MODERNIZAÇÃO PERIFÉRICA E A RELAÇÃO CAMPO...
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MODERNIZAÇÃO PERIFÉRICA E A RELAÇÃO CAMPO-CIDADE NO NORTE
DO PARANÁ
Introdução.
O presente trabalho é fruto de uma iniciação científica sobre a orientação do
Professor Anselmo Alfredo, do departamento de Geografia da Universidade de São
Paulo, e recebe apoio financeiro da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São
Paulo (FAPESP).
A pesquisa busca uma análise espacial do processo de modernização, cujo
método, bem como sua exposição, vai do abstrato ao concreto, que é, inclusive, idêntico
ao da exposição de Marx em O Capital, principal referência teórica desta pesquisa.
Assim, preliminarmente, há uma discussão sobre a divisão campo cidade do
ponto de vista clássico, intitulada “Uma abordagem sobre a divisão campo cidade”, que
teve como texto basilar o capítulo “A assim chamada acumulação primitiva” d’O
Capital e se aproxima mais de uma discussão relacionada ao aspecto histórico da
constituição do moderno do que aos seus elementos abstratos, ainda que ambos estejam
necessariamente imbricados. O capítulo também aborda, de modo simplificado, o modo
como parte significativa da geografia brasileira tem tratado este tema.
Este primeiro percurso da pesquisa fornecerá, dessa forma, subsídios para um
segundo momento, que buscará compreender como que elementos abstratos do processo
de modernização definem a realidade concreta do norte do Paraná. Assim, trata-se de
compreender como se estabelece uma produção espacial no norte do Paraná, cuja ação
da Companhia de Terras Norte do Paraná (CTNP) a partir de 1930 é de fundamental
importância, como simultânea constituição de uma divisão campo cidade determinada
pelos sentidos da reprodução do valor.
Outro ponto seria evidenciar como os relatórios da Comissão Mista Brasil
Estados Unidos para o Desenvolvimento (CMBEU-DE) conferem uma leitura desta
realidade através de seu planejamento para a modernização da infra-estrutura de
transporte, expressando, desse modo, as características da constituição de um mercado
nacional interno mediado por capitais internacionais. Assim, trata-se de apontar como
que os relatórios da CMBEU-DE ajudam a compreender, através de seus projetos de
modernização da infra-estrutura viária para a região norte do Paraná especificamente,
bem como para todo o Brasil, a ocorrência do processo de expansão de capitais norte-
americanos para a realidade periférica da economia nacional brasileira.
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1. Uma abordagem sobre a divisão campo cidade.
1.1. Discussões no interior da Geografia sobre a cisão campo cidade.
Na geografia1, as discussões sobre a relação campo cidade são,
predominantemente, elaboradas a partir de uma distinção entre espaços urbanos e rurais
como um aspecto recorrente na história da sociedade humana, identificando, assim,
desde a antiguidade - alguns textos apontam para 4.000 anos a.C -, uma divisão (ou
regionalização) estabelecida entre ‘urbano’ e ‘rural’. Estas categorias, ou mesmo
qualificativos espaciais, são postos como aspecto trans-histórico e, portanto, de modo
externo às categorias do moderno e da modernização. Sendo, deste modo, o urbano
identificado a elementos como concentração, centralidade e divisão social do trabalho e
o rural à produção agrícola e à dispersão ou isolamento.
O estabelecimento desta cisão é compreendido em função da possibilidade de
acumulo de excedentes, fato proporcionado pelo aumento da produtividade agrícola
(revolução agrícola) que promoveria uma maior divisão social do trabalho resultando no
desenvolvimento de outras funções além do trabalho produtivo, como administração,
política e produção do saber.
Diferentemente, o esforço desta discussão terá como objetivo compreender a
cisão entre campo e cidade através do processo de modernização. De modo que, como
“questão de método e de objeto”, estamos de acordo com a seguinte perspectiva
proposta por Anselmo Alfredo:
Cabe-nos como questão de método e de objeto, a análise de
fenômenos próprios da forma valor como que sempre resultantes de uma
realidade posta na e pela modernização. Do que deriva, segundo a perspectiva
aqui exposta, a necessidade de se compreender sob as determinações do valor
os fenômenos então postos (2006, p.2)
1 Os textos discutidos constam na seguinte referência bibliográfica: SPOSITO, M. E. B.; WHITACKER, A. M. (ORGS). Cidade e campo: relações e contradições entre o urbano e o rural, SP, Expressão Popular, 2006. Trata-se de uma compilação de textos em que diversos autores apresentam as características sobre as quais o relatório se posiciona.
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Assim, é fundamental analisar está cisão a partir do que foi exposto por Marx em
“A assim chamada acumulação primitiva”, capítulo XXIV d’O Capital, cuja cisão entre
campo e cidade se constitui em pressuposto básico do moderno, em que a violência e o
roubo marcam a imposição da constituição desta realidade e a própria descrição do
autor, aspectos interessantes a serem ressaltados, pois evidenciam a intensidade do
processo.
A análise de Marx evidencia, desse modo, que não se trata de uma transição
evolutiva na história da humanidade, isto é, da passagem de uma realidade agrícola para
uma urbano-industrial como decorrente de certo sentido teleológico na história. Ao
contrário, Marx aponta o modo abrupto e violento em que camponeses são expulsos de
suas terras para se constituírem com força de trabalho. Assim emerge a cisão campo
cidade, como resultante de um processo de separação e contraposição entre capital e
trabalho, isto é, simultaneamente como pressuposto e resultado do processo de
modernização já que ao mesmo tempo que se trata da constituição das categorias
basilares do moderno (capital e trabalho) é um processo que já encontra na produção de
mercadorias seu sentido.
Engels, em “A situação da classe trabalhadora na Inglaterra”, aborda a questão
da constituição do moderno, porém em uma perspectiva distinta de Marx, no sentido
que não analisa o momento de expropriação dos camponeses de suas terras, mas sua
chegada aos centros industriais urbanos e sua constituição em trabalhadores industriais
assalariados.
O centro principal desta indústria [algodoeira] é o Lancashire, donde
de resto, é originária; ela revolucionou completamente este condado,
transformando este pântano sombrio e mal cultivado numa região animada e
laboriosa, duplicou sua população em 80 anos e fez brotar do solo, como que
por encanto, cidades gigantescas como Liverpool e Manchester que juntas
contam com 700.000 habitantes. (ENGELS, 1988, p. 18)
O trecho citado é do capítulo “As cidades” de seu livro supracitado, em que o
autor descreve como as cidades nascem como cogumelos, da noite para o dia. A própria
situação da classe trabalhadora é um importante indício do processo intenso de expulsão
dos camponeses de suas terras e de sua constituição como trabalhadores assalariados.
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(...) foi a indústria que permitiu aos proprietários destes estábulos
alugá-los como se fossem habitações de seres humanos, explorando a miséria
dos operários, minando a saúde de milhares de pessoas em seu próprio
proveito; foi a indústria que fez com que o trabalhador, recém-libertado da
servidão, pudesse ser utilizado de novo como simples material. (ENGELS,
1988, p.66)
Nota-se, desse modo, como as massas de camponeses que chegam às cidades
não encontram uma estrutura que consiga abrigar tamanha quantidade de pessoas,
postas a serviço da produção de mercadorias, evidenciando, diga-se novamente, a
intensidade e a imediaticidade do processo.
Assim, o estabelecimento de uma realidade urbano-industrial contraposta a uma
realidade agrária, a partir do processo de modernização, deve, portanto, ser entendida
como que resultante do processo de contraposição entre capital e trabalho, cujo
amalgama desta relação é a “extração de mais-trabalho2 como um fim em si mesmo”
(KURZ, 1993), posto que este mais-trabalho se constitui como meio de
desenvolvimento das forças produtivas; processo que é imanente à acumulação
capitalista e coloca a cidade como expressão maior desta contraposição e, assim, da
aglomeração de meios de produção e da força de trabalho, cujo desenvolvimento das
forças produtivas (máquinas a vapor) tem grande influência.
(...) foi encontrado o primeiro motor que produz sua própria força
motriz, consumindo para isso carvão e água, cuja potência energética está
totalmente sobre o controle humano (...) permitindo a concentração da
produção em cidades ao invés de, como a roda d’água, dispersá-las pelo
interior. (MARX, Livro I, vol. 2, 1985, p. 11)
Assim, a concentração e o desenvolvimento dos meios de produção, a
determinar a produção espacial urbana, devem ser colocados neste processo de
2 O trabalho excedente ou mais-trabalho é a quantia de trabalho além da necessária para o suprimento das necessidades do trabalhador. No feudalismo, o mais trabalho era apropriado pelo senhor de formas diversas como corvéia, talha e banalidades, era um trabalho cujo camponês realizava para a manutenção da realeza; com o capitalismo a coação ao trabalhador para realizar o mais-trabalho e apropriar-se do mesmo se dará, como diz Marx, segundo uma coação muda das condições econômicas, em que o trabalhador naturaliza a obrigação de se vender livremente como força de trabalho e, desse modo, que trabalhe mais do que o necessário para sua sobrevivência. (MARX, 1988)
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desenvolvimento das forças produtivas nunca visto que estão relacionados aos nexos do
capital. É assim que, em diversos momentos da descrição de Marx ou mesmo de Engels,
este processo é visto como uma monstruosidade3, ou seja, como algo de proporções
imensuráveis, que se constitui, afinal, na expressão da determinação contida no próprio
conceito de capital, pois impele o constante investimento em meios de produção como
finalidade em si mesmo.
Assiste-se do mesmo modo, um processo de eliminação das contingências, isto
é, do irregular e ocasional, cujo controle cada vez mais eficiente de fontes de energia e
dos processos produtivos impõe a eliminação não apenas destas contingências externas
à atividade produtivas, mas uma racionalização ou otimização das atividades ao próprio
sujeito que trabalha.
Nas passagens de Marx sobre o estabelecimento da indústria sobre a manufatura
(Capítulo XIII do livro I, Maquinaria e grande indústria), evidencia-se que há uma
eliminação da subjetividade como pressuposto da produção capitalista. Ou seja, não se
trata apenas da máquina como pressuposto do processo de industrialização, mas de
compreender como que ela permite suprimir as inconstâncias de uma produção
manufatureira, aumentando exponencialmente a produtividade do trabalho. A máquina,
assim, age na eliminação da subjetividade do trabalhador artesanal, isto é, “apodera-se
da habilidade do artesão e deixa para o homem, além do novo trabalho de vigiar com o
olho a máquina, corrigir com a mão os erros dela” (MARX, 1985, Livro I, vol.2, p. 9).
Em outras palavras - neste primeiro momento da cisão campo cidade-, se há uma
realidade que se apresenta aos nossos olhos de modo regularizado, racionalizado ou
mesmo concentrado e intensamente marcado pela produção industrial; e, em
contrapartida, uma realidade agrária, cuja produção agrícola define um padrão espacial
e mesmo um processo produtivo marcado por um ‘atraso’ tecnológico, ou mesmo por
um processo não tão intenso de racionalização do processo produtivo, isto dever ser
visto a partir das determinações do valor, isto é, aquilo que se coloca como unidade e,
assim, simultaneidade, a definir momentos distintos de um mesmo processo, qual seja, a
acumulação de capital.
3 “Como sistema articulado de máquinas de trabalho que recebem seu movimento apenas de um autômato central através de uma máquina de transmissão, a produção mecanizada possui sua forma mais desenvolvida. No lugar da máquina individual surge aqui um monstro mecânico, cujo corpo enche prédios fabris inteiros e cuja força demoníaca, de início escondida pelo movimento quase festivamente comedido de seus membros gigantescos, irrompe no turbilhão febril de seus inúmeros órgãos de trabalho propriamente ditos” (MARX, 1985, Livro I, vol. 2, p. 14)
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Assim, trataremos em seguida de analisar este processo de cisão entre capital e
trabalho a partir da divisão campo cidade posta para a produção de mercadorias.
1.2. O processo de divisão entre campo e cidade como constituição do moderno.
A base de toda a divisão do trabalho desenvolvida e mediada pelo
intercâmbio de mercadorias é a separação entre a cidade e o campo. Pode-
se dizer que toda a história econômica da sociedade resume-se no
movimento desta antítese... (MARX, 1988,Livro I, Vol. 1, p.265 ).
A epígrafe resume a discussão que se pretende realizar sobre a modernização.
Assim a analisaremos detidamente, buscando desvendar a importância que Marx atribui
à antítese campo e cidade, quando diz que ela resume toda a história econômica da
sociedade.
Apenas transcrevendo, trata-se da cisão e contraposição entre campo e cidade se
constituir como “base de toda a divisão do trabalho”. Assim, nosso percurso é o de
desvendar como que a divisão campo cidade engendra tal divisão social do trabalho.
As reticências da epígrafe suprimem o trecho que julgamos fazer mais sentido a
partir de agora, trata-se da seguinte oração: “[no movimento desta antítese] do qual
porém já não iremos tratar aqui”. Ou seja, no fim da seção IV, “A produção da mais-
valia relativa”, que é um momento já bem desenvolvido do modo de produção
capitalista. Entendemos que a retomada desta discussão sobre os pressupostos da
constituição do capital irá ocorrer apenas no capítulo XXIV, em que Marx analisa,
justamente, a gênese do capitalismo, intitulada “A assim chamada acumulação
primitiva”.
Neste capítulo, Marx demonstra como a realidade capitalista emerge a partir da
desestruturação da sociedade feudal, processo que é marcado pelo estabelecimento de
cisões, cuja divisão campo cidade ganha destaque, pois é pressuposto para uma
sociedade fundamentada na produção de mercadorias. Esta cisão expressa o
rompimento de uma estrutura de produção autárquica herdada do período feudal através
da expropriação dos camponeses de seus meios de subsistência; sendo suas terras postas
para a criação de matérias primas para a indústria e a reprodução de sua existência
condicionada ao trabalho assalariado.
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O ponto central da discussão será, portanto, o que se constitui como unidade em
meio às fragmentações do moderno, cuja divisão campo cidade nos é aqui objeto de
discussão. Neste caso, trata-se de pensar na constituição de um mercado interno, que só
ganha sentido e existência pela necessidade de se juntar aquilo que foi fragmentado.
Assim, emerge a necessidade de se estabelecer a relação entre aqueles que passam a
produzir o que não consomem e consumir o que não produzem, isto é, as trocas entre os
ramos produtivos tornados autônomos e ao mesmo tempo dependentes uns dos outros,
cuja acumulação se coloca como finalidade deste processo.
Desse modo, se a análise de Marx aponta que no momento anterior à
constituição da economia capitalista prevalece uma produção que visa à reprodução dos
indivíduos e da comunidade, cuja unidade de produção se circunscrevia à família e se
dava de modo autônomo; o desenvolvimento da produção mercantil e o estabelecimento
da propriedade privada da terra levam ao rompimento desta economia que se bastava a
si mesma, processo que é marcado pela apropriação da base fundiária camponesa, isto é,
da separação entre camponeses e seus meios de subsistência.
A assim chamada acumulação primitiva é, portanto, nada mais que o
processo histórico de separação entre produtor e meio de produção (Marx,
Livro I, vol. 2, 1985; 262)
Cisão, portanto, que se constitui como pressuposto para uma sociabilidade cuja
mercadoria se constitui como mediação à subsistência, pois a separação entre produtor e
meios de produção, decorre na submissão das pessoas à forma mercadoria. Isto é, os
trabalhadores são forçados a se venderem livremente como força de trabalhos e, assim,
trocar salário por meios de subsistência.
“A separação entre a cidade e o campo”, diz Marx em “A ideologia Alemã”,
“pode ser concebida (...) como o começo de uma propriedade que tem por base somente
o trabalho e a troca” (MARX, 1977, p. 79, destaques meus), cujo sentido do trabalho e
da troca é a apropriação de mais-trabalho. Assim, a propriedade privada da terra é o
fundamento de uma sociabilidade que deixa de ter como pressuposto a satisfação das
necessidades (valor de uso) para ser fundamento da exploração de mais-trabalho.
Dinheiro e mercadoria, desde o princípio, são tão pouco capital
quanto os meios de produção e de subsistência. Eles requerem sua
transformação em capital. Mas essa transformação mesma só pode realizar-se
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em determinadas circunstâncias, que se reduzem ao seguinte: duas espécies
bem diferentes de possuidores de mercadorias têm de defrontar-se e entrar em
contato; de um lado possuidores de dinheiro, meios de produção e meios de
subsistência, que se propõem a valorizar a soma-valor que possuem mediante a
compra de força de trabalho alheia; do outro, trabalhadores livres, vendedores
de trabalho (...). Com essa polarização do mercado estão dadas as condições
fundamentais da produção capitalista. (MARX, 1985, Livro I, Vol. 2, p 282)
Destes processos, Marx compreende que se estabelece a consolidação de uma
nova relação social fundamentada na contradição essencial entre capital e trabalho. Pois,
se antes os servos estavam imersos em uma série de obrigações feudais que o
submetiam ao trabalho (tributos) nas terras do senhor, isto é, a formas de coação que se
pautavam na violência e no monopólio da terra para se apropriar do trabalho alheio;
com o capitalismo, a coação ao trabalho e a apropriação de seu excedente se
estabelecerão pelo monopólio das condições objetivas de trabalho na forma de capital e,
assim, posto para a valorização de si mesmo. Desse modo, o trabalhador livre é livre
dos meios que possibilitam prover seu sustento e assim sujeitado ao trabalho
assalariado. Trata-se da subordinação formal do trabalhador ao capital.
Entretanto, assinala Marx a respeito da coação ao trabalho assalariado, não basta
forçar os trabalhadores a “se venderem livremente” é necessário que eles naturalizem a
condição de se venderem voluntariamente enquanto força de trabalho. Em suas
palavras:
Não basta que [existam] as condições de trabalho num pólo como
capital e no outro pólo, pessoas que nada têm para vender a não ser sua força
de trabalho. Não basta também forçarem-nas a se venderem
voluntariamente. Na evolução da produção capitalista, desenvolve-se uma
classe de trabalhadores que, por educação, tradição costume, reconhece as
exigências daquele modo de produção como leis naturais evidentes. A
organização do processo capitalista de produção plenamente constituído
quebra toda a resistência, a constante produção de uma superpopulação
mantém a lei da oferta e da procura de trabalho e, portanto, o salário em trilhos
adequados às necessidades de valorização do capital, e a muda coação das
condições econômicas sela o domínio do capitalista sobre o trabalhador.
(MARX, 1985, Livro I, Vol. 2, 277, grifo meu).
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O capitalismo resulta, portanto, da polarização dos meios de produção (capital)
na forma de propriedade privada4 de um lado e, de outro, de sujeitos desprovidos de
propriedade, impossibilitados de obter seu sustento e, assim, “forçados a se venderem
voluntariamente” como força de trabalho em troca de salário.
A naturalização, apontada na citação acima de Marx, trata-se da constituição de
uma ilusão necessária que mistifica a violência e a contradição do moderno, qual seja,
que a coação ao trabalho assalariado é realizada para a reprodução ampliada do capital e
não garante, em alguns momentos, como descreve Engels na Inglaterra do século XIX,
nem suas condições mínimas de sobrevivência.
Assim, a relação capital-trabalho engendra uma espécie de trabalho que se
distancia da realização das necessidades do sujeito que trabalha. Nossa perspectiva, de
acordo com Kurz (1993), é de apontar o trabalho como categoria do moderno, que
representa dispêndio abstrato de força de trabalho humana (“gelatina de trabalho
humano”, como coloca Marx) no sentido único de valorização do valor, que assim surge
como produtor de mercadorias.
Trabalho que estará determinado pela medida de trabalho socialmente
necessário, assim condicionado às determinações da redução do tempo de produção, que
por sua vez se define em função da constituição de uma lei fundamental do modo de
produção capitalista: o “processo cego” que impele os capitalistas ao investimento em
meios de produção por meio da concorrência entre os capitais. Assim, o trabalho, em
sua forma capitalista, se realiza segundo a determinação abstrata do valor de troca, de
modo que sua finalidade não é outra senão a obtenção de mais-trabalho para o
investimento em meios de produção. Como aponta Robert Kurz, o trabalho emerge
como categoria do capital e traz em si mesmo sua finalidade (KURZ, 1993), isto é, não
tem como finalidade suprir o indivíduo de suas necessidades, mas realizar a ampliação
do valor5.
Esta forma “tautológica” de trabalho se evidencia em períodos de crise
econômica, pois não são fatores naturais (catástrofes ou anomalias climáticas), falta de
4 Com assinalou Marx em seu texto manuscrito “formações econômicas pré-capitalistas”, a propriedade privada capitalista é aquela que dá o direito de uma pessoa se apoderar dos meios de produção de maneira individual, privando os demais indivíduos de seu uso. 5 “Mas o trabalho, nessa estranha forma abstrata, pode ser definido também como atividade que, de maneira igualmente estranha, traz sua finalidade em si mesma. É precisamente esse caráter, de finalidade inerente, que igualmente caracteriza o sistema burguês do ocidente e o movimento operário moderno: revela-se no ponto de vista do trabalhador e no ethos do trabalho abstrato aquela idolatria fetichista do maior e mais intenso dispêndio possível de força de trabalho, além das necessidades concretas subjetivamente perceptíveis.” (KURZ, 1993, 21)
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mão-de-obra ou ainda meios de produção que promovem uma situação de violência
explicita e carência, mas é a impossibilidade de valorização do capital que obstrui a
produção promovendo a miséria generalizada.
Diferentemente de sua forma moderna, Marx esclarece a condição do trabalho6
em sua forma não-capitalista:
A finalidade deste trabalho [pré-capitalista] não é a criação de valor,
embora eles possam realizar trabalho excedente para trocá-lo por trabalho
estrangeiro ao grupo, isto é, por produtos excedentes alheios. Seu propósito é a
manutenção do proprietário individual e sua família, bem como da
comunidade como um todo. A posição do individuo como trabalhador, em sua
nudez, é propriamente um produto histórico (MARX, 1977 b, p. 66).
A efetivação hegemônica desta lógica de produção, cujos valores de uso são
meios para a realização e apropriação do valor, este, portanto como finalidade da
produção capitalista, determina a dinâmica das partes cindidas. Do mesmo modo que
capital e trabalho deixam de constituírem uma unidade orgânica, cooperativa, eles são
contrapostos em uma relação em que o capital suprime o trabalho.
Assim, com a expropriação de camponeses antes economicamente
autônomos e sua separação de seus meios de produção, se dá no mesmo ritmo
a destruição da indústria subsidiária rural, o processo de separação entre
manufatura e agricultura. Somente a grande indústria fornece, com as
máquinas, a base constante da agricultura capitalista, expropria radicalmente a
imensa maioria do povo do campo e completa a separação entre agricultura
e a indústria rural doméstica, cujas raízes –fiação e tecelagem - ela arranca.
(MARX, 1985, Livro I, Vol. 2, p. 284, grifo meu)
Evidencia-se, através desta passagem, o fato de que aquilo que antes se
constituía como uma unidade submetida a um único sentido, sendo que a manufatura
estava em função da produção agrícola, tendo ambas a finalidade de reprodução da
comunidade, tornam-se, com a produção capitalista, lógicas independentes de produção,
na qual a indústria passa a determinar a produção agrícola e tudo isto vinculado ao
sentido de reprodução ampliada do valor. 6 Como já foi apontado, Kurz realiza, inclusive a partir de Marx, uma compreensão do trabalho enquanto categoria do moderno, no entanto, em Marx também é possível apreender uma compreensão ontológica do trabalho. Fato que é mais recorrente em textos anteriores a sua obra O Capital, como no caso da citação seguinte extraída dos Grudisses “Formações Econômicas Pré-capitalistas”.
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Portanto, com a contraposição estabelecida entre capital e trabalho a atividade
produtiva deixa de estar vinculada à satisfação das necessidades sociais para prevalecer
em seu caráter abstrato como medida de tempo de trabalho socialmente necessário para
a produção de mercadorias, de modo que sua realização ocorra na circulação e assim o
mais-trabalho seja apropriado e reposto como investimento na forma de meios de
produção, ou seja, o trabalho com a finalidade de acumular mais-trabalho.
Dessa forma, é na valorização do valor que o capital encontra seu sentido, isto é,
na ampliação do capital primeiramente empregado. Valorização, por sua vez, que
depende do investimento em forças produtivas, pois é desse modo que se aumenta o
potencial de extração de mais-valia, em um processo de passagem da extração da mais-
valia absoluta (extenuação do trabalhador pelo aumento da jornada de trabalho) para a
mais-valia relativa, aumento da produtividade do trabalho através do revolucionamento
das forças produtivas.
Esse aumento de produtividade representa, portanto, a ampliação da apropriação
do trabalho extra, isto é, aquele que está para além do que é realizado para reproduzir a
própria força de trabalho, sem necessariamente aumentar o tempo da jornada de
trabalho. A apropriação deste mais trabalho proporcionará o constante desenvolvimento
dos meios de produção. Assim, o produto do trabalho dos trabalhadores se torna o
próprio meio de sua coerção, isto é de sua subsunção real, segundo os termos de Marx.
Desse modo, Marx chama a atenção para um dos aspectos da inversão entre sujeito e
objeto que se dá com o capital, pois se antes os homens utilizavam seus meios de
subsistência em função de suas necessidades, agora os meios de subsistência na forma
de capital se tornam meios de coerção do trabalhador, de modo a obrigá-lo a fornecer
uma enorme quantidade de mais-trabalho.
Este processo, descreve Marx, “proclamou a extração de mais-valia como
objetivo último e único da humanidade” (MARX, 1985, Livro I, Vol. 2, p. 288, grifo
meu). Do mesmo modo, pode-se notar esta inversão entre sujeito e objeto no sentido de
que, se antes os homens possuíam o controle dos meios de produção, agora são estes
que ditam o processo produtivo, transformando o trabalhador em mero vigia deste
processo, isto é, em mera extensão da máquina.
É na seguinte citação de Marx que se evidencia o que passa a estar por trás da
produção de mercadorias quando se estabelece de forma efetiva a contradição capital-
trabalho:
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O linho tem exatamente o mesmo aspecto que antes. Nenhuma de suas
fibras foi alterada; mas uma nova alma social penetrou-lhe no corpo. Ele
constitui agora parte do capital constante dos senhores da manufatura (...) os
fusos e teares, antes disseminados pelo interior, estão agora concentrados em
algumas casernas de trabalho, tal como os trabalhadores e como a matéria-
prima. E os fusos, os teares e a matéria-prima, de meios de existência
independente para fiandeiros e tecelões, transformaram-se, de agora em
diante, em meios de comandá-los e de extrair deles trabalho não-pago
(MARX, Livro I, Vol. 2, pp. 282-83, grifo meu).
Engels, em seu livro supracitado, expõe os primórdios da constituição do
mercado de trabalho como um processo genocida, no qual a força de trabalho chega ao
limite de uma sustentação ideológica dado o alto nível de extenuação da classe
trabalhadora, pois, como descrevem Marx e Engels, através de fontes como jornais e
relatórios oficiais, há um apelo de setores da sociedade para uma normatização, que
assim proporcionasse uma moralização das condições de trabalho.
O que se percebe através desses relatos é que neste momento inicial da produção
industrial concentrada nas cidades há um desenvolvimento das forças produtivas nunca
visto. Este desenvolvimento e concentração dos meios de produção passam a engendrar
um processo de descompasso entre matérias primas e sua transformação em produtos
manufaturados ou industrializados, enquanto a produção rural, tornada uma ramo
produtivo da indústria, dependente das condições naturais, tem um desenvolvimento
produtivo mais demorado, não conseguindo abastecer suficientemente a indústria.
Coube, desse modo, ao proletário este déficit, pois a produção de matérias primas é
privilegiada em detrimento da produção de alimentos, que encarecidos e insuficientes,
resulta na fome que se soma a uma infinidade de precariedade nas condições básicas de
sobrevivência do trabalhador, como moradia, saneamento, descanso etc.
As contribuições dos autores analisados permitem compreender que a cisão entre
campo e cidade se efetiva em torno de um processo simultâneo de divisão social e
espacial do trabalho e de contraposição entre trabalho e capital. Cisão que é desde sua
constituição uma troca desproporcional entre agricultura e indústria, uma vez que a
produção agrícola não é suficiente para alimentar as máquinas de algodão e fornecer
alimentos aos operários. Desequilíbrio que resulta não em função de uma precariedade
técnica da produção agrícola, mas como uma determinação do processo de valorização
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do capital, no qual o desenvolvimento das forças produtivas torna cada vez mais
insuficiente a produção de matérias primas no campo.
Enfim, a cisão campo cidade, na análise de Marx, é compreendida como
resultante de um processo determinado pelo moderno, isto é, trata-se de compreender a
modernidade com uma forma específica de vida social, cujo principal fundamento é a
produção de mercadoria como aspecto determinante desta sociedade.
Há, desse modo, uma contraposição às análises sobre a divisão campo cidade
que partem de uma perspectiva ontológica desta cisão deixando de compreender sua
especificidade estabelecida pelo conceito de capital. Ou seja, deixar de apontar que há
uma determinação em função das contradições inerentes do capital que, assim,
determinam à constituição de categorias que, por sua vez, se impõe como formas de
existência humana, deriva em uma análise que se limita aos aspectos fenomenológicos,
ou mesmo às formas de aparência da realidade moderna deixando de compreender que
há um sentido profundo que determina o modo de ser desta realidade.
Desse modo, atenta-se para a inversão que Marx faz da noção de sentido da
história da dialética hegeliana. Isto é, não se trata de um sentido posto por
determinações abstratas, como na noção do “Espírito Universal”, mas de compreender
como que através das condições materiais, cuja separação entre produtores e meios de
subsistência é essencial, se estabelece uma determinação que passa a reger a existência
das categorias que compõe o conceito de capital, cuja mercadoria é o aspecto elementar.
Assim, se em nossa realidade hodierna há uma expansão da cidade para o
campo, a análise que se pretende busca compreender como que este fenômeno está
determinado pelas contradições da reprodução do capital. Trata-se, portanto, de romper
com uma análise que se restringe ao aspecto exclusivamente material da realidade, que,
assim, compreende a matéria como aspecto determinante da realidade capitalista. Pois,
se a matéria aparece como determinante isto não ocorre senão de modo fetichizado, uma
vez que são as determinações do valor que determinam o modo de surgimento da
realidade capitalista.
Henri Lefebvre (apud SPOSITO & WHITACKER, 2006) é amplamente
utilizado nestas discussões, sobretudo por analisar a questão da expansão do capital para
aquilo que seriam resquícios de ruralidade, os quais, segundo a expressão do autor,
mantém uma primazia do valor de uso em detrimento valor de troca. Há, dessa maneira,
um modo de vida rural (campesinidade) cujas relações sociais não são,
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predominantemente, mediadas pela mercadoria e a produção prima pelo valor de uso. A
partir destas colocações, fica-nos como problematização apontar se esta perspectiva em
relação à uma realidade constituída a partir do moderno, como a realidade brasileira,
que nasce, pois, em função da produção de mercadorias, como coloca Caio Prado
(1987) em sua análise sobre o sentido da colonização, não implicaria em uma
compreensão dual da realidade, qual seja, entre o atraso e o moderno ao invés de
compreender esta diferença como momentos distintos de uma mesma realidade.
Assim, mesmo se pensarmos no caso dos caipiras descritos por Antonio Candido
(Parceiros do Rio Bonito), trata-se de apontar que esta situação social resulta do
processo de modernização, já que aqueles que se constituem como sujeitos à margem de
uma economia de trocas no interior do Estado de São Paulo - Bofete ainda na década de
1950, derivam do processo da formação social brasileira posta pelo processo de
modernização, que Maria de C. Franco (1984) nos ajuda a compreender como tipo
social resultante do período escravista, mais aproximadamente daquele que se
constituíam como “homens livres na sociedade escravocrata”, isto é, sujeitos que não
conseguiram se inserir no processo de acumulação agrário-exportador fundamentado no
trabalho cativo, ou seja, na própria forma como o moderno se dava na colônia,
resultando em um tipo social que ainda em meados do século XX se reproduziam
segundo uma economia do “mínimo vital” e a margem de uma economia de trocas,
caracterizando uma forma recorrente de um “agrarismo rústico”. Em outras palavras, o
que se tem nomeado de camponês pela geografia agrária paulista resulta do próprio
processo de modernização.
O processo de constituição da divisão campo cidade se estabelece englobando
esta realidade rústica, que assim é incorporada aos sentidos de uma produção
determinada aos sentidos da reprodução do capital. Assim como coloca Martins:
Tanto o agrarismo rústico e o caipira como tipo humano
correspondente estão contidos nos alicerces do processo de constituição da
economia nacional e, por conseqüência, de industrialização, como ele se dá no
Brasil, quanto que a modernização agrária constitui uma impossibilidade
própria dessa situação. (MARTINS, 1964, p. 1)
Assim, a discussão da divisão campo cidade, nos termos de um processo de
modernização, elucida a particularidade da realidade periférica brasileira, pois ela define
15
a particular constituição do mercado interno nacional, cujo processo de industrialização
é determinante.
1.3. Sobre a divisão campo cidade no interior da economia periférica brasileira.
Parte-se de uma compreensão da formação sócio-espacial brasileira como
resultante do processo de modernização. Perspectiva que retoma a análise de Caio Prado
(1954) sobre o sentido da colonização, a qual é colocada como produção de uma
realidade moderna, posta para a produção de mercadorias através dos empreendimentos
mercantis da expansão marítima portuguesa. Assim, se há um aspecto que poderia
caracterizar a economia periférica como um relativo atraso, no sentido do
desenvolvimento das forças produtivas, esta realidade não deixa, entretanto, de ser
definida pelo moderno.
Desse modo, pode-se compreender que com o processo de colonização, e
mesmo após a independência, permanece a característica que define a realidade
econômica periférica brasileira, qual seja: a realização de capitais internacionais, pois se
há uma constituição de uma divisão campo cidade determinada pelo que se denomina de
pacto colonial, de modo que se em um primeiro momento (colonização) a colônia se
constitui como mercado consumidor de produtos manufaturados e exportadora de
produtos agrícolas, após sua independência há ainda uma reiteração da realização de
capitais internacionais no próprio processo de constituição do Estado Nacional
brasileiro, porém na forma de meios de produção, a partir da própria constituição do
mercado nacional periférico, cuja realidade agrária brasileira é determinante para o
entendimento deste processo.
Em outras palavras, trata-se de compreender o relativo atraso do
desenvolvimento das forças produtivas nacionais não como uma singularidade ou como
decorrência das opções políticas, mas o quanto esta diferença se constitui como um
momento da produção universal do valor, o que implica em uma necessária análise
simultânea do processo de modernização (ALFREDO, mimeo 2008).
Portanto, a análise da modernização aqui empreendida, parte da compreensão de
que a modernização resulta de contradições inerentes (autonegatividade) ao conceito de
capital, que engendram, assim, uma necessidade de dirimir suas crises, postas, em um
16
primeiro momento, como superprodução de mercadorias e assim na necessidade de
exportação das mesmas.
Crises que resultam do “processo cego” de concorrência entre capitais que impele
ao constante revolucionamento das forças produtivas e, assim, um constante aumento
da produtividade que invariavelmente resultam na ocorrência de excedentes de capitais
sem a possibilidade de serem realizados (capitais ociosos ou crise de superprodução) e,
negativamente, na constante redução relativa do número de trabalhadores necessários.
Processo que aparece como desenvolvimento e progresso do homem em relação ao seu
domínio da natureza, mas que é resultado de contradições inerentes ao desenvolvimento
do capital.
A expansão destes capitais, para realidades não-modernas ou atrasadas foi uma
forma de dirimir estas crises, que assim efetivou um processo de expansão do capital
pelo mundo. As análises de Lênin (2005), por exemplo, compreendem este processo de
difusão do capitalismo pelo mundo já em seu aspecto crítico, no entanto, apenas no
sentido de crise de superprodução.
Se na análise deste autor a expansão (“imperialismo”) se constitui como um
aspecto que evidenciaria a “fase superior”, isto é, final do modo de produção
capitalista, pois a concentração de capitais criaria a “base material” para o
desenvolvimento de uma produção socializada; ela deixa, entretanto, de compreender o
aspecto central da supressão do trabalho como determinação do próprio conceito de
capital. Não obstante, Lênin traz importantes considerações ao evidenciar o sentido da
expansão do capital, quando aponta a expansão como um dirimir da crise de
superprodução, em que capitais ociosos, que não encontram possibilidade de realização
ou ampliação nas suas respectivas economias nacionais, são deslocados para países
atrasados. Fato que evidencia, também, o aspecto tautológico da produção em sua
forma capitalista, colocado como “valorização do valor como um fim em si mesmo”
(KURZ, 1993).
Portanto, a perspectiva que divisamos, a partir das análises de Marx, sobretudo na
sua apreensão da “Queda tendencial da taxa de lucro”, é a do conceito de capital como
inerentemente crítico, isto é, contraditório em sua essência, pois coloca-se como
imanência a supressão daquilo que constitui seu fundamento e conteúdo, a saber, a
relação capital-trabalho. Assim, se em um primeiro momento há a expansão do capital
pelo mundo, que aparece como evolução positiva (acumulação), isto não se faz senão
contraditoriamente, isto é, como aprofundamento de sua crise, e portanto como
17
resultado de sua autonegatividade, ou seja, de uma evolução negativa, que aprofunda a
incapacidade do capital explorar trabalho.
É justamente a partir desta expansão do capital, que se apresenta como um
desenvolver das forças produtivas pelo mundo, que é possível falar em certo “desnível
do tempo histórico” (KURZ, 2006) estabelecido no processo de modernização;
constituindo-se, tal expansão, como modernização retardatária ou tardia, que, ao assim
se por, se faz como corrida de superação desta condição (KURZ, 1993). Isto
implicando em uma perspectiva desenvolvimentista, ou seja, na ilusória possibilidade
de um desenvolvimento mundial do capital em mesmos níveis.
Em outras palavras, a realização das determinações formais do
capital, do valor, não têm condições lógicas de se realizar a partir de um
processo de homogeneização. As contradições da forma que, no plano mais
externo mostram-se como impossibilidade de realização do lucro, re-
interpretam e absorvem, sob as suas determinações, elementos que passam,
então, a participar, nesta desigualdade, da realização do moderno e da
modernização. Este processo de desigualdade do desenvolvimento,
simultaneidade negativa ou atualização técnica, corrobora para a
coexistência de temporalidades múltiplas unificadas pela e na forma valor.
(ALFREDO, mimeo 2008)
Assim, ao considerar o processo de industrialização brasileira que passa a se
efetivar de modo mais acentuado a partir da década de 1930, o processo imanentemente
crítico do capital se coloca como principal chave de compreensão. Em outras palavras,
trata-se de entender este processo negativo do capital como aspecto determinante da
expansão da industrialização para economias periféricas, tal como se apresenta o caso
brasileiro.
Silva e Tavares fazem importantes considerações sobre a necessidade de se
considerar o processo de industrialização do Estão de São Paulo como desencadeado
pelo complexo cafeeiro, isto é, trata-se de analisar como que a exploração do trabalho
através do regime de colonato, em um primeiro momento, e, posteriormente, com a
crise do café pós década de 1930, na figura do meeiro, do sitiante etc. (Pierre Monbeig,
1984) foi possível um deslocamento de excedentes (mais-valia) para outras formas de
produção como na importação de bens de produção.
18
A mais-valia absoluta incorporada ao café entregue no mercado,
constituída numa imensa massa de trabalho não pago, realizava-se
predominantemente fora da economia cafeeira. (...) Nesse sentido, através do
trabalho pretérito incorporado à mercadoria [café], a produção agrícola
remunerava o capital do tratamento industrial do café. Desse modo a
reprodução do capital teria que ocorrer, na cafeicultura, predominantemente
sob a forma de reprodução extensiva e territorial, baseada amplamente na
exploração da mão-de-obra sob relações não capitalistas de produção. (...)
Como a fazenda não absorvia capital senão limitadamente, já que ela própria
produzia parcela básica do seu capital, pela transformação da renda em
trabalho em capital, a oposição entre práticas capitalistas e relações de
produção não-capitalistas se resolveria na reprodução capitalista do capital
[através do trabalho assalariado], fora do café, na indústria, como se deu,
quase ao mesmo tempo em que se instalou o trabalho livre. (MARTINS,
2004, pp. 92-93)
Assim, apontamos desde já, tratou-se de uma indústria que não se estabelecia
através de sua autodeterminação, ao contrário, estava determinada a reiterar a realidade
agrária exportadora do café. Tavares (1985) coloca a questão do seguinte modo:
A indústria de bens de consumo assalariado, uma vez instalada, serve de
suporte ao esquema de reprodução global do capital cafeeiro sob dois ângulos.
[De modo esquemático adaptado por mim]:
- O primeiro é o de garantir o custo de reprodução da mão-de-obra do complexo
cafeeiro, mesmo nas etapas de declínio do café, quando o poder de compra das
exportações vem abaixo e diminui mais que proporcionalmente a capacidade
para importar bens de consumo manufaturado.
- O segundo é o de manter a taxa de acumulação global quando esta começa a
cair, ao caírem os preços internos do café, e ao desacelerar-se o ciclo de
expansão na fronteira agrícola (TAVARES, 1985, p. 99)
Estas importantes considerações são ainda retomas em outro trecho no qual a
autora aponta as dependências da indústria em relação à agricultura, pois dela dependia
a capacidade de expansão física assim como de ampliação da capacidade produtiva,
uma vez que era a economia cafeeira que fornecia excedentes que poderiam ser
19
investidos na indústria como bem apontou Martins (loc. cit.); do mesmo modo, era a
realidade agrária que se constituía em mercado consumidor dos bens de consumo
produzidos por esta indústria (TAVARES, 1985, p. 100)
Desse modo, o ponto central da discussão está, a nosso ver, na forma particular
da constituição da divisão campo cidade, posta como uma cisão elementar para a
produção de mercadorias como destacou Marx.
No Brasil, a produção da cisão entre o campo e a cidade tem sentido oposto ao
modelo clássico inglês descrito por Marx. Pois, ao invés de promover o estabelecimento
de uma realidade determinada pelos nexos da produção industrial, o surgimento de
indústrias, no Brasil, se constitui em um modo de aprofundar a realidade agrária
exportadora. Constitui-se, desse modo, um mercado interno estabelecido pelos sentidos
da produção agrária.
Assim, se no caso inglês a acumulação originária significou uma intensa
expropriação do camponês de sua base fundiária herdada do período feudal, no Brasil
não há uma expropriação do trabalhador livre do campo, fato que Sérgio Silva destaca
quando afirma que: “Em 1910, estima-se que 90% dos operários de São Paulo são
estrangeiros” (1986: 92), ou seja, do mesmo modo que se importou o capital industrial,
foi necessário uma importação da mão-de-obra. Não se estabeleceu, dessa forma, um
revolucionamento da produção agrária, sendo esta realizada após a crise do café em
pequenas propriedades de sitiantes, como descreve Monbeig em Pioneiros e
Fazendeiros de São Paulo, obra escrita na década de 1940.
Desse modo se compreende o não estabelecimento do Departamento produtor de
bens de produção (I) na economia brasileira, pois não há uma efetivação de um
entrelaçamento entre ramos produtivos industriais, mas, ao contrário, o estabelecimento
de ramos industriais destinados a atender a demanda da realidade agrária cafeeira.
Esta dependência frente ao setor exportador, pelo lado da
acumulação, é decisiva, pois, se bem o modo de produção capitalista se
torna dominante no Brasil, por força da própria expansão cafeeira, não se
geram, em simultâneo, forças produtivas capitalistas capazes de reproduzir,
endogenamente, o conjunto do sistema. Vale dizer, não se passa, ao mesmo
tempo, ao modo especificamente capitalista de produção, ao chamado
‘capitalismo industrial’. (TAVARES, 1985, p. 100)
20
Assim, compreende a autora, se considerarmos industrialização como a
“constituição de forças produtivas especificamente capitalistas”, ou seja, um
departamento produtor de bens de produção que determine a indústria por si mesma
com o estabelecimento de ramos produtivos industriais entrelaçados, ao passo que
redefine sua produtividade através da produção de máquinas mais produtivas, deve-se
entender como processo de industrialização apenas o que ocorre a partir da década de
1950, quando há uma maciça importação de capitais internacionais (TAVARES, 1985,
pp. 100-101). Fato este, que será detidamente estudo por nossa pesquisa.
Assim, não se trata, de apontar como que o café possibilitou as bases para a
industrialização em uma análise de certo modo teleológica e linear, que compreende a
passagem de uma realidade agrária para uma forma industrial e urbana, ou de
compreender que a precariedade (baixa produtividade) da produção agrícola se constitui
como obstáculo à produção industrial, como aponta Caio Prado (1956); mas de
compreender as determinações das relações comerciais internacionais brasileiras, que
definiram uma industrialização subordinada ao complexo cafeeiro.
A análise de Marx sobre o modelo clássico inglês, cuja acumulação primitiva
possibilitou o desenvolvimento de um ramo produtor de bens de produção e, assim,
determinante de todos os demais, pois promove o revolucionamento dos meios de
produção, encontra sua explicação na expansão do comércio pela Europa, através do
desenvolvimento dos centros urbanos e dos novos mercados coloniais, fatos que
impelem a um desenvolvimento das forças produtivas, pois a base de produção feudal
não consegue realizar a produção exigida.
Os novos mercados coloniais não podiam ser atendidos pelo número
relativamente baixo de trabalhadores urbanos legados pela Idade Média e as
manufaturas propriamente ditas abriram, ao mesmo tempo, novas áreas de
produção à população rural expulsa da terra com a dissolução da
feudalidade. (MARX, Livro I, vol. 2, 1985, p. 48)
Com este impulso à produção industrial, há o desenvolvimento de ramos
produtivos que se especializam na produção de máquinas, este Departamento I é de
fundamental importância, pois é ele quem define os outros ramos, “O revolucionamento
do modo de produção numa esfera da indústria condiciona seu revolucionamento nas
outras” (MARX, Livro I, vol. 2, 1985, p. 15).
21
Com o aumento das invenções e a crescente procura pelas máquinas
recém-inventadas, desenvolveu-se cada vez mais, por um lado, a separação
da fábrica de máquinas em diversificados ramos produtivos, por outro lado a
divisão do trabalho no interior das manufaturas que construíam maquinas
(idem, p. 14)
No caso brasileiro, ainda que se tenha como determinação o capital comercial,
este não proporcionará, como no caso inglês, o desenvolvimento da manufatura em
indústria, pois é um comércio que determina a produção agrícola. Assim, as
determinações da expansão do capital no Brasil condicionam o desenvolvimento de uma
indústria que tem como finalidade reproduzir a agricultura não se constituindo, pois,
num departamento produtor de bens de produção.
Destaca-se, do mesmo modo, que na realidade periférica brasileira, a tributação
que recaia sobre a produção agrícola, já que estava nela a única forma de acumulação de
divisas, não repercutiu em uma acumulação que fosse suficiente para a constituição de
um departamento I, ou seja, não possibilitou a passagem de uma economia agrária para
uma produção industrial, no sentido de colocar esta como fator determinante do
processo de acumulação. Tratou-se, na verdade, de uma industrialização que tinha como
determinação reiterar a produção agrária, pois dela dependiam as importações de bens
de produção, assim como era a realidade rural que se constituía em mercado consumidor
desta indústria. Foi, portanto, uma industrialização que aprofundou, contraditoriamente,
o padrão agro-exportador até pelo menos a década de 1950, quando se dá uma maciça
incorporação de capitais internacionais, sobretudo norte-americanos.
Cabe-nos ressaltar, a partir das contribuições de Anselmo Alfredo (mimeo
2008), como estes fatos estão postos em função das determinações do processo de
modernização e, portanto, das contradições inerentes ao conceito de capital. Assim, a
principal ‘torção’ na análise é a de que não se trata de uma mera incorporação do atraso
para a reprodução do moderno, como é posto pelas discussões sobre a expansão do
capital, mas de compreender através da perspectiva da simultaneidade como que atraso
e moderno são postos como necessidades da reprodução do valor global.
Se a crítica vai no sentido de mostrar uma perda da dicotomia entre o
moderno e o atraso, na medida em que ambos são momentos de uma só
unidade, isto é, o próprio processo de valorização do valor, é de se notar, a
22
partir de agora, os sentidos que o desvendar desta contradição implica na
análise do próprio reproduzir ampliado que é, em verdade, o êmbolo lógico e
social do próprio capital enquanto tal. ( ALFREDO, mimeo, p. 99)
Desse modo, na periferia, segundo Alfredo, diferentemente da análise dos outros
autores citados, há uma expropriação da própria formação das categorias que deveriam
efetivar este capital que se coloca como anteposto através da importação de bens de
produção. Ou seja, ainda que a realidade periférica se constitua como momento da
reprodução de capitais ou mesmo do valor, cabe desvendar como que há, para esta
realidade periférica o estabelecimento de uma anteposição do capital em relação às suas
categorias (trabalho, por exemplo), o que resultaria em uma possível expropriação da
própria formação destas categorias.
Do mesmo modo, reitera-se que nossa análise compreende a contradição como
um aspecto inerente ao conceito de capital que determina, desse modo, sua expansão e
assim amplia seu caráter crítico.
Desta maneira, a nossa torção vai no sentido de fortalecer a análise
própria das relações de produção que permitiriam o que iremos considerar
como uma crítica categorial do processo de modernização que não se limita a
uma acumulação nacional, já que posta como simultaneidade do processo de
formação do capital mesmo, trata-se de uma crítica à acumulação da qual a
periferia seria a sua identidade negativa, do ponto de vista de uma divisão
social interna, trata-se não de observar a insuficiência da agricultura no
processo de acumulação, mas a sua determinação no sentido de fazer desta
industrialização específica, que vai até a década de 50, uma forma de
reproduzi-la e extensificá-la. (ALFREDO, mimeo, p. 106)
Assim, com propõe Alfredo, “não foi uma ruptura da realidade agrária para uma
urbano industrial, mas a apropriação dos conteúdos – relações de produção – agrários
como suporte da formação de um mercado interno para a industrialização que só assim
se tornaria possível (idem)”.
Trata-se de vermos, a partir destas discussões, como este processo se dá no norte
do Paraná, na década de 1950, em função da importação de capitais internacionais norte
americanos através dos relatórios da CMBEU-DE.
23
2. Compreensão da Particular divisão campo cidade estabelecida no norte do
Paraná.
2.1. O Norte do Paraná.
A ocupação do norte do Paraná por interesses de capitais específicos tem marcas
mais expressivas a partir do início do século XX através da Companhia de Terras do
Norte do Paraná (CTNP), subsidiária da companhia inglesa Paraná Plantations, que
adquiri, por volta do ano de 1925, uma enorme área de terras, cerca de 550.000
alqueires, equivalentes a 13.166 Km² (aproximadamente doze vezes o município de São
Paulo), constituindo a maior empresa de colonização da América do Sul. Esta
colonização é de fundamental importância para o que denominamos, hoje, norte do
Paraná, uma vez que esse empreendimento consolidou as bases da conformação
econômica da região.
Já havia, entretanto, desde o início do século XX, uma prolongação da economia
cafeeira paulista para norte do Paraná caracterizando uma sub-região denominada Norte
Velho ou Pioneiro, região esta que, delimitada ao norte e a leste pelo estado de São
Paulo, se estende até o vale do rio Tibagi a oeste, rio que também marca uma das
fronteiras das terras colonizadas pela CTNP, que por sua vez se estendiam, a grosso
modo, até o rio Ivaí a Oeste. (NICHOLLS, 1970)
A partir do norte pioneiro iniciou-se a expansão ferroviária para o restante do
norte do Paraná, expansão que ligava esta região à economia paulista e ao porto de
Santos. Ourinhos-SP foi o ponto de ligação entre a Estrada de Ferro Sorocabana (SP) e
a Estrada de Ferro São Paulo-Paraná que partia de Cambará-PR. Ampliada por capitais
ingleses a São Paulo-Paraná transpôs o rio Tibagi e adentrou nas glebas da CTNP
elevando significativamente o preço de suas terras, evidenciando, com a venda de terras,
uma forma de reprodução ampliada do capital ferroviário investido.
24
A presença da ferrovia SP-PR, elevou de tal forma o preço da terra
que se em 1920, o preço era de 50$000 Rs o alqueire, passou quatro anos
depois a atingir a cifra de 2:500$000 Rs. (Steca & Flores, 2002, p. 147)
Vender terras tornou-se, assim, fonte de recursos menos incerta e mais
rendosa. Para que os negócios sejam lucrativos, é preciso organizar o
espaço; e as empresas de colonização estão melhores equipadas para o fazer.
(MONBEIG, p. 241, 1984, grifo meu.)
Nota-se que Monbeig destaca a importância da “organização espacial” como
condição para auferir lucros; nossa perspectiva, contudo, parte de uma sutil diferença
que compreende a seguinte questão a ser resolvida: o espaço produzido através dos
investimentos ingleses como cisão campo-cidade para a produção de mercadorias, cujo
planejamento da CMBEU-DE, na década de 50, possui o mesmo intuito ou essência,
não estaria em função da determinação de se criar condições para remuneração do
capital internacional? Assim, não se trataria de pensar apenas na lógica da produção
capitalista como busca de lucros, mas de se interpretar este sentido da organização
espacial como uma necessidade de reprodução de capitais internacionais ociosos.
O norte do Paraná se justifica aos interesses ingleses por ser uma área de enorme
fertilidade, que devido à incidência de derramamentos vulcânicos deu origem ao
latossolo vermelho, amplamente conhecido como “terra roxa’, capaz, portanto, de
fornecer renda para a indenização dos capitais investidos que, além da venda da terra,
encontrava no transporte ferroviário de mercadorias (frete) uma forma de rendimento. A
bibliografia consultada denomina essa região de colonização planejada como Norte
Novo.
Ressaltamos o estudo de Pierre Monbeig (1984), no qual classifica a região
Norte do Paraná como uma extensão do oeste paulista dada a semelhança nos processos
de ocupação pós-crise de 1929, como visto: marcados pela pequena propriedade e
25
instalação simultânea da cisão campo-cidade em um processo caracterizado pela
anteposição da ferrovia e dos núcleos urbanos à ocupação.
A fundação de núcleos urbanos precede de pouco à colocação à venda
dos lotes rurais. O desenvolvimento desses núcleos é uma garantia de
sucesso para o empreendimento. (MONBEIG, p. 235, 1984)
Tal anteposição, para Monbeig, aparece como atrativo para a vinda de ex-
colonos dos antigos latifúndios cafeeiros paulistas e como garantia de lucros, mas
também revela os sentidos de uma ocupação determinada à remuneração destes capitais
antepostos.
Entre as cidades que foram fundadas através do planejamento espacial da CTNP
estão as cidades de Londrina (principal pólo regional e hoje segunda maior cidade do
Estado do Paraná) e Maringá como grandes núcleos urbanos, outras cidades ao longo da
Estrada de Ferro São Paulo-Paraná como Cambé, Arapongas, Apucarana também são,
hoje, importantes cidades. O projeto realizou ainda a construção de diversas outras
cidades menores que, inicialmente planejadas como Patrimônios de beneficiamento de
produtos agrícolas, são hoje núcleos urbanos de menor influência.
Esta expansão agrícola é compreendida através da perspectiva de que com o
capitalismo as determinações da produção espacial ultrapassam o nível material da
produção e reprodução das condições básicas da subsistência humana e adquiri
determinações abstratas engendradas pelas “leis coercivas, que impelem os capitalistas a
inovações em busca de lucros” (Harvey, 1993, p.169). Estas inovações resultam em um
enorme e desnecessário desenvolvimento das forças produtivas que acabam por
promover uma superacumulação de capitais, que para não decorrer em desvalorização,
recorrem ao investimento em áreas “atrasadas” de forma a se reproduzirem7.
7 “Esse excesso de capital pode existir como excedente de mercadorias, de moeda, de capacidade produtiva, e também leva a um excedente de força de trabalho (desemprego ou subemprego amplo). A
26
Assim, se há uma coerção que o ambiente da circulação impõe aos capitalistas
impelindo-os, por meio da concorrência, a realizarem uma constante revolução nos
meios de produção de modo a permanecerem competitivos, isto se traduz em redução do
tempo de produção. É, portanto, em decorrência da tendência à supressão do tempo de
produção que desponta as determinações do valor na sociedade capitalista.
Desse modo, é através da análise que Marx expõe em O Capital que surge a
possibilidade da compreensão de que o capitalismo engendra uma realidade em que as
categorias passam a ser definidas de acordo com as determinações da produção. Assim,
compreende-se o espaço não como palco, mas como meio, condição e produto da
sociedade (Ana F. A. Carlos, apud ALFREDO, 2005). Desse modo, o espaço,
pressuposto para a produção capitalista, deve estar em concordância com as
determinações desta produção, isto é, ao seu ritmo de valorização do valor.
Assim compreendemos que o que chamamos de espaço no capitalismo é aquilo
que se constitui como um termo cindido da dimensão espaço-temporal, cujo espaço
surge como redução do tempo (duração) de produção, isto é o espaço se define como
supressão do tempo de trabalho socialmente necessário.
Desse modo, se o movimento histórico é determinado, segundo Marx, pela
própria lógica de produção capitalista, as transformações no espaço ocorrem em função
da negatividade do capital, qual seja, seu impulso imanente de redução do tempo de
produção, ou seja, de redução do valor.
A temporalidade do capital pode ser compreendida como uma
autotransformação definida pelo superar de suas barreiras – que se
expressam como elementos históricos a serem ultrapassadas -, postas a
partir de seus próprios limites, isto é, contradição a serem superadas
oriundas de sua lógica intrínseca. Deste pondo de vista, pode-se derivar daí
única solução efetiva para tais crises, na ausência do ajuste espacial, é a desvalorização do capital.” (HARVEY, 2005, p. 115)
27
o fato de que os limites (lógicos) num dado momento constituem-se como
história, isto é, efetivam transformações sócio-espaciais a serem superadas
para a sua reprodução. Trata-se da transmutação da lógica contradita em
história. (cf. Karl Marx, 1997, vol. 2, apud ALFREDO, A, 2006, p. 4)
Portanto, do mesmo modo que a mercadoria e o trabalho são reduzidos a tempo
de trabalho homogêneo, o espaço também se constitui sob este duplo aspecto, qual seja,
possui uma materialidade, mas está só se realiza em função das determinações do valor,
isto é, o espaço é também abstrato8. Concordamos, pois, com a seguinte interpretação
sobre o planejamento proposta por Anselmo Alfredo:
Planejamento, bem entendido, naquilo que se refere a uma adequação global
da sociedade em direção à reprodução da lógica produtiva, donde o espaço
aparece como uma das dimensões que se contrapõe à plena fluidez do
processo. Se há uma dimensão material e outra financeira, em que ambas
podem facilmente estar uma funcionalmente correspondendo à outra e ao
processo de acumulação, a terceira dimensão, espacial e temporal, esta por
ser atualizada. (ALFREDO, 2005, p. 21)
Busca-se, desse modo, analisar o fato de a produção espacial no norte do Paraná,
decorrente da atuação da CTNP e depois sob a ótica dos projetos da CMBEU-DE, ser
determinada ao mesmo tempo a indenizar capitais internacionais investidos e a efetivar
trocas no interior da economia nacional. Decorre daí o necessário estabelecimento da
divisão campo-cidade como um aprofundamento da produção agrícola, cujos projetos
da CMBEU-DE visam potencializar tal produção, uma vez que dela depende a
indenização da importação de capitais.
A contradição posta como acumulação capitalista, encontra, no caso brasileiro,
a necessidade de remunerar tanto um capital monetário que não encontra
8 Deve-se dizer que tais esclarecimentos acerca da especificidade do espaço no capitalismo foram feitas a partir do Prof°. Dr. Anselmo Alfredo, através de aulas ministradas no curso de Geografia Econômica II no Departamento de Geografia da FFLCH-USP, bem como através de palestras e grupos de estudos.
28
outros meios de aplicação a não ser nos paises atrasados; como, ao mesmo
tempo, esta remuneração deve comportar um desenvolvimento da produção
dos meios de consumo nacionais, para estabelecer a crítica circulação do
capital social. (Alfredo, mimeo a)
Os relatórios da CMBEU-DE como evidência do investimento de capitais
ociosos podem fornecer um embasamento empírico para se pensar na modernização
periférica brasileira, sobretudo em seus resultados espaciais, pois consistem
fundamentalmente em uma estratégia espacial (infra-estrutura de transporte) para a
reprodução de capitais internacionais no norte do Paraná.
2.2. Comissão Mista Brasil Estados Unidos para o Desenvolvimento (CMBEU-DE)
De modo geral, os relatórios constituem um conjunto de estudos que apontam as
“necessidades” de um investimento infra-estrutural, prevendo uma série de empréstimos
junto aos Estados Unidos, de modo a viabilizar o desenvolvimento econômico nacional
através da exportação de produtos primários e incorporação de bens de produção. Esse
pressuposto deriva da interpretação dos projetos de investimento da CMBEU-DE serem
destinados, majoritariamente, ao setor de transportes, tanto de ferrovias como de
rodovias, promovendo, segundo o próprio relatório, uma dinamização de regiões
econômicas, como é o caso, do norte do Paraná (CMBEU-DE, V. 5).
Assim, os relatórios evidenciam a pertinência de uma análise da divisão campo
cidade como pressuposto e resultado do processo de modernização, pois aponta como
que a expansão agrícola resulta em um “surto e crescimento de uma número
considerável de cidades médias o interior.”
Os relatórios analisam o desenvolvimento econômico da região Norte do Paraná
nos últimos dez anos (1940-50) da seguinte maneira:
29
O prodigioso desenvolvimento econômico do norte e do oeste do
Estado do Paraná é fato tão conhecido, que bastam algumas cifras globais para
ilustrá-lo. A população do Estado aumentou de 1,2 para 2,1 milhões no
período 1940 a 1950. (CMBEU-DE, V. 7, p. 99)
O norte do Paraná tornou-se uma das mais importantes regiões
brasileiras produtoras de cereais, tendo sua produção de arroz de terra seca
quase duplicada entre 1940 e 1951, enquanto a safra de feijão aumentou de
140.000 para 230.000 toneladas, a de mandioca de 165.000 para 275 000, e a
de milho de 860.000 para 940.000. Simultaneamente, a colheita de algodão
nessa zona subiu de 24.000 a 42.000 toneladas, anualmente. (idem, p. 100)
Do ponto de vista econômico, não se pode subestimar a importância
de que se revestem o fornecimento de meios para a pronta movimentação da
nova safra cafeeira e de outros produtos agrícolas do Paraná e da produção de
cereais pela população rural do Estado, que cresce rapidamente. (idem, p. 92)
Esses são alguns exemplos tirados do item “a importância do projeto” presente
no relatório de volume 7. Observa-se que os relatórios justificam os projetos pela
necessidade de ajuste entre a capacidade produtiva e a de transporte dos produtos
agrícolas da região, sendo que os transportes encontram-se em defasagem.
A necessidade de adequar a circulação do capital numa supressão do
próprio tempo de circulação para atender às exigências de uma capacidade
produtiva mundialmente posta evidencia-se diante do próprio projeto da
CMBEU-DE. (Alfredo, mimeo b)
A realidade descrita pelos relatórios aponta um período de intensa
transformação, urbana e da estrutura agrária, cujo processo de industrialização e, assim,
de constituição do mercado interno nacional, través da incorporação de capitais
internacionais é o principal fator de transformações. Veja-se, por exemplo este trecho
extraído do Relatório Geral da CMBEU-DE:
30
O Processo de industrialização e, sobretudo, a rápida e concentrada
urbanização que o acompanhou, alargam grandemente os mercados
citadinos. Ao mesmo tempo o restabelecimento da lucratividade da
cafeicultura e sua resultante expansão para abarcar novas zonas [como é o
caso do norte do Paraná], assim como o incremento da produção comercial
de alimentos, foram responsáveis pelo surto e crescimento de um número
considerável de cidades médias no interior. Estas se estão vinculando aos
principais centros industriais por um sistema de transporte que cada vez
mais se orienta no sentido de integração do mercado interno antes que no
sentido de carreamento do comércio para o exterior. (Relatório Geral, p. 35)
Assim, nota-se como que o desenvolvimento de um mercado interno, cujo pivô
central é o processo de industrialização, coloca a agricultura como ramo de produção de
matérias primas para a indústria e, no caso brasileiro, como financiador da própria
industrialização, pois permite a importação de bens de produção. Processo que se
estabelece de modo fetichizado ao se por como base de um discurso nacional
desenvolvimentista, que vê a constituição do mercado interno e do processo de
industrialização um fortalecimento da nação em contraposição aos interesses
internacionais.
Trata-se, portanto, de retomar a divisão social do trabalho a luz das discussões
feitas sobre a negatividade inerente do capital. Pois, os trabalhos tornados autônomos e
determinados pela necessidade de redução do tempo de produção, tornam-se
descompassados, perde-se, desse modo, a proporcionalidade que existia dentro de uma
unidade produtiva não cindida, por exemplo, entre a produção rural e industrial
doméstica no mundo feudal.
31
Marx divide entre dois macros departamentos toda a produção capitalista, sendo
o departamento I o produtor de meios de produção e o Departamento II o produtor de
meios de consumo9.
A constituição de departamentos, portanto, é resultado do processo da cisão
campo cidade, em que ocorre a autonomia de ramos da produção, que entram em
descompasso, pois se antes, formavam uma unidade produtiva, sendo que um processo
se constituía como pressuposto do seguinte; com a autônima destes processos há um
desenvolvimento desigual dos ramos produtivos.
Trata-se, desse modo, de se pensar a modernização periférica do Brasil e os
projetos de modernização da CMBEU-DE sobre a perspectiva do descompasso entre os
dois departamentos da economia. Como o departamento I (meios de produção) é mais
produtivo em relação ao departamento II (meios de consumo); pois, além do fato de que
enquanto o primeiro realiza grande quantidade de valor na venda de cada máquina
produzida, o processo de acumulação do departamento II é mais demorado, pois ao
adiantar capital, para compra de um meio de produção, deverá produzir grande
quantidade de produtos (meios de consumo) para realizar este capital adiantado.
Assim, os projetos da CMBEU-DE evidenciarem uma tentativa de exportação de
meios de produção, que em nossa perspectiva seriam capitais excedentes.
De forma explicita, Harvey exemplifica esse processo de tentativa de contorno
da crise via “ajuste espacial”:
9 Marx define os dois setores da economia da seguinte maneira:
“O produto global e, portanto, a produção global da sociedade decompõem-se em dois grandes departamentos. I. Meios de produção, mercadorias que possuem uma forma em que têm de entrar ou pelo menos podem entrar no consumo produtivo. II. Meios de consumo, mercadorias que possuem uma forma em que entram no consumo individual da classe capitalista e da classe trabalhadora.
Em cada um desses departamentos todos os diferentes ramos da produção que lhes pertencem constituem um único grande ramo da produção, uns o dos meios de produção, outros o dos meios de consumo. Todo capital empregado em cada um desses dois ramos da produção constitui um grande departamento particular do capital social.” (MARX, 1985, p.293, V. II, Livro II, grifo meu.).
32
Esse “reparo espacial” (...) do problema da superacumulação
capitalista promove a produção de novos espaços dentro dos quais a produção
capitalista possa prosseguir (por exemplo, por meio de investimentos em infra-
estrutura) (...) Emprestar dinheiro (com freqüência levantado, digamos, nos
mercados de capital de Londres ou Nova Iorque por meio da formação de
capital fictício) à América Latina para a construção de infra-estruturas de
longo prazo ou para a compra de bens de capital que ajudem a gerar produtos
por muitos anos é uma forma típica e forte de absorção da superacumulação.”
(Harvey, 1993, p. 172)
Em Lênin10 (2005), encontramos umas das primeiras elaborações derivadas dos
esclarecimentos de Marx sobre aspectos de uma crise originada do processo de
concorrência entre capitais que, ao promover o investimento em capital constante, de
modo a aumentar a produtividade e baixar o custo da produção, realiza, no entanto, um
processo cego desencadeando uma desproporção entre a acumulação de capital e sua
remuneração. Esta crise se ameniza com a exportação dessa capacidade altamente
produtiva para os países atrasados, trata-se da exportação de capitais.
O relatório também permite observar o desenvolvimentismo atrelado ao
sentimento nacionalista da década de 50 insuflado pelo Governo Vargas através do
“desenvolvimento da Nação”, como se observa abaixo no trecho do despacho do
presidente Getúlio Vargas.
O reequipamento das oficinas e a mecanização dos serviços de reparos
e asfaltamento das estradas contribuirão para o progresso econômico do Estado
do Paraná e para o abastecimento dos centros consumidores em muitos pontos
do território nacional. (Despacho do presidente da república, Getúlio Vargas,
em 23 de março de 1953, presente no relatório CMBEU-DE volume 7)
10 “O desenvolvimento desigual e a subalimentação das massas são as condições e as premissas básicas inevitáveis deste modo de produção. Enquanto o capitalismo for capitalismo, o excedente de capital não é consagrado à elevação do nível de vida das massas do país, pois significaria a diminuição dos lucros dos capitalistas, mas ao aumento desses lucros através da exportação de capitais para o estrangeiro, para os paises atrasados.” (LÊNIN, 2005, p.62)
33
Dessa forma e contraditoriamente, a modernização é incorporada para o
desenvolvimento nacional das forças produtivas que, no entanto, se realizaria a
reprodução ampliada de capitais internacionais.
34
3. Análise espacial crítica da modernização.
O investimento de capitais externos no Brasil na década de 50 tem como
correspondente um pensamento desenvolvimentista concebendo tais investimentos
como sinais do desenvolvimento nacional como já foi exemplificado.
Para Pierre George, por exemplo, o desenvolvimento capitalista refere-se à
“passagem de uma economia de carência e de privação para uma economia de
consumo” (GEORGE, p.11, 1971), compreendendo que o consumo proporcionado pelo
capitalismo seria um progresso, quando, ao contrário, em Marx (1977) encontramos que
a produção nas sociedades pré-capitalistas está voltada para a reprodução da
comunidade (da existência humana) e com o capitalismo o sentido da produção se
desloca para uma forma tautológica de acumulação de riqueza11 (valorização do valor),
o capital com um fim em si mesmo.
A periferia, desse modo, é entendida como uma forma de reprodução crítica do
capital, pois permite ao centro se reproduzir enquanto tal através de sua exploração.
Kurz (1993) compreende a tentativa de modernização das economias do terceiro mundo
como fracassada, pois sua situação não foi superada através do endividamento12, devido
ao alto grau de seu desenvolvimento tecnológico dos países centrais. O que ocorre, para
este autor, é justamente o processo inverso o intenso aprofundamento da crise dos
países centrais atingiu a periferia do sistema (KURZ 2004).
11 Riqueza abstrata, cuja substância é o trabalho abstrato como medida de valor. 12 “Enquanto nos anos 70 ainda estava vinculada a esses créditos a ilusão de se poder alcançar por esse caminho o desenvolvimento interno, a industrialização e a capacidade de participar no mercado mundial, essa bolha de sabão estourou o mais tardar em 1982, quando a insolvência do México marcou o inicio da famosa crise de dividas do terceiro mundo” (KURZ, 1993, p. 170); “Mais cedo ou mais tarde tem que impor-se inexoravelmente a lei da rentabilidade, que diz que somente é válida e capaz de participar no mercado aquela produção que corresponda ao nível mundial de produtividade (idem, p. 171); Cada passo de desenvolvimento e aumento da produtividade nos países atrasados é negativamente compensado, em escala crescente, por dois, três ou mais passos nas regiões mais avançadas (ibidem, p. 172)”
35
É justamente a partir desta expansão do capital, que se apresenta como um
desenvolver das forças produtivas pelo mundo, que é possível falar em certo “desnível
do tempo histórico” do processo de modernização, se constituindo, tal expansão, como
modernização retardatária ou tardia, que ao assim se por, se faz como corrida de
superação desta condição (Kurz, 2004). Isto, implicando em uma perspectiva
desenvolvimentista, isto é, na ilusória possibilidade de um desenvolvimento mundial do
capital, em mesmos níveis. Corrida, que chega ao fim e perde, enfim, sua sustentação
ilusória de efetivação, pois a realidade se apresenta como uma “nova silmultaneidade”
posta, entretanto, não pelo desenvolvimento dos países de modernização tardia, mas
pela crise que chega a sua maturidade nos países mais desenvolvidos e abate
simultaneamente todo o globo, entretanto com efeitos mais catastróficos para os países
pobres.
Crise, que não se trata mais de um processo cíclico, mas de crise profunda,
marcada, diga-se novamente, pela perda da possibilidade do capital explorar trabalho,
em função dos altos níveis de desenvolvimento tecnológico. O capital enfim, chega a
sua maturidade, que, portanto, coincide com seu colapso.
Assim, se havia um desnível do tempo histórico, cuja desigualdade de
desenvolvimento das forças produtivas sustentava a crença em uma modernização
recuperadora, está diacronia, no entanto, não deixa de estar mediada pela sincronia e,
assim, simultaneidade e universalidade do valor, que se constitui justamente em função
desta desigualdade de desenvolvimento. Ou seja, a desigualdade (diacronia) sempre foi
pressuposto para a realização do capital, pois se constitui com possibilidade de um
dirimir de suas crises de realização do valor.
Em outras palavras, a realização das determinações formais do capital,
do valor, não têm condições lógicas de se realizar a partir de um processo de
homogeneização. As contradições da forma que, no plano mais externo
mostram-se como impossibilidade de realização do lucro, re-interpretam e
absorvem, sob as suas determinações, elementos que passam, então, a
participar, nesta desigualdade, da realização do moderno e da modernização.
Este processo de desigualdade do desenvolvimento, simultaneidade negativa
ou atualização técnica, corrobora para a coexistência de temporalidades
múltiplas unificadas pela e na forma valor. (ALFREDO, mimeo)
36
Os relatórios da CMBEU-DE são um momento dessa modernização via capital
externo, expressando uma necessária incorporação de capitais internacionais para o
estabelecimento de trocas internacionais, que em sendo assim, ao promover a
constituição de um mercado nacional se faz como tributário, contraditoriamente, do
capital internacional.
Como forma de compreensão da difusão do capitalismo pelo globo, ou seja, da
produção do espaço capitalista pelo globo, o pensamento que leva em consideração as
contradições e as determinações espaciais faz-se necessário, uma vez que o capitalismo
suprime o tempo enquanto sucessão, de forma que o espaço possibilita a compreensão
da coexistência do moderno e do atraso como uma distinção temporal que é unida,
enquanto simultaneidade, para a realização das possibilidades de lucro. (ALFREDO,
2005)
37
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