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Música em Contexto http://periodicos.unb.br/index.php/Musica O Padre José Maurício Nunes Garcia: um embranquecimento historiográfico Pedro Razzante Vaccari Universidade do Estado de São Paulo ORCID: https://orcid.org/0000-0002-2492-9362 [email protected] Vaccari, Pedro Razzante. 2019. “O Padre José Maurício Nunes Garcia: um embranquecimento historiográfico”. Música em Contexto 13, no. 2: 53-70. Disponível em https://periodicos.unb.br/index.php/Musica/article/view/32057 . ISSN: 1980-5802 DOI: Recebido: 04 de setembro, 2019. Aceite: 27 de novembro, 2019. Publicado: 25 de dezembro, 2019.

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O Padre José Maurício Nunes Garcia: um embranquecimento historiográfico

Pedro Razzante VaccariUniversidade do Estado de São Paulo

ORCID: https://orcid.org/[email protected]

Vaccari, Pedro Razzante. 2019. “O Padre José Maurício Nunes Garcia: um embranquecimento historiográfico”. Música em Contexto 13, no. 2: 53-70. Disponível em https://periodicos.unb.br/index.php/Musica/article/view/32057.

ISSN: 1980-5802DOI:

Recebido: 04 de setembro, 2019.Aceite: 27 de novembro, 2019. Publicado: 25 de dezembro, 2019.

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O Padre José Maurício Nunes Garcia: um embranquecimentohistoriográfico

Pedro Razzante Vaccari

Resumo: Este artigo busca revisitar a historiografia sobre o compositor negro brasileiro Padre José Maurício NunesGarcia. O texto inicia com os primeiros escritos sobre o músico, por Manuel de Araújo Porto Alegre, seguidos pelaprodução de Taunay, Luiz Heitor, Rossini de Lima e Renato Almeida, considerados sob o viés romântico daMusicologia. Verificou-se como houve um velado ou às vezes um deliberado embranquecimento da figura do Padre,de modo a torná-lo mais palatável ao gosto da elite europeizada. Bruno Kiefer e Vasco Mariz, mais recentes, nãotrouxeram uma perspectiva diferente, porém acentuaram ainda mais esse clareamento, assim como Cleofe deMattos que, mesmo apoiada em fontes primárias, ainda mantém esse mesmo viés historiográfico.

Palavras-chave: Padre José Maurício Nunes Garcia. Historiografia. Musicologia. Embranquecimento.

Father José Maurício Nunes Garcia: a historiographic whitening

Abstract: This article revisits the historiography of the Brazilian black composer José Maurício Nunes Garcia. The textbegins with the first writings about the musician, by Manuel de Araújo Porto Alegre, followed by the production ofTaunay, Luiz Heitor, Rossini de Lima, and Renato Almeida, considered under the romantic bias of that Musicology. Inthose writings, there was a veiled or sometimes deliberate whitening of the figure of the composer, to make it morepalatable to the taste of the Europeanized elite. Bruno Kiefer and Vasco Mariz, more recent, did not bring a differentperspective, yet they further accentuated this clarification, as well as Cleofe de Mattos who, even supported byprimary sources, still maintains this same historiographic bias.

Keyword: Padre José Maurício Nunes Garcia. Historiography. Musicology. Whitening.

El Padre José Maurício Nunes Garcia: un blanqueamiento historiográfico

Resumen: Este artículo busca revisar la historiografía sobre el compositor brasileño negro Padre José MaurícioNunes Garcia. El texto comienza con los primeros escritos sobre el músico, por Manuel de Araújo Porto Alegre,seguido de la producción de Taunay, Luiz Heitor, Rossini de Lima y Renato Almeida, considerado bajo el sesgoromántico de la Musicología. Se verificó como se había velado, o a veces, deliberadamente blanqueado la figura delPadre, con el fin de hacerlo más agradable al gusto de la élite europeizada. Bruno Kiefer y Vasco Mariz, másrecientes, no aportaron una perspectiva diferente, pero acentuaron aún más este blanqueamiento, así como Cleofede Mattos, que, incluso con el apoyo de fuentes primarias, aún mantiene este mismo sesgo historiográfico.

Palabras-clave: Padre José Maurício Nunes Garcia. Historiografia. Musicología. blanqueamiento.

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Introdução

José Maurício Nunes Garcia (1767 – 1830) é,indiscutivelmente, um dos principais nomesna história da música no Brasil e o maisimportante de sua geração. Por isso, textosrecentes têm discutido o fato dehistoriadores do século XIX e XX tentarem, decerto modo, embranquecê-lo, sugerindouma mestiçagem que, possivelmente, podenão ter ocorrido. Em acordo com opensamento da época,

O “embranquecimento” torna-se o únicomeio à disposição do homem de cor desejosode fazer esquecer a “tara” de sua origemafricana, empreender uma ascensão social,adquirir certo peso econômico. Mas oprimeiro efeito desse comportamento é o deisolar no seio da sociedade o grupo bemcaracterizado dos mulatos de personalidadeambígua. (MATTOSO, 1981, p. 223).

Se era vedado ao negro qualquerreconhecimento como gente, ao “mulato” eao pardo – dois de seus desdobramentos –faziam-se, devido à sua parcela branca,algumas exceções.

Livros como o de Hofbauer, em “uma históriade branqueamento ou o negro em questão”(2006), mostram as diferentes acepções queos termos “negro” e “preto” possuem nahistória cultural e social do Brasil; como essasquestões semânticas, de significado e designificante, foram transmudando ao longodos anos; e como o branqueamentoestrutural, às vezes velado e às vezes nítido,foi se tornando cada vez mais presente nasociedade.

Já o texto de Krause (2006) faz uma reflexãosobre o fato de Machado de Assis ser um dosprincipais símbolos da literatura brasileira e

não ser considerado negro, verificando-se,inclusive, através da sua representaçãopictórica por meio de quadros em queaparece com traços bastanteembranquecidos.

A partir dessas premissas, tenho conduzidouma pesquisa sobre José Maurício NunesGarcia há algum tempo, resultando em doisartigos já publicados sobre o assunto. EmKerr e Vaccari (2019) procuramos mostrarcomo a hegemonia do europeísmo nomundo ocidental levou afrodescendentescomo José Maurício a se refugiarem emestilos que absolutamente não têm nada deafricano ou brasileiro.

Já em Vaccari (2018) inicio maisespecificamente a discussão sobre odeliberado clareamento do Padre, a exemplodo que houve com Machado de Assis.

O presente artigo, portanto, aprofunda asquestões postas em Vaccari (2018) sobre ocompositor negro brasileiro Padre JoséMaurício Nunes Garcia com o interesse deidentificar como ocorreu o processo velado,ou às vezes deliberado, de seuembranquecimento por parte deimportantes escritores de musicologiabrasileira. Essa premissa usa como suporteteórico as discussões acerca dobranqueamento do negro em Hofbauer(2006) e, mais especificamente, sobre oembranquecimento de Machado de Assis,abordado em Krause (2008).

Os primeiros escritos sobre José Maurício por Manuel Porto Alegre

Principio na figura de Manuel de AraújoPorto Alegre (1806-1879). É de sua autoria a

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primeira menção historiográfica aocompositor que se conhece até o momento,no artigo “Ideias sobre música”, na revistaNitheroy, publicada em Paris em 1836, ouseja, seis anos após a morte de José Maurício.(Porto Alegre, 1836)

Analisando os escritos de Porto Alegre sobreJosé Maurício já se nota, sutilmente e àsvezes explicitamente, uma tentativa detornar o compositor mais claro, mais próximodo branco que do negro, sem dúvidaimbuído das ondas deterministaspseudocientíficas da época.

Que dor não sentiremos, voltando paranossa querida Pátria, olhando para o coro, enão vendo o braço de um Marcos, ou de umJosé Maurício commandando de um acenocento e cinqüenta artistas, que rompiam emmágico accordo um Gloria, um Credo! Comose poderá hoje executar a miserere, a Missade Santa Cecília, essa producção immortaldo Fluminence Mozart? (Porto Alegre 1836,180)

Repare que o primeiro a ser citado é MarcosPortugal, ou seja, o europeu caucasiano. Emseguida fala de José Maurício como se estefora um prodígio divino, um acontecimentoque suplanta o mundo terreal, para findar naexortação de sua imagem como “FluminenceMozart”. Dadas as devidas vênias aosexageros literários, ao comparar JoséMaurício com Mozart, o compositor brancoaustríaco, Porto Alegre não apenas quercolocar o Padre em pé de igualdade com ele,como, possivelmente, também dotá-lo dascaracterísticas que o europeu trazia:características culturais, sociais, e, por quenão, de etnia. Tornando-o branco como umMozart fluminense, retirava dele qualquerlaivo de sangue africano quer pudessepossuir.

A seguir Porto Alegre continua a destilar aenorme profusão de adjetivos e figuras delinguagem para exaltar a figura de JoséMaurício, findando seus encômios com oparágrafo abaixo:

José Mauricio, querendo compor a sua Missade requiam, cheio do sentimento christão, ainspirado do gênio, penetrou a campa damorte, meditou, e chorou sobre as cinzas dahumanidade, e cheio de terror, saindo,ajoelhou-se diante d'aquelle, que, sentadosobre o cimo da cupola estrelladadofirmamento, olha para a eternidade, esuplicou-lhe inspiração: o negro fel datristeza, e a lympha das fontes lacrimaesformaram-lhe a tinta com que escrevia taesnotas, que tanto tocam, e embebem n'almaaquella doçura de uma melancólicasaudade, que tanto afaga, e acaricia ocoração do homem sensível. (PORTOALEGRE, 1836, p. 181)

A escolha das palavras, psicanaliticamente,remete a ondas de pensamento doinconsciente. Após a imensa quantidade deenaltecimentos e hipérboles, Porto Alegreresolve sua descrição romanesca adjetivandoo “fel” de “negro” – e associando-o à “tristeza”.É comum encontrarmos a cor negraassociada a fel, tristeza, melancolia1, mauhumor – principalmente no Romantismo2.Entrementes a comparação deliberada de umsentimento de angústia a um nome querepresenta toda uma etnia parece, não àépoca, mas atualmente, extremamentepejorativo, quase racista se tratando de uma

1 É interessante notar que a etimologia da palavra melancolia remete à “bílis negra” , um dos quatro fluidos corporais, junto ao sangue, fleuma e bile amarela, presentes em textos do “antigo sistema hipocrático-galênico dos quatro temperamentos que identificam nas qualidades psicossomáticas as determinações do comportamento” (Silva 2008).

2 Há o “sentimento que norteava o romantismo do inglês Lord Byron, o spleen, é que eu relacionava diretamente ao sentimento de melancolia do negro africano, o banto” (Lima 2002, 31).

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personalidade negra. Portanto além dedesejar traçar um perfil de um José Mauríciovienense, Porto Alegre tenta impingir-lhe apecha de um personagem romântico.

A próxima publicação seria apenas no ano de1850, quando Porto Alegre escreve umaresenha publicada na revista Guanabara, arespeito da coleção de peças compostas pelofilho de José Maurício, o Dr. José MaurícioNunes Garcia, intitulada “Mauricinas” (Garciaet al. 1949). Essa coleção de peçasacompanha também o retrato do Padre JoséMaurício feito por seu filho, o Dr. JoséMaurício, talvez o retrato mais famoso docompositor. Conforme desenvolvo mais afrente, essa representação mauriciana,embora seja a capa de muitas biografias docompositor, mostra o Padre bastanteembranquecido e com os traços negros“suavizados”. Destarte pontua Porto Alegre:

[…] o retrato que acompanha a obramusical também é de sua feitura; e apezar dealgumas incorrecções ligeiras de rigorososprincípios da arte de desenhar, não deixa deestar próprio, e de ter merecido aapprovação geral de quantos (o)conheceram […]. (Porto Alegre 1850, 333).

Mais uma vez aqui, como em muitas fontesprimárias, precisamos ter confiança àspalavras do narrador, sem saber ao certoquem seriam esses que supostamente“conheceram” José Maurício. A mesmadificuldade de se ater ao prisma do escritor,que muitas vezes pode confundir nossapercepção da realidade – o que éplenamente impossível de resolver, estandoo objeto deste estudo morto há mais de 250anos.

Essa mesma perspectiva dominaria ahistoriografia sobre José Maurício durante oséculo XIX e quase todo o Século XX. Assim é

constituído o artigo “Apontamentos sobre avida e a obra do Padre José Maurício NunesGarcia”, também de Porto Alegre, publicadona revista do Instituto Histórico e GeográficoBrasileiro, em 1856, que é possivelmente oprimeiro artigo de que se tem notíciaversando apenas sobre José Maurício.

Neste artigo mais uma vez vemos ManuelPorto Alegre imbuído de seu espírito antesalvissareiro e elogioso ao Padre, com suaescrita habitual de pormenores idílicos,surreais e platônicos. Logo ao final daprimeira página ele escreve que JoséMaurício, “pelo lado paterno descendia deuma familia estabelecida em Irajá, e pelomaterno de uma crioula de Guiné” (PortoAlegre 1856, 1). O termo “crioulo” eraamplamente disseminado, à época, paradesignar negros escravos no então chamadoNovo Mundo – as Américas. A discriminaçãosofrida por conta de sua descendência ficaem evidência na seguinte passagem, ondeele diz que o Padre,

a despeito da sua côr mixtiça, era toleradona côrte, n'essa côrte onde o auto denascimento formava o maior merecimentodo homem, dava direito a todas assympathias, e onde o ser Brazileiro, emormente mulato, bastava para alienar de sitodos os favores, e muitos direitos. (PortoAlegre 1856, 3)

Porto Alegre termina o artigo, entretanto,sustentando a sua tese de que José Maurícioera mestiço. Tece a primeira descriçãopormenorizada do compositor:

Foi José Mauricio um homem de estaturamais que ordinaria; tinha uma physionomianobre, um olhar penetrante, e luminosoquando regia a orchestra, ou fallava da arte;as dimensões e saliencias osseas do seu todo,mostravam que havia sido de uma forteconstituição. Tinha nos labios, na fórma do

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nariz, e na saliencia dos pomolos oscaracteres da raça mixta. (Porto Alegre 1856,7)

No parágrafo seguinte Porto Alegre desvela opseudocientificismo da época, ao apontarque um médico que examinara a máscaramortuária de José Maurício havia concluídoser de ser humano inferior – uma das teoriasdo século XIX era de que a forma do crâniodeterminava a inteligência. Porto Alegrecontradita-o, dizendo que na verdade “é omiolo” que identifica a suposta“superioridade” ou não do cérebro. Nas suaspalavras:

O dr. Dannessy, phrenologista e discípulofanatico de Gall, possue uma cópia damascara acima referida no seu gabinete emParis, mas nas suas indagações enganou-seredondamente, o que bem prova a respeitodo cerebro e suas protuberancias externas,que as mais das vezes o miolo é quem decidee não a casca. Estes enganos do mesmodoutor se repetiram em outras vezes nalegação brazileira, depois de haver apalpadoum grande numero de cabeças brazileiras.(Porto Alegre 1856, 7)

Vemos por esse texto que a visão enviesadaprocurava distorcer as evidências científicasmesmo dentro da Medicina, objetivandocom isso dar um lastro à pérfidasuperioridade caucasiana. As mesmas teoriasque corroboravam a escravidão, amanutenção dos negros em estado demiséria extrema, solapavam sua dignidade eexistência com uma ciência duvidosa (Hazan2009).

Os textos de Taunay e Luiz Heitor

A mesma visão romântica de Porto Alegrenortearia outros dois de seus grandesbiógrafos, o Visconde de Taunay (1843-1899)

– nobre, músico, engenheiro militar,sociólogo e historiador brasileiro – e LuizHeitor (1905-1992), musicólogo brasileiro.

O Visconde de Taunay produziria a maisextensa e completa biografia de JoséMaurício até aquele momento, e que, pormuito tempo, foi a fonte quase única parapesquisadores e musicólogos seaprofundarem em sua vida e obra. Suabibliografia é composta por três obrasfundamentais: um pequeno esbocetobiográfico, de 1897, que também compôs aintrodução à edição do Réquiem parasolistas, coro e orquestra do mesmo ano(Taunay 1897). Nele, Taunay refere-se a JoséMaurício como “fructo unico do legitimoconsorcio de Apollinario Nunes Garcia,natural da ilha do Governador, e de VictoriaMaria da Cruz, do bispado de Marianna(Minas Geraes), ambos de côr, esta filha ouneta de uma negra da Costa d’Africa (Guiné)”.(Taunay 1897, 1)

Observe que não havia, logicamente, apreocupação corrente de cuidado com osindivíduos de etnia negra, recém-alforriadosda escravidão – em 1888. Chamava-se depessoas “de cor”, o que em si já encerrava opreconceito nem ao menos velado. Tambémpercebemos a falta de atenção científica –parece que tanto faz se sua mãe Vitória erafilha ou neta de uma negra da Guiné,denotando pouca ou nenhuma preocupaçãoantropológica.

Ao final dessa pequena biografia Taunaydescortina, em um longo parágrafo, aconcepção – provavelmente de seu tempo –de que a “verdadeira” e “genuína” música seriaa germânica. Ao dividir a obra do Padre emduas fases – Cleofe Person de Mattos adividiu em três – Taunay descreve a primeira,mais longa, como de “máxima valia e pureza,

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oriundo da genuína fonte germânica”.(Taunay 1897, 3)

Com relação à segunda, no entanto,argumenta ser “já de adulteração edecadência, devido à influência do maugosto e da escola italiana”. Ora, se não é umadiscriminação com a música italiana, frente àsupervalorização da música alemã, nomínimo é uma afronta ideológica de cunhoracista. O próprio adjetivo “genuíno” e osubstantivo “pureza” reiteram uma tendênciade enfatizar os traços europeus caucasianosassociando-os, historicamente, à candura,jovialidade, dons divinos e angelicais. Parafechar o texto com a reafirmação do que foiexposto ao longo dele, Taunay elabora umparágrafo onde disserta, sem delongas, suaintenção de “clarear” o Padre José Maurício:

Era José Mauricio de estatura bastanteelevada, physionomia expresiva, intelligente,olhar penetrante, mas em extremo bondoso,côr amulatada para o claro, um tantoarroxeada na commissura dos labios, maçãsdo rosto salientes, testa larga, comaccentuado lobinho do lado direito, nosultimos annos de vida. (Taunay 1897, 3)

Interessante notar como há uma pressa emse alcunhar a sua etnia como sendo de “coramulatada para o claro”. Essa observaçãomostra como era importante “deixar claro” onegro que era personalidade no século XIX –como fizeram com Machado de Assis, àmesma maneira.

Na sua obra Dous artistas máximos – JoséMauricio e Carlos Gomes, publicada em 1930,Taunay, logo ao princípio, destaca seu intuito,já verificado no esboceto biográfico, de“germanizar” a figura de José Maurício.

Louvável com certeza foi o ímpeto de Taunayde tentar consagrar o nome de José Maurício,ao clamar pela publicação integral de sua

obra – no entanto o custo disso é que podeser considerado alto. Em determinado trecho,quando disserta a respeito da partitura daMissa em si bemol maior de José Maurício,que Taunay teria deixado aos cuidados docompositor Alberto Nepomuceno (1864-1920) o musicólogo arremata: “E dellas sahiua peregrina perola para sempre limpa dasimpurezas que a cercavam, sem lhealterarem, nem de leve, a candidez e a valia”.(TAUNAY, 1930, p. 48)

Observe como os vocábulos empregadossempre se relacionam à limpeza, ou a tornarpuras determinadas partituras, ou então aconstante menção a cores brancas, cândidas,que viriam extirpar da tez e da epiderme assuas impurezas, os seus sinais negros ouqualquer coisa que remetesse a negritude.No resto do livro há a utilização dessevocabulário – “sombrio” e “obscuro” setratando de momentos musicais tensos emJosé Maurício, e “clareza” e “candura” quandocita uma passagem que lembra a músicagermânica (Alemanha/Áustria).

Em sua outra obra, Uma grande glóriabrasileira José Maurício Nunes Garcia,também publicada postumamente em 1930,há, logo ao princípio, passagem em queMarcos Portugal “empalidece” ao sercomparado com José Maurício: “Veja bemque o Principe costuma chamal-o o novoMarcos. Empallideceu de despeito o autor doDemofoonte, inclinou-se e despediu-se”.(TAUNAY, 1930, p. 17) O fato de um brancoportuguês empalidecer defronte a umapossível equiparação com um negrobrasileiro pode ser uma espécie de tentativade, tornando-se ainda mais branco, reiterarsua suposta ‘superioridade’. Um brancopálido seria ainda mais superior a um negro?Claro que, como foi supracitado, essesmusicólogos escreviam de formas

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romanescas e criativas, traçavam perfis quebem se acomodassem aos moldes do séculoXIX. Porém, é imprescindível que se mostrecomo houve um trabalho, deliberado ou não,de aproximar José Maurício de um brancoeuropeu, quiçá para valorizá-lo comosímbolo nacional – lembrando que o séculoXX começava, e em breve o Nacionalismoprecisaria de símbolos, de bandeiras e depersonalidades carismáticas. O mesmoprocesso de embranquecimento afetou, alémde José Maurício e Machado de Assis,também o compositor negro Carlos Gomes.

Mais à frente ainda Taunay reafirma seugermanismo ao dizer que até 1811 em suaobra o Padre havia sido “absolutamentepurista allemão” no modo de ser e de compore pôde entregar-se, sem constrangimento deespecie alguma, a todos os surtos do seuestro e das suas inclinações”. (Tanyau 1930,87).

Curioso que para Taunay o fato de JoséMaurício tornar-se exímio e autêntico puristaalemão seria absolutamente natural – umnegro provindo dos trópicos compondo feitoum austríaco do século XVIII, ainda quepudesse ser perfeitamente normal à época,não constitui exatamente uma originalidadede composição, mas antes um arremedocolonialista.

Com diversas contradições continua o textoTaunay, ora denominando José Mauríciomulato, ora mulato quase negro. Sempre ocontrastando com Marcos Portugal, à modacinematográfica de Mozart e Salieri dostrópicos, coloca que o compositor português“acreditára que bastaria a sua simplespresença para fazer escurecer, senão destruirradicalmente o prestigio do timido JoséMauricio”. (Taunay 1930, 102). Aqui o verbo“escurecer” adquire conotação injuriosa,

defectiva, como se estivesse o implícito que“escuro” significaria algo de extrema pobreza,miséria, torpeza e desprovido de valor. Alémde que sempre estar presente a ideia de sujo,impuro – que seria, obviamente, aos olhos deTaunay, limpos e purificados pela escolaalemã de música.

Autores da primeira metade do século XX

Com praticamente os mesmos arroubosromanescos de escrita hiperbólica foi RenatoAlmeida (1895-1981), advogado, jornalista,musicólogo e folclorista. Em sua História daMúsica Brasileira, de 1926, dedica 13 páginasa José Maurício (Almeida 1926, 63-76). Aoexaltar as qualidades do Padre à maneiraexacerbada, semelhante a Porto Alegre eTaunay, Almeida vai ainda adiante, aoposicionar José Maurício dentro de um eixocivilizatório que ele próprio parece teresboçado:

Não era um barbaro, de inspiração frementee desordenada, como uma flor sylvestre eexuberante da terra nova e inculta, mas umcivilizado, de linhas sobrias e medidas, comum perfeito conhecimento de technicamusical, de composição e orchestração.(Almeida 1926, 68)

A visão colonial predominante é explícita:prevalece ainda, em pleno século XX, a ideiaum tanto equivocada de que havia ocontinente apolíneo – do Deus Apolo, daharmonia, beleza e candura – onde moravamos afetos cordiais, brandos e cortesãos, ouseja, a Europa Ocidental. E o outrocontinente, bárbaro, indomado, inculto,devasso e selvagem, o Novo Mundo, aAmérica – principalmente a América do Sul,de clima tropical e mais propícia a um

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espelhamento edênico por parte dosinvasores.

Assim como Taunay, Almeida pretendiacontinuar a germanização do Padre Maurício.Ao escolher o Réquiem de 1816 como a obrapor excelência do compositor,indubitavelmente exclama: “José Mauricio eraum filho exilado da música classica allemã esua ascendencia está no formidavel Bach, emMozart e em Haydn”. (Almeida 1926, 71).Afora a simples constatação de que não hánada de influência direta de Bach em JoséMaurício, o fato de querer equipará-lo aoscompositores germânicos só faz buscarigualar o que é inigualável – outras terras,outra população, outro idioma, outra históriae outra cultura fazem do Brasil um mundo àparte da Europa, ainda que busquem semprecopiar os estrangeirismos. Se ele compunha àmoda alemã era antes por sobrevivência, porestar demais ligado à Igreja e por umaaparente devoção à religiosidade intrínsecaao seu trabalho de Mestre de Capela.

O próximo a publicar sobre a vida e obra doPadre seria Mário de Andrade (1893-1945).Conhecido por suas críticas mordazes,responsáveis, em parte, por abalar areputação de compositores como HeitorVilla-Lobos (Salles 2018), Mário tratou daobra de José Maurício em ModinhasImperiais, no prefácio, ao relatar a respeitodas características das modinhas emodinheiros portugueses e brasileiros,afirmando que José Maurício era “mulato,filho de negra mineira filha de mãi Guiné edum brasileiro da ilha do Governador”(Andrade 1980 [1930], 5).

A seguir, em Música, doce música (1933),algumas passagens deixam entrever mais oromancista Mário do que o musicólogo:“Magro, alto, moreno escuro, olhar bem vivo,

lábios grossos, maçãs pontudas, narinascheias, José Mauricio trabalha, ensaia, ensinae compõe”. (Anrdade 2006 [1933], 122). Essesdetalhes físicos parecem ter se formadoquiçá da observância de retratos, como ofeito por seu filho José Maurício Nunes GarciaJr., aliados ao devaneio fecundo domodernista (“maçãs pontudas” soam maiscomo a descrição de um personagem fictíciode romance). Note que ele se refere a JoséMaurício como “moreno escuro”, e não negro– lembrando que o próprio Mário tinhaascendência negra.

Mário assevera que José Maurício era “filhode uma crioula mineira, Vitória da Cruz, porsua vez filha duma escrava da Guiné. O paiera branco, nascido na Ilha do Governador ese chamava Apolinário Nunes Garcia”.(Andrade 2006 [1933], 121). Considerando-o“moreno escuro”, aqui então considera ahipótese de o Padre ser filho de um branco –pela primeira vez na Historiografia Brasileira,sem, no entanto, citar quais as fontes seutilizaria. O deslize subconsciente, a meu ver,que Mário de Andrade comete nesse estudoé de afirmar, se referindo a Bach, que haviaum “formidável clarão (que) reinava aqui noBrasil, capaz de amar João Sebastião Bachentão inteiramente esquecido e ignorado naEuropa toda”! (Andrade 2006 [1933], 127).Seria esse “clarão” o mesmo que haviaacometido os musicólogos anteriores, queviam que faltava luz, claridade ebranqueamento na História da MúsicaBrasileira? Curiosa, destarte, é a assertiva aofim do artigo, em que Mário supõe que, sesobraram apenas as partituras do Padre quese conheciam à época, “só nos ficará quasi,um José Maurício mestiçado pelo desleixohumano”. (Andrade 2006 [1933], 130). Aquiparece o modernista se redimir da fraseanterior: teria, sob esse prisma, o Padre se

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tornado mestiço por um desleixo, umdescuido da humanidade? Ou fora realmenteum gesto deliberado de uma elite quegalgava, a todo custo, o embranquecimentoda população brasileira? Por fim, Máriodestila seu derradeiro preconceito à músicamauriciana ao afiançar que José Maurício“nem os arrebatamentos da humildade ou dapureza quis ter”3. (Andrade 2006 [1933], 131).

Posteriormente, temos a biografia “Vida eépoca de José Maurício”, de Rossini Tavaresde Lima (1941), uma espécie de romancesobre a vida do Padre – com detalheselucubrados e requintes nos pormenoresimaginados. O prefácio, no entanto, deBráulio Sánchez-Sáez, é o primeiro naMusicologia a considerar José Maurício comonegro, filho de negros:

Foi necessaria a simples e admiravel penadeste jovem Tavares de Lima, para que essemilagre aparecesse e a figura aparentementeinsignificante de um negro, filho de negrosmanchados pelo estigma da escravidãobrilhasse no que havia de consciência […](Lima 1941, 18).

Nesse texto fica claro o preconceito inerenteao pensamento da época, quando o autor,Sánchez-Sáez, utiliza a frase “figuraaparentemente insignificante de um negro”,como se um negro fosse, necessária enaturalmente, uma figura desprezível e dignade insignificância. Ou seja, mesmo quandoprocuravam suavizar a questão do racismo,os musicólogos da época findavam emilações preconceituosas, ainda queinconscientemente.

3 Não se sabe a que exatamente ele se refere, devido à sua escrita muito poética, todavia é de seesperar que a tal “pureza” fosse uma pureza germânica, também, uma pureza de elementos que quiçá subtraísse do Padre suas características mais brasileiras. Mas é só uma conjetura.

Apesar disso, pode ser considerada aprimeira biografia do Padre que o trata comohomem negro, filho de negros. A própriacapa (Figura 1) traz uma figura de um retratoraro, aparentemente de autor anônimo,representando José Maurício mais negro doque o retrato popularmente disseminado.

Fig. 1 – Ilustração de José Maurício Nunes Garcia nacapa do livro Vida e época de José Maurício (Lima,

1941).

Fig. 2 – O Padre José Maurício Nunes Garcia, pintadosob a perspectiva de seu filho, José Maurício Nunes

Garcia Jr. Nariz afilado, pele embranquecida e cabelosem cachos ou ondulações.

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Repare como nesta Figura 1 o Padre estárepresentado como autêntico negro –principalmente narinas e lábios. Bem distintaimagem daquela que se conhece de JoséMaurício de quase todas as suas biografiasposteriores (Figura 2).

O livro de Tavares de Lima não deixa,entrementes, de ter valor histórico: narradode forma similar à de um romance doRomantismo, começa como se fora umanovela de José de Alencar (1829-1877), aodescrever o relacionamento dos pais de JoséMaurício: “Apolinário está contente. E temrazão. Vitória, negra bonita e faceira, que eleconhecêra na reza, é sua esposa, peranteDeus e a lei”. (Lima 1941, 21)

Percebe-se que aqui já não há o pudor dereferir-se a seus pais ou ao Padre como‘mulatos’, ‘pardos’, ‘mulatos escuros’ ou‘mulato claro’, conforme vinha se fazendo naMusicologia desde o século XIX – finalmentesão retratados como negros.

Portanto constitui a obra de Lima um marcona Historiografia – pioneira ao extirpar aimagem de um José Maurício mulato claroou moreno escuro. O autor é o primeiro,também, a chamá-lo de ‘preto’:

Contudo, encontra logo três barreiras paravencer. A primeira é a sua côr. Preto naqueletempo não era gente. Quando se falava queum filho de negro desejava estudar, todos osbrancos ridicularizavam. (Lima 1941, 30)

Lima, dessa maneira, traçou um limiar, apesarde seu caráter por vezes romanesco efolhetinesco do século XIX. Pela primeira vezdesde Porto Alegre, um musicólogo sedebruça sobre questões raciais e sociais doRio de Janeiro mauriciano, sem redundar emamenizações raciais ou temperosembranquecedores – negros são negros e

brancos são brancos. “Passam-se os anos eele vai se tornando famoso, ainda que sejapreto, ainda que seja pobre”. (Lima 1941, 38)

Estranho fato ter passado essa obrapraticamente desconhecida da Musicologia –lembrando que só encontrei um exemplardeste livro, que teve apenas uma edição, naBiblioteca Mário de Andrade, em São Paulo,disponível apenas para consulta.

Luiz Heitor (1905-1992), contemporâneo deLima, no entanto é bem mais difundido, adespeito de quase nada ter contribuído parao incremento das pesquisas sobre JoséMaurício. Na revista Ilustração musical de1930, escreve que os pais do Padre eram“gente de côr; seus avós haviam sidoescravos. Elle mesmo era mulato claro. Epauperrimo”. (Heitor 1930, 75). Aqui retoma-se a prática do clareamento de José Maurício,com informações, no mínimo, conflitantes, oque nos faz, obviamente, questionar comopais negros puderam gerar um filho mulatoclareado?

Em Música e Músicos do Brasil (Heitor 1950),surge, entre relatos pormenorizados eanálises de obras musicais de José Maurício,a utilização do termo “obscuro” (p. 109), paradesignar o Rio de Janeiro colonial, que seriaentão ermo de incentivos culturais, segundoo autor. A narrativa é conduzida ao ponto emque ele afirma:

Para bem compreendermos o que representade esforços, de clara e admirável energia essainstrução dada a um menino pobre e de côr,precisamos lançar os olhos sôbre o meio emque vivem nossos personagens. (Heitor 1950,110)

Nessa acepção, Heitor identifica o racismoestrutural da época, reconhecendo queseriam precisos “esforços de clara e admirável

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energia” para que houvesse a ascensão de“um menino pobre e de cor”. Todavia, esseesforço em reconhecer os méritos do jovemJosé Maurício frente a uma sociedade que“ridicularizava” o mínimo desejo de negrosem prosseguir estudos, parece ir por águaabaixo ao comentar que, “José Mauricio, nosec. XVIII e em princípios do passado, eraexigente e precioso na combinação dostimbres como um compositor hipercivilizadode nossos dias” (Heitor 1950, 132). Essaanálise abre espaço para dúvidas sobre asintenções do autor. Nesta comparação, LuizHeitor chamaria a atenção para adescendência negra de José Maurício comouma probabilidade de não-civilidade (o quecriaria um espanto por não sê-lo); ou para ocontexto da época como menos civilizado,em relação aos dias atuais?

Em 150 anos de Música no Brasil, de 1956, eleconsagra ao Padre quinze páginas (Heitor1956, 27-42), onde rememora os escritosanteriores, de Porto Alegre, Taunay e Máriode Andrade. Heitor também assume umapostura puritana – a continuação dagermanização da música brasileira, aoespecular que a música “em estilo teatral,pesadamente ornamentada, nas partesvocais, contamina a inspiração de JoséMaurício após a chegada de Marcos Portugalao Rio de Janeiro” (Heitor 1956, 40). Oemprego do verbo “contaminar” impinge umcerto caráter depreciativo à música aquicriticada, no caso, a italiana –majoritariamente teatral. “Contaminar”remete ainda a danificar com substânciasimpuras, incidindo novamente na teoria dapureza germânica artística dos incipientesmusicólogos do século XIX e XX.

Autores da segunda metade do século XX

Pode-se considerar, ainda, o esforçomusicológico de Bruno Kiefer (1923-1987)que arregimentou a obra História da músicabrasileira: dos primórdios ao início do séculoXX, de 1976 (Kiefer 1997 [1976]). Ao contráriode Mário de Andrade, Kiefer trata os pais deJosé Maurício como “ambos mulatos” (p. 53).

Fig. 3 – Retrato na obra de Bruno Kiefer (Kiefer 1997[1976], 52). Percebe-se que é a mesma imagem daFigura 2, pintado sob a perspectiva de seu filho.

A seguir, também, a obra de Vasco Mariz(1921-2017), História da Música no Brasil, de1981, dedica um capítulo a José Maurício.Logo ao princípio de seu relato, Mariz objetaque “José Maurício é uma personalidade quejá se delineia com bastante clareza, graças apesquisas recentes, sobretudo de ClêofePerson de Mattos” (Mariz 1994 [1981], 55).Claro que, a nível consciente, Vasco Marizquis especificar os progressos musicológicosa respeito do Padre, porém é espantosocomo as palavras e expressões escolhidas sãoquase sempre “claramente”, “clareza”, “deixarclaro”, quando se incumbem de falar do

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Padre, os musicólogos desde Porto Alegreaté o final do século XX. As palavras “clareza”e “pureza” são repetidas, por Mariz, noparágrafo seguinte (MARIZ, 1994 [1981], p.55). Para Mariz a mãe de José Maurício nãoera negra, mas “parda liberta” (MARIZ, 1994[1981], p. 55), em mais uma contradiçãohistoriográfica – para os musicólogosanteriores ela era negra.

Vasco Mariz vai ainda mais longe nadescrição dos pormenores físicos do Padre:

José Maurício teria sido mulato claro, comtraços fisionômicos comprovando sensívelcontribuição de sangue europeu, e decabelos finos e soltos, na descrição de seupróprio filho. Possuía estatura acima damédia, a julgar por testemunhos fidedignos,e forte constituição. (Mariz 1994 [1981], 55).

Interessante que não há nenhuma referênciaa fontes de pesquisa, somente umaconvicção de que ele possuía esses atributosfísicos, baseadas em “testemunhosfidedignos” mas que não se sabe quem são.Percebe-se que Mariz procura contradizerMário de Andrade, para quem José Maurícioera “moreno escuro” (Andrade 2006 [1933],122), mostrando que não havia umapreocupação em estruturar uma pesquisametódica e sistemática na produçãohistoriográfica brasileira. Esses musicólogosparecem, antes, trabalhar com hipótesespouco ou quase nada embasadas. Nota-se,aqui, ademais, uma nítida disposição deMariz em afirmar uma suposta comprovada“sensível contribuição do sangue europeu”na constituição física de José Maurício, sem,entretanto, explicitar quais seriam essasprovas. Afigura-se, dessa forma, apenas maisum exemplo desse processo deembranquecimento para justificar sua

posição de destaque na musicologiabrasileira.

Em José Maurício: o padre-compositor, deMauro Gama (1983), há, curiosamente, umoutro retrato de José Maurício (Figura 4),também feito por seu filho José MaurícioNunes Garcia Júnior.

Este retrato é mais uma variação sobre aFigura 2 (com acréscimo de instrumentosmusicais), reforçando mais uma vez a escolhade retratá-lo com características menosnegras do que aquela da Figura 1. AdianteGama coloca que o pai do Padre era“provavelmente branco e brasileiro, […] amãe, mulata, filha de crioula da Guiné” (Gama1983, 21).

Fig. 4 – José Maurício Nunes Garcia, retrato a óleo porseu filho José Maurício Nunes Garcia Júnior. Gama,

1983, p. 11.

Ao contrário de Lima (1941), que designaJosé Maurício e seus pais como negros,Gama, 42 anos depois, parece desejar, comsua afirmação sem fundamento algum, queseus pais eram menos negros do querealmente teriam sido. Ele é, além do mais, o

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único que caracteriza sua mãe como mulata– e não negra – e seu pai como branco – enão pardo ou negro.

O marco na pesquisa sobre José Maurício foi,sem dúvida, a obra de Cleofe Person deMattos. Uma fonte fundamental para oconhecimento e entendimento da vida e daobra do Padre músico, tem sido raras vezesabordada do ponto de vista antropológicoou social.

Logo ao princípio de sua narrativa, Cleofe deMattos descreve deste modo as avós de JoséMaurício: “Duas criaturas de cor escura – asduas avós nasceram escravas – encontram-sena ascendência direta do padre José MaurícioNunes Garcia” (Mattos 1997, 17). Assemelha-me um tanto pejorativo o termo “criatura decor escura4”, com pouco cuidado na escolhadas palavras. Em seguida, apresenta o pai doPadre, Apolinário Nunes Garcia, como “pardoforro” (Mattos 1997, 17), que é a expressãoutilizada no processo De genere, documentonecessário para a ordenação de JoséMaurício como padre, em 1791, quando eletinha 24 anos de idade, ao qual Cleofe deMattos teve acesso. Verifica-se que ambos ospais, nesse documento, são colocados como“pardos forros”, derrubando a sugestãolevantada por Mário de Andrade (2006[1933]) ou Gama (1983), de que o pai de JoséMaurício fosse branco. O livro de Mattos,portanto, é a primeira obra de envergadura aanalisar, factualmente, fontes primárias depesquisa sobre o Padre, e é a primeirapesquisadora que delimita, sobremaneira, ofator étnico em José Maurício de forma quaseperemptória:

4 O que remete ao contexto escravocrata em que o Brasil estava então inserido – escravidão longa, negros tratados como “criaturas” sem alma, meros objetos a serem barganhados para exploração.

Esgotam-se, portanto, em duas escravas, asinquirições sobre a ascendência de JoséMaurício. O desconhecimento do nome e daqualificação do avô – do lado materno comodo paterno – reforça espontaneamente asuposição de que repetia-se, no caso dasavós do futuro mestre-de-capela, a rotina davida das escravas. A pergunta sem respostadeixa entrever o caminho estreito por ondetransitou a parcela de raça branca em JoséMaurício. [Mattos, 1997, p. 21).

“A rotina da vida das escravas” é umaexpressão um tanto quanto vaga, todaviapresta à suposição de que seria oenvolvimento delas com brancos5. ContudoMattos conclui que é praticamenteimpossível determinar a “parcela” de etniacaucasiana em José Maurício – “raça” tornou-se um termo pejorativo quando designandoseres humanos. A musicóloga torna provávelinferir que, a parte dita branca teriapercorrido a família do pai de José Maurício,Apolinário, somente (Mattos, 1997).

Posteriormente, Figueiredo (2012) seria umdos únicos a caracterizar os pais do Padrecomo “pretos” (p. 1).

5 A literatura brasileira é cheia de referências às relações sexuais entre escravas e senhores ou seusfilhos como, por exemplo, no livro Menino de engenho de José Lins do Rego. O próprio processode miscigenação discutido por Gilberto Feyre (Freyre 1995 [1933]) já foi atribuída à “escassez de mulheres brancas [que] possibilitaria uma maior reciprocidade entre as mulheres escravas e os colonizadores portugueses.” (Lemos Pacheco 2006, 161). Mas essa visão romântica e, de certa forma consensual, não condiz com a realidade, emacordo com Sônia Giacomini, para quem, “a lógica da sociedade patriarcal e escravista parece delinear seus contornos mais brutais no caso da mulher escrava. A apropriação do conjunto das potencialidades dos escravos pelos senhores compreende, no caso da escrava, a exploração sexual do seu corpo, que não lhe pertence pela própria lógica da escravidão.” (Giacomini apud Lemos Pacheco 2006, 163). Para a citação original, ver Sônia Giacomini, 1988, “Ser escrava no Brasil”, Estudos Afro-Asiáticos, 15, pp. 145-170.

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Fig. 5 – Selo em homenagem ao compositor

Fig. 6 – 1 – Máscara mortuária; 2- retrato a óleo pintado pelo filho; 3 – fotografia do filho, Dr.José Maurício; 4 – desenho de José Lanzelotti (1926-1992) da década de 1970. Fonte:

https://movimento.com/marcos-portugal-x-padre-jose-mauricio-o-humilde-resignado/

Conclusão

Esse texto procurou revisar escritos sobre oPadre José Maurício Nunes Garcia erelacioná-los com as imagens disponíveis eutilizadas para representá-lo.

Quanto aos textos, percebeu-se que há umacontínua tentativa de embranquecê-lo aotentar imputar-lhe uma descendência branca

da qual não há nenhuma comprovaçãofactual. Quanto às imagens, tambémpercebe-se esse embranquecimento,principalmente pelo uso constante do retratopintado pelo seu filho (Figura 2) nosprincipais textos e sites sobre o compositor, eque é a que representa a imagem commenos características negras. Inclusive essafoi a imagem utilizada para representar José

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Maurício num selo oficial dos Correiosbrasileiro (Figura 5).

Sobre essa questão, Antonio Campos faz umacomparação entre algumas imagens docompositor e seu filho (Figura 6). Sobre elasaplica linhas guia para comparar algunstraços principais e escreve:

A figura 2 é um retrato a óleo de JoséMaurício pintado pelo filho, o Dr. JoséMaurício Nunes Garcia Jr., ao qualaplicamos, com uma pequena rotação paraencaixá-lo no retrato, o mesmo sistema delinhas-guias. O procedimento revelaalgumas deficiências, como o afilamentoexcessivo do rosto e do nariz; o “lobinho”(quisto sebáceo) que se desenvolveu no ladodireito da testa do padre-mestre fora deposição e os pequenos olhos, que destoamda aparência na máscara mortuária. Todosesses erros constituem evidências de o filhoter pintado o retrato de memória, depois damorte do pai. (Campos 2016)

Em consonância com nossosquestionamentos, o autor ainda escreve:

A partir dessas considerações, sustentamosque todos os erros cometidos pelo Dr. GarciaJr., no quadro e nos demais retratos que fezdo pai, posteriormente vertidos paralitografias, foram intencionais, edemonstram uma canhestra tentativa debranqueamento da imagem paterna para aposteridade. (Campos 2016)

Outra forma de identificação de suascaracterísticas é pela análise das fotos deseus descendentes. Observando o retrato dedois de seus cinco filhos (Figuras 7 e 8) comSeveriana Rosa de Castro, nascida em 1789,nota-se antes a presença de fenótiposnegros, contraditando a ideologia doembranquecimento colocada em Hofbauer(2006), advinda, em grande parte das teoriasraciais promulgadas pela elite caucasiana,darwinismo social, Antropologia cultural e

outras correntes que redundariam noarianismo alemão do século XX (Schwarcz2008).

A importância de se discutir e questionar osdiversos elementos contributivos para oembranquecimento de José Maurício namusicologia brasileira, está no fato de sereconhecer que os negros tiveram um papelessencial em todo o processo culturalbrasileiro, desde o Brasil colonial.Contribuição essa que, por muito tempo foinegada ou camuflada, devido a um forteracismo presente na cultura brasileira.Somente agora, a partir da década de 1970,que as características negras de JoséMaurício foram celebradas, tanto no desenhode José Lanzellotti, quanto nos escritos deCleofe Person de Mattos.

Quantas outras personalidades brasileiras,negras, também passaram para a históriacomo mulatos claros ou pardos?

Fig. 7 – Antonio (1813-?), filho de José Maurício NunesGarcia. Fonte:

http://www.josemauricio.com.br/JM_E_Cap.htm

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http://www.anm.org.br/conteudo_view.asp?id=1772

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