,“Falcão – Meninos do
tráfico” retratou o cotidiano e os conceitos ideológicos de um personagem que atuou durante
muito tempo de sua vida no mundo crime, até que em um determinado momento optou por
ser um trabalhador formal. O personagem Betinho aponta quais são as possíveis hipóteses que
um criminoso tem de usufruir os bens que conquistou atuando no mundo do crime. Assegura
que os “bandidos legais” (cidadãos transgressores da conduta ética e moral estipulada pela a
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sociedade) têm ciência que o exemplo de vida que estão dando para seus filhos não é
benéfico, e para proporcionarem uma melhor qualidade de vida para seus herdeiros optam por
abandonar a criminalidade, isto é, uma pessoa que foi criminosa, mas não deseja que o seu
filho siga este caminho inglório, o cidadão abandona esta “profissão” com o intuito de
proporcionar uma vida digna para seu filho.
Este corte durante a entrevista com o Betinho sintetizou o conceito intelectual de dois
agentes do tráfico, e através de seus enunciados, ambos aparentaram ter optado por seguir a
vida deste “submundo” (criminalidade/narcotráfico), pois provavelmente não tiveram
oportunidade de promoverem-se como pessoas dignas, ou melhor, esses jovens não tiveram o
privilégio de estarem inseridos no seio de uma família com bases sólidas, que lhes ensinassem
as condutas sociais e éticas, e lhes dessem apoio moral e emocional para que eles trilhassem
um rumo diferente ao qual estão inseridos.
Gostaríamos de salientar que esta análise está sendo feita de acordo com as
apresentações dos fatos retratados no filme “Falcão”. E o caso de abandono ou negligência
familiar já foi apontado anteriormente por alguns “falcões”. Por este motivo, mencionamos as
possíveis hipóteses das narrativas que surgiram durante a análise da última tomada.
Através da entrevista/ depoimento de Betinho, podemos perceber que o documentário
“Falcão” quis trazer à tona o exemplo de um personagem que conseguiu sair da criminalidade
e ter uma vida digna após seguir o conselho de um policial. Sendo assim, podemos afirmar
que alguns agentes de segurança pública honram a farda que vestem, contudo em alguns
trechos do filme, alguns “falcões” alegam que os políciais são maléficos, e o depoimento do
personagem Betinho apresenta outra versão deste fato, ou melhor, ele enuncia que um dos
agentes de segurança pública lhe sugeriu um conselho benéfico que mudou radicalmente de
forma positiva sua vida.
Para fechar o documentário “Falcão – Meninos do Tráfico”, MV Bill dá um
depoimento. Filmagem: cena externa, imagens em primeiro plano, a câmera está centralizada
na face do MV Bill.
Eu não sei qual é o papel exato deste documentário. Solucionar eu tenho certeza que
não é. Nem eu tenho esta resposta, ninguém tem. Nem juiz, nem Presidente da República,
ninguém consegue resolver isto. Mas, acho que é mais um instrumento pra ajudar, a pensar,
a repensar as leis dentro do Brasil. A repensar o conceito de humanidade que se fala tanto.
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Acho que o rap num tem nem obrigação de ser ético e nem sensato, por isso, acho que ele
cuida dessas questões também, questões ignoradas por outras vertentes musicais, por outros
artistas, ignorados pelo poder público. Achei que se mostrado não só este, mas, como todos
os problemas, as pessoas discutam, até, façam uma reflexão, e vejam se este Brasil que a
gente quer. Ou a gente tem um Brasil só, ou a gente tem dois “Brasis”. E parece que estão
cuidando de um Brasil só, e esquecendo do outro. Só, que outro está crescendo se
transformando num “monstro”, onde nós já perdemos o controle, e tá engolindo todo mundo.
Sendo assim, o documentário “Falcão”, abordou um dos pontos mais críticos da
sociedade brasileira, que é o narcotráfico. Este segmento mercantil emprega qualquer cidadão,
oferece poucos benefícios, e faz com que milhares de jovens sigam uma conduta que não é
das melhores. Entretanto, como relatado pelo o MV Bill, as esferas governamentais
esquecem-se, ou não se esforçam para solucionar este problema. Quanto mais se adia, pior
ficará a situação desta parte da população, que por diversas vezes só encontra no narcotráfico
maneiras para obter renda mensal.
Em quase todos os relatos pronunciados pelos “falcões” podemos perceber que os
mesmos não tiveram oportunidade de estudar em uma escola de qualidade e muito menos de
aprender uma profissão. Sem contar que muitos desses meninos não têm bases familiares
concretas. Sem a colaboração de familiares e das esferas políticas, a “única” oportunidade que
lhes resta é o caminho da criminalidade. E o fato mais agravante é que muitos desses agentes
do narcotráfico, além de comercializar entorpecentes, utilizam drogas com o intuito de
esquecer os problemas pessoais; e, também há aqueles que somente trabalham neste ramo e
aguardam silenciosamente por uma oportunidade profissional plausível.
Realmente, o documentário “Falcão” apresentou diversos elementos que precisam ser
tratados com extrema urgência pelos dirigentes da nossa sociedade. Se acaso as esferas
políticas não soubessem deste problema, o filme “Falcão”’ os apresentou de maneira legitima
e satisfatória.
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
Concluímos com o presente estudo que o documentário “Falcão – Meninos do
Tráfico” (2006) apresentou de forma legítima quais são os verdadeiros fatores que estão
introduzidos entre os becos e vielas das comunidades carentes de todo o Brasil. O
documentário teve total êxito, podemos confirmar isso pelo fato de ter conquistado um lugar
privilegiado para apresentação na maior emissora televisiva brasileira - TV GLOBO, por meio
de sua revista eletrônica “Fantástico”. È interessante notar, que após ser exibido na Rede
Globo, o mesmo foi reproduzido em outras emissoras televisivas nacionais.
O filme entrou para a história da Rede Globo como o primeiro e único (até o
momento) documentário exibido por esta Instituição, haja vista que no final da década de 80,
esta emissora negou-se a veicular o documentário “Santa Marta - duas semanas no morro”
(1987), produzido pelo cineasta Eduardo Coutinho, alegando não ter interesse, pelo fato desta
obra ser muito antropológica, e eles almejavam fatos mais jornalísticos.
Em tempos remotos seria impensável a exibição de “Falcão: ...” dentro de um programa como o “Fantástico”, formatado como uma revista eletrônica para contemplar o jornalismo e o entretenimento. Até então, o espaço destinado ao jornalismo apenas reproduzia o gênero telejornal na apresentação e exibição de matérias - algumas no formato de reportagens especiais - e entrevistas jornalísticas. O gênero documentário, irmão do telejornal, entrou no fantástico mundo da TV Globo pelas asas do “Falcão” (BONIZEM, 2007, p.93).
Acreditamos que as Organizações Globo só cederam espaço ao documentário “Falcão
– Meninos do Tráfico” no “Fantástico” pelo fato de não ter conseguido produzir um
documentário que enfocasse todas as questões que foram abordadas na obra. Notemos que em
2003, o jornalista desta Instituição, Tim Lopes, tentou fazer uma matéria investigativa sobre o
narcotráfico e os bailes funks na comunidade carente, Vila Cruzeiro- RJ, e não teve sucesso,
foi capturado, torturado e executado pelos traficantes desta região.
Tim Lopes quis ser o “jornalista super-man”, tentando entrar na favela com a cara e a
coragem e conquistar uma matéria extraordinária, porém na linguagem do tráfico isso é um
X9 (delator) e a sentença para esse tipo de pessoa é a morte.
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Enquanto Zeca Camargo (ancora do “Fantástico”) chama os jovens da favela de
“geração perdida”, condenando-os sem base jurídica ou teórica/humanitária, vemos Tim
Lopes tentando romper esse cerco, mas sendo torturado e morto, justamente porque leva
consigo o estigma da Globo.
O “falcão” vê a Globo como uma facção inimiga, que não tem nada o que fazer na
favela, pois não traz nada de bom.
Até o presente o momento, classificamos o documentário “Falcão” como uma obra
audiovisual brasileira que visou esclarecer de forma analítica os aspectos que estão inseridos
no mundo do tráfico. Além do mais, este filme denunciou o mercado ilícito das propinas entre
os agentes do narcotráfico e os representantes de segurança pública.
O trabalho desenvolvido pelo rapper MV Bill e o seu produtor Celso Athayde
percorreu durante seis anos diversas comunidades carentes do Brasil, registrando em vídeo o
cotidiano dos cidadãos menos favorecido. Todavia, esses militantes sociais conseguiram
introduzir no filme “Falcão” a “voz do povo”, que por inúmeras vezes fica calada durante as
reportagens jornalísticas produzidas pelos meios de comunicação dos grandes grupos.
Temos ciência que esses meninos infligiram as condutas sociais, mas, um aspecto tem
que ser ressaltado, eles têm que pagar por seus atos, mas não é necessário serem julgados e
discriminados antes mesmo da sentença do juiz.
Muitas emissoras televisivas referem-se a estes garotos como se eles não tivessem uma
segunda oportunidade de se redimirem, e este fato agrava ainda mais a sua posição social.
Pois todos eles precisam de oportunidade para progredirem na vida, e sem isso fica quase
impossível conquistar qualquer tipo de êxito.
A maioria destes garotos optou por seguir a vida do crime, por falta de opção. Não
podemos nos esquecer que as comunidades carentes brasileiras são carentes das ações
promovidas pelas as esferas políticas brasileiras.
Graças aos trabalhos desempenhados por inúmeras organizações não-governamentais,
milhares de jovens carentes recebem oportunidades de participarem de projetos sociais que
lhes proporcionam atividades profissionalizantes e esportivas. Sendo assim, esses jovens
conseguem seguir uma rota longe da criminalidade e progredir profissionalmente.
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A CUFA (Central Única das Favelas) é uma organização que através de suas ações
sociais já conseguiu inserir no mercado milhares de jovens carentes , devido ao seu trabalho
qualitativo continua agindo em prol dos menos favorecidos e constantemente diversifica suas
ações. Vale a pena ressaltar que, todos os progressos que a CUFA conquistou e continua
conquistando são devidos aos inúmeros militantes sociais que atuam voluntariamente nesta
instituição.
Consideramos os filmes “Favela dos meus amores” (1935) - Humberto Mauro e “Rio
40 Graus” (1955) - Nelson Pereira dos Santos, como marco zero das grandes obras do
Cinema Novo, pelo fato de terem sido os primeiros a exibir os contrastes das comunidades
carentes e da cultura popular instalada nesta classe social e também pelo fato de terem sofrido
com as represálias impostas pela censura militar.
Ambos cineastas, Humberto Mauro e Nelson Pereira dos Santos, abriram caminho
para criação de novas produções audiovisuais, e como abordamos neste trabalho, os filmes
que retratavam os contrastes destas comunidades carentes foram “censurados” e
descriminalizados pelos grandes proprietários dos meios de comunicação. Mas, mesmo
sofrendo “represálias” os cineastas do Cinema Novo que abordaram este tema não se
deixaram levar por tais desagravos. Devido à persistência, os cineastas do cinema
contemporâneo podem abordar em suas obras diversos elementos que estão introduzidos nas
comunidades carentes, sem sofrer “qualquer” tipo de censura.
Durante muito tempo a favela só ocupou as páginas de editorias policiais, atualmente
conquista de forma emergente espaço privilegiado na sétima arte brasileira. Sendo que, o
cinema nacional é democrático apresenta obras que retratam as periferias em filmes do gênero
entretenimento, com intuito de divertir o público, e também, apresenta as comunidades
carentes em obras do gênero documentário, com o objetivo de mostrar a sociedade diversas
questões socioeconômicas que precisam ser resolvidas.
O documentário “Falcão – Meninos do Tráfico” apresentou o narcotráfico como a
ponta do Iceberg que está crescendo de forma demasiada na nossa sociedade, cabe agora às
esferas governamentais implantarem métodos políticos que beneficiem essa população para
solucionar este problema. Também a mídia é responsável pela divulgação de trabalhos de
cunho social, pois não adianta nada fazer documentários se não houver um espaço de
veiculação nas grande emissoras televisivas.
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Queremos concluir ressaltando que o cinema é absolutamente democrático, apresenta
obras com liberdade de expressão. Seja num filme que mostra uma favela de uma forma
fictícia ou num filme mais realista, o grande objetivo do filme nacional que foca as
comunidades carentes é quebrar o preconceito, os tabus e estabelecer na sociedade parâmetros
de igualdade e democracia.
69
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Cadu Barcellos, Luciana Bezerra e Manaíra Carneiro. Brasil: Cacá Diegues e Renata Almeida
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