Não estamos mais tão forever alone - Versão Final

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Não estamos mais tão Forever Alone? As representações de relacionamentos interpessoais amorosos nas Rage Comics Leonardo de Almeida Soares Coelho Monografia apresentada ao Departamento de Comunicação Social da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro / PUC Rio para obtenção do título de especialista em Comunicação e Imagem Orientadora: Liliane Heynemann Rio de Janeiro, agosto de 2012.

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Não estamos mais tão Forever Alone?

As representações de relacionamentos interpessoais amorosos nas

Rage Comics

Leonardo de Almeida Soares Coelho

Monografia apresentada ao Departamento de Comunicação Social da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro / PUC Rio para obtenção do título de especialista em Comunicação e Imagem

Orientadora: Liliane Heynemann

Rio de Janeiro, agosto de 2012.

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Resumo

Coelho, Leonardo de Almeida Soares. Não estamos mais tão Forever

Alone? Rio de Janeiro, 2012. 78p. Monografia de Especialização -

Departamento de Comunicação Social, Pontifícia Universidade Católica

do Rio de Janeiro.

As Rage Comics constituem um tipo específico de quadrinhos feito para a

veiculação na internet (webcomic), cujo perfil é caracterizado principalmente

pela interatividade, a temática cotidiana e humorística, além de uma iconografia

simples e baseada em memes. A pesquisa aqui proposta pretende estudar as Rage

Comics para compreender de que jeito os relacionamentos amorosos estão sendo

representados, e como isso dialoga com os principais conceitos da cibercultura e

da pós-modernidade.

Palavras-chave

Rage Comics, memes, Relacionamentos amorosos, cibercultura, pós-

modernidade.

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Sumário

1 - Introdução 6

2 –Memes, Rage Faces e Rage Comics 10

2.1. As Rage Faces 15

2.2. As Rage Comics no Reino dos Quadrinhos 20

3 – Forever Alone na sociedade e na cibercultura 28

3.1. Características do público/autor 32

3.2. O público jovem na sociedade atual 35

3.3 – A Cultura dos Memes dentro da Cibercultura 41

4 – Leitura de Imagens 47

5 – Conclusão 59

6 - Bibliografia 62

Anexos 67

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4

Lista de figuras

Figura 1 10

Figura 2 11

Figura 3 14

Figura 4 15

Figura 5 17

Figura 6 18

Figura 7 22

Figura 8 28

Figura 9 34

Figura 10 37

Figura 11 41

Figura 12 46

Figura 13 49

Figura 14 52

Figura 15 54

Figura 16 55

Figura 17 67

Figura 18 67

Figura 19 67

Figura 20 67

Figura 21 67

Figura 22 67

Figura 23 68

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Figura 24 68

Figura 25 e 26 68

Figura 27 68

Figura 28 e 29 68

Figura 30 e 31 68

Figura 32 e 33 68

Figura 34 68

Figura 35 68

Figura 36 68

Figura 36 68

Figura 37 68

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1- Introdução

Se fizermos uma enquete rápida e informal, movida meramente pela

curiosidade, haverá uma boa possibilidade de que o imaginário da população

média sobre os quadrinhos, tebeos, comics, historietas, mangás, bande dessinés,

ou qualquer outra titulação dada a essa linguagem, mostre-se confusa e, muitas

vezes, calcada de preconceitos. Como bem afirmou Scott McCloud em seu livro

“Desvendando os Quadrinhos”: “A expressão ‘história em quadrinhos’ teve

conotações tão negativas que muitos profissionais preferem ser conhecidos como

ilustradores, artistas comerciais ou, na melhor das hipóteses, cartunistas”.

(MCCLOUD, 2005, 18)

Até mesmo no universo acadêmico, inclusive na área da comunicação, a

visão acerca dos quadrinhos costumava ser deturpada. Um dos primeiros

acadêmicos que pesquisou seriamente o tema no Brasil, o jornalista e professor

José Marques de Melo, da Faculdade Cásper Líbero, em São Paulo durante a

segunda metade da década de 1960 afirmou que “era acusado clandestinamente de

pesquisar o lixo cultural”. (MELO apud RAMOS, 2008, 2).

Com o tempo, a sociedade e a Academia passaram a aceitar o estudo

sistemático dessa linguagem. Grandes pesquisadores como Umberto Eco, Moacy

Cirne e até mesmo o quadrinista Will Eisner deram grandes contribuições ao

dicionário dos quadrinhos. Contudo, ainda hoje, “é muito comum alguém ver nas

histórias em quadrinhos uma forma de literatura” (RAMOS, 2010, 17). O autor

Paulo Ramos ainda completa esse pensamento, afirmando que essa atitude nada

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mais é que uma forma de rotular de modo social e academicamente aceitável a

linguagem dos quadrinhos.

Minha ideia para esse projeto provém da surpresa que tive quando vi boa

parte dessas afamadas Rage Comics em diferentes sítios e blogs da web. “Elas

falam da minha vida. Estou sendo observado!”, pensei. Esse pensamento

paranoico não durou muito. Rapidamente pesquisei sobre o assunto, descobrindo

as inúmeras possibilidades narrativas e diferentes “personagens” que poderiam ser

usados. O PokerFace, o TrollFace, o FuckYeah, além do pobre Forever Alone.

Todos eles diziam alguma coisa muito íntima, muito verdadeira. Eu já fora todos

eles, em algum momento da vida.

Se eu tive essa sensação, muito provavelmente outras pessoas igualmente a

tiveram. De qualquer jeito, essa relação de cumplicidade entre as tirinhas e nós

mesmos provém de outra coisa que descobri, tentando averiguar a autoria das tais

tirinhas.

Pensava eu inicialmente que havia um cartunista por trás delas, alguém

produtivo e extremamente criativo. Não havia. O que havia eram milhares de

autores, todos criando suas histórias, que acabavam sendo muito parecidas. Toda

conceituação tradicional de autoria e obra acaba aqui. Essas tiras não pertencem

necessariamente a ninguém, mas sim a todos.

Mas como eles faziam essas tirinhas? O MSPaint e outros programas

similares de criação gráfica foram minha ideia original, e ela realmente procede.

Contudo, pela quantidade de tirinhas que existem e saem diariamente na web, não

era possível que tantas pessoas usassem esses programas, até porque é preciso de

um mínimo de paciência e dedicação para criar uma dessas webtiras.

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Pesquisando mais um pouco achei o que procurava: sítios de construção

desses memes. Neles sua ideia podia se tornar realidade sem precisar se esforçar

no MSPaint. Bastava escolher suas faces no catálogo, diagramá-las a gosto e

pronto. Estava feito uma Rage Comics.

Além do aspecto significativo, histórico e da própria produção dessas Rage

Comics, havia algo que me fascinava ainda mais nessas tirinhas, e ai voltamos

novamente ao pensamento paranoico que tive ao me deparar com essas tirinhas

pela primeira vez. Por que eu tive essa sensação?

Mesmo com intensas diferenças, sociais, econômicas e culturais entre,

digamos, alguém da classe mais abastada dos EUA e um morador da comunidade

da Rocinha, no Rio de Janeiro, há algo que os liga além da possibilidade de usar a

internet. Eles ambos são humanos, e sendo humanos, em boa parte de suas vidas,

independentemente de como elas transcorram, acontecerão coisas parecidas. Eles

se apaixonarão, terão amigos, se machucarão, terão manias esquisitas, se sentirão

solitários, passarão por problemas, etc.

São essas pequenas coisas em comum que definem nossa existência, mesmo

que outros tenham essas mesmas idiossincrasias, por mais estranhas que possam

ser. No geral, parece haver pouca margem para as distinções entre uma cultura e

outra, e até mesmo entre níveis sociais e econômicos diferentes. Há apenas a

humanidade como um todo.

A sociedade em que vivemos está hoje obrigatoriamente pautada pela

internet. É dela e de seu ambiente dinâmico que nascem boa parte das grandes

inovações atuais, e é também nela que as outras mídias se reformulam e acham

novos caminhos. Sua influência é tanta que, para Pierre Levy podemos até mesmo

falar de uma nova universalidade, que seria “diferente das formas culturais que

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vieram antes dele no sentido de que ele se constrói sobre a indeterminação de um

sentido global qualquer. (Levy, 1999, 15)

Sendo assim, é sobre essa base aparentemente indeterminada que esse

trabalho se sustenta. Dentro desse novo conceito de universal, o amor e suas

representações emergiram, ao menos nas Rage Comics, como uma temática

extremamente repercutida e influente na produção. Não é surpresa que tal assunto

fizesse sucesso, mas havia algo em suas representações que estava estranho, e é

daí que surgiu o interesse e o embrião da pesquisa que desenvolvi.

A metodologia que utilizei foi interpretação de diversas Rage Comics

conseguidas em sítios específicos, os weblogs, de conteúdo memético brasileiros,

e outros sites estrangeiros. Através da contextualização desse material com a

realidade sociopolítica, busquei compreender melhor essa nova espécie de

webcomics, como ela funciona na dinâmica da cibercultura e de que jeito ela

comunica questões diversas relacionadas aos relacionamentos amorosos nos

tempos atuais.

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2 –Memes, Rage Faces e Rage Comics

Figura 1

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A tirinha acima (Figura 1) recria uma situação que quase todos os que

possuem ou possuíram um cartão de crédito já passaram: a tensão decorrente da

incerteza do processamento ou não de um pagamento qualquer, e o alívio íntimo,

quase vitorioso, que se apossa do comprador após sua confirmação. Independente

da qualidade dos traços, essa rápida narrativa conta uma situação que nos é

cotidiana, ainda que na maior parte das vezes seja vivida de modo solitário, como

algo que não dividimos com ninguém.

De alguns anos para cá, a popularidade dessas webcomics, chamadas de

Rage Comics, literalmente explodiu na cibercultura, como podemos observar logo

abaixo, em um gráfico do Google Insight (Figura 2), que mede a presença do tema

nas pesquisas de público em seu servidor durante os últimos anos.

Figura 2

Após um começo tímido em 2008, é possível perceber que, a partir de 2010,

o tema começou a se desenvolver e ganhar popularidade, o que acabou por

ampliar imensamente a gama de possibilidades visuais e narrativas.

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Mesmo que não se saiba o nome das diferentes Rage faces1 que compõem as

Rage Comics (todas possuem origem e nome próprio), sua compreensão é

altamente intuitiva, já que estas possuem traços simplificados em um teor

específico, como, por exemplo, o Forever Alone, que explicita a sensação de

solidão, o que pode criar uma empatia com o público leitor, que ri justamente

dessa aproximação.

Vale lembrar que essas obras são popularmente chamadas de memes,

apesar de sua original, e correta, denominação ser Rage Comics. memes são de

acordo com a teoria desenvolvida pelo biólogo Richard Dawkins em seu livro O

Gene Egoísta de 1976, uma

unidade de transmissão cultural, ou unidade de imitação. Assim como os genes se

propagavam no pool gênico saltando de corpo em corpo via espermas ou óvulos, os memes

se propagam no pool memético, saltando de cérebro para cérebro por um processo que, no

sentido mais amplo, pode ser chamado de imitação (apud Waizbort ,2003,27)

Em resumo, Dawkins tenta construir uma analogia da cultura com a

evolução, com o objetivo de “prover uma base de comparação sobre a qual se

poderia erguer um sem número de questões construtivas” (Ruse apud Waizbort,

2003,28) Tanto para ele quanto para os pesquisadores do tema memes, qualquer

tipo de construção cultural – línguas, ideologia, religião, etc – possui certa

autonomia, evoluindo e se adaptando ou não a novas condições. “O que

chamamos de cultura e sociedade é um complexo sistema de ideias, de memes”

(Waizbort, 2003,39).

Se utilizando desse entendimento, podemos deduzir então que qualquer

ideia, e o que dela advém - filme, imagens, músicas -, pode ser transformada em

1 Ver figuras 17, 18, 19, 20, 21 e 22 no anexo com algumas das Rage faces mais conhecidas e seus

respectivos nomes.

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memes, desde que seja imitada e/ou reciclada. Há inclusive quem tenha feito uma

proposta taxonômica2 que, entretanto, não será usada na minha análise.

Justamente por ter um conceito ainda tão amplo, além de incipiente, a teoria

dos memes é bastante criticada por sua falta de comprovação empírica, e também

por sua visão aparentemente reducionista do ser humano como um mero

replicador de memes. Contudo, o estudioso Ricardo Waizbort tenta equilibrar a

polêmica com sua visão pessoal, da qual também compartilho.

Nossos cérebros não são exatamente máquinas. E não creio também que os adeptos da

teoria dos memes acreditem que os seus e os nossos cérebros são máquinas de reprodução

de ideias. Mas se é para reconhecer a existência de alteridades nos universos físicos,

biológicos, psíquicos e sociais, então talvez devamos considerar, ao menos hipoteticamente,

cientificamente, que possam existir partículas, ou seres (biológicos e mentais) que nos usam

(como máquina ou não) para se reproduzirem. (2003,39-40)

Um exemplo prático do que são memes, pelo menos na cibercultura, pode

ser encontrado em sítios brasileiros de humor. Durante a novela Passione (2010),

da Rede Globo de Televisão, o personagem Gérson, vivido pelo ator Marcelo

Anthony, tinha um segredo íntimo de natureza sexual. Pelo sucesso da trama, o

personagem foi alçado na cultura cibernética como alvo de inúmeras brincadeiras,

seja em Rage Comics ou não3, que satirizavam a respeito de qual seria o tal

segredo. Com isso ele foi “transformado” em um meme, já que passou da

condição de apenas existir como um produto cultural específico (personagem de

uma novela global) para ser transformado em vários outros dentro da cultura

(nesse caso a cibercultura), ainda que essencialmente ligados às características do

original.

2 A proposta de taxonomia foi desenvolvida pela Dra. Raquel Recuero no trabalho “Memes em

weblogs: Proposta de Taxonomia”. Compós, 2006 3 Ver Figura 23.

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Com o desenvolvimento do personagem na novela, seu meme também foi

mudando. Após descobrirem seu segredo, a tara por voyeurismo escatológico, ele

foi transformado, por exemplo, em um selo (Figura 3), que durante algum tempo e

em alguns sítios simbolizou qualquer produção cultural, vídeo, imagem, som, etc,

que tivesse uma natureza repulsiva.

Figura 3

Como se pode perceber por esse caso, há uma clara dinâmica de interação

entre o público e a cultura, que é fortalecida pelo fato de que qualquer um que

estiver disposto pode reciclar esse meme a seu bel prazer. E na cibercultura, pela

facilidade de produção, distribuição e compartilhamento, isso fica extremamente

evidente. Além dos próprios instrumentos do computador, são inúmeros os sítios

que providenciam as ferramentas necessárias para isso, e outros tantos servem

como mural para essas criações. No caso das tirinhas, o autor tem a liberdade de

fazer o que quiser, desde contar pequenos casos do cotidiano, até comentar acerca

de dúvidas amorosas ou qualquer outra coisa que tenha vontade.

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2.1. As Rage Faces

De acordo com o site I Know Your Meme, que pesquisa, cataloga e

organiza os mais conhecidos memes da internet, das quais as Rage Faces fazem

parte, a primeira face catalogada é a Rage Guy4 (face de fúria, em tradução livre),

em 2008. Após o sucesso do personagem e das primeiras tirinhas, inúmeros

leitores e usuários começaram a criar novas “faces” para complementar a

iconografia, ampliando assim tanto o público quanto as possibilidades narrativas.

Em boa parte dessas adições, o desenho é extremamente simples e tosco,

construído normalmente por usuários em programas básicos de criação gráfica,

como o MSPaint, ou em diferentes sítios feitos com esse propósito. Em outras

Rage Faces, porém, há o uso de fotografias como base, como é o caso do casal

Obama, no meme intitulado Not Bad (Figura 4), utilizado em diversas Rage

Comics.

Ao analisarmos as Rage Faces isoladamente, podemos perceber que os

títulos que lhe são atribuídos têm clara relação com o que está sendo retratado. A

imagem acima (Figura 4), por exemplo, mesmo sem o seu nome, passaria

4 Essa primeira Rage Comic está na figura 24 no anexo

Figura 4

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facilmente a interpretação que lhe é atribuída. Com esse tipo de simplificação

iconográfica, quase que exclusivamente voltado para o riso, é válido incluí-las no

conceito de caricaturas genéricas, que “significa a forma de expressão artística

através do desenho que tem por fim o humor” (Melo apud Oliveira & Almeida,

2006, 78) e que não buscam interpretar uma personagem específica ou até mesmo

pública, visando a crítica.

Especificamente, a caricatura é a representação da fisionomia humana com características

grotescas, cômicas ou humorísticas [..] Retrato humano ou de objetos que exagera ou

simplifica traços, acentuando detalhes ou ressaltando defeitos. Sua finalidade é suscitar

risos, ironia. Trata-se de um retrato isolado (ibid)

Scott McCloud, em seu “Desvendando os Quadrinhos”, investiga o porquê

do poder de empatia existente nos cartuns. Para ele, quando abstraímos dos

detalhes específicos da realidade, como profundidade, cor, perspectiva, ou, em

resumo, simplificamos o desenho, estamos na verdade ampliando o significado

essencial deste. Sua identidade, sua personalidade por assim dizer. Assim,

segundo ele, podemos envolver mais pessoas, universalizando seu conteúdo.

(McCloud, 2005,30)

Mais que isso, essas Rage Faces, cartuns em sua essência, são como faces

das quais o próprio leitor pode utilizar em si mesmo. “Quando você olha para uma

foto ou desenho realista de um rosto, você vê isso como o rosto de outra pessoa.

Contudo, quando entra no mundo do cartum você vê a si mesmo” (McCloud,

2005,36).

Na cibercultura, os memes se tornaram os melhores hospedeiros para esse

tipo de caricatura genérica. Por se valerem de qualquer imagem situada no

ciberespaço, qualquer uma pode ser usada/descartada para expor algum tipo de

sentimento específico (solidão, ódio, contentamento, angústia, etc).

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O caso da Rage Face do Presidente Obama, citado anteriormente, foi

proporcionado por sua viagem à Grã-Bretanha em 2011, quando um fotógrafo da

agência de notícias Reuters tirou uma foto dele e de sua esposa, Michelle Obama,

surpresos positivamente com alguma coisa que viam.

Figura 5

O curioso flagrante, dois dias após sua publicação, foi escolhido como

“imagem do dia” pelo jornal The Guardian. Pouco depois, em um conhecido site

de internet chamado Reddit, que é um dos principais portos de conteúdos

meméticos no ciberespaço, um participante criou uma Rage Comic com a imagem

através de um processo chamado de vetorização – dessa forma simplificando-a e

ampliando sua essência -, para após isso inseri-la em uma narrativa. Após exposta

aos outros, a “febre” tomou conta dos membros do site, que passaram a usar o

novo meme em inúmeras Rage Comics (Figura 6) e outras obras. Todas elas,

porém, possuem quase sempre o mesmo sentido do original: a sensação de estar

pasmo frente a alguma coisa.

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Figura 6

Com a explosão criativa dessas “faces”, inúmeros níveis do espectro

sentimental do ser humano podem hoje ser alcançados iconograficamente nessas

caricaturas genéricas e meméticas, bastando para isso somente achar a imagem

certa – em filmes, desenhos, pinturas, etc. - e até certo ponto torcer para ela ser

aceita, compartilhada e reciclada pelos internautas. “Para Barbieri, os quadrinhos

dialogam com recursos da ilustração, da caricatura, da pintura, da fotografia, da

parte gráfica, da música e da poesia...” (apud Ramos, 2010, 18).

Contudo, engana-se quem pensa que todas as Rage Faces são engraçadas

ou irônicas. Há a solidão também, como no Forever Alone, a raiva com o já citado

Fuuuu, ou até mesmo o prazer pelo bizarro, no Me Gusta.

A finalidade humorística, porém, parece persistir em todas. “O riso, o

humor, a anedota, ao contrário, mostram não a superioridade humana, mas a

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desmascaram, apontando o homem como aquilo que é, um animal fraco e nu que

pensa e se pensa. E ao se pensar pensa-se mais do que é.” (Acselrad,2003,3)

Em seu trabalho “Gêneros jornalísticos opinativos de humor: caricaturas e

charges”, as autoras Neide Oliveira e Lara de Almeida compartilham uma visão

parecida, e adicionam que as caricaturas não servem apenas para o riso: Elas

também caracterizam: “a caricatura é uma arte autêntica, uma arte de caracterizar,

que pode levar ao riso e ao rancor à alegria ou à tristeza” (Lima apud Oliveira &

Almeida, 2006, 80)

A caricatura não tem como objetivo principal fazer rir. Isto é tão certo que há caricaturas

lúgubres [..] Longe de ser um testemunho de alegria, o próprio exagero caricatural não é

senão um meio nas mãos do artista para exprimir seu rancor. De fato, os caricaturistas são,

como todos os autores cômicos, naturalmente inclinados a humores negros (Gaultier apud

Oliveira & Almeida, 2006,80)

No caso das Rage Faces há, todavia, uma questão inédita a ser discutida.

Não há mais a figura do caricaturista ou dos autores cômicos profissionais aqui.

Quem faz essas faces é o público, os internautas. Advindos de diferentes

formações e origens, o autor aqui não aparece de modo tão conciso, com uma

assinatura. Na verdade, é praticamente inútil tentar descobrir a autoria de diversas

desses memes. Elas são de todos, e ao mesmo tempo de ninguém.

Isso, por si só enriquece ainda mais as possibilidades, já que sem qualquer

tipo de direito autoral atrelado, em diversas ocasiões se pode ver essas Rage Faces

sendo reutilizadas em outras formas e formatos, como vídeos, motivacionais5,

entre outros, expondo claramente o

Princípio de imanência da mensagem ao seu receptor, que pode ser aplicado a todas as

modalidades do digital [...] Na cibercultura, qualquer imagem é potencialmente matéria-

prima de uma outra imagem [...] a obra não está mais distante, e sim ao alcance da mão.

Participamos dela, a transformamos, somos em parte seus autores. (Lévy,1999, 153)

5 Motivacionais são quadros de imagem única cujo propósito é motivar as pessoas, sendo

normalmente usadas na cultura corporativa. Ver figuras 25 e 26

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Porém, essa possibilidade de interagir e criar a tira ou meme a seu bel

prazer não trouxe, pelo menos até o momento, nenhuma grande inovação estética

no formato das Rage Comics em si. Desde o início, era visível a continuidade de

uma estrutura narrativa bem conhecida e tradicional dos leitores dos quadrinhos:

as tiras. Mesmo assim, por estarem inseridas em um ambiente novo - o

ciberespaço - e se utilizarem de memes para sua construção, pode-se dizer que as

Rage Comics são uma nova espécie dentro do Hipergênero dos quadrinhos,

conceito esse utilizado por Paulo Ramos em seu livro “A leitura dos quadrinhos”

(2010,20), que seria um rótulo “que se daria as coordenadas para a formatação

textual de vários gêneros que compartilham diversos elementos”.

2.2. As Rage Comics no Reino dos Quadrinhos

Quadrinhos são uma narrativa gráfico-visual, impulsionada por sucessivos cortes (...) O

lugar significante do corte (..) será sempre o lugar de um corte espaço-temporal, a ser

preenchido pelo imaginário do leitor (Cirne apud D´Oliveira, 2004, 83)

Atualmente, há um grande interesse, principalmente entre os jovens, a

respeito da chamada cultura dos memes. São milhares os sítios da internet que

sobrevivem da propagação de conteúdo “memético”, de natureza quase sempre

humorística, colaborativa e interativa.

Como já foi descrito anteriormente, existem inúmeros tipos de memes,

cada um com suas particularidades. Alguns podem ser meras expressões

linguísticas que caíram no gosto do público, sendo reutilizadas diversas vezes na

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cultura popular como, por exemplo, o popular bordão “Cala a boca Magda”6. Já

outros podem ser cenas que ficaram famosas no cinema e foram reciclados na TV

(ex: várias cenas do filme Matrix). No caso da cibercultura, os memes é que são

reutilizados em forma de uma narrativa Rage Comics.

Sendo assim, as chamadas Rage Faces, tais como a Rage Guy e tantas

outras, é que são considerados os memes. O que se faz com eles, dependendo do

caso, é que pode resultar ou não em uma tirinha, nesse caso uma Rage Comics.

Em resumo, nenhuma tira é um meme em si, mas elas possuem obrigatoriamente

memes em sua narrativa. As Rage Comics são, portanto, Webcomics (já que estão

inseridas na web), e mais especificamente, Webtiras meméticas, ou, em inglês,

Memetic webcomics. Para corroborar essa afirmação, Fenty et al afirmam que,

“When speaking of webcomics, we specifically mean comics that are made first

for the web, made by an independent creator, who may be working with other, but

who all have no originary print version and no corporate sponsorship.”

A razão de estas serem consideradas tiras é que, analisando várias Rage

Comics, podemos perceber que o formato-padrão dessas é baseado quase que

integralmente na forma das tirinhas clássicas, tais como as que existem nas

páginas de jornal, com não mais do que quatro ou cinco quadros, independente de

como eles são diagramados na tela, na vertical ou horizontal. A explicação desse

fenômeno pode decorrer do simples fato de que tanto os autores são pessoas sem

embasamento profissional para pensar em inovações estéticas quanto elas estão se

importando apenas em passar a mensagem, o conceito que elas precisam passar,

não necessitando de elucubrações no formato.

6 Esse bordão era utilizado pelo personagem de Caco Antibes (Miguel Falabella) durante a sitcom

Brasileira “Sai de baixo” (1996-2002) para humilhar sua esposa, Magda, vivida pela atriz Marisa

Orth

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Talvez por isso seja raro visualizar o conceito da Tela Infinita de Scott

McCloud de que os quadrinhos no ciberespaço poderiam “assumir praticamente

qualquer forma e tamanho” (McCloud apud Queluz, 2009, 5) sendo efetivamente

usado na construção de algumas tiras. “However, the space in webcomics is not

ideal as McCloud would have it, because the space is limited by computer

technology, including screen sizes, pixel depth, and download times on the

web”(Fenty et al. 2004, 4) Sendo assim, a tendência dos autores, isto é, pessoas

comuns, é fazê-las de modo tradicional, como podemos verificar na tira ao lado

(Figura 7).

“É importante observar que o humor advém de uma situação corriqueira”.

Paulo Ramos (2010, 24), em seu livro “A leitura dos Quadrinhos”, explicita que

essa é a característica divisora entre a charge e o cartum. A primeira se atualiza na

relação com algum fato histórico, real, enquanto a segunda é construída através de

fatos cotidianos, tal como acontece nas Rage Comics, e se utiliza de personagens

Figura 7

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ficcionais, sem qualquer intenção de crítica, o que a aproxima das tiras cômicas,

como cita Paulo Ramos (2010,16).

Charge e Tira cômica, por exemplo, são textos unidos pelo humor, mas diferentes no

tocante às características de produção. Para ficar apenas em uma distinção: A Charge

aborda temas do noticiário e trabalha em geral com figuras reais representadas de formas

caricatas, como os políticos; a tira mostra personagens fictícios, em situações igualmente

fictícias.

A tira anterior prova essa relação com o corriqueiro, ao usar uma atividade

aparentemente normal (brincar com a caneta) como estratégia para provocar a

sensação de humor (fantasiar que o clique de uma caneta a impulsionaria como

um foguete). No caso das Rage Comics essa ligação é tão forte que, muitas vezes,

essa Webtira Memética também pode ser usada como “um híbrido de piada e

quadrinhos” 7 (ibid)

Mais que isso, a Rage Comic confirma com isso seu status como quadrinho,

já que é construída através de diferentes cortes que são devidamente preenchidos

pela leitura, dando-lhe dinamismo e movimento, tal como afirma Moacy Cirne.

Já sobre o aspecto criativo, sabe-se que os nomes dados aos personagens

dessas tiras normalmente são anônimos, tais como o Fulano e o Sicrano, só que

relacionados a interjeições8. Portanto, eles não são exatamente ficcionais, mas sim

representações de que pode ser qualquer indivíduo, o que fortalece a conexão com

aquele que a lê. Ainda sobre essa conexão, é característica o uso da primeira

pessoa do singular nas narrativas, normalmente colocada junto ao artigo definido

francês “Le”, que substitui os artigos definidos, por exemplo, “The” e “O e A” na

7 Essa é uma tendência muito clara que vem se desenvolvendo nos últimos tempos. Ver figura 27

8 Para homens usa-se Derp, Herp e outras variações, e para mulheres Derpette ou Derpina. A

origem do nome está relacionada à interjeições em inglês como “Duh” ou “Dur”, que expressam

estupidez.

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língua inglesa e portuguesa9. Essa excentricidade, além de permitir aproximar

linguisticamente culturas diversas, também fortalece a oralidade. Sobre isso, Ong

(apud Braga, 2007,4), coloca que

A escrita e a leitura diferem da oralidade, em termos de ausência: o leitor está normalmente

ausente quando o escritor escreve, e o escritor está normalmente ausente quando o leitor lê,

ao passo que, na comunicação oral, falante e ouvinte estão presentes, um diante do outro

(Ong, 1998, p. 191).

No que tange à temática do cotidiano, o aspecto testemunhal das Rage

Comics, isto é, a exposição de alguma situação vivida pelo autor em determinado

momento de sua vida, é bastante presente10

. Essa veia narrativa teve seus altos e

baixos na história dos quadrinhos, sendo mais conhecida a fase dos Comix, os

quadrinhos marginais da década de 70, que tiveram em Robert Crumb seu

principal expoente. Neles, a paródia é um elemento agregador e central, assim

como é nas Rage Comics , frequentemente parodiando eles mesmos, os leitores e

quaisquer instituições que desaprovassem (Fenty et al, 2004,6)

A partir dos anos 80, a tendência para esse tipo de história se fortaleceu,

ainda que de modo mais sério. Nas primeiras webcomics, nos anos 90, os

“primeiros cartunistas online eram, em geral, autobiográficos e centrados na vida

universitária.” (Santos & Queluz, 2009, 6) Ainda segundo os autores

a origem dos webcomics vem da necessidade dos indivíduos de expressarem-se

graficamente e não apenas textualmente. Segundo o autor, os quadrinhos ou cartuns online

nasceram em uma discussão também online entre alguns técnicos da Carnegie Mellon

University entre 17 e 19 de setembro de 1982. Estes técnicos tentaram desenvolver uma

maneira de explicar, textualmente, senso de humor ou estado de espírito. Após algumas

considerações definiram os símbolos (atualmente chamados emoticons) “:)” para

representar alegria ou humor e “:(” para representar descontentamento. Para Campbell

(2006), os emoticons são cartuns feitos com os recursos existentes na época” ( Campbell

apud Santos & Queluz, 2009, 4).

9 Por exemplo, ao invés de começar uma tirinha colocando “A mãe cozinhando”, se inicia com “Le

mãe cozinhando”. 10

Existe um ícone utilizado especialmente para dizer se a história é real ou não, chamado “True

Story”. Ver figura 22

Page 25: Não estamos mais tão forever alone - Versão Final

25

Sendo assim, aparentemente está no sangue das webcomics ser o espelho

das emoções individuais. Inspirados ou não pelo movimento dos quadrinhos

subversivos de Crumb e outros quadrinistas, que usavam e abusavam de suas

próprias experiências de vida, normalmente entediantes e/ou autodepreciativas,

em suas histórias, percebe-se nas Rage Comics desses novos “autores” amadores

do século XXI essa característica11

·.

Além disso, não há qualquer tipo de censura editorial às Rage Comics,

assim como não havia para os quadrinhos undergrounds. Qualquer temática é

válida, desde que seja bem feita e engraçada. De fato, aparentemente, o único tipo

de edição que essas tiras meméticas sofrem é o processo de filtragem, e apenas em

sítios de maior visibilidade, como os grandes portais de conteúdo memético,

dando vida à afirmação de que “a principal diferença, e que até hoje permeia os

quadrinhos online, é a falta de um editor” (Santos & Queluz, 2009, 6).

Uma frase do estudioso Róman Gubern sobre essa fase dos quadrinhos se

alinha quase que perfeitamente com outras características dessas Rage Comics. De

acordo com ele, os artistas undergrounds dos anos 60 e 70.

Não almejavam o lucro nem a popularidade dos respectivos autores, mas o protesto de sinal

libertário com frequentes recursos à extravagância, à escatologia e ao erotismo desaforado,

expressos num grafismo agressivo e pouco tranquilizador, batizado como feísmo. (Gubern

apud Magalhães, 2009, 3)

De fato, ninguém que resolve fazer uma Rage Comics está procurando

fama e dinheiro, espera-se. “webcomics, in our limited sense, are very much like

Underground Comix because they are made and distribuited by a small group and

have no massive financial backing” (Fenty et al ,2004, 3) Ela é, no geral, apenas

11

Ver as figuras 28 e 29 para uma comparação entre um trabalho de Robert Crumb e uma Rage

Comic

Page 26: Não estamos mais tão forever alone - Versão Final

26

uma narrativa de alguma coisa que aconteceu com seu autor e/ou algo que ele

deseja expor e compartilhar com o mundo através dessas tiras.

No entanto, há de se questionar o processo de autoria nessa nova espécie

de quadrinhos, que difere bastante da geração underground. Apesar de elas

possuírem um autor, este na verdade não é importante, tanto que não é praxe

colocarem créditos pessoais nas Rage Comics. Ao contrário dos quadrinistas,

marginais ou não, da internet ou não, que assinam suas obras, quem faz essas

webtiras meméticas não é necessariamente um profissional do ramo dos

quadrinhos, mas sim um amador entusiasta. Não há neles o orgulho do autor,

apenas aparentemente a necessidade da expressão criativa. “O leitor de histórias

em quadrinhos digitais não é apenas mais um leitor. É um interventor” (Santos &

Queluz, 2009,8). Justamente por conta dessa desconfiguração na relação entre o

público e o autor que nessa monografia me utilizo do dualismo entre eles, citando-

os em algumas ocasiões como sendo uma entidade única, o público e/ou autor.

O grafismo nas Rage Comics é claramente tosco e simplificado, muito ao

contrário dos traços agressivos, mas ainda assim detalhados e técnicos de Robert

Crumb, Spain Rodriguez e outros da geração Zap Comix. Todavia, por trás dessa

aparência superficial e bruta, há um caleidoscópio rico de assuntos potenciais a

serem trabalhados, sendo os principais os assuntos universais12

, que não

conhecem fronteiras culturais, como o amor, o cotidiano, as relações, etc.

A estética do tosco nas Rage Comics por sua vez não é novidade no

ciberespaço. Diversas webcomics conhecidas trabalham com essa linha gráfica,

que preza mais o que se narra do que o que se mostra. “Cersibon”, uma webcomic

brasileira que beira ao nonsense, é um bom exemplo dessa tendência. Outro

12

Vale ressaltar que o uso da palavra “universal” reconhece a diversidade cultural, mas tenta

encontrar pontos em comum entre todas elas.

Page 27: Não estamos mais tão forever alone - Versão Final

27

exemplo se tem nas tirinhas norte-americanas do “Cyanide and Happiness”, cuja

temática absurda também angaria muitos fãs13

. No geral, o humor das Rage

Comics é também bem extravagante, aumentando pequenos acontecimentos

corriqueiros a tamanhos colossais.

Entre as características inovadoras dessas Rage Comics podemos citar

ainda a fuga à tendência da especificidade temática. “Many webcomics focus on

subculture areas, like hardcore video gaming, role-playing games, computer

programming and other forms of ‘geek cultures’ ” (Fenty et al, 2004, 3)14

. As

Rage Comics, porém, não funcionam nessa direção. Sua temática, como já foi

exposta, abarca geralmente temas universais.

Acreditamos que há sim elementos para afirmar que as Rage Comics são

uma nova espécie do hipergênero dos quadrinhos, descendente direta da união

entre webcomics e os memes. Porém, sua intrínseca ligação temática com o

cotidiano nos dá margem para observar para além das webtiras meméticas em si,

contextualizando o universo em que a nova modalidade existe e quem a

constrói/reconstrói e lê tudo dentro da nova geografia do ciberespaço.

As imagens da Pós-modernidade, desconstruídas, reinterpretadas, livres para a expansão

criadora apresentam outros domínios e outros conceitos de linguagem visual com a

sobreposição de formas interpretativas em que imperam territórios ainda inexplorados.

(Rahde, 2000, 6)

13

Ver exemplo dessas duas tirinhas nas Figuras 30 e 31 no anexo 14

Um exemplo brasileiro disso são as webcomics “Vida de Programador” e “Vida de Suporte”,

que tiram sarro dos problemas profissionais dos programadores e dos técnicos em T.I - Ver figuras

32 e 33.

Page 28: Não estamos mais tão forever alone - Versão Final

28

3 – Forever Alone na sociedade e na cibercultura

Figura 8

Page 29: Não estamos mais tão forever alone - Versão Final

29

O Forever alone, do alto de sua solidão intransponível, ajuda a desconstruir

um dos mitos que a globalização tecnológica e a massificação das redes sociais

consolidaram na sociedade contemporânea: o mito de que estar conectado à rede

significa também estar acompanhado. Onde quer que você esteja, deverá estar

invariavelmente conectado, para fazer parte da chamada “aldeia global”, termo

criado por McLuhan.

Não são incomuns, no nascimento e desenvolvimento de qualquer mídia, o

otimismo, os mitos hiperbólicos, a sensação de infinitos caminhos que toda nova

mídia parece trazer. A da “aldeia global” é uma dessas mais conhecidas. Manuel

Castells constrói uma recordação desses tempos utópicos.

Criada como um meio para a liberdade, nos primeiros anos de sua existência mundial a

internet pareceu prenunciar uma nova era. Os governos pouco podiam fazer para controlar

fluxos de comunicação capazes de burlar a geografia e, assim, as fronteiras políticas. A

liberdade de expressão podia se difundir através do planeta sem depender da mídia de

massa, uma vez que muitos podiam interagir com muitos de maneira irrestrita. [...] A

privacidade era protegida pelo anonimato da comunicação na internet e pela dificuldade de

investigar as origens e identificar o conteúdo de mensagens transmitidas com o uso de

protocolos da Internet. (Castells, 2003,139)

O que a Rage Comic da página anterior (Figura 8) explicita é uma

consequência estranha desse desenvolvimento. A personagem e/ou autora cria

uma Rage Comic na qual ela própria observa e ri de uma webtirinha memética em

que o Forever Alone é usado. Porém, logo depois, ela própria veste a máscara da

qual ria. “Porque é a mais pura verdade” ela afirma, se transformando na

caricatura solitária que ela tanto acha engraçada.

Não são poucas as Rage Comics que produzem uma sensação de

espelhamento entre os leitores, que, por conseguinte, usam as mesmas tirinhas

para demonstrar o seu espanto com a proximidade destas com suas vidas15

. Isso

15

Veja mais um exemplo semelhante na figura 34.

Page 30: Não estamos mais tão forever alone - Versão Final

30

pode expor diferentes questionamentos a respeito de como quem as faz observa o

mundo e a sociedade, além deles próprios.

Em seu livro “A Galáxia da internet” (Zahar, 2003), Manuel Castells

ressalta que, no que diz respeito à sociabilidade, estamos vivendo em uma era no

qual o individualismo impera e a amplitude do coletivo, da política, foi

comprimida ao mero pesar da consciência solitária. Inúmeros outros autores

reafirmam essa tendência, mas é Jock Young, no entanto, que parece resumir a

opinião de muitos. “No momento em que a comunidade entre em colapso, a

identidade é inventada” (Young apud Bauman, 2008, 192).

Em seu texto, “Identidade no mundo globalizante”, o sociólogo Zygmunt

Bauman observa que há algum tempo a questão da identidade têm se tornado

fulcral nos estudos sociológicos, “mais que isso, podemos dizer que a ´identidade’

agora se tornou um prisma através do qual outros aspectos tópicos da vida

contemporânea são localizados, agarrados e examinados” (2008, 178)

Para André Lázaro (1996,220), a explicação disso vem através das

palavras de Baudrillard, que afirmam que a concentração monopolista industrial,

ao extinguir as diferenças reais entre as pessoas, tornando-as todas homogêneas,

abriu a porta para o reino da diferenciação, onde a palavra de ordem

“personalidade” emergiu soberana.

Personalizar-se é uma ordem para escapar à massificação, que é uma fatalidade.

Personalizar-se é uma ascese. Sob certos aspectos, é mais rigoroso até que qualquer

ascese : o Corpo se torna “o mais belo objeto de consumo. [...] O corpo, a rigor, é o lugar

de um novo suplício: o de suportar uma identidade incontestada e incontestável que o

organiza e significa de fora, e lhe impõem uma disciplina rigorosa sob risco da

condenação e do castigo da recusa (ibid)

Utilizando essa constatação fica incompreensível como as Rage Faces,

com seu grafismo icônico, possa ter se desenvolvido. Entretanto, dentre uma das

Page 31: Não estamos mais tão forever alone - Versão Final

31

interpretações possíveis, podemos colocar a globalização como agente principal,

que de acordo com Giddens (apud Albuquerque & Oliveira, 2008,8) “implica um

movimento de distanciamento da ideia sociológica clássica da “sociedade” como

um sistema bem delimitado”.

Essa corrosão da coletividade em prol do individual traz consigo um novo

tipo de redes sociais, um novo tipo de relacionamento, que “poderíamos chamar

de relações terciárias, ou no que Wellman chama de 'comunidades personalizadas',

corporificadas em redes egocentradas” (Castells, 2003, 108), das quais a internet e

seu ciberespaço parecem ser o símbolo máximo.

Exemplos claros disso são os diferentes subgrupos culturais que coexistem

dentro da cibercultura, cada um em seu nicho e espaço delimitado, formando uma

grande galáxia caótica de sistemas razoavelmente independentes entre si. “O

ciberespaço propaga um movimento potente e cada vez mais vigoroso, não

converge sobre um conteúdo particular, mas sobre uma forma de comunicação

não midiática, interativa, comunitária, transversal, rizomática” (Levy, 1999, 134).

A socióloga Eva Illouz, por sua vez, ao inserir o discurso da identidade

nesse contexto, trabalha que a “internet permite um eu muito mais flexível, aberto

e múltiplo” (2011, 115), tal qual as diversas faces das Rage Comics, capazes de

mudar de um quadro para o outro, manipuladas pela intenção do autor.

O que pode levar, então, a essa sensação de solidão, mesmo tendo em vista

uma realidade aparentemente fértil para a socialização fácil e saudável? Um dos

conceitos mais interessantes que Castells usa e que parece funcionar nessa

realidade é o dos “laços fracos”. Segundo o autor, os laços fracos “raramente

constroem relações pessoais duradouras. As pessoas se ligam e se desligam da

internet, mudam de interesse, não revelam necessariamente sua identidade...”

Page 32: Não estamos mais tão forever alone - Versão Final

32

(Castells, 2003, 108). Para reiterar essa afirmação, podemos usar uma frase

exemplar encontrada no livro “Amor Líquido”, do sociólogo Zygmunt Bauman,

na qual ele, ao analisar os sítios de relacionamentos, depara-se com a por demais

honesta frase de um jovem a respeito da vantagem decisiva da relação amorosa

eletrônica. “Sempre se pode apertar a tecla de deletar.” (Bauman, 2004, 13)

Isso pode vir a construir uma noção de socialização que, ao mesmo tempo,

fascina por seus infinitos caminhos e, também, choca por sua fragilidade quando

exposta ao mundo real. Tal realidade, por si só, ao entrar em conflito com os

tumultuosos anos da juventude contemporânea, com todas as suas multifacetadas

características sociais, políticas e culturais, provoca uma ampla gama de

consequências, que se refletem nas Rage Comics.

3.1. Características do público/autor

Apesar de não existirem pesquisas empíricas relacionadas ao público que

faz e/ou consome Rage Comics, podemos deduzir as mais importantes dessas

características a partir das próprias webtiras. Nessa primeira verificação,

poderemos embasar melhor nossa análise do contexto geral tanto da sociedade

quanto do meio da cibercultura.

Primeiramente, após uma extensa análise nas Rage Comics catalogadas,

ficou muito clara a aparição de diversas figuras de autoridade, como mães, pais,

professores, chefes, etc16

. Isso é um aspecto importante para constatar que a

hipótese de que os principais autores e personagens dessas webtiras são, no geral,

jovens de ambos os sexos, já que essas presenças são muito constantes nos anos

16

Veja outro exemplo na figura 35

Page 33: Não estamos mais tão forever alone - Versão Final

33

de formação. Mais que isso, normalmente o caráter dessas personagens

autoritárias está intimamente ligado às questões de poder sobre a personagem

principal, que são a personificação dos autores e/ou do público que as faz e/ou lê.

As mães, por exemplo, tendem a ser retratadas como seres praticamente

onipotentes e oniscientes, invariavelmente injustos (Figura 9), ainda que

carinhosas e obtusas ciberneticamente. Os pais, por sua vez, tendem a ser

mostrados como seres ora brincalhões, que adoram pregar peças (ou trollar no

dicionário cibernético) nos filhos ou ora demasiadamente despreocupados com

eles, normalmente relegando as decisões para a matriarca. Contudo, se mostram

demasiadamente preocupados com as filhas, expondo talvez um resquício de um

conservadorismo imóvel frente a uma cultura cada vez mais sexualizada.

Tanto os chefes quanto os professores, seres externos à família tradicional,

mas presentes no cotidiano, também tendem a serem retratados como injustos e

imponentes, responsáveis por inúmeras das mais malditas chagas que podem

infligir a personagem em seu miserável cotidiano.

Em resumo, em todas essas personagens pode-se perceber o uso constante

de estereotipização, que nada mais são que simplificações a fim de “descrever os

indivíduos que fazem parte dele de forma rápida e econômica do plano cognitivo”

(Deschamps e Moliner apud Pieniz et al, 2012, 4)

“no caso da categorização social, o efeito de assimilação (acentuação das semelhanças

percebidas entre os objetos classificados numa mesma categoria) leva à estereotipia,

enquanto o efeito de contraste (acentuação das diferenças percebidas entre os objetos

classificados em categorias distintas) desemboca num fenômeno de discriminação em

relação aos membros de grupos de não pertença. (ibid)

Page 34: Não estamos mais tão forever alone - Versão Final

34

Figura 9

Outro dado interessante dessas webtiras é a diversidade de temáticas

apresentadas. Além das questões de relacionamentos, cotidiano, família etc.

percebe-se um constante uso de elementos comuns à cultura jovem de hoje, como

videogames, desenhos, animes e outros17

, o que fortalece ainda mais a hipótese da

juventude criadora. Já a questão de gênero será mais bem desenvolvida no

próximo capítulo, uma vez que esta está intimamente relacionada à questão dos

relacionamentos interpessoais amorosos.

Sendo assim, pode-se perceber que, no geral, o público que faz e/ou

consome essas webtiras são jovens que normalmente optam, frente ao poder do

17

Veja a Figura 36

Page 35: Não estamos mais tão forever alone - Versão Final

35

grupo a que pertencem, por uma atitude de manada, utilizando-se quase sempre

dos mesmos temas, situações e personagens.

A conservação desta concordância superficial é facilitada pelo fato de cada participante

ocultar seus próprios desejos por trás de afirmações que apoiam valores aos quais todos

os presentes se sentem obrigados a prestar falsa homenagem. (...) Os participantes, em

conjunto, contribuem para uma única definição geral da situação, que implica não tanto

num acordo real quanto às pretensões de qual pessoa, referentes a quais questões, serão

temporariamente acatadas, haverá também um acordo real quanto à conveniência de se

evitar um conflito aberto de definições da situação. Referir-me-ei a este nível de acordo

como um “consenso operacional” (Goffman apud Braga, 2007, 7).

3.2. O público jovem na sociedade atual

Compreender o que especificamente é “jovem” hoje se constitui em uma

tarefa hercúlea em todos os sentidos, já que ela engloba além de um número

enorme de pessoas um amplo espectro de realidades sociopolíticas e culturais.

Contudo, uma coisa é certa: em um mundo voltado essencialmente para o

consumo de bens, o conceito de jovem, e principalmente o de juventude, alcançou

um patamar quase messiânico de importância para o sistema capitalista, o nirvana

para o consumo em massa e os lucros. “Toda cultura vive por meio da invenção e

propagação de significados de vida, e cada ordem vive manipulando a ânsia pela

transcendência.” (Bauman, 2008, 8).

Nessa realidade, é imprescindível que tal grupo etário possua, portanto, a

capacidade financeira de usufruir os produtos que o sistema constrói com os

jovens em mente. Ao mercado de trabalho e às instituições de ensino cabe integrá-

los a essa realidade. Porém, nos tempos atuais, com as constantes mudanças

provocadas principalmente pelo avanço tecnológico, toda a filosofia do trabalho

alterou-se profundamente.

Na geração dos pais dos jovens de hoje, e mais ainda na de seus avós, o

contexto trabalhista possibilitava uma visão de longo prazo ao profissional que

Page 36: Não estamos mais tão forever alone - Versão Final

36

intencionava entrar nela. Por sua vez, hoje nos Estados Unidos, pesquisas afirmam

que um jovem “com um nível moderado de educação espera mudar de emprego

pelo menos onze vezes durante sua vida” (Bauman, 2008, 35).

Barbara Ehrenreich, no livro ‘Desemprego de Colarinho-Branco’, que trata

sobre sua malfadada tentativa de conseguir um emprego na América Corporativa,

complementa esse dado ao explicar que, no contexto atual, é imprescindível estar

sempre trabalhando.

Um vácuo de qualquer espécie e por qualquer motivo - cuidar dos filhos, de pais idosos,

recuperar-se de alguma doença ou até dar consultoria – é imperdoável. Se você não tiver

passado todos os momentos de sua vida ganhando dinheiro para outra pessoa, pode

desistir de conseguir emprego. (Ehrenreich, 2005,179)

Essa “flexibilidade” forçada que se inseriu no centro da filosofia

trabalhista, ao mesmo tempo em que traz inúmeras coisas extremamente positivas,

também provoca um novo tipo de insegurança, que muitas vezes não pode ser

combatida como era antigamente, como, por exemplo, com as organizações

sindicais.

A vida laboral está saturada de incerteza (...) A incerteza de hoje é uma poderosa força

individualizante. Ela divide ao invés de unir, e como não existe jeito de dizer quem

sobreviverá a essa divisão, a ideia de ‘interesses comuns’ fica ainda mais nebulosa e por

fim torna-se incompreensível. (Bauman, 2008, 36)

Nesse contexto, ironicamente podemos usar o mesmo conceito de “laços

fracos” proposto por Castells para a cibercultura, dessa vez integrado à sociedade

como um todo e ao trabalho em especial. Basta apenas alterar a frase: As pessoas

se ligam e se desligam - ou são desligadas - dos(as) trabalhos/pessoas, mudam de

interesse, não revelam necessariamente sua identidade. Resta apenas aos cidadãos

consumir, como explica Everardo Rocha. “o cotidiano na sociedade moderno-

contemporânea é revestido de produtos e serviços que se tem ou se quer, as razões

Page 37: Não estamos mais tão forever alone - Versão Final

37

das imperiosas necessidades que governam o desejo de bens são temas que

povoam as conversas e a imaginação.” (in Pereira et al org. 75,76)

Portanto, nesse quadro extremamente instável, não é nem um pouco

incomum encontrar desabafos como o que existe na Rage Comic a seguir:

Ao periciar essa webtira memética (Figura 10) percebemos três quadros.

No primeiro o autor/personagem expõe que a preparação para a vida adulta é

imensa, ilustrada por variações de uma Rage Face genérica chamada Derp, que,

como já dissemos, é o anônimo. A segunda mostra – com um erro de ortografia -

as expectativas dos jovens, que se imaginam sair de todo esse preparo muito bem,

tal qual o Fuck Yeah, que simboliza alguém que sempre se sai bem das situações,

por mais difíceis que sejam. Por fim, ao perceberem que os resultados são poucos

ou não corresponderam aos esforços, basta rir da desgraça própria. Nesse caso, o

Figura 10

Page 38: Não estamos mais tão forever alone - Versão Final

38

autor e/ou personagem se utiliza das faces LOL, que significa em inglês “Muitas

Risadas” e o Fuck this Shit, que pode ser traduzido de modo politicamente correto

como “cansei disso tudo”. Por fim, ele estampa a tira com a face True Story, que

significa que a narrativa é, pelo menos a princípio, verídica18

.

Os jovens, por estarem completamente imersos nessa realidade, expõem

esses mesmos sintomas externos, tanto os benéficos quanto os maléficos, e é

justamente por estarem dentro desse sistema, que é impessoal e bastante dinâmico,

chamado por Bauman de modernidade líquida, que esses jovens são, exceto uma

minoria, levados pela correnteza tal qual um barco sem âncora, incertos de seu

destino.

Cada vez mais os jovens universitários percebem o seu contexto econômico e social, o

mercado de trabalho e a própria vida profissional como estando dominados por forças que

lhes escapam. Nesse cenário, o delineamento de uma trajetória profissional, de uma

carreira, é vivenciado pelos jovens como algo extremamente complexo e difícil, uma vez

que sentem não conseguirem exercer qualquer influência ou controle sobre as rotas

pretendidas. (Dib, 2007,13)

Em sua tese de doutorado “Juventude e projeto profissional: a construção

subjetiva do trabalho”, a professora Sandra Korman Dib apresenta que a

juventude de hoje sofre da síndrome do “não saber”. A autora deixa claro que tal

sintoma, comum a praticamente todos que passaram pela juventude, está, porém,

hoje, mais complexo e disseminado. (2007,20)

Entretanto, talvez uma das grandes diferenças desse novo sistema é que os

jovens mais abastados, com mais acesso à educação, foram e estão sendo

igualmente atingidos, em uma irônica democracia da falta de esperança. “A luta

para não ser excluído do processo de integração social vai atingir todos os jovens,

18 De acordo com dados da OIT (Organização Internacional do Trabalho) de 2007, os jovens

representam 44% dos desempregados do mundo. No Brasil a taxa também chega perto da

metade, e 52% dos jovens que trabalham o fazem sem carteira assinada (Dib & Castro,2010,4)

Page 39: Não estamos mais tão forever alone - Versão Final

39

independentemente da condição socioeconômica em que se encontrem (Waiselfisz

apud Dib & Castro, 2010,5)”.

Sabendo dessa realidade, fica compreensível que as Rage Comics

postulem, entre várias possibilidades narrativas, a exposição aberta de intimidades

e feridas tipicamente voltadas aos problemas juvenis, em uma forma que ao

mesmo tempo invade e protege a privacidade de quem a faz e lê, já que são

mascaradas pelas Rage Faces. E graças ao caráter icônico delas, suas narrativas

gráficas tem a possibilidade de ser compartilhada, e entendida, por mais pessoas

ao redor do mundo, como uma linguagem gráfica universal.

No contexto da cibercultura, que é dinâmico, participativo e interativo as

Rage Comics, portanto, são um ótimo veículo para a expressão sadia dos

descontentamentos atuais, em especial dos jovens, indo como resposta ao que

Bauman, em seu livro, “A sociedade Individualizada”, expõe.

Medos, ansiedades e tristezas são feitos de tal modo que devem ser sofridos sozinhos.

Eles não se somam, não se acumulam em uma ‘causa comum’, não tem um ‘endereço

natural’. Isso priva a postura solidária de seu status passado de tática racional e sugere

uma estratégia de vida bem diferente daquela que levou ao estabelecimento das

organizações militantes da classe trabalhadora (Bauman, 2008, 36-37).

Na conclusão de seu livro “Desemprego de Colarinho Branco”, Barbara

Ehrenreich coloca que “as pessoas têm uma necessidade natural – suponho até

física – de procurar outras pessoas em estado de sofrimento parecido.”

(Ehrenreich, 2005,230) Nesse sentido, as Rage Comics podem representar uma

estranha forma de solidariedade grupal e anônima, existente apenas na

cibercultura e que se limita quase que exclusivamente a ela, e em cujo universo

sobrevivem tanto narrativas testemunhais de diferentes teores quanto as mais

superficiais baboseiras. Muito frequentemente estas também estão fundidas,

dificultando a distinção entre a realidade e a ficção.

Page 40: Não estamos mais tão forever alone - Versão Final

40

Entretanto, nesse quadro há uma pincelada de esperança, que é justamente

essa ação coletiva, mesmo que seja pra tirar sarro de si mesmos. Ao “perderem

seu tempo” construindo uma narrativa em Rage Comics, em especial se ela for

autobiográfica, para a leitura dos outros, eles estão praticando uma ação que para

Richard Sennet (2009,30) é uma condição humana especial: o engajamento,

mesmo que construído através de sua inocente função de crítica ou seus traços

feios e toscos.

Talvez seja por isso que, ao olharmos para as estranhas faces das Rage

Faces, muitas vezes elas “nos parecem à primeira vista as faces dum delírio.”

(Sitwell apud Oliveira & Almeida, 2006, 80). O mesmo autor complementa sua

argumentação, ao colocar que as caricaturas - julgando que as Rage Faces sejam

caricaturas genéricas - podem, em um horror gradativo, ser encontradas “todos os

dias nas ruas e nos jornais” (ibid). Nesse caso, então,

A caricatura reflete os momentos contemporâneos com uma exatidão, um instinto heroico

e com uma consciência instintiva da vida futura que, ao seu lado, qualquer das belas-artes

se amesquinha, e a literatura se confessa envergonhada de seus artifícios retóricos (Lago

apud Oliveira & Almeida, 2006, 81)

Page 41: Não estamos mais tão forever alone - Versão Final

41

3.3 – A Cultura dos Memes dentro da Cibercultura

Figura 11

Page 42: Não estamos mais tão forever alone - Versão Final

42

A tirinha da página anterior é excepcional em seu resumo da vida cotidiana

moderna, em especial a dos jovens. Ao menos aparentemente, inúmeras atividades

que antes eram feitas por outros dispositivos hoje giram ao redor do computador,

em uma convergência de informações e de ações nunca antes vista na história das

mídias e da cultura. No computador tanto vemos quanto fazemos, ao mesmo

tempo em que temos acesso a tudo que os outros criam.

Porém, é necessário pontuar que essa convergência não é apenas a união de

múltiplas funções dentro de um aparelho, o que de fato acontece no computador e

nos celulares. Ela representa também uma “transformação cultural, à medida que

consumidores são incentivados a procurar novas informações e fazer conexões em

meio a conteúdos midiáticos dispersos” (Jenkins, 2008, 27-28).

Isso leva a um aspecto muito interessante a respeito dos memes no geral.

Eles, tal qual o sistema Operacional Linux, são um tipo de artesanato público.

Assim como o Kernel, o núcleo do software do Linux, está livre e acessível a

qualquer um que o queira usar e adaptar, o núcleo das Rage Comics, as Rage

Faces, está disponível de graça para todos, no modelo que Eric Raymond chama

de bazar, “do qual qualquer um pode participar da Internet, produzindo códigos.”

(apud Sennet, 2010,35)

A diferença aqui é que o propósito aqui não é minimizar os erros, os bugs

que ocorrem no sistema, mas sim aumentar a diversão, produzindo novos códigos

ou readaptando códigos já feitos para outros usos.

O 9gag, um site portuário de conteúdos meméticos bastante famoso entre

os internautas mais jovens funciona mais ou menos dessa maneira. Mal um

assunto entra na Hot Page – onde aparecem as obras mais votadas pelos

internautas – e rapidamente ela é readaptada e retrabalhada, dando margem para

Page 43: Não estamos mais tão forever alone - Versão Final

43

que um tema assuma proporções bíblicas, e, como um tornado, desapareça como

que do nada. “O código está constantemente evoluindo, não é um objeto acabado

nem fixo. Existe (...) uma relação quase instantânea entre a solução de um

problema a detecção de problemas” (Sennet, 2010,36).

Um exemplo recente dessa convergência midiática é o Meme brasileiro Luísa

está no Canadá, que rapidamente invadiu outras mídias. Após o vídeo em si

“bombar” na internet e a referida frase começar a cair no gosto popular, outras

mídias menos interativas, como a televisão e o rádio, se interessaram pelo assunto,

criando assim novas conexões com um produto de origem diferente, aumentando

a própria validade deste, que no ciberespaço não seria extensa.

Para os jovens, essa convergência tanto utilitária quanto cultural é mais bem

recebida e reproduzida, e por isso, como mercado consumidor em potencial, o

mercado precisou e está precisando se adaptar justamente a esse público. Contudo,

falar de Cibercultura não é falar de um universo jovem em si, apesar destes serem

importante fonte de público e conteúdo. Afinal de contas, como afirma Manuel

Castells, o mundo da internet é tão multifacetado quanto o mundo real (1999 48).

“A produção social é estruturada culturalmente. A internet não é exceção. A

cultura dos produtores da Internet moldou o meio.” (Castells, 2003,34) Com isso,

o autor nos faz crer que os engenheiros da internet primordial moldaram tanto o

espaço quanto a sua cultura inicial.

Castells, ainda nesse mesmo texto, coloca que a cultura da internet é feita em

uma estrutura de quatro camadas, “a cultura tecnomeritocrática, a cultura hacker,

a cultura comunitária virtual e a empresarial” (ibid). Contudo, apesar de ser

compreensível que exista na cibercultura uma mescla entre todas essas camadas, a

cultura memética que estamos analisando aqui tem por princípio a comunidade

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44

virtual, “já que ela acrescenta uma dimensão social ao compartilhamento

tecnológico, fazendo da internet um meio de interação social seletiva e de

integração simbólica” (Castells, 1999, 34-35).

Voltando ao conceito original de memes, “elemento não-físico que se utiliza

do cérebro como artefato de replicação”, podemos entendê-lo dentro da

cibercultura como uma expressão livre, horizontal, sem controle central, que se

forma de modo autônomo. Isto é, é construída pelos próprios usuários a partir dos

próprios interesses destes. (Castells, 1999,49) Vale lembrar que a cultura

memética, pelo menos na teoria, por si só já existia há tempos na internet, e até

mesmo fora dela, mas foi apenas nos últimos anos, com o potencial organizador

do ciberespaço que redes comunitárias surgiram conglomerando esse tipo de

conteúdo.

Assim, embora extremamente diversa em seu conteúdo, a fonte comunitária da internet a

caracteriza de fato como um meio tecnológico para a comunicação horizontal e uma nova

forma de livre expressão. Assenta também as bases para a formação autônoma de redes como

um instrumento de organização, ação coletiva e construção de significado (ibid)

Nesse contexto, “o estudo dos memes é frequentemente relacionado com o

estudo dos sistemas complexos, e percebido por muitos como uma ordem

emergente nesses sistemas” (Recuero, 2006,2).

Entretanto, é possível vislumbrar os memes, nesse caso específico as Rage

Faces e as Rage Comics, como tendo genes provenientes dos weblogs, em

especial a interação social, como coloca Recuero.

A maior parte das páginas voltadas à produção de obras meméticas, dentre

elas as Rage Faces e Comics, é composta por weblogs, normalmente

individualizados, feitos para a “expressão e construção de si. Eles são espaços

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45

onde alguém fala a alguém, onde há informação que é colocada em comum a uma

coletividade de leitores.” (Recuero, 2006,5).

Há, portanto, inúmeros blogs de pequeno porte competindo entre si, tal quais

os memes, em busca daquilo que mais importa no ciberespaço: leitores. “Os

blogueiros utilizam-se dos blogs não apenas para construir sua rede social, mas

igualmente, para gerar reputação e status dentro dela. O blog é, portanto, um

instrumento de captação social para os blogueiros.” (ibid)

Os produtos dessa luta, as Rage Comics, são, porém, mais que apenas um

instrumento de fidelização. São também um tipo de compartilhamento; uma

narrativa autobiográfica ou ficcional, que busca a empatia do leitor através de sua

temática cotidiana e baseada em memes. Com sua obra devidamente não assinada,

o autor não quer apenas massificar sua obra para os outros, ele quer a

correspondência emocional de seus pares. O compartilhamento é o grande prêmio

para o artista anônimo das Rage Comics. É o pagamento de honra, em forma de

“curtir”.

Quando uma das participantes traz ao LV (livro de visitas de um blog) um assunto

pessoalmente importante naquele momento, as demais frequentadoras imediatamente acolhem

aquele conteúdo emitindo opiniões sensatas, de apoio, que se reiteram, estabelecendo esse

consenso. Tal acordo tácito parece pretender mais acatar a pessoa que expôs seu problema do

que obter uma concordância real sobre a situação em si. (Braga, 2007,8)

Sítios como o 9gag, o Quickmeme, Reddit, apesar de terem grande acesso e

poder de propagação, são a minoria no quesito produção. Normalmente as obras lá

contidas foram achadas primeiramente em inúmeros blogs pessoais, postadas no

sítio e jogadas para a degustação pública, que a julga apta ou não para ser

compartilhada com mais leitores.

Dentro dessa nova mediação cultural por vezes os memes até mesmo podem

influenciar a produção tradicional de quadrinhos, como aconteceu recentemente

Page 46: Não estamos mais tão forever alone - Versão Final

46

com o anúncio do falecimento do cantor russo Eduard Khill, o Trololo Guy19

. Ele

ficou famoso após um vídeo de uma canção sua se tornar memético. Por conta

dessa fama, que ressurgiu quase que exclusivamente por conta do sucesso do

vídeo, a notícia de sua morte ultrapassou até mesmo os limites da cibercultura,

sendo pautadas nas principais mídias, e também nas tiras tradicionais,

exemplificadas aqui no trabalho do conhecido cartunista argentino Liniers.

Figura 12

Considerando todas essas características vigentes, fica claro, portanto, que a

cultura memética, potencializada pela própria cibercultura e suas características,

pode sim construir significados tão diversos quanto interessantes para a análise

comunicacional.

19

Um dos motivos da música ter feito sucesso, pelo menos na internet, é que a canção, por ter sido

censurada pelo governo soviético, ficou sem nenhuma letra, apenas com o cantarolar, de onde

surgiu o nome.

Page 47: Não estamos mais tão forever alone - Versão Final

47

4 – Leitura de Imagens

Sendo esse um estudo sobre um assunto que apenas recentemente vem

tomando forma e se introduzindo na cultura acadêmica, a metodologia escolhida

para o estudo do tema foi a análise de fontes e documentos, nesse caso as Rage

Comics.

Todas as tiras foram observadas nos sítios pré-determinados20

durante um

período de tempo de aproximadamente dois meses, porém sem nenhuma intenção

temática por trás21

. A pesquisa se deu através tanto da busca por tags22

relacionados ao assunto quanto por uma busca pura e simples através dos arquivos

destes.

Depois de retiradas dos sítios e devidamente catalogadas de acordo com

suas características, colheu-se aproximadamente 154 tiras, que, por fim, foram

analisadas. As características que embasaram a análise foram, primeiramente, o

tema, isto é, qual a temática da Rage Comic e quais os temas que mais aparecem.

Em segundo lugar, analisou-se o formato. Como ela se estruturava

esteticamente e se era feita no formato clássico ou buscava inovar na

apresentação.

20

Ver bibliografia 21

Por exemplo, analisar a representação das Rage Comics no período antes, durante e depois dos

dias nos namorados. 22

Etiqueta virtual que serve para catalogar qualquer obra virtual de acordo com a intenção de

quem a posta. Por exemplo, em uma tira sobre amor, as tags poderiam ser “amor”, “namoro”,

etc.

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48

Após isso o enredo e os personagens entraram em cena. Qual era a história?

Como ela se desenvolvia? Quais os personagens que se envolviam mais em cada

tema e enredo? Qual aparecia mais e qual aparecia menos? Quais os seus gêneros?

Por fim, já que as Rage Comics são feitas por Rage Faces que não foram

criadas por quem fez a tira, é válido observar quais foram as faces escolhidas para

as obras

Ao se desenvolver uma reflexão acerca da representação de um tipo de obra

visual estamos necessariamente falando de algo que pode se refratar em inúmeros

diferentes resultados. Por exemplo, no caso das Rage Faces, por exemplo, o uso

de uma face em revelia de outra “cria um exagero, uma deformação que impede a

visão do real, ou expõe e tematiza o tema?” (França in Pereira, et al ,2004,18)

Na cibercultura, com todo o seu dinamismo, esse cuidado parte do

pesquisador precisa ser redobrado. Contudo, por conta de algumas das

características das Rage Comics que citamos anteriormente, em especial os fatos

da simplificação icônica e de que não há uma autoria reconhecível dessas obras e

nem a identificação dos personagens e/ou autores, fica mais claro e mensurável

como a representação funciona. “A identidade social refere-se a um sentimento de

semelhança com (alguns) outros, enquanto a identidade pessoal se refere a um

sentimento de diferença em relação a esses mesmos outros” (Deschamps &

Moliner apud Pieniz, et al, 2012, 4)

De fato, analisando as Rage Comic pode-se perceber um distanciamento

claro de qualquer realismo gráfico, o que vai de encontro com o que McCloud

afirma sobre os símbolos, e que “à medida que o século XXI se aproxima, a

iconografia visual pode nos ajudar a perceber uma forma de comunicação

universal. Ícones exigem nossa participação para funcionar” (McCloud, 2005,58).

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E, valendo-se do que foi analisado até agora, é difícil achar objetos mais icônicos

e participativos do que os memes na cultura popular.

Com isso, essa tendência explica as narrativas com temáticas universais

normalmente existentes nas webtiras meméticas, o que é fortalecido pelo fato de

que a “identificação do espectador é uma especialidade do cartum, e por isto este

tem penetrado com facilidade na cultura popular do mundo”. (McCloud, 2005,42)

Nesse contexto, a representações de como os relacionamentos interpessoais

amorosos são colocados nas Rage Comics emergem como interessante tema de

pesquisa. Sendo o Amor um interesse universal, fica claro como as Rage Comics

podem facilmente representar aquilo que seu público/autor acha dele.

Figura 13

Na figura acima há uma clara representação de um relacionamento

interpessoal amoroso heterossexual (em nenhuma das tiras foi observado um casal

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50

homossexual), composto em cinco quadros e com apenas dois personagens, um

masculino e outro feminino. Sem qualquer tipo de suporte visual adicional fora os

personagens, a narrativa gira em torno da promessa de um relacionamento sexual

entre eles por parte da mulher ao homem, personificado aqui pela face Me Gusta.

Mais tarde, porém, ela volta atrás e cobra alguma ação para fazer aquilo que ela já

havia prometido fazer. O homem, contrariado, tenta discutir, mas rapidamente é

“finalizado” com o ultimato frio de sua mulher, que nesse último quadro é

simbolizado pelo personagem de Darth Vader, da saga cinematográfica “Guerra

nas Estrelas”. Aparentemente, o intuito do autor/autora é representar a mulher

como um ser intransigente e autoritário, contra a qual o homem não possui poder

para lutar contra. Essa tendência é clara em boa parte das Rage Comics que foram

catalogadas para a pesquisa dessa dissertação.

Em um total de 154 tiras colhidas – que abarcam qualquer tipo de

relacionamento interpessoal, seja de amizade, familiar, profissional ou de amor -

quase metade delas, 71, tinham como temática o namoro e os diferentes conflitos

que dele advém. Por sua vez em nenhuma dessas os personagens saiam do

esquema “casal heterossexual”.

Com essa percepção da influência do tema amor nas Rage Comics, podemos

contextualizar o que escreve Everardo Rocha em seu texto “Comunicação, troca e

classificação” (in Pereira org. 2004,75), apenas emendando-o ao universo do

virtual.

Não é por acaso que, em muitas situações cotidianas – festas familiares, encontros de

trabalho, reuniões com amigos -, podemos observar a recorrência de certos tópicos que

motivam nossas conversas. [...] Sempre se tem algo a dizer sobre o trabalho e os outros

estão prontos para escutar e comentar, ampliando o assunto, complementando ou

discordando da ideia.

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51

O amor, e o que dele decorre, aparece assim como um tópico recorrente nas

Rage Comics, vitrificando as palavras de André Lázaro, que disse que ele “torna-

se o tema central da felicidade moderna e, por isso, é presença obrigatória nas

produções da indústria da cultura” (Lázaro, 1996, 216).

Bauman, por sua vez, ao alinhavar sua visão sobre o individualismo nas

sociedades contemporâneas, constrói mais um plano a essa análise. Para ele

tem se falado muito da reflexividade da vida contemporânea; na verdade, todos nós

tendemos a ser contadores de histórias compulsivos e encontramos poucos ou nenhum

tópico mais interessantes que nós mesmos para nossas histórias – nossas, emoções,

sensações e mais íntimas experiências. (Bauman, 2008, 17)

É interessante ressaltar também que, dentro desse amplo grupo, apenas duas

Rage Comics possuem claramente uma personagem central feminina. Isto é, que

comandam, ou narram as ações que existem na narrativa. Todas as outras têm um

homem como personagem-chave, aquele que toma as decisões ou que sofre as

ações e consequências, nesse caso quase sempre perpetradas pelas suas cônjuges.

Isso fortalece ainda mais a hipótese de que a maioria dos autores dessas Rage

Comics são jovens do sexo masculino.

Ainda sobre o amor, é Marcuse (apud Lázaro, 1996, 214) que cita que esse é

“o refúgio onde resistem todos os ideais de transcendência, felicidade, e

solidariedade que a ‘destruição produtiva’ liquida”. Contudo, na dinâmica desse

novo século, esse mesmo refúgio se viu sitiado pela intensidade sufocante e

criativa do capitalismo, transformando-o também em um produto vendável.

Desse jeito, não é de se estranhar que nas Rage Faces e nas Rage Comics o

amor e os relacionamentos amorosos sejam representados de uma forma

eminentemente humorística. Através dessas pequenas obras icônicas e

autorreferenciais, o indivíduo do século XXI se vende para seus semelhantes, só

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52

que não com suas qualidades, como era de se esperar, mas com seus defeitos e

idiossincrasias. Contudo, o próprio ato criador em si já está impregnado em si da

necessidade pela transcendência, e o compartilhamento desses providencia tantos

outros iguais a ele a se solidarizarem mutuamente do conforto de suas cadeiras.

Nesse sentido, para as Rage Comics pelo menos, “o amor é o maior conflito e a

maior solução” (ibid), já que tanto incita quanto resolve as narrativas.

Dentro desse espectro, é notável tanto o tom altamente confessional de

algumas quanto às imaginativas – e sempre de teor humorístico – elucubrações

narrativas que normalmente envolvem alguma resposta masculina extremamente

irônica ou apelativa (Figura 14) e, pelo menos no tema de relacionamentos

interpessoais amorosos, normalmente bastante sexualizadas.

Figura 14

Não é de se esperar que o autor/autora dessa Rage Comic realmente tenha

feito o que é narrado nessa tira. Ainda que a premissa da cena seja extremamente

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53

provável de acontecer em qualquer relacionamento interpessoal amoroso, o seu

desfecho tende bruscamente a um tipo de humor não condizente com a etiqueta

social. Ou, em resumo, algo que nenhuma pessoa faria com seu parceiro(a) caso

não quisesse ter problemas de relacionamento. Não por acaso, quando o

personagem masculino responde ao desejo de sua parceira, ele é personificado não

por uma Rage Face genérica, utilizada no primeiro quadro, mas sim a TrollFace,

que é utilizada para simbolizar que o personagem está tomando uma atitude que

visa deixar o outro com raiva. Na cultura cibernética, o termo troll vem da

expressão trolling for suckers, que pode se traduzido como “lançando a isca para

os trouxas”. Nesse sentido, portanto, essa é uma Rage Comic que representa algo

que as pessoas – e como foi demonstrado, quase sempre homens – gostariam de

dizer, mas não podem. Outras faces também têm intenções parecidas, tais como a

Awww Yeahh, a Fuck this Shit, além de outras.

É Bergson um dos principais autores a discutir o papel do riso, do cômico na

sociedade. Analisando-se as Rage Comics, fica claro a constante aparição e o uso

do humor como arma. Contextualizando isso com a necessidade de

autorreferência nas narrativas provocado pelo individualismo com a realidade

sociopolítico e econômica cada vez mais incerta, pode-se dizer que as Rage

Comics são uma expressão veemente desse quadro. A diferença é que, ao invés

das lutas políticas, o debate ideológico e outros tipos de contestação social são

aqui substituídos pelo humor, que também tem o seu valor.

A teoria (social do riso) de Bergson parte da premissa de que existe um contraste entre a

actividade natural e a actividade mecânica. Esta premissa é explorada numa análise de

orientação sociológica que explica o humor como correctivo social. Bergson estava

persuadido de que a rigidez de carácter poderia provocar profundas inadaptações sociais.

Nos casos em que, pela sua gravidade, essa rigidez ameaçasse a sobrevivência, a sociedade,

temendo o automatismo dos hábitos contraídos, tenderia a reprimi-los. O riso surgiria,

assim, como um "gesto social" corrector visando o aperfeiçoamento social. (Mouta, 1996,

17)

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54

Esse equilíbrio trazido pelo humor é mais uma vez fortalecido pelas faces

icônicas e pouco realistas das Rage Faces. Nesse sentido, elas podem ser qualquer

um ou até mesmo a personificação de quem a lê. Sem passado e nenhuma

bagagem para “atrapalhar” a contextualização do personagem, não há com que se

preocupar além de curtir a narrativa.

Como já foi anteriormente citado, a introdução de novos tipos de Rage

Faces permitiu a busca de uma maior complexidade expressiva, como por

exemplo a expressão de impotência, crítica ou dúvida perante ou fatos que

acontecem em qualquer relacionamento, ou incredulidades perante ações

incompreensíveis da parceira.

Figura 15

Em quatro quadros, a narrativa (Figura 15) expõe humoristicamente uma

situação completamente plausível, que pode ter acontecido com o autor da tira.

Apesar de não podermos confirmar a veracidade disso, o uso do pronome pessoal

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em primeira pessoa (Le me, ou Le Eu, em português) ao invés da terceira fortalece

essa suposição. O homem, incrédulo com a injustiça que a sua parceira cometeu, é

personificado em uma Rage Face que promove justamente essa sensação.

Desde o início da análise das imagens pudemos perceber como o olhar

masculino está aparentemente impregnado nas Rage Comics cuja temática é o

namoro. Até nas tiras cujo autor e/ou personagem é aparente feminina isso se

demonstra de modo claro.

Figura 16

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Na narrativa acima (Figura 16), composta em sete quadros, a personagem

feminina está se sentindo solitária (forever alone), se perguntando o porquê de

ninguém amá-la. Nisso, um personagem masculino convenientemente chega e lhe

chama para sair. Ironicamente, a personagem feminina rechaça veementemente

(fuck this shit) a aproximação daquilo que poderia ser a resposta de suas

lamentações, dizendo “Você não é bom o bastante para mim”. Agora manchada

de sangue, ela volta ao problema inicial, na mesma miséria na qual começou.

Apesar de não ser possível saber quem fez a essa Rage Comic, é viável

pensar que se trata de mais uma tira feita pelo gênero masculino. Primeiramente,

não há como a história ser verídica, já que nenhuma menina recorreria a armas de

fogo para rechaçar uma simples paquera. Sendo assim, a narrativa parte de uma

observação.

No caso do Forever Alone em especial, a Rage Face normalmente é

utilizada para atribuir a sensação de extrema solidão que de vez quando se abate

em qualquer ser indivíduo, fazendo-o pensar que irá para sempre ficar sem

companhia. Contudo, no caso dessa tira, ao ser sucedido pela face Fuck this Shit,

que é usado para simbolizar o desdenho, isso demonstra uma observação crítica.

Levando em conta que aparentemente os principais autores dessas tiras são

homens, como já foi explicado, fica possível afirmar que essa Rage Comics,

apesar da personagem ser feminina, foi feita por um homem para criticar a atitude

hipócrita de algumas mulheres perante a solidão.

Muito se discute como a internet alterou os paradigmas do amor e do

romance na sociedade contemporânea. Sites de relacionamento, por exemplo, ao

decupar o ser humano não ao seu todo, mas à pequenas partes mensuráveis como

“personalidade”, “hobbies”, entre outros - que ironicamente são vistos como o

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“eu verdadeiro” – providenciam, de acordo com a socióloga Eva Illouz, um

romance diferenciado, já que ele “anula o corpo, e por isso, supostamente, faculta

uma expressão mais plena do eu autêntico”(Illouz, 2011, 108)

Entretanto, aparentemente uma das consequências é a mercantilização do

romance e do amor como um todo, bem visível na frase “Você não é bom o

bastante para mim”, como se o outro fosse uma mercadoria indesejada, mesmo

atendendo aos desejos aparentes da personagem.

Por outro lado, se há um espírito na rede, ele é o da abundância e da permutabilidade. É que

o namoro pela internet introduziu no campo dos encontros românticos os princípios do

consumo de massa, baseados numa economia de abundância, escolha infinita, eficiência,

racionalização, orientação para alvos seletivos e padronização. (Illouz, 2011, 130)

Com isso, emerge-se uma realidade utilitarista do amor, baseada no cálculo

preciso das consequências a longo e em curto prazo que, como um mero contrato

de prestação de serviços, podem ser estendido ou não. Na contramão disso,

porém, as Rage Comics apresentam-se como a representação crítica dessa

realidade, inspiradas quase sempre nas experiências pessoais dos autores e

autoras.

Não por acaso, o termo Friendzone23

, que nada mais é que a relação

platônica na qual um dos integrantes (normalmente o masculino) deseja entrar

uma relação romântica enquanto o outro não, é um dos assuntos mais explorados

nas Rage Comics. No mundo onde aparentemente o amor é a mercadoria mais

desejada, como lidar com a frustração de não tê-lo? E, ironicamente, quando tê-lo,

como aguentar os conflitos que dele decorrem?

Assim, ao invés de postar em seus blogs pessoais páginas e páginas de

textos sobre seus problemas com o amor, os autores e autoras parecem preferir o

23

Também chamado no Brasil de “zona da amizade”.

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formato Rage Comics, que aumenta o seu poder de alcance na mesma medida em

que diminui um pouco a sensação de estarem forever alone.

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5– Conclusão

A temática universal dos sentimentos humanos combinada ao surgimento de

ícones meméticos chamados de Rage Faces ajudou, no dinâmico e interativo

ambiente do ciberespaço, a criar uma extensa biblioteca de narrativas

confessionais, sejam elas críticas, satíricas ou meramente humorísticas, que se

convencionou em chamar de Rage Comics, um tipo novo e bem específico de

webcomics. Uma webtira memética, ou em inglês, memetic webcomics.

Desenvolvidos através de um artesanato público construído através da net,

os memes, e as Rage Faces, estão essencialmente livres para serem adaptados por

qualquer internauta em qualquer lugar, com conhecimento profissional ou não,

sempre com a finalidade do compartilhamento, dando vida ao enunciado que diz

que “O leitor de histórias em quadrinhos digitais não é apenas mais um leitor. É

um interventor” (Santos & Queluz, 2009,8)

Feita por qualquer um que tiver interesse, mas especialmente por jovens não

profissionalizados do sexo masculino, as Rage Comics firmaram-se assim como

um interessante objeto de estudo das representações sociais que o público que a

faz e lê constitui da própria sociedade, além de espelhar suas próprias

particularidades, mesmo sem intenção declarada.

Em seu livro “Por que vocês são pobres?”, William T. Volmann, ao tentar

fazer com que os indivíduos de menor poder aquisitivo conceituassem sua própria

pobreza, chegou a seguinte conclusão (2010, xiv). “As pessoas que, apesar de

pobres, não estão em perigo iminente de morrer têm mais chance de recuperar o

fôlego e conceitualizar a própria pobreza”. Nesse sentido, a pulsão criativa dos

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autores das Rage Comics, emergida naturalmente de um contexto social e

trabalhista tirânico em sua incerteza, infinito em suas possibilidades e democrático

em sua desesperança, não deixa de ser uma conceitualização de seu próprio

tempo.

Porém, nas Rage Comics os autores escolhem nunca entrar em confronto

direto com o que lhes incomoda, apenas tangenciando-o sutilmente, utilizando de

um artifício bem conhecido aos quadrinhos.

Na maior parte das Rage Comics analisadas percebe-se claramente a

importância do humor em seu desenvolvimento, seja com finalidade crítica,

satírica ou apenas criativa. Nelas, cada Rage Face pode se adaptar a diferentes

narrativas que podem ser produzidas, não possuindo significado fixo e claro,

estando sempre em constante mutação, entrando diretamente em confronto com a

ideia de que a simplicidade dos quadrinhos e do cartum significa falta de

conteúdo.

O ideal platônico do cartum parece omitir a ambiguidade e caracterização complexa que

são marcas registradas da literatura moderna, tornando-o adequado só para crianças. Contudo,

elementos simples podem-se combinar de maneiras complexas, como átomos se tornam moléculas,

e moléculas, vida. E assim como o átomo, uma grande força está contida nestas linhas simples,

liberável só pela mente do leitor. O cartum é muito mais do que aparenta ser. (McCloud, 2005,45)

Já no que tange à representação pessoal, por sua vez, nas narrativas Rage

Comics seus autores e/ou personagens não tem a vergonha de se mostrar como

realmente são em diferentes momentos de suas vidas, sejam miseráveis, egoístas,

mesquinhos, solitários, idiotas, sagazes, etc. Nesse contexto, as representações

desempenham um papel básico no sentimento de identidade, já que é a partir delas

que os indivíduos aprendem sua diferença e sua semelhança em relação ao outro.”

(Deschamps & Moliner apud Pieniz, et al, 2012,10) E mais, eles não veem

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problema em tirar sarro de si mesmos. Ao que parece, nas Rage Comics rir é

sempre o melhor remédio.

Essa particularidade intrigante entra em confronto direto com o sistema

que a cerca, já que na atual dinâmica entre a sociedade e a tecnologia, com a

convergência midiática e também informacional, o somatório ideológico resultou

em um processo de mercantilização do corpo e do próprio conceito de amor.

Nessa realidade, então, como qualquer produto, deve-se projetar sempre a

aparência da perfeição, com a finalidade de venda.

“Thoureau disse, certa vez, que a maioria de nós leva vidas de desespero

silencioso.” (Vollmann, 2010, xiv) Contudo, nas Rage Comics, parece haver um

grito sintagmático entre a realidade e a criatividade, que busca ultrapassá-la em

busca do sorriso sincero. “O riso é eminentemente comunicacional.” (Acselrad,

2003,8).

Mais que isso, as Rage Comics parecem invocar em suas narrativas um

consenso grupal e anônimo sobre os problemas que os afligem, normalmente

relacionados a problemas de relacionamento – em especial com o sexo oposto - e

com a autoridade. É também um engajamento que ao menos aparentemente existe

apenas na cibercultura, e que sobrevive apenas nos seus meandros,

caracterizando-se como um furor silencioso, revolucionário e individual contra os

opressores, mas que em sua essência é inocente e juvenil.

A questão, porém, é que o jogo da vida que todos jogamos, com nossas auto-reflexões e

histórias sendo suas partes mais importantes, é conduzido de tal forma que as regras do

jogo, o conteúdo do maço de cartas e a forma como as cartas são embaralhadas e

distribuídas raras vezes sofrem um exame; e ainda com menos frequência se tornam matéria

de reflexão, muito menos de discussão séria.(Bauman, 2008, 17-18)

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6 - Bibliografia

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Imagens

Figura 1 - Sem Título. (fonte: trollando.com)

Figura 2- Sem Título. (fonte: googleinsight)

Figura 3- Sem Título. (fonte: naosalvo.com)

Figura 4- Sem Título. (fonte: knowyourMeme.com)

Figura 5- Sem Título. (fonte reuters.com)

Figura 6- Sem Título. (fonte (knowyourMeme.com)

Figura 7- Sem Título. (fonte 9gag.com)

Figura 8- Sem Título. (fonte: 9gag)

Figura 9- Sem Título. (fonte: naoligo.com)

Figura 10- Sem Título. (fonte 9gag.com)

Figura 11 - Sem Título. (fonte: ahnegao.com.br)

Figura 12 - Sem Título. (fonte: http://macanudoliniers.blogspot.com.br/)

Figura 13 - Sem Título. (fonte: leninja.com.br)

Figura 14 - Sem Título. (fonte: leninja.com.br)

Figura 15 - Sem Título. (fonte: 9gag.com)

Figura 16 - Sem Título. (fonte: Ahnegao.com)

Figura 17- Sem Título. (fonte: knowyourmeme.com)

Figura 18 - Sem Título. (fonte: knowyourmeme.com)

Figura 19 - Sem Título. (fonte:knowyourMeme.com)

Figura 20 - Sem Título. (fonte: knowyourMeme.com)

Figura 21- Sem Título. (fonte: knowyourMeme.com)

Figura 22 - Sem Título. (fonte: knowyourMeme.com)

Figura 23- Sem Título. (fonte: tenso.com.br)

Figura 24 - Sem Título. (fonte: knowyourMeme.com)

Figura 25 - Sem Título. (fonte: motivationaltwist.com)

Figura 26- Sem Título. (fonte: 9gag.com)

Figura 27- Sem Título. (fonte: naoligo.com.br)

Figura 28- Sem Título. (fonte: oesquema.com.br)

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Figura 29 - Sem Título. (fonte: 9gag.com)

Figura 30 - Sem Título. (fonte: cersibon.blogspot.com.br)

Figura 31 - Sem Título. (fonte: cyanidetraduzidos.com.br)

Figura 32 - Sem Título. (fonte: vidadeprogramador.com.br)

Figura 33 - Sem Título. (fonte: vidadesuporte.com.br)

Figura 34 - Sem Título. (fonte: ahnegao.com.br)

Figura 35- Sem Título. (fonte: leninja.com.br)

Figura 36- Sem Título. (fonte: leninja.com.br)

Figura 37 - Sem Título. (fonte: vacilol.com.br)

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Anexos

Figura 18 - Yao Ming Face ou Fuck this Shit.

Figura 17 - Me Gusta

Figura 19- Poker Face

Figura 20 - Forever Alone

Figura 21 – Trollface

Figura 22 - True Story

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Figura 23– Uma webcomic baseada no personagem de

Marcelo Anthony na novela Passione, da Globo

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Figura 24 – A Primeira Rage Comic catalogada em que aparece

o Rage Guy.

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Figura 25 e 26 – Exemplos de um “motivacional” e de seu meme, o “Desmotivacional”,

que ironiza as mensagens motivacionais

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Figura 27 – As adaptação gráfica de piadas no formato Rage Comics fortalece o

humor.

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Figura 28 e 29– A tendência ao uso do tédio e a autodepreciação como elemento temático é claro tanto nos

quadrinhos undergrounds quanto nas Rage Comics

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Figura 30 e 31– Duas webcomics bem conhecidas por

internautas brasileiros. “Cersibon” e “Cyanide and

Happiness”

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Figura 32 e 33– As webcomics “Vida de Suporte” e “Vida de programador”

são bons exemplo da especificidade temática que muitas das tiras de internet possuem.

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Figura 34 – Essa Rage Comic é mais um exemplo de como as pessoas se

relacionam com as tiras.

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Figura 35 – Aqui a professora é retratada como um indivíduo injusto, já que ela dá

preferência a uns ao invés do personagem e/ou autor.

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Figura 37 – Produtos culturais de mídias voltadas tradicionalmente ao público juvenil,

como os videogames, são fartamente usados nas Rage Comics

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Figura 38 – Única Rage Comic da pesquisa cuja personagem principal é claramente uma

mulher.