Música, dança, grafite, teatro, esportes, livros: arte ... · gistrado é vivo; é uma grande...

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Ano XVIII - nº 73 Maio de 2011 Filiado à CUT/FENAJUFE Sindicato dos Trabalhadores do Poder Judiciário e do Ministério Público da União no DF Música, dança, grafite, teatro, esportes, livros: arte, solidariedade e respeito à vida são o foco dos projetos que ajudam a criar a cultura da paz Música, dança, grafite, teatro, esportes, livros: arte, solidariedade e respeito à vida são o foco dos projetos que ajudam a criar a cultura da paz

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Ano XVIII - nº 73Maio de 2011

Filiado à CUT/FENAJUFE

Sindicato dos Trabalhadores do Poder Judiciárioe do Ministério Público da União no DF

Música, dança, grafite, teatro, esportes, livros:arte, solidariedade e respeito à vida são o foco dos

projetos que ajudam a criar a cultura da paz

Música, dança, grafite, teatro, esportes, livros:arte, solidariedade e respeito à vida são o foco dos

projetos que ajudam a criar a cultura da paz

Page 2: Música, dança, grafite, teatro, esportes, livros: arte ... · gistrado é vivo; é uma grande vantagem que leva so-bre ela. Infelizmente não faz uso disso com frequên-cia. Via

maio“Revolução” virou palavra banalizada (vazia de conceito)pelo uso desgastante. Purpurina de peças publicitárias. Nadaa ver com uma convulsão profunda das relações econômi-cas, culturais, sociais e políticas. No máximo um levante ali,uma queda autoritária adiante, um exagero caricato de re-beldia lá ou uma fantasia de mídia em busca do espetáculoda notícia. O achatamento global da vida empastela o “real”.Fragmenta. Só é “verdadeiro” se passar na TV ou sair emjornal. Revolução profunda, estrutural, radical, fica para en-saios com graus maiores ou menores de saudosismo piegas.

O maio polarizado na França em 68 ainda guarda uma agen-da provocativa de transformação, exatamente por não divi-dir a mudança interior (pessoa comprometida) da exterior(coletiva, institucional). Não é nem chamado de “revolução”,apenas de “os acontecimentos de maio”. Procede. Não ocor-reu nenhuma virada no sistema. Mexeram foi nas atitudes

frente aos sistemas. Ali ficou deflagrado o pon-to de ebulição para expor o indivíduo fren-te às máquinas. Maio muito mais libertárioem espírito que eficaz em mudanças insti-tucionais. Alguma coisa no Estado ficou di-

ferente. Mas nenhuma revolução.

O Maio-68 francês deu o tom da virada culturalque o mundo ensaiava desde o final da Segunda Guerra,com a euforia de viver “tudo ao mesmo tempo agora” (de-pois de se perceber a vida por um triz, capaz de evaporarpelo extermínio em massa). Um maio com a marca muitomais no comportamento. A cultura foi assumida no centrodas grandes transformações: arte, sexualidade, diversida-de, mestiçagens, entretenimento, alimentação, natureza, ex-pressões deslocadas de grandes estruturas, reações aos nar-cóticos enquadramentos do ensino formal etc. Exigir o im-possível. Crer no estado de graça dentro do cotidiano cadavez mais bruto e insensível. Também em um maio mais re-moto (1933, dia 10) a insanidade nazista de Hitler quei-mou livros em frente à Universidade de Berlim. Foram inci-nerados não só autores judeus, mas também comunistas,pacifistas e tudo que fosse contra a “ordem vigente”. Aintolerância em contraponto.

Neste maio de 2011 perguntamos onde está o impulso dasviradas românticas; como se apresentam novas “fogueiras”,menos explícitas e, no entanto, hábeis para nos isolar sobcabrestos que impeçam um fluxo maior de invenção. O pul-so de maio ainda pulsa. Hoje, menos espetacular, mas ativona construção coletiva de todas as utopias. Basta cada umdecidir que novos maios renascerão.

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ARTE EM BRASÍLIA

Coordenação editorial:Cynthia Borges

Edição:Usha Velasco

Reportagem:Deniza GurgelFabíola GóisThais AssunçãoValéria de Velasco

Colaboradores:TT CatalãoJosé Geraldo de Sousa JuniorYuri Matsumoto MacedoAndré Luis Macedo

Revisão: Ana Paula Barbosa Cusinato

Projeto gráfico e arte: Usha Velasco

Tiragem: 15.000 exemplares

Coordenadores-GeraisAna Paula Barbosa CusinatoBerilo José Leão NetoCledo de Oliveira Vieira

Coordenadores deAdministração e FinançasJailton Mangueira AssisJosé Oliveira SilvaRaimundo Nonato da Silva

Coordenadores de AssuntosJurídicos e TrabalhistasAntônio José Oliveira Silva

Marília Guedes de AlbuquerqueNewton José Cunha Brum

Coordenadores de Formaçãoe Relações SindicaisEliane do Socorro Alves da SilvaJosé Joventino Pereira de SousaSheila Tinoco Oliveira Fonseca

Coordenadores deComunicação, Cultura e LazerMaria Angélica PortelaOrlando NoletoValdir Nunes Ferreira

Sindicato dos Trabalhadores do Poder Judiciário e do MPU no DFSDS, Ed. Venâncio V, s. 108 a 114, Brasília-DF, 70393-900 • (61) 3212-2613

www.sindjusdf.org.br

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BETE COUTINHO

Mineira de Belo Horizonte e servidora pública em Brasília, Bete encontrou na fotografia um meio de concretizar seuuniverso imaginário. Dedicada a ensaios autorais onde dialoga com as artes plásticas, ela começou a estudar fotografiaem 2008 e já tem no currículo três exposições coletivas e uma individual – Brasília Pequena, realizada no Espaço f/508.

Sobre este trabalho, formado por doze imagens digitais que compõem fotografia e desenho, ela conta: “Do registrofotográfico de pequenos detalhes garimpados em restos de edificações demolidas, Brasília é recriada. Da emoção provo-cada por um fato real surge o pequeno personagem, que volta do mundo onírico e percorre a noite escura e solitária do

Planalto. Antes do amanhecer, torna-se autor da sua própria história e só então retorna para o lugar de onde veio.”

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4 Revista do Sindjus • Maio/2011

José Geraldode Sousa Junior

Reitor da Universidade deBrasília, professor da Faculdade

de Direito e coordenador doprojeto O Direito Achado na Rua

“Seu ponto departida é trazer a

Justiça para o social,de modo a permitir

um processo de apli-cação que leve a ul-trapassar as condi-ções limitadoras de

seu momento deprodução: ‘Enquantoa sociedade for fun-dada na injustiça, asleis terão por funçãodefender e sustentar

a injustiça.’”

O pró-labore de José Geraldopara este artigo é doado

mensalmente à campanha devoluntariado Eu Doo Talento

(veja em www.sindjusdf.org.br)

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título acima devo-o a Anatole France, prêmioNobel de literatura de 1921, um dos fundado-

res da Liga dos Direitos do Homem, notável escri-tor que tratou frequentemente o tema da Justiça eda condição do jurista.

Num texto com o mesmo título ele traduz aimpressão retida da observação de um quadro deMabuse (Jan Gossaert), talvez a mesma que se possaperceber na pintura de van Eyck (o Políptico deGantes), em que são figurados também os juízesíntegros, tal como são conhecidos.

De sua observação, diz Anatole, pode-seconcluir ter o mestre dado aos dois juízes o mesmoar grave de doçura e de serenidade. Mas, vistos osdetalhes que caracterizam um e outro, pode-se verque eles, no entanto, são diferentes, na índole e nadoutrina. Um traz na mão um papel e aponta o textocom o dedo; o outro ergue a mão com mais benevo-lência do que autoridade, como que a liberar umpensamento prudente e sutil. São íntegros os dois,conclui o escritor, mas é visível que o primeiro seapega à letra, o segundo ao espírito.

Essa tensão entre letra e espírito já havia apareci-do em outro texto de Anatole France (Crainquebille),buscando encontrar um equilíbrio possível entre aordem e a regularidade e uma expectativa humanae sensível para representar uma Justiça justa.

Em outro texto sobre esse tema (A Lei éMorta, o Juiz é Vivo), alinha parêmias do célebremagistrado Magnaud, erigido, na doutrina e na li-teratura (Victor Hugo, em Os Miseráveis), em ex-pressão de aplicação equitativa do Direito, com afórmula “decidir como o bom juiz Magnaud”, con-forme ensina Carlos Maximiliano.

Seu ponto de partida é trazer a Justiça para osocial, de modo a permitir um processo de aplica-ção que leve a ultrapassar as condições limitadorasde seu momento de produção: “Enquanto a socie-dade for fundada na injustiça, as leis terão por fun-ção defender e sustentar a injustiça.”

No texto mencionado, o sentido de suacrítica é, pois, convocar a integridade do juiz para anecessidade de vencer e de ultrapassar, pelo incon-formismo transformador, a reprodução, nas leis, da

iniquidade social, hierarquizante e excludente. Docontrário, nessas condições, diz ele, num texto quedepois seria recuperado por João Mangabeira (A ora-ção do paraninfo) em mensagem a estudantes deDireito, só restará ao magistrado “a missão augustade assegurar a cada um o que lhe toca: ao rico a suariqueza e ao pobre a sua pobreza”.

Por isso o chamamento que faz Anatole Franceao juiz vivo, para se posicionar ativamente em faceda lei morta: “A bem dizer, eu não teria muito re-ceio das más leis, se elas fossem aplicadas por bonsjuízes. Dizem que a lei é inflexível. Não creio. Não hátexto que não se deixe solicitar. A lei é morta. O ma-gistrado é vivo; é uma grande vantagem que leva so-bre ela. Infelizmente não faz uso disso com frequên-cia. Via de regra, faz-se mais morto, mais frio, maisinsensível do que o próprio texto que aplica. Não éhumano: é implacável. O espírito de casta sufoca neletoda simpatia humana. E vejam que só estou falan-do dos magistrados honestos.”

Para esse chamamento, no entanto, ad-verte Jean Cruet, no livrinho paradigmático publi-cado em 1908 (A Vida do Direito e a Inutilidade daLei), é preciso que os magistrados ousem “sair forados textos, para compreender o mundo social emtoda a sua extensão, em toda a sua complexidade eem todo o seu movimento”.

Não se trata de desconsiderar os textos legisla-tivos, mas de compreender que a rigidez das fórmu-las em que se expressam não dispensa uma media-ção que recupere “o aspecto verdadeiro das coi-sas”, de modo a desvendar o direito que se revela“na sociedade organizando-se por si própria”.

Daí a necessidade de os juízes se daremconta, como mostra Bistra Apostolova (Perfil e ha-bilidades do jurista: razão e sensibilidade), de queprefigurar o sentido dos conflitos é a tarefa que lhescabe e que mediá-los requer compreender o signifi-cado que eles alcançam em seu próprio tempo.Como disposição e como atitude, sem o desesperoaniquilador que Tolstoi impõe ao juiz de sua narra-tiva (A morte de Ivan Ilich), para abrir-lhe a consci-ência que desnuda a sua trajetória profissional, so-cial e familiar como “monstruosa mentira camuflan-do vida e morte”.

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Os íntegros juízes

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5Revista do Sindjus • Maio/2011

Sheila TinocoCoordenadora deFormação do Sindjus emembro da Comissãode Organização do6º Congresso

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“Sim, nós servido-res podemos fazermais pela Justiça!Basta que nosdeem as devidascondições. O Judi-ciário e o MPUtambém podemfazer mais pelosservidores. Esse éo cerne da discus-são que vamostravar nos dias 27e 28 de maio”

Maio, o mês dos trabalhadores,de lutas e movimentos históri-cos, será um mês bastante es-pecial em nossa jornada. Alémdas mobilizações pela aprova-ção do nosso Plano de Cargos,Carreira e Remuneração, maioserá também o mês do 6º Con-gresso do Sindjus. Por isso, pre-cisamos nos envolver por com-pleto com as atividades do sin-dicato, mostrando a nossa for-ça, a nossa garra, a nossa união.

Os nossos congressos sem-pre nos impulsionaram rumo aoaperfeiçoamento das nossas lu-tas e da nossa carreira. E estenão será diferente. As palestras,as discussões, as oficinas pro-

movidas serão fundamentais para a consolidação dademocracia sindical e de uma carreira mais sólida e pró-xima dos nossos ideais e aspirações.

Os encaminhamentos deste congresso, assim comonas edições passadas, vão nos guiar, auxiliando as nos-sas lutas diárias, das mais específicas às mais gerais, eorientando nossos passos a curto, médio e longo pra-zo. O 6º Congresso tem tudo para ser um marco notocante à construção dessa obra permanente que é anossa carreira.

E, não por acaso, ele tem a nossa carreira como tema:“O que essa categoria faz; o que essa categoria podefazer. Missão, ampliação de papéis e valorização.” Não

tenho dúvidas de que será uma grande oportunidade deforjarmos as diretrizes do plano de carreira que, numfuturo próximo, levaremos ao Congresso Nacional.

Em meados de 2009, em uma reunião com o colé-gio de presidentes dos tribunais superiores, o Sindjusdeixou claro que após a aprovação da nossa tabelasalarial, discutiríamos um plano de carreira capaz deatualizar nossas atribuições, adequar nossas funçõesà realidade institucional e modernizar nossa atuação.Vamos cobrar isso.

Nós, servidores, desempenhamos um papel estraté-gico no Poder Judiciário e no MPU; um papel que permi-te o funcionamento da Justiça brasileira. Ainda não te-mos o reconhecimento devido, mas vamos buscá-lo apartir de um trabalho de excelência e de uma carreiraque nos valorize.

Vamos trazer à pauta pontos específicos da nossacarreira, como a melhor forma de remuneração, e ban-deiras históricas, como o combate à terceirização noserviço público. Precisamos participar ativamente desseCongresso e reafirmar nossas lutas por isonomia de tra-tamento, salário justo, melhores condições de trabalhoe maior qualidade de vida.

Sim, nós servidores podemos fazer mais pela Justi-ça! Basta que nos deem as devidas condições. E, poroutro lado, o Judiciário e o MPU também podem fazermais pelos servidores. Esse é o cerne da discussão quevamos travar nos dias 27 e 28 de maio, no palco doParlamundi, durante o nosso 6º Congresso.

Contamos com a sua presença e com a sua contribui-ção para esse evento que é a nossa oportunidade de cons-truir a muitas mãos uma carreira que nos contemple.

AO LEITOR

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Justiça: “O queessa categoria faz;o que essa catego-ria pode fazer.Missão, ampliaçãode papéis e valori-zação” serão ostemas em debate

Rumo ao 6º Congresso

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Deniza Gurgel

ansados de esperar pelo interminá-vel prazo que o ministro Peluso tem

dado ao governo para cumprir a promes-sa de aprovar o reajuste da categoria,os servidores decidiram sair às ruas. “Fi-camos decepcionados com o governo noano passado e nos desgastamos muito.

Acho que agora é o momento de mos-trar nossa força”, afirmou a servidora doTSE Helena Koshiro, na paralisação emseu tribunal, no dia 11.

A frase de Helena resume o estadode espírito da categoria e sintetiza o ob-jetivo das mobilizações e protestos queaconteceram em maio. Os servidores doJudiciário e MPU realizaram paralisações

Tempoesgotado

de 24 horas e atos de protesto em cadaórgão, para alertar os presidentes dostribunais e administradores do Ministé-rio Público sobre a premente necessida-de de assumir seu papel na negociaçãodos PLs 6613 e 6697.

“O que estamos fazendo aqui hojeé mostrar que chegamos ao limite danossa insatisfação”, afimou o coorde-

Paralisações eprotestos de maiomostram que apaciência dosservidores já acaboue que não dá maispara esperar peloreajuste salarial

JUSTIÇA

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Mais de 500 servidoresse manifestam naPGR: procurador nãodemonstra iniciativa

FOTOS: CARLOS ALVES

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nador do Sindjus Berilo Leão, duranteo ato realizado no dia 10, no TRT. “Es-tamos nos preparando para o grandeato do dia 18 e a participação dos ser-vidores é que vai fazer nossa luta cres-cer”, completou o coordenador CledoOliveira, ao afirmar que que as parali-sações de 24 horas são uma prévia doque vem pela frente.

No dia 18 de maio todos os órgãosda Justiça vão parar. Um grande ato uni-ficado dará o último recado aos chefesdo Judiciário e do MPU: a categoria jáestá mais que cansada de esperar poruma atitude das autoridades.

“Todos os servidores têm que apoi-ar o sindicato se quiserem o plano apro-vado. Se for necessária a greve geral,vamos a ela juntos. Sindicato sozinhonão faz nada”, destacou Ercilia Guima-rães, do TRT. O colega Eduardo Meloconcorda: “Infelizmente, se não fizer-mos aquela greve que causa transtor-no, não vamos conseguir o reajuste. Te-

competente que lute realmente pela gen-te, então o servidor tem mais é que parar.Aqueles que criticam nossa luta é porquenão sabem da nossa realidade. O que rei-vindicamos é um salário justo para aca-bar com a defasagem”, concordou a ser-vidora do MPDFT Tânia Barbosa.

No dia 12 de maio foi a vez do TJDFTse manifestar, com mais de 300 servido-res na rua. E, no dia 13, o STJ e o TSTparalisaram as atividades. Winston Luizde Oliveira Rodrigues, servidor do STJ,lembrou que as razões para a revoltaestão mais que claras: “Nossa categorianão recebe reajuste desde o pagamen-to da última parcela do plano anterior, eesse plano é de 2006”, explicou. “Nãotemos reajuste anual, como acontececom o salário mínimo ou com outras ca-tegorias que têm reposição todo ano. Osnossos planos servem apenas para re-por as perdas, já que entre um plano eoutro nós ficamos sem aumento ne-nhum”, completou ele.

mos que parar mesmo e para valer.”Flávio Vieira, servidor do MPDFT, con-

corda: “Pelo visto a greve é o único ca-minho para conseguirmos a valorizaçãoque merecemos”, afirmou. No dia 11,cerca de 500 servidores do MinistérioPúblico subiram a rampa da Procurado-ria Geral da República e deram um gran-de abraço no prédio. Munidos de apitos,buzinas, camisetas, faixas e bandeiras,eles mostraram que a categoria está uni-da na batalha pelo reajuste.

O maior descontentamento dos ser-vidores do MPU é com a falta de inici-ativa do procurador-geral Roberto Gur-gel. “Ele tem autonomia para negociaro reajuste. Quando cruza os braços edeixa a responsabilidade para o minis-tro Peluso, deixa de honrar a cadeiraem que está sentado. É o procuradorquem tem que cuidar dos seus servido-res”, afirmou a coordenadora-geral doSindjus, Ana Paula Cusinato.

“Não existe nenhuma autoridade

Ato no TJDFT:servidoresforam às ruasem protesto

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Rômulo estuda trombone e querser profissional: “As aulas de

música me ajudaram muito.Aprendi a me concentrar, a pensar

naquilo que posso conseguir”

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ESPECIAL

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as de Bach e Beethoven que ocupam o seudia a dia quando não está na escola. “Asaulas de música me ajudaram muito.Aprendi a me concentrar, a pensar naquiloque posso conseguir”, reconhece o garo-to, que chegou aos sons que mudaram oseu caminho por meio do Balaio Mambem-be, um dos projetos da Associação Cultu-ral Meninos de Ceilândia, que oferece ofi-cinas de música, dança e serigrafia a cercade 110 crianças e adolescentes da região.

Tudo começou com um bloco de car-naval que ganhou as quadras de Ceilân-dia, em 1995. O grupo chamava a aten-ção com os seus alegres bonecos gigantesagitando as vias da cidade como nas tra-dicionais folias de Pernambuco. Mas osorganizadores enxergaram muito além.“Começamos a perceber que só aquilo nãoseria suficiente para ajudar a comunidade,que sofre tanto com a violência, a mudaralguma coisa. Sentimos a necessidade deoferecer algo mais, que ajudasse os jovensa mudar o comportamento, a aprender afocar nos objetivos, a entender que, se nãose dedicar, se não estudar, não consegueresultado. E a teoria musical é ideal paraeles perceberem isso e mudarem o modode ser. Sem a concentração, eles até to-cam, mas não conseguem o resultado quequerem ouvir”, explica o administrador deempresas Ailton Velez da Silva, um dos fun-dadores e atual presidente da associação.

O trabalho de grupo feito durante ospreparativos para o carnaval evoluiu, noveanos depois, para as oficinas e os cursos decapacitação em música, dança, costura eserigrafia, estimulados por parcerias com es-colas públicas. “Procuramos, com os cursos,trabalhar a formação, a autoestima dosmeninos, a inclusão social. Esse é o tipo de

Reza a sabedoria indígena que umvelho índio descreveu, certo dia, comoeram os seus conflitos internos:“Dentro de mim existem dois cães.Um é mau e cruel, e o outro, muito bome dócil. Estão sempre brigando.“Então lhe perguntaram qual dosdois venceria. E ele respondeu:“Aquele que eu alimentar.”

Valéria de Velasco

uatro horas da tarde, num final deabril. Enquanto o repórter de uma

rádio FM relata que a polícia acabara deflagrar dois jovens de 19 anos e 16 anosarmados com um revólver calibre .38 e cin-co munições intactas, que seguiam demoto para eliminar um desafeto, em Cei-lândia Norte, um grupo de meninos e me-ninas da mesma cidade se debruça, pou-cas quadras adiante, sobre partituras declássicos da música brasileira. Estão come-çando as aulas de trompete, trombone evioloncelo num pequeno galpão da QNM3, e o adolescente Rômulo Novaes Ricar-do, de 17 anos, não tem tempo para pen-sar que lá fora, ao alcance de qualquergaroto cheio de energia como ele, outrostipos de instrumentos disparam o som damorte que liquida em poucos segundos osprojetos da juventude.

Desde 2007 envolvido com os misté-rios dos acordes que o trombone estendeàs casas da vizinhança, o estudante doensino médio, morador do P Sul, um bair-ro pobre de Ceilândia distante 35km deBrasília, quer se tornar músico profissio-nal. “É o meu sonho”, conta Rômulo, en-tre partituras de frevo, maracatu e sinfoni-

Ailton: “Esse é o tipo de ocupaçãoque tira os jovens do foco da violência”

ocupação que tira os jovens do foco da vio-lência”, acredita Ailton. As ações, segundoele, são orientadas dentro da perspectivade geração de renda e da formação para asformas pacíficas de resolução de conflitos.“A proposta não é só abrir a chance de umaprofissão, de um emprego, mas ensinar queisso tem de vir junto com as práticas de res-peito, de convivência pacífica dentro da co-munidade”, defende.

Há cinco anos professor de trompete etrompa de harmonia da associação, o poli-cial militar Marcos Nunes vê nos projetos

Projetos focados na cultura dasolidariedade e respeito à vidamostram que há caminhos paratirar o país do vergonhoso 6º lugarno ranking da violênciapaz

A construção da

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ESPECIAL

Maria deFátima:“Isso aquié umasegundaescola”

dosMeninos de Ceilândia a chance de apro-ximar os dois objetivos. “Os garotos costu-mam ser um pouco rebeldes, e a músicamuda o jeito de ser, o comportamento de-les. Depois que entram no curso eles ficammais atenciosos, mais respeitosos, começama evitar a rua e a estudar mais na escola”,diz Marcos. Músico da Banda da PolíciaMilitar de Brasília, o sargento aponta outroponto positivo nas atividades da associa-ção. “Eles começam como hobby, mas logopassam a ver a música como uma possibili-dade de profissão, a enxergar um leque deoportunidades”, afirma.

Os resultados mostram que o sonho do

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Revolução àmoda francesa

Os mesmos princípios que ins-piraram, em 1789, a RevoluçãoFrancesa – Liberté, Egalité, Fraterni-té –, e provocaram profundastransformações sociais a partir daabolição da servidão, estão nabase, 210 anos depois, do Progra-ma de Ação sobre uma Cultura dePaz da Organização das NaçõesUnidas. Dessa vez, sem derrama-mento de sangue.

Numa tentativa de derrubar, nonovo milênio, a escravidão à culturade violência que atormenta paísescomo o Brasil, a ONU propõe, naDeclaração de 1999 que divulgou oprograma, mudanças de valores eatitudes em todos os níveis dasociedade e entre as nações. Tudopara que se exercitem, como sedeve, os princípios da liberdade,igualdade e solidariedade.

O documento reconhece que apaz não se resume apenas à ausên-cia de conflitos e define a culturade paz como um conjunto de valo-res que observem princípios como:

Respeito à vida e promoçãoda prática da não-violência pormeio da educação, do diálogoe da cooperação.Respeito e promoção de todosos direitos humanos eliberdades fundamentais.Compromisso com a soluçãopacífica dos conflitos.Compromisso em satisfazer asnecessidades de desenvolvimentoe de proteção do meio ambiente.Respeito e fomento à igualdadede direitos e oportunidadesde mulheres e homens.Adesão aos princípios deliberdade, justiça, democracia,tolerância, solidariedade,cooperação, pluralismo,diversidade cultural, diálogo eentendimento em todos os níveisda sociedade e entre as nações.

Clarice Cabral(de frente) dáaulas de violon-celo aos Meninosda Ceilândia;Marcos Nunes(no canto) tocana banda da PMe também é pro-fessor do projeto:“A música mudao jeito de ser”

estudante de trombone Rômulo Ricardo temtudo para virar realidade. “Já temos três jo-vens que começaram com a gente e estãona Banda da Presidência da República”, co-memora Ailton Velez. Com apenas 16 anos,a aluna Jéssica Tavares segue o mesmo ca-minho. Há três anos ela frequenta as aulasde música e, com seu talento, já garanteuma pequena renda dando aulas de flautadoce, conta Ailton. O curso de costura abreo leque das chances de profissionalização,com a colocação, no mercado, das camise-tas, fantasias e peças de cama e mesa cria-das e produzidas pelos grupos que partici-pam da capacitação.

“Com os trabalhos que a gente faz demanhã e à tarde, todos os dias, nós conse-guimos tirar a meninada da rua e aindagarantir renda para muitas pessoas que pre-cisam”, orgulha-se a maranhense Maria deFátima Santos, coordenadora do grupo decorte e costura da associação. “E ainda ra-lamos todo sábado, com os ensaios da or-questra popular”, acrescenta. Às voltas comuma nova empreitada – colocar num siteas peças feitas pela equipe, para divulgaros produtos e aumentar as vendas – Mariade Fátima não para, mas se sente gratifica-da. “Isso aqui ajuda a gente financeiramentee mentalmente. É uma segunda escola.”

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A preocupação de tirar a garotada darua se respalda na criminalidade que tiraa paz de moradores como Maria de Fáti-ma e se oficializa nos índices que fizeramo Distrito Federal saltar do oitavo para osexto lugar no ranking de mortes violen-tas entre as unidades da Federação, nosdez anos compreendidos entre 1998 e2008, de acordo com o Mapa da Violênciadivulgado no final de fevereiro deste ano

pelo Ministério daJustiça e InstitutoSangari. O levan-tamento mostraque as maioresvítimas são jo-vens na faixa dos15 aos 24 anos econfirma a ten-dência apontadaem pesquisas an-teriores do Pro-grama Segurançacom Cidadaniada ONU no Brasil.

Quarto lugarnum ranking de

84 países, o Brasil registrava, em 2004,segundo os estudos, a taxa de 27 homicí-dios por 100 mil habitantes. Mas, quandoos dados se referiam à população jovem,a taxa subia para 57,1 mortes por 100 mil.O Mapa da Violência revela que, em 2008,ano em que Ceilândia figurava no topo doranking de ocorrências criminais no DF, amédia nacional se manteve no mesmo ní-vel – 26,4 homicídios por 100 mil habi-tantes, mais que o dobro do limite de 10por 100 mil fixado pela Organização Mun-

dial de Saúde quando estabeleceu os pa-râmetros para configurar uma situação de“epidemia da violência”. Com índice de34,1, quase oito pontos acima da médianacional, Brasília fica atrás apenas dosestados de Alagoas, Espírito Santo, Per-nambuco, Pará e Amapá.

A “epidemia” que assola a capital daRepública, no entanto, ganha sinais aindamais alarmantes quando os índices se con-centram nos homicídios entre a populaçãode 15 a 24 anos de idade: de 34,1 o nú-mero dispara para 77, 2 por 100 mil, jo-gando o DF para o quarto lugar no país noranking de mortes violentas entre jovens.“O grande causador da violência entre jo-vens é o conflito em função da busca deespaço”, reflete o diretor-presidente doGrupo Azulim, Iranildo Gonçalves, o Iran,enquanto contempla a fachada do recém-inaugurado Hip Hop Café, o mais novoempreendimento da organização cultural,na pequena Sobradinho II. A cidade fica a25 quilômetros do Palácio do Planalto, masa proximidade do poder é apenas geográ-fica. “Nossos jovens são ‘lançados aos le-ões’ pelo Estado, que não oferece condi-ções, não estabelece políticas públicas paraque eles possam conquistar seu espaço,ser reconhecidos”, critica Iran.

Escorado nos 17 anos de experiênciaem ações junto a adolescentes da comu-nidade, Iran avalia que muitos se envol-vem em violência para provar a si mesmosque são capazes de alguma coisa. “Quan-do o jovem se vê como alguém nesse es-paço e se sente valorizado, ele segue na-turalmente o caminho da não-violência.Não busca o crime”, assegura. A história

do grupo lhe dá razão. Cansados de sertachados de gangue, perseguidos pelapolícia e apontados como suspeitos detudo o que acontecia de ruim nas ruas dacidade, Iran e sua turma de amigos decidi-ram, em 1993, virar o jogo. A atitude ren-deu, no ano seguinte, a criação do GrupoCultural, batizado Azulim em homenagemà cor da maioria dos integrantes – um ne-gro quase azul, de tão forte.

“O Azulim foi concebido com a pro-posta de mostrar ao jovem que ele é umser atuante, que move a rua, a comunida-de com ações positivas. Porque assim elevai se ver como um cidadão produtivo, debem, vai entender que não é necessárioprejudicar para ser visto”, explica Iran.Logo o grupo percebeu que não bastava“ocupar a mente” e sair das ruas. A pala-vra de ordem, então, passou a ser criaroportunidades, trabalhar meios de gerarrenda, preparar para o mercado de traba-lho. “Colocamos uma pitada de capacita-ção dentro das oficinas culturais. Elas ga-nharam um formato empreendedor, paramostrar aos jovens que eles são capazesde ir além, podem criar de forma mais pro-fissional para entrar no mercado.”

Um dos resultados foi a criação da Ofi-cina de Personalização de Ambientes, aOPA, um desdobramento da Oficina deGrafite, que está dando chance aos garo-tos de ganhar dinheiro com a sua criativi-dade. Atraído pela linguagem das pinturasnos muros que consagrou artistas comoJean Michel Basquiat nos anos 70, emNova York, o estudante Paulo Sérgio San-tos Siqueira, de 17 anos, entrou para oAzulim, há quatro anos, e hoje garante uma

“Nosso jovens são lançados aos leões”

EPIDEMIA

mortes para cada 100 milpessoas. Um índice acima de

O DF é o 6º no ranking demortes violentas no Brasil e o 4ºna faixa de 15 a 24 anos, com

77,2

por 100 mil já caracterizauma epidemia de violência.

10

Iran e PauloHenrique,

do Azulim:busca de

espaço. PauloSérgio, 17

anos, ganhadinheiro com

sua arte empaineis e

camisetas

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13Revista do Sindjus • Maio/2011

renda na OPA, com a produção de painéiscomerciais e camisetas. “Nosso grupo estásó crescendo”, conta o garoto, animadocom o sucesso do Hip Hop Café e com aperspectiva de novas encomendas, que lheembalam o sonho de lutar por uma vagaem artes plásticas ou biologia na Univer-sidade de Brasília.

A clientela também só aumenta. “A per-sonalização de ambientes é um novo filão”,acredita o artista plástico Vinícius MartinsRodrigues, instrutor da OPA, que criou o vi-sual do Café a partir da história do movi-

mento hip hop. “Usamos o xadrez comopano de fundo e o grafite, ambientando oespaço desde a calçada, mas com poucoselementos de rua, para não fica poluído.Ficou tão agradável que atrai tanto jovenscomo famílias”, explica Vinícius. ”É um es-paço que não tinha na comunidade. Ofere-cemos atrações culturais e aqui todos sesentem em paz. Não trabalhamos com be-bidas alcoólicas, e então todos se sentemseguros”, conta Paulo Henrique de JesusCantilo, um dos fundadores do Azulim.

Gerente do novo espaço, Paulo Henri-

que diz que o Café está sempre lotado,“virou point”, e atribui o êxito do empre-endimento à preocupação do grupo em“acolher, ser agradável, oferecer o me-lhor”. Cuidado que também salta aosolhos do outro lado da rua, na simpáticasede do Azulim, onde a porta de entradapara crianças, adolescentes e visitantes éuma bem organizada biblioteca, aberta àpopulação. Todos os que chegam apreci-am a biblioteca antes mesmo de conheceras áreas destinadas às oficinas de dança,DJ, informática e grafite.

Sede dogrupo Azulim:a entrada éuma bibliotecaaberta àcomunidade

Vinícius noHip Hop Café:“Ficou tãoagradávelque atraitanto jovenscomo famílias”

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14 Revista do Sindjus • Maio/2011

Na prática, as estratégias do Azulime Meninos de Ceilândia em trabalhar aarte, o empreendedorismo e a multipli-cação de conhecimentos como instru-mentos de transformação social sãobem-sucedidos exemplos da pedagogiade cultura de paz proposta pela ONU noPrograma de Ação divulgado em 1999e adotado pela Unesco como meta parao milênio (p. 23). A teoria é a mesmaque inspirou a criação, doze anos antes,da Universidade da Paz, em Brasília, aprimeira das 18 unidades da Rede Uni-paz no Brasil. “A fundação surgiu comoarauto de uma nova forma de pensar,baseada em uma teoria de educaçãopara a paz que se apoia sobre as trêsecologias, a pessoal, a social e a ambi-ental planetária”, explica a arquiteta eurbanista Regina Fittipaldi, vice-presi-dente licenciada da Unipaz, onde é vo-luntária há 21 anos.

É um exercício holístico, segundo Re-gina, que envolve três momentos. O pri-meiro, que ela chama de “despertar”, équando a pessoa se abre para refletir so-bre novos paradigmas, sobre o que sig-nifica “estar no mundo”, como fizeramos jovens azulins em 1993. O segundoocorre quando ela questiona como in-tegrar na sua vida esses novos referen-ciais – quando o Azulim, por exemplo,optou pela dedicação ao grupo e lhe deuo formato de ONG. E o terceiro, signifi-cativamente batizado de “obra-prima”,quando trabalha de que forma vai seapropriar dos novos conhecimentos naprática. “Esse processo de transforma-ção pessoal deve transbordar para a so-ciedade. De nada adianta encher a pa-rede de diplomas se não há compromis-so social”, alerta a arquiteta.

Às voltas com as filas de meninos emeninas na faixa dos 15 anos à esperade uma vaga nas oficinas de basquete,dança, audiovisual e produção de even-tos do projeto Jovens de Expressão daCufa-DF, em Ceilândia, o instrutor JúlioCésar Simão sabe que esse compromissoé garantia de bons retornos. “É uma opor-tunidade para cuidar da saúde física emental e ao mesmo tempo sair das ruas,

dos riscos da violência”, alega, enquan-to observa o desempenho das meninasno treino de break. “Muitos saem daquicom trabalho garantido. Eles se destacam,viram instrutores. As oficinas estão fazen-do a diferença”, conta. A “diferença” aju-da a empoderar jovens como a estudan-te do ensino médio Ruth Iunis, de 17 anos(na capa desta revista), que toda terça equinta se dedica às aulas de dança, eNeiard Lima, o Nei, de 23 anos, que alémdo break se destaca nos treinos de bas-quete de rua do projeto.

Moradores de Ceilândia, Ruth e Neiparticipam, entre uma aula e outra, dasdiscussões dos grupos, na sede Ceilan-dense da Cufa-DF. Ali, temas como dro-gas, aborto, violência e oportunidade detrabalho dominam a pauta na realidadeda cidade e na preocupação dosjovens.“A dança e o esporte como ‘ban-deiras de paz’ são apenas meios de fa-zer com que os jovens tenham esse es-paço de empoderamento”, explica o pe-dagogo Max Maciel, coordenador daCufa-DF. Essas atividades, segundo ele,são “uma espécie de ponte”, uma pos-sibilidade de abrir espaço para mudan-ças de comportamento, de atitudes, paraque eles tenham instrumentos que lhespermitam visualizar as suas próprias po-tencialidades e buscar seu espaço nasociedade e no mercado de trabalho.

A bandeira da paz também atrai es-

forços da polícia. Na tentativa de ajudara Ceilândia a vencer o estigma de cidademais violenta da capital federal, a PolíciaMilitar do DF criou, há 19 anos, o Progra-ma de Educação para Cidadania e Segu-rança (Educs). Com foco na prevenção dacriminalidade e nos direitos do cidadãoao desenvolvimento, policiais treinadospara a função atuam junto às famílias decrianças e adolescentes em conflito coma lei, virando uma espécie de “anjo daguarda” na apuração e encaminhamen-to dos problemas. As questões que en-contram pela frente variam do analfabe-tismo às drogas. Mas ninguém esmorece,assegura o policial Gmayeel Sousa, inte-grante do grupo. “Montamos uma equi-pe de alfabetização, que é um direito fun-damental do cidadão, e contamos comas redes de apoio para o encaminhamen-to de casos”, explica.

A nova postura enterra marcas dosanos de chumbo da ditadura, que associ-aram a farda ao medo, para dar lugar àmais perfeita tradução do programa dasNações Unidas, transformando a culturade guerra, violência, imposição e discri-minação em práticas de diálogo, tolerân-cia e solidariedade. A cultura de paz é apaz em ação, é a cultura de vida, resumeo diretor da Unesco no Brasil, FedericoMayor. “É o respeito aos direitos huma-nos no dia a dia. Um novo sentido de com-partilhar, ouvir e zelar uns pelos outros.”

Uma nova forma de pensar

Júlio César, instrutor:“Fazendo a diferença”

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15Revista do Sindjus • Maio/2011

Nei treina break e bas-quete de rua na Cufa da

Ceilândia, onde a comunida-de coloca em prática a

definição da Unesco: culturade paz é “a paz em ação”

15Revista do Sindjus • Maio/2011

Meninos de Ceilândia: 3373-2741

Grupo Azulim: 3485-3912

Cufa-DF: 3372-0957

Fundação Cidade da Paz:www.unipazdf.org.br

Educação para Cidadania eSegurança (Educs): 8441-8993

QUEM FAZ A PAZ

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A primeira coisa que temque ser feita é diminuir

as desigualdades sociais.E garantir os serviçosessenciais do Estado:

educação, saúde, transporte.Só isso já contribuiriabastante. O cidadão

comum fica refém de todaessa violência e não pode

fazer muita coisa.

Vandemberg SantosMelo, TJDFT (Fórum

de Santa Maria)

A recente tragédia na escola do Realengo, no Rio de Janeiro, onde onze crianças eadolescentes foram assassinados a tiros, reaqueceu o debate sobre o combate à violência.

Ou, mais e maior que isso: sobre a criação de uma cultura de paz. No Distrito Federal asituação é tão ou mais grave quanto nos outros grandes centros urbanos brasileiros:

entre as 27 unidades da federação, ocupamos um triste 4º lugar no ranking de mortesviolentas na faixa etária de 15 a 24 anos. O que fazer para mudar esse quadro?

A violência no DF cresceporque chegam muitas

pessoas de outros estadosque acreditam que terão maisoportunidades aqui. Mas elas

se deparam com umarealidade diferente e muitos

acabam caindo namarginalidade. Acho que aeducação é a base de tudo,com ela podemos mudar arealidade dos jovens que

estão à margem da sociedade.

Inês Amaral, TSE

A violência é umaquestão social. Deve serfeito um trabalho com os

jovens, na escola e em casa.Brasília era bem mais

calma, mas com oinchaço dos últimos anosa vida tem se complicado

mais e a violência temestado cada vez maispresente. Acho que os

jovens merecem mais lazer,emprego e esportes.

Marcos Carvalhedo, TSE

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soluçõesEm busca de

Combater a violência não ésomente com repressão, mascom a prevenção, começando

pelas escolas: respeito ao próxi-mo, valorização da família, a

importância de conviver, respei-tar as diferenças. Tudo issoconta. Faltam mais projetos

sociais voltados para os jovens.Por isso falo do fortalecimentodas escolas: elas já estão aí e

não recebem a atenção devida.

Bruna Falco de FáSouza, MPDFT

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17Revista do Sindjus • Maio/2011

Pelo fato de ser a capital,o DF e a União deveriamcuidar mais dos jovens,investir em cultura, nos

estudos, no primeiro emprego,tirar o jovem da rua. O futuro

de qualquer país está najuventude, se não temos

jovens prontos para estudar etrabalhar, o que teremos?Um futuro complicado, eu

acredito. Investir no jovem éum retorno para o país.

Valdir Pinheiro Azevedo, TRT

A violência pode ser comba-tida com políticas públicas ea participação da sociedade.

O caminho melhor seria aeducação dentro de casa,

fortalecendo a base familiar,e depois com bons profissio-nais no ensino fundamentale médio. A questão das dro-

gas deve ser tratada commais cuidado, porque está

ligada à violência.

Cristiano Antonio Veranode Souza, MPDFT

Sou contra as armas.O que aconteceu na escola

do Rio mostra que arma nãoresolve. As escolas e a famíliatêm papel primordial. Temos

que mostrar que a violência nãoleva a lugar algum. A gente tem

que fazer a cultura da paz.Investir em educação é oprimordial. E em esporte,

música, coisas que realmentesensibilizam os jovens.

Tonia de Almeida, TJDFT(Fórum do Gama)

A cultura da paz deve sermais difundida, pouca gente

conhece. É muito triste aquestão da violência no DF.

Ela está relacionada à educa-ção, a um trabalho de base.Se houvesse atividades nasescolas voltadas para o res-

peito ao próximo, o não-preconceito, a não-discrimina-ção, talvez Brasília não tivesseíndices tão altos de violência.

Brummel Henrique dePaula Mendes, MPDFT

Combater a violência apenasnão é a solução. Falta

investimento na área de educa-ção, saneamento, moradia.

Tudo isso se reflete na seguran-ça, a consequência final é a

violência. Com certeza aeducação é um dos caminhospara mudar essa realidade. Einvestir em trabalho, para que

haja um desenvolvimentoeconômico de modo geral.

Gilberto SoaresClemente Júnior, TRT

Acho que essa violência éfruto dos governos anteriores,

que prometeram lotes emelhores condições de vida

para pessoas de outrosestados. Mas acredito que com

educação podemos mudaressa realidade. Lazer e esporteajudam, mas o principal sãoos programas de empregopara os jovens, porque issomuda significativamente a

realidade deles.

Helena Koshino, TSE

Brasília era um lugartranquilo para se criar os

filhos, mas hoje não é mais.Temos que resgatar a

valorização da família, ainstituição fundamental da

sociedade. Hoje, infelizmente,nós temos um complicador, amídia, que passa uma ideiaerrada de felicidade. Isso éuma má influência para osjovens e para os adultos.

Onilda Medeiros deOliveira, TSE

Acho que a razão principalpara o número de mortes

violentas aumentar é que asfamílias e os jovens se

afastaram de Deus. Isso mudaos valores das pessoas. Au-

mentou o consumo de drogas,de bebidas alcoólicas. Achoque as famílias estão muito

divididas; antes elas passavamvalores para os filhos, hojenão existe mais orientação.

Maria Eulilia CavalcantiAmorim Pontes, TRT

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20 Revista do Sindjus • Maio/2011

O que é o PDOT

O Plano Diretor de OrdenamentoTerritorial é um conjunto de princípios eregras para todos que constroem ou utili-zam o território: governo, iniciativa priva-da ou cidadãos. Ele orienta o crescimentourbano com base nas características terri-toriais, sociais, econômicas e ambientais.

O grande desafio do PDOT 2009 foiajustar a legislação à cidade real, reco-nhecendo antigas áreas rurais como parteda zona urbana e dando base ao proces-so de regularização fundiária, urbanísticae ambiental de inúmeros parcelamentosirregulares. Após aprovado na CâmaraLegislativa, o Plano Diretor transformou-se em lei distrital (Lei Complementarnº 803, de 25 de abril de 2009).

Plano de ordenamento territorialsegue aos trancos e barrancos,

entre denúncias de favorecimento aempreiteiros, de inconstitucionalidade

e de risco de faltar água no DF

Para ondevamos?

Fabíola Góis

rasília, 51 anos depois de inaugurada, ainda não tem umplano de ordenamento territorial capaz de atender às ne-

cessidades da população, hoje em torno de 2,2 milhões de pes-soas. Um terço dessa população vive em áreas informalmenteocupadas, com grande número de habitações sem documenta-ção legal. A maioria é de baixa renda.

Por que é tão difícil pôr ordem numa cidade recém-criada,idealizada e planejada? São várias as tentativas de planos, leis esiglas difíceis de ser decoradas: PEOT, PDOT, PPCUB, PDL, LUOS.O controvertido Plano de Ordenamento Territorial (PDOT) teve,este ano, 60 dispositivos considerados inconstitucionais – o querepresenta 20% do seu conteúdo.

Além de contestado juridicamente, o PDOT também é con-denado por urbanistas, ambientalistas e entidades da socieda-de civil, que o acusam de beneficar os empresários do setorimobiliário em detrimento da população, além de ameaçar ma-nanciais de água e outras áreas de preservação.

O Ministério Público propôs uma ação direta de inconstitu-cionalidade e o Tribunal de Justiça do DF e Territórios entendeuque há vício de iniciativa (os deputados distritais não poderiamser autores das alterações propostas). Houve denúncias de lote-amento do PDOT para atender a interesses pessoais e financei-ros dos parlamentares. Mas, enquanto isso, mesmo com a pen-dência de inconstitucionalidade da lei, o uso do solo vem sendoalterado, a especulação imobiliária corre solta, o meio ambienteé cada vez mais degradado e a criação de novos setores habita-cionais ameaça causar falta d’água no DF.

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21Revista do Sindjus • Maio/2011

Os problemas começaram tão logoa capital foi ocupada, mas as tentati-vas de organização do território só seiniciaram a partir da partir de 1970 (vejana página seguinte). Foram avaliadasduas alternativas de ocupação. Uma pri-orizava a preservação da bacia do lagoParanoá; a outra, a diminuição dos cus-tos e do tempo de deslocamento da po-pulação. A primeira foi a escolhida.

Por muito tempo foram proibidasnovas ocupações nas imediações doPlano Piloto. Mas a pressão populacio-

ambientais e da especulação imobili-ária tornaram-se polêmicas.

Por lei, as revisões do PDOT deve-riam ser a cada cinco anos. A segun-da, porém, aconteceu com uma déca-da de atraso: só foi aprovada pela Câ-mara Legislativa em 2008 (e sancio-nada em 2009). Mas o Ministério Pú-blico do DF e Territórios (MPDFT) pro-pôs uma ação direta de inconstitucio-nalidade por considerar que as altera-ções do uso do solo, como queriam osdeputados distritais, não poderiam ser

nal era crescente. Em 1987 o urbanistaLucio Costa, em seu plano Brasília Re-visitada, propôs novas áreas habitacio-nais, os setores Sudoeste e Noroeste.

Em 1992 foi formulado o primeiroPDOT, com foco no principal eixo decrescimento do DF, na direção sul-su-doeste. Em 1997 foi feita a primeirarevisão, com indicação de criação denovos centros urbanos, além de trans-formar em zona urbana as áreas ocu-padas pelos condomínios irregulares.As discussões em torno dos impactos

Planejamento tardio e polêmico

Cerrado cedeu espaço a Vicen-te Pires e Águas Claras: coma promessa de “organizar acidade”, GDF pretende aumen-tar o adensamento populacio-nal em várias outras áreas

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22 Revista do Sindjus • Maio/2011

realizadas. Sessenta dispositivos foramconsiderados inconstitucionais.

O Tribunal de Justiça do DF e Terri-tórios (TJDFT) entendeu que algunsitens inseridos na proposta a pedido dosdistritais caracterizaram vício de inicia-tiva. A lei diz que apenas o Executivopode fazer alterações no projeto.

As mudanças no PDOT permitirama inclusão de novas áreas e setores ha-bitacionais, com o consequente aumen-to de despesa para os cofres públicos.Também houve denúncias de loteamen-to do Plano Diretor para atender inte-resses pessoais e financeiros dos parla-mentares. Aliás, essa é a principal re-clamação dos especialistas na área. Acrítica é que o plano tem sido modifi-cado ao longo dos anos para atendernão à população que precisa dele, massim a empresários interessados na es-peculação imobiliária.

Para Tânia Batella, o ideal seria fa-zer um novo PDOT, porque o vigentenão atende aos anseios do brasiliense.“A única solução correta e digna seriaa revogação total. Esse plano não temconserto, porque teve como base e ob-jetivos o interesse imobiliário”, criticaa arquiteta e urbanista, coordenadorada Comissão de Política Urbana do Ins-tituto dos Arquitetos do Brasil.

Tânia também integra a Federaçãoem Defesa do DF, com representantesdos conselhos comunitários das asas Sule Norte, do Sudoeste, do Park Way, doslagos Sul e Norte, dos setores Comerci-al e de Diversões, além de presidentesde entidades e associações como o Ins-tituto Histórico e Geográfico do DF e oFórum das Organizações Não Governa-mentais Ambientalistas.

A arquiteta considera o PDOT emvigor uma afronta ao tombamento deBrasília. Segundo ela, o plano foi cons-truído sem a participação da socieda-de, como determina a legislação. “Oplano não tem planta, tem croqui. Nin-guém sabe onde começa e onde ter-mina”, observa.

Críticas à forma e ao conteúdoPara Tânia, não se deveria propor

neste momento outra alteração no pla-no, uma vez que, pela lei, não pode ha-ver modificação fora do prazo, a nãoser que haja relevante interesse públi-co declarado. “Se for apenas para su-prir os vazios, é necessário definir coma própria sociedade”, afirma.

A promotora Marta Eliana de Oli-veira, da 3ª Promotoria de Defesa doMeio Ambiente e Patrimônio Cultural,acompanha as modificações do PDOTcom olhar atento. Para ela, um dosgrandes problemas do plano é o au-mento da área urbana além do neces-sário, com indicações de que isso seriafeito para atender à especulação imo-biliária. “O Estatuto das Cidades esta-belece que não deve haver retenção doimóvel urbano para fins de ocupação.No DF, há tendência de horizontaliza-ção das ocupações sem que haja sus-tentabilidade para isso”, critica.

Marta Eliana comenta estudo rea-lizado pela consultoria da Câmara Le-gislativa do DF, em que se afirma que aexpansão urbana proposta na revisãodo PDOT ultrapassa a necessidade. “Já

Tânia: “O plano nãotem planta, tem croqui.

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A única solução correta e dignaseria a revogação total. Esse plano nãotem conserto, porque teve como base e

objetivos o interesse imobiliário.Tânia Batella, coordenadora da Comissão de

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23Revista do Sindjus • Maio/2011

É preciso um estudo técnico de impac-to ambiental”, avalia.

O MPDFT recomendou ao governoo veto total do documento. Entre as ile-galidades, Marta Eliana aponta a au-sência do memorial descritivo, docu-mento com mapas que traçam as coor-denadas e os limites dos terrenos. Ou-tros problemas são a definição de no-vas áreas econômicas sem planejamen-to do Zoneamento Ecológico-Econômi-co (ZEE) previsto em lei e a redução deáreas de proteção ambiental e de ma-nanciais de água do Catetinho, Alaga-do e Ponte da Terra.

fizemos recomendações ao secretárioGeraldo Magela alertando que essa al-teração no PDOT não pode ser uma novarevisão. Caso contrário, entraremos comnova ação”, diz.

Segundo a promotora, a inconsti-tucionalidade declarada pelo Judiciáriofoi meramente formal, não mexeu noconteúdo. “Algumas áreas estão semdisciplina”, aponta. Uma delas é a Ci-dade Portuária que o GDF pretende fa-zer em Planaltina. “Nunca se discutiuesse assunto no PDOT. Ficamos saben-do dessa Cidade pelo jornal. Não estáno projeto nem no documento técnico.

Na fase de implantação (1957 a1967), previa-se que na bacia do lagoParanoá haveria somente o Plano Pilo-to. Mas foi necessário construir novascidades para abrigar os milhares demigrantes: Taguatinga (criada em1958), Cruzeiro (1959), Sobradinho(1960) e Gama (1960). A “cidade li-vre” que seria removida transformou-se em Núcleo Bandeirante. Planaltina

As três fases da urbanização do DF

Fonte: Sedhab

(1859) e Brazlândia (1933) eram cida-des de Goiás incorporadas ao DF.

A fase de consolidação foi mar-cada pela Campanha de Erradicaçãode Invasões (CEI), de onde surgiu onome Ceilândia (1971). Nesse perío-do foi criado também o Guará(1968). Taguatinga, Gama e Sobradi-nho se expandiram; Lago Norte eLago Sul começam a se consolidar.

A partir de 1980 começa a fase deexpansão urbana, com altas taxas decrescimento populacional e a criaçãode Samambaia, Recanto das Emas,Santa Maria e Riacho Fundo I e II.Candangolândia, São Sebastião eParanoá foram regularizadas e expan-didas. Surgiu o Sudoeste, voltado paraa classe média, e proliferaram os con-domínios fora das zonas urbanas.

Segundo a promotora MartaEliana, as maiores irregularidadesna atual proposta de PDOT são:

Ausência de memorial descritivo(mapas, coordenadas e limitesdos terrenos).

Definição de novas áreaseconômicas sem o obrigatórioZoneamento Ecológico-Econômico.

Redução de áreas de proteçãoambiental e de mananciais de água.

Marta: expansão urbanaproposta na revisão do PDOTultrapassa a necessidade

ISABELA

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24 Revista do Sindjus • Maio/2011

O recém-instalado governo do DF co-meçou a dar agilidade ao processo de atu-alização do PDOT, abrindo espaço para su-gestões da população por um período de30 dias. Foram mais de 500 contribuiçõespelo site e mais de 100 apresentadas porescrito por diversas entidades. A agilida-de, porém, parou por aí. A intenção da Se-cretaria de Estado de Desenvolvimento Ur-bano e Habitação do DF (Sedhab) era di-vulgar no dia 11 de abril a minuta do pro-jeto de lei com as alterações, mas, devidoà escassez de pessoal para analisar as de-mandas, não há mais prazo definido.

O secretário adjunto da Secretaria de Ha-bitação, Rafael Oliveira, afirma que o gover-no considera a possibilidade de concluir oprocesso até o fim do primeiro semestre. Umdos focos será o adensamento populacionaldas cidades e um dos pontos mais polêmi-cos é o Setor Habitacional Catetinho, entre oPark Way e o Gama. Ele está presente nosplanos de ordenamento territorial do DF des-de 1976, na época do Plano Estrutural deOrdenamento do Território do DF (PEOT), edepois foi reafirmado nos planos subsequen-tes, que apontaram a região como preferen-cial para a expansão urbana.

Os riscos ambientais da criação donovo setor, no entanto, foram levantadospelos próprios técnicos da Sedhab. A pro-posta ainda será debatida durante audiên-cia pública prevista para junho, mas a deci-são final caberá ao governador. O SetorCatetinho foi um dos dispositivos do PDOT

considerados inconstitucionais, já que tra-tava-se de emenda apresentada por depu-tados distritais – ele não estava no projetoenviado pelo Executivo à Câmara em 2009.

Caso a criação da nova área seja con-cretizada, a promotora Marta Eliana temea falta de água no DF. “Estamos muitoperto de ficar sem água. O fornecimentodurante a seca já alcança a demanda. Seinstalarem o Setor Catetinho teremos pro-blemas no futuro, porque lá existe o ribei-rão do Gama, uma área de proteção demanancial”, explica.

A arquiteta Tânia Batella tem a mes-ma opinião da promotora. Para ela, basta

O Setor Catetinho e o risco de falta d’águaobservar as vias com excesso de carrospara perceber que o DF cresceu demais. Eo próprio Plano Diretor de Transportes Ur-banos (PDTU) aprovado pela Câmara Le-gislativa no dia 19 de abril é incompatívelcom a proposta de uso do solo – ele prevêvias interbairros que não estão no PDOT.

A arquiteta afirma que a maior partedos problemas identificados no PDOT nãoforam criados pelos deputados distritais,mas sim pelo próprio Executivo, no textooriginal, que transformou áreas de aden-samento nas cidades satélites sem que fi-casse demonstrado que haveria água sufi-ciente no local.

Rafael Oliveira, da Sedhab:conclusão prevista para julho

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25Revista do Sindjus • Maio/2011

A arquiteta e urbanista Suely Gonzales,professora aposentada da Faculdade de Ar-quitetura e Urbanismo da Universidade deBrasília (UnB), afirma que o PDOT apresen-ta equívocos graves e erros estruturais quedeveriam ser objeto da revisão que o go-verno está propondo. Alguns deles estãocompreendidos na ação direta de inconsti-tucionalidade movida pelo MPDFT.

É preciso, por exemplo, rever a necessi-dade das enormes manchas de expansãoao sul do DF e de promover a contençãourbana na área da bacia do rio São Barto-lomeu. “Entretanto, há um sério problemade gestão do nosso território: enquantoocorre a revisão, que estão chamando deadequação do PDOT, desde 2004, o uso dosolo vem sendo alterado, mesmo com a pen-dência da inconstitucionalidade da lei”, cri-ticou a arquiteta.

A preocupação de Suely Gonzalez é ace-lerar o processo de revisão para que o go-verno e a sociedade tenham instrumentoseficazes de gestão e controle: “É precisoacelerar esse processo. E mais: é preciso quea Lei do Uso e Ocupação do Solo (LUOS),prevista no PDOT, seja imediatamente apre-sentada. Ela faz parte dessa urgência.”

Segundo Suely, o cronograma de elabo-ração da LUOS está com quase um ano deatraso. “O diagnóstico deveria ter sido apre-sentando em setembro do ano passado”,diz. Enquanto isso, continua a arquiteta, aTerracap planeja a criação de novos lotes,como no novo Setor Hoteleiro Norte e nanova quadra do Sudoeste.

Exemplos históricos da ausência de mo-nitoramento, segundo Suely Gonzalez, sãoa proliferação dos condomínios irregulares,a ocupação indisciplinada no comércio lo-cal (os “puxadinhos”) e o caos arquitetôni-co que se tornou a área das quadras 700do Plano Piloto. “Estamos no século XXI.Há todo um instrumental tecnológico dis-ponível para realizar esse monitoramentode forma dinâmica e eficiente. É só ter von-tade política para executá-lo”, finaliza.

Suely: governo esociedade precisamde instrumentoseficazes de controle

Ausência demonitoramento

ISABELA

LYRIO

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Neste espaço, os psiquiatras YuriMatsumoto Macedo e André LuisMacedo publicam mensalmente artigossobre saúde mental. Para saber mais,acesse www.animaconsultorio.site.med.br

André Luis Macedo, especialistaem Psiquiatria, formou-se em Medi-cina pela UnB e fez residência emPsiquiatria no Hospital de Base doDF. É psiquiatra do TJDFT, membroda Associação Brasileira de Psiquia-tria (ABP) e da Associação Psiquiá-trica de Brasília (APB).

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Yuri Matsumoto Macedoformou-se em Medicina pelaUniversidade Federal do Pará, pós-graduou-se em Medicina doTrabalho pela UniversidadeEstadual do Pará e fez residênciaem Psiquiatria no Hospital de Basedo DF. Publicou o livro Louco équem me diz (2005), com casosverídicos de pacientes psiquiátricos.Também é membro da ABP e APBr.

SAÚDE

odos nós experimentamos a tristeza emalgum momento da vida. É um sentimen-

to que tem motivos, que dura algumas horas oupoucos dias e é justificado pelo contexto. Maisque isso: é um sentimento necessário. Pessoasque nunca sentiram tristeza dificilmente sabe-rão o que é alegria. Ninguém sabe o que é bomsem conhecer o que é ruim. Ninguém torceriapara um time que não tem adversários.

Mas aqui vamos falar da depressão – omal do século. É comum dizer “hoje estoudeprimido” como sinônimo de “estou triste”,mas depressão não é tristeza. É um proble-ma médico grave, que precisa ser tratado.Estima-se que a depressão esteja entre as cin-co doenças que mais levam uma pessoa aprocurar o médico; no entanto, nem sempreé diagnosticada.

É comum que os pacientes deprimidos sequeixem de falta de energia, cansaço, doresvariadas, alterações de peso e de sono; semfalar em tristeza, choro, culpa ou ideias demorte. Cerca de 50% dos estados depressivosnão são diagnosticados pelos profissionais de

saúde, seja por falta de treino, de tempo, des-conhecimento, descrença, estigma de que é“fraqueza” ou “falta de força de vontade”.

A Organização Mundial de Saúde (OMS)reconhece a depressão como uma das doen-ças que ocasionam maior comprometimento esofrimento, provavelmente a segunda maiorcausa entre todas as outras condições de inca-pacidade. No entanto, é provável que menosde 25% dos indivíduos afetados recebam tra-tamento adequado. A Associação Brasileira dePsiquiatria (ABP) estima que cerca de 10% dosbrasileiros sofrem desse mal.

A depressão é uma doença que afeta ocorpo, o humor e os pensamentos. Os sinto-mas surgem com mais frequência entre os 15e 30 anos de idade, mas podem acometer tam-bém crianças e idosos. Nem todos os sinto-mas listados a seguir (incluindo a tristeza) pre-cisam estar presentes para o diagnóstico. Otempo de acometimento também é fundamen-tal. O número e a gravidade dos sintomas va-riam entre as pessoas e numa mesma pessoaao longo do tempo.

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26 Revista do Sindjus • Maio/2011

tristezadisfarçada de

Doença

“Doença que não sangra”:a pessoa custa a acreditar-se

doente, o que aumenta o tempode sofrimento e diminui

as chances de tratamento

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Principais sintomas

Tristeza, ansiedade, irritabilidadeou sensação de vazio persistente.Pessimismo, desespero, culpa,impotência, desvalia.Perda de interesse ou de prazer ematividades que antes apreciava.Cansaço, lentidão, faltade energia, apatia.Dificuldades de concentração, dememória ou para tomar decisões.Dormir menos ou dormir mais.Alterações de peso e apetite(para mais ou para menos).Ideias de suicídio.Dores e desconfortosfísicos persistentes.

A depressão causa intenso sofrimentopara o paciente e as pessoas que o cercam erepercute negativamente na vida familiar, so-cial e profissional. Pode levar a desemprego,separações, isolamento, abuso de álcool edrogas. Aumenta o risco de suicídio e de do-enças como a coronariana e os tumores. Porser uma “doença que não sangra”, que nãose revela em exames concretos, o pacientecusta a acreditar-se doente ou a falar disso,aumentando ainda mais o tempo de sofrimen-to e diminuindo as chances de tratamento.

O diagnóstico é clínico, ou seja, baseadoem sinais e sintomas, e não existe exame la-boratorial ou de imagem específico para isso.Por esse motivo, o médico psiquiatra deve serprocurado em caso de suspeita. Felizmentehá uma ampla gama de tratamentos eficazespara a depressão, incluindo principalmentemedicamentos antidepressivos e psicoterapi-as. Mais de 80% dos portadores melhoram emuitos podem até mesmo se curar, depen-dendo do caso, do tipo de depressão, da gra-vidade e de sua recorrência. Seguir a orienta-ção do especialista sobre a duração do usode remédios previne as recaídas e a cronifi-cação do problema.

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UMA REALIDADE CINZENTA • Depoimentos de pacientes

Tive um episódio depressivo agudo. Osprimeiros sintomas foram insônia e ideia fixa.Eu tinha terminado um namoro e não para-va de pensar nisso. A autoestima tambémandava baixa, o que acho que contribui paraesse quadro. Depois de uma semana fui aopsiquiatra e comecei a tomar antidepressivoe indutor de sono. A medicação começou afazer efeito em uns quinze dias, mas o qua-dro agudo durou três meses.

“Parecia que euia enlouquecer”

Acho que desde a adolescência eu sen-ti sintomas de depressão, mas por volta dos30 anos isso começou a ficar mais sério. Ti-nha insônia à noite e muito desânimo dedia, muito sono. Eu fazia natação de ma-nhã, antes do trabalho, mas comecei a ma-tar as aulas para dormir no carro, no estaci-onamento da academia. Depois desisti denadar, passei a estacionar perto do traba-lho e dormir durante uma ou duas horas.

Deixei de ter vontade de fazer qualquercoisa, só queria dormir. Acho que eu só “fun-cionava” porque tinha dois filhos pequenos.Mas estava sempre irritada com eles, e porisso sentia muita culpa. Tudo ficou ruim de-mais na minha vida. Comecei a ter dores nocorpo toda noite. Sentia também um incô-modo físico, uma coisa que eu só conseguiadefinir como “agonia”. Era como se eu nãome encaixasse mais em mim mesma. Pareide sair de casa, não via mais meus amigos,não queria nem falar ao telefone. Eu traba-lhava muito, mas meu trabalho não rendia enem me dava mais prazer como antes.

Na época eu fazia terapia, e quandocontei essas coisas à psicóloga, ela me dis-

“Tudo ficou ruimdemais na minha vida”

Maria P. Gomes, publicitária e escritora

Vicente Ferreira Marques, empresário

Foram os piores dias de minha vida. Fi-quei todo esse tempo sem trabalhar. O mun-do ficou cinzento, a realidade perdeu as co-res. Eu pensei que ia morrer. Emagreci setequilos, minha energia vital se esvaiu, não meinteressava por nada, nem por sexo, acheique tinha ficado impotente. Só conseguiadormir com medicação, e durante poucas ho-ras. Sentia sono de dia mas tinha medo dedormir, porque, quando cochilava, pareciaque eu ia enlouquecer.

se que eu estava deprimida e que precisavame consultar com um psiquiatra, caso con-trário ela não poderia mais continuar meatendendo. Foi bom que ela tenha sido duracomigo, senão eu não teria ido ao médico.

Comecei um tratamento e no começomelhorei, mas depois passei a ter dificulda-de com os remédios. Testei muitos, mas al-guns não faziam efeito e outros me davammuitos efeitos colaterais. O médico disse que“não sabia mais o que fazer” comigo, recei-tou um medicamento fitoterápico e não mar-cou mais retorno, meio que me mandou em-bora. Foi horrível, o remédio não fez efeito eeu pensei que fosse enlouquecer. Eu nãodormia mais nem de dia nem à noite, meusouvidos zumbiam, meu corpo tremia, sentimuita ansiedade, angústia, medo.

Finalmente encontrei um bom profissio-nal e passei a tomar uma medicação quefuncionou. Aos poucos foi passando a sen-sação de que minha vida era um pesadelo.Estou bem, já consegui diminuir a dosagemdos remédios e minha meta é parar, emborasaiba que é difícil. Também faço exercíciosfísicos regularmente, para me dar ânimo econtrolar a ansiedade.

Leitura recomendada

Eu tomo antidepressivo, graças a Deus –Cátia Moraes – Ed. Best Seller, 192p.

Depressão – da bile negra aosneurotransmissores – Taki AthanassiosCordas – Lemos Editorial, 103p.

O demônio do meio-dia – uma anatomiada depressão – Andrew Solomon –Ed. Objetiva, 504p.

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Thais Assunção

á dizia Vinicius de Moraes: “Mu-lher, que máquina és...” Na épo-

ca em que escreveu esse verso, porém,o poeta – que morreu em 1980, aos67 anos – não poderia imaginar o es-paço que as mulheres ocupariam nomercado de trabalho. Hoje é possívelver mulheres motoristas de ônibus etáxis, delegadas e agentes de polícia,motogirls, frentistas em postos de ga-solina, pilotos da aviação civil e atéde caças e helicópteros militares.

A função da mulher não é mais“esquentar a barriga no fogão e es-friar no tanque”, como se dizia anti-gamente – ou pelo menos não é ape-nas essa, já que a maioria enfrentauma tripla jornada ao se dividir entretrabalho, casa e filhos. Essas “máqui-nas”, como disse Vinicius, mostramque, além de ser capazes de vencerdiariamente essa maratona, aindaconseguem espaço em profissõesconsideradas exclusivamente mascu-linas até bem pouco tempo.

Que o diga a ladrilheira Maria Fran-cinete da Costa. Ela é trabalhadora da

construção civil “com muito orgulho”,como faz questão de dizer. “Adoro aminha profissão e fico orgulhosa demim mesma quando sou elogiada pelomeu chefe”, conta a moça.

Aos 26 anos, mãe de três filhos,Francinete acorda às 4h da manhãpara estar na obra, no Guará II, às6h30. Moradora do Varjão, próximo aoLago Norte, ela enfrenta quatro con-duções diárias para ir ao trabalho. “Éuma rotina dura. Trabalho na obra atéas 17h e chego em casa mais ou me-nos às 19h10”, revela.

Com seus 1,60m de altura, Franci-nete impõe respeito e diz que não équalquer gracinha que a faz perder acompostura no trabalho. Mas às vezesé preciso ser um pouco mais agressi-va. “Certa vez um colega perguntou:‘seu marido te deixa trabalhar na obracom tantos homens?’ Eu respondi: ‘cla-ro, ele confia em mim’. Ele disse quenão deixaria a esposa dele trabalharcomo eu, e então respondi: ‘porquevocê é um otário!’”, conta ela, rindo.

Segundo Francinete, a profissão deladrilheira surgiu por acaso. Sua irmã,Maria do Socorro, que já atuava há

Eu acho muitoimportante que asmulheres ocupemcargos de chefia oucargos que eramsó de homens. Nósmulheres temos quemandar também

Maria Francinete daCosta, trabalhadora daconstrução civil

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Mulheres chamam a atenção em funçõesque há poucos anos eram consideradas

“de homem”. Decididas a provar que têmcompetência, elas se dedicam em dobro e

aos poucos conquistam seu espaço

superpoderosasMeninas

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dois anos na construção civil, chamou-a para trabalhar na limpeza e ajudar aretirar o rejunte dos pisos. Depois deuma semana de trabalho, a moça seinteressou pelos azulejos e cerâmicase viu no trabalho de ladrilheira um ser-viço “com arte”, que ela seria capazde realizar.

O chefe da obra a convidou paraum teste de assentar cerâmica. Ela sesaiu bem. Depois de um mês, outroconvite: revestir uma cozinha inteira.“Eu nem acreditei quando ele me con-vidou, mas aceitei o desafio, fiz tudodireitinho e fui muito elogiada pelo

trabalho”, conta Francinete.Isso aconteceu há mais de um ano

e meio e a moça não saiu mais daconstrução civil. Seu chefe atual dizque, às vezes, tem que ter “cuidadocom as palavras”, porque agora lidacom mulheres no canteiro de obras:“Tenho que conter os xingamentos, termais educação, porque com os homenso tratamento às vezes é na brutalida-de mesmo”, comenta rindo o mestrede obras Arismar Pereira Trindade. Masele não perde a chance de elogiar afuncionária: “A Francinete trabalha su-per bem. Não tenho reclamações so-

bre a qualidade do serviço que ela de-sempenha aqui na obra.”

Ciente da importância do trabalhoque desempenha como ladrilheira e doseu papel como mulher, mãe e traba-lhadora, Maria Francinete diz que amulher está mostrando toda sua forçae que tem capacidade para desempe-nhar com qualidade todo tipo de fun-ção: “Eu acho muito importante queas mulheres ocupem cargos de chefiaou cargos que eram só de homens. Nósmulheres temos que mandar também,mostrar que não é só eles que man-dam”, afirma.

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Pequena diante do Black Hawk, uma má-quina da Força Aérea Brasileira com vinte me-tros de comprimento, Déborah de MendonçaGonçalves sorri, orgulhosa e realizada. Estáprestes a concretizar um sonho de infância: serpiloto de helicóptero.

Aos 24 anos, ela é segunda tenente na Baseda Força Aérea em Manaus. Ingressou na car-reira militar em 2006, com 19 anos, e para issoteve que se mudar da grande São Paulo paraPirassununga, mais tarde para o Rio Grande doNorte e por último para o Amazonas.

O posto de piloto do Black Hawk no 7º Es-quadrão do 8º Grupo de Aviação – mais co-nhecido como Esquadrão Harpia – aguarda ajovem Déborah assim que ela terminar a tercei-ra e última missão de treinamento na base daForça Aérea, com lições tanto de voo como deresgate. O Esquadrão Harpia destina-se a bus-ca e salvamento (SAR) e busca e salvamentoem combate (C-SAR), na selva e no mar. Tam-bém realiza missões de apoio às populações ri-beirinhas e indígenas, principalmente em cam-panhas de vacinação e outras ações do Minis-tério da Saúde.

“Não vejo a hora de pilotar e, além disso,ajudar as pessoas”, diz a jovem. Ela deve assu-mir em junho e será a primeira mulher a pilotarum helicóptero Black Hawk na Base. “Sou pio-neira. Estou orgulhosa do que consegui e gosta-ria de influenciar outras mulheres a tomar a de-cisão de ser piloto”, afirma.

Ajudar vítimas de acidentes e contribuir parasalvar vidas foram alguns dos fatores que moti-varam sua decisão: “Escolhi Manaus por ser umaregião mais carente de profissionais nessaárea”, conta Déborah. Os colegas homens nãoa intimidam e confiam no seu trabalho: “Elesme respeitam e encorajam. E eu quero mostrarpara eles que eu também posso”, conclui.

Sou pioneira. Estou orgulhosado que consegui e gostariade influenciar outras mulheresa tomar a decisão de ser pilotoDéborah de Mendonça Gonçalves,segunda tenente na Base da ForçaAérea em Manaus

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Eu tambémposso”

FOTOS: ARTHUR MONTEIRO

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Radiante: assim é a motorista de ôni-bus e ex-caminhoneira Bernadete Perei-ra Braga. Ela conta toda sorridente a suahistória de paixão por caminhões e ôni-bus, que começou quando tinha apenas19 anos de idade. Foi quando resolveuenfrentar as estradas ao lado do maridoe aprendeu a dirigir caminhão.

Foram 20 anos na dura rotina de ca-minhoneira. “Viajamos muito, entregan-do cargas pelo Brasil todo. Era uma vidacansativa, com muitos problemas no diaa dia. Mas eu enfrentava tudo com ale-gria, sem perder o ânimo”, diz Bernade-te. Ela conta que sofreu preconceitos,mas que não fica comentando e se re-cusa a “ficou impressionada” com isso.

“Uma vez, quando comecei a diri-gir o ‘zebrinha’, um senhor que estavana parada de ônibus deu sinal para euparar, mas, quando abri a porta e eleviu que era uma mulher ao volante, de-

sistiu. Ele me mandou embora e disseque pegaria outra condução. Achei a si-tuação ridícula, mas não me importocom isso”, diz ela.

Há oito anos Bernadete trabalhacomo motorista de “zebrinhas” na em-presa Viplan, com mais cinco colegas,todos homens. Segundo ela, o que maisa chateia no dia a dia é enfrentar o trá-fego difícil. “A minha maior dificuldadeé o trânsito de Brasília. O motorista temque ter um grande jogo de cintura, mui-ta paciência, e ainda pensar nos passa-geiros que estão sob sua responsabili-dade”, afirma.

Sempre maquiada, cabelos muitobem penteados e brincos nas orelhas,Bernadete conta que a vaidade a acom-panha desde a época em que era cami-nhoneira: “Acho que a mulher tem quedar o toque de beleza por onde passa.Temos que estar sempre bonitas, pas-

No volante da zebrinha

sar uma imagem alegre.”A rotina diária nesses oito anos

como motorista a fez conhecer bem ospassageiros, que elogiam seu trabalho:“A maioria já me conhece. Eles sentemsegurança e tranquilidade comigo”,avalia. Com a autoestima elevada e oprazer de desempenhar sua função,Bernadete, hoje com 49 anos, diz quenão quer se aposentar e que ainda vaidirigir por muito tempo pelas “tesouri-nhas” da capital.

Um senhor deu sinalpara eu parar, mas, quandoviu que era uma mulherao volante, disse quepegaria outra condução.Achei a situação ridículaBernadete Pereira Braga,motorista de ônibus

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A moça damoto rosa

Botas, jaqueta de couro e capacetecor de rosa. É assim que a motogirl AnaLúcia da Silva, 28 anos, se arruma paraenfrentar mais um dia de trabalho. Há17 anos, quando chegou da Paraíba, AnaLúcia não imaginava que a capital seriao cenário para realizar seu sonho de pi-lotar uma moto – e muito menos queesse prazer se transformaria em profis-são. “Quando vim para cá eu tinha 11anos e só pensava em trabalhar e serindependente”, conta. Mas ela se casouaos 16 anos e a independência finan-ceira teve que ser alcançada com o tra-balho de doméstica. Durante sete anosmanteve a rotina de casa para o traba-lho e do trabalho para casa.

Porém, Ana Lúcia se decepcionou como companheiro e resolveu se separar. “En-trei com um processo na Justiça. Na divi-são de bens eu optei por ficar com a moto,para poder trabalhar. Pintei tudo de rosapara meu ex-marido nem pensar em exi-gir a devolução”, conta, rindo.

Ela se habilitou aos 22 anos, e, com apermissão em mãos, começou a procurartrabalho. Distribui currículo e esperou me-ses até uma empresa chamá-la. “Fiqueimuito feliz quando me ligaram para dizerque eu podia começar a trabalhar. Era arealização de um sonho”, relembra.

Ana Lúcia não imaginava, porém,que ainda enfrentaria muitos proble-

nela. “Aprendi logo os endereços, fui er-rando e aprendendo”, revela.

Hoje, após quatro anos na mesmaempresa, Ana Lúcia pode dizer queBrasília não é mais um mistério; os en-dereços ela tira de letra. E o amor àmoto continua incondicional. “A motopara mim é tudo. Eu adoro trabalhar enão quero sair desse emprego de mo-togirl. Por mim, trabalho o resto davida nessa profissão”. Ela tem no cur-rículo quatro acidentes, sendo que umdeles a deixou 62 dias “de molho”.Mas a moça só lamenta uma coisa:“Sofri muito por ter ficado tanto tem-po longe da minha moto.”

mas. Além de não conhecer bem a ci-dade, ela tinha que ouvir muitas pia-das por ser mulher. “No início eu de-morava muito para fazer uma entrega.Meu chefe dizia: ‘Ana, você tem queaprender a andar na cidade, desse jei-to não dá”, conta ela.

Quando demorava muito nas entre-gas, ela ouvia das pessoas que “só po-dia ser mulher para atrasar tanto”. Ou-via isso tanto de homens quanto demulheres. Mas, apesar das dificuldades,a moça não desistiu. Ela sentia que es-tava no lugar certo, trabalhando na úni-ca empresa que a acolheu, e não queriadecepcionar o empregador que confiou

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Na divisão de bens euoptei por ficar com amoto, para podertrabalhar. Pintei tudode rosa para meu ex-marido nem pensarem exigir a devolução

Ana Lúcia da Silva, motogirl

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FOTOS: ARTHUR MONTEIRO

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Lúcia Antônia Moraes Bandeira nãoconsegue disfarçar o brilho no olhar aofalar da profissão. Paradoxalmente, porém,conta que tornou-se delegada de políciapor acaso – ou melhor, “empurrada” peloirmão. “Eu já trabalhava como escrivã emGoiás, mas não pensava em continuar nacarreira policial. Meu irmão, que é agentede polícia em Goiás, insistiu que eu fizesseo concurso para delegada no DF, logo queterminei a graduação em Direito”, relem-bra ela. “Ele me fez assinar uma procura-ção e foi ao banco pagar minha inscrição”,relembra Lúcia, sorrindo.

corajou a ir até o fim.Há onze anos, quando começou a car-

reira como delegada, ela enfrentou seuprimeiro caso de homicídio. A imagem davítima ficou na sua cabeça por semanas:um jovem de 21 anos muito machucado,desfigurado. “Era de madrugada, estáva-mos com uma equipe pequena na 20ª DP(no Gama), quando recebemos uma liga-ção anônima. A testemunha viu uma pes-soa muito machucada na calçada. Encon-tramos o corpo do rapaz ainda quente,mas sem vida”, relembra Lúcia.

O “faro” da delegada foi essencial pararesolver o caso: “Como o jovem tinha sidoassaltado, mandei que a equipe se dividis-se e todos procurassem os documentos dorapaz em bueiros e lixos. A carteira deleestava num bueiro perto de uma residên-cia, onde encontramos os criminosos. Elesconfessaram o crime: bateram no rapaz atélevá-lo a óbito”, explica.

Essa foi apenas a primeira morte pre-senciada por Lúcia. “Na verdade eu meacostumei, a vida de delegada é muitoagitada”, afirma; “por outro lado, não te-mos rotina e isso que me empolga.” Elase orgulha dos cas’os solucionados, dosquais já perdeu a conta, e se considerapreparada para os desafios futuros.

“Nunca sofri preconceito; acho queisso é reflexo de um trabalho que façocom amor e responsabilidade”, avaliaLúcia. Hoje diretora da Divisão de Ho-micídios II, na Corvida, ela já comandoua Penitenciária Feminina do Gama e as20ª, 37ª e 14ª DPs, no Gama, além dadelegacia do Recanto das Emas.

Delegada por acasoEla passou em todas as etapas de

provas do concurso e seguiu para o cur-so de tiro e de luta marcial na Academiade Polícia. Supresa, adorou as aulas e seapaixonou pela profissão: “Começamoscom a pistola .38, depois passamos paraa .40. Mas o que gosto mesmo é da sub-metralhadora, bem mais fácil de mane-jar. Adoro atirar, saio das aulas relaxa-da”, diz. Sempre que chegam novos ar-mamentos os policiais e delegados fa-zem treinamento. Lúcia conta que no úl-timo curso de tiro ela estava com seismeses de gravidez – o que não a desen-

‘ ‘ Começamos com apistola .38, depoispassamos para a .40.Mas o que eugosto mesmo é dasubmetralhadora, maisfácil de manejar

Lúcia Antônia Moraes Bandeira,delegada da polícia civil do DF‘ ‘

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Do alto dos seus 95 anos,o poeta Manoel de Barrosensina que o ser humano

é incompleto, e que isso nãoé defeito; é qualidade.Assim como ele, muitas outras

pessoas precisam ser Outras.E são. Esta coluna publicarámensalmente histórias de gente

que concilia o serviço públicocom as mais diversasatividades. São atletas, chefes

de cozinha, professores,pintores, mágicos, mecânicos,músicos... A lista não tem fim.

OUTROS EUS

A maior riqueza do homemé a sua incompletude.Nesse ponto sou abastado.Palavras que me aceitam comosou – eu não aceito.Não aguento ser apenas umsujeito que abreportas, que puxa válvulas,que olha o relógio, quecompra pão às 6 horas da tarde,que vai lá fora,que aponta lápis,que vê a uva etc. etc.PerdoaiMas eu preciso ser Outros.Eu penso renovar o homemusando borboletas.

Manoel de Barros

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Thais Assunção

Entre ásperas palavrasdoçura, encantamentoe a delicadeza dos primeiros tempos.Não, não era apenas sinal.Era mesmo o ponto.Final.

ara a analista judiciária do TST Raimun-da Mendes dos Santos Ferreira, o poema

acima (Releitura, de sua autoria) é especial-mente marcante em sua vida. “Há sempre umpoema ou trecho que fica meio ‘onipresente’no meu dia a dia por um bom tempo. Releitu-ra, do livro Retrato essencial, é um deles”,avalia a servidora.

A paixão pela escrita começou ainda nainfância, quando Raimunda escrevia poemaspara o Dia das Mães. “Descobri que escreverseria a minha sina, o meu destino, porque sim-plesmente não consegui parar a partir daquelemomento”, conta. Raimunda não titubeiapara apontar a escritora que mais a influen-ciou: “Cecília Meireles, sem dúvida.”

No tímido início como poeta, ainda na in-fância, o que encorajou Raimunda Mendes ainvestir no sonho de escrever foi a presençamarcante do trabalho de Cecília Meireles –que era professora e produziu uma extensaobra voltada para as crianças. “Constatei quea poesia tinha uma voz feminina da qual eume sentia mais próxima. Nos primeiros con-tatos que tive com a poesia de Cecília Meire-les, fiquei comovida pela suavidade, pela flui-dez daquelas palavras”, explica.

Os contos fizeram parte de seus momen-tos iniciais como escritora, mas Raimunda fazquestão de ressaltar: “Minha grande paixãoé mesmo a poesia.” Há cinco meses a servi-dora publicou seu terceiro livro de poemas,chamado Retrato essencial. Os outros dois sãoA Casa Interior e Tessitura do Tempo.

Como muitos autores que adotaram pseu-dônimos em suas obras, Raimunda Mendesfoi buscar um apelido de infância para usarem seus poemas. Ela assina como Graça R.Mendes. “Adotei esse apelido antigo não sópara fazer uma referencia à época de criança,mas também porque traz ótimas lembrançasda minha família”, explica.

A inspiração, para Raimunda, pode vir deacontecimentos do dia a dia, de histórias an-tigas ou da vontade de expressar e comparti-lhar seus sentimentos com as pessoas. Assim,ela tenta se dedicar ao máximo à sua paixãopela poesia. Leva várias horas para escrever erevisa tudo minuciosamente, para que todosos textos obedeçam ao padrão almejado.

Com um sorriso no rosto e a clara felici-dade por poder desenvolver um dom de quetanto gosta, Raimunda conta que o seu en-volvimento com os colegas de trabalho semodifica quando o assunto são os seus livros.“Basicamente as relações pessoais passam acaminhar por outra vertente, ou seja, algunscolegas saem do âmbito puramente profissio-nal e conversam comigo sobre seus sentimen-tos, trocam ideias. Há aqueles que tambémescrevem e querem saber se é fácil ou difícilpublicar um livro. Outros fazem questão dedizer que se identificaram com algum dosmeus poemas. Enfim, parece que o ambientefica mais humano”, avalia a servidora.

A escrita é um momento de entrar em umnovo mundo, conhecer novas regras, aprofun-dar-se em outras vidas. Para Raimunda, seualter ego, Graça R. Mendes, tem o dom de fa-lar sobre seus sentimentos: “Escrever é sem-pre uma tentativa de aprisionar um momen-to, uma emoção, seja boa ou ruim. Quandoescrevo sei que estou fazendo um exercíciode vida, explorando o desconhecido, buscan-do respostas. Mas na maioria das vezes es-crever é obedecer a uma imperiosa vontadede dizer, de não calar.”

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Dizer,não calar

Para a poeta e servidoraRaimunda Mendes, escreveré explorar o desconhecidoem busca de respostas

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Raimunda acha queser poeta é um fatorque modifica sua vidaprofissional: “Pareceque o ambiente ficamais humano”

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JUSTIÇApara os servidores do Judiciário e MPU

Aprovação dos PLs 6613 e 6697

JÁ!

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BERTO/STF