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Anais da XVII Semana Acadêmica de Ensino, Pesquisa e Extensão – Universidade e Comunidade: em busca da transformação social
v.1, nº. 1, 2016. ISSN – 2448-1319
Anais da XVII Semana Acadêmica de Ensino, Pesquisa e Extensão – Universidade e Comunidade: em busca da transformação social v.1, nº. 1, 2016. ISSN – 2448-1319
MULHER, MÃE, DONA DE CASA E ESPOSA: DIFICULDADES E SUPERAÇÕES
PARA INGRESSAR E PERMANECER NA UNIVERSIDADE PÚBLICA
Samara Gomes Aguiar (Uneb-Nepe) i
Valquiria Normanha Paes (Uneb-Nepe)
Sônia Maria Alves de Oliveira Reisii
Resumo
Este trabalho apresenta reflexões sobre o acesso de mulheres ao ensino superior e ainda sobre
a condição feminina no meio universitário. Do ponto de vista metodológico, os dados
produzidos e analisados nesse trabalho são o resultado de uma pesquisa bibliográfica
realizada no intuito de identificar o que vem sendo discutido em relação ao acesso e a
permanência da “mulher, mãe, dona de casa, trabalhadora e esposa” no Ensino Superior. A
compreensão dos dados fundamenta-se nos pressupostos da abordagem qualitativa e da
análise de conteúdo. Os estudos de Ávila e Portes (2009); Queiroz (2001) e Sousa (2008)
subsidiaram teoricamente este texto. Conclui-se que os avanços e as conquistas das mulheres
não foram fáceis, mas, mediante muitas lutas produziram resultados significativos na vida de
grande parte delas. Com as conquistas já alcançadas, estão legitimadas a defender seus
direitos, o que as impulsiona na aquisição de novos espaços e ainda na busca constante por
seu “empoderamento”, tanto dentro quanto fora do lar.
Palavras-Chave: Mulheres. Empoderamento. Ensino Superior.
1 Introdução
Ao ingressarmos na universidade nos depararmos com as especificidades da vida
acadêmica feminina e as dificuldades encontradas pelas mulheres para garantir seu acesso e
permanência no ensino superior. Nesse contexto, sentimo-nos motivadas a aprofundar os
estudos sobre a realidade da mulher contemporânea, enfatizando os múltiplos papéis que ela
desenvolve em uma sociedade onde a figura feminina ainda é tratada de acordo com os
reflexos de um passado historicamente machista e extremante excludente.
Posto isso, objetivamos nesse texto apresentar e discutir apontamentos de estudos
sobre mulheres, que nas condições de mãe, dona de casa, trabalhadora e esposa, conseguem
ingressar na universidade e, por mais dificuldades que encontrem ainda obtêm êxito em
conciliar todos esses papéis e os estudos.
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Do ponto de vista metodológico, os estudos e pesquisas apresentados e analisados
nesse trabalho é resultado da pesquisa bibliográfica que fizemos para identificar o que vem
sendo discutido em relação ao acesso e a permanência da “mulher, mãe, dona de casa,
trabalhadora e esposa” no Ensino Superior. A compreensão dos dados fundamenta-se nos
pressupostos da abordagem qualitativa (ALVES-MAZZOTTI, 1999) e da análise de conteúdo
(BARDIN, 1977).
2 Estudos e pesquisas sobre mulheres no contexto universitário
A mulher, desde a antiguidade até o final do século XVII era considerada um ser
imperfeito, sendo colocada na sociedade, pelo Estado, como a dona do lar, o sexo frágil,
relativamente incapaz, aquela responsável pela educação dos filhos e manutenção da família,
onde tornava-se necessário oferecer a ela a proteção do “ser superior”, no caso o homem, que
poderia ser seu pai, irmão ou marido. Ainda segundo Andrade e Santos, (2013, p. 27),
o estudo e a conceituação do termo gênero permitem entender como homens
e mulheres assumem comportamentos e papéis normativos culturalmente
estabelecidos e desiguais em termos de poder e importância. As mulheres
internalizam a sua subordinação e desvalorização com base em discursos
sociais institucionalizados (nas escolas, nas empresas e organizações, nas
igrejas e demais templos religiosos e mesmo dentro de casa) que trazem
implicações diretas na sua constituição de sujeito.
No entanto com o passar dos anos, essa concepção de que a mulher era o sexo frágil,
que necessitava de constante assistência e vigilância foi se modificando. Elas vão à luta por
sua inclusão na sociedade capitalista e como primeira conquista conseguem o direito ao voto,
obtido em 1932. Dentre muitos avanços, pode-se citar a criação do anticoncepcional, no ano
de 1960, que lhes proporcionou uma maior independência sexual, além do divórcio e
principalmente o direito à educação igualitária.
A mulher durante essa época lutava por direitos iguais em relação ao sexo masculino,
com várias conquistas adquiridas. O casamento e a família deixaram então de ser prioridade
em sua vida e o homem tornou-se apenas um companheiro e não mais o seu dono, como antes
era determinado, assim, alguns de seus hábitos, impostos pela sociedade, marido e pela
própria família, se transformaram e elas puderam então definir por si mesmas quais espaços
gostariam de ocupar.
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Ao estudar a história da educação das mulheres no contexto brasileiro ficou evidente
que sempre houve a preocupação de oferecer a elas uma formação, quase que totalmente,
voltada para a vida doméstica e para as competências consideradas femininas. Tinham aulas
de bordado, culinária e de costura, ao passo em que a educação conferida aos homens era
mais focada no ensino da leitura, da escrita e da matemática. Muito diferente da mulher, o
homem sempre foi preparado para cursar o Ensino Superior, assim eram instruídos desde
cedo, para atingirem as chamadas boas profissões, como advogados, engenheiros e médicos,
enquanto as mulheres tinham acesso à educação somente dentro de suas casas e eram
educadas apenas para as aptidões do lar, ou seja, eram formadas para se tornarem boas donas
de casa, boas esposas e boas mães.
Felizmente hoje, depois de muitas lutas femininas, conseguiram superar muitos
preconceitos e romper com esse passado privativo em relação ao acesso ao Ensino Superior.
No entanto, ainda temos muitos embates e enfrentamentos a fazer, pois encontramos
constantemente mulheres em condições de inferioridade e de submissão em relação aos
homens, principalmente no mercado de trabalho, onde muitas delas ocupam os mesmos
cargos que eles e ainda recebem salários inferiores. Além disso, enfrentam a jornada dupla de
trabalho, pois além dos afazeres profissionais tem que se dedicar às ocupações domésticas e
maternas.
Apesar das contradições e negação de direitos das mulheres brasileiras, a
independência conquistada por elas nos últimos tempos contribuiu para a elevação de sua
autoestima. Hoje, as mulheres se casam mais tarde, têm poucos filhos e divorciam-se muito
mais, ou seja, não vivem mais em casamentos por conveniência que não lhes fazem bem,
apenas para terem o título de mulheres de família. Recentemente elas estão ganhando cada
vez mais espaço no mercado de trabalho e principalmente no cenário acadêmico, ficar restrita
aos cuidados do lar e dos filhos está se tornando um passado cada vez mais distante e
incogitável. Segundo Carvalho (2011, p. 150),
atualmente, percebe-se uma mudança muito grande no perfil das mulheres,
que antigamente realizavam apenas tarefas tradicionais, como cuidar da casa
e dos filhos. Elas estão competindo de igual para igual com os homens e
estão correndo atrás do tempo perdido. Trabalham fora e realizam ainda as
tarefas tradicionais, além de serem mãe e esposa. Tudo isso graças às lutas
dos movimentos feministas a partir da década de 70, envolvendo a entrada
feminina nas decisões políticas e de seus interesses na agenda
governamental.
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Ultimamente a mulher tem ganhado um destaque semelhante àquele dado aos homens.
Além disso, alcançam cada vez mais os mesmos direitos, garantidos por lei aos homens,
sendo um deles o acesso à educação, principalmente no nível superior, que antes lhe era
negado. Entretanto, se obtiveram a possibilidade de acesso à educação, foi por meio de um
intenso combate iniciado há muito tempo. Quebraram barreiras, foram persistentes e não se
deixaram levar pela influência machista que a sociedade tenta inculcar nas pessoas. Hoje
sabem impor seus pensamentos, seu entusiasmo e principalmente seus valores. Estão
conquistando aos poucos o seu merecido espaço, talvez ainda pequeno, mas em constante
desenvolvimento e progressão.
Infelizmente, quando se trata de sociedade, essas conquistas não significam
exatamente a equidade de gênero, pois ainda percebe-se a permanência de pensamentos
preconceituosos, que insistem em diminuir o valor da mulher e de suas conquistas.
2.1 Múltiplas identidades da mulher e seus diferentes papéis
O termo identidade vem assinalando acerca daquilo que é idêntico, onde a ideia de
essência que aqui é compartilhada, ou seja, expressa o que somos de verdade. Segundo
Moreira (2008, p. 1-2),
em termos políticos, a ênfase na identidade deriva do reconhecimento de que
certos grupos sociais têm, muito, sido alvos de inaceitáveis discriminações.
Entre eles, incluem-se os negros, as mulheres e os homossexuais. Tais
grupos têm se rebelado contra a situação de opressão que os têm vitimado e,
por meio de árduas lutas, têm conquistado espaços e afirmado seus direitos à
cidadania. Com muita tenacidade, têm contribuído para que se compreenda
que as diferenças que os apartam dos “superiores”, “normais”,
“inteligentes”, “capazes”, “fortes” ou “poderosos” são, na verdade,
construções sociais e culturais que buscam legitimar e preservar privilégios.
Portanto, percebe-se que as mulheres procuram, por meio de movimentos de luta, a
busca incessante por direitos iguais, mostrando que todos, enquanto humanos, somos
merecedores dos mesmos direitos e deveres, e que não há lógica em considerar um ser inferior
e outro superior.
Ao longo dos anos, depois de muito persistirem e batalharem, as mulheres
conseguiram sua entrada no mercado de trabalho. Essa inserção possibilitou a aquisição de
novos espaços na sociedade, onde cada vez mais foram estimuladas e condicionadas a
assumirem múltiplos papéis. Segundo Back et al. (2012, p. 329);
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a sociedade fez com que a mulher assumisse vários papéis, como ser
trabalhadora, dona-de-casa, mãe e ainda deve seguir os padrões da moda
imposto pela mídia, pois até para conseguir um bom trabalho, as mulheres
devem se vestir como as empresas esperam que elas se vistam.
Visto que suas obrigações como donas de casa, mães e esposas ainda são consideradas
como questões culturais, naturais e de competência feminina, as mulheres já assumem
também outras funções, como a de estudantes e trabalhadoras. Para as que são mães, esposas
e por consequência, donas de casa, cuidar dos filhos, da casa e do marido requer muito de seu
tempo e disposição, no entanto apesar dessa correria cotidiana, as mulheres conseguem dar
conta de todas as funções que lhe são impostas. Portanto percebe-se que ser mulher não é
nada fácil, tendo em vista as múltiplas obrigações que desempenham e que são atribuídas a
elas como obrigação.
2.2 O contexto da universidade e a vida acadêmica
O acesso da mulher à universidade aconteceu pela primeira vez no ano de 1837 nos
Estados Unidos, em uma universidade exclusiva para elas. Antes a mulher era invisível na
área educacional por isso seu ingresso aconteceu tardiamente. No Brasil o público feminino
só teve esse acesso no final do século XIX, onde a primeira mulher a adentrar a universidade
foi uma baiana, no ano de 1887, cursando medicina.
Segundo Ávila e Portes (2009, p. 92) “ao contrário do que ocorreu no passado da
história das mulheres no Brasil, quanto ao acesso ao ensino superior lhes foi, durante tanto
tempo, negado, atualmente, as mulheres são maioria nesse segmento de ensino no país”. Por
mais que a mulher tenha conseguido entrar na universidade, ainda existem diversos problemas
que as impedem ou atrapalham seu pleno desenvolvimento, atentando ao fato de que na
maioria das vezes elas se formam em cursos considerados majoritariamente femininos, tais
como Pedagogia, Letras, Enfermagem, enquanto que o homem ingressa na universidade para
cursar Medicina, Direito e Engenharia, cursos considerados de maior valor e relevância. De
acordo com Queiroz (2001, p. 195), isso acontece por causa,
da expectativa da sociedade, em geral, e do grupo familiar, em particular,
agindo sobre a mulher desde muito cedo, direcionam suas escolhas para o
que é esperado como o papel feminino. Assim, não é difícil compreender
porque, num mundo em que a participação da mulher é cada vez mais ampla
e num espaço onde elas estão representadas quase que nas mesmas
proporções que os homens, sigam se distanciando das atividades
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tradicionalmente desempenhadas por homens e busquem, ainda hoje,
carreiras identificadas com as atividades do mundo privado, aquelas
reconhecidas como “tipicamente femininas”.
Mas felizmente, elas já estão conseguindo percorrer por outros seguimentos de maior
significação, não que os cursos acima citados e em grande parte das vezes optados por elas,
não tenham relevância, mas é preciso acabar com qualquer resquício de segregação entre os
públicos femininos e masculinos. De acordo com Ávila e Portes, (2009, p. 95),
Em 2005, na área da saúde, as mulheres ingressantes só não representam a
maioria no curso de Educação Física. Levando-se em consideração todos os
cursos de Medicina do país (independente da colocação geral do número de
matrículas), as mulheres são maioria dos ingressantes, mas não dos
concluintes. Em outros anos, a porcentagem de mulheres chega a ser
ligeiramente superior, como no caso do Espírito Santo em 2000 (50,4%), do
Pará e do Rio de Janeiro em 2005, com 51,1% e 51,2% de mulheres,
respectivamente. Quando não são maioria, a distância entre os pontos
percentuais que separam os homens das mulheres é muito pequena (com
média de 47% das mulheres nesses cursos).
As mulheres ainda encontram dificuldades para permanecerem na universidade,
considerando que a vida universitária exige que os estudantes tenham um elevado nível de
dedicação e isso demanda tempo para aplicar-se aos estudos. Na vida cotidiana ocorre de
forma semelhante, elas se ocupam da casa, dos filhos e maridos e, muitas delas não encontram
apoio familiar para permanecerem na universidade e muito menos quem as incentive a ir
além, isto acaba gerando um baixo número de donas de casas que conseguem a permanência
no espaço acadêmico.
Durante uma busca pela biblioteca do Campus XII da UNEB, no período de maio a
junho de 2015 foi encontrada uma monografia cujo tema era: Gênero e currículo na escola:
presença e desafios, desenvolvida pelas alunas Angélica de Almeida e Rafaela Moreira dos
Santos, na cidade de Guanambi no ano de 2013. O trabalho de TCC evidenciava que,
a mulher tem conquistado crescentes espaços que eram dominados pelo
homem, a partir de lutas dos movimentos de mulheres diante das novas
configurações sociais que desenham no mundo, principalmente a partir do
final do século XX. É perceptível que, apesar das conquistas alcançadas, há
muito que se avançar nas discussões relacionadas ao gênero, principalmente
quando diz respeito à questão da mulher, com atenção especial as discussões
no âmbito educacional que ainda são tímidas. (CARVALHO e SANTOS,
2013 p. 33).
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Então, observamos que apesar dos avanços que vemos dia após dia, ainda são muito os
desafios que as mulheres se deparam para conseguirem o sucesso naquilo que diz respeito ao
ingresso e principalmente a permanência no cenário acadêmico, para tanto sugerimos a elas
uma conscientização acerca de seus direitos e uma força motivadora que as ajude a continuar,
mesmo diante de tantos empecilhos, impostos pelo patriarcado.
2.3 Políticas públicas educacionais para a mulher: trajetória histórica e suas
contribuições para a causa feminina
Como um processo construído historicamente, o que se entende é que até se chegar na
implementação de políticas públicas muitas lutas foram traçadas, e foi graças a elas que
muitos direitos foram conquistados.
No tocante à educação, o primeiro avanço feminino foi, ainda que tímido, conquistado
durante o período colonial, onde as meninas começaram, ainda que de forma coadjuvante, a
adentrar os espaços das escolas, no entanto com uma educação diferenciada, mais focada para
questões do lar e do cuidado com a família, ao passo em que os meninos eram instruídos nas
ciências, como matemática, história, leitura e escrita, outro ponto que merece destaque é o
fato de que os colégios que ofertavam a educação feminina eram quase que totalmente
particulares, o que significava que somente as moças de família com poder aquisitivo mais
elevado é que tinham a garantia do acesso à escolarização.
Foi no ano de 1880 com a fundação da Escola Normal na Corte do Rio de Janeiro que
começou a acontecer o ingresso feminino no ensino público, onde professoras formadas pela
Escola Normal, em sua maioria filhas de fazendeiros influentes, começaram a ensinar crianças
e adolescentes do sexo feminino e das camadas populares. Já em relação às províncias, foi
após a Reforma Constitucional descentralizadora que se garantiu a gratuidade da educação
primária, tanto para meninos quanto para meninas, e a partir disso as escolas normais abriram
suas portas de vez à população escolar feminina menos favorecida.
É no século XIX também que surgem as primeiras manifestações do movimento
feminista no Brasil, que saem em defesa dos direitos da mulher, quanto à sua educação,
profissionalização e voto, mas é só após as conquistas dos direitos civis, no ano de 1930, que
as condições de igualdade das mulheres foram de fato legalizadas. É depois da aquisição
desses direitos que a educação de forma “igualitária” começa a ser ofertada para as mulheres,
onde os conteúdos de seu ensino deixam de ser aqueles voltados para as aptidões familiares e
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domésticas e tornam-se profissionalizantes, de forma a proporcionar à mulher uma educação
semelhante àquela dada ao homem.
No entanto percebeu-se que somente implementar leis não era suficiente para
modificar a estrutura social machista e patriarcal que dominava, e ainda domina, a sociedade,
era preciso a realização de um trabalho mais profundo que realmente intuísse agregar
transformações à sociedade.
Analisando uma obra de Souza (2008), que trata da trajetória histórica do acesso
feminino ao ensino superior, descobriu-se que os primeiros casos de mulheres a cursarem essa
modalidade de educação aconteceram primeiramente nos Estados Unidos, no ano de 1837,
com a criação de universidades exclusivas para as mulheres. Aqui no Brasil, ainda de acordo
com Souza (2008), o primeiro episódio é datado do final do século XIX, no ano de 1887, com
a formatura de Rita Lobato Velho Lopes na Faculdade de Medicina na Bahia, que concluiu
seu curso em 10 de dezembro de 1887, após defender sua tese sobre a operação cesariana,
onde formou-se com a seguinte ressalva “primeira mulher diplomada em Medicina no Brasil,
1887”.
Graças à grande expansão da universidade que ocorreu no ano de 1970, é que o
mulheril de fato começou a fazer parte, de forma significativa, do ensino universitário no
nosso país. Percebendo-se que foi a partir do ingresso das mulheres nas universidades que o
ensino superior conseguiu se ampliar no Brasil, movido por essa expressiva e crescente
demanda feminina.
Atualmente, no que diz respeito às políticas públicas voltadas para o ingresso e
principalmente permanência da população feminina na universidade, o que se pode afirmar,
de acordo com a visão de Silveira (2004), é que até o momento muitos avanços foram
conseguidos, no entanto muitas dessas políticas ainda se apresentam de forma deficiente,
deixando a desejar em muitos aspectos, como real efetivação, melhor dinâmica e abrangência.
Fazendo-se necessário expor acerca de quais políticas nos referimos, sendo elas, a licença
maternidade; o direito à realização de atividades domiciliares em decorrência de gravidez e o
direito das mães universitárias a matricular seus filhos em creches ofertadas exclusivamente
para elas.
No tocante à licença a maternidade o que se sabe é que a lei garante que a partir do
oitavo mês de gestação e durante os três meses seguintes a estudante, em estado de gravidez,
será auxiliada pelo regime de exercícios domiciliares, instituído pelo decreto Lei nº 1.044, de
21 de outubro de 1969, em conjunto com a Lei nº 6.202, de 17 de abril de 1985, exclusiva
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para gestantes. Durante o período de amparo da lei a aluna não será obrigada a assistir aulas
em sala, mas seus professores podem passar exercícios que deverão ser realizados em casa,
são os chamados exercícios domiciliares.
Sobre as creches é preciso explicar que os primeiros esboços dessa lei foram
primeiramente definidos pela Constituição de 1988, que atribuía ao Estado o dever de ofertar
às crianças de 0 a 6 anos de idade, matrículas equivalentes ao número demandado. Essa
reivindicação merece destaque uma vez que o maior percentual de mulheres que engravidam é
de jovens em idade universitária, onde muitas delas, pressionadas pelo novo momento
materno, pelas tarefas domésticas e ainda pelo trabalho e família, acabam tendo que optar
entre cuidar de seus filhos ou estudar. Isto porque, como já foi dito anteriormente, ainda não
há a real efetivação e distribuição das políticas públicas, e grande parte das reitorias e dos
governos não procuram ofertar as condições para que essas jovens tenham as ferramentas
necessárias para conseguir conciliar a vida acadêmica com a vida doméstica. Segundo Raupp
(2002, p. 150),
As creches nas universidades federais surgem no percurso de luta intensa por
creches na década de 1970, processo desencadeado pelos movimentos
sociais e liderado pelas mulheres trabalhadoras, feministas, empregadas de
empresas públicas e privadas, e pelos sindicatos, que reivindicavam o
atendimento à criança na faixa etária de 0 a 6 anos.
Dessa maneira, percebe-se que essa reivindicação não é atual, mas vem se arrastando
desde o ano de 1970, sempre com a intenção de oferecer às crianças e mães os meios
necessários para, de um lado, permanecer na universidade e de outro estudar com qualidade.
Desde que as primeiras políticas públicas focadas na mulher foram implantadas, no
ano de 1984, através de iniciativas do Conselho Estadual da Condição Feminina e a partir da
criação do Centro de Orientação e Encaminhamento Jurídico, da Procuradoria de Assistência
Judiciária (COJE), em 1984, elas têm sido orientadas pelo Plano Nacional de Políticas para as
Mulheres, o PNPM, que tem como intuito principal questionar a permanência dos papéis
tradicionais atribuídos a mulher, dentro do espaço doméstico, que perpetuam a divisão sexual
do trabalho centrada no desempenho delas nas características de esposas, mães, e donas de
casa. Isto é, a mulher fica limitada ao cenário doméstico, que pouco contribui para a conquista
de sua autonomia, uma vez que não têm a liberdade de decidir quais espaços desejam ocupar,
pois estão presas à algumas funções que lhes foram impostas.
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Desse modo, o que ficou evidente é que é de extrema importância que as pessoas
sejam conscientizadas acerca da necessidade de incorporar em suas atitudes rotineiras o ideal
de igualdade entre homens e mulheres. Para isso, é fundamental ainda que se busque romper
com esse o modelo de sociedade vigente, que ainda está pautada no machismo e que fecha os
olhos para a situação de desigualdade que as mulheres enfrentam. Assim, compreendemos
que a mulher deve ter direito à educação de qualidade para que consiga condições, cada vez
melhores, de conquistar seus merecidos espaços na sociedade, sejam eles no campo político,
administrativo, educacional e social.
3 Considerações finais
Já assinalamos que os serviços de “cuidar”, dos filhos e da casa, são considerados
“próprios” das mulheres, de sua “natureza feminina”. Na interpretação de Tedeschi (2008, p.
25), “o uso da natureza traz implícita uma diferenciação que está na formação cultural de
homens e mulheres, está ligada aos afazeres domésticos, tarefas que são culturalmente
impostas e atribuídas ao sexo feminino”.
Notamos que as oportunidades de estudo nunca foram iguais entre os meninos e as
meninas. No momento de estudar, eles são privilegiados, enquanto elas sofrem com a
colocação de obstáculos que é uma realidade histórica que deve ser analisada pelas categorias
classe, gênero, geração, etnia, uma vez que pensar o gênero implica também entender essas
outras categorias.
As relações de gênero não podem ser entendidas como um fato isolado na sociedade,
pelo contrário, elas são constitutivas de toda realidade, pois o modelo paradigmático de ser
homem e ser mulher regula todas as nossas ações. Esse processo é insistentemente mostrado
nos estudos de gênero, quando retratam as inúmeras tentativas dos homens (pais e/ou
maridos) em impedir as mulheres de frequentar à escola; ainda do esforço de incumbir nelas
as responsabilidades com a vida doméstica para poupar os homens dos problemas presentes
no cotidiano familiar; e das funções que desempenham como mães e trabalhadoras ao lado
dos maridos, apesar de sua força de trabalho não ser reconhecida como geradora de renda ou,
quando reconhecida como secundária, sendo que em muitos casos é a renda mantenedora
familiar.
Observamos que os conceitos de ser homem e ser mulher são construídos socialmente
na cultura em que estão inseridos. Seguindo essa ideia, ensinam-nos desde a infância como
devemos ser e nos portar, como homens ou mulheres, para sermos socialmente aceitos.
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Segundo a nossa cultura, temos um ideário de que as mulheres são sensíveis, dóceis, amáveis,
frágeis, gentis e cuidadosas, ocupando-se, sobretudo, do privado, da família, das “coisas” de
mulher, principalmente com o cuidado do outro; e os homens fortes, inteligentes, racionais,
competitivos, provedores, ocupando-se do público, preparados para ordenar.
De acordo com Touraine (2007) constatamos que apesar das mulheres serem atingidas
por desigualdades e violências, nos últimos anos elas se julgam mais responsáveis do que
submissas, mais livres do que dependentes, manifestando, ainda, sua intensidade de viver, sua
capacidade e vontade de agir para existirem em melhores condições, demonstrando, com isso,
que são agentes ativas, tornando-se produtoras de uma organização social de ideologias,
deixando de lado a posição de consumidoras do produto do homem, e, assim, superando e
sobrepondo-se à condição de vítimas em que muitas vezes são relacionadas.
Com isso, percebemos que os avanços e as conquistas das mulheres são significativos,
produzindo resultados na vida de grande parte delas, pois, com as conquistas já alcançadas, as
mulheres já estão legitimadas a defender seus direitos, o que as impulsiona para a conquista
de novos espaços e do “empoderamento”, tanto dentro quanto fora do lar.
Referências
ALVES-MAZZOTTI, Alda Judith; GREWANDSZNAJDER, Fernando. O método nas
ciências naturais e sociais: pesquisa quantitativa e qualitativa. 2. ed. São Paulo: Pioneira,
1999.
ANDRADE, Silva Vieira; SANTOS, Helena Miranda. Gênero na psicologia: articulações e
discussões. – Salvador: CRP-03, 2013.
ÁVILA, Rebeca Contrera; PORTES, Écio Antônio. Notas sobre a mulher contemporânea no
ensino superior. Mal-Estar e Sociedade - Ano II - n. 2 - Barbacena - jun. 2009 - p. 91-106.
Disponível em: <http://www.uemg.br/openjournal/index.php/malestar/article/view/13/41>.
Acesso em: 10 de junho de 2016.
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i As autoras do trabalho são graduandas do IV semestre do Curso de Pedagogia na Universidade do Estado da
Bahia, Campus XII. Participam da linha de pesquisa “Educação do campo, educação de jovens e adultos e
movimentos sociais”, vinculada ao Núcleo de Estudos, Pesquisa e Extensão Paulo Freire (NEPE). ii Doutora e Mestre em Educação pela FAE/UFMG. Professora Assistente da Uneb, Campus XII. Coordenadora
do Núcleo de Estudos, Pesquisa e Extensão Paulo Freire (NEPE), pesquisadora da linha “Educação do campo,
educação de jovens e adultos e movimentos sociais”. Professora da disciplina “Educação de Jovens e Adultos”
do curso de Pedagogia.