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BIBLIOTECA VIRTUAL DE CIÊNCIAS HUMANAS A PSICOLOGIA NO MARANHÃO: PERCURSOS HISTÓRICOS Márcia Antonia Piedade Araújo

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BIBLIOTECA VIRTUAL DE CIÊNCIAS HUMANAS

A PSICOLOGIA NO MARANHÃO:

PERCURSOS HISTÓRICOS

Márcia Antonia Piedade Araújo

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Márcia Antonia Piedade Araújo

A psicologia no Maranhão:

percursos históricos

Rio de Janeiro

2014

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SUMÁRIO

Prefácio __________________________________________________ 2

A particularidade da Psicologia: a psicologia no Nordeste _____ 2

INTRODUÇÃO ______________________________________________ 5

CAPÍTULO I _______________________________________________19

A PSICOLOGIA TEM UMA HISTÓRIA... ___________________________19

CAPÍTULO II ______________________________________________30

...E ESSA HISTÓRIA OCORRE NUM CERTO ESPAÇO _______________________30

CAPÍTULO III ______________________________________________46

OS PRIMÓRDIOS DA PSICOLOGIA NO MARANHÃO ______________46

CAPÍTULO IV ______________________________________________85

A PSICANÁLISE NO MARANHÃO _____________________________85

CAPÍTULO V _____________________________________________105

OS CURSOS DE PSICOLOGIA NO MARANHÃO ___________105

CONSIDERAÇÕES FINAIS ___________________________________206

REFERÊNCIAS __________________________________________210

APÊNDICES ______________________________________________217

APÊNDICE A - Relação candidatos/vagas das graduações da UFMA

APÊNDICE B - Candidatos do curso de Psicologia nos vestibulares de

1991 a 2000

APÊNDICE C - Quadro de reformulações curriculares do curso de

psicologia do UniCEUMA

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PREFÁCIO

A particularidade da Psicologia: a psicologia no Nordeste

A história da psicologia no Brasil sempre viveu como que

encoberta, como negando sua própria existência, visto os estudos

universitários dedicarem-se principalmente às histórias europeias e norte-

americanas nas famosas disciplinas de Teorias e Sistemas, além do

conteúdo das demais matérias ser todo ele embasado em autores

estrangeiros. Esta perspectiva, não só a-histórica, mas também

universalista, pressupõe a neutralidade da ciência psicológica e garante

que os conhecimentos produzidos em outras sociedades podem ser

tranquilamente adotados em terras brasileiras.

Aos poucos, contudo, esta situação tem se modificado, graças a um

conjunto de pesquisadores interessados em desvendar o véu que encobria

nossa história e trazer à luz os diversos caminhos percorridos pela

psicologia no Brasil. Além disto, há cada vez um maior número de

psicólogos interessados em historicizar seus saberes e suas práticas.

Neste sentido, uma geração de novos pesquisadores do Nordeste

têm se dedicado a apresentar a história que a psicologia traçou em seus

respectivos Estados, o que possibilitou que já tenhamos o relato da

psicologia no Rio Grande do Norte e no Ceará.

Estes trabalhos permitem que se torne evidente a historicidade da

psicologia, haja vista a marcante diferença temporal entre o aparecimento

dos primeiros cursos de psicologia nas regiões Sul-Sudeste, nos anos 50 e

60, e seu aparecimento bem posterior na região Nordeste, acompanhando

o surto de desenvolvimento industrial de cada uma dessas regiões. Vê-se,

pois, que a psicologia necessita de um determinado solo, que implica

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modernização tecnológica, urbanização e — por que não? — certa

psicologização prévia para que se possa ter início seu estudo sistemático,

para que surjamos cursos de psicologia.

O estudo ora publicado por Márcia Araújo insere-se nesta linha e é

um belo relato sobre a história do aparecimento da disciplina e da criação

dos cursos de psicologia no Maranhão. A autora procura traçar primeiro o

contexto histórico do Maranhão, e de sua São Luís querida, para então

apontar para as condições de possibilidade do aparecimento do saber

psicológico. Resgata um personagem ímpar e pouco conhecido pelas

novas gerações, o Padre João Mohana, grande responsável pela

divulgação de conceitos psicológicos em sua análise e trabalho de

aconselhamento na relação entre casais e na educação de filhos. Aponta a

presença pioneira dos psicólogos trabalhando no Departamento Estadual

de Trânsito (DETRAN) e dos primeiros psicanalistas — presença, e

talvez possamos dizer, hegemonia, que deixa muito clara, mostrando seus

efeitos na constituição atual dos cursos. E, enfim, fala sobre estes, das

dificuldades encontradas pela Universidade Federal do Maranhão para

conseguir criar seu curso, o primeiro do Maranhão, em contraposição às

facilidades que o Centro Universitário do Maranhão, vai encontrar alguns

anos depois.

Este é um simples resumo do livro, não mostra a garra e a emoção

da autora ao narrar episódios que viveu, experiências que sentiu na pele,

que todavia deixa transparecer em vários momentos de sua escrita,

embora procure que esta se situe ao nível do relato e análise. Por isto

mesmo, se torna um livro mais que recomendado para leitura não só

pelos psicólogos maranhenses, mas por todos aqueles que se interessam

pela Psicologia no Brasil.

Tenho uma relação especial de afeto com este trabalho, pois ele é

fruto da dissertação de mestrado de Márcia Araújo, que tive a honra e o

prazer de orientar. A dissertação foi realizada dentro de um projeto

conjunto da Universidade do Estado do Rio de Janeiro e da Universidade

Federal do Maranhão, uma das experiências mais ricas de minha vida

acadêmica, pela riqueza de conteúdos que brotou do conjunto de

professores/alunos, pelo interesse e afã que demonstraram em obter

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novos conhecimentos e, principalmente, pelos belos resultados, dos quais

este livro é um exemplo. Espero que sua trajetória seja tão positiva e tão

geradora de encontros como o foi para mim e para Márcia Araújo a

confecção da dissertação original.

Barcelona, 30 de outubro de 2004.

Ana Maria Jacó-Vilela

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INTRODUÇÃO

[...] A história simplesmente não é imparcial; é altamente e inevitavelmente seletiva [...] Mesmo que alguém tivesse muitas vidas e poderes infinitos de observação e de m e m ó r i a , a i n d a a s s i m s e r i a t a r e f a impossível fazer uma descrição completa e imparcial de todos os eventos ocorridos [...]

Michael Wertheimer, 1982

Quando histórias são lembradas, simultaneamente são lembrados

os tempos em que as estórias eram contadas na infância e tinham sempre

finais felizes. Nelas se vivenciavam grandes momentos em que, na

imaginação, figurava-se como personagem, embora, ao mesmo tempo,

tudo parecesse um pouco distante. Hoje conta-se uma história na qual se

é o personagem real, onde não está previsto aquele final e nenhum outro,

mas onde está prevista a certeza de poder contá-la.

Conhecer uma realidade com a qual se tem uma experiência direta

é entrar em contato com o que foi visto e mesmo vivido, num

determinado tempo, e que se torna mais visível quando exposto para

análise.

Assim, durante mais de dez anos, o Departamento de Psicologia da

Universidade Federal do Maranhão — composto na ocasião em sua

maioria por professores com formação em Filosofia e Pedagogia —,

presenciou e vivenciou as questões levantadas pela comunidade

interessada pela profissão, dentre as quais, além de muitas outras, cumpre

destacar: Por que não havia o curso de Psicologia? Quando a

Universidade criaria o curso? Se já existia o Departamento, se já existiam

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os professores e se as disciplinas já estavam sendo oferecidas a outros

cursos, o que estava faltando? Estas e outras perguntas, a comunidade as

fazia procurando compreender o presente, o que obrigatoriamente levava

a se lançar um olhar ao passado.

Ao se eleger o tema "A Psicologia no Maranhão: percursos

históricos", a escolha e interesse em estudá-lo surgiu de reflexões

vinculadas à experiência acadêmica, que se estava tendo como docente

do Departamento de Psicologia desde 1979, — acompanhando os

percalços do seu desenvolvimento que, de modo sui generis, antecedeu à

criação do curso (este, criado somente em 1991) — e, consequentemente,

da implicação por se ter envolvimento de alguma forma nessa história.

Embora tendo que relatar, em algum momento, neste trabalho,

algumas situações vivenciadas, procurou-se construir criticamente o

objeto de estudo, buscando articular as citadas vivências com os

referenciais teóricos escolhidos, no sentido de resgatar a dimensão

histórica desse estudo, na tentativa de tornar possível responder a

questões e contribuir para que outras análises possam ser realizadas.

Este trabalho não pretende enaltecer nem citar os "grandes feitos"

de alguns, mas evidenciar de forma crítica as ideias, a evolução e a

estrutura da Psicologia no Maranhão, no período que abrange os anos de

1970 a 1998 com extensão até abril de 2002. Como resultado, almeja-se

registrar, analisar, divulgar e posteriormente ampliar essa história,

documentando um período, de forma a torná-la útil para outros estudos,

na tentativa de evitar-se algo tão frequente quando se pesquisa: a

"queixa" pela falta de informação.

Entende-se que, para compreender a Psicologia, é preciso

considerar-lhe a história — não a que busca somente uma linearidade

evolutiva, mas a que está em processo e é conhecida através de amplos

estudos e pesquisas realizadas sobre essa ciência e profissão. A

compreensão de sua trajetória é indispensável para pensar-se a Psicologia

em suas transformações e problemáticas atuais.

Deste ponto decorre que é bastante válida e enriquecedora a

pesquisa histórica dessa ciência, pois ela proporciona o conhecimento de

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que a sua aparente descontinuidade revela a existência de sua identidade

e continuidade. A busca da identidade da Psicologia parece ter, na

reconstrução histórica, o seu ponto de origem. O conhecimento do

passado pode facilitar compreender o presente. Assim, como diz Massimi

(1987, p. 114), "[...] a história, ao mesmo tempo que recupera as origens

de uma forma de saber, revela seu destino [...]".

Nesse entendimento, muitas são as razões que justificam e

encorajam as pesquisas na linha da História da Psicologia. A escolha

desse tema partiu da preocupação relacionada com o que pesquisar, por

se tratar de uma proposta de trabalho em que, ao final, deixar-se-á um

produto direto das inquietações e experiências vividas.

Como diz Catharino (1999, p. 172),

[...] questões nos inquietam e preocupam, mas também nos mobilizam

e incitam a abdicar do cômodo papel de espectador para assumir o de

atores. Atores que se enredam e que participam da construção desta rede

que é a história da psicologia, na qual figuramos como personagens que

pesquisam, que agem, que respondem e que inventam novas perguntas

para contar outras histórias.

Conhecer essa história no Maranhão, por mais recente que seja, faz

parte dos muitos estudos que estão acontecendo nessa área. Isto diz

respeito à recuperação da memória da Psicologia, tema sobre o qual os

pesquisadores, ao longo das últimas décadas do século XX, tanto no meio

nacional quanto internacional, têm demonstrado crescente interesse. A

necessidade de escrever sobre esse tema encontra eco nas palavras de

Massimi (1990, p.75-76): "[...] qualquer tentativa de preservação, coleta

ou indagação crítica, relativa a áreas ou âmbitos específicos da psicologia

brasileira representa uma contribuição fundamental".

O estudo da história abordado neste trabalho teve como objeto as

condições históricas já constituídas e a serem desenvolvidas, a partir do

estudo das redes de relações que envolvem um determinado período. O

propósito que se teve foi de tentar transformar os fatos em si em fatos

analisados, sem a pretensão de "descobrir" essa história. Acredita-se ser

importante recuperar o que for possível para futuras produções, na

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tentativa de preencher as lacunas de memórias e documentos, tendo em

vista que a história, sempre provisória, produz efeitos diversos ao ser

contada novamente. Nesse sentido, resgata-se a visão de Jacó-Vilela

(2001, p. 177, grifo do autor) aqui expressa, a qual contribui para um

melhor entendimento Sobre o assunto:

Embora a história inevitavelmente remeta ao passado, ela o põe em

permanente movimento, construída que é em múltiplos presentes. Ação

de memórias diversas, que iluminam ou obscurecem o presente a partir

de fragmentários ou totalizantes hojes, a historicização de nossos

fazeres pode nos permitir proceder à desnaturalização do nós-mesmos

— aquele que tantas vezes insiste em repetir assim é, assim foi, assim

será – ou, num funesto destino, impedir que o façamos.

Procura-se, também, compreender o modo como a Psicologia se

apresenta enquanto comprometida com a recuperação de sua história

como uma nova forma de estar no mundo. Vista como elemento central

do agir e do fazer humano, é entendida como um conhecimento

relacionado ao próprio homem enquanto ser social e histórico, que vive o

presente, com traços do passado e pensamento no futuro. Tal saber é

concebido numa perspectiva que expressa suas ações, num processo

contínuo de transformações e mudanças nas relações em que ele se insere

e se desenvolve. Nesse panorama, o conhecimento da História da

Psicologia torna-se particularmente necessário para se compreender a

Psicologia como construção histórica.

Esta constatação é assim descrita por Bombassaro (1997, p. 90):

[...] O conhecimento tem um caráter histórico por dois motivos: em

primeiro lugar, porque o passado que o carregou até nós se manifesta

como história, como o que aconteceu; e, em segundo lugar, porque

também o presente, ao interpretar o passado, cria a história [...].

Na medida em que se avançou na investigação para alcançar os

objetivos propostos, alguns trabalhos já realizados auxiliaram no

entendimento de questões básicas, principalmente as relacionadas a

cursos de Psicologia em universidades.

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Durante o levantamento da literatura, foi possível resgatar cinco

trabalhos realizados sobre essa temática que contribuíram sobremaneira

para o desenvolvimento do tema, pela estreita relação com o assunto.

O primeiro foi a monografia de curso de especialização de Léda

(1995) com o título "O Curso de Psicologia na Universidade Federal do

Maranhão: trajetória de um processo de formação", em que a autora

enfatiza o momento da criação e da reestruturação do curso, realizando

uma análise comparativa dos currículos constantes nas duas propostas no

sentido de proporcionar conhecimentos indispensáveis à prática

profissional dos alunos.

O segundo foi a dissertação de mestrado de Carvalho (1997)

intitulada "Reconstruindo a História do Curso de Psicologia da

Universidade Federal do Pará: um curso numa região em processo de

desenvolvimento", em cuja narrativa a autora situa o contexto da região,

o movimento para a implantação e criação do curso, sua direção mais

evidenciada na área comportamental e o problema do reconhecimento do

curso. A leitura desse material foi de grande importância, pelo fato de se

ter percorrido alguns desses contextos.

O terceiro foi o livro de Rieche (1998) com o título "O Curso de

Psicologia da Universidade do Estado do Rio de Janeiro: a história

possível (1964-1978)". Sua leitura despertou interesse pelo estilo

detalhado de contar a história, o que facilitou a percepção do trato que foi

imprimido à pesquisa, e à trajetória desse curso de Psicologia, na qual se

insere o contexto da fundação da própria Universidade.

O quarto foi a dissertação de mestrado de Carvalho (2001) com o

título "A cidade e a alma reinventadas: modernização urbana e a

consolidação acadêmica e profissional da psicologia na cidade de Natal

— Rio Grande do Norte". Em sua fala o autor prioriza o ponto de vista

histórico, as relações existentes entre a modernização urbana — década

de 80 — e o desenvolvimento da Psicologia em Natal. Descreve a forma

como a Psicologia se inseriu em algumas instituições de ensino,

apontando contribuições para a área. Destaca o contexto em que foi

criado o curso de Psicologia, ao mesmo tempo em que ocorriam as

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mudanças na cidade de Natal, denominada por ele de "Cidade do Prazer",

devido, principalmente, ao turismo que envolvia a cidade e ao estilo de

vida das pessoas.

O quinto foi o livro de Marques (2001), resultado de sua

dissertação de mestrado intitulada "Curso de Psicologia da Universidade

Federal do Ceará: história da criação/criação de uma história". Nele a

autora apresenta a reconstituição da história no sentido de compreender-

lhe a dinâmica atual e fornecer elementos para mudanças, considerando

as ocorrências e transformações relativas ao processo de criação e

funcionamento do curso, como agência criadora e divulgadora do saber

psicológico.

O esforço aqui empreendido se constituiu em fornecer subsídios e

despertar interesses para essa área de conhecimento, reconhecendo-se

que realizar uma pesquisa, produzir um conhecimento não é colocar um

ponto final, mas abrir um leque de infinitas discussões e análises,

principalmente ao escrever sobre a História da Psicologia, pois nada pode

ser definitivo. Esse processo está sempre inacabado, necessita ser

continuamente escrito.

A partir desta reflexão foi possível uma análise que vai ao encontro

das ideias de Bombassaro (1997, p. 121), em que a história como passado

somente aparece através da interpretação de documentação. Nesse

sentido, não é possível separar a história como um conjunto de eventos

ocorridos num determinado tempo e a história como o conjunto de

proposições sobre esses eventos. Por serem interdependentes, é

importante

[...] compreendermos que a historicidade do conhecimento não reside

simplesmente no fato de existir à nossa disposição um conjunto de

informações, objetivado no tempo e historicamente produzido, mas que

ela tem a ver com o modo pelo qual essas informações são transmitidas e

interpretadas.

Teve-se como objetivo analisar os percursos históricos da

Psicologia no Maranhão, considerando como recorte temporal o período

que antecedeu a criação dos cursos, 1970, até os anos noventa do século

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XX, quando eles se criaram com prosseguimento até abril de 2002 na

tentativa de mostrar como se estruturou essa área no Estado.

Apresentada a justificativa a respeito do interesse na realização

desse estudo, apontada por pesquisadores como Pessotti (1988), Massimi

(1990) e outros, ao dizerem da importância de estudos históricos da

Psicologia brasileira, encontrou-se, nas palavras de Antunes (1999, p.

125-126), essa necessidade:

[...] A escassez de estudos nessa área, no entanto, exige que estudos

sobre o assunto venham a ser estimulados, pois constata-se com especial

clareza a imensidão de elementos, praticamente intocados, que pedem

sistematização e divulgação [...].

Percurso metodológico

Mesmo sabendo que todas as partes de um estudo estão

relacionadas, a metodologia ocupa lugar de relevo na pesquisa por

requerer procedimentos que lhe norteiam o desenvolvimento. Pesquisar

pressupõe processo integrado de etapas definidas pelo pesquisador,

visando seu objeto de estudo; portanto, optou-se por uma pesquisa

empírica, com abordagem qualitativa. Outrossim, para contar a trajetória

da Psicologia no Maranhão, a proposta de trabalho pautou-se tanto em

dados de documentos escritos — uma análise documental — quanto em

depoimentos orais, obtidos por meio de entrevistas. Por se tratar do

resgate de uma história da qual também se é protagonista, um

emaranhado de dúvidas reforçou a necessidade de atenção que se deveria

dar ao estudo.

Desse modo, para a pesquisa documental foi necessário recorrer às

instituições em busca do material a ser utilizado, necessitando-se então

de esclarecê-las sobre os objetivos da pesquisa. Dentre esses documentos

alguns foram de fácil acesso, devido à vivência que se tem no setor. Para

a obtenção de algumas fontes, contudo, foram feitas solicitações por

escrito. Vale ressaltar que alguns documentos foram enviados por e-mail,

entre eles a lista dos psicólogos inscritos nas décadas de 70 e 80 no

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Maranhão pelo Conselho Regional de Psicologia — 11ª Região. De posse

dos documentos foi realizada uma leitura prévia para facilitar sua

seleção, a fim de se direcionar o estudo de campo e a própria escrita do

texto.

Em relação aos documentos oficiais — projetos de cursos,

resoluções, ofícios, atas de reuniões, pareceres, etc — foram eles

selecionados, considerando-se sua importância em relação à pesquisa.

Nessa etapa, procurou-se estabelecer uma classificação desses

documentos, muitos deles indicados por ocasião das entrevistas, de modo

que ficassem claros os registros das fontes e a procedência do material

coletado, de tal forma que a organização facilitasse a sua posterior

análise.

A única dificuldade em relação ao empréstimo de alguns

documentos está relacionada ao desaparecimento de todos os livros de

Ata do Departamento de Psicologia da Universidade Federal do

Maranhão (UFMA), os quais serviriam para um maior entendimento de

sua trajetória e do curso, visto que esses livros registravam todos os

acontecimentos importantes que marcaram sua história. A análise

documental foi, ao mesmo tempo, dificultada e enriquecida pela

diversidade de informações acrescidas e/ou suprimidas nas diferentes

versões de um mesmo documento.

O documento é aquele elemento factual, tangível, escrito, podendo

ser pego e lido, para o entendimento do que pensavam e como resolviam

suas questões aqueles que agora se tornam os personagens da história que

se pretende reconstruir.

Contudo, o documento, na sua perenidade, no seu texto enxuto,

nem sempre revela os jogos de poder, as lutas de facções, os

personalismos e tudo aquilo que envolve a relação entre homens. Em

razão disso, utilizou-se também outro instrumento de coleta de dados, a

entrevista, por ser uma técnica em que o entrevistador se apresenta frente

ao entrevistado que lhe fornece informações com propósitos definidos.

Através desse instrumento coletaram-se os dados relatados pelos

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informantes que vivenciaram uma determinada realidade num processo

de interação.

A preferência pela entrevista semiestruturada permitiu

esclarecimentos e correções necessárias para a obtenção das informações,

oferecendo um campo mais amplo de interrogativas à medida que eram

recebidas as respostas dos entrevistados. Uma das grandes vantagens foi

abrir espaços ao exame de outros dados relevantes para o estudo,

suscitando um aprofundamento ao provocar uma participação mais

privilegiada do informante, sem, contudo, perder de vista os propósitos

da pesquisa.

Em relação aos depoimentos orais, foram realizadas 44 (quarenta e

quatro) entrevistas das quais apenas algumas são citadas ao longo do

texto, de acordo com o estudo desenvolvido. Esses depoimentos foram

utilizados como meio de alcançar dados indispensáveis à pesquisa,

mesmo sabendo das críticas que lhes são feitas, relacionadas à sua

validade, principalmente por estarem baseados na visão pessoal e na

memória de um ator social, que, via de regra, transmite sua versão sobre

os acontecimentos, e não a reconstituição dos próprios acontecimentos.

Assim, segundo Hagvette (1997, p. 94),

[...] sendo a memória humana falha e deficiente, os acontecimentos ou

impressões relatados podem ser distorcidos, episódios deslocados ou

elementos omitidos. A reconstituição 'de memória' pode estar imersa em

reinterpretações, seja pela distância existente entre o fato passado e o

depoimento presente que já incorpora possíveis mudanças de perspectiva

ou de valores do ator social, seja porque o fato pode ser reinterpretado

à luz dos seus interesses.

E Antunes (1996, p. 95) justifica:

Usar a memória como recurso é trabalhar com uma leitura que se faz a

partir do presente, embora seja este um produto histórico. Resgatar o

passado tal c o m o s e d e u n a s u a t o t a l i d a d e n ã o é

completamente possível, nem é tarefa que consiga chegar a ser um

produto acabado. Deve-se procurar , no entanto, juntar os

elementos disponíveis, organizá-los, buscando compreender suas

contradições e a dinâmica de seu movimento e, fundamentalmente,

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tentar, com a limitação inerente ao olhar do presente, mais se

aproximar do passado e compreendê-lo a partir dos sinais que

permaneceram [...].

Com o cuidado sugerido pelas considerações anteriores, insistiu-se

na utilização da referida técnica por acreditar-se que ela proporcionaria

valiosas contribuições prestadas pelos informantes. Para tanto, trabalhou-

se de modo a minimizar as possíveis distorções ocorridas, confrontando

os dados dos depoentes com os dados dos documentos oficiais.

Os informantes foram selecionados a partir de um conjunto que

apresentou características consideradas importantes para atingir os

objetivos da pesquisa. Foram entrevistados alguns psicanalistas de São

Luís com a finalidade de conhecer-se um campo que se constituiu antes

da criação dos cursos de Psicologia; a família de um dos mais ilustres

pioneiros da Psicologia no Maranhão, Padre João Miguel Mohana; outros

psicólogos (profissionais autônomos) que atuavam na área antes da

criação dos cursos.

Foi também objetivo, neste trabalho, levantar as instituições que

contribuíram para a oficialização da Psicologia no Maranhão. Assim,

num segundo momento, entrevistaram-se os professores do Departamento

de Psicologia da Universidade Federal do Maranhão, que dele fizeram

parte desde antes da fundação do curso; professores dessa época que

ainda estão em exercício; e aqueles admitidos por concurso após a

criação do curso. Entrevistaram-se, também, professores de outras

instituições congêneres que ministraram cursos para os professores do

Departamento de Psicologia. Por fim, entrevistou-se a professora que

participou do processo de criação do curso de Psicologia do Centro

Universitário do Maranhão (UniCEUMA) e os professores que foram

admitidos após sua implantação.

Decidiu-se por esse universo por entender-se que ele seria o

principal vértice para fornecer os dados necessários ao estudo que aqui se

propôs realizar, graças à visão que se tinha deles como personagens

significativos na História da Psicologia no Maranhão no período

estudado. Para tanto, prepararam-se roteiros de entrevista para cada

grupo de entrevistados, estabelecendo articulações com o objeto de

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estudo, com questões iniciais e abertura para acréscimo de outras,

submetidas às particularidades que se fizeram necessárias. Ao se entrar

em contato com as pessoas, elas foram informadas do que se tratava,

através de explicação sobre a finalidade do estudo, o porquê da pesquisa

e a justificativa da importância de suas contribuições.

Tentou-se estabelecer confiança mútua para evitar, no momento da

entrevista, silêncios, ansiedades, falta de motivação, recusa em

responder, desvios, ou mesmo uma colaboração aparente, estimulando a

comunicação e possibilitando o fluxo das informações. Para isso,

procedeu-se a um contato informal inicial para sondar a possível

colaboração, a disponibilidade em participar, o conhecimento do assunto,

para, dessa forma, evitarem-se dificuldades quanto à participação. Além

destas situações houve atenção ao que possivelmente acomete as pessoas

em seus depoimentos: falhas de memória, esquecimentos, desejos,

crenças, emoções, enfim, várias condições decorrentes das próprias

subjetividades.

A finalidade desses depoimentos foi preencher lacunas que

porventura pudessem existir nos documentos escritos, ou até mesmo

trazer esclarecimentos acerca do que está sendo pesquisado, pois muitas

vezes a informação fornecida pelas pessoas são as únicas fontes de que se

dispõe para conhecer-se uma determinada realidade. As perguntas foram

de acordo com questões básicas necessárias à compreensão de como se

constituiu a área da Psicologia no Maranhão. Ainda no que diz respeito

às questões formuladas, admite-se que elas foram mais bem trabalhadas a

partir das leituras dos documentos, o que permitiu uma visão mais ampla.

Solicitaram-se aos entrevistados autorização para gravar as entrevistas.

Além disso, o local e o horário foram combinados previamente

com os informantes. O contato se deu por telefone e pessoalmente, mas a

aceitação nem sempre era de imediato, pois alguns entrevistados pediam

tempo para pensar, dizendo que dariam um retorno futuramente, o que

invariavelmente acontecia. Em média, as entrevistas duravam cerca de 40

minutos, sendo realizadas pela pesquisadora acompanhada de duas alunas

do 5º período do curso de Psicologia da Universidade Federal do

Maranhão que foram selecionadas e treinadas para colaborar na pesquisa.

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As informações eram gravadas em fita cassete e posteriormente

transcritas pelas colaboradoras, sob a supervisão da pesquisadora com

exceção de entrevistas que aconteceram sob a forma de perguntas

enviadas (roteiro das entrevistas) e respostas recebidas através de correio

eletrônico.

Mesmo tendo sido explicado o objetivo da pesquisa, os

entrevistados consideraram de difícil concretização a intenção que se

tinha, por não existir antecedente sobre a História da Psicologia no

Maranhão. Alguns indagavam o porquê de eles terem sido os escolhidos,

principalmente os primeiros psicólogos que chegaram a São Luís.

Entretanto, depois de entenderem a proposta, resolveram colaborar e

também solicitaram que lhes fosse apresentado o trabalho ao seu término,

para que tomassem conhecimento de como se construiu essa história ao

longo desses anos, afirmando que não haviam pensado nessa

possibilidade, mesmo com toda a experiência na área.

As entrevistas foram realizadas com uma primeira leitura das

questões por parte dos entrevistados, sem nenhuma reserva, com

respostas imediatas. Contudo, um informante fez questão de ter em mãos

as questões para ler e responder, mesmo sem o claro entendimento de

algumas. Encontrou-se até quem se recusava a dar qualquer tipo de

entrevista que não fosse por escrito, negando-se a gravá-la.

Na devolução da entrevista transcrita, alguns confirmavam os

dados, outros refaziam suas falas no intuito de melhorar as informações e

esclarecer melhor as ideias. Os informantes que solicitaram a realização

de entrevista por correio eletrônico dificultaram o trabalho no sentido de

que as respostas foram limitadas. Contudo, considerou-se que as

entrevistas foram oportunas, pois contribuíram com informações sobre a

temática em estudo, constituindo-se em material fundamental pela

geração de conteúdos para a produção deste trabalho.

A apresentação dos resultados ocorre por um registro narrativo,

contrapondo-se documentos e/ou entrevistas, complementados com a

pesquisa bibliográfica feita anteriormente. Pretende-se, principalmente,

resgatar os dispositivos que resultaram na criação dos cursos de

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Psicologia no Maranhão. Também, a análise apresentada no decorrer do

estudo não se encontra especificada em categorias prévias, mas toma

forma no texto após os dados colhidos nos documentos e revelados nas

entrevistas, que permitiram descrever e interpretar o percurso dessa

história.

Das diferentes entrevistas contidas nesse estudo, foram feitos

recortes de momentos que propiciaram a análise, como o percurso

histórico da Psicologia no Maranhão, considerando-se o pioneirismo do

Padre João Mohana, os psicólogos que entraram no Estado nas décadas

de 70 e 80 e assumiram o espaço até então não ocupado em sua

totalidade, assim como psiquiatras e psicólogos que se organizaram para

estruturar a Psicanálise na cidade.

Também abordam o fato de, na Universidade Federal do

Maranhão, diferentemente do ocorrido em outras instituições congêneres,

a criação do Departamento de Psicologia ter-se dado antes da existência

do próprio curso. E, finalmente, os dados analisados tentaram apontar o

caminho para a criação dos cursos de Psicologia no Maranhão, da

Universidade Federal do Maranhão(UFMA) e do centro Universitário do

Maranhão (UniCEUMA), onde foram evidenciadas as diversas

vicissitudes pelas quais passaram.

Com base no exposto o estudo foi estruturado em cinco capítulos.

No primeiro, apresentou-se: o interesse de pesquisadores, nas

últimas décadas do século XX, por estudos históricos na área psicológica;

o porquê de estudar a história; a necessidade de preservação e

recuperação da memória da Psicologia; e o ensino da disciplina História

da Psicologia nos cursos de graduação em Psicologia.

No segundo, fazendo uso das contribuições de Pessotti, Bock,

Antunes e Massimi, tratou-se sobre a História da Psicologia no Brasil,

considerando a necessidade apontada por eles e outros autores de investir

em estudos na difusão desse conhecimento, evidenciando sua trajetória

para uma compreensão mais ampla da Psicologia.

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No terceiro, que aborda os primórdios da Psicologia no Maranhão,

caracterizou-se o Estado do Maranhão, destacando os aspectos da

colonização, da economia e da cultura no sentido de possibilitar ao leitor

uma visão da estruturação do panorama educacional nessa região, para, a

partir daí, mostrar como veio se autonomizando a área psicológica na

cidade de São Luís.

No quarto, com um breve histórico da Psicanálise no Brasil,

realizou-se uma narrativa sobre a Psicanálise no Maranhão, apresentando

a estruturação e a expansão desse campo em São Luís.

No quinto, apresentou-se a trajetória dos cursos de Psicologia no

Maranhão. Para tanto, caracterizaram-se as suas instituições

mantenedoras, fazendo-se um resgate da história de sua criação, com

destaque da constituição dos cursos e do Departamento de Psicologia da

Universidade Federal do Maranhão. O registro dessa história resultou de

um trabalho de análise documental, complementado por entrevistas

realizadas com os principais personagens que vivenciaram essa história.

Por último, teceram-se as considerações finais, não como texto

acabado, mas como espaço para caminhos a serem percorridos.

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CAPÍTULO I

A PSICOLOGIA TEM UMA HISTÓRIA...

[...] a história, num mundo estático, é desprovida de sentido. A história em sua essência é transformação, movimento [...] A história propriamente dita só pode ser escrita por aqueles que encontram e aceitam um sentido de direção na própria história. A convicção de que viemos de algum lugar está vinculada de perto à convicção de que estamos indo para algum lugar. Uma sociedade que perdeu a confiança na sua capacidade de progredir no futuro rapidamente deixará de preocupar-se com seu progresso no passado [...]

Edward Hallet Carr, 1996

A necessidade de contextualizar a Psicologia em seu âmbito social

e cultural no Brasil tem motivado um aumento progressivo de sua

historiografia. Assim sendo, considera-se que situar, inicialmente, o

porquê de pesquisar a História da Psicologia e a sua importância

contribua para o entendimento do tipo de estudo que se pretende realizar.

Historicamente, o interesse por este tema aparece nas últimas

décadas do século XX e tem avançado progressivamente. Algumas

contribuições nessa área são devidas a iniciativas e esforços de

pesquisadores preocupados em entender um campo que apresenta muitas

divergências e enfoques contraditórios. Contudo, algumas ações se

fizeram presentes em todo o mundo, reconhecidas por grandes

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historiadores como um referencial para pesquisas, leituras e trabalhos

citados pela literatura.

Nos Estados Unidos, foi formado um grupo de estudiosos da

História da Psicologia que mais tarde se transformou na Divisão n.26 da

American Psychological Association (1965). Também durante a década

de 60 foram criados os "Akron Archives for History of Psychology", um

recurso valioso como fonte de material para os interessados na História

da Psicologia.

Nesse mesmo período foi fundado o "Journal of the History of the

Behavioral Sciences", periódico de difusão internacional especializado

nos estudos históricos em Psicologia e ciências humanas, assim como a

Cheiron, Sociedade Internacional para o Estudo da História das Ciências

Comportamentais e Sociais.

Posteriormente, em 1982, na Europa, ocorre um crescente

desenvolvimento da historiografia no campo da Psicologia, quando foi

fundada a seção europeia da sociedade Cheiron, sendo a Espanha o país

com maior produção. Ali se formou o "Grupo de Trabajo en Historia de

la Psicología" (1987) e a "Sociedade Española de Historia de la

Psicología" (1989).

Até então na América Latina as pesquisas sobre a História da

Psicologia não eram muito frequentes. Porém, nos últimos anos

observou-se um interesse maior por essa temática, fruto de dois

acontecimentos: o primeiro foi a edição, pelo colombiano Rubén Ardila,

de um livro totalmente dedicado à História da Psicologia, "La psicologia

en América Latina: pasado, presente y futuro" (1986). O segundo,

quando, no Brasil, especificamente em São Paulo, no mês de abril de

1988, aconteceu o Primeiro Seminário de História da Psicologia na

América Latina.

Mesmo como uma área nova de estudos, a História da Psicologia

no Brasil1 apresentou mudanças, consolidando-se enquanto segmento de

pesquisa e de ensino. Como destacam Brozek e Campos (1996, p. 57-63),

1 Para uma visão mais ampla, cf. capítulo 2.

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a formação de especialistas nesse campo assim como os métodos de

reconstrução historiográfica e a intensificação no uso de fontes primárias

proporcionaram uma melhor formação dos psicólogos interessados nesse

domínio de investigação, motivando, consequentemente, a criação e a

organização de núcleos, grupos, publicações, eventos e produções

científicas na área.

No Brasil, conforme Campos e Massimi (1998, p. 305), a

preservação da memória da Psicologia mostra-se como uma tarefa

urgente para os historiadores brasileiros, pois muitos dos materiais

expressivos encontram-se em estado precário de conservação e em alguns

casos sem catalogação adequada, dificultando desse modo o acesso às

fontes.

Ressalta Massimi (1990, p. 76):

Uma questão mais grave e difícil a ser resolvida é a da recuperação da

documentação histórica mais antiga da psicologia brasileira pré-

científica, pois [...] as condições de preservação desse material são, em muitos

casos, extremamente precárias, e o levantamento e leitura do mesmo implicam

grandes recursos em termos de tempo, finanças e dedicação de pesquisadores [...].

Com efeito, seria apropriado empreender esforços para recuperar,

preservar e colocar em ordem todo esse material, criando arquivos ou

centros de documentação de História da Psicologia e das idéias

psicológicas na cultura brasileira. Lacombe (1974 apud CAMPOS;

MASSIMI, 1998, p. 305) afirma que "[...] a consciência de que a

conservação dos documentos é uma necessidade de interesse geral custa

muito a surgir [...]”, apontando assim o tamanho das dificuldades a serem

enfrentadas.

No Brasil, considera-se necessária a criação de arquivos e

catálogos de fontes para a História da Psicologia em diferentes Estados,

que possibilitem a pesquisa e ao mesmo tempo a preservação da memória

histórica de cada região em seus moldes particulares. Pensando numa

situação ideal, poderia ser organizada a história de cada curso de

Psicologia e da profissão de psicólogo nos diversos Estados brasileiros

(essa experiência já vem ocorrendo, mesmo de forma tímida).

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Fica claro que, ao tomar a decisão de pesquisar, as fontes de

informação são consideradas essenciais para viabilizar a pesquisa. Em

alguns casos os pesquisadores defrontam-se com obstáculos devido à

ausência de dados, que dificulta a busca de informação muitas vezes

prejudicada pela falta de acesso direto a fontes primárias ou secundárias.

É sempre conveniente lembrar que as fontes de informação numa

pesquisa são o elo entre o pesquisador e a informação.

Conforme expressa Baraúna (1999, p. 175), o crescente interesse

pela História da Psicologia no Brasil é bem-vindo por muitas razões. As

mais urgentes se prendem ao valor da recuperação da história e da

memória da Psicologia mesmo recente. Explicando sua posição, a autora

afirma:

Os estudos e pesquisas mais recentes voltados para a história da

Psicologia têm evitado o anacronismo comumente encontrado nos

antigos manuais, onde as ideias aparecem como se existissem em

abstrato, como se fossem autônomas em relação à realidade. Esse tipo de

reconstrução histórica, que busca trazer as teorias e práticas psicológicas

para o seu contexto de produção, resgata um pressuposto bastante

difundido em outras áreas das chamadas ciências humanas, mas que

é frequentemente esquecido nos meios psi: o de que o

pensamento é sempre produzido num momento determinado, e que

para compreendê-lo é necessário buscar também suas determinações

históricas, até onde isso for possível.

Para uma pesquisa histórica não basta estar preocupado com

questões do tipo: O que selecionar? O que relacionar com quê? Como

interpretar? Para uma pesquisa histórica precisa-se contar com aspectos

extremamente relevantes, entre eles as fontes apropriadas para

reconstrução, onde o historiador identifica os vestígios para poder coletá-

los, organizá-los, analisá-los e interpretá-los.

Como atestam Brozek e Guerra (1996, p. 12), não há uma regra

que determine as desigualdades entre um vestígio trivial e um vestígio

significativo. Segundo eles, existem dois fatos importantes no registro

dos dados que são: "[...] 1) é impossível registrar todos os fatos

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potencialmente relevantes; 2) é indispensável saber escolher os

documentos para um estudo aprofundado [...]".

Na pesquisa histórica em Psicologia o desafio atual das

investigações está em não se lidar com o saber já instituído, com

realidades estagnadas, de modo a evitar uma reconstrução idealista, mas,

sempre que possível, recorrer também a documentos não publicados,

fontes inéditas, tudo isso articulado com as relações entre a evolução das

ideias e o contexto sócio-histórico.

Um outro desafio pode estar relacionado ao fato de que a definição

da História da Psicologia presume o levantamento de uma multiplicidade

de interrogações. Uma História da Psicologia não se ajusta apenas ao seu

campo próprio, mas partilha conhecimentos com outras ciências, como

História, Filosofia, Medicina, Pedagogia, não só por conta de seu

conteúdo, mas devido à interface com esses e outros campos do saber.

A pesquisa histórica da Psicologia ainda conta com mais um

desafio: estudiosos envolvidos com essa área defendem que o estudo

adequado dessa história pode ajudar a centralizar as questões

fundamentais, integrar um campo de diversidades, como também auxiliar

a reunir um campo fragmentado. Os que não veem necessidade de

justificar esses estudos apontam razões como o fato de que o estudo da

Psicologia tornou-se uma prática tradicional. Outros defendem a ideia de

que o estudo da História da Psicologia é perda de tempo para um

pesquisador, pois a história pode legitimar algumas preocupações ou

tendências atuais, além de outras (WERTHEIMER, 1998, p. 21-41).

Constata-se, assim, que há algumas situações que merecem

atenção, principalmente aquelas relacionadas às fontes de informação e

ao despertar do interesse pela pesquisa e pelo estudo da História da

Psicologia.

Por muito tempo a História da Psicologia teve o encargo de narrar

todo o desenrolar dos acontecimentos, dos precursores, das grandes

ideias de uma época, de um passado, combinando significações

articuladas e apresentadas apenas em termos de fatos, supondo-se que

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esses fatos têm uma determinação, uma causalidade determinista. Essa

visão é sintetizada por Wertheimer (1982, p. 13-14) quando diz:

Não existe algo que seja a história definitiva, correta e imutável de

coisa alguma. O que é colhido da corrente dos acontecimentos

como merecedor da nossa atenção, e a maneira como é selecionado e

interpretado, depende, em última análise, dos pontos de vista

idiossincrásicos e subjetivos do historiador. Não obstante, a visão

histórica de uma disciplina pode oferecer fundamentos, integração e

perspectiva, além de ser, por si só , a lgo absorvente.

O interesse pela história da psicologia parece estar-se desenvolvendo, no

correr da segunda metade do século vinte. Muitas histórias foram escritas

com a orientação cronológica, mas tem havido também livros baseados

nas escolas mais significativas, nos homens mais importantes, nas obras

de maior influência, ou nas áreas de pesquisa mais importantes [...].

Alguns pesquisadores ainda permanecem mais ou menos fiéis a

essa abordagem. Muitos estudiosos se prendem basicamente à sucessão

ordenada de dados e datas, nomes e produções. No entanto, o

conhecimento histórico, visto dessa forma, corresponde a uma

determinada concepção histórica. Hoje em dia uma vertente mais crítica

se manifesta.

Além disto, é importante ressaltar que a compreensão histórica da

Psicologia sob esse prisma crítico implica o conhecimento das relações

socais onde ela se produz e é produzida. As diferentes formas de contar a

História da Psicologia, a que se fez referência anteriormente, têm

mostrado que o processo histórico é contínuo, mas não linear, pois ele

tem idas-e-vindas, desvios, cortes e rupturas, e a forma como se conta a

história pode influenciar o porquê de ela ser contada, e ainda o que ser

contado nela.

Enquanto área de conhecimento, a Psicologia é considerada uma

produção histórica concretizada numa realidade, relacionada com

diferentes fatores de natureza política, social, cultural e científica.

Contudo, esta é uma visão recente acerca da Psicologia. Nas

últimas décadas do século XX ela tem passado por uma considerável

avaliação no que se refere à análise de sua constituição e ao seu processo

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de mutação enquanto ciência e profissão. Nesse processo foi criticada e

questionada em seus saberes e práticas, devido ao modelo de objeto que

construiu e com o qual trabalhou por muito tempo, qual seja, a ideia de

homem possuidor de uma natureza humana, uma "essência". Outro ponto

de crítica se refere ao profissional psicólogo por assumir uma

neutralidade supostamente científica e aerifica em relação aos fatos

sociais.

As reflexões e explicações nesse sentido devem-se ao fato de que,

enquanto ser humano, se está em permanente movimento e

transformação, diferentemente da visão de homem portador de uma

natureza humana onde deveria ser buscada a sua essência. O homem está

em continua mudança e essa mudança tem sido vista, principalmente, de

forma qualitativa; logo, o homem do passado era diferente do homem

contemporâneo devido às circunstâncias sócio-históricas e, como tal,

deve ser compreendido. Assim, Bock, Gonçalves e Furtado (2001, p. 22)

esclarecem:

[...] A compreensão do 'mundo interno' exige a compreensão do

'mundo externo', pois são dois aspectos de um mesmo

movimento, de um processo no qual o homem atua e

constrói/ modifica o mundo e este, por sua vez, propicia os

elementos para a constituição psicológica do homem.

O homem se realiza e se humaniza produzindo historicamente sua

existência. Nesse processo ele cria as ideias que vão expressar suas ações

e as relações que ele estabelece consigo mesmo e com os outros. Como

enfatiza Antunes (1998, p. 365),

[...] a história é vista como construção humana coletiva, pois o

homem, seu sujeito primordial, é histórico na medida em que é

social. Assim, compreender a história humana e, sobretudo, as

ideias produzidas historicamente pelos homens, exige a busca de

compreensão das relações sociais que permeiam, determinam e são

determinadas por suas ações.

Deve-se observar que, se um homem vive e faz a história, não se

pode conceber a História da Psicologia como acabada ou mesmo

estabelecida definitivamente. Pesquisar a História da Psicologia é estudar

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os meios e os modos como as pessoas se transformam, como

consequências das próprias alterações nas condições históricas.

A pesquisa histórica em Psicologia tem-se tornado indispensável e

fundamental para o entendimento de suas origens e de suas práticas.

Assim, para compreender a diversidade da Psicologia não se dispensa

essa recuperação, pois a história da sua construção corresponde, em cada

momento, às exigências de conhecimentos da humanidade, aos

constantes desafios da realidade social e, enfim, à inesgotável

necessidade que tem o homem de compreender a si mesmo e ao mundo

que o cerca. As possibilidades dessa compreensão passam pela

vinculação a uma dada realidade histórico-social, tornando possível uma

aproximação melhor em seu dizer e fazer.

Nesse sentido, a pesquisa histórica em Psicologia não é um

retrocesso, como pensam alguns estudiosos, mas o fundamento que

permite uma melhor compreensão do homem em relação ao contexto

social do qual faz parte.

Baraúna (1999, p. 178) esclarece um pouco mais acerca da

importância da pesquisa histórica em Psicologia, dizendo:

A construção de novas formas de pensar o psíquico passa

necessariamente pela introdução da historicidade na

Psicologia e pelo contato dos psicólogos com a produção

historiográfica brasileira. O desenvolvimento de pesquisas

históricas na própria Psicologia, voltadas à contextualização de

seus objetos de estudo, traria elementos valiosos para compreensão dos

tipos de subjetividade que foram sendo engendrados na nossa história,

além de tornar mais rico e intenso o contato e a troca com outras

disciplinas.

Na verdade, pensar em construir o futuro da Psicologia pode

apresentar-se como uma tarefa difícil, mas, ao mesmo tempo, urgente, no

sentido de formar a consciência histórica das novas gerações de

psicólogos e dos que demonstram estar interessados em conhecê-la. Essa

preocupação é válida para os dias atuais, quando os esquecimentos se

fazem presentes. Nesse contexto, Massimi (1996, p. 87-88) alerta:

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[ . . .] Nós nos encontramos hoje em um clima sociocultural

que faci lita o esquecimento ou a censura da memória, em jovens

e adultos, o que, por sua vez, implica num enfraquecimento da

consciência da própria identidade cultural em indivíduos e

sociedades, bem como em um empobrecimento da capacidade

crítica [...]

Um aspecto que pode favorecer o interesse pela História da

Psicologia é o seu ensino nos cursos de graduação; entretanto, muitas

vezes, segundo Wertheimer (1998, p. 35), a forma como ela é ensinada

apresenta-se entediante e desconexa, com nomes, datas e fatos a serem

memorizados para uma avaliação e logo esquecidos. Justificando seu

pensamento, o autor afirma:

[...] O estudo da história da psicologia poderia ajudar o estudante a

desenvolver uma visão geral integrada desse campo, que poderia

servir para reduzir a diversidade assustadora e aparentemente

desarticulada de material encontrado em vários cursos de

psicologia [...].

Essa reflexão é compartilhada por outros estudiosos do assunto,

entre eles, Mancebo (1999a, p. 117) que, em sua análise histórica da

formação em Psicologia no Rio de Janeiro, alerta para os múltiplos

terrenos dessa ciência:

À revelia do modo como muitas vezes reproduzimos a História da

Psicologia em nossas aulas, não encontramos uma realidade

organizada em tomo de uma infindável rede de sistemas e escolas que se

sucederam e revezaram no tempo, caminhando para as formas mais

'evoluídas' do saber psicológico. Ao invés de relações de continuidade

(sucessores e predecessores), assistimos relações de lutas e

alianças travadas contemporaneamente, numa clara alusão ao fato de que

as trajetórias históricas não se dão, necessariamente, pela força dos

grandes homens, grandes feitos e ideias ou por determinações pré-

estabelecidas. [Sua preocupação vai além quando diz] [...] é preciso,

portanto, propiciar-lhe [ao aluno] as condições de exercer a crítica

diante das alternativas que lhe são apresentadas e dos impasses de nossa

disciplina [...].

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Baraúna (1999, p. 178) também chama a atenção para esse aspecto.

Para ela a história tem sido ausente nos cursos de formação em

Psicologia:

[...] Esse desconhecimento nos leva a inúmeros equívocos, desde a

transposição direta e sem mediações de teorias produzidas em outras

épocas e contextos, até o uso descontextualizado de testes psicológicos

e modelos de intervenção em ins t i tuições . Em a lguns

casos , a p rópr ia reconstrução 'histórica' de nossa subjetividade é

feita com base em teorias (europeias) produzidas a partir de condições

objetivas de vida da Europa do século XIX, que pouca

semelhança tem com o Brasil da mesma época.

Antunes (1999, p. 10), analisando o pouco investimento em

estudos na área da História da Psicologia, em geral, e da História da

Psicologia no Brasil, em particular, como relegadas a um plano

secundário, declara:

[...] Poucos são os cursos de Psicologia que têm essa disciplina em

seu currículo, são escassos os estudos e pesquisas nessa área e a

bibliografia é extremamente restrita. Essa situação agrava-se

sensivelmente quando a referência é a História da Psicologia no

Brasil. É possível afirmar que é generalizado o

desconhecimento do processo de construção histórica da

Psicologia em nosso país, reflexo possível do próprio

desconhecimento da História do Brasil pela maioria da

população brasileira.

Em termos gerais, o problema pode estar vinculado à forma como

são elaborados os programas das disciplinas de História da Psicologia,

quando existem, pois poucos são os currículos de cursos de formação em

Psicologia que contemplam a disciplina; nesse caso, grande parte dos

psicólogos brasileiros desconhecem a história de sua própria profissão

(BROZEK; MASSIMI, 1998a, p. 433).

Conforme Massimi (1996, p. 89), a forma como são ministradas as

disciplinas teóricas deveria evidenciar, de maneira clara, um

entendimento mais abrangente da História da Psicologia, pois considera

que muitas vezes o modo como são apresentados tais conteúdos não

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estimula o interesse e o despertar do pensamento empreendedor e

científico de futuros pesquisadores. Nesse sentido, recomenda que

[...] a formação dos alunos interessados nos estudos históricos

deva ser proporcionada a partir dos primeiros anos do curso, pois trata-se

de iniciá-los numa perspectiva intelectual que coloque a

d i me n s ã o t e m p o r a l c o m o r e c u r s o p a r a compreensão de

teorias e práticas psicológicas [...].

As preocupações referidas buscam, sobretudo, o conhecimento da

História da Psicologia e a formação do profissional, que possam

contribuir com essa ciência de forma mais ativa e crítica, possibilitando

saber que rumos ela vem tomando.

Mesmo com a iniciativa dos pesquisadores da Psicologia e com as

produções de que se dispõe, em fase de difusão, algumas medidas podem

ainda melhorar esse quadro, conforme salientam Brozek e Massimi

(1998a, p. 434):

Os objetivos preeminentes a alcançar nos próximos anos são : ed ição

de fon tes documentár ia s impor tante s para o es tudo e o

ensino da h is tó r ia d a psicologia; elaboração de manuais

introdutórios à história da psicologia que sigam abordagens

historiográficas mais recentes e proporcionem quadros comparativos

entre o desenvolvimento da psicologia e o paralelo desenvolvimento das

demais ciências e da história sociocultural; preparo de recursos

informatizados para transmissão dos conhecimentos na área.

A preocupação com a História da Psicologia no Brasil tem

motivado diversos grupos de pesquisadores, dentre eles o Núcleo Clio-

Psyché da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, que vem

resgatando e divulgando a memória dessa ciência, apresentando trabalhos

diversificados com a intenção, segundo Coimbra (2001, p. 13), de trazer

concepções diferentes acerca não só da historicização dos assuntos, mas

da implicação de seus atores com a realidade cotidiana brasileira. Além

desse, têm-se os Núcleos de História da Psicologia da Pontifícia

Universidade Católica de São Paulo e o de Epistemologia e História da

Psicologia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, contribuindo

para o conhecimento dessa ciência.

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CAPÍTULO II

...E ESSA HISTÓRIA OCORRE NUM CERTO ESPAÇO

[...] Se existe, pois, uma função histórica, que especifica a incessante confrontação entre um passado e um presente, quer dizer, entre aquilo que organizou a vida ou o pensamento e aquilo que hoje permite pensá-los, existe uma série indefinida “de sentidos históricos” [...].

Michel de Certeau, 1982

Falar sobre a História da Psicologia no Brasil pode parecer um

desafio, pelas queixas apontadas em relação à falta de estudos sobre esse

tema — o que vem ocorrendo desde a avaliação negativa de Brito

(1912 apud BROZEK; MASSIMI, 1998b, p. 209) ao dizer que até

então nada havia digno de menção — e, também, por ser essa história

considerada por muitos como área negligenciada e carente, relegada

a um plano secundário e com pouco acesso a informações. Mesmo

assim, algumas contribuições, como aquelas apresentadas

anteriormente, têm aparecido advindas de estudiosos interessados

nessa temática.

Aqueles que estão empenhados em produzir sobre esse tema

acreditam ser ele necessário, pois a História da Psicologia no Brasil

leva a pensar em questões mais abrangentes e fundamentais, como a

consciência do contexto social em que se vive no fluxo do tempo.

Como diz Antunes (1998, p. 374), a História da Psicologia,

particularmente a do Brasil, necessita de estudos que procurem

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compreendê-la como produção social, articulada ao movimento

histórico global da sociedade.

Nesse sentido, tornam-se urgentes os estudos nessa temática,

necessitando constantemente de ampliação e divulgação. As razões

para isso são variadas, e a Psicologia, talvez mais do que qualquer

outra ciência ou profissão, tornou-se interessada em refletir sobre a

sua história. Esse desafio tem caracterizado essa ciência nas últimas

décadas do século XX, podendo de certo modo apresentar pontos que

merecem ser examinados. Um deles, como referido anteriormente, é

que a Psicologia procura compreender o indivíduo inserido no

contexto histórico, entendendo esse homem que se faz homem e que

ao mesmo tempo participa da construção do seu mundo. Desse modo,

o indivíduo só pode ser compreendido se estiver imerso na totalidade

social e histórica que vai dar sentido à sua singularidade, percepção

que no passado não existia.

Isto leva a compreender o quanto a Psicologia caminhou-

conquistou seu próprio espaço como área de conhecimento e campo

de práticas — e necessita caminhar, procurando consolidar sua

identidade, a partir de uma investigação esclarecedora de suas raízes

e pressupostos.

Para contar a História da psicologia no Brasil, buscou-se apoio

em dados levantados por Antunes (1999), Bock (1999b), Massimi

(1990) e Pessotti (1988). Este último organizou a história das idéias

psicológicas no país, dividindo-a em quatro períodos: período pré-

institucional — dos escritos dos missionários que aqui est iveram e

escreveram textos que seriam psicológicos até o século XVIII;

período institucional — século XIX e início do século XX; período

universitário — quando a Psicologia começa a aparecer como

disciplina em cursos superiores; e período profissional — posterior à

regulamentação da profissão.

Os autores acima citados consideram que os estudos históricos

em Psicologia no Brasil têm mostrado que a preocupação com os

fenômenos psicológicos remonta a um longo passado — período colonial

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(1500-1822) —, preocupação que surge inserida em diferentes áreas

do saber, especialmente da Medicina e da Pedagogia. A importância

desses trabalhos prende-se à compreensão da construção histórica da

Psicologia no Brasil marcada pelo choque cultural entre os

colonizadores portugueses, os negros africanos e os nativos da Terra

de Santa Cruz. Nesse período histórico definiu-se a identidade

sociocultural do Brasil, uma preocupação com a definição de um caráter

nacional.

Ressalta Antunes (1999, p. 21):

O processo de colonização do Brasil por Portugal, no contexto da

expansão econômica europeia, foi pautado fundamentalmente na

exploração. A metrópole decidia o que deveria ser produzido, a

maneira de fazê-lo e seu monopólio, tendo como finalidade exclusiva o

lucro. Não houve p r eo cup ação d e fa to co m a co l o n ização

p ro p r i amente d i t a , o q ue ca r ac te r i za o B ras i l

mera me nte co mo co lô n i a d e exp lo ração .

Nesse período, não se fala da Psicologia no sentido do termo

atual, mas de ideias relacionadas a processos psicológicos, com

trabalhos revelando a existência de formas de conhecimento

psicológico, com forte influência do pensamento europeu. Esses

primeiros trabalhos em muito colaboraram para o estabelecimento

dessa ciência no Brasil, o que fez com que Pessotti (1988, p. 18) lhe

realçasse a importância, considerando o período pré-institucional

como específico. Isto porque o conteúdo psicológico, publicado e

lido, era desvinculado de instituições intelectuais específicas do

mesmo modo como não havia a preocupação em construir a

Psicologia, ou mesmo explicar psicologicamente qualquer tipo de

problema.

Os trabalhos dessa época são individuais, escritos por autores

brasileiros ou que moravam no Brasil, em sua maioria autodidatas.

Os temas abordados nesse período se caracterizavam, de acordo com

Massimi (1994, p.22), pela diversificação, motivados em alguns

casos por interesse especulativo e, em outros, por interesse

doutrinário, com finalidade religiosa ou moral, ou, ainda, com a

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necessidade prática de definir métodos para a terapia e o controle de

distúrbios de comportamento. Para Pessotti (1988, p.18), os

trabalhos produzidos, principalmente os direcionados para o

problema da conquista dos índios pela catequese ou pela educação,

demonstravam de modo especial a preocupação com a organização

do Estado e da sociedade.

Encontrando temáticas tão variadas, Massimi (1994, p.22)

agrupa tais trabalhos conforme os objetivos que abordam. Assim, um

primeiro tema trata do “conhecimento de si mesmo” nos escritos de

teólogos, filósofos, médicos e pedagogos, assumindo diferentes

enfoques em decorrência dos estilos adotados.

Essa temática, de acordo com Antunes (1999, p.19), guarda

íntima relação com questões que seriam abordadas mais tarde pela

Psicologia, destacando o autoconhecimento como um assunto que

continua sendo objeto da ciência e da prática psicológica, assim

como a objetivação da experiência interior que se constitui de

importância fundamental para a pesquisa psicológica. Entre os

representantes desse tema estão o Padre Antonio Vieira, Frei Mateus

da Encarnação Pinna, Dom Azeredo Coutinho e Mathias Aires

Ramos da Silva de Eça.

O "estudo das emoções humanas" se constitui no segundo

grupo de temas relativos a conhecimentos psicológicos, e o interesse

por ele fica claro nos escritos de cunho religioso, moral e médico.

Essas obras, conforme Antunes (1999, p. 18), se direcionam para

análises no campo comportamental em que os assuntos versam sobre

saudade, amor, ódio, vaidade ou tristeza. Muitos foram os que

escreveram sobre esse tema, entre os quais citam-se: Padre Antonio

Vieira, Frei Mateus da Encarnação Pinna e Padre Angelo Ribeiro de

Siqueira no contexto ético-religioso; Mathias Aires no contexto

moral; e Francisco de Mello Franco no contexto médico.

A esse respeito Massimi (1994, p. 22) comenta:

[...] As emoções, chamadas de 'paixões' ou 'afetos da alma' são atribuídas,

em alguns casos, a forças de natureza física ('humores'), ou ao

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movimento dos nervos; em outros casos, elas são consideradas

afeições da alma, independentes da disposição e de constituição

do corpo [...].

Para o terceiro grupo, alguns autores aqui citados

valorizaram os fenômenos sensoriais, mais precisamente no século

XVIII, estimulados pela filosofia empirista, pois consideravam a

atividade sensorial como origem de todo conhecimento. Segundo

Antunes (1999, p. 19), em muitos estudos realizados a utilização da

observação se fazia presente com resultados obtidos através da

experimentação. Em alguns temas (que mais tarde viriam a se

desenvolver na Psicologia) figuram fatores de natureza sexual, loucura,

fantasias, instintos e ilusão de ótica. Os intelectuais que se destacaram

nesse tema foram: Padre Antonio Vieira, Mathias Aires, Encarnação

Pinna, Angelo Siqueira e Mello Franco.

Para o quarto grupo, ainda de natureza psicológica, de acordo

com pesquisas realizadas por Massimi, no período colonial houve

grande frequência de trabalhos em relação ao tema educação e controle

do comportamento infantil. Esse interesse aparece desde o século XVI

nos relatos dos missionários jesuítas, sendo abordada também a

questão do desenvolvimento da personalidade feminina.

Com referência à criança e seu processo educativo, os assuntos

eram aprendizagem, influência dos pais, desenvolvimento da criança,

formação da personalidade, controle e manipulação do comportamento,

entre outros; e, para a personalidade feminina, as obras tratam de temas

como gravidez, amamentação, comportamento maternal, sexualidade e

seus desvios. As contribuições significativas nessas áreas foram: de

Alexandre de Gusmão, Mathias Aires, Mello Franco, Azeredo

Coutinho, Fernão Cardim, Manoel Figueiredo e Americus para o tema

relativo à criança; e de Feliciano Nunes, Alexandre de Gusmão,

Azeredo Coutinho e Mello Franco, para a personalidade feminina.

Vale destacar que nas pesquisas de Massimi utilizadas por

Antunes (1999, p. 20) a problemática do trabalho se fez presente

especialmente sob a ótica moral, social e psicológica, principalmente a

censura ao ócio e ao vício, já que o indígena era visto como preguiçoso

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e ocioso com tendência ao pecado. Nesse caso, o trabalho era usado

como meio de cura e civilização. As questões aqui discutidas por

Mello Franco, Alexandre de Gusmão e Mathias Aires giravam pela

adaptação ao trabalho, importância do trabalho para a criança, controlo

sobre a atividade produtiva e trabalho como instrumento de controle.

Ainda no final do período colonial, os conhecimentos

psicológicos aplicados à medicina por Mello Franco tratavam de

questões como psicopatologia, estudos sobre os nervos e sistema

nervoso, temperamentos, terapêuticas, teorias sobre sono e sonhos,

sexualidade e outros.

Deste modo, o pensamento psicológico, que foi fabricado nesse

período, é importante para a compreensão da História da Psicologia no

Brasil, pelos assuntos abordados, explicitando as raízes de algumas

temáticas estudadas em momentos posteriores. Entretanto, a Psicologia

do período pré-institucional foi inspirada no Brasil em uma posição

iluminista do homem e da sociedade, comprometida com os grupos

dominantes dessa época.

Nas palavras de Antunes (1999, p.110), esse período

[...] refletia as condições de sociedade na qual se inseria, não

apenas por incorporar seu pensamento dominante, como também

seus conflitos. Sobre o pensamento psicológico propriamente

dito, sua principal característica é ser tratado no interior de

outras áreas do saber, não se vinculando explicitamente a

instituições específicas, como viria a ocorrer no período

subsequente.

Com o surgimento de instituições médicas e escolares no

Brasil, a produção do saber psicológico esteve mais restrita a esses

locais de produção do conhecimento, No século XIX, o país passava

por mudanças culturais, políticas e econômicas. Assim, o pensamento

psicológico apresentou diferenças em relação ao período anter ior,

marcadamente na produção de ideias e práticas psicológicas.

Caracterizado por Pessotti (1988, p.22-23) de institucional, esse

período e o século XX foram fundamentais para a Psicologia, na

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preparação do seu processo de autonomização. As elaborações

teóricas durante esse período ocorrem paralelamente com o processo

de independência do Brasil e sua consolidação como Estado moderno.

Diante dessa situação, Massimi (1994, p.24) situa os conhecimentos

psicológicos como instrumentos úteis para propiciar a adaptação dos

sujeitos na busca de uma identidade nacional. Nesse contexto são

criadas faculdades, sociedades científicas e revistas.

As produções desse período foram muitas e os estudos médicos

se destacaram por promover o desenvolvimento de teorias e práticas

psicológicas de tal forma que a Psicologia Clínica define-se nesse

contexto. A Medicina brasileira do século XIX tem como proposta

um tipo de saber global acerca do homem, compreendendo não

apenas as dimensões físicas e morais, mas suas relações no meio

ambiental.

Os estudos nessa área abordavam problemáticas de natureza

psicológica, fruto de teses de doutorado elaboradas por médicos

brasileiros e defendidas publicamente, condição exigida para a

conclusão do curso de graduação pelas Faculdades de Medicina do

Rio de Janeiro e da Bahia, criadas em 1832. Embora os temas

estivessem ligados à Psiquiatria, à Neurologia, à Medicina Social e à

Medicina Legal, os assuntos tratados eram diversificados. Entre eles

citam-se paixões ou emoções, histeria, psicofisiologia, hipocondria,

sexualidade, higiene escolar.

A tese de Manoel Ignacio de Figueiredo Jaime, intitulada "As

paixões e afetos d'alma em geral, e em particular sobre o amor,

amizade, gratidão e o amor da pátria", defendida em 1836, foi a

primeira a tratar do fenômeno psicológico. A partir daí ocorre um

crescente aumento na produção de trabalhos como a tese de Henrique

Roxo "Duração dos atos psíquicos elementares", orientada por

Teixeira Brandão, no ano de 1900, apresentada à Faculdade de

Medicina da Bahia, considerada como primeiro trabalho em

Psicologia Experimental publicado no Brasil, assinalando a partir

claro início de muitos outros importantes trabalhos (PESSOTTI,

1988, p.21; ANTUNES, 1999, p.29).

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O florescer da pesquisa mostra-se no ano de 1907, com a tese

de Maurício Medeiros sob o título "Métodos em Psicologia'',

apresentada à Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro, reconhecida

como o primeiro trabalho brasileiro referente à metodologia em

Psicologia. Dentro dessa abordagem contem-se as obras de Plínio

Olinto2. Nesse momento, novas conexões surgiram, como, por

exemplo, a Psicologia com a Neurologia e com a Psiquiatria.

A institucionalização da Psicologia no Rio de Janeiro atinge seu

ápice naquela época, com a difusão de produções através:

a) do Laboratório de Fisiologia, mantido pelos irmãos Miguel,

Álvaro e Branca Osório, para investigações sobre os reflexos e a

atividade nervosa central;

b) do Laboratório de Psicologia do Engenho de Dentro, criado

em 1923, por Gustavo Riedel, destinado ao estudo, cura e profilaxia

de moléstias mentais, com aparelhagem sofisticada para medir

sensações, reflexos, memória, pensamento, discriminação, onde a

função do psicólogo estava bem definida e era vista como auxiliar

indispensável do médico, demonstrando a estreita relação da

psiquiatria com a psicologia, a que se fez referência anteriormente;

c) da Liga Brasileira de Higiene Mental, fundada em 1922, por

Gustavo Riedel, a qual, como atesta Lourenço Filho (1955 apud

MASSIMI, 1990, p. 66-67),

[...] mantém um laboratório e um “Seminário b r a s i l e i r o d e

p s i c o l o g i a ” q u e s e r e ú n e semanalmente. Além disso, organiza

anualmente as 'Jornadas Brasileiras de Psicologia', tendo uma enorme

influência na evolução da psicologia científica no Brasil [...].

Pelas extensas produções, quantidade de pesquisas e ensaios no

Laboratório, Antunes (1999, p. 51) diz que

2 Esse autor, em 1911, publica "Associação de Ideias" e em 1944, "A Psicologia

Experimental no Brasil".

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[...] três elementos apresentam-se como particularmente significativos: a

preocupação com a fo rmação de ps icó logos e a d i fusão do

conhecimento psicológico; o trabalho clinico e a aplicação da

Psicologia a questões relativas ao trabalho.

Assim, a autora destaca a importância do Laboratório de

Psicologia de Engenho de Dentro para o reconhecimento da

autonomia científica e prática da Psicologia no Brasil.

Em 1924, Waclaw Radecki assumiu a direção desse Laboratório

e foi autor de muitos trabalhos ali produzidos, devendo-se a ele,

também, a significativa divulgação e ampliação da Psicologia no

Brasil.

Conforme Pessotti (1988, p. 22), na Faculdade de Medicina do

Rio de Janeiro os estudos, as teses e as pesquisas estavam voltados,

principalmente para a Neuropsiquiatria, a Neurologia e a Psicologia.

Na Faculdade de Medicina da Bahia, os estudos eram direcionados a

pesquisar a aplicação social da Psicologia, por meio da Criminologia,

Higiene Mental, Psiquiatria Forense, sendo os médicos Artur Ramos,

Juliano Moreira, Afrânio Peixoto e Raimundo Nina Rodrigues os que

se destacaram pela produção bibliográfica. Nessa Faculdade, no

período de 1840 a 1900, foram defendidas 43 (quarenta e três) teses

sobre temas de Psicologia como a de Francisco Tavares da Cunha,

"Psicofisiologia acerca do Homem", em 1851, e a de Ernesto

Carneiro Ribeiro, "Relação da Medicina com as Ciências Filosóficas:

Legitimidade da Psicologia", apresentada no ano de 1864.

Contudo, essas contribuições não ficaram restritas ao Rio de

Janeiro e à Bahia. No ano de 1918, Francisco Franco da Rocha

difundia, na Faculdade de Medicina de São Paulo, ideias sobre

Psicanálise, o que mais tarde lhe permitiu escrever o livro "A

doutrina de Freud". Foi ele quem, em 1898, fundou o Hospital de

Juqueri, onde aplicava técnicas psicológicas e psicoterápicas, além de

criar um Departamento de Psicopatologia nessa Faculdade. Ainda em

São Paulo, o Instituto de Higiene foi outro centro de disseminação da

Psicologia, composto por médicos, educadores e engenheiros.

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Nesse período, em Recife, o pioneiro da Pesquisa Social da

América Latina, Ulisses Pernambucano, fundou, em 1925, o Instituto

de Seleção e Orientação Profissional de Pernambuco, propiciando

uma vasta produção de pesquisas em Psicologia Aplicada. Convém

registrar sua atuação no Hospital da Tamarineira e na Colônia de

Barreiros, quando realizou “[...] uma modalidade nova de assistência

aos alienados [...] incluindo o hospital aberto, a atenção às famílias

dos doentes, a utilização do trabalho como método terapêutico [...]"

(MASSIMI, 1990, p. 68).

Para Antunes (1999, p. 64),

[...] é possível dizer que a Medicina veio a ser, nesse p e r ío d o , um

i mp o r tan te sub s t r a to p a r a o desenvolvimento da Psicologia no

Brasil, mantendo uma tradição iniciada no fim do período colonial e

ao mesmo tempo a superando. A evolução do pensamento psicológico no

interior da Medicina até o século XIX, preparou o terreno para

que o conhecimento e a p rát ica da Psicologia se

desenvolvesse a tal ponto que fizeram delinear-se com maior

clareza seus contornos, tendo assim contribuído para a

penetração da Psicologia científica e sua definição como

campo autônomo d e co nhe c i me nto e ação , o q ue v e io a se

concretizar nas décadas iniciais do século XX.

O período institucional contou também com a Pedagogia na

produção e multiplicidade de assuntos psicológicos, ministrada nos

colégios e nas Escolas Normais, com o propósito de preparar o corpo

docente brasileiro, cujas carências eram consideradas parte da

deficiência do sistema educacional do país. Nesse sentido, surge a

necessidade de se organizar o ensino, utilizando-se métodos

objetivos, inspirados nos moldes europeus e norte-americanos. A

relação da pedagogia com estudos psicológicos é, nesse momento,

extremamente reforçada, pois a educação é vista como o grande fator

responsável pelo desenvolvimento da sociedade, visão articulada pelo

pensamento positivista da época.

A relação da pedagogia com a psicologia toma-se mais forte no

final do século XIX e início do século XX, especialmente pela rigidez

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metodológica do ensino, em que duas condições eram apontadas

como essenciais: a necessidade de conhecimento por parte do

educando e a formação do educador que, assim, deveria ter domínio

desse saber para a realização eficaz de sua ação pedagógica. Os

conteúdos de Psicologia faziam parte dos programas da disciplina

"Pedagogia" das Escolas Normais, abordando-se questões como

educação das faculdades psíquicas, aprendizagem e utilização de

recompensas como instrumentos educativos (ANTUNES, 1999, p .

28).

Como o objetivo da Pedagogia naquela época estava pautado na

direção da educação das faculdades da alma, ficou evidente sua

dependência em relação à Psicologia, uma vez que ela se ocupava do

funcionamento de tais faculdades. Sobre essa relação, diz Massimi

(1990, p. 55):

Enquanto a tarefa da psicologia é a de definir o significado, a função,

as características e a dinâmica evolutiva das faculdades

psíquicas, a pedagogia se ocupa dos meios e dos métodos para o

desenvolvimento delas.

No final do século XIX, a relação da Psicologia com a

Pedagogia se altera, conforme descreve Massimi (1990, p. 56):

[...] com o surgimento da psicologia experimental e com a substituição

dos ideais tradicionais que fundamentavam a pedagogia, por uma

visão de educação como sendo considerado dependente da

coletividade social. Nessa fase, a pedagogia será totalmente subordinada

à psicologia [...]

No nível legislativo o governo republicano propõe a Reforma

Benjamim Constant em 1890, dirigida ao ensino do Distrito Federal.

Essa Reforma propõe, entre outras mudanças: a tentativa de

substituição do currículo acadêmico por um currículo enciclopédico

com disciplinas científicas na sequência determinada pela orientação

positivista; a organização do ensino secundário, primário, normal,

com gratuidade estabelecida ao ensino primário; e a criação do

Pedagogium, instituição pedagógica pioneira no país, comprometida

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com a educação, que propiciou a expansão desse pensamento pelas

Escolas Normais.

O Pedagogium constituiu-se em centro de pesquisas

educacionais, uma espécie de academia e museu pedagógico, onde foi

organizado o Laboratório de Psicologia Experimental, em 1906.

Considerado o primeiro Laboratório de Psicologia do país, foi

planejado por Binet, em Paris, e dirigido por Manoel Bomfim. A

produção do Laboratório resultou em muitas pesquisas e publicações,

como o livro de Bomfim, "Noções de Psicologia", editado entre 1917

e 1922, e outro, sobre Testes, em 1928 (PESSOTTI, 1988, p. 24;

ANTUNES, 1999, p. 73).

Nesse panorama, as instituições educacionais, em especial as

Escolas Normais das cidades de São Paulo, Recife, Rio de Janeiro,

Fortaleza e Belo Horizonte constituíram-se em importante marco para

o estabelecimento da Psicologia científica do Brasil, no âmbito

teórico e prático de seu conhecimento. Foi no interior dessas

instituições que os primeiros profissionais da Psicologia começaram

sua atuação profissional, como Lourenço Filho, Noemy Silveira

Rudolfer, Damasco Penna, Anísio Teixeira, e outros (PESSOTTI,

1988, p.24; ANTUNES, 1999, p.72; BOCK, 1999b, p. 69).

De acordo com Pessotti (1988, p. 26), esse período institucional

da Psicologia brasileira estendeu-se por um século: da instalação das

Faculdades de Medicina até a criação da Universidade de São Paulo

(USP), em 1934, e de outras universidades logo depois. Durante esses

cem anos fatos importantes aconteceram:

[ . . .] a consolidação da independência, os movimentos

abolicionistas, o processo de industrialização no Brasil, a

imigração europeia em grande escala, a proclamação e consolidação da

República, os movimentos separatistas, a revolução paul is t a de 1932

e , a j ulgar pe la s o bras mencionadas, todos esses

acontecimentos parecem não ter exercido qualquer influência clara

sobre a orientação do saber psicológico no país, afora a afirmação

tácita da liberdade individual de pesquisa nas mais diversas áreas e

intensa preocupação com o ensino público e com a formação de

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pensadores e pesquisadores no campo da aplicação médica ou

pedagógica da Psicologia.

O período universitário da Psicologia, segundo Pessotti (1988,

p. 26), foi marcado, como se mencionou anteriormente, com a criação

da primeira universidade brasileira, a Universidade de São Paulo. A

partir daí, a Psicologia passa da condição de disciplina opcional e

torna-se obrigatória, no ensino superior, ministrada nos cursos de

Ciências Sociais, Filosofia e Pedagogia, como também nos cursos de

Licenciatura.

Durante esse período, outros fatos relevantes ocorreram: a

Psicologia atinge seu desenvolvimento autônomo desvinculado da

Medicina e virtualmente independente da aplicação escolar; cria-se a

cátedra de Psicologia da Educação na USP; o Instituto de Educação

da Escola Normal do Rio de Janeiro incorpora-se à Universidade do

Distrito Federal em 1935. Massimi (1990, p. 74) define a era

universitária como: "[...1 o início de uma nova fase da história da

psicologia brasileira [...]”.

Como informa Pessotti (1988, p. 27), outros acontecimentos

importantes para a Psicologia nesse período foram: a criação da

Associação Brasileira de Psicólogos; a publicação, pela revista

Arquivos Brasileiros de Psicotécnica, de um anteprojeto de lei que

tratava da formação e regulamentação da profissão; a multiplicação

de instituições, associações de pesquisadores e núcleos de estudo em

vários Estados do Brasil; a criação de Sociedades de Psicologia; e o

surgimento da Psicologia Industrial.

A Psicologia brasileira nesse período pôde contar ainda com

contribuições decorrentes de influências estrangeiras, ligadas à

Psicologia norte-americana e europeia, com a vinda de professores

para chefiar e orientar grupos de pesquisadores e estudiosos do

conhecimento psicológico através de cursos e conferências.

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No Laboratório do Engenho de Dentro, que foi incorporado à

Universidade do Brasil, destacam-se3 Jayme Grabois, Nilton Campos,

Antonio Gomes Penna e Eliezer Schneider; na Universidade do Rio

Grande do Sul, Décio de Souza; nas Universidades Federal e Católica

de Minas Gerais, Helena Antipoff, que muito contribuiu com seus

conhecimentos na Educação e na Psicologia.

Cumpre também ser lembrado que, embora a Medicina não

dominasse esse período, como ocorreu no período institucional, as

contribuições continuaram graças a esforços como de Durval

Marcondes, Lourenço Filho, Franco da Rocha, Raul Briquet e outros,

que fundaram em 1927, no Rio de Janeiro, a Sociedade Brasileira de

Psicanálise (PESSOTTI, 1975, p. 4).

A formação em Psicologia anterior à criação dos cursos de

Bacharelado e Licenciatura era considerada insuficiente e não

profissionalizante, uma vez que os alunos tinham conhecimento de

teorias, mas não estavam capacitados à aplicação da prática

psicológica. Os conteúdos ministrados versavam sobre teoria

gestáltica, teoria psicanalítica, teorias da aprendizagem, do

desenvolvimento e da personalidade, diferenças individuais,

psicofísica e funcionalismo (PESSOTTI, 1988, p.28).

Como comenta Bock (1999b, p. 159), no período universitário,

[...] a Psicologia vai recebendo contornos claros de um conhecimento a

serviço da adaptação dos indivíduos ao seu meio social e físico. São

concepções dominantes aquelas individualizantes, a - h i s t ó r i c a s e

c a r r e g a d a s d e u ma v i s ã o naturalizante do homem e de seu

fenômeno psíquico [...].

O período profissional, conforme Pessotti (1988, p.28), foi

importante para a Psicologia pela criação dos cursos de Bacharelado e

Licenciatura em Psicologia, e pela regulamentação da profissão de

psicólogo através da Lei n° 4.119, de 27 de agosto de 1962.

3 Cf. verbetes em CAMPOS, R. H. de F. (Org.). Dicionário biográfico da psicologia

no Brasil: pioneiros. Rio de Janeiro: Imago, 2001.

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Na criação do primeiro curso de Psicologia do país, pela

Universidade de São Paulo — diferentemente de Pessotti, alguns autores

defendem que o primeiro curso de Psicologia foi criado na Pontifícia

Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ) em 1953 —,

incentivada por Anita Cabral, o corpo docente foi composto por

pedagogos e filósofos. Essa foi por muito tempo uma característica

dominante dos cursos de Psicologia, permanecendo até recentemente em

muitos lugares, como na Instituição a que ora se tem vínculo pelos

estudos e pelo trabalho, a Universidade Federal do Maranhão.

A análise realizada por Pessotti (1988, p. 28) sobre a formação de

psicólogos no Brasil faz referência ao fato de esta análise ter ocorrido

com a chegada da Análise Experimental do Comportamento e da

Modificação do Comportamento, na USP, a partir dos ensinamentos de

Fred S. Keller nessa área, que mais tarde foi expandida para os grandes

centros de formação de psicólogos.

A propagação dessa área foi mais evidenciada com a criação do

Departamento de Psicologia na Universidade de Brasília, em 1964, que

contou com a participação de Fred Keller, Carolina Bori, Rodolpho Azzi e

J. Sherman. Por pressão do governo militar, no ano de 1965 ocorreu a dissolução desse

Departamento, o que implicou na saída de profissionais para outros Estados,

disseminando essa abordagem teórica em Psicologia. A produção

científica e didática permaneceu, portanto, sob a orientação

comportamentalista, ainda mais fortalecida com a implantação dos cursos

de pós-graduação. Somente depois de muitos anos foi que outras

orientações técnico-metodológicas imprimiram suas posições na

psicologia.

No período profissional, como salienta Pessotti (1988, p. 30),

alguns problemas se evidenciam, a saber: a cessação da convivência com

as disciplinas da Filosofia e das Ciências Sociais; a criação de

departamentos independentes dentro da própria área de Psicologia, às

vezes antagônicos; a criação de um número excessivo de cursos de

Psicologia no país, sem planejamento, mas com o apoio da ditadura

militar; o pouco comprometimento de profissionais autônomos em

relação aos núcleos acadêmicos, entre outros. Mesmo com os problemas

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apontados, ao longo do tempo a profissão conquistou seu espaço de

ciência autônoma.

Para Bock (1999b, p.159), nesse período,

[ . . .] cresce uma concepção instrumental da P s i co lo g ia .

L i ma v i são fu nd a me nt ad a em tendências científicas, que

empregavam métodos das ciências naturais no estudo do

homem, demonstrando, assim, uma concepção a-histórica, um sujeito

abstraído de suas relações sociais e do seu contexto cultural [ .. .]

cresce também, paralelamente, os movimentos que negam as

concepções individualizantes e a-históricas na Psicologia e que buscam a

construção de uma Psicologia crítica, que situe o homem em seu

momento social e histórico para compreender seu mundo psíquico [...].

A longa História da Psicologia originada no Brasil colonial

(período em que se pode reconstituir a história de "ideias psicológicas") e

atravessada por diferentes campos do saber mostrou que a Psicologia tem

exercido sua função social nos diferentes segmentos da sociedade,

contribuindo para a compreensão dos problemas humanos. Todavia,

torna-se cada vez mais urgente o conhecimento de sua história assim

como das condições que forneceram o substrato para o seu

desenvolvimento, evidenciando as lutas e alianças em sua trajetória até à

constituição do campo autônomo de práticas e saberes que hoje se

conhecem.

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CAPÍTULO III

OS PRIMÓRDIOS DA PSICOLOGIA NO MARANHÃO

É consenso aos que se dedicam a preservar a memória e a identidade da civilização humana, ou de partes da civilização, que o movimento do tempo opera muito mais a favor do esquecimento que da lembrança [. . .] Este movimento de 'abandono do passado', quando não é puro descaso, c o n s c i e n t e o u i n c o n s c i e n t e m e n t e é resultado, diriam muitos, da necessidade de sermos modernos [...]

Ananias Martins, 2000

3.1 O Estado do Maranhão: o contexto

O Maranhão faz parte dos nove Estados que compõem a região

Nordeste do Brasil a qual, em razão da variedade de clima, vegetação e economia,

divide-se em cinco zonas: Litoral, Zona da Mata, Agreste, Sertão e Meio-

Norte. Localiza-se mais precisamente no Meio-Norte ou Nordeste

Ocidental, no Hemisfério Oeste. Portanto, limita-se, ao norte, com o

Oceano Atlântico; a leste e sudeste, com o Estado do Piauí; ao sul e a

sudoeste, com o Estado do Tocantins; e a oeste, com o Estado do Pará.

Possuindo uma extensão de 328.663 km², é considerado o 8º Estado mais

extenso do Brasil, e o 2º da região Nordeste, abrigando uma população de

5.638.381 habitantes de acordo com os dados do Instituto Brasileiro de

Geografia e Estatística (IBGE), do ano de 2000. Encontra-se distribuído

politicamente em 217 municípios divididos em cinco mesorregiões —

Norte, Oeste, Centro, Leste e Sul —, caracterizadas pelos tipos de

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atividades desenvolvidas em relação agricultura, à pecuária, à indústria, à

vegetação e aos meios de transporte.

A designação de "Maranhão" a este Estado está envolta em uma

série de controvérsias. Conhecida anteriormente como Trindade, alguns

pesquisadores acreditam que a etimologia do nome deriva da palavra

indígena maranãguaras (de maranã por paraná, semelhante ao mar, e

guara, habitante) provavelmente tupinambás chegados do sul, fugindo à

ocupação portuguesa do Brasil. Outros a explicam como "água que corre

brigando", ou, ainda, derivada do nome de algum transitório descobridor,

pois o apelido da marangnon, aportuguesado depois, já de muitos séculos

era conhecido na Espanha (MEIRELES, 1960, p. 21).

De acordo com Meireles (1960, p. 20), Maranõn era o nome do

atual rio Amazonas. Isso reforça a hipótese de o nome Maranhão estar

associado ao naufrágio de Aires da Cunha (um dos donatários da

Capitania do Maranhão) no golfão onde fica a Ilha de São Luís, pois, não

conhecendo o lugar, julgou ter naufragado onde o rio Amazonas se lança

ao mar, constituindo-se esta última a mais provável explicação acerca do

nome desta terra.

Embora o Maranhão seja conhecido pela sua história e tradição, é

importante salientar que o propósito desta exposição é delinear alguns

fatos relevantes presentes na memória de seu povo, os quais constituem

pontos considerados significativos para esse estudo, tais como o processo

de colonização, a economia e a cultura, propiciadores do atual panorama

educacional no ensino superior no Estado.

O período pré-colonial brasileiro (1500-1530) é marcado pela falta

de um plano de ocupação dessas terras por parte do governo português,

que tinha como principal interesse o lucrativo comércio de especiarias

com Oriente. Sendo assim, os colonizadores limitaram-se a explorá-las

periodicamente e a defendê-las contra intromissões estrangeiras,

principalmente francesas.

O declínio do comércio oriental, aliado à preocupação de perder a

terra para os franceses, fez com que a Coroa Portuguesa optasse pela

colonização das terras brasileiras. Para tanto, a adoção do sistema de

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capitanias hereditárias que tinham por objetivo estimular a iniciativa

particular para a colonização das terras portuguesas na América, foi um

sistema administrativo mais conveniente para a Coroa, realizando a tarefa

de colonização sem arcar com o ônus de empreendimento.

Assim, o Brasil foi dividido em quinze lotes de terra denominados

capitanias, dentre as quais a do Maranhão, doada aos donatários João de

Barros e Fernão Álvares de Andrade que, associando-se a Aires da

Cunha, empreenderam algumas tentativas para tomar posse de sua

capitania, tentativas que, em função da difícil penetração nesta região,

resultou em fracasso.

Desse modo, dir-se-ia que a colonização do Maranhão não ocorreu

no contexto da implantação das capitanias hereditárias. Foi somente a

partir de 1612 que se iniciou efetivamente a ocupação desta região pelos

conquistadores franceses. Nos escritos de Barbosa de Godóis — História

do Maranhão (1904 apud LIMA, 1981, p. 22), lê-se que

[...] a demora da colonização do Maranhão deveu-se também à má

impressão deixada na Corte pela expedição de Pero Coelho. Foi, aliás,

este Pero Coelho, talvez o principal responsável pelo ódio que os

indígenas passaram a dedicar aos portugueses a quem chamavam

indistintamente de “pêros”, em lembrança das muitas atrocidades e

traições ignominiosas de que foram vítimas.

Ao chegarem ao Brasil, os colonizadores encontram duas raças

distintas de indígenas dominando quase a totalidade do território

brasileiro: os tupis e os tapuias. No Maranhão, os índios, principalmente

os tupinambás que aqui habitavam, eram provenientes do litoral leste do

Brasil e encontravam-se distribuídos em vinte e sete aldeias sob a chefia

de Japiaçu. Foram eles que denominaram a capital do Estado — São Luís

— de Upaon-Açu, que na língua tupi significa Ilha Grande.

Com efeito, São Luís, a Upaon-Açu dos Tupinambás, visitada por

muitos aventureiros, transformou-se no grande palco das lutas ocorridas

para conquistar o território maranhense. Dessa forma, a origem da cidade

confunde-se com interesses colonizadores e com conflitos de ocupação

territorial por portugueses, franceses e holandeses.

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Sabe-se que as primeiras intenções colonizadoras partem dos

franceses, cujos propósitos eram ocupar terras da América, das quais

Portugal e Espanha consideravam-se os únicos proprietários. Devido a um

acordo assinado entre as duas nações no ano de 1494, denominado

Tratado de Tordesilhas, esse lado do mundo era dividido em duas partes,

cabendo o lado leste do Brasil, de Belém ao norte até Laguna ao sul, a

Portugal, e o lado oeste, à Espanha. Ocorre que, em 1500, os portugueses

chegam ao Brasil em uma esquadra comandada por Pedro Álvares Cabral,

que aporta na Bahia. Depois que o governo português toma conhecimento

da imensidão do território a ser conquistado, resolve dividi-lo em

capitanias hereditárias, cabendo a João de Barrosa responsabilidade pelos

investimentos que garantissem a ocupação das terras do Maranhão. De

fato, os franceses chegaram à Ilha de São Luís antes dos portugueses e de

outros invasores. A primeira expedição marítima data de 1535, outras

foram tentadas por terra, mas encontravam a resistência dos índios da

região. A expedição comandada por Jacques Riffault, em 1594,

estabeleceu um posto de comércio de madeiras que eram enviadas à

França para produção de tintas que coloriam tecidos (MARTINS, 2000, p.

22-23).

Outra expedição, comandada por Charles Des Vaux, aqui chega

com o objetivo de tomar posse da região. Para tanto, os franceses

aprendem a língua dos índios, conquistando-lhes a simpatia e confiança

para organizar a defesa da nova colônia, certos de que os portugueses

tentariam expulsá-los logo que tomassem conhecimento da situação.

Destarte, em 1612, a França resolve enviar ao litoral do Maranhão uma

expedição composta de três navios com quinhentos homens e os primeiros

missionários, fundando um núcleo de colonização denominado "França

Equinocial", sob o comando de Daniel de La Touche, Senhor de La

Ravardière. Em 12 de agosto de 1612, os franceses celebraram a primeira

missa no local e em 8 de setembro do mesmo ano o Senhor de La

Ravardière funda a cidade de São Luís, assim denominada em

homenagem ao rei menino francês Luís XIII.

Entretanto, ao tomarem conhecimento do sucesso da invasão

francesa, os reis portugueses enviam expedições para expulsar os

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invasores e resgatar o processo de colonização. Então, sob o comando de

Jerônimo de Albuquerque, os franceses são derrotados em novembro de

1614 na batalha de Guanabara4.

Além disso, com o fim de assegurar o domínio sobre o território da

Ilha, Portugal passou a enviar expedições colonizadoras, uma delas no ano

de 1615 sob o comando do engenheiro-mor do Estado do Brasil, Francisco

Farias de Mesquita, que teve a missão de projetar a construção de fortes

que resguardassem a Ilha contra invasões e de elaborar o primeiro plano

de urbanização de São Luís: um conjunto urbanístico de concepção

hispânica, visto que Portugal se encontrava, naquela época, sob

dominação espanhola.

É importante destacar que o caráter civil que impera no Centro

Histórico5 da capital do Maranhão é considerado um dos mais

representativos e ricos da tipologia arquitetônica portuguesa produzida

durante a colonização do Brasil, cujas características marcantes são os

sobrados de fachadas revestidas com azulejos também portugueses.

Em meados do século XVII, em 25 de novembro de 1641, Portugal

torna a disputar o Maranhão com os invasores, dessa vez os holandeses,

que tentaram repetir o sucesso da ocupação realizada em Pernambuco em

1630, quando foram atraídos pela cultura do açúcar na zona rural. Assim

como os franceses, queriam os holandeses fazer de São Luís uma colônia

de seu país.

Com uma esquadra composta de dezoito embarcações e dois mil

homens comandados por João Cornelis Lichtardt, os invasores holandeses

ancoraram em terras maranhenses na enseada de Araçagy. Esses

holandeses saquearam a cidade, profanaram igrejas de onde roubaram

todo o ouro e pedras preciosas que adornavam os altares, provocando

4 Batalha naval travada entre portugueses e franceses, importante no processo de

expulsão destes últimos da Ilha de São Luís. 5 Em face da extensa dimensão de área construída e do caráter representativo do conjunto

arquitetônico e urbanístico do Brasil-Colônia (séculos XVIII e XIX), a cidade de São Luís é hoje

reconhecida e foi elevada pela UNESCO — Organização das Nações Unidas para a Educação e

Cultura — à categoria de Patrimônio Cultural da Humanidade.

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pânico na população. Aprisionaram o governador Bento Maciel Parente,

obrigaram a população a prestar juramento público ao governo e à

bandeira holandesa e, por fim, designaram para governar a capital do

Estado o holandês Pieter Bas.

Após dois anos de invasão, graças à resistência dos moradores

juntamente com os reforços vindos de Lisboa, numa operação surpresa,

em fevereiro de 1644, os portugueses consumaram a expulsão holandesa,

após muitas emboscadas, lutas e mortes. Em razão disso, os maranhenses

comemoraram a vitória, e os lusitanos recuperaram a posse do território.

A partir daí, inicia-se, de fato, a colonização portuguesa no Maranhão.

Isto, na prática, significava somente a posse inconteste, já que nada foi

feito para o desenvolvimento local. As lembranças da expulsão dos

holandeses estão contidas nos dois primeiros versos da quarta estrofe do

Hino do Maranhão6 (NASCIMENTO; CARNEIRO, 1996, p.81):

Reprimiste o Flamengo aventureiro,

E o forçaste a no mar buscar guarida;

Dois séculos depois, disseste ao luso:

- A liberdade é o sol que nos dá vida.

No tocante à economia, o Maranhão e a região Norte viviam em

estado de abandono e miséria, produzindo um primário extrativismo

vegetal submetido à indigente agricultura de subsistência. O comércio

maranhense era insignificante até 1750, as produções agrícolas eram

pouco desenvolvidas, de modo que somente em 1756 o Estado começa

sua arrancada para o progresso, através da criação da Companhia de

Comércio organizada pelo Marquês de Pombal.

Ressalte-se, entretanto, que, em 1682, a Coroa Portuguesa criou a

Companhia de Comércio do Maranhão e Grão-Pará, empresa monopolista

constituída por capitais burgueses, visando, dentre outros aspectos,

aquecer o mercado colonial. A referida Companhia se dispunha a fornecer

mão de obra africana aos lavradores maranhenses; abastecer o mercado

interno com produtos manufaturados; fazer a comercialização da produção

maranhense através do envio anual de navios.

6 Letra de Antônio Baptista de Godóis e música atribuída a Antonio dos Reis Raiol.

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Pode-se dizer que o Maranhão teve apreciável progresso econômico

em meados do século XVIII até o primeiro quartel do século XIX, quando

desempenhou importante papel na produção econômica do Brasil. Possuía

condições para ser um grande Estado: tinha na agricultura uma das

atividades mais importantes, com destaque para o algodão, o arroz e o

açúcar — que, no seu apogeu, foram exportados para o mercado exterior

—; era um porto com condições de operação; era o segundo parque

industrial do país, composto de muitas fábricas (onze fábricas de fiação e

tecelagem de algodão, sendo três em Caxias, uma em Codó — municípios

do Maranhão — e as demais em São Luís, possuindo, ainda, um de

engenho central de açúcar, uma fábrica de calçados, uma fábrica de

fósforos, uma fábrica de produtos cerâmicos, uma fábrica de chumbo e

pregos, quatro fábricas de pilar arroz, duas fábricas de açúcar e

aguardente, entre outras).

Como se pode evidenciar, a articulação do Maranhão ao mercado

externo ocorreu a partir de acontecimentos conjugados: a criação da

Companhia Geral de Comércio do Grão-Pará e Maranhão que efetivou a

entrada da mão de obra africana; a expulsão dos jesuítas pela junta

governativa, que os considerava prejudiciais à economia na medida em

que se opunham ao trabalho escravo indígena, de interesse dos

comerciantes e fazendeiros necessitados de trabalhadores. Durante esse

período, o Maranhão se tornou a quarta economia do país, fato que alterou

profundamente a vida do Estado, ocasionando o florescimento de seu

panorama cultural.

Conforme observa Meireles (1960, p. 283), esse fato

[...] se traduziu no enriquecimento material e no aprimoramento

intelectual da sociedade, e culminaria, já no Império, no surgimento de

uma elite latifundiária e de uma nobreza rural que concederiam à então

província uma posição de primeiro plano no cenário nacional, não só no

campo econômico, como no político e no cultural.

Tal situação, em São Luís, permitia a seus habitantes importar

louças, móveis, joias e as mais famosas companhias de teatro do mundo.

No final do século XVIII e início do XIX, conforme Meireles (1960, p.

289), os futuros condes, viscondes, barões, moços fidalgos e

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comendadores, que eram filhos dos abastados senhores rurais, educavam-

se com requinte na Europa, cursando as universidades de Coimbra ou

Lisboa, ou as universidades da França ou da Alemanha, de onde voltavam

bacharéis e doutores em Leis, Filosofia, Medicina, Matemática,

imprimindo à sociedade local costumes de apurado bom gosto e finas

maneiras que contribuíram favoravelmente na construção de grupos

literários.

Desse modo, foi-se constituindo a geração de intelectuais que mais

tarde formaria o "Grupo Maranhense" do Romantismo brasileiro que,

junto aos autodidatas, conquistaram para o Maranhão, no período áureo do

Império, o título de "Atenas do Brasil"7. Nesse sentido, tem-se João

Lisboa, Sotero dos Reis, Gonçalves Dias, Cândido Mendes, Coelho Neto,

Graça Aranha, Aluízio de Azevedo, Barbosa de Godóis, Odorico Mendes,

Sousândrade, Teixeira de Sousa, Gomes de Sousa, Rubem Tavares,

Franco de Sá, Raimundo Nina Rodrigues, entre tantos outros que, em sua

maioria, migraram, como mariposas, para a Corte — o Rio de Janeiro,

cujo brilho os arrebatava — razão por que, até hoje, muitas vezes não são

conhecidos como tendo sua origem no Maranhão.

Meireles (1960, p. 291-292) assinala:

Este “Grupo Maranhense” abrange, no tempo, o ciclo que vai de 1832 a

1868 e corresponde assim, no campo econômico, ao Ciclo do Algodão.

Com o Ciclo do Açúcar, sobrevém Ciclo Literário de 1868 a 1894,

quando se sobrepõem as influências da Escola Naturalista, do

Parnasianismo e do Simbolismo poético, e quando, desfazendo-se o

“grupo” local, os nossos homens de letras passam a emigrar cedo para o

sul, onde, grangeando justo renome, fazem-se essencialmente literatos

nacionais.

A economia do Maranhão, segundo Lima (1981, p. 181) e Meireles

(1960, p. 290), sustentou-se precariamente até 1888, marco do começo de

sua decadência, visto que o advento da República gerou o desequilíbrio

econômico com efeitos desastrosos sobre a vida política, econômica e

7 Título atribuído a São Luís na primeira metade do século XIX devido ao grande número de

intelectuais que se destacaram no cultivo das letras — o Grupo Maranhense.

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cultural do Maranhão no último decênio do século XIX para o primeiro

quartel do século XX. O Estado entra em declínio em virtude de fatos

considerados importantes, tais como: a Abolição da Escravatura, que

dificultou a produção agrícola e a pecuária totalmente centrada no

trabalho escravo; a inexistência de estrutura tecnológica, principalmente

no setor têxtil, quando a produção de algodão teve uma queda

considerável no mercado internacional devido ao aparecimento de um

material de melhor qualidade, menor preço e maior durabilidade; o

consequente fechamento do parque industrial maranhense; as

consequentes questões financeiras que dificultavam vencer a crise que

abateu o Maranhão — fecundo, progressista e promissor. Fica, assim, o

Maranhão, a partir de então, vivendo das glórias do passado, lutando para

não perder a tradição de "Atenas Brasileira".

Esse desejo é expresso na quinta estrofe no hino maranhense, em

que o poeta solicita que o futuro dê ao Maranhão as mesmas glórias do

passado (NASCIMENTO; CARNEIRO, 1996, p. 81):

E na estrada esplendente do futuro.

Fitas o olhar, altiva e sobranceira,

Dê-te o provir as glórias do passado

Seja de glória tua existência inteira.

Mesmo com a descrença, a falta de estímulo e apatia que tomou

conta dos intelectuais do final do século XIX, eles conseguiram em 1908,

congregar esforços e fundar a Academia Maranhense de Letras e, em

1926, o Instituto Histórico e Geográfico do Maranhão. Essas Instituições

foram fundadas pelo grupo denominado de "novos atenienses", dentre os

quais se destacaram, Antônio Lobo, Domingos Perdigão, Antônio Lopes e

outros.

Essa situação de crise continuou até o término da Primeira Guerra

Mundial, quando se inicia, em nível de exportação, a comercialização de

babaçu, fruto nativo que tem sua importância para o Maranhão, devido às

indústrias que se instalaram na região para o beneficiamento do produto

para os mercados mundiais, permitindo que aos poucos se reativasse a

economia do Estado, sem, contudo, lhe devolver a fase de riqueza já

vivenciada. A distância dos grandes centros consumidores (São Paulo e

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Rio de Janeiro) tornava impossível a concorrência da produção

maranhense.

Com relação ao panorama educacional, conforme Meireles (1960,

p. 220), a primeira escola de que se tem conhecimento começou a

funcionar em 1626, em São Luís, com o jesuíta Luís Figueira, na

residência da Companhia de Jesus no bairro da Madre-Deus, com o

objetivo de ensinar "as letras" aos filhos dos portugueses, além dos

seminários dos capuchinhos franceses destinados aos meninos colonos e

nativos. Durante o século XVII, além das primeiras letras, a instrução se

fez presente com aulas de Filosofia, Teologia, Retórica e Gramática,

mantidas por essa Companhia. Em seguida, outras escolas foram abertas

em Alcântara8, como o Colégio de N. S. do Pilar onde os ensinamentos

eram de leitura, e latim de catecismo, e a escola gratuita de ler, escrever e

solfa dos mercedários do Convento de N. S. dos Remédios. Ainda,

segundo o autor, nos escritos de Betendorf — em sua "Crônica", de 1910,

ficou registrado que o curso de Teologia, pelo aperfeiçoamento

apresentado, permitia que a Companhia encaminhasse seus noviços e

padres de outras províncias, até mesmo do Reino, para estudar em São

Luís.

Na segunda metade do século XVIII foram instaladas, no Estado, as

aulas régias, das quais a tradição guarda boas lembranças, principalmente

da terceira que ocorreu na capital em 1794, sob a direção de Manuel do

Nascimento Câmara. Anterior a 1753, Gabriel Malagrida, da Companhia

de Jesus, fundou um abrigo para moças órfãs e senhoras desvalidas, o

Recolhimento de N. S. da Anunciação e Remédios, a primeira escola

feminina do Estado. No final desse século, quando a situação econômica do

Maranhão estava à míngua, os primeiros estudantes começaram a se deslocar

em busca de formação no Reino (MEIRELES, 1960, p. 220-221).

8 Cidade tombada pelo Patrimônio Histórico Nacional, antiga aldeia de Tapuitapera, cujas origens

antecedem ao período da colonização portuguesa no Maranhão. Atualmente, por determinação do

Governo Federal, o município passou a sediar o Centro de Lançamentos Aeroespaciais, projeto do

Estado Maior das Forças Armadas.

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Em 1820, o italiano Carlos de La Rocca funda o primeiro colégio

particular de São Luís, localizado na Quinta das Laranjeiras: Por volta de 1826 e

1827, José Cândido de Moraes e Silva e Manuel Pereira da Cunha

inauguram o segundo, no bairro de São Pantaleão.

No começo da República, o panorama educacional se alterou

devido aos reflexos de uma política estatal que agitou o poder da Igreja,

no contexto da sociedade civil exercida até então. Em 28 de setembro de

1892, com a promulgação da nova Constituição Estadual, a Lei n° 56, de

15 de maio de 1893, organizou o ensino a partir das novas condições

políticas, ficando o ensino público dividido em primário, secundário e

técnico ou profissional. Em São Luís, o colégio Liceu Maranhense, foi

mantido e seu currículo equiparado ao do Ginásio Nacional. Foram

criados um Conselho Superior de Instrução Pública, um Fundo Escolar e a

Escola Normal. Esta escola funcionava no mesmo prédio do Liceu

Maranhense. Em 1897, ainda na vigência da lei anteriormente citada, o

governador da época, Cunha Martins, criou uma Escola Modelo, anexa à

Escola Normal, destinada à educação de menores do sexo masculino e

feminino e à prática dos alunos normalistas e de várias cadeiras de ensino

primário no interior do Estado (BUZAR, 1985, p. 2).

Segundo Amaral (1896 apud BUZAR, 1985, p. 2) em 1907,

funcionavam no Maranhão 244 escolas em nível primário, 11 em nível

secundário e 4 escolas no profissional ou técnico; desse total, duas eram

federais, 143 estaduais, 54 municipais e 60 particulares que atendiam

aproximadamente 14.104 alunos.

Apesar de todas as dificuldades no âmbito econômico, foi com a

elite intelectual e a força da tradição cultural do Estado que surgiram em

1908 propostas de criação e implantação das primeiras escolas superiores

do Maranhão, efetivadas em 1918, que serão alvo de apresentação

posterior.

No período que vai de 1918 a 1930, o Maranhão teve um relativo

progresso econômico e, consequentemente, social, devido a dois

importantes fatores: a construção da Estrada de Ferro São Luís —

Teresina, que possibilitou o transporte de carga e passageiros por todo o

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vale de Rio Itapecuru, chegando até o vizinho Estado do Piauí e, por

conseguinte, a outras cidades do Nordeste; a criação da linha de

cabotagem através de um contrato do Governo da União com a

Companhia Nacional de Navegação Costeira, com transporte para

pequenos portos do interior. Na área educacional foi construída em 1896 a

Escola Modelo Benedito Leite cujas atividades, iniciadas em 1900,

permanecem até os dias atuais, em pró do ensino fundamental e médio.

Para difundir não só a cultura maranhense, mas também a cultura

universal, foi reconstruído o Teatro Arthur Azevedo, obra de admirável

beleza.

A década de 30 é marcada por lutas revolucionárias em todo o país

e, como não poderia ser diferente, também no Maranhão, quando o

governo do presidente Getúlio Vargas substitui o governador do Estado

por um interventor, ocorrendo a partir daí sucessivas mudanças de

interventores advindos de motivos éticos e políticos, ficando assim o

Estado, durante todo o período getulista, praticamente sob dominação

federal. Foi nessa época que aqui entraram grandes levas de migrantes

nordestinos, fugindo da seca e dos problemas econômicos que assolavam

seus Estados. A partir de 1950, as mudanças provocadas pela entrada dos

migrantes começaram a ser percebidas, graças as famílias que começaram

a expandir as fronteiras agrícolas e a diversificar a produção. Também

contribuiu para isso a construção de rodovias, integrando o Maranhão com

o restante do país. Em termos políticos e econômicos essa década foi

caracterizada pelo mandonismo, que se refletia na dominação dos coronéis

e seus correligionários, sendo seu maior representante Vitorino Freire. No

campo da educação, percebem-se ações isoladas decorrentes da própria

debilidade da estrutura administrativa do Estado, que não possuía

condições de organizar ações mais globais, nem revelava presteza no

tratamento dos problemas educacionais.

Em 1965, teve início um período de grande desenvolvimento

econômico, através de uma série de obras públicas, como a construção do

porto marítimo do Itaqui e a pavimentação da rodovia São Luís - Teresina.

Outros que o sucederam construíram obras importantes para o progresso

da região.

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Em termos educacionais, houve um aumento pouco relevante no

ensino fundamental e uma preocupação centrada nos projetos

educacionais do ensino médio e superior, como base para o desenvolvimento

econômico do Maranhão. Devido ao desinteresse pelo ensino fundamental, a

criação de escolas particulares teve um acréscimo, principalmente pelo

fato de, àquela época, o ensino médio mantido pelo Governo limitar-se a

dois colégios em São Luís, o Liceu Maranhense e a Escola Normal,

apontados anteriormente, herança mantida ainda do Brasil-Império.

Aliados a essa situação, foram elaborados projetos que visavam dinamizar

o setor da educação e acelerar resultados, adequando-se à realidade local,

montados de acordo com as necessidades mais prementes, como a

implantação no Estado de empresas agropecuárias e industriais. Os

projetos foram os seguintes: Projeto Bandeirante, implantado em 1968,

somente para os municípios do Estado; Projetos TV Educativa e

Madureza, implantados, respectivamente, em 1969 e 1970 para São Luís

(BONFIM, 1985, p. 86).

Ainda durante esse governo, no período de 1967 a 1969, viriam a

ser criadas em São Luís a Escola Superior de Administração Pública, a

Escola de Engenharia do Maranhão, A escola de Agronomia e a Escola de

veterinária, a fim de prover o Estado de recursos humanos qualificados

nessas áreas, que deram origem à Universidade Estadual do Maranhão

(UEMA).

No período de 1970 a 1994 houve pouco interesse dos governadores

maranhenses pelo setor educacional no Estado, destacando-se apenas a

implantação do complexo educacional Centro Integrado do Rio Anil

(CINTRA), Fundação destinada ao ensino fundamental e médio,

funcionando em uma antiga fábrica de fiação e tecelagem desativada.

O ano de 1995 marca a entrada de dois projetos importantes no

panorama educacional, com a construção dos Faróis da Educação

(baseados em um modelo de Curitiba-PR), destinados a pesquisas de

alunos de escolas públicas de ensino fundamental e médio, e o Programa

de Capacitação de Docentes (PROCAD), na UEMA, com o objetivo de

qualificar os professores da rede pública de todo o Estado, habilitando-os

ao exercício da profissão.

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A descrição acima sobre esses três aspectos que fundamentaram o

panorama educacional do Estado, teve como objetivo situar a História do

Maranhão para, posteriormente, mostrar sua relação com a criação das

Instituições de Ensino Superior do Maranhão e o contexto dos cursos de

Psicologia, temas que serão explanados nos capítulos seguintes.

3.2 Os Precursores da Psicologia no Maranhão

A abordagem já apresentada sobre a Psicologia no Brasil, realizada

por alguns estudiosos como Pessotti (1988), Antunes (1999), Massimi

(1990) e outros, demonstrou que o estudo dos fenômenos psicológicos

esteve inserido em diferentes áreas do saber, como a médica e a

educacional, obviamente com conotações diferenciadas entre si. E foi por

essas mesmas vias que a Psicologia chegou ao Maranhão. No entanto,

cabe ressaltar que não é aqui propósito descrever como essas produções

aconteceram, mas apenas situar que esse foi também o caminho

percorrido. Esses percursos tiveram importância fundamental para

entender como, a partir deles, e de outros campos do saber, a Psicologia

foi penetrando no Estado.

No Maranhão, esse saber esteve por muitos anos ocasionalmente

atrelado à figura de médicos-pediatras assim como, em especial, à dos

psiquiatras, pois em suas instituições estava centralizado o tratamento

relativo à saúde mental. Quanto à participação dos médicos-Pediatras

nessa área, dados colhidos em entrevistas realizadas mostram a frequência

com que esses profissionais eram procurados para atendimentos de cunho

psicológico.

Consta na história da Psiquiatria que o Hospital Nina Rodrigues,

fundado em 1941, foi a primeira instituição psiquiátrica no Maranhão a

abrigar os enfermos mentais. Contudo, foi apenas em 1987 que os

primeiros psicólogos, sem vínculo empregatício, deram início a um

trabalho nessa casa de saúde, haja vista a ausência de profissionais

qualificados para acompanhamento psicoterápico dos pacientes ali

internos.

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Os psicólogos recém-chegados, ao tomarem conhecimento da

realidade apresentada, não só a do Hospital Nina Rodrigues, quanto de

outras instituições, partiram para um trabalho de sensibilização junto a

todos os profissionais que direta ou indiretamente encontravam-se

envolvidos com o tratamento da saúde mental, a fim de que pudessem

demarcar um campo de saber específico que, até então, não dispunha de

profissionais.

Os autores citados inicialmente apontam que uma outra via de

entrada da Psicologia no Brasil deu-se através das Escolas Normais,

surgidas a partir da segunda metade do século XIX, cujo objetivo era a

formação de um corpo docente competente e adaptado às necessidades do

sistema educacional brasileiro (MASSIMI, 1990, p. 54). A disciplina

"Psicologia" nessas Escolas objetivava oferecer uma estrutura teórica que

pudesse subsidiar as futuras professoras na solução de problemas

decorrentes da prática pedagógica. A produção das Escolas Normais,

segundo Antunes (1999, p. 80),

[...] consistiu, provavelmente numa das mais importantes

contribuições para o estabelecimento da Psicologia científica no

Brasil, quer no âmbito teórico, quer no âmbito da aplicação prática

de seus conhecimentos. Sua importância reside t a mb é m no

fa to d e mu i to s d o s p r i me i ro s profissionais da Psicologia

terem iniciado sua formação nessas escolas [...].

Durante muito tempo, no Maranhão, as escolas da rede pública e

particular do ensino de 2º grau, em especial as Escolas Normais,

contemplavam em seus currículos a disciplina Psicologia, assim como

aquelas que habilitavam para o magistério de 1° grau (1ª a 4ª séries). A

partir de 1997, aquela disciplina foi retirada dos currículos, permanecendo

apenas nas escolas de formação de professores e nas escolas do ensino

médio de Enfermagem com o título de Psicologia Aplicada e Ética

Profissional, geralmente ministrada por um bacharel em Enfermagem e,

ocasionalmente, por profissionais da área de Psicologia.

A Psicologia no Maranhão, como se está explicitando, teve sua

origem em outros campos do saber, semelhantemente aos demais Estados

brasileiros, o que evidencia a contribuição de pioneiros.

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Dessa feita, o interesse que se tem pelos precursores vai ao encontro

dos que estão preocupados em registrar a contribuição de profissionais na

construção da Psicologia brasileira, especialmente, de acordo com as palavras de

Bock e Ferreira (2001, p. 7), quando afirmam: "A Psicologia Brasileira

sofre de escassez de imagens e informações sobre nosso território e os

personagens que marcaram tendências em seu desenvolvimento [...]".

Ao se tomar por referência os pioneiros, pode-se destacar o que

Campos (2001, p. 21) assinala:

Consideramos como pioneiros aqueles que iniciaram ou propiciaram

oportunidades de realização de trabalhos relevantes na área da Psicologia,

ou que produziram contribuições originais em continuidade ao

trabalho de outros [...]. Assim sendo, escrever sobre esse percurso é

conhecer como, no Maranhão, os saberes psicológicos tiveram

origem.

Inicia-se traçando a biografia de um dos mais importantes precursores da

Psicologia no Maranhão: Padre João Miguel Mohana9. As informações

sobre Pe. Mohana são inúmeras devido à sua formação, aos estudos e

pesquisas que realizou. A proposta que se tem visa mostrar sua atuação

como pioneiro na História da Psicologia e da Psicanálise no Maranhão.

Para se obterem estes dados foi necessário recorrer às matérias

anteriormente publicadas, além dos dados colhidos em entrevista realizada

com seus irmãos, quando se procurou saber sobre a sua história familiar, a

sua atuação como médico, escritor, psicólogo, psicanalista e sobre os

trabalhos que desenvolveu nessas áreas.

João Miguel Mohana nasceu em 1925, em Bacabal, município do

Maranhão. Era filho de Miguel Abraão Mohana e Anice Mohana, árabes

(libaneses). Primogênito de uma família de sete irmãos, sendo quatro

homens e três mulheres, sofreu fortes influências nos âmbitos cultural e

religioso. A cultural, advinda da vivência de seus pais em capitais como

São Luís e São Paulo, e das histórias contadas por eles do Oriente e do

9 Cf. Verbete sobre Mohana escrito em colaboração por Márcia Antonia Piedade

Araújo, Manoel William Ferreira Gomes e Ana Maria Jacó-Vilela publicado em

CAMPOS, R. 1-1. de F. (Org.). Dicionário biográfico da psicologia no Brasil: pioneiros. Rio de

Janeiro: Imago, 2001.

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Ocidente, com destaque para a visita à França na vinda para o Brasil. Já a

religiosa, pela convivência pacífica com protestantes, espíritas e ateus em

Viana, município do Estado, o que lhe propiciou uma visão diferenciada

da vida e do ser humano. Vale ressaltar ainda a constituição familiar,

como declarada em entrevista pelos irmãos:

[...] o ambiente era de muito trabalho, alegria e amizades [...] O

temperamento na família sempre foi muito variado, tendendo para os

naipes mais fortes. João dizia que se Miguel e Anice vivessem hoje,

seriam separados, talvez, pois ambos eram de forte personalidade

e às vezes coléricos.

Sua formação acadêmica foi em Salvador onde concluiu o curso de

Medicina no ano de 1949, na Universidade Federal da Bahia. Um ano

depois Mohana passa a exercer a profissão na cidade de São Luís como

pediatra, o que ocorreu durante seis anos. Na capital maranhense,

paralelamente a essa atividade profissional, desenvolveu uma importante

atuação cultural, como presidente da Ação Católica, arregimentando

novos talentos em torno do teatro, cinema, música e literatura, que depois

passariam a figurar significativamente no cenário cultural brasileiro.

Como médico-pediatra, percorreu todo o interior do Estado do

Maranhão, juntamente com Dom José Delgado, arcebispo de São Luís.

Dedicava particular atenção aos pobres, que eram maioria nos

ambulatórios públicos. Com essa tendência à caridade e à solidariedade,

viu surgir, paralelamente à prática da Medicina, a vocação sacerdotal.

No auge de sua atividade profissional e literária, aos trinta anos de

idade, Mohana tomou a decisão de ser padre, o que deu origem a muitas

especulações pela imprensa de todo o país como: desilusão sentimental?

Vocação antiga aflorada? E ainda houve quem perguntasse, por que

Mohana decidiu abraçar o sacerdócio aos trinta anos, quando tinha em

mãos as satisfações que o mundo pode dar a um médico e a um escritor

vitorioso. Foi o próprio Mohana que resolveu responder a essa indagação.

Já no curso médico, de vez em quando eu me encontrava perguntando a

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mim mesmo se tomara caminho certo. Tanto que na minha turma eu

cultivava mais amizade com aqueles que evidenciavam idealismo [...]10.

No Rio Grande do Sul, ordenou-se sacerdote no Seminário Maior

de Viamão, em 2 de julho de 1960, iniciando então um apostolado

que acabou se espalhando por todo o Brasil e por outros países, a

convite de Universidades, Dioceses e Movimentos Pastorais, através de

conferências, seminários, cursos e livros.

Ao ser ordenado clérigo, Mohana decidiu colocar seus

conhecimentos a serviço da sociedade, despertando a atenção do público

que o procurava pelo domínio demonstrado ao tratar as problemáticas

espiritual e social do homem.

Suas atuações como médico, padre, escritor, psicólogo e

psicanalista, conforme explicadas pelos irmãos, eram frutos de vocações

que iam surgindo naturalmente conforme as circunstâncias exigiam, onde

certas tendências precisavam ser catalisadas para poderem ser deflagradas.

Já na literatura, Silva (1995, p. 33) informa acerca de suas

produções:

A obra literária do escritor [...] é um valioso acervo cultural que desafia a

inteligência de quantos se propõem a estudar o seu conteúdo. Tudo

nela reflete o espírito místico e a sólida cultura de um homem cuja

intensa atividade intelectual, a serviço da fé, o autoriza a se dizer, como

Sócrates, portador de uma missão divina: a de conduzir a alma humana à

perfeição pelo caminho da verdade.

Padre Mohana, como era mais conhecido, teve destaque na

literatura nacional já em 1952, com o livro “O Outro Caminho”, que

recebeu da Academia Brasileira de Letras o prêmio de melhor

romance do ano publicado no país. O reconhecimento literário

ultrapassou fronteiras e, logo, teve suas obras traduzidas para vários

idiomas. Nesse sentido, a literatura do Maranhão teve em João

Mohana a continuidade da tradição maranhense de "Terra de Letras".

Um acervo de 44 livros, 15 mil palestras e 2 mil partituras, além dos 15

10 Extraído de memórias escritas pela família, em folha avulsa datilografada e sem data.

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mil sermões pregados na Catedral de São Luís e outros templos pelo

Brasil, revelam a sua alta produtividade.

Como pesquisador dos valores culturais do Estado, dedicou-se

durante trinta anos a descobrir músicas maranhenses, eruditas e populares,

chegando a encontrar partituras de 169 compositores, num total de 1.416

obras, muitas inéditas, documentadas em seu livro "A grande música do

Maranhão", apresentando, assim, ao Brasil e ao mundo São Luís como a

"Atenas Musical do Brasil". Esse valioso acervo encontra-se em uma sala

especial no Arquivo Público do Estado, e é procurado por pesquisadores de

países diversos.

As obras de João Mohana foram agrupadas a partir dos seguintes

temas: educação para o casamento, espiritualidade, romances, teatro e

outros. Das muitas obras publicadas citem-se "Maria da Tempestade", um

dos melhores romances lançados no Brasil na década de 50, assim

considerado por direcionar a homens e mulheres a mensagem de um casal

que fez do casamento uma odisseia de autenticidade. Já em seu livro "O

Outro Caminho", examina os problemas humanos da sociedade

maranhense num determinado período histórico, através de uma rigorosa

crítica humanística. Em outros livros, como "Plenitude Humana" e "O

Encontro", o escritor dá um tom impecável à espiritualidade através de

diversas técnicas de composição. O livro "O Mundo e Eu" é uma obra de

doutrinação cristã, com objetivo predominantemente apologético, porque

elaborado, como diz seu autor, para o coração, a inteligência e a ação de

quem deseja ter fé (O IMPARCIAL, 1995).

Segundo seus irmãos, sua atuação como psicólogo e psicanalista

deveu-se à herança do pai, pela inteligência reflexiva e, da mãe, pela

intuição psicológica, duas influências constatadas em seus livros. Afirmam

ainda que os estudos nessas áreas iniciaram-se durante sua passagem pelo

seminário. Ensinou Psicologia (História da Psicologia) no Seminário Santo

Antônio, em São Luís.

Segundo informações apresentadas em entrevista, foi durante o

curso ginasial que João Mohana, através do Irmão Mário (Colégio Maristas

em São Luís), ouviu falar pela primeira vez sobre Psicologia e o que

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significava essa ciência. Mas a grande influência que recebeu foi de um

jesuíta francês, radicado na Bahia. Camilo Torrend, admirado por Mohana

por sua solidez cultural e genialidade, era também botânico, zoólogo,

agrônomo, teólogo, físico, químico e psicólogo, correspondia-se com

universidades da Inglaterra, Estados Unidos e França. Através dele,

Mohana teve acesso às publicações científicas desses países, conciliando

assim estudos médicos com os de cunho psicológico, propiciado por uma

convivência de nove anos, que lhe despertou seguramente esse interesse.

Remetendo-se à amizade decisiva em sua vida com o Padre Camilo

Torrend, resgata-se a seguinte fala do Pe. Mohana:

[...] Foi quem me iniciou nos estudos de Psicologia e Higiene Mental.

Tanto que, paralelamente ao curso médico, eu ia estabelecendo

correlações entre Medicina, Neurologia, Endocrinologia,

Psiquiatria e Psicologia, as quais me abriram as portas do imenso

campo no qual hoje me movo à vontade11.

Além dos estudos e da influência na área, Mohana correspondia-se

com psicólogos do Rio de Janeiro, São Paulo e Minas Gerais e com

algumas escolas de Psicanálise.

Para Mohana, o saber psicológico privilegiava a busca de um maior

desenvolvimento do ser, através de uma psicologia baseada em reflexões

sobre a vida. Tratava de assuntos do cotidiano, da intimidade humana,

especialmente da incerteza, da dúvida e de como os fatos exteriores

ocasionavam verdadeiros cataclismas interiores. Ensinava que a

adversidade, as neuroses e as dores são como nuvens escuras, que

deveriam ser tratadas como passageiras. Afirmava que o homem preferia

os valores transitórios em detrimento dos valores eternos, mergulhando,

assim, na angústia e na depressão, enfim, no tédio da vida e na perda do

significado da existência. Contemplava uma psicologia iluminada pela fé e

que indagava sobre a incerteza e a dúvida do homem perplexo diante de si

e do mundo (O IMPARCIAL, 1995).

11 Extraído de memórias escritas pela família, em folha avulsa datilografada e sem

data.

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Pelo fato de ser padre, era constantemente questionado, em muitas

entrevistas que concedeu aos jornais de São Luís e de outras capitais, a

respeito dos conhecimentos evidenciados em várias áreas e da facilidade

com que tratava de assuntos como os conjugais. Destaca-se aqui uma

pergunta formulada por dois jornalistas de São Luís: "Como é que um

padre resolve escrever sobre assuntos conjugais, sem ter tido essa

experiência. Como explica isso?" Eis a resposta de Mohana:

Isso é um privilégio, uma maravilha, quem dera todo mundo fosse assim,

porque quando o aconselhador matrimonial é casado ele corre o perigo de

projetar sua experiência matrimonial nos casais que ele atende. Ele passa

a raciocinar dentro da perspectiva muito estreita, muito limitada, muito

reduzida da experiência dele [...] Isso leva a erros fatais. Já, quando o

aconselhador matrimonial é um celibatário, como no meu caso, ele se

serve de estudo, se serve da experiência de uma multidão de casais que

ele vai analisando, vai estudando. Afinal de contas, uma fonte de

conhecimento não é só a experiência, é o estudo [...] (BORGES; CASTRO,

1995, p. 7).

A sociedade maranhense beneficiou-se com as contribuições do Pe. Mohana

na área psicológica por muito tempo, mesmo após a chegada dos primeiros

psicólogos à cidade de São Luís, tendo em vista a imagem que a população

fazia do psicólogo e o pouco conhecimento de sua atuação. É interessante

observar que, mesmo sabendo da existência dos serviços oferecidos nos

consultórios, na maioria das vezes as pessoas primeiro procuravam o padre

que posteriormente as encaminhava aos profissionais.

Lentamente, o campo psicológico foi se constituindo com a chegada de

psicólogos a São Luís (entre as décadas de 1970 e 1980) e bem mais tarde

com a criação dos cursos. A entrada desses profissionais e o surgimento

dos cursos (1991 e 1998) no Estado, ocorreram com considerável atraso

em relação à regulamentação do exercício profissional amparado na Lei n°

4.119, de 27 de agosto de 1962.

Na década de 70, foram dados os passos iniciais na tentativa de elaboração do

primeiro projeto de criação de um curso de Psicologia na antiga Fundação

Universidade do Maranhão (FUM), hoje Universidade Federal do

Maranhão (UFMA), mas, apenas na década seguinte (1980), era iniciada a

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trajetória que resultou na implantação do referido projeto, como se verá

adiante. Nesse período, os primeiros profissionais formados em outras

instituições brasileiras chegaram a São Luís. No Brasil, no entanto, a

atuação do psicólogo já estava avançada, ocorrendo antes mesmo da

regulamentação da profissão e dos cursos.

A contextualização histórica desse processo sustenta-se em estudos de autores

como Coimbra (1995), Mancebo (1999b), Bock (1999a, 1999b) para uma

compreensão mais ampla do panorama da Psicologia enquanto ciência e

profissão e sua relação com os acontecimentos que permeavam o Brasil

nesses períodos.

Os terríveis e inesquecíveis anos 70, assim denominados por

Coimbra (1995, p. 17), são fortalecidos pela consolidação do regime

militar de forma brutal a partir de medidas repressivas, tendo por base a

Doutrina de Segurança Nacional, pela qual a censura assume formas

violentas de controle, impedindo manifestações de toda ordem,

principalmente as que possuíam um caráter mais crítico.

Durante esses anos, o país enfrentava grandes dificuldades, fruto da ditadura

militar instaurada desde 1964 que, em nome da ordem e do progresso,

criou dispositivos como a cassação de direitos políticos, a intervenção em

entidades estudantis e sindicais, a centralização do poder na mão do

Executivo, as torturas, as perseguições, os desaparecimentos de políticos

oposicionistas e as mortes.

A década de 70 foi caracterizada pelo regime militar e pelos inúmeros

acontecimentos desastrosos que marcaram esse momento da sociedade brasileira.

Um deles, segundo Coimbra (1995, p. 29), foi a disseminação cultural de

duas categorias para o jovem não partidário do regime do país; a do

subversivo e a do drogado. No primeiro caso, como subversivo, era

apresentado com conotações de periculosidade e violência, acompanhado

de adjetivos como criminoso, traidor e ateu, considerado uma ameaça

política à ordem vigente, devendo ser identificado e controlado, pois era

contra a religião, a família, a pátria, a moral e a civilização — um anti-

social. No segundo caso, como drogado, era apresentado como um ser

moralmente danoso, devido aos hábitos e costumes desviantes.

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Desse modo, tanto os subversivos como os drogados apresentavam

problemas psicológicos graves e sérios e eram dessa forma considerados

doentes. Essas categorias serviram para enfraquecer movimentos de

resistência. Em consequência desse fato, surge um outro, a preocupação

com a família, que é responsabilizada e chamada a cooperar no sentido de

manter a sociedade saudável, como explica Coimbra (1995, p. 31-32):

[...] esses filhos 'desviantes' e 'diferentes' são produzidos pelos

problemas por que essas famílias passam [...] O privado, o familiar, torna-

se o refúgio contra os terrores da sociedade, nega-se o que acontece fora e

volta-se para o que acontece dentro de si, de sua família.

A situação apontada acima torna-se muito valorizada nos anos 70,

quando o interesse pelos problemas da interioridade aumenta. Tudo parecia

estar reduzido ao psiquismo, surgindo daí um discurso psicologizante.

Nesse contexto, Coimbra (1995, p. 34) relata:

Acredita-se que a aproximação, a descoberta de si mesmo, a liberação

das repressões, a busca da autenticidade e do calor humano são os fatores

essenciais para o bom andamento de uma sociedade. As categorias

políticas são transformadas em categorias psicológicas; o importante não

é o que se faz, mas o que se sente. Ou seja, há um esvaziamento político,

há uma psicologização do cotidiano e da vida social.

Como tudo girava em torno de processos internos, qualquer

sentimento de mal-estar ou mesmo as angústias do dia-a-dia eram

rotuladas de "falta", necessitando para tanto de um especialista "psi" para

resgatar as vítimas (COIMBRA, 1995, p. 34).

Dentro da perspectiva desse discurso, Mancebo (1999b, p. 149)

chama a atenção para um fato considerado importante em relação aos

cursos de Psicologia que se multiplicavam nessa década:

Foi nessa cultura psicológica que os primeiros cursos de Psicologia

se desenvolveram. Foram alimentados e embalados por esse clima,

ao mesmo tempo que forneceram teorias, técnicas e modelos de

intervenção para o acirramento da psicologização da sociedade e para a

alocação das individualidades no centro da compreensão do mundo.

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Convém destacar que, após a institucionalização da Psicologia, os

cursos proliferaram, as instituições particulares deram grandes saltos nessa

época em decorrência da falta de vagas nas instituições públicas, as quais

deixavam estudantes, que haviam sido aprovados, como excedentes. O

ensino de qualidade foi deixado de lado. Mancebo (1999b, p. 147)

assinala:

[...] Na década de 70, houve um crescimento explosivo de

faculdades privadas, para atender àqueles que, excedentes da rede oficial,

desejavam obter um título universitário e, com ele, alcançar posições

mais altas na escala social. A educação passou a ser encarada como um

grande negócio, com cursos funcionando à noite, turmas superlotadas e

ministrando cursos de baixa qualidade [...] Esse também foi o

desenvolvimento do ensino superior de Psicologia [...] no país.

Ainda segundo Mancebo (1999b, p. 142-143), no Brasil dessa época,

duas condições deixaram sua marca na conjuntura do processo de criação

dos cursos de Psicologia e nos primeiros anos de seu funcionamento: a

ditadura militar, em que as universidades e, de modo especial, os

estudantes, tiveram papel de destaque na oposição à situação, e o "boom"

relativo à cultura psicológica, caracterizada pela ideia de psicologização da

sociedade, uma cultura que já se havia constituído, mas que se configurou

e ganhou forma nesse período, com o conhecimento que o homem podia

ter de si mesmo como meio de conhecer o mundo.

No final dessa década, conforme Bock (1999b, p. 78-79), o país

passava a viver um clima de expectativa. Era a abertura lenta, gradual e

segura com a retirada da censura e dos atos institucionais. Os estudantes

foram os primeiros que se organizaram com reivindicações, no setor da

educação, por mais verbas, melhoria no ensino, educação pública e gratuita

para todos, redução de mensalidades. Muito embora reprimidos em suas

manifestações, conseguiram introduzir bandeiras de luta, pois

questionavam a ditadura militar e os métodos utilizados.

Muitos outros movimentos cresceram, até que, em 1979, com a

mobilização da classe trabalhadora, greves começaram a acontecer em todo

o país. Foi ainda nesse mesmo ano que o Governo aprovou a Lei de

Anistia, abrindo as portas do país aos seus filhos, exilados políticos da

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ditadura militar. Os psicólogos também partiram para uma reorganização

necessária da profissão, iniciada em São Paulo e, em seguida, por outros

Estados, através de ocupações e/ou criação de seus sindicatos.

Chega a década de 80 e são outros os desafios para a Psicologia e

seus profissionais. Predominou nesse período a busca por uma nova

identidade, com muitos debates, congressos, encontros, publicações,

reflexões. Cotejem-se alguns aspectos enumerados por Bock (1999b, p.

81): encerravam-se duas etapas da categoria, uma marcada pelas

intervenções e lutas corporativistas, e outra que teve como resultado a

consolidação da profissão no Brasil; engajavam-se os psicólogos nas lutas

junto aos trabalhadores e começavam a participar de movimentos sindicais

para a construção da Central Única dos Trabalhadores (CUT). A partir daí,

iniciou-se uma mudança na história desses profissionais através de debates

e reflexões sobre seus problemas, com a proposta de uma atuação mais

adequada junto à população brasileira e suas necessidades. Desse modo,

passam a questionar sua formação e modelo de atuação, ensejando a luta

para a ampliação do mercado de trabalho. Inicia-se, assim, a sua

participação nas lutas da sociedade civil.

Nessa época, os psicólogos reivindicaram espaços no serviço

público, como no setor da saúde, com a luta pela abertura de ambulatórios

de Saúde Mental, que foi referência desses anos. Questionavam a atuação

em comunidades, bem como os trabalhos na área escolar. Bock (1999b, p.

93) esclarece:

Buscava-se construir uma nova identidade. Os psicólogos queriam

participar na sociedade de modo mais 'contundente', progressista, ao lado

da maioria da população e dos trabalhadores da educação e da saúde.

Mais adiante, a autora observa:

O psicólogo dá um grande salto, então, ao perceber que, para ampliar seu

espaço e sua contribuição social, não basta o conhecimento das teorias

psicológicas, mas, pelo contrário, é preciso criticá-las, criticar nossos

instrumentos, nossa visão de homem e de mundo. Além disso, é preciso

assumir a dimensão política de sua atuação profissional e o alcance de

nossas intervenções [...] (BOCK, 1999b, p. 102).

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O empenho dos profissionais não foi suficiente para alterar a

situação em que se encontrava a categoria, em vista dos problemas que

permaneciam os mesmos, tais como a concentração nos consultórios,

atividades pouco diversificadas, mercado restrito e poucos psicólogos no

serviço público. Assim sendo, a categoria voltou-se para si, em busca de

uma nova identidade e consequente redefinição de sua imagem social

como solução para essa crise (BOCK, 1999b, p. 109).

Ainda nessa década, segundo Bock (1999b, p.110-114), aconteceram

dois fatos considerados importantes pela marca que produziram na

categoria: o I Congresso de Psicologia realizado em São Paulo, no ano de

1988, onde os participantes se referiam à Psicologia como uma profissão

prematura, com falta de pesquisa e de postura de investigação, em que a

teoria parecia estar sempre distanciada da prática, com indefinição quanto

à natureza da ciência, se humana ou biológica, com multiplicidade de

teorias, misturada com práticas alternativas, entre outras dificuldades,

quando a busca era de definições mais nítidas do fenômeno psicológico, do

trabalho do psicólogo e da construção de um percurso social para a

Psicologia; o Congresso Unificado dos Psicólogos, realizado em 1989, em

Brasília, quando foi debatida a necessidade de reestruturação das entidades

da categoria, os sindicatos e os conselhos, e quando se deu a participação

dos psicólogos nas discussões da Lei de Diretrizes e Bases da Educação.

No final dessa década, a Psicologia ainda se encontrava como área

de atuação restrita e elitista, embora já não pudessem ser negados os

aspectos sociais e culturais ao se falar de mundo psíquico. Havia uma

predisposição de luta e debate em relação a essas necessidades, embora

esses caminhos não estivessem bem definidos.

Esse período foi considerado, ainda por Bock (1999a, p. 320-321),

como "fervilhante", em que a Psicologia precisava ser reinventada para

responder às necessidades da população com as quais os psicólogos não

estavam habituados a trabalhar. E ela afirma:

Estava dada a largada para um período em que os psicólogos iriam se

perguntar e refletir sobre a relação de seu trabalho e do próprio fenômeno

psicológico com a realidade social. A realidade social entrava na

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Psicologia para remexer tudo o que, durante tantos anos, ficou

naturalizado e cristalizado [...].

Uma característica que chamou a atenção sobre esses anos foi o

emprego de muitos termos para designar a Psicologia e o trabalho do

psicólogo, não só na quantidade como na diversidade, principalmente os

que se relacionavam a modos de intervenção no sentido do ajustamento e

da adaptação, como também na admissão de algumas concepções sociais e

históricas. Na opinião de Bock (1999b, p. 164), estavam:

[...] de um lado, as concepções fundamentadas na ideia de natureza

humana, e de outro, as concepções fundamentadas na ideia de

condição histórica da humanidade e de seu psiquismo. “Sentir-se a si

mesmo”, “buscar seu verdadeiro eu” são expressões que convivem com

expressões como “o homem constrói seu mundo e, ao fazer isso, constrói-

se a si mesmo”.

O Brasil dessa época continuava sob o regime militar e vivenciou

novas greves resultantes do processo recessivo causado pelas perdas

salariais e pela instabilidade no emprego. O poder já não estava somente

com o Estado, mas também em instituições sociais que criticavam e

denunciavam exclusões e opressões. Com a abertura política dois

momentos marcaram o cenário nacional: a fundação do Partido dos

Trabalhadores (PT) e a mobilização da sociedade para as eleições diretas

que não aconteceram. Após vinte e um anos, no entanto, o país tinha um

presidente civil, simbolizando, assim, o epílogo de um fatídico período de

ditadura militar e o início de um novo período, o da Nova República, com

os mesmos vícios e os mesmos homens, sem dúvida.

Os passos que foram dados a partir daí, como a reformulação e

promulgação da Constituição e as eleições diretas para Presidente da

República, não deram ao Brasil bons tempos, pois a economia passou por

diferentes planos econômicos, e a sociedade mais uma vez se viu

sacrificada pela recessão com a desvalorização dos salários e perda do

poder aquisitivo. Em todos os setores sociais, o quadro era desanimador.

Na saúde, por exemplo, havia índices crescentes de mortalidade. A falta de

habitação, as moradias sem saneamento básico, o desemprego e a violência

caracterizavam a baixa qualidade de vida do povo brasileiro. Ao lado

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dessas constatações, a sociedade manifestou seu repúdio com greves e

protestos, reivindicando melhores condições de vida.

Tal contexto levou os psicólogos a examinarem, debaterem e

criticarem aspectos específicos da profissão, como também sua

participação em relação às condições pouco propícias por que passou o

país nessas décadas. Como ficou demonstrado, o engajamento do

profissional na sociedade possibilitou-lhe repensar algumas de suas

atuações junto à sociedade brasileira.

Nesse mesmo momento, as preocupações com as questões referentes

à Psicologia ainda não faziam parte do cotidiano da maioria da população

do Maranhão em vista de aqui existirem situações mais graves ligadas a

outros problemas, como, por exemplo, o da educação.

Retomando a proposta de se conhecer a realidade encontrada pelos

psicólogos no Maranhão sobre este campo do saber, recorreu-se ao

Conselho Regional de Psicologia — 11ª Região, através da representação

na cidade de São Luís, para que fosse concedida a relação dos profissionais

com seus respectivos números de registro e data de inscrição. Da lista

enviada pelo Conselho, foram selecionados 7 (sete) psicólogos — 6 (seis)

residentes nesta cidade e 1 (um) que, atualmente, mora em Recife. Desses

profissionais, 5 (cinco) se inscreveram no Conselho na década de 70 e 2

(dois) na década de 80. Elaborou-se um roteiro de entrevista e, na análise

apresentada a seguir, os entrevistados foram identificados por letras e

números que vão de E1 a E7 (entrevistas realizas em 2001).

Antes da década de 70, inexistiam em São Luís serviços

profissionais de Psicologia, embora houvesse instituições de ensino,

empresas e hospitais psiquiátricos que passivelmente necessitassem de

especialistas na área. Esse dado só pôde ser identificado a partir da

declaração dos entrevistados ao afirmarem que, somente depois dessa

década, excetuando-se o Pe. João Mohana, é que se ouviu falar de

trabalhos realizados na área da Psicologia na cidade de São Luís.

No que diz respeito à formação na área da Psicologia, ficou evidente

que alguns informantes sentiram a necessidade de se deslocar a outros

Estados em busca dessa formação, já que não havia o curso de Psicologia

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em seu local de origem. A maioria dos profissionais graduou-se em

Pernambuco, na Paraíba e em Brasília. A escolha pelo Estado e pela

instituição foi devida, em alguns casos, ao fato de parentes e amigos ali

residirem.

Ao serem indagados quanto à opção pela Psicologia, responderam

que isto se deveu às leituras de livros e revistas; ao interesse em poder

ajudar as pessoas; à influência familiar; à busca pelo autoconhecimento; ao

interesse pelo campo educacional; às conversas com profissionais da área e

testes de orientação vocacional. No entanto, alguns declararam que durante

a formação pensaram em desistir por não encontrarem no início do curso

aquilo que tanto esperavam, chegando até a pensar em escolher outra área.

Com base no que foi dito durante as entrevistas, é importante considerar

que, para alguns, a escolha pela Psicologia já era bem clara, enquanto para

outros oferecia dúvidas.

Segundo um dos informantes, sua decisão foi surgindo a partir do

interesse em trabalhar com crianças especiais, ou que tivessem dificuldade

de aprendizagem. Assim revela:

A minha opção sempre foi pela área da educação. Eu queria ter uma

escola, ser professora, trabalhar com crianças, mas não sabia exatamente

como chegar a isso [...] Até então eu não tinha ouvido falar de Psicologia.

Comecei a ler sobre o assunto, buscar informações [...] Quando comecei

o curso, logo no primeiro ano, com as matérias básicas, me desencantei

um pouco porque não via nada daquilo que na verdade eu queria [...]

Quando comecei a ver as matérias específicas, principalmente Psicologia

do Desenvolvimento I, fui me apaixonando, sobretudo no quarto ano do

curso quando éramos obrigados a escolher uma área, no meu caso a da

Psicologia Escolar, com a qual comecei a me identificar, passando,

assim, a gostar da escolha que fizera (E1).

Contrapondo-se a esse posicionamento, o informante abaixo declara:

Desde muito cedo demonstrei interesse em fazer Psicologia, sempre tive

uma atração pelo psíquico, pelos mistérios da mente [...] No segundo

grau, já era claro o meu interesse pelo curso de Psicologia e pela minha

opção de especializar-me na área clínica. O interesse pelas pessoas e seus

problemas sempre prevaleceu. Desde a adolescência era procurada para

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dar conselhos, para ajudar [...] Durante o curso procurei conhecer outras

áreas de atuação do psicólogo graças ao estágio que fiz em hospitais,

escolas e empresas, o que me enriqueceu consideravelmente. (E2).

A escolha feita por um outro informante mostra que a Psicologia

aparece como uma opção "moderna", em oposição às opções

tradicionalmente destinadas à mulher:

Eu não saberia dizer se houve um insight, se houve alguma coisa mais forte

que me fizesse optar pela Psicologia. Naquela época, o curso da área de

humanas era buscado mais pelas mulheres, tanto que na minha turma 80%

fez Serviço Social, curso que não me empolgava. Então, eu achei que a

Psicologia, pelas leituras realizadas, sem influências da família, e por não

haver em São Luís psicólogos com quem eu pudesse conversar, era minha

opção pessoal e espontânea [...] Quando estava no segundo ano, pensei

abandonar tudo para fazer Direito, mas acabei gostando do curso e o

terminei. (E6).

A opção pela Psicologia foi vista como algo difícil pela falta de

conhecimento sobre a área e por divergências de opiniões familiares. Vale

ressaltar que poucos tinham um conhecimento prévio daquilo que

procuravam e outros não possuíam essa informação. Em nenhum momento

da entrevista foi percebido, em suas falas, sinal de insatisfação com a

profissão escolhida.

Analisando-se a questão referente à atuação profissional, parte dos

informantes afirmou que, devido às circunstâncias do mercado de trabalho,

optaram por iniciar sua carreira na área organizacional, ao chegarem a São

Luís. Ainda assim, outras áreas foram exploradas no início da carreira,

dentre elas a clínica, a escolar e a hospitalar. Todavia, atualmente muitos

trabalham em áreas distintas à da escolha inicial, diferente de outros que

continuaram atuando na mesma área da primeira escolha. As situações

vivenciadas nesse processo são relembradas nos depoimentos a seguir:

Minha área de atuação inicial foi a Psicologia Clínica. Quando cheguei

em São Luís montei um consultório. Naquela época, havia muito

preconceito em relação à Psicologia, as pessoas buscavam fora do Estado

o tratamento, que nunca era espontâneo, mas por indicação médica.

Fizemos [na época, trabalhava com outra psicóloga] todo um trabalho de

visita aos pediatras como uma maneira de sermos conhecidas na cidade

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[...] Ficamos cinco anos no consultório. A parte clinica era muito lenta,

não havia retorno financeiro, nem de realização e gratificação, pois a

procura era pouca, o que nos fez buscar a Psicologia Organizacional. Na

época todos que chegavam iam para o DETRAN. Atualmente trabalho na

área organizacional no setor que engloba treinamento. (E6).

Eu não conheço aprofundadamente outra área com tanto embasamento e

vivência como a que tenho com a Educação Escolar. Já trabalhei com a

Psicologia Organizacional em um hospital psiquiátrico, assim que

cheguei em São Luís, mas minha experiência maior, atualmente, é com a

Psicologia Escolar, direcionada aos distúrbios de aprendizagem, em uma

escola e em meu consultório. (E1).

[...] sempre quis a área clínica, mas trabalhei inicialmente na área escolar

quando cheguei em São Luís. Depois em uma instituição desenvolvendo

trabalho terapêutico e preventivo com menores de rua durante dez

anos. Foi uma experiência gratificante. Paralelamente, comecei

atividades clínicas em consultório. Mais tarde, trabalhei com Recursos

Humanos, em uma empresa onde aplicava testes para seleção de

candidatos. Atualmente me dedico exclusivamente ao

atendimento no consultório, um trabalho com o qual me identifico.

(E2).

O consultório, onde a maioria declarou que trabalhou e/ou trabalha,

foi visto por alguns como negativo por oferecer pouca estabilidade

financeira; já a escolha pela área organizacional se mostrava como algo

seguro por oferecer renda fixa. Essa informação pode ser comprovada no relato

que se segue:

[...] Eu pensava trabalhar vinculada a uma empresa onde pudesse no final

do mês ter um salário “x” para receber, e não somente com o consultório,

onde correria o risco de não ter uma renda fixa (E4).

A maioria dos informantes, quando chegou a São Luís, além das

atividades de consultórios, encontrou no Departamento Estadual de

Trânsito (DETRAN) a instituição que, mesmo sem vínculo empregatício,

lhes ofereceu, de início, campo de atuação, pois, segundo eles, devido à

inexistência de psicólogos no Estado, os exames psicotécnicos eram

realizados por médicos. Logo, a partir desse dado novo, considerou-se

necessário colher informações junto a esse órgão com a intenção de

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verificar como e quando ocorreu a entrada dos psicólogos nessa

Instituição.

De acordo com as informações obtidas no DETRAN, em 1970 foi

exigida a aplicação de exames psicotécnicos pelo Conselho Nacional de

Trânsito e, a partir de 1971, a primeira psicóloga que residiu em São Luís,

Addi Assumpção Azevêdo, formada pela Pontifícia Universidade Católica

do Rio Grande do Sul, foi credenciada pela Portaria n° 071/71.

A partir daí, os psicólogos eram contratados para prestar serviços

que eram realizados fora do DETRAN. Posteriormente, a direção da

Instituição construiu, em suas instalações, um espaço físico reservado para

o exame psicotécnico de candidatos requerentes da carteira de habilitação

de motorista, realizado em São Luís e em alguns municípios do Maranhão.

Essa situação é esclarecida por alguns informantes:

[...] nós prestávamos serviços, éramos muitos, trabalhávamos em sistema

de rodízio. Havia os que se deslocavam para o interior do

Maranhão, obedecendo a uma escala de trabalho [...]. (E6).

Anteriormente, no DETRAN, os psicólogos eram prestadores de

serviços na aplicação de testes psicotécnicos e não havia um

compromisso de trabalho de pesquisa educacional nem profissionais

suficientes para atender à demanda. Foi quando optamos por terceirizar, o

que levou a não se fazer mais a avaliação psicológica [...] Trabalhamos

com uma Coordenadoria de Educação para o Trânsito.

Desenvolvemos um Projeto de Educação Continuada para o

Trânsito em convênio com a Fundação Sousãndrade e a Universidade

Federal do Maranhão [...] que ofereceu um curso de Psicólogo

Perito Examinador em virtude de ser esse curso exigido por Lei para

poder ser realizada a avaliação psicológica. (E3).

Foi uma época, segundo os entrevistados, de muito trabalho e de

retorno financeiro. Assim, em decorrência da existência dessa única opção

de trabalho, os primeiros psicólogos atuaram na área organizacional e

ainda na clínica, tradicional. Além dessas, a atuação ocorria também, de

modo restrito, no campo educacional. As escolas de São Luís, segundo os

informantes, raramente contratavam o profissional e, quando isto

acontecia, esse serviço se restringia à aplicação de teste vocacional:

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Na época, não havia Psicologia Escolar no Maranhão. Quando havia, era

uma pessoa que aparecia uma vez na semana para fazer testes com os

alunos [...] No início eu senti muitas dificuldades, porque nunca se ouvia

falar de psicólogo nas escolas, e os pais não aceitavam que seus filhos

recebessem orientação psicológica [...] Hoje, apenas algumas escolas têm o

psicólogo com trabalho de acompanhamento diário, felizmente uma área

que está se expandindo em São Luís. (E1).

Quanto aos motivos da escolha para trabalhar em São Luís,

prevaleceram aqueles essencialmente familiares, ou os exclusivamente

financeiros, bem como a conciliação de ambos. Vejam-se os motivos

esclarecidos pelos psicólogos:

Em primeiro lugar, porque sou maranhense. Eu saí daqui para estudar

[...] saí sabendo que ia voltar para minha terra, pois toda a minha

família está aqui, minhas raízes estão aqui [...] vim com o

emprego certo, um convite para trabalhar no DETRAN, pois na

época só havia uma psicóloga que trabalhava lá. (E7).

Foram motivos familiares. Meus pais moravam em São Luís. (E5).

Não foi propriamente uma escolha. Comecei a namorar uma pessoa

desta cidade. Após minha formatura nos casamos, e o fato de ele já ter

emprego fixo aqui obrigou-me a deixar Recife e começar uma

vida nova. Casei com ele sabendo que minha família ficaria lá e

eu teria que morar em São Luís, terra que eu não conhecia [...] eu tive

sorte, trabalhei logo e conciliei a saudade da terra que adoro com as

oportunidades daqui. Hoje me considero maranhense, minha

adaptação não foi tão difícil. (E2).

Vim morar em São Luís depois que me formei porque me casei

com um maranhense. (E4).

Quando me formei vim para São Luís passar férias e surgiram os

empregos: o DETRAN e logo em seguida o consultório.

Pretendia voltar para Brasília para ter mais experiência, fazer

cursos, uma especialização para me sentir mais segura para

trabalhar e atuar, até porque eu sabia da deficiência dos

profissionais na cidade e eu teria que me virar sozinha; eu não teria ajuda

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[...] Aqui, nada havia para oferecer informações, nem Conselho

nem Associação. Quando eu cheguei havia um grupo muito pequeno e

desunido que causou sérios problemas [...] o clima era muito ruim

e ninguém prestava informações caso fôssemos procurar. Até

o Conselho foi chamado para resolver problemas pessoais. Além

disso, a imagem do psicólogo não era muito boa nesta cidade.

Tanto que em um episódio fomos procurar o Pe. Mohana que era a figura

respeitável da época com quem se podia conversar. Depois que

começaram a chegar outros psicólogos, melhorou bastante. Mesmo

com toda essa desunião havia respeito. (E6).

A minha vinda para São Luís é uma história [...] Hoje, eu já gosto desta

cidade, mas tive muitas dificuldades [...] Morava em Teresina e tinha

uma clínica montada que, devido a questões financeiras, teve que

ser fechada [...] Meu marido foi convidado para trabalhar como

psicólogo em uma empresa nesta cidade por quinze dias, ficou seis

meses que depois foram prorrogados, e eu fiquei sozinha dois

anos. Por questões familiares e por saber que aqui as

empresas que estavam se instalando necessitavam de psicólogo na área

organizacional, eu concordei em vir para cá, desde que ele me

conseguisse emprego [...]. (E1).

Um informante relatou que, além das questões familiares, buscava

desenvolver um trabalho para realizar-se profissionalmente:

O que me fez vir para São Luís foi a intenção de fazer um trabalho

aqui. Por incrível que pareça, sempre pensei no DETRAN, porque

observei em Recife o trabalho que era desenvolvido naquela época,

e me interessei por fazê-lo aqui [...] sempre quis fazer algo pelo meu

Estado. (E3).

Como pôde ser observado, embora os motivos declarados fossem

familiares e financeiros, ficou explícita, em algumas colocações, uma certa

resistência quanto à mudança para São Luís para construir uma vida nova

e, ao mesmo tempo, trabalhar em uma terra onde sequer existiam pessoas

para trocar informações, ou até mesmo um Conselho ou Associação que

servisse de suporte profissional. Destaca-se, ainda, certo desconforto por

parte de um informante que traz à tona a falta de unidade do grupo, sem

deixar de considerar que entre eles havia respeito.

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Quanto aos trabalhos que foram desenvolvidos na área da Psicologia

em São Luís, nesse período, os entrevistados informaram que o mercado de

trabalho não estava aberto, nem sensibilizado para essa profissão; havia

poucos profissionais, além da falta de conhecimento da atuação do

psicólogo, o que dificultava suas atividades até mesmo nas instituições em

que iniciaram seus trabalhos. Essas situações foram assim descritas:

Ninguém sabia a função do psicólogo na sociedade [...] O que ele

vai fazer? Contratar psicólogo para quê? (E4).

Além da existência de poucos profissionais na cidade, o

conhecimento da população sobre o que é ser psicólogo era muito

reduzido naquela época [...] ainda hoje sinto que permeia aquela

história da loucura [...] o que predominava, realmente, era a

Psicologia Organizacional tradicional, onde o psicólogo fazia

recrutamento, seleção e teste. Aprova, reprova e pronto. Está apto,

mais nada. (E1).

[...] o único trabalho de que eu ouvia falar era o psicotécnico no

DETRAN, não tinha conhecimento de trabalhos de pesquisa ou

projetos sociais na área. (E3).

A única situação que lembro é que nós nos reuníamos para tentar

criar uma Associação de Psicólogo. (E6).

Em relação ao aspecto da visão distorcida do papel e imagem do

psicólogo, Jacó-Vilela, Gonçalves e Oliveira (1997, p. 178, grifo do autor)

assinalam:

Vários são os atributos e as definições de psicólogos que, numa

investigação impressionista, podem ser encontrados em nossa

sociedade. Uma característica comumente presente, mesmo em

entendimentos marcantemente negativista-como naqueles em que o

psicólogo é referido como pessoa de extrema frieza, invasora etc

— é a que o circunda com uma aura de magia, como taumaturgo,

um novo tipo de sacerdote, o portador — moderno — da bola de

cristal, o especialista nas adivinhações sobre o outro.

Apesar das dificuldades percebidas pelos entrevistados, alguns

apontaram a oportunidade de trabalho, já na década de 70, em instituições

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como a Universidade Federal do Maranhão (UFMA), a Associação de Pais

e Amigos de Excepcionais (APAE) e a Fundação Estadual do Bem-Estar

do Menor (FEBEM). E, nos anos 80, surgiram outros espaços: o Consórcio

de Alumínio do Maranhão (ALUMAR), a Companhia Vale do Rio Doce

(CVRD), a Norte Serviços Gerais (NORSERGEL), a Empresa Brasileira

de Correios e Telégrafos (CORREIOS) e a Companhia de Águas e Esgotos

do Maranhão (CAEMA).

Uma questão interessante é que os informantes não conheciam

trabalhos de Psicologia anteriores a sua chegada em São Luís. Só depois de

estimulados alguns conseguiram se lembrar dos trabalhos realizados pelo

Pe. João Mohana, direcionados à Psicologia e à Psicanálise com famílias.

Essas informações foram encontradas nas seguintes falas de alguns

informantes:

Já ouvi falar do Pe. Mohana, li pouco sobre ele e não o conheci

pessoalmente. Ouvi falar dele como pioneiro da Psicologia no

Maranhão. (E4).

Eu não consigo lembrar se havia algum trabalho antes [...] Nós tínhamos

o padre e médico João Mohana. Eu não tenho certeza se ele era

psicólogo, embora nós conversássemos muito. Tive muitos pacientes

enviados por ele. Ele era conhecido como o psicólogo de São Luís. (E7).

Eu ouvi falar demais do Pe. Mohana através de um amigo que

trabalhava na equipe que desenvolvia trabalhos de assistência a

famílias da comunidade [...] eu tinha muita vontade de conhecê-lo, mas

não tive oportunidade de entrar em contato. Li alguns de seus livros

nos quais, realmente, havia muito de Psicologia. (E3).

O que sei a respeito do Pe. Mohana é que ele fazia aconselhamento, o

que, a meu ver, estava de acordo com sua atuação como padre, não

exigia, portanto, a Formação de Psicólogo. (E5).

Eu não tinha muitas informações sobre o Pe. Mohana, sabia da

existência dos livros, mas não senti interesse por eles. Sabia que ele

desenvolvia todo um trabalho sobre Psicanálise e também com

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famílias, apesar de não ter formação na área, por isso quando

chegamos aqui o procuramos. (E6).

Um dado importante apontado anteriormente pelo informante E6

durante a entrevista, foi a tentativa de criação da primeira Associação

Profissional dos Psicólogos do Maranhão. Buscou-se, então, saber como

surgiu a necessidade de criação dessa Associação. Segundo a psicóloga

Dilercy Aragão Adler — que foi a primeira representante do Maranhão no

Conselho Regional de Psicologia de 1983 a 1992 — presidente da

Associação, esse órgão foi fundado em 1985, com a proposta de atuar

junto ao Conselho na realização de atividades que normalmente não

aconteciam, como uma ação complementar. Segundo ela, a ideia de fundar

a Associação foi exatamente em função da necessidade de criar aqui as

condições para que o Maranhão também fosse engajado, como o restante

do Brasil, na questão do sindicalismo.

Na realidade, o Estado tinha uma representação no Conselho e nada

em relação à questão sindical. Assim, os psicólogos partiram para essa

luta. Conforme a presidente, "[...] o Conselho é um órgão de controle e o

sindicato é responsável por empreender lutas pela categoria, e era isso que

buscávamos".

Com pouco tempo de duração, de 1985 a 1987, a Associação prestou

serviços à comunidade, através de palestras, seminários e debates em

escolas e instituições. À época, contava com 24 (vinte e quatro) sócios,

num universo de 30 (trinta) psicólogos, em São Luís. No entanto, todo esse

empenho e mobilização não foram suficientes para dar continuidade à

Associação, mesmo cumprindo algumas exigências consideradas

necessárias para o seu funcionamento (Estatuto). Foi a partir do segundo

mandato da Diretoria que a Associação encerrou suas atividades, não tendo

sido possível resgatar o documento comprobatório desta revelação apesar

dos esforços empreendidos. Alguns psicólogos pensam na possibilidade de

retorno da Associação.

Pode-se dizer que, com os dados obtidos com os informantes, foi

possível perceber situações em que eles enfatizam a necessidade e a

importância do profissional no mercado, fazendo uma avaliação mais

positiva das duas últimas décadas do século XX, de sua inserção em

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diferentes campos de trabalho em São Luís. Mesmo não se tendo

investigado a respeito da evolução da Psicologia nesta cidade, alguns

apontam a trajetória da Psicologia em São Luís, destacando pontos como,

por exemplo: o profissional deve deixar a marca do seu trabalho; o

mercado não está restrito só na área da Psicologia; o profissional deve

atuar de forma integrada, entre outros. Desse modo, constatou-se que os

informantes consideram que o processo de transformação da Psicologia no

Maranhão tem ocasionado mudanças e evoluções, embora precise ser

alterado especialmente no que se refere à valorização do profissional e à

união da categoria. Sendo assim, para uma psicóloga, nos últimos vinte

anos

[...] começou a surgir a necessidade e a importância do papel do

profissional. O mercado, hoje, não está bom, é regular, e o que faz a

diferença é o perfil do profissional. A atualização, a busca de

informações [...] Conheço profissionais que dizem que em São Luís não

há espaço. Eu discordo. Existem campos de atuação como escolas,

empresas e instituições, depende de cada um, dos argumentos que se tem,

do valor que se dá aquilo que se está oferecendo. Está cada vez mais

evidente a necessidade do psicólogo nesses espaços [...]. (E4).

Esse dado pode ser resumido na informação de Bock (2001, p. 25),

ao dizer:

A noção de fenômeno psicológico sofre uma transformação interessante

no decorrer dos anos, especialmente entre 1980 e 1995. Essa

transformação acompanha mudanças nos modos de inserção da categoria

na sociedade. Os psicólogos, conquistando novas formas organizativas

— grupos progressistas passam a ocupar a direção das entidades —, vão

aumentando sua participação nos movimentos sociais. Aos poucos,

ocorre também uma verdadeira transformação nas concepções de

fenômeno psicológico.

Considerando-se a situação da Psicologia quando aflorou em São

Luís no início da década de 70, e hoje, em 2001, destaca-se o seguinte

comentário:

[...] infelizmente muita coisa não pode ser acrescentada devido à falta de

registro e essa é a grande falha da Psicologia no Maranhão, o que é uma

pena. Naquela época, as pessoas eram muito individualistas, o grupo era

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disperso, o ambiente criado afastava as pessoas, não aconteciam

reuniões para estudos, para o desenvolvimento de trabalhos comunitários

[...] acredito que foi por falta de maturidade nossa em lidar com nossos

próprios interesses, por querermos nos desenvolver sozinhos. Hoje as

coisas não funcionam assim, o trabalho é realizado em equipe e

está mais fortalecido do que naquela época. (E6).

A reflexão acima evidencia o quanto é necessária a autoconstrução e

a de seu trabalho, sem esquecer de dialogar, ouvir e avaliar continuamente.

Nesse sentido Pessotti (1988, p. 17) diz:

Quando, pois, alguém se dispõe a voltar-se para si mesmo e a analisar-se

criticamente, está a demonstrar, independentemente do grau de correção

dessa análise, um apreciável grau de amadurecimento.

Na trajetória esboçada, observa-se que a Psicologia no Maranhão

percorreu caminhos semelhantes aos que são apontados em seu percurso

histórico nacional, como já mencionado. A necessidade da presença desses

profissionais no Estado foi-se constituindo, durante essas décadas, a partir

das demandas percebidas por eles e das oportunidades por eles criadas de

verificar que esse espaço estava aberto, mesmo com restrições da

população.

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CAPÍTULO IV

A PSICANÁLISE NO MARANHÃO

[...] ninguém pode saber melhor do que eu o que é psicanálise, em que ela difere de outras formas de investigação da vida mental, o que deve precisamente ser denominado de psicanálise e o que seria melhor chamar de outro nome qualquer [...].

Sigmund Freud, 1914d/1974.

Sabe-se que a Psicanálise chega ao Brasil, o primeiro país americano

a implantar o freudismo, entre os anos de 1914-1930, quando os

psiquiatras Arthur Ramos, Júlio Porto-Carreiro, Francisco Franco da

Rocha e Durval Marcondes fizeram sua progressiva implantação nos

Estados do Rio de Janeiro e São Paulo, adequando a doutrina de Freud às

preocupações terapêuticas dirigidas ao tratamento da loucura e ao

entendimento das temáticas infantis.

Em 1945 o movimento psicanalítico no Brasil começou a fazer parte

da International Psychoanalitical Association (IPA) e a aceitar suas

normas. Mesmo em meio a graves conflitos ocorridos no Brasil entre Mark

Burke e Wener Kemper, foi fundada e reconhecida pela IPA em 1955 a

Sociedade Psicanalítica do Rio de Janeiro (1953) por Kemper, e logo em

seguida (1959) os simpatizantes de Burke associaram-se a outros

psicanalistas e criaram a Sociedade Brasileira de psicanálise do Rio de

Janeiro.

Em 1947, Mário Martins encabeçou a organização da Sociedade

Psicanalítica de Porto Alegre que obteve seu reconhecimento pela IPA em

1963. Em 1967, cria-se a Associação Brasileira de Psicanálise (ABP), com

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o objetivo de reunir as Sociedades de Psicanálise do Brasil filiadas à IPA,

passando a se constituir como órgão federativo.

Apesar do grande número de associações que surgiram no Brasil,

seu fortalecimento só tem início com a aceitação da Psicanálise pela

sociedade, para a qual, é lógico, a constituição das sociedades e

institucionalização da Psicanálise em muito contribuíram.

Entretanto, nos anos 70 surge uma crise. O cenário psicanalítico

estava se desgastando pelas pressões quanto à formação analítica, à

proibição de formação como analistas de outros profissionais que não

fossem médicos, à rigidez de regulamentos e hierarquias, ao discurso

girando em torno da "verdadeira" Psicanálise12 (COIMBRA, 1995, p. 65-

67).

No Brasil dos anos 70, as práticas da Psicanálise avançam nos

grandes centros urbanos, penetrando na imprensa, aparecendo em

publicações como livros, revistas especializadas com seções de

aconselhamento psicológico, assinadas por psicólogos e/ou psicanalistas,

de modo a produzir a chamada "cultura psicológica" já mencionada no

capítulo anterior.

Na década de 80, violentas crises ocorreram no interior das

Sociedades "oficiais" com diferentes justificativas: uns entendendo que

eram decorrentes dos pressupostos autoritários que alguns grupos

adotavam, e outros, que podiam ser devidas à entrada do movimento

lacaniano, que acabou com a hegemonia existente. Tudo isso de alguma

forma serviu para uma reestruturação das Sociedades “oficiais”, uma

solução para o movimento psicanalítico, ou seja, uma busca de autorização

da Psicanálise (COIMBRA, 1995, p. 184).

12 Produção de uma prática, de um território onde a "verdade" está presente, onde os

que não fazem parte de uma formação específica não podem a ela ter acesso, nem

os que a exercem — a realizada nas Sociedades "oficiais". Cf. COIMBRA, C. M. B.

Guardiães da ordem: uma viagem pelas práticas psi no Brasil do "milagre". Rio de

Janeiro: Oficina do Autor, 1995, p. 67. A citação de Freud que serve de epígrafe a este

capítulo ilustra bem a importância do tema na instituição psicanalítica.

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Nesse momento, afirma-se o lacanismo, fazendo críticas à

“verdadeira” Psicanálise e à formação estabelecida pela IPA, por não

aceitar dar continuidade ao tipo de ensino e de hierarquia vigente nas

Sociedades, por recusar a forma burocratizada de formação do psicanalista,

bem como a leitura que faziam da obra de Freud. Seus efeitos refletiram-se

nas instituições, caminho enveredado pela maioria dos profissionais,

inclusive os do Maranhão13.

A psicanalista Elizabeth Roudinesco (2000, p. 3) diz que a

Psicanálise está disseminada em todo o mundo, e novas gerações de

analistas estão surgindo e vendo novos problemas, entre eles que

Psicanálise não apresenta a mesma prática de antes, que ela mudou do

ponto de vista da técnica e da prática.

Especificamente em relação ao Maranhão, segundo os informantes,

o campo psicológico se constituiu principalmente através da divulgação da

Psicanálise. Considerando-se que a psicanálise se estruturou aqui — como

também no Rio de Janeiro e em São Paulo — anteriormente à criação dos

cursos de Psicologia, esse foi o indicador que impulsionou a pesquisar

sobre esse campo no Estado, por se entender que a trajetória de vida,

especialmente de vida profissional, pode ser um dispositivo útil para se

entender a dinâmica de um dado campo de saber.

Para discorrer sobre a Psicanálise no Maranhão, centralizou-se a

atenção na cidade de São Luís. Conseguiu-se localizar e entrevistar

membros de quatro grupos que atuam na cidade (em 2000) além de

profissionais que deles não fazem parte. Destes entrevistou-se a pioneira da

Psicanálise nesta localidade. Embora tais profissionais, em sua maioria,

tenham autorizado sua identificação pelo nome, optou-se por não fazer

isto, utilizando-se, para tanto, o código "P" (psicanalista) e a numeração 1

a 9 para distingui-los, não significando que a ordem seja a mesma das

entrevistas.

O procedimento para conhecer essa realidade foi a elaboração de um

roteiro de entrevista. Com seus resultados passou-se a descrever os

13 Voltar-se-á a essa questão mais à frente neste capítulo.

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acontecimentos de forma sequenciada, visando construir uma narrativa

acerca da Psicanálise no Maranhão.

Dos 9 (nove) psicanalistas entrevistados, 6 (seis) são professores na

UFMA, sendo 5 (cinco) da carreira do magistério superior e 1 (um)

substituto. Contudo, uma psicanalista (com formação em Psicologia na

Universidade Federal do Rio de Janeiro), aprovada em concurso público,

permaneceu na Instituição no período de 1991 a 1994, quando solicitou

exoneração. Como os demais, tem atividades em consultórios. Observou-se

que a maioria segue a Psicanálise lacaniana. Assim, ao transcreverem-se

suas trajetórias, optou-se por utilizar suas próprias palavras, reveladoras do

pensamento que partilham.

A primeira psicanalista de São Luís, P1, teve uma formação

acadêmica diversificada. Segundo ela, seu interesse pela Psiquiatria e pela

psicanálise se pautava em seu percurso de vida explorando seus conflitos,

percebendo em que a Psicanálise poderia ajudar a entendê-los, assim como

em seu comprometimento com as questões político-sociais (encontrava-se

no Brasil, num sistema capitalista) que se presentificavam, com

interrogações como: Até que ponto um sistema político é produtor de

doenças mentais? O que escapa ao controle político, econômico ou social?

O que significa pensar que todo sintoma é automaticamente social, já que

não se pode pensar em sujeito sem laço social? Qual o lugar da

Psicanálise?

De acordo com P1 pode-se perceber a presença da Psicanálise nos

movimentos sociais na medida em que o sujeito está no campo da ética

cujos efeitos são sentidos na clínica. Parte daí sua paixão pela Psicanálise,

ao pensá-la como uma prática libertária, embora saiba e registre sempre

que não se pode pensar o Brasil psicanaliticamente14.

14 Em seu discurso parece não haver incoerência entre a presença das questões político-

sociais e sua prática profissional, pois, segundo ela, trata-se de uma área legítima da

investigação psicanalítica. Contudo, considera que isto não significa fazer do

consultório um local de proselitismo de ideias, tendo em vista que nele ela ocupa o seu

lugar de analista, mas, fora desse espaço, ela, a psicanalista, é uma cidadã engajada

nas lutas que podem conduzir a uma mudança na sociedade brasileira.

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Começou a estudar Psicanálise quando da sua formação no curso de

Medicina, estudo que foi intensificado nessa época por sua própria análise

pessoal e pelo estudo em grupo da obra de Freud. Durante esse tempo

outras questões a acompanhavam: Como estabelecer possibilidades de

interlocução da Psicanálise com outros campos do saber? Como se poderia,

por exemplo, compreender a questão da política no discurso psicanalítico?

Como articular desejo15, poder e produção?

O seu processo de formação reside na própria influência da

Psicanálise e de psicanalistas comprometidos em transformar o exercício

da Psicanálise no Brasil, especialmente de Helio Pellegrino, Joel Birman,

Jurandir Freire, que marcaram o seu posicionamento como analista.

Em 1983, com um grupo de profissionais de diversas áreas, fundou a

Associação Maranhense de Medicina Psicossomática, da qual foi

presidente durante duas gestões. Era um espaço de discussão sobre o

paciente sob a ótica biopsicossocial. Durante alguns anos essa Associação

participou das políticas de atendimento à saúde mental nos hospitais em

São Luís.

Segundo P1, nesse grupo havia alguns psiquiatras que faziam uma

abordagem mais dinâmica, o que se poderia chamar de psicoterapia de

base analítica, além de outros profissionais que foram buscar sua formação

em outros centros, surgindo então o interesse de pensar a Psicanálise em

São Luís, dando enfoque à obra de Lacan. É assim que aparece o primeiro

grupo local de Psicanálise, composto por psicólogos e psiquiatras, entre

eles a entrevistada, que permaneceu nesse grupo por um período curto de

tempo. Em algumas reuniões foi proposta a formação de uma Sociedade. A

ideia desta entrevistada era de não haver de imediato essa criação, e sim,

buscar um caminho para saber onde poderiam chegar. Posteriormente,

mais 2 (dois) psicólogos passaram a fazer parte do grupo. O grupo

15 Termo empregado em Filosofia, Psicanálise e Psicologia para designar, ao mesmo

tempo, a propensão, o anseio, a necessidade, a cobiça ou o apetite, isto é, qualquer

forma de movimento em direção a um objeto cuja atração espiritual ou sexual é

sentida pela alma e pelo corpo. Cf. ROUDINESCO, E.; PLON, M. Dicionário de

psicanálise. Rio de Janeiro: Zahar, 1998, p.146.

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dissolveu-se e dele saíram pessoas que formaram outros grupos, hoje

Escolas e Instituições, em São Luís.

Segundo a entrevistada, na ocasião viajava quinzenalmente ao Rio

de Janeiro, para continuar sua análise (realizada com uma psicanalista

kleiniana) e manter-se ligada aos seus antigos supervisores. Sua opção de

formação foi pela SPID (Sociedade de Psicanálise Iracy Doyle), da qual

participou como membro cursista por quatro anos, tendo sido secretária do

Centro de Estudos. Continua ligada a essa Sociedade, mantendo sua

supervisão e sua análise.

Seu processo de formação como analista ocorreu pela própria análise

como condição sine qua non para tal e pelo aporte teórico sua função — o

divã. Nesta formação, ela declara:

[...] vejo a revolucionária contribuição de Lacan à Psicanálise, trazendo a

linguística de Saussurre junto com o estruturalismo antropológico de

Lévi-Strauss, construindo a concepção do inconsciente estruturado como

linguagem. Pensar o inconsciente desta maneira determinou uma nova

forma de escutar o cliente, o lugar do analista no processo, a direção da

cura, o fim da análise [...].

A psicanalista tece críticas a alguns analistas lacanianos que fazem

uso do hermetismo da linguagem de Lacan que, por ser realmente difícil de

ler, pode ter permitido várias interpretações. Critica também, a forma de

tratar a formalização deixada por ele através de seus esquemas, grafus,

aforismos e matemas, sustentando um culto à obscuridade.

Em sua observação, a transmissão16 da Psicanálise no Maranhão

lembra o sentido que Lacan deu à Proposição de 9 de outubro de 1967: "O

analista só se autoriza17 por si mesmo". A partir daí coloca algumas

questões, como: Será que esta Proposição não está sendo usada ao pé da

16 Diz respeito ao processo de análise, requisito fundamental à formação do analista e aos

dispositivos institucionais da sessão clínica e do cartel. (Definição verbal de uma

psicanalista entrevistada). 17 Refere-se à Proposição de Lacan segundo a qual o analista só se autoriza por si mesmo. A

autorização se dá no processo de análise e permite ao analista sustentar sua posição

diante do psicanalisando. (Definição verbal de uma psicanalista entrevistada).

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letra por analistas auto-autorizados? Será que está sendo valorizado o

estatuto social ou institucional do psicoanalista, e não o seu desejo como

mola central de sua formação? Haverá alguma relação entre o grande

número de "psicanalistas" abrindo novos consultórios na cidade, o número

de Escolas e o fato de estes psicanalistas autorizarem-se por si mesmos?

Finalizando, diz que é preciso compreender que aquilo que Lacan

propôs é que "auto-autorizar-se analista é autorizar-se pelo seu desejo".

Contudo, afirma que há sempre mercado para o bom profissional que tem o

que trocar, considerando a ética como um dado fundamental nesta relação.

Observa-se que, após o grupo inicial de que P1 participou, a

institucionalização da Psicanálise em São Luís ocorre pela fundação, em

1985, da Escola de Psicanálise do Maranhão. Dentro do espírito de seguir

na historicização da Psicanálise, passa-se a apresentar sinteticamente sua

trajetória, a partir das entrevistas realizadas.

4.1 Escola de Psicanálise do Maranhão

Para melhor compreender a história da Escola de Psicanálise do

Maranhão (EPM), fundada em 1995, após dez anos de experiência

institucional de seus membros, entrevistou-se P2, presidente dessa Escola,

que, naquele momento, era composta por vinte membros. Ela é

consequência do percurso de alguns analistas formados pelo Núcleo de

Estudos Freudianos (NEF), criado em 1985, e pela Sociedade Psicanalítica

do Maranhão (SPMA), criada em 1989. Após a dissolução desta

Sociedade, foi fundado um movimento que teve a duração de um ano: a

Liça Freudiana. Seu objetivo era estudar os dispositivos de funcionamento

de uma Escola de Psicanálise, conforme estabelecidos por Jacques Lacan,

e produzir um conhecimento que permitisse seguir em direção à fundação

da EPM, o que ocorreu. A Escola é dirigida por uma Comissão Diretora de

acordo com a teoria e a prática psicanalítica.

A presidente da Escola, desde o início, é P2. Sua formação

acadêmica em Psicologia se deu na Universidade Federal do Rio de Janeiro

(UPRJ), curso concluído em 1978. Começou a estudar Psicanálise em

1975, durante o curso de Psicologia. A finalidade, a princípio, ligava-se à

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seleção para estágio na clínica da UFRJ, onde a orientação era

psicanalítica. Seu processo de formação de analista é concebido tal como

Lacan o concebe, contínua e ininterrupta. Diz ela:

[...] Por isso ao falar dela não conjugo o verbo no passado. Minha

formação não apenas foi, continua sendo realizada através de análise

pessoal, de supervisões realizadas no Rio de Janeiro e de estudo e

produção teórica [...].

As atividades desenvolvidas por essa Escola e restritas aos seus

membros são as sessões clínicas, as reuniões institucionais, a Comissão de

Garantia, o pertencimento ao Conselho Consultivo e à Comissão Diretora.

Considera-se seu objetivo fundamental a transmissão da Psicanálise,

destacando-se o cartel18 como principal dispositivo para a formação do

analista na Escola.

Além destas atividades, a EPM tem outras, dirigidas especificamente

à comunidade, cujo objetivo é fazer circular a produção e oferecer uma

programação para os que estejam interessados em Psicanálise. As

programações anuais abertas à comunidade constituem-se das atividades

consideradas importantes para o momento, assim como aquelas que se

tornaram rotineiras, cuja finalidade e objetivo é o compromisso com a

transmissão da Psicanálise comprometida com a letra de Freud e o ensino

de Lacan.

Pela EPM passaram alguns membros que dela se desligaram para

formar outras Escolas/Instituições nessa cidade. Por questões de afinidades

institucionais, essa Escola mantém permanente troca com a Tempo

Freudiano Associação Psicanalítica, instituição localizada no Rio de

Janeiro. A Escola conta com uma Coordenação de Publicações (conselho

Editorial) com o compromisso de fazer circular, anualmente, a "Revista da

Escola de Psicanálise do Maranhão" com textos da autoria de seus

18 É o dispositivo institucional com a formação de um pequeno grupo em que três se

escolhem e escolhem mais um. O número de componentes de um cartel não pode

ser três e não deve ultrapassar cinco membros. Eles escolhem um texto, uma obra e a

estudam durante certo tempo, que deve estar fixado. Ao fim do prazo, o cartel deve

dissolver-se, para que novos cartéis se formem, nos mesmos moldes. (Definição verbal

fornecida por uma entrevistada).

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membros. Quanto à transmissão da Psicanálise no Maranhão, P2 se

posiciona do seguinte modo:

Só posso falar daquela que acompanho na Escola da qual faço parte. É

um trabalho árduo, difícil, que exige muita dedicação e determinação, o

que não considero um privilégio nem desta Escola nem do Maranhão. É

o que se espera, desde Freud, na transmissão de um saber (não todo) e de

uma práxis (do inconsciente) que opõem sempre as mais duras

resistências.

A psicanalista P3 também é membro dessa Escola. Com formação

acadêmica em Psicologia pela Universidade de Brasília, concluída no ano

de 1980, começou a estudar Psicanálise em 1991, quando essa Instituição

ainda se denominava Sociedade Psicanalítica do Maranhão. Seu objetivo

era fazer sua formação para tornar-se psicanalista, por isto nesse mesmo

ano de 1991 inicia também sua análise pessoal.

Quanto à formação de analista, considera, da mesma forma que P2,

que ela não apenas foi, mas continua sendo. Comunga, assim, da definição

de Lacan sobre a formação que se faz sempre no sentido das "formações do

inconsciente", de tal modo que a formação do analista, na qual se inclui, é

permanente. Iniciou sua formação nos anos 90 e continua. Assim, declara:

[...] Lacan não distingue a análise pessoal da análise didática19. Para ele

toda análise é didática, entretanto há pelo menos dois tempos na análise

que se definem conforme a posição do analisando e a posição que o

analisando supõe ao analista. Considero que estou no segundo tempo de

minha análise, portanto próxima de seu fim. Sim, as análises terminam,

as formações não.

A transmissão da Psicanálise no Maranhão é observada por P3 como

um desafio para qualquer instituição de Psicanálise, remetendo a uma

questão: É possível a transmissão da Psicanálise na instituição?

19 Termo empregado a partir de 1922 e adotado, em 1925, pela International Psychoanalytical

Association (IPA), para designar a psicanálise de quem se destina à profissão de psicanalista.

Trata-se de uma formação obrigatória. Cf. ROUDINESCO, E.; PLON, M. Dicionário de

psicanálise. Rio de Janeiro: Zahar, 1998, p.17.

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A resposta só é possível a partir da experiência, isto é, na medida em que

os membros da instituição — guardadas as diferenças — sustentam a

Psicanálise, suas posições, seus conceitos, etc. Bom, em nossa

instituição, a EPM, é possível testemunhar isso.

Contudo, apesar de ver com bons olhos as outras Instituições

existentes na cidade, não considera necessário que elas se comuniquem,

participem umas das atividades das outras, ou que tenham os mesmos

objetivos. Esclarecendo melhor sua posição, comenta:

Quando se fala de instituição, deve-se apostar no seu funcionamento,

em sua experiência e na possibilidade de sustentar ou

testemunhar a Psicanálise, devendo cada uma falar por si [...].

Entretanto, sabe-se da existência de profissionais que não estão

ligados a qualquer instituição e que também não fazem circular suas

posições e, o que é mais perigoso ainda, tem-se a denúncia, já

oficializada, do funcionamento de um curso de dois anos que diploma

psicanalista e não faz exigência quanto à análise ou supervisão. Isto é

inadmissível. Isto não é Psicanálise e o público deve ser

informado a esse respeito20.

4.2 Escola Brasileira de Psicanálise

Um grupo de pessoas interessadas em estudos psicanalíticos criou

uma instituição denominada "Articulações em Psicanálise", com

surgimento formal em 1992, (embora seus membros já tivessem um longo

percurso de estudos sobre a temática, desde o ano de 1985) a qual, após

reflexões de seus membros quanto ao processo de formação, foi dissolvida

em 1994, depois de dois anos de atividades. Logo em seguida, no ano de

1995, deu-se a criação da V Escola do Campo Freudiano — Escola

Brasileira de Psicanálise.

A Escola, segundo os informantes, tem por objetivo a Psicanálise e,

por finalidade, a restauração de sua verdade, a transmissão de seu saber,

oferecendo-o ao controle e ao debate científico, para, em consequência,

20 Neste caso, a psicanalista refere-se à Sociedade Psicanalítica Ortodoxa do Brasil (SPOB).

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conseguir o estabelecimento da qualificação do psicanalista. Ela ministra

uma formação, garante a relação do psicanalista com esta formação, e se

propõe a colocá-la em debate.

Essa Escola é nacional e conta com várias Seções e Delegações no

Brasil. No Maranhão a Delegação está vinculada à Seção de Minas Gerais.

Em São Luís a Delegação é coordenada por membros aderentes e

correspondentes.

A psicanalista P4 teve sua formação acadêmica como psicóloga na

Universidade Gama Filho no Rio de Janeiro concluída no ano de 1982.

Começou a estudar Psicanálise em 1989, num seminário intitulado

"Constituição do Sujeito", ministrado numa instituição ligada ao Campo

Freudiano denominada "Articulações em Psicanálise”. Antes da fundação

da Escola Brasileira de Psicanálise, vários psicanalistas do Rio de Janeiro,

de São Paulo, de Belo Horizonte vieram a São Luís, sustentando uma

transmissão.

As atividades programadas pela Escola, abertas à comunidade para

analistas, ou não, têm por objetivo propiciar novas vias de discussão que

permitam aos interessados um aprofundamento continuo na teoria

psicanalítica, dando prosseguimento a projetos já iniciados. A importância

dessas atividades, tanto as restritas aos membros quanto às abertas à

comunidade, contribuem para a discussão e reflexão de questões

psicanalíticas, provocando uma transferência de trabalho. As restritas aos

seus membros são, segundo a entrevistada, as sessões clínicas, cuja

importância para sua formação está presente em sua declaração:

O analista não vive sozinho. A Escola apresenta o passe21 como um

procedimento no qual um analista, para fazer-se autorizar como analista

da Escola, falará de sua análise. A autorização, assim, não é dada apenas

por ele, mas por outros também.

21 Termo empregado em 1967 por Jacques Lacan para designar um processo de travessia que consiste em

o analisando (passante) expor a analistas (passadores), que prestarão contas disso a um júri dito de

credenciamento, aqueles dentre os elementos de sua história que sua análise o levou a considerar

como suscetíveis de dar conta de seu desejo de se tornar analista. Cf. ROUDINESCO, E.; PLON, M.

Dicionário de psicanálise. Rio de Janeiro: Zahar, 1998, p. 575.

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A finalidade de seus estudos psicanalíticos ligava-se a questões de

seu trabalho como psicóloga e ao fato de fazer análise desde 1986,

considerando ser essa uma consequência, um efeito da própria análise.

Portanto, seu processo de formação de analista se deu através da análise

pessoal, de participações em todas as jornadas do Campo Freudiano a

partir de 1993, seja como palestrante, debatedora, ouvinte, seja pelo fato de

sustentar uma transmissão de Psicanálise desde 1990. Pretende fazer o

passe de entrada na Escola Brasileira de Psicanálise, já que a

transferência22 de trabalho se direciona ao Campo Freudiano.

A seu ver, a transmissão da Psicanálise no Maranhão ocorre com

seriedade. Segundo ela existem muitas pessoas fazendo leituras e estudos

de Freud e Lacan. Mostrou-se preocupada com a Sociedade Psicanalítica

Ortodoxa do Brasil (SPOB) por sua proposta de usar de forma deturpada o

nome da Psicanálise.

Ainda dentro dessa Escola, entrevistou-se também a psicanalista P5.

Ela teve a formação acadêmica em Psicologia concluída na Universidade

Gama Filho no Rio de Janeiro em 1983. Interessou-se pela Psicanálise

desde a época em que frequentava a Universidade, na condição de

estudante de Psicologia, quando procurava participar de atividades

extracurriculares promovidas por outras instituições, participando de

cursos e eventos como também fazendo sua análise pessoal, um referencial

que mais tarde, como profissional, viria a sustentar sua prática de trabalho.

No ano de 1989, já em São Luís, foi convidada pela psicanalista

promotora do seminário intitulado “Constituição do Sujeito”, para dele

participar, o que lhe possibilitou continuar seus estudos em Psicanálise,

participando das atividades promovidas pelo grupo "Articulações em

Psicanálise". Segundo a psicanalista, sua opção por essa Escola foi devido

à forma pela qual ela se diferencia das demais em termos de práticas

22 Termo progressivamente introduzido por Sigmund Freud e Sandor Ferenczi (entre 1900 e

1909), para designar um processo constitutivo do tratamento psicanalítico mediante o qual os

desejos inconscientes do analisando concernentes a objetos externos passam a se repetir, no

âmbito da relação analítica, na pessoa do analista, colocado na posição desses diversos objetos. Cf.

ROUDINESCO, E.; PLON, M. Dicionário de psicanálise. Rio de Janeiro: Zahar. 1998,

p.766-767.

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institucionais como, por exemplo, o dispositivo do passe que, para essa

Escola, é considerado "[...] o pivô que articula a direção do tratamento na

experiência analítica [...]". Quanto ao seu processo de formação de

analista, acredita que

[...] seja possível não só a partir do encontro entre o analista e o

analisando, mas também, e fundamentalmente, entre o analista e uma

instituição para onde possa endereçar as suas questões relativas aos

conceitos e instrumentos utilizados na sua prática, podendo, assim,

discutir acerca do seu trabalho solitário e partilhar com os demais colegas

as suas experiências.

A transmissão da Psicanálise no Maranhão, no seu entendimento,

não ocorre apenas pela Escola Brasileira de Psicanálise, pois existem

outras instituições psicanalíticas em São Luís, que se diferenciam

especialmente por adotarem concepções distintas quanto ao final da

análise.

4.3 Escola Lacaniana de Psicanálise do Maranhão

Um grupo dissidente da Escola de Psicanálise do Maranhão fundou,

em 1997, a Escola Lacaniana de Psicanálise do Maranhão, constituída, no

momento (2000), por dez membros.

A psicanalista P6 é a diretora geral da Escola. Concluiu o curso de

Psicologia em 1975, pela Universidade Gama Filho no Rio de Janeiro.

Começou a estudar Psicanálise em 1985, com um grupo de psicanalistas

interessados que, posteriormente, fundou a Escola de Psicanálise do

Maranhão, com a finalidade de aprofundar conhecimentos anteriores. Para

a psicanalista, seu processo de formação como analista ocorreu tanto por

sua análise pessoal — iniciada em São Luís e continuada na Escola

Lacaniana no Rio de Janeiro — quanto pela supervisão a que se submete.

As atividades restritas aos membros da Escola são as sessões

clínicas e o cartel, considerados de importância fundamental para a

formação do analista. As atividades abertas à comunidade têm por objetivo

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a produção e formação dos membros da Escola e articulações com outras

instituições. A transmissão da Psicanálise no Maranhão segundo ela é:

[...] lenta, porque tem a ver com o sujeito que está fazendo a formação; é

algo particular. Na formação lacaniana você está sempre em formação,

você está sempre se autorizando. Não existe um diploma.

Outro membro dessa Escola entrevistado foi a psicanalista P7, cuja

formação acadêmica em Psicologia ocorreu na União das Escolas

Superiores do Pará (UNESPA), atual Universidade da Amazônia

(UNAMA), em 1993. Começou a estudar Psicanálise quando cursava o

último ano do curso de Psicologia, ainda nesse momento somente com

interesse acadêmico; o estudo ligado à formação de analista ocorreu ao

entrar para a Escola Lacaniana de Psicanálise do Maranhão, em 1997. A

finalidade dos seus estudos foi o desejo de ocupar o lugar de analista.

Quanto às atividades restritas aos membros da escola, concebe a

sessão clínica como a sua prática analítica por ser testemunhada por seus

pares, o que considera fundamental no processo de autorização, sendo o

cartel um lugar privilegiado de formação, pela própria produção (texto) a

partir das questões que provocam uma demanda. Considera essas

atividades importantes por estarem implicadas com o estudo da psicanálise

e por requererem um percurso nos campos teórico e prático, sustentando

sua autorização.

Com relação às programações comentadas por P6, voltadas à

comunidade, P7 considera que têm como objetivo a transmissão da

Psicanálise a partir dos estudos de Freud e Lacan, para a formação de

analistas e também para estudo dos que se interessam teoricamente pela

Psicanálise.

Seu processo de formação como analista começou como participante

das atividades da Sociedade Psicanalítica do Maranhão, atual Escola de

Psicanálise do Maranhão, declarando que não chegou a fazer o pedido para

ser membro dessa Instituição em função de suas próprias resistências

(segundo ela, como já dizia Freud, onde há muita resistência, há muito

desejo), que apontavam para o seu desejo de ocupar o lugar de analista,

com a exigência do seu percurso teórico e do seu processo pessoal de

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análise. Passou, então, a fazer parte da Escola Lacaniana de Psicanálise do

Maranhão, para depois de um ano começar a clinicar e a dar testemunho de

sua escuta nas sessões clínicas. Considera-se numa categoria de analista

iniciante que recebe a denominação de analista praticante, havendo

momentos em que se sente mais autorizada e outros em que não, situação

que enfrenta com cada paciente em razão dos próprios atos analíticos.

Observa que a transmissão da Psicanálise no Maranhão ocorre em

[...] um local muito propício por apresentar um leque de opções de

instituições e pelo modo como essas instituições estão trabalhando,

trazendo profissionais de outros Estados, promovendo seminários e

cursos, que se constituem em uma importante fonte de formação

para analistas e também em instrumento de transmissão. Mesmo

assim, ainda percebe a cidade isolada em relação a outros centros, o

que é um fator complicador da formação.

4.4 Centro de Estudos Psicanalíticos do Maranhão

O Centro de Estudos Psicanalíticos do Maranhão, outra instituição

de formação psicanalítica existente em São Luís, foi criado, em setembro

de 1997, por um grupo de pessoas que possuíam uma "mesma

transferência de trabalho" e que, por não encontrarem identificação com as

outras instituições psicanalíticas desta cidade, resolveram fundá-lo, de

acordo com suas compreensões do lacanismo. No momento (2000) é

composto por dezesseis membros.

O Centro é coordenado pelo psicanalista P8 que tem formação

acadêmica em Letras (1986) e em Filosofia (1990), ambas na Universidade

Federal do Maranhão. Começou a estudar Psicanálise em 1987 com a

finalidade, em princípio, de conhecer a teoria, mas com a análise pessoal

veio a descoberta do desejo de formação. Para ele a formação do analista é

contínua. A sua foi realizada no Centro de Estudos Freudianos do Recife

— uma formação sustentada por análise pessoal, teoria, supervisão clínica

e escrita.

Segundo o psicanalista, todas as atividades da Instituição são para os

membros, mas, restritas mesmo, só as de intercontrole e sessões clínicas,

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que considera importantes para a formação. A programação da Instituição

para a comunidade conta com grupos de estudos, seminários e um projeto

intitulado "Sexta-Analítica", realizado mensalmente, no qual a finalidade é

discutir com profissionais de outras áreas os significantes da cultura. O

objetivo dessas atividades para a comunidade é a transmissão e difusão da

Psicanálise. A transmissão da Psicanálise no Maranhão para ele é

[...] bastante curiosa, uma vez que formalmente a Psicanálise chegou

bem antes que a Psicologia. Por existirem várias instituições

nesta cidade é natural que essa transmissão não seja uniforme, pois

cada uma tem seu estilo próprio. O fato de São Luís ficar isolada

dificulta o contato com outros estilos, o que é lamentável, e a falta de

eventos interinstitucionais talvez justifique o pequeno público

que aqui temos.

O psicanalista P9 é membro dessa Instituição. Sua formação

acadêmica foi em Medicina pela Universidade Federal do Maranhão,

concluída em 1980, e especialização em Psiquiatria pela Universidade do

Estado do Rio de Janeiro em 1984. Começou a estudar Psicanálise no Rio

de Janeiro em 1980, e seu primeiro contato com essa área de conhecimento

foi através da teoria, que o deixou fascinado. Isto o levou a procurar a

análise pessoal, decorrente de seu interesse pela formação. É um dos

membros fundadores do Centro de Estudos Psicanalíticos do Maranhão.

A formação em Psicanálise, segundo P9, é permanente. As

atividades restritas aos membros são analisadas por ele como

fundamentais; participa, portanto, de todas, considerando-as um processo

de ajuda em sua formação psicanalítica. Existem várias programações para

a comunidade, entre elas os seminários, as jornadas, os fóruns, os

encontros anuais e a "Sexta-Analítica" referida anteriormente, com o

objetivo de disseminar a Psicanálise.

Seu processo de formação como analista foi iniciado no Rio de

Janeiro em 1981, depois participou por vários anos em São Luís da

instituição intitulada "Articulações em Psicanálise" (no período de 1984 a

1985). Suas supervisões ocorreram no Rio de Janeiro em 1981, em São

Luís em 1985 e em Recife em 1996, dando sempre continuidade a seu

projeto. Para ele, a transmissão da Psicanálise no Maranhão é difícil, por

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[...] faltarem muitas coisas, por ser esta cidade geograficamente

distante dos grandes centros, dificultando, assim, que as

pessoas tenham oportunidade de ver e observar outros estilos,

aprender com eles.

Considerando o número de escolas em São Luís, investigou-se sobre

os motivos que levaram a esse fato e se havia demanda para comportar

essas opções. Os entrevistados consideraram que não existia (e não existe)

uma demanda elevada da comunidade local. Aventaram como motivos do

número de escolas, a questão da orientação quanto à formação contínua e

ininterrupta, que caracteriza a sua prática, como também a análise pessoal

didática, considerada a pedra fundamental da formação para o psicanalista.

Ficou evidente, ainda, que isso ocorre pela própria história de dissidências

e/ou cisões comuns na Psicanálise, fruto de interesses das pessoas que dela

fazem parte e da identificação dessas pessoas com a proposta de cada

Escola, como uma forma de iniciação à "verdade" da Psicanálise de que

cada uma se propõe ser detentora. Foi afirmado, espontaneamente, por

membros de duas instituições, que há demanda elevada dos interessados

em delas fazer parte.

Pode-se encontrar nas palavras de Russo (1993, p. 102) a descrição

das consequências desta situação:

É interessante constatar que a 'reforma' lacaniana, com toda sua

crítica à institucionalização da psicanálise, signi f icou, na

verdade, uma proliferação de instituições que passam a disputar entre

si a legitimidade da transmissão do título de psicanalista [...].

O processo de difusão da Psicanálise em São Luís, iniciado na

década de 80, surgiu em meio a acontecimentos marcantes no país como o

regime militar, crises nas Sociedades "oficiais" de Psicanálise do Rio de

Janeiro, sempre o modelo hegemônico para o Brasil, e a inauguração do

espaço para diferentes e variadas formas de "verdadeiras" psicanálises,

uma reorientação no campo psicanalítico, promovida pelo lacanismo

(COIMBRA, 1995, p. 67-68).

A intenção no trabalho não foi esclarecer esses momentos, mas

conhecer como em pouco mais que uma década esse campo se estruturou e

se expandiu na cidade, possibilitando que um dos informantes pudesse

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declarar que "a Psicanálise formalmente chegou antes da Psicologia",

referindo-se ao fato de que, até aquele momento (1985), não havia sido

criado o curso de Psicologia no Maranhão, desconhecendo naturalmente as

práticas psicológicas pré-existentes em São Luís.

Observa-se que o universo de entrevistados, nesta etapa do estudo,

realizada no ano 2000, como já foi mencionado, constituiu-se de 9 (nove)

profissionais, sendo 6 (seis) psicólogos, 2 (dois) psiquiatras e 1 (um)

filósofo. Percebe-se que os psicólogos definiram seu interesse pelos

estudos psicanalíticos a partir do curso de Psicologia, tendo os demais

sentido necessidade de aprofundar conhecimentos anteriores, ou de buscar

formação para tornarem-se psicanalistas. De qualquer forma, todos

destacaram que, no momento de sua análise pessoal, houve a decisão pela

Psicanálise.

Como foi visto, a fala da entrevistada P1 chama a atenção para o

grande número de psicanalistas abrindo novos consultórios e escolas de

Psicanálise em São Luís. Essa observação vai ao encontro dos

questionamentos que se teve com relação ao número de escolas, embora se

tenha que admitir que os demais entrevistados justificaram tal fato pelas

cisões existentes e pelas concepções distintas que ocorrem ao final da

análise.

As Escolas foram fundadas no período de 1989 a 1997. O que se

pôde verificar é que as pessoas do primeiro grupo permaneceram algum

tempo juntas em uma Escola e, mais tarde, com as dissidências, foram

fundando outras instituições. Desse modo, o número de membros em cada

uma ficou reduzido no início, mas, aos poucos, ampliou-se, aparentemente

por sempre haver novas pessoas interessadas em fazer parte dessas

Instituições.

Pelo que se vê, essa procura é desencadeada pela falta de outras

opções de pós-graduação em São Luís. Observa-se que esse interesse pelas

"escolas de psicanálise" se intensificou, após a criação dos cursos de

Psicologia em São Luís, pois alguns alunos e ex-alunos do curso de

Psicologia da Universidade Federal do Maranhão (UFMA), e alunos do

Centro Universitário do Maranhão (UniCEUMA) deles participam, além

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de vários professores destes cursos serem membros das referidas Escolas.

Parece que as Escolas de Psicanálise, nesta cidade, se tornaram um espaço

de qualificação do profissional psicólogo, mais que simplesmente uma

especialização ou ampliação do conhecimento nessa abordagem.

No caso específico dos ex-alunos e alunos do curso de Psicologia da

UFMA, provavelmente esse interesse tenha surgido desde o início do curso, já

que 8 (oito) professores admitidos por concurso possuem formação psicanalítica, ou se

deva ao fato de, até o momento (2002) o curso ter condições de oferecer

estágio na área clínica somente na abordagem psicanalítica.

Uma queixa constante dos informantes se referiu ao distanciamento

dos grandes centros, o que dificulta a troca de informações e obriga alguns

deles a sempre se deslocarem, mesmo que por curto espaço de tempo, a fim de

manterem supervisão e realizarem trocas entre as escolas, a partir de

afinidades institucionais. Ficou evidente que a inviabilidade dessa troca

entre as Escolas locais ocorre por razões ligadas ao objetivo de cada uma,

embora a maioria das instituições seja de orientação lacaniana. Esse aspecto

pode ser mais bem entendido quando Russo (1993, p. 103) esclarece:

[...] As diversas instituições de formação lacanianas, apesar de

terem propostas aparentemente bastante semelhantes e usarem os mesmos

argumentos para justificá-las, não abrem mão de uma existência própria,

às vezes agindo como se fossem únicas [...].

Uma preocupação demonstrada pelos membros das Escolas foi em

relação à transmissão da Psicanálise no Maranhão. Consideraram

complexas e de difícil entendimento as questões que se encontram

implicadas nesse processo — transmissão. O que realmente se percebeu —

e foi ressaltado na fala dos informantes — é que a transmissão é

caracterizada pela proposta apresentada por cada Escola, pois, como

afirmaram, apresentam diferentes estilos, de acordo com o modo como

sustentam a Psicanálise -suas posições e conceitos, exigindo de quem está

buscando a formação muita dedicação e determinação, entre outras

qualidades. No entanto, o ponto comum dessas declarações foi o

distanciamento entre a cidade de São Luís e as demais capitais, como um

fator complicador da viabilidade desse processo de transmissão. Entende-

se que isso talvez se deva ao fato de que, de certo modo, a Psicanálise

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esteja constantemente sendo discutida em relação à formação de novos

adeptos. Como diz Russo (1993, p. 90):

[...] A transmissão do conhecimento psicanalítico, portanto, não pode ser feita da

mesma forma que outros tipos de conhecimento (através de aulas, cursos

convencionais, um determinado currículo ou mesmo [...] através de uma

linguagem convencional).

Vale ressaltar ainda que o espaço de transmissão, definido pela

maioria dos informantes, se constitui através das atividades desenvolvidas

para a comunidade, cujos objetivos foram descritos como transferência de

trabalho, produção e formação dos membros, disseminação do saber,

circulação da produção aos interessados e aos que buscam conhecimentos

teóricos sobre a Psicanálise.

Assim, pelo que se pôde captar das entrevistas, constatou-se que o

percurso da Psicanálise em São Luís encontra-se em expansão. No entanto,

esta abordagem, apesar de todo o empenho de seus seguidores, encontra-se

num plano que possibilita a apropriação por atores diversos,

desrespeitando requisitos essenciais de sua teoria e prática, banalizando

essa área, como observa Roudinesco (2000, p. 3). Em síntese, pode-se

dizer que, devido à inexistência de outras abordagens em São Luís, ela

assume papel hegemônico, hierarquizando a formação "psi", passando a

impressão de uma grande distinção entre o graduado em Psicologia e o

psicanalista, sendo este último sempre referido como ocupante de uma

"classe" mais elevada.

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CAPÍTULO V

OS CURSOS DE PSICOLOGIA NO MARANHÃO

Aonde, afinal, pode ir se formando um psicólogo? (e digo 'ir se formando' porque nunca estaremos completamente formados). Na universidade, em parte. Nas instituições de ensino e formação especializadas, também em parte. Em práticas supervisionadas, em grande parte. Mas também, e indispensavelmente, num contato amplo e variado com a boa literatura, com as obras de arte, com a meditação filosófica, com os estudos históricos e antropológicos, de um lado, e, de outro, no acompanhamento, mesmo que à distância, do rico campo dos estudos psicobiológicos e etológicos. Realmente, uma tarefa interminável e para toda uma vida, mas sem dúvida, uma vida muito interessante e sempre em movimento.

Luís Cláudio M. Figueiredo, 1995

A década de 90 marca a entrada, no Maranhão, dos cursos de

Psicologia. A chegada desses cursos resultou em um maior conhecimento a

respeito dessa ciência e do profissional psicólogo, que já estava inserido

em alguns campos da sociedade maranhense, mas que ainda necessitava

buscar sua formação e outros Estados. Nesse sentido, considera-se

necessário situar a realidade da Psicologia brasileira durante esse período.

Para tanto, recorre-se a Bock (1999b, p. 126-127) que caracterizou a

década de 90 como importante para a sistematização da diversidade

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construída na década de 80, quando os psicólogos refletiram e construíram

novas ideias.

A categoria que, anteriormente, almejava uma identidade para o

psicólogo, deu lugar, na década de 90, à preocupação com a imagem da

Psicologia e do psicólogo junto à população. Segundo Bock (1999b, p.

127): "[...] Em 1990, vamos nos deparar com mais certezas e posições. Se

a década de 80 levantou questões, a década de 90 parece se propor a

respondê-las". Para isso, ainda segundo a autora, os congressos, as

publicações e a realização sistemática de pesquisas sobre a categoria no

Brasil tiveram papel importante na discussão de questões relativas à

profissão e à própria ciência. Assim sendo, essa década obteve alguns

resultados para suas reivindicações, entre eles: o psicólogo começou a ser

visto como profissional da saúde; a profissão se aproximou dos contextos

sociais; houve aumento do número de profissionais em outros campos de

trabalho, não tradicionais, o que levou à necessidade de rever a formação

tradicional dos psicólogos.

Com relação a essa revisão, uma importante contribuição foi a

elaboração, em 1995, de um documento pela Comissão de Especialistas de

Ensino de Psicologia — MEC/SESu, intitulado "A formação em Psicologia

- contribuições para estruturações curriculares e avaliação dos cursos", cuja

proposta enfatiza pontos considerados importantes, que ainda os cursos

tentam introduzir em seus currículos, quais sejam:

I. [...] formação básica pluralista e sólida;

II.[...] formação generalista;

III.[...] formação interdisciplinar;

IV. preparação do psicólogo para uma atuação multidisciplinar;

V. certeza de uma formação científica, crítica, reflexiva;

VI. permissão para uma efetiva integração teoria-prática;

VII. compromisso com o a tendimento das demandas

sociais;

VIII. compromisso ético, que deve permear todo o currículo;

IX. rompimento do modelo de atuação 'tecnicista';

X. especificação das “terminalidades” dos cursos de Psicologia

(BOCK, 1999b, p. 154).

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Esses pontos chamaram a atenção, pois alguns deles fazem parte da

nova proposta enviada pelo Fórum de Entidades Nacionais às

universidades brasileiras neste ano (2002), demonstrando com isso que há

uma necessidade de alterar a estrutura curricular de modo que não se

restrinja apenas à inclusão e exclusão de disciplinas, mas que resulte de

mudanças no sentido de ampliar a qualidade da formação do profissional,

comprometida com as necessidades sociais, pautada em princípios éticos,

técnicos e científicos.

Branco (1998, p. 30) salienta que a sociedade brasileira apresenta

características sobre as quais o futuro profissional deve refletir,

considerando o campo de atuação, a atividade exercida e a instituição

responsável por essa formação. Esse pensamento é reforçado pela autora

quando afirma que

[...] novas possibilidades de atuação têm sido criadas,

buscando responder a outros tipos de demanda anteriormente

negadas [...] Na medida se rompe com as amarras da demanda

tradicional, o espaço de atuação do psicólogo se amplia, novos empregos

se abrem e o profissional necessita de uma visão de totalidade,

capacidade de refazer a prática e não simplesmente trajá-la com novas

cores recobrindo um mesmo conteúdo.

Uma abordagem sobre a criação dos cursos de Psicologia no Estado

se faz então necessária para o conhecimento do processo de sua

constituição, suas reformulações e seu reconhecimento oficial, sempre

lembrando que sua criação ocorre nessa época de uma nova proposta a respeito da

Formação de Psicólogo. Para tanto, além da análise documental, foram

realizadas 12 (doze) entrevistas com professores do Departamento de

Psicologia da Universidade Federal do Maranhão, incluindo-se os

aposentados, os que pediram para sair, os que estão em exercício e 5

(cinco) professores do Centro Universitário do Maranhão, aqui

identificados por terem autorizado a citação de seus nomes.

No Maranhão, até o ano 2000, o ensino superior é ministrado por 8

(oito) estabelecimentos de ensino, sendo 2 (duas) instituições públicas

federais (Universidade Federal do Maranhão e Centro Federal de Educação

Tecnológica do Maranhão), 1 (uma) instituição pública estadual

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(Universidade Estadual do Maranhão) e 5 (cinco) particulares (Faculdade Santa

Terezinha; Faculdade Santa Fé; Centro Universitário do Maranhão; Faculdade

Atenas Maranhense e a Faculdade São Luís). Embora existindo essas

instituições, o curso de Psicologia é oferecido pela Universidade Federal

do Maranhão (UFMA) e pelo Centro Universitário do Maranhão

(UniCEUMA), razão pela qual somente a trajetória destas duas é aqui

apresentada.

5.1 Sobre a Universidade Federal do Maranhão

O percurso do ensino superior no Maranhão iniciou, como foi regra

em todo o Brasil, com Escolas Superiores Isoladas. Assim, em 1908 a elite

intelectual da época, representada por Antônio Lobo, Fran Paxeco e

Domingos de Castro Perdigão, na tentativa de preservar a tradição de

"Atenas Brasileira" para São Luís, idealizou a criação das instituições de

ensino superior, optando por primeiro criar uma Faculdade de Direito.

Entretanto, isto não foi viabilizado.

Somente em 1916 o literato Domingos de Castro Perdigão retomou a

ideia. Para tanto, foi formada uma comissão composta pelos intelectuais acima

citados, mais Antônio Lopes, Alfredo de Assis e José de Almeida Nunes.

Finalmente, em 28 de abril de 1918, em Assembleia realizada na

Biblioteca Pública do Estado do Maranhão, foi criada a Faculdade de

Direito, ocasião em que foi homologado o Estatuto e iniciada a elaboração

do Regimento Interno da Faculdade, os quais foram aprovados em 20 de maio de

1918, sendo no dia 1° de julho de 1918 realizada a sessão inaugural, no Teatro

Arthur Azevedo, das aulas do curso Jurídico e Social23.

A segunda instituição de ensino superior foi a Escola de Farmácia,

fundada no dia 03 de maio de 1922, oriunda de movimento de contestação

liderado pelos médicos Luís Viana e Cesário Veras, contra o apoio legal

23 O pesquisador prof. Ramiro Corrêa Azevedo diz, diferentemente, que o primeiro curso

universitário coube à área biomédica, em 1911, com a fundação da Escola de

Enfermagem, pioneira do ensino universitário no Maranhão. Cf. AZEVEDO, R. C. Breve

histórico sobre as instituições de 3° grau no Maranhão. CEUMA Perspectivas, São Luís, ano 4,

v.5, out. 2000.

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fornecido pelo Estado do Maranhão aos farmacêuticos práticos para o

exercício de atividades, tendo em vista a inexistência de profissionais

diplomados naquela época. Tal mobilização visou atender, também, às

exigências legais da União que impedia a abertura e direção de farmácias

por profissionais não habilitados.

Em 1925, por iniciativa também do Dr. Luis Viana, juntamente com

a direção da Escola de Farmácia, tentando suprir a falta de cirurgiões-

dentistas diplomados e, assim, atender ás necessidades do Estado, foi

criado o curso de Odontologia, passando então a instituição a ser

denominada Faculdade de Farmácia e Odontologia que funcionou no

mesmo prédio e assim permaneceu até o ano de 2001.

No ano de 1929, através da imprensa do Estado, com os artigos do

jornalista Paulo Kruger de Oliveira, foi lançada a ideia da criação de uma

Faculdade/Escola de Medicina, composta por professores e médicos. A

comissão liderada pelo farmacêutico Silveira Teixeira ficou encarregada de

tomar as providências necessárias para sua implantação, inclusive de obter

suportes financeiros para que fosse criada. Mesmo com o empenho de

todos, divulgada sua criação e escolhido o diretor em 1930, a Faculdade

não funcionou.

Devido às intervenções que ocorreram no Estado, no período

compreendido entre 1930 e 1931, o ensino superior entra em declínio.

Somente no ano de 1933 instalou-se novo movimento de continuidade do

ensino superior, com a criação da Faculdade de Agronomia que, depois de

reconhecida pelo Estado do Maranhão como entidade de utilidade pública,

só funcionou até o ano de 1938, tendo em vista a falta de reconhecimento

pela União.

Em 1941, após crises políticas e intervenções federais no Maranhão,

as Faculdades de Direito e de Farmácia e Odontologia foram fechadas pelo

Departamento Nacional de Ensino, que constatou irregularidades em suas

estruturas de funcionamento relativas às suas instalações e ao exame

vestibular. Em 1944, o Interventor Federal Dr. Paulo Martins de Sousa

Ramos criou a Fundação Paulo Ramos, com fim estatutário de manter o

ensino superior no Estado. Dessa forma, as Faculdades citadas foram

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instituídas e autorizadas a funcionar pelos Decretos n° 17.558/45 e

17.553/45, respectivamente (BUZAR, 1985, p. 12).

No decorrer dos anos de 1948 a 1949, por iniciativa das Irmãs

Terceiras Capuchinhas e de um grupo de médicos, considerando-se a

precariedade da saúde pública no Maranhão, foi fundada a Escola de

Enfermagem São Francisco de Assis, reconhecida oficialmente pelo

Decreto Federal n° 30.628, de 11 de março de 1952.

Com a federalização das Faculdades de Direito, Farmácia e

Odontologia, que deixam assim de ser escolas superiores de natureza

particular, transformando-se em órgãos da Administração Pública, a

Fundação Paulo Ramos foi extinta. Desse acontecimento surgiu a idéia -

articulada pelos professores das Faculdades acima e membros da

Academia Maranhense de Letras, juntamente com o recém-chegado

Arcebispo D. Adalberto A. Sobral — de criar-se a Faculdade de Filosofia,

fato ocorrido em 15 de agosto de 1952.

Em abril de 1953 foram autorizados a funcionar quatro cursos em

nível de Bacharelado: Filosofia, Letras Neolatinas, Geografia e História e

Pedagogia, com a finalidade de preparar futuros professores para o ensino

médio. Nesse mesmo ano foi criada a Escola Maranhense de Serviço

Social — mantida pela Sociedade Feminina de Instituição e Caridade e

reconhecida pelo Estado em 1954 e pelo Ministério de Educação e Cultura

em 1956 — cujo objetivo era disseminar a educação social e elevar o

índice de cultura no Maranhão.

Como a educação superior estava avançando e objetivando estimular

seu crescimento, o arcebispo metropolitano D. Delgado fundou, em 1956,

a Sociedade Maranhense de Cultura Superior (SOMACS), com a

finalidade de promover o desenvolvimento da cultura e instituir a

Universidade Católica do Maranhão (BUZAR, 1985, p. 16).

Segundo Buzar (1985, p. 17), nessa época para instituir e manter

uma Universidade era necessário criar mais duas Faculdades no Estado,

exigência da legislação federal. Assim, D. Delgado fundou, em 20 de

janeiro de 1957, com o apoio do Presidente Juscelino Kubitschek, a

Faculdade de Ciências Médicas do Maranhão, autorizada a funcionar pelo

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Decreto n° 43.941 de 3 de julho de 1958. Ainda julho de 1958, o professor

Waldemar Carvalho idealizou a criação da Faculdade de Ciências

Econômicas nos Estados do Maranhão e Piauí, para cujo propósito

encaminhou ao Ministério de Educação e Cultura, por duas vezes,

solicitação para a autorização e funcionamento, os quais foram negados,

tendo como principal justificativa a falta de qualificação dos professores.

Somente em abril de 1965, no Governo de Castelo Branco, a autorização

foi concedida.

A criação da Universidade Católica se deu pela reunião das

Faculdades de Filosofia, Ciências Médicas e Serviço Social, e da Escola de

Enfermagem, e seu reconhecimento como Universidade Livre pela União,

pelo Decreto n° 50.832 de 22 de junho de 1961. À Universidade Católica

foram integrados órgãos suplementares, entre eles a Rádio Educadora do

Maranhão Rural Limitada. A esse tempo também foi criada a Faculdade

Católica de Direito, tendo sido escolhido nesse mesmo ano como Diretor

da Instituição o professor Antenor Bogéa, que não chegou a assumir o

cargo, em razão de o Ministério não ter considerado necessária a criação de

mais uma instituição de Direito em São Luís, que já contava com uma

funcionando.

A Universidade Católica existiu durante 6 (seis) anos, enfrentando

graves dificuldades financeiras, fato que chegou ao conhecimento do

Ministério da Educação e Cultura, que propôs como alternativa sua doação

à União, na tentativa de solucionar o problema. Tájra (1985, p. 27)

esclarece:

Esta proposta foi formalizada em memorial apresentado ao Ministério da

Educação e Cultura, pelo Reitor da Universidade Católica, D. Antônio

Batista Fragoso, e resultou na Lei n° 5.152 de 21 de outubro de 1966 que

autorizou o poder executivo a instituir a Fundação Universidade do

Maranhão, entidade de direito público, que tem a finalidade de implantar,

progressivamente, a nova Universidade no Maranhão e declarou, através do

seu Art. 4°, extinta a Universidade Católica do Maranhão [...].

Na nova instituição de ensino, a Fundação Universidade do

Maranhão (FUM), foram inicialmente integradas as Faculdades de Direito,

Farmácia e Odontologia, Filosofia, Ciências e Letras, Serviço Social,

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Ciências Médicas, e a Escola de Enfermagem. Tendo autonomia didática,

administrativa, financeira e disciplinar, conferida por Lei, a FUM elaborou

seu Estatuto que, depois de homologado pelo Conselho Federal de

Educação, em 1967, instituiu o Conselho Diretor, nomeado pelo Presidente

da República, tendo sido seu primeiro Reitor o professor Pedro Neiva de

Santana.

A Fundação logo em seu primeiro ano de funcionamento passou por

sérias dificuldades financeiras e problemas de ordem legal, que

ocasionaram, em outubro de 1968, a renúncia do Reitor Pedro Neiva de

Santana e do Vice-Reitor Administrativo, o professor Mário Martins

Meireles. Desse modo, assumiu interinamente a Reitoria da Universidade o

Vice-Reitor Pedagógico, Cônego José de Ribamar Carvalho. Nesse mesmo

ano, o Governo Federal estabeleceu as novas Bases e Diretrizes para a

Educação Superior Brasileira — a chamada Reforma Universitária de 1968

— e o Reitor planejou obter, através da Reforma, a implantação da

Universidade Federal do Maranhão (UFMA).

Segundo Buzar (1985, p.29), uma das primeiras medidas adotadas

pelo Reitor na política de implantação da nova instituição foi a reforma

estatutária, no sentido de atender às mudanças decorrentes da nova

legislação do ensino superior, começando em janeiro de 1970 a organizar

sua estrutura administrativa24.

Para substituir o Reitor, Cônego José de Ribamar Carvalho, foi

nomeado, em 1972, o professor Josué de Sousa Montello como Reitor pro-

tempore, tendo sido substituído, interinamente, no ano de 1973, pelo então

Vice-Reitor professor Manoel Soares Estrela, que permaneceu nessa

condição até 1975, época em que foram criados os cursos de Engenharia

Elétrica e o de Eletrônica. Nesse mesmo ano um novo Reitor tomou posse,

desta vez o professor José de Maria Ramos Martins. Mesmo com as

mudanças ocorridas na Reitoria, continuou o plano de implantação da

Reforma Universitária. Em julho de 1979 o Reitor deixa o cargo e a Vice-

Reitora em exercício, professora Maria de Lourdes Portela Nunes, assume

interinamente a Reitoria da Universidade, transmitindo o cargo de Reitor,

24 Para uma visão mais ampla, cf. o item 5.1.1.

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ainda nesse ano, ao professor José Maria Cabral Marques, que continuou a

ação desenvolvimentista iniciada pelos seus antecessores, permanecendo

no cargo durante nove anos, até 1988.

Em 1988, assumiu o lugar de Reitor o professor Jerônimo Pinheiro,

eleito por consulta à comunidade acadêmica e nomeado pelo Presidente da

República, após apreciação da lista sêxtupla enviada pelo Conselho

Universitário, permanecendo no cargo até 1992. Durante a sua gestão,

quando da realização da VII Semana de Psicologia, ele assumiu

publicamente o compromisso de criar o curso de Psicologia, que começou

a funcionar em 199125. Em 1992, o oitavo Reitor é empossado — professor

Aldy Mello de Araújo. E em 1996 assumiu a Reitoria o professor Othon de

Carvalho Bastos cujo primeiro mandato ocorreu até outubro de 2000.

Nesse mesmo ano foi reconduzido ao cargo por mais quatro anos, até

2004.

Conforme observa Tájra (1985, p. 37),

[...] o aparecimento do ensino superior no Maranhão, devido

a aspectos peculiares do Estado apresenta características

um pouco diversificadas daquelas que compõem o perfil

de outras universidades brasileiras [...] na medida em

que a vida intelectual era organizada como parte de

uma situação colonial de dependência cultural.

Neste retrospecto da história da Universidade, com a história da

Psicologia no Maranhão como objeto de estudo deste trabalho, torna-se

necessária uma incursão pela Faculdade de Filosofia, através da qual

alguns cursos foram autorizados a funcionar, entre eles o de Pedagogia,

cuja regulamentação ocorreu em 1939, através do Decreto-Lei nº 1.190,

em nível nacional, para somente 14 (quatorze) anos depois (1953) ser

regulamentado no Maranhão.

Com o objetivo de formar bacharéis e licenciados para as áreas de

conteúdo e para o setor pedagógico, o curso foi estruturado sob a

25 Cf. item 5.1.2.

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configuração do Esquema 3+1. Desse modo, o Bacharelado em Pedagogia,

com duração de 3 (três) anos, habilitava o concludente como técnico em

educação enquanto a Licenciatura em Pedagogia, com mais 1 (um) ano de

estudos sobre Didática, habilitava seu portador como professor para o

magistério de nível médio (BUZAR, 1985, p. 43).

Com a criação da Faculdade de Educação (FACED), em 1971, e a

necessidade subsequente de atender a outras habilitações, ocorreu nesse

mesmo ano a reformulação da estrutura curricular, que passou a conter não

só disciplinas obrigatórias para o 1° Ciclo, entre elas Introdução à

Psicologia, mas também, para o Núcleo Comum, a disciplina Psicologia

Educacional I, II, III e IV.

Ressalta-se a importância do curso de Pedagogia na história dos

cursos de Psicologia, visto que, ao longo de sua existência, esse curso

priorizou a disciplina Psicologia em sua estrutura curricular, em nível local

ou nacional.

Clara referência sobre essa relação é encontrada em Bock (1999a, p.

319), ao dizer:

[...] A educação foi vista como a grande responsável pelo

desenvolvimento da sociedade. A relação Pedagogia-

estudos psicológicos será, então, altamente reforçada. A

Psicologia permitia que a Ed ucação fo sse pensada a p ar t i r

d e b ases científicas.

A Universidade Federal do Maranhão está estruturada em Órgãos

Deliberativos, constituídos de Colegiados Superiores, Colegiados

Acadêmicos e Órgãos Executivos, que, por sua vez, são compostos de

Órgãos Executivos Centrais, Auxiliares e Acadêmicos. O espaço físico da

Universidade está composto pelo Campus Universitário do Bacanga, que

recebeu essa denominação por estar localizado à margem esquerda do Rio

Bacanga, situado à oeste da Ilha de São Luís. Construído na década de 70,

abrigou gradativamente os cursos que se situavam fragmentariamente no

centro da cidade. No momento (2002), somente 2 (dois) cursos e parte da

Administração Superior ainda não se encontram incorporados a essa

estrutura. Conta também com campi avançados no Estado nos municípios

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de Codó e Imperatriz, atendendo somente a alguns cursos da área de

Ciências Sociais.

De acordo com o Sistema de Informações da UFMA (SIUFMA-

2001), a Universidade possui 31 (trinta e um) cursos de graduação nas

áreas de Saúde, Tecnológica, Humanas e Sociais, atendendo a 10.360

alunos, e oferece Pós-Graduação lato-sensu em várias especialidades e

stricto-sensu — mestrado e doutorado — em algumas áreas do

conhecimento. Na tentativa de qualificar seu corpo docente com maior

rapidez, a Universidade tem buscado convênios em programas alternativos

de qualificação criados pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal

de Nível Superior (CAPES), na modalidade Interinstitucional (MINTER) e

depois na do Programa de Qualificação Institucional (PQI).

5.1.1 Departamento de Psicologia da Universidade Federal do Maranhão

A Reforma Universitária de 1968 foi desencadeada por uma

campanha nacional de reivindicações e críticas à estrutura da Universidade

brasileira promovida pelos estudantes universitários. Tal medida provocou

uma reviravolta não só no ambiente universitário, mas também no meio

político. Nesse clima, Coimbra (1995, p. 116) afirma:

A Reforma Universitária é feita de forma autoritária, impositiva e

antidemocrática, sem nenhuma p a r t i c i p a ç ã o d a

c h a m a d a “ c o m u n i d a d e ” universitária [...] Seu principal

objetivo é diminuir e mesmo impedir a pressão exercida pela

classe média para ascender socialmente via Universidade. Tal fato,

caracterizado como “crise universitária”, agrava-se ainda mais pela

pressão estudantil que atinge seu auge em 1968 [...].

Em suas reivindicações, buscavam os estudantes, principalmente,

dotar os estabelecimentos de ensino superior de autonomia administrativa e

financeira, extinguir a cátedra vitalícia e garantir a participação estudantil

na administração da Universidade. Isso ocasionou a criação de grupos de

trabalho para estudar a proposta de implantação da Reforma Universitária.

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Ao lado desse fato, o Conselho Federal de Educação, no período

compreendido entre 1962 e 1963, estudou a reformulação do currículo

mínimo e a carga horária dos cursos superiores. A proposta não foi aceita

por todas as instituições de ensino superior, à época, por não advir de um

decreto presidencial.

No mesmo período, também foram criados, na Universidade do

Brasil, grupos de trabalho com a finalidade de estudar a proposta de

diretrizes para a Reforma Universitária e ainda de elaborar um Regimento

Analítico da Universidade Brasileira (BUZAR, 1985, p. 27).

A partir dessas inúmeras pressões, e ao ensejo de aspectos das

reivindicações que iam ao encontro de interesses dessa Instituição e do

regime militar, novos desdobramentos foram surgindo, complementando o

estudo inicial sobre a Reforma Universitária, concretizada finalmente na

Lei n° 5.540/68. Um relatório foi apresentado destacando-se os pontos

considerados essenciais que implicaram em mudanças estruturais na vida

acadêmica, como a criação de estruturas orgânicas e flexíveis; a unificação

do concurso vestibular; a adoção do sistema de créditos; a integração e

participação dos estudantes na universidade; a dissolução da cátedra e a

departamentalização; a estrutura do ensino básico e do profissionalizante;

os dois níveis de pós-graduação (mestrado e doutorado); a organização das

universidades sob a forma de autarquia, fundação ou associação, sendo

assegurada a autonomia universitária em qualquer um dos regimes adotados,

entre outras mudanças (BUZAR, 1985, p. 28-29).

A Universidade Federal do Maranhão praticamente nasceu (1966) e

cresceu com a Reforma Universitária. Em novembro de 1968, ao assumir a

Reitoria, o Cônego José de Ribamar Carvalho se comprometeu em

implantá-la, iniciando-a experimentalmente em 1969. Para tanto, foram

realizadas as reformulações pertinentes, 'aprovadas pelos Decretos n°

67.047 e 67.048 de 13 de agosto de 1970, respectivamente o novo Projeto

do Estatuto da Fundação e o Anteprojeto do Estatuto da Universidade

(TMRA, 1985, p. 28).

Assim, em consonância com as diretrizes nacionais e a infraestrutura

adotada pela Universidade, o Reitor começou nesse mesmo ano a

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implantação progressiva da nova estrutura administrativa em observância

aos princípios e normas da Reforma Universitária, pela qual os Institutos e

Faculdades isoladas passaram a funcionar.

A nova concepção acadêmica ficou estruturada em Unidades

compostas por Institutos e Faculdades que se subdividiram em

Departamentos assim distribuídos:

o Ins t i tuto de Ciências Fís icas e Naturais , com

os Departamentos de Química, Morfologia,

Parasitologia, Matemática e Física e Ciências Fisiológicas;

o Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, constituído

pelos Departamentos de Filosofia, Psicologia, Sociologia,

Geografia e História;

o Instituto de Letras e Artes, composto pelos Departamentos

de Estudos Luso-Brasileiros, Letras, Artes e Comunicações;

a Faculdade de Farmácia, com os Departamentos de

Farmácia e Pesquisas Clínicas e Tecnologia Farmacêutica;

a Faculdade de Odontologia, formada pelos Departamentos de

Dentística e Clínica, Odontologia Preventiva, Prótese e

Cirurgia Oral;

a Faculdade de Ciências Médicas, que deu origem aos

Departamentos de Cirurgia, Medicina, Patologia,

Neuropsiquiatria, Obstetrícia e Ginecologia, Higiene e

Medicina Legal e Pediatria;

a Faculdade de Enfermagem, com os Departamentos de

Enfermagem e de Enfermagem Clínica;

a Faculdade de Direito, formada pelos Departamentos de

Direito Jurídico e Propedêutico, Direito Privado, Direito Público e

Processo;

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a Faculdade de Serv iço Socia l , ins t i tu ída com

os Departamentos de Teoria e Fundamentação e

Metodologia e Aplicação;

a Faculdade de Ciências Econômicas, constituída pelos

De par t a me n to s d e Ec on o mia , Co n ta b i l i da de e

Administração;

a Faculdade de Educação, com os Departamentos de

Administração e Planejamento e Métodos e Técnicas.

A ideia central era que os Departamentos fossem agrupados

conforme as áreas de conhecimento. Para tanto, três grandes Centros foram

criados: a Área de Estudos Gerais, abrangendo os Institutos de Ciências

Físicas e Naturais, Filosofia e Ciências Humanas e Letras e Artes; a Área

Médica, compreendendo as Faculdades de Farmácia, Enfermagem,

Odontologia e Medicina; e a Área de Estudos Aplicados, integrada pelas

Faculdades de Direito, Serviço Social, Ciências Econômicas e Educação.

A esse respeito, Tájra (1985, p. 32) diz:

Esses Centros tinham como principal finalidade coordenar didática e

cientificamente as Unidades, agrupadas por áreas específicas de

conhecimento, e, brevemente, com a extinção dos institutos e Faculdades

coordenariam diretamente os Departamentos referentes à sua área de

ação, integrando, assim, o ensino dos diversos cursos o que eliminava

a duplicação dos meios para fins idênticos ou equivalentes, objetivo

fundamental da Reforma Universitária.

A criação dos Departamentos na Universidade visou substituir as

cátedras que, pela sua rigidez, impediam a integração do ensino e

dificultavam a formação de equipes interdisciplinares das quais dependia a

qualidade didático-pedagógica das atividades desenvolvidas (TÁJRA,

1985, p. 31).

A adoção dessas medidas foi fundamental na estrutura da

Universidade, pois lhe deu poder de assumir formas diferentes, de acordo

com as necessidades apresentadas por cada curso, especialmente pela

inclusão de novas disciplinas oferecidas, e, em alguns casos, pela criação

de outros Departamentos.

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Conforme constatado, esses Departamentos foram criados como

parte integrante dos Institutos e Faculdades existentes. Cabe ressaltar a

inclusão do Departamento de Psicologia (1970), sem ainda haver sido

criado o curso de Psicologia, no Instituto de Filosofia e Ciências Humanas.

De acordo com os docentes desse período, quando ocorreu a

transformação da Universidade Católica em Fundação Universidade do

Maranhão, as Faculdades que existiam foram agrupadas e os professores

que ministravam disciplinas de Psicologia passaram a compor o

Departamento de Psicologia, pequeníssimo, com 5 (cinco) docentes. Esse

corpo docente se constituía de professores já contratados pela Instituição,

com exercício em outros Departamentos, Licenciados em Filosofia e

Pedagogia.

Uma situação bastante desconfortável existiu durante muitos anos

em relação ao próprio espaço físico, deixando os professores insatisfeitos.

A professora Terezinha Godinho, que participou de todo o processo de

departamentalização de onde se originou o Departamento de Psicologia da

Universidade Federal do Maranhão e esteve na chefia desse órgão durante

dezessete anos, recorda:

[...] não tínhamos um paradeiro fixo, a cada necessidade

solicitada cedíamos o espaço e éramos alocados em outro

prédio, não tínhamos espaço disponível, só existia a sala da chefia e

uma sa la de p ro fessores o nde rea l izávamos a s

A s s e mb l e i a s . O ú n i c o e s p a ç o c o m q u e o Departamento

contava era uma sala no prédio da área tecnológica, junto ao curso

de Engenharia Elétrica, onde ficava montado, precariamente, o

Laboratório de Psicologia Experimental.

O Departamento também passava, àquela época, por situações

difíceis em relação ao quadro docente. Nesse sentido, Terezinha Godinho

comenta:

Com a obrigatoriedade da disciplina Psicologia em quase todos os

cursos da UFMA, o Departamento realizou o primeiro concurso público

em 1970, para a admissão de docentes, visando atender a

demanda solicitada, que ficava Cada vez mais difícil devido aos cursos

que eram criados e/ou a inclusão de mais disciplinas de Psicologia em

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seus currículos [...] [Depois disso] o curso de Pedagogia, em 1972, a

partir de um parecer do Conselho Federal de Educação,

resolveu retirar os professores e as disciplinas de Psicologia da

Educação e Psicologia Educacional que faziam parte do Departamento

de Psicologia, para compor o Departamento de Educação —

situação que persiste. Perdemos assim quatro professores.

Solicitamos, então, que o Conselho de Centro se manifestasse quanto

a esse procedimento e a resposta foi que era possível, pois já havia

precedente numa outra universidade brasileira, ficando, desse modo,

os docentes divididos em dois Departamentos.

A partir daí o Departamento de Psicologia ficou sem o número de

professores suficientes para funcionar. A grande consequência desse fato

foi a fusão com o Departamento de Biologia, fusão que sempre chamou

muita atenção pela própria denominação — Departamento de Psicologia e

Biologia —, o que em nenhum momento dificultou a convivência pessoal,

mas, sim, a administrativa. Considerando esse fato, Terezinha Godinho

esclarece:

Havia a determinação de que deveria existir um número

mínimo de professores para que um Departamento fosse

constituído [...] [Desse modo] ficou resolvido que os docentes da

Psicologia e da Biologia seriam agrupados sob a denominação de

Departamento de Psicologia e Biologia, embora não houvesse

afinidade entre as duas áreas.

A fusão dos Departamentos só foi operacionalizada em 23 de maio

de 1979, apesar de a determinação ter acontecido em 24 de agosto de 1977,

em razão da Portaria nº 471/79-GR (Gabinete do Reitor), que transferiu os

professores de Biologia do Departamento de Ciências Morfológicas e

Fisiológicas para o Departamento de Psicologia, justificada pela

Administração Superior, daquela época, como um ato necessário em

virtude de os dois Departamentos não possuírem número legal para existir.

Apesar dessa fusão legal, na prática os dois Departamentos

continuaram funcionando isoladamente. Na realidade, os professores e

pesquisadores oriundos do Departamento de Biologia tinham um

funcionamento autônomo, no Laboratório de Hidrobiologia (Labohidro).

Portanto, embora de forma precária, possuíam espaço físico e instalações

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destinadas para suas atividades, localizado fora do Campus Universitário

do Bacanga, distante do Departamento de Psicologia. Além disso, elegiam

seu próprio Diretor. Somente quando necessitavam do aparato

administrativo é que solicitavam apoio do Departamento de Psicologia. A

aproximação era pouca, acontecia quinzenalmente quando eram realizadas

as Assembleias, em que todos se faziam presentes, relatando as atividades

desenvolvidas e as comunicações de praxe.

O estudo da proposta para o desmembramento dos Departamentos

foi iniciado em janeiro de 1981, considerando-se as seguintes

características: a) formação profissional e interesses acadêmicos

acentuadamente distintos — enquanto os professores de Psicologia

desenvolviam atividades didáticas, os de Biologia, em sua maioria,

dedicavam-se às atividades de pesquisa no Labohidro —; b) a limitação de

verbas que muitas vezes impedia o atendimento das reivindicações dos

dois Departamentos; c) a dificuldade de acompanhamento, pelo

Departamento, dos professores de Biologia, pelo fato de terem exercício

distante do Campus Universitário; d) o número de docentes nesse período

(Departamento de Psicologia e Biologia contava com 26 (vinte e seis)

docentes, sendo 14 (quatorze) professores de Psicologia e 12 (doze) de

Biologia); e) a determinação do Reitor José Maria Cabral Marques de criar

o curso de Biologia.

O desdobramento foi aprovado em 29 de novembro de 1982, através

da Resolução n° 11/82-CONSUN (Conselho Universitário), vinculando o

Departamento de Biologia ao Centro de Ciências da Saúde.

Mesmo com todos esses entraves, o Departamento de Psicologia, ao

longo do tempo — três décadas —, veio se preparando para a criação do

curso de Psicologia que, como foi mencionado anteriormente, era um

anseio dos professores e da comunidade ludovicense26.

Especificamente, o interesse emergiu da vivência que se teve e se

continua tendo nesse Departamento. Assim, considera-se importante poder

rever e compartilhar sentimentos e dificuldades em relação àquele

26 Termo designativo dos nascidos em São Luís.

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cotidiano de trabalho. Acredita-se também ser necessário resgatar a

história do Departamento de Psicologia como um local onde se configurou

a emergência do curso de Psicologia. Desse modo, entrevistaram-se

professores daquela época com a intenção de complementar as lembranças

guardadas desse processo com a memória dos demais integrantes do

Departamento.

Os profissionais — não psicólogos, mas com titulação e contrato

para o exercício da docência em disciplinas de Psicologia em quase todos

os cursos de graduação da UFMA — tinham o propósito de criar o curso

de Psicologia, embora ainda sentissem necessidade de conhecimentos mais

aprofundados de natureza psicológica. Contudo, devido à escassez de

recursos financeiros e a distância geográfica em relação a outros centros,

dificultando o acesso às informações e conhecimentos específicos da área,

o Departamento resolveu qualificar seus docentes, utilizando diferentes

estratégias, como as Semanas de Psicologia e a realização de cursos de

atualização e especialização na própria Instituição, além de oficinas. Para

tanto, foram convidados professores de outras Instituições de Ensino

Superior.

As semanas de psicologia, promovidas pelo Departamento,

começaram a acontecer a partir de 1981 e se estenderam até 1990, desde

antes da criação do curso, com os objetivos de informar sobre o campo

psicológico, favorecer trocas de experiências e também sondar o interesse

da comunidade maranhense pela área psicológica. Juntamente com esses

eventos, aconteciam os cursos e as oficinas.

Para os eventos havia sempre um convite prévio a docentes de

universidades brasileiras. Seus currículos eram analisados de acordo com a

temática central e disponibilidade de, para além das palestras, ministrarem

pequenos cursos. Na época, o Departamento contava com recursos

financeiros para atender aos custos com passagens, diárias e hospedagem

dos convidados. Os demais ministrantes eram profissionais de outros

Departamentos da UFMA e psicólogos e psicanalistas da comunidade de

São Luís.

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O tema central era trabalhado no turno matutino com palestras e

mesas-redondas e, no período vespertino, eram ministrados pequenos

cursos com carga horária entre 30 e 40 horas. Os temas eram variados.

Entre eles podem-se citar o problema da delinquência, a família, a

psicanálise, a consciência, a terceira idade.

Durante esse período de realização das Semanas, a comunidade, em

especial a acadêmica, demonstrava interesse em participar, o que era

comprovado pelo número elevado de inscrições de participantes nos

eventos. Foi durante a realização da VII Semana de Psicologia (1990),

quando se estava na coordenação, que os participantes indagaram do

Reitor, professor Jerônimo Pinheiro, quanto à criação do curso de

Psicologia no Maranhão, tendo ele, ao final de sua fala, se manifestado

com uma surpresa para a Assembleia: a criação do curso de Psicologia,

com vestibular para o ano seguinte. Após a criação do curso, em 1991,

somente duas outras Semanas foram realizadas. Acredita-se que os

motivos são vários, entre eles as constantes greves com alterações no

calendário acadêmico e a falta de recursos financeiros para promover a

vinda de profissionais de outras universidades.

A outra estratégia para qualificar os professores e criar o curso de

Psicologia, como dito anteriormente, está relacionada aos cursos

oferecidos pelo Departamento de Psicologia. Convém frisar que foram

muitos, de tal modo que os professores às vezes se sentiam

sobrecarregados, já que os cursos aconteciam ao mesmo tempo em que as

outras atividades acadêmicas, sem liberação de carga horária. Essa situação

era sentida por todos, pois, quando se acabava de escrever o trabalho final

de um curso, já estava programado um outro. Esses cursos, segundo os

coordenadores, eram trabalhosos no que diz respeito à sua execução,

devido à pouca estrutura para funcionamento, à necessidade de espaço

físico e, ainda, a questões administrativas.

É interessante registrar que alguns desses cursos eram somente para

o grupo de professores do Departamento, com exceção dos mestres e

doutores; outros eram para o grupo, mas também abertos à comunidade em

geral e acadêmica, desde que atendesse à exigência de áreas afins.

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Os cursos oferecidos pelo Departamento foram de atualização e de

especialização em áreas da Psicologia. Os de especialização (Metodologia

da Pesquisa em Psicologia, Psicofisiologia, Psicologia da Personalidade,

Instrumentação e Experimentação em Psicologia e Psicologia Social)

foram realizados de 1981 a 1986. Os cursos de atualização (Psicofisiologia

e Psicopatologia do Comportamento, Psicologia da Consciência,

Psicologia Social Comunitária e Desenvolvimento Humano: aspectos bio-

psico-sociais) foram ministrados no período compreendido entre 1979 e

1991.

Esses cursos ganharam força e foram intensificados quando foi

contratado o primeiro psicólogo de Departamento, Houshang Khazrai,

como professor visitante, em 1980. Com doutorado em Medicina e pós-

doutorado em Psicologia, ambos em Paris, o professor Khazrai

permaneceu no Departamento até 1990, quando solicitou exoneração da

Instituição.

O professor Khazrai planejava e ministrava vários cursos de

especialização cujas propostas eram aprovadas pelos docentes em

Assembleia Departamental, após análise dos objetivos, da programação e

dos conteúdos das disciplinas. Em alguns, todo o grupo participava e, em

outros, os professores optavam pelo que desejavam fazer. Para saber um

pouco mais sobre a vinda desse professor para o Departamento de

Psicologia, considerou-se necessário indagar da professora Terezinha

Godinho como foi o processo de sua contratação. Ela revela:

Quando o reitor da Universidade, José Maria Cabral Marques, mandou o

currículo do professor Houshang Khazrai para o Departamento apreciar,

eu estava na chefia. Foi bastante problemático. A Assembleia

Departamental viu que o currículo era riquíssimo, mas nós não tínhamos

o curso de Psicologia. Como existia o curso de Medicina e professor era

médico e psicólogo, com doutorado e pós-doutorado em Paris, o

Departamento respondeu louvando o currículo, mas dizendo que ele

estaria mais bem situado no Departamento de Medicina. A resposta que

eu tive era que eu não tinha sido consultada para aceitar o currículo, mas

para apreciá-lo, Pelo que sei, foi em Brasília que ele conseguiu o

professor. No princípio, o professor ficou limitado a dar cursos de

especialização para nós, porque ele não falava a nossa língua. Então, não

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se tinha condição de colocar o professor imediatamente na sala de aula,

embora ele tivesse um conhecimento superior a todos nós. Ninguém

estava questionando o saber e a competência dele [...] mas ele precisava

dominar melhor a língua para poder entrar em contato com os alunos. O

professor Khazrai inicialmente passou a fazer parte do Departamento de

Psicologia como professor visitante e mais tarde submeteu-se a concurso

para professor titular, sendo aprovado e passando a ministrar aulas de

Psicologia no curso de Medicina, pois, até então, não havia sido criado o

curso de Psicologia.

Para poder contar de que forma o Departamento de Psicologia da

UFMA se preparou para a criação do curso de Psicologia, procurou-se

reconhecer que atividades foram desenvolvidas pelos docentes durante

esse período.

Para tanto, foram elaborados dois roteiros de entrevista para os

professores participantes e para os que ministraram os cursos, dos quais 7

(sete) eram professores participantes do Departamento de Psicologia,

residentes em São Luís e atualmente aposentados, 3 (três) eram professores

convidados a ministrar os cursos, residentes no Rio de Janeiro, cujas

entrevistas foram realizadas durante o período de estágio que se fez na

Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ).

O propósito foi fazer uma análise com as informações obtidas dos

participantes e dos ministrantes de cursos. Com os resultados das

entrevistas, foi possível conhecer e compreender como o Departamento

administrou o volume de cursos realizados e que resultados foram

alcançados.

Tentou-se, assim, descobrir de que cursos os docentes haviam

participado e por quem foram ministrados. Nesse processo de coleta de

dados, percebeu-se que os entrevistados revelaram muita disposição de

falar sobre a sua participação nos cursos, embora dissessem ser melhor

verificar nos certificados as informações mais precisas. Foi possível

entender melhor esta colocação quando se constatou que a maioria dos

professores possui quatro das cinco especializações que foram oferecidas,

além dos quatro cursos de atualização. Alguns desses cursos foram

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realizados em módulos, ainda que não se tratasse de uma escolha pessoal

em alguns casos.

Nesse sentido, o professor Milton Athayde da Universidade do

Estado do Rio de Janeiro, afirma:

Fui convidado para ministrar um curso de atualização em

Psicologia Social Comunitária, com carga horária de 120 horas. Foi um

curso programado para ser intensivo, manhã e tarde, distribuído em

dois módulos de 60 horas [...].

Tanto ele quanto os professores João Ferreira da Silva Filho e

Ângela Arruda, ambos da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ),

que ministraram os cursos de Psicofisiologia e Psicopatologia do

Comportamento e Psicologia Social, respectivamente, destacaram que

tiveram de se deslocar a São Luís mais de uma vez para ministrá-los.

Ficou demonstrado nas falas que essa situação era frequente em

todos os cursos oferecidos. Isto se devia ao compromisso assumido pelos

professores do Departamento de Psicologia, de que os cursos aconteceriam

sem prejuízos de outras atividades acadêmicas.

Embora os dois grupos de entrevistados soubessem da necessidade e

finalidade dos cursos, os participantes revelaram em suas falas que a

preocupação maior era com a questão da qualificação voltada para o ensino

das disciplinas de Psicologia, com a futura criação do curso, com a

reciclagem do professor com vistas à melhoria e ao aprimoramento do seu

desempenho, com a aplicação da prática pedagógica em sala de aula e com

um conhecimento mais aprofundado dos diferentes estudos apresentados

nessa área, por solicitação dos cursos de graduação a que o Departamento

atendia na ocasião. Essas justificativas ficaram evidentes na fala da

professora Teresinha Raposo ao afirmar: "[...] tornou-se necessária a

qualificação desses profissionais na aquisição de conhecimentos

específicos na área psicológica [...]"; e da professora Penha Santos

segundo a qual "[...] havia interesse do Departamento em reciclar e

qualificar os docentes, dando-lhes a oportunidade de aplicar os

conhecimentos dessa 'área na sua prática pedagógica".

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Nesse mesmo contexto, os ministrantes informaram que tinham

conhecimento do número reduzido de psicólogos no Departamento, do

empenho para a criação do curso de Psicologia e de uma capacitação

científica especializada, com conteúdos específicos, que estavam sendo

solicitados pelos cursos da Universidade. Além disso, o professor Milton

Atayde, acrescenta:

[...] as pessoas achavam [professores de Psicologia da Universidade

Federal da Paraíba (UFPB)] muito positivo o esforço que vocês punham

em prática, de tal modo que a sondagem inicial que me foi feita tinha

esse tom: apoiar do melhor modo esse movimento profissional

afirmativo dos colegas do Maranhão [...].

Observou-se que todos os informantes tinham conhecimento da

necessidade e finalidade dos cursos, pela forma como foram se

expressando no transcorrer de seus depoimentos, pela experiência que

vivenciaram, pela compreensão dos compromissos assumidos que

confirmaram a proposta básica de qualificação e aprofundamento na área

psicológica e deram oportunidade de reflexão na busca de novos caminhos

para a constituição do curso de Psicologia.

Observou-se, também, que a comunicação administrativa acerca dos

cursos era eficaz, já que os entrevistados, ministrantes e participantes

sabiam que os cursos eram patrocinados pela Universidade Federal do

Maranhão, através das Pró-Reitorias de Graduação, de Pesquisa e Extensão

e de Administração. Além desse, o apoio efetivo do antigo Centro de

Estudos Básicos (CEB), denominado depois de Centro de Ciências

Humanas (CCH) do qual o Departamento de Psicologia sempre fez parte, é

ressaltado por aqueles que participaram dos eventos.

Com relação aos critérios de seleção para os cursos, os participantes

informaram que todos os docentes lotados no Departamento de Psicologia

estavam automaticamente inscritos nos cursos. Esse ponto é comentado

pela professora Conceição Jorge, ao dizer:

A UFMA, através do Departamento de Psicologia, teve quase que a

obrigação de oferecer inúmeros cursos ao longo de mais de vinte anos,

nos quais a motivação não se expressava em uma escolha pessoal,

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mas na necessidade de qualificação profissional, uma vez que os

docentes do Departamento eram escritos ex-offício nos cursos.

As vagas restantes eram abertas à comunidade para docentes de

áreas afins, mediante a análise dos currículos, exceto quando o curso se

destinava apenas para os professores do Departamento. Outro critério

adotado estava ligado à administração do curso, expressa através de

pagamento da taxa de inscrição, cobrada pelo setor competente da UFMA

a todos os participantes. Os ministrantes, por sua vez, sabiam ser essa a

clientela dos cursos, o que facilitou o desenvolvimento da programação de

suas atividades.

Uma questão bastante discutida à época pelos professores

participantes era acerca dos critérios de escolha dos docentes a serem

convidados. Segundo os informantes, esses docentes eram selecionados:

pela competência e experiência nas áreas dos cursos, considerados critérios

prioritários; por indicações, após análise e aprovação dos currículos

enviados pelas Instituições de Ensino Superior que atendiam à solicitação

do Departamento de Psicologia; por serem de universidades mais próximas

do Maranhão (ficando aí implícita a questão financeira, com os convites

privilegiando mais as universidades do Nordeste); e, também, por contatos

diretos com professores em congressos, seminários e cursos na área

psicológica, realizados em outras capitais do país. Essas informações

foram confirmadas pelas professoras Liba Lago e Terezinha Rabelo.

De modo análogo, os ministrantes, por sua vez, informaram ter sido

convidados por motivos diversos: o professor João Ferreira da Silva Filho

disse que na época era pesquisador do Conselho Nacional de

Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), professor da

Universidade Santa Úrsula e da Universidade Federal do Rio de Janeiro, e

que foi convidado pela Pró-Reitoria de Ensino e Pesquisa da UFMA e pela

professora Conceição de Maria Ferreira da Silva Jorge do Departamento de

Psicologia; a professora Ângela Arruda, que na ocasião era da

Universidade Federal da Paraíba (UFPB), considerou que sua indicação foi

por informações colhidas junto ao Departamento de Sociologia e

Antropologia da UFMA; e o professor Milton Athayde, que também nesse

período era professor da UFPB, justificou que os motivos da escolha de

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seu nome tinham a ver com sua atuação profissional no Nordeste, inclusive

no Maranhão, e ainda com o fato de a professora Ângela Arruda haver

comentado a respeito do trabalho que o Departamento de Psicologia da

UFMA estava desenvolvendo.

Ficou claro que, apesar de os docentes participantes afirmarem que a

escolha dos docentes ministrantes considerava mais as universidades do

Nordeste, algumas exceções ocorriam, como na escolha do professor João

Ferreira da Silva Filho, que indicou outros docentes de universidades do

Rio de Janeiro, que aqui vieram ministrar cursos. Infelizmente, não foi

possível entrevistá-los.

Na avaliação do resultado desses cursos, os informantes

participantes afirmaram a proficuidade dos conhecimentos adquiridos para

um desempenho acadêmico mais atualizado, com formação ampla e crítica;

outros declararam, entre eles as professoras Teresinha Raposo e Socorro

Polary, que o aproveitamento se multiplicava com a elaboração da

monografia ao final dos cursos, destacando os cursos da área social, no que

concerne a uma visão crítica da ciência psicológica e sua função social, e

também a necessária qualificação dos docentes do Departamento.

Por outro lado, a avaliação dos resultados pelos ministrantes também

é positiva. Cada um deles chama a atenção para um aspecto. Assim, o

professor João Ferreira da Silva Filho afirmou: "O resultado mais

importante foi a criação do curso de Psicologia, para o qual estávamos

capacitando os professores". A professora Angela Arruda, após encontrar

professores participando de eventos em outros Estados brasileiros e ter

sido convidada mais uma vez pelo Departamento para participar de uma

mesa redonda em uma Semana de Psicologia da UFMA e ministrar outro

curso junto com outros professores da UFPB, concluiu: "Considerei que

era uma expressão do interesse do debate sobre as questões da Psicologia

Social no panorama brasileiro daquele momento". O professor Milton

Athayde, após considerar a seriedade e a assiduidade dos participantes,

destacar a troca de conhecimentos e experiências vivenciadas em sala de

aula, ressaltou:

[...] ao final do curso, ao lado do sentimento de que não havia dado

conta da grandeza da responsabilidade e da demanda, fiquei com uma

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sensação muito positiva pelo trabalho feito em conjunto. O próprio fato de

o curso ser dado em dois períodos permitiu alguma avaliação, em

processo, ao que me lembre, positiva.

Com os resultados obtidos nas entrevistas, concluiu-se que, embora

com a carência de profissionais em São Luís para ministrar cursos, o

Departamento atingiu sua finalidade, que era a qualificação dos docentes,

destacando-se o aprofundamento dos conteúdos em diversas áreas com os

vários cursos realizados, com melhoria do desempenho no exercício da

docência. Verificou-se, também, que o objetivo foi alcançado, o que é

constatado com a criação do curso de Psicologia.

5.1.2 O Curso de Psicologia da Universidade Federal do Maranhão

A história do curso de Psicologia da Universidade Federal do

Maranhão está intrinsecamente ligada à necessidade de oferecer

oportunidades para o Maranhão ingressar no cenário nacional, nessa área,

assegurando à comunidade mais uma opção profissional.

Esse foi o pensamento do grupo de professores do Departamento de

Psicologia que sempre alimentou o desejo de sua criação. De certo modo, a

cada tomada de posicionamento para que o curso se consolidasse poder-se-

ia contar uma história em separado, mas não é esse o objetivo para o

momento. Nesse sentido, tentou-se não descrevê-la em minúcias, mas

apontar os principais marcos de seu percurso até o momento atual (abril de

2002). Um dado característico desse trajeto foi o número de reformulações

pelas quais o projeto passou durante esses anos. Não se fará uma análise

comparativa entre elas, mas é interessante ressaltar como tudo foi se

desdobrando.

As reformulações do projeto do curso, segundo se pôde apurar,

estiveram ligadas à preocupação com a atuação do profissional formado

neste Estado, na expectativa de que essa atuação não estivesse muito

distante da realidade nacional, que atendesse, sim, às características locais.

Esse caráter regional serviu para facilitar a criação do curso. No projeto

original, onde estava inserido, pouco se observou desse caráter, mesmo

porque as questões práticas e legais que direcionam um curso, em geral,

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dificultam a viabilidade dessa ação. De fato, seria importante que os cursos

pudessem servir às reais necessidades de suas comunidades, devendo esse

compromisso estar previsto no processo de criação ou reformulação desses

cursos. Essa proposta fica evidente nas palavras de Branco (1998, p. 28),

ao dizer: "Não há como refletir sobre o profissional que se pretende formar

sem se analisar a sociedade onde ele atuará, a atividade que exercerá e a

agência que o educará [...]".

Para escrever sobre a criação do curso de Psicologia da Universidade

Federal do Maranhão, procurou-se examinar as condições de sua implantação,

analisando os caminhos legais que foram sistematizados durante o

processo.

Embora não existindo comprovações documentadas, a primeira tentativa de

criação do curso de Psicologia da Universidade Federal do Maranhão

surgiu em 1971, quando o professor João Pereira Martins Neto, que

ocupava o cargo de Diretor do Centro de Estudos Gerais, a que o

Departamento de Psicologia pertencia, solicitou a elaboração de um

projeto que promovesse a habilitação de psicólogos.

Para tanto, a Assembleia Departamental elegeu uma comissão

composta pelas professoras Conceição de Maria Ferreira da Silva Jorge,

Terezinha de Jesus Vieira da Silva Godinho e Terezinha Fernandes Franco

Rabelo. A equipe começou a trabalhar e, antes de concluir o projeto,

esbarrou em algumas exigências fundamentais para que um curso pudesse

ser criado, entre as quais, a contratação de professores na área da

Psicologia, o que implicaria na realização de concursos para admissão desses

docentes. A UFMA, sob a administração do Reitor Cônego José de Ribamar

Carvalho, decidiu não criar o curso naquele momento. Entretanto, os

professores do Departamento de Psicologia não desistiam do sonho e

continuamente se mobilizavam, solicitando aos setores competentes da

Universidade providências no sentido de agilizar a sua criação embora a

resposta fosse sempre a mesma: qualificação e quadro docente.

A professora Terezinha Godinho comenta a respeito desse processo:

[...] esse projeto foi montado com grande dificuldade, porque nós não

tínhamos naquela época acesso fácil a outras universidades e nem

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psicólogos no Departamento [...] começamos a consultar catálogos de

cursos para elaborar o projeto, que mesmo antes de ficar pronto foi

negado pela Administração Superior, devido ao fato de o Departamento

não contar em seu quadro com professores pós-graduados [...] na

UFMA, era raro o professor que saía em busca dessa qualificação. Esse foi

um grande entrave para a criação do curso.

Apesar desses fatores contrários, houve persistência dos professores

do Departamento de Psicologia em seu objetivo, conseguindo chamar a

atenção da Administração Superior da Universidade que, através da Pró-

Reitoria de Ensino e Pesquisa, solicitou, em 1977, sob a administração do

Reitor José de Maria Ramos Martins, um projeto de pesquisa com o título

"Pesquisa junto à comunidade para a criação do curso de Psicologia",

objetivando sondar as possibilidades do mercado de trabalho e a clientela

interessada no curso.

O Departamento, em Assembleia, elegeu um grupo de professores

para elaborar o projeto e implementar a pesquisa que contou com a

participação de Terezinha de Jesus Vieira da Silva Godinho, Lilia Maria

Ferreira Lago e Maria do Socorro Nogueira Polary.

Foram então selecionadas 5 (cinco) escolas de 2 grau da rede pública

e particular de São Luís para a realização dos trabalhos. O levantamento

consistiu na aplicação de questionários elaborados pela comissão, com a

aprovação da Assembleia Departamental, haja vista ser de interesse de

todos a criação do curso. De posse dos dados, foi elaborado o relatório

final que não foi entregue porque a UFMA, nessa época, resolveu

interromper algumas pesquisas que estavam em andamento. Embora sem

registro documental, a partir dos dados colhidos com as professoras que

participaram dessa pesquisa, soube-se que a conclusão a ser apresentada no

documento sinalizava haver um forte interesse por parte de alunos quanto à

criação do curso de Psicologia, mas que o mercado de trabalho era muito

restrito e alguns desconheciam as possibilidades de atuação do profissional

psicólogo. Segundo elas, essa foi mais uma experiência frustrada.

Mais uma vez a professora Terezinha Godinho fala a respeito dessa

pesquisa:

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O que apuramos na ocasião é que havia muita clientela interessada em

Psicologia, mas esbarramos no mercado de trabalho, por ser um campo

muito restrito, e na falta de conhecimento por parte dos alunos da atuação

do profissional [...] naquela época poucas escolas tinham serviços de

Psicologia estruturados, algumas tinham projeto de contratar psicólogos.

O único mercado que nós tínhamos aqui era o DETRAN e estava

chegando a ALUMAR, que possivelmente abriria mais uma opção de

trabalho nessa área.

Em maio de 1986, já sob a administração do Reitor José Maria

Cabral Marques, o Departamento de Psicologia enviou, por solicitação da

Pró-Reitoria de Graduação (PROG), em caráter de urgência, uma proposta

simplificada de criação do curso de Psicologia, com as habilitações de

Bacharelado e Licenciatura, visando à oferta de vagas ao concurso

vestibular em julho desse mesmo ano. Em abril de 1987, a proposta foi

devolvida para a elaboração do projeto definitivo, mas o teor do

documento não afirmava que o curso seria criado de imediato, informando

apenas que era de interesse da Administração Superior dar prosseguimento

ao estudo de criação de novos cursos na UFMA.

Essa comunicação provocou nos professores do Departamento, que

há muito tempo desejavam a criação do curso, a disposição de agilizar os

trabalhos, o que ficou demonstrado na apresentação do projeto, na qual é

afirmado:

Ao Departamento de Psicologia coube natural e necessariamente o

primeiro e mais importante passo na conquista ou no alcance desse

desafio — a elaboração do projeto do Curso de Psicologia da Universidade

Federal do Maranhão [...] (PROJETO..., 1988, f.1).

Desse modo, foi necessário constituir duas comissões formadas

pelas professoras do Departamento de Psicologia: uma em 1986 - Norma

de Serviço DE. PSI. nº 003/86 —, para elaborar a proposta simplificada

para a criação do curso, composta pelas professoras Conceição de Maria

Ferreira da Silva Jorge, Maria do Socorro Nogueira Polary, Terezinha

Fernandes Franco Rabelo e Terezinha de Jesus Vieira da Silva Godinho;

outra em 1987 — Ordem de Serviço DE. PSI. n'' 005/87 —, para preparar

o projeto definitivo do curso de Psicologia, composta pelas mesmas

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professoras e mais a professora Heloisa Moreira Lima Leite —

posteriormente a primeira coordenadora do curso de Psicologia.

O projeto do curso, denominado aqui de "Projeto... (1998)",

elaborado e discutido no Departamento de Psicologia, ficou pronto em

janeiro desse ano e foi encaminhado à Pró-Reitoria de Graduação (PROG)

para apreciação e aprovação. A espera foi longa, tanto por parte dos

professores do Departamento como da comunidade, e esta, que já havia

tomado conhecimento da intenção da UFMA de criar o curso, aguardava

ansiosa pelo anúncio do vestibular. Isso, contudo, somente aconteceu

depois de 2 (dois) anos da entrega do projeto e 20 (vinte) anos após a

tentativa inicial. O primeiro curso de Psicologia no Maranhão foi

finalmente criado em 1990, sob a administração do Reitor Jerônimo

Pinheiro, de acordo com o Processo n° 000768/88-24, nas modalidades de

Bacharelado e Licenciatura com o primeiro vestibular realizado em agosto

de 1991. A escolha dessas habilitações iniciais provocou mais tarde sérios

momentos de tensão.

Em entrevista concedida por quatro membros da comissão,

procurou-se saber que ligações tinham com a Psicologia e por que foram

escolhidos para tal tarefa. Os informantes afirmaram serem todos do

Departamento de Psicologia, terem vivência em sala de aula em diferentes

disciplinas de Psicologia nos diversos cursos da UFMA, e, ainda, serem os mais

antigos no Departamento. Relataram, inclusive, as dificuldades e

implicações existentes na criação de um curso, como busca de contatos e

reuniões com professores de outras universidades, análise de currículos

enviados, além das questões burocráticas pertinentes ao processo,

principalmente porque, no caso do curso de Psicologia, contavam na época

com apenas um psicólogo no Departamento, o professor doutor Houshang

Khazrai, mas que, apesar disso, se encontravam abertos para receber

contribuições de outras pessoas. A grande preocupação, conforme

declarado, era a consciência de estarem contribuindo para a futura

formação de profissionais em uma área insistentemente cobrada pela

comunidade em geral. Esse dado pôde ser observado mais tarde através da

demanda para o primeiro concurso vestibular, quando o curso foi o

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terceiro27 mais procurado e, também, quando 53 (cinquenta e três) alunos

de vários cursos da UFMA solicitaram vagas via transferência para o curso

de Psicologia, conforme consta na Ata do Colegiado de Curso de 8 de

julho de 1993.

Após a decisão da UFMA de criar o curso de Psicologia, embora

estivesse declarado o interesse em receber contribuições externas, não se

encontrou nenhum documento da comissão que indicasse o contato, quer

com os psicólogos que já trabalhavam na cidade, conforme se fez

referência anteriormente, presentes aqui desde 1970, para que

colaborassem na elaboração do projeto, através de suas experiências, quer

com os psicólogos já contratados como técnicos pela própria Universidade.

Tendo em vista as justificativas já apresentadas para a criação do

curso, os informantes apontaram outra, ao afirmarem que, ao longo do

tempo, o Departamento de Psicologia atendeu a algumas solicitações da

UFMA, entre elas a qualificação de seus professores. Como se constatou, o

fato de já existir o Departamento de Psicologia e esses professores

ministrarem disciplinas a quase todos os cursos da UFMA foi um forte

argumento utilizado para justificar a criação do curso. A respeito desses

pontos os informantes foram unânimes, como se pode verificar abaixo:

[...] com quase 25 anos servindo a toda a Universidade e qualificando

seus docentes, o Departamento de Psicologia se empenhou e

enfrentou o desafio da criação do curso, mesmo a despeito do quadro

restrito de professores, acreditando no papel que o profissional da

área p o d e r i a r ep r e s e n t a r n u m e s q u e ma d e desenvolvimento

regional, nas expectativas da comunidade em favor do curso, no

respeito, credibilidade e, sobretudo, na sua identidade. (SOCORRO

POLARY).

Aspiração antiga dos docentes do Departamento de Psicologia desde

1970, quando de sua implementação na UFMA, o curso de Psicologia,

para se constituir, necessitou de uma primeira pesquisa realizada por um

grupo de professores, com o objetivo de definir as necessidades e,

27 Embora no teor do documento pesquisado conste como sendo o terceiro curso mais procurado, em análise

posterior comprova-se que ele ocupa a segunda posição, como pode ser comprovado em quadro anexo.

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principalmente, o desejo da comunidade de São Luís, dos estudantes do

ensino médio e da Universidade. Depois foram criadas duas

comissões para preparar o projeto do curso, o que só veio a ocorrer

por vontade política da Administração Superior da UFMA nos anos

90. (CONCEIÇÃO JORGE).

A constituição do curso se deu a partir de um grupo de professores do

Departamento de Psicologia que não eram psicólogos, mas que

trabalhavam em disciplinas de Psicologia para outros cursos da UFMA

[...] criado também a partir do interesse e necessidade da comunidade

em geral, expressa através de uma pesquisa realizada nas escolas de ensino

médio de São Luís e da UFMA [...] esse grupo levou em frente essa ideia

até acontecer realmente o curso de Psicologia. (MANOEL WILLIAM).

O curso de Psicologia foi em primeiro lugar um desejo do Departamento

de Psicologia [...] nós nos questionávamos muito a respeito, não tínhamos

identidade própria. A disciplina Psicologia ministrada em

diversos cursos da UFMA permitiu a criação do Departamento de

Psicologia, sendo este o primeiro passo para a criação do curso [.,.] em

segundo, a própria Universidade começou a perceber que tinha

necessidade de criar o curso, que era bom para ela, porque já havia

naquela época vários profissionais, em nossa comunidade, formados em

outras instituições, fora do Maranhão. (HELOISA LEITE).

O Departamento de Psicologia alimentava a ideia de criar o curso de

Psicologia há muito tempo. A chefe do Departamento, professora

Terezinha Godinho, deu os primeiros passos. Muitos cursos de

especialização vinham sendo realizados e este fato foi intensificando a

necessidade de ampliar o raio de atuação do Departamento, que até

então oferecia disciplinas em muitos cursos da Universidade.

(MOACIR COL DEBELLA).

[...] nós já havíamos tentado muitas vezes a criação desse curso em outras

gestões [...] a falta de recursos financeiros para equipamentos,

laboratórios e contratação de professores foi sempre um empecilho

[...] veio a elaboração dos p rojetos quando encontramos uma

cer ta dificuldade, tendo em vista que teríamos de buscar em outras

instituições uma série de informações, pois não tínhamos onde pesquisar.

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E o tempo de elaboração desses projetos era em curtíssimo prazo.

(TEREZINHA GODINHO).

Pode-se observar nas falas acima que a necessidade de criação do

curso de Psicologia aparecia de forma mais concreta no empenho dos

professores do Departamento, os quais estavam diretamente envolvidos

com a comunidade e, portanto, eram sempre procurados para informar

sobre uma possível criação do curso. A falta de identidade, apontada por

dois informantes, tem a ver com a ausência do curso, a não formação na

área, o que acarretava certo desconforto, além de que, com o curso,

algumas atividades poderiam ser desenvolvidas, principalmente as

direcionadas à pesquisa e à extensão, que ocorriam de forma escassa no

Departamento. Outro ponto percebido é que havia uma ocupação do

espaço nessa área que, apesar de reduzido, acenava com possibilidades de

expansão, sendo preenchido por profissionais formados em outras

localidades. É interessante observar que a UFMA demorou a perceber a

importância do curso para o Estado: havia uma incoerência entre a

solicitação do projeto e a sua efetivação, principalmente em relação ao

prazo de implantação. Convém destacar que durante o tempo de espera,

para que essa implantação se efetivasse, foram criados 6 (seis) outros

cursos, distribuídos nas áreas de Saúde, Humanas e Tecnológica.

No Projeto... (1988, f.1-2), a comissão desenvolveu várias ideias

para a criação do curso, quais sejam: um curso se operacionaliza ao longo

de um currículo e constitui um conjunto estruturado de conhecimentos que

se requerem mutuamente, a partir de um ponto de vista determinado; o

conhecimento em Psicologia é suscetível de redefinições em função do seu

avanço, mas, sobretudo, em função das respostas que procura dar a uma

determinada realidade; e, principalmente, o estudo de um instrumental

reconhecido como científico não basta se ele permanece totalmente

desvinculado do contato com a realidade social em que se inscreve. É

preciso, portanto, além de preparar o profissional, preparar o pesquisador,

torna-lo capaz de superar a condição de mero consumidor de

conhecimentos e de se defrontar com os problemas da sociedade,

assumindo posição crítica, contribuindo para a sua compreensão e solução.

Daí a necessidade de direcionar o curso para uma perspectiva de

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compromisso social, considerando em primeiro lugar essa região singular

em termos de Brasil - o Nordeste - que, segundo dados apresentados no

projeto, naquela época apresentava uma realidade com várias dificuldades,

em que conviviam o árido e o fértil, o rural e o urbano, o tradicional e o

moderno, interagindo e modificando-se, mesmo que lentamente, e com

reflexos sobre a mentalidade, a maneira de pensar, de perceber e de viver

das pessoas.

Ainda no Projeto... (1988, f. 3-4), o Maranhão, situa-se num nicho

ecológico, uma região pouco desenvolvida e também não explorada em

termos de conhecimento, que vai do mar até o sertão, povoada pelo homem

tão ligado à sua terra, em constante migração do campo para a cidade, do

norte para o sul, sendo que o enfoque do universo psíquico que acompanha

a trajetória de sua gente torna-se necessário na compreensão dessa

realidade psicossocial.

Foi com essa intenção que os participantes da comissão entenderam

que havia uma lacuna no quadro a ser preenchida com o profissional de

Psicologia. Essa lacuna se refletia, no Estado, nos programas de

desenvolvimento econômico, nos planos de pesquisa e comunicação, no

ensino de nível médio, na tecnologia e na saúde, ou seja, no próprio

desenvolvimento da região. Assim se posicionaram na justificativa do

projeto:

[...] Necessária se faz a presença de profissionais capazes de penetrar na

realidade concreta em que se inserem, para conhecê-la e agir de acordo

com ela, sem o transplante de modelos importados. (PROJETO...,

1988, f. 4).

As ideias trabalhadas pela comissão permitiram um estudo das

diretrizes que norteariam a apresentação dos conhecimentos psicológicos a

serem incorporados pelos alunos, entre eles: conhecimentos básicos da

ciência psicológica e de outras ciências que fundamentam e

complementam o estudo dos fenômenos psicológicos, como também uma

reflexão epistemológica sobre a Psicologia, de modo a colocar em

perspectiva a diversidade de teorias e métodos que coexistem nessa

ciência.

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A partir dessas ideias, foi proposto um currículo que buscasse

estabelecer campos de análise específicos com os quais se fundamentaria a

intervenção do profissional dessa área em diferentes contextos, de modo a

lhe permitir compreender o conjunto de determinações (sociais, políticas e

ideológicas), bem como a perspectiva histórica da Psicologia no Brasil.

Cabe aqui destacar a importância de contemplar, nessa época, a Psicologia

no Brasil como um ponto positivo dessa proposta curricular, uma vez que

em muitos currículos de cursos de Psicologia ela é pouco valorizada.

A partir dessas considerações e análises de currículos de outras

universidades brasileiras, o curso foi organizado de uma forma que

possibilitaria a integração das disciplinas do currículo mínimo definido

pelo Conselho Federal de Educação (CFE), com duração de 3.240 (três

mil, duzentas e quarenta) horas para o Bacharelado e 3.420 (três mil,

quatrocentas e vinte) horas para a Licenciatura, composto de disciplinas

nucleares, complementares (obrigatórias), eletivas, legislação específica,

disciplinas eletivas, Estágio Supervisionado e monografia de conclusão de

curso (este último sempre presente em todas as reformulações).

Nessa proposta, a comissão procurou não enfatizar divisões como

Psicologia Geral, Psicologia Experimental e Psicologia da Personalidade,

muito atreladas a uma tradição positivista. Entretanto, por exigência do

currículo mínimo, foi mantida, em caráter formal, a denominação

tradicional das disciplinas, ficando registrada ao lado a terminologia

proposta. Para tanto, no Projeto... (1988, f. 35-41), foi definida a seguinte

estrutura:

1. Eixo das Macro-Teorias, em que se concentrava o conhecimento

teórico básico do curso, organizado deforma que o aluno

pudesse ter uma visão simultânea de diferentes abordagens

teóricas da Psicologia, bem como das disciplinas ligadas

diretamente à questão do desenvolvimento (Psicologia Geral I, II

e III — Teorias da Consciência I, II e Psicologia Experimental I,

II e III — Teorias do Comportamento I, II e III, Psicologia da

Personalidade I, II e III — Teorias do Inconsciente I, II e III e

Psicologia Evolutiva I e II);

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2. Eixo da Filosofia, que proporcionaria ao aluno condições de

análise, reflexão crítica e compreensão das questões filosóficas

associadas aos sistemas teóricos em Psicologia (Iniciação ao

Pensamento Filosófico, Antropologia Filosófica e Metodologia

Científica);

3. Eixo da Sociologia, Antropologia, Psicologia Social, um estudo

da sociedade humana, que forneceria ao aluno uma base teórica

e um espaço para relativizar a Psicologia e sua prática em termos

do contexto social (Sociologia, Antropologia Cultural e

Psicologia Social I e II);

4. Eixo da História Social da Psicologia, que se juntava aos dois

anteriores com o objetivo de fornecer ao aluno elementos para

contextualizar a Psicologia e sua prática (História da Psicologia

Social no Brasil e Introdução à Psicologia);

5. Eixo da Biologia, cujo conhecimento, de caráter mais geral, era

considerado necessário ao profissional da Psicologia (Biologia e

Neurofisiologia I e II);

6. Eixo da Pesquisa, que oferecia um espaço relevante para o

estudo da pesquisa e suas técnicas, considerando-se não só o

aspecto profissionalizante do curso, mas também, e sobretudo, a

preparação para a produção científica no curso universitário

(Matemática, Estatística I e II, Pesquisa Experimental em

Psicologia e Pesquisa não Experimental em Psicologia);

7. Eixo Profissionalizante, no qual os conteúdos diziam respeito de

forma mais direta à prática do profissional de Psicologia

(Psicopatologia I e II, Medidas em Psicologia, Psicologia Social

Comunitária, Psicologia Social das Organizações, Psicologia

Escolar, Psicologia Ecológica, Dinâmica de Grupo e Relações

Humanas, Marginalidade Social e Psicologia do Excepcional) e

no qual se encontravam também as disciplinas de formação

pedagógica destinadas ao aluno de Licenciatura (Didática I, II e

Estrutura e Funcionamento do Ensino de 1° e 2° graus);

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8. Eixo do Ciclo Geral de Estudos, em que se concentravam, por

exigência do Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão

(CONSEPE), através da Resolução n° 40/88-CONSEPE, as

disciplinas instrumentais Métodos e Técnicas de Estudo e

Pesquisa Bibliográfica e Língua Portuguesa, além das

disciplinas da legislação específica, Estudo de Problemas

Brasileiros I e II e Prática Desportiva — (Educação Física I, II,

III e IV).

As disciplinas eletivas (Psicologia Preventiva, Psicologia

Diferencial, Psicofarmacologia, Sociologia do Desenvolvimento,

Psicologia da Criatividade, Psicologia da Comunicação, Psicologia da

Indústria, Psicologia Aplicada à Administração, Introdução à Educação e

Família na Sociedade) seriam oferecidas a partir do 5° período, tendo o

aluno do Bacharelado que cursar obrigatoriamente cinco disciplinas, e o de

Licenciatura, quatro.

Essa forma de cursar as disciplinas eletivas era determinada pela

própria divisão das vagas oferecidas pelo curso, com 15 destinadas ao

Bacharelado e 15 à Licenciatura Plena. Previstas na admissão no curso,

essas opções foram retiradas quando da primeira reformulação do projeto.

O Estágio Supervisionado (Estágio Curricular) fazia parte da vida

acadêmica do aluno a partir do 8° período, devendo obedecer às normas de

estágio da Universidade Federal do Maranhão UFMA — Departamento de

Psicologia.

Conforme se observou, além da necessidade de criação do curso

(justificativa) e do currículo proposto para tal fim, fizeram parte também

do Projeto... (1988, f. 5) os objetivos, o perfil profissiográfico, o

regulamento de funcionamento do curso e a previsão de necessidades para

a sua implantação. Quanto aos objetivos gerais estabelecidos no Projeto...

(1988, f. 5), podem-se relacionar:

a) formar profissionais capazes de conhecer a realidade

psicossocial brasileira e de nela integrar-se como agentes de

transformação;

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b) oferecer formação teór ico-prá t ica necessár ia ao

conhecimento da dinâmica psicossocial das organizações

com a finalidade de operacionalizar técnicas psicológicas

que ensejem a minimização dos conflitos psicossociais;

c) capacitar bacharéis e licenciados em Psicologia com o fim

de promover o ajuste individual e social do ser humano,

bem como de exercer o magistério das disciplinas de sua área

em diferentes instituições de ensino;

d) propiciar conhecimentos básicos de ciência, necessários à

investigação psicológica, para o desenvolvimento do

espírito crítico.

De acordo com os objetivos citados, o profissional de

Psicologia, formado pela UFMA, seria aquele que estuda os aspectos

psicológicos da vida humana; que descreve, analisa e explica o

comportamento; que é capaz de interagir com pessoas, com

flexibilidade em sua adaptação ao ambiente e às situações; que

estabelece formas variadas de relação interpessoal assim como tem

interesse científico pelos problemas humanos; que utiliza métodos

científicos para a interpretação da realidade do homem numa

perspectiva crítica e transformadora. Esse perfil foi apresentado

considerando-se a formação do profissional nessas habilitações.

Assim:

a) o bacharel em Psicologia é o profissional capacitado para

estudar e avaliar os mecanismos do comportamento,

habilitado para a pesquisa psicológica, podendo realizar

pesquisas, planos e projetos pertinentes à realidade

psicossocial;

b) o licenciado em Psicologia é o profissional capacitado a

estudar e avaliar os mecanismos do comportamento,

podendo realizar pesquisas, planos e projetos pertinentes à

realidade psicossocial e educacional, como também

exercer o magistério em disciplinas de Psicologia.

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O dado mais importante no Projeto... (1988) foi a escolha dessas

habilitações. Assim sendo, tentou-se verificar com os fundadores os

mecanismos que influenciaram essa decisão. Acreditou-se ser necessário

conhecer as razões dessas opções para entender os efeitos delas advindos.

Algumas das respostas obtidas foram:

[...] essas escolhas surgiram como uma resposta das próprias

características do Departamento. Formado por pedagogos e filósofos,

preocupou-se primeiro em habilitar profissionais para atender à

demanda de docentes na comunidade. A ideia inicial era a implantação

progressiva da habilitação Formação de Psicólogo [...] daí resultou o

interesse e a preocupação em montar um curso que se identificasse

com as necessidades do Departamento e, por extensão, com as

necessidades do mercado de trabalho. (MOACIR COL DEBELLA).

A escolha das habilitações do curso de Psicologia, descritas no projeto

e aprovadas pelos Colegiados Superiores da UFMA, deveu-se ao fato

de haver recursos humanos e materiais no Departamento de

Psicologia, naquela ocasião, apenas para aquelas duas

habilitações. (CONCEIÇÃO JORGE).

[...] essas habilitações ocorreram considerando-se o quadro

profissional do Departamento de Psicologia [...] composto em sua

maioria de pedagogos e filósofos especialistas em diversas

áreas da Psicologia, aguardando-se a expansão do quadro e a entrada de

psicólogos, um compromisso da Administração Superior da UFMA.

(SOCORRO POLARY).

O curso elaborado não foi de Formação de Psicólogo, e isso ocasionou uma

certa confusão. Decidimos então criar as habilitações de Bacharelado e

Licenciatura [...] pode ter sido um pouco de falha nossa [da comissão],

porque era mais fácil criar dessa maneira e porque não tínhamos o quadro

de professores. Esse pensamento era compartilhado pelo grupo [...] um

fato é criar o curso, outro é ter professores para dar aula, cuja autorização

para contratação era feita pelo MEC. Foi uma necessidade de facilitar a

criação, depois as modificações iriam surgindo naturalmente. (HELOISA

LEITE).

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[...] era difícil criar um curso de Psicologia com essas habilitações. O que

dizer então do curso de Formação de Psicólogo, se esse curso exigia

maiores recursos para criação de laboratórios, clínicas etc.? [...] a

dificuldade era grande [...] para não dar um passo temerário, a comissão

decidiu inicialmente que seria criado dessa forma, com projeção

futura para Formação de Psicólogo, embora sabendo que o grande

anseio da comunidade era essa habilitação. Isso gerou posteriormente

sérios problemas para o curso. Fomos então ao Reitor falar de nossa

dificuldade e ele disse: 'um curso não se cria por inteiro, se cria por

semestre, então vamos avançar aos poucos' e resolvemos prosseguir.

(TEREZINHA GODINHO).

[...] não houve intenção inicialmente de escolher a habilitação de

Formação de Psicólogo, visto que naquela época havia grande

dificuldade de professores na área da Psicologia, haja vista o número

reduzido de psicólogos na cidade. Para que pudéssemos iniciar o curso,

teríamos, naquele momento, de ter em nosso quadro um número de 22

(vinte e dois) professores com DE (Dedicação Exclusiva) e formação

em Psicologia. Para ilustrar essa situação, podemos citar os diversos

concursos realizados pelo Departamento de Psicologia, onde os

candidatos eram de outros Estados brasileiros, além de um concurso

sem inscritos e outros com total desistência, ficando a Banca

Examinadora composta de professores de outras Instituições de Ensino

Superior, sem atividade. (MANOEL WILLIAM).

Ao decidirem criar o curso com as habilitações de Bacharelado e de

Licenciatura, a comissão sabia das consequências advindas dessa decisão,

mas não previa que fosse mais tarde alvo de tantas turbulências diante da

expectativa dos candidatos ao vestibular que ansiavam pela criação de um

curso de Psicologia (Formação de Psicólogo) em São Luís. Ao ingressarem

no curso e ao tomarem conhecimento de que se tratava de Licenciatura e

Bacharelado, os alunos organizaram-se em protestos e reivindicações,

visando à criação da habilitação de Formação de Psicólogo que, na

realidade, era a por eles pretendida. A comissão, no entanto, sentia-se

impotente para modificar o curso, tendo em vista a Universidade não ter

oferecido condições para tal. Esse fato envolveu, além da comunidade

universitária, a ludovicense, e esse envolvimento, posteriormente, implicou

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na criação do curso de Psicologia do Centro Universitário do Maranhão

(UniCEUMA), como será abordado mais adiante.

A grande discussão da época era saber se os alunos tinham ou não

conhecimento de que o curso oferecia apenas aquelas habilitações. Na

realidade, ao prestarem vestibular, eles pensavam que estariam formados

como psicólogos e isso de fato não ocorria, o que ocasionava grande

descontentamento no corpo discente. Conforme dados colhidos com dois

membros da comissão, os alunos tinham conhecimento das habilitações

por elas constarem no Manual do Vestibular, onde se encontrava

explicitado o curso oferecido, as modalidades e o campo de atuação,

embora concordassem com a possibilidade de eles não terem lido o

informativo. A primeira coordenadora do curso, professora Heloisa

Moreira Lima Leite, que permaneceu até fevereiro de 1993, afirmou:

[...] constava no Manual do Vestibular que o curso oferecido só tinha

Licenciatura e Bacharelado. Eles não tinham lido o manual e, na cabeça

deles, era Psicologia Clínica [...] eu levei para a sala de aula essas

informações e apresentei a eles o curso, dizendo do que se tratava. O erro,

no caso dos nossos alunos, foi assinar e se inscrever sem ler o que

estavam fazendo. No primeiro ano os alunos criaram muita confusão

[...].

Para a segunda coordenadora do curso, que assumiu nesse mesmo

ano, a professora Loide Célia de Brito, houve uma certa dificuldade de

interpretação. Disse ela: "Creio que a maioria tinha conhecimento, mas

eles pensavam que o Bacharelado era que dava direito a ter a Formação de

Psicólogo".

Como se pode perceber, embora a execução do Projeto... (1988)

tenha se retardado muito, a comunidade só estava informada de que seria

criado o curso de Psicologia, mas pouco sabia de sua estruturação. Não

houve por parte da UFMA e nem do Departamento de Psicologia maiores

esclarecimentos sobre que tipo de profissional seria formado. Como já

referido, o anseio da comunidade era muito grande, pois o pensamento era

de que se formariam psicólogos clínicos, não havendo por nenhum

momento dúvidas quanto à não inclusão da habilitação em Formação de

Psicólogo.

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Esta nova habilitação só foi aprovada e efetivada em 1994, e, por

uma outra falha da Instituição, durante muito tempo — até 1998 — ela não

constava no Manual do Vestibular. Muitos candidatos ao curso acabaram

desistindo desse intento devido a comentários de que o curso da UFMA só

oferecia Licenciatura e Bacharelado. Esse fato repercutiu na comunidade e

foram constantes as explicações dos professores do Departamento de

Psicologia e da Coordenação do Curso a esse respeito. A última

informação que se tem a respeito dessa situação, datada desse ano (2002),

se refere àquela contida na home page da UFMA que apresenta o curso

ainda com aquelas duas habilitações. Somente ao descrever a grade

curricular é que se refere à habilitação Formação de Psicólogo, gerando

equívocos e confusões sobre o curso. Ao longo desses anos o maior

divulgador sobre as habilitações oferecidas tem sido o próprio aluno.

O currículo, de acordo com as informações obtidas nas entrevistas,

foi baseado em grande parte no projeto de reformulação curricular que

estava em estudo na Universidade Santa Úrsula no Rio de Janeiro, como

no de outras como a Universidade Federal do Rio de Janeiro, a

Universidade Federal da Paraíba e a Universidade Federal de Pernambuco.

Nesse sentido, a professora Terezinha Godinho comenta a escolha dessas

Universidades que serviram de parâmetro na montagem do curso proposto:

[...] nós tivemos acesso a outras universidades, mas a Santa Úrsula foi a

principal, pela facilidade de poder tirar dúvidas a partir do contato que

tínhamos com os professores que nos auxiliaram na elaboração do

projeto, pois foram eles que anteriormente vieram dar cursos de

especialização para os docentes do Departamento de Psicologia.

Esse relato é confirmado pela professora Socorro Polary: “A

comissão pesquisou e analisou vários projetos de cursos, optando, na

estruturação curricular, pelas diretrizes delineadas na Universidade Santa

Úrsula, em estudos realizados naquele momento”.

Com relação à declaração dos informantes, a decisão da escolha por

essa Universidade deveu-se ao fato, já referido, de o professor João

Ferreira da Silva Filho, docente daquela Instituição, ter vindo ministrar

cursos para os professores do Departamento de Psicologia. A proximidade

desse professor, por ter familiares na cidade, propiciou uma integração e

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um interesse por parte dos docentes da UFMA, já que o acesso a outras

instituições, naquela época, era mais difícil.

Continuando sua trajetória na Pró-Reitoria de Graduação (PROG), o

Projeto... (1988) foi analisado e o Parecer nº 24/88, da técnica de assuntos

educacionais, Lidmar Figueiredo V. Pereira, considerou pertinente a

necessidade social proposta, as habilitações de Bacharelado e Licenciatura,

os objetivos, o perfil profissiográfico, admitindo que atendiam à Resolução

de 19 de dezembro de 1962 do Conselho Federal de Educação e ao Parecer

n° 403/62, que fixa os mínimos de conteúdos e a duração do curso, e

regulamentam a profissão. Contudo, solicitou algumas providências que

julgou necessárias, visando particularmente o posterior reconhecimento do

curso pelo Conselho Federal de Educação. As principais exigências

referiam-se à ausência da minuta do anteprojeto de resolução, cujo teor era

o próprio regulamento do curso; de docentes para ministrar a maioria das

disciplinas que constavam no currículo; de informações sobre a biblioteca

(títulos e periódicos), indispensável ao bom andamento do curso.

Referiam-se, ainda, à necessidade de acertos na creditação de disciplinas;

de alteração da estrutura curricular na parte referente às disciplinas

pedagógicas e outras; e da mudança do curso do Centro de Estudos

Básicos (CEB) — nova denominação do Centro de Estudos Gerais — para

o Centro de Ciências Sociais (CCSo), como se pode ver a seguir:

[...] a alocação do Curso no Centro de Estudos Básicos naturalmente ocorreu

em função do Departamento de Psicologia, que abrange maior número

de disciplinas do curso. Essa área de conhecimento, no entanto, deveria

estar alocada no Centro de Ciências Sociais, sendo necessária uma revisão

nesse campo na Universidade, a fim de que a distribuição dos

Departamentos e Cursos, nos respectivos Centros, corresponda às áreas de

conhecimento [...] (PROJETO..., 1988, f. 55).

O projeto retornou ao Departamento de Psicologia, onde a comissão

atendeu às solicitações da relatora, principalmente as referentes à estrutura

curricular, e enviou-o ao Centro de Estudos Básicos, que novamente o

encaminhou à PROG, onde por duas vezes foi analisado e as relatoras

Edna Antônia Pinheiro Costa (técnica em assuntos educacionais) e Maria

de Fátima R. Caracas (subcoordenadora de graduação) enfatizaram os três

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pontos contidos no primeiro parecer, a saber: 1) a efetiva disponibilidade

de meios necessários ao funcionamento do curso, referente à instalação,

manutenção, execução e, principalmente, à falta de docentes para ministrar

a maioria das disciplinas; 2) o acervo bibliográfico, indispensável e

imprescindível para um bom andamento do curso e seu posterior

reconhecimento; 3) a alocação do curso no Centro de Ciências Sociais.

Desse modo, o projeto retornou ao Centro de Estudos Básicos e o Diretor

solicitou que a chefe do departamento de Psicologia, como membro desse

Conselho, relatasse o projeto do curso, considerando as ponderações feitas.

Em seu parecer, a professora Socorro Polary retomou a questão da

necessidade social do curso de Psicologia para o Maranhão, ressaltando

pontos contidos no projeto do curso, detendo-se nas apreciações relatadas,

dizendo que as modificações solicitadas em relação à alocação de

disciplinas haviam sido atendidas. No tocante à disponibilidade de meios,

manifestou sua posição e a do Departamento de Psicologia:

[...] é preciso superar as limitações sem prejudicar a implantação de

um curso, por não ter as condições ideais. Esta posição é unânime

no Departamento de Psicologia mesmo porque existe há quase 25

anos, serve a toda a Universidade e se ressente da falta do seu

próprio Curso que, sem dúvida alguma, virá conferir ao

Departamento maior identidade, maior força, respeito e

confiabilidade a nível desta Universidade e da sociedade como um

todo. (PROJETO..., 1988, f. 107).

E quanto à alocação do curso, a professora Socorro Polary assim se

manifesta: "[...] nos parece ser mais uma questão de revisão do nome do

Centro (Estudos Básicos) que, a nosso ver, não define sua abrangência,

questão que deve ser estudada e repensada na UFMA" (PROJETO..., 1988,

f. 107).

Como se pode perceber, essas observações demonstravam o nível de

insatisfação dos professores do Departamento de Psicologia em aceitar

prorrogar por mais tempo a implantação do curso. De um lado, não

contavam com situações ideais de funcionamento — como, aliás, é a

situação até o presente (2002) —, de outro, tinham que admitir a mudança

do curso para outro Centro, isto porque o Departamento, desde a

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implantação da departamentalização em 1970, fazia parte do Centro de

Estudos Gerais (primeira denominação do Centro de Estudos Básicos) e

havia uma promessa de que, no novo prédio a ser construído, o curso teria

espaço destinado a suas instalações.

Com a aprovação do parecer da professora, o Diretor do Centro de

Estudos Básicos, professor Moacir Antônio Col Debella, enviou o Projeto... (1988),

em julho desse ano, para apreciação pelo Conselho Universitário

(CONSUN). Em seu despacho um dado chama atenção no que se refere à

alocação do curso:

[...] tendo em vista também, além do argumento levantado pela relatora,

que o Centro programou, em termos de espaço físico, laboratório e

salas de professores [...] será o primeiro curso de Psicologia do

Brasil a iniciar suas atividades com um Centro de Psicologia Aplicada,

que comportará diferentes equipamentos e salas especiais a servirem

tanto à comunidade quanto à clientela do curso no novo prédio do

CEB. Desta forma seria um contra-senso deslocar o curso para o Centro

de Ciências Sociais. (PROJETO..., 1988, f. 108).

O espaço físico que era um fator importante para o funcionamento

do curso, simplesmente não existia. Embora tivesse sido solicitado desde a

proposta de criação, somente foi conseguido em 1995, quando da

administração do Reitor Aldy Mello de Araújo. O investimento por parte

da UFMA na construção de um novo prédio para instalação do Núcleo de

Psicologia Aplicada, com todo o equipamento de laboratório e campo de

estágio específico, já visava à futura implementação da habilitação

Formação de Psicólogo, que não podia mais ser adiada, sob pena de causar

prejuízos aos alunos, à própria Universidade e à comunidade maranhense.

Esse processo foi agilizado com a colaboração do professor do

Departamento de Psicologia, Moacir Antônio Col Debella, que na época

assumira a direção do Centro de Estudos Básicos. Embora considerasse sua

participação como modesta, seu próprio relato mostra a importância de sua

atuação:

[...] este apoio se traduziu pela preocupação em adquirir o Laboratório de

Psicologia, a ser organizado no novo prédio com a participação do

professor Houshang Khazarai, que desenvolveu o projeto estrutural,

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definiu equipamentos e acompanhou a implantação, sendo que sua saída

da UFMA, antes do término dessa implantação prejudicou sensivelmente

a execução do projeto, que só foi reorganizado a partir da entrada de

psicólogos no Departamento, após a realização dos concursos.

Nesse sentido, a questão do melhor lugar para o curso se instalar

estava praticamente solucionada, uma vez que o parecer posterior emitido

pela Secretaria dos Colegiados Superiores foi favorável à permanência do

curso no Centro de Estudos Básicos (CEB), com a proposta de criação do

novo prédio com instalações destinadas a atender ao curso. Dois aspectos

chamam a atenção: de um lado, o nome do Centro, que deixou de ser

relevante quando passou a se denominar Centro de Ciências Humanas

(CCH); e de outro, a afirmação do Diretor de que havia a intenção de

posteriormente ser incluída a habilitação Formação de Psicólogo, que

nesse período não tinha possibilidade de ser implantada.

Depois de entregue, em 12 de julho desse ano, pelo Centro de

Estudos Básicos para ser votado no Conselho Universitário, o Projeto...

(1988) foi retirado de pauta em agosto do mesmo ano, a pedido da

Administração Superior, por falta de recursos necessários à implantação de

um novo curso à época, retornando à PROG por solicitação daquele órgão

e voltando à Secretaria dos Colegiados Superiores em 30 de outubro de

1990, para ser apreciado na sessão do CONSUN, de 05 de novembro de

1990, através da relatora Iraci de Jesus Barros Malheiros. O CONSUN foi

favorável à criação do curso, após considerar que o currículo fora

atualizado e após ouvir o Diretor do CEB a respeito dos entendimentos da

Administração Superior com o Departamento de Psicologia sobre a

possibilidade de serem colocados três funcionários formados em

Psicologia para dar apoio ao curso em tempo total ou parcial. Aprovado,

por unanimidade, o parecer da relatora se transformou na Resolução n°

13/90-CONSUN, onde consta que o Processo n° 000768/88-24, em

decorrência da premência do tempo, necessitava ser atualizado. Para tanto,

uma comissão deveria ser designada pela PROG, para proceder à revisão

do Projeto... (1988) e submetê-lo novamente à aprovação do Conselho

Universitário no prazo de 5 (cinco) meses.

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Em janeiro de 1991, a Pró-Reitoria de Graduação designou um

grupo de estudo para proceder à atualização do Projeto... (1988), através da

Portaria n° 001-PROG, composto por quatro técnicos e dois professores, a

saber: Alzira Maria Barbosa Pinheiro Nunes (coordenadora), Claudia

Sousa Bacelar (psicóloga), Edna Antonia Pinheiro Costa (técnica em

assuntos educacionais), Heloisa Moreira Lima Leite (professora do

Departamento de Psicologia), Moema Figueiredo Viana Pereira Brandão

(advogada) e Teresinha de Jesus Rocha Raposo (professora do

Departamento de Psicologia), com data limite de entrega em 31 de março

de 1991. De acordo com o documento, a comissão solicitou a prorrogação

do prazo de entrega, considerando ser o projeto uma experiência inovadora

e destacando a necessidade de subsídios que assegurassem uma estrutura

adequada para a implantação do curso, fazendo-se necessária a

participação de um consultor junto à equipe.

O projeto de reformulação ficou pronto em janeiro de 1992 e

aprovado pela Resolução n° 08/92-CONSUN. Nele ocorreram mudanças:

no currículo, como se observará mais adiante; nos turnos de

funcionamento, de matutino-vespertino para véspero-noturno; na forma de

entrada no curso, quando havia a divisão de habilitações, passando a

escolha de habilitação a ser feita somente a partir do 7º semestre letivo, de

modo que o aluno só teria acesso a outra habilitação mediante novo

vestibular, ou mediante vagas para graduados; na implantação do regime

semi-seriado, com eliminação das disciplinas eletivas. Vale conferir como

algumas dessas decisões alteraram a dinâmica do curso.

No que diz respeito aos turnos de funcionamento do curso, essa foi

uma experiência que, na prática, demonstrou causar dificuldades para os

alunos, pois algumas disciplinas tinham suas aulas iniciadas no final do

turno vespertino e a maior parte se concentrava no turno noturno. Ao longo

desse tempo a situação vem sendo modificada, pois os alunos, a partir do

ano de 1999, iniciam suas atividades no turno vespertino e terminam no

primeiro horário do turno noturno. A proposta em estudo pretende

concentrar as atividades de sala de aula somente no turno vespertino, o que

ainda não foi possível devido à extensa carga horária, conforme a grade

curricular do curso.

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Quanto ao regime adotado, o semi-seriado está em vigor até o

momento (abril de 2002). Nesse regime a inscrição é realizada em blocos

de disciplinas em cada semestre letivo, o que também tem causado sérias

dificuldades para alunos e professores, uma vez que, em razão da entrada

anual dos alunos e da carência de professores as disciplinas só são

ministradas uma vez ao ano, ficando os reprovados sem condições de

cursar novamente a(s) disciplina(s). Contudo o Art. 3 da Resolução n°

02/94-CONSUN é esclarecedor parágrafos que asseguram ao aluno esse

direito:

§ 2° O aluno que não obtiver aprovação em mais de 02

(duas) disciplinas do bloco cursado será,

automaticamente, considerado reprovado e obrigado a

inscrever-se apenas nas disciplinas em que ficou

reprovado.

§ 3° Ficando reprovado em até 02 (duas) disciplinas

do bloco, o aluno deverá recuperá-las no término do

semestre letivo correspondente, desde que a soma total

das mesmas não ultrapasse 120 (cento e vinte) horas.

§ 4° O aluno terá direito a inscrever-se no bloco

fixado para o semestre letivo subsequente e cursar, sob

forma de 'dependência', até 02 (duas) disciplinas do

semestre anterior nas quais não obteve aprovação na

recuperação, desde que as mesmas não correspondam

a matéria do currículo mínimo (PROJETO..., 1993a,

f.110).

Entre outros problemas verificados ao longo desses 11 (onze) anos,

o mais comum é que, na maioria das vezes, na prática, o sistema semi-

seriado não acontece. Os blocos de disciplinas que deveriam ser cursadas

pelos alunos são alterados em decorrência da falta de professores. Devido a

essa escassez, torna-se delicada a ampliação do número de vagas, embora

exista demanda da comunidade. O curso oferece 30 (trinta) vagas anuais

(tendo sido acrescidas a partir do Vestibular/02 com mais 6 (seis) vagas).

Um ponto que merece ser comentado, é que o Departamento de Psicologia

se ressente de um quadro de professores para atender às recomendações do

regime adotado.

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Caberia aqui questionar o trabalho realizado pela comissão, quanto à

possibilidade da introdução, naquele momento, da habilitação de Formação

de Psicólogo, pois havia se passado 1(um) ano da entrega do projeto e a

comissão poderia ter sugerido uma mudança de direcionamento do curso,

contemplando essa habilitação, tendo em vista os protestos dos alunos que

vinham ocorrendo no interior do curso, como foi aludido anteriormente.

Em consulta à nova proposta apresentada pela comissão, no que se

refere ao projeto, observou-se que a apresentação, as ideias trabalhadas e a

justificativa permaneceram as mesmas do projeto original, embora a carga

horária tenha sido alterada para 3.390 (três mil, trezentas e noventa) horas

para o Bacharelado e 3.630 (três mil, seiscentas e trinta) horas para a

Licenciatura. No que se refere aos objetivos já citados ocorreram pequenas

mudanças na definição para o licenciado e para o bacharel, assim como no

perfil profissiográfico.

A alteração que se processou no currículo foi a inclusão e retirada de

disciplinas e adendos dentro dos eixos já existentes, conservando-se os

enunciados anteriormente apresentados. Conforme a reformulação e

atendendo à equivalência do Currículo Pleno da UFMA com o Currículo

Mínimo do Conselho Federal de Educação, a proposta apresentada ficou

assim definida:

1. Eixo das Macro-Teorias, em que foram mantidas as disciplinas

Teorias da Consciência I, II e III, Teorias do Inconsciente I e II,

Teorias do Comportamento I e II e Psicologia Evolutiva I e II,

adotando a nomenclatura Psicologia do Desenvolvimento I e II e

incluindo Teorias e Sistemas I e II;

2. Eixo da Filosofia, em que foi mantida a disciplina Metodologia

Científica, suprimidas Iniciação ao Pensamento Filosófico e

Antropologia Filosófica e incluídas Lógica, Filosofia da

Educação (Licenciatura) e Filosofia das Ciências Sociais;

3. Eixo da Sociologia, Antropologia, Psicologia Social, em que

foram conservadas as disciplinas Antropologia, Sociologia e

Psicologia Social I e II, foi retirada Antropologia Cultural e

introduzida Sociologia do Desenvolvimento;

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4. Eixo da História da Psicologia (antes sob a denominação de

Eixo da História Social da Psicologia), de onde foram retiradas

História da Psicologia Social no Brasil e Introdução à

Psicologia, e acrescentada História da Psicologia;

5. Eixo da Biologia, em que foi mantida Neurofisiologia I e II,

retirada Biologia e incluídas Psicopatologia I e II e

Neuroanatomia;

6. Eixo da Pesquisa, em que foi mantida a disciplina Estatística I e

II, suprimida Matemática e ainda as disciplinas Metodologia da

Pesquisa não Experimental em Psicologia e Pesquisa

Experimental em Psicologia, com a antiga nomenclatura e

adendos (Psicologia Experimental I e II);

7. Eixo Profissionalizante, em que foram conservadas Psicologia

Social Comunitária, Psicologia Social das Organizações,

Psicologia Escolar, Psicologia Ecológica, Medidas em

Psicologia, Dinâmica de Grupo e Relações Humanas,

Marginalidade Social e Psicologia do Excepcional, acrescidas

Psicofarmacologia, Psicolinguística, Psicologia da Criatividade,

Psicologia Diferencial, Psicologia Clínica, suprimida

Psicopatologia I e II (que passou a fazer parte do Eixo da

Biologia) introduzidas, para a formação pedagógica, Filosofia da

Educação, Prática de Ensino, Estágio Curricular e mantidas

Estrutura e Funcionamento do Ensino de 1 e 2° graus e Didática

(sem os adendos I e II);

8. Eixo do Ciclo Geral de Estudos, em que foram mantidas as

disciplinas instrumentais Métodos e Técnicas de Estudo e

Pesquisa Bibliográfica e Língua Portuguesa, além das

disciplinas da legislação específica, Estudo de Problemas

Brasileiros I e II e Prática Desportiva I, II, II e IV.

As disciplinas eletivas constantes no primeiro currículo, em função

do regime adotado, já não fazem parte desta grade curricular. Algumas

passaram para o Eixo Profissionalizante, outras foram retiradas (Psicologia

Preventiva, Sociologia do Desenvolvimento, Psicologia da Comunicação,

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Psicologia Aplicada à Administração, Introdução à Educação e Família na

Sociedade), ficando a disciplina Psicologia Industrial, com a nomenclatura

Psicologia Organizacional, incluída em reformulações posteriores

(PROJETO..., 1988, f. 121-122).

Procedida a revisão, o Projeto... (1988) foi enviado para o

CONSUN em 15 de setembro de 1992, quando o curso já se encontrava em

pleno funcionamento. O parecer da relatora Maria José das Mercês Farias

considerou que todas as alterações e, principalmente, o currículo do curso

foram atualizados pela comissão, atendendo às exigências legais,

conceituais e de formação profissional. Essa análise foi procedida após

uma síntese de todo o projeto do curso, especialmente no tocante à

estruturação curricular considerada bem elaborada a partir dos eixos

epistemológicos que, segundo ela, deveriam possibilitar a integração dos

currículos das disciplinas, o que evitaria o paralelismo, a dispersão e a

repetição.

Como se pode observar, a gestação do curso de Psicologia na

Universidade de Federal do Maranhão foi bastante demorada, com muitas

idas-e-vindas, ocasionando desgaste ao corpo docente do Departamento de

Psicologia e à comunidade, fazendo com que muitos alunos deixassem de

lado a opção pela Psicologia.

Uma questão crítica durante toda a trajetória do curso de Psicologia,

e que permanece até hoje — 2002, diz respeito à contratação de

professores. Essa necessidade, como se constatou, foi sentida desde sua

criação e observada por inúmeros pareceres constantes do projeto em favor

da composição de um quadro docente que atendesse à realidade do curso.

Segundo informações não oficiais, o curso deveria ter um quadro com 22

(vinte e dois) professores com regime de trabalho de Dedicação Exclusiva

(DE).

Quando o curso entrou em funcionamento, o Departamento de

Psicologia contava com 13 (treze) professores, sendo 2 (dois) doutores, 2

(dois) mestres e 9 (nove) especialistas. No período de 1990 a 1995, 1 (um)

professor solicitou exoneração e 10 (dez) se aposentaram, alguns deles

para não perder as vantagens oferecidas, em decorrência da implantação do

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Regime Jurídico Único, fato que atingiu toda a rede pública de

universidades. Assim, do antigo quadro permaneceram somente 2 (dois)

docentes, o que tornava a situação cada vez mais crítica, a ponto de ser

solicitada a abertura de concursos à Administração Superior. No período

compreendido entre 1991 e 1996, esses concursos foram sendo realizados,

em diversas áreas do conhecimento, permitindo a entrada de 20 (vinte)

professores, sendo 17 (dezessete) psicólogos, (12 graduados, 3

especialistas e 2 mestres), 2 (dois) médicos psiquiatras, 1 (uma) pedagoga

(com mestrado em Psicologia da Personalidade). Observe-se que 8 (oito)

desses novos professores tinham formação em Psicanálise, o que, de certa

forma, pode ter causado alguma influência no curso, como já se comentou

e se voltará a comentar a seguir.

Com relação ao primeiro concurso realizado nas áreas clínica e

escolar ocorreram dois fatos marcantes: para a primeira não houve

inscrições e para a segunda os candidatos não compareceram para a

realização dos exames. Isso demonstrou a principal dificuldade para a

criação do curso — a distância dos centros desenvolvidos, responsável

pelos grandes transtornos para a continuidade do curso, principalmente

devido ao regime adotado (semi-seriado). Então, para que os concursos

acontecessem, houve necessidade de comunicação com outras instituições

do Norte e Nordeste, em busca de candidatos para o preenchimento de

vagas, o que veio a ocorrer realmente. Daí a presença no Departamento de

Psicologia de professores oriundos de universidades do Pará, da Paraíba e

também do Rio de Janeiro.

Alguns acontecimentos motivaram a saída de 9 (nove) professores,

em consequência de situações variadas, entre as quais cumpre citar:

pedidos de exoneração da Instituição, transferência para outra Instituição,

ou para outro Departamento na própria UFMA, ocasionada por problemas

de relacionamento com alunos, com a Coordenação do Curso e a Chefia do

Departamento.

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Conseguiu-se entrevistar somente 2 (dois) desses professores, que

assim analisaram sua saída28:

Resumo os acontecimentos do meu amplo desapontamento com a

UFMA, pela total e contínua dificuldade e/ou falta de condições de

desempenho e desenvolvimento profissional. Isso desestimulou,

bloqueou, restringiu, dificultou e impediu a realização do meu

trabalho [resultando na exoneração a pedido da professora].

(INFORMANTE 1).

No meu caso pedi transferência para outro Departamento por não

concordar com os caminhos que o curso estava tomando [...] na época

de forma bastante improvisada, o que dificultava o trabalho dos

professores. Era impossível continuar sem a existência de normas

complementares específicas ao curso que era semi-seriado e véspero-

noturno. A Coordenação não possuía controle e os alunos faziam o

que bem entendiam. Considero, em linhas gerais, que esses, entre

outros, foram os principais motivos que me levaram a sair do

Departamento de Psicologia. (INFORMANTE 2).

Alguns dos professores que ficaram comentaram tais saídas da

seguinte forma:

Vários foram os professores concursados que pediram para sair do

Departamento de Psicologia. As razões foram desde doença, interesse

maior em dedicar-se ao consultório, envolvimento em situações

problemáticas com alunos do curso, as quais culminaram em

processos movidos pelos mesmos alunos em duas situações [...]

animosidades entre professores no próprio Departamento e desejo de

regresso à sua terra natal. Um caso único foi o de uma professora que

fez o concurso já com planos de pedir transferência [...] (DENISE

LÉDA).

Eu acredito que muitas pessoas que entraram para o quadro docente

do nosso Departamento, apesar de terem um bom conhecimento da

disciplina que iriam ministrar, não tinham experiência de magistério,

o que determinou muitos conflitos na relação professor-aluno. Outro

motivo foi um certo desencanto de alguns professores com a questão

28 Para essa resposta os informantes não autorizaram identificação.

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salarial, pois achavam que o consultório deles era mais interessante

que dar aula na Universidade. (GERALDO MELÔNIO).

Alguns professores, logo após iniciarem seus trabalhos como

docentes no Departamento de Psicologia, ficaram insatisfeitos com

fatos variados ocorridos, como o número de disciplinas e a

diversidade delas, já que deveriam lecionar disciplinas diferentes da

área do concurso a que se haviam submetido na UFMA. Ao lado

disso, havia o problema de relacionamento pessoal, naquela época

entre docentes, chefia, coordenação e alunos. (PAULA

FRASSINETTI).

A saída desses professores foi motivada por questões de conflitos

administrativos e acadêmicos. (MANOEL WILLIAM).

As repercussões desses episódios provocaram, em 1995, a saída do

chefe do Departamento e da coordenadora do curso. Soma-se a isso o fato

de que nenhum dos professores, a partir daí, se sentia em condições de

assumir esses cargos, o que obrigou a Administração Superior a

estabelecer um prazo para que os docentes se pronunciassem. O impasse

continuou ainda por algum tempo, quando os professores foram

informados de que um interventor seria colocado para administrar esses

setores. Desse modo, a Assembleia Departamental solicitou a presença do

Reitor para melhores esclarecimentos sobre a situação. O Reitor enviou a

Pró-Reitora de Graduação em seu lugar, que informou a intenção de

realmente indicar um interventor para o Departamento e a Coordenação,

caso os professores não assumissem os cargos. Após muitas discussões,

três professores resolveram aceitar, sob a forma de comissão, os dois

cargos, até que fossem realizadas as eleições. Antes que elas ocorressem,

dois professores concordaram, a pedido de Reitor Aldy Melo de Araújo,

em assumir os referidos cargos como pro-tempore. Para o Departamento, a

professora Paula Frassinetti da Silva Sousa e, para a Coordenação, a

professora Denise Bessa Léda. Procurou-se saber o que motivou essa

situação, obtendo-se respostas bastante reveladoras. O professor Manoel

William Ferreira Gomes, que estava na chefia do Departamento de

Psicologia nessa época desabafou:

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Tendo chegado ao nosso conhecimento que o Reitor atribuiu

responsabilidade ao chefe do Departamento de Psicologia por

acontecimentos relacionados com o curso de Psicologia e, como

tínhamos a certeza de que em momento algum contribuímos para que

tais ocorrências viessem a se efetivar — ao contrário, sempre fizemos o

melhor de nós, pautado nas decisões da Assembleia Departamental —,

decidimos entregar, em caráter irrevogável, a função de chefe do

Departamento de Psicologia. Em virtude desse acontecimento, os

professores, em Assembleia, elaboraram uma exposição de motivos

enviada ao Reitor, solicitando a sua presença no Departamento para

esclarecimento dos fatos que ocasionaram nosso pedido de afastamento.

O Departamento ficou, então, sem chefia e sem candidatos a exercê-la.

Depois de algumas semanas e pela gravidade dos fatos, a Reitoria,

através da Pró-Reitora de Graduação, em reunião do Departamento

de Psicologia, solicitou mais uma vez que alguém se candidatasse à

chefia do Departamento, e à Coordenação. Não sendo atendido esse

pedido, haveria uma intervenção nesses setores. A Assembleia se

manifestou contrária a essa situação, e depois de muitas discussões

decidiu-se pela constituição de uma comissão, composta por três

professores, que permaneceu três meses assumindo as atividades

administrativas do Departamento e da Coordenação.

A professora Loide Brito, que era a coordenadora do curso de

Psicologia, disse:

Como coordenadora, à época, eu estava dentro de todo esse processo, mas

eu acho que a situação se tornou insustentável quando eu desaprovei a

atitude de uma professora que injustiçou uma aluna, rebaixando sua

nota. Além disso houve uma divisão de opiniões entre professores, uma

mudança brusca no Departamento com a chegada de muitos novatos em

um só momento e uma certa animosidade entre um grupo de professores

com alunos do curso. Em seguida, o assunto saiu do campo acadêmico e

foi para o político, envolvendo interesses pessoais. Em razão disso solicitei

dispensa da função.

O professor Geraldo Melônio, membro da comissão que assumiu o

Departamento de Psicologia e a Coordenação do Curso, assim se

posicionou:

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Foi um momento que eu chamo de crise institucional do Departamento e

da Coordenadoria do Curso, quando ninguém queria assumir esses cargos

em virtude de uma série de conflitos de difícil solução, até que o Reitor

foi chamado e nomeou uma comissão, da qual eu fazia parte, para tentar

minimizar os problemas. Os alunos foram importantes nesse processo,

pois eles sempre negociavam conosco em busca de soluções práticas,

durante reuniões com os professores. A comissão permaneceu em

atividade até duas professoras assumirem os cargos como pro-tempore.

Ainda no ano de 2001, os declarantes consideram que esse assunto é

algo difícil de comentar. Chegaram a perguntar se haveria mesmo

necessidade de falar-se a respeito. Segundo eles, relembrar esses fatos

considerados maléficos traria de certo modo muito sofrimento. As

lembranças a que se referem têm a ver com situações que levam a refletir

sobre a forma como se vivia, sempre esperando o pior, com Assembleias

Departamentais constantes e desgastantes. Nunca se sabia o que poderia

acontecer. Quando um professor solicitava exoneração, por força da luta

que se tinha para ver acontecerem os concursos, a preocupação era grande,

pois o quadro de professores para o curso, que a todo custo se queria

manter, parecia escapar ao controle e à vontade do grupo. Conversava-se

com os insatisfeitos, tentando demovê-los da ideia de abandonar o curso,

pois, afinal, algumas conquistas tinham sido alcançadas, embora esta

estratégia nem sempre desse bons resultados.

A situação se tornou tão insustentável que, em 08 de julho de 1996,

o Departamento de Psicologia, em Assembleia, resolveu encaminhar ao

Pró-Reitor de Graduação uma exposição de motivos através do Ofício n°

047/96-DE. PSI., solicitando a suspensão do concurso Vestibular/97 para o

curso de Psicologia. Tal exposição era justificada pela grave situação

existente, vez que na época o quadro docente se encontrava composto

apenas por 8 (oito) professores permanentes e 9 (nove) professores

substitutos, alguns deles com contratos em fase final. Some-se a isso que

os 3 (três) professores concursados em janeiro de 1996 ainda não haviam

sido efetivados em seus cargos. Como consequência 6 (seis) disciplinas do

curso deixaram de ser ministradas, alunos prestes a graduar-se não tinham

orientador para suas monografias, o Laboratório de Psicologia e o Núcleo

de Psicologia Aplicada não funcionavam por falta de docentes e,

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finalmente, o Departamento não vinha atendendo a todas as solicitações de

disciplinas dos outros cursos, num total de 37 (trinta e sete).

A professora Maria José das Mercês Farias, Diretora do

Departamento de Desenvolvimento de Ensino e Graduação (DEDEG), em

seu parecer, ratificou os dados contidos no documento, mas, por se tratar

de reduzir o total de ingressos no curso, sugeriu que tal situação fosse

analisada pelo Colegiado de Curso e decidida pelo Conselho de Ensino,

Pesquisa e Extensão (CONSEPE), sugestão que mereceu o apoio do Pró-

Reitor. O Colegiado de Curso, em reunião realizada no dia 26 de agosto de

1996, decidiu por unanimidade pela não realização do Vestibular/97. O

processo retornou ao Pró-Reitor que, após análise, emitiu parecer, dizendo

da impossibilidade de alterar decisões hierarquicamente superiores e

sugerindo que o referido processo deveria ser apreciado pelo Conselho

Universitário (CONSUN), o que não chegou a acontecer, ficando a UFMA,

sob a administração do Reitor Othon de Carvalho Bastos, com a

responsabilidade de agilizar a contratação dos professores concursados

com a garantia de mais professores substitutos para o quadro.

A continuidade desse tipo de prática, acarreta uma fragilidade no

sentido de que se torna impossível uma sistematização por sub-áreas de

conhecimento; o corpo docente é individualizado e não segue diretrizes

normativas e seletivas de estudo e pesquisa, tendo muitas vezes que

lecionar disciplinas para as quais não se sente bem preparado.

Notadamente há um esforço por parte do grupo em criar algumas áreas em

comum e distribuir mais equilibradamente as disciplinas entre os colegas,

evitando sobrecarga individual de trabalho. Assim é que as seleções para

os professores substitutos são direcionadas para as áreas em que há maior

carência de docentes, mas, assim mesmo, constata-se que a dificuldade

apresentada no início do curso persiste. O Departamento de Psicologia,

como se vê, continua enfrentando sérias dificuldades em relação ao

número de professores para compor seu quadro docente, constituído

(abril/2002) apenas por 14 (quatorze) professores efetivos e 10 (dez)

substitutos para atender a demanda de seu próprio curso, assim como os

demais cursos da UFMA que contemplam a disciplina Psicologia em seus

currículos.

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Tendo em vista as situações difíceis enfrentadas pelo curso após a

entrada da primeira turma, presença marcante na história do curso de

Psicologia da UFMA, pelo movimento empreendido por ela na busca da

implantação da Formação de Psicólogo (lembrada tanto pelos professores

que participaram do projeto das primeiras habilitações quanto pelos que

trabalharam na criação dessa nova habilitação), procurou-se saber quais as

necessidades que motivaram o surgimento desse processo, apontado por

todos os entrevistados como uma pressão dos alunos em todas as instâncias

da UFMA, como se pode ver a seguir:

Constatou-se que o mercado de trabalho para bacharéis e licenciados em

Psicologia não era tão promissor quanto se pensou inicialmente e que a

extrema ansiedade nascia entre os alunos que estavam preocupados com

a natureza do curso e com a atividade profissional que iriam

desempenhar. Na prática os alunos que ingressaram na Universidade

estavam motivados a ser psicólogos, e não professores ou pesquisadores

em Psicologia. (MOACIR COL DEBELLA).

Foram os alunos que brigaram muito por isto: entraram com a habilitação

de Bacharelado e Licenciatura e saíram do curso com a Formação de

Psicólogo [...] esse foi um mérito que se deve a eles. (HELOISA LEITE).

Tão logo os alunos tomaram conhecimento de que o curso não oferecia

essa habilitação, iniciaram uma luta em favor de sua criação. (LOIDE

BRITO).

Logo no primeiro ano sentiu-se a necessidade dessa implantação por

pressão dos alunos, através de seu representante no Colegiado de Curso,

que insistentemente apresentava em reuniões a solicitação de seus

colegas. Essa questão tomou proporções além da comunidade acadêmica,

exigindo uma posição da Administração Superior da UFMA [...]

surgindo daí uma comissão que elaborou o projeto da nova habilitação.

(MANOEL WILLIAM).

Fiquei tão surpreendida quanto os alunos da primeira turma ao saber que

o curso não formaria psicólogos. Posso deduzir, então, que a insatisfação

por essa condição ímpar impôs, por si mesma, o movimento no sentido

de mudá-la. (ALAYDE MARTINS).

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Acredito que a Psicologia Clínica surgiu em virtude de uma ampliação do

mercado de trabalho. (THAIS MORAES).

Decorridos dois anos de ingresso da primeira turma, já estava

evidente a necessidade de implantação da Formação de Psicólogo. Face a

essa realidade, a Assembleia Departamental e o Colegiado do Curso

decidiram proceder às alterações necessárias à sua implantação e à

reformulação curricular das habilitações já existentes, decorrentes do

Núcleo Comum de Formação. Para tanto foi designada uma comissão

composta pelas professoras Loide Célia de Brito, Cláudia Sousa Bacelar,

Alayde Maria Ferreira Martins e Denise Bessa Léda.

De acordo com a nova reformulação do projeto, Processo n°

9456/93-06, a comissão observou que não bastava incluir disciplinas ou

acrescentar carga horária, o que poderia comprometer a coerência da

proposta e a compatibilidade entre o currículo e o perfil profissiográfico do

aluno que seria formado. Assim, na apresentação do projeto, foi feita uma

análise dos 30 anos de existência da Psicologia no Brasil como profissão,

tomando-se por base um processo de discussão coordenado em nível

nacional pelo Conselho Federal de Psicologia, a fim de obter-se uma nova

regulamentação da profissão, redefinindo a formação do psicólogo e sua

atuação no mercado. A comissão fez questão de incluir as mais amplas

formas de atuação em sua proposta, já que eram identificadas de modo

consensual no país, tais como: dissociação teoria-prática; prevalência de

posturas unidirecionais, parciais e estáticas; e ausência ou escassez de

disciplinas que assegurassem a formação de um juízo crítico e inovador,

características apresentadas como componentes do modelo de formação

profissional vigente.

Na tentativa de buscar a qualidade da formação profissional, a

proposta elaborada foi baseada em princípios norteadores relacionados em

itens que incluíam o agrupamento de disciplinas, explicitando-se sua

função para a formação profissional. Para tanto, a comissão apresentou,

entre outras, a seguinte justificativa:

[...] a necessidade de reformulação curricular das habilitações já

existentes decorre do fato de que o “'Bacharelado”, a “Licenciatura” e a

“Formação de Psicólogos” contam com um ciclo comum de estudos com

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duração de quatro anos. Desta forma, todas as disciplinas teóricas,

excetuando-se as de formação pedagógica, serão cursadas pelos alunos

das três habilitações em conformidade com os princípios [norteadores]

que tentam superar a dissociação teoria / prática. Portanto, dispensar do

bacharel o conhecimento sobre a teorização já elaborada a partir das áreas

de atuação profissional, ou, do psicólogo e do licenciado, os

conhecimentos requeridos para a pesquisa, por exemplo, seria reforçar a

distinção entre um profissional apto a pesquisar (sem conhecer

suficientemente as questões apresentadas pela prática) e um profissional

da técnica (incapaz de teorizar sua própria prática). (PROJETO..., 1993a,

f. 5).

As cargas horárias destinadas às habilitações foram de 3.840 (três

mil, oitocentas e quarenta) horas para o Bacharelado; 4.080 (quatro mil e

oitenta) horas para a Licenciatura; e 4.200 (quatro mil e duzentas) horas

para a Formação de Psicólogo. Essa distribuição tornou-se necessária para

diferenciar as habilitações, contemplando a parte diversificada do currículo

(PROJETO..., 1993a, f. 5-6).

A proposta de reestruturação do curso de Psicologia foi estabelecida,

conservando-se a maioria das disciplinas presentes na reformulação

anterior, acrescidas de outras, alterando-se a carga horária e o enunciado

dos eixos, que passaram a ser denominados de princípios norteadores,

conforme descritos abaixo:

1. formação teórica baseada numa fundamentação epistemológica

consistente, capaz de promover posturas críticas investigadoras

livres de dogmatismo, por meio de disciplinas que favoreçam o

discernimento a relativização do saber psicológico e o

questionamento dos fundamentos lógicos e éticos da Psicologia,

incentivando o posicionamento crítico e abrindo espaço para a

postulação de novas proposições teóricas (História e

Fundamentos do Saber Psicológico I, II e III, Filosofia das

Ciências Sociais, Sociologia, Antropologia Cultural e Estrutural,

Prática Profissional e Ética do Psicólogo I e II);

2. formação básica pluralista, fornecedora de análise comparativa e

crítica entre as diferentes concepções de homem e ciência, da

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qual fazem parte as teorias coexistentes na Psicologia,

distribuídas em disciplinas organizadas em eixos de macro-

teorias definidos de acordo com seus fundamentos

epistemológicos, cuja carga horária equitativamente distribuída

entre os eixos reflete a recusa do pré-julgamento e/ou das opções

teóricas não fundamentadas (Teorias do Comportamento I, lI e

III, Teorias da Consciência I, II e III, Teorias do Inconsciente I,

II e III, Psicologia do Desenvolvimento I, II e III);

3. incentivo à integração entre as funções práticas e científicas do

profissional, por meio da metodologia do ensino e de ementas,

que asseguram a prática de investigação voltada

preferencialmente para a realidade sociocultural, cujos

conhecimentos instrumentais agrupam disciplinas que oferecem

meios indispensáveis à produção do conhecimento e à formação

técnico-profissional, onde saberes afins constituem-se em

instrumentos para distinção e delimitação do campo de

investigação e atuações profissionais (Metodologia Científica,

Métodos e Técnicas de Estudo e Pesquisa Bibliográfica,

Estatística I e II, Metodologia da Pesquisa não Experimental em

Psicologia, Lógica, Psicolinguística, Neuroanatomia,

Neurofisiologia, Psicofisiologia, Psicofarmacologia,

Psicopatologia I e II, às quais é acrescida a disciplina "Língua

Portuguesa" obrigatória, àquela época, em toda a UFMA pela

Resolução n°40/88 do CONSEPE);

4. formação que destaca a intervenção profissional, privilegiando a

produção teórica sem restringi-la a simples execução técnica,

onde a área do saber aplicado agrupa conhecimentos diretamente

ligados à formação técnico-profissional, oferecidos em

disciplinas que buscavam preservar a distinção do objeto

conceitual, apesar de atreladas ao currículo mínimo e à realidade

empírica das áreas de atuação profissional (Psicologia da

Aprendizagem, Psicologia Social I e II, Psicologia Escolar,

Psicometria, Técnicas de Exame I e II, Psicologia

Organizacional, Psicologia Hospitalar, Psicologia do

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Excepcional I e II, Aconselhamento Psicológico I e II,

Psicomotricidade, Teorias e Técnicas Psicoterápicas I e II,

Dinâmica de Grupo e Relações Humanas, Psicopedagogia

Terapêutica, Seleção, Treinamento e Orientação de Pessoal);

5. busca de identificação e consolidação de áreas de atuação

profissional emergentes, através de uma visão pluralista da

realidade do campo de atuação do psicólogo e de uma visão

ampliada das concepções tradicionais das áreas já consolidadas

(clínica, escolar, organizacional, social), que têm no Estágio

Curricular a orientação para o exercício de uma prática

fundamentada em posicionamentos teóricos explicitados, a fim

de que o exercício profissional não se restrinja à reprodução de

técnicas determinadas a priori por concepções pré-formadas do

campo de atuação profissional;

6. legislação específica que faz constar ainda no currículo pleno a

disciplina Prática Desportiva, por força da Resolução n° 07/93-

CONSUN (PROJETO..., 1993a, f. 3-4).

Considerando-se o redirecionamento do currículo ora apresentado,

pode-se traçar uma correlação entre os dois currículos. Os princípios 1 e 2

correspondem aos Eixos Macro-Teorias, Filosofia, Sociologia,

Antropologia, Psicologia Social e História da Psicologia; o princípio 3

corresponde aos Eixos Biologia e Pesquisa; e os princípios 4 e 5

correspondem ao Eixo Profissionalizante. A legislação específica

corresponde ao Eixo Ciclo Geral de Estudos, com a retirada da disciplina

Estudo de Problemas Brasileiros. Esse projeto encontra-se em vigor,

embora, como se verá mais adiante, nova proposta de reformulação tenha

ocorrido e outra já esteja em processo.

A implantação da habilitação Formação de Psicólogo, juntamente

com a reformulação do currículo no curto espaço de tempo de

funcionamento do curso, foi justificada pela comissão a partir das

seguintes situações constantes no Projeto do Curso (PROJETO..., 1993a, f.

7), tais como:

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a) a insatisfação geral dos alunos do curso, face à inexistência da

Formação de Psicólogo;

b) a brusca diminuição de demanda da comunidade pelo curso que,

da 3ª posição no concurso vestibular de 1991, caiu para a 11ª em

199229 (APÊNDICE B);

c) a grande evasão registrada no decorrer dos anos de 1991 e 1992,

através de transferência externa e abandono, que equivaleu, na

primeira turma, a uma redução de quase um terço do número

inicial de alunos (dos trinta que ingressaram restaram vinte e

dois), dos quais uma média superior a cinco alunos tomou

providências para efetuar suas transferências para outras

Instituições de Ensino Superior que ofereciam a Formação de

Psicólogo;

d) o mercado de trabalho para o psicólogo no Maranhão,

particularmente em São Luís, evidenciava a carência da atuação

desse profissional, ao passo que, enquanto licenciados e

bacharéis, os egressos deparar-se-iam com a oferta hipertrofiada

de professores de 1° e 2° graus mal remunerados e com a

ausência de incentivo e tradição na área da pesquisa;

e) a aquisição de todo o equipamento necessário à instalação de um

Laboratório de Psicologia pela UFMA que destinara espaço

físico no novo prédio do Centro de Estudos Básicos para a

instalação de um Núcleo de Psicologia Aplicada o que, além de

outros objetivos institucionais, tinha como meta primordial

constituir-se em campo de estágio específico para a formação do

psicólogo.

O documento finaliza afirmando que continuar adiando as

providências quanto à implantação da habilitação Formação de Psicólogo

se constituía em prejuízo, não só aos alunos, mas à Universidade e à

comunidade maranhense. Esse entendimento pôde ser verificado quando,

29 Em pesquisa posterior esta informação foi alterada conforme quadro anexo.

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em 1997, ano da graduação da primeira turma, somente 18 (dezoito) alunos

concluíram o curso.

Conforme tabela anexa (APÊNDICE A), a 3ª posição no concurso

vestibular de 1991 foi corrigida para 2ª, em razão de a divisão do curso de

Direito em turnos ter sido equivocadamente considerada como dois cursos.

Em 22 de setembro de 1993, a Coordenação do Curso, após

aprovação pelo seu Colegiado em 02 de setembro, encaminhou para

apreciação do Conselho de Centro (CONCEB) o Projeto... (1993a), com a

proposta de implantação da habilitação Formação de Psicólogo e da

reformulação curricular das habilitações Licenciatura e Bacharelado. De

acordo com observações colhidas no documento, a relatora Regina Helena

Martins de Farias, após verificar a adequação da proposta de reforma

curricular às normas sobre currículos existentes na UFMA, emitiu seu

parecer com questões que deveriam ser respondidas pela Pró-Reitoria de

Graduação.

Segundo seu entendimento, para o profissional com a Formação de

Psicólogo, o mercado de trabalho acenava com possibilidades abrangentes;

contudo, para as outras habilitações, o mesmo não ocorria. No caso do

licenciado, estava definida sua atuação, mas o mercado de trabalho não era

propício, afirmando a relatora que a disciplina Psicologia já não constava

do currículo da maioria das escolas de 2° grau; além disso, destacava a

extensa carga horária destinada ao 9° (nono) período, num total de 600

(seiscentas) horas, entre teoria e prática para serem cumpridas no turno

noturno, onde se encontrava o maior número de disciplinas, questionando,

nesse aspecto, sua operacionalização. Para o bacharel, as colocações feitas

questionavam a atuação desse profissional e indagavam se o Conselho

Federal de Psicologia permitia a retirada dessa habilitação, constatada a

sua inexistência no projeto do estágio obrigatório.

Em 30 de setembro de 1993, o parecer foi encaminhado à PROG,

que respondeu justificando ter sido o projeto elaborado por professores do

curso e aprovado por seu Colegiado. Sugeriu, então, sua devolução para a

Coordenação do Curso no sentido de que esse órgão prestasse informações

sobre o projeto para posterior parecer. Para tanto, anexou o Parecer n°

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403/62, a Resolução de 19 de dezembro de 1962, a Lei n° 4.119/62, o

Decreto n° 53.464, a Resolução n° 9, de 10 de outubro de 1969, a Portaria

Ministerial n° 159/65, que fixa os novos critérios e a duração dos cursos

superiores, a Resolução n° 37/90-CONSEPE, que disciplina o

funcionamento do Estágio Curricular, e a Resolução n° 04/81- CONSUN,

que trata dos turnos de funcionamento da UFMA.

A Coordenação do Curso, em reunião de Colegiado, procedeu aos

ajustes que julgou necessários, mas decidiu manter a oferta do

Bacharelado, incluindo o estágio e a ementa correspondente, mantendo o

horário nos turnos véspero-noturno, considerando o elevado total de carga

horária no curso. Após novo parecer, emitido também pela relatora Regina

Helena Martins de Farias, o projeto foi aprovado em sessão do Conselho

Universitário do dia 04 de março de 1994 através da Resolução n° 02/94-

CONSUN, com a criação da Formação de Psicólogo e a reformulação do

curso de Psicologia nas modalidades de Bacharelado e Licenciatura.

Desse modo, ficou assegurada a habilitação almejada para os alunos

ingressos desde 1991, tendo sido os currículos adaptados em atendimento

às novas exigências da Resolução.

Pelo que se percebe, a comissão que reformulou o projeto deveria ter

sugerido a alteração do parágrafo 1º do Art. 16, da Resolução 02/94-

CONSUN, que diz:

A partir do 9° semestre letivo o aluno deverá seguir o Bacharelado,

Licenciatura Plena ou Formação de Psicólogo em conformidade com sua

opção pessoal, formalizada no semestre imediatamente anterior.

Admite-se isso por se entender que essa orientação se constitui em

uma forma excludente entre as habilitações. Esse aspecto é considerado,

até hoje (abril de 2002), desfavorável para o aluno em vista da escolha de

uma única habilitação, impossibilitando-o de graduar-se em outra. Talvez

por esse motivo, durante esses 11 (onze) anos de curso, nenhum aluno

tenha optado por outra habilitação que não fosse a de Formação de

Psicólogo. O aluno tem questionado a situação em que se encontra e a

Coordenação do Curso está tentando resolver esse impasse, na nova

proposta de reformulação curricular em estudo.

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No tocante à necessidade de reformulação curricular, os informantes

afirmaram:

Ainda em 1992, o Colegiado do Curso de Psicologia iniciou estudos,

visando a uma reforma curricular, ou melhor, à criação da habilitação

Formação de Psicólogo. Naquela época o projeto foi elaborado e seguiu

as tramitações legais dentro da UFMA para aprovação. (PAULA

FRASSINETTI).

[...] lembro que naquela época eu fazia parte do Colegiado do Curso e

logo no início se propôs a reforma curricular, mas houve uma certa

resistência por parte da coordenadora, explicando os motivos, em níveis

acadêmicos e administrativos, da impossibilidade de realização naquele

momento [...] segundo ela o curso teria que amadurecer para poder

realizar isso. (MANOEL WILLIAM).

Em julho de 1999, o projeto do curso foi novamente reformulado.

Desta vez a reformulação ligava-se à necessidade de rever e implementar

uma nova caracterização e concepção pedagógica do curso, a partir de um

estudo desenvolvido pelo Núcleo de Avaliação de Cursos (NAC),

discussões no Colegiado do Curso e Assembleia Departamental, com base

nas propostas das Diretrizes Curriculares para os cursos de Psicologia no

país. Essas ideias foram reforçadas após a primeira visita da Comissão de

Avaliação do Ministério da Educação e Cultura (MEC) para

reconhecimento do curso nesse mesmo ano. Esse processo resultou em

significativas alterações, entre elas a retirada da habilitação de

Bacharelado, atualização de ementas, inclusão e exclusão de disciplinas,

explicitação das atividades práticas, aprimoramento da sequência das

disciplinas com melhor adequação da carga horária, em especial a do

Estágio Supervisionado. A duração do curso nessa nova proposta previu,

para a Formação de Psicólogo, um mínimo de 4.200 (quatro mil e

duzentas) horas; já para a Licenciatura, um mínimo de 3.150 (três mil,

cento e cinquenta) horas. Para tanto, a Pró-Reitoria de Graduação resolveu

instituir uma comissão através da Portaria n° 50/99-PROG, para o processo

de reconhecimento do curso, composta por técnicos daquele setor e

professores do Departamento de Psicologia, ficando assim designados:

Maria de Nazaré Ferraz Thomas, Maria Célia Macedo de Araújo Melo,

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Manoel Pereira Fonseca, Manoel William Ferreira Gomes, Márcia Antônia

Piedade Araújo, Denise Bessa Léda e Cada Vaz dos Santos Ribeiro.

Com os resultados do NAC, a comissão decidiu analisar

principalmente os conteúdos ministrados, considerando os aspectos

relevantes das disciplinas oferecidas, partindo de um amplo debate com os

professores do curso e de outros Departamentos, a fim de serem

encontradas alternativas para uma nova proposta de reformulação,

considerando-se ainda as propostas de implantação das Diretrizes

Curriculares, especialmente no que se referia às competências e

habilidades na formação do aluno. Nesse sentido, foram modificadas a

concepção do curso, o núcleo comum de formação, o perfil

profissiográfico, a finalidade do curso, os objetivos gerais e específicos

para cada habilitação, a pesquisa e a extensão a partir dos serviços

oferecidos pelo Núcleo de Psicologia Aplicada, que podem abranger as

áreas Psicologia Clínica, Psicologia Hospitalar, Psicologia do Trabalho,

Psicologia Escolar e Psicologia Social (PROJETO..., 2000, p. 1-2).

Visando à qualidade da formação profissional, a proposta apresentada se

apoiava em eixos estruturantes, que articulavam os conteúdos curriculares.

Com a finalidade de assegurar a objetividade da proposta, tais eixos

apresentavam um núcleo comum de formação, necessário ao profissional

de Psicologia, conforme será demonstrado a seguir:

1. fundamentos epistemológicos e históricos, que permitissem ao

formando uma visão do processo de construção do

conhecimento psicológico, desenvolvendo nele a capacidade para

avaliar criticamente diferentes teorias e metodologias em Psicologia

(História e Fundamentos do Saber Psicológico I e II, Filosofia

das Ciências Sociais, Introdução ás Ciências Sociais, Teorias da

Consciência I, Antropologia Cultural e Estrutural, Teorias do Inconsciente I,

Sociologia, Teorias do Comportamento I e Introdução à

Filosofia);

2. fenômenos e processos psicológicos básicos, que

desenvolvessem uma compreensão aprofundada dos fenômenos

que constituem, classicamente, o campo da Psicologia enquanto

ciência e, também, dos desenvolvimentos recentes nas diversas

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áreas de investigação psicológica (Teorias da Consciência II e

III, Psicologia da Aprendizagem, Teorias do Comportamento III,

Psicologia do Desenvolvimento I, II e III, Psicologia Escolar,

Psicologia Hospitalar, Psicologia do Trabalho I e Psicologia

Aplicada aos Portadores de Necessidades Especiais);

3. fundamentos metodológicos, que garantissem a apropriação

crítica do conhecimento disponível e a capacitação para a

produção de novos conhecimentos, assegurando uma visão

abrangente dos diferentes métodos e estratégias de produção do

conhecimento científico em Psicologia (Métodos e Técnicas de

Estudo e Pesquisa Bibliográfica, Metodologia Científica,

Teorias do Comportamento II, Metodologia da Pesquisa não

Experimental em Psicologia, Psicologia Social I e II e Teorias

do Inconsciente II);

4. procedimentos para investigação científica e prática profissional,

que garantissem tanto o domínio técnico envolvido no uso de

instrumentos de avaliação e de intervenção, quanto a competência para

construir, avaliar e adequar instrumentos a problemas e contextos

específicos de investigação e ação profissional (Técnicas de

Exame I e II, Psicodiagnóstico, Dinâmica de Grupo e Relações

Humanas, Prática Profissional e Ética do Psicólogo,

Aconselhamento Psicológico, Teorias do Inconsciente III,

Teorias e Técnicas Psicoterápicas — abordagem psicanalítica,

Teorias e Técnicas Psicoterápicas — abordagem —

existencialista e Teorias e Técnicas Psicoterápicas — abordagem

comportamentalista);

5. interfaces com campos afins do conhecimento — ciências da

vida, humanas e sociais —, que demarcassem a natureza e a

especificidade do fenômeno psicológico, de forma a torná-lo

perceptível em sua interação com fenômenos físicos, biológicos,

sociais e culturais e a assegurar uma compreensão integral e

contextualizada do campo de estudo da Psicologia

(Neuroanatomia, Psicofisiologia, Estatística Geral, Estatística

Aplicada à Psicologia e Psicopatologia I);

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6. práticas em campo, que assegurassem um núcleo básico de

competências, de forma a permitir a inserção do graduado em

diferentes contextos institucionais e sociais, articuladamente

com profissionais de áreas afins (Psicologia do Trabalho II,

Psicopatologia II).

É conveniente lembrar que o Estágio Supervisionado nessa

reformulação foi dividido em Básico e Curricular (PROJETO..., 2000, f. 3-

4).

As disciplinas eletivas propostas para essa reformulação foram:

Dinâmica de Grupo Aplicada à Seleção e Treinamento nas Organizações,

Educação Especial, Genética do Comportamento, Gestão de Pessoas,

História e Política Educacional no Brasil, Psicodiagnóstico Miocinético

(PMK), Psicofarmacologia, Psicolinguística, Psicologia Ambiental,

Psicologia Comunitária, Psicologia das Relações Familiares, Psicologia do

Esporte, Psicologia Hospitalar II, Psicologia Social III, Psicomotricidade,

Psicopedagogia Terapêutica, Saúde e Qualidade de Vida no Trabalho e

Psicologia da Terceira Idade.

Ainda nesse projeto, o aluno de Licenciatura deveria cursar as

disciplinas de formação pedagógica (Didática, Filosofia da Educação.

Estrutura e Funcionamento do Ensino Fundamental e Médio) e Prática de

Ensino — Estágio Curricular.

Ressalte-se aqui que, na elaboração desse projeto, houve a intenção

de proporcionar ao corpo discente a oportunidade de vivenciar uma

estrutura curricular que viesse atender ao perfil do profissional adequado à

realidade maranhense, embora não se distanciando da realidade nacional,

assim como de reverter situações que têm dificultado, como já exposto, a

vida acadêmica do aluno. Portanto, optou-se pelas propostas das Diretrizes

Curriculares, mesmo sem terem sido regulamentadas.

Concluídos os trabalhos, o Projeto... (2000), depois de aprovado no

Colegiado de Curso, foi encaminhado em 28 de agosto desse ano para o

Conselho de Centro de Ciências Humanas (CONCCH), a fim de ser

relatado. Em seu parecer, a relatora Márcia Manir Miguel Feitosa

considerou alguns aspectos positivos, entre eles os eixos temáticos, a

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duração do curso e a formação do profissional na habilitação Formação de

Psicólogo, sugerindo, contudo, algumas modificações, entre as quais que

fossem mais bem explicitados os motivos que nortearam a retirada da

habilitação de Bacharelado como um dos perfis, de formação do

profissional em Psicologia, de modo a configurar mais claramente,

inclusive, a escolha pela habilitação Licenciatura. Destacou, ainda, que

talvez fosse conveniente precisar quais eram as necessidades do Estado do

Maranhão, no que tange à formação do profissional de Psicologia, para que

houvesse maior adequação dos objetivos reais do curso à realidade

psicossocial.

Em resposta às observações emitidas pela relatora, o Colegiado de

Curso assim se manifestou: justificou a decisão de excluir a habilitação em

Bacharelado pela falta de demanda dos discentes no decorrer desses anos,

embora o principal objetivo dessa habilitação — a formação do

pesquisador —, estivesse sendo incorporada e sustentada pela formação

como um todo, podendo o aluno, se desejasse, desenvolver essa atividade,

optando pela pesquisa junto ao Núcleo de Psicologia Aplicada (NPA);

também fez questão de lembrar que, a partir dessa nova proposta, o aluno

deixaria de realizar apenas uma escolha entre as habilitações propostas,

restrição do modelo anterior. Quanto à necessidade de formação do

profissional no Estado, respondeu que a sugestão estava correta em

abstrato, mas que implicaria realização de pesquisas para obtenção desses

dados; que esforços estavam sendo empreendidos no sentido de adequar o

curso de Psicologia à realidade sociocultural; que o aluno contaria com

uma carga horária destinada a atividades complementares e haveria

inclusão de disciplinas nas diversas áreas de atuação, possibilitando uma

articulação teórica-prática baseada em possíveis necessidades; e,

finalmente, que a Licenciatura não seria uma escolha, pois já fazia parte do

curso desde sua criação.

Esse projeto não foi aprovado no Conselho de Centro de Ciências

Humanas. Está sendo objeto de estudo de várias comissões compostas de

acordo com as áreas da Psicologia, em conformidade com as

recomendações da Associação Brasileira de Ensino de Psicologia (ABEP),

que trata da formação em Psicologia, assim como as sugeridas no Projeto

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de Resolução, emitido pelo Fórum de Entidades Nacionais da Psicologia,

visando instituir as Diretrizes Curriculares Nacionais para os cursos de

graduação em Psicologia no país. Alguns pontos já acordados foram: a

reintrodução da habilitação de Bacharelado; a volta do regime de créditos,

visando contemplar as disciplinas eletivas; a carga horária do curso

permitindo a inclusão de reestruturação das atividades complementares, de

ensino, de pesquisa e de extensão.

Um dado que chamou a atenção no curso de Psicologia, durante

todos esses anos, foram os Estágios Supervisionados. Iniciados em 1996

apenas nas áreas de Psicologia Organizacional e de Psicologia Clínica, esta

com abordagem psicanalítica, somente a partir de 1997, com a nomeação

de mais professores, foram sendo definidos outros, entre eles o de

Psicologia Escolar e o de Psicologia Hospitalar, este também com

abordagem psicanalítica. No ano 2000, começou o estágio em Psicologia

Social e só a partir deste ano (2002) está sendo oferecido o de Psicologia

Jurídica. Observa-se, no entanto, uma preferência dos alunos para a prática

do Estágio Supervisionado na área clínica, apesar de só haver a

psicoterapia de base psicanalítica. Uma das explicações para esse fato é a

carência de professores com outras abordagens para essa atividade, de

modo a permitir ao aluno outras opções, conforme alusão feita

anteriormente. Isso tem direcionado o corpo discente a escolher outros

campos de estágio que, a princípio, podem não ser a sua primeira opção.

Esse dado pode ser comprovado pela contratação de um professor

substituto atuando como supervisor no Núcleo de Psicologia Aplicada na

linha comportamental, o que gerou uma demanda ainda maior pelo estágio

na clínica.

No que se refere ao reconhecimento do curso, foram realizadas duas

visitas pelo Ministério de Educação e Cultura (MEC), sendo a primeira em

julho de 1999 e a segunda em setembro de 2000. Estas Comissões de

Verificação foram constituídas pelos professores Maria Ângela Guimarães

Feitosa (Universidade de Brasília), Francisco José Batista de Albuquerque

(Universidade Federal da Paraíba) e Reinier Johannes Antonius

Rozestraten (Universidade Federal do Pará) — Portaria SESu-MEC n°

887/99, de 22/06/99 —, para avaliar "in loco", com base nos Padrões de

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Qualidade, as condições de funcionamento do curso de Psicologia da

UFMA, conforme o Processo n° 23017.000453/98-11, objetivando o

reconhecimento legal e consequentemente a expedição de diplomas.

Por ocasião da primeira visita, verificou-se a ausência de evidências

de que o curso havia sido previamente autorizado pelo MEC e apreciado

pelo Conselho Nacional de Saúde. Esses impasses foram solucionados

após esclarecimentos dos professores do Departamento de Psicologia e da

Pró-Reitoria de Graduação de que o projeto original, nas habilitações

Licenciatura e Bacharelado (e não o reformulado, que incluía a Formação

de Psicólogo) foi enviado diretamente ao MEC.

Conforme observado no documento expedido imediatamente pela

Comissão de Verificação, o parecer final dessa visita foi pouco favorável,

com as recomendações assumindo caráter de exigência, com a

determinação do prazo de 3 (três) meses para que fossem implementadas

pela Instituição. As mais urgentes foram as seguintes:

a) necessidade de cumprimento de exigências legais quanto à

autorização inicial do curso;

b) apresentação, pela Administração da Universidade, de um plano,

institucionalmente aprovado, de capacitação docente para os

professores de Psicologia, através da proposição de Mestrado

Interinstitucional ou de saídas individuais para aperfeiçoamento;

c) consolidação da documentação do curso de forma a assegurar

organização, atualidade e precisão;

d) apresentação, pela Instituição, de um plano de ampliação do

quadro docente com professores permanentes, de forma a

viabilizar uma diversificação dos referenciais teóricos dos

diferentes tipos de intervenção profissional a que os alunos

devem ser expostos e possibilitar um maior envolvimento dos

professores com atividades de extensão e pesquisa;

e) plano institucional de expansão e atualização cdo acervo

bibliográfico, quanto à aquisição de livros e de revistas

especializadas;

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f) projeto do curso, em especial sua concepção, melhor detalhado,

com as disciplinas contemplando atividades práticas, quando

necessário, revisão dos créditos referentes às diferentes atividades e,

principalmente, ao Estágio Supervisionado;

g) adequação das salas de aula ao tamanho das turmas, respeitadas

as exigências de conforto e salubridade.

Além dessas recomendações, a comissão destacou em suas

observações: a) o ponto fraco da exclusão das habilitações, uma vez que o

aluno, ao optar por uma delas, só terá acesso a outra através de novo

vestibular, ou, então, recorrendo ao reingresso como portador de diploma

de nível superior; b) o número insuficiente de professores com regime de

Dedicação Exclusiva, priorizando as atividades didáticas, inviabilizando a

pesquisa e a extensão; c) a proposta curricular que, apesar de respeitar o

currículo mínimo de 1962, não contempla inovações como também não

evidencia esforço de adaptação às necessidades regionais; d) as mudanças

nas disciplinas a serem ministradas pelos professores, em média três

disciplinas diferentes por semestre; e) os serviços assistenciais oferecidos à

comunidade, no Núcleo de Psicologia Aplicada (NPA), de acordo com a

disponibilidade docente e discente, e não com a demanda apresentada; f) as

dependências do Núcleo distantes do centro da cidade, sendo um motivo

do não alcance da clientela em potencial; g) a área física do NPA que,

embora compatível com o volume de atendimento, não permite uma

expansão para melhor conformidade com as necessidades pedagógicas e de

prestação de serviço à comunidade (BRASIL, 1999, p. 2-18).

Com as providências a serem tomadas, essa visita causou transtorno

para o curso, principalmente para os alunos já graduados, que

necessitavam do reconhecimento para poder atuar no mercado. Desse

modo, ao mesmo tempo em que a Coordenação do Curso, o Departamento

de Psicologia e a Administração Superior da UFMA trabalhavam para

sanar as deficiências detectadas, solicitou-se prorrogação do prazo por 6

(seis) meses para o cumprimento das exigências.

Conforme recomendado, a exigência legal foi atendida no que se

refere à consulta ao Conselho Nacional de Saúde. Além dessa, outras

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recomendações foram também atendidas, a saber: a documentação do

curso foi organizada e atualizada; para o plano de capacitação docente foi

firmado um convênio nos moldes de Mestrado Interinstitucional entre a

Universidade Federal do Maranhão e a Universidade do Estado do Rio de

Janeiro (UFMA/UERJ), para capacitação de oito professores do quadro

permanente; as salas de aula foram ampliadas; o projeto pedagógico do

curso foi reestruturado; e foram adquiridos livros e periódicos para o

acervo bibliográfico. Deixaram, no entanto, de ser cumpridas as exigências

de ampliação do quadro docente — embora tenha sido firmado um Termo

de Compromisso entre a UFMA e a Secretaria de Educação Superior

(MEC/SESu), no sentido de abertura de vagas tão logo sejam autorizadas30

— e da expansão da área física do NPA.

A segunda visita aconteceu no período de 13 a 16 de setembro de

2000. Desta vez, o documento não foi entregue de imediato e as

expectativas e dúvidas para o reconhecimento foram maiores. Em reunião

com os docentes do curso, a Comissão de Verificação, depois de proceder

à investigação do cumprimento das recomendações anteriores, considerou-

as cumpridas em grande parte, ressaltando o trabalho do corpo docente

bem como da Instituição na busca das soluções. No entanto, o curso

novamente não foi reconhecido, e sim estabelecido o prazo de 6 (seis)

meses para atender pontos que incluíam o acervo bibliográfico atualizado

quanto ao número de títulos e volumes de livros e de periódicos, não tendo

sido apresentado um plano institucional de expansão do acervo da área de

Psicologia; de efetivação do plano de expansão do corpo docente de forma

a viabilizar envolvimento mais abrangente em atividades de pesquisa e

extensão; de estabelecimento de relações mais claras entre a formação e a

atuação profissional, inclusive em relação ao exercício do Magistério; e de

atualização do conteúdo da disciplina Ética.

Além dessas exigências — que significam a percepção de

deficiências —, a Comissão Avaliadora verificou a grande carência de

ambiente adequado para o funcionamento do Laboratório de Psicologia

Animal e do Núcleo de Psicologia Aplicada (NPA). Para assegurar as

30 É interessante que o MEC exija, para a melhoria do curso, a ampliação do corpo docente, mas é

lamentável que esta mesma ampliação seja sempre protelada.

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condições éticas e sanitárias desses ambientes, recomendou que fossem

reformulados e separados fisicamente. Forneceu ainda sinais de que

recomendaria o reconhecimento do curso, mesmo que somente para os

alunos formados até aquela data.

Em junho de 2001, foi enviado para a UFMA o Relatório MEC/

SESu e o Parecer n° 125/2001-CES, do Processo n°23017.000453/ 98-11,

relatado pela conselheira Eunice Ribeiro Durham que, após a análise do

parecer apresentado pela Comissão de Verificação e as recomendações do

Relatório acima, votou favoravelmente ao reconhecimento do curso de

Psicologia, nas modalidades de Licenciatura e Formação de Psicólogo pelo

prazo de 1 (um) ano, quando a Instituição deveria atender às

recomendações da comissão, a fim de obter a renovação do

reconhecimento.

Observe-se que, nessa época, o curso já havia formado 74 (setenta e

quatro) alunos, impossibilitados de exercer a profissão por questões legais.

Em relação a esse ponto, o Relatório da Comissão de Verificação destaca:

O curso deve ser reconhecido para finalidade exclusiva de permitir

diplomação dos alunos que já o concluíram até a presente data, uma vez

que as exigências adicionais de cumprimento necessário não os

beneficiaria (BRASIL, 2001, p. 6).

Nesse momento (abril de 2002) está sendo providenciado o

atendimento a essas últimas recomendações. Em relação ao quadro

docente, foram destinadas três vagas para realização de concurso na

Carreira do Magistério, tendo em vista a autorização pelo Ministério31. O

acervo bibliográfico foi contemplado com aquisição de exemplares

provenientes do projeto do Mestrado Interinstitucional. Quanto ao NPA e

ao Laboratório de Psicologia Animal, foi enviado documento à

Administração Superior solicitando as modificações sugeridas pela

Comissão de Verificação.

31 Estas vagas nos foram destinadas pela percepção, por parte da Reitoria da UFMA, das

necessidades existentes. Na verdade fazem parte do conjunto de vagas ofertadas pelo MEC ao

total das universidades federais, conjunto que supre, no máximo, a 1/3 dos afastamentos do corpo

docente do Magistério Superior Federal.

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Conforme os informantes, o reconhecimento do curso tem sido

motivo de muito trabalho, visto que as recomendações do MEC têm prazos

definidos para serem cumpridas e envolvem toda a estrutura acadêmica e

administrativa da UFMA. Ressaltaram que, de acordo com as novas

políticas a serem empreendias pelo MEC a todos os cursos de graduação

no país, esse reconhecimento não será mais definitivo, pois passarão a ser

consideradas as avaliações realizadas pelo Exame Nacional de Cursos

(ENC) e as condições de oferta do curso.

Aqui, é importante lembrar que, a partir de 1995, um outro elemento

foi incluído no processo de avaliação dos cursos de graduação no país, o

Exame Nacional de Cursos, por meio da Lei n° 9.131 de 24/11/95,

conhecido como provão com a finalidade de ser um indicador de qualidade

do ensino nos cursos de graduação, num amplo processo de avaliação das

instituições de educação superior. Essa medida, até hoje (2002), não foi

bem aceita pelas instituições e pelos alunos, provocando muitos protestos.

Os exames começaram a ser realizados em alguns cursos no ano de 1996.

As avaliações dos cursos de Psicologia foram iniciadas em 2000,

consequentemente por duas vezes já aconteceram.

Na primeira avaliação do curso de Psicologia da UFMA, realizada

em junho de 2000, participaram todos os concludentes num total de 25

(vinte e cinco) alunos, obtendo-se o conceito C. Em novembro desse

mesmo ano, uma Comissão de Especialistas em Ensino de Psicologia

(CEEPSI), composta pelos consultores, professores Tânia Maria Santana

de Rose (Universidade Federal de São Carlos) e Romariz da Silva Barros

(Universidade Federal do Pará) veio proceder à Avaliação das Condições

de Oferta do Curso. O relatório apresentado apontou os seguintes

resultados: a avaliação do corpo docente e das instalações recebeu o

conceito CR (Condições Regulares), a organização didático-pedagógica

recebeu o conceito CI (Condições Insuficientes) e a avaliação das

instalações CR (Condições Regulares) (BRASIL, 2000, p. 42).

Essa avaliação de 2000, portanto, revela que o curso, como um todo,

apresentava extremas dificuldades. Aliás, se o corpo docente e as

instalações são somente "regulares" e a organização didática pedagógica é

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"insuficiente", como estranhar que o conjunto dos alunos concludentes

receba nota "C" no provão?

Em junho de 2001, foi realizada a segunda avaliação e 24 (vinte e

quatro) graduandos submeteram-se ao ENC, obtendo o conceito A.

Conforme a Portaria n° 1781, de 17/12/99, a avaliação considera o perfil

do graduando, as habilidades e o conteúdo programático objetivados no

curso de graduação em Psicologia.

O que causa estranheza é a rápida mudança do conceito dos alunos

no "provão" — de "C" para "A" — se, como se sabe, os efeitos de uma

transformação no corpo docente ou na organização pedagógica demoram

algum tempo para se fazerem sentir.

Foi traçado o percurso do curso de Psicologia da Universidade

Federal do Maranhão, com suas idas-e-vindas, o empenho dos professores,

a luta dos alunos, tudo objetivando fornecer uma formação de qualidade à

comunidade maranhense, ultrapassando aos poucos as dificuldades e

barreiras apresentadas durante esse processo.

5.2 Sobre o Centro Universitário do Maranhão

A partir do ano de 1989 ocorre mais uma mudança no sistema de

ensino superior, em São Luís, instaurando uma nova fase na história da

educação no Maranhão: a criação de cursos particulares. A primeira, no

Estado, foi o Centro de Ensino Unificado do Maranhão (FICEUMA), de

que faziam parte a Faculdade de Ciências Contábeis e Econômicas de São

Luís, a Faculdade de Filosofia Ciências e Letras "Gonçalves Dias" e a

Faculdade de Ciências Jurídicas e Administrativas de São Luís (CENTRO

DE ENSINO UNIFICADO DO MARANHÃO, 1998, p. 9).

Na criação destas Faculdades, observam-se aspectos semelhantes ao

que ocorreu nas outras instituições públicas de ensino no Maranhão32. Na

documentação oficial do Centro de Ensino Unificado do Maranhão

32 A esse respeito, cf. item 5.1 Sobre a Universidade Federal do Maranhão.

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(CEUMA) consta tratar-se de uma associação cultural e educativa que tem

por finalidade ministrar o ensino superior em áreas diversas e também o

ensino médio e que surgiu

[...] das necessidades educacionais de um Estado potencialmente rico, onde o

Ensino Superior se restringia a uma Universidade Federal e uma

Estadual, que ministram apenas cinco cursos no período noturno. Implantou-

se, assim, as FICEUMA com o objetivo de criar novas alternativas para os

que desejassem qualificação para o mercado de trabalho, embora não

pudessem ser estudantes profissionais. (PROJETO..., 1993b, não paginado).

Em 1990, a direção das FICEUMA solicita a unificação das

entidades mantenedoras das Faculdades numa única — o Centro de Ensino

Unificado do Maranhão (CEUMA) —, solicitação que é deferida através

do Parecer n° 939/90-CEF. A partir dessa unificação, foi adotado um

modelo de organização que permitiu a integração administrativa e didática

das Faculdades no sentido de uniformizar os procedimentos operacionais

da Instituição.

Nesse mesmo momento, ocorre de forma galopante a criação de

novos cursos nessa Instituição, entre eles o de Psicologia (1998), como se

verá adiante, cuja justificativa se baseia na necessidade social, decorrente

das mudanças estruturais no conjunto da organização espacial do Estado,

resultantes da aglomeração urbana ocasionada pelo fluxo migratório nas

últimas décadas do século XX.

Os projetos do Governo Federal, entre eles a Ferrovia Carajás-Ponta

da Madeira, a implantação do Distrito Industrial, as construções do Porto

do Itaqui, o Terminal Pesqueiro e a Base Espacial de Alcântara são

considerados os fatores que geraram os sérios problemas de ordem social

apontados pelo CEUMA. Associado a essa problemática foi ressaltado um

dos efeitos perversos do processo de urbanização, o habitacional, com o

surgimento de favelas na periferia dos municípios do Maranhão —

cortadas pela Ferrovia Carajás ou de alguma forma afetadas por algum dos

projetos — e mesmo na capital. A questão social, segundo o CEUMA, é

mais acentuada nesta cidade que, ao longo das últimas décadas, tem

sofrido uma degradação de qualidade de vida, ocasionada pela ocupação

espacial desordenada.

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Em seus 12 (doze) anos de funcionamento a Instituição alcançou

mais uma meta, que foi tornar-se Centro Universitário do Maranhão

(UniCEUMA), em 27 de setembro de 2000, através do processo de

reconhecimento do MEC — Parecer CNE/CES n° 839/2000. Seu objetivo

é galgar o nível de universidade.

5.2.1 O Curso de Psicologia do Centro Universitário do Maranhão

Conforme descrito anteriormente, a ideia da criação de uma

universidade particular no Maranhão surgiu quando seu principal dirigente

Mauro Alencar Fecury procurou colocá-la em prática, convocando um

grupo de professores e técnicos para iniciar a tarefa de sua concepção e

implantação, sendo constituída em 1989 como Centro de Ensino Unificado

do Maranhão (CEUMA). Contava, então, essa Instituição com 19

(dezenove) cursos superiores, atendendo a 8.472 alunos. Em sua estrutura

organizacional, com um Conselho Universitário (CONSU), órgão superior

de natureza deliberativa e normativa e de instância final para todos os

assuntos acadêmico-administrativos —; com um Conselho de Ensino,

Pesquisa e Extensão (CEPE), órgão central de supervisão das atividades de

ensino, pesquisa e extensão, possuindo atribuições deliberativas,

normativas e consultivas —; e com um Conselho de Curso, composto pelo

coordenador, seu representante nato, por 5 (cinco) professores e por 1 (um)

representante discente indicado pelo Centro Acadêmico. Além da sede

central, sua estrutura física é composta de dois campi, localizados em

bairros distintos da cidade de São Luís, com funcionamento nos turnos

matutino, vespertino e noturno.

Para a criação do curso de Psicologia do Centro Universitário do

Maranhão — UniCEUMA, foi elaborado um projeto de autorização em

1993, para o qual foi contratada como consultora a professora Eleusina

Rêgo Oliveira, que contou com a colaboração do professor Carlos Augusto

Ancilon Cavalcante e posteriormente com a professora Maria Lúcia

Martins Lobato e a professora Maria de Fátima Costa Teixeira. Constam

do documento a concepção, os objetivos, o perfil profissiográfico, a

organização curricular e a estrutura física, assim como a experiência na

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área educacional das 3 (três) Faculdades já existentes e seus respectivos

cursos, os órgãos de apoio e a justificativa da necessidade social para a sua

criação. Nesse ponto o documento assinala o meio ambiente, a economia, a

atividade industrial, o crescimento populacional, contemplando a situação

do ensino no Estado do Maranhão, do nível pré-escolar ao superior,

considerando os dados da época e as projeções.

Em seu projeto de autorização encaminhado em 1994, o

UniCEUMA solicitou 240 (duzentas e quarenta) vagas anuais distribuídas

em 120 (cento e vinte) por turno (diurno e noturno), com regime escolar

seriado anual para a habilitação Formação de Psicólogo, alocado na

Faculdade de Ciências da Saúde de São Luís. Nessa proposta, o curso

habilitaria o profissional para atuar em escolas, organizações e clínicas,

através da aplicação de conhecimentos psicológicos teóricos e técnicos. A

organização curricular foi elaborada nos termos da Resolução do Conselho

Federal de Educação de 19 de dezembro de 1962, embasada no Parecer n°

403/62 da legislação que criou o curso de Psicologia.

Especificamente em relação ao ensino superior no Maranhão, o

UniCEUMA justificou a criação do curso de Psicologia a partir da

demanda crescente à Universidade Federal do Maranhão (UFMA), através

de dados colhidos junto ao Ministério de Educação e Cultura (MEC), que

mostrou dispor a UFMA de apenas 30 (trinta) vagas anuais, não

conseguindo oferecer, segundo a proposta, oportunidades à maioria dos

interessados em graduar-se no curso.

Baseada nesses dados, a Instituição enumerou os seguintes aspectos

para explicar a criação do curso: atendimento às necessidades do ensino de

1° e 2° graus, tanto na capital São Luís como em todo o Maranhão,

indicando que há um efetivo crescimento na taxa de escolarização; relação

demanda-oferta de vagas para o curso ser 3,43 vezes superior à média do

país; processo de mudanças socioeconômicas e políticas, com destaque

para o pólo industrial do Estado, para a evolução portuária, com a

aceleração do transporte navegável, e, ainda, a Ferrovia Carajás, pelos

níveis elevados de transporte de produtos extrativos minerais; grande

número de pessoas interessadas nos turnos vespertino e noturno.

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O curso de Psicologia foi então autorizado — Processo n°

23000.006744/96-59 —, pela Portaria n° 206 de 06 de março de 1998

(PROJETO..., 1993b, não paginado). O processo de constituição desse

curso, conforme apresentado pelos docentes entrevistados, em linhas gerais

reforça a justificativa do projeto de autorização para o seu funcionamento,

pois havia uma demanda para psicólogos no Estado do Maranhão e

adjacências, portanto a necessidade de um curso com Formação de

Psicólogo, já que a UFMA oferecia apenas as habilitações de Licenciatura

e Bacharelado. Sobre esse aspecto, os professores entrevistados afirmam:

O curso perpassa todo o percurso histórico da necessidade de criação de

uma universidade particular no Maranhão [...] Foi estudando os cursos

onde havia maior demanda de alunos na sociedade maranhense, que se

pensou na criação do curso de Psicologia [...] mesmo existindo um curso

na UFMA, que oferecia 30 vagas por ano. (FRANCISCO SOUSA).

[...] tínhamos uma demanda e uma responsabilidade para com a

comunidade [...] evitando que as pessoas se deslocassem para a Paraíba e

outros Estados, resolvemos montar o nosso curso e hoje ele é uma

realidade [...] (CARLOS AUGUSTO CAVALCANTE).

O processo do curso do UniCEUMA foi elaborado em cima do processo

da Universidade Federal do Maranhão. Nós ficamos sabendo que o curso

da UFMA oferecia apenas Licenciatura e Bacharelado [...] sentindo esse

espaço, surgiu o interesse em criar um curso de Psicologia Clínica [...]

com uma visão holística, diferente do que estava sendo feito até então.

(MARCOS LIMA).

Como se pode observar, o processo de constituição do curso no

UniCEUMA, segundo os informantes, foi baseado na necessidade de uma

universidade, no Estado, que atendesse a elevada procura pelo curso e pela

habilitação Formação de Psicólogo, a fim de que se evitasse o

deslocamento para outros Estados. É interessante notar que essas

justificativas contradizem a realidade, tendo em vista que, a partir de 1993,

a UFMA havia feito as alterações necessárias em seu Projeto Pedagógico

para a implantação da habilitação Formação de Psicólogo que entrou em

vigor em 1994, descartando a necessidade de transferência para outras

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regiões. No entanto, o número pequeno de vagas oferecidas pela UFMA

ainda é uma realidade.

Após o envio do projeto de autorização, a Comissão de Especialistas

de Ensino de Psicologia da Secretaria de Educação Superior, composta

pelos professores Maria Ângela Guimarães Feitosa, Antônio Virgílio

Bittencourt Bastos e Olavo de Faria Galvão, designada pela Portaria SESu

n° 151/96, de 21 de fevereiro de 1997, procedeu à avaliação do projeto do

curso de graduação em Psicologia do UniCEUMA, Processo n°

23000.006744/96-59. A comissão, com base no Art. 40 da Portaria n° 181

de 23/02/96 do MEC, emitiu o Parecer Conclusivo n° 3.604/97-

DEPES/SESu, não recomendando a autorização solicitada.

Em outubro de 1997, o relator Yugo Okida, em seu despacho no

Processo n° 23000.005866/96-09-CES, antes de proceder à apreciação

final dos projetos de autorização dos cursos de Psicologia no país, decidiu

ouvir as instituições interessadas, entre elas o UniCEUMA, sobre o

relatório expedido pela comissão citada anteriormente, estabelecendo o

prazo máximo de 30 (trinta) dias para que a Instituição se manifestasse

sobre as observações contidas nesse documento.

Em atendimento a essa solicitação, o UniCEUMA respondeu em 18

de novembro de 1997, através do Ofício n° 09/97-CEUMA, comentando

os itens do relatório do Parecer Conclusivo, posicionando-se contrário a

alguns conceitos insatisfatórios, especificamente no que se refere à

caracterização do curso, no tocante ao regime escolar (vagas, turnos,

turmas), à estrutura curricular (na qual a comissão havia constatado a

insuficiência ou inexistência de algumas informações no Projeto

Pedagógico) e ao corpo docente (em relação à política de sua

remuneração), justificando para cada um deles os motivos de não

concordar com a avaliação. Finalmente, o UniCEUMA considerou a

pontuação obtida no Projeto Pedagógico favorável ao prosseguimento de

autorização do curso, haja vista os conceitos satisfatórios nos outros itens,

como a necessidade social (demanda por vestibular, importância para a

região), a estrutura curricular (compatibilização da carga horária ao

conteúdo), a biblioteca (acervo, área física, plano de expansão) e a

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infraestrutura física (edificação, salas de aulas, laboratórios,

equipamentos).

A essa análise o UniCEUMA juntou cópia do ofício enviado pela

Secretaria de Estado da Saúde do Maranhão que informava, a seu pedido,

sobre a necessidade social de criação de dois de seus cursos de graduação,

Odontologia e Psicologia — Formação de Psicólogo. O secretário e

presidente do Conselho Estadual de Saúde/SES/MA expediu então o

Ofício n° 036/GS/SES em janeiro de 1997, sugerindo, respeitosamente,

que o Ministro da Saúde recomendasse ao Ministro de Estado da Educação

e Desportos a aprovação desses cursos, por haver necessidade social

comprovada no programa de saúde do Governo do Estado, para a sua

criação, afirmando a inexistência de profissionais graduados suficientes

nessas áreas para prestar serviços de saúde à comunidade maranhense,

visto que o número de vagas oferecidas para o curso de Odontologia (da

UFMA) era insuficiente para suprir a necessidade que se apresentava à

época e, ainda, a inexistência do curso de Psicologia — Formação de

Psicólogo — no Estado do Maranhão.

Pelo que se vê, a necessidade de implantação do curso de

Odontologia não era tão premente como foi apresentada, pois, conforme

visto anteriormente, ele foi criado na segunda década do século XX, e,

mesmo vivenciando dificuldades, funcionou sem interrupções. Portanto, o

número de profissionais graduados durante todos esses anos, embora não

sendo suficiente, acredita-se que vinha atendendo à necessidade da

população. Com relação ao curso de Psicologia, parece que houve, no

mínimo, uma falta de informação, considerando-se a existência do curso de

Psicologia criado pela UFMA em 1991 que já graduava seus primeiros

alunos em Formação de Psicólogo, naquele ano de 1997.

Em 02 de dezembro de 1997 o relator Yugo Okida elaborou o

Parecer n° 705/97, referente ao Processo n° 23020.002126/96-56, que

tratava da autorização de novos cursos de Psicologia no país, e, em seu

Relatório/Mérito, analisando as observações do Conselho Nacional de

Saúde (CNS), quanto à necessidade social, observou que este órgão havia

se manifestado desfavoravelmente ao prosseguimento da criação de novos

cursos de Psicologia. Essa posição foi ratificada pelo Conselho Federal de

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Psicologia, ao considerar inoportuna a criação de novos cursos,

principalmente em universidades particulares. Em decorrência dos 153

(cento e cinquenta e três) pedidos de novos cursos de Psicologia, consta em

seu relato que foi constituída uma Comissão de Especialistas da SESu/

MEC para analisar os processos. O relatório conclusivo elaborado pela

comissão recomendou o prosseguimento da tramitação de apenas 4

(quatro) instituições, sendo 1 (uma) na região Centro-Oeste, 2 (duas) no

Nordeste e 1 (uma) no Sudoeste. Eis o que consta do Relatório/Mérito:

Considerando que em algumas regiões do território brasileiro, segundo

levantamento feito por meio da “Sinopse Estatística da Educação

Superior, Graduação, Censo Educacional 94”, editada pela Coordenação

do Sistema Estatístico da Educação do MEC, não existem cursos de

Psicologia em funcionamento ou que, ainda, carecem de profissionais da

área, como é o caso de alguns Estados como o Piauí, Amazonas, Pará,

Mato Grosso do Sul, Pernambuco, Rio Grande do Norte, Alagoas,

Rondônia, Acre, Roraima, Tocantins, Maranhão, Sergipe, Espírito

Santo, Goiás, parte do Paraná e Distrito Federal, solicitamos à SESu o

envio dos processos dessas regiões para uma análise mais acurada,

levando em conta que, além da possível necessidade de implantação do

referido curso nas regiões supra mencionadas, pudéssemos detectar

projetos que apresentassem alguns indicadores de qualidade.

(PROJETO..., 1993b, não paginado, grifo nosso).

O relator relembrou o despacho enviado anteriormente para as

Instituições e elaborou seu parecer, segundo ele, com base nas informações

obtidas, votando favoravelmente à continuidade da tramitação de 13 (treze)

processos de autorização, entre os quais o do UniCEUMA. Contudo, o

relator alertava que seria necessária a visita de uma Comissão Verificadora

ao local, para proceder-se à conferência das informações contidas no

projeto.

A criação de novos cursos de Psicologia no país era uma questão

que vinha sendo discutida e analisada pelas entidades representativas

(sindicatos e conselhos), em eventos realizados pela categoria. Por ocasião

do Congresso Unificado dos Psicólogos em Brasília, no ano de 1989, além

das problematizações das estruturas organizativas da profissão, tomaram-

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se, segundo Bock (1999b, p. 115), várias decisões acerca de pontos que

estavam em debate, entre elas

[...] a participação nas discussões da Lei de Diretrizes e Bases da Educação, o

apoio à criação do Conselho Federal do Ensino Superior e a defesa

intransigente do ensino público e gratuito, a criação de um fórum de

debates sobre a formação do psicólogo, a luta para impedir a

abertura de novos cursos de Psicologia, a necessidade de avaliar a

qualidade dos cursos existentes, a defesa de redução de vagas nos cursos

de Psicologia, o fechamento de cursos de má qualidade, a defesa da

supervisão de estágios de Psicologia só por psicólogos, a formação dos

psicólogos reorientada para as prioridades sociais, a garantia de um ensino

crítico e reflexivo, a extinção da hora/aula como forma de contratação no

30 grau, o incremento aos recursos de pesquisas [...].

Assim, em janeiro de 1998 o projeto de autorização para o

funcionamento do curso foi apreciado pela Comissão de Verificação do

MEC, composta pelos professores Olavo de Faria Galvão (Universidade

Federal do Pará), Maria Emília Yamamoto (Universidade Federal do Rio

Grande do Norte) e a técnica em assuntos educacionais Maria Célia

Macedo Araújo Melo (Delegacia Regional do MEC — São Luís — MA),

que, designados pela Portaria n° 697/97-SESu-MEC, de 31 de dezembro

de 1997, procederam à verificação das reais condições para o

funcionamento do curso de Psicologia do UniCEUMA com vistas à sua

autorização. Desse modo, a comissão avaliou, como consta no relatório

apresentado, entre outros dados, a confirmação da necessidade social

apresentada no projeto a partir da alta demanda por vestibular, a

necessidade de profissionais na área da Psicologia e a ausência de um

curso com formação regular de psicólogos.

Mesmo constatando a necessidade de profissionais no Estado, a

comissão, em suas recomendações, avaliou que 240 (duzentas e quarenta)

vagas seria um número excessivo, o que implicaria lançar no mercado

cerca de 200 (duzentos) profissionais por ano, muito além da necessidade

— um universo superdimensionado —, o que ocasionaria acelerada

saturação de profissionais, dificultando a manutenção da qualidade

almejada pela Instituição, já que na cidade de São Luís não existiam

muitos profissionais com pós-graduação stricto-sensu em quaisquer das

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áreas da Psicologia, e ainda era difícil a vinda de profissionais de outros

centros com esse perfil em curto prazo. A Comissão Avaliadora

recomendou a autorização para o funcionamento do curso de Psicologia

com a abertura de 120 (cento e vinte) vagas, possibilitando uma gradação

na ocupação do mercado profissional (PROJETO..., 1993b, não paginado).

Considerou ainda que a estrutura curricular apresentada no projeto

necessitava ser reformulada quanto ao currículo mínimo, adequando-o ao

perfil do profissional que atendesse às características regionais,

considerando três aspectos: o próprio projeto, montado em 1993, as

modificações da Lei de Diretrizes e Bases (LDB) e o trabalho realizado

pela Comissão de Especialistas do MEC. Resolveu-se que, embora a

Instituição tenha realizado a reformulação do currículo em relação ao

primeiro ano do curso, ela deveria estender-se para os demais anos. Além

disso, sugeriu-se que ela elegesse áreas prioritárias e as fortalecesse através

da contratação de pessoal qualificado, treinando e atualizando professores

nas respectivas áreas.

Embora a Instituição já houvesse alterado o quadro docente,

objetivando a autorização, a comissão considerou-o ainda fraco, mesmo

com formação compatível nas disciplinas que os docentes se propunham a

ministrar. Em suas recomendações sugeriu a contratação de pessoal com,

no mínimo, especialização e, preferencialmente, com mestrado, sendo

necessário um planejamento de qualificação formal, com previsão de

tempo para a pesquisa e extensão; uma qualificação formal dos seus

docentes (mestrado e doutorado), através de convênios, ou mestrados

interinstitucionais e, ainda, que fosse retirada a política de remuneração na

forma de hora/aula para a implantação do regime de trabalho em tempo

parcial e tempo integral (PROJETO..., 1993b, não paginado).

Em relação à biblioteca, considerada bastante adequada, a comissão

apenas recomendou a aquisição de periódicos nacionais e internacionais na

área da Psicologia. A infraestrutura física foi avaliada favoravelmente, com

laboratórios bem equipados, sendo recomendada apenas a construção de

salas de trabalho para os professores, prevendo-se a implantação dos

regimes de trabalho mencionados.

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A comissão, depois da análise realizada, emitiu parecer conclusivo,

autorizando o funcionamento do curso, enumerando os pontos essenciais

que a Instituição deveria ainda atender. Assim, conforme teor do

documento constante no projeto do curso, reafirma

[...] fortemente que a instituição: 1. Aprove rapidamente um

novo Plano de Cargos e Salários de Pessoal Docente prevendo a

contratação de docentes em regime de tempo integral, com carga

horária para atividades extra-aulas, desde atendimento de alunos

e preparação de aulas, até dedicação a pesquisa e serviços, e

condições para afastamento para pós-graduação stricto-sensu

com vencimentos em tempo parcial e integral, em São Luís ou

fora; 2. Redefina o Perfil do Profissional Psicólogo a ser

formada nas FICEUMA, que vai nortear a definição do currículo

pleno, em concordância com as Diretrizes Curriculares para o

Curso de Psicologia, em elaboração na SESU/MEC; 3. Adote

uma política de incentivos que permita a atração de um núcleo

mínimo de professores titulados, garantindo a excelência da

formação para a primeira turma. (PROJETO..., 1993b, não

paginado).

Em 17 de fevereiro de 1998, o relator Yugo Okida, no Parecer n°

136/98-CES, em seu Relatório/Mérito, comentou o Parecer n° 705/97-

CES, da Comissão Verificadora, que visitou "in loco" as instalações do

futuro curso, aprovando o prosseguimento da tramitação do processo

baseado nas análises da comissão citada e autorizando a implantação do

curso de Psicologia na habilitação Formação de Psicólogo. Após tal

análise, entre outras considerações, disse que dificilmente a Instituição

poderia redefinir naquele momento o perfil do profissional a ser formado;

que ela previa uma reformulação curricular tão logo fossem divulgadas as

Diretrizes Curriculares, tendo, para isso, designado uma comissão de

professores; e, finalmente, que vários benefícios foram propostos para

melhoria do corpo docente, os quais deveriam ser incrementados e

oficializados pela Instituição. Em seu voto, o relator foi favorável ao

funcionamento do curso, com 100 (cem) vagas totais anuais, divididas nos

turnos vespertino e noturno, como sugerido pela Câmara de Ensino

Superior. Embora tenha sido essa a decisão, o UniCEUMA oferece 100

(cem) vagas por semestre no vestibular.

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Antes da emissão desse Parecer, o UniCEUMA enviou um

documento, aprovado pelo seu Colegiado Superior, contendo o

regulamento do Magistério, onde incluiu, por sugestão da comissão, o

Plano de Carreira de Magistério — mesmo não sendo obrigado a

apresentá-lo — que previa a contratação de professores em tempo integral33

(PROJETO..., 2001, p. 29).

Em relação aos incentivos e vantagens para estimular a fixação e

melhoria do corpo docente, conforme sugerido pela comissão, o

UniCEUMA pretende criar um programa de pós-graduação

interinstitucional com a Universidade Federal do Pará em Teoria e

Pesquisa do Comportamento, objetivando promover a imediata

qualificação dos docentes. A escolha dessa Instituição deve-se à

proximidade geográfica, o que, segundo eles, torna possível a

concretização dessa iniciativa.

A partir das considerações da Comissão de Verificação, o projeto

que autorizou o funcionamento do curso foi revisto e atualizado em 2001,

servindo de suporte para atender ao curso e também para obter seu

reconhecimento, principalmente no que se refere à concepção, justificativa,

objetivos, perfil profissiográfico (habilidades básicas e profissionais),

filosofia educacional, missão do curso, princípios e fundamentos do curso,

organização do curso (eixos norteadores), conforme sintetizado a seguir.

O UniCEUMA explicita a Psicologia enquanto ciência e profissão

como um campo autônomo de saber que tem ainda uma curta história, mas

que vem aos poucos se consolidando. Esse fato poderá conferir à

Psicologia, dentre as profissões do futuro, um papel de destaque como uma

das mais promissoras. A Instituição assume seu papel no atendimento à

necessidade de formação de profissionais psicólogos, conforme se segue:

[...] toma para si parte da incumbência de constituir um pólo de

preparação de profissionais da Psicologia alinhados com o

desenvolvimento mais recente dessa peculiar ciência. Neste

33 Embora conste no projeto de reconhecimento do curso o regime de trabalho de 40 horas semanais ou DE

(Dedicação Exclusiva), na prática, o que se observa é que até o ano de 2001 os professores continuavam

recebendo por hora/aula, de acordo com a titulação que possuíam.

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contexto, em março de 1998, foi criado o Curso de Psicologia,

objetivando atender à demanda não só da Ilha de São Luís, do interior

do Estado, incluindo as mais longínquas localidades do Estado do

Maranhão e até outros Estados da região Nordeste [...] Nessa grande

região geográfica, o acesso ao serviço psicológico e ao ensino em

Psicologia tem sido basicamente possível pela vinda de profissionais de

outros Estados. Essa situação é a que ainda se vivencia hoje inclusive

para o desenvolvimento e estruturação do curso. (PROJETO...,

2001, p. 45).

O UniCEUMA justifica a implantação do curso pelo fato de o

Maranhão ter hoje (2001) cerca de 253 (duzentos e cinquenta e três)

psicólogos, de acordo com dados oferecidos pela representação do

Conselho Regional de Psicologia (CRP) local, sendo esse um número

insuficiente para atender à demanda do mercado que vem crescendo a cada

dia, nas diversas áreas da Psicologia e pelo fato de somente em 1991 a

Universidade Federal do Maranhão ter criado seu curso de graduação em

Psicologia, oferecendo, naquele momento, apenas as habilitações em

Licenciatura e Bacharelado (PROJETO..., 2001, p. 46).

Quanto aos princípios e fundamentos do curso, conforme o

documento, o aluno terá uma formação diversificada (generalista), o que

implica oferecer, desde cedo, disciplinas que deem boa fundamentação

teórica, mas que incluam também conteúdos e experiências práticas, que

ofereçam ao aluno oportunidade para realizar trabalhos de campo,

pesquisas acadêmicas, vivências relacionadas ao conteúdo estudado,

visando a um conhecimento horizontal orientado pela

multidisciplinaridade, de modo a favorecer a interseção da Psicologia com

as diferentes ciências, tanto no sentido epistemológico, quanto no sentido

da instrumentalização metodológica.

Através de sua filosofia educacional, o curso de Psicologia propõe

oferecer uma educação integral, compreendendo a totalidade do ser

humano, formando o cidadão crítico e transformador, preparando-o para o

exercício profissional, no que diz respeito à pesquisa e atualização

científica.

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Referente à missão, o curso oferece, nos últimos semestres, além das

disciplinas teóricas e práticas, o Estágio Supervisionado: o Básico, em 4

(quatro) áreas de atuação, e o Específico, com concentração em 2 (duas)

áreas, o que, de certo modo, vem minimizar falhas históricas da formação

do psicólogo quando era comum o aluno, ao chegar ao 5° ano, fazer opção

pelo estágio sem nenhum conhecimento concreto das áreas de atuação. Tal

medida permite a concentração em determinadas áreas de interesse do

aluno durante a sua formação.

O curso tem por objetivo a formação integral do psicólogo,

assegurando-lhe um sólido conhecimento, a partir de uma linha

praxiológica que lhe proporcione, como futuro profissional, efetivas

oportunidades de aperfeiçoamento pessoal e melhoramento da sociedade.

Outrossim, em seu perfil profissiográfico, o psicólogo, entre outras

características, deve apresentar um conhecimento abrangente de áreas afins

da Psicologia e o desenvolvimento de habilidades básicas e profissionais

que fundamentem o trabalho em equipe e possibilitem as efetivas práticas

interdisciplinares.

Em relação à organização (eixos norteadores), o curso busca

possibilitar ao aluno uma atuação progressista na construção do

conhecimento científico. Desse modo, a estrutura curricular contempla

disciplinas fundamentais à formação do profissional psicólogo generalista,

podendo desenvolver uma maior concentração em uma das áreas propostas

pelo curso (hospitalar, organizacional, clínica, escolar). Assim, as

disciplinas Antropologia, Sociologia, Filosofia, Psicologia Social ampliam

a visão dos alunos, levando-os a contemplar o social; as disciplinas

Genética Humana, Fisiologia Humana, Neuroanatomia, Psicofarmacologia

e Psicopatologia Geral oferecem uma melhor compreensão do homem no

aspecto biológico, podendo facilitar interfaces com outras ciências; e as

disciplinas Teorias e Técnicas Psicoterápicas Comportamentais, Teorias e

Técnicas Psicoterápicas Psicanalíticas, Teorias e Técnicas Psicoterápicas

em Gestalt e Teorias e Técnicas Psicoterápicas Humanísticas oferecem um

melhor entendimento das abordagens psicológicas através dos conteúdos

teóricos e práticos. Além dessas disciplinas há também as específicas das

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áreas de Psicologia Hospitalar, Psicologia Organizacional e Psicologia

Escolar.

Além do que é oferecido, cabe ao aluno complementar o currículo

com atividades extracurriculares como pesquisas, congressos, seminários,

encontros promovidos pela Instituição ou por órgãos da iniciativa pública

ou privada no Estado ou fora dele, com apoio e incentivo do UniCEUMA e

da Coordenadoria do Curso (PROJETO..., 2001, p. 53-54).

A estrutura curricular apresentada no projeto para autorização,

elaborada nos termos da Resolução do CFE de 19 de dezembro de 1962,

originária do Parecer n° 403/62, mantém congruência com os objetivos do

curso, o perfil do profissional e as condições socioculturais da região.

Assim, o currículo do curso previu inicialmente um sistema anual com um

total de 4.332 (quatro mil, trezentos e trinta e duas) horas, mas nas

reformulações subsequentes houve pequenas alterações, encontrando-se

em abril 2001 com apenas 4.064 (quatro mil e sessenta e quatro) horas.

Após a primeira reformulação curricular (solicitada pela Comissão

de Verificação), a estrutura do curso, para a entrada dos alunos em 1998,

conservou o sistema anual da distribuição de disciplinas nos dois primeiros

anos, alterando-o a partir daí para uma organização semestral. Na segunda

reformulação, em 1999, o aluno cursava um bloco de disciplinas

anualmente e os demais por semestre. Em 2000 e 2001, foi adotado o

sistema semestral. Além disso, algumas disciplinas do projeto de

autorização foram mantidas, outras foram suprimidas, algumas ganharam,

outras perderam adendos (I, II e III) e outras ainda mudaram de

nomenclatura. Assim sendo, a estrutura curricular foi alterada quatro

vezes, dificultando, pelo que se percebe, a passagem do aluno por esse

processo, pela exigência dos pré-requisitos e do aumento e diminuição da

carga horária total do curso. Vale frisar também um redirecionamento do

curso no que se refere às abordagens psicológicas, pois inicialmente havia

uma grade curricular com ênfase na abordagem comportamental e, com a

inclusão de disciplinas relativas ao Inconsciente, parece haver um

equilíbrio.

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Para melhor demonstração das sucessivas reformulações do

currículo, considerou-se necessária a construção de um quadro

(APÊNDICE C), que pudesse promover visualização mais fácil e

entendimento das modificações ocorridas no curso em tão curto espaço de

tempo, antes que houvesse, a graduação da primeira turma. As informações

sobre essas alterações, nesse sentido, foram escassas. O que se soube,

informalmente, e depois com as entrevistas, foi que as turmas

reivindicavam disciplinas que consideravam importantes para sua

formação.

A justificativa apresentada para as reformulações foi a de promover

uma adequação aos eixos norteadores, aludidos anteriormente. A

preocupação do curso em atender a formação dos alunos ficou explicitada

em sua própria organização, conforme se pode ver a seguir:

[...] foi estruturado para contemplar uma formação p ro f i s s io na l

p a u t ad a no co n h ec i me n to epistemológico e histórico dos

fenômenos e processos psicológicos básicos, que permitam ao discente

uma visão do processo de construção do conhecimento psicológico,

desenvolvendo a capacidade para avaliar criticamente diferentes

teorias e metodologias em psicologia com vistas a uma atuação

profissional de qualidade [...] o educando deve adquirir o domínio

das técnicas de avaliação e intervenção psicológica que respaldem uma

atuação profissional em uma das áreas que o curso propõe (Hospitalar,

Organizacional, Clínica, Escolar), assegurando, desta forma, a

formação integral centralizada no conhecimento dos

fenômenos e processos psicológicos, fundamentais ao desempenho

profissional do discente.

A formação em Psicologia, proposta pelo UniCEUMA, objetiva

despertar no formando a necessidade de constante aperfeiçoamento e

atualização técnica e científica, priorizando a capacitação para atuar de

maneira interdisciplinar e multiprofissional, no sentido de atender à

demanda do mercado e inclusão do mesmo nas áreas profissionais afins.

(PROJETO..., 2001, p. 53).

Como previsto no Projeto... (2001, p. 54), nos últimos 4 (quatro)

semestres do curso o aluno entrará em contato com a prática profissional,

sendo que, no 7° e 8° semestres manterá contato com as quatro áreas de

atuação e, no 9° e 10º semestres realizará o estágio no máximo em duas

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áreas de atuação, conforme sua escolha. Contudo, no Estágio

Supervisionado Específico Clínico terá a formação oferecida em, no

mínimo, três abordagens teóricas.

O Estágio Supervisionado, então, encontra-se estruturado em Básico

e Específico. No Básico, o discente entrará em contato com as seguintes

áreas: Psicologia Organizacional, Psicologia Escolar, Psicologia Hospitalar

e Psicologia Clínica, com 240 horas, sendo 60 horas para cada área de

atuação. Esse primeiro momento visa oferecer ao aluno subsídios para uma

opção mais consciente do(s) campo(s) que deverá escolher para o Estágio

Específico.

As atividades desenvolvidas nos estágios devem receber sua

fundamentação teórica de forma sistematizada e culminar com a

elaboração de um trabalho ao final de curso, cujas características

variarão em função das habilitações ou áreas de concentração escolhidas

pelos discentes (Psicologia Clínica, Organizacional, Hospitalar e

Escolar) e especificidade da atuação desenvolvida pelo estudante.

O Trabalho para a conclusão de curso consistirá na elaboração de um

projeto de pesquisa, relato de caso, ou relato de experiência durante

o estágio específico, que contemple diagnóstico, bibliografia,

intervenção e conclusão, de acordo com a área escolhida, a ser

defendido perante uma banca examinadora constituída de três

psicólogos, sendo o supervisor docente membro nato. (PROJETO...,

2001, p. 55).

O curso de Psicologia do UniCEUMA pretende oferecer quatro

opções de abordagem na área clínica (Comportamental, Psicanálise,

Gestalt e Humanismo). Por enquanto estão em funcionamento as de

Humanismo e Gestalt e a predominância dos alunos da primeira turma foi

pela área clínica, na abordagem Gestalt, ocorrendo uma mudança

significativa na proposta inicial do curso, cujo enfoque era o

comportamental.

Para tanto, o UniCEUMA conta com uma clínica de atendimento

psicológico — Clínica Pe. João Mohana —, na qual os estudantes poderão

ampliar a atuação nesse campo da Psicologia. O espaço físico da Clínica é

constituído de salas de atendimento individual e grupal, supervisão e

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atividades lúdicas. Em outro espaço está situado o Laboratório de

Psicologia Experimental. Administrativamente, o curso é constituído pelo

Conselho de Curso e Coordenação de Curso, tendo em 2001, 30 (trinta)

professores ministrando aulas.

Como anteriormente foi demonstrado nas falas, para a compreensão

dos momentos da criação desse curso foi necessário buscar, além dos

documentos, informações junto aos professores que acompanharam o

processo. Para tanto, foi elaborado um roteiro de entrevista, elegendo

questões como a constituição do curso, a participação no processo de

criação, as relações desses professores com a Psicologia, a decisão do

UniCEUMA para a escolha da habilitação Formação de Psicólogo, as

universidades que serviram de parâmetro para a grade curricular, a

reformulação curricular e o reconhecimento do curso. Os professores que

participaram do processo de criação do curso e outros que posteriormente

colaboraram nesse processo revelaram suas atuações conforme descrito a

seguir.

A coordenadora do curso, professora Eleusina Oliveira, afirmou:

"Minha participação foi integral no projeto de autorização do curso."

O professor Carlos Augusto Cavalcante, que na época era

Superintendente de Ensino, Pesquisa e Extensão, declarou:

[...] minha participação foi ativa. Eu era responsável por coordenar a

montagem de todos os cursos do UniCEUMA [...] dando opiniões,

procurando sempre o que havia de melhor no Brasil e no mundo para

que não fizéssemos algo desatualizado, não condizente com a

necessidade da nossa comunidade.

A professora Cláudia Valeska comenta:

[...] fui convidada posteriormente para ser coordenadora dos laboratórios

multidisciplinares [...] e como dispunha de tempo acompanhei o

desenvolvimento do curso junto à coordenadora e também a elaboração

da proposta pedagógica do curso a fim de organizar os horários das

aulas e dos professores, decidir sobre a clínica e a sua criação.

Já o professor Marcos Lima declara:

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A professora Eleusina Oliveira elaborou todo o projeto de autorização

do curso [...] posteriormente participei de reuniões em que discutíamos a

grade curricular e a reorganização do curso.

Conclui-se, pois, que a coordenadora do curso realizou todas as

atividades necessárias, trabalhando e discutindo questões, com seus

colaboradores, para a construção e desenvolvimento do curso.

Ao serem perguntados a respeito da ligação que tinham com a

Psicologia, os entrevistados informaram serem todos psicólogos. No

entanto, o professor Carlos Augusto Cavalcante destaca:

A maioria era de psicólogos, mas havia pedagogos e assistentes sociais,

trabalhando de modo interdisciplinar [...] trouxemos psicólogos do Rio

de Janeiro, São Paulo, a presidente do Conselho Federal de Psicologia

nessa época, a professora Ana Bock, e conversamos com professores da

UFMA.

Partilhando desse dado, o professor Francisco Sousa complementa:

"[...] Ainda hoje, nós temos a participação de consultores de outras regiões

que vêm para trabalhar principalmente na elaboração do projeto de

reconhecimento do curso", e segundo as professoras Eleusina Oliveira e

Cláudia Valeska, "[...] eram todos psicólogos com larga experiência na

docência".

Percebe-se, portanto, que a qualificação dos colaboradores no que

diz respeito às suas ligações com a área da Psicologia e a

interdisciplinaridade não foi suficiente para evitar a sobrecarga do curso

em uma só área da Psicologia, nesse caso específico, da área

comportamental. Contudo, é interessante registrar que o curso conseguiu, a

partir das reformulações curriculares, redirecionar essa escolha inicial, o

que ficou mais evidente nas opções por outras áreas no Estágio

Supervisionado.

É importante chamar a atenção para o fato de que, embora não tenha

sido mencionado no projeto de autorização que universidades serviram de

parâmetro para a montagem da grade curricular, nas entrevistas foi obtida

essa informação. De acordo com os entrevistados, foram elas: a

Universidade Federal do Pará (UFPA), o Centro de Ensino Unificado de

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Brasília (CEUB), a Universidade de São Paulo (USP), a Pontifícia

Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), a Universidade Federal do

Maranhão (UFMA), além da Universidade Federal do Rio de Janeiro

(UFRJ), da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), da

Universidade de Brasília (UnB), da Universidade Federal de Pernambuco

(UFPE) e da Universidade da Amazônia (UNAMA). Observa-se, contudo,

que o grande número de instituições citadas não permite que se possa

afirmar quais serviram de parâmetro. As declarações seguintes esclarecem

este ponto.

A proposta de conhecer a grade curricular de outras universidades,

segundo o professor Carlos Augusto Cavalcante, deu-se da seguinte forma:

[...] procuramos estruturar o curso de uma maneira bem abrangente

pensando na realidade local [...] nós trouxemos também algumas ideias

do exterior, na época principalmente dos Estados Unidos da América.

Já o professor Marcos Lima afirma ter sido a Universidade Federal

do Pará, por isso,

[...] carregou-se muito na área comportamental, o que já está sendo

modificado [...] Até porque o primeiro consultor era psicólogo, com

doutorado na área comportamental e foi ele que deu respaldo científico

para a autorização do curso.

O professor Francisco Sousa diz:

Não houve predominância de uma instituição para a montagem da grade

curricular. Foram consultas bem abrangentes, mas uma universidade

bastante consultada foi a UFPA.

Apesar deterem sido consultadas diversas universidades com o

objetivo de promover um currículo abrangente, de acordo com a maioria

dos entrevistados houve um predomínio das relações com a UFPA, o que

resultou em maior ênfase na área comportamental, provocando, mais tarde, a

necessidade de reformulação curricular.

Mesmo sendo um curso recente, passou por várias reformulações,

como já foi comentado. Destarte, sente-se necessidade de conhecer como

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foram essas sucessivas reformulações. A seguir, alguns esclarecimentos a

esse respeito:

O curso já está na segunda reformulação curricular por orientação dos

consultores que vieram analisar e avaliar o curso para ser autorizado.

Esse processo foi realizado através de reuniões para discussão das

ementas e adoção de sugestões feitas pelo consultor, que geralmente é

alguém ligado ao MEC. No UniCEUMA, como o curso é novo ainda,

está no quarto ano, não existem professores para todas as disciplinas.

Existem disciplinas sem professor titular. Na verdade, existe uma

comissão que faz a avaliação geral. Um dado importante nessas

reformulações foi o questionamento dos alunos acerca do

direcionamento do curso, montado dentro de uma proposição voltada

para a formação clínica, com ênfase na comportamental. Houve, então,

reivindicação de disciplinas do Inconsciente, que foram inseridas para

atender a essas solicitações. (FRANCISCO SOUSA).

Já foram feitas várias mudanças. Para tanto, foi

solicitado um professor de Brasília (UnB), o qual junto

com outros professores procederam às reformulações no sentido de

inclusão e retirada de disciplinas, alterações de nomes e comparação de

conteúdos, visando à melhoria da qualidade do ensino e ao enxugamento

do curso segundo as orientações do MEC. (CLÁUDIA VALESKA).

Por orientação do MEC nós temos uma comissão permanente de

atualização curricular, cujos professores verificam, constantemente, o

que há de novo e o que está ultrapassado para poder atualizar. Essa

atualização ocorre a partir das ementas, atingindo toda a grade curricular

aprovada pelo Colegiado de Curso e depois pelo Conselho Superior.

(CARLOS AUGUSTO CAVALCANTE).

Há constantes reuniões de reajuste da grade curricular. Há uma comissão

designada para essa atividade, principalmente para o realinhamento do

curso, notadamente nas disciplinas introdutórias referentes à História da

Psicologia, a fim de evitar choques de conteúdo de disciplinas.

(MARCOS LIMA).

Como se pode constatar, parece haver uma prática no curso voltada

para a atualização dos currículos em atendimento às solicitações do MEC e

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às reivindicações dos alunos, prática subsidiada por professores não só da

Instituição mas também de outros Estados. Esse dado demonstra a

tendência do curso em redirecionar-se para outras áreas além da

comportamental, fazendo jus ao perfil generalista proposto.

Quanto à decisão da escolha da habilitação Formação de Psicólogo

tanto no projeto que autorizou o funcionamento do curso como no de seu

reconhecimento sobre a existência de outra habilitação, os informantes

declararam:

Exatamente porque a UFMA oferecia apenas Licenciatura e

Bacharelado, foi que o UniCEUMA concluiu: existe espaço no mercado

para um curso que ainda não existe [...] isso facilitou a aprovação pelo

MEC do curso de Psicologia [...] O UniCEUMA tem apenas Formação

de Psicólogo nas áreas organizacional, clínica, escolar e hospitalar e

habilita o profissional em duas dessas áreas. (MARCOS LIMA).

Nós sempre acreditamos muito nessas habilitações básicas: clínica,

escolar e organizacional. A habilitação é Formação de Psicólogo nessas

áreas, além do Bacharelado e futuramente da Licenciatura. (CARLOS

AUGUSTO CAVALCANTE).

Essa decisão foi basicamente minha, uma vez que não tínhamos, na

ocasião, nenhum curso de Formação de Psicólogo. (ELEUSINA

OLIVEIRA).

[...] o que sei é que a professora Eleusina Oliveira, desde o início, tinha a

idéia da clínica [...] Eu lembro que existia uma tendência muito grande no

curso de Psicologia da UFMA para a área de educação, então ela queria

formar um profissional generalista [...] Quando eu cheguei do Pará, eu

pensava que a UFMA seguia o mesmo esquema da UFPA, onde o curso

contempla Licenciatura, Bacharelado e Formação [...] mas eu nunca fui

até lá para saber, embora ouvisse as pessoas comentarem que havia

Formação [...] sei que o aluno do UniCEUMA sai com diploma de

Formação de Psicólogo, mas a grade curricular abrange o Bacharelado.

(CLÁUDIA VALESKA).

O UniCEUMA partiu para uma habilitação de clínica porque havia uma

falta de informação ou mal entendimento em relação ao curso da UFMA

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de que só oferecia Licenciatura e Bacharelado, e não Formação de

Psicólogo, como foi efetivamente o processo de formação inicial. Por

conta disso, o UniCEUMA solicitou e propôs a criação de uma

habilitação voltada para a atuação na clínica. Tanto é que hoje o nosso

curso só tem essa habilitação e não tem formações intermediárias de

licenciado e nem bacharel. Não existem outras habilitações.

(FRANCISCO SOUSA).

Embora alguns informantes tenham declarado a existência de uma

outra habilitação além da Formação de Psicólogo, nos projetos de

autorização e reconhecimento, como já assinalado, não consta esse dado.

Quanto à questão do reconhecimento, de acordo com os

entrevistados, o curso de Psicologia do UniCEUMA encontra-se em fase

de pré-reconhecimento pelo MEC, estando o seu projeto sendo elaborado.

A Coordenação do Curso vem preparando a documentação, para que ele

seja reconhecido antes da formação da primeira turma, em dezembro de

2002.

Assim, pela Portaria SESu/MEC n° 2.243/2001, foi designada a

Comissão Verificadora composta pelos professores Ronald João Jacques

Arendt (Universidade do Estado do Rio de Janeiro), Maria Emília

Yamamoto (Universidade Federal do Rio Grande do Norte) e Eulina da

Rocha Lordelo (Universidade Federal da Bahia), responsável pela

avaliação "in loco" das condições de funcionamento do curso, que ocorreu

no período de 13 a 15 de dezembro de 2001, ficando o curso à espera do

relatório do MEC.

Em abril de 2002 foi enviado pelo Ministério da Educação ao

UniCEUMA o Relatório que trata do reconhecimento do curso de

Psicologia, na habilitação de Formação de Psicólogo, decorrente do

Processo n° 23000.014610/2001-85 —, relatado pelo conselheiro Lauro

Ribas Zimmer, que emitiu Parecer n° 126/2002-CNE/CES, aprovado pela

Câmara de Educação Superior em 2 de abril de 2002.

As considerações constantes no documento referem-se inicialmente

às vagas oferecidas pelo curso, num total de 200 (duzentas). O relator

solicitou ao UniCeuma esclarecimento sobre este número, pois o curso

havia sido autorizado com somente 100 (cem) vagas totais anuais pelo

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Conselho Nacional de Saúde e pela Comissão de Especialista de Ensino de

Psicologia da SESu/MEC. O UniCeuma informou que o seu Conselho de

Ensino e Pesquisa, através da Resolução CEPE n° 006/2000-UniCEUMA,

de 28 de setembro desse mesmo ano, autorizou o aumento do número de

vagas oferecidas, com duas entradas semestrais, distribuídas nos turnos

vespertino e noturno.

O conselheiro fez também referência à visita da Comissão

Avaliadora que, após a análise das condições de funcionamento do curso,

recomendou seu reconhecimento pelo prazo de 1 (um) ano, somente para

os alunos que ingressaram nos anos de 1998 e 1999, solicitando que o

Conselho Nacional de Educação determinasse ao UniCEUMA o

atendimento, no prazo máximo de 6 (seis) meses, das recomendações

abaixo, feitas quando da visita seguinte:

a) reformulação do Projeto Pedagógico apresentado pela

Instituição, em todos os seus componentes, devendo adequar-se

e ajustar-se às Diretrizes Curriculares;

b) número elevado de vagas, que poderá comprometer a qualidade

do curso, em decorrência da situação do Estado do Maranhão,

em termos de disponibilidade de recursos para prover a

Formação de Psicólogo e a demanda local por cursos de

Psicologia;

c) avaliação das condições limitadas de convênios para a realização

dos estágios curriculares, pelo número pequeno de psicólogos no

Estado e de empresas que contam com serviços de psicologia;

d) adequação das instalações físicas em relação ao grande número

de alunos no Centro de Psicologia Aplicada;

e) ampliação do acervo da biblioteca, considerado insuficiente, no

que diz respeito às fontes de consulta em periódicos

internacionais;

f) implantação em curto prazo de um plano de carreira docente

com a fixação de cargas horárias que incluam ensino, preparação

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205

de aulas, pesquisa ou extensão e a implementação de uma

política de efetivo apoio e capacitação docente.

Após sua apreciação, o relator discordou da avaliação da comissão

quanto ao reconhecimento do curso apenas para os alunos que ingressaram

nos dois primeiros anos (1998/1999), considerando que ficariam excluídos

os alunos que ingressaram em 2000 e 2001, embora uns se encontrem

realizando o curso nas mesmas condições que os outros. Também não

concordou com a conclusão da SESu/MEC, em conceder o reconhecimento

pelo prazo de 1 (um) ano, analisando o curto prazo destinado à Instituição

para o atendimento de todas as recomendações arroladas. Dessa forma,

votou favoravelmente ao reconhecimento do curso pelo prazo de 3 (três)

anos, com um total de 200 (duzentas) vagas, devendo o UniCEUMA

atender as solicitações da Comissão de Avaliação. A Câmara de Educação

Superior aprovou por unanimidade o voto do relator (BRASIL, 2002, p. 1-

3).

Observa-se, pelo exposto no documento, que, embora o número

elevado de vagas comprometa o próprio funcionamento do curso, no

tocante ao espaço físico do Centro de Psicologia Aplicada e ao

encaminhamento de alunos para estágios, devido às condições

apresentadas, o curso foi aprovado com 200 (duzentas) vagas, quase

alcançando a proposta inicial, quando o UniCEUMA solicitou, no projeto

de autorização, 240 (duzentas e quarenta) vagas para o curso.

A análise da trajetória do curso de Psicologia do UniCEUMA

demonstrou o seu crescimento com o alcance de um dos seus principais

objetivos à época, que era o de oferecer um número maior de vagas aos

interessados pela área. Entretanto, outros objetivos importantes, inerentes a

um curso de graduação, ainda estão por ser atingidos totalmente, como, por

exemplo, a definição funcional do quadro docente, recomendada em quase

todos os pareceres e/ou relatórios, como uma condição para o bom

funcionamento do curso ainda não atendida pela Instituição.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Toda a história — na qual se podem interpolar à vontade novos capítulos, mas na qual não é conveniente que se pule nenhum, porque quando menos se espera reaparecem velhos personagens — envolve centenas de nomes e centenas de viagens por florestas densas, palácios, estradas, encruzilhadas etc. [...].

Luís Cláudio Figueiredo, 2002

Finaliza-se este estudo dizendo que em momento algum se teve a

pretensão de dar conta da amplitude que engloba o tema — "A Psicologia

no Maranhão" — pois, como se pode observar, a história narrada se

constituiu de fragmentos considerados importantes para o entendimento da

estruturação do conhecimento da área psicológica no Estado, mais

especificamente em sua capital — São Luís. Por isso, o objetivo, neste

espaço, não é o de estabelecer conclusões, mas o de apontar

acontecimentos que merecem ser mais bem pesquisados, para que não se

perca o registro das experiências históricas. Reconhece-se, assim, que há,

para cada aspecto abordado, possibilidades de outros estudos,

especialmente em relação aos cursos de Psicologia. Lamenta-se a não

inclusão de alunos entre os entrevistados e, em relação à contribuição do

Padre João Miguel Mohana, não ter havido condições de contatar com

aqueles que conviveram com ele e desfrutaram de seus ensinamentos e

atendimentos.

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Escolheu-se trilhar esse caminho por entender-se que um primeiro

passo necessitava ser dado. Este passo se ampliou na medida em que o

fazer e o dizer deste trabalho ganhou mais força, principalmente após

algumas dificuldades encontradas na coleta de documentos e nos contatos

com alguns entrevistados, tanto com os que incentivaram quanto com os

que desestimularam esta caminhada. Torna-se necessário dizer mais uma

vez da implicação que se teve no estudo em relação ao trabalho

desenvolvido no Departamento de Psicologia e na criação do curso de

Psicologia da Universidade Federal do Maranhão, pois a trajetória

apresentada esteve permeada de muitas recordações a tal ponto que,

mesmo tentando estabelecer um distanciamento, não foi possível deixar de

ver que sempre se esteve ocupando um determinado lugar.

Constatou-se que o caminho percorrido pela Psicologia no

Maranhão, em relação à conquista do seu espaço, aconteceu de forma

lenta, motivada: 1) pelo desconhecimento da população quanto à atuação e

imagem do profissional psicólogo; 2) pela escassez da oferta de trabalho

no Estado, com raras oportunidades de campo para o psicólogo; 3) pela

demora, no meio universitário, da criação do primeiro curso de Psicologia.

Para suprir todas essas carências, o Estado contava apenas com a

experiência pioneira do Padre João Mohana.

A pesquisa realizada possibilitou fazer o levantamento da

documentação pertinente aos assuntos abordados, considerando o período

proposto neste trabalho, entre 1970 e 1998, com prosseguimento até abril

de 2002. Apesar de haver dispersão e mesmo ausência de fontes para

alguns casos, trabalhou-se na tentativa de ultrapassar as barreiras que o

documento impõe.

[...] Ao mesmo tempo, o valor heurístico e a significação do documento

dependem também da acuidade da leitura e do esforço interpretativo do

historiador: este, ao extrair de uma fonte de informação algum

conhecimento útil, é movido e orientado por seu objeto de interesse. Além

disso, o documento põe limites ao esforço de investigação, porque

nem sempre as questões que i n t e r e s s a m a o p e s q u i s a d o r s ã o b e m

documentadas, nem sempre os documentos conservados são os que se

desejaria. (MASSIMI, 1990, p. 76).

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Foi possível, também, trabalhar com as memórias, nas falas dos

atores sociais que vivenciaram esses percursos, sendo que esses atores, em

sua maioria, foram (e são) a própria história. Como explica Antunes (1996,

p. 96),

[...] trabalhar com a memória é como brincar com fios e lanternas. Um fio

puxa outro, e este, mais outro. Um foco de luz ilumina espaços que mostram

outros e mais outros. Não se anda em linha reta, assim como não se puxam

todos os fios, nem se iluminam todos os cantos.

O que realmente aqui se tentou assinalar foi como se autonomizou a

Psicologia no Estado do Maranhão, embora com considerável atraso em

relação a outras regiões do país. Em resumo pode-se expressar que nessa

passagem foi possível verificar que:

a) durante muito tempo o conhecimento psicológico esteve atrelado

ao Padre João Mohana, com .o reconhecimento da população

que o procurava para tratar de assuntos dessa ordem,

provavelmente sem diferenciar entre o atendimento psicológico

e o religioso (ou espiritual);

b) os psicólogos enfrentaram várias dificuldades entre as décadas

de 70 e 80, na cidade de São Luís, para o reconhecimento, pela

população, desse campo de conhecimento e trabalho;

c) a partir das dissidências ocorridas no primeiro grupo de

psicanalistas, houve uma proliferação de instituições

psicanalíticas na cidade com demanda interna significativa, sem

que se percebesse demanda externa capaz de justificar tal

expansão;

d) em relação ao curso de Psicologia da Universidade Federal do

Maranhão, apesar de todos os percalços, desde a criação do

Departamento de Psicologia e a luta empreendida pelos seus

docentes para a criação do curso, tem conseguido manter-se,

porém deixa a desejar com relação às expectativas do alunado:

1) pela ausência de outras abordagens na área clínica sem ser a

psicanalítica; 2) pela continuidade da carência de professores,

responsável pela sobrecarga de atividades docentes e pela

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inviabilidade da pesquisa e da extensão de forma mais intensa;

3) pelo tipo de sistema adotado (semi-seriado); 4) pela

impossibilidade de o aluno cursar mais de uma habilitação

proposta pelo curso, em razão da natureza excludente das

habilitações; 5) pela extensa carga horária que dificulta o

funcionamento do curso apenas em um turno;

e) em relação ao curso de Psicologia do Centro Universitário do

Maranhão, apesar da existência de estrutura física adequada ao

seu funcionamento, existe a necessidade de rever sua política de

pessoal.

Considera-se que o propósito deste estudo, de conhecer como se

estruturou a área da Psicologia no Maranhão, foi atingido, reconhecendo-se

que, de fato, só através da história dessa ciência é que foi possível entendê-

la neste processo. Afinal, com base nas contribuições registradas e na

pesquisa empírica, pôde-se chegar a esse entendimento, a ponto de se

sugerir um repensar crítico dessa ciência, a partir dos cursos existentes. Por

ser uma área relativamente recente no Maranhão, vislumbrou-se a

construção do futuro da Psicologia voltada a objetivos mais concretos, com

vistas a atender à realidade social, considerando o agir e o fazer humano.

Os avanços conseguidos pela Psicologia no Maranhão e as várias lacunas

que permeiam esses avanços, como visto no decorrer deste estudo,

dificultam que essa ciência possa galgar uma posição de igualdade em

relação aos centros mais avançados. Destarte, a situação atual exige

intenso trabalho consorciado entre os interessados na Psicologia, capaz de

eliminar barreiras que venham a prejudicar o crescimento dessa área.

Enfim, com esta narrativa crê-se que o trabalho tenha contribuído

para o registro dessa história e ainda para o despertar da necessidade de a

Psicologia no Maranhão trilhar por outros caminhos que não aqueles

recorrentes. Em especial, pelos cursos de Psicologia que se acredita serem

os maiores veículos para a realização dessas mudanças.

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APÊNDICES

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APÊNDICE A

Relação candidatos/vagas das graduações da UFMA

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Área / Curso 1.991 1.992 1.993 1.994 1.995 1.996 1.997 1988.1 1988.2 1999.1 1999.2 2000.1 2000.2

Bibliotecono

mia 2,93 3,59 4,82 3,64 5,56 2,6 4,58 2,88 8,48 7 7,56 7,2 7,72

Ciência da

computação 15,14 11,7 19,96 14,2 18,32 15,12 12,88 22,04 15,16 22,16 15,6 14,2 16,88

Ciências

imobiliárias 7 6,69 4,51 4,89 3,6 3,43 0 5,46 0 4,03

Ciências

aquáticas 8,2

Ciências

biológicas 6,91 6,09 11,82 5,18 10,04 7,24 6,31 11,36 0 16,8 0 15,44 13,9

Ciências

contábeis 12,6 10,3 18,11 12,51 15,79 9,34 10,39 1309 11 19,23 12,4 7,77 13,11

Ciências

econômicas 9,91 5,92 12,33 8,02 10,34 7,01 4,36 8,1 5,86 0 0 4 0

Ciências

sociais 6,82 3,18 7,82 4,33 7,46 4,09 3,11 12 0 10,66 0 9,89 0

Comunic. social -

Jornalismo 11,9 9,33 17,2 8,77 10,43 11,38 9,83 18,67 16,33 22,25 14,27 17,4 14,8

Comunic.

social -

Radialismo 2,97 7,27 7,03 4 6,6 4,13 6 18,67 7,33 8,17 9,93 7,93 11,27

Comunic.

social - Rel.

Públicas 7,27 6 9,2 7,87 6,63 9,96 5,92 13,33 80,08 17,25 9,6 13,4 14,67

Desenho

industrial 6,5 6,66 9,61 5,14 8,55 4,5 5,28 8,45 7,05 8,25 7,55 5,85 6,6

Direito

(Mat/Not) 17,38 16,88 26,35 23,94 21,74 19,58 18,24 36,11 26,37 34,54 30,96 28,03 29,33

Educação

artística 3,04 4,21 6,93 4,69 7,19 3,2 3,87 6,89 6,03 9,26 7,86 8,23 8,46

Educação física 3,67 4,04 5,11 3,63 4,96 4,6 4,09 6,97 8,03 11,69 8,94 13,26 12,69

Enfermagem 6,04 7,11 13,34 9,21 12,4 11,15 7,74 20,54 18,07 20,04 24,47 18,17 20,23

Engenharia

elétrica 11,58 9,04 12,19 7,06 8,44 7,27 4,39 12,32 8,48 10,04 7,22 7,33 7,67

Farmácia 9,77 10,41 13,98 11,82 15,16 11,48 9,38 20,83 19,27 18,63 24,63 15,83 19,37

Filosofia 3,2 2,64 6,3 2,98 5,76 2,77 3,73 5,23 7 7,86 7,57 6,71 9,4

Física 3,11 2,7 4,39 2,15 2,9 2,88 2,22 4,73 3,91 3,64 4,68 3,95 5,05

Geografia -

Bacharelado 1,98 5,6 6,8 6,5 9,3 7,15 9,68

Geografia -

Licenciatura 4,11 3,51 8,74 4,44 5,96 5,03 4,18 8,1 7,65 7,25 13,5 8,9 12,56

História - Bacharelado 2,43 4,3 2,93 6,67 2,37 2,37 6,67 4 6,53 8,13 6,73 10,33 5,93

História -

Licenciatura

plena 4,03 3,4 7,55 4,58 5,7 8,5 4,18 12,25 14,8 10,7 17,72 11 16,72

Hotelaria 2,63 5,37 4,93 4,97 5,77 3,8 4,66 6,83 10,41 0 11,2 0 13,27

Letras 4,6 4,77 7,87 6,16 6,9 7,34 4,4 11,8 10,2 12,66 13,05 11,88 13,73

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Em 1991 (1º vestibular do curso de Psicologia) o curso de Psicologia foi o

2º mais procurado na UFMA, ficando atrás apenas do curso de Direito.

Em 1992, cai para a 9ª posição, ficando à sua frente os cursos já

tradicionalmente com maior demanda, (Medicina, Direito, Odontologia, Farmácia,

Ciência da Computação...).

Em 1993, devido aos problemas já explicitados anteriormente, referentes à

ausência da habilitação Formação de Psicólogo, aconteceu a maior queda na

preferência, ficando o curso de psicologia em 15ª colocação nas opções dos

vestibulandos.

A partir de 1994, acontece a retomada do crescimento da demanda,

ficando, logo naquele ano, em 6º lugar na preferência dos candidatos.

De 1995 a 1999 houve uma relativa estabilidade quanto á opção por

Psicologia dentre os vestibulandos, situando-se, em média, no 5º lugar.

Em 2000 a escolha dos candidatos pelo curso de Psicologia dá novo salto,

desta feita para aproximar-se dos mais escolhidos (3º lugar) ficando atrás apenas

dos cursos de Medicina e Direito.

Licenciatura

Ciências exatas - 0 0 0 1,27 0,97 0 0 0 0 0 0

Matemática 3,74 4,27 6,24 3,21 5,59 3,98 3,7 7,12 6,32 5,97 6,1 5,17 4,34

Medicina 22,57 21,94 28,84 25,01 30,94 29,89 23,96 41,31 44,23 41,89 51,23 28,91 58,63

Odontologia 17,21 16,25 18,48 16,25 20,77 21,08 13,36 33,05 24,6 28,9 25,35 19,4 24,15

Pedagogia 7,34 6,27 12,91 8,34 6,33 8,74 7,16 12,51 18,43 17,71 10,66 18,57 9,03

Pedagogia

Magistério 4,51 0 0 0 0 6,9 0 8,89 0 7,31

Psicologia 18,9 8,67 17,1 11,9 20,47 14,9 12,31 20,9 0 21,8 0 24,43

Química

Bacharelado/

Lic. Plena 2,38 2,03 2,73 2,7 3,3 2,64 2,66 2,68 5,28 4 5,36 3,12 5

Química

industrial 4,35 3,05 5,39 4,11 4,08 5,28 2,42 5,64 4,8 6,48 4,12 4,64 4,08

Serviço social 11,86 7,96 16,59 9 14,11 7,8 8,97 8,89 12,48 15,68 10,4 15,63 13,87

Turismo 4,73 7,33 6,83 6,8 10,51 9,34 7,26 14,86 0 25,83 0 15,84 0

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APÊNDICE B

Candidatos do curso de Psicologia nos vestibulares de 1991 a 2000

Ano Vagas inscritos Relação

Cand./Vaga

Classificação

Cad./Vaga

Aprovados Eliminados Classificados

1991 30 567 18,9 2 259 308 30

1992 30 260 8,67 9 98 162 30

1993 30 513 17,1 15 86 427 30

1994 30 757 25,23 6 172 585 30

1995 30 614 20,47 4 30 584 30

1996 30 447 14,9 5 30 417 30

1997 35 431 12,31 5 35 396 35

1998 30 627 20,9 4 30 597 30

1999 30 654 21,8 6 30 624 30

2000 30 733 24,43 3 30 703 30

A demanda de candidatos ao vestibular para o curso de psicologia sofreu

uma brusca queda no segundo ano (1992), pois passou de 2º mais procurado

dentre os cursos de graduação da UFMA (1991) para o 9º lugar e, em 1993, para o

15º. Em que pese o interesse inicial por um novo curso (1º no Estado do

Maranhão) a constatação de que não se tratava de curso de Formação de

Psicólogo, e sim de Licenciatura e Bacharelado, levou ao desinteresse pelo curso.

Em 1994, com a aprovação da reformulação do projeto inicial do curso de

Psicologia, acrescentando a habilitação Formação de Psicólogo, novamente

elevou-se o percentual da demanda, vindo a alcançar em 2000 a colocação de 3º

mais procurado na UFMA.

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APÊNDICE C

Quadro de reformulações curriculares do curso de psicologia do UniCEUMA

Disciplinas 1993 1998 1999 2000 2001

Comunicação e

Expressão

x x Língua

portuguesa*

I e II -

Filosofia x x x I e II x

História da Psicologia x x Hist. e Sist. Da Psi.*

Idem 1999 I e II Idem 1999

Antropologia x x I e II Antropologia e

Sociologia*

Idem

2000

Metodologia Científica

x x x I e II x

Complementos de

Estatística

x x Estatística* Idem 1999 I e II Idem

1999

Psicologia Geral x x idem 1998 Idem 1999 x

Psicologia

Experimental

x x x I e II Idem

2000

Psi. do Desenvolvimento

x I, II e III I e II I e II Idem 2000

Biologia x x x x Gen.

Hum. Apli. à

Psi.*

Fisiologia Humana x x x x x

Neuropsicologia x - - - -

Teorias e Sist. em Psi. x - - - -

Psicologia Social x I e II idem 1998 Idem 1998 Idem

1988

Psi. da Personalid. I e

II

x x x x x

Téc. De Exa. e Acons.

Psi. I e II

x s/adendo idem 1998 idem 1998 Idem

1988

Psicologia Escolar x Psi. Esc. e Dif.

de Aprend.*

x x x

Psicologia Organizacional

x I e II idem 1998 Idem 1998 Idem 1988

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Psicologia do Excepcional

x I e II idem 1998 Idem 1998 Idem 1988

Psicopatologia Geral x I e II idem 1998 Idem 1998 Idem

1988

Ética Profissional x x x x x

Psicologia da

Aprendizagem

x x x x x

Din. de Grupo e Rel.

Humanas

x I e II idem 1998 Idem 1998 Idem

1998

Psicomotricidade x x x x x

Teorias e Téc.

Psicoterápicas

x A partir de 1998

a disciplina foi dividida em

abordagens:

Teorias e técnicas em

Gestalt, em

Psicanálise, em Humanística e

Comportamental

Seleção e Orient.

Profissional

x x x x x

Psicologia da

Percepção

x - - - -

Clínica Experimental x - - - -

Técnicas de Entrevista x - - - -

Prática Pro. em Psi.

Clínica

x - - - -

Prática Pro. em Psi. Escolar

x - - - -

Prática Pro. em Psi.

Organiz.

x - - - -

Informática - x x I e II -

Psicologia Ciência e Profissão

- x x I e II x

Anatomia e

Neuroanatomia

- x x Neuroanatomia* Idem

2000

Psicologia Hospitalar

I e II

- x x x x

Estágio Superv.

Básico I e II

- x x x x

Estágio Superv.

Específico I e II

- x x x x

Psicofarmacologia - x x x x

Técnicas Projetivas I - x x x x

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e II

Psicometria - x x x x

Psicodiagnóstico - x x x x

Dificuldade de

Aprendizagem

- - x x x

Teorias da Consciência

- - - x x

Teorias do

Inconsciente

- - - x x

Psicolinguística - - - x x

Legenda:

(x) = Disciplina mantida

(-) = Disciplina suprimida

(I, II e II) = Adendos da disciplina

(*) = Nova nomenclatura da disciplina