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NANCELY HUMINHICK VIEIRA
A Fotografia Cultural e a religação das culturas:
um estudo sob o prisma do pensamento complexo.
UNINOVE
São Paulo – 2012
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NANCELY HUMINHICK VIEIRA
A Fotografia Cultural e a religação das culturas:
um estudo sob o prisma do pensamento complexo.
Tese apresentada ao Programa de Pós-
Graduação em Educação da
Universidade Nove de Julho –
UNINOVE, sob orientação da Profª Dra.
Izabel Petraglia, como exigência parcial
para a obtenção do título de Doutor em
Educação.
UNINOVE
São Paulo – 2012
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Vieira, Nancely Huminhick
A fotografia cultural e a religação das culturas:
um estudo sob o prisma do pensamento complexo.
/ Nancely Huminhick Vieira. 2012
166 f.
Tese (Doutorado) – Universidade Nove de
Julho - UNINOVE, São Paulo, 2012.
Orientador (a): Profa. Dra. Izabel Petraglia.
1. Fotografia cultural. 2. Complexidade. 3.
Imprinting cultural.
I. Petraglia, Izabel. II. Titulo.
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A Fotografia Cultural e a religação das culturas:
um estudo sob o prisma do pensamento complexo.
BANCA EXAMINADORA:
Profª. Drª. Izabel Petraglia – UNINOVE Orientadora
______________________________________ Prof. Dr. José J. Queiroz – UNINOVE
Profª. Drª. Elaine T. Dal Mas Dias - UNINOVE
Profª. Drª. Francisca Eleodora Santos Severino UNIABC
Profª. Drª. Maria Cristina Correia Leandro Pereira - USP
Prof. Dr. José Eustáquio Romão Diretor do PPGE – UNINOVE
UNINOVE
São Paulo – 2012
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Foto: Kelly West Mars
―Mas é inevitável que de cada procedimento técnico, exercido com amor e rigor, se desprenda
uma poesia específica. Mais ainda no caso da fotografia, cujo vocabulário já participa da magia
poética – a gelatina, a imagem latente, o pancromático – e cujas operações se assimilam
naturalmente às da criação poética – a sensibilização pela luz, o banho revelador, o mistério da
claridade implícita no opaco, da sombra representada pelo translúcido – ó Mallarmé!‖
Carlos Drummond de Andrade
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AGRADECIMENTOS
Em primeiro lugar agradeço a Deus e a essa força que existe dentro de
nós, que não nos deixa esmaecer nos momentos difíceis;
À Universidade Nove de Julho, UNINOVE, pela concessão de bolsa de
incentivo à pesquisa, para a realização de curso de Doutorado em Educação;
À Profa Drª Izabel Petraglia, que me orientou novamente em mais uma
etapa acadêmica, com preciosa orientação, carinho e amizade;
Ao Prof. Dr. Boris Kossoy e ao Prof. Dr. José J. Queiroz, por suas
importantes contribuições na banca de qualificação;
Aos professores da banca de defesa, por terem aceitado o convite e
partilharem comigo desta etapa tão importante;
Às amigas, Cida Atum, Cida Flores, Eliana Aparecida, Marcia Humeniuk,
Nathalia Vieira e Deise Duarte;
À minha família que sempre apostou em meus projetos;
A todos aqueles que direta ou indiretamente me permitiram realizar este
trabalho.
Muito obrigada!
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RESUMO
O objetivo desta tese é compreender como a Fotografia Cultural se
coloca diante do sujeito, que é complexo, e como se adapta às culturas tão
diversas daquelas impostas pelo imprinting. Pretende oferecer argumentos
para mostrar que este sujeito, se manifesta por meio da fotografia de maneira
subjetiva. O embasamento teórico tem como enfoque a teoria da
complexidade, em Edgar Morin e diferentes espectros da fotografia são
norteados, principalmente por Boris Kossoy. Se por um lado o pensamento
complexo contribui para a religação de culturas e o entendimento do homo
complexus, por outro, os diversos questionamentos da fotografia trazem à tona
as diferentes maneiras de repensá-la, com vistas à possibilidade de se fazer
emergir um novo conceito de fotografia - a Fotografia Cultural - e que esteja
inserido no contexto social, econômico e político das sociedades
contemporâneas. No breve percurso da história da fotografia, alguns ícones
imagéticos são destacados em sua relação com a complexidade, como
também a linguagem fotográfica, o âmago do sujeito-fotógrafo, em que emerge
o imprinting cultural - a bagagem - o filtro cultural do fotógrafo na escolha e
composição de suas criações fotográficas. Na sequência são apresentados e
analisados diferentes gêneros fotográficos, como: Fotojornalismo,
Fotodocumentarismo e Fotografia Antropológica. O objetivo é apontar
semelhanças e diferenças entre os gêneros, de modo a estabelecer fontes e
relações com a Fotografia Cultural. Arte e Ciência são assuntos discutidos a
partir de definições de Cultura Humanística e Cultura Científica como suas
relações e interligações com a fotografia. Nesta pesquisa, com as descobertas
realizadas, apresentamos o nosso conceito de Fotografia Cultural e é por meio
das imagens e das análises que fazemos delas que exemplificamos o nosso
objeto apostando numa linguagem não verbal.
Palavras-chaves: fotografia cultural; complexidade; imprinting cultural;
fotografia; cultura humanística; cultura científica.
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ABSTRACT
The aim of this thesis is to understand how the Cultural Photography
stands before the subject, which is complex, and how it adapts to different
cultures as those imposed by imprinting. Intends to offer arguments to show
that this subject is expressed by means of photography in a subjective way. The
theoretical framework focuses on the complexity theory, Edgar Morin and
different spectra of the photography are guided mainly by Boris Kossoy. On in
one hand the complex thinking contributes to the rewiring of cultures and
understanding of homo complexus, on the other, the various questions of
photography bring out different ways to rethink it, in order to be able to bring out
a new concept of photography – the Cultural Photography which is inserted in
the social context, economic and political of contemporary societies. In the brief
course of history of photography, some pictorial icons are highlighted in relation
to the complexity, as well as the photographic language, the core of the subject-
photographer in emerging cultural imprinting – the baggage – the cultural filter
of the photographer in choosing and composition of his photography creations.
Following are presented and analyzed different photographic genres, such as:
Photography Journalism, Photography Documentaries and Photography
Anthropological. The goal is to point out similarities and differences between
genres, in order to establish relations with sources and Cultural Photography.
Art and Science are subjects to discuss from definitions of humanistic and
scientific culture and its relationship and linkages with photography. In this
research, carried out by the findings, we present our concept of Cultural
Photography and is through the images and analyses we made on them that
exemplify our object betting on a non-verbal language.
Keywords: cultural photography; complexity; cultural imprinting;
photography; humanistic culture; scientific culture.
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SUMÁRIO
Introdução 01
1 A COMPLEXIDADE NA IMAGEM 12
1.1 Arte e Estética 12
1.2 Fotografia 22
1.3 Cultura 30
1.3.1 Conhecimento e Cultura 35
1.3.2 Imprinting Cultural 37
2 GÊNEROS FOTOGRÁFICOS 41
2.1 Fotojornalismo 41
2.2 Fotodocumentarismo 48
2.3 Fotografia antropológica 58
2.3.1 Fotografia etnográfica 71
3 ENTRE A ARTE E A CIÊNCIA 82
3.1 As Duas Culturas 82
3.2 Fotografia e as Duas Culturas 85
4 INTROSPECÇÃO: OLHARES E DESCOBERTAS 90
4.1 Fotografia Cultural 90
4.2 Série de Clicks Culturais e Análise das Imagens 109
Considerações Finais 138
Bibliografia 146
Webgrafia 151
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LISTA DE FIGURAS
Figura 1 - Objetos de Arte – Grécia Antiga - p. 13 Fonte: http://filosofandoehistoriando.blogspot.com/2009/11/arte-na-grecia-antiga.html Figura 2 - Detalhe de Vaso grego - p. 13 Fonte: http://www.historianet.com.br/conteudo/default.aspx?codigo=210 Figura 3 – Exposição ―Alma Revelada‖ em São Paulo - Steve Mc Curry – p. 16 Fonte: http://traveling-inthelife.blogspot.com/2011/11/steve-mccurry-exposicao-alma-revelada.html 05/01/2012 Figura 4 - Roda de Bicicleta - ready-made – Duchamp, 1913 - p. 19 Fonte: http://salomao.tijolo.zip.net/arch2008-07-01_2008-07-31.html Figura 5 – Fonte - ready-made – Duchamp, 1917 - p. 19 Fonte: http://www.suapesquisa.com/biografias/marcel_duchamp.htm Figura 6 - Natureza morta, primeira Daguerreotipia - 1839 - p. 23 Fonte: http://www.cotianet.com.br/photo/hist/daguerre.htm Figura 7 - L. J. M. Daguerre - Jean-Baptiste Sabatier Blot, 1844 - p. 24 Fonte: http://www.artdeciel.com/pioneers.aspx Figura 8- Joseph Nicephore Niépce - p. 24 Fonte: http://www.cotianet.com.br/photo/hist/niepce.htm Figura 9 - Vista da janela em Le Gras - Joseph Niépce – Fotografia,1826 - p. 25 Fonte:http://www.eca.usp.br/prof/mylene/grad/Projetos/sites98/taniamm/Historia%20da%20fotografia/hist%C3%B3ria_da_fotografia%2002.htm Figura 10 - Estojo de um Daguerreótipo - p. 25 Fonte: http://shmaraarte.blogspot.com/ Figura 11 - Hogg fotografando no estúdio de Richard Beard: de autor desconhecido –
Daguerreótipo, 1843 – p. 26
Fonte:http://www.girafamania.com.br/montagem/fotografia2.html
Figura 12 - W. H. Fox Talbot em daguerreotipo, 1844 - p. 26 Fonte: http://www.cotianet.com.br/photo/hist/fox.htm Figura 13 - Estúdio de Talbot em Reading, 1844 - p. 27 Fonte: http://www.cotianet.com.br/photo/hist/fox.htm Figura 14 - Hércules Florence, 1875 - p. 27 Fonte: http://www.girafamania.com.br/montagem/fotografia-brasil-hercules-florence.htm Figura 15 – Técnica de revelação e fixação com nitrato de prata no papel. Ela retrata uma cópia de um diploma – p. 28 Fonte: http://galleries.fototagger.com/link.php?action=detailimage&id=401&sort=6
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Figura 16 - Steve McCurry, September 11, New York, NY, USA - p. 39 Fonte: http://www.culture-se.com/noticias/902 Figura 17 - Fotógrafos em ação no campo I - Foto: Renato Negrão - p. 45 Fonte: arquivo pessoal Figura 18 - Fotógrafos em ação no campo II - Foto: Renato Negrão - p. 45 Fonte: arquivo pessoal Figura 19 - Edições do jornal ilustradas com fotografias preto e branco - p. 47 Fonte: http://www.pelckmans.be/magazines/riis.htm Figura 20 - China through the Lens of John Thomson - Foto: John Tomson - p. 50 Fonte: http://deltabridges.com/event/dongguan-events/china-through-lens-john-thomson-1868-1872-dongguan Figura 21 - The Bayon Temple, Angkor Thom, 1866 - Foto: John Tomson - p. 50 Fonte:http://www.bl.uk/onlinegallery/features/photographicproject/enlarged/johnthomsonlge.html Figura 22 - Sadie Pfeifer, a Cotton Mill Spinner – Lancaster, Carolina do Sul, EUA, 1908 - Foto: Lewis Hine - p. 52 Fonte:http://www.moma.org/collection/browse_results.php?criteria=O%3AAD%3AE%3A2657&page_number=4&template_id=1&sort_order=1 Figura 23 - NYC Empire State - Foto: Lewis Hine - p. 52 Fonte: http://cafehistoria.ning.com/photo/lewis-hine-nyc-empire-state Figura 24 - Five Cents Lodging, Bayard Street c., 1889 - Foto: Jacob Riis - p. 54 Fonte: http://www.pelckmans.be/magazines/riis.htm Figura 25 - Plank for a Bed, 1890 - Foto: Jacob Riis – p. 54 Fonte: http://artenorteamericana-flul.blogspot.com/2010/04/jacob-riis-florbela-espanca-peoma-pior.html Figura 26 - Bud Fields and His Family - Hale County, Alabama, Summer, 1936 - Foto: Walker Evans – Farm Security Administration - p. 56 Fonte: http://www.bbc.co.uk/radio3/nightwaves/gallery/walkerevans.shtml?select=03 Figura 27 - Migrant Mother - Nipomo, California, 1936 - Foto: Dorothea Lange – Farm Security Administration - p. 57 Fonte: http://www.bbc.co.uk/radio3/nightwaves/gallery/walkerevans.shtml?select=03
Figura 28 - Caduveo menina - Foto: Guido Boggiani - p. 65 Fonte: http://hoary.org/snaps/czech/gb.html Figura 29 - The milanese - Foto: Guido Boggiani - p. 66 Fonte:http://atraspirareilpomeriggidisole.blogspot.com/2009/07/milanese-guido-boggiani-1861-1901-of.html Figura 30 – Yanomami, 1974 - Foto: Claudia Andujar - p. 68 Fonte:http://www.itaucultural.org.br/aplicexternas/enciclopedia_ic/index.cfm?fuseaction=artistas_biografia&cd_verbete=875&cd_idioma=28555&cd_item=1
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Figura 31 – Yanomani, 1981 - Foto: Claudia Andujar - p. 68 Fonte: http://www.colecaopirellimasp.art.br/autores/1/obra/393 Figura 32 - Claudia Andujar com índia Yanomami, década de 70 - Fotografia: Carlo Zacquini - p. 69 Fonte: Acervo pessoal de Claudia Andujar - Discursos fotográficos, Fonte: Londrina, v.6, n.9, p.249-273, jul./dez. 2010 http://www.uel.br/revistas/uel/index.php/discursosfotograficos/article/view/8121/7036 Figura 33 - Criança Kayapó - Foto: Rosa Gauditano - p. 70 Fonte: http://www.nossatribo.org.br/index_2.asp?opc=compras Figura 34 - Índia Yanomami - Foto: Rosa Gauditano - p. 71 Fonte:http://guia.folha.com.br/exposicoes/ult10048u644199.shtml Figura 35 - Da-ño're: perfomance coletiva de canto e dança - Foto: Rosa Gauditano - p. 73 Fonte: http://img.socioambiental.org/v/publico/Xavante/xavante_11.jpg.html Figura 36 - Cerimonial de Casamento - Foto: Rosa Gauditano - p. 73 Fonte: http://img.socioambiental.org/v/publico/Xavante/xavante_13.jpg.html Figura 37 - Fotógrafo francês Pierre Verger - p. 76 Fonte: http://www.cultura.gov.br/site/2008/10/22/pierre-verger/ Figura 38 - Câmera Rolleiflex - Foto: Ricardo Milani - p. 76 Fonte: http://www.temmais.com/blog/ricardomilani/?param=1108 Figura 39 - Integrante da exposição ―A Paris de Verger‖ - Foto: Pierre Verger - p. 77 Fonte: http://fotoclubef508.wordpress.com/2009/09/09/exposicao-a-paris-de-pierre-verger/ Figura 40 - Campo de Marte, no centro de Paris - Foto: Pierre Verger - p. 78 Fonte: http://kantophotomatico.blogspot.com/2009/09/bahia-exposicao-resgata-imagens-do.html Figura 41 - Integrante da exposição ―A Bahia de Verger‖ - Foto: Pierre Verger - p. 79 Fonte: http://bethccruz.blogspot.com/2009/04/fotografias-de-pierre-verger.html Figura 42 - Orixás de Pierre Fatumbi - Uma iaô de Esu da Bahia - Foto: Pierre Verger - p. 79 Fonte: http://bethccruz.blogspot.com/2009/04/fotografias-de-pierre-verger.html Figura 43 – Garoto na Comunidade Nova Esperança, RN, Brasil, 2010 - Foto: Nan Huminhick - p. 92 Fonte: arquivo pessoal Figura 44 – Casal em moradia do assentamento em São Miguel do Gostoso, RN, Brasil, 2010 - Foto: Nan Huminhick - p. 93 Fonte: arquivo pessoal Figura 45 – Claudia Andujar com índia Yanomami, na década de 70 - Fotografia: Carlo Zacquini - p. 98 Fonte: Acervo pessoal de Claudia Andujar - Discursos fotográficos, Fonte: Londrina, v.6, n.9, p.249-273, jul./dez. 2010
xiii
http://www.uel.br/revistas/uel/index.php/discursosfotograficos/article/view/8121/7036 Figura 46 – Duchamp Nordestino - S. M. do Gostoso, RN, Brasil, 2009 - Foto: Nan Huminhick – p. 103
Fonte: arquivo pessoal Figura 47 – Café próximo a Torre Eifel, Paris, França, 2010 - Foto: Nan Huminhick – p. 104 Fonte: arquivo pessoal Figura 48 – Pont dês Arts, Paris, França, 2010 - Foto: Nan Huminhick – p. 106 Fonte: arquivo pessoal Figura 49 – Pont dês Arts, Paris, França, 2010 - Foto: Nan Huminhick – p. 106 Fonte: arquivo pessoal Figura 50 – Rue de Lappe x Rue de Charonne, Paris, França, 2010 - Foto: Nan Huminhick – p. 108 Fonte: arquivo pessoal Figura 51 – Scooter com Capa de chuva e frio, Paris, França, 2010 - Foto: Nan Huminhick– p. 108 Fonte: arquivo pessoal Figuras 52 a 65 - Inglaterra – Londres – Série Feiras e Mercados, 2010 - Foto: Nan Huminhick - p.111-113 Fonte: arquivo Pessoal Obs. Figuras 52, 58 e 61 – Fotos: Cida Atum Figuras 66 a 69 - Espanha – Barcelona – Série Artistas, 2010 - Foto: Nan Huminhick - p. 114 Fonte: arquivo Pessoal Figura 70 - Espanha – Sitges – Série Artistas, 2010 - Foto: Nan Huminhick - p. 115 Fonte: arquivo Pessoal Figuras 71 a 75 - França – Paris - Série Artistas, 2010 - Foto: Nan Huminhick – p. 115-116 Fonte: arquivo Pessoal Figuras 76 a 80 - Inglaterra – London - Série Artistas, 2010 - Foto: Nan Huminhick - p.117 Fonte: arquivo Pessoal Figura 81 – Cosplay 01 – p. 119 Fonte: http://rakbruword.blogspot.com.br/2012/04/moda-cosplay.html
Figura 82 – Cosplay 02 – p. 120 Fonte: http://mulherescarnivoras.wordpress.com/tag/cosplay/
Figura 83 – Cosplay 03 – p. 120 Fonte: http://www.resistencia-nerd.com/2011/03/cosplay-pokemon-o-pior-e-melhor-
da.html
Figura 84 – Sushiman brasileiro 01 – Foto: Carolina Iskandarian/ G1 - p. 120
xiv
Fonte:http://www.cozinhajaponesa.com.br/v04/culturajaponesanoticias_d.asp?s=3&c=
404
Figura 85 – Sushiman brasileiro 02 – p. 121 Fonte: http://www.revistaestilofashion.com.br/sushiman-elson-o-baiano-mais-japones-
de-sao-paulo/
Figura 86 – Cultura dos bolivianos no bairro do Pari 01 – p. 121 Fonte: http://adrianorangel.com.br/blog/?tag=bolivianos
Figura 87 – Cultura dos bolivianos no bairro do Pari 02– p. 121 Fonte: http://adrianorangel.com.br/blog/?tag=bolivianos
Figura 88 – Evento Revelando SP 01– Foto: Reinaldo Meneguim - p. 122 Fonte: http://www.feambra.org/detalhe_secao.php?codigo=349
Figura 89 – Evento Revelando SP 02 – Foto: Miguel Schincariol – p. 122 Fonte: http://www.flickr.com/photos/miguelschincariol/3947771518/
Figura 90 – Evento Revelando SP 03 - p. 122 Fonte: http://mais.uol.com.br/view/5qal5ayeacp0/revelando-sao-paulo--parque-da-
agua-branca-04023870E4993366?types=A&
Figura 91 – Vista da Casa do Caboclo – Pq. da Água Branca - p. 123 Fonte: http://www.papillon.blog.br/2010/09/tiraram-o-revelando-sp-da-agua-branca-
puta-falta-de-sacanagem-vou-xingar-muito-no-twitter/
Figura 92 - Vista interna da Casa do Cabolclo – Pq. da Água Branca - p. 123 Fonte:http://blogviagens.com/2010/06/parque-da-agua-branca-em-sao-paulo/ Figura 93 – Casa do Cabolclo – Pq. da Água Branca - p. 123 Fonte:http://blogviagens.com/2010/06/parque-da-agua-branca-em-sao-paulo/ Figura 94 – Festa das Estrelas – Liberdade – Foto: Carlos Pupo - p. 124 Fonte:http://www.flickr.com/photos/pupo13/5968617074/ Figura 95 – Festa das Estrelas 01 – Liberdade – p. 124 Fonte: http://www.discovernikkei.org/en/nikkeialbum/albums/114/slide/?page=4 Figura 96 – Festa das Estrelas 02 – Liberdade - p. 124 Fonte: http://fotos.estadao.com.br/fotoreporter-festival-das-estrelas-2011-no-bairro-da-
liberdade-em-sao-paulo24072011,galeria,,143280,,57,0.htm?pPosicaoFoto=20
Figura 97 – Fotografia da família Gonzales Huminhick - p. 127 Fonte: Arquivo Pessoal da família Figura 98 – Esboço da fotografia de 1918 com informações obtidas durante a pesquisa, 2010 - Desenho e Foto: Nan Huminhick – p. 128 Fonte: Arquivo Pessoal Figura 99 – Árvore Genealógica da família Huminhick e Vieira - p. 129 Fonte: Arquivo Pessoal da família Figura 100 – Série 01 - Fases da vida do casal - de 1956 a 2006 - p. 130-131 Fonte: Arquivo Pessoal da família
xv
Figura 101 – Séria 02 - Tradição - Família na Basílica de Nossa Senhora Aparecida – p.132 Fonte: Arquivo Pessoal da família Figura 102 – Série 03 – Tradição - Família no Estúdio – Tradição - p. 133 Fonte: Arquivo Pessoal da família Figura 103 – Série 04 - Trajetória de vida de Nancely Huminhick Vieira - p. 136-137 Fonte: Arquivo Pessoal da família
1
INTRODUÇÃO
“A vida, como as imagens, não pede
dinâmica familiar nem disposições genéticas. A vida se mostra como imagem antes mesmo
de haver uma história de vida”.
James Hillman
Durante meus primeiros anos de magistério nos ensinos fundamental e
médio, na área de artes, já me sentia inquieta, querendo ultrapassar os limites
tradicionais do ensino que, em 1995-96 não se enquadravam mais na nova
sociedade policultural e complexa. Os questionamentos que emergiam me
direcionavam a buscas dentro do universo acadêmico, encontrando muitas
respostas durante a minha caminhada na elaboração e construção da
dissertação de mestrado intitulada: A Estética do Olhar: O ensino da fotografia
sob o prisma do pensamento complexo.
No Mestrado em Educação da Universidade Nove de Julho - UNINOVE,
com área de Concentração em Teorias e Políticas em Educação, o meu projeto
foi acolhido na linha de pesquisa de Fundamentos Filosóficos e
Epistemológicos em Educação, depois, Educação e Complexidade, e, hoje,
Teorias em Educação, cujas disciplinas e atividades enriqueceram
consideravelmente minha bagagem na área da Educação. Alguns temas
estudados, norteados pela Filosofia e pela teoria da Complexidade passaram a
fazer parte de maneira intrínseca ao meu dia a dia, tanto pessoal como
profissional.
Também fiz parte do NIIC – Núcleo Interinstitucional de Investigação da
Complexidade e do Grupec – Grupo de Pesquisa em Educação e
2
Complexidade. Esta participação foi fundamental no desenrolar da minha
pesquisa, cujo referencial teórico já era embasado no pensamento complexo, a
partir de Edgar Morin, seu principal pensador.
Morin trata da complexidade e das incertezas do mundo contemporâneo,
esmiuçando temas respaldados por sua linha de pensamento, que me
trouxeram muitas respostas e novos questionamentos.
Durante toda sua vida, Morin foi animado e inspirado pela necessidade de romper com a idéia de um saber parcelado, acreditando na incompletude de todo e qualquer conhecimento Por isso, fala das incertezas da ciência e da importância em distinguirmos os diferentes aspectos do nosso pensamento, mas jamais isolando-os, separando-os entre si. Este é o cerne do pensamento complexo: distinguir, mas não separar (PETRAGLIA, 2008, p. 58-59).
Assim, o pensamento complexo contribuiu para elucidar a importância
das artes na construção do sujeito que é homo complexus, além de justificar
relações e interligações entre fotografia, complexidade e educação,
considerando as articulações do todo e das partes na concepção da imagem.
A pesquisa, tanto teórica como empírica, foi desenvolvida para testar a
hipótese de trabalho formulada em duas proposições: A primeira, que a
aplicação da fotografia enriquece de forma significativa o currículo do Ensino
Médio na disciplina de Educação Artística, podendo também estimular a
comunicação, a criatividade e o desenvolvimento do espírito crítico do aluno. A
segunda hipótese demonstrou que a complexidade pode se constituir como
ferramenta eficaz de religação para o ensino da Fotografia.
A minha dissertação de mestrado, que foi apresentada em três capítulos
a saber: O Ato Fotográfico: A Civilização da Imagem; Educação e Teoria da
Complexidade e Ensino da Fotografia e Complexidade, evidenciou a
inesgotável ligação entre teoria e prática e também propiciou o diálogo entre
3
complexidade e fotografia, sujeito e ato fotográfico, arte e método, o que, mais
uma vez, vem motivar meus questionamentos.
Desta vez, no Doutorado, retorno à pesquisa, com o propósito de
conhecer, estudar e desvelar um conceito e/ou uma vertente da fotografia cujo
teor ainda carece de definição: A Fotografia Cultural. Então, assumo-a, aqui,
como meu objeto de investigação, no sentido de esclarecer o seu significado e
as relações existentes entre arte e técnica.
O objetivo desta pesquisa é compreender como a Fotografia Cultural se
coloca diante do sujeito, que é complexo, e como se adapta às culturas tão
diversas daquelas impostas pelo imprinting. Pretende-se reunir argumentos e
subsídios para se conhecer o sujeito, que é operator, spectador e spectrum da
Fotografia Cultural, apresentando como ele se manifesta de maneira subjetiva.
Barthes define operator, spectador e spectrum inseridos em um contexto
cultural:
[...] O Operator é o Fotógrafo. O Spectator somos todos nós, que compulsamos, nos jornais, nos livros, nos álbuns, nos arquivos, nas coleções de fotos. E aquele ou aquela que é fotografado, é o alvo o referente, espécie de pequeno simulacro, se eídolon emitido pelo objeto, que de bom grado eu chamaria de Spectrum da fotografia, porque esta palavra mantém, através da sua raiz, uma relação com o ―espetáculo‖ [...] (BARTHES, 1984, p. 20).
Segundo o autor, seria um contrato cultural entre o criador e o
consumidor, à espera de interpretações diante do Spectator, baseado pelo que
foi proposto pelo Operator, no caso o fotógrafo.
O meu interesse pelo tema nasceu quando eu ministrava a disciplina
denominada Fotografia Cultural, no nível Superior de ensino, no curso de
Comunicação Digital da Universidade Paulista - UNIP. Apesar de a disciplina
abranger diversas modalidades da prática da fotografia, não existe material
4
teórico sobre o tema, ou seja, ela pode existir na prática, mas ainda não há
teórico que a tenha explicado, pelo menos, até o presente momento, ao que se
tenha conhecimento.
A ementa da disciplina abrange o conteúdo programático teórico e
prático apresentado a seguir, o qual deve ser cumprido pelo professor da
disciplina:
Conteúdo teórico:
1. A fotografia como expressão; O fotografo: um filtro cultural;
2. Características básicas do conteúdo fotográfico;
3. Fontes fotográficas e o objeto da investigação;
4. Iconologia e interpretação: a imagem como emoção;
5. Informação (fragmentária), interpretação e manipulação;
6. Imagem e conhecimento.
Conteúdo Prático: sugestões de atividades práticas:
1. A prática fotográfica de eventos culturais;
2. A releitura de momentos históricos da vida;
3. Compreensão da fotografia como um produto cultural;
4. Uso da fotografia como registro e fonte para pesquisas culturais;
5. Discussão da fotografia como uma linguagem não-verbal.
Esses conteúdos apresentados são os indícios a que recorri para
começar a pesquisa sobre o meu objeto. Fato de grande significação é que
este conteúdo está quase na íntegra em um dos livros de Boris Kossoy, que é
autor referência desta tese.
5
Sempre que ministro esta disciplina e sou questionada sobre a definição
do termo e indicações de leitura sobre Fotografia Cultural, preciso responder
que não existe, ainda, teoria sobre o assunto.
Como lidamos e tratamos o tempo todo com o termo teoria e nessa
pesquisa ele terá um papel significante, achei importante defini-lo: É um termo
originário do grego theoría, que é usado com vários significados, e segundo
Abbagnano (ABBAGNANO, 1970, p. 916 apud LORIERI e QUINTAL, 2010, p.
63), os gregos a entendiam como “especulação ou vida contemplativa‖, ou
seja, uma idéia que se faz a respeito de algo que se quer fazer e que se
opunha à prática. Prática, aqui entendida como toda ação do homem sobre a
natureza e sobre outros homens. Lorieri e Quintal consideram teoria como:
[...] a organização das representações que o homem constrói sobre objetos ou fenômenos, num sistema conceitual elaborado segundo critérios lógicos (estes, por sua vez, igualmente construídos pelo homem. Ou seja, teoria é um conjunto organizado de idéias ou de representações mentais sobre a realidade ou sobre partes dela ou ainda a fenômenos a ela pertencentes [...]. (LORIERI e QUINTAL, 2010, p. 63)
Pode-se considerar, então, que teoria é uma representação mental em
que se levantam hipóteses a respeito de algum objeto ou fenômeno, ou seja,
em que se faz uma interpretação deles. Os autores (LORIERI e QUINTAL,
2010, p. 64) também explicam: ―[...] Quando elaboramos explicações,
entendimentos, compreensão da realidade ou de aspectos da realidade, nós
produzimos teoria‖.
Segundo Lorieri e Quintal vários pensadores têm sua versão sobre o que
é teoria e que nos ajuda a definir seu significado. Entre eles podemos citar
Brandão: ―[...] teoria pode ser entendida como perceber algo do real desde uma
certa posição entre outras e a partir de uma concepção peculiar de ideias, no
6
interior de um certo lugar próprio da cultura das ciências‖, e Horkheimer, que
diz que ―[...] teoria é o saber acumulado de tal forma que permita ser este
utilizado na caracterização dos fatos tão minuciosamente quanto possível‖.
(LORIERI e QUINTAL, 2010, p. 65)
Os autores (2010, p. 65) nos apontam que existem diferenças e
coincidências entre os diversos pensadores, mas que todos nos mostram, de
alguma maneira, que ela é necessária e que é ―[...] o resultado da leitura que a
consciência humana faz da realidade [...]‖.
Neste artigo, os autores também apresentam as ideias de Morin sobre
teoria:
Teoria não são as soluções dos problemas, mas a possibilidade de tratá-los. A teoria é resultante da realidade humana concreta. [...] ele afirma que as teorias não são um mero saber especulativo sem finalidade prática, mas que nascem de um problema real necessitando de respostas reais. (LORIERI e QUINTAL, 2010, p. 68).
Morin não desvincula a teoria da prática. Desta mesma maneira,
trabalharemos aqui com teoria e prática, técnica e ciência habitando em um só
corpo, que é a fotografia.
Como a Fotografia Cultural perpassa por diferentes âmbitos, épocas,
sociedades, é oportuno analisar a ruptura entre técnica e ciência e uma
possível religação entre elas, como também o significado do imprinting cultural.
Imprinting é o termo que Konrad Lorenz propôs para falar da marca
indelével que as primeiras experiências deixam no animal recém-nascido.
Como o exemplo de filhotes que seguem como se fosse a sua mãe o primeiro
ser vivo que passa por eles.
7
Morin apresenta o imprinting cultural como uma marca inapagável
imposta pelas primeiras experiências do animal e dos seres humanos. Termo
este que será abordado e discutido mais adiante.
Coloca-se, então o problema desta tese: Como pode ser conceituada a
Fotografia Cultural? A Fotografia Cultural pode ser considerada um elemento
de religação entre as culturas científica e humanística?
Temos como hipótese que a Fotografia Cultural pode ser definida a partir
de diversos olhares e compreensões, não se fechando em um único conceito, e
que pode apresentar-se como elemento integrador das duas culturas.
O método baseou-se em pesquisas teórica e empírica, a partir do
levantamento e revisão bibliográfica sobre fotografia, cultura e complexidade; e
realização de material fotográfico que leve em conta as concepções
desveladas neste estudo acerca de Fotografia Cultural.
O quadro teórico desta pesquisa constitui-se da teoria da complexidade
em Edgar Morin e de diferentes espectros da fotografia, norteados
principalmente por Boris Kossoy. Se por um lado o pensamento complexo
estará contribuindo para a religação das culturas e pelo entendimento do homo
complexus, por outro, os diversos questionamentos sobre a fotografia trarão à
tona os diferentes modos de pensar e analisar meandros da fotografia, com
vistas à possibilidade de se fazer emergir um novo conceito de fotografia - a
Fotografia Cultural - e que esteja inserido no contexto social, econômico e
político das sociedades contemporâneas.
Vista a necessidade de conhecer temas convergentes ao nosso objeto,
realizei pesquisas em bibliotecas presenciais e virtuais. Apresentarei a seguir o
estado da arte, de modo a estabelecer relações com este trabalho.
8
A primeira pesquisa estudada foi “O corpo da rua: A fotografia de Pierre
Verger na construção da Bahia Iorubá”, sob orientação do Professor Dr.
Ulpiano T. B. de Meneses constituiu-se da dissertação de mestrado
apresentada por Josélia Aguiar, em 2008, no Programa de História Social do
Departamento de História da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências
Humanas da Universidade de São Paulo - USP. Este trabalho estudou a
atuação do fotógrafo francês Pierre Verger (1902-1996) com o propósito de
compreender a relação entre suas fotografias da Bahia e as tentativas de
definir, em meados do século XX, uma identidade baiana.
Ainda para a obtenção do título de Doutora em Educação na área de
Fundamentos da Educação da Universidade Federal de São Carlos, UFSCAR,
Magali Alonso de Lima realizou a tese “A Captura do Olhar: A fotografia como
construtora de saberes na antropologia educacional”, em 2004. Este trabalho
teve como objetivo relacionar ―a mudança do olhar‖, tendo a fotografia como
objeto de conhecimento e sua aplicabilidade no campo da antropologia visual e
educacional.
Encontrei também a pesquisa “Guardião de imagens: memórias
fotográficas e a relação de pertencimento de um pioneiro com Londrina”, de
Maria Luisa Hoffmann - Dissertação de Mestrado em Comunicação sob
orientação do Professor Dr. Paulo César Boni, da Universidade Estadual de
Londrina – UEL. O objetivo da dissertação foi realizar uma análise a partir de
lembranças individuais de um pioneiro da cidade de Londrina, Omeletino
Benatto. Foram selecionadas 15 imagens da época da colonização descritas
textual e oralmente pelo pioneiro Benatto, sob a perspectiva de se realizar uma
leitura da fotografia por meio da memória e da história oral.
9
Por fim tive acesso à tese de doutorado “Fotos Jornalísticas: A imagem
da violência como espelhamento das metamorfoses da sociedade brasileira em
processo de globalização” em 2001 de Francisca Eleodora Santos Severino
sob orientação do Prof. Dr. Waldenyr Caldas, apresentada ao Programa de
Ciências de Comunicação da Universidade de São Paulo. Este trabalho
apresenta um estudo empírico e teórico sobre fotos jornalísticas que retratam a
violência. O objetivo foi evidenciar que essas imagens são, ao mesmo tempo,
formas de expressão cultural e de representação das relações sociais e
políticas.
Com relação ao tema Fotografia Cultural, não encontrei qualquer artigo,
dissertação ou tese, apenas algumas informações em workshops e projetos. O
material mais significativo que pude localizar foi um curso de pós-graduação
intitulado “Fotografia: Cultura, Técnica e Expressão”, com duração de 18
meses na Faculdade São Luís - Canto da Fabril – Diamante, MA.
O que pude evidenciar aqui, é que no estado da arte não foram
encontradas obras específicas sobre Fotografia Cultural, porém todas
apresentadas relacionam-se direta ou indiretamente com cultura. Desta
maneira vamos tecendo um paralelo o tempo todo com imagens e culturas. Por
exemplo, na dissertação de Josélia Aguiar que trata da identidade baiana, na
verdade, a autora está retratando uma identidade cultural. Da mesma maneira
quando é abordada a questão da memória e da história real através das
fotografias, também se está retratando uma época e de certa forma sua cultura.
Conhecer o estado da arte do objeto desta tese foi de suma importância,
pois desta maneira ampliei minhas perspectivas de estudo para
aprofundamento deste trabalho.
10
Assim, esta tese será apresentada em quatro capítulos, a saber:
I. A Complexidade na Imagem;
II. Gêneros Fotográficos;
III. Entre a Arte e a Ciência;
IV. Introspecção: Olhares e Descobertas
No primeiro capítulo serão apresentados subsídios que tratam da
imagem e suas relações complexas, em três momentos: Arte e Estética,
Fotografia e Cultura. No primeiro momento definimos etimologicamente as
palavras arte e estética e depois relacionamos as duas. Os autores que nos
auxiliam são Bolognesi, Nascimento, Paviani e Portich. Em fotografia
abordamos brevemente o início da sua história, alguns ícones e sua relação
com a complexidade. No terceiro momento tratamos da cultura e abordamos
também dois termos que permeiam o nosso trabalho: imprinting cultural e filtro
cultural. No decorrer do capítulo e da compreensão dos temas abordados,
começa-se a se formar uma teia de informações que darão a base da tese.
O segundo capítulo trata da apresentação e análise de diferentes
gêneros fotográficos, como: Fotojornalismo, Fotodocumentarismo e Fotografia
Antropológica. O objetivo é apontar semelhanças e diferenças entre os
gêneros, de modo a estabelecer fontes e relações com a Fotografia Cultural.
O autor referência tanto em fotojornalismo como em fotodocumentarismo
é Jorge Pedro Sousa, ainda que alguns pesquisadores entendam o
fotodocumentarismo como uma ramificação do fotojornalismo. Outros pensam
que é anterior ao aparecimento do fotojornalismo. Desta discussão desponta
outro questionamento: se o fotodocumentarismo é independente ou se é uma
11
ramificação do fotojornalismo, fato que aumentou ainda mais a necessidade da
pesquisa e meu interesse pelos diversos gêneros.
Arte e Ciência serão assuntos abordados no terceiro capítulo, em que
procuro estabelecer e apresentar as definições de Cultura Humanística e
Cultura Científica como suas relações e interligações com a fotografia.
Apresento os subcapítulos a seguir: As Duas Culturas, a Fotografia e as Duas
Culturas.
No quarto e último capítulo, apresento por meio desta pesquisa e das
descobertas que fiz, o meu conceito de Fotografia Cultural e será através das
imagens apresentadas e das análises que fiz delas que exemplificarei o meu
objeto através de uma linguagem não verbal.
O trabalho se encerra com as considerações finais, ainda que não se
estabeleçam ideias ou conceitos fechados e unívocos, mas que legitimem
práticas multiculturais de religação.
12
1 A COMPLEXIDADE NA IMAGEM
“O daguerriótipo não é apenas um instrumento que serve para retratar a natureza [...]
dá a ela a capacidade de reproduzir-se”.
Louis Daguerre
Neste capítulo serão apresentados subsídios que tratam da imagem em
suas relações complexas. Trataremos, de maneira introdutória, arte e estética;
fotografia e cultura, com destaques para a relação com o conhecimento e com
o imprinting cultural. Começamos aqui, a tessitura da teia de conhecimentos
que será base para a compreensão do que denominamos Fotografia Cultural.
1.1 Arte e Estética
“As artes são o meio mais seguro de se esconder do mundo,
mas também o meio mais seguro de unir-se a ele”.
Franz Liszt
Para dar início a este capítulo, apresentaremos brevemente algumas
considerações sobre os termos Arte e Estética e a relação que aí se
estabelece.
Pode-se considerar que a Arte existe desde os primeiros indícios do ser
humano na Terra, manifestando-se por meio dos desenhos feitos pelos
primeiros homens nas cavernas.
Etimologicamente, a palavra Arte vem do latim ars, que significa técnica
ou habilidade, produto ou processo em que o conhecimento é
usado para desenvolver determinadas habilidades, mas sua definição não é tão
13
simples, ela varia de acordo com a época e com cada cultura. No sentido
moderno, também podemos usar o termo Arte como atividade artística ou
produto da atividade artística.
Platão, na Grécia Antiga, já definia o que eram objetos de arte (Figs. 01 e
02 a seguir) como ―seres de imitação‖, e os desclassificava, pois argumentava
que eram afastados do mundo das ideias, portanto eram produtos de
irracionalidade. Em seu livro X de A República, o filósofo chamou a Arte de
mimesis, que significa cópia, imitação ou reprodução da natureza, e a associou
a um espelho que reflete as coisas e os seres do mundo. Já Sócrates chamava
os artistas de imitadores, dizia que não tinham serventia para a vida dos
cidadãos (NASCIMENTO, 2010, p. 17).
Fig. 01 - Objetos de Arte – Grécia Antiga Fig. 02 - Detalhe de Vaso grego
Aristóteles começa a mudar esta ideia criando a noção de
verossimilhança, que ao contrário da imitação de objetos e fatos acontecidos,
as artes imitariam acontecimentos possíveis, não reais, mas que poderiam ter
acontecido.
14
A pintura, aliada a mimesis, esteve presente na história da cultura
ocidental até o final do século XIX, quando passou a ser valorizado o trabalho
manual para a produção de objetos artísticos.
Em cada período histórico tínhamos um determinado estilo de Arte, que
com o passar do tempo era substituído por outro. O que caracteriza o nosso
tempo, em termos de Arte, é que no mesmo espaço e tempo convivem
diversos tipos e formas de expressão, pois vivemos em uma época de
pluralismo cultural, na qual é possível a convivência de muitos estilos e
nenhum, especificamente.
Em um sentido mais amplo, podemos dizer que Arte é um tipo de
criação humana que possui valores estéticos, em que transparecem emoções,
sensações, histórias de vida e cultura. É representada por diversos estilos
como a pintura, o cinema, o teatro, a dança, a arquitetura e as artes plásticas,
em geral. A Arte não se limita apenas a determinados espaços fechados, pois
podemos encontrá-la em toda parte, em nosso cotidiano. Costa (2004, p. 12)
afirma que ―[...] há arte nos espaços pelos quais transitamos, nos locais onde
estudamos ou trabalhamos e até nas embalagens que consumimos [...]‖, ou
seja, ela está por toda parte: em muros, jardins, apresentações de artistas de
rua, televisão etc. Vivemos rodeados pela Arte.
Podemos usar o termo Arte ou a expressão obra de arte em dois
sentidos diferentes: classificativo e valorativo, isto é, podemos dizer que algo é
uma obra de arte, desta forma a estaremos classificando como tal, mas quando
dizemos que é uma verdadeira obra de arte, estamos lhe colocando um valor,
de acordo com aquilo que, para nós, é valioso, que nos emociona e nos toca, e
aqui entra o nosso senso estético.
15
Para que possamos entender o senso estético precisamos,
primeiramente, definir o que é Estética. A palavra Estética vem do grego -
aisthésis, substantivo ligado ao verbo sentir, que significa faculdade de sentir
ou compreensão pelos sentidos. Em português, sentir também tem a
conotação de emocionar-se, ter sentimentos. Em filosofia, o mundo sensível
significa a percepção que temos em relação ao mundo exterior. Em outras
palavras, de acordo com Bolognesi e Portich (2010, p. 3), tudo o que é exterior
ao sujeito estimula a sua dimensão sensível, na medida em que desperta a
sensibilidade e provoca o despertar da percepção, caminho primeiro para o
entendimento e a compreensão.
Bolognesi e Portich afirmam (2010, p. 3):
A conotação de uma disciplina específica, a Estética, no amplo universo investigativo da filosofia, foi cunhada pelo filósofo alemão Alexander Baumgarten, que nas Reflexões Filosóficas Acerca da Poesia, de 1735, e na Estética – A Lógica da Arte e do Poema, de 1750, pretendeu estabelecer critérios objetivos para a definição de beleza natural e artificial. Atualmente o significado da Estética está vinculado à beleza do corpo, das obras de arte ou de um ambiente.
No entanto, entendemos que a Estética não se limita à questão da
elegância, já que, a partir do século XVIII, a dimensão estética passou a ser
considerada como atributo básico do ser humano, superando até mesmo a
pura racionalidade.
Edgar Morin (2003b) apresenta o estado estético como um transe de
felicidade, que se coloca em diferentes situações e não resume o termo apenas
às obras de arte, mas, o expande às propriedades naturais, como o oceano,
pôr do sol, paisagem com montanhas, por exemplo. Com relação às
propriedades materiais ele cita (2003b, p. 132): um avião e ou/um carro,
mesmo estes exemplos podem ter uma forte carga estética, já que se
16
apresentam também como objeto de desejo que fará o indivíduo manifestar
emoções e sensações com relação a seu significado.
Morin associa a estética ao imaginário e a poesia, que é quando ocorre
a associação com a fotografia. O autor diz:
A estética e o imaginário têm uma parte em comum: a estética alimenta o imaginário e é, em parte, alimentada por ele (epopéias, romances, poesias, esculturas, etc.). A estética e a poesia vivida têm em comum o encantamento que podem provocar. (MORIN, 2003b, p. 133)
São essas algumas sensações que a fotografia apresenta/transmite
esteticamente, alimentando assim o imaginário a tal ponto de ser capaz de tirar
lágrimas de um expectador ao apreciar ou ao se deparar com uma imagem.
Morin (2003b, p. 135) cita também uma frase que se aproxima
diretamente da fotografia, principalmente do Fotojornalismo ou uma fotografia
de impacto: ―Milagre da estética: a tragédia nos encanta na aflição mesma que
nos proporciona‖. Como observamos na imagem a seguir (Fig. 03).
Fig. 03 – Exposição ―Alma Revelada‖ em São Paulo - Foto: Steve Mc Curry
O sentido estético nos seres humanos se forma a partir da infância, de
acordo com cada cultura e as vivências. E, é nessa fase em que o sujeito
17
começa a identificar o belo, e a perceber o que o emociona, por isso as
pessoas têm visões tão diferentes sobre o que é belo, pois cada uma
desenvolve um senso estético, único e particular. Aprendemos a valorizar
alguns tipos de linguagem e formas de expressão que tenham a ver com nossa
nacionalidade, origem e classe social.
Além disso, também temos a influência da sociedade, que transmite a
sua ideologia pelos meios de comunicação, definindo um senso estético que
lhe interessa. As pessoas são ―bombardeadas‖ com informações para que
assumam um gosto que não é o seu, e depois de algum tempo passam a não
ter consciência da influência que receberam. A Estética, dessa forma, perde a
sua conotação de sentimento e prazer, e passa a considerar apenas o aspecto
físico, que, ditado pela mídia define um padrão de beleza, limitando o que é
belo a tais padrões pré-estabelecidos. E, com isso, o diferente é descartado,
inclusive as pessoas que não se encaixam nesses padrões impostos.
Costa (2004, p. 21), percebendo a estreita ligação entre Arte e Estética
nos diz ―Dentre as características mais importantes da arte, destacamos a
emoção e o prazer que ela desperta e que alguns filósofos identificam como o
prazer do belo ou prazer estético [...]‖.
A relação entre Arte e Estética teve início no século XVIII. A Estética
surge como uma das disciplinas filosóficas, a partir da concepção de que a
beleza artística independia da imitação da natureza, o que acabava com a ideia
de que a Arte era apenas mimesis. Ela passa a ser considerada como produto
cultural que nascia da sensibilidade, liberdade ou subjetividade dos artistas.
Assim, compartilhamos com Dias a ideia de que (2008, p. 106):
A objetivação do eu tem um propósito subjetivo. É o tratamento consciente dispensado pelo sujeito a ele mesmo, com um mínimo de
18
objetividade, por tratar-se da necessidade da apresentação do eu-sujeito, tendo como referência o mundo externo.
O artista relaciona-se por meio dessa objetivação com a obra e, ao
mesmo tempo com o mundo externo, não ficando nesse caso, restrito a ter que
seguir padrões pré-estabelecidos. Pois a subjetividade tanto do observador
quanto do artista transcende o enquadramento do objeto retratado, pondo-o em
movimento, dando-lhe continuidade narrativa, garantindo a engrenagem de sua
autorreferência.
Desta forma, os objetos de arte poderiam ser criados belos, sem que a
natureza que os inspirou fosse bela. (NASCIMENTO, 2010, p. 20).
Em 1887 nasce Henri-Robert-Marcel Duchamp, em Blainville (Seine-
Maritime), na França, a 28 de julho. Posteriormente, ele é conhecido como
Marcel Duchamp, o inventor do ready-made. ―Este estilo de Arte tem como
base a indiferença visual, ausência do bom ou mau gosto. Qualquer objeto
fabricado, isolado do seu significado funcional, com ou sem tratamento, pode
tornar-se um ready-made.‖ (VIEIRA,1995, p. 11).
Em 1913, Duchamp revoluciona todo um patrimônio cultural e plástico de
séculos. Tira o objeto do seu cotidiano e confere a ele valor de Arte. A palavra
Ready-Made só apareceu em 1915, mesmo que o primeiro Ready-Made tenha
sido inventado em 1913: Roue de bicyclette (Roda de bicicleta) (Fig. 04 a
seguir). A seguir apresenta a obra Fonte, em 1917 (Fig. 05 a seguir). Tratava-
se de "[...] um desconcertante urinol que escandaliza o meio artístico, desde
então a história passa a reproduzir este gesto", diz Lisette Lagnado, que em
1994, foi a curadora da exposição intitulada ―A presença do ready-made – 80
anos‖ que aconteceu no MAC – Museu de Arte Contemporânea de São Paulo.
19
Fig. 04 - Roda de Bicicleta - ready-made – Duchamp, 1913
Fig. 05 - Fonte - ready-made – Duchamp, 1917
20
Marcel Duchamp tentou se aproximar da realidade do objeto criado com
sua própria identidade plástica dentro de sua absoluta objetividade. ―[...]
Qualquer objeto fabricado, isolado do seu significado funcional pode tornar-se
um ready-made, com ou sem tratamento [...].‖ A escolha do ready-made é
baseada na indiferença visual, ausência do bom e mau gosto. (VIEIRA,1995, p.
11).
No início do século XX ocorrem novas rupturas culturais promovidas
pelos movimentos de Vanguarda, em que é retomada a concepção do artista
como trabalhador manual, produtor de objetos reais, e não de imitações, mas
também considerados como objetos artísticos porque são criados de forma
desalienada, com criatividade e liberdade. (NASCIMENTO, 2010, p. 22).
Ernst Gombrich1, famoso historiador de arte, afirmava em seus discursos
que não existia nada que se pudesse realmente chamar de Arte, que o que
existia na verdade eram Artistas. Podemos então, supor que ele considerava
que cada período histórico tinha a sua definição do que fosse Arte, e que
caberia ao historiador buscar e analisar o que cada sociedade pensava e
considerava como tal.
Quando observamos uma determinada obra de arte podemos ter
sensações, as mais diversas possíveis e que dependem da nossa vivência e
cultura. Podemos apreciá-la, nos sentirmos comovidos, enxergar o belo que o
artista quis mostrar, ou podemos nem achar belo, mas tentar entender o que o
artista sentiu quando produziu a obra.
Existe muita confusão em se entender o que é considerado belo. Para
este entendimento não é necessário uma obra de arte ter aparência agradável
1 E.H. Gombrich nasceu em Viena, em 1909, e faleceu no dia 3 de Novembro de 2001, em Londres. Autor do clássico
internacional «A História da Arte» e de outros «bestseller», foi talvez o historiador de arte mais conhecido do seu tempo. Acesso em 10/09/2011. Fonte: http://www.wook.pt/authors/detail/id/13808
21
e harmoniosa, mas sim nos proporcionar o prazer estético, que nos provoca
emoções. A indústria cultural, por meio da fotografia, do cinema, do vídeo e da
televisão popularizou o conceito do belo. A indústria do lazer e do
entretenimento, por ter o papel de divertir, também acabou por afastar das
pessoas tudo aquilo que mostrasse imperfeições.
Em contrapartida à indústria cultural podemos falar de dois movimentos
artísticos: o Realismo e o Impressionismo. O Realismo, que defendia que a
Arte tem que mostrar o mundo conforme a visão do artista; e o Expressionismo,
que mostrava na arte a morbidez e o lado doentio do indivíduo e da sociedade.
[...] Dessa discussão resulta a certeza de que o belo é uma qualidade das obras de arte, que desperta uma emoção a qual estão associados os sentimentos e as idéias do artista e a identidade que ele é capaz de estabelecer com o público. Que essa emoção resulte de uma composição bonita ou feia, isso é secundário, está relacionado com o movimento artístico ao qual o artista pertence e com a idéia que ele quer transmitir [...] (COSTA, 2004, p. 31).
Esses dois movimentos defenderam que a beleza pode ser resultado da
desarmonia, do agressivo e até do disforme, já que como dito anteriormente, o
belo está ligado ao prazer estético.
Os critérios estéticos mudam, conforme a variação de tempo e espaço,
pois cada época elege o que considera o melhor da Arte em seu tempo, o que
acaba guiando a produção artística e também o gosto do público naquele
determinado período.
Existem diversos fatores que influenciam na mudança dos padrões
estéticos: a rebeldia dos jovens em querer criar novas formas de expressão;
modificações na sociedade; guerras; revoluções; mudanças de poder político e
invenção de tecnologias, que levam à criação de novos tipos de produção
artística.
22
Os critérios estéticos fazem parte de nossa vida, estão presentes em
tudo o que experimentamos e que conhecemos durante o nosso crescimento,
porque em tudo, até na maneira de nos vestir, esses critérios estão presentes.
É a partir deles que somos guiados a apreciar ou não uma obra de arte, são
eles que definem com o que ficamos emocionados, tocados, seja por meio de
uma música, pintura, fotografia, enfim, qualquer forma de Arte. Inclusive com
obras polêmicas, como as que atualmente são expostas em bienais de Arte.
Isto nos remete a Duchamp, que esteve muito além do seu tempo, com
seu ready-made, pois expondo um objeto industrial, de uso corriqueiro na
época, um urinol, provocou diversos sentimentos: repulsa em alguns e prazer
naqueles que compreenderam o que o artista queria dizer com sua Arte. Ele
demonstra que a Estética e a Arte são indissociáveis, porque para um objeto
ser considerado Arte é preciso ter estética, ou seja, provocar emoções. Sem
emoção não existe arte!
Agora que já pensamos um pouco sobre Arte e Estética vamos adentrar
no universo da fotografia e caminhar rumo a sua relação com a cultura.
1.2 Fotografia
A invenção da fotografia não tem apenas um criador, em que apenas
uma pessoa ou um grupo tem o crédito, podemos definir este advento como a
montagem de um quebra-cabeça, em que a síntese e o resultado de inúmeras
descobertas contribuíram para aprimorar esta linguagem que transformou a
forma e os temas relacionados à Arte.
Podemos citar entre os envolvidos: Joseph Nicèphore Niépce (1765-
1833), Louis Jacques Mandé Daguerre (1789-1851), William Henry Fox-Talbot
23
(1800-1877), Antoine Hercules Romuald Florence (1804-1879) e Leonardo da
Vinci (1452-1519).
Atribui-se como data oficial da invenção da fotografia o dia 19 de agosto
de 1839, quando se oficializa a primeira câmara fotográfica, com um processo
chamado de Daguerriotipia, tendo como seu criador Louis Jacques Mandé
Daguerre (Figs. 06 e 07 a seguir). Porém, a primeira imagem de que se tem
notícia foi em data anterior, 1826, registrada por Joseph Nicèphore Nièpce
(Figs. 08 e 09 a seguir). A partir daí surgiram muitos estúdios, descobertas,
com muitos envolvidos (Figs. 10 a 15).
A primeira notícia que se tem sobre fotografia foi publicada no jornal
Gazette de France, no dia 06 de Janeiro de 1839 – um pouco antes de o
governo francês anunciar a descoberta de Daguerre.
Fig. 06 - Natureza morta, primeira Daguerreotipia, 1839
24
Fig. 07 - L. J. M. Daguerre - Jean-Baptiste Sabatier Blot, 1844
Fig. 08 - Joseph Nicephore Niépce
25
Fig. 09 - Vista da janela em Le Gras - Joseph Niépce – Fotografia, 1826
Fig. 10 - Estojo de um Daguerreótipo
26
Fig. 11 - Hogg fotografando no estúdio de Richard Beard: de autor desconhecido – Daguerreótipo, 1843
Fig. 12 - W. H. Fox Talbot em daguerreotipo, 1844
27
Fig. 13 - Estúdio de Talbot em Reading, 1844
Fig. 14 - Hércules Florence, 1875
28
Fig. 15 - Técnica de revelação e fixação com nitrato de prata no papel. Ela retrata uma cópia de um diploma.
Essas imagens são ícones da história da fotografia. Tanto as imagens
dos descobridores como os seus feitos que caracterizaram a descoberta de
uma técnica que revolucionou o mundo.
Em minha dissertação de mestrado2 já compartilhei com Kossoy que o
advento da fotografia como um novo meio de conhecimento do mundo, em
meio a uma série de invenções decorrentes da Revolução Industrial
influenciariam os rumos da história. Em suas palavras:
A fotografia, uma das invenções que ocorrem naquele contexto, teria papel fundamental enquanto possibilidade inovadora de informação e conhecimento, instrumento de apoio à pesquisa nos diferentes campos da ciência e também como forma de expressão artística (KOSSOY, 2001, p. 25).
Lá, no mestrado, eu já concluía que o avanço nas pesquisas
tecnológicas da fotografia deve-se acima de tudo à cultura de consumo e de
2 VIEIRA, Nancely C. ―A Estética do Olhar: O ensino da fotografia sob o prisma do pensamento complexo. Dissertação
(Mestrado em Educação) – Centro Universitário Nove de Julho, São Paulo. 2006. p.15-16
29
produção que a Revolução Industrial desencadeou, particularmente na Europa
e nos Estados Unidos.
A partir de 1860 surgem grandes empresas de fotografia, sendo uma
das principais a Kodak, de propriedade de George Eastman, um industrial
norte- americano que fabricava celulóide em Rochester, NY, o que permitiu que
os retratos e desenhos manuais da época fossem substituídos pela fotografia,
gerando economia de tempo e dinheiro.
Kossoy (2001) nos mostra que não podemos enxergar a fotografia
apenas pelo seu viés estético, mas também como fonte de informação e
comunicação histórica, pois ela retrata um determinado momento no tempo, e
precisamos analisá-la sob diversos aspectos, não somente pelo olhar artístico
do fotógrafo, mas também levando em consideração todo o processo
necessário para se chegar à obtenção da imagem, é isto que lhe dá um caráter
ambíguo e misterioso. O autor compara o fotógrafo a um filtro cultural, pois
além de registrar uma cena do passado, também imprime na imagem que
produziu muito de si: sua cultura, ideologia, criatividade, sensibilidade, seu
talento, intelecto e estado de espírito, ou seja, é uma testemunha de uma
manifestação artística, pois reproduz o mundo do autor.
A complexidade na fotografia analisa os aspectos que compõem o todo
de um processo fotográfico, desta maneira, o resultado final, tem influência
direta do seu autor e de todo o seu processo cultural, estético e técnico, pois
ele é ao mesmo tempo agente e personagem do processo. Suas imagens
serão bases para reflexões e estudos iconográficos.
A iconologia por meio da absorção de mecanismos técnicos, como:
fotometria, foco, tecnologia etc., nos proporciona novas soluções que permitem
30
fazer reflexões interpretativas que são influenciadas por aspectos sociais,
econômicos, políticos, religiosos e estéticos do interpretador.
O pensamento complexo cria uma trama comum que enreda em si um
tecido de infindáveis significados e sujeitos, e é desta forma que podemos
analisar o ato fotográfico, pois ele possui um conjunto de fatores fragmentados
em sua produção, o que nos permite múltiplas interpretações ao analisá-lo.
Se não podemos enxergar a fotografia só pelo lado estético, mas
precisamos enxergá-la de forma contextualizada é importante observá-la sob
diferentes aspectos: cultural, sensível, criativo, político, histórico, entre outros.
Na sequência apresentamos o sub capítulo que discorre sobre cultura na
intenção de articulá-la com o tema de nossa pesquisa que é a Fotografia
Cultural.
1.3 Cultura
A palavra cultura deriva do latim colere, que tem o significado de cultivar
a terra. Apareceu na antiga Roma associada à agricultura, portanto, cultura
seria o campo cultivado. Foi a partir do século XVIII que ganhou o significado
de ―cultura do espírito‖, e passou a ser associada ao vocábulo civilização,
derivado do latim civitas, que significa cidade (NASCIMENTO, 2010, p. 03)
Os dois termos tinham caráter elitista, pois apenas os povos da Europa
eram considerados civilizados, e o restante, bárbaros. No final do século XIX,
estudos antropológicos fizeram com que esses termos perdessem o teor
elitista. Cultura, para os antropólogos, passou a ―compreender tanto os
produtos de atividade mental, moral, artística e científica, como as bases
31
materiais da evolução social‖ (AZEVEDO, 1958, p. 21 apud NASCIMENTO,
2010, p. 03). Desta forma, todas as sociedades, fossem elas primitivas ou
evoluídas, possuíam sua cultura. Assim, cultura pode ser definida como:
conhecimentos, crenças, artes, moral, costumes, hábitos e aptidões, adquiridos
pelo indivíduo por meio da sociedade em que nasce e necessária para sua
sobrevivência. Os hábitos adquiridos em uma geração são passados para a
seguinte. Trata-se da aprendizagem social.
Morin apresenta-nos suas ideias sobre cultura:
A cultura que caracteriza as sociedades humanas é organizada/organizadora via o veículo cognitivo da linguagem, a partir do capital cognitivo coletivo dos conhecimentos adquiridos, das competências aprendidas, das experiências vividas, da memória histórica, das crenças míticas de uma sociedade [...]. E, dispondo de seu capital cognitivo, a cultura institui as regras, normas que organizam a sociedade e governam os comportamentos individuais [...]. (MORIN, 2008b, p. 19)
Com isso, podemos entender a importância da linguagem para o
surgimento e a transmissão da bagagem cultural de uma sociedade. É a cultura
que governa e dita as regras de como o indivíduo deve comportar-se e agir
para se adaptar ao que a sociedade espera dele.
Morin (2003b, p. 166) complementa: ―A cultura dá forma e norma. Desde
o nascimento, o indivíduo começa a incorporar a herança cultural que assegura
a sua formação, orientação, seu desenvolvimento de ser social.‖ Desta
maneira, entrelaça-se a herança recebida com o fator biológico. Cada cultura
favorece e inibe, ao mesmo tempo, a expressão das habilidades individuais,
tais como: alimentação, educação, modelos de comportamento etc. O mesmo
autor diz: ―Assim, a cultura submete o indivíduo e, ao mesmo tempo, o
autonomiza‖ (MORIN, 2003b, p. 166). E assim, a cultura torna-se a fonte
32
geradora e regeneradora. Na troca, ela proporciona e se alimenta ao mesmo
tempo, pois sua relação com o indivíduo é simultânea.
O homem é um ser que fala, trabalha e modifica a natureza e a si
mesmo, mas a ação humana se dá coletivamente, ou seja, suas palavras têm
significado no diálogo com o outro, e o trabalho é uma tarefa social. Desde que
nasce, ele tem contato com o mundo cultural da sociedade em que vive, com
dados já prontos que lhe serão ensinados: modo de andar, de falar, a língua,
como brincar, comportar-se, maneiras de se alimentar etc. É desta forma que é
preparado para poder viver adequadamente com os outros.
Existem vários conceitos de cultura que podem ser amplos e genéricos,
tornando-a muito elástica. Sua definição pode estar ligada ao conceito de
civilização, ou pode ser restrita às atividades consideradas nobres, como
cultura literária, filosófica, científica e artística. Mesmo nos dias de hoje o senso
comum considera principalmente a concepção ―elitista‖, que denomina como
culta a pessoa que possui saberes especializados ou uma cultura erudita. De
qualquer modo, como existe o uso do termo cultura de forma ampla ou restrita,
é necessário que saibamos em que contexto ele está sendo utilizado, para que
possamos dar-lhe o seu real sentido.
Na Antiguidade Clássica se exaltava a supremacia do homem sobre a
natureza, e Aristóteles atribuía ao homem a racionalidade e a capacidade de se
sobrepor às imposições das leis naturais, considerava que as diferenças entre
homens e animais adviriam do fato de eles serem racionais, políticos e artistas.
Carvalho nos mostra que por intermédio de uma cognição cultural, o
homem deixou de lado sua parte biológica, caracterizada pelos instintos:
[...] mediações como a proibição do incesto, as materialidades, a linguagem, atuam como marcadores que tecem a passagem das
33
compulsões biológicas às diversidades que o modelo cultural universal se incumbe de criar e perpetuar (CARVALHO, 2003, p. 86).
Desta forma, criou-se o paradigma da superioridade do homem frente à
natureza e aos outros animais, e somente por meio de múltiplos saberes é que
se mudará esta ideia.
Karl Marx também se ocupou em comparar a sociedade humana com a
natureza. Em um texto de 1857, Para a Crítica da Economia Política, ele diz
que a sociedade humana produz necessidades inexistentes no mundo natural.
Para o autor, os homens têm necessidades similares as dos animais, como
comer, morar, comunicar-se, etc., mas, a maneira como estas necessidades
são satisfeitas é que os distingue e que determina o que é um fato cultural. Um
exemplo que Marx destaca, é a fome: ―A fome é a fome, mas a fome que se
satisfaz com carne cozida, que se come com garfo e faca, é uma fome distinta
da que devora carne crua, com unhas e dentes‖ (MARX, 1982, p. 09 apud
NASCIMENTO, 2010, p. 09). O ato de alimentar-se é biológico, mas a maneira
como se come, o tipo de alimento que se ingere e a maneira de preparo
exprimem as particularidades culturais de indivíduos, agrupamentos humanos
ou determinadas sociedades.
De acordo com a diversidade histórica de sociedades, nações, regiões,
países, surgiu a classificação das culturas: superiores ou inferiores, que serve
para distinguir os diversos tipos de cultura, ou seja, a dominação dos mais ricos
sobre os mais pobres, e que ocorria até em grupos sociais diferentes. A partir
daí surgiram as expressões cultura popular e alta cultura, o que se pressupõe a
dominação de uma cultura sobre a outra. A cultura popular seria um
subproduto da cultura dominante ou erudita, e que seria receptora,
simplificadora e divulgadora da cultura dominante.
34
Durante o século XX, com o advento da televisão, rádio, jornais, revistas
etc., os conteúdos divulgados por estes meios de comunicação receberam o
nome de cultura de massa, pois se referem às expressões culturais que são
transmitidas a milhares de pessoas ao mesmo tempo. Esta cultura é
considerada como mais uma forma de alienação política dos indivíduos e
neutralização de sua consciência crítica.
Nos dias de hoje, fala-se em respeito às diversas culturas existentes, e
nada melhor que o conhecimento para que se quebrem preconceitos e se
respeitem as particularidades de outros povos e indivíduos.
[...] As outras sociedades não são melhores do que a nossa: mesmo que sejamos inclinados a pensar dessa maneira, não temos a nossa disposição nenhum método para prová-lo (LÉVI-STRAUSS, 1995, p. 453 apud CARVALHO, 2003, p. 34).
Em resposta às classificações de culturas superiores e inferiores, surgiu
o relativismo cultural, que segundo definição de Carvalho (2003, p. 08), ―[...] as
culturas são unidades autossuficientes, fechadas e coerentes em si mesmas‖.
Para o relativismo, não existem culturas superiores e inferiores, todas têm o
mesmo valor, mas elas se fecham em si mesmas, não permitindo as trocas
culturais.
A troca entre as culturas é muito enriquecedora, pois propicia a geração
de novos conhecimentos: técnicas, sabores, arte. Podemos citar como
exemplo, no Brasil, o futebol, que é considerado o esporte nacional, mas ele
nos foi trazido pelos ingleses, portanto não pertencia, originalmente, a nossa
cultura. Morin deixa bem claro isto:
[...] As culturas são aparentemente fechadas em si mesmas para salvaguardar sua unidade singular. Mas, na realidade, são também abertas: integram nelas não somente os saberes e técnicas, mas também idéias, costumes, alimentos, indivíduos vindos de fora. As
35
assimilações de uma cultura a outra são enriquecedoras (MORIN, 2003c, p. 57).
Compreendemos, então, que toda cultura está aberta ao mundo exterior,
onde as ideias migram entre si. A aquisição de um novo conhecimento
regenera a cultura. Segundo Morin (2008b, p. 17): ―[...] todo conhecimento,
inclusive o científico, está enraizado, inscrito no e dependente de um contexto
cultural,social e histórico [...]‖. O autor questiona ainda, se é possível produzir
conhecimento que tenha alguma autonomia.
1.3.1 Conhecimento e Cultura
Francis Bacon (1561-1626) nos apresentou que o pensamento podia ser
inconscientemente influenciado pelo seu entorno: sociedade, educação,
linguagem, tradições, fatores estes que formam um conjunto de componentes
nucleares de uma cultura.
Morin nos auxilia:
Se a cultura contém um saber coletivo acumulado em memória social, se é portadora de princípios, modelos, esquemas de conhecimento, se gera uma visão de mundo, se a linguagem e o mito são partes constitutivas da cultura, então a cultura não comporta somente uma dimensão cognitiva: é uma máquina cognitiva cuja práxis é cognitiva (MORIN, 2008b, p. 19) (Grifos do autor).
Entendemos, assim, que a cultura comporta um repertório cognitivo
muito amplo, abrindo-se a diversas possibilidades de aquisição de
conhecimento.
O autor usa também o comparativo metafórico da cultura de uma
sociedade como uma espécie de megacomputador complexo (Morin, 2008b).
Nos dias atuais, a presença de um computador no cotidiano é algo fundamental
e ao mesmo tempo comum. Fundamental pelas funções que executamos por
36
meio dessa ferramenta: serviços bancários, pesquisas, comunicação e até
mesmo entretenimento. Por intermédio do computador e da comunicação
acabamos com as barreiras físicas. É como se pudéssemos ter acesso a tudo
e a todos, e temos; ao menos o que está publicado em sites ou aquilo que as
ferramentas da tecnologia nos oferecem. Ao mesmo tempo o computador é
simples, pois faz parte de um devir coletivo, está aí, praticamente em todos os
lugares, e isso fica mais evidente nas grandes metrópoles. Agora, quanto ao
seu uso e eficiência podemos dizer que ainda é relativo, pois depende dos
desempenhos individuais, mas já se tornou insubstituível na vida de milhões de
pessoas.
E pensar que, uma única unidade de computador já ocupou uma sala
toda no passado, hoje o seu tamanho foi tão reduzido que pode estar dentro de
um minúsculo aparelho telefônico. O megacomputador a que Morin se refere e
compara à cultura de uma sociedade, memoriza dados cognitivos, armazena e
executa programas, prescreve normas. Dessa maneira, cada espírito
cérebro/individual seria um terminal individual e um conjunto destes terminais
comporia o Grande Computador, que é determinada cultura. O conhecimento
estaria, então, ligado, por todos os lados, à estrutura da cultura.
Cada terminal contribui para as interrelações relativas ao conhecimento.
Morin (2008b) sugere que este processo tem início no período embrionário e
desenvolve-se durante a primeira infância. Nasceriam, então, aí, as primeiras
marcas de uma cultura que se encontra primeiramente no entorno em que o
embrião foi gerado e se desenvolveu posteriormente, no início da vida. Essas
marcas podem ser fatores com que ele se deparou, como tabus, normas,
37
vivências, costumes, que ―[...] incorporam em cada pessoa um imprinting
cultural, frequentemente sem retorno‖ (MORIN, 2008b, p. 25).
1.3.2 Imprinting Cultural
Nenhuma ideia ou teoria nasce sem que haja influências sociais,
culturais e históricas, portanto, ideias e teorias são geradas pelo determinismo
do conhecimento, e cada sociedade impõe o conhecimento que é preciso
conhecer.
Segundo Morin:
Todas as determinações propriamente sociais, econômicas, políticas (poder, hierarquia, divisão em classes, especialização e, nos tempos modernos, tecnoburocratização do trabalho) e todas as determinações propriamente culturais-noológicas convergem e se sinergizam para aprisionar o conhecimento em um multideterminismo de imperativos, normas, proibições, rigidez e bloqueios (MORIN, 2008b, p. 29).
Imprinting é o termo que Konrad Lorenz propôs para dar conta da marca
incontornável imposta pelas primeiras experiências do animal recém-nascido,
como ocorre com alguns filhotes, que ao nascerem seguem o ser vivo mais
próximo e atribuem a ele a condição de mãe, caso essa convivência persista.
Morin também conceitua o termo, como uma marca inapagável imposta
pelas primeiras experiências vividas:
Ora há um imprinting cultural que marca os humanos, desde o nascimento, com o selo da cultura, primeiro familiar e depois escolar, e que prossegue na universidade ou no exercício da profissão. Ao contrário do que orgulhosamente pretendem os intelectuais e os sábios [...] os subcultivados são alvos de um imprinting e de uma normalização atenuados, e há mais opiniões pessoais diante de um balcão de uma taberna que num cocktail literário. (MORIN, 1991, p. 25)
38
O imprinting une-se à normalização, o que garante o conformismo e a
transmissão de geração a geração. Para Morin (2008b, p. 31): ―O imprinting e a
normalização asseguram a invariância das estruturas que governam e
organizam o conhecimento [...]‖.
O imprinting está presente e se manifesta também em nossa percepção
visual, pois desde a mais tenra infância somos altamente hipnotizados por tudo
o que está ao nosso redor e que vivenciamos, direta ou indiretamente. Por
todos os lados há a presença de uma ―alucinação coletiva‖ que atinge
diferentes classes e gêneros. Morin (2008b, p. 30) corrobora esta ideia: ―[...] A
alucinação, que faz ver o inexistente, junta-se à cegueira, que oculta o
existente. Os falsos testemunhos sinceros são numerosos [...]‖.
Ficamos cegos diante de tanta informação. A cegueira banaliza a
informação. Podemos passar todos os dias diante de uma mesma situação e
não enxergá-la mais, como, por exemplo, uma guerra que é notícia tantas
vezes pelos meios de comunicação, ficando insustentável acompanhar uma
tragédia como espetáculo de uma vida real. Isso porque esse tipo de
comunicação está relacionado à cultura de massa (Fig. 16 a seguir).
Morin (2003a, p. 50) afirma:
[...] No âmago da leitura ou do espetáculo cinematográfico, a magia do livro ou do filme faz-nos compreender o que não compreendemos na vida comum. Nessa vida comum, percebemos os outros apenas de forma exterior, ao passo que na tela e nas páginas do livro eles nos surgem em todas as suas dimensões, subjetivas e objetivas.
Assim, quando um artista revela a guerra com sua Arte, o cineasta, por
meio de um filme, ou o fotógrafo, através de seu olhar, trata-se de outra forma
de nos apresentar a realidade. Voltamos a enxergar e, com o senso estético,
voltamos a nos emocionar com aquela informação.
39
Fig. 16 – Steve McCurry, September 11, New York, NY, USA
Ainda com relação à presença do imprinting, ele pode produzir diferentes
modos de conhecimento, em que cada indivíduo é uma reprodução típica do
entorno em que viveu e modifica-se ao deparar com novas experiências.
Nos textos de Kossoy sobre fotografia, é comum encontrarmos termos
tais como bagagem cultural e filtro cultural, que se referem ao percurso pelo
qual uma pessoa passou no decorrer da vida, e não exatamente o processo
embrionário ou os primeiros anos da infância que deflagraram o surgimento do
imprinting.
Para evidenciar o imprinting pela visão de Morin, apresentamos a seguir
a abordagem do tema liberdade e suas relações, como dependência e
autonomia:
40
[...] De fato, sofremos limitações do nosso meio natural; somos prisioneiros de nosso patrimônio genético, que produziu e determinou nossa anatomia, nossa fisiologia, nosso cérebro, logo nossa mente/espírito; estamos fechados em nossa cultura, que inscreve em nós, desde o nosso nascimento, normas, tabus, mitos, ideias, crenças; estamos submetidos à nossa sociedade que nos impõe leis, regras e interditos; somos mesmos possuídos por nossas ideias, que se apropriam de nós enquanto acreditamos dispor delas. Assim somos ecológica, genética, social, cultural e intelectualmente determinados. Como poderíamos dispor de liberdades? (MORIN, 2003b, p. 268)
O autor apresenta a ideia de que estamos fechados em nossa cultura,
desta maneira não haveria como fugir do imprinting que nos é imposto desde
os primeiros anos. E fato muito interessante é a questão da liberdade: mesmo
em relação às ideias que acreditamos possuir, na verdade são elas que nos
possuem. Por isso, toda autonomia é dependente. E, com relação ao nosso
patrimônio genético, ele também nos dá autonomia, mas ao mesmo tempo nos
mantém sob sua dependência.
Morin (2003b, p. 272) conclui: ―E, como veremos agora, a inscrição do
indivíduo numa cultura e numa sociedade faz-lhe submeter-se a uma nova
dependência, que, com frequência, lhe tira a possibilidade de uma autonomia e
de um acesso a novas liberdades‖.
41
2 GÊNEROS FOTOGRÁFICOS
“Se eu pudesse contar a história em palavras, não precisaria carregar uma câmera”.
Lewis Hine
Neste capítulo serão apresentados, os gêneros que tem ligação direta
ou indireta com a Fotografia Cultural. São eles: fotojornalismo,
fotodocumentarismo e fotografia antropológica. Apresentaremos aqui,
diferenças e semelhanças entre os gêneros, de modo a orientar uma possível
definição de Fotografia Cultural, objeto deste estudo.
2.1 Fotojornalismo
O fotojornalismo oferece credibilidade ao texto. Ela informa, denuncia,
revela, opina, expõe e mostra. Como o valor informativo vem em primeiro lugar,
valores técnicos ou estéticos acabam por ser secundários.
Para definir este gênero, recorremos a um autorreferência na área,
Jorge Pedro Souza que é pesquisador e professor de jornalismo na
Universidade Fernando Pessoa, no Porto – Lisboa.
[...] leva-me a considerar, de forma prática, as fotografias jornalísticas como sendo aquelas que possuem "valor jornalístico" e que são usadas para transmitir informação útil em conjunto com o texto que lhes está associado. O fotojornalismo é, na realidade, uma actividade sem fronteiras claramente delimitadas. O termo pode abranger quer as fotografias de notícias, quer as fotografias dos grandes projectos documentais, passando pelas ilustrações fotográficas e pelos features (as fotografias intemporais de situações peculiares com que o fotógrafo depara), entre outras. De qualquer modo, como nos restantes tipos de jornalismo, a finalidade primeira do fotojornalismo, entendido de uma forma lata, é informar‖ (SOUSA, 2002:07) (Grifos do autor).
42
Como indica o autor, o fotojornalismo é uma atividade sem fronteiras
claramente delimitadas, podendo transitar por diversos caminhos, mas que se
dirige a uma mesma finalidade: informar.
Compartilhamos também da ideia de Severino (2001, p. 79), quando
define o fotojornalismo como uma estrutura não isolada, que apesar de
autônoma, articula-se com outras estruturas: ―[...] seja esta a legenda que a
acompanha ou o artigo que ela ilustra [...].‖ Apesar de concorrentes as mesmas
não se confundem, pelo contrário, se complementam.
Segundo Sousa (1998, p. 12), as primeiras manifestações, do que viria a
ser o fotojornalismo notam-se quando os primeiros entusiastas da fotografia
apontaram a câmera para um acontecimento, tendo em vista fazer chegar essa
imagem a um público, com intenção testemunhal. E acrescenta (Sousa,
1998:13), que o primeiro daguerreótipo político publicado na imprensa foi The
Great Chartist Crowd, em 1848, divulgado no The Sunday Times, uma
reprodução sob a forma de gravura de madeira.
A fotografia é usada como news medium (mídia) entrando na história da
informação desde 1842, embora não se possa afirmar com propriedade sobre a
existência de fotojornalismo nesse período, pois os processos de reprodução
que eram necessários só se desenvolveram a partir do final do século XIX.
Sousa nos auxilia:
Aliás, o fotojornalismo necessita de processos de reprodução que só se desenvolvem a partir do final do século XIX — até meados do século passado, desenhadores, gravuristas e gravuras de madeira eram intermediários entre fotógrafos e fotografias e os leitores. De facto, a publicação directa de fotografias só se tornaria possível com as zincogravuras, que surgiriam ao virar do século. Até essa altura, a tecnologia usada envolvia papel, lápis, caneta, pincel e tinta para desenhar; depois, tornava-se necessário recorrer a madeira, cinzéis e serras para criar as gravuras. (1998, p. 12)
43
Diversos são os suportes atuais em que temos a presença do
fotojornalismo, desde jornais e revistas até exposições e boletins de empresas,
não se restringindo a veículos impressos, tendo uma significação nos meios
digitais.
Entretanto, o termo fotojornalismo pode abranger muitos gêneros
diferenciados de fotografias, como por exemplo, features (fotografias
intemporais de situações peculiares), notícias, ilustrações fotográficas, projetos
documentais etc. Como identificar se uma fotografia é realmente jornalística?
Partiremos da ideia de que a função primeira deste tipo de fotografia é que ela
tenha valor jornalístico. Segundo Sousa (2002, p. 07): ―[...] Em termos comuns,
pode-se, contudo, considerar que tem ‗valor jornalístico‘ o que tem valor como
notícia, ou seja, o que tem ‗valor-notícia‘ à luz dos critérios de avaliação
empregues consciente ou não conscientemente pelos jornalistas.‖
Para o autor, a comunicação tem ligação direta com este tipo de
fotografia. E acrescenta (2002, p. 05): ―[...] O domínio das linguagens, técnicas
e equipamentos fotojornalísticos é, assim, uma mais-valia para qualquer
profissional da comunicação [...]‖. Com o avanço da tecnologia, é
imprescindível a este profissional ter conhecimento e domínio sobre o uso da
fotografia nos diferentes meios.
Os cursos de graduação em Comunicação têm, em sua maioria, o
ensino de fotojornalismo. Em cursos de curta duração, como o de
Comunicação Digital – que abrange outros cursos como: Designer gráfico,
Produção audiovisual, Montagem multimídia, Vídeo digital, Computação
gráfica, todos têm no currículo a disciplina fotografia. Afinal, vivemos hoje, num
44
mundo interligado, conectado e multimídia3. O profissional que domina as
linguagens, os equipamentos e as técnicas fotográficas usa a imagem de
maneira expressiva e criativa, além de estar em sintonia com o grande avanço
nos meios tecnológicos.
A imagem está presente diariamente em sites, blogs, comunidades
virtuais etc. Outro fato que deve ser ressaltado aqui, é a rapidez da
transmissão da informação do jornalismo e do fotojornalismo atrelada à
tecnologia. Nos dias atuais, as fotos estão sendo enviadas in loco – do próprio
campo de futebol, por exemplo. Os fotógrafos, além de carregarem todo o
equipamento, estão munidos também de laptops e internet móvel, entre outros
aparatos. Outros momentos em que se faz muito uso destes recursos são
durante catástrofes e guerras. Os fotógrafos e jornalistas enviam as
informações instantaneamente, às vezes ao vivo até, dependendo da
veiculação da mídia usada (Figs. 17 e 18 a seguir).
3 Multimídia é a combinação, controlada por computador, de pelo menos um tipo de media estático (texto, fotografia,
gráfico) com pelo menos um tipo de media dinâmico (vídeo, áudio, animação). Acesso em 10/08/2011. Fonte: http://essem.com.br/home/index.php?option=com_content&view=article&id=46&Itemid=142
45
Fig. 17 - Fotógrafos em ação no campo I - Foto: Renato Negrão
Fig. 18 - Fotógrafos em ação no campo II - Foto: Renato Negrão
Para uma fotografia jornalística ter qualidade ela tem que unir a força da
notícia à força visual. Enveredam-se aí pela intuição e pelo sentido de
oportunidade do fotógrafo, como nos coloca SOUSA (2002, p. 10): ―[...] quer
para determinarem se uma situação (ou um instante numa situação) é de
46
potencial interesse fotojornalístico, quer para a avaliarem eticamente, quer
ainda para a representarem fotograficamente [...]‖.
O fotojornalista deve estar constantemente se atualizando, afinal ele tem
um desafio diferente a cada momento, às vezes vários no mesmo dia, pois tem
pautas a cumprir, as quais só se intera quando chega à redação. Para isso ele
precisa usar sua intuição, sensibilidade nas oportunidades que lhe aparecem. É
necessário também que o profissional esteja sempre em busca de novos
ângulos nas cenas cotidianas com que se depara, principalmente em cenas de
entrevistas coletivas, em que o espaço para atuação é ínfimo.
Outro momento difícil para o fotojornalista é quando tem que compor
imagens no frenesi de determinada situação, como ocorre em coberturas de
greves, manifestações, guerras, grandes eventos etc. Nesses casos é comum
encontrar ânimos alterados, e cabe a ele, por meio de sua intuição e
experiência, discernir o ―instante decisivo‖ que, para Henri-Cartier Bresson
(1908-2004) significava o momento fundamental de alguma situação qualquer.
O fotógrafo via na fotografia uma nova plasticidade. Bresson nasceu na França,
morou em diversos países realizando ensaios fotográficos e ficou
mundialmente conhecido por trabalhos publicados nas revista Life4 entre
outras.
Independente do caminho percorrido pelo fotojornalista para fazer sua
imagem, ele precisará transmitir, pela mensagem fotográfica, o sentido que
deseja. A fotografia ajuda a credibilizar a informação textual. Assim,
entendemos que no fotojornalismo há uma grande sintonia entre fotografias e
textos.
4 A Revista Life foi fundada em 1936 por Henry Luce. Acesso em 10/08/2011.
Fonte: http://www.almanaquedacomunicacao.com.br/noticias/107.html
47
Baynes (1971) sugere que o aparecimento do primeiro tablóide fotográfico, o Daily Mirror, em 1904, marca uma mudança conceptual: as fotografias deixaram de ser secundarizadas como ilustrações do texto para serem definidas como uma categoria de conteúdo tão importante como a componente escrita [...]. (SOUSA, 2002, p. 13)
Com o surgimento do tablóide fotográfico a imagem ganha significação e
valorização, passando a fazer parte de uma categoria de conteúdo. O primeiro
tablóide fotográfico apareceu em 1904, com o Daily Mirror, jornal inglês
fundado por LordNorthclife5 que inovou ao ser o primeiro jornal diário a publicar
fotografias, trazendo uma mudança conceitual. De acordo com Sousa (2000, p.
13): ―As fotografias deixaram de ser secundarizadas como ilustrações do texto
para serem definidas como uma categoria de conteúdo tão importante como a
componente escrita.‖
Seguem imagens das edições de julho de 1904 (Fig. 19):
Fig. 19 - Edições do jornal ilustradas com fotografias preto e branco.
Até então, somente as revistas publicavam fotos. Os jornais, por razões
econômicas, publicavam gravuras copiadas de fotos.
5 Alfred Charles William Harmsworth, mais tarde, Alfred Lord Northcliffe (1865-1922) foi um pioneiro jornal britânico
que revolucionou a revista e publicação de jornais na Grã-Bretanha, nos primeiros anos do século XX, e que exercia o poder político significativo por meio de seus jornais populares. Acesso em 22/08/2011. Fonte: http://www.netsaber.com.br/biografias/ver_biografia_c_4024.html
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Com o desenvolvimento industrial e o avanço da tecnologia a fotografia
ganha espaço cada vez maior nos veículos de comunicação tornando-se um
objeto visual de relacionamento social e conquistando cada vez mais destaque,
o que se faz por meio das referências sociais e culturais dos leitores.
Segundo Severino:
Como objeto prenhe de experiências humanas e de vontades contraditórias, ela se insere na pauta dos jornais, não apenas como ato de vontade individual e isolada, do fotógrafo, mas, fundamentalmente, como parte de um planejamento burocrático que, ao dirigir sua força comunicativa para determinados objetivos, pode esvaziá-la. Nesse esvaziamento, aliena a vontade de experiência em prol de realização de metas pré-estabelecidas (2001, p. 188).
Quando a autora coloca que ocorre um esvaziamento de sentido, ela se
refere ao fato de que muitas vezes no fotojornalismo a fotografia está a serviço
de uma meta já pré-estabelecida e burocrática, vindo até mesmo a mudar a
intenção primeira do fotógrafo. Fato este que já não é uma constante no
fotodocumentarismo, que trabalha por outro viés de comunicação e identidade.
2.2 Fotodocumentarismo
A fotografia, desde o seu nascimento, é usada como fonte de
conhecimento. É considerada, por sua semelhança com a verdade, uma forma
de documentação, pois registra no papel uma realidade que a pintura não
alcança. Uma única fotografia vem imbuída de múltiplos significados, e assim,
um conjunto de imagens sobre um mesmo tema se torna um conjunto de
conhecimentos e significados que pode contar uma história, que chamamos de
fotodocumentarismo, que tem como seus precursores John Thomson, Jacob
Riis e Lewis Wickes Hine.
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Os indícios do que viria a ser o fotodocumentarismo, foram: Fotografia
de viagens e curiosidades etnográficas, Documentação fotográfica da
conquista do Oeste, nos EUA, sobretudo nas fotos de Alexander Gardner
(1821-1882), Thimothy O' Sullivan (1840-1882) e William Henry Jackson (1843-
1942), Levantamentos etnográficos dos índios norte-americanos, entre o final
do século XIX e princípio do século XX, realizados por Edward Curtis (1868-
1952) e Fotografias de intenção documental de orientação colonialista e
comercial.
O escocês John Thomson (1837-1921) foi o primeiro fotodocumentarista
social, que se preocupou com alguns temas como a fome, conflitos étnicos e
religiosos, guerras etc. O fotógrafo tinha a intenção de trazer à tona questões
até então desconhecidas em algumas partes do mundo, possibilitando à
população a oportunidade de obter conhecimento de determinadas situações e
de poder agir em prol de sua sociedade. Thomson publicou em 1862 uma obra
intitulada Street Life in London (A Vida nas Ruas de Londres), que reunia
fotografias (xilogravuras) e textos explicativos. Esta obra é considerada como o
ponto de partida do fotodocumentarismo de denúncia social (Figs. 20 e 21 a
seguir).
50
Fig. 20 – China through the Lens of John Thomson - Foto: John Tomson
Fig. 21 – The Bayon Temple, Angkor Thom, 1866 - Foto: John Tomson
De acordo com Boni (2008, p. 02), ―[...] este tipo de segmento
fotográfico, seria uma atividade de fotógrafos ‗empenhados‘ em modificar uma
determinada realidade, procurando instigar a vergonha e o acanhamento pelas
injustiças.‖ Este tipo de fotografia retrata temas relacionados com o meio
ambiente. Jacob Riis e Lewis Hine vieram dar relevância a este gênero.
51
Primeiramente, o sociólogo norte-americano Lewis Wickes Hine (1874-
1940) aplicou suas fotografias no ensino acadêmico, pois lecionava na Ethinical
School, em Nova York. Em 1903 comprou sua primeira câmera, e em 1905
dedicou-se a fotografar, a fim de divulgar a miséria dos imigrantes europeus em
Ellis Island, bem como cortiços e pessoas carentes. Em 1908, continuou os
seus estudos sociológicos com imagens de trabalhadores metalúrgicos de
Pittsburgh, na Pensilvânia. Largou a escola e passou a se dedicar,
especialmente à arte de fotografar. Para ele, a câmera era tanto um
instrumento para a reforma social como uma ferramenta de pesquisa. Expôs à
opinião pública as péssimas condições de trabalho, em que os metalúrgicos se
encontravam. Apresentou por meio de suas fotografias as condições
desumanas da exploração da mão-de-obra, especialmente a infantil, e tão
perplexo ficou com o resultado de suas próprias imagens que fez desse tema,
uma causa pessoal. Todo esse trabalho e as reivindicações tiveram como
resultado a aprovação da lei contra o trabalho infantil (Figs. 22 e 23 a seguir).
Hine também trabalhou como investigador, fotografando as fábricas e as
crianças em que nelas trabalhavam. Essa pesquisa resultou em dois livros
sobre o assunto, "Child Labour in the Carolinas" (1909) e "Day Laborers Before
Their Time" (1909). Em um período de 12 meses, aproximadamente, viajou
fotografando crianças pelos Estados Unidos cobriu mais de 12.000 milhas. Em
1916, o Congresso finalmente aprovou a legislação em proteção das crianças.
52
Fig. 22 – Sadie Pfeifer, a Cotton Mill Spinner - Lancaster, Carolina do Sul, EUA, 1908 - Foto: Lewis Hine
Fig. 23 – NYC Empire State - Foto: Lewis Hine
Jacob Riis, dinamarquês (1849-1914), documentou a vida de imigrantes
e indigentes nos bairros pobres de Nova York. Acreditava que se suas
53
fotografias estivessem imbuídas em artigos com textos denunciativos poderiam
ajudar os necessitados, fazendo-os serem vistos.
Segundo Boni:
[...] Ele chocou a sociedade ao mostrar as precárias condições de
vida dos imigrantes, especialmente os latinos, que viviam em cortiços,
sem nenhuma condição de higiene. Buscou – e conseguiu – ajudá-
los. A sociedade se mobilizou e exigiu das autoridades providências
para amenizar as dificuldades dessa população. Diversos conjuntos
residenciais foram construídos, com infra-estrutura, luz e saneamento
básico, além de parques e áreas de lazer (2008, p. 06).
Riis iniciou sua carreira como repórter, mas a condição de imigrante o
aproximou da fotografia, pois sentiu necessidade de mostrar a miséria
existente, não muito longe de onde viviam as classes mais altas. Assim, teve
êxito como fotodocumentarista de denúncia social (Figs. 24 e 25 a seguir).
A fotografia de guerra e de pequenos eventos foi consagrada na época
pela imprensa, porém o mesmo destaque não foi dado ao fotodocumentarismo.
Os seus precursores publicaram fotos em álbuns, e Riis tentou que suas fotos
fossem publicadas na imprensa, mas não obteve sucesso.
54
Fig. 24 - Five Cents Lodging, Bayard Street c., 1889 - Foto: Jacob Riis
Fig. 25 - Plank for a Bed, 1890 - Foto: Jacob Riis
55
Sousa (2002, p. 08) entende que, de forma ampla, o
fotodocumentarismo pode reduzir-se ao fotojornalismo, já que ambos usam a
imprensa como meio de divulgação e têm a intenção de informar, documentar
etc. Entretanto, em sentido restrito, por vezes, distingue-se um estilo do outro
pela tipologia do trabalho. O fotodocumentarismo trabalha com projetos
fotográficos, requer mais tempo de elaboração e gestação e não precisa
obedecer a uma pauta. Quando há um determinado acontecimento, o
fotojornalista circunscreve o seu trabalho à descrição e à narração fotográfica
do acontecimento em causa, já o fotodocumentarista procura registrar em suas
fotos a forma como esse acontecimento afeta as pessoas. Sousa (1998, p. 08)
afirma que ambos os gêneros contam uma história em imagens e que o
fotodocumentarismo de compromisso social, cujos temas ainda hoje são
referenciais para o fotojornalismo, vem dar crédito à ideia de que este estilo
não é uma ramificação deste segmento, como pensam alguns pesquisadores,
mas, caracteriza-se como um estilo próprio.
Os temas que são abordados pelos fotodocumentaristas são
intemporais, abordam assuntos relacionados com a vida e que tenham
significado para o homem. Sousa complementa:
[...] Esta noção ampliou o leque de temas fotografáveis no campo do
fotodocumentalismo, já que, nos tempos em que a actividade dava os
primeiros passos, a ambição fotodocumental se direccionava
unicamente para os temas estritamente humanos. A tradição do
fotodocumentalismo social, aliás, permanece bem viva. (2002, p. 09)
Então, esse leque temático se expandiu, principalmente com as
contribuições de Hine e Riis, dando início ao nascimento do
fotodocumentarismo moderno, e posteriormente, com o trabalho dos fotógrafos
da Farm Security Administration - FSA, que foi o primeiro grande projeto de
56
fotodocumentarismo que se desenvolveu nos anos 30-40 nos Estados Unidos.
Projeto este que documentou a recuperação econômica da América durante a
implementação das políticas do New Deal6 , do Presidente Roosevelt. FSA era
um programa de ajuda financeira aos agricultores que tinham perdido suas
terras durante o período de depressão econômica. O responsável pela
administração deste projeto foi Roy Emerson Stryker (1893-1975), que reuniu
os melhores fotógrafos americanos: Walker Evans (1903-1975), Dorothea
Lange (1895-1965), Ester Bubley (1921-1998), Arthur Rothstein (1915-1985),
Russell Lee (1986-1903), Jack Delano (1914-1997), entre outros. As fotos foram
publicadas na revista Life e divulgadas por meio de exposições.
Seguem imagens de dois destes fotógrafos da FSA e um breve relato
sobre cada um deles (Figs. 26 e 27 a seguir).
Fig. 26 – Bud Fields and His Family - Hale County, Alabama, Summer, 1936 - Foto: Walker Evans
6 O New Deal ("Novo Acordo") foi o nome dado à série de programas implementados nos Estados Unidos entre 1933
e 1937, durante a presidência de Franklin Delano Roosevelt, com o objectivo de recuperar e reformar a economia norte-americana, e ajudar os prejudicados pela Grande depressão foi inspirado no Square Deal (Acordo Justo), nome dado pelo anterior Presidente Theodore Roosevelt à sua política económica. Acesso em 17/09/2011. Fonte: http://www.thinkfn.com/wikibolsa/New_Deal
57
Fig. 27 – Migrant Mother - Nipomo, California, 1936 - Foto: Dorothea Lange
Dorothea Lange foi a fotógrafa americana que mais contribuiu com
imagens para documentários do século XX, participou de diversos projetos,
inclusive em 1935, juntou-se à Farm Security Admnistration - FSA - e percorreu
vinte e dois Estados do Sul e Oeste dos Estados Unidos, elaborando imagens
que documentavam o impacto da Grande Depressão na vida dos camponeses.
Suas fotos, na maioria, mostram mulheres mergulhadas na miséria e que,
através das lentes, jamais perderam a dignidade. Dorothea Lange nasceu em
Hoboken, New Jersey, em 1895, e morreu em São Francisco, Califórnia, em
1965. ―Migrant Mother‖, de sua autoria, é a fotografia mais famosa saída da
FSA e uma das mais reproduzidas na história da fotografia, tendo sido
estampada em mais de dez mil publicações.
58
Walker Evans, fotógrafo americano, fez uma série de fotos entre 1938 e
1941. Ele fotografava escondido no metrô de Nova York, pois desde aquela
época era proibido registrar imagens sem permissão. Ficou famoso pelas
imagens que fez, que retratavam a devastação econômica e moral da grande
depressão, nos Estados Unidos, na década de 20. O autor usava a fotografia
como um manifesto contra a miséria em que viviam os agricultores americanos,
registrando o cotidiano com precisão e dignificando, apesar de tudo, a pobreza,
na qual estes agricultores viviam.
Sousa faz referência à intenção dos fotógrafos:
Por vezes, exploram um determinado frame, isto é, um
enquadramento contextualizador no processo de produção de
sentidos, como é notório nos fotógrafos do "compromisso social", que
tinham uma intenção denunciante e reformadora, que as fotos deviam
consubstanciar, atingindo mesmo os que não queriam ou não sabiam
ver. Se em Thomson esta tendência não é totalmente visível, com
Riis, Hine e o Farm Security Administration já se evidencia essa
preocupação denunciante, embora talvez um pouco constrangida no
FSA (1998, p. 30).
E é esta intenção denunciante e reformadora que traz à tona, pelo
fotodocumentarismo, uma nova motivação que a fotografia do século XX irá
propiciar. Tratava-se de conhecer o outro, saber como ele vive, o que pensa e
como vê o mesmo mundo por um ângulo diferenciado.
2.3 Fotografia antropológica
A fotografia antropológica está intrinsecamente ligada ao filtro cultural do
seu autor, que não necessariamente precisa ser um antropólogo, já que
antropologia7 tem em sua raiz ―o estudo sobre o homem‖. Podemos dizer que,
7 A Antropologia é o estudo do homem como ser biológico, social e cultural. Sendo cada uma destas dimensões por si
só muito ampla, o conhecimento antropológico geralmente é organizado em áreas que indicam uma escolha prévia de certos aspectos a serem privilegiados como a ―Antropologia Física ou Biológica‖ (aspectos genéticos e biológicos do
59
numa visão simplista do conceito de fotografia antropológica, a relação está no
fato de a imagem possuir informações visuais significativas em que um
antropólogo possa dela obter uma vasta gama de representações. Assim,
algumas fotografias podem ser de interesse antropológico sem terem sido
produzidas com essa intenção.
Para Edwards:
Basicamente uma fotografia antropológica é qualquer uma da qual
um antropólogo possa retirar informações visuais úteis e
significativas. A essência definidora de uma fotografia antropológica
não é seu assunto, mas a classificação do conhecimento ou realidade
feita pelo usuário, que a fotografia parece transmitir. (EDWARDS,
1996, p. 24)
Desta maneira, Elisabeth Edwards (1949-2010) corrobora a ideia de que
para a classificação do termo o mais importante não é se determinada
fotografia foi feita por um fotógrafo profissional ou por um antropólogo. No
caso, o que será relevante é a classificação do conteúdo existente na imagem
e, para isso, o fundamental é que a pessoa que registrou tenha conhecimento
da realidade que está fotografando, o que posteriormente transparecerá na
imagem final.
Sendo assim, Andrade propõe unir o olhar fotográfico ao olhar
antropológico (2002), quando defende a ideia de que é possível pensar a
antropologia como uma comunhão de técnicas, visões e experiências na busca
da criação e do conhecimento. A autora ressalta ainda que devemos aprender
a olhar para as diversidades culturais, independentemente de sermos ou não
antropólogos, pois ainda não sabemos como olhar para as mudanças,
desigualdades, preconceitos etc.
homem), ―Antropologia Social‖ (organização social e política, parentesco, instituições sociais), ―Antropologia Cultural‖ (sistemas simbólicos, religião, comportamento) e ―Arqueologia‖ (condições de existência dos grupos humanos desaparecidos). Além disso podemos utilizar termos como Antropologia, Etnologia e Etnografia para distinguir diferentes níveis de análise ou tradições acadêmicas. Acesso em 18/09/2011. Fonte: http://www.fflch.usp.br/da/vagner/antropo.html
60
Andrade afirma:
Foram precisos alguns anos para que eu entendesse os olhares
cruzados entre a fotografia e a antropologia. Meu processo de
percepção ao fotografar assemelha-se ao observador na antropologia
- olhar amplo e pequeno. Perceber o outro, as diferenças do outro e
registrá-las, isso sempre foi para mim uma tarefa da fotografia. O
antropólogo é um fotógrafo que escreve aquilo que vê – e muito
pouco fotografa. E a pergunta de Etienne Samain8 (1987) vem
complementar a reflexão: ―o antropólogo não pode escrever com a
imagem sobre o assunto de sua dissertação ou tese de doutorado?‖
(2002, p. 18-19).
O uso da imagem na academia e na pós-graduação é cada vez maior.
Atualmente, existem alguns núcleos de pesquisa comprometidos com os
estudos e uso de fotografias, iconografias, como fonte documental na
antropologia e em pesquisas acadêmicas.
Andrade (2002, p. 27) manifesta-se, em diversos momentos sobre o
olhar: o olhar atento, cuidadoso, meticuloso e até selvagem, e comenta uma
frase que aparecia nos muros da PUC/SP - Pontifícia Universitária Católica de
São Paulo, há alguns anos: ―ver com olhos livres‖9. Assim, quando um
pesquisador se torna participante do local pesquisado ele passa a vivenciá-lo e
pertencer a ele. O olhar selvagem é um olhar desprovido de pré-conceitos, é
um olhar de quem sabe que deve ser cauteloso, silencioso, para poder apreciar
sua caça, estando assim aberto à afetividade e às fronteiras do inconsciente e
da loucura.
Flusser também compartilha dessa ideia, quando afirma (2002, p.29):
Quem observar os movimentos de um fotógrafo munido de aparelho (ou de aparelho munido de fotógrafo) estará observando movimento de caça. O antiqüíssimo gesto do caçador paleolítico que persegue a caça na tundra. Com a diferença que o fotógrafo não se movimenta em pradaria aberta, mas na floresta densa da cultura [...].
8 Etienne Samain: antropólogo, professor do Departamento de Multimeios do Instituto de Artes da Universidade
Estadual de Campinas (Unicamp). 9 Frase presente em pichação anônima nos muros da PUC-SP. Sem data. Nota da autora.
61
O autor faz uma comparação significativa para este estudo, pois
relaciona o fotógrafo ao aparelho (no caso, a câmera) e a caça, envoltos numa
densa cultura. Esta tarefa não é fácil, pois ao fotografar, o fotógrafo avança
contra as intenções de sua cultura.
Compartilhamos da ideia de Morin, quando afirma (2008b, p. 56):
[...] embora o conhecimento permaneça inscrito em uma sociedade, em uma cultura e um tempo, ele pode buscar nessa sociedade, nessa cultura e nesse tempo, meios de considerar outras culturas, outras sociedades, outros tempos, assim como os meios de refletir sobre si mesmo sob o ponto de vista dessas outras culturas. [...]
Desta maneira além de romper com as barreiras entre as culturas, pode-
se enxergar além do tempo atual e da sociedade, transparecendo nas imagens
não apenas situações que mais tarde serão consideradas de uma determinada
época e cultura, mas também, podendo ser atemporais.
O ser humano comporta um conceito de dualidade que é defendido por
Morin como uma contradição intransponível da existência humana, e por
carregar essa dualidade, o sujeito se manifesta, ora sapiens ora demens,
mantendo assim presença da incerteza, do erro e da ilusão. Morin afirma
(2008a, p. 07): ―A loucura humana é fonte de ódio, crueldade, barbárie,
cegueira. Mas sem as desordens da afetividade e as irrupções do imaginário, e
sem a loucura do impossível, não haveria élan, criação, invenção, amor e
poesia‖. Para o autor, a afetividade nos cega e, paradoxalmente também nos
ilumina, pois entre o sapiens e o demens há uma distância perceptível que, ao
mesmo tempo, é tênue e brusca. O homo sapiens, que é o homem sábio,
razoável, complementa e contrapõe-se ao mesmo tempo ao homo demens,
que é o homem da afetividade, do mito e do delírio.
62
Analisando a relação da fotografia com a antropologia e a etnografia,
percebemos que a fronteira entre as duas é ínfima. A investigação
antropológica nasce junto com a necessidade dos fotógrafos de documentarem
o desconhecido. Freund (1974, p. 82) coloca que as pessoas deixam de ser
retratadas individualmente para se inserirem culturalmente e se reconhecerem
nas fotografias das comunidades a que pertencem, tendo a oportunidade de
conhecer também o outro.
Entendemos que a imagem fotográfica nasce da observação de uma
realidade que está contida em uma estrutura cultural, criando, com isso, a
possibilidade de uma imagem comungar com o texto na esfera antropológica,
proporcionando ao observador um melhor entendimento dos significados.
O percurso da antropologia
Após o invento da primeira fotografia, já houve muito avanço com a
evolução da técnica e da simplificação dos procedimentos. Com isso, a
fotografia passou a fazer parte importante da vida social e do cotidiano das
pessoas. Com o barateamento e a ampliação do acesso à fotografia, as
pessoas puderam ter uma visão mais autêntica da realidade. A fotografia
aproximou, então, realidades distintas e peculiaridades antes desconhecidas.
Artistas começam a fazer uso da fotografia como fonte de inspiração para as
suas criações artísticas, entre eles Man Ray10 (1890-1976). Fotógrafos
começam ir além dos retratos de famílias e fotografam cenas mais corriqueiras,
10
Emmanuel Radnitzky mais conhecido como Man Ray, nasceu na Filadélfia dia 27 de agosto de 1.890 e se tornou fotógrafo, pintor e anarquista norte-americano. Acesso em 20/09/2011. Fonte: http://www.benissimo.com.br.
63
como fez Alfred Stieglitz11 (1864-1946) ao fotografar o transporte; Eugène
Atget12, (1857-1927) com as prostitutas em Paris; e Paul Strand13, (1890-1976)
retratando em suas viagens pelo mundo diversos povos e culturas; e outros a
registrar festas populares.
Foi neste cenário que surgiu a fotografia em série, a partir de apostas de
aficionados do hipismo a Edward Muybridge (1830-1904), numa situação em
que a fotografia era testemunho da verdade. A pedido de um americano rico
que havia feito uma aposta com amigos, é solicitado a Muybridge que
retratasse a seguinte situação: quando um cavalo está a galope, há um
momento em que nenhum dos cascos toca a terra. O americano queria provar
a partir da fotografia que, em determinado instante da corrida, o cavalo ficava
mesmo com as quatro patas no ar. Então, o fotógrafo dispôs de 24 câmeras na
pista de corrida de cavalos, cada uma ligada a um fio atravessando o caminho.
A cada fio que o animal tocava durante o galope, disparava a máquina e tirava
uma foto de si mesmo. Isso contribuiu para o aparecimento do cinema, por
meio da fotografia em série.
Mais uma vez as evoluções técnicas ocorridas na fotografia vieram
trazer benefícios às pesquisas e às investigações socioculturais. As máquinas
fotográficas se tornaram mais leves e surgiram outros formatos.
11
Alfred Stieglitz, fotógrafo americano nascido em Hoboken, Nova Jersey, pioneiro no uso profissional de pequenas câmaras portáteis e o primeiro fotógrafo a ter suas obras no acervo de importantes museus de Boston, Nova York e Washington. Acesso em 15/08/2011. Fonte: http://www.dec.ufcg.edu.br/biografias/AlfredSt.html 12
Eugéne Atget nasceu na França em 12 de fevereiro de 1856 ou 57, não se sabe ao certo. Ficou órfão ainda criança e foi criado e educado por um tio. [...] Em 1889 dedicou-se a pintura e acabou desenvolvendo sua capacidade observotória tornando-se fotógrafo,resolvendo desmascarar a realidade. Acesso em 15/08/2011. Fonte: http://www.riguardare.com.br/riguardare/atget.html 13
Fotógrafo norte-americano, Paul Strand nasceu em 1890, em Nova Iorque. Estudou na Ethical Culture School e em 1907 juntou-se a um clube de fotografia, onde freqüentou aulas com Lewis Hine. Acesso em 15/08/2011. Fonte: http://fotoclubef508.wordpress.com/2009/04/26/fotorio-2009-paul-strand/
64
Os pioneiros que fizeram uso dessas técnicas mais evoluídas foram
Margareth Mead (1901-1978) e Gregory Bateson (1904-1980), que observaram
por muito tempo a maneira de ser e a cultura do povo de Bali entre 1936 e
1938. Seus objetivos eram claros: não queriam pesquisar só os costumes e
também o caráter dos balineses, como ―as pessoas vivem, comportam-se,
comem, dançam, dormem, entram em transe e incorporam essa abstração à
qual chamamos de cultura‖ (BECCKER, 1996 apud ANDRADE, 2002, p. 71).
Estes fotógrafos registraram 25 mil fotos e 6 mil metros de filme, porém
declararam nos resultados das pesquisas que primeiramente ficaram por muito
tempo observando, anotando e fazendo descrições, mas concluíram
posteriormente que as descrições verbais não eram suficientes para traduzir
imageticamente o que eles queriam. O resultado deste trabalho está no livro
com 759 fotografias, intitulado Balinese Character. A Photographic Analysis
publicado em 1942 pela New York Academy of Sciences. Este material foi uma
das únicas obras consideradas de antropologia visual que fez uso da fotografia
de forma central. Os autores trataram a imagem como forma narrativa
indispensável às suas pesquisas (Andrade, 2002, p. 71).
Fotógrafos como Guido Boggiani (1861–1901), Claudia Andujar (1931),
Rosa Gauditano (1955), entre outros, desenvolveram diversos trabalhos de
pesquisa e projetos riquíssimos entre os índios e em outras culturas.
Relatamos a seguir, aspectos relevantes sobre cada um deles:
Guido Boggiani 14 observou de forma participativa e registrou a aldeia
14
Guido Boggiani, era italiano, nasceu em Novarra, foi antropólogo, etnógrafo, pintor, fotógrafo e aventureiro. Suas últimas imagens foram tiradas no Alto do Paraguai, em 1902. Acesso em 11/06/2011. Fonte: http://www.forumfoto.org.br/pt/tag/guido-boggiani/
65
dos Kadiwéu15 em 1934. Podemos notar a espontaneidade e a segurança dos
índios no belo resultado de suas fotos. Apesar de os mesmos permanecerem
imóveis ao serem retratados, estavam inseridos em seu habitat, e tanto as
pinturas como as vestes contribuíam para a naturalidade da imagem. Apenas o
que os incomodava ainda era o fato daquele instrumento de roubar almas, a
máquina fotográfica, estar apontada para eles (Figs. 28 e 29).
Fig. 28 – Caduveo menina - Foto: Guido Boggiani
15
A primeira notícia que se tem dos Kadiwéu (família linguítica: Guaikurú) data do século XVI, proveniente de uma expedição européia que adentrou a região chaquenha à procura de metais preciosos no interior do continente. Eles estão no Mato Grosso do Sul e contam 1.346 (Funasa, 2009). Acesso em 11/06/2011. Fonte: http://pib.socioambiental.org/pt/povo/kadiweu/264
66
Fig. 29 - The milanese - Foto: Guido Boggiani
Andrade (2002, p. 58-61) afirma: ―O olhar de Boggiani eternizou a alma
indígena, a cultura, a arte na pele dos Kadiwéu, atuando como antropólogo,
fotógrafo e artista. Mas será mesmo que a câmera não pode também captar a
alma para melhor transmitir e sentir uma comunidade?‖
Desde o início da história da fotografia a preocupação era que a
fotografia tivesse alguma ligação com bruxaria, com o fato de que no momento
do click a alma seria roubada. Dubois (1993, p. 228) define esse sentimento
angustiante de passar para o outro lado no momento da pose fotográfica,
suscitando ao modelo uma onda de medo, pois não se sabe o que esperar e
acreditando, ele próprio, numa presença incerta, flutuante, virtual, em que lhe
seria roubada a alma.
67
Claudia Andujar16 fotografou várias etnias, mas foi entre os índios
Yanomami17 que permaneceu mais tempo, desenvolveu diversas pesquisas e
os retratou num período de quase 30 anos. Eles se localizam em três lugares:
Amazonas, Roraima, Venezuela. Entre 1972 a 1974 realizou um trabalho mais
intenso, quando ganhou uma bolsa de estudos da Fundação Guggenheim,
apegou-se demais a eles e praticamente ficou morando com os índios, saia
apenas para fazer as revelações dos filmes. Como sua presença se prolongou
na Amazônia, isso incomodou muito os militares, pois era época de repressão.
Nesse mesmo período, Cláudia iniciou um projeto de documentação sobre os
índios Yanomami, o que a impulsionou a participar entre 1978 e 1992, da
Comissão pela Criação do Parque Yanomami. Criou a partir desta experiência
um acervo de cem mil imagens (entre elas Figs. 30 e 31 a seguir), que resultou
num trabalho cheio de significados, tanto com publicações de suas fotografias
nacional e internacionalmente, como a publicação de diversos livros. (BONI,
2010, p.260-261). Entre eles: Amazônia, em parceria com George Leary Love
(1937-1995), pela editora Praxis, em 1978; Mitopoemas Yanomami, pela
Olivetti do Brasil, em 1979; Missa da Terra sem Males, pela editora Tempo e
Presença, em 1982; e Yanomami: A Casa, a Floresta, o Invisível, pela editora
DBA, em 1998, entre outros. Em 2005, é lançado o livro A Vulnerabilidade do
Ser, pela editora Cosac & Naify (Fonte: http://www.itaucultural.org.br).
16
Claudia Andujar nasceu na Suíça e, após a Segunda Guerra Mundial, emigrou para Nova York, onde começou a interessar-se por pintura e fotografia. Estabeleceu residência no Brasil em 1955 e passou a fotografar populações isoladas no litoral do estado de São Paulo. Acesso em 20/08/2011. Fonte: http://editora.cosacnaify.com.br/Autor/16/Claudia-Andujar.aspx 17
O etnônimo "Yanomami" foi produzido pelos antropólogos a partir da palavra yanõmami que, na expressãoyanõmami thëpë, significa "seres humanos". Essa expressão se opõe às categorias yaro (animais de caça) eyai (seres invisíveis ou sem nome), mas também a napë (inimigo, estrangeiro, "branco"). Acesso em 20/08/2011. Fonte: http://pib.socioambiental.org/pt/povo/yanomami/570
68
Fig. 30 – Yanomami, 1974 - Foto: Claudia Andujar
Fig. 31 – Yanomani, 1981 - Foto: Claudia Andujar
69
Essa renomada artista se naturalizou brasileira em 1955, tem hoje 80
anos e ainda trabalha como membro e fotógrafa da Galeria Vermelho18 em São
Paulo. Em entrevista a Paulo Cesar Boni (2010), quando indagada sobre como
ela gostaria de ser lembrada, respondeu: ―Gostaria de ser lembrada como uma
pessoa que vai até o fim quando acredita em algo‖ (p. 253). Ao final, Boni pediu
para fazer uma fotografia para ilustrar a entrevista, mas em resposta Andujar
disse:
Como sempre defendi a causa yanomami – e os considero meus parentes – mandarei para você uma fotografia antiga em que apareço ao lado de uma yanomami. Creio que essa fotografia seja a melhor forma de dizer aos seus leitores quem é Claudia Andujar e a causa a que ela se dedica (BONI, 2010, p. 253).
Segue abaixo esta imagem que representa belissimamente o trabalho de
Claudia Andujar (Fig. 32).
Fig. 32 - Claudia Andujar com índia Yanomami, década de 70 - Fotografia: Carlo Zacquini
18
Fruto das idéias de Eliana Finkelstein e Eduardo Brandão, a Galeria Vermelho foi inaugurada em 2002 após um intenso processo de re-configuração e restauro das três pequenas casas localizadas na vila de número 350, da Rua Minas Gerias, em Higienópolis (SP). É um dos principais pontos de criação e divulgação de arte contemporânea no Brasil. Acesso em 11/09/2011. Fonte: http://www.galeriavermelho.com.br/pt/galeria
70
Rosa Gauditano19 fotografa índios há mais de dez anos, sua produção
intensificou-se no final da década de 80 (Figs. 33 e 34 a seguir). Ela afirma que
o interesse pelo assunto surgiu quando foi fazer a cobertura jornalística em
1989 em Altamira, Pará, desde então não parou mais de documentar o que
chamamos genericamente de índios brasileiros, mas que na verdade são mais
de duzentas etnias falando cerca de cento e setenta línguas diferentes entre
eles.
Fig. 33 – Criança Kayapó - Foto: Rosa Gauditano
19
Rosa Gauditano, nasceu na capital paulista em 1955, tendo estudado jornalismo nas faculdades Integradas Alcântara Machado/Cásper Líbero e fotografia na Fundação Armando Álvares Penteado. Começou a trabalhar profissionalmente em 1977, para o jornal Versus, do qual se tornou editora de fotografia no ano seguinte. Acesso em 11/09/2011. Fonte: http://www.funarte.gov.br/brasilmemoriadasartes/acervo/infoto/biografia-de-rosa-gauditano/
71
Fig. 34 – Índia Yanomami - Foto: Rosa Gauditano
O antropólogo é um observador integrante do objeto de estudo, e assim
como na fotografia, as tensões entre dualidades sempre existiram na
antropologia, e muitas vezes, por causa delas, soluções foram geradas. O
corpo e a alma, o uno e o diferente, a neutralidade e a participação são
confrontos que acompanham a prática da antropologia.
2.3.1 Fotografia etnográfica
A etnografia estuda os grupos da sociedade, suas características
culturais, sociais e antropológicas. Para que uma fotografia seja considerada
uma fotoetnografia ela precisa ser utilizada como instrumento principal na
realização de um trabalho etnográfico.
Morin coloca que as condições socioculturais do conhecimento, mesmo
sendo de naturezas distintas, estão ligadas por um nó górdio: ―[...] as
72
sociedades só existem e as culturas só se formam, conservam, transmitem e
desenvolvem através das interações cerebrais/espirituais entre os indivíduos‖
(2008b, p. 19). Fato este que está presente na fotografia etnográfica, pois este
tipo de fotografia tem caráter peculiar no resgate de informações relacionadas
a diferentes grupos da sociedade, é usado em diversos tipos de publicações,
pesquisas científicas, e é objeto de estudo de diversos trabalhos acadêmicos.
Esse segmento também contribuiu para que houvesse um resgate de
informações relacionadas aos diferentes tipos de etnias.
Os parâmetros adotados na realização de um trabalho fotoetnográfico
seguem a linha da antropologia visual, que se designa por vezes também como
antropologia da imagem ou antropologia visual e da imagem, que se dedica ao
estudo e à produção de imagens, nas áreas da fotografia, cinema e novas
mídias.
A cultura e os costumes das etnias estão constantemente em
transformação. Um exemplo disso é a prática de Rosa Gauditano em suas
imagens junto aos índios Xavantes:
Uma das vantagens do material fotoetnográfico é que ele expõe ao receptor a etnia em seu momento atual, bem como suas aculturações e transformações. Por exemplo, ao presenciar a exposição fotoetnográfica sobre os índios Xavantes, da fotógrafa Rosa Gauditano, não se vê indígenas totalmente nus. No imaginário social, no entanto, ainda persiste a idéia de que os índios vivem nus. Esse imaginário se deve à educação escolar, à televisão e aos registros fotográficos mais antigos, que construíram o significado de como eram e como são algumas comunidades indígenas. Nas fotografias da comunidade retratada por Rosa Gauditano se vê índios com shorts e índias com sutiãs. (BONI e MORESCHI, 2007, p. 141-142)
Essa percepção reforça a importância da fotoetnografia nas pesquisas
de campo, e faz emergir as transformações culturais da época atual com
relação aos esteriótipos com os quais convivemos e também, desmistificando
alguns. As fotos a seguir, (Figs. 35 e 36) retratam a prática de Gauditano, em
73
que os índios participam de rituais, porém, já com vestimentas que não lhes
pertencem.
Fig. 35 – Da-ño're: perfomance coletiva de canto e dança - Foto: Rosa Gauditano
Fig. 36 – Cerimonial de Casamento - Foto: Rosa Gauditano
Outro fator de grande acuidade, como nos alerta Achutti (1997, p. 03-
04), refere-se à preparação e organização do material fotoetnográfico. O autor
74
coloca que o fotógrafo, antes de iniciar o seu projeto, deve fazer uma
planificação, organizando e elaborando todos os tópicos importantes, desde o
momento da elaboração até o produto final (exposição, livro etc.), pois a
linguagem apresentada deve ser acessível para que o leitor entenda e absorva
as informações contidas nas imagens. Boni e Moreschi (2007, p. 141)
concluem: ―As fotografias no resultado final devem formar um todo‖.
Como já nos apresentou Petraglia (2008, p. 59), ―o todo é uma unidade
complexa. E o todo não se reduz à mera soma dos elementos que constituem
as partes. É mais do que isto, pois cada parte apresenta sua especificidade e,
em contato com outras, modificam-se as partes e também o todo‖. Desta
maneira, a afirmação apresentada por Boni e Moreschi vem legitimar o que nos
apresenta a teoria da complexidade em relação à importância do todo, para a
realização e o planejamento de um projeto fotográfico.
A qualidade do material fotográfico é de suma importância e o etnólogo
deve ter conhecimento de domínios da técnica fotográfica, bem como o
fotógrafo deve ter conhecimento etnográfico da comunidade pesquisada.
Quanto melhor o resultado imagético, mais rico em detalhes se apresentará
este material para análise nas pesquisas. É possível também fazer a análise de
um material realizado por um fotógrafo que não estava envolvido no momento,
mas que possuía um material de interesse para a referida pesquisa.
Darbon corrobora essa idéia:
Observar-se-á evidentemente que sua captação da imagem no quadro de suas pesquisas não se limita aos documentos que ele mesmo produz por ocasião de sua presença no campo: pode também aplicar-se à análise das imagens produzidas por outros (1998, p. 103).
Neste caso o fotógrafo terá suas imagens analisadas por um
pesquisador, o que facilitará, caso o fotógrafo tenha se distraído ou perdido
75
algum detalhe que será revelado na imagem, fazendo que seja desnecessário
ao pesquisador voltar ao campo.
Boni e Moreschi (2007) nos trazem informações sobre o início da
fotoetnografia, revelando que os primeiros indícios surgiram por volta de 1870
com John K. Hillers (1843-1925), que foi contratado pelo Departamento de
Etnologia Americana. Ele registrou várias tribos indígenas dos Estados Unidos.
Alice Flectcher (1838-1923), antropóloga, registrou em 1880 os índios Omahas
e os Sioux, em Dakota. Franz Boas (1858-1942) realizou em 1886 um trabalho
de campo, que durou 40 anos para ser finalizado, com o grupo Kwakiutl. Outros
apareceram no caminhar deste percurso, mas foi Pierre Édouard Léopold
Verger (1902-1996) que ficou conhecido mundialmente.
Pierre Verger nasceu em Paris em 1902. Depois dos 30 anos aprendeu
um ofício que o encantou: a fotografia, e descobriu a paixão pelas viagens.
Após aprender técnicas básicas, adquiriu a sua primeira Rolleiflex (Figs. 37 e
38 a seguir).
76
Fig. 37 – Fotógrafo francês Pierre Verger
Fig. 38 – Câmera Rolleiflex - Foto: Ricardo MIlani
77
Passou 15 anos viajando pelo mundo em busca de civilizações que
estavam se extinguindo, sobrevivendo exclusivamente da fotografia. Ele às
vezes negociava suas fotos com jornais, agências e centros de pesquisas.
Suas fotos foram posteriormente publicadas em periódicos internacionais (Figs.
39 e 40 a seguir).
Em Paris, realizou diversos trabalhos e parcerias com fotógrafos
renomados, como Henri Cartier Bresson (1908-2004) e Robert Capa (1913-
1954). Trabalhou no museu do Trocadero, onde se tornou responsável pelo
laboratório de revelação, e foi lá que acompanhou os resultados de diversas
expedições, entre elas Dakar-Djibouti (1931-1933), conhecendo então vários
membros desta: Marcel Griaule (1898-1958), Germaine Dieterlein (1903-1999),
André Schaefner (1895-1980), Jacques Faublée (1912-2003), Denise Paulme
(1909-1998), Alfred Métraux (1902-1963), entre outros. Esse provavelmente foi
o seu primeiro contato com um trabalho etnográfico e de fotografias
etnográficas.
Fig. 39 – Integrante da exposição ―A Paris de Verger‖ - Foto: Pierre Verger
78
Fig. 40 - Campo de Marte, no centro de Paris - Foto: Pierre Verger
Paris se tornou, para o fotógrafo, um lugar onde revia amigos e fazia
contatos para novas viagens. Trabalhou para as melhores publicações da
época, mas estava sempre de partida: "A sensação de que existia um vasto
mundo não me saía da cabeça e o desejo de ir vê-lo me levava em direção a
outros horizontes", revela Verger.
As mudanças começaram a acontecer no dia em que Verger
desembarcou na Bahia, em 1946 para passar algumas semanas e acabou
permanecendo por quase 50 anos, instalando-se em Salvador. Enquanto a
Europa vivia o pós-guerra, em Salvador tudo era tranquilidade. Foi seduzido
pela hospitalidade e riqueza cultural da cidade, onde sempre preferia a
companhia do povo e os lugares mais simples. Os negros estavam em toda a
parte, monopolizando a cidade e sua atenção, tornando-se então personagens
79
para as suas fotos. Quando Verger teve contato com o candomblé acreditou ter
encontrado a fonte da vitalidade baiana e tornou-se um estudioso do culto aos
orixás (Figs. 41 e 42 a seguir).
Fig. 41 – Integrante da exposição ―A Bahia de Verger‖ - Foto: Pierre Verger
Fig. 42 – Orixás de Pierre Fatumbi - Uma iaô de Esu da Bahia - Foto: Pierre Verger
80
O seu envolvimento foi tão intenso como pesquisador africanista que lhe
rendeu bolsas de estudos, convites para lecionar em universidades e até um
título de doutor. O livro de Jean-Pierre Le Bouler
intitulado ―Pierre Fatumbi Verger: um homem livre‖ descreve um pouco desta
trajetória:
Em 1948, depois de sua iniciação no candomblé baiano, viaja para a África por intermédio de Théodore Monod, então diretor do Institut Français d‘Afrique Noire (IFAN) para estudar os cultos religiosos africanos. Desta viagem resultaram suas primeiras publicações como pesquisador africanista e sua profunda integração na cultura iorubana através da religião, tendo até sido rebatizado de Fatumbi (renascido pela graça de Ifá) em função de sua iniciação como babalaô (pai do segredo). Desde sua iniciação em Ifa em 1952, até seu falecimento, Verger realizou muitas viagens para a África e França, onde fazia suas pesquisas e trabalhava para instituições, como por exemplo, Universidade de Ifé na Nigéria (como professor convidado), Museu Nacional da Nigéria e o Centre Nacional de la Recherche Scientifique em Paris (como diretor de pesquisa) (ROLIM,2002).
Em 1966 a Universidade Sorbonne, na França conferiu-lhe o título de
doutor ao defender uma tese, na qual foi orientado por Paul Mercier. Seu
trabalho, que teve início praticamente como autodidata, acabou por ser
reconhecido internacionalmente. Promoveu durante muitos anos um intenso
intercâmbio entre o Brasil e a África, levando e trazendo imagens, objetos e
saberes. Começou a trabalhar na organização do Museu Afro-Brasileiro, em
Salvador, em 1973, e em 1979 a Universidade Federal da Bahia outorgou-lhe o
título de Professor Adjunto. Verger contribuiu ativamente para toda a
legitimação da ―tradição africana‖ no Brasil, principalmente em Salvador. Tinha
duas grandes preocupações em seus últimos anos de vida: garantir a
sobrevivência do seu acervo fotográfico e de suas pesquisas, e disponibilizar
este material a um maior número possível de pessoas. Em 1988 transformou a
sua própria casa num centro de pesquisa e criou a Fundação Pierre Verger
(FPV), em que foi mantenedor, doador e presidente. Em 1996, faleceu aos 93
81
anos de idade, deixando um acervo aproximado de 62.000 negativos
fotográficos e uma linda história de vida.
Ao finalizar este capítulo, já podemos ter uma noção do gênero que mais
se aproxima à Fotografia Cultural, no caso fotografia antropológica. No próximo
capítulo essas ligações ficarão mais claras.
82
3 ENTRE A ARTE E A CIÊNCIA
A ciência é expressão da cultura. É difícil definir suas fronteiras.
Ilya Prigogine
Ah! Esses falsos contrários! Guerra e Paz! Razão e paixão!
Sujeito e objeto! Não existe nada disso. Friedrich Nietzsche
Este capítulo tratará de arte e ciência e nele apresentaremos as
definições de cultura humanística e cultura científica, bem como suas relações
e interligações com a fotografia. Vale, aqui, destacar que, algumas dessas
ideias foram apresentadas, de maneira introdutória no capítulo três da
dissertação de mestrado, intitulada ―A estética do olhar: O ensino da fotografia
sob o prisma do pensamento complexo‖, de nossa autoria20.
3.1 As duas culturas
Quarenta anos atrás, o numero de cientistas interessados na física de
estado sólido e na tecnologia da informação não passava de poucas
centenas. Era uma “flutuação”, quando comparado às ciências como
um todo. Essas disciplinas hoje se tornaram tão importantes que têm
consequências decisivas para a história da humanidade.
Ilya Prigogine
20
VIEIRA, Nancely C. ―A Estética do Olhar: O ensino da fotografia sob o prisma do pensamento complexo.
Dissertação (Mestrado em Educação) – Centro Universitário Nove de Julho, São Paulo. 2006.
83
A citação de Prigogine ilustra de forma coerente este subcapítulo. Ele
escreveu uma carta às futuras gerações (PRIGOGINE, 2009, p. 11). O autor
menciona que a escreveu com humildade, pois seu trabalho é no domínio da
ciência e não da humanidade. Prigogine (2009, p. 13) pretende com seus
argumentos lutar contra a resignação ou impotência: ―[...] As recentes ciências
da complexidade negam o determinismo; insistem na criatividade em todos os
níveis da natureza. O futuro não está dado‖.
Cultura científica e cultura humanística: dois sistemas, dois estilos, duas
irreconciliações. Contra isso tudo é que Prigogine se insurge com audácia e
deliberação. Essas duas culturas precisam se reconciliar, para que o
pensamento volte a considerar a natureza e a cultura sem dualidades e
oposições.
A expressão ―duas culturas‖ foi criada em uma conferência de Charles
Percy Snow em Cambridge (1959), para apontar diversidades entre cientistas e
não cientistas. O autor apresentou suas ideias em sua palestra intitulada
―Rede‖. Ele falou sobre a falta de comunicação entre as humanidades (arte,
imagem, literatura, música) e as ciências (tecnologias científicas). Suas
palavras causaram grande impacto na época, gerando a discussão, que
perdura até hoje, acerca das necessidades da educação na difusão do
conhecimento científico.
Num pólo os literatos; no outro os cientistas e, como mais representativos, os físicos. Entre os dois, um abismo de incompreensão mútua – algumas vezes (particularmente entre os jovens) hostilidade e aversão... Cada um tem uma imagem curiosamente distorcida do outro. [...] Os não cientistas tendem a achar que os cientistas são impetuosos e orgulhosos [...] têm a impressão arraigada de que superficialmente os cientistas são otimistas, inconsequentes da condição humana. Por outro lado, os cientistas acreditam que os literatos são totalmente desprovidos de previsão. [...] De um lado e de outro, existem alguns que são inteiramente infundados. (SNOW, 1995, p. 21-22)
84
Snow era cientista e escritor, transitando invariavelmente entre as duas
áreas, ambas com valores de similar importância e inteligência, porém com
profundo distanciamento entre elas. O autor coloca de maneira decisiva a
contraposição de dois pólos. De um lado, a incerteza; do outro, a exatidão.
Morin (2003b) corrobora esta ideia, enfatizando as contribuições da
cultura das humanidades para o estudo e compreensão da condição humana
que se coloca como elemento fundamental no paradigma da complexidade. No
que diz respeito à dualidade das culturas, Morin afirma:
Dotado de curiosidade onívora, de um lado pelos fatos, pelos fenômenos, pelos acontecimentos, de outro pelos problemas ditos filosóficos e pelas ideias, sempre circulei do empírico ao teórico, do antropológico ao contemporâneo e da cultura humanística à cultura científica (MORIN, 2003b, p. 44).
O autor destaca a relevância em não se manter encerrado numa única
perspectiva, estabelecendo relações entre os diversos saberes, para que o
diálogo entre eles se modifique e/ou complemente, fazendo emergir daí um
novo tecido complexo em que a trama entrelaça os fios das culturas.
A cultura humanística floresceu desde o renascimento até o século XVIII,
é antropocentrada, preocupa-se com a situação do homem no mundo, com o
bem, com o mal e com a sociedade. Até o final do século XVIII, o conhecimento
sobre o homem e o mundo era limitado e inteligível. Os saberes eram
conclusivos e fechados e os limites entre literatura e filosofia eram tênues e
estanques. A filosofia tinha uma linguagem mais esotérica, incapaz de dar
respostas a seus próprios questionamentos e também ainda não estava
fechada na instituição universitária.
Já a cultura científica desenvolveu-se por meio de rupturas, não só
determinando um corte epistemológico entre filosofia e ciência, ou seja, uma
85
quebra nos princípios daquelas culturas que já eram donas da verdade
absoluta, mas também promovendo uma ruptura ontológica entre ambas, o que
significa uma diferenciação de entendimento e atitude no cerne do ser humano.
Diferentemente da cultura humanística, que é uma cultura geral, a
cultura científica é de especialização. O espírito pode associar, com clareza, os
conhecimentos da cultura humanística, mas não os da científica. E é o
crescimento exponencial dos conhecimentos que caracteriza a cultura
científica. Estes conhecimentos ficam fechados em disciplinas e inacessíveis
ao leigo, e o espírito honesto – homem puro –, que antes assimilava com
facilidade a cultura humanística, agora não o faz mais.
A grande separação entre as duas culturas, iniciada no século XIX e
agravada no século XX, desencadeou sérias consequências para ambas.
3.2 Fotografia e as duas culturas
A riqueza da fotografia reside, de facto, no que nela não existe, mas que nela
é projectado e fixado por nós.
Edgar Morin
Para Morin, o que realmente se projeta na fotografia não é a realidade,
mas um retrato dela e, sendo a fotografia uma possibilidade de
autoconhecimento, são essas conexões entre real e imaginário que dão ao ser
humano a opção de perceber-se.
A fotografia é um elemento que possuí de maneira intrínseca a presença
das culturas científica e humanística; nela não existe cisão entre as duas, um
86
fator não se desprende do outro. A presença destas culturas transparece na
fotografia, tendo o receptor consciência ou não deste fato.
Para ficar mais clara a relação da fotografia com as duas culturas,
usaremos o entendimento da iconografia e da iconologia.
O prefixo de iconografia provém do grego eikon e significa imagem; seu
sufixo graphia, também proveniente do grego, significa escrita ou descrição.
Panofsky (1979, p. 53) diz que ―A iconografia é, portanto, a descrição e
classificação das imagens [...]‖ e que ela auxilia no estabelecimento de datas,
origens e até na autenticidade de uma imagem; porém, ela não elabora uma
interpretação sozinha nem tem esta pretensão, situando-se mais no nível da
descrição do que no da interpretação.
Já a iconologia, que tem o mesmo prefixo, difere pelo significado do
sufixo, que indica a ideia de estudo. Ao serem absorvidos pela iconologia,
mecanismos técnicos como fotometria, foco, tecnologia em geral, nos
direcionam a possíveis e novas interpretações e abrem espaços para a criação
de reflexões interpretativas influenciadas por diferentes contextos sociais do
interpretador.
Panofsky (1979, p. 54) afirma:
Iconologia, portanto, é um método de interpretação que advém da síntese mais do que da análise. E, assim como a exata identificação dos motivos é o requisito básico de uma correta análise iconográfica, também a exata análise das imagens, das estórias e alegorias é o requisito essencial para uma correta interpretação iconológica [...].
Quando o autor associa a palavra síntese à iconologia ele se refere a um
tipo de interpretação que requer ―algo mais‖ que conceitos ou fontes literárias.
Digamos que quando falamos sobre a iconografia aproximamo-nos da
cultura das ciências, em que se pode fazer uma análise do documento visível,
87
que é quando nos referimos a uma imagem analógica que passou por todo um
processo técnico, foi impressa no papel fotográfico ou digital e será observada
por meio de algum tipo de visor. Esta análise encontra subsídios no
pensamento complexo e nos elementos constitutivos apresentados por Kossoy
(2001, p. 38) para a realização de uma fotografia: o assunto, o fotógrafo e a
tecnologia; as coordenadas de situação: espaço e tempo; e o produto final: a
fotografia. Porém, teríamos de dividir esses elementos constitutivos em dois
blocos:
Cultura humanística – ICONOLOGIA
Assunto - tema escolhido, fragmento do mundo exterior (natural, social, etc.).
Fotógrafo - autor do registro, agente e personagem do processo.
Espaço - geográfico, local onde se deu o registro.
Tempo - cronológico, época, data, momento em que se deu o registro.
Cultura científica – ICONOGRAFIA
Tecnologia - materiais fotossensíveis, equipamentos e técnicas empregados
para a obtenção do registro diretamente pela ação da luz, coordenadas de
situação.
Presença em ambos: PRODUTO FINAL
Fotografia - a imagem, registro visual fixo de um fragmento do mundo exterior,
conjunto dos elementos icônicos que compõem o conteúdo e seu respectivo
suporte.
88
Os componentes analisados por Kossoy (2001, p. 38), que constituem
partes do processo do registro fotográfico, são interligados e unos em sua
ocorrência: ―sua unicidade será sua condição‖.
Desta maneira, percebemos o quanto a fotografia é um elemento de
religação entre as duas culturas, pois o que realmente deu propriedade à
fotografia não foram os químicos ou a câmera utilizada, mas o que de nós
existe nela.
Outro viés que podemos seguir para descrever um pouco mais a relação
da fotografia com essas duas culturas seria refletindo sobre dois fatores
presentes na imagem: o real e o imaginário.
Este processo de construção de realidades está em conflito com a
realidade objetiva e material da fotografia. Há uma realidade que se vê e outra
que se imagina. Kossoy (2002b, p. 46-47) apresenta um entendimento de duas
realidades:
[...] a realidade que se imagina: a primeira realidade (a do fato passado), recuperado apenas de maneira fragmentada por referências (pleno de hiatos) ou pelas lembranças pessoais (emocionais), [...] que relacionamos aqui à cultura humanística e à iconologia; [...] a segunda realidade (a que se inscreve no documento, a representação) – através de nossos filtros culturais, estético/ideológicos [...].
Dubois (1993) apresenta-nos uma análise em três linhas gerais sobre as
diversas posições defendidas no decorrer da história por teóricos e críticos da
fotografia a respeito do princípio de realidade presente na imagem e sua
relação com o referente. As linhas são as seguintes: a fotografia como espelho
do real, como transformação do real e como traço do real.
Na primeira, ele atribui esse princípio de realidade à semelhança
existente entre a foto e seu referente, como um ato mimético por essência. Na
89
segunda, este princípio foi designado como impressão ou efeito. Tentou-se
demonstrar também que esta imagem não era apenas um espelho fotográfico e
sim neutro, passível de análises, interpretações e até de transformação do real.
Na terceira e última linha, como traço do real, constatamos que a fotografia
difere dos outros modos de representação, pois segundo Dubois (1993, p. 26):
―[...] subsiste apesar de tudo na imagem fotográfica: um sentimento de
realidade incontornável do qual não conseguimos nos livrar [...]‖.
Mesmo tendo consciência da existência de diferentes códigos numa
fotografia, ao estarmos diante de uma não deixamos de crer na realidade que
representa.
Morin (1997, p. 189) entende que, quando tratamos de ficção ou de uma
irrealidade imaginária, existe aí uma camada muito fina da imagem objetiva.
Tudo dependerá da resistência ou intransigência do real em relação ao
imaginário que o ser humano emana.
90
4 INTROSPECÇÃO: OLHARES E DESCOBERTAS
Meu interesse pela Fotografia adquiriu uma postura mais cultural.
Roland Barthes
Neste capítulo apresentaremos nosso conceito de Fotografia Cultural,
por meio de pesquisas e descobertas. As imagens apresentadas e analisadas
individualmente e nas séries fotográficas exemplificam nosso objeto por meio
de uma linguagem não verbal.
4.1 Fotografia Cultural
A Fotografia Cultural pode ser definida a partir de diversos olhares e
compreensões, não ficando restrita a um único conceito, podendo deixar esta
definição apresentar-se como elemento integrador das culturas humanística e
científica, levando em conta a ética como perspectiva desta religação.
Todo olhar sobre a ética deve perceber que o ato moral é um ato individual de religação; religação com o outro, religação com uma comunidade, religação com uma sociedade, no limite, religação com a espécie humana. (MORIN, 2005, p. 21)
Para o autor, é dentro desta harmonia que se busca desenvolver uma
ética de solidariedade numa comunidade, proporcionando, assim, aos sujeitos
um comportamento fraterno. Existe uma fonte individual da ética que leva o
sujeito à amizade e ao amor, fazendo com que este tenha uma posição
altruísta.
91
Para ficar mais clara a posição da ética nessa religação,
apresentaremos a seguir as abordagens de Morin em relação à autoética e à
antropoética.
A autoética é uma ética que envolve o ―pensar‖, o pensar bem e o
pensar-se; podemos dizer que ela é uma ética de si para si e,
consequentemente, isso se espelha no outro. Para o autor, ―a auto-ética
constitui uma verdadeira cultura psíquica, mais difícil e necessária que a cultura
material e física‖ (MORIN, 2005, p. 93). Desta maneira, o sujeito constitui ao
mesmo tempo um princípio de pensamento e uma necessidade ética, sendo
imprescindível a autoanálise.
Ao se autoanalisar o sujeito faz um exercício de introspecção e ao se
auto-observar ele passa a ter uma nova consciência de si, permitindo-se uma
descentralização de si mesmo. Morin (2005, p. 95) diz: ―A auto-análise é uma
exigência primordial da cultura psíquica; deveria ser ensinada desde o começo
do ensino fundamental para se tornar uma prática tão costumeira quanto a
cultura física‖. E aqui se encontra um ponto essencial da ética como elemento
de religação que mencionamos e que está presente na Fotografia Cultural,
quando esta desperta no spectador a autoanálise dos sujeitos e a autocrítica.
A antropoética é o modo ético de assumir o destino humano, sendo
mediada pela autoética. Para Morin (2005, p. 159), algumas características
são:
[...] assumir uma relação dialógica entre nossa razão e nossos mitos, nossa razão e nossas paixões; viver tanto quanto for possível de amor poesia num mundo prosaico; reconhecer no outro, ao mesmo tempo, a diferença e a identidade; saber que não existe piloto automático em ética, a qual sempre enfrentará escolha e aposta e sempre necessitará de uma estratégia.
92
O autor evidencia a antropoética e exemplifica na citação anterior a ética
do universal e a ética do singular, reconhecendo no outro a diferença e a
identidade, como também a relação dialógica entre razão, mito e paixão. A
antropoética se faz presente nos desenvolvimentos da era planetária,
colocando os seres humanos em comunicação e interdependência, como que
fazendo emergir para a espécie humana uma nova comunidade de destino, um
novo direcionamento.
A Fotografia Cultural evidencia e propicia estas religações, como
exemplificado nas imagens a seguir, (Figs. 43 e 44), que foram feitas
desenvolvendo uma relação de respeito e ética, quando nos propusemos a
entrar nessa comunidade e registrar tais cenas. A comunidade chama-se Nova
Esperança, está localizada em São Miguel do Gostoso (RN) e faz parte do
Projeto Assentamento Incra.21
Fig. 43 – Garoto na Comunidade Nova Esperança, RN, Brasil, 2010 - Foto: Nan Huminhick
21
O Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) INCRA é um órgão federal brasileiro que administra o processo de colonização e reforma agrária do país. Acesso em 30/04/2012. Fonte: <http://www.brasilescola.com/brasil/incra-x-ibama.htm>.
93
Fig. 44 – Casal em moradia do assentamento em São Miguel do Gostoso, RN, Brasil, 2010 - Foto: Nan Huminhick
Entendemos por Fotografia Cultural uma imagem que articula aspectos
objetivos da técnica e subjetivos da emoção. Trata-se de uma imagem que ao
mesmo tempo articula conscientemente ou inconscientemente os princípios do
94
pensamento complexo, que são operadores do cérebro humano:
hologramático, recursivo e dialógico.
Parafraseando Petraglia (2001, p. 33-35), o princípio hologramático
evidencia o paradoxo das organizações complexas, em que o todo está na
parte e a parte está no todo. Um holograma é uma imagem física projetada no
espaço em três dimensões. O rompimento dessa imagem não se dá através de
fragmentos, mas sim por imagens completas multiplicadas. O princípio
recursivo é como um circuito em que produto e efeito são ao mesmo tempo
produtores e causadores daquilo que o produz, ultrapassando noções de
retroação e regulação, trocando-as por auto-organização e autoprodução.
Nesse processo os estados iniciais dependem dos estados finais e vice-versa.
O princípio dialógico é norteador de toda perspectiva multidimensional que
alimenta a complexidade. O seu desafio é unir noções antagônicas onde
opostos são ao mesmo tempo, complementares, podendo vir a conceber um
mesmo fenômeno complexo.
Quando realiza as imagens para si ou para o outro, no caso, serviços
contratados, o fotógrafo seleciona determinado aspecto do real, organiza
esteticamente sua composição, utiliza os recursos oferecidos pela tecnologia
que estão ao seu alcance no momento e compõe o produto final: a imagem
como testemunho fotográfico que apresenta o resultado de um ato criativo e
individual que configura a atuação do fotógrafo enquanto filtro cultural. Kossoy
apresenta-nos este resultado como uma visão subjetiva do autor (fotógrafo) e
nos auxilia neste entendimento:
Qualquer que seja o assunto registrado na fotografia, esta também documentará a visão de mundo do fotógrafo. A fotografia é, assim, um duplo testemunho: por aquilo que ela mostra da cena passada,
95
irreversível, ali congelada fragmentariamente, e por aquilo que nos informa acerca de seu autor. Toda fotografia é um testemunho segundo um filtro cultural, ao mesmo tempo que é uma criação a partir de um visível fotográfico. Toda fotografia representa o testemunho de uma criação. Por outro lado, ela representará sempre a criação de um testemunho. (KOSSOY, 2001, p. 50)
O autor atribui ao fotógrafo um filtro cultural, pois o registro visual é
consequência de sua própria atitude, de sua vivência, dos lugares por onde
passou e das pessoas com quem conviveu, ou seja, sua bagagem cultural,
estado de espírito, ideologia, criatividade e sensibilidade, que acabam
transparecendo em suas imagens. O autor do registro fotográfico ora é agente,
ora é personagem deste processo, desenvolvendo, assim, distintos fatores que
servirão como alicerces para reflexões interpretativas posteriores e para
estudos iconográficos e iconológicos.
Do ponto de vista iconológico, a Fotografia Cultural é, para nós, aquela
em que sentimos a presença da cultura no seu dia a dia, deixando
transparecer, por exemplo, os costumes da época em que a imagem foi ou está
sendo flagrada ou quando um detalhe nos salta a vista e nos provoca para uma
reflexão maior! É também inclassificável e citamos Barthes para nos auxiliar:
Desde o primeiro passo, o da classificação (é preciso classificar, realizar amostragens, caso se queira constituir um corpus), a Fotografia se esquiva. As divisões às quais ela é submetida são de fato ou empíricas (Profissionais/Amadores), ou retóricas (Paisagens/Objetos/Retratos/Nus), ou estéticas (Realismo/Pictorialismo), de qualquer modo exteriores ao objeto, sem relação com sua essência [...] (BARTHES, 1984, p. 12-13).
Como a Fotografia Cultural transita em diversos âmbitos e, como explica
o autor, esquiva-se de possíveis classificações, tentamos aqui aproximá-la e
distanciá-la ao mesmo tempo de alguns gêneros. Após pesquisar e escrever
sobre três gêneros distintos da fotografia, identificamos uma aproximação
maior de nosso objeto com um deles: Fotografia Antropológica, pois ela
96
também vivencia o habitat tentando fazer parte integrante dele, realizando,
assim, um trabalho mais autêntico. Outros aspectos de similaridade são: se
destinar ao uso da fotografia como registro e fonte para pesquisas culturais; ter
um olhar mais amplo e desprovido de preconceitos com as diversidades
culturais; o resgate de informações relacionadas a diferentes grupos da
sociedade e do registro da cultura e costumes de etnias que estão em
constantes transformações.
O indivíduo fotógrafo é também um sujeito, por isso, é necessário
relacioná-lo com o outro e também com o seu meio. Assim, temos um sujeito-
fotógrafo que, para realizar seu trabalho, precisa ter uma relação de
pertencimento, misturando-se ora a determinado habitat, ora a um dos diversos
personagens de sua foto.
Dias (2008, p. 61) declara: ―O reconhecimento do sujeito que externaliza
afetos e emoções se faz pela racionalidade, que indica e protege contra o erro
e a ilusão, tendência do caráter dialógico que modula as nuances do real, da
lógica e do determinismo radical‖. Concordamos com a autora que é nessa
relação de pertencimento, que o sujeito-fotógrafo externaliza suas emoções
misturando-se ao meio em que está inserido naquele momento.
Uma Fotografia Cultural permite compreender o sujeito como homo
complexus que religa o sapiens ao demens na cultura que, ao mesmo tempo,
aprisiona e liberta, domina e emancipa, sendo produto e produtora da espécie
humana. Mas, como afirma Morin (2003b, p. 277) ―Os indivíduos não se
submetem apenas à sociedade e à cultura, mas também aos deuses e as
ideias.‖ Se tanto deuses como ideias fazem parte da subjetividade humana
97
uma Fotografia Cultural é a mais subjetiva possibilidade de captar sujeitos,
objetos e seu contexto.
Valemo-nos, mais uma vez de Dias (2008, p. 59-66) para explicar o
nosso entendimento de subjetividade: ―[...] um sistema que organiza e
desorganiza o mundo interno e o mundo externo do sujeito, facilita e dificulta o
desenvolvimento e crescimento pessoal, resgata o passado que interfere no
agora do presente, prospecta o futuro, desvela e distingui o singular e o
especial‖. Portanto uma Fotografia Cultural é a que cria, recria, integra
fragmentos, contextos, realidades numa rede relacional complexa que ao
passo que oculta também desvela sonhos, desejos, expectativas, saberes e
fazeres dos sujeitos, das sociedades e das culturas.
Morin (2003b, p. 77) afirma que ―O sujeito é por natureza fechado e
aberto‖. Poderíamos dizer que estas atitudes transparecem numa fotografia,
dependendo do momento e da relação com o outro em que ela foi feita: ―A
qualidade de sujeito permite-nos percebê-lo na semelhança e dessemelhança.
O fechamento egocêntrico torna o outro estranho para nós; a abertura altruísta
o torna simpático‖. O outro, neste caso, poderia ser o próprio fotografado ou os
expectadores da imagem que ele realiza.
A próxima imagem, (Fig. 45), mostra a relação da fotógrafa Claudia
Andujar com o ambiente e com uma índia yanomami. Ela foi retratada dentro
de uma das comunidades com as quais conviveu durante sua pesquisa
realizada junto aos yanomami, conforme mencionamos no subitem 2.3. É clara,
nesta imagem, a relação do indivíduo enquanto sujeito aberto, que passa a
conhecer e até pertencer a um grupo que não é o seu, deixando nítida a
semelhança e dessemelhança existentes.
98
Fig. 45 - Claudia Andujar com índia Yanomami, na década de 70 - Fonte: Carlo Zacquini.
Quando o fotógrafo decide – às vezes em segundos – o que deseja para
uma nova cena, quando visualiza a fotografia que está para nascer, transita
pelo desconhecido, sente medo e desejo ao mesmo tempo, pois não sabe se o
seu alvo mostrar-se-á como amigo ou inimigo.
Morin questiona se a relação com o outro é secundária em relação a
algo que se deseja para si em primeiro lugar. Será que no eu do fotógrafo há
um espaço em que se separam essas duas dimensões? Ou estará sempre em
primeiro lugar a intenção do fotógrafo? A Fotografia Cultural é um gênero no
qual o fotógrafo busca a união entre o que almeja e a ética envolvida pelo que
será fotografado, pois existirá sempre um elo cultural objetivo e subjetivo.
No momento da criação, o fotógrafo deixa transparecer sua linguagem
pessoal, que se desenvolverá e se modificará ao longo de sua carreira e da
vida.
[...] A fotografia se conecta fisicamente a seu referente, - e esta é uma condição inerente ao sistema de representação fotográfica – porém, através de um filtro cultural, estético, técnico, articulado no imaginário de seu criador. A representação fotográfica é uma recriação do mundo físico ou imaginado, tangível ou intangível; o assunto registrado é produto de um elaborado processo de criação por parte de seu autor. (KOSSOY, 2002b, p. 42-43)
99
E é também no processo de criação do fotógrafo que ele insere não só
sua bagagem cultural como sua ética, a partir do momento em que recria sua
interpretação de um mundo físico ou imaginado, como diz Kossoy.
Para Morin (2003b, p. 79): "[...] Podemos ser possuídos subjetivamente
por um Deus, um Mito, uma Ideia, e é essa ideia, esse mito, que, instalados
como um vírus no programa egocêntrico nos comandará, imperativamente,
enquanto cremos servir voluntariamente". Quando nos encontramos nesse
processo criativo, é como se realmente estivéssemos sob a influência de algo
externo a nós, que nos atinge, mas é a relação do eu-isso que aí se manifesta.
É nesse processo criativo que se realiza o ciclo ordem-desordem-organização,
presente nos sistemas abertos e que culmina na auto-eco-organização. E,
porque somos complexos, somos produtos e produtores de cultura.
O ato de criação nos remete mais uma vez a Morin (1999b, p. 207-208),
quando cita uma frase de Szent-Gyorgy: ―[...] a descoberta consiste em ver o
que todo mundo viu e pensar o que ninguém pensou‖. Ele menciona o jovem
Newton e sua descoberta da Lei da Gravidade. Explica que quando Newton vê
a queda da maçã, ele não vê somente isso, mas, vê além, vê também e ao
mesmo tempo o movimento que atrai esse corpo para a terra, ele vê o invisível.
Podemos dizer, então, que Newton precisou de um ―novo olhar‖ para poder ver
o que ninguém via, mesmo estando invisível, e podemos dizer que, com este
novo olhar, ―[...] qualquer descoberta, a começar pela de uma coisa invisível
para todos, é uma conquista cognitiva que comporta invenção e criação‖
(Morin, 1999b, p. 208). Estes termos se complementam e se sobrepõem num
universo em que a criatividade é essencial ao pensamento.
É extraordinário que os progressos do conhecimento objetivo necessitem de imaginação criadora. Recapitulemos: não apenas os
100
grandes sistemas filosóficos, mas também as grandes descobertas científicas, aparentemente as mais evidentes a posteriori, como a atração universal ou da equivalência massa/energia, são o fruto de uma imaginação surpreendente. A imaginação elabora formas ou figuras novas, inventa/cria sistemas a partir dos elementos captados aqui ou ali ou desviados dos sistemas que integravam, o que confirma, na esfera do pensamento, o caráter experimental de toda evolução criadora. (MORIN, 1999b, p. 209)
Quando o autor relaciona conhecimento objetivo com imaginação
criadora, deparamos mais uma vez com a Fotografia Cultural e sua relação
com as duas culturas. A importância dada à imaginação e à criatividade num
âmbito científico traz um diferencial que pode enriquecer o pensamento criador,
atingindo, como diz Morin, desde grandes sistemas filosóficos a grandes
descobertas científicas.
Durante o ministério da disciplina denominada Fotografia Cultural, no
curso de Comunicação Digital da Universidade Paulista (Unip), relacionávamos
a prática da ementa com o registro de diversos eventos culturais, como shows,
apresentações teatrais, feiras típicas etc., muitos deles realizados na própria
universidade, momento este em que os alunos podiam elaborar e aplicar os
seus conhecimentos. Porém, durante os exercícios abordados em sala de aula,
baseados também na ementa, estudávamos alguns textos de Kossoy e
realizávamos alguns projetos. O fato é que, quando íamos para a realização
prática destes textos estudados, deparávamos com diversas dificuldades, pois
os temas e discussões ali realizados não eram apropriados para serem
fotografados dentro da universidade. Tratávamos ali de levantamento
fotográfico de determinadas culturas, análise de álbuns de fotos de família,
fotografia como expressão, fonte de emoção e recordação. Eram estes os
temas que vínhamos descobrindo com as leituras propostas pela disciplina. E
para isso teríamos de ir a campo, realizar pesquisas, registrar situações e
descobertas, fazer um levantamento das fotos familiares antigas e conversar
101
com os referentes envolvidos de forma direta ou indireta. A opção era, então,
realizar alguns trabalhos extrassala, como aconteceu com o projeto Trajetória
de Vida, que era a realização de um levantamento fotográfico pessoal de cada
aluno e que apresentaremos detalhadamente a seguir.
Entendemos, então, que não podemos explicar Fotografia Cultural com
um conceito único, pois ela pode ser definida a partir de diversos olhares e
compreensões, e pode apresentar-se como elemento integrador das culturas
científica e humanística.
Para Morin (1997, p. 42), ―pode, pois, haver um aperfeiçoamento
subjectivo a partir duma simples representação objectiva‖, realizando a relação
dialógica, na qual os opostos se complementam, permitindo que o spectador
assuma a inseparabilidade de noções diferentes para a concepção de um
mesmo fenômeno complexo.
A Fotografia Cultural reúne conceitos e preceitos presentes em diversos
gêneros fotográficos, mas distingue-se pela presença marcante dos princípios
hologramático, recursivo e dialógico do sujeito fotógrafo, que se manifesta na
expressão de sua subjetividade e objetividade da cena fotografada. O processo
de interpretação da imagem ocorre a partir da compreensão do fotógrafo e da
explicação que ela propicia e é intenção de uma Fotografia Cultural promover a
reflexão do spectador a favor da inclusão, da religação, da ética do
pertencimento e da complexidade humana.
Apresentaremos, a seguir, seis fotografias, das quais cinco são
parisienses e a primeira a ser apresentada foi feita no Nordeste do Brasil.
Consideramos tais imagens Fotografias Culturais, pois a cultura está presente
em cada uma delas de diferentes maneiras, e exemplificaremos visualmente o
102
que é, para nós, esse novo conceito. Na sequência, e ainda nesse capítulo,
apresentaremos algumas séries de Fotografias Culturais e as comentaremos
por categorias.
Com relação à primeira imagem (figura 46), inicialmente apresentaremos
a observação de uma visitante na mostra fotográfica que realizamos na
Universidade Nove de Julho (Uninove) durante o I Congresso Internacional de
Filosofia da Educação de Países e Comunidades de Língua Portuguesa –
Sofelp em 2009, quando já discutíamos o objeto desta tese. Ao observar a
fotografia em questão, a visitante disse: ―Ah, mas vocês deviam estar com uma
‗super máquina‘ para ter conseguido esta foto, não?‖ Na hora achamos melhor
não responder, porque seria complicado explicar que naquela imagem as duas
culturas estavam intrinsecamente ligadas e, principalmente, que o mais
importante ali provavelmente não teria sido o equipamento usado, mas sim a
bagagem cultural do fotógrafo e o seu olhar em relação ao que ele queria
registrar e transmitir com aquela imagem, e possivelmente um equipamento de
última geração naquele momento é o que menos importava.
Ainda analisando a imagem, intitulada: ―Duchamp nordestino‖, podemos
mostrar que esta fotografia desperta e educa o olhar de quem vê,
transformando-o num olhar sensível – o spectador, como diria Barthes (1984).
Esta Fotografia Cultural faz com que o observador veja além do aparente, pois
não mostra apenas a realidade de quem mora naquela casa de pau a pique,
mas traz todo um questionamento da relação dialógica provocado pela
presença da tecnologia – cultura científica, demonstrada por meio da antena
parabólica, que a princípio não parece estar no lugar certo, considerando que,
normalmente a vemos em locais urbanos. Desta maneira, a antena torna-se um
103
punctum, que Barthes (1984) denomina como o detalhe pungente que afeta,
que seduz, ou seja, o ponto de efeito que nos torna interessante e nos provoca
a reflexão ao olhar determinada fotografia.
A imagem a seguir, (Fig. 46) está propositalmente apresentada na
posição horizontal e em tamanho maior para ser melhor visualizada.
Fig. 46 – Duchamp Nordestino – S. M. do Gostoso, RN, Brasil, 2009 - Foto: Nan Huminhick
104
Na cena seguinte, do café, (Fig. 47), não existem ali, simplesmente,
duas xícaras de café, mas, vários elementos culturais: a água com gás, que é o
acompanhamento e é tomada antes, os cubinhos de açúcar embalados, o que
não é comum em nosso País, as diversas bicicletas estacionadas próximas à
entrada do metrô, o que também não é um costume nosso, mas representam
de maneira lírica e poética aspectos de influência europeia.
Fig. 47 – Café próximo à Torre Eiffel, Paris, França, 2010 - Foto: Nan Huminhick
Esta fotografia em particular pode promover o cultivo do estado poético
de quem fez a foto e de quem a observa. Morin (2003a, p. 45) nos auxilia:
A poesia, que faz parte da literatura e, ao mesmo tempo, é mais que a literatura, leva-nos à dimensão poética da existência humana. Revela que habitamos a Terra, não só prosaicamente – sujeitos à utilidade e à funcionalidade –, mas também poeticamente, destinados ao deslumbramento, ao amor, ao êxtase. Pelo poder da linguagem, a poesia nos põe em comunicação com o mistério, que está além do dizível.
105
O autor faz uma diferenciação significativa para este estudo, entre a
prosa e a poesia. Fotografia Cultural, em nossa definição, é aquela que
transmite a poesia visualmente, levando o observador a estimular a sua
dimensão poética da existência. Não ficando à disposição apenas da utilidade
e da funcionalidade, mas abrindo-se ao deslumbramento, ao êxtase.
As próximas imagens, (Fig. 48 e 49), mostram a Pont des Arts, também
conhecida como Ponte dos Cadeados, em Paris. Esta ponte é só para
pedestres e liga o Institut de France ao Museu do Louvre. No local existe uma
tradição, segundo a qual os casais apaixonados prendem cadeados em uma
grade para simbolizar o amor e uma relação sem fim; neles são gravados os
nomes dos enamorados. Para finalizar, a tradição indica jogar as chaves no Rio
Sena, para os enamorados ficarem presos um ao outro para sempre.
Fotografias como essas, da Pont des Arts, provocam o spectador,
despertam nele sensações e indagações: romance, poesia, lirismo, o amor e a
falta dele. Se a princípio não se sabe onde essa ponte se localiza, logo passará
pela cabeça de quem a observa que é um local que respeita e dá vazão aos
sonhos.
Kossoy (2002b, p. 44-45) faz-nos pensar, ainda, sobre a leitura dessa
imagem:
[...] somos seres carregados de emoção. E, felizmente nossas emoções não são programadas, nossas reações emocionais podem ser, em função dos estímulos externos, imprevisíveis. Ainda bem que é assim, caso contrário seríamos robôs, replicantes.
O autor quer dizer que não há um sistema padrão de interpretações,
podendo uma mesma fotografia atingir subjetivamente a um observador e a
outro não, pois o conteúdo das imagens permite sempre uma leitura plural,
provocando diferentes impactos em cada um de nós.
106
Fig. 48 – Pont des Arts, Paris, França, 2010 - Foto: Nan Huminhick
Fig. 49 – Pont des Arts, Paris, França 2010 - Foto: Nan Huminhick
107
As próximas cenas mostram os costumes de uma cidade, em que as
scooters (lambretas) ficam estacionadas sobre as calçadas, disputando o local
com os pedestres; outro fato curioso – que faz parte da cultural local – é o uso
de capas para proteger estas ―motos‖. Esta capa, usada como mostra na
imagem, é destinada principalmente a conter o frio nas pernas do condutor,
que nesta localidade, no inverno chega a uma sensação térmica de até
15 graus negativos, e proteger também da chuva. Queremos demonstrar que
essas imagens abaixo, (Fig. 50 e 51), têm para nós a presença de uma cultura
com costumes específicos.
Kossoy (2002b, p. 44) nos auxilia: ―Dependendo, porém, dos estímulos
que determinadas imagens fotográficas causam em nosso espírito nos
veremos, quase sem perceber, interagindo com elas num processo de
recriação de situações conhecidas ou jamais vivenciadas‖. O spectador, ao
observar a imagem, no primeiro momento já questiona sua localidade
geográfica, pois pode estar deparando com uma cena ainda não vista,
promovendo na sequência a análise e a leitura de uma nova realidade.
Morin (2003a, p. 33) diz: ―[...] a cultura das humanidades favorece a
aptidão para a abertura a todos os grandes problemas, para meditar sobre o
saber e para integrá-lo à própria vida, de modo a melhor explicar,
correlativamente, a própria conduta e o conhecimento de si‖. Entendemos e
concordamos com o autor que é por intermédio dessa abertura que se dão as
diferentes possibilidades de interpretação e análise a partir de uma fotografia,
ou até mesmo para sua pré-elaboração.
Podemos dizer, ainda, que uma Fotografia Cultural nos transmite que:
108
Fig. 50 – Rue de Lappe x Rue de Charonne, Paris, França, 2010 - Foto: Nan Huminhick
Fig. 51 – Scooter com capa de chuva e frio, Paris, França, 2010 - Foto: Nan Huminhick
109
[...] É preciso ensinar que as coisas não são apenas coisas, mas também sistemas que constituem uma unidade, a qual engloba diferentes partes. Não mais objetos fechados, mas entidades inseparavelmente ligadas a seu meio ambiente, que só podem ser realmente conhecidas quando inseridas em seu contexto [...]. (MORIN, 2003a, p. 76-77)
Mais uma vez, Morin aproxima-nos de nosso objeto com suas ideias e
reflexões. Em uma fotografia, um detalhe ínfimo, quase imperceptível para
alguns, não é apenas uma ―coisa‖, como cita o autor. Esse mesmo detalhe
abre ao observador um leque desmedido de possíveis interpretações, podendo
levá-lo até a realidade do contexto em que a imagem foi feita. Quando o
observador faz essas religações interpretando e/ou analisando uma imagem,
podemos dizer que ele está promovendo, por meio de uma Fotografia Cultural,
uma interpretação ao mesmo tempo hologramática, recursiva e dialógica.
Este novo gênero fotográfico reconhece e demonstra fenômenos
multidimensionais, em vez de isolar parcialmente de maneira reducionista as
suas dimensões gerais. Como em nossa pesquisa, defrontamos com a
presença de diferentes indícios de Fotografias Culturais, organizamos em
séries fotográficas alguns exemplos, para melhor explicitá-las.
4.2 Série de Clicks Culturais e Análise das Imagens
As fotografias a seguir, são de nossa autoria, com poucas exceções que
terão seus créditos e/ou fontes informadas. As imagens escolhidas para estas
séries pertencem aos locais e cidades a que tivemos acesso no período da
pesquisa entre 2009 a 2011. Elas narram valores intrínsecos à determinada
cultura: saberes, normas, hábitos, crenças, ideias, mitos etc., que passam de
geração para geração. Como afirma Morin: (2003b, p. 35) ―[...] A cultura
acumula o que é conservado, transmitido, aprendido e comporta vários
110
princípios de aquisição e programas de ação. O primeiro capital humano é a
cultura. O ser humano, sem ela, seria um primata do mais baixo escalão‖.
Relacionamos nas séries, imagens que tivessem em comuns alguns
temas e situações em países e cidades diferentes. Apresentar essas
Fotografias Culturais se fez necessário, pois ―as linguagens de todas as
culturas, mesmo as mais arcaicas, têm a mesma estrutura‖ (2003b p. 35). E é
isso que procuramos demonstrar na sequência:
Série Feiras e Mercados
Em Londres, prevalecem as feiras que acontecem nos antigos mercados
e na tradicional Rua Portobello Road. A feira mais conhecida e mais popular
acontece em Notting Hill, Portobello é a feirinha (Figs. 52 a 57 a seguir) mais
famosa de rua e nasceu há 60 anos como feira de antiquário, doando à famosa
rua o aspecto que é conhecido até hoje e que já é conhecida a quase uma
década como um dos quarteirões mais chics da cidade. Lá são comercializados
desde antiguidades, discos, flores, roupas a alimentos, como: pães, legumes e
frutas. Podemos dizer que é um mercado a céu aberto. Acontece aos sábados
e é visita obrigatória ao turista, em especial o brasileiro, para que possa
presenciar e sentir uma cultura tão diferente da nossa, que não está apenas
nos produtos vendidos, mas também nas pessoas passando e nos diversos
músicos se apresentando na rua, fato este que não se vê aqui, com tanta
frequencia. Outras feiras que acontecem em Londres são as de Candem Town
e Covent Garden, ambas em antigos mercados.
111
Candem Town é um distrito de Londres, a feira (Figs. 58 a 61 a seguir)
acontece todos os domingos e ocupa uma área enorme na zona norte perto
dos canais. Lá existe uma grande diversidade cultural, mistura de brechó,
roupas modernas, souvenirs pouco convencionais, comidas de diversas partes
do mundo, da mais exótica a mais comum. Esta feira ocupa diversos espaços e
ruas, não é descartado nem mesmo um espaço vazio debaixo de um viaduto,
que no Brasil são espaços ociosos e até marginalizados.
Covent Garden é um dos bairros mais famosos de Londres, lá o espaço
é mais elitizado, acontece principalmente dentro de um antigo mercado de
frutas, uma mistura de luxo e criatividade, com bancas comercializando
diferentes produtos, lojas coloridas e modernas e restaurantes, podendo-se
também desfrutar de comida típicas como a paella espanhola ao som de uma
ópera lírica em que uma artista mostra seu trabalho. (Figs. 62 a 65 a seguir)
Inglaterra – Londres - 2010
Fig. 52 – Nan Huminhick – Foto: Cida Atum Fig. 53 - Feira de Portobello Road 2010
112
Fig. 54 – Feira de Portobello Road, 2010 Fig. 55 – Feira de Portobello Road, 2010
Fig. 56 – Feira de Portobello Road, 2010 Fig. 57 - Feira de Portobello Road, 2010
Fig. 58 – Feira de Camden Town, 2010 - Foto: Cida Atum Fig. 59 - Feira de Camden Town, 2010
Fig. 60 - Feira de Camden Town, 2010 Fig. 61 - Feira de Camden Town, 2010 Foto: Cida Atum
113
Fig. 62 - Feira de Covent Garden, 2010 Fig. 63 - Feira de Covent Garden, 2010
Fig. 64 - Feira de Covent Garden, 2010 Fig. 65 - Feira de Covent Garden, 2010
Série Artistas de Rua
Quando fomos à Europa para passeio e também para conhecer outras
culturas, ficamos surpresos com a infinidade de artistas (músicos e estátuas
vivas) que se apresentam em ruas públicas, calçadões, praças e metrôs. Em
cidades como Barcelona (Espanha – Figs. 66 a 70), Paris (França - Figs. 71 a
75) e Londres (Inglaterra - Figs. 76 a 80), não é negado a estes artistas
exporem seu trabalho e ganharem com isso. Os locais em que mais
encontramos estes artistas foi nas ramblas em Barcelona, próximo às igrejas
como Notre Dame e Sacré Coeur em Paris, na Ponte das Casas do Parlamento
e na feira de Portobello, em Londres. O público que por ali passa se encanta e
114
para alguns minutos para assistir, contribuindo voluntariamente ao final de cada
apresentação com alguns trocados.
Espanha – Barcelona – 2010
Fig. 66 – Artistas no Parque Guell, 2010
Fig. 67 - Artistas nas Ramblas, 2010
Fig. 68 - Artistas nas Ramblas, 2010
Fig. 69 - Artistas nas Ramblas, 2010
115
Fig. 70 - Artistas na orla da praia – Espanha, Sitges (cidade vizinha à Barcelona), 2010
França – Paris - 2010
Fig. 71 - Sacré Coeur, 2010 Fig. 72 - Sacré Coeur, 2010
116
Fig. 73 - Sacré Coeur, 2010 Fig. 74 - Notre Dame, 2010
Fig. 75 - Notre Dame, 2010
117
Inglaterra – Londres – 2010
Fig. 76 – Ponte das Casas do Parlamento, 2010
Fig. 77 – Artista em preparação na ponte, 2010
Fig. 78 – Artista em Nothing Hill, 2010 Fig. 79 – Artista em Nothing Hill, 2010
Fig. 80 – Ponte das Casas do Parlamento, Artista Escocês, 2010
118
Série Manifestações Culturais
São Paulo é uma cidade que abriga diferentes povos e culturas.
Sabemos que todos os dias chegam aqui pessoas do mundo inteiro. Cidade
multicultural, famosa por sua noite agitada, gastronomia plural, infinitas
possibilidades de trabalho, lazer etc. Com tudo isso, as culturas de quem aqui
chega vão se entrelaçando e não é incomum ver um paulistano vestido de
cosplay (caracterização de um personagem de filme ou desenho japonês –
Figs. 81 a 83 a seguir), um carioca de terno e gravata ou um nordestino
trabalhando como sushiman (Figs. 84 e 85 a seguir). Por esses motivos
decidimos realizar essa série em São Paulo/Brasil.
Desta maneira, o tempo todo nos deparamos com manifestações
culturais pela cidade. Temos as festas anuais dos bolivianos e a Feira da
Kantuta que acontece todos os domingos no bairro do Pari, (Figs. 86 e 87 a
seguir), quando eles mostram orgulhosos, sua cultura à população paulistana,
momento de rememorar suas raízes. Outro exemplo é o evento Revelando SP
– Festival da Cultura Paulista Tradicional que acontece anualmente e já teve
como sede por diversos anos o Parque Dr. Fernando Costa (Parque da Água
Branca) e que tem a participação de várias cidades do Estado, (Figs. 88 a 90 a
seguir). Há estandes de culinária, artesanato e apresentações de grupos
artísticos. A ideia é dar uma amostra das diversas manifestações culturais
oriundas de municípios paulistas e a escolha deste parque não é por acaso,
pois ele conserva ainda uma origem rural em plena capital paulistana. Todos os
passantes se encantam ao ver em plena cidade de São Paulo: carros de bois,
charretes, corrida de cavalhadas e congada, folia de reis, noite cigana,
serestas, catira, sanfoneiros e muito mais. Ainda neste parque, temos um
119
exemplo típico destas manifestações: é a Casa do Caboclo (Figs. 91 a 93 a
seguir), uma casa de taipa que reproduz o espírito do campo e aos sábados e
domingos serve a tradicional ―cavaca‖, broa de milho assada na chapa do
fogão a lenha, com café ralo ao som de moda de viola.
Vamos citar agora uma última manifestação cultural, dentre muitas que
existem ainda: Sendai Tanabata Matsuri - Festa das Estrelas, realizada
anualmente no bairro da Liberdade em São Paulo. Conhecida como a maior
festividade tradicional do Japão no Brasil, relata a lenda de uma princesa e seu
amado, que só podiam se encontrar uma vez por ano, no mês de julho (Figs.
94 a 96 a seguir). Por causa desta lenda, nesse dia as pessoas fazem pedidos
e escrevem seus desejos no tanzaku (papeleta colorida) e amarram no bambu
para que possam ser realizados.
Brasil - São Paulo
Fig. 81 – Cosplay 01
120
Fig. 82 – Cosplay 02
Fig. 83 – Cosplay 03
Fig. 84 – Sushiman brasileiro 01 - Foto: Carolina Iskandarian
121
Fig. 85 – Sushiman brasileiro 02
Fig. 86 – Cultura dos bolivianos no bairro do Pari 01
Fig. 87 – cultura dos bolivianos no Pari 02
122
Fig. 88 – Evento Revelando SP 01 - Foto: Reinaldo Meneguim
Fig. 89 - Evento Revelando SP 02 - Foto: Miguel Schincariol
Fig. 90 – Evento Revelando SP 03
123
Fig. 91 – Vista da Casa do Caboclo – Pq. da Água Branca
Fig. 92 – Vista interna da Casa do Caboclo – Pq. da Água Branca
Fig. 93 - Casa do Caboclo – Pq. da Água Branca
124
Fig. 94 - Festa das Estrelas – Liberdade - Foto: Carlos Pupo
Fig. 95 - Festa das Estrelas 01 – Liberdade
Fig. 96 - Festa das Estrelas 02 – Liberdade
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Série Patrimônio Histórico Familiar
Nesta série apresentaremos fotografias pertencentes a diversos álbuns
fotográficos de uma mesma família, em diferentes momentos, sendo eles:
fotografias de grandes grupos; fases da vida de um casal; tradição de se
fotografar visitas às basílicas; tradição da fotografia em estúdios e por fim, a
retrospectiva fotográfica – trajetória de uma vida.
Série Álbum de Família
A fotografia é, sem dúvida alguma, um meio de conhecimento do
passado. É observando essas imagens antigas que temos nos álbuns de
família que o observador se emociona quando rememora muitos momentos
felizes que passaram e que ficaram de forma objetiva para trás. Vê também a
passagem do tempo na sua própria imagem, por meio do envelhecimento e
pela ausência dos que não estão mais presentes.
Dias (2008, p. 60) enriquece nossa compreensão:
―A auto-referência se mantém apesar da passagem do tempo e se mostra na objetivação do eu e na constância do Eu. Este Eu, que só pode ser dito por mim, ocupa e preenche o lugar da centralidade e do egocentrismo, e se mantém apesar da passagem do tempo.‖
A autora nos indica, então, que o Eu estará presente nas fotografias
destes álbuns independente das marcas que o tempo deixou ou não, em seu
rosto, pois esse Eu pertence ao sujeito, que vai compreender muito mais do
que as determinações e características objetivas do indivíduo.
Os álbuns apresentam fotografias com um forte viés cultural: nas
residências das famílias, nos estúdios fotográficos, igrejas, enfim, cenas que
126
nos contam por meio das imagens, as emoções, os momentos de lazer e
trabalho, os integrantes da família, as vestimentas, os móveis típicos de
determinada época.
Foi só no final do século XIX, quando o processo de reprodução ganhou
mais rapidez no ato de fazer e reproduzir a fotografia, que começam a aparecer
os álbuns de família. Este hábito foi inserido no cotidiano, mas como seus
custos ainda eram elevados restringia-se às classes mais altas, tornando-se
um símbolo de posição social.
Kossoy (2001) comenta que, quando o homem vê a si próprio nas velhas
imagens dos álbuns de família, emociona-se e se conscientiza de que o
passado realmente ficou para trás. Ele cita S. Milgram: ―As famílias constroem
uma pseudonarrativa que dá realce a tudo o que foi positivo e agradável na
vida, com uma sistemática supressão do que foi sofrimento‖ (MILGRAM, 1977,
p. 42 apud KOSSOY, 2001, p. 100).
É por intermédio das fotografias antigas que voltamos ao passado e
reconstituímos nossa trajetória de vida; porém, na sua maioria são registrados
os momentos felizes, salvo pouquíssimas exceções encontramos cenas tristes
ou fotografias de crianças mortas integrando estes álbuns, costumes estes dos
países latino-americanos do século XIX (KOSSOY, 2001, p.100).
Na tentativa de recuperar memórias muitas vezes empoeiradas em
gavetas e armários, resolvemos abrir alguns acervos desses álbuns
fotográficos, fazendo um levantamento e exemplificado visualmente a história
de uma família, contemplando, assim, as gerações e os acontecimentos que
por ela passaram.
127
Como diria Barthes (1984, p. 29), ―A vida privada não é nada mais que
essa zona de espaço, de tempo, em que não sou uma imagem, um objeto. O
que preciso defender é meu direito político de ser um sujeito‖.
Cada integrante desta família analisada, ou deste álbum é um sujeito
que se separa do todo da família e demonstra sua individualidade no decorrer
imagético do tempo.
Família Gonzales Huminhick
Onde tudo começou...
Fig. 97 – Fotografia da família Gonzales Huminhick
Esta fotografia (Fig. 97 acima) foi tirada em 1918 na cidade de Itajobi,
interior de São Paulo por um amigo da família. Os adultos em sua maioria são
imigrantes espanhóis, vindos de Málaga. No alto temos cinco irmãos, sendo
128
que dois são gêmeos, abaixo, no centro de preto temos a matriarca da família,
ao lado temos as esposas com seus filhos. A terceira menina da esquerda
para a direita é Barbara Gonzales Huminhick – hoje com 100 anos, mãe de
Helena, a quem iremos apresentar no álbum de família analisado nesta
pesquisa. Fizemos o esboço abaixo (Fig. 98) para pesquisa e reconhecimento
dos personagens na foto.
Fig. 98 – Esboço da fotografia de 1918 com informações obtidas durante a pesquisa, 2010 – Desenho e foto: Nan Huminhick
Na sequência apresentamos outras séries fotográficas, Árvore
Genealógica (Fig. 99), Fases da vida do casal (Fig. 100), Tradição de se
fotografar visitas às basílicas (Fig. 101) e Tradição da fotografia em estúdios
(Fig. 102).
129
ÁRVORE GENEALÓGICA DA FAMÍLIA HUMINHICK E VIEIRA - Fig. 99
Casal Helena Huminhick e José Candido Vieira
Fig. 93 – Árvore Genealógica
Helena
Huminhick
José
Candido Vieira
Egidio Candido
Vieira - pai
Maria
Candida –
mãe
Barbara Gonzales – mãe
Nicola Huminhick - pai
Nancely Huminhick
Vieira Filha e Neta
130
Série 01- Fases da vida do casal - de 1956 a 2006 - Fig. 100
Helena e José no sítio em Itajobi Helena e sua cunhada Cidinha Helena e José com sobrinhos
Cerimônia de Casamento de Helena e José José e seu amigo no centro de sp Cerimônia de Casamento de Helena e José
Primeira casa – Vila Brasilândia Casal na Ap. do Norte - 1966
Casal com irmã dela e primos dele
131
Filhos e sobrinhos - 1964 José na empresa Goyana em SP Família na praia com seu carro decavê
Festa em família - 1974 Casal - 1974 Filhos, Adalberto, Sergio e Nancely
Aniversário em família – Vó Barbara, Tia Zinha, Nancy,
Helena , José e a pequena Bárbara – 1996
Casal - 1998 Casal – 2000
Casal – 2004
Comemoração de Bodas de Ouro - 2006
Bodas de Ouro – 2006 / 1956
132
Série 02 - Tradição - Fig. 101
Família na Basílica de Nossa Senhora Aparecida
Helena e José com parentes - 1961 Helena e José com parentes e filhos – 1970
Helena e José com parentes – 1966 Helena e José com os filhos – 1968
Helena com a mãe e filhos – 1968 Os três filhos de Helena – 1968
133
Série 03 - Tradição - Fig. 102
Família no Estúdio
Tia Isabel – tia de Helena – 1961 (30 anos) Tia Isabel – tia de Helena – 1966 (35 anos) Tia Isabel – tia de Helena - 1971 (40 anos)
Estúdio com paisagem de fundo e telefone Estúdio com flores e cadeira Estúdio com pônei e escada decorativa
Estúdio com pele de carneiro Helena e João Huminhick (irmão) - 1956 Estúdio com objetos decorativos
134
Série 04 – Projeto Sala de Aula – Trajetória de Vida
Nesta retrospectiva fotográfica que narra a trajetória da vida de um
indivíduo em particular temos contato com a Fotografia Cultural em diversos
momentos: a imagem como conhecimento, releituras de momentos históricos
da vida, fotografia como objeto da investigação e fonte fotográfica. Acreditamos
que esta série representa a Fotografia Cultural em sua amplitude, pois engloba
muitos fatores que não são apenas estéticos e sim de reflexões ontológicas.
Em seus constantes questionamentos, Barthes (1984, p. 12) dizia: ―Em relação
à fotografia, eu era tomado de um desejo ‗ontológico‘: eu queria saber a
qualquer preço o que ela era em ‗si‘, por que traço essencial ela se distinguia
da comunidade das imagens‖. E é nesta série de fotografias aqui apresentadas
que sentimos a presença intrínseca desta inquietude do autor.
Realizávamos em sala de aula um trabalho em que tentávamos englobar
as diferentes vertentes da Fotografia Cultural. Era a realização e montagem de
uma retrospectiva da vida do aluno, na qual ele faria um levantamento
fotográfico de sua trajetória de vida, desde seu nascimento até os dias atuais.
Para isso, elencava uma foto por ano de sua existência, somando um total de
fotografias de acordo com sua idade atual. Para cumprir as etapas deste
projeto, o aluno iria rememorar sua história, situações, locais, ou seja, estaria
fazendo uma retrospectiva cultural e imagética de tudo o que já tinha vivido.
Kossoy (2001, p. 99-100) compartilha conosco essa ideia:
A experiência visual do homem quando diante da imagem de si mesmo, retratado por ocasião das mais corriqueiras e importantes situações de seu passado, leva à reflexão do significado que tem a fotografia na vida das pessoas. [...] Pelas fotos dos álbuns de família constata-se a ação inexorável do tempo e as marcas por ele deixadas, como lembra um psicólogo: ―As famílias constroem uma pseudonarrativa que dá realce a tudo o que foi positivo e agradável na vida, com uma sistemática supressão do que foi sofrimento‖.
135
Entendemos e concordamos com o autor que é por intermédio das
fotografias de nossas trajetórias que reconstituímos nosso percurso de vida e
ao mesmo tempo apresentamos as diversas culturas e situações culturais que
vivenciamos ao longo da vida: o batismo, a primeira comunhão, os familiares,
os vizinhos, os amores e os olhares, as sucessivas paisagens, os novos
amigos etc. A cada instante, novos personagens passam a fazer parte da cena.
Dificilmente nos desligaremos emocionalmente dessas imagens, pois estamos
envolvidos afetivamente com seus conteúdos. Quando rememoramos tais
imagens, somos levados ao passado numa fração de segundos, vivenciando
novamente os acontecimentos dos quais fomos personagens em sucessivas
épocas e lugares, transparece então toda a diversidade cultural por que já
passamos durante a vida.
A imagem abaixo, (Fig. 103), traz como exemplo um recorte da
Retrospectiva Fotográfica de Nancely Huminhick Vieira, com apenas algumas
imagens narrando a trajetória de sua vida, na época com 40 anos de idade.
Série 05 - Trajetória de vida de Nancely Huminhick Vieira – Fig. 103
Retrospectiva fotográfica da vida de Nancely Huminhick cobrindo desde
o período do nascimento aos 40 anos de idade. Apresenta-se uma imagem
referente a cada ano de vida, destacando lugares, pessoas, diferentes
momentos e situações no decorrer de sua vida.
136
Nan aos 4 anos - 1972 Foto de Família - Nan aos 5 anos - 1973 Ap. do Norte - Nan aos 6 anos – 1974
Marli (amiga) e Nan aos 8 anos - 1976 Sergio (irmão) e Nan aos 14 anos - 1980 Nan aos 15 anos – 1981
Alunos escola pública, 18 anos - 1984 Pais e Nan aos 21 anos - 1991 Nan aos 15 anos – 1981
137
Nan aos 36 anos - 2004 Defesa de Mestrado aos 38 anos - 2006 Nan aos 40 anos – 2008
Para finalizar, trazemos uma afirmação de Kossoy, com a qual
compartilhamos: (2002b, p. 46) ―A imagem fotográfica ultrapassa, na mente do
receptor, o fato que representa.‖ Fato este, presente na recepção do spectador
quando observa uma Fotografia Cultural e é provocado, despertado a inúmeras
indagações e reflexões. Assim, encerramos esta série de fotografias culturais
de diferentes povos, lugares e culturas com uma primeira amostragem do que
entendemos por este novo conceito fotográfico, que, é tema de disciplina em
cursos de gestão em fotografia em nível de Graduação, de modo que carecia
de significação.
138
CONSIDERAÇÕES FINAIS
“Se eu fosse apenas curiosa, seria muito difícil dizer a alguém “quero ir à sua casa, estimular você a falar e ouvir você me contar a história da sua vida”. As
pessoas me responderiam: “Você está maluca”. Além do mais, ficariam muito precavidas. Mas a câmera é uma espécie de licença. Muita gente quer que prestemos a elas muita atenção
e esse é um tipo razoável de atenção para se prestar”.
Diane Arbus
Ao eleger como objeto de investigação desta tese a vertente Fotografia
Cultural, tivemos o propósito de conhecer, estudar e desvelar esse termo que
ainda carecia de definição, no sentido de esclarecer seu significado e
compreensão, bem como as relações existentes entre arte e técnica.
Procuramos oferecer durante a pesquisa, argumentos que mostrassem que o
sujeito-fotógrafo, se manifesta por meio da fotografia de maneira subjetiva.
Este novo conceito de fotografia - a Fotografia Cultural está inserido no
contexto social, econômico e político das sociedades contemporâneas e
manifesta-se por uma linguagem não verbal.
Entendemos ter atingido os objetivos fundamentais deste trabalho, que
consistiam em compreender como a Fotografia Cultural se coloca diante do
sujeito, que é complexo, e como se adapta à culturas tão diversas daquelas
impostas pelo imprinting.
O homo complexus é ao mesmo tempo homo sapiens e demens, que se
auto-eco-organiza e no pensamento complexo encontra aceitação para suas
contradições. O ser humano constitui, no cerne de sua identidade, o paradoxo
da unidade e da multiplicidade, uma existência una, porém polarizada de
diversas dimensões, complementares e antagônicas.
139
Desde a infância somos atraídos por tudo o que está ao nosso redor e
que direta ou indiretamente vivenciamos. O imprinting vem acompanhado de
uma normalização que não contesta dúvidas, normas, tabus, transmitindo-nos
um sistema de crenças que nos acompanhará pelo resto de nossa existência.
Ele está presente e se manifesta também em nossa percepção visual quando
fazemos ou contemplamos uma fotografia.
Desta maneira tornou-se imprescindível que nossa metodologia fosse
composta também de pesquisa empírica, pois tanto a realização das fotografias
como suas análises, trouxeram-nos importantes elos de ligação quando
encontramos resultados por meio de nossa percepção visual.
A metodologia baseou-se, então, em pesquisa teórica, a partir do
levantamento e revisão bibliográfica sobre fotografia, cultura e complexidade, e
pesquisa empírica, com a realização de material fotográfico que levou em conta
as concepções desveladas neste estudo acerca de Fotografia Cultural.
O estado da arte apresentado foi realizado por meio de pesquisas em
bibliotecas presenciais e virtuais, como também na troca de informações com
fotógrafos e professores da área fotográfica, visto a necessidade de conhecer
temas convergentes ao nosso objeto, já que não encontramos obras
específicas sobre o tema. Entretanto, as obras (dissertações e teses)
estudadas e que compuseram o estado da arte, aqui apresentado, relacionam-
se direta ou indiretamente com fotografia e cultura.
Para a realização das fotografias, optamos por fazê-las em viagem pela
Europa no ano de 2010. Fotografamos durante 15 dias todas as situações ou
elementos culturais que por um motivo ou outro despertou nossa atenção e
saltou-nos à vista. A partir das imagens obtidas, que compuseram um acervo
140
de aproximadamente 2.000 mil imagens, selecionamos algumas específicas
sobre os temas aqui desenvolvidos. Esses temas deram origem a duas séries
fotográficas Feiras e Mercados e Artistas de Rua, contendo ao total, 29
imagens. Escolhemos também para iniciar o quarto capítulo uma série de 6
imagens, sendo 5 de Paris e 1 do Brasil, indicativas da presença da cultura.
Para a série Manifestações Culturais, escolhemos a cidade de São
Paulo/Brasil, que é uma cidade multicultural por excelência e com expressões
de diferentes povos que aqui vivem. Neste caso, usamos imagens que não são
de nossa autoria, mas, foram pesquisadas de acordo com os temas e eventos
que quisemos apresentar.
Muitos foram os desafios para realizar esta pesquisa, primeiro pelo fato
de não ter material teórico suficiente sobre o tema, portanto a maneira que
encontramos foi a de ir primeiro aos indícios da fotografia e em sequência,
estudamos outros gêneros, para poder chegar ao que denominamos como
Fotografia Cultural. Outro desafio foi o fato de que toda fotografia tem um
caráter cultural, como também documental, desta maneira demos ênfase a
estudar esse novo conceito por um viés subjetivo. Consideramos que a
subjetividade é um sistema que organiza e desorganiza o mundo interno e
externo do sujeito a partir das dependências que estabelece com o meio em
que vive. Dessa maneira o entendimento do nosso conceito permitiu
compreender tanto o spectador como o fotógrafo-sujeito como homo
complexus, a partir da cultura.
O quadro teórico baseou-se no referencial construído e orientado
por dois eixos norteadores: o pensamento complexo, em Edgar Morin, e o
estudo da fotografia, em Boris Kossoy, ambos corroborando as relações e
141
articulações entre arte fotográfica, complexidade e educação. Ao buscamos tal
aporte teórico, entendemos que nossas indagações foram respondidas e as
expectativas, devidamente contempladas.
Se, por um lado, o pensamento complexo contribuiu para a religação das
culturas e pelo entendimento do homo complexus, por outro, os diversos
questionamentos sobre a fotografia trouxeram à tona os diferentes modos de
pensar e analisar seus meandros, com vistas à possibilidade de fazer emergir
uma nova vertente, que é a Fotografia Cultural.
Num trabalho científico os direcionamentos que os aportes teóricos nos
dão implicam de forma decisiva no desenvolvimento da pesquisa. Fazem-nos
ver detalhes e caminhos que não veríamos se não estivéssemos iluminados
por essas teorias, e podemos então, deixar aberto às discussões e
contribuições o conceito aqui exposto de Fotografia Cultural.
A partir daí, ficam respondidas de forma positiva nossas indagações
iniciais, que consistiram em nosso problema de investigação: Como pode ser
conceituada a Fotografia Cultural? A Fotografia Cultural pode ser considerada
um elemento de religação entre as culturas científica e humanística.
A Fotografia Cultural integra fragmentos, contextos, realidades numa
rede relacional complexa das sociedades e das culturas. No decorrer da
pesquisa transitamos pelo universo da intersecção de dois temas, tentando
encontrar o eixo de ligação entre eles e foi no encontro com alguns autores e
no amparo da teoria da complexidade que nos aproximamos da definição do
nosso objeto.
Entendemos ter comprovado a hipótese de que a Fotografia Cultural
pode ser definida a partir de diversos olhares e compreensões, não se
142
fechando em um único conceito, e que pode apresentar-se como elemento
integrador das culturas científica e humanística.
Nossa hipótese ficou ainda mais clara quando realizamos as séries
fotográficas e nos deparamos com um grande leque de imagens e nessas
fotografias pudemos observar e analisar atentamente aspectos objetivos da
técnica e subjetivos da emoção.
Para exemplificar, elencamos nas séries alguns temas analisados e
fotografados em que demonstramos a presença de aspectos análogos em
diferentes países, reforçando a ideia de que não há um único caminho para
definir Fotografia Cultural e que ela, por si só já é aberta a múltiplas e plurais
influências, porque é complexa por natureza.
Fizeram parte desta pesquisa os seguintes capítulos:
1. A Complexidade na Imagem;
2. Gêneros Fotográficos;
3. Entre Arte e Ciência;
4. Introspecção: Olhares e Descobertas.
No capítulo A Complexidade na Imagem, foram apresentados subsídios
que tratavam da imagem e suas relações complexas, em três momentos:
Arte/Estética, Fotografia e Cultura, com destaques para a relação imagética
com o conhecimento e o imprinting cultural, formando, assim, uma teia de
conhecimentos que foi base para a compreensão do que denominamos
Fotografia Cultural.
O capítulo Gêneros Fotográficos apresentou diferentes gêneros
fotográficos, como: Fotojornalismo, Fotodocumentarismo e Fotografia
143
Antropológica. O objetivo foi apontar semelhanças e diferenças entre os
gêneros, de modo a estabelecer fontes e relações com a Fotografia Cultural.
No capítulo Entre Arte e Ciência abordamos essa relação, tendo
estabelecido e apresentado definições de Cultura Humanística e Cultura
Científica e suas relações e interligações com a fotografia. Os subitens deste
capítulo foram: As Duas Culturas, a Fotografia e as Duas Culturas.
No capítulo Introspecção: Olhares e Descobertas, introduzimos nosso
conceito de Fotografia Cultural. Primeiramente, no que tange à linguagem
fotográfica e ao âmago do sujeito-fotógrafo, em que emerge
o imprinting cultural, a bagagem e o filtro cultural do fotógrafo na escolha e
composição de suas criações fotográficas. Apresentamos uma série de
imagens fotográficas em que temos indícios da Fotografia Cultural, em seguida,
foi feita uma análise das imagens apresentadas. Tais imagens exemplificaram
nosso objeto por meio de uma linguagem não verbal. Encerramos expondo
nosso conceito de Fotografia Cultural, porém não estabelecendo ideias ou
conceitos fechados e unívocos, mas sim ideias que legitimem
práticas multiculturais de religação.
Elencamos abaixo, ainda alguns tópicos que sintetizam Fotografia
Cultural numa perspectiva complexa:
Uma imagem que articula aspectos objetivos da técnica e
subjetivos da emoção;
Uma Fotografia Cultural permite compreender o sujeito como
homo complexus que religa o sapiens ao demens na e a partir da
cultura;
144
A Fotografia Cultural reúne conceitos e práticas presentes em
diversos gêneros fotográficos, mas distingue-se pela presença
marcante dos operadores cerebrais – hologramático, recursivo,
dialógico –, que se manifestam na expressão da subjetividade e
da objetividade da cena fotografada.
Uma Fotografia Cultural promove a reflexão do spectador a favor
da inclusão, da religação, da ética do pertencimento, da
solidariedade e do reconhecimento da complexidade humana.
Esse gênero fotográfico incorpora e demonstra fenômenos
multidimensionais, em vez de isolar parcialmente, de maneira
reducionista, as suas dimensões gerais.
Quando escolhemos algumas imagens e demos destaque no quarto
capítulo, tivemos a intenção de analisá-las imageticamente e identificar as
definições anteriormente expostas, a partir de diversos olhares e
compreensões.
Vale, ainda, ressaltar que, ao chegar ao fim desta pesquisa, temos
material teórico e prático para apresentar aos alunos que cursam a disciplina
que nos inspirou e instigou ao problema de investigação e que leva o mesmo
nome: Fotografia Cultural. Podemos afirmar que temos agora um conceito, que
é ponto de partida para discutir Fotografia Cultural.
Estudar Fotografia Cultural nessa interface com a educação nos trouxe
além de grandes descobertas, muito prazer, e agora vamos à sala de aula,
munidos de um novo conhecimento construído e, portanto, mais aptos a
discutir o tema, e quem sabe até, atribuir a ele novos significados e
perspectivas. Se nossa ideia inicial não era cunhar um termo de referência
145
absoluto, certamente era contribuir para o aprofundamento do tema, e
conceituá-lo, sem perder de vista a incerteza do conhecimento, deixando
aberto o debate a fim de suscitar novas indagações para outros estudos.
146
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