Moendo corações e forjando mentes

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MOENDO CORAÇÕES E FORJANDO MENTES: A TV ABERTA BRASILEIRA MOENDO CORAÇÕES E FORJANDO MENTES: A TV ABERTA BRASILEIRA André M. Gavazza André M. Gavazza “Quem tem dinheiro controla Radar, satélite e antena Palco, palanque e arena Onde quem não tem rebola” (Quem e ninguém. Siba)

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Texto de análise do conteúdo da tv aberta brasileira apresentado no 21º curso anual do NPC.

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MOENDO CORAÇÕES E FORJANDO MENTES: A TV ABERTA BRASILEIRAMOENDO CORAÇÕES E FORJANDO MENTES: A TV ABERTA BRASILEIRA

André M. GavazzaAndré M. Gavazza

“Quem tem dinheiro controlaRadar, satélite e antenaPalco, palanque e arena

Onde quem não tem rebola”(Quem e ninguém. Siba)

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MOENDO CORAÇÕES E FORJANDO MENTES: A TV ABERTA BRASILEIRAMOENDO CORAÇÕES E FORJANDO MENTES: A TV ABERTA BRASILEIRA

Ainda que a chegada de novas tecnologias da informação e comunicação tenha abalado o papel até então incontestável da televisão, gerando debates acalorados sobre seu desaparecimento, a decadente e tão mal falada TV aberta ainda é o veículo mais usado como meio de informação e entretenimento no Brasil1.Tudo no que acreditamos, de que temos medo, o que desejamos, todas as nossas reações, tendências, dúvidas, certezas e inseguranças, ou seja, tudo o que somos, ou ao menos acreditamos ser, é fruto de um complexo emaranhado de informações a que somos expostos - a maioria das quais sem que sejamos conscientes. O meio audiovisual, do qual a televisão é ainda o maior expoente, é por excelência o modo de comunicação do ser humano contemporâneo. A TV se mostra assim uma das vias mais eficientes para a construção do olhar sobre o mundo que nos rodeia e sobre nós mesmos. Seu impacto e credibilidade2 fazem dela uma excelente arma de convencimento sobre o que quer que se queira.O discurso veiculado através da TV é assimilado de maneira fluida e constante. Não é necessário, portanto, que alguém assuma a função de guru e o transmita clara e diretamente, ainda que isso ocorra eventualmente. Absolutamente tudo o que está presente na TV é parte de um mosaico de informações que reproduz sem parar valores, pontos de vista e certezas capazes de ser absorvidos pela maioria desatenta dos espectadores3. Palavras soltas, as cores do cenário, a performance do apresentador, a trilha sonora, tudo “entra pelos poros” dos milhões de brasileiros expostos diariamente à televisão.

Muitos Brasis e poucas vozes4

O alarmante são os interesses que se apropriaram desse poderosíssimo instrumento de construção da hegemonia. Num país tão plural quanto o Brasil, 90% do conteúdo televisivo transmitido é produzido no eixo Rio-São Paulo5 e as cinco principais redes de TV são responsáveis por 82,5% da audiência nacional, controlando 65% de todas as emissoras do país6. Sob o pretexto de nos representar, portanto, o que essas redes de TV fazem é nos impor um olhar sobre nós e o mundo em que vivemos a partir de uma perspectiva extremamente limitada e etnocêntrica. Acabamos nos sentindo representados em padrões que não nos representam, mas cuja aceitação legitima a manutenção e fortalecimento dos privilégios daqueles que os forjam.Como repetia inúmeras vezes o incansável comunicador popular Vito Giannotti, a mídia tem lado. E que lado é esse? Tomando como base os canais de TV aberta do Rio de Janeiro, que pertencem a famílias milionárias e grupos empresariais7, a resposta é clara: o lado da elite, da burguesia, do patrão. Os interesses desse grupo são defendidos obedecendo a três motivações básicas: Ideológica (estrutural), econômica (material) e política (conjuntural). Essas motivações se retroalimentam,

1 Segundo a Pesquisa Brasileira de Mídia de 2015, 95% dos brasileiros veem TV, sendo que 73% o fazem diariamente, buscando informações (79%) e entretenimento (67%). Segundo a mesma pesquisa, 72% dos lares brasileiros possuem TV aberta, enquanto 23% possuem TV por antena parabólica (http://www.secom.gov.br/atuacao/pesquisa/lista-de-pesquisas-quantitativas-e-qualitativas-de-contratos-atuais/pesquisa-brasileira-de-midia-pbm-2015.pdf).

2 54% dos brasileiros confiam sempre ou muitas vezes nas notícias veiculadas na TV (ibidem).

3 Apenas 23% dos entrevistados afirmam não praticar qualquer outra atividade enquanto assistem TV (ibidem).

4 Retirado do título do anteprojeto apresentado por Monique F. M. Da Silva ao Programa de Pós-Graduação em Mídia e Cotidiano do Instituto de Arte e Comunicação Social da UFF.

5 http://www.direitoacomunicacao.org.br/noticias.php?id=4768.

6 http://www.intervozes.org.br/direitoacomunicacao/?page_id=28556.

7 Família Marinho (Rede Globo), Amilcare Dallevo e Marcelo de Carvalho (Rede TV!), família Saad (Rede Bandeirantes), família Martinez (CNT), família Abravanel (SBT) e Edir Macedo (TV Record).

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formando um circuito fechado. Os valores defendidos sedimentam o conjunto de ideias (ideologia) que legitima uma estrutura social benéfica aos interesses da burguesia em detrimento da maioria dos grupos sociais. Os grupos políticos engajados nesse projeto de sociedade garantem seu funcionamento através do acesso às instituições públicas. O parceiros comerciais também pertencem ao seleto grupo de beneficiários dessa estrutura social e financiam esse mecanismo através de anúncios publicitários e investimentos em campanhas e projetos dos grupos políticos. Esses três atores (mídia corporativa, políticos conservadores e grupos empresariais) fazem parte do “clubinho exclusivo” que determina a informação que vamos ver, ler e ouvir.Quais são essas informações? Que facetas da verdade nos são empurradas goela abaixo? O que, sem que percebamos, “entra pelos nossos poros” durante a exposição à programação televisiva? Quais são esses valores que pretendem nos representar sem representar? Que mentiras repetidas mil vezes se tornam verdades8, nos fazendo colaboradores de um regime que nos oprime? Enfim, o que o referido “clubinho exclusivo” nos permite e incentiva assistir?

Dissecando o mosaico

Para responder as perguntas acima, me propus o seguinte exercício. Sem desconsiderar as informações apreendidas anteriormente (afinal, a TV faz parte do nosso cotidiano, sejamos telespectadores ou não), observar atentamente durante um período determinado a maior variedade possível de programas da TV aberta, tentando abranger todas as sete emissoras VHF, a maioria das faixas horárias, todos os dias da semana e a maior variedade possível de gêneros televisivos. Durante a observação, também me propus a observar os maiores anunciantes publicitários e, quando possível, descobrir quem está por trás deles.Tal empreitada deveria ser capaz de explicitar, de uma maneira geral, o discurso dominante na TV aberta brasileira, com seus lugares-comuns, preconceitos, invisibilidades e estereótipos. Também seria possível reconhecer os financiadores desse conteúdo e talvez até encontrar alguma relação entre o conteúdo transmitido e seus interesses diretos. As informações coletadas deveriam ser passíveis de categorização e quantificação, de maneira a tornar mais nítidos seu alcance e conteúdo, fazendo-as valiosas para a desconstrução do discurso que se pretende analisar. É verdade que o tempo total observado (7 horas e 25 minutos) pode ser considerado pouco significativo, mas se levarmos em conta que o tempo médio de um telespectador brasileiro na frente de um televisor é de 4 horas e 31 muntos9 por dia, o tempo observado pode ser visto como a condensação da experiência televisiva de um espectador médio em pouco mais 1 dia e meio. Limitações à parte, o universo analisado, que respeitou à medida do possível o desequilíbrio dos índices de audiência das diferentes emissoras10, permite chegar a algumas conclusões. O conteúdo observado corresponde a:

• Total de 7 horas e 25 minutos, divididos assim:

◦ Rede Globo: 2 horas e 57 minutos;

◦ Rede Record: 1 hora e 18 minutos;

◦ SBT: 1 hora e 11 minutos;

◦ Bandeirantes: 43 minutos;

◦ TV Brasil: 36 minutos;

8 Paráfrase da famosa citação do ministro da propaganda nazista Joseph Goebbles.

9 Pesquisa Brasileira de Mídia de 2015 (http://www.secom.gov.br/atuacao/pesquisa/lista-de-pesquisas-quantitativas-e-qualitativas-de-contratos-atuais/pesquisa-brasileira-de-midia-pbm-2015.pdf).

10 Exceção feita à TV Brasil, que foge do padrão das emissoras comerciais e acaba cumprindo o papel análogo ao de grupo de controle.

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◦ Rede TV!: 23 minutos;

◦ CNT: 17 minutos.

• Período compreendido entre 16/09/2015 a 03/11/2015 (48 dias);

• Dias observados: 16/09, 19/09, 25/09, 01/10, 07/10, 11/10, 15/10, 16/10, 21/10, 26/10 e 03/11 (11 dias);

• Gêneros observados: coluna social eletrônica, culinária, entrevistas, evangélico, filme de longa-metragem, programa de auditório, reality show, série animada, telejornal local, telejornal nacional, telejornal policial, telenovela e variedades.

Ocupar, catequizar, cativar

“Pedir ela quer. Pergunta se quer trabalhar, fazer uma faxina, lavar uma roupa. Não quer!”. “É mulher de malandro. Eles se merecem”. “Quando a mulher diz 'não', quer dizer talvez. Quando diz 'talvez', quer dizer 'sim'”. “Não quer ter filho? Fecha as pernas!”. “Para que o mundo funcione bem, basta que cada um faça a sua parte”. “Quem faz a escola é o aluno”. “O Brasil é o país da impunidade”. “Quem acredita em regeneração de traficante acredita também em Papai Noel”. “Os direitos humanos defendem bandidos. Quem defende os direitos do cidadão de bem?”. “Bandido bom é bandido morto”. “A solução é demolir todas as favelas”. “MST e MTST são braços terroristas do PT”. Frases como estas podem ser facilmente ouvidas em locais públicos, no ambiente familiar, locais de trabalho ou lidas em comentários em blogs ou redes sociais. Na base de todas elas está um sistema de valores e crenças, que através de aproximações, analogias e saltos conclusivos geralmente muito pouco fundamentados, criam uma percepção de mundo que poderia ser descrita mais ou menos assim:

Antes de tudo é preciso saber que o mundo sempre foi como é. A família, a maternidade, a monogamia, o amor romântico, os padrões estéticos, tudo isso é imutável, aistórico e - por que não dizer? - sagrado. Questionar ou tentar mudar isso são atos dignos de punição.A boa revolução, portanto, se aproxima da caridade. O revolucionário é uma pessoa que faz o bem ao próximo e permite a comunhão dos ideais e valores eternos. Não há qualquer problema entre classes sociais. O que há são pessoas boas e pessoas más. A elite pode e deve ser generosa com seus serviçais, que devem ser gratos a ela. Diga-se de passagem, são os ricos de bom coração, que através de sua genialidade e esforço individuais alcançaram destaque na sociedade, os responsáveis pelos sucessos da humanidade. Devemos tudo a seu dinheiro - Deus onipotente - e seus méritos. Eis os verdadeiros revolucionários.Não nos confundamos, entretanto. Solidariedade é uma palavra vazia. Ninguém ajuda outra pessoa se não enxergar vantagens imediatas e é assim que deve ser. Seres humanos se movem por razões meramente pessoais. Portanto, conflitos de ordem coletiva devem ser resolvidos por vias individuais, valendo recorrer às intrigas e agressões quando necessário. Nunca devemos nos esquecer do valor supremo: a obediência. Nunca questionar as regras e punir severa e individualmente os que as descumprem. Afinal, há razões divinas para que certos indivíduos ou grupos sejam predestinados ao sucesso. Não há alternativa a não ser obedecer aos desígnios superiores. Há especialistas - nossos guias - , que com uma abordagem técnica podem provar que essa verdade é lógica, racional e cientificamente respaldada. Não devemos dar ouvidos a grupos potencialmente violentos como os sem terras ou grevistas, que não passam de vagabundos que causam insegurança e atrapalham os que querem trabalhar. Estes sim devem ser festejados. O trabalhador ordeiro e comportado, o empreendedor que busca encontrar e seguir sua vocação é o verdadeiro cidadão de bem com quem devemos nos identificar.Em terras tupiniquins, no entanto, parece que essas verdades irrefutáveis ainda não surtiram efeito. Por ora, o bom humor é o que nos tem restado para lidar com nossa natural

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incapacidade de fazer o que quer que seja bem feito. Diferentemente dos vizinhos argentinos, que estão a um passo de finalmente interromper uma sequência de 12 anos da família Kirchner no poder. Eles precisam de menos Cristina e mais Papa Francisco, a celebridade pontífice que foi “divar” no congresso dos EUA e na Assembleia Geral da ONU, onde, aliás, também esteve presente a trapalhada presidente Dilma Rousseff, o que, convenhamos, não tem a menor importância. Importante é a generosidade da abnegada Alemanha de Angela Merkel, que está arcando sozinha com a altíssima conta dos refugiados sírios, os únicos no mundo que fazem jus à nossa nossa atenção, culpa exclusiva da ditadura de Bashar Al-Assad e seu aliado Vladmir Putin. Alheios a tudo isso, Chile e Bolívia seguem em sua picuinha pelo litoral do Pacífico. Chafurdando em problema menores, a América do Sul jamais deixará de ser a latrina onde o mundo civilizado despeja suas sobras e dejetos.Ora, mas já nos afogamos em nossos próprios dejetos. O governo, a CBF, Lula, nada e ninguém na política presta. São todos corruptos e desonestos. Crise, crise, crise. Governo está na corda bamba. Crise, crise, crise. Receita Federal não trabalha direito. Crise, crise, crise. Muito precisa ser feito para sairmos desse lamaçal. A começar pela educação, que é uma mercadoria como qualquer outra e deve estar toda nas mãos da iniciativa privada, já que o estado não sabe gerir decentemente os recursos de que dispõe, além de fornecer um serviço que não responde às demandas práticas dos clientes e do mercado. Mas isso não basta. É necessário que, uma vez privatizado este serviço, as empresas que o exploram sejam subsidiadas generosamente pelo estado, ao contrário do que acontece hoje, quando os empresários da educação se veem de mãos atadas para sobreviver em meio à crise sem os incentivos de que precisam. Que estado é esse que não cumpre suas obrigações de sustentar o livre mercado? Mas nem tudo está perdido. Grandes empreendimentos como os megaeventos pipocam no país nos últimos anos, nos fazendo felizes e deixando seu legado. Devemos comemorar sua realização e torcer para seu sucesso. Devemos reconhecer também o valor das empresas sérias e corajosas, que apesar de tudo seguem cumprindo magnificamente seu papel social, como a Companhia do Metropolitano de São Paulo. Gigantesco, moderno, seguro e eficiente, o metrô de São Paulo funciona do jeito que a cidade merece.Em um país violento como o Brasil, a segurança se torna uma preocupação central do cidadão de bem. Devemos tomar todas as medidas para nos proteger contra aqueles que perturbam nosso estilo de vida, criando zonas exclusivas, onde agentes privados de segurança têm poder de polícia, nos blindando, isolando e punido todo tipo de elemento estranho, sejam ladrões, pedintes, vendedores ambulantes, suburbanos, favelados ou pobres em geral. Fora dessas zonas exclusivas, temos a polícia do nosso lado, lutando incansavelmente contra o crime e garantindo nosso constantemente ameaçado direito à propriedade privada. E fazem isso sempre que possível de forma respeitosa , mesmo quando motivados por questões individuais e cometendo alguma ilegalidade. Por isso, não podemos permitir que nossa polícia continue acuada pelos criminosos e os defensores dos direitos humanos, que não passam de demagogos e protetores de bandidos metidos em sujeira até o pescoço. Ela precisa cumprir sua função de vigiar, invadir e controlar as favelas, onde eventuais excessos e violações de direitos são efeitos colaterais aceitáveis da justa política de segregação social que garantirá nossa paz. Deixem a polícia trabalhar! Sorte nossa que os jornalistas sérios também estão do nosso lado. Sorte nossa contar, por exemplo, com o Globocop, mistura de policial cibernético e olhos da lei, apoiando a polícia em sua missão de vigilância. Além disso, é preciso que esses criminosos sejam severamente punidos, independentemente da idade. Jovens ou não, pessoas envolvidas com o crime são irrecuperáveis.A favela é um território de guerra e a violência cometida por velhos mafiosos de sotaque italiano, respeitáveis senhores de cabelos brancos ou belos jovens caucasianos de corpos sarados são relativizáveis. Personagens complexos e parecidos demais conosco, cidadãos de bem, não podem ser julgados por suas contradições. É quando asfalto e favela e se misturam. É quando nos reconhecemos como um só povo, uma massa homogênea, composta

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majoritariamente de brancos de beleza condizente com o padrão hegemônico, pouco importando se vivemos em um bairro de luxo ou em uma favela, onde, como se sabe, quase não há negros. Caso queiramos encontrá-los, devemos procurar na cozinha da casa de alguma família burguesa, local onde é permitido que empregados negros e uniformizados socializem. Ou assistir uma partida de futebol, o show de uma banda de jazz ou de samba. Sua função é nos servir ou entreter. Os negros são e sempre foram, afinal, os coadjuvantes subalternos do mundo, ao que deveriam ser gratos, já que ao menos têm um espaço. Não têm história ou lugar em qualquer mitologia relevante e sequer sua espiritualidade é legítima. Se forem pobres - e portanto fracassados - e ainda pior, jovens, e ousarem sair sem permissão da favela (onde sabemos que são minoria) e de seus bairros precários, tornam-se inimigos públicos e medidas preventivas, ainda que ilegais, devem ser tomadas contra eles. Eles devem permanecer lá no seu território, aguardando e agradecendo a generosidade do estado e seus parceiros, que com suas UPPs e eventos culturais se esforçam para fazer da favela um cartão postal digno de ser exibido aos grandes investidores da nova cidade-mercadoria. Desta forma, talvez possam se encaixar no grande projeto vitorioso de modernização do espaço comum. Indígenas? Não temos esse produto aqui, senhor.A beleza física, sempre jovial, em diferentes tons de branco e em um corpo trabalhado, deve ser um critério para que as portas se abram na sociedade. Esse é o mérito de inúmeros winners, que se tornaram celebridades e cuja intimidade muito nos interessa. São modelos ideais nos quais devemos nos espelhar. Sua futilidade, mas também virtudes como fé e castidade, nos são ostentados para que os celebremos e desejemos, Homens e mulheres têm desde nascença desejos e vocações diferentes. É tolerável que algumas mulheres frequentem o espaço do homem e até mesmo que assumam funções masculinas, desde que sigam se submetendo às regras imutáveis e inquestionáveis impostas pelos homens.Às vezes os homens são mais agressivos com as mulheres do que são com outros homens. Também, pudera, mulheres são naturalmente histéricas e mentalmente desequilibradas. Invasão de privacidade, agressão física e cárcere privado cometidos contra uma mulher são atos repreensíveis, mas toleráveis. Como sabemos, hoje em dia homens e mulheres têm os mesmos direitos e a mulher reúne todas as condições para garanti-los. Quando não o faz, portanto, a culpa é dela. A maior vítima desses atos, no fim das contas, é a sagrada relação entre o agressor e a agredida. A família deve ser protegida a qualquer custo! Por família entende-se a estrutura mononuclear, monogâmica e patriarcal. Se, além de tudo, a mulher for mãe, é dessa maternidade que deve tirar sua força. Ela deve aceitar qualquer coisa para cumprir seu papel de protetora dos filhos e da família, inclusive ser comprada por um mafioso branco e riquíssimo, especialmente se, além de mãe, for negra. A regra é clara: os homens cuidam do futuro da humanidade;as mulheres, da família. Caso falhe neste papel, há uma outra função reservada a elas: carne para consumo masculino. Para ter sucesso, no entanto, em qualquer desses dois papéis, é preciso manter eternamente sua beleza jovial e afinada com a ordem vigente, não medindo esforços para superar suas concorrentes.Gays praticamente não existem. Quando encontramos um, ele e seu gênero confuso representam um incômodo para os padrões da tradicional e sagrada família. No entanto, àquelas que se desgarraram do padrão tradicional é permitido tentar lidar com novos paradigmas. Mas tudo tem limite. Travestis não toleramos. Eles são patéticos, motivos de piada e, quando se tornam um estorvo, devem ser removidos. Transgêneros, aberrações ainda mais raras que os gays, têm um gênero ainda mais confuso que o destes. É inadmissível que não possamos enquadrá-los como homens ou mulheres.Ouço aqui, quase como um murmúrio, vozes dissonantes. Dizem que pessoas comuns têm profundidade afetiva. Afirmam que o futebol feminino é relevante. Assumem que a mulher pode tomar decisões em relação ao seu corpo, que pode se entregar, abandonar, etc. Dizem

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ainda que travestis e transexuais, tradicionais vítimas de preconceito, têm na prefeitura de São Paulo apoio para fazer valer seus direitos. Ora, só podiam ser as vozes esquerdopatas do aparato público desse governo comuno-feminazi.

A descrição acima corresponde ao que se pode apreender do conteúdo transmitido pela TV aberta brasileira. Difícil determinar com precisão se as opiniões e posicionamentos aqui representadas pelas frases citadas anteriormente são causa ou consequência dessa avalanche de “verdades” que os “barões da mídia” nos empurram. Afinal, a opinião pública e e fluxo midiático são forças que se retroalimentam. Seja como for, pouco importa que não sejamos nada parecidos com o que a TV nos diz que somos ou o mundo não se comporte da maneira que ela nos informa. O fato é que de tanto reproduzirmos um discurso que não é nosso, acabamos nos moldando a ele, como uma profecia que se autorrealiza. Cabe aqui destrinchar esse convincente mundo de fantasia do qual nos embriagamos diariamente.

O lugar do negro

Na TV aberta brasileira o negro tem um espaço extremamente limitado. Apesar de pretos e pardos representarem, segundo o Censo de 2010, mais da metade da população brasileira11, estão ausentes ou têm presença insignificante em mais da metade do tempo de programação, segundo o observado nesta pesquisa. Essa insignificância chama especial atenção nas telenovelas, mesmo em espaços onde uma forte presença negra seria esperada, como nas duas favelas onde são ambientados núcleos de “I love Paraisópolis” e “A regra do jogo”, exibidas pela Rede Globo respectivamente no horário “das sete” e “das nove”. Seja na versão “projaqueana” da gigantesca comunidade paulistana, seja no fictício Morro da Macaca, o aspecto é clean, meticulosamente composto para dar a impressão que se quer passar da favela ideal, conforme afirma a diretora geral e de núcleo da novela das nove: “É uma favela que deu certo: feliz, colorida e alegre. Uma mistura de vários lugares como Santorini, na Grécia, as Ramblas, em Barcelona, México, Trancoso, Vidigal. São muitas cores e muitas texturas. Não é só cenário pelo cenário. Eu quis tratar de Brasil, de ser humano”12. Para a diretora, o ser humano e o Brasil que deram certo são gente branca como Suzana Vieira, Juliano Cazarré e Cauã Reymond, que estampam a página de apresentação da favela cenográfica. Em “I love Paraisópolis”, é com os personagens de Bruna Marquezine, Alexandre Borges, Caio Castro e Tatá Weneck que vamos conhecer essa comunidade que, segundo Wolf Maia, diretor de núcleo, “significa o Brasil inteiro”13. Assistindo o vídeo de apresentação da “maior cidade cenográfica já feita no Projac”14, descobrimos que os negros e pardos só tiveram espaço na mão de obra usada na sua construção. Com certeza esse também foi o papel reservado a eles no limpíssimo folhetim “Os dez mandamentos”, exibido pela Rede Record com a tradicional obstinação cristã de embranquecer sua mitologia e a história antiga.Essa redução dos papéis em que são retratados os negros é tão inaceitável quanto sua ausência ou insignificância. Ocupando sempre lugar subalterno, pretos e pardos não parecem se prestar a outra função que não servir ou entreter. A desconfiada e uniformizada Melodia de “I love Paraisópolis” ou a “empregada já da família” Dinorah, de “A regra do jogo” servem à elite branca, ainda que decadente no segundo caso. Deodora (Dani Ornellas), mulher negra e favelada, não poderia exercer outra função na novela das sete que não a de faxineira. Reunir a condição de negra e mulher permite que possam ser tratadas como mercadoria, como se vê na transação disfarçada de ajuda entre Don Peppino (Lima Duarte) e Deodora. Ninfa, interpretada por Roberta Rodrigues na novela das nove, pode nos divertir e atrair com seu rebolado, assim como Bira, com sua risada gostosa e talentos musicais no Sexteto do Jô. Também podemos nos deleitar com o baile do professor Patrick

11 http://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/periodicos/93/cd_2010_caracteristicas_populacao_domicilios.pdf

12 http://oglobo.globo.com/cultura/revista-da-tv/bem-vindo-ao-morro-da-macaca-visitamos-principal-cenario-de-regra-do-jogo-nova-aguardada-novela-das-21h-17264098

13 http://gshow.globo.com/novelas/i-love-paraisopolis/extras/noticia/2015/05/com-10000-m-cidade-cenografica-de-i-love-paraisopolis-e-a-maior-ja-feita-no-projac.html

14 Idem.

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Carvalho, que serve de escada para a branquíssima Françoise Forton na “Dança dos famosos”, quadro do “Domingão do Faustão” reverberado no “Vídeo Show” do dia 15/10. Neste mesmo programa, uma bela e seminua mulher negra aparece como “anja” de propriedade de Lamartine Babo, que argumenta “discutir o sexo dos anjos” com ela, no programa “Vai lá Lalá”, reapresentado como homenagem a Miele, recentemente falecido. Se esses “afrotalentos” não forem suficientes para agradar o telespectador, talvez em uma partida de futebol, evento fartamente noticiado, como aqui se pôde observar no Repórter Brasil e no Jornal da Globo (TV Brasil e Rede Globo, respectivamente), cumpra essa função.Em certos casos, um espaço menos subserviente pode ser concedido ao negro, em especial se seu tom de pele “nem tão negro assim” o permitir, como no da personagem Patrícia, naturalmente coadjuvante, interpretada por Lucy Ramos em “I love Paraisópolis”. Amiga, crítica e articulada, ela é a terapeuta de Margot, personagem de destaque interpretada pela super branca Maria Casadevall. Também é possível encontrá-los na função de repórter ou de “garota do tempo”, sempre servindo de suporte aos âncoras, estrelas sempre brancas dos telejornais. Estes casos foram observados no “Bom dia Brasil” e no “Jornal Nacional”, todos da Rede Globo.Mesma sorte não têm aqueles pardos que, por “mau comportamento”, acabam relegados ao papel de vilões. Além de negros, jovens e favelados, estes interpretam o suspeito de arrastão, traficante preso, criminoso em fuga e adolescente retirado justamente do ônibus pela polícia, como na 2ª edição do RJ TV do dia 16/10/2015.Dos sete canais abertos analisados, a Rede Record se apresentou como a que mais esconde o negro de sua programação, não sendo observada presença significante desse grupo durante os 78 minutos observados, que incluíram uma telenovela e alguns poucos minutos de telejornais policiais, um reality show e um filme de longa-metragem. Ao contrário, a Rede Globo é a que mais opta por representar o negro, o que só não ocorreu nos 13 minutos de observação da telenovela “Além do tempo”. Nas 2 horas e 44 minutos restantes, no entanto, o negro aparece quase sempre nos papéis tradicionais acima descritos, de onde se conclui que ao invés de esconder, a Globo prefere controlar e construir a imagem e o discurso sobre o negro de acordo com seus interesses.Salvo a exceção da TV Brasil, a história, a mitologia, a espiritualidade, em suma a cultura produzida pelo negro está completamente ausente da TV aberta brasileira, a menos que possa ser apropriada como mera mercadoria, como a transmissão do carnaval do Rio de Janeiro ou Salvador ou completamente deslegitimada, como em programas evangélicos do tipo “Desmanche espiritual”, exibido pela CNT. Sua beleza, raramente presente no conteúdo televisivo e ainda mais rara na publicidade, precisa ser castrada até caber nos limites do “grau de negritude” permitidos pelos padrões dominantes. Com sua autoestima destruída e sem um contra-discurso que os afirmem como cidadãos portadores de direitos e sujeitos de sua história, cabe ao negro brigar por um lugar ao sol, na TV ou na sociedade, que se encaixe nos papéis subservientes e comportados previstos no grande projeto de conciliação de classes em andamento, ou assumirem a função do vilão, que antes de ser uma resistência a este projeto, ocupa um lugar necessário para seu bom funcionamento. Uma das consequências disso pode ser ilustrada pelo aumento de 14,1% das taxas de homicídio da população negra por armas de fogo entre 2003 e 2012, ao passo que uma queda de 18,7% da mesma taxa se verifica no mesmo período na população branca15. Em poucas palavras, obedeça ou morra. Ainda assim, é comum encontrarmos posições que tentam defender que a questão do negro não existe, que o problema da desigualdade no Brasil é meramente socioeconômico e que, lançando mão de soluções que atacam unicamente este campo, naturalmente os problemas de negros e brancos seriam resolvidos. Nessa linha, ataques às cotas raciais – instrumento que aumentou consideravelmente o acesso de negros às universidades, com resultados sobre desempenho e evasão animadores16 - , como no vídeo publicado pela Folha de São Paulo com a modelo Carol Prazeres 17, ajudam a

15 Mapa da Violência 2015 (http://www.mapadaviolencia.org.br/pdf2015/mapaViolencia2015.pdf).

16 http://revistaforum.com.br/digital/138/sistema-de-cotas-completa-dez-anos-nas-universidades-brasileiras/

17 https://www.youtube.com/watch?v=xRNtn3UyIdI

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sedimentar o mito de que é possível construir uma sociedade mais justa sem tocar na questão especificamente racial.

O lugar da mulher

Ao contrário do negro, a mulher na TV aberta brasileira sempre teve presença marcante. Vale aqui, portanto, qualificar essa presença. Deixando de lado o conteúdo publicitário, percebe-se um certo grau de pluralidade na maneira como a mulher é retratada. Ainda assim, antigos preconceitos persistem e podem ser observados mesmo em uma rápida olhada na programação televisiva.A função mais frequentemente reproduzida é a de âncora de telejornal ou apresentadora de programas de auditório ou de variedades. Chama a atenção que nos telejornais de abrangência nacional, as âncoras estão sempre acompanhadas de um homem, independentemente da emissora ou faixa horária. O motivo parece claro. Esses são exatamente os programas jornalísticos que pretendem passar a impressão de maior seriedade e que fazem questão de ter a maior credibilidade possível frente ao público. Como seria possível, em uma sociedade extremamente machista, uma mulher assumir a importantíssima função de informar fatos que podem mudar a história de um país sem a supervisão atenta de um homem? Sua presença, no entanto, confere leveza e um certo ar de equilíbrio a esses programas. Ana Paula Araújo, Christiane Pelajo, Katiuscia Neri, Laura Ferreira, Amanda Klein e Renata Vasconcellos estão no mais alto patamar que uma jornalista pode chegar na TV aberta brasileira. Ana Luíza Guimarães apresenta sozinha o RJ TV – 2ª edição, que apesar dos altos índices de audiência, carrega a responsabilidade de ser apenas um telejornal local. De resto, sobram às mulheres programas pouco sérios como Vídeo Show, Programa Eliana ou Casos de Família. Mesmo no programa de fofocas TV Fama, Flávia Noronha fica sob os cuidados do experiente Nelson Rubens. Nem é preciso dizer que nos telejornais de temática policial a mulher aparece, na melhor das hipóteses, como repórter ou delegada; na pior, vítima ou assassina irrecuperável, como no caso do “Brasil Urgente” exibido no dia 19 de setembro. Não é demais acrescentar que nenhuma das apresentadoras aqui citadas é negra ou, à exceção de Christina Rocha, atingiu os 50 anos de idade.Os estereótipos que legitimam essa imagem de pouca credibilidade da mulher se repetem em diferentes faixas horárias e gêneros televisivos. A histeria, a loucura e o desajuste mental e psicológico estão presentes na postura ensandecida de Mara Maravilha no episódio do dia 16 de outubro do reality show “A Fazenda”, da Rede Record. A catarse de xingamentos e acusações que se vê ali bem poderiam ser observados através da personagem bipolar Nelita, interpretada por Bárbara Paz em “A regra do Jogo”, ou mesmo sua filha Belisa, personagem de Bruna Linzmeyer, que, ainda que de forma injusta, acaba internada em uma clínica psiquiátrica. Além de loucas e histéricas, mulheres são masoquistas e cultivam relações doentias porque, no fundo, gostam disso. Isso é o que se pode entender do episódio do dia 15 de outubro do programa “Casos de família”, exibido pelo SBT e comandado por Christina Rocha. A apresentadora, que faz questão de repetir a todo momento que conhece profundamente a alma feminina e é acompanhada de uma especialista, a psicóloga Anahy D'amico, joga a culpa das atitudes agressivas e mesmo criminosas dos maridos de duas das presentes no programa em cima delas mesmas. Invasão de privacidade, cárcere privado e agressões físicas são assumidos abertamente em um programa vespertino sem que a palavra “crime” seja mencionada. Ao contrário, o caso é tratado como um problema conjugal corriqueiro e a grande preocupação é o salvamento da família.A ideia de que a maior função da mulher é ser mãe e cuidar da casa e da família é presente em diversos momentos. Além do programa de auditório citado acima, vemos a mulher nesse lugar na novela “Os dez mandamentos”, no desespero de Nefertari, esposa de Ramsés que vai implorar a Moisés para que seu deus poupe seu filho da praga. A fuga da rainha, aliás, é algo só justificado pelo estado limite em que se encontra, uma vez que as mulheres na novela estão sempre dentro de casa, enquanto os homens, especialmente Moisés e Ramsés, decidem o futuro do império egípcio, do povo hebreu e negociam diretamente com seus deuses. É pelo dever de exercer essa função, garantindo um futuro digno para sua filha Lilica, que Deodora aceita se casar com Don Peppino em

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“I love Paraisópolis”. A gratidão de Rosa, personagem de Carolina Kasting na primeira fase de “Além do Tempo”, à generosidade do Conde é devida pelos mesmos motivos. No “Bom Dia Brasil” do dia 25 de setembro também vemos uma mãe e uma filha expondo suas justas angústias enquanto a crise na Síria impede que o netinho retorne ao Brasil. São bem mais raras as vezes em que um homem aparece nessa função.Seria essa excessiva dedicação aos filhos e à família e a consequente distância de assuntos mais sérios e complexos o motivo da frivolidade e do ar pueril naturalmente atribuído às mulheres? Seria uma dedução possível se acrescentarmos a todos os relatos aqui expostos a alegria abobalhada de Mônica Iozzi no “Vídeo Show” ou a ingenuidade da empregada Urbana, interpretada por Maria Paula Lima em “I love Paraisópolis”. A personagem de Vanessa Giácomo em “A regra do jogo”, Tóia, é enganada facilmente pelo calculista Romero Rômulo, com quem mantém um romance. É por essa “natural” ingenuidade feminina que a âncora Ana Paula Araújo precisou responder uma pergunta sobre sua preferência entre o vocalista do A-Ha ou Johnny Depp, ao final de uma matéria sobre o Rock in Rio no dia 25 de setembro. Impensável uma pergunta do mesmo tipo dirigida a seu colega Chico Pinheiro. Ali, era a imagem da mulher que sonha com o príncipe encantado que estava sendo encenada, pegando gancho em uma matéria que terminava atribuindo o mesmo papel a três mulheres que participavam da reportagem.Tais idiossincrasias não deixam dúvidas, portanto, que há espaços a serem ocupados por mulheres e espaços a serem ocupados por homens na sociedade. Uns de Marte, outros de Vênus e não se discute isso. No entanto, é tolerável que vez por outra seja permitido que mulheres ocupem espaços tipicamente masculinos, como foi possível conferir no “Programa Eliana” do dia 11 de outubro. Chega a ser fofo ver uma mulher jogando sinuca e sexy uma agente de segurança privada. Sendo este um espaço entendido como do homem, é de se esperar que essa tolerância em relação à presença feminina venha com um preço. Por essa razão, os galanteios dirigidos às seguranças do metrô de São Paulo são tratados como brincadeiras muito bem-vindas pela apresentadora e os outros que participam do programa. O recado é claro: mulheres podem ocupar o espaço masculino desde que aceitem com as regras impostas pelos homens.

No mesmo programa dominical, aliás, a exaltação da beleza jovial dos e das agentes de segurança do metrô é constante. A certa altura a apresentadora chega a perguntar se é preciso passar em teste de beleza para ser aceito na função. Eis que mais uma característica salta aos olhos em relação ao papel da mulher na TV aberta brasileira. A beleza, sempre jovem e geralmente branca parece ser uma condição para ocupar esse espaço. Não é à toa que entre as apresentadoras dos telejornais e programas dos mais diversos tipos esbarremos vez por outra com modelos ou ex-modelos e que a maioria delas, como já salientado, não permaneça na função além dos 50 anos de idade. Neste quesito pouco importa a maneira como a mulher vai ocupar espaço na televisão. Seja como “paniquete”, âncora de um telejornal local ou nacional, protagonista ou coadjuvante de uma telenovela ou mera figurante de um programa de humor, os critérios beleza física, idade e tom da pele sempre serão relevantes.

Tudo isso leva a uma triste conclusão. Tratadas como histéricas, loucas e infantilizadas, as mulheres recebem pouca credibilidade para lidar com temas complexos e sérios. Sua função social fica restrita então ao ambiente familiar, recebendo toda a responsabilidade pelo que acontece nesse âmbito. Incursões ao campo masculino são permitidas, mas sob forte vigilância e limites rígidos. Caso não esteja preparada para assumir esse sagrado papel, a função de objeto sexual é a outra alternativa. Como não basta querer para que se tenha garantido lugar em qualquer dos dois papéis, é esperado que as mulheres compitam entre si, o que implica em manter a aparência jovem e a beleza dentro dos padrões vigentes. Por isso, personagens como Atena, interpretada por Giovana Antonelli em “A regra do jogo” e Soraya (Letícia Spiller em “I love Paraisópolis”) se apresentam como belas, vingativas e maquiavélicas. Pelo mesmo motivo, Fafá de Belém, em entrevista dada no “Programa do Jô” no dia 1º de outubro, afirma que “o pior olho gordo é de atual mulher de ex”. Tal competição é naturalizada ao ponto de ser entendida como inerente à mulher. Uma rápida busca na internet

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pode revelar um mundo dedicado a essa competição, normalmente tratado como mero entretenimento18. Uma vez naturalizada essa construção da mulher, parece justificável que seja objeto de tutela masculina, o que em grande medida pode explicar o vergonhoso posto ostentado pelo Brasil de 7º colocado entre 84 países pesquisados que mais assassinam mulheres no mundo, com uma taxa de 4,4 feminicídios por 100 mil habitantes19. Sob todo o período de “tutela”, as mulheres são agredidas inicialmente por pais, padrastos e conhecidos, em seguida pelos cônjuges e ex-cônjuges e quando idosas pelos filhos20. É mais que claro que a TV aberta tem cumprido importante papel nesse cenário.

O lugar do jovem

Como no caso dos negros e das mulheres, a sobreposição de características vai determinar o lugar que o jovem ocupa na TV aberta brasileira e, por conseguinte, o lugar esperado na sociedade.Basicamente, o que vai determinar a maneira como o jovem é retratado é seu tom de pele e/ou classe social. Se brancos e/ou de classe média ou alta, esses jovens serão retratados de forma predominantemente positiva. Belos, apaixonados, românticos, crentes e castos como Deborah e Bezalel, de “Os dez mandamentos”. Belo, romântico, esclarecido e decidido como Luana, em “I love Paraisópolis”. Estudantes focados, responsáveis e atentos como na reportagem sobre os efeitos da crise sobre as universidades privadas, no “Bom Dia Brasil” do dia 25 de setembro. Filhos que recebem carinho e atenção do pai, como na reportagem sobre o filme “De volta para o futuro” na edição do dia 21 de outubro do telejornal “Café com jornal”. Protagonistas corajosos, como no longa-metragem exibido no dia 19 de setembro no “Cine aventura” da Rede Record. Mesmo quando retratados como bandidos, como o personagem Grego, de Caio Castro em “I love Paraisópolis”, teremos oportunidade de olhar com mais cuidado para o fundo do personagem e descobrir nele humanidade através do amor que nutre por Mari (personagem de Bruna Marquezine que é outro exemplo de jovem belo e cheio de virtudes) e a dor pelo estado de coma em que se encontrava Ximena, sua parceira de “bandidagem”.Caso sejam negros e/ou pobres, a humanidade presente na imagem desses jovens se resume à injustiça resignada, quase justificada, como no caso do adolescente morador da favela do Pavão-Pavãozinho, parado pela polícia quando ia à praia surfar com amigos por estar sem documentos, na edição de 25 de setembro do “Bom dia Brasil”. Ou talvez no preguiçoso ensaio de pesar, na mesma edição, pelo assassinato de uma criança no Caju. De positivo, apenas as crianças e adolescentes das comunidades da Babilônia e Chapéu Mangueira que parecem muito satisfeitas com a realização da Festa Literária das Periferias (FLUPP), evento cultural levado a essas duas comunidades, todas ocupadas por UPPs, destinado a promovê-las a cartão postal da cidade que se quer vender a investidores nacionais e estrangeiros. Assimilar o jovem favelado como coadjuvante desse magnífico projeto do qual, uma vez cumprido seu papel, será sumariamente descartado é o motivo dessa matéria relativamente positiva exibida no “Jornal Nacional” do dia 3 de novembro. Para os demais, os velhos e conhecidos rótulos de suspeito, infrator, ladrão, criminoso, bandido, traficante que abundam na edição do dia 16 de setembro do “RJ TV – 2ª edição” e no “Bom dia Brasil” do dia 25 de setembro. Assassino irrecuperável e monstro também são presentes, como na edição de 19 de setembro do “Brasil Urgente”.No frigir dos ovos, a categoria “jovem” não passa de um potencializador das características dos espaços a serem ocupados por outros grupos sociais. A mulher em busca do papel puro e virtuoso da mãe se torna ainda mais pura se jovem e, preferencialmente, branca. Se no papel de objeto sexual, é apenas na juventude que suas chances de sucesso são reais. Da mesma forma, são os jovens, majoritariamente os brancos, que moldam o padrão estético hegemônico que desfila na telinha. São eles, também, especialmente se negros, os que morrem em maior quantidade quando se trata de

18 http://entretenimento.r7.com/videos/celulite-e-flacidez-veteranas-tentam-derrubar-nova-paniquete-com-picuinhas/idmedia/54090f9a0cf2c56b329fdd83.html

19 http://www.mapadaviolencia.org.br/pdf2012/MapaViolencia2012_atual_mulheres.pdf

20 Idem.

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assassinatos por armas de fogo21.O lugar do pobre e do favelado

A figura do pobre, do favelado e do negro muitas vezes acaba se misturando. De um modo geral, nos programas analisados, o pobre e a favela aparecem cumprindo três funções.A primeira cria um ambiente de completa conciliação de classes. Seja na já referida matéria do “Jornal Nacional” retratando as comunidades do Chapéu Mangueira e Babilônia de maneira extremamente dócil e grata pela FLUPP, seja na maneira grata e subserviente com que se comporta a também já citada personagem de Carolina Kasting na novela “Além do tempo” em relação ao seu patrão, o Conde Felipe Castellini. A inexistência de tensões entre as classes sociais nestes dois casos e a forma positiva como são retratados o conde no último exemplo e o estado e seus parceiros no primeiro, indica que eventuais conflitos possam passar por soluções de caráter individual. O problema não é, portanto, a existência de uma elite, mas sua má qualidade. Da mesma maneira, ricos num mundo repleto de pobres não são um problema se os ricos forem generosos como o conde ou Michael Jay Fox, exaltado na edição de 21 de outubro do telejornal “Café com Jornal”. O ex-ator, portador do mal de Alzheimer, é dono da maior fundação sem fins lucrativos do mundo que pesquisa, não apenas sua doença, mas também mal de Parkinson. O pobre, portanto, ao invés de praguejar contra o sistema que o oprime ou buscar qualquer saída de ordem coletiva, deve torcer pelo sucesso dos bons ricos, do bom estado, das boas empresas, enquanto almeja alcançar também seu sucesso individual em um mundo extremamente competitivo. No reality show da Rede Record “A fazenda”, um episódio chama bastante atenção. Mara Maravilha, por distração, molha o microfone, o que é proibido pelas regras do programa. A punição neste caso atinge a todos os participantes, mecanismo criado para estimular a transformação da punição coletiva em uma punição individual ainda maior aplicada pelos integrantes prejudicados sobre a integrante que desencadeou a pena. Não se espera – e não há espaço para isso – que os competidores questionem a regra, mas a obedeçam e punam severamente quem a descumpriu. Como na famosa frase de Margareth Tatcher, “não há alternativa”22. Obedeça e puna ou seja eliminado. Para cumprir essas regras inquestionáveis o pobre e/ou favelado deve seguir os exemplos de empreendedoras como a personagem Paulucha, de “I love Paraisópolis”, ou o trabalhador vocacionado e feliz celebrado na chamada do “Globo Repórter” do dia 25 de setembro ou que se diverte enquanto trabalha na montagem das estruturas do Rock in Rio, conforme mostrado pelo “RJ TV – 2ª edição”. Se o objetivo/ prêmio está claro, esse pobre e/ou favelado pode ser impelido a se movimentar nesse sentido pelo medo de sentir na pele e na alma o peso do fracasso imposto pela ética protestante, representado pela falta de prosperidade financeira, conforme deixa claro o pastor Daniel Santos do programa “Desmanche Espiritual” exibido pela CNT no dia 7 de outubro.A segunda função é de apresentar a favela e seu morador como um produto acabado para a fruição cool e diferenciada da burguesia e a exploração econômica dos investidores que enxergam nesses territórios boas oportunidades de retorno financeiro. É a favela completamente desprovida de negros, colorida e alegre, “que deu certo”, conforme o descrito pelos gerentes de núcleo das novelas “I love Paraisópolis” e “A regra do jogo”. Nessas favelas, mesmo os criminosos como Grego, Don Peppino, Ximena, Zé Maria, Romero Rômulo e Atena são brancos e respeitáveis aos olhos dos mais preconceituosos. Se a primeira função representa o processo, a segunda é o projeto finalizado. No mundo real, esta fase ainda não chegou, mas está caminhando a passos largos em diversas comunidades da Zona Sul do Rio de janeiro23 e na Paraisópolis real, em São Paulo24.A terceira função é a que estão relegados todos os pobres, favelas e bairros que não se ajustam aos

21 http://www.mapadaviolencia.org.br/pdf2015/mapaViolencia2015.pdf

22 “There Is No Alternative”. A frase ficou conhecida pela sigla TINA e se referia à aplicação de medidas econômicas liberalizantes e impopulares durante o governo da “Dama de Ferro”.

23 http://rioonwatch.org.br/?p=11037

24 http://brasil.elpais.com/brasil/2015/06/01/politica/1433185554_574794.html

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interesses das elites, às quais pertencem, não nos esqueçamos, os donos dos veículos de comunicação que aqui são tratados. Seja por incapacidade técnica ou pessoal, seja por simplesmente não fazer parte dos planos dessas elites ou por se negarem abertamente a se prestarem a esse papel, estes pobres e/ou favelados serão aqueles que serão entendidos como corpo estranho a ser removido, como os vendedores ambulantes e pedintes cuja presença foi denunciada aos agentes de segurança do metrô de São Paulo no “Programa Eliana” do dia 11 de outubro. São estes cuja simples existência configura “atitude suspeita” e deverão ser mantidos longe dos condomínios de classe média através de barras de ferro e grades e mantidos encarcerados por mais tempo, conforme mostrado no “Bom dia Brasil” do dia 25 de setembro. Serão também estes, que ao serem desalojados de suas casas, terão a presença da polícia nas proximidades, não para garantir o seu direito à propriedade privada, mas para que o processo de expropriação do seu direito de moradia seja completado sem transtornos, conforme o noticiado no “Café com jornal” do dia 21 de outubro. A favela onde vivem esses pobres não é colorida como o Morro da Macaca ou a Paraisópolis cenográfica, não está desprovida de negros, mas é difícil saber, já que favelas como essas sempre são mostradas através de vista aérea, de longe, pelos olhos do “Globocop”como a de Honório Gurgel na reportagem do RJ TV – 2ª edição dia 16 de setembro ou do Chapadão e Pedreira do dia 28 de abril. A imagem aérea desumaniza, insinua uma operação de combate e um território a ser conquistado. Algo para ser eliminado, no fim das contas. Todos os adjetivos usados para os negros e jovens que não preenchem os requisitos para serem assimilados ao grande projeto de conciliação de classes também servem para os pobres e favelados. Estes, se conseguirem fugir da aniquilação que está no seu horizonte próximo, não receberão o legítimo tratamento solidário dispensado aos familiares da criança síria cuja família de classe média vive em São Paulo, como noticiado no “Bom dia Brasil”. Ao contrário, serão entendidos como um peso para o estado da mesma forma que o são os refugiados sírios que chegam à Alemanha, segundo matéria presente na mesma edição do mesmo telejornal. Estes são descartáveis, matáveis e invisíveis até que se organizem e comecem a impor seus próprios interesses.

O lugar dos movimentos sociais e populares organizados

Eis uma das ausências mais esperadas e, ao mesmo tempo, marcantes da TV aberta brasileira. Esperada porque não seria possível imaginar que corporações controladas pelos grupos econômicos que são dariam qualquer espaço para aqueles que, em última análise, lutam contra seus interesses. Marcantes porque, a despeito disso, esses movimentos se propõem a representar os interesses da maior parte dos espectadores dessas emissoras.Naturalmente que um conteúdo que martela a todo momento a necessidade de soluções individuais em detrimento das coletivas, que prega incessantemente a delirante conciliação de classes, que promove a competição e a caridade em prejuízo da solidariedade, que se obceca com a ideia da obediência, que se deleita em reforçar estereótipos, que demonstra sintomas gravíssimos da “síndrome de vira-lata”, não tolera os mínimos avanços sociais, celebra alegremente a segregação social, racial e opressão de gênero e não nutre qualquer simpatia pelos valores democráticos não poderia incluir um olhar generoso a respeito de movimentos que lutem por causas populares. Não é à toa que de todo os 26 programas de televisão observados, um deles em duas oportunidades, apenas nos dias 16 de setembro e 21 de outubro, respectivamente no RJ TV – 2ª edição, da Rede Globo, e no “Café com jornal”, da Bandeirantes, foram registradas menções a esses atores. No primeiro caso, é noticiada de forma muito rápida uma manifestação de funcionários dos Correios em greve. Algumas de suas reivindicações são reportadas quase como em uma narração de corrida de cavalos e, mesmo com um espaço tão pequeno para dar a notícia, é lembrada a presença da polícia no local, deixando claro que greves e manifestações populares e trabalhistas não são caso de política, mas de polícia. No segundo caso, as notícias estão condensadas num bloco de notícias rápidas chamado “Expresso de notícias”. É noticiada uma manifestação do MST em frente à Conab. O motivo é explicado de forma rápida e quase ininteligível e logo acrescentado o termo “pacífico” ao protesto, o que pressupõe seu potencial violento. Não bastasse isso, é também reportado que os servidores que chegavam ao local era impedidos de entrar. Supostamente esperava-se que uma

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manifestação do MST pela suspensão do pagamento de um programa importante para os agricultores que representam não alterasse a rotina da instituição. Em seguida é noticiada a continuação da greve dos bancários, que não teriam aceitado a proposta da Federação nacional dos Bancos. Na semana seguinte os bancários seguiam em greve e, no dia 26 de outubro, em uma chamada do “Jornal Nacional” é dito que a greve dos bancários aumenta os roubos aos bancos. Juntando as duas notícias e esta última chamada é possível culpar os malditos bancários por não terem aceito a proposta do patronato e ocasionado o aumento da insegurança nos bancos.Além desses raros casos, vale a pena comentar o personagem Romero Rômulo, da novela “A regra do jogo”. Dono de um discurso humanista muito próximo dos repetidos por defensores dos direitos humanos em geral, Romero não apenas “defende bandido”, como gostam de repetir os mais conservadores, mas também é um deles. Participante de uma“facção” criminosa, Romero não tem escrúpulos em usar seu filho, a namorada (a bela e bem intencionada Tóia) e quem mais passar pela sua frente e puder lhe auferir vantagens. Ex-vereador com contatos na política e dono de uma fundação que trabalha na reabilitação de criminosos condenados, o personagem é provavelmente o maior vilão da novela e seu disfarce de defensor de direitos humanos suscita inúmeras, nada confortáveis ou ingênuas analogias.Movimentos sociais e populares praticamente inexistentes, mas quando presentes apresentados como um estorvo para os cidadãos de bem. Um defensor dos direitos humanos que cumpre todos requisitos para caber perfeitamente na caricatura de lobo em pele de cordeiro de que precisam os grupos mais conservadores para alimentar seu imaginário e reforçar seu discurso. É possível acreditar que nada disso é proposital?

O lugar do homoafetivo e do transgênero

Apesar dos avanços recentes no Brasil e na América Latina dos direitos dos homoafetivos e do crescimento da luta pelos direitos dos transgêneros, a prática de seu apagamento social segue significativa. Tal fenômeno pode ser facilmente observado na TV aberta brasileira, refletindo e ao mesmo tempo reforçando práticas sociais repressivas em relação a esses grupos de cidadãos. Das 27 observações que encerram o total de 26 distintos programas da TV aberta, apenas 2 oportunidades foi possível registrar a presença de homoafetivos, com abordagens significativamente diferentes. Na novela “A regra do jogo”, transmitida no horário nobre da Rede Globo, o casal Úrsula e Duda, ainda que coadjuvantes, introduzem mais do que a presença de lésbicas no ambiente familiar, mas também o debate sobre a constituição de uma família fora dos padrões heteronormativos. Porém, toda essa “ousadia” só é permitida em um ambiente familiar já constituído fora dos padrões tradicionais burgueses, já que a casa de Feliciano abriga uma família numerosa que parece estar sempre de portas abertas. No programa de auditório “Casos de família”, transmitido pelo SBT na faixa da tarde e apresentado por Christina Rocha, em um dos casos abordados no programa de 15 de outubro, ao fazer referência a um amigo de um dos participantes , há uma clara dificuldade em definir o gênero da pessoa, que no fim das contas é apenas cis e homoafetivo. Por algum tempo, a própria apresentadora se mostra confusa em relação à orientação sexual e gênero da pessoa em questão. A presença do personagem citado causa nítido desconforto no casal “aconselhado”.A presença do transgênero é verificada em duas oportunidades. Na primeira delas, no “Programa Eliana”, dominical exibido das 15 às 19h, de 11 de outubro, a personagem Narcisa, interpretada pelo humorista Tiago Barnabé, se pretende uma caricatura de Narcisa Tamborindeguy. No entanto, o que se observa é um personagem patético, atrapalhado, mal educado e com pouco tato social, motivo constante de piadas e alvo de todos as atitudes preconceituosas tradicionalmente praticados contra qualquer pessoa que não se encaixe no padrão heteronormativo. A mesma confusão em relação ao gênero verificada no episódio relatado do programa “Casos de família” é aqui repetido, desta vez pela própria apresentadora, que diz não saber se chama sua “amiga” de “ele” ou “ela”, o que é reforçado pela cena em que, se metendo no treinamento dos agentes de segurança do metrô de São Paulo, a personagem, apresentada nesse momento como fisicamente fraca e incapaz de travar

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uma luta corporal, deixa cair sua peruca, cena repetida inúmeras vezes com efeitos sonoros que deveriam aumentar o humor da cena. O ápice do desrespeito à figura representada pelo personagem se dá no momento em que a apresentadora, trajada de agente de segurança metroviário e se utilizando do poder de polícia que lhe é conferido, ordena que a “amiga” sem noção, que a esta altura já havia se tornado um estorvo, seja retirada dali, o que é feito de forma truculenta por dois agentes, arrastando-a ridiculamente para fora da sala. No “Repórter Brasil”, telejornal noturno exibido no horário nobre pela TV Brasil, do dia 7 de outubro, é noticiado o programa “transcidadania” da prefeitura de São Paulo, que promove escolarização e reintegração social de travestis, transexuais e homens trans25. Na reportagem, são entrevistados os transgêneros Aline e Luciano, que puderam usar seu nome social no exame do ENEM. Aline relata que, com o programa, foi possível voltar a estudar e não se sentir obrigada a se prostituir.Aqui chama a atenção a franca oposição entre duas abordagens. Nos dois programas de auditório vespertinos do SBT, voltados para público de extratos socioeconômicos mais baixos, o tratamento de homoafetivos e trans é extremamente conservador e preconceituoso, chegando a níveis inaceitáveis de agressão. Nos programas da Rede Globo e da TV Brasil, que a despeito de serem exibidos no horário nobre apresentam índices de audiência muito diferentes, voltados no entanto para públicos semelhantes (classes médias), o tratamento é bem mais positivo e complexo. O que se espera disso? Que pessoas homoafetivas e trans pertencentes às classes médias e altas sejam as únicas a gozar dos avanços nos direitos sociais e individuais conquistados nos últimos anos? Será que, além de sermos o país campeão mundial de crimes motivados por homo-transfobia26, queremos garantir que nossas vítimas sejam sempre pobres?

O lugar do indígena

A população indígena brasileira, segundo o Censo de 201027 é de 0,4% do total (aproximadamente 818 mil). Apesar de pouco expressiva em relação à totalidade da população, é a que apresenta maior índice de crescimento, além de corresponder a uma variedade cultural que abrange 274 línguas28.Seria de se esperar que ao menos uma menção, uma notícia rápida ou mesmo um comentário desse conta desse tão diverso e peculiar universo de pessoas presentes no território nacional, se não pelo seu peso demográfico, ao menos pela sua variedade de culturas e possibilidades que representam. No entanto, nas 7 horas e 25 minutos de observação realizados, a única referência feita a um povo indígena foi o breve aparecimento, na edição de 25 de setembro do “Bom dia Brasil”, de Evo Morales, um aymara boliviano que, no entanto, não foi noticiado por ser indígena, mas por ser presidente da Bolívia.Em que pese o tom desdenhoso dedicado à reportagem, em que foi preciso convocar um analista internacional para explicar que o litígio entre Chile e Bolívia pela saída pelo mar é de natureza política (!!!) - o que é apenas uma parte da verdade -, o fato deixa mais que claro que a chegada de grupos historicamente oprimidos a posições de poder é muitas vezes a única forma de evitar seu apagamento do imaginário coletivo e consequente marginalização econômica e social.

Os anunciantes

Como já mencionado, o circuito que movimenta o mecanismo de dominação depende da perfeita conexão entre as três partes, ideológica, política e econômica. Sem estas últimas, desaparecem as bases materiais de que dependem os grupos políticos engajados no projeto dominante de sociedade para tocar suas redes de influência. Também minguam as fontes de financiamento que permitem o bom funcionamento do aparato de comunicação necessário para o sucesso do projeto.

25 http://www.redebrasilatual.com.br/cidadania/2015/07/dignidade-a-comunidade-lgbt-transcidadania-completa-6-meses-7560.html

26 https://homofobiamata.files.wordpress.com/2015/01/relatc3b3rio-2014s.pdf

27 http://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/periodicos/93/cd_2010_caracteristicas_populacao_domicilios.pdf

28 http://www.funai.gov.br/index.php/indios-no-brasil/quem-sao?limitstart=0#

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Da mesma maneira que representantes eleitos com o capital de seus parceiros comerciais não se sentem em posição de virar-lhes as costas quando estes buscam acesso ao estado, os conglomerados de comunicação são atentos às demandas daqueles que os financiam. É o conhecido “uma mão lava a outra”. Se é pouco comum que o conteúdo televisivo seja construído especialmente para atender aos interesses de um ou outro anunciante específico – a menos que se trate de programas patrocinados exclusiva ou majoritariamente por apenas uma fonte – é ainda menos comum que se produza material que desagrade seus patrocinadores/ parceiros. Em certos casos, no entanto, a conexão entre as duas partes é tão perfeita que fica-se com a impressão de termos esbarrado com conteúdo encomendado. É o caso dos dois exemplos a seguir.No dia 25 de setembro, o “Bom dia Brasil” exibiu uma dobradinha de matérias com a educação como tema. Na primeira, são mostradas creches públicas que seguem há muito com as obras paradas ou jamais saíram do papel, a despeito das vultosas somas repassadas pelo governo federal. Na matéria seguinte, noticiou-se o esforço das faculdades privadas para sobreviver frente à crise. De descontos nas mensalidades a uso de propagandas invasivas, as “pobres” instituições fazem de tudo para manter os “clientes” atuais enquanto saem à caça de outros. Com os cortes nos repasse do FIES, teria se instaurado o mundo selvagem da competição capitalista com que todos os liberais sempre sonharam, mas que estranhamente agora serve de motivo para queixas. No final das contas, os defensores do livre mercado parecem não saber viver sem o “paternalismo” do estado. A sequência das duas matérias deixa um recado claro. De um lado, um cenário desastroso promovido por um estado que não é capaz de gerir a educação infantil. Do outro, cortes na subvenção de instituições que, se livres para fazer o que sabem, entregariam aos seus clientes (educação é apenas uma mercadoria, afinal) diplomas de alto valor de mercado e que os ajudariam em sua vida prática, como explica ser a função das universidades Rudá Ricci, apresentado como especialista em educação. Isso combina perfeitamente com a pergunta que encabeça a página inicial da Faculdade das Américas, cujos donos são os mesmos da instituição financeira Crefisa, anunciante do bloco: “você está preparado para disputar as melhores vagas do mercado de trabalho?”29 .No dia 21 de outubro, o também matutino “Café com jornal”, da Bandeirantes, abre o bloco noticiando que a crise vem aumentando a inadimplência nas escolas e faculdades privadas. Ainda que sem o tom dramático e as informações bem amarradas do noticiado quase um mês antes em seu análogo da Rede Globo, a notícia cria um ambiente de solidariedade, por exemplo, com os donos do Colégio Ícaro, um dos anunciantes do bloco de comerciais que havia recém-terminado.Por outro lado, há casos em que se tem a sensação de que essa conexão passa longe. É o que se percebe no anúncio do “Prêmio Juíza Patrícia Acioly de Direitos Humanos”. Não bastasse o prêmio ser uma parceria entre o Bradesco S.A. (um dos financiadores da bancada ruralista através da Klabin S.A.30), a Vale (empresa de lama) e a máfia do transporte no Rio (Rio ônibus e Fetranspor), o anúncio é feito entre dois blocos do telejornal policialesco “Cidade Alerta”, o típico conteúdo televisivo que de forma mais direta e despudorada desdenha dos direitos humanos. A aparente desconexão, antes de ser uma exceção à regra do perfeito funcionamento do tripé de dominação, é puro escárnio em relação aos valores que garantem nossas conquistas civilizatórias. Afinal, a conexão entre os parceiros do produto anunciado e o programa que patrocinam é completo, uma vez que extirpado todo o sentido dos direitos humanos, o uso do termo fica à mercê dos interesses de quem se propuser a usá-lo frente a espectadores apáticos e resignados em meio à barbárie.Outra coisa que saltou aos olhos durante o período observado é a presença excessiva de anúncios publicitários da indústria farmacêutica. Entre os principais anunciantes, este setor representa mais de 20% de todas as inserções publicitárias, seguido do setor automobilístico, financeiro e telecomunicações. Ainda mais curioso é que esses anúncios se concentram basicamente na Rede Record e nas mãos de apenas dois anunciantes, a Hypermarcas (Doril, Epocler, etc.) e Genomma Lab Brasil (Cicatricure, Medicasp, Asepxia, etc.). Esta última - a segunda maior anunciante no total

29 http://www.vemprafam.com.br/

30 http://proprietariosdobrasil.org.br/agronegocio/ - acessado em 18/11/2015

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do tempo analisado, sendo superada apenas pela Via Varejo, a maior anunciante do Brasil31 - tem um contrato de exclusividade com a emissora do Bispo Macedo e curiosamente não produz medicamentos, já que a produção é toda terceirizada, focando seus investimentos em propaganda, segundo matéria de 08/06/2014 na versão on line da Folha de São Paulo32. Completam o festival da hipocondria as inserções da Ultrafarma, registradas exclusivamente na Rede TV!.Ora funcionando de maneira nitidamente conectada com a programação, ora de forma mais sutil, tirando sarro e mesmo desrespeitando o cidadão e o humano que vivem no telespectador ou se aproveitando de suas fragilidades mais diversas, os anunciantes, antes de estarem reduzidos à “hora de zapear” ou de se somarem ao conteúdo televisivo como mais uma fonte de construção de subjetividade, são parte fundamental e interdependente do mecanismo de dominação, interferindo de maneira constante no conteúdo exibido pelas emissoras.

Uma guerra longa e permanente

A decadente TV aberta no Brasil ainda está bem viva. Alcança quase a totalidade da população e está presente em todos os cantos do país. Viva e poderosa, as informações transmitidas por ela são munição privilegiada que vem sendo usada para nos atingir de forma letal na constante guerra pela hegemonia da sociedade. Sua letalidade, no entanto, se dá por envenenamento, matando suas vítimas gradualmente, ao passo que as torna dependentes desse veneno. Tal processo se dá de forma quase imperceptível, dado seu índice de diluição em meio a substâncias aparentemente inócuas. Em um primeiro momento a vítima não atenta para a necessidade de levantar a guarda frente ao ataque. No momento seguinte, ainda que perceba, já não é mais possível fazê-lo. Apatia, cinismo e cansaço são sintomas comuns da morte que se anuncia no vitimado.A principal faculdade afetada pela exposição aos efeitos tóxicos desse conteúdo é a percepção sobre si mesmo e o mundo que nos rodeia. Sob o efeito constante dessa corrosiva substância, passa-se a ter uma visão turva da própria identidade e do ambiente que se ocupa, a desejar a substituição desse ambiente e, mais grave, de si próprio, por um outro eu e um outro nós quase sempre inalcançável. Em geral não é possível identificar onde ou quando esse ideal foi gestado, mas o fato de ser compartilhado por um grande número de pessoas e ser reproduzido em todos os espaços que nos é permitido frequentar o torna verossímil e, mais que isso, inescapável.Não se trata aqui de assumir uma postura ludista33 contra os aparatos tecnológicos ou negar o formato audiovisual do qual se utiliza a televisão. Ao contrário, tudo isso pode e deve ser usado a nosso favor. Se o conteúdo transmitido por essas emissoras de TV se mostra tão tóxico a todos nós é porque aqueles que controlam sua operação são os mesmos inimigos que controlam as grandes corporações e se apoderam do aparato do estado. Por isso, não seria de se esperar um desequilíbrio menor entre o número de baixas do nosso lado e do lado do inimigo nas inúmeras batalhas que travamos. A mídia tem lado e os interesses que ela defende são os dos seus donos, grandes grupos econômicos, famílias e indivíduos milionários, entre empresários e políticos34.Guiados por tais interesses, perdemos a capacidade de construir referências através de relações sociais plurais, equilibradas e sustentáveis. Nossa embriaguez permanente e progressiva nos faz tornar invisíveis negros, indígenas, pobres, moradores de favela, movimentos populares organizados, pessoas homoafetivas e transgêneros concretamente existentes. Quando não é

31 http://exame.abril.com.br//marketing/noticias/os-30-maiores-anunciantes-do-brasil-em-2014/lista

32 http://www1.folha.uol.com.br/mercado/2014/06/1466851-farmaceutica-mexicana-genomma-lab-e-fabrica-de- propaganda.shtml – acessado em 18/11/2015.

33 O ludismo foi um movimento operário surgido no início do século XIX que se opunha à substituição dos trabalhadores pelas máquinas, se voltando fisicamente contra estas. O movimento, que teve seu nome tirado de um de seus líderes, Ned Ludd, foi desaparecendo à medida que os trabalhadores se aperceberam de que sua reação não deveria ser às máquinas, mas ao uso que seus proprietários faziam delas.

34 http://donosdamidia.com.br/inicial

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completamente possível negá-los, nos faz projetar seu futuro apagamento ou controlar da maneira mais castradora possível sua participação na sociedade, reduzindo-os a papéis humilhantes e punindo-os severamente quando se negam a ocupá-los. A estupidez na qual emergimos profundamente durante esse processo de envenenamento nos faz aceitar como natural os reduzidos espaços subservientes aos quais relegamos metade de nós, as mulheres, que permanecem como posse masculina, sendo promovidas, na melhor das hipóteses, a elite de segunda classe, se brancas e bem colocadas socioeconomicamente. Sob tal efeito, seguiremos celebrando histericamente a juventude em detrimento das faixas etárias mais avançadas, mas apenas quando se tratarem de jovens brancos, egressos das classes dominantes e encaixados nos padrões estéticos que nos são ditados. Se negros, gordos, pobres e/ou favelados, o melhor uso que seremos capazes de fazer desses indivíduos será como combustível, para explosão ou carburação, da grande máquina que mantém nossa respiração artificial. Toda essa demência nos obriga a remodelar constantemente os territórios que ocupamos de maneira a adaptá-los ao nosso delírio. A favela “que deu certo” não é aquela capaz de se criar ou recriar através de sua própria história e das relações forjadas organicamente por seus moradores35, mas aquela que será estuprada e mutilada até se encaixar no projeto da vez, como o atual modelo da cidade-mercadoria.Eis os valores dos “barões da mídia” e seus iguais. Valores que sustentam a compreensão limitada do conceito de família de metade da população brasileira36, legitimando a tramitação do absurdo projeto de lei que pretende enquadrá-lo em termos estreitos para efeitos legais37. A banalização da violência e do uso indiscriminado de armas de fogo presentes na maioria absoluta dos enlatados hollywoodianos da programação noturna, aliados ao culto ao individualismo são um belo material para sustentar a alteração no estatuto do desarmamento, que tramita no congresso38, tornando mais fácil o porte de armas com consequências deletérias previsíveis. São esses mesmos valores antidemocráticos os usados para criar um clima de terror e desaprovação à regulamentação, prevista na Constituição Federal, dos conselhos de participação social, instituída por decreto presidencial39. As manobras desonestas e ilegais de Eduardo Cunha para forçar sua contrarreforma política40 e a redução da maioridade penal só são possíveis em um ambiente de total resignação política aliado à histeria conservadora alimentados pelo envenenamento diário que os “donos da bola” nos impõem. O mesmo vale para retrocessos como à PL que dificulta ainda mais o aborto legal 41 e a lei antiterrorismo42. Nossa homo-transfobia, nossos altos índices de feminicídio, o extermínio de nossa juventude negra, tudo isso combina perfeitamente com interesses daqueles que controlam o tripé ideológico-político-financeiro.Não serão eles os que protagonizarão uma revolução nos meios de comunicação. Muito pelo contrário. A medir pela reação ao Marco Civil da Internet43 e à Lei 12.485 (lei da TV paga)44, sem falar no engavetamento do projeto de lei que promove a regionalização da produção audiovisual45 e a incapacidade de se tocar no assunto da regulação da mídia, é nítido que para o “clubinho” é

35 http://www.virusplanetario.net/sobreviver-reflexoes-complexo/

36 http://www2.camara.leg.br/enquetes/?wicket:interface=:3::::

37 http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=597005

38 http://www.bbc.com/portuguese/noticias/2015/10/151019_desarmamento_porte_lk

39 http://www.diariodocentrodomundo.com.br/a-derrubada-do-decreto-8243-foi-um-tiro-no-pe-diz-ao-dcm-a-cientista-politica-thamy-pogrebinschi/

40 http://congressoemfoco.uol.com.br/noticias/reforma-politica-de-cunha-e-retrocesso-diz-oab/

41 http://www.esquerdadiario.com.br/Projeto-de-Eduardo-Cunha-que-dificulta-aborto-em-casos-de-estupros-e-aprovado-na-CCJ

42 https://medium.com/@eunaosouterrorista/eu-n%C3%A3o-sou-terrorista-d47ca97fd7ac#.6nu3gkfo4

43 http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2014/lei/l12965.htm

44 http://intervozes.org.br/sociedade-defende-nova-lei-de-tv-por-assinatura/

45 http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=585376

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preciso atrasar o futuro até que eles possam se apropriar completamente dele. Somos nós, trabalhadores, militantes, comunicadores e lideranças populares, acadêmicos e políticos engajados na bandeira da democratização dos meios de comunicação que devemos ocupar esse lugar.

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Anexo I: Lista de programas assistidos

Programa Dia do mês Dia da semana

Início da observação

Fim da observação

Tempo de observação

Emissora

Mentes bri-lhantes: Isa-ac Newton e as forças do universo

16/09/2015 Quarta-feira 18:35h 18:55h 20 minutos TV Brasil

Além do tempo

16/09/2015 Quarta-feira 18:50h 19:03h 13 minutos Rede Globo

RJ TV – 2ª edição

16/09/2015 Quarta-feira 19:03h 19:20h 17 minutos Rede Globo

Cine aventu-ra: Pequenos guerreiros

19/09/2015 Sábado 17:06h 17:20h 14 minutos Rede Record

Brasil Ur-gente

19/09/2015 Sábado 17:20h 17:33h 13 minutos Rede Bandeirantes

Cidade Aler-ta

19/09/2015 Sábado 17:33h 17:41h 8 minutos Rede Record

Bom Dia Brasil

25/09/2015 Sexta-feira 8:02h 8:49h 47 minutos Rede Globo

Jornal da Globo

01/10/2015 Quinta-feira 0:40h 0:43h 3 minutos Rede Globo

Programa do Jô

01/10/2015 Quinta-feira 0:43h 1:11h 28 minutos Rede Globo

Programa Amaury Jr.

01/10/2015 Quinta-feira 1:11h 1:120 9 minutos Rede TV!

Desmanche Espiritual

07/10/2015 Quarta-feira 21:35h 21:52h 17 minutos CNT

Repórter Brasil

07/10/2015 Quarta-feira 21:52h 21:58h 6 minutos TV Brasil

Cinema Na-cional: Vou rifar meu co-ração

07/10/2015 Quarta-feira 21:58h 22:08h 10 minutos TV Brasil

Programa Eliana

11/10/2015 Domingo 17:54h 18:34h 40 minutos SBT

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Programa Dia do mês Dia da semana

Início da observação

Fim da observação

Tempo de observação

Emissora

Vídeo Show 15/10/2015 Quinta-feira 14:52h 15:12h 20 minutos Rede Globo

Casos de Fa-mília

15/10/2015 Quinta-feira 15:12h 15:43h 31 minutos SBT

A Fazenda 16/10/2015 Sexta-feira 23:01h 23:17h 16 minutos Rede Record

Café com Jornal

21/10/2015 Quarta-feira 8:48h 9:09h 21 minutos Rede Bandeirantes

Dia Dia 21/10/2015 Quarta-feira 9:09h 9:18h 9 minutos Rede Bandeirantes

Os Dez Mandamen-tos

21/10/2015 Quarta-feira 21:17h 21:39h 22 minutos Rede Record

I love Parai-sópolis

26/10/2015 Segunda-feira

20:09h 20:30h 21 minutos Rede Globo

Cidade Aler-ta Rio

26/10/2015 Segunda-feira

20:30h 20:34h 4 minutos Rede Record

Os Dez Mandamen-tos

26/10/2015 Segunda-feira

20:34h 20:48h 14 minutos Rede Record

Jornal Naci-onal

03/11/2015 Terça-feira 21:18h 21:29h 11 minutos Rede Globo

A Regra do Jogo

03/11/2015 Terça-feira 21:29h 21:46h 17 minutos Rede Globo

TV Fama 03/11/2015 Terça-feira 21:46h 21:50h 4 minutos Rede TV!

Rede TV News

03/11/2015 Terça-feira 21:50h 22:00h 10 minutos Rede TV!

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Anexo II: Referências

• Pesquisa Brasileira de Mídia 2015 ( http://www.secom.gov.br/atuacao/pesquisa/lista-de-pesquisas-quantitativas-e-qualitativas-de-contratos-atuais/pesquisa-brasileira-de-midia-pbm-2015.pdf);

• Muitos Brasis e poucas vozes. Anteprojeto apresentado por Monique F. M. Da Silva ao Programa de Pós-Graduação em Mídia e Cotidiano do Instituto de Arte e Comunicação Social da UFF;

• Coletivo Intervozes (http://www.intervozes.org.br/direitoacomunicacao/);

• Censo 2010 (http://censo2010.ibge.gov.br/);

• Mapa da Violência 2015 (http://www.mapadaviolencia.org.br/pdf2015/mapaViolencia2015.pdf);

• Mapa da Violência 2012 (http://www.mapadaviolencia.org.br/pdf2012/MapaViolencia2012_atual_mulheres.pdf);

• Relatório 2014 Assassinato de Homosssexuais (LGBT) no Brasil (https://homofobiamata.files.wordpress.com/2015/01/relatc3b3rio-2014s.pdf);

• FUNAI – Índios no Brasil. Quem são. (http://www.funai.gov.br/index.php/indios-no-brasil/quem-sao?limitstart=0#);

• Donos da Mídia (http://donosdamidia.com.br/inicial#);

• Os 30 maiores anunciantes do Brasil em 2014 (http://exame.abril.com.br//marketing/noticias/os-30-maiores-anunciantes-do-brasil-em-2014/lista);

• Relatório Violência Homofóbica 2012 (http://www.sdh.gov.br/assuntos/lgbt/pdf/relatorio-violencia-homofobica-ano-2012);

• DataSenado. Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher 2013 (http://www.senado.gov.br/senado/datasenado/pdf/datasenado/DataSenado-Pesquisa-Violencia_Domestica_contra_a_Mulher_2013.pdf);

• Feminicídio no Brasil (http://feminicidionobrasil.com.br/);

• OLIVEIRA, Dannilo Duarte. Jornalismo Policial na Televisão Brasileira: Gênero e modo de endereçamento. Vitória da Conquista. Edições UESB, 2014.