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II SIMPÓSIO SOBRE A BIODIVERSIDADE DA MATA ATLÂNTICA. 2013 125 Morfo-anatomia foliar de Justicia wasshauseniana Profice (Acanthaceae) Livia Zottele¹, Elisa Mitsuko Aoyama². ¹ Centro Universitário Norte do Espírito Santo, Universidade Federal do Espírito Santo, CEP 29932-540, São Mateus-ES. E-mail: [email protected]. ² Departamento de Ciências Agrárias e Biológicas, Centro Universitário Norte do Espírito Santo, Universidade Federal do Espírito Santo Introdução A família Acanthaceae possui uma distribuição pantropical, ocorrendo no Brasil 41 gêneros e 432 espécies (Profice et al., 2012). As flores de Acanthaceae muitas vezes apresentam corolas coloridas e, com frequência, brácteas vistosas, que são polinizadas por abelhas, vespas, mariposas, borboletas e aves a procura de néctar (Judd et al., 2009), o que representa uma grande importância ecológica das espécies. Dentre as espécies, cerca de 130 são do gênero Justicia L., que ocorrem em praticamente todos os biomas, predominando maior diversidade de espécies na Mata Atlântica e Amazônia (Profice et al., 2012). Justicia wasshauseniana Profice, vulgarmente conhecida como rabo de quati, é uma espécie herbácea que possui flores de coloração branca (Vale, 2012). É nativa do Brasil, sendo endêmica dos estados da Bahia, Rio de Janeiro e Espírito Santo (Profice et al, 2012). Segundo Fraga & Simonelli (2007) das aproximadamente 3.900 espécies de Angiospermas listadas para o Espírito Santo, cerca de 306 espécies estão vulneráveis à extinção, incluindo entre elas J. wasshauseniana. Na literatura há poucos estudos sobre esta espécie, e respectivamente sobre sua anatomia. Desta forma, este trabalho teve como objetivo estudar a anatomia e a morfologia foliar de Justicia wasshauseniana Profice. Material e métodos Folhas de Justicia wasshauseniana foram coletadas na Reserva Natural Vale, Linhares - Espírito Santo, na estrada Arlindinho, (S 19 07’07.8’’ WO 40 02’58.5’’), onde as plantas se encontram nativas. Foram coletadas 15 folhas adultas retiradas do 2º nó. Para o estudo morfológico, foram analisados caracteres relacionados à filotaxia, contorno, simetria, venação, tipo de ápice e base, e margem. Com relação à nervura secundária, foram observados os seguintes caracteres: venação, espaçamento e ângulo. Com relação ao pecíolo foi observado sua inserção na lâmina foliar (Vidal e Vidal, 1995). Para as análises biométricas foram avaliadas 15 folhas quanto aos parâmetros: comprimento total, comprimento base-largura (comprimento da base foliar até a metade do limbo), largura, comprimento e diâmetro do pecíolo. Os resultados foram calculados e obtidos a média e o desvio padrão. Para o estudo anatômico as folhas foram fixadas em FAA (formaldeído:ácido acético:álcool etílico 50% v/v, 2:1:18), de acordo com Johansen (1940), mantidas por 48 horas e posteriormente transferidas para etanol 70%. Secções transversais da porção mediana do limbo (região internevural e nervura central) e secções paradérmicas das faces abaxial e adaxial do limbo foram obtidas, à mão livre, com o auxílio de lâmina de barbear e isopor. As lâminas foram montadas em glicerina e analisadas ao microscópio.

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II SIMPÓSIO SOBRE A BIODIVERSIDADE DA MATA ATLÂNTICA. 2013 125

Morfo-anatomia foliar de Justicia wasshauseniana Profice (Acanthaceae)

Livia Zottele¹, Elisa Mitsuko Aoyama².

¹ Centro Universitário Norte do Espírito Santo, Universidade Federal do Espírito Santo, CEP 29932-540, São Mateus-ES. E-mail: [email protected]. ² Departamento de Ciências Agrárias e Biológicas, Centro Universitário Norte do Espírito Santo, Universidade Federal do Espírito Santo

Introdução

A família Acanthaceae possui uma distribuição pantropical, ocorrendo no Brasil 41 gêneros e 432 espécies (Profice et al., 2012). As flores de Acanthaceae muitas vezes apresentam corolas coloridas e, com frequência, brácteas vistosas, que são polinizadas por abelhas, vespas, mariposas, borboletas e aves a procura de néctar (Judd et al., 2009), o que representa uma grande importância ecológica das espécies. Dentre as espécies, cerca de 130 são do gênero Justicia L., que ocorrem em praticamente todos os biomas, predominando maior diversidade de espécies na Mata Atlântica e Amazônia (Profice et al., 2012). Justicia wasshauseniana Profice, vulgarmente conhecida como rabo de quati, é uma espécie herbácea que possui flores de coloração branca (Vale, 2012). É nativa do Brasil, sendo endêmica dos estados da Bahia, Rio de Janeiro e Espírito Santo (Profice et al, 2012). Segundo Fraga & Simonelli (2007) das aproximadamente 3.900 espécies de Angiospermas listadas para o Espírito Santo, cerca de 306 espécies estão vulneráveis à extinção, incluindo entre elas J. wasshauseniana. Na literatura há poucos estudos sobre esta espécie, e respectivamente sobre sua anatomia. Desta forma, este trabalho teve como objetivo estudar a anatomia e a morfologia foliar de Justicia wasshauseniana Profice.

Material e métodos

Folhas de Justicia wasshauseniana foram coletadas na Reserva Natural Vale, Linhares - Espírito Santo, na estrada Arlindinho, (S 19 07’07.8’’ WO 40 02’58.5’’), onde as plantas se encontram nativas. Foram coletadas 15 folhas adultas retiradas do 2º nó. Para o estudo morfológico, foram analisados caracteres relacionados à filotaxia, contorno, simetria, venação, tipo de ápice e base, e margem. Com relação à nervura secundária, foram observados os seguintes caracteres: venação, espaçamento e ângulo. Com relação ao pecíolo foi observado sua inserção na lâmina foliar (Vidal e Vidal, 1995). Para as análises biométricas foram avaliadas 15 folhas quanto aos parâmetros: comprimento total, comprimento base-largura (comprimento da base foliar até a metade do limbo), largura, comprimento e diâmetro do pecíolo. Os resultados foram calculados e obtidos a média e o desvio padrão. Para o estudo anatômico as folhas foram fixadas em FAA (formaldeído:ácido acético:álcool etílico 50% v/v, 2:1:18), de acordo com Johansen (1940), mantidas por 48 horas e posteriormente transferidas para etanol 70%. Secções transversais da porção mediana do limbo (região internevural e nervura central) e secções paradérmicas das faces abaxial e adaxial do limbo foram obtidas, à mão livre, com o auxílio de lâmina de barbear e isopor. As lâminas foram montadas em glicerina e analisadas ao microscópio.

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126 ZOTTELE & AOYAMA: MORFO-ANATOMIA FOLIAR DE JUSTICIA WASSHAUSENIANA

As ilustrações foram obtidas em fotomicroscópio com projeção de escalas micrométricas.

Resultados e Discussão

Com base nos dados biométricos, o comprimento total da folha corresponde a 17,19 ± 4,05 cm, o comprimento base-largura, corresponde a 6,60 ± 1,26 cm, a largura corresponde a 6,24 ± 1,50 cm, o comprimento do pecíolo corresponde a 2,3 ± 1,6 cm e o diâmetro do pecíolo corresponde a 2,11 ± 0,40 mm. Em relação aos estudos morfológicos, a espécie apresenta filotaxia oposta, folhas simples, com forma da lâmina foliar elíptica à ovada, levemente assimétrica, ápice agudo, base decorrente, margem inteira, com venação penada. As nervuras secundárias apresentaram espaçamento irregular. O pecíolo possui inserção marginal na folha. Os resultados obtidos para os cortes anatômicos mostraram que as folhas de J. wasshauseniana, em vista frontal, apresentaram células epidérmicas com parede anticlinal delgada e sinuosa. As folhas apresentam estômatos diacíticos (Figura 1.d.), sendo hipoestomáticas, permitindo que a perda de água pela transpiração seja minimizada (Larcher et al., 2006). Na face abaxial das folhas, foram encontrados tricomas tectores pluricelulares unisseriado com ornamentações na parede celular (Figura 1.c), e na face adaxial, tricomas glandulares subséssil (Figura 1.e). A presença de tricomas glandulares é comum nas espécies da família. Em relação aos tectores, a variação do formato, número de células, ornamentação e espessura pode ser empregada para a identificação das espécies (Ahmad, 1978 apud Aoyama e Indriunas, 2012). Em ambas as faces epidérmicas, foram encontrados litocistos (Figura 1.d), onde já foram descritos para outras espécies do gênero, como Justicia pectoralis Jacq. (Aoyama e Indriunas, 2012). Os cistólitos são estruturas restritas a poucas famílias como Moraceae, Urticaceae e Acanthaceae (Metcalfe et al 1983 apud Aoyama e Indriunas, 2012) podendo variar nas Acanthaceae, sendo os cistólitos solitários os mais comuns (Ahmad, 1978 apud Aoyama e Indriunas, 2012). Em secções transversais, a epiderme é uniestratificada com células de formato e tamanho irregulares e o mesofilo é dorsiventral (Figura 1.b), onde internamente à epiderme da face abaxial se destaca um parênquima paliçádico pouco desenvolvido, disposto em uma única camada de células. Segundo Aoyama & Indriunas (2012) essa disposição do parênquima paliçádico também ocorre em Justicia carnea Lindl, Justicia kleinii Wassh. & L. B. Sm.e Justicia scheidweilerii V. A. W. Graham. Logo abaixo, se destaca o parênquima lacunoso, com células de formato irregular. Na nervura central (Fig 1.a), internamente à epiderme apresentam-se duas a três camadas de colênquima em ambas as faces, sendo que interno ao colênquima da face adaxial apresenta-se uma camada de parênquima paliçádico. O sistema vascular é formado por feixe vascular colateral em forma de arco e por dois feixes menores próximos às projeções laterais. Em secções transversais, o pecíolo apresenta epiderme uniestratificada com células de formato quadrangulares, apresentando tricomas tectores pluricelulares e tricomas glandulares multicelulares subsésseis. Internamente à epiderme, ocorre uma faixa contínua de colênquima. Assim como ocorre na nervura central, o sistema vascular é forma por feixe vascular colateral em forma de arco e por dois feixes menores próximos às projeções laterais (Figura 1.f). Essa disposição dos feixes vasculares na nervura central e no pecíolo são comuns em várias espécies da família Acanthaceae (Metcalfe e Chalk, 1965; Fahn, 1990 apud Larcher et al 2006 ).

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Conclusão

As características morfológicas e anatômicas descritas para a espécie estudada contribuem imensamente para sua identificação, uma vez que há poucos estudos na literatura para este gênero e principalmente para esta espécie que se encontra vulnerável à extinção.

Agradecimentos

À Reseva Natura Vale, pelo espaço cedido para realização das coletas, e ao Geovane de Souza Siqueira curador do herbário CVRD, que colaborou imensamente para identificação e localização da espécie.

Referências

Ahmad, K.J. Epidermal hairs of Acanthaceae. Blumea, v. 24, pp. 101-117. 1978. Aoyama, E. M; Indriunas, A.. Anatomia foliar de duas espécies de “anador”: Justicia

pectoralis Jacq. e Justicia gendarussa Burm. F. (Acanthaceae). In: VI Simpósio Iberoamericano de Plantas medicinais, 2012, Ponta Grossa.

Aoyama, E. M; Indriunas, A.. Anatomia foliar de três espécies de Justicia

L.(Acanthaceae) da mata atlântica. In: Simpósio sobre biodiversidade de Mata Atlântica: conservação e sustentabilidade, 2012, Santa Teresa.

Fahn, A.1990. Plant Anatomy. Pergamon Press, Oxford, UK 588pp. Graham, V. A. W.1988. Delimitation and Infra-Generic Classification of Justicia

(Acanthaceae) Kew Bulletin 43 (4): 551-624. Judd, W. S.; Campbell, C. S.; Kellogg, E. A.; Stevens, P. F. Sistemática Vegetal: um

enfoque filogenético. 3. ed. Porto Alegre: Artmed, 2009. 632 p. Kollmann, L. J. C.; Fontana, A. P.; Simonelli, M.; Fraga, C. N. As Angiospermas

ameaçadas de extinção no Estado do Espírito Santo. In Simonelli, M. & Fraga, C. N. (Org.). Espécies da flora ameaçadas de extinção no estado do Espírito Santo. Vitória: Ipema, 2007. p. 108-112.

Larcher, L.; Boerger, R. M. 2006. Anatomia foliar de Odontonema strictum (Nees) O.

Kuntze (Acanthaceae). Curitiba: Biotemas. Metcalfe, C. R.; Chalk, L. 1983. Anatomy of the dicotiledons: wood structure and

conclusion of the general introduction. Clarendon Press, Oxford. Metcalfe, C. R.; Chalk, L. 1965. Anatomy of the dicotiledons,leaves, steam, and wood

in relations to taxonomy whit notes on economic uses. Clarendon Press, Oxford, UK, 560pp.

Profice, S.R., Kameyama, C., Côrtes, A.L.A., Braz, D.M., Indriunas, A., Vilar, T., C.

Pessoa, Ezcurra, C., Wasshausen, D. 2012. Acanthaceae in Lista de Espécies da

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Flora do Brasil. Jardim Botânico do Rio de Janeiro. Disponível em: http://floradobrasil.jbrj.gov.br/2012/FB000033.

Vale, 2013. Herbário virtual. Disponível em: http://www.vale.com.br/pt

br/sustentabilidade/Biodiversidade/reserva-natural-vale/herbario-virtual/Paginas/default.aspx (03/05/2013)

Vidal, W.N, Vidal, M.R.R., 1995. Botânica organografia. Viçosa: Imprensa

Universitária UFV.

Figura 1. Análise anatômica de folhas de Justicia wasshauseniana Profice (Acanthaceae). 1.a- Secção transversal da nervura central. 1.b- Secção transversal da região internervural do limbo. 1.c- Tricoma tector unisseriado presente na epiderme adaxial.1. d- Secção paradérmica da face abaxial do limbo, evidenciando o litocisto (seta branca). 1.e- Secção paradérmica da face adaxial do limbo. A seta preta indica um tricoma glandular unisseriado e a seta branca indica o litocisto. 1.f- Secção transversal do pecíolo.