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Simone Avellar

Era época de Guerra Fria. Estados Unidos eUnião Soviética viviam tensões que ameaçavam, aqualquer momento, jogar – literalmente - o mundopelos ares. Nesse momento, nos EUA, o conceito deredes de computadores já tinha sido desenvolvido,mas era muito frágil levando-se em consideração ocontexto. Até então toda a comunicação da redepassava, necessariamente, por um computadorcentral. Se a URSS resolvesse atacar essa base, todaa informação seria destruída. Os Estados Unidos nãopodiam correr esse risco.

Foi nesse cenário que nasceu, em 1969, aarpanet, embrião da internet que conhecemos hoje.A arpanet foi desenvolvida pela ARPA – AdvancedReasearch Project Agency – e teve como grandenovidade uma tecnologia de rede que permitia queos departamentos se conectassem sem precisarpassar por um centro único.

No Brasil, a história da internet confunde-secom a da Rede Nacional de Pesquisa, criada em 1989.Seu objetivo era o de construir umainfra-estrutura de rede internet parafins acadêmicos. Em 1995 aconteceua abertura oficial da internet noBrasil, estendendo seus serviços deacesso a todos os setores dasociedade.

Quando a internet aindaestava em processo dedesenvolvimento, bem no seuinício, na década de 80, existiammais ou menos 100.000 hosts (cadaendereço de IP que designa umcomputador). Em 1996, já havia9.500.000 hosts e 30 milhões deusuários. Hoje, no mundo todo, mais de um bilhãode pessoas já aderiram ao espaço virtual.

Os Estados Unidos lideram o ranking mundialcomo o país que possui maior número deinternautas, com 70% (210 milhões) da populaçãodevidamente inserida no mundo virtual. O Brasil,nesse mesmo ranking, assume a décima posição, com32,1 milhões de usuários. Ainda que esse númeropossa não parecer muito significativo, é importantenotar uma grande evolução no número deinternautas brasileiros desde origem da internet aquino país: em 1997, dois anos após a abertura oficial,apenas um milhão e meio de pessoas tinham acessocontínuo à rede.

Um fator que contribuiu para apopularização da internet foi a explosão dasconexões em “banda larga” ocorrida nos últimosanos. Banda larga é o nome utilizado para definiras conexões com velocidade acima de 56 kbps, valormáximo atingido pelas linhas analógicas (modem).As tecnologias mais utilizadas para a banda largasão a por telefonia digital, cabo e rádio. A demandapor internet em alta velocidade no Brasil aumentou81% no ano de 2005 e especialistas na áreaacreditam que esse número ainda tende aaumentar. Eduardo Parajo, da Abranet (AssociaçãoBrasileira dos Provedores de Acesso) fala sobre oassunto: “O Brasil tem mais de 30 milhões deinternautas. E ainda há uma grande parte da

RetrRetrRetrRetrRetratos de uma vida virtualatos de uma vida virtualatos de uma vida virtualatos de uma vida virtualatos de uma vida virtualO impacto da internet no BrO impacto da internet no BrO impacto da internet no BrO impacto da internet no BrO impacto da internet no Brasil e no mundoasil e no mundoasil e no mundoasil e no mundoasil e no mundo

população que não tem acesso à internet. Aindahá muito espaço para crescer”.

Em um país que possui 170 milhõeshabitantes, 45,65% da população já teve acesso acomputadores pelo menos uma vez na vida e 33,2%já acessou a internet. O número de internautas quepossuem acesso domiciliar é de 22 milhões.

A taxa de analfabetismo no Brasil é de 13,3%.Entre esse grupo, constata-se que apenas 12% dosanalfabetos já utilizaram um computador algumavez na vida e 5,67% já acessaram a internet. Emrelação às pessoas que cursaram o nível superior essenúmero sobe para 93% já tendo tido contato comcomputadores e 86,5% com a internet.

A faixa etária entre 16 e 24 anos é a parcelaque abriga a maior quantidade de internautas, sendoque 58,83% desses jovens já acessaram a internetalguma vez. Já entre a população com mais de 60anos apenas 3,21% já utilizou a rede.

Entre os que costumam acessar freqüentementea internet, 43,39% a utilizam em casae 25,4% em acesso público pago,como lan houses. A maioria (69,4%)utiliza a internet para fins pessoaisou privados. Por mês o brasileiroacessa, em média, 57 sites e gastapraticamente um dia todo (24 horas)na internet.

Em relação a Web 2.0, criadapelo americano Tim O’reilly paradefiner a nova tendência da WorldWide Web, os brasileiros estão comtudo: No orkut, somos a maiorpopulação cadastrada (55%). NoYoutube, dos mais de seis milhões

de vídeos armazenados, mais de dois milhõespertencem à brasileiros, e no fotolog mais de 50% doslogins (entre aproximadamente oito milhões e meio)são de brasileiros também.

A Web 2.0 pressupõe, sobretudo, ainteratividade do internauta. Defende-se a criação deum ambiente mais dinâmico, no qual os usuárioscolaborem para a organização do conteúdo. Para isto,a tecnologia utilizada deve ser simples, para quepermita que mesmo os usuários com poucoconhecimento sejam capazes de publicar e absorverinformações. Entre os sites Web 2.0 podem ser citados:Orkut, Youtube, Wikipedia, Fotolog, Apontador.

Se existem 32 milhões de internautas no país,significa dizer que mais de 80% da população estáexcluída dessa tecnologia. Existem diversos fatoresque explicam essa exclusão e, entre as maioresbarreiras, está a falta de computadores em casa.

Não estar incluído, ou não ter conhecimentosda tecnologia da internet nos dias de hoje, pressupõeo encontro de alguns obstáculos. Dados comprovamque 80% dos candidatos a estágios semconhecimentos de informática não conseguememprego. Além disso, existem todos os benefícios,que uma pessoa sem acesso a internet perde: 72%dos serviços do Governo Federal são oferecidos pelainternet, sem contar com as facilidades de pesquisae comodidades, como as linhas bank line quepermitem o pagamento de faturas online.

Por mêso brasileiro

acessa, em média,57 sites e gastapraticamenteum dia todo

(24 horas)na internet

Para acessar o NºZero não é precisocadastro. A navegação fica por sua conta. Nodesafio de montar um jornal a cada semestre,com novas pautas e alunos de diferentesperíodos, adotamos a Internet como base.

O tema já está saturado na grandeimprensa, o que nos obrigou a tentar buscarum outro olhar, uma maneira diferente decontar uma história que pode não ser inéditapara o leitor.

Se na Internet o espaço é ilimitado, aquinos deparamos com o limite do papel, umlimite físico para contar em um jornal o quehá de mais virtual na grande rede, como oSecond Life, a web-arte e os mitos quecirculam via e-mail. A fórmula queencontramos foi cada um explorar umapauta especial, para tentar fugir do sensocomum.

Nessa aventura vamos daqueles quefazem da Internet uma necessidade em suasvidas até os que estão na contramão desteprocesso: excluídos digitais e pessoas queaboliram a web de suas vidas.

Nada mais apropriado, para encerrar,do que marcarmos uma continuidade nosblogs pessoais, orkuts e avatares da web.

UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO

ReitorAloisio Teixeira

ESCOLA DE COMUNICAÇÃO

DireçãoIvana Bentes

Coordenação do Curso de JornalismoAna Paula Goulart

Núcleo de Imprensa Elizabete Cerqueira coordenação executiva

Cecília Castro programação visual

número 11 - 2007/1Informativo produzido pelos alunos da Escola de

Comunicação da UFRJ

Orientação acadêmica e de textoMaurício Schleder

Paulo Roberto PiresCoordenação editorial

André Motta LimaCoordenação gráfica e design

Cecília CastroAssessoria de Imprensa

Elizabete CerqueiraApoioSG-6

PR-1

Divisão Gráfica da UFRJ

Este número foi produzido com matérias elaboradas pelosalunos da disciplina Jornal Laboratório. As fotografias e

ilustrações são de responsabilidade exclusiva dos alunos.Término em 10/06/2007.

TIRAGEM: 1.000 exemplaresDISTRIBUIÇÃO GRATUITA

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Bruno Marinho

Quando se entra no quarto deTiago Seabra Magalhães, 21 anos, o quemais chama a atenção é a estante en-costada na parede oposta à janela. Nomóvel, um monitor tela plana, de 21polegadas, é acompanhado pelo con-junto de duas caixas de som principaismais duas outras auxiliares que for-mam seu pequeno home theater, motivode orgulho para o estudante de Enge-nharia de Telecomunicações.Escondido por detrás do gabinete retan-gular, um detalhe que faz toda adiferença: a conexão da Internet quemudou radicalmente seus hábitos deconsumo.

É apegado na facilidade que aInternet lhe proporcionou que Tiagoconta como, conscientemente, alterouseus costumes e passou a ver a Rede nãocomo acessório, mas sim com a salva-ção para a maioria de seus problemas.

- A comodidade que tenho com aInternet é algo impressionante. Ela mefacilita com os trabalhos da faculdade,na procura por estágios. Quando querosaber alguma coisa, alguma notícia ouinformação específica, a encontro rapi-damente na Internet – explica.

Tiago é exemplo das várias trans-formações causadas pela entrada darede mundial de computadores no co-tidiano das pessoas, mas, com certeza,não é o único. Segundo o Instituto Bra-sileiro de Geografia e Estatística (IBGE),32 milhões de brasileiros têm acesso àInternet. Quando é levado em conside-ração o número de pessoas que tem adisposição conexões de alta velocidade– caso no qual o jovem se enquadra -, aquantidade de usuários diminui. Atu-almente, cerca de 13,5 milhões depessoas têm a possibilidade de compar-tilhar arquivos de som, imagem e vídeocom extrema facilidade.

Apesar do maior acesso à informa-ção e conteúdo dos mais variados, o quemais se destaca na relação de amor deTiago com a Internet são os novos crité-rios que usa no momento de decidir oque merece ser consumido. O jovem,que garante ser um amante de música –seu estilo favorito é o Rock’n Roll – nãocompra um CD há mais de quatro anos.Mas então, o que aconteceu? Ao acessara pasta “Músicas” de seu computador,ele mostra centenas de arquivos no for-mato MP3. Isso mesmo. Desde que temInternet banda larga (seu primeiro aces-so caseiro foi em maio de 2003) Tiagopassa longe das lojas de CD.

- A coisa mais fácil do mundo ébaixar músicas. Além dos programasespecíficos, no Orkut existem comuni-dades de todas as bandas, o que sófacilita sua busca. Hoje em dia eu não

compraria nem o melhor CD do meugrupo musical favorito – garante.

Segundo o estudante, um fator quepoderia lhe levar a comprar um CD, ain-da assim em condições muito especiais,seria um possível interesse no encartedo álbum. Porém, como o trabalho doprodutor editorial existe na Rede à dis-posição de quem quiser, não há nada queo faça pegar em dinheiro quando o as-sunto é música em estúdio. Isso porque,quando se trata de apresentação ao vivo,Tiago ainda é partidário das tradições:

– Eu não abro mão do show aovivo. É por causa da emoção, do calordo evento. Além disso, a exibição aovivo de uma banda internacional, por

exemplo, é algo mais raro, que aconte-ce uma vez na vida, outra na morte.

Tiago é daqueles jovens que cres-ceram revezando brincadeiras ao ar livrecom doses diárias de televisão evideogame. Na adolescência, um deseus programas favoritos sempre foi irao cinema com amigos e namoradas. Osídolos da tela grande, conta, são mui-tos. Ele é fã do espião James Bond, dasaventuras espaciais de “Star Wars”,dentre outros. Entretanto, se antes suasidas ao cinema se davam mensalmen-te, agora ele só sai de casa por um filmese for daqueles que realmente desper-tam sua atenção. A razão para isso é,mais uma vez, a facilidade de se fazer o

download das estréias antes mesmo deentrarem em cartaz no Brasil.

- A expectativa que existe quandose assiste a um filme no cinema é muitomaior. A tela grande, o escuro, a gentese concentra mais. Mas eu agora tenhooutras formas de lazer – disse Tiago, quetambém não sente falta da refeição quetradicionalmente vinha em seguida aofilme. Para ele, basta pedir por telefonea mesma comida que poderia escolherna praça de alimentação de umshopping center, por exemplo.

Tiago admite que a Internet fezcom que o cinema, uma das maioresopções de lazer no início de seu relaci-onamento com Nathália, sua atualnamorada, fosse relegado a segundoplano. Por outro lado, ele garante queo programa foi substituído por idas arestaurantes e bares. Ele vai ainda maislonge ao dizer que um problema típicode namorados foi solucionado graçasàs seções de filmes no computador.Atualmente, nenhum dos dois precisanegociar com o parceiro quando so-mente um quer assistir a um lançamento,já que a falta de companhia não é pro-blema quando a exibição acontecedentro de casa.

- Agora não temos mais esse tipode discussão. Se um não quer ver aque-le filme, o outro vê pela Internet –confirma Nathália, que usa a Rede tan-to quanto Tiago, e que, assim como ele,tem brilho nos olhos ao descrever asmaravilhas do mundo online.

Antes de instalar a Internet ban-da larga em seu computador, Tiagopassou pela fase em que trocou a luzdo dia pela escuridão providencial daslan houses e seus jogos on line. Para aalegria de seus pais, Maomé deixou deir até a montanha depois que a monta-nha foi trazida para dentro de casa. Oque aconteceu então no lar dos SeabraMagalhães foi uma disputa entremídias: de um lado, a TV a cabo e asdezenas de canais que distraíam a todaa família. Do outro, a força de um veí-culo capaz de exercer as funções derádio, som estéreo, aparelho de DVD e- por que não? – televisão. Certamentenão é preciso dizer quem se saiu vitori-oso desse duelo de titãs.

- Eu ainda assisto aos canais aber-tos, mas não sinto nenhuma falta da TVa cabo. Na Internet você é capaz de en-contrar todos os tipos de séries que vocêimaginar, antes de entrarem no ar aquina TV do Brasil. Não preciso da MTV.Assisto a Videoclipes e apresentaçõesmusicais pelo youtube. Consigo ver aslutas de vale-tudo ao vivo, de graça,estando conectado. Além disso, tenhoacompanhado as partidas de NBA pelaInternet – enumera, numa série de van-tagens que parece não ter fim.

Há quatro anos com Internet bandalarga em casa, Tiago garante que sua vidamelhorou com seu uso e abuso. O que elenão sabia é o quanto essa melhoria podeser observada no bolso de quem paga ascontas. Ao serem calculadas as despesasque teria caso a rede mundial decomputadores não tivesse papel tãointenso em sua vida, conclui-se que,independentemente de toda acomodidade, a conexão de altavelocidade pode ser considerada umaquestão de economia para a classe média.

Segundo Tiago, sua média dedownloads musicais é de 15 arquivos pormês, ou, se preferir, de um CDencontrado nas lojas. Se estipularmos opreço médio de um álbum no comérciolegal, a economia é de cerca de R$ 30,00.Como o estudante não compra o artigohá quatro anos, significa que, até hoje,R$1.440,00 deixaram de ser gastos commúsica.

Quando o assunto é cinema, aeconomia também é grande. Tiago afirmaque assiste pelo computador a uma média

de cinco filmes por mês. Caso o estudantevoltasse a freqüentar as salas de exibiçãopara assistir a mesma quantidade defilmes, seus gastos seriam de R$ 85,00,considerando-se a refeição feita após asessão e sem contar com os gastos comtransporte e com a presença da namorada.Isso porque Tiago provavelmente arcariacom as despesas femininas.

Na matemática da Internet, hátambém o lucro gerado com ocancelamento da TV por assinatura. Sefossem assinantes, Rosa e Ênnio Soares,pais de Tiago, pagariam todo mês abagatela de R$179,90. Mais que o dobrodo valor que é cobrado pela Internet bandalarga: R$82,92. O casal ficou surpreso aoperceber a economia graças à Internet.

- A Internet é importante porqueposso ficar mais tranqüila com o Tiagodentro de casa. Além disso, tem aeconomia que não imaginava ser essa.Agora tenho certeza de que fiz a coisa certaao cortar a TV por assinatura ­– afirma amãe, dona-de-casa, contando com o apoiodo marido, aposentado.

Dias inteiros sem sair da banda largaDias inteiros sem sair da banda largaDias inteiros sem sair da banda largaDias inteiros sem sair da banda largaDias inteiros sem sair da banda largaNa rotina conectada de Tiago só a namorada continua real. Mas os programas mudaram

Conexão rápida foi sinônimo de economia

Fones de ouvido: Tiago não incomoda ninguém com o som alto do filmes que assiste pelo PC

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Cizenando Cipriano Jr.

Segundo estudo recente do siteTechnorati [www.technorati.com],nasce um blog na rede a cada segundo.Além disso, a grande maioria das fer-ramentas disponíveis para se criar umdiário virtual são gratuitas. “É umamídia pessoal e moderna. Seu sucessose fundamenta na interação e na proxi-midade com o leitor. É tudo feito parao leitor de forma direta”. Assim RosanaHermman, dona do Querido Leitor[www.queridoleitor.zip.net], define osblogs. O termo, que se originou dacorrutela da palavra <weblog>, foi cu-nhado há dez anos pelo teóricoamericano Jorn Barger.

Ele designava, inicialmente, páginasde internautas que permaneciam dia-riamente muitas horas on-line (ouconectados à Internet) e, deste modo,atualizavam constantemente seu con-teúdo. Além disso, este grupoespecífico divulgava links (ligaçõespara outros sites) e também tornavapossível aos visitantes a chance de co-mentar o que era postado de modoinstantâneo.

Entretanto, ainda é discutido opioneirismo de Barger, pois já eramdetectados na rede endereços com ascaracterísticas semelhantes a dadefinição.

Com a afirmação da Internet comoreal veículo de informação, o papeldesta ferramenta se expandiu e atual-mente a blogosfera, como édenominado o mundo dos blogs, tem opoder de atrair a audiência entre tan-tas possibilidades que a “grande rede”oferece.

No Brasil, este fenômeno é patente.Desde a criação do primeiro blog emportuguês, em março de 1998, porNemo Nox (pseudônimo), o número deblogueiros tupiniquins aumenta e sedestaca. Por exemplo, na lista das 100personalidades mais influentes de 2007,publicada pela revista Isto É[www.terra.com.br/istoe] no iníciodeste ano, figuram Antônio Tabet, cri-ador e mantenedor do Kibe Loco[www.kibeloco.com.br], um dos blogsde humor mais populares da rede, eRaquel Pacheco, jovem que sob o ape-lido de Bruna Surfistinha[www.brunasurfistinha.com] ganhouprojeção a partir do blog em que des-crevia seu cotidiano como prostituta.

Inicialmente, esta forma de se inse-rir na rede era visto com certopreconceito, pois foi logo associada àpublicação de cotidianos particularesna rede e o ato de blogar foi imediata-mente taxado como uma atividadeadolescente, espécie de diário moder-no. Com o tempo, contudo, o caráter

todos os grandes portais têm blogueiroscontratados”.

Autor do Pensar enlouquece, pensenisso [www.interney.net/blogs/inagaki], onde discorre sobre temascomo o amor ou os piores cantores domundo, Alexandre Inagaki iniciou esteano uma empreitada de fôlego. Em par-ceria com também blogueiro EdneySouza [www.inteney.net], deu início aum novo condomínio de blogs na redebrasileira, cuja proposta é oferecer remu-neração aos abrigados sob sua marca. Acriação já nasceu com patrocinadores.

“Blogs, em geral, são exércitos de umhomem só. Estamos buscando umamaneira de congregar escribas detalento, fazer com que cada blogagregue novos leitores e ao mesmo criarum portal diferenciado de notícias, queserá diariamente abastecido por textosinéditos e de qualidade”, comentouInagaki em entrevista a Tiago Dória[www.thiagodoria.blig.ig.com.br]. Oempreendimento entrou no ar emfevereiro deste ano, abarcando 21 blogs.

O FUTURO DA MÍDIA DO FUTUROTabet entende que a situação tende-

rá a uma acomodação natural, sem osextremismos nem de uma revolução(fase, segundo ele, já superada), nemde um apocalipse. E a permanência, noseu ponto de vista, depende muito darelação com os leitores.

“Não acredito em boom e nem emdeclínio. Acho que a tendência é a es-tabilização, como colunas de jornal, etc.Alguns estão aí, já. E vão ficar. Outrosaparecerão. E, claro, outros vão sumir.Os leitores são fundamentais para oblog. No meu caso, são críticos, inteli-gentes e gostam de colaborar. O KibeLoco não tem cara de site pessoal. É ummeio de expressão. Meu e deles”, de-clara o blogueiro.

Já Rosana Hermann aponta para aconfluência de mídias como uma ma-neira de manter a atualidade daferramenta. “É certamente um merca-do [o dos blogs] em expansão, que passaa integrar até streaming ao vivo, comofaço agora”, diz, referindo-se a esta for-ma de se transmitir dados de áudio e/ou vídeo em tempo real.

Inagaki comenta a questão sob oaspecto da enormidade de infromações(a maioria fúteis) que a rede oferece:“No dilúvio de informações da Web [arede], ter um blog é quase como jogaruma garrafa no mar em busca de al-guém que a encontre”, afirma, paraacrescentar: “Com o agravante de que,citando tira publicada pelo AdãoIturrusgarai, é bem provável que a gar-rafa que você porventura achar teráuma mensagem com a frase “enlargeyour penis” ou coisa do tipo”.

Diários que podem mudar o mundoDiários que podem mudar o mundoDiários que podem mudar o mundoDiários que podem mudar o mundoDiários que podem mudar o mundoPainel sobre blogs a partir da visão dos principais blogueiros brasileiros

Pimenta no post dos outros...Pimenta no post dos outros...Pimenta no post dos outros...Pimenta no post dos outros...Pimenta no post dos outros... “Rankings e prêmios são besteira.Quando prestar atenção nos fatos,você parará de se ocupar com isso evoltará a fazer a única coisa que umblogueiro pode fazer para tornarseu blog realmente significativo:blogar”, destila Carlos Cardoso, doContraditorium[www.contraditorium.com].

tir de uma simples vontade de compar-tilhar algumas piadas com e trabalhoconstruiu, em abril de 2002, o KibeLoco, hoje abrigado no portalGlobo.com [www.globo.com], queconta com respeitáveis 200 mil visitan-tes únicos por dia.

“Eu acredito no poder dos blogs.Mas acho que isso se restringe a seto-res sócio-culturais, etc.”, afirma oblogueiro. Sobre a influência no coti-diano, Tabet faz um recorte em relaçãoa possibilidade de um post interferirna vida política do país: “A interfe-rência na área política ainda é menor.Apesar de bons blogs que trabalham otema, políticos ainda preferem agir deacordo com pautas de jornais, revis-tas e TV”.

Ricardo Noblat, que construiu todaa sua carreira profissional na mídiaimpressa, passou a publicar na rede, emmarço de 2004, as notas que o tempotornaria velhas para serem publicadasno jornal. Desde então, o Blog doNoblat [www.noblat.com.br] passoupela CPI do Mensalão e, da condiçãode pioneiro, tornou-se o principal ob-servador político na internet brasileira.O jornalista conta que a maior dificul-dade que encontrou de adaptação ao

Formada em Física e com mestradoem Física Nuclear, Rosana teve, aindana década de 1970, o primeiro contatocom computadores. Porém, foi somentecom o desenvolvimento de sua carreiracomo escritora e jornalista que passoua adotar a internet, nos anos 1990, comoum auxiliar em seu trabalho.

“Sempre acreditei no sucesso dosblogs, mesmo quando todos duvida-vam disso. O meu passou a ter vidaprópria que independe da minha car-reira em tevê. O mundo ficou bem menorcom a rede”, afirma ela, atualmente re-datora do programa Pânico na TV[www.paniconainterne.com.br] ,complementando: “O blog já é podero-so no Brasil, prova disso é o fato de que

dos posts foi mudando. Passou-se autilizar esse mecanismo para, por meiode um recorte do mundo, deter o visi-tante na página. Com a descoberta dainternet pela mídia tradicional – maisclaramente jornais e emissoras de tele-visão –, o blog tornou-se uma soluçãopara a interatividade que a veiculaçãona rede exige das empresas que trans-ferem suas marcas para este espaço.

OS BLOGUEIROS EXISTEMA pedra fundamental de todos os

blogs é o olhar particular do autor so-bre a realidade. No bloco dos queadotam o humor como arma, a referên-cia de mais sucesso é a página do (ex)publicitário Antônio Tabet – que a par-

novo meio foi a transposição de suamaneira de relatar uma notícia.

“A linguagem é diferente. Aindauso o que aprendi no jornal paraescrever. Não sei direito o que é isso.Estou tentando descobrir. Mas estásendo ótimo aprender”, declarouNoblat ao Observatório da Imprensa.Atualmente ele tem seu bloghospedado no site do jornal O Globo[www.oglobo. com.br] e nele mantémuma coluna semanal (publicada àssegundas-feiras). Antes, sua página jáfora abrigada pelo portal IG[www.ig.com.br], onde passou a re-ceber pelas postagens, e também pelojornal Estado de São Paulo[www.estadao.com.br].

Dez blogs parDez blogs parDez blogs parDez blogs parDez blogs para se ter nos fa se ter nos fa se ter nos fa se ter nos fa se ter nos favoritosavoritosavoritosavoritosavoritos

Não há nada mais popular e moderno na blogosfera do que a feitura de listassobre qualquer coisa. Como qualquer blogueiro que se preze, este escribatambém faz a sua, com o endereço de 10 blogs que valem a pena ser visitados,segundo minhas viagens rede.

· Soninha <http://blogdasoninha.folha.blog.uol.com.br/>· Pedro Alexandre Sanches <http://pedroalexandresanches.blogspot.com>· Juca Kfouri <http://blogdojuca.blog.uol.com.br/>· Nei Lopes <http://neilopes.blogger.com.br/>· Luís Nassif <http://luisnassif.blig.ig.com.br/>· No front do Rio <http://oglobo.globo.com/rio/ancelmo/frontdorio/>· Blog do Tas <http://marcelotas.blog.uol.com.br/>· Jacaré Banguela <http://www.jacarebanguela.xpgplus.com.br/>· Jesus, me chicoteia! <http://www.jesusmechicoteia.com.br/>

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Camila Nobrega

Marcar encontro para dis-cutir literatura virou coisa dopassado. A atual rotina dosescritores, críticos e curiosos émanter-se atualizado nos prin-cipais endereços ecomunidades virtuais que sepropõem a discutir o tema. Onúmero de sites e blogs desti-nados à literatura tem crescidomuito nos últimos anos e algu-mas discussões seguem noiteadentro, com mais de cem pes-soas participando e outrascentenas acompanhando, masapenas observando.

A internet hoje é o espaçoque abriga os mais acaloradosdebates literários. O site Para-lelos — onde pode-seencontrar crônicas, entrevistase opiniões de diversos escrito-res —, o Todoprosa, do sitenominimo.com, e os inúmerosblogs de escritores brasileirose estrangeiros são exemplos dealguns endereços que fazemparte de listas pessoais paravisitação diária. Os comentári-os, notícias ou entrevistaschegam a receber mais de cemrespostas, críticas ou resmun-gos. No caso do TodoProsa,escrito pelo jornalista SérgioRodrigues, que é um dos edi-tores do NoMínimo, algunscomentários são verdadeirascríticas literárias, espaço ondeautores, fãs e críticos discutemos novos nomes da literatura,opinam sobre livros, matérias,e até quebram o pau.

— Muitos assuntos rende-ram debates bastanteentusiasmados e até nervosos.Nenhum deles chegou aos pés,tanto em número de comentá-rios quanto em exaltação dosânimos, da polêmica recentesobre o projeto Amores Ex-pressos. Foram muitascentenas de comentários, in-clusive de autores que estãoparticipando do negócio; masnem todos usaram seus nomesverdadeiros. — explica o jor-nalista Sérgio Rodrigues.

O projeto Amores Expres-sos vai mandar 16 escritoresbrasileiros para diferentes ci-dades do mundo, de onde elesse comprometem a escreverum romance cada, que serãopublicados pela editora Com-panhia das Letras. Para se teruma idéia do alcance das dis-

cussões virtuais, uma únicacrítica sobre esse projeto foipublicada pelo jornalista noTodoprosa e rendeu inúmerasrespostas no próprio blog,além de se estender a outrosdomínios na internet. Alémdisso, de forma surpreenden-te, o Todoprosa foi citado portodos os escritores entrevista-dos, quando perguntadossobre endereços que costu-mam visitar para acompanharas opiniões e atualizações so-bre literatura.

A jovem escritora AnaPaula Maia, que mantém pu-blicações de folhetins no blog“killingtravis” assume acom-panhar as discussões quasediariamente:

— Sai até pancadaria noTodoprosa e em blogs de ou-tros escritores, centenas decomentários, ferve! Sem dúvi-da a internet é um dos lugaresmais interessantes para se de-bater literatura. — E completa:— Mas eu gosto de observar omovimento, nem sempre que-ro falar, gosto mesmo deobservar quietinha. Posso ficar

aqui, até de pijama, acompa-nhando tudo sem serpercebida — afirma AnaPaula, que preferiu marcar aentrevista pelo MSN.

Apesar disso, um impor-tante consenso é sobre oexagero em algumas declara-ções demasiadamente irônicase agressivas, como explica ojornalista e escritor MarceloMoutinho.

— Em geral, só faço comen-tários quando o debaterealmente me parece pertinen-

te, já que as discussões chegama extremos inacreditáveis.Mesmo assim, acredito que arede ajudou a viabilizar nova-mente uma ‘vida literária’ nonosso país, conectando autoresde vários cantos e possibilitan-do um diálogo muitointeressante. — defende o es-critor, que mantém o blog“Pentimento”.

Os entusiastas dessa novavida literária, agora virtual,ressaltam que nunca sepôdediscutir tantos assuntoscom tanta gente ao mesmotempo, e de modo tão natural.

— Ainda tem muitoexibicionismo, muita agres-sividade infantil. Mas a trocade opiniões é muito en-riquecedora, tem gente ali querealmente entende de literaturae quer trocar figurinhas deverdade. É aí que a internetmostra esse trunfo que só elatem de incluir o leitor najogada. A tendência, com o

tempo, é que a qualidade dopapo cresça em todos os blogs.- acrescenta Sérgio Rodrigues.

Apesar dos exagerosdesmedidos, a enorme par-ticipação de pessoas que sepropõem a debater literaturamostra a influência da rede noassunto. Só no orkut, apesquisa pelo título“literatura” gera um resultadode mais de oitocentascomunidades. Aos poucos, osespaços virtuais invadem ascasas de brasileiros, de umaforma mais simples eparticipativa. A escritora

Vida literária 2.0Vida literária 2.0Vida literária 2.0Vida literária 2.0Vida literária 2.0Escritores e críticos quebram o pau nos comentários de blogs transformados em saraus virtuais

Para acompanhar as discussões literárias no mundo virtual, um bom começo é visitar os sites mais acessados.Sugestões (alguns dos favoritos em números de acessos):

Sites: Blogs pessoais dos entrevistados:• todoprosa.nominimo.com.br • www.marcelomoutinho.com.br• www.paralelos.org • killingtravis.blogspot.com• portalliteral.terra.com.br • invejadegato.blogger.com.br

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OKOKOKOKOK

Antônia Pellegrino, autora doblog “Inveja de Gato” eparticipante do projeto “Amo-res Expressos” ressalta anovidade de a discussãoliterária fazer parte do dia-a-dia das pessoas, como um dosbenefícios da internet.

— Acho fascinante a litera-tura ser alguma coisacotidiana. Imagino o sujeito /

leitor / comentarista saindo dobanho, postando um comentá-rio antes do jantar — algoassim, bem banal. — E conti-nua: — Sempre me intrigoubastante essa figura, o comen-tarista de blog. Eles são umacategoria; batem ponto, são fi-éis, comparecem diversasvezes ao longo do dia para sa-ber o que se passa na discussãoonline, muitas vezes pensamou falam coisas interessantes,fazem amigos. É uma rede desociabilidade fortíssima – pes-soas reunidas por um mesmointeresse: literatura.

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Carolina Cabral

Em meados da década denoventa, poucas pessoas poderiamprever o boom da Internet, quecomeçava a dar seus primeirospassos, e o lugar que ela teria na vidadas pessoas em todo o mundo, nestecomeço de século XXI.

Nos dias de hoje, não é mais umluxo ou simples questão de opçãouma pessoa utilizar e dominar omanuseio e serviços disponíveis naInternet, mas quase um utensílio tãonecessário e “vital” quanto um carroou telefone.

Com o surgimento da WorldWide Web, esse meio foienriquecido. O conteúdo da redeficou mais atraente, com apossibilidade de incorporar imagense sons. Um novo sistema delocalização de arquivos criou umambiente em que cada informaçãotem um endereço único e pode serencontrada por qualquer usuário darede.Os famosos “sites” foramcriados e qualquer informação, sobrequalquer assunto, em qualquerlíngua, pode ser encontrada emquestão de segundos – claro,dependendo se sua conexão édiscada ou via cabo.

Verdadeiras febres como oGoogle e Wikipedia nos oferecemdados sobre o que quisermos, apenasdigitando uma palavra-chave.

Através da Internet, podemosescutar músicas que nãoencontramos mais em discos, álbunsque ainda não foram lançados, filmesque sequer começaram a passar noscinemas e todo tipo de informaçãoatualizada em tempo real. Talvezseja mais fácil saber notícias sobre aguerra do Iraque, através da Web,do que estando em Bagdá.

Mas não são somente assuntosrelacionados à vida em sociedadeque encontramos na rede. Oumelhor, também encontramosassuntos relacionados à morte ecomo a morte na Internet cria casosbizarros, cômicos ou até mesmotrágicos.

EXISTE VIDA APÓS A INTERNET?Um exemplo da obsessão que as

pessoas têm pela morte e como issose reflete na rede é o sitewww.deathclock.com, que emportuguês significa “relógio damorte”. O visitante só precisa

O dia em que morri na internetO dia em que morri na internetO dia em que morri na internetO dia em que morri na internetO dia em que morri na internetNos últimos vinte anos a rede mostrou-se o meio mais eficiente para a troca rápida de informações entre

pessoas de todo o mundo. Mas não são apenas notícias de cultura, futebol ou política que circulam pela Web

informar sua data de nascimento,peso, altura e se é fumante, para queapágina determine o dia, mês e anoda morte do internauta.

Há ainda casos mais sérios, comoo do suicídio de um jovem de 16 anos,morador do de Porto Alegre, queplanejou a hora e o local de sua mortee compartilhou este momento, comoutras pessoas, em um fórum virtualna Internet.

O jovem se suicidou em julho de

das vítimas. O problema é que estapressa “matou” muita gente que estáviva.O empresário, do setor demármore, Júlio Guidi estava noavião da Gol que caiu na florestaamazônica. Julio era capixaba,casado, tinha 39 anos, dois filhos euma conta no orkut..

Mas não era só ele. Outro JulioGuidi, esse que não estava no vôo,acabou sendo “morto” por muitagente. O Julio Guidi, vivo, tem 21

anos, é carioca, morador de CampoGrande e estudante de Direito erecebeu mais de quatro mil scrapscom mesnsagens de pêsames, como:“fica com Deus”, “descanse em paz”e “que Deus te dê descanso “.Segundo Julio, no começo asmensangens eram levadas nabrincadeira, mas depois dealgunsdias, ele começou a se sentirmuito incomodado: “– Nosprimeiros dias, eu levava nasacanagem, meus amigos tambémentraram na “pilha” e enviavammensagens dizendo “que saudade,Julinho”, mas depois começou a ficarmacabro e não paravam de chegarcentenas de “scraps” lamentandominha “morte”.

Ele conta que após cinco dias,resolveu colocar uma mensagem napágina inicial de seu perfil, alertandoàs pessoas de que não haviamorrido, mas que lamentava a mortedo outro Julio Guidi. Mas segundoele, mesmo assim, as mensagens nãoparavam de chegar. E foi assim queele resolveu mudar de tática:

– Fui obrigado a deletar aquelaantiga conta, ficar algum tempo semacesso ao Orkut e só algumassemanas depois criei um novo perfile adicionei apenas os amigos maischegados.

Mas não são somente cidadãoscomuns que sofrem com esse tipo deboataria na Internet. Váriascelebridades já foram “mortas” naInternet. Um caso ilustre é o doescritor Zuenir Ventura. Em outubrode 99, o jornal Estado de São Pauloveiculou uma notícia anunciando amorte do escritor em um acidentede carro, no bairro da Lagoa. Emseguida, começaram a circularcorrentes de email na internet,confirmando que Zuenir tinhamorrido.

Uma suposta empregada dojornalista teria dado a informação,logo depois desmentida por ZuenirVentura.O próprio escritor tomou ainiciativa de ligar para algumasredações de jornais.

Segundo Zuenir, o boato teriasurgido a partir da ligação de umrepórter para um número que já nãolhe pertencia. Uma mulher que teriase identificado como sua empregadapassou a informação do acidente eda morte: “– Obituários já estavamsendo feitos, colegas meus – até hojetêm uma raiva danada de mim porisso (risos) – estavam tomandocerveja no bar e foram chamadospara fazer meu perfil. Tudo isso foiaté muito engraçado, mas, duranteduas horas, meu filho ficou achandoque eu tinha morrido e eu nãoconseguia desmentir.”

Fica de lição para os Julios, Zuenire todos os internautas, é que todomorto da internet pode estar vivofora dela.

Orkut que mata,Orkut que mata,Orkut que mata,Orkut que mata,Orkut que mata,também dá nometambém dá nometambém dá nometambém dá nometambém dá nomea vivoa vivoa vivoa vivoa vivoOrkut Büyükkokten, engenheiro desoftware, de 32 anos, nascido naTurquia e criado na Alemanha, criouum dos maiores fenômenos daInternet nos últimos tempos.O Orkut é uma rede social filiada aoGoogle, criada em 19 de Janeiro de2004, uma rede de relacionamentoque atinge milhões de pessoas emtodo o mundo.

2006, no banheiro do apartamentoonde morava com os pais. O planode suicídio já havia sido anunciadono blog que mantinha na Internet.

Além do blog, ele participava defóruns virtuais de discussão, entreeles, grupos que debatiam osuicídio. Foi em um desses fórunsque o adolescente encontrou pessoasque o incentivaram a levar adiante aidéia de se matar. Além de osparticipantes, darem ao jovem dicassobre a forma considerada maiseficiente para se matar, elesacompanharam, em tempo real, omomento de sua morte.

ORKUT TAMBÉM MATAMas nada como o site de

relacionamentos Orkut para gerarmuita confusão na Internet comcasos de pessoas que morreram. Umcaso curioso foi o dos homônimosJulio Guidi. Com a divulgação dalista de passageiros que morreramno acidente do Boeing 737-800 daGol, diversos internautas correrampara o Orkut para encontrar o perfil

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Mesas virtuais, dinheiro de verdadeMesas virtuais, dinheiro de verdadeMesas virtuais, dinheiro de verdadeMesas virtuais, dinheiro de verdadeMesas virtuais, dinheiro de verdade

Carlos Leal

Quando, em 2003, o norte-americano ChrisMoneymaker ganhou dois milhões e quinhen-tos mil dólares no torneio mundial de pôquer,transmitido ao vivo pela ESPN, o pôquer onlineassumia seu caráter de fenômeno mundial.Moneymaker era mais um jogador amador dainternet que, através dos chamados “torneiossatélites” realizados na rede, teve a oportunida-de de disputar o evento principal da sériemundial de pôquer (disputado na mo-dalidade Texas Holdem), realizadoem Las Vegas todos os anos e até en-tão jogado quase que exclusivamentepor profissionais. Os prêmios, com oaumento do número de participantes,tornaram-se cada vez mais altos. Mi-lhões de pessoas passaram aidentificar a oportunidade de compe-tir em um jogo emocionante a partirde sua própria casa e ainda ter achance de se tornarem milionárias.Nas palavras do próprio Chris“Money Maker”, “pessoas começarama pensar: se esse cara pode, eu tambémposso”.

O fenômeno mundial começoua se desenhar quando foi lançado ofilme Cartas na Mesa, em 1999, no qualMatt Damon interpretou um jovemjogador que ambicionava sair das me-sas clandestinas de Nova York eganhar o campeonato mundial em Las Vegas.Porém, foi na virada do século que o pôquer ex-plodiu. Em 2001 foram inventadas as chamadashole cards cams (câmeras fixadas na borda damesa, que mostram as cartas de cada jogador) ea idéia foi comprada pelo Travel Chanel. Foi cri-ado, então, o WPT (Word Poker Tour), umtorneio disputado em todo mundo entre os me-lhores jogadores de vários países.

Com a audiência dos torneios aumentan-do dia após dia, o número de jogadores dos sitesde pôquer online, que também surgiram no fi-nal da década de 90, deram um salto exponencial.Foi isso que possibilitou o surgimento dos “tor-neios satélites”, através dos quais jogadorespodiam pagar inscrições baratas e, ao vencer ouchegar entre as primeiras colocações, se classifi-carem para torneios ao vivo com premiações demilhares de dólares.

No Brasil, um dos países com o maior nú-mero de usuários de internet no mundo, em suamaioria jovens, o fenômeno do pôquer on-linese estabeleceu rapidamente. Já existe um núme-ro significativo de jogadores brasileirosprofissionais com destaque no cenário interna-cional. São pessoas que passam, em média, oitohoras por dia jogando na internet e tem no jogo

sua fonte exclusiva de renda. O paulista AndréAkkari começou a jogar na internet em 2004 e setornou profissional no inicio de 2006, sendo atu-almente o segundo lugar do ranking brasileirodo site Super Poker. Akkari coleciona títulos tan-to no online como no jogo ao vivo, sendo o maisimportante deles o primeiro lugar no BelagioCup, realizado no cassino mais famoso do mun-do, em Las Vegas, no ano de 2006. Na ocasião,derrotou mais de 160 oponentes, sendo que en-tre eles estavam alguns dos melhores jogadores

profissionais dos EUA, num torneio que cobra-va 1000 dólares de inscrição.

“A evolução do meu jogo foi conseqüên-cia de uma aplicação muito forte em estudos,livros, dvd’s e no material que é oferecido nainternet de aprendizagem”. Segundo Akkari, seurápido crescimento no jogo só foi possível porconta desse estudo dos conceitos ligados ao pô-quer, aliado com a prática permanente que ainternet possibilita. “Com certeza, o pôquer on-line é uma ferramenta que faz com jogadores queestejam em mercados distantes das centrais gran-des do pôquer, como Las Vegas e Europa,tenham acesso ao jogo de forma sustentável. Nainternet conseguimos ter uma gama muito gran-de de torneios (onde o jogador paga umainscrição pré- estabelecida e é premiado casochegue entre os primeiros colocados )e cashgames (jogo apostado onde uma ficha vale umdólar) o dia inteiro, a qualquer hora. Isso facilitamuito a nossa vida”.

Atualmente existem cerca de cinqüenta miljogadores de pôquer on-line só no Brasil. Alémda grande participação de brasileiros em tornei-os na internet, existe um grande número sites,fóruns de debate sobre o jogo e comunidades noorkut. A maior delas, a “Poker Brasil”, reúne atu-

almente mais de trinta e três mil pessoas e delaparticipam desde iniciantes até jogadores expe-rientes. Já a comunidade “Poker Mania” temduas mil e trezentas pessoas e lá estão presentesos principais jogadores do país, inclusive pro-fissionais que enfrentam os melhores jogadoresdo mundo no circuito internacional.

Rio, São Paulo, Minas Gerais, Paraná,Goiás e Mato Grosso já têm federações orga-nizadas e promovem eventos regularmente.“Levou cerca de nove meses de torneios reali-

zados até formarmos a Federação. Porcausa dela existem mais de 300 joga-dores praticando ativamente na capitaldo Paraná e em todo sul do país. Elafomentou mais de 900 jogadores quepraticam assiduamente. Esses númerosnunca foram levantados de forma pre-cisa, mas são aproximadamente estes”,atesta Marco Marcon, presidente da Fe-deração Paranaense de Poker. Aprincipal preocupação destas federa-ções é de regulamentar o pôquer epromover sua prática de maneira es-portiva e responsável, acabandodefinitivamente com a imagemdistorcida de que se trata de um jogode azar, clandestino e com jogadoresviciados. Segundo Marcon. aqueles queestão começando devem procurar me-sas de valores baratos e de acordo comsua renda: “Os amadores não deveminvestir no jogo mais do que aquilo que

em seu salário tem reservado para o Lazer”.Em uma iniciativa pioneira, várias federa-

ções do Brasil organizaram o primeiroCampeonato Brasileiro de Poker online. O even-to reunirá mais de 500 jogadores que nãoprecisaram pagar nada para participar. Os doisprimeiros irão ganhar uma vaga para disputar oevento principal do Word Poker Series de 2007,que ocorre em julho em Las Vegas. Além destasduas vagas, vários outros jogadores brasileirosjá se classificaram para o torneio através de sa-télites pela internet. A expectativa é de quequando um brasileiro vença um grande torneiointernacional, o pôquer passe a ser acompanha-do pelo grande publico e ganhe umaregulamentação definitiva no Brasil.

Diferente do pôquer tradicional, no qualcada jogador tem cinco cartas na mão, no TexasHoldem cada um recebe duas cartas que devemser combinadas com outras cinco, que são aber-tas no centro da mesa. Esta dinâmica gera umtipo de pôquer que, por sua agilidade, emoção,facilidade de compreensão inicial e possibilida-de quase ilimitada de jogadas e combinações, éapontado por muitos como o jogo do século XXI.As cartas estão na mesa, as apostas estão feitas.Qual será o resultado?

Pôquer online se torna fenômeno mundial e pessoas que vivem do jogo na rede é cada vez maior

Momento decisivo de um torneio de pôquer online

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Gabriel Machado

A religião cibernética não conseguiuarrebanhá-la como sua discípula.Sempre que diz não gostar de internet,a atriz e produtora teatral Renata Rorizé vista, de acordo com suas própriaspalavras, “como uma E.T.”. Os fiéis,segundo ela, “pregam seu Evangelho”a todo custo, tentando “convertê-la”. Aatriz faz um apelo:

- Por favor, não me descreva comouma xiita! Só não quero que a internetinterfira em minha vida pessoal. Mas,na área profissional, não há comodeixar de usá-la.

É o que ocorre com muitos dos seusamigos de teatro, que passaram autilizá-la depois de resistir até o “últimomomento”, apesar de não gostarem deinternet.

- No mundo artístico, muitas vezes apessoa se isola para sua produçãocriativa. Foi o caso também de (Jean-Jacques) Rousseau e (Henry David)Thoreau (filósofos) – justifica Renata.

Apesar de muita resistência, elapercebe toda a força de atração dainternet e confessa:

- Sei que algum dia acabareicapitulando.

O ator Orã Figueiredo, de 41 anos,é outro dos hereges. Até nove mesesatrás, ele não tinha contato algum comcomputador, muito menos internet.Teve sua iniciação quando conheceusua namorada, jornalista, que trouxepara sua vida o computador, mas otempo não lhe permite oaprofundamento.

- A profissão de ator não me exigia autilização da internet. Mas agora, secomeçar a usar mais, sei que tomareigosto. Ainda assim, não acho que ainternet vai ocupar um espaço tãogrande na minha vida. Também não meimagino passando meu tempo de lazerno computador – frisa.

Já o estudante da ECO/UFRJ, JoãoPaulo Toledo, de 20 anos, parece nãoantever nenhum futuro de conversão.Ele possui amigos de filiaçõescibernéticas diversas e não se senteprejudicado por ter abdicado da rede,mesmo sendo diferente dos demaisjovens:

- As pessoas ficam espantadas efalam: “Você não tem MSN?! Mas comovocê fala?” O mundo agora está dentroda internet e o Google tornou-se umdeus.

Também jovem aluno da ECO,Arthur Ottoni, de 23 anos, apenasacessa sites quando já sabe o que estáprocurando. E utiliza o e-mail. Quantoao resto, faz duras críticas:

- Abomino Orkut e MSN. Essasduas formas geram uma pseudo-integração entre as pessoas.Geralmente as pessoas se surpreendemao saber que não tenho, mas é o tipoda coisa que quem tem acha que nãopode ficar sem, mas não percebe que étotalmente descartável da sua vida.

Ao contrário do que exemplificamJoão e Arthur, a aposentadaMargarida Lacerda, de 67 anos, dizque os jovens, como seus netos, nãoconseguiriam viver sem a internet.“Hoje a internet é necessária, tudo giraem torno dela.” Já seu caso pode nãoparecer tão incomum: uma senhora

Apesar de a religião cibernética queimá-los perante a sociedade, os hereges da internet

persistem em seus credos e acusam os críticos de criarem uma nova era de Inquisição.

inativa, que não está na idade de lidarcom tecnologia. Contudo, ela foge àexpectativa:

- Trabalhei 33 anos com informática.Os computadores ainda funcionavamcom cartões perfurados. Mas nãocheguei a pegar a internet. Cansei detanto mexer no computador. Já saturou.

Ainda em plena atividade, RenataRoriz passou a ter um assistente deprodução para acessar a Web por ela,no início de 2006, quando começou aprodução de sua primeira peça, CoraCoralina.

- Não quero ter que mexer nainternet. Sempre que precisava no meutrabalho, pedia ajuda para meusamigos. O contato com a internet podenão ser direto, mas ele sempre existe -frisa.

A artista argumenta que é umaquestão de tempo e qualidade de vida.

A liberdade individual que deve vir emprimeiro lugar.

- Não sou contra a modernidade. Astecnologias foram criadas para facilitarnossas vidas, só que acabaramdominando-as. É bom estar conectado,mas e o lado solitário da vida? Aspessoas também têm que se voltar parao seu interior e para a natureza.

João Paulo também não gosta docontato mediado pelo computador e nãoentende as relações que os internautasadoram cultivar.

- O mundo virtual me incomoda.Parece que é totalmente fictício,totalmente fora da realidade. Talvez o

contato pelo computador seja mais fácil,pois não é necessário se expor.

Nesse ponto, Renata complementa,fazendo uma analogia com seu meioprofissional: o mundo da internet seriaum teatro, em que “um bando defantasmas fala com outro bando.” Já Orãdestaca uma oposição entre a Web e oteatro:

- Na internet, as pessoas se isolamna frente de uma tela. Até a câmerade TV filtra a nossa visão. Mas, noteatro, a relação é real, as pessoas vãopara ver outras pessoas, para sentiro calor humano, para interagir comelas.

Mas é a interação que João consideraum dos fundamentos do mundo www.E que seria a justificativa para nãogostar de internet.

- Desculpe se não consigo explicardireito, mas é porque é algo que faz

parte da minha personalidade. Masacho que explica o fato de a internetpedir à pessoa que tome atitudes otempo inteiro e exigir respostas. É omundo da agilidade, da atenção, daação. Eu prefiro a contemplação, oexercício mental e criativo. Sou maiscalmo e fechado. As pessoas falammuito hoje em dia, são verborrágicas emuito abertas, expõem a vida sem omenor problema. Não faz o meu estilo– explica.

Arthur também não simpatiza como universo cibernético. Alega que oOrkut e o MSN seriam “estimuladoresde vaidade”, em que as pessoascompetem para mostrar quem temmais amigos, sendo que o MSN aindageraria conversas sem conteúdo e mal-entendidos.

- Os dois apenas contribuem para aconstrução de uma sociedade cada vezmais individualista, perdendo o seuessencial, que é a troca estabelecida pelacomunicação direta entre pessoasdiferentes, em detrimento do espíritocoletivo – critica.

Orã afirma que “nem com cachê”entra em Orkut ou em chat, que levam àviolação de privacidade e constituemuma relação “promíscua”.

Já Margarida não vê problema naconversa on-line e percebe muitasvantagens no uso da rede.

- Eu sei mexer na internet, sei sobreOrkut e MSN, não estou desligadadesse mundo. Mas prefiro manter meuestilo de vida. Já estou habituada. Paramim, é bem melhor a relação pessoal.Até pelo telefone não gosto de falarmuito.

Visão muito defendida por RenataRoriz:

- O mundo exige que estejamosacessíveis a todo minuto. Mas querome desconectar do mundo. Por isso,só levo meu celular quando realmenteé necessário. Não posso ter paz nasminhas horas de lazer, preciso semprepensar em trabalho?

Arthur concorda:- Reconheço a importância do

celular, pois trabalho e tenho que ficarconstantemente disponível para serachado por alguém. Porém, acho queé apenas mais uma forma de controleda sociedade sobre o cidadão. É semdúvida mais um limitador dasliberdades do indivíduo.

Diante da feroz campanha deadesão à fé cibernética, e tambémtecnológica, a atriz questiona ahomogeneidade:

- A linguagem do computador éatraente, sim, mas por que todos têmque, necessariamente, segui-la?

Na era virtual, eles preferem aderir às relações pessoais e fugir da ‘opressão’ cibernética

Hereges da Internet resistem à conversãoHereges da Internet resistem à conversãoHereges da Internet resistem à conversãoHereges da Internet resistem à conversãoHereges da Internet resistem à conversão

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Fernanda Castelo Branco

A mãe ficava preocupada vendoo filho jogar até tarde na internet. Opai ameaçou cortar a mesada:“Quando tiver que batalhar o própriodinheiro, quero ver se vai ficar a noitetoda no computador!”. Mas para ogaroto isso não era problema, eleestava upando o Monk... E isso poderialhe render 300 reais.

Daniel é um jogador deRagnarök, e o Monk (monge, eminglês) é o seu personagem. Foramdois meses e meio de dedicação atéque atingisse o nível 85. Agora oMonk está poderoso: “Ele derrubaqualquer Kina 99 híbrido e já matouum Lord 82 vit”, disse Daniel,orgulhoso, seja lá o que issosignifique.

O Ragnarök é um dos Role Play-ing Games online mais populares noBrasil e funciona com três servidoresoficiais: Íris, Loki e Chaos – todosgerenciados pela Level Up! Games. Aempresa lançou o jogo no Brasil em2004 e em menos de um ano já tinha700 mil usuários no país. Em todo omundo, são 30 milhões de jogadoresde Ragnarök. Existem também osservidores independentes, mantidospor jovens mais entusiasmados.

Nesses RPGs você cria umpersonagem em um universo virtuale passa a interpretá-lo, sem que hajaum roteiro pré-determinado. Assituações imprevisíveis surgem dainteração com centenas (às vezes,milhares) de participantesque atuamsimultaneamente naqueleuniverso. Quando umamultidão compartilha ummesmo jogo pela internet,ainda se aplica outradenominação: massivemultiplayer online RPG, ouMMORPG.

Os bonequinhos têm“profissões” diferentes, quedeterminam suas funçõesno jogo; os iniciantes têmpoucas habilidades epoucos bens. Para evoluir (ou “upar”,como eles dizem) é preciso realizarmissões desafiadoras, como destruirmonstros, e conquistar os itensmágicos que aparecem comorecompensa. Mas isso leva tempo –são meses até que se possam adquiriras melhores armas e ficar forte o

suficiente para encarar qualquerinimigo. Daí, quem não tem apaciência ou a habilidade para tantoacaba gostando da idéia de comprarum personagem já pronto, e opagamento é feito com dinheiro domundo real.

Acessórios como armaduras,curativos, chapéus e até sorvetetambém estão à venda nas própriaslojinhas do jogo, com bonecosmercadores encarregados dasnegociações. Ali, tudo deve ser namoeda fictícia do Ragnarök, o Zeny.Mas o mercado parelelo não só existe,como ferve. A taxa de câmbio podevariar de R$ 5 a R$ 8 pormilhão de Zenys – umacarta mágica, por exemplo,pode sair por R$ 40.

Os personagenspodem se valorizar deacordo com o nível e com odinheiro acumulado comeles. O Monk do Danielainda tinha 40 milhões deZenys, que, negociados coma taxa mais baixa, valeriam200 reais: “Na verdade vocêsó vai pagar 100 por umMonk nível 85”, ele tentaconvencer. E não é mesmodos mais caros, uma menina de SãoPaulo anunciou um Blacksmith (fer-reiro) nível 91 por R$ 600. Esseprovavelmente viria com muitositens.

Acontece que essas transaçõesque envolvem dinheiro de verdade

são proibidas pelasempresas que controlam osgames, porque as centenasde pessoas que lucram comos jogos não pagam direitosautorais – afinal, não foramos jogadores que criaram osprodutos. Como“governantes” daquelemundo virtual, as empresasquerem cobrar uma espéciede ICMS (Imposto sobreCirculação de Mercadoriase prestação de Serviços).

O esquema defiscalização, baseado no regulamentodo jogo, prevê punições aos mal-comportados que podem envolverredução de nível e confisco de Zenys.Os jogadores que são pegosrealizando “transação ilegal” ficamsem acesso ao jogo por 24 horas, seforem, digamos, réus primários. Os

reincidentes são suspensos por 5 diase, na terceira ocorrência, o infrator ébanido do jogo. Os itens compradosno mercado negro também podem serconfiscados, se descobertos pela LevelUp!.

Em março de 2007, a Level Up!flagrou e puniu 131 jogadores quenegociavam personagens ou itens,dos quais 27 já haviam cometido ainfração antes. Em abril, o número depunidos caiu para 96, mas os casos dereincidência aumentaram para 35.

O site de leilões Mercado Livretambém expulsou os vendedores de“bens virtuais”. No Orkut, as

comunidades relacionadasa essas atividades sãopoucas; têm no máximo 40membros e quase nadapublicam além de spams.Mas não é difícil encontrarum vendedor e asnegociações continuamsendo feitas pela internet emesmo por telefone. Danielmora no Piauí e estavadisposto a vender para umcliente do Rio de Janeiro:“nesse caso a gente entraem contato por telefone,ajusta os detalhes, eu te dou

minhas referências, RG, CPF,endereço e etc. Aí você faz o depositono banco, e eu passo a te ligar todosos dias até a transferência. Leva uns 2ou 3 dias, no máximo. Então, quandoo dinheiro bater aqui eu passo meuregistro no jogo para você”.

O jogador também pode criarmais de um personagem, uma equipe,que pode ser vendida numa espéciede pacote promocional. Quatro“chars” (do inglês, characters) defunções diferentes, todos de nívelsuperior a 80, estavam anunciados noOrkut por apenas R$1.800. Existe,inclusive, gente que fazpersonagens porencomenda. Você pede umWizard (bruxo) nível 99 edali a uma semana o rapazte entrega. Osequipamentos e a roupa dopersonagem tambémpodem ser encomendados,mas são cobrados à parte.

Toda essa busca porum personagem forteacontece porque oRagnarök gira em torno dachamada WOE – War of

Emperium, ou Guerra do Emperium,cujas batalhas têm datas e horáriosmarcados pelos servidores.

Os jogadores se organizam emguildas (em referência às associaçõesde auxílio mútuo constituídas naIdade Média entre trabalhadores),liderados por um mestre, o GuildMaster, que teve de encontrar (oucomprar) o precioso metal Emperiumpara ter o direito de criar o grupo.

As guildas têm como objetivoconquistar castelos, porque nelessurgem diariamente tesouros, poções,cartas, equipamentos... E o castelo émais generoso à medida que recebeinvestimentos, em Zenys, de seusdonos, por isso também é importantepara a guilda defender suas possespara não perder os Zenys aplicados.

Em cada servidor são 20 caste-los distribuídos por 4 cidades nocontinente virtual Rune-Midgard, oque significa que muitas guildas ficamsem nenhum. É na ocasião dasguerras que elas têm a oportunidadede acesso aos tesouros. Todas asguildas podem se enfrentar simulta-neamente na WOE, e os jogadores searticulam por softwares de mensagemde voz, como o Skype, para traçarestratégias e receber ordens decomando enquanto jogam.

Os grupos podem costuraralianças e lutar juntos nas guerras,mas a guilda convidada para ajudarfica proibida de pegar o castelo parasi, é simplesmente uma práticapolítica, uma troca de favores.

As diferentes profissões sãoimportantes na guerra porque suashabilidades são complementares, umé mais forte, outro mais rápido, outropode “curar” os ferimentos doscompanheiros. Quando umpersonagem é derrotado noenfrentamento, leva preciosos

minutos para voltar ao jogo.As compras de

Zenys, equipamentos epersonagens é o meioinstantâneo de conseguirum personagem bom osuf ic iente pra encararqualquer in imigo naWOE; é negociação depoder. Por isso é tão im-portante que o Monkeste ja derrubandoqualquer Kina 99 híbridoe já tenha matado umLord 82 vit.

Vendo Monk 85. Ótimo estado. Aceito propostaJogadores do RPG online Ragnarök negociam

seus personagens e equipamentos do jogo por dinheiro real

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10 NO 11 - 2007/1

Mariana Pires de Mello

Em tempos de obsessão porsegurança digital, os hackers setornaram os vilões da web. No sensocomum, eles são encarados comoinvasores ou criminosos e seriam osresponsáveis por ataques virtuais equebra de licenças e senhas. Ou seja,os maiores culpados pelavulnerabilidade digital que apavoraas grandes empresas e sistemasfinanceiros que mantém bases on-line.

A palavra hacker surgiu nosanos 50, no Massachusetts Institute ofTechnology (MIT), EUA, e deriva dotermo hack, usado para definir atividadesde alta tecnologia com os quais algunsestudantes se ocupavam. Seria alguémque, deliberadamente, ganha acesso aoutros computadores, frequentementesem conhecimento ou permissão dousuário.

Mas os hackers resolveram sairem defesa própria e querem “limpar suaficha”. Por isso, passaram a bola paraos crackers. Segundo R.C., gerente derede de uma empresa de tecnologia quese considera um hacker, “crackersinvadem para causar prejuízo ou seapropriar de algo que não lhespertence”. Ele ainda acrescentou que “ohacker invade apenas pelo desafio, nãopara benefício próprio”:

– A verdade é que o grandeprazer é o desafio de conseguir fazeruma coisa que ninguém tenha feitoantes. Existem hackers que têm honra,que invadem apenas para sevalorizarem no grupo. (veja odepoimento de R.C. no box ao lado).

“Cracker”, segundo a Wikipédia,foi um termo criado em 1985 porhackers em protesto contra o usoindevido do termo “hacker” emnotícias de crimes digitais. “ O usodeste termo”, continua o site, “reflete aforte revolução contra o roubo evandalismo praticado pelos crackers”.

Hoje, passados mais de 20 anos, oshackers ainda lutam para se livrar doestigma de criminosos. Querem serenxergados por sua esperteza esagacidade. E estão empenhados nisso:hoje, está disponível na web um grandenúmero de sites, com conteúdopedagógico elaborado por hackers, quetentam esclarecer a diferença existenteentre hackers e crackers.

PROFISSIONALIZANDOPARA O BEM

A homepage do Hackerteen,em âmbito nacional, é a que mais sedestaca. Sob o slogan“profissionalizando jovens para obem”, o site, lançado em novembrode 2004, é iniciativa de um projeto

educacional que começou em dezem-bro de 2003 e durante um ano, investiuem pesquisa e desenvolvimento.

Através de aulas on-line e, umavez por semana, na sede do Hackerteen,em São Paulo, o projeto objetiva“canalizar a energia, o tempo que ojovem passa na frente do computador,para ele aprender o que realmente fará adiferença no seu futuro”, segundo asinformações da homepage.

– A maioria dos jovens no mundointeiro desperdiça tempo no Orkut, noMSN e com games. É claro que aí temmuita coisa positiva, mas pela falta dedisciplina natural do jovem e anecessidade de uma melhor forma deuso da tecnologia, nós criamos oHackerTeen – ressaltou MarceloMarques, diretor de estratégias doprojeto.

No Hackerteen os adolescentesaprendem a lidar com diferenteslinguagens de programação e são

desenvolvidos materiais, como gibis ecartilhas, que aliam diversão ao conteúdoe entretêm os jovens. Além disso, sãooferecidas matérias como Segurança emComputadores, Empreendedorismo naInternet e Ética Hacker:

– Tivemos muitos contatos comHackers para saber como e o quêensinar nas aulas de segurança decomputação. Um deles foi o GustavoNoronha, que desenvolveu as aulas dePython (uma linguagem deprogramação). Já as aulas de éticaforam criadas junto com o sociólogoSérgio Amadeu, e as disponibilizamosgratuitamente para os alunos fazeremo download de suas casas. As aulas têmconteúdo relacionado a conceitos deética e filmes que os jovens gostam.

Segundo Marcelo, uma estatís-tica revelada pelo ex-diretor geral daAssociação Brasileira de Inteligência(ABIN), Mauro Mar-celo, tambémimpulsionou aidealização doHackerteen: 80% doscrimes que ocorrem naInternet são cometi-dos por jovens.Marcelo Marquestambém ressaltou queo mercado de trabalhoestá à procura dessesjovens:

– Há empresasque procuram jovenspara trabalhar na área de Tecnologia daInformação, e são poucas as que conse-guem encontrar o jovem que temconhecimento no assunto – destacou ele,que reforçou a meta do Hackerteen emfazer com que os jovens aprendam comoproteger os dados das empresas, paraassim se direcionarem a um futuro naárea de tecnologia.

A CULPA É DA MÍDIAEm seus websites, os hackers se

mostram insatisfeitos principalmentecom o emprego errado, por parte damídia e dos veículos de comunicação,do termo hacker. Para eles, seu usopejorativo foi o principal responsávelpela “má fama” que os hackers têm hojejunto à sociedade.

No site The Jargon File, há umacarta de desabafo de um hackerdestinada ao editor do jornal norte-americano Wall Street Journal. Nela, ohacker culpa os editores dos jornaispela insistência em empregar o termocom conotação negativa, alegando que,mesmo que os repórteres saibam o realsignificado da palavra hacker, são eles,os editores, que os restringem apermanecer no erro. “A coisa maistriste é que seus repórteres sabem a

diferença entre ‘hacker’ e ‘cracker’. Elessabem como fazer essa distinção, masvocê não deixa! Você insiste em usar otermo ‘hacker’ pejorativamente. Quandoos repórteres tentam usar outra palavraou explicar os outros significados, vocêmuda, edita, corta”, diz a carta.

O remetente ainda tentou definiro hackerismo, alegou não ver problemaem assumir que é um hacker e apontouos jornais como os principaisresponsáveis pela manipulação daopinião púbica em relação ao termo: “Eusou um hacker. Ou seja, eu gosto decomputadores – trabalhar com eles,aprender sobre eles e escrever programasinteligentes. Não há nada de vergonhosono ‘hackerismo’ que eu faço, mas quandoconto às pessoas que sou um hacker, elaspensam que eu estou admitindo algoinapropriado e perverso – porque jornaiscomo o seu empregam erradamente a

palavra ‘hacker’,dando a impressãoque ela significa‘invasor’ e nadamais”.

– Se o jorna-lismo, seja no jornalimpresso, na TV oumesmo na própriaweb, tratasse oshackers a partir deseu significado ver-dadeiro, não haveriatanta confusão entreos significados de

hacker e cracker – disse R.C.. O hackertambém lembrou que o jornalismo éum formador de opinião – Acompa-nhando as notícias, as pessoasestruturam suas idéias e pré-concei-

tos, e à medidaque a mesmapalavra vai apa-recendo nessasnotícias, semprecom intençãopejorativa, é assi-milada porleitores e especta-dores”.

Mas nãoé toda a grande

mídia que não sabe (ou que omite quesabe) a diferença entre hacker e cracker.Marques apontou uma reportagem dotelejornal SBT Brasil, do dia 25 de agostode 2005, disponível no Youtube (www.youtube.com/watch?v=7OLs Vlaa6-M),que ele considera “a melhor” quando setrata de estabelecer essa diferença. A re-portagem – que cobriu a OperaçãoPegasus, deflagrada pela Polícia Fede-ral em 2005, e foi construída a partir deum menino de 13 anos –, além de usar aexpressão “hackers do bem”, deu deta-lhes sobre o projeto Hackerteen.

HackHackHackHackHackers passam a bola parers passam a bola parers passam a bola parers passam a bola parers passam a bola para os cra os cra os cra os cra os crackackackackackersersersersersAcusados de invasões criminosas na intimidade alheia agora jogam a culpa em nos que quebram programas

Falta de segurança digital: atribuída aos hack-ers, mas criada por crackers

R.C. contou aoR.C. contou aoR.C. contou aoR.C. contou aoR.C. contou aoNº ZERO uma de suasNº ZERO uma de suasNº ZERO uma de suasNº ZERO uma de suasNº ZERO uma de suas

aventuraventuraventuraventuraventurasasasasas

“ O grande prazer é o desafio deconseguir fazer uma coisa queninguém tenha feito. Diferente do quemuitos pensam, hackers nãoinvadem para prejudicar ou destruirsistemas. Em nosso ambiente, osucesso é muito valorizado e existemhackers que têm honra, que invademsem objetivo de ter ganho, apenaspara se valorizarem no grupo. Em umgrande portal de esportes, conseguiacessar um banco de dados quecontinha nomes, senhas e aténúmeros de cartões de crédito (o sitetinha uma loja virtual). Tive acessoaos arquivos dos servidores e a todosos sistemas do site. Depois de unsdias, resolvi brincar ali, pois o sitepublicou notícias contra o meu time,Flamengo. Coloquei à mostra, napágina inicial, todos os números doscartões de crédito (o site tem tresmilhões de visitas

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NO 11 - 2007/1 11

0,23% - Norte

0,65% - Centro-Oeste

0,89% - Nordeste

1,44% - Sul

4,42% - Sudeste

Ficar fora da Internet dificulta socialização e diminui oportunidade de emprego

Kareen Arnhold

Com uma vida diferente da deboa parte dos jovens, que se sociali-zam cada vez mais pela Internet epelos serviços que ela dispõe - comobate papos pelo MSN Messenger eencontros na rede através do site derelacionamentos do Orkut - RenanCosta Silva Júnior, de 19 anos, mo-rador da comunidade Morro dosMacacos, em Vila Isabel, tem aces-so à rede duas vezes ao mês emmédia.

Trabalhando como assistentede cabeleireiro durante o dia eestudando à noite, ele é privado nãoapenas dos hobbies da juventude,como também de oportunidades demudar de vida. Pela falta dedomínio da Internet, acaba deperder uma vaga de emprego paraassistente de escritório. “Estouficando pra trás”, declara.

Seu contato escasso com a redede computadores, limitado àspoucas vezes que pode ir a lan houses- quando há disponibilidade detempo e de dinheiro – trazdificuldades para Renan. Na horade “navegar”, ele se diz perdido,principalmente no momento daspesquisas escolares. “Não sei fazerpesquisas no computador; levoséculos para achar um trabalho emais séculos para escrever. Nãotenho prática”, explica.

No país, enquanto 69,21% daspessoas com rendimento mensaligual ou superior a R$ 1801 acessama Internet diariamente, o númerocorrespondente para as querecebem até R$ 300 por mês nãoultrapassa 20,09%, de acordo com os

cálculos do Comitê Gestor daInternet no Brasil (CGI.br). Esses20% da população acessam a redegeralmente no local de trabalho, nacasa de amigos, em lan houses ou emcentros de inclusão digital, que é ocaso de Maxilene Alves doNascimento, de 17 anos.

Aluna do programa Cyber-Escola, projeto desenvolvido pelaIncubadora Tecnológica deCooperativas Populares da Uni-versidade Federal do Rio de Janeiro(ITCP/UFRJ), ela vê no domíniodos computadores, em especial daInternet, a chance para crescer navida e conseguir bons empregos.Sempre à procura de cursosgratuitos, tenta ultrapassar oslimites impostos por sua condiçãosocial: “é um meio importante paratudo e as pessoas que acessam estãosempre à frente. Então, eu faço tudoo que aparece, porque eu me ocupoe me capacito mais”.

Apesar das adversidades demorar em um bairro afastado emNova Iguaçu e de lidar com umarotina diária que lhe toma boaparte do tempo - como cuidar dedois irmãos mais novos e da casaenquanto a mãe cozinha para fora,freqüentar a escola à noite etrabalhar como manicure paraajudar nas despesas - ela não abremão da possibilidade de ser umainternauta. “Faço cursos deinformática de terça a sexta-feira,na parte da manhã. Não deixo deir porque acho que muita coisapode melhorar quando euaprender a mexer na Internet, atémesmo a minha renda”.

Maxilene ainda vai além nosseus planos em relação à Internet:ela sonha em abrir uma lan housecom o namorado, podendo fazera manutenção das máquinas e seresponsabilizar pelo acesso à rede.“Quando terminar o curso, vou

estar mais preparada para lidarcom o computador. É para issoque estou me capacitando”.

No país, 90% da populaçãoque domina as tecnologias decomunicação e informação, emespecial a Internet, pertencem àsclasses A e B. Este índice evidenciaa expansão das diferenças sociaispara a área digital e adiscrepância, cada vez maior, dechances oferecidas para ricos epobres. No entanto, apesar daescassez, Maria Santana CostaPena de Moraes, encontrou umaoportunidade e agarrou-se a ela.

Paraense de 26 anos, MariaSantana percebeu, ao vir para o Riode Janeiro em busca de trabalho,que só atingiria seu objetivo se sou-besse lidar com o computador:

– Vim correr atrás de umaoportunidade, mas eu sóconseguia entregar papelzinho narua ou ser garçonete. Então,percebi que me faltava algo.Fiquei sabendo de um curso deinformática e, como não pagavanada, entrei na fila imensa e nãodesisti.

Ela se capacitou pela ONGComitê para Democratização daInformática do Rio de Janeiro(CDI), onde hoje trabalha comoauxiliar administrativa. MariaSantana credita seu sucesso aosconhecimentos da era digital:

– Antes de saber mexer naInternet, me sentia excluída da so-ciedade. Depois que aprendi,conquistei meu espaço. Eu acredi-to que a inclusão digital podemelhorar nossa vida, nosso país,nosso mundo.

Os sem-tela ficam parOs sem-tela ficam parOs sem-tela ficam parOs sem-tela ficam parOs sem-tela ficam para trása trása trása trása trás

O acesso diário a Internet é feito, em sua maior parte,pelos ricos. Por não disporem de conexão banda larga– que, apesar de o preço ter caído, continua cara paraa grande maioria dos brasileiros – os pobres tendemutilizar a rede de computadores com menorfreqüência, respeitando os horários com tarifasreduzidas para conexões discadas (dial-up), sendo

DIGA-ME ONDE MORAS ...DIGA-ME ONDE MORAS ...DIGA-ME ONDE MORAS ...DIGA-ME ONDE MORAS ...DIGA-ME ONDE MORAS ...... E TE DIRE... E TE DIRE... E TE DIRE... E TE DIRE... E TE DIREI QUEI QUEI QUEI QUEI QUEM ÉSM ÉSM ÉSM ÉSM ÉS

eles de 0 a 6 horas durante a semana, a partir das 14horas aos sábados e durante o dia todo nos domingose feriados.Um mapa da quantidade de acesso diário por regiãodo Brasil evidencia a concentração de ricos noSudeste, em contrapartida à de pobres no Norte,segundo dados da PNAD.

Ilustração: A

line Arnhold

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12 NO 11 - 2007/1

Eduardo Melido

DE: [email protected]: [email protected]: 24/04/2007 – 18:39

Boa tarde,Sou Eduardo Melido Ribeiro, aluno do6º período de jornalismo da Escola deComunicação da Universidade Federaldo Rio de Janeiro (Eco/UFRJ).Gostaria de fazer uma entrevista comV. Exa. para a disciplina JornalLaboratório. ...Enfim, imaginando a dificuldade de umestudante entrevistar o prefeito do Rio,gostaria de saber quais são aspossibilidades de lhe enviar algumasperguntas e receber resposta nospróximos 15 dias ou se for possíveldriblarmos todas as dificuldades,entrevistar V.Exa. pessoalmente.Tentarei aproveitar o material que jápesquisei na internet, mas espero contarcom suas declarações em umaentrevista exclusiva.Grato,Eduardo Melido Ribeiro. EMR

DE: [email protected]: [email protected]: 24/04/2007 – 19:03

Eduardo,Aguardo as perguntas por e-mail.CM

CM, esta é a assinatura do e-mailpessoal de César Maia (DEM).Prefeito do Rio de Janeiro, ele é orepresentante máximo dospolíticos-blogueiros, homens donovo século que usam a Internetcomo ferramenta política.CM quebra incríveis recordes deresposta de e-mail, parecendo queo prefeito passa o dia inteiro naInternet, possivelmente um milagrepara o administrador da segundamaior metrópole brasileira.

Auto-proclamado ouvidor,consegui uma entrevista exclusivacom o prefeito, na verdade, é umasérie de troca de e-mails [email protected] [email protected], este e-mail éanunciado no site do prefeito comoum e-mail pessoal.Ninguém pode confirmar se faleimesmo com o César Maia.Trocamos muitos e-mails desde o

primeiro contato, até o fechamentodesta edição, no total, foram 21.DE: [email protected]: [email protected]: 27/04/2007 – 12:26

DE: [email protected]: [email protected]: 27/04/2007 – 20:19

EMR: Há quanto tempo o senhor usa aInternet?CM: Desde 1995.EMR: Quanto tempo o sr. usa por dia,em quais horários?CM: Concentradamente das 5 hs as 7hse das 22hs as 24s. E sempre que surgeum contato importante a fazer ouresponder. Tres vezes por dia checo asnoticias.EMR: Quem opera o e-mail? E o blog?CM: Sim. O ex-blog conta com 3jovens.EMR: O sr. lê todos os mails ou háalguém para “filtrar” spams,entrevistas, debates, notícias, enfim.CM: De meus tres e-mails pessoais,sim. Só quando estou ausente que peçapara um assessor repassar asreclamações para os secretarios.EMR: Quando surgiu a idéia do blog?Quais eram suas principais razões?CM: Surgiu em 2004 em função daseleições presidenciais nos EUA.EMR: Por que transformá-lo em um ex-blog?CM: Para reduzir o tempo que o blogexigia.EMR: O senhor acha que está fazendoo papel de jornalista ao trazerinformações em seu blog?CM: Não. É um blog de politico.EMR: Existe algo que o sr. acha q ficou“devendo” a população?CM: Nunca se completa tudo. Nem naFinlandia.EMR: Nos e-mails recebidos, há muitascríticas?CM: Há de tudo.EMR: O sr. pretende usar a internetcomo ferramenta de uma possívelcampanha em 2008?CM: Faço isso desde 1996.EMR: Quais são seus planos para o ex-blog?CM: A vida dirá. Não sei. Inauguro umsite com os mais modernosinstrumentos usados por poucospoliticos e vou continuar com os dois.Vamos ver.EMR: E já pensou em usar o blog/mailcomo um fórum de debate de assuntose planos que chamassem mais atençãoda população? Tais como planos para

segurança e educação, por exemplo.CM: De certa maneira isso é feito,embora não simultaneamente.EMR: A que o sr. atribui tantarepercussão quando polemizou acampanha presidencial de 2006?CM: Talvez a falta de informação comlastro teórico pela imprensa.EMR: A imprensa lhe dá vozsuficiente? O blog serve além de tudo,como uma forma de expressar algo quenão seria publicado?CM: O suficiente. Certamente.EMR: Aos críticos que dizem que oprefeito do Rio não deveria ocupar-setanto com um blog/Internet, o queresponder?CM: Minha jornada começa as 5 horase termina as 24 horas. Com tempo parabanho,....são 16 horas. A jornada detrabalho formal são 10 horas.CMEMR: Já podemos combinar umaréplica? Grato, aguardo pacientemente suasrespostas.

Em entrevista por e-mail ao CorreioBraziliense, César comparou otempo gasto com o uso da Internetcom a administração da cidade: “Oe-mail multiplica por 100 acapacidade de decidir, afinal são300 e-mails diários, sendo que 100são spam ou quase isso.Basicamente recebo reclamações.Sou um ouvidor.”Foi o blog www.cesarmaia.blogspot.com que potencializou ocontato do prefeito com cidadãos,aliados, opositores e jornalistas. O

blog foi o fenômeno da blogosferapolítica. Mas em novembro de 2005,César criou o ex-blog oficial, naverdade, o blog do prefeito passoua ser uma lista de e-mail enviadapara as pessoas cadastradas.César Maia não é o único a desfrutardos prazeres das ferramentas nainternet. O ex-governador do Rio,Anthony Garotinho resolveu atacara partir de 27 de março de 2007 umnovo front, o Blog do Garotinhowww.blogdogarotinho.com.br. Lá odesempregado político usa dasartimanhas da rede para exaltar suapersonalidade, ele conta apenascom comentários moderados, logo,apenas elogios são postados e ascríticas desconsideradas.Sem tanta repercussão na imprensacomo o do desafeto, o ex-governador reforça seus ideais noblog e resolveu partir para o ataquecontra grandes organizações, emespecial, contra a Rede Globo, aquem acusa de ter feito umacampanha “dolorosa e mentirosa”contra ele próprio enquanto pré-candidato a Presidência.Já as Instituições como SenadoFederal, Câmara dos Deputados,Assembléias Estaduais, além doPoder Judiciário e Executivoembarcaram no boom da tecnologiahá muito mais tempo: Canaispróprios de TV, jornais epublicações próprias e websitesmodernos e atualizados. Desde1936, os brasileiros ouvem no rádioa “Voz do Brasil” trazendo onoticiário oficial dos Três Poderes.

CÉSAR MAIA, BLOGUECÉSAR MAIA, BLOGUECÉSAR MAIA, BLOGUECÉSAR MAIA, BLOGUECÉSAR MAIA, BLOGUEIRO ASSUMIDO, USAIRO ASSUMIDO, USAIRO ASSUMIDO, USAIRO ASSUMIDO, USAIRO ASSUMIDO, USAPolíticos do século XXI descobrem

na internet uma nova forma deatuação. No Rio de Janeiro, o

prefeito César Maia criou um blogpessoal e em pouco tempo ganhou

destaque entre os cidadãos cariocase a imprensa. Mas o que tanto atrai

os internautas?

o jornal.pmd 14/11/2008, 10:1312

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O ex-blog do prefeito cariocachamou atenção especial durante aseleições 2006. Mesmo sem sercandidato, César Maia roubou acena nas páginas políticas dejornais, sites e blogs. Ele é um dosmaiores críticos da política do PT ede Lula, e na época do Mensalão,iniciou uma guerra no mundovirtual: invasões de blogs, spams ehackers nos sites dos partidos.

DE: [email protected]: [email protected]: 01/05/2007 – 19:25

DE: [email protected]: [email protected]: 01/05/2007 – 20:08

EMR: As notícias de invasão em seublog eram verdadeiras? Houve um“ponto crítico”?CM: Houve uma vez. Mas as noticiasforam sobre invasao nas caixas dealguns assessores.EMR: A atuação política na Internet éfundamental para o administrador doséculo XXI?CM: Certamente.EMR: Quais são seus planos para ofuturo político? Alguma candidaturaem vista?CM: Começo a pensar em 2009.EMR: O público do seu ex-blog éformado por simpatizantes de suapolítica e jornalistas?CM: Há todo perfil de pessoas. Asinscrições são voluntarias, em geral peloboca a boca ou por redes que repetem.EMR: O que o sr. considera mais

importante nos e-mails que recebe?Seriam as reclamações, os debates?CM: Reclamações servem comopesquisa. Sugestões como participação.CM

Durante as eleições, César mostrouapoio ao candidato GeraldoAlckmin até o momento em que oex-governador do Rio, AnthonyGarotinho, resolveu abraçar acampanha tucana. Alckmin viroualvo de Maia, que a cada dia,lançava novas críticas em relação aoentão candidato do PSDB eAnthony Garotinho.

DE: [email protected]: [email protected]: 05/10/2006 – 09:30

“1. A assessoria de Alckmin (espera-se que tenha sido a assessoria)promoveu um encontro dele comGarotinho em SP, provavelmente pelaleitura equivocada do resultado eleitoralno Rio (...) Avaliar o resultadocomparando Lula e Alckmin é umequívoco de quem faz política apenascom equações de primeiro grau.3. Esse Ex-Blog desafia a candidatura deAlckmin a aparecer no calçadão deCopacabana no domingo, ao lado doGarotinho. Recomenda-se capacete de aço.4. (...) Acabou a força do discurso éticoda candidatura de Alckmin no cidadedo Rio de Janeiro. O eleitor vai dizerassim: - Como diz o Lula, são todosiguais.7. Foi o Beijo da Morte. Um abração doGarotinho: abraço de afogado!”

Em seus blogs, os políticosfluminenses também aproveitamseus espaços para criticar outrospolíticos. Garotinho não cansa deelogiar a esposa e ex-governadoraRosinha e na coluna diária Papo deBlog, ele comenta um determinadotema/notícia do dia. Já, César Maiaressalta as boas ações da prefeitura,comenta a política nacional einternacional e traz notícias que nãosão encontradas no noticiárioconvencional.Os Partidos Políticos também vêmaumentando sua atuação naInternet, o PT de São Paulo hospedablogs de seus políticos, oDemocratas também conta comoutros políticos blogueiros e temum blog do partido.PMDB, PP e PTB são alguns dospartidos que têm políticosblogueiros, com um diferencial emrelação aos fluminenses, todosfuncionam como páginas oficiais,impessoais, longe da informalidadede César Maia ou da ferocidade deGarotinho.Além dos sites próprios, a interaçãoda população chama atenção e fazbrilhar os olhos dos políticosbrasileiros, muitos com perfis noorkut e com os partidos financiandoblogs e imóveis no Second Life,como Democarátas, PCB e PSDB.(veja mais da atuação política noSecond Life, na página XX)

DE: [email protected]: [email protected]: 08/05/2007 – 18:06

A WEB COMO FERRAMENTA WEB COMO FERRAMENTA WEB COMO FERRAMENTA WEB COMO FERRAMENTA WEB COMO FERRAMENTA POLÍTICAA POLÍTICAA POLÍTICAA POLÍTICAA POLÍTICADE: [email protected]: [email protected]: 08/05/2007 – 23:11

EMR: Quais eram os outros objetivosiniciais do blog?CM: Controle do governo federal. EMR: A participação de jornalistas natroca de e-mails é constante?CM: É intensa.EMR: Na sua visão, o grande boom doex-blog foi nas eleições 2006?CM: Continua no mesmo patamar. Adiferença é que na eleição pauta mais aimprensa.EMR: O sr. troca idéias com outrospolíticos do DEM sobre a idéia de umblog? Alguém já pensa em adotar aidéia?CM: O DEM está adotando assim comooutros parlamentares.CM

César Maia sofre com críticas porser blogueiro, em resposta aoscariocas que se preocupam com umprefeito antenado, enquantoassistem à degradação da cidade,CM preferiu recorrer à matemáticaem seu e-mail-entrevista: - Minhajornada começa às 5 horas e terminaàs 24 horas. Com tempo parabanho,... são 16 horas. A jornada detrabalho formal são 10 horas.Em nossa última troca de e-mails,pergunto à CM o que tanto atrai emseu ex-blog: “O fundamental é ainformação primaria, que não estádisponivel em nenhum lugar e queé dada em primeira mão. Isso é oque atrai. Mas para isso ela sempredeve ser absolutamente confiavel.”

Outros prefeitos ao redor do mundoOutros prefeitos ao redor do mundoOutros prefeitos ao redor do mundoOutros prefeitos ao redor do mundoOutros prefeitos ao redor do mundoque usam a Internet:que usam a Internet:que usam a Internet:que usam a Internet:que usam a Internet:

Com uma rápida pesquisa no Google, encontramos dois exemplosinternacionais, são o prefeito de Albuquerque, maior cidade do NovoMéxico, Sudoeste do Estados Unidos, no endereço http://www.cabq.gov/blogs/mayor/ e o prefeito de Londres, KenLivingstone em seu blog http://www.mayor-of-london.co.uk/blog/ .

Nestes blogs, os temas sociais são debatidos por parte da popula-ção diretamente com o prefeito, no caso americano, o modelo deEscolas Públicas que a cidade adotaria foi pauta do blog em 2006.No blog londrino, Ken Livingstone apresenta temas como os custospara as Olimpíadas de 2012, o aumento de taxas, a guerra contra oterrorismo, entre outros assuntos, além de glorificar a capital daInglaterra .

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Internet leva arte de volta à Academia

Um deserto virtual composto depaisagens, por onde o viajante nave-ga. Um click em determinadasuperfície o transporta para um des-conhecido novo ambiente. Em um doscenários os avatares dos diferentesusuários podem interagir diretamen-te com outros, via chat. O projetoDesertesejo de realidade virtual, desen-volvido em 3D pelo net.artita GilberttoPrado, explora poeticamente a exten-são geográfica, rupturas temporais, asolidão, a reinvenção constante e aproliferação de pontos.

Imagens captadas por até 50celulares simultaneamente dis-ponibilizadas à manipulação nainternet, através do teclado e domouse. Em De Vez em Nunca, trabalhoda net.artista Giselle Beiguelmandesenvolvido em 2005, as pessoas sãoconvidadas a recompor a ordem dosquadros, reeditando o filme original eintroduzindo filtros de cor sobre asimagens.

A arte desenvolvida na ou paraa internet é conhecida como Net.art,web art ou internet art. Assim como ovídeo nos anos 60 proporcionou a vídeoarte, a internet no final dos anos 90 setornou um meio viável para artistasdarem forma as suas idéias. Essas ex-periências artísticas utilizam o maiscontemporâneo dos suportes: ainternet.

PESQUISA, CONCEITUAÇÃO ECRIAÇÃO SIMULTÂNEASEles são professores universitá-

rios, pesquisadores da comunicação esemiótica de todo o mundo, estudama comunicação em rede, discutem ainteratividade e fazem arte. GilberttoPrado é net.artista, participante dogrupo Art-Réseaux e professor do de-partamento de Artes Plásticas da USP.Desertesejo foi apresentado pelo ItaúCultural, na 25ª Bienal de São Paulo,Núcleo Net Arte Brasil e em outroseventos como o 9º Prix Möbius

International des Multimédias - Pe-quim, China, 2001.

Giselle Beiguelman é net.artista,vencedora do Prêmio Sergio Motta deArte e Tecnologia, professora do De-partamento de Comunicação daPUC-SP e coordena, em parceria comVera Bightti, o grupo de pesquisas NetArt: perspectivas criativas e críticas. Seustrabalhos participaram de exposiçõesna 25a Bienal de São Paulo, no Museude Arte e Mídia na Alemanha e naFundação Telefônica, em Madri.

Diferente do ocorre com pinto-res, escultores e desenhistas que setornam professores por ser, muitasvezes, a única saída para se trabalharcom arte, no país. O net.artista não le-ciona porque não consegue viver dasua arte. A pesquisa acadêmica, a pro-dução textual e o contato com osalunos fazem parte do processo de ela-boração das obras. A ação artísticaestá inserida na pesquisa e a pesqui-sa na ação artística. Para GiselleBeiguelman “os net.artistas são os quepensam e problematizam a cultura derede”.

A russa Olia Lialina é umanet.artista modelo, reverenciada porseus pares. Criadora daArt.Teleportacia, primeira galeria vir-tual dedicada exclusivamente a essetipo de arte e primeira a comercializa-las, ela é uma artista multimídiapremiada, formada em jornalismo,professora universitária da MerzAkademie Stuttgart, curadora e críti-ca. Roda o mundo realizandopalestras, workshops, seminários eparticipando de júris. Ela é precurso-ra na conceitualização da net.art ereferência como modo de atuação donet.artista. Além de suas obras onlinee página pessoal ela mantém uma pá-gina de apoio as suas aulas e um blogque usa a metalinguagem para discu-tir com alunos questões relativas acomunicação e novas tecnologias.

O domínio de softwares sofistica-dos não é pré-requisito, mas a maiorparte dos net.artistas desenvolvem

seus próprios aparatos tecnológicos edispositivos hi-tech, que desconstroemimagens, jogam com textos, sons,vídeos e produzem gráficos e desenhos.

Os net.artistas são quase todosdoutores, pesquisam, conceitualizame fazem arte simultaneamente, em ge-ral, coordenam grupos de pesquisasobre net.art e com a ajuda de seus alu-nos não deixam escapar nenhumanovidade tecnológica. Aficionadospor computadores, dependentes dainternet, um pouco por ser seu instru-mento de trabalho outro tanto porvício, paixão.

A relação do net.artista com auniversidade é bem definida por Sil-via Laurentiz, pesquisadora de arte etecnologia e net.artista, que junto comGilbertto Prado coordena um grupo depesquisa em poéticas digitais da PUC-SP, desenvolvendo trabalhosexperimentais com a participação deprofessores, artistas e alunos da gra-duação e da pós-graduação. “Estamossempre em constante pesquisa, reuni-dos em grupos de pessoas dediferentes formações com um interes-se comum, e isto, faz com que aspessoas se concentrem em núcleos crí-ticos e com produção criativa, logo, asuniversidades têm sido ambiente fér-til e propício. Além da PUC-SP e daUSP, cito também Unesp, Senac,Anhembi-Morumbi; sem falar em ou-tros estados, como Brasília, RioGrande do Sul, Rio de Janeiro eBahia”, afirma.

A internet trouxe autonomia aosartistas, permitindo que eles solidifi-cassem redes em todo o mundo. Emgeral eles se conhecem pessoalmentede congressos e bienais internacio-nais. Os sites pessoais, coletivos egalerias virtuais facilitaram a realiza-ção, divulgação e comercialização desuas obras de forma independente.

Giselle Beiguelman é uma das di-retoras da Noema, primeira galeriavoltada para arte digital criada noSecond Life, um empreendimento bra-sileiro que propõe exposições

Net Arte nasce de experimentações estéticas e pesquisa tecnológica nas universidades

Luiza Duarte itinerantes em espaços reais. “ANoema pensa e propõe um projetopara o século XXI : inventar condiçõespara a criação, difusão e circulaçãodas obras sem transformar a obra dearte em eufemismo de varejo, nem oartista em outdoor ambulante decorporações”, defende, depois de ga-rantir que seu sonho é ter uma obracomprada e exposta no site do Google.

POR QUE ARTE NA INTERNET? Aparentemente recente, mega-

novidade para alguns, a net.art temtrabalhos que datam de 1997, dez anosatrás. Net.artistas brasileiros reconhe-cidos mundo afora são desconhecidospara galerias, museus, críticos e cen-tros culturais no Brasil, a grande mídiatampouco parece os ter descoberto.

Os net.artistas falam em negaçãodo suporte, ou seja, a internet não se-ria apenas o que a tela é para apintura, ela seria um campo de cria-ção de sentido. “Quando utilizo asredes, utilizo-as como linguagem e nãoapenas como um suporte. Isto trazconseqüências importantes, pois estouconsiderando que ali contém célulasexpressivas e de comunicação; não es-tou apenas passando idéias por maisum suporte, elas nascem exatamenteda confluência entre meu pensar, e opotencial destes meios”, define SilviaLaurentiz.

Imagens de De vez em Nunca, trabalho da net.artista Giselle Beiguelman

www.Net.Artwww.Net.Artwww.Net.Artwww.Net.Artwww.Net.Art

guggenheimcollection.org

zkm.de

itaucultural.org.br/desertesejo

desvirtual.com/portfolio.htm

webbiennial.org

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A TV pe la internet :A TV pe la internet :A TV pe la internet :A TV pe la internet :A TV pe la internet :esta comodidade é ilegal?

Mariana Esteves

Antes de sair para ir à faculdade,Ana Elisa Vianna, de 22 anos, deixatudo preparado em seu computador.Lost, 24 Horas e Jericho – três dosseriados favoritos dela – já estãoengatilhados no seu programa torrent,que irá baixar em cerca de 40 minutosos últimos episódios de cada um deles.

Aninha, como gosta de ser chama-da, pode ser considerada por muitoscomo uma aficcionada por séries. Co-nhece tudo o que passa e o que jápassou no canal Sony, tem caixas emais caixas de DVDs de seriados detodos os tipos. Um verdadeiro sonhode consumo para os canais a cabo quetransmitem essas produções america-nas, não fosse o fato de que, dos oitoseriados que acompanha semanal-mente, apenas um ela vê pela TV.

A prática de download de sériesvem se tornando cada vez mais co-mum na internet. Depois do estrondodo download e do compartilhamentode músicas, o aumento da capacidadedos discos rígidos e as velocidadesestelares a que as conexões chegarampermitiram a troca que arquivos maispesados e complexos via web, como osvídeos. O princípio é o mesmo, e os im-pactos legais também.

Há quase um ano, Aninha baixaepisódios pela internet, tática queaprendeu com amigos. O acesso viaweb aos capítulos veio cair como umaluva para uma fã como ela, acabandocom empecilhos como horários restri-tos, indisponibilidade e, claro, aansiedade. “Comecei a baixar pela im-possibilidade de ver pela TV, nos casosem que a série não é transmitida nopaís, e pela falta de tempo para assis-tir nos horários da televisão. Depois,mesmo que a série venha a ser exibi-da, eu continuo baixando, pois sempreestou em uma etapa mais avançadados capítulos e não quero esperar me-ses por episódios novos na TV paga”,explica.

Para os canais a cabo e as produ-toras dos seriados, o download estávirando uma questão séria, à medidaque vai conquistando mais adeptos.Além da evidente preocupação com apirataria ¬– quando os arquivos bai-xados são gravados em DVDs erevendidos sem autorização – os capí-tulos chegam à internet sem intervaloscomerciais (maior fonte de renda dos

canais de TV) e passam por cima doscaros royalties que os canais nacionaispagam para ter direito à transmissãodas séries.

Isso torna o download ilegal?Para Aninha, não. “Eu não consideroque o download sem fins lucrativosseja ilegal. Baixar, gravar e revender,é outra história”, diz. E a legislaçãobrasileira concorda, em partes, comela. Segundo o artigo 184 do CódigoPenal, constitui crime oferecer, com aintenção de lucro, produtos protegi-dos por direitos autorais. Já própriaLei dos Direitos Autorais, em seu ar-tigo 46, estabelece que a reproduçãode trechos de obras para uso privadonão é considerada infração. Fica en-tão para a interpretação de quemaplica a lei, a definição de “trecho”.

COMO FUNCIONAÉ verdade que a maior parte dos

sites que disponibilizam episódiosinéditos de seriados o faz gratuita-mente, de forma voluntária, semaparente incentivo, a não ser o gostopelo entretenimento. São verdadeirosmutirões de fanáticos por séries quefazem com que seja possível assistir aum episódio de Heroes com legendasem português, apenas um dia apóssua exibição nos EUA.

A rapidez desse processo é pos-sível graças ao desenvolvimento edisseminação de tecnologias sofistica-das, como programas de capturadigital de sinais de televisão e siste-mas de compartilhamento dearquivos via web. O princípio é o mes-mo do vídeo-cassete, só que, ao invésde emprestar para o seu vizinho a fitaVHS, você disponibiliza o conteúdopara milhões de pessoas ao mesmotempo, na rede mundial de computa-dores.

Trata-se de uma atividade degrande alcance, porém extremamen-te simples, de forma que qualquer umpode participar. Para produzir legen-das para os capítulos inéditos, porexemplo, basta ser bom em inglês eentrar em contato com alguns dos sitesque disponibilizam essas traduções,como o www.legendas.tv . “Atual-mente eu participo de uma equipe quefaz a legenda de Lost” – conta Aninha– “Como estudante de licenciatura eminglês, tradução é uma atividade queme interessa e a legendagem me per-mite praticar.”

SUBSTITUIÇÃO DA TV?Toda essa comodidade dos

downloads – rapidez, eficiência, horá-rios flexíveis – pode levar a pensar quea exibição de seriados pela TV estácom os dias contados. Mas não é bemassim. Essa prática, apesar de estar emexpansão, depende muito de conexõesrápidas e de computadores velozes,recursos ainda restritos a uma peque-na parcela da população brasileira.Além disso, ainda é limitado o núme-ro de pessoas que baixam episódiospela web, se comparado ao número deassinantes de TV a cabo que não o fa-zem. Bem ou mal, o download ainda éuma atividade ligada a um público fãmais engajado e conhecedor deinternet.

E mesmo para os canais de TV, odownload não é de todo mau. Numarecente entrevista ao jornal Agora SãoPaulo, Stefania Granito, gerente demarketing dos canais Sony, AXN eUSA, disse acreditar que o downloadajuda da divulgação das séries. Sãoinúmeros os blogs e sitesespecializados que acompanham pas-so a passo o desenvolvimento dastramas, gerando discussões que nãoseriam possíveis sem o download.Muito se comenta na comunidadeonline sobre seriados que ainda irãoestrear na TV a cabo brasileira, o quegera um marketing viral precioso paraos canais. O caso mais recente foi o dosuper aclamado Heroes, série que mo-vimentou intensos debates na internetantes mesmo de ser exibida pela USA,gerando grande expectativa para a es-tréia.

Para muitos fãs como Aninha, sea TV ainda quer mesmo garantir a sua

parte com a exibição de séries, ela devemelhorar seus serviços ao invés decondenar o download. A chave é in-vestir na rapidez com que trazem essasproduções para a telinha, além de pri-vilegiar as novidades do ramo e repetirmenos capítulos de seriados antigos etemporadas velhas.

COMO BAIXARCOMO BAIXARCOMO BAIXARCOMO BAIXARCOMO BAIXARSUA SÉRIE FSUA SÉRIE FSUA SÉRIE FSUA SÉRIE FSUA SÉRIE FAAAAAVORITVORITVORITVORITVORITA:A:A:A:A:

1- Programas bittorrent, comoo Utorrent, um software decompartilhamento de arquivosentre usuáriosque utiliza vastosbancos de dados disponíveisem sites comowww.mininova.org ew w w . t o r r e n t s p y . c o m .Vantagens: arquivos fáceis deencontrar e download rápido.

2- Sites especializados, como owww.isfree.tv. Vantagens: nãoé necessário instalar nenhumprograma.

3- Orkut. onde sérirespopulares têm comunidadesmovimentadas, com links paradownload de episódiosrecentes. Vantagens: não énecessário instalar nenhumprograma.

4- Para o caso de seu arquivode vídeo vir sem legendas emportuguês, você poderá baixá-las em www.legendas.tv ouwww.opensubtitles.org.

Os downloads rápidos e fáceis de séries de TV pela internet se popularizam cada vez mais

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Você não lambe o selo, mas elas colamVocê não lambe o selo, mas elas colamVocê não lambe o selo, mas elas colamVocê não lambe o selo, mas elas colamVocê não lambe o selo, mas elas colamA maioria das correntes de e-mail vai para a lixeira, mas é bom saber que algumas já atravessaram as

fronteiras do mundo virtual e foram parar em jornais e até no palácio do ItamaratyAlice Assumpção

Livro de geografia utilizado emescolas de segundo grau norte-americanas apresenta mapa em que aAmazônia e o Pantanal sãodenominados reservas internacionais.Difícil encontrar um internauta que nãotenha se deparado com esse boato,difundido por correntes de e-mail naInternet brasileira no início do ano de2000. Aos que acreditaram, um consolo:dois órgãos da imprensa brasileiratambém compraram a idéia. A versãoeletrônica da revista Ciência Hoje e oEstadão publicaram o falso alarme comoverdade em maio de 2000.

Um mês depois da gafe, oembaixador do Brasil em Washington naépoca, Rubens Antônio Barbosa,divulgou uma nota de esclarecimentodesmentindo a mensagem. O episódio,porém, gerou um mal-estar diplomáticoentre Brasil e Estados Unidos queculminou com a publicação de umamatéria do The New York Times, emjunho de 2002, na qual o jornalãoclassificava o boato como “paranóianacional” brasileira.

O (mau) hábito de espalhar falsashistórias pode ser tão antigo quanto opróprio homem, mas há de se convir quea Internet, sobretudo os e-mails, tornoua vida dos linguarudos muito mais fácil.Isso porque, com poucos cliques,qualquer um dos 30 milhões deinternautas brasileiros que possuemconta de e-mail pode enviar um texto(de conteúdo verídico ou não) a dezenasde amigos ou mesmo a toda sua lista decontatos. Basta que alguns dessesdestinatários se impressionem obastante com a mensagem a pontode reenviá-la aos maispróximos para começaruma corrente de e-mail.

Antes deaderir à comuni-dade do Orkut

“Eu odeio correntes de e-mail”, porém,vale prestar atenção a uma ressalva: es-sas men-sagens noti-ciosas não serestringem a inverdades, “teorias da cons-piração” e lendas urbanas. Ao menos é oque afirma o professor de biologia DanielPolly, que tem autoridade para falar doassunto: guarda, há oito anos, todas ascorrentes que recebe, já tendo em seu “ar-quivo” algumas centenas dessasmensagens eletrôni-cas. “A maioriadesses e-mails sãomentirosos, mas, en-tre eles, encontrotambém informaçõesinteressantes de uti-lidade pública,serviços, segurança ecuriosidades. Procu-ro sempre checar averacidade delas, emsites especializados”afirma Daniel. Comolembra o professor, osinternautas brasilei-ros podem recorreràs páginas www.quatrocantos.com ewww.efarsas.com,conhecidas por desmascarar falsos aler-tas de e-mail, para descobrir se estãodiante de mais uma pegadinha do mun-do virtual. Nos Estados Unidos, o sitewww.snopes.com dá conta desse mesmo

serviço.A designer de interiores Jussara

Romaguera é outra adepta confessa dessasmensagens eletrônicas. “Fiquei sabendoda onda do golpe de falso seqüestro portelefone antes de os jornais e revistascomeçarem a noticiá-la, pois recebicorrentes com relatos de pessoas quehaviam recebido esses telefonemas eresolveram prevenir os amigos escrevendo

e-mails que acabarampercorrendo aInternet”. Jussara,contudo, admite que jáfoi tachada deinconveniente. “Meufilho costuma dizer queeu encho a caixa decorreio de meusfamiliares”.

A falta de con-trole sobre essasmensagens, contudo,faz com que a difusãoindiscriminada deconteúdos falsos se so-breponha à divulgaçãodos conteúdos verda-deiros. Das 184correntes eletrônicas

apuradas pelo site www.quatrocantos.com, em seus cinco anos de existência,apenas 34 foram classificadas como ver-dades ou meias-verdades.

Grandes corporações são os al-vos preferenciais dessas mensagensmentirosas. Em entrevista concedida quan-do ainda era assessor de imprensa doMcDonalds, Julio Menezes, da empresa deassessoria Companhia de Notícias do Rio,afirmou que o boato disseminado via e-mail de que a carne dos hambúrgueres do

George Bush tem o menor QI

entre os presidentes americanos

dos últimos 50 anos?

Não. Essa é para ninguém achar que lambanças

só acontecem na imprensa tupiniquim. Em 2001 esse

boato digital, baseado numa suposta pesquisa de um

renomado instituto americano pautou o jornal inglês

The Guardian e o neo-zelandes Southland

Times.

Condoleezza Rice é um estaleiro?

Já foi. A Chevron, multinacional de petróleo, batizou em 2001

um de seus navios petroleiros de Condoleeza Rice em

homenagem aos serviços prestados pela secretária de Estado

norte-americana, que trabalhou por uma década na empresa. As

fotos do navio que circulam na Internet, no entanto, são

montagens grosseiras. Algum engraçadinho soube da história e

falseou uma imagem para chamar mais atenção para a mensagem.

O gesto da Chevron causou desconforto para a Casa Branca e,

restaurante era feita de minhoca levou acadeia de fast food a colocar o selo “100%carne bovina” na embalagem de seus san-duíches. Numa iniciativa semelhante, aCoca-Cola resolveu criar a sessão “boatose mitos” em seu website para desmentir os24 diferentes boatos difundidos via e-maila respeito de seus produtos.

Vincular nomes de marcasfamosas a supostos escândalos ou atribuira autoria de textos a escritores de destaque,são, aliás, a maneira mais fácil de fazeruma mensagem mentirosa chamar aatenção dos internautas e varrer a Web. Éjustamente por isso que tantas correntestrazem a assinatura de Luis FernandoVeríssimo, por exemplo. A bagunça é tantaque já rendeu um livro. Caiu na Rede,organizado pela jornalista Cora Rónai, trazuma seleção de textos de Internet de autoriaerroneamente atribuída a escritorescélebres. Cora consegue corrigir algumasinjustiças, dando o devido crédito aosverdadeiros responsáveis por algunsdesses apócrifos.

Ronaldo Vasconcellos, analistade segurança do Centro de Atendimento aIncidentes de Segurança da Rede Nacionalde Ensino e Pesquisa (Cais/RNP)compara as correntes de e-mails aosfamigerados spams (mensagenscomerciais consideradas a maior pragaa Internet). “Spam e mensagensencaminhadas em massa por amigos têmuma característica em comum:normalmente são indesejados”. Antes deler a seleção de verdades e mentiras quecolocamos abaixo, é bom prometer: nãovale copiar isto num e-mail e enviar aosamigos, melhor deixar para fazeresclarecimentos à moda antiga, no boca-a-boca.

Livros didáticos coreanos colocam parte da China sob domínio da Coréia do Sul?

Mentira. Essa corrente circulou na Internet chi-

nesa no início deste ano. Dizia que livros didá-

ticos de história do ensino médio sul-coreanos

apresentavam mapas que decepavam parte do

território da China antiga, atribuindo-os à Co-

réia. A história, desmentida pelo jornal sul-co-

reano Oh My News, faz lembrar o boato que

circulou na Web brasileira em 2000, em que su-

posto livro didático norte americano apresen-

tava o mapa do Brasil sem a Amazônia. Mapa de livros didáticos sul-

coreanos decepa a China: qualquer

semelhança é mera coincidência

Batatinha quando nasce

espalha as ramas pelo chão?

Certo. A saber: quem tem boca vaia Roma, corro

de burro quando foge, quem não tem cão caça

como gato (ou seja, sozinho). Cuspido e escarrado

vem de esculpido em carrara, um tipo de mármore

de alta qualidade.

Página de falso livro americano em

que Brasil aparecia sem Amazônia

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Mauricio Costa

Nada de gritos, presos algemadosou confusão. Na recepção da Delegaciade Repressão aos Crimes de Informática(DRCI) a vítima mais exaltada reclamaem voz baixa. “É a segunda vez que ve-nho aqui para tentar solucionar oproblema do meu filho. Espero que ago-ra tudo seja resolvido”. Patrícia Araújoda Silva, moradora de Oswaldo Cruz,chegou com papel na mão e muita dorde cabeça. Patrícia registrou queixa so-bre fotomontagens de seu filhopublicadas no Orkut. Nas imagens, orosto do adolescente de 17 anos apare-ce em corpo de rato. Prontamenteatendida, deixa a delegacia satisfeita ecom a esperança de não precisar voltar.

A queixa de Patrícia é mais umana média de 25 por semana que aDRCI recebe. O problema é que nemtodos podem ser solucionados imedi-atamente.

Apesar de atuar com qualquer tipode delito previsto no Código Penal erealizado através da internet, a açãopolicial no Orkut é restrita, como ex-plica a delegada Sânia Burlandi.

“Quando há algum crime neste sitede relacionamento, o que nós fazemosé pedir os dados cadastrais do criadorda página e o IP do usuário, para pos-terior apreensão da máquina.Entretanto, estou aqui desde janeirodeste ano e, mesmo enviando diversosinquéritos para a Justiça, não recebe-mos resposta”, alerta.

Segundo a delegada, o problemaestá no fato de o Orkut ser ligado aoGoogle. Como a empresa norte-ameri-cana é hospedada fora do Brasil, otrâmite é diferenciado, e o procedimen-to, demorado. Nos demais casos decrimes de informática, a polícia realizarepresentação judicial pedindo a que-bra de sigilo de dados do usuário dainternet. Essa representação é encami-nhada para o Ministério Público, que semanifesta a favor ou contra a quebra.

Portanto, se o criminoso não forpego em flagrante, o máximo que po-derá ocorrer é a retirada do ar do perfilou da comunidade noOrkut. Para o inspetorMárcio Araujo o problemaé motivo de vergonha na-cional.

“É o caso mais chatoque encontramos aqui. Fi-camos em um impasseonde eles não nos infor-mam nada e há muitasdenúncias desse serviço. Cerca de 75%dos usuários são brasileiros e posso di-zer que a metade desse percentual écomposta por fakes. O Orkut se carac-teriza, para mim, como vergonha

nacional, pois os administradores se ne-gam a dar informações e nada estásendo feito. O máximo que fazem é re-tirar a página do ar. O usuário brasileirodeveria ter senso crítico e optar por ou-tros sites de relacionamento”, alerta.

O obstáculo limita, mas não impe-de investigações. A DRCI funcionaligada a todas as demais delegacias doRio de Janeiro. A atuação conjunta coma 10ª Delegacia de Polícia, de Botafogo,resultou na prisão em flagrante de ummenor que havia participado do assal-to à ex-miss Brasil Leila Schuster.

“Recebemos uma denúncia peloDisque-denúncia de que o menor porta-va armas em sua casa. Investigamos seuperfil no Orkut, onde ele apresentava asarmas em suas fotos. Como a 10ª DP eraa responsável pelo inquérito do roubo,ela representou a busca e apreensão.Tudo foi encontrado conforme constava

Pedofilia, apologia ao tráfico de ar-mas e de drogas, ameaças, ofensas,difamação e injúria são casos comunsna DRCI, mas nenhum se compara aosdelitos de fraudes. As maiores ocorrên-cias são de estelionato e de furtomediante fraude.

Quem nunca ficou ressabiado aorealizar compras em sites de comércio?Este tipo de usuário é o que possui maischances de freqüentar a delegacia paradenunciar crimes de estelionato pelainternet. As principais vítimas são asque fazem transações em páginas como mesmo propósito do MercadoLivreou Submarino, como afirma a delega-da Sânia Burlandi.

“Falsos vendedores anunciam apa-relhos tecnológicos como máquinafotográfica, retroprojetor ou impresso-ra. Na verdade, muitas vezes aquilo alié fraude. O comprador deposita uma

lizado. Se, por acaso, o IP correspondeao da Telemar, torna-se necessária aquebra de dados do usuário dainternet. Assim, a polícia poderá des-cobrir, por telefone binado, o númerodo responsável por aquele telefone.

Nos casos de vítimas pelo Orkut,os policiais realizam ronda virtual, ouseja, pesquisa pela internet, ou aindaouvem as vítimas que se dirigem até adelegacia. Para registrar a ocorrência,ela deve levar impressa a página quecontém os crimes. A DRCI também éres-ponsável pela administração daDelegacia Virtual. O programa passoua integrar eletronicamente todas asdelegacias do Rio de Janeiro. As denún-cias, anônimas ou não, também sãoefetuadas pelo site da Delegacia Virtu-al. Se preferir, a vítima pode comparecerem qualquer Delegacia de Polícia e fa-zer a queixa pesoalmente.

Os policiais permanecem a maio-ria do seu tempo dentro da delegacia,recebendo queixas ou realizando in-vestigações virtuais. Para buscas eapreensões distantes do perímetro dadelegacia, o apoio do Grupo de Inves-tigação Complementar é fundamentalpara o trabalho da polícia.

“Para não retirar um policial queestá registrando alguma ocorrência emandá-lo para São João de Meriti, oGIC nos dá suporte e contata os polici-ais mais próximos do local”, informaSânia Burlandi.

As vítimas podem realizar denún-cias acessando o site:

www.delegaciavirtual.rj.gov.br

Ronda virtual: como a polícia trabalha na internet

“O Orkut secaracteriza,para mim,como vergonhanacional”

Tipificações PenaisTipificações PenaisTipificações PenaisTipificações PenaisTipificações Penaisinvestigadas pela DRCIinvestigadas pela DRCIinvestigadas pela DRCIinvestigadas pela DRCIinvestigadas pela DRCI

Calúnia; Difamação; Injúria, Ameaça;Divulgação de segredo; Furto; Dano;Apropriação Indébita; Este–lionato;Violação ao direito autoral; Escárniopor motivo de religião; Fa–vorecimento da prostituição; Atoobsceno; Escrito ou objeto obsceno;Adultério; Incitação ao crime; Apo-logia de crime ou criminoso; Falsaidentidade; Inserção de dados falsosem sistemas de informações; Falsotestemunho; Adulterar dados em sis-temas de informações; Exercícioarbitrário das próprias razões; Jogode azar; Crime contra a segurançanacional; Preconceito ou discrimi-nação Raça-Cor-Etnia-Etc; Pedofilia;Crime contra a propriedade indus-trial; Inter-ceptação de comunicaçõesde informática; Interceptação de e-mail comercial ou pessoal; Crime delavagem de dinheiro; Crime contrasoftware - “Pirataria”.

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nas fotografias”, explica Sânia Burlandi.Não são só assaltos e apologia ao

tráfico que fazem parte da investigaçãopor Orkut e outros serviços da internet.Dos mais complicados, os crimes depedofilia também recebem atenção es-pecial na DRCI. O inspetor MárcioAraujo lembra de um caso onde o in-vestigado acabou preso.

“Conseguimos chegaraté a máquina dele e, atra-vés da perícia, foiverificado que era especia-lista em comunicação porOrkut, MSN, YahooMessenger para conversarcom menores. Fingindo sermenor, tinha finalidade deconvencer suas vítimas a

tirarem as roupas diante da webcam. Overdadeiro pedófilo não se encontra so-mente no Orkut, está camuflado nestesite e usa outros artifícios para atrair aspessoas”, lembrou.

quantia na conta do suposto vendedore nunca recebe a mercadoria. Esse é onosso carro-chefe. O furto mediantefraude ocorre quando se subtrai umbem de alguma pessoa utilizando frau-de. Exemplo é a utilização de senha semautorização do titular para realizartransação bancária pela internet”,enfatiza a delegada.

Para efetuar denúncias de fraudespor estelionato na DRCI, a vítima devecomparecer à delegacia e portar o com-provante de depósito do valor doproduto em conta bancária. Se o com-prador mantiver contato com ovendedor por e-mail a investigaçãodeverá acelerar, isto porque é mais fá-cil de descobrir o IP do suspeito.

Em caso de fraude de um bancopara outro (exemplo da transferênciade dinheiro), a polícia solicita ao bancoas informações necessárias sobre a mo-vimentação, como horário e dia. Hátambém o pedido do número do IP uti-

Inspetor Márcio Araujo

Policiais enfrentam novos desafios diante dos crimes praticados após a expansão da rede mundial de computadores

Sânia Burlandi explica como os sites de comércio se tornaram o carro-chefe das ocorrências

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Assim sou se lhe pareceAssim sou se lhe pareceAssim sou se lhe pareceAssim sou se lhe pareceAssim sou se lhe pareceFalsidade ideológica

na Internet: crimeainda sem solução

A lei brasileira prevêreclusão de um a cinco anospara os autores das “brin-cadeiras”. Mas a aplicaçãodas leis vigentes para o ter-ritório da Internet aindatem percurso longo. Umdos principais problemas éque cada país possui seuCódigo Penal. No Brasil, aConstituição se estende atodos os cidadãos de naci-onalidade brasileira,independentemente do ter-ritório onde a ação sejacometida.

Falsidade ideológica écrime em qualquer país,contudo a origem do delitoe a forma de punição sãoempecilhos constantes paraque os falsos perfis doOrkut sejam retirados do ar.

O escritório brasileirodo Google afirma que nadapode fazer para atender àsinvestigações, uma vez quedados referentes à identida-de dos usuários estãolocalizados nos EstadosUnidos e na Grã-Bretanha.Porém, o des-cumprimentodas ordens judiciais podefazer com que seja abertoum in-quérito policial soli-citando à Justiça a apuraçãodas responsabilidades doGoogle Brasil.

Alguns casos decybercópias já foram apura-dos e solucionados. Emabril de 2005, a Abin (Agên-cia Brasileira deInteligência) tirou do ar osperfis do ministro chefe daSecretaria de Comunicaçãode Governo e Gestão Estra-tégica, Luiz Gushiken, e daprimeira-dama do Brasil,“Marisa Letícia, ambos fal-sos.

No Orkut,No Orkut,No Orkut,No Orkut,No Orkut,proliferproliferproliferproliferproliferamamamamam

perfis deperfis deperfis deperfis deperfis defffffalsos usuáriosalsos usuáriosalsos usuáriosalsos usuáriosalsos usuários

e confusãoe confusãoe confusãoe confusãoe confusãoentreentreentreentreentre

anônimos eanônimos eanônimos eanônimos eanônimos efffffamososamososamososamososamosos

Paula Amorim

Entrar no Orkut e se deparar comalguém se passando por você. Estacena não é rara entre pessoasconhecidas do grande público oumesmo seres humanos que vivemlonge dos holofotes. Os falsos orkutsou orkuts clonados, como algunsgostam de chamar, são capazes deenganar os mais desavisados e atéconstranger o alvo da cybercópia.

Classificado como site derelacionamentos, o Orkut tem comocaracterística a possibilidade depermanente contato com amigos,parentes ou pessoas que tenham“perfis” compatíveis. Estaaproximação permite que fãsalimentem o desejo de trocarmensagens com seus ídolos. Queadolescente não gostaria de receberrecados de Rodrigo Santoro? Pois bem,em uma breve pesquisa encontramoscerca de mil “Rodrigos Santoros” ecom diferentes características. RodrigoSantoro, o verdadeiro, não possuiorkut.

As reações por parte dosclonados são as mais diversas. Emrecente nota em sua coluna no jornalO Globo, Ancelmo Góes informou queo cantor Roberto Carlos estava irritadocom o Google, atual proprietário dosite, por ainda não ter retirado os perfis“ Roberto Carlos Braga”, “RobertoCarlos oficial” e “Roberto Carlos. Orei”.

Em uma destas páginas,encontramos a descrição “Eu sou o ReiRoberto Carlos. Para os mais íntimos,Bebeto. Sou uma pessoaextremamente apaixonada pela vida,e pela minha carreira, adoro cantar!”.Mensagens apaixonadas são postadasem sua caixa de recados e fotos de suacarreira são exibidas em seu álbum.Está lotado com novecentos e setentae quatro amigos.

Apesar da irritação, RobertoCarlos ainda não acionou a Justiçapara investigar os autores dafalsificação. Porém, esta medida já foitomada por outros artistas. A atrizAna Paula Arósio contratou oadvogado Michel Assef para que elea ajude a retirar do ar uma falsa páginasua no Orkut. No falso perfil constaque a atriz está aceitando trabalhospor um salário-mínimo, além de estarespecificado que seu prato preferidoé buchada de bode. O autor dadifamação ainda não foi descobertopela Delegacia de Defraudações.

Em outro caso, o jogador defutebol Rogério Ceni do São Paulo

Futebol Clube aparece em uma páginadeclarando que seu maior sonho erajogar no Corinthians, clube que já ohavia rejeitado alguns anos antes dese tornar jogador profissional. Ojogador alguns meses atrás desmentiuas histórias dizendo que não temconhecimento dessas informações eque não faz parte do Orkut.

Até mesmo Orkut Büyükkökten,engenheiro de software quedesenvolveu a rede social, enquantouma das pessoas mais conhecidas doOrkut, teve seu perfil clonado com ainserção de comunidadeshomossexuais.

O Google alega que analisaindividualmente os perfis em questãoe que nos últimos meses aumentouem mais de mil vezes a equipe desuporte que trata dos casos de abusoe conteúdo ilegal relatados porusuários. Contudo, Brad Pitt, MickJagger e Alanis Morissette continuamfalando em português na página daInternet.

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Na trNa trNa trNa trNa trave? Virave? Virave? Virave? Virave? Viral é gol de placa da propagandaal é gol de placa da propagandaal é gol de placa da propagandaal é gol de placa da propagandaal é gol de placa da propagandaNa internet, consumidores tornam-se ‘webcúmplices’ do marketing interativo

Pedro Veríssimo

Ronaldinho Gaúchoestá sentado no gramadoquando recebe um par dechuteiras novas. Rapida-m e n t e , d i s p õ e - s e aexperimentá-lo. Calçadasas ‘chuteiras de ouro’, ocraque evoca sua catego-ria habitual para levantaruma bola e, em sucessi-v a s e m b a i x a d a s , c o n -duzi-la até a entrada dagrande área. Ronaldinhobrinca com a bola e, semdeixá-la cair, desfere umchute em direção ao gol.Para sua surpresa, a re-donda bate no travessãoe volta no peito do joga-dor. Ele domina, ajeita ec h u t a d e n o v o . A g o r avocê tem certeza de que abola vai entrar. Que nada,ela volta a acertar o postesuperior e cai nos pés deRonaldinho. Não conten-te em apenas equilibrar abola na cabeça, o habili-d o s o j o g a d o r r e p e t e afaçanha de acertar as tra-ves mais duas vezes e saide campo sorridente.

Quantas vezes vocêindicou esse vídeo a al-g u é m ? O u m e l h o r ,quantas pessoas te envi-a r a m e - m a i l s o ucomentaram com você so-b r e e l e ? E s e , m e s m oassim, você não se depa-r o u c o m e s s e p e q u e n ofilme na Internet, ao me-nos deve tê- lo vis to noFantástico, com direito anarração de Cid Moreirae em pleno horário nobrede domingo na televisãoaberta.

Estava criada a po-l ê m i c a a c e r c a d av e r a c i d a d e d o v í d e o(“Será possível acertar ot ravessão quat ro vezesconsecut ivas?” ) e , comi s s o , i n t e n s i f i c o u - s e oboca a boca sobre o assun-to e, conseqüen temente,o s a c e s s o s a o a r q u i v oque, a esta altura, já nãoe s t a v a d i s p o n i b i l i z a d osomente no site da Nike,m a s n o s m a i s d i v e r s o sportais de hospedagem de

vídeo, como o YouTube eseus s imi lares . Era umviral.

E ao se discutir se ovídeo era falso ou real ,um número cada vez mai-o r d e c u r i o s o s o uautoproclamados ‘espe-cialistas em montagens’,empenhados em descobrirf a l h a s q u e i n d i c a s s e m

i n i c i a t i v a : v e n d e r s e u sprodutos e fortalecer suamarca diluindo o traba-l h o d a d i v u l g a ç ã o n opróprio mercado consu-m i d o r , s e m q u e e l e s esinta usado.

Para o publicitárioAntonio Pedro Tabet, admi-nistrador do blog ‘Kibeloco’,essa interatividade é o gran-

Em vídeodivulgado pelaNike,RonaldinhoGaúcho acertoua trave emquatro chutesconsecutivos.Com as imagensespalhadas pelaInternet, ocraque se‘multiplicou’por todo omundo levandoa marca da Nike

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“os consumidoresse divertem,

informam-se e serelacionam ao

fazer essapropagandadisfarçada”

diz o publicitárioAntonio Pedro Tabet

m a n i p u l a ç ã o d a s i m a -g e n s o u a p e n a s á v i do spor mostrar o vídeo aosamigos, fizeram da cam-panha ‘Joga Bonito’, ums u c e s s o d o s e t o r d eMarketing da Nike. A for-n e c e d o r a d e m a t e r i a lesportivo do Barcelona,c l u b e d e f e n d i d o p o rRonaldinho Gaúcho, viu,com uma simples filma-gem, que, certamente, nãopesou no orçamento dae m p r e s a , o n ú m e r o d eacessos a sua página naweb aumentar considera-velmente. E o melhor da

de segredo das peças demarketing que têm seu prin-cipal meio de propagação naInternet.

“Acho que o grandel a n c e é t r a n s f o r m a r omercado consumidor emcúmplice. E fazer isso deuma maneira que o mer-c a d o n ã o s e s i n t au t i l i z a d o . M u i t o p e l ocontrário. Ele compra asua briga”, disse Tabet,que tratou de defender aprática:

“E isso não signifi-c a n e n h u m t i p o d ee x p l o r a ç ã o . A f i n a l , o s

consumidores se diver-t e m , i n f o r m a m - s e e s erelacionam ao fazer essapropaganda disfarçada.O cliente lucra, o merca-do lucra e o veículo lucra.Não há perdedores,” con-tinuou.

Para emplacar, umviral precisa cumprir al-g u n s r e q u i s i t o s . Oprofessor JC Oliveira, daESPM de São Paulo expli-cou o processo : “Nessemodelo de Marketing, ousuário é veículo. Para oconteúdo de uma peça ser‘viralizável’, tem que ser

relevante ao consumidor,geralmente é engraçadoou inusitado. O viral deveser o primeiro a dar umainformação, despertandoo desejo de compartilhá-lan o s u s u á r i o s ” , d i s s e oprofessor.

Outro fator que ditao sucesso de uma campa-n h a p u b l i c i t á r i a n a

‘grande rede’ é a maneiracomo a peça é divulgada.Propagadores de vídeos enotícias inusitadas, blogsfamosos, como o próprio‘ K i b e l o c o ’ d e A n t o n i oTabet são os pr incipaiscaminhos percorridos poruma ação de marketingda agência até os consu-midores.

“Ter bom relaciona-mento com os mante-nedores de blogs de altav is i tação é impor tantepara as agências porqueajuda muito na divulgaçãodas ações”, observou.

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O mercado fonográfico na erO mercado fonográfico na erO mercado fonográfico na erO mercado fonográfico na erO mercado fonográfico na era digitala digitala digitala digitala digitalSerá o fim do CD?Será o fim do CD?Será o fim do CD?Será o fim do CD?Será o fim do CD?

Ilustração: E

lisa Branco

Renata Leal

A era digital chegou e cami-nha a passos largos. As vendas deCDs não são mais as mesmas des-de que os internautas conseguempegar músicas na rede. O MP3, oscelulares e todos os aparelhos ele-trônicos que tocam músicas emformato digital estão espalhadospor todos os lugares. Mesmo as gra-vadoras que relutaram em aceitar onovo mercado não querem maisperder as vendas online. Odownload vem crescendo em ritmoacelerado e promete, cada vez mais,um futuro próspero para aquelesque investirem. A indústriafonográfica está se reorganizando,o que não significa, ao menos porenquanto, o fim dos álbuns dispo-níveis nas lojas.

Sinal dos novos tempos: desde2004 a marca de premiação paravendagem de CDs foi reduzida. NoBrasil, eram necessárias 100 mil có-pias para o disco de Ouro, 250 milpara disco de Platina e vendas aci-ma de 1 milhão para Diamante.Mas, esses valores caíram pela me-tade, apontando para um momentode crise no mercado. A indústriaque movimentava R$ 1 bilhão e 200milhões em 1995, em 2006, amargouuma queda, chegando a R$ 250 mi-lhões, retração de quase 80% emuma década.

“Acredito que o download pagoé o negócio mais promissor do mo-mento. O departamento de vendasonline da Universal é recente, temdois anos, e, de acordo com ele, éum dos setores que mais movimen-ta dinheiro para a gravadora.”, dizGê Pinto, Diretor de Arte da Uni-versal Music. A gravadora fezparcerias com sites como o IMúsica,Terra, Yahoo dentre outros e vemfechando novas sociedades no mer-cado digital.

O primeiro site brasileiro de dis-tribuição digital de músicalegalizada surgiu no ano 2000 . “Omercado naquela época ainda eraum ponto de interrogação”, afirmaum dos idealizadores do IMúsica,Felipe Llerena.

O IMúsica, inicialmente, tinhaum banco de dados composto porfaixas de gravadoras independen-tes e canções fora de catálogo. Jánesse último ano, visitado por maisde 1 milhão de usuários mensal-mente, o site pioneiro no país fezacordos de licenciamento com maisde 300 gravadoras e distribuidoras,entre as quais Warner Music, EMIMusic, Deckdisc, Trama, IndieRecords e Biscoito Fino.

As gravadoras foram aos poucosentrando no mercado. A Trama foia primeira no Brasil a vender faixasavulsas por download e produzirmúsicas exclusivamente para ainternet. A Biscoito Fino não ficoupara trás e também disponibilizaem seu site, além dos CDS, músicasque podem ser baixadas em forma-to MP3. Mas, de acordo com agravadora, por enquanto odownload no site é apenasmarketing, ainda não temrepresentatividade nas vendas.

O preço de uma faixa avulsa nainternet custa a partir de R$1,99.Caso um internauta pegue um dis-co inteiro acaba pagando o preço deum CD comprado em loja.

Uma característica marcante noconsumo atual de música é o inte-resse por faixas individuais, em hitsdo momento, e não nos álbuns naíntegra. A Federação Internacionalda Indústria Fonográfica - IFPI di-vulgou uma pesquisa em 2006 emque se estima que os downloads desingles subiram 89%, chegando a795 milhões.

Júnior Costa, 22 anos, estudan-te de administração, diz não gostarde comprar CDs por não escutá-losinteiros, “Eu gosto de ter no meucomputador as músicas do momen-to, funks, hip hop, axé, e qualqueroutro estilo que eu esteja curtindo.”

O público dos sites de venda demúsica ainda não é formado poruma faixa etária jovem. Llerenaacredita que um dos fatores princi-

pais para isso é as músicas seremvendidas através de cartões de cré-dito

O estudante de economiaHenrique Vasconcelos, 22 anos, dizpegar músicas da internet não sópela facilidade como também porainda ser um produto de graça, “OsCDs andam muito caros, não é pos-sível sair comprando tudo o que sequer ouvir”.

Entre as pesquisas sobre a pirata-ria o custo dos CDs nas lojas, emtorno de 25 e 30 reais, é uma razõespara o afastamento dos consumidores.

Segundo Felipe Llerena, um dosconselheiros da ABMI - AssociaçãoBrasileira de Música Independente,o problema da pirataria é antes detudo uma fa lha educacional e deconsciência dos brasileiros. Cercade 25% da receita do IMúsica vaipara os artistas e seus representan-tes e quando a música é baixada degraça, o trabalho dos músicos não éreconhecido, diz Llerena.

Os números brasileiros de vendasdigitais ainda não são representati-vos em comparação a outras partesdo globo. Mas, as vendas online epara telefones celulares foram os ca-nais de distribuição com maiorcrescimento nos últimos anos.

Há tempos já se prevê o fim dosCDs . Mas, o Compact Disk aindaexiste, e 75% da música mundial écomercializada através dele. A mú-sica digital, seja em computadores,MP3 players e telefones, ainda ca-minha ao lado do CD. E, talvez, porum muitos anos.

“O rumor de que o CD pode aca-bar é uma balela, o fato é que aindústria do disco está fragilizadaporque o modelo “artista - grava-dora - estúdio - marketing – loja”,não é mais o único possível”, acre-dita Llerena.

Gê Pinto, da Universal Music,diz preferir ir a uma loja comprar oálbum do que ficar procurandomúsica na internet. “Gosto de ter oencarte, as letras e também o pra-zer de entrar em um lugar, comprare levar um objeto.” Para Gê, o CDsempre terá o seu espaço, ainda quetenha que dividi-lo.

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NO 11 - 2007/1 21

Rodrigo:“Beijando sua boca emordendo seus lábios”

Maria:“Arranhando suascostas com as unhas”

Rodrigo:“Encostando seu corpono meu e agarrandosua cintura bem forte”

O diálogo acima éapenas o trecho inicial deuma conversa feita pelaInternet que chegou a níveisbem mais extremos sem sairdo computador.

Ganhando cada vezmais adeptos, o sexo virtualconsiste em narrar, juntocom outra pessoa, tudo o queaconteceria caso os doisestivessem tendo umarelação. Trata-se de darmargem à criatividade paratentar excitar e ser excitadopela pessoa que está dooutro lado do computador.Mas tudo isso não foge docampo da conversa.

Geralmente este tipo dediálogo ocorre em salas debate-papo ou em programasde computador quepermitem comunicaçãoimediata como, por exemplo,o MSN Messenger. E ospraticantes destamodalidade de sexosurpreendem pelaheterogeneidade. Dentrodeste universo há pessoasnovas e outras maismaduras; há diferença dereligiões, de classes sociais,de cores, enfim, não há umpadrão que possa serapontado.

“Eu adoro curtir umabadalação. Festas e boatessão comigo mesmo!”, contouMaria.

“Prefiro o dia à noite.Minha praia são os esportes.Gosto de andar de bicicleta,fazer ginástica e também depraticar natação”, foi o queafirmou Luciana.

“Não sou de sair.Prefiro ficar em casa. Adoromexer no computador”,declarou Patrícia.

G a r a n t i n d oprivacidade com o nomefictício, Maria trabalha comosecretária em uma firma deadvocacia. No final de abril,completou 30 anos de idade.Nos últimos três anos, elaentra na Internet para terencontros quentes. “Noinício, eu apenas entrava nassalas de bate-papo voltadaspara este tema e ficava lendoo que os outros escreviam.Mas, com o tempo, asconversas foramdiminuindo, pois as pessoascomeçaram a preferirescrever em conversasparticulares, o que impediao acesso de terceiros paraleitura. Eu já estava ficandoentediada e, um dia, decidientrar em uma sala daquelascomo participante. Coloqueium nome bem sensual –‘morenarj’, ela lembra atéhoje – e comecei a conversarcom um cara. Na primeiravez eu estive um poucoenvergonhada, mas depois agente acaba gostando e aíquer sempre mais”, relatoua secretária, que tem muitomedo de que os paisdescubram o teor de suasconversas na Internet. “Soude uma família muitocatólica. Não acho que estoufazendo algo de errado, massei que meus pais não iriamgostar se descobrissem estemeu segredinho”.

Luciana é a mais velhadas três: têm 35 anos. Já écasada e diz que a prática dosexo pela Internet só fazesquentar sua relação com omarido. “Nas minhasconversas estimulo minhaimaginação. Sempre procuromeu marido depois para pôrem pratica tudo aquilo queapenas imaginei quandoestava em frente ao monitor.Mas ele não sabe disso não.Ficaria uma fera sesoubesse”, disse Luciana,que trabalha comoprofessora de educação

f í s i c a .Perguntada senão se consideravauma adúltera por fazer sexovirtual com outra pessoa, elafoi bem direta em suaresposta. “Quando faço issoestou pensando em meumarido, portanto, não hátraição”.

Aos 19 anos de idade,Patrícia é a mais próxima doestereótipo que se criou paraos adeptos do sexo virtual:não tem o hábito de sair decasa e muito menos umnamorado. Quando não estána faculdade está em frenteao computador, ondeencontra a maior parte deseus amigos. “A cidade (Riode Janeiro) é muito violentae chata. Em frente aocomputador viajo para omundo todo. De lá eu possoaté arrumar um namorado.Meus últimos casos foramtodos pela Internet”, contouela, que só “transa” com umde seus amigos virtuais.“Com qualquer um não.Tem que me conquistarprimeiro”.

Perguntadas sobre oque pensam a respeito daprática do sexo pela Internet,a maior parte das pessoasdisse que consideram umafalta do que fazer ou falta devergonha na cara. Maria aose incomoda com este fato.Apesar de já ter perdido uma

a m i g apor causa de

seu hábito, ela continuapraticando. “Uma amigaminha já me virou às costasdepois que lhe contei sobreo que faço no computador.Na época fiquei chateada,mas hoje nem ligo mais. Parater agido desta forma éporque ela não era minhaamiga”.

Já Patrícia pensa ocontrário. Ela confessa quefica irritada quando escutaalgum comentário negativo.“Falar mal de quem praticaé que é uma falta do quefazer. Tenho certeza de que,se algum dia fizessem, iriamgostar tanto que fariam dissoum hábito”.

Mas o que será que levatodas estas pessoas abuscarem nas conversas viaInternet uma fonte de prazere excitação? Para a sexólogaAna Paula Guimarães, osucesso deste tipo de sexoreside na liberdade que eleconcede a nossa imaginação.“O segredo para o sucessodo sexo via computador éque, graças a ele, você podedar asas à imaginação. Portrás do monitor o serhumano se sente protegidopara fazer [ou melhor, dizer]coisas que eleprovavelmente não teriacoragem de fazer naprática”.

Luciana endossa o coroda sexóloga. “O computadorme deu a liberdade de poderfazer tudo o que eu sempresonhei. É gostoso demaisficar imaginando o que estáacontecendo e como estáacontecendo”.

Mas há pessoas que nãose contentam com apenas aimaginação e buscam reforçoem aparatos eletrônicoscomo, por exemplo, a webcam. Através dela, os adeptospodem ver a pessoa comquem estão tendo a relação.“Gosto de usar a câmera econversar através deheadphones. Assim possoolhar para a pessoa comquem estou transando e teruma conversa mais naturalcom ela. Não dá para transarsem ver a pessoa, semadmirar o seu corpo”,comentou Patrícia, quecostuma se despir diante deseus “namorados” durante arealização do sexo virtual.

Para Ana Paula, o usode câmeras descaracteriza osexo pela Internet. “Este tipode sexo é marcado pelainteratividade. Não fazsentido você assistir ao quea outra pessoa está fazendo.A partir deste ponto achoque começa a ocorrer umamistura entre o sexo pelaInternet e o voyeurismo.Para este último a web já estárepleta de atrações, comovídeos pornográficos, fotossensuais ou de sexo, entreoutros. Elas não estimulam ainteratividade. Logo, nãopodem ser consideradascomo sexo pela Internet”.

Com câmera ou semcâmera, o fato é que onúmero dos adeptos temcrescido. As salas de bate-papo temáticas se encontrammais cheias e já foramcriadas no mínimo quatrocomunidades no site derelacionamentos Orkut como nome “Sexo pela Internet”,sendo que a mais popularpossui cerca de 100membros.

Rafael Oliveira

Mouse com pimenta: combinação eMouse com pimenta: combinação eMouse com pimenta: combinação eMouse com pimenta: combinação eMouse com pimenta: combinação excitante?xcitante?xcitante?xcitante?xcitante?Prática cada vez mais comum na web, sexo pela Internet mexe com a imaginação

dos internautas e apimenta as conversas online

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Page 22: N 11 - 2007/1 - eco.ufrj.br · – Eu não abro mão do show ao vivo. É por causa da emoção, do calor do evento. Além disso, a exibição ao vivo de uma banda internacional, por

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Bárbara Fernandes

Até há pouco tempo o Second Life eratido como um ‘jogo’ curioso. Causouestranhamento que um ‘game’ que maisparecia uma mistura de The Sims comsalas de bate-papo pudesse gerardinheiro de verdade. Há até cotaçãoespecial para o Linden Dollar (US$1,00= L$ 267,00 em maio). Ou seja,teoricamente os usuários estariambrincando com dinheiro de verdade.Porém, desde que surgiu a primeiramilionária do Second Life (SL para osíntimos), a chinesa Anshe Chung,passou-se a prestar mais atenção nessesimulador de realidade (a verdadeiradenominação do SL segundo seusmembros mais xiitas). Desde entãohouve a progressiva popularização doSecond Life que já conta com mais decinco milhões de habitantes.

Para fazer parte do SL é necessário,primeiro, escolher o tipo de conta. Háopções FREE ou pagando o equivalentea US$10,00 por mês para se obter acessoa algumas regalias como possuirterreno. Escolhida a forma depagamento, basta escolher o nome doseu personagem (avatar) e fazer odownload do jog... digo do simuladorde realidade. Assim que você se tornausuário você pode escolher entre seisopções de corpo (skin) para seu avatar.Mas não se preocupe, depois vocêpoderá modificá-lo de quase infinitasformas e até comprar novos tipos decabelo, rosto, corpo e roupa.Inicialmente, o corpo de seu avatar seráa imagem e semelhança de bonecosBarbie e Ken, mas é possível comprarcertos apetrechos a serem anexados.Pode-se também, com o auxilio doPhotoshop, criar roupas, acessórios,tatuagens, móveis e até estádios. Paratrazer o objeto criado fora do SL bastapagar L$10. Muitos estilistas, designerse arquitetos têm descoberto a vocaçãoou ganho um dinheiro extra com suascriações virtuais.

Todos os novatos no SL costumamlevar muito tempo para entender comotudo funciona. Depois de mesesusando-o, é bem provável que continuesem entender como usar a maioria dosaparatos. Mas, isso acaba por torná-lomais interessante já que sempre seaprende algo novo. Assim que secomeça a utilizar, os avatares entramno Tutorial. Lá se aprende o básicocomo as teclas para se mexer, comoalterar o corpo e a roupa do avatar, avoar (ah se na vida real fosse assim) eetc... É interessante notar que quem nãotem o dom para a cirurgia plásticacostuma ter um rosto com o da Cher oudo Michael Jackson.

Talvez seja mais complicado para osnovatos (também conhecidos comon00b) se acostumarem a se comunicarna Babel que é o second life. Há apossibilidade de usar o Instant Messageque funciona tal como um torpedo decelular e só a pessoa para quem vocêenvia a mensagem pode lê-la. Ou pode-se usar o chat onde tudo é ditopublicamente e quem estiver em umraio de 50 metros lerá. Está previstopara que em breve as conversas possamser ouvidas usando um sistemasemelhante ao Skype. Muitos são os queadoram a idéia por trazer mais realismoà comunicação, porém há quem vejaisso como um fim da fantasia de seroutra pessoa. Outra complicaçãoadvém de que já é difícil ler todas asmensagens (e saber para quem sãodirecionadas), imagine escutar, aindamais sem a ajuda do ‘history’ (históricoonde se podem ler todas as mensagensenviadas).

A maior parte dos movimentos dosavatares é feito através das ‘balls’. Sãobolas nas quais se clica para efetuar aação desejada seja dançar, sentar,pintar entre outras. Todas essas ‘balls’foram produzidas por usuários, mas énecessário amplo conhecimento deprogramação para criar movimentostão intrincados como dançar salsa.

Adquirir emprego à primeira vistaé difícil, porém, trabalhar comodançarino (a) ou faxineiro (a) é muitofácil. Geralmente, há uma ‘ball’indicando que ao clicar ali ganhará xlindens. Mas costumam ser trabalhosapenas para iniciantes porque sãomuito mal remunerados (em geral, sãorealizados enquanto o usuário estálanchando ou usando o banheiro). Hámuita oferta de emprego feita pelospróprios usuários. Em alguns lugares,até, foi banida a propaganda excessivaporque fazia da ‘ilha’ uma feira. Épossível trabalhar em quase todas asáreas: vendedor, jornalista, corretor deimóveis e, um dos mais populares,como acompanhante. Por maisestranho que possa parecer, aprostituição é um dos empregos maisrentáveis e é legal em quase todas asilhas consideradas ‘maduras’.

Os terrenos são chamados de ilha.Para ir de uma à outra só voandograndes distâncias ou através dométodo mais fácil de locomoção: oteleporte. Com ele é possível ir da IlhaÉtoile, onde há uma réplica do Arco doTriunfo, à Ilha São Paulo em questãode segundos. Algumas ilhasrepresentam tão perfeitamente aarquitetura de certas cidades queacabam por impressionar. Passear pelailha de Amsterdã é como ter uma

prévia da cidade real. Os detalhes sãoprimorosos. Na Ilha Bahia há umaréplica virtual do pelourinho aonde atéa topografia é igual. As ilhas sãodivididas por conteúdo maduro ou não.Isso visa evitar que adolescentes, oupessoas que se chocam com facilidade,entrem em contato com cenas de sexoou nudez.

Empresas de renome já enxergam opotencial do Second Life. Unibanco, G1,Bradesco, Nokia e outras já puseramfiliais virtuais para divulgar seusprodutos. No caso do G1 se vai maislonge. Por estar ‘dentro’ do Second Lifetem acesso mais fácil do que se passalá e por isso, é um dos poucos meios decomunicação que tem produzidoinformações detalhadas e de formaveloz a seu respeito (sem as quais quemvos fala, Catarina DeCuir, nãoconseguiria produzir tal texto).

Partidos políticos também têmdescoberto, ainda que devagar, o SL.O pioneiro dentre os brasileiros foi oPSDB. Logo depois os Democratasfincaram um prédio na mesma ilha e,recentemente, também é possívelvisitar a sede virtual do PCB. Mas, aimpressão que passam é de que grandeparte desses ainda não sabe ao certo oque fazer lá. Quando se visita o prédiodos Democratas não se encontra umaalma viva. Tudo o que se pode fazer érecolher uma espécie de flyer sobre opartido e SÓ. Já no caso do PSDB servecomo uma excelente plataformapolítica. O prédio é facílimo de serencontrado em uma das principaispraças da Ilha São Paulo. Lá, além deganhar camiseta com o logo tucano,também se pode conversar com filiadose receber os projetos do partido.Infelizmente, até o momento não foipossível encontrar o PCB.

Nos últimos meses houve uma maiordivulgação do SL e com isso um maiorafluxo de brasileiros para lá. Ilhas emque antes só se falava inglês começama apresentar conversas em português(e portunhol). Além disso, a Ilha Brasilé uma das mais procuradas com mais

-Já me congelei, caí de mais de 200metros de altura, levei tiro;aparentemente meu avatar é imortal.-Logo que entrei houve uma pequenafalha de comunicação. Um espanholfala “tire a roupa”, mas não especificase falava comigo ou com um alemão.Depois deixou bem claro que não eracomigo.-Maconha é vendida como se fossepamonha, aos berros e no meio dapraça.-Ao mudar minha ‘skin’ percebi que,se quisesse ser fiel à minha aparência,teria, em uma escala de 0 a 100, alturaigual à -2.-Já fui vendedora de camisas,faxineira, dançarina, mas descobrique a atividade mais rentável é a decafetina.-Conheci um avatar de um inglês queadora mudar radicalmente suaaparência. Já foi japonês, robô, punke até mendigo bêbado.-As drogas e as bebidas produzemefeito nos personagens. Aliás, aminha é bem fraca para bebida. Bastaum copo de cerveja e já não consigocontrolar direito seus passos.-Já participei (ou bisbilhotei) deconcursos ‘exóticos’ como: melhorfantasia de super-herói, melhorbunda, melhor em jeans entre outros.-Copacabana é linda, mas toda vezque coloco os pés lá eu levo tiro erecomeça o SL.-‘Ball’ escrita ‘on hand’ NÂO querdizer ficar de mão dada.-É bom ser mulher. Enquantoganhamos partes íntimas de graça,homens têm que desembolsar pelomenos L$100 para algo de tamanhodescente.-Surge um novo termo avatariano,digo, secondlifiano.Trata-se do furry,quem usa avatar de bicho ao invésde corpo humano. Já virou gíria parapessoas que escrevem ‘axim’.

Em um protesto virtual contra ofechamento do RCTV. Com direitoa carregar cartaz e usar mordaça.

Entenda como usar esse novo ‘jogo’UMA SEGUNDA VIDAUMA SEGUNDA VIDAUMA SEGUNDA VIDAUMA SEGUNDA VIDAUMA SEGUNDA VIDA

de 10000 visitas por dia. Nãose sabe ao certo se em breveocorrerá com o SL o queaconteceu com o Orkut ou seoutros países tambémdespontaram por lá. Mas, oSecond Life já se transformouem nova moda entre osbrasileiros mais ‘antenados’.

Diário de Bordo:Diário de Bordo:Diário de Bordo:Diário de Bordo:Diário de Bordo:Catarina DeCuirCatarina DeCuirCatarina DeCuirCatarina DeCuirCatarina DeCuir

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NO 11 - 2007/1 23

Taiane Linhares

Lá vai Gustavo manifestar o seuódio à sociedade de consumo. O lugarescolhido? Uma famosa livraria em umshopping carioca. Apesar dos 36°C,Gustavo veste um casaco de bolsos gran-des, já cheios de balas, canetas e incensos.Chegando à livraria dirige-se aos lança-mentos. E lá está o livro “Jaulas Abertas”de Tom Regan, filósofo que prega a li-bertação animal. Gustavo não achouuma versão para download na internet,por isso descolou umas dicas de furtocom seus amigos do Yomango.net. Nãoqueria fazer feio na nova empreitada.Pega dois exemplares do livro, pergun-ta o preço ao balconista, esconde um nobolso interno do casaco, o outro voltapara a prateleira. Foi seu primeiro gran-de furto, motivo para se orgulhar. Agora,cheio de moral, discute, em um fórumda internet, táticas para subtrair MP3players de lojas de varejo.

A Internet tornou a vida de todosmais fácil. Que outro meio proporciona-ria o contato direto com guerrilheiros nafrente de combate e “terroristas” presospor libertar chimpanzés de laboratório?Sites de forte conteúdo ideológico, nãoraramente, incitam seus usuários a pra-ticar atividades ilegais. Para fugir àvigilância, alguns administradores hos-pedam seus sites em domínios noexterior. Porém, pelo enorme conteúdodisponível na web, o policiamento setorna ineficaz, passando à mão de cadausuário:

– O controle na Internet é feito deforma descentralizada. Se alguém sesente ofendido por um dado conteúdo,pode recorrer a vias administrativas oujudiciais para apagá-lo. O MinistérioPúblico também pode ser avisado atra-vés de denúncias, e iniciar um processode retirada do site do ar – esclareceCarlos Eduardo Mendes de Azevedo, doNúcleo de Computação Eletrônica(NCE) da UFRJ.

Entre os usuários de tais páginasainda se conserva uma opinião bastan-te realista sobre o assunto, pois a internetainda não é vista como principal meiode ação revolucionária:

– O ativismo tradicional, por exem-plo, pode ser sim feito pela Internet, sóque tende a capengar se não tomar lu-gar fora do “Cybermundo”. Entendo quea Internet pode servir para complemen-tar um ativismo no mundo real – adverteAlex Silva, ecoativista e professor deHistória.

Na Europa, um movimento que pre-ga o roubo como forma de resistência aoestilo de vida consumista se dissipa e já

consegue adeptos no Brasil, o Yomango.Surgido na Espanha, no ano de 2002, etendo a Internet como meio de discus-são de táticas de furto, o Yomango é ummovimento irreverente que, em uma gí-ria espanhola, significa “eu roubo”. Osite esclarece aos leitores qual seria oprincipal objetivo do Yomango, que nãoé uma apologia ao roubo, mas sim umatentativa de enten-der por que aspessoas roubam. Apágina aponta duashipóteses para essefato “a pobreza emque muitos vivem ea política abusivadas multinacionaisque governam omercado e o mun-do”. Segundo osidealizadores dom o v i m e n t o ,“Yomango não éroubo, a proprieda-de é o roubo”.

Há orientaçõesno site (www.yomango.net) para os que não queremconsumar um ato ilícito, os chamados“Yomango passivos”. Para praticar essamodalidade deve-se ir a um grande su-permercado, encher o carrinho comprodutos perecíveis (carnes e congela-dos) e depois abandoná-lo numa áreaescondida da loja, de forma que seja en-contrado apenas quando os produtosjá estiverem estragados.

O potencial subversivo da Internettambém é posto à prova por grupos dedefesa à vida animal, que segundo ogoverno norte-americano, são “a ameaçanúmero 1 em termos de terrorismo nopaís”. Através de sites como o daAnimal Liberation Front (ALF), ummovimento descentralizado que ageatravés de células anônimas, tornam-sepúblicas ações a favor da chamadalibertação animal. Acreditando queanimais não nasceram para serexplorados pelo homem, grupos dejovens vegetarianos resgatam animaisde laboratórios, granjas e outros lugaresonde sofram risco de morte. A ALFtambém defende a destruição dopatrimônio de empresas que sobrevivemda exploração de animais (laboratóriosque fazem testes em animais,corporações do ramo alimentício, lojasque vendam pele, circos e rodeios). Paraque um ativista seja reconhecido comomembro da ALF basta pichar o localinvadido com o nome do movimento, oque garante a ele apoio jurídico dainstituição caso algo dê errado. O site

da ALF (www.animalliberationfront.com) disponibiliza guias de ação diretapara aqueles que pretendem sair dateoria e correr os riscos da vida nailegalidade.

Na madrugada do dia 05 de julhode 2007 ativistas libertaram 121 cães queseriam usados como cobaias no cursoImersão em Treinamento de Cirurgia

Videolaparoscópica, em Anápolis (GO).O grupo, que através de inscrições emum muro se intitulou pertencente à ALF,utilizou uma bomba para desviar aatenção de policiais que estavam nasimediações. Após o disparo da bomba,os ativistas cortaram a cerca e entraramno recinto. Após a ação 88 cães foramrecapturados, mas uma liminar garantiuque os animais, que seriameutanasiados após a cirurgia, nãoseriam utilizados no curso. Os únicosrelatos existentes sobre o caso deAnápolis foram apurados pelonutricionista e ativista GeorgeGuimarães e estão no site da ongVegetarianismo Ético, Defesa dosDireitos Animais e Sociedade (Veddas),www.veddas.org.br.

Os ativistas da ALF têm como ca-racterística o rosto encapuzado, comisso suas identidades somente são reve-ladas quando são presos. No site sãodivulgados seus nomes, fotos e endere-ços das penitenciárias onde eles seencontram, para que simpatizantes dacausa enviem cartas aos prisioneiros. Osite da North American Earth LiberationPrisoners Support Network (www.ecoprisoners.org) apóia ativistas norte-americanos presos por se engajarem emcausas ambientais. Nele, assim como nosite da ALF, pede-se que enviem livros aosinternos e doações às suas famílias. Ou-tros sites também divulgam ações diretasem defesa dos animais, como o Bite Back(www.directaction.info), o No

Compromise (www.nocompromise.org) eo brasileiro Ativismo.com (www.ativismo.com).

Os administradores do siteAtivismo.com reconhecem a importân-cia da ALF em contexto mundial eressaltam o crescimento de ações inspi-radas no site em nosso país:

– A ALF é sem dúvida um ator im-portante no movimento da libertaçãoanimal. Apesar de termos ações com es-ses objetivos desde a década de 70, a“onda” começa a se formar aqui apenasnos últimos anos, justamente quando ainternet passa a fazer parte da vida dobrasileiro - diz F.S., responsável pelapágina do Ativismo.com, que preferenão se identificar.

O medo de represálias de donos decircos, promotores de rodeios epecuaristas é uma constante ao grupo.Para evitar o envolvimento do site com oconteúdo divulgado, o Ativismo.comesclarece em sua página inicial que écontrário a “qualquer tipo de ação quedesrespeite as normas jurídicas dopaís”, atuando apenas como órgão decomunicação do meio.

Embora a divulgação de informa-ções sobre lutas armadas não sejaproibida, sites como o das Forças Arma-das Revolucionárias da Colômbia –Exército do Povo (FARC-EP) têm o níti-do objetivo de cooptar um efetivo militar.Com um conteúdo bem estruturado,apágina (www.farcep.org) tem a colabo-ração de universitários, além de umagrande massa de artigos, entrevistas,matérias, vídeos e áudios de discursos.Através de fotografias disponibilizadasno site a guerrilha é mostrada como umagrande colônia de férias, tendo até mes-mo uma área dedicada apenas às fotosdas mulheres das FARC, levando ao péda letra a instrução de que se deve “se-duzir” jovens para a causa. Os álbunsde música, disponíveis para download,foram gravados pelos próprios guerri-lheiros. Figuram entre eles cançõescomo: No hay patria sin libertad, Salsade la unidad, Charanga de lainsurrección e Guerrillera.

Conhecida por recrutar adolescentes,as FARC, em 2003, envolveu-se em um in-cidente com o Brasil. Em agosto daqueleano, Alexandre de Donato, 14 anos, fugiude sua casa na Ilha do Governador para sejuntar às FARC. Todo contato foi feito ape-nas pelo site. O adolescente, antes de partir,deixou um bilhete ao pai dizendo que “es-tava abrindo fogo ao inimigo”, mas, apósuma conversa com os policiais que o res-gataram em Manaus, mostrou-sedecepcionado ao “descobrir que os revo-lucionários eram de direita”.

Ativistas da ALF com os animais libertados em suas ações

EEEEEspaço aberto parspaço aberto parspaço aberto parspaço aberto parspaço aberto para os clandestinosa os clandestinosa os clandestinosa os clandestinosa os clandestinosSites com forte conteúdo ideológico incentivam atividades ilegais

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24 NO 11 - 2007/1

O filme livre conquista a webO filme livre conquista a webO filme livre conquista a webO filme livre conquista a webO filme livre conquista a webA cultura do vídeo na Net mudou o modo de fazer, consumir e entender cinema. Se os blockbusters dominavam

o mercado de distribuição, a internet criou um espaço favorável de divulgação da produção independente

Flávia Castro

A distribuição au-diovisual sempre estevevinculada à necessidade dagrande indústria cinemato-gráfica, mas a cultura docompartilhamento da infor-mação na Internet mudou essecenário. Enquanto as grandescorporações a cada hora in-ventam uma nova estratégiapara combater a pirataria, im-pulsionada principalmentepela Web, o caminho se abriupara os produtores indepen-dentes.

O cineasta Bruno Vianna,por exemplo, foi o primeirobrasileiro a disponibilizar oseu longa-metragem,“Cafuné”, na web. O projetofoi premiado no concurso dedesenvolvimento de roteirosdo Governo do Estado do Rio,em 2002, e no concurso de lon-gas-metragens de baixoorçamento do Ministério daCultura em 2003, o queviabilizou a produção. Na horade distribuir, de acordo com odiretor, eles tinham “um filmecom linguagem diferenciada,nenhum elenco global epouquíssimo apelo comercial”.

Se por um lado, a pirata-ria gera um prejuízo anual deR$ 340 milhões no Brasil – se-gundo a Associação de Defesada Propriedade Intelectual(Adepi) – por outro ela é a so-

lução. Vianna, diretor eroteirista de “Cafuné”, pirateouo seu próprio longa-metragem,colocando-o, na íntegra, numdos mais populares programasde compartilhamento de dados(pirata) pela internet: o Emule.

Só um detalhe: isso foi fei-to “com a benção” dadistribuidora, ou seja, no mes-mo dia em que o filme estreounas salas de cinema, todo con-teúdo estava disponívelgratuitamente na rede. O usoda Internet, nesse caso, foialém da necessidade de espa-ço no mercado. “Eu quisexperimentar, provocar, talvezabrir caminhos para novasmaneiras de fazer cinema”,explicou o produtor.

Ainda segundo Vianna, ofilme “Cafuné”, que só entrouno circuito de exibição graçasa um prêmio concedido pelaDistribuidora Estação, saiu ga-nhando com a iniciativa. “Emtermos de visibilidade comcerteza foi excelente, já quehouve muita mídia que trata-vam quase que exclusivamentedesse aspecto”. A Internet fun-cionou, portanto, como meiode distribuição e divulgação deum filme não-comercial.

Mais um detalhe: além deabrir mão da possibilidade delucrar com o seu trabalho, eletambém abriu mão da propri-edade intelectual da obra, ouquase isso. Com o download,são adquiridas cenas extrasque podem ser editadas em umprograma caseiro. Dessa for-ma, pode-se atuar comoco-autor, criando uma novaversão para a história.

Obviamente existem al-gumas regras nesse jogo,especificadas pelo Creative

Commons, uma licença, a qualprotege o direito autoral do ar-tista ao mesmo tempo em quepossibilita a livre circulação deconteúdo na rede. O contratodiz: 1) que podem ser feitas có-pias do filme para distribuiçãonão comercial; 2) que o filmepode ser manipulado. Mas exi-ge-se, por exemplo, que o autorganhe crédito a cada modifica-ção. O que ele pensa sobreisso? “Se alguém alterar a nar-rativa e mandar pra um festival,citando o autor original, vouachar bem bacana”.

Entretanto, um filmecomo o “Cafuné”, com poucomais de 800 Mb, leva, em mé-dia, cinco dias para carregarem Internet Banda Larga comvelocidade de 100 Mbps, e nãopossui alta qualidade de some imagem. Apesar de atecnologia Streaming ter con-tribuído para a distribuiçãovirtual, já que dispensa odownload de arquivos, aindafalta muito para esse formatode transmissão alcançar a efi-cácia de um DVD, além de estasuportar apenas filmes de cur-ta duração.

A conseqüência disso foia criação de uma cultura dadistribuição dos curtas-metragens. De qualquer tipo.Do informativo ao grotesco.Do amador ao profissional. Aoportunidade de compartilhar,de experimentar, de tornar pú-blica uma produção autoralpassa a ser mais forte que a ne-cessidade de qualidade ouintimidade com a câmera.

Não é difícil entender,portanto, a popularização desites de compartilhamento devídeos como o You Tube, queem pouco tempo conquistou

mais de cem milhões de visi-tas e 56 mil novos arquivospostados diariamente. Não sepode ignorar o alcance dessetipo de mídia. Tanto que a Re-vista “Time” concedeu ao siteo título de “Melhor invençãodo ano”, de 2006.

De acordo com a publica-ção, a página participou de trêsrevoluções na Internet. Apopularização da produçãocaseira de vídeos, facilitadapor câmeras digitais, telefonescelulares e softwares de fácilmanuseio. A consolidação daweb 2.0, que implica nainteratividade entre produto-res e consumidores deconhecimento. E a revoluçãocultural que permite a qual-quer pessoa divulgar na rede,sem censura, aquilo que pro-duziu.

Mas o espaço é bastanteatrativo também para a difu-são da produção profissional.O “Curta o Curta”, o mais re-conhecido site de carátercomercial de exibição de cur-tas-metragens, tem um acervode cem filmes on-line e é visi-tado por 20 mil pessoasmensalmente. O realizador dovídeo paga cerca de R$ 100 porano para ter acesso ao serviço.

Um dos coordenadoresdo projeto, GuilhermeWithaker, diz que “o empreen-dimento é pura filantropia”.Ele continua explicando que “oobjetivo é oferecer uma alter-nativa ao grave problema dedistribuição cinematográfica,principalmente no Brasil”.

Esse grave problema so-bre o qual Withaker fala é oseguinte: entre os 143 títulosque estão atualmente inéditosou nas fases de produção e

finalização no país, apenas 43têm contrato de distribuição e,dessa forma, estréia assegura-da, segundo dados da AgênciaNacional do Cinema(Ancine).Em conseqüência, amaioria das produções tem aopção de serem vistas apenasnos festivais de cinema.

O que também se perce-beu não ser uma má idéia. Apartir daí foram criados festi-vais de vídeo exclusivamentepara a Internet. A idéia coloue hoje são milhares de mostrasde todos os tipos e com umaabrangência infinitamentemaior, já que pessoas de todoo mundo podem assistir a umdos vídeos competidores.

É também por isso queGuilerme Withaker vê aInternet “como o espaço maisdemocrático de troca de co-nhecimento”. Para ele, aexclusão digital não interferena expansão do conteúdo li-vre. “A inclusão digital noBrasil e na maioria dos paísesem desenvolvimento vai acon-tecer através das redes detelefonia celular e da televisãodigital”.

Whitaker olha para o fu-turo da distribuição e vê a Webcomo o inevitável caminho àfrente. “A Internet funcionacomo uma vitrine para o cine-ma: é universal, permite que ointernauta decida o que querver, e diminui as barreiras en-tre o público e o criador”. Elenão sabe afirmar, contudo, seessa interatividade, e a ausên-cia de mediadores, seráintensificada ou combatidapelos grandes conglomeradose como isso afetará a produ-ção independente. Vamos terque esperar o final do filme.

Cena do filme “Cafuné”, de BrunoVianna (2006)

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