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MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL PROCURADORIA-GERAL DA REPÚBLICA HABEAS CORPUS Nº 383.336/RJ RELATORA: MINISTRA MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA – 6ª TURMA IMPETRANTE: TIAGO MARTINS LINS E SILVA E OUTROS IMPETRADO: TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 2ª REGIÃO PACIENTE: HUDSON BRAGA (PRESO) PARECER Nº 166/2017/RPN OPERAÇÃO CALICUTE PENAL E PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO PRÓPRIO. NÃO CONHECIMENTO. LAVAGEM DE DINHEIRO, OCULTAÇÃO DE BENS E ATIVOS E ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA. OPERAÇÃO CALICUTE. PRISÃO PREVENTIVA. GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA E DE APLICAÇÃO DA LEI PENAL. FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA. COMPLEXIDADE E EXCEPCIONALIDADE DO ESQUEMA CRIMINOSO. PODER ECONÔMICO E GRAU DE INFILTRAÇÃO DA ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA EM SETORES DO ESTADO ELEVADOS. GRAVIDADE CONCRETA DA CONDUTA. RISCO DE REITERAÇÃO CRIMINOSA. INSUFICIÊNCIA DE MEDIDAS CAUTELARES DIVERSAS DA PRISÃO. INEXISTÊNCIA DE CONSTRANGIMENTO ILEGAL. PARECER, EM PRELIMINAR, PELO NÃO CONHECIMENTO DO WRIT E, NO MÉRITO,PELA DENEGAÇÃO DA ORDEM. - I - 1. Trata-se de ordem de habeas corpus, com pedido de decisão liminar, impetrada em favor de Hudson Braga, Paciente que estaria sofrendo constrangimento ilegal por força do v. Acórdão proferido pelo Tribunal Regional Federal da 2ª Região que, denegando o writ manejado HC 383.336/RJ 1

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HABEAS CORPUS Nº 383.336/RJ

RELATORA: MINISTRA MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA – 6ª TURMA

IMPETRANTE: TIAGO MARTINS LINS E SILVA E OUTROS

IMPETRADO: TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 2ª REGIÃO

PACIENTE: HUDSON BRAGA (PRESO)

PARECER Nº 166/2017/RPN

O P E R A Ç Ã O C A L I C U T E

PENAL E PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUSSUBSTITUTIVO DE RECURSO PRÓPRIO. NÃOCONHECIMENTO. LAVAGEM DE DINHEIRO, OCULTAÇÃODE BENS E ATIVOS E ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA.OPERAÇÃO CALICUTE. PRISÃO PREVENTIVA.GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA E DE APLICAÇÃO DALEI PENAL. FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA.COMPLEXIDADE E EXCEPCIONALIDADE DO ESQUEMACRIMINOSO. PODER ECONÔMICO E GRAU DEINFILTRAÇÃO DA ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA EMSETORES DO ESTADO ELEVADOS. GRAVIDADECONCRETA DA CONDUTA. RISCO DE REITERAÇÃOCRIMINOSA. INSUFICIÊNCIA DE MEDIDASCAUTELARES DIVERSAS DA PRISÃO. INEXISTÊNCIADE CONSTRANGIMENTO ILEGAL. PARECER, EMPRELIMINAR, PELO NÃO CONHECIMENTO DO WRIT E,NO MÉRITO,PELA DENEGAÇÃO DA ORDEM.

- I -

1. Trata-se de ordem de habeas corpus, com pedido de

decisão liminar, impetrada em favor de Hudson Braga,

Paciente que estaria sofrendo constrangimento ilegal por

força do v. Acórdão proferido pelo Tribunal Regional

Federal da 2ª Região que, denegando o writ manejado

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perante aquela Corte, manteve a prisão preventiva

decretada pelo juízo a quo.

2. Em 09/11/2016, o Juízo da 7ª Vara Federal da Seção

Judiciária do Rio de Janeiro, acolhendo representação do

Ministério Público Federal, decretou a prisão preventiva

do ora paciente Hudson Braga e de mais sete corréus –

Sérgio de Oliveira Cabral Santos Filho, Wilson Carlos

Cordeiro da Silva Carvalho, José Orlando Rabelo, Carlos

Emanuel de Carvalho Miranda, Luiz Carlos Bezerra, Wagner

Jordão Garcia e Luiz Paulo Reis – para a garantia da

ordem pública e para assegurar a aplicação da lei penal

(e-STJ fls.33-156).

3. A custódia preventiva foi determinada nos Autos nº

0509565-97.2016.4.02.5101, ajuizado em decorrência das

investigações denominadas “Operação Calicute”, em que se

apurou a formação de um poderoso esquema de corrupção,

desvio e lavagem de dinheiro.

4. Referida medida constritiva foi determinada pelo

Juízo da 7ª Vara Federal da SJRJ para assegurar a

aplicação da lei penal e para garantia da ordem pública,

tendo em vista a gravidade concreta dos atos delitivos

praticados e do concreto risco de reiteração das

atividades criminosas, sendo de especial relevo a

apuração de práticas recentes de lavagem de dinheiro.

5. Em favor do Paciente foi impetrado um primeiro

habeas corpus junto ao Tribunal Regional Federal da 2ª

Região, sendo certo que a ordem foi denegada naquela

Corte, nos termos do Acórdão assim ementado (e-STJ

fls.158-193):

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PROCESSO PENAL. HABEAS CORPUS. OPERAÇÃO CALICUTE.GRAVIDADE EM CONCRETO DOS FATOS. GARANTIA DAORDEM PÚBLICA. ASSEGURAÇÃO DA APLICAÇÃO DA LEIPENAL. NÃO CABIMENTO DE MEDIDAS CAUTELARESALTERNATIVAS À PRISÃO. DENEGAÇÃO DA ORDEM.I - Os pressupostos para a prisão preventivarestam atendidos, na medida em que a denúncia jáfoi oferecida e recebida pelo Juiz Federalimpetrado, o que, sob o prisma do primeiro juízoa respeito das provas suficientes da existênciados fatos e indícios razoáveis de autoria, já severifica satisfeito. Além disso, a instrução sevaleu do instituto da colaboração decoinvestigados, o que, uma vez cotejados comoutros elementos, são aptos a solidificar umpouco mais o pressuposto de indícios suficientesda existência de fatos delituosos e sua autoria.II - Há amparo legal para a medida extrema noscasos em que se projete a reiteração criminosae/ou o crime tenha sido praticado emcircunstâncias e/ou condições pessoais do autor,que indiquem concreta gravidade dos fatos,capazes de negar frontalmente a ordem públicavigente e mediante a qual devem se pautar oscidadãos. Com efeito, situações como: gravidadeconcreta do crime; circunstâncias da prática docrime; perspectiva de reiteração no crime;condições pessoais do agente; periculosidadesocial; integrar associação criminosa, sãofrequente e atualmente reconhecidasjurisprudencialmente como justificativas para adecretação da prisão preventiva para a garantiada ordem pública.III - Um argumento tão genérico como: "aconhecida situação das prisões no Brasil", atodos deveria então ser aplicado, por força doprincípio da isonomia inserido no art. 5º daCarta Magna brasileira, e não só ao ora paciente,haja vista que todos estão recolhidos no mesmosistema prisional nacional que tanto se criticaem tese, sendo certo que, no caso, até com algumavantagem para o ora paciente, que se encontra emprisão especial, diversamente da maioria dosmilhares de presos para os quais a lei nãoconferiu tal privilégio. Nem mesmo o EgrégioSupremo Tribunal Federal assim atuou, haja vistaque, ao julgar Recurso Repetitivo afeto ao RE592.581, o Pretório Excelso adotou diversasrecomendações e medidas a respeito do sistemapenitenciário, mas todas elas no sentido demanter o seu funcionamento com as pessoas que láestão recolhidas, e jamais concedeu habeas corpus

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geral de ofício para todos os presos. Então, oque nos cabe fazer é aplicar a legislaçãovigente, na forma e conforme sua mens legis,analisando caso a caso o que for pertinente.IV - Não há nos autos prova robusta de que opaciente se encontre em alguma das hipóteses doart. 318 do CPP, pois não é maior de 80 anos deidade; não comprovou estar extremamentedebilitado por motivo de doença grave; nem queseja imprescindível para o cuidado de pessoamenor de 6 anos de idade ou deficiente; muitomenos que esteja em período de gestação a partirdo sétimo mês de gravidez e, como homem, seja oúnico responsável pelos cuidados do filho de até12 (doze) anos de idade incompletos.V - Ordem denegada.(grifos aditados)

6. Nesse contexto, a Defesa técnica impetra o presente

writ (e-STJ fls. 1-29), sob as alegações de ausência de

fundamentação idônea na decisão atacada e falta dos

requisitos legais para a manutenção da custódia

preventiva, ante a inexistência de dados concretos que

demonstrem que a soltura do Paciente oferece risco à

ordem pública e à aplicação da lei penal.

7. Por fim, requer a concessão da ordem para que o

Paciente seja imediatamente posto em liberdade, com ou

sem a aplicação de outras medidas cautelares diversas da

prisão, previstas no art. 319 do CPP.

8. Nessa instância, o pedido de liminar restou

indeferido (e-STJ fls.378-393). As informações

solicitadas à autoridade apontada por coatora e ao Juízo

de primeira instância foram prestadas(e-STJ fls.406-471,

473-679, 683).

9. Vieram os autos à Procuradoria-Geral da República

para manifestação (e-STJ fl.685).

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- II -

10. Preliminarmente, cumpre registrar que o Superior

Tribunal de Justiça, perfilhando o entendimento firmado

pela Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, passou a

inadmitir o habeas corpus como substitutivo de recurso

próprio, ressalvada, porém, a possibilidade de concessão

da ordem de ofício ante as excepcionais hipóteses da

flagrante ilegalidade, do abuso de poder ou da

teratologia jurídica (Cfr., dentre outros, HC 362.357/MT,

Rel. Ministro Felix Fischer, Quinta Turma, julgado em

04/10/2016, DJe 17/10/2016; HC 363.787/SP, Rel. Ministro

Antonio Saldanha Palheiro, Sexta Turma, julgado em

27/09/2016, DJe 13/10/2016).

11. No caso concreto, trata-se de habeas corpus

substitutivo de recurso próprio, o que impede o seu

conhecimento. Não obstante, cumpre avaliar a existência

de manifesta ilegalidade a ensejar a concessão da ordem

de ofício.

- III -

12. A representação ministerial que deu ensejo à

decretação da prisão do paciente apontou a formação de um

poderoso esquema de corrupção, fraudes a licitações,

desvio e lavagem de dinheiro, que foi revelado por meio

das investigações desenvolvidas a partir de provas

obtidas nas investigações antecedentes denominadas “Lava

Jato” e “Operação Saqueador”.

13. Como desdobramento da “Operação Saqueador”, foi

iniciada nova investigação no Estado do Rio de Janeiro, a

qual ensejou a deflagração da denominada “Operação

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Calicute”. A nova investigação teve também por fundamento

as revelações contidas nos acordos de colaboração

premiada de executivos da empresa ANDRADE GUTIERREZ,

firmados com a Procuradoria-Geral da República e

homologados pelo Supremo Tribunal Federal.

14. O Ministério Público Federal também celebrou acordo

de leniência com a empresa ANDRADE GUTIERREZ, ficando a

empresa obrigada a colaborar com as investigações,

apresentar documentos e informações pertinentes aos

ilícitos investigados, relacionados a contratações de

obras no Estado do Rio de Janeiro.

15. O objeto da investigação, realizada pelo MPF e

Polícia Federal com apoio da RFB, diz respeito ao esquema

de cartelização mediante pagamento de propinas envolvendo

grandes obras públicas de construção civil no Estado do

Rio de Janeiro, algumas custeadas com recursos federais,

como a construção do Arco Metropolitano, a reforma do

Estádio Maracanã e a urbanização de comunidades, ação

conhecida como “PAC das Favelas”.

16. As investigações descortinaram a atuação de

organização criminosa na prática de desvios milionários

de recursos públicos durante a gestão do então Governador

do Rio de Janeiro, Sérgio de Oliveira Cabral Santos

Filho, a partir do ano de 2007, envolvendo várias

empresas cartelizadas contratadas para a execução das

obras, dentre elas a ANDRADE GUTIERREZ e a CARIOCA

ENGENHARIA.

17. Por meio de formação de cartel, frustravam-se

sistematicamente licitações relacionadas às obras de

construção civil contratadas pelo Governo do Rio de

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Janeiro. O esquema criminoso formado pelas empresas

pagava propinas a mandatários políticos e gestores

públicos num percentual de 5% sobre os valores faturados.

Esses valores ilícitos eram geridos pelo núcleo

administrativo do esquema e posteriormente ocultados e

lavados pelo núcleo operacional.

18. O principal modo como ocorriam os desvios ilícitos

consistia na utilização de empresas conhecidas como

“laranjas” ou “empresas de fachada”, constituídas em nome

dos operadores financeiros, que recebiam pagamentos por

serviços fictícios. Essa sistemática servia para

dissimular, além de desvios de recursos para obras

públicas, o pagamento de propina a agentes estatais em

espécie, dificultando o rastreamento do dinheiro sujo.

19. O objetivo dessa sistemática de desvio é apagar o

rastro do dinheiro. As empresas de fachada ou “laranjas”

são criadas pelos operadores do esquema apenas para

permitir o saque em espécie dos recursos desviados, de

maneira dissociada da origem ilícita, ocultando os reais

beneficiários, especialmente os agentes políticos e

públicos.

20. A representação do MPF pela prisão preventiva expõe

que os operadores administrativos do esquema criminoso,

dentre os quais figura o paciente Hudson Braga, eram

gestores públicos do Governo do Estado do Rio de Janeiro

responsáveis por solicitar e administrar o recebimento de

propinas pagas por empreiteiras (e-STJ fl.205).

21. A representação e a denúncia oferecidas pelo MPF

perante o Juízo da 7ª Vara Federal do Rio de Janeiro

descrevem a atuação dos acusados na movimentação para

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empresas fantasmas, de valores provenientes, direta ou

indiretamente, de crimes contra a Administração Pública,

para posteriormente serem sacados em espécie,

possibilitando o pagamento de vantagens indevidas.

22. O modo de atuação da organização criminosa, no

desvio de recursos e na lavagem de dinheiro, com

intermediação de “laranjas”, é semelhante ao dos casos

investigados na “Operação Lava-Jato.” Delações premiadas

obtidas em processos da Lava-Jato confirmaram a

existência de gigantesco esquema de corrupção e desvio de

verbas públicas no Estado do Rio de Janeiro.

- IV -

23. Discute-se no presente writ a legalidade da prisão

preventiva decretada em desfavor do Paciente, pela

suposta prática dos delitos de lavagem de dinheiro,

ocultação de bens e ativos e organização criminosa.

24. É certo que a privação antecipada da liberdade do

indivíduo acusado de crime reveste-se de caráter

excepcional em nosso ordenamento jurídico. A medida deve

estar embasada em decisão judicial fundamentada (art. 93,

IX, da CF), que demonstre a existência da prova da

materialidade do crime e a presença de indícios

suficientes da autoria, além dos pressupostos do artigo

312 do Código de Processo Penal. Exige-se, ainda, na

linha de exegese adotada pela jurisprudência pátria, que

a decisão impugnada esteja pautada em motivação concreta,

vedadas considerações abstratas sobre a gravidade do

crime.

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25. No caso em tela, a prisão preventiva restou

devidamente justificada pelo Juízo a quo para a garantia

da ordem pública, tendo em vista a gravidade concreta dos

crimes imputados, bem como o risco de reiteração na

prática criminosa de lavagem de dinheiro, como se

verifica dos trechos a seguir, em especial seus destaques

(e-STJ fls.98-99, 103-108, 110-112):

Hudson Braga foi responsável pela Secretaria deObras do Governo do Estado do Rio de Janeiro naadministração de Sérgio Cabral e seria um dosimportantes membros da Organização Criminosa sobinvestigação, exercendo papel de destaque comooperador administrativo do esquema delituoso. Foiidentificado como destinatário de propina eoperador do esquema de lavagem do dinheiro nestasinvestigações, valendo-se para tanto de diversasempresas e de interpostas pessoas (laranjas) emsuas atividades, em especial suas esposa e filhae seu sócio.Os depoimentos dos colaboradores das empreiteirasANDRADE GUTIERREZ e CARIOCA ENGENHARIA, ClóvisPrimo, Alberto Quintaes, Roberto José Teixeira,Rodolfo Muntuano, Eduardo Backheuser e RoqueMeliande, foram uníssonos em afirmar que HudsonBraga cobrou e recebeu propina no valor de 1% dasobras realizadas pela Secretaria de Obras doGoverno do Estado do Rio de Janeiro, chamada pelopróprio investigado de “taxa de oxigênio” e cujaarrecadação cabia a Wagner Jordão e José OrlandoRabelo.[…]No entender do órgão ministerial, as provasobtidas durante a investigação, a maioria delasmediante decisões cautelares preparatóriasdeferidas por este Juízo, denotam a existência deum grande esquema de ocultação e lavagem dasvantagens espúrias, auferidas pelo investigadoquando ocupava o cargo de Subsecretário Estadualde Obras e cobrava das empreiteiras a tal “taxade oxigênio”. O órgão ministerial sustenta, eassim o faz com base em elementos obtidos dasquebras dos sigilos bancário, fiscal, telemáticoe telefônico, que Hudson Braga estaria lavando odinheiro amealhado com a cobrança de propina(“taxa de oxigênio”).

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Considero tais imputações gravíssimas, contudo,devo reconhecer que se encontram lastreadas emfortes elementos identificados ao longo dasinvestigações, os quais passo a analisar a fim deque não paire dúvida acerca da relevância dosmesmos.Foram identificados ao menos três esquemas delavagem de dinheiro, inclusive ainda emandamento, através dos quais o investigado Hudsoncomo adiante detalhados:1) Lavagem de dinheiro mediante prestação deserviços de consultoria, por meio de empresa defachada e empresas em sociedade com Luiz PauloReis:[…] Logo após deixar o Governo do Estado, oinvestigado Hudson Braga constituiu a empresa H.BRAGA CONSULTORIA EMPRESARIAL declarando comosede o seguinte endereço: Av. Paulo de Frontin,590, Sala 913, Edifício Plaza Business, Aterrado,Volta Redonda/RJ.Em diligência policial realizada naquele local,conforme o Relatório de Pesquisa nº 720/2016referido pelo MPF, não foi possível constatarqualquer sinal externo de seu funcionamentoatravés de placa de identificação das salascomerciais. Além disso, outra empresa da qualtambém é sócio, SULCON CONSTRUÇÕES MATERIAIS EEQUIPAMENTOS LTDA, encontra-se “localizada” namesma sala comercial onde funciona a H. BRAGA,sem qualquer identificação aparente.Apesar de recentemente constituída, e de suaprecária ou inexistente instalação física, a H.BRAGA Consultoria logrou faturar, num espaço detempo inferior a 30 dias, o valor superior a 2milhões de reais, por supostos serviços deconsultoria prestados à empresa Confedere SA.,[…].Em relação à empresa SULCON Construções Materiaise Equipamentos Ltda, apesar de ter sidoconstituída em 12 de dezembro de 1988, dela fazparte o investigado Hudson Braga apenas a partirde 2 de março de 2015, dividindo em 50% asociedade com Luiz Paulo Reis.O afastamento do sigilo fiscal identificou que aSULCON, que estava sem nenhuma movimentaçãofinanceira há anos; com o ingresso do investigadoHudson Braga subitamente teve um expressivoincremento de sua receita, mormente a partir deoutubro de 2015, como atestado pela a ReceitaFederal (fls. 872/895), com seu faturamentosaltando de R$0,00 nos anos anteriores para

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R$740.638,15 no ano de 2015. Estes dadosdespertam suspeitas quanto a irregularidades nasatividades da empresa SULCON.2) Lavagem de dinheiro mediante utilização de“laranjas” para abertura de empresas, também emsociedade com Luiz Paulo Reis:A empresa TERRAS DO PINHEIRAL EMPREENDIMENTOIMOBILIARIOS LTDA, constituída em 28 de março de2012, igualmente teria apresentado súbitoacréscimo de sua receita com a concomitante àentrada de Hudson Braga e Luiz Paulo Reis nasociedade. A filha de Hudson Braga, JéssicaMachado Braga, ingressou na sociedade em30/06/2015, sem que ela tivesse capacidadefinanceira para tal. Coincidentemente, nesseperíodo, Hudson Braga estaria abrindo empresas epassando a integrar diversas sociedadessuspeitas.[…] Convém destacar que, como a quebra de sigilobancário de Hudson Braga revelou, os R$100.000,00 utilizados por Jéssica Braga paraingressar na sociedade foram provenientes daconta do seu pai (fls. 909911). Tal fato indicairregularidade na transação comercial, levando acrer que a operação, na verdade, teria consistidoem expediente utilizado por Hudson Braga paralavar o dinheiro proveniente vantagem pecuniáriaindevida anteriormente recebida, utilizando suafilha (Jéssica Braga) como “laranja”.Das apurações acerca da empresa TERRAS DOPINHEIRAL chama especial atenção o fato de que,em curto espaço de seis meses, Jéssica Bragarecebeu dividendos no valor de R$ 695.000,00,vale dizer, investindo R$ 100.000,00 JÉSSICAobteve um lucro de 695 % do valor de seuinvestimento, situação que aponta para possívelocorrência de crime de lavagem de dinheiro.Todos esses fatos constituem indícios de queHudson Braga utilizar-se-ia dos nomes defamiliares como "laranjas", a fim de ocultar opatrimônio ilicitamente obtido através da chamada“taxa de oxigênio”. São coerentes, portanto, asconclusões levadas a cabo pelo MPF.3) Lavagem de dinheiro mediante aquisição de bensde luxo em nome de terceiros.Foram encontradas informações acerca de sinais deriqueza de Hudson Braga, aparentementeincompatíveis com a sua renda declarada, emespecial a propriedade de um helicóptero e de umalancha, conforme evidenciado na quebra de sigilodas comunicações eletrônicas e de dados

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telemáticos. Chama a atenção o fato de nenhumdesses bens constarem em sua declaração deimposto de renda, de acordo com informaçõescontidas no Dossiê Integrado encaminhado pelaReceita Federal, apesar de provas contundentes desua utilização como se dono fosse.[…]Há ainda outra situação, noticiada pelo MPF, amerecer clareamentos que por certo o investigadoHudson Braga terá interesse em oferecer. Refiro-me ao Relatório de Inteligência Financeira nº24093 do COAF, que informa possível atividadecriminosa na sequência de depósitos em dinheiroque a empresa TRANS-EXPERT VIGILÂNCIA ETRANSPORTE DE VALORES LTDA fez, entre 2013 e2015, na conta bancária de certa empresa(CREAÇÕES OPÇÃO) depósitos de mais deR$25.000.000,00 em dinheiro, fato que já é objetode procedimento judicial (Operação Farejador -processo nº 0507378-19.2016.4.02.5101).Durante a referida operação policial, foramapreendidos documentos que aparentam ter algumvínculo com a Organização Criminosa descritanestes autos e ora sob investigação, e vários sãoos vínculos entre uma possível atividadecriminosa através da empresa TRANS-EXPERT e oHudson Braga. Nos mencionados documentos hámenção à possível guarda de dinheiro, pelaempresa TRANS-EXPERT, do investigado HudsonBraga, o que leva o MPF a suspeitar, com totalcoerência, que “a empresa TRANS-EXPERT, por meiode seu gestor, DAVID, possui atividade suspeitaque aponta para uma possível utilização de seusserviços para a lavagem de dinheiro através dainternalização de dinheiro em espécie nas contasda empresa CREAÇÕES OPÇÃO LTDA, posteriormenterepassada à OBJETIVA GESTÃO E COMUNICAÇÃOESTRATÉGICA LTDA. de SÉRGIO CABRAL”. Nesta linhade raciocínio, por ora hipotética, mas que semostra minimamente coerente com os elementos deprova, valores atribuídos ao investigado HudsonBraga estariam sendo, por meio de operaçõesilícitas de lavagem de dinheiro, sendodirecionados para a empresa do investigado SérgioCabral (OBJETIVA).[…]A serem confirmadas essas situações suspeitas,que encontram fundamento mínimo nas provascarreadas a estes autos, também o investigadoHudson Braga estaria, em situação flagrante,operando para a lavagem e ocultação de ativos os

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quais, numa avaliação ainda preliminar, seriamfruto de práticas corruptas cometidas por amplaOrganização Criminosa.(grifos aditados)

26. Diante da gravidade concreta dos crimes praticados

e da necessidade de evitar a reiteração da prática

delitiva sistêmica no âmbito da organização criminosa,

cujos integrantes dispõem de meios para ocultar o

patrimônio obtido com o cometimento de crimes, foi

decretada a prisão preventiva do Paciente como garantia

da ordem pública e para assegurar a aplicação da lei

penal, resgistrando-se a impossibilidade de aplicação de

medidas cautelares alternativas (e-STJ fls. 112-113):

Pertinente, portanto, o requerimento ministerialquanto à determinação da medida extrema em facedesse requerido, uma vez que o mesmo teriaparticipado ativamente do esquema delituoso, pormeio do qual teria amealhado indevidamente grandequantia de dinheiro. Além disso, as investigaçõessugerem que as atividades empresariais desseinvestigado, que envolvem seus familiares(“laranjas”), afiguram-se incompatíveis com seupadrão socioeconômico anterior à constituição dassociedades, bem como apresentam acréscimopatrimonial suspeito, o que pode se relacionarcom atos de lavagem de dinheiro.Sua permanência em liberdade representa o efetivorisco de reiteração delituosa, seja pelas váriasoperações comerciais recentes e em andamento quesugerem práticas ilícitas de lavagem de dinheiroe ocultação de patrimônio, seja pela gravidadeconcreta que atribuo à sua participação naOrganização Criminosa descrita, a partir de umaapreciação ainda preliminar dos elementos deprova trazidos pelo MPF.Aplicam-se aqui, outrossim, as mesmas observaçõesque lancei a respeito do investigado SérgioCabral, em especial sobre a gravidade docomportamento deste investigado contra a ordempública, se confirmadas as suspeitas iniciais,posto que exercia à época o cargo de Secretáriode Estado.

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Não cabe falar em substituição da medida extremapor outras cautelares menos gravosas (art. 319,CPP), pois em se tratando, em princípio, deOrganização Criminosa, com a prática de váriosatos e contratos fraudulentos, que provavelmenteoculta registros úteis à investigação, somente asegregação imediata, aliada a outras medidas,poderia permitir a completa elucidação dos fatos.(grifos aditados).

27. A gravidade concreta da conduta do Paciente está,

nos mesmos moldes da decisão supra, admitida como

fundamento do v. Acórdão contra o qual se faz impetrado o

presente mandamus. De fato, aderindo à inteligência do

decreto de prisão cautelar, o TRF da 2ª Região bem

concluiu que a imposição da custódia cautelar se destina,

na espécie, à garantia da ordem pública e da aplicação da

Lei Penal, ante a gravidade concreta dos crimes imputados

ao paciente. Transcrevo (e-STJ fls.167, 184-185):

Já na primeira linha de análise dos ponderáveisargumentos trazidos pelos impetrantes, não sepode confundir: ausência de fundamentação dadecisão judicial com fundamentação da qual não secompartilha, coisas bastante diferentes e que nãoraras vezes a jurisprudência vem misturando.No primeiro caso a decisão é absolutamente vazia,limitando-se, na maioria das vezes, a repetirexatamente a letra da lei. No segundo caso, háfundamentos visivelmente expostos pelo juiz, maseles não são do agrado do desatendido peladecisão, ou não convergem com o de outro órgãojudicial.Somente no primeiro caso haveria "ausência defundamentação idônea" e "gritante e insofismávelnulidade absoluta", como aduzido em outro writ decoinvestigado. No segundo, o que cabe é revisãodos fundamentos pelo órgão revisor, análise ejulgamento sobre a improcedência ou procedênciados fundamentos adotados pelo juiz. No caso, adecisão tem fundamentação.[…]No caso concreto, quanto ao ponto, o que sepercebe é que, de fato, quando se analisam aspeças dos autos e a própria decisão atacada, é

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que não se trata, afinal, de propinas pagas afuncionários de escalões menores do serviçopúblico, apenas para se obter benesses menosimportantes, como a liberação de uma multa detrânsito por exemplo. Nem se está diante dedesvios de bens públicos do almoxarifado de umarepartição pública, como vassouras ou produtos delimpeza.Indicia-se com suficiência, verdadeira práticainsistente e sistemática de corrupção e desvio dedinheiro público tendo como cortina de fumaçalicitações a princípio regulares para realizaçãode vultosos projetos e obras. Sangria desenfreadade valores que iriam alimentar empresasparticulares e agentes públicos corruptos,executivos e ordenadores de altas alçadas nosetor público.E foi assim que a gravidade concreta do caso foiperceptível e fundamentada pelo Magistrado combase nas circunstâncias como teriam sidopraticados os fatos, mediante corrupção sistêmicana obtenção de contratos com empresas públicas,com dinheiro desviado de forma sorrateira,dissimulada e intrincada a pessoas quedesempenham funções de alta alçada na direção dasreferidas empresas públicas.Os fatos imputados ao paciente são, comofundamentado pelo Magistrado a quo, concretamentegraves, e não só porque se encontramclassificados em figuras típicas das leis penaisque cominam penas elevadas, mas porque ostentamlesividade social ímpar.Aponta-se que ele, HUDSON BRAGA, foi concorrentefundamental no desvio de verbas públicas definalidades sociais que poderiam ser atendidas emcampos como os da saúde, educação, segurançapública, saneamento, dentre outros, e cujacarência é perceptível a olhos nus em váriospontos da cidade, do Estado e do país.E não há dúvida de que a corrupção, o peculato, alavagem de dinheiro, os crimes por meio delicitações e as associações criminosas são, hoje,em determinadas circunstâncias com que sãopraticados, crimes até muito mais graves do queos de tráfico de drogas e crimes violentos contrao patrimônio individual de uns e outros.Nesse diapasão, não socorreria a defesa, aalegação de que a fundamentação seria genéricapor se dirigir igualmente ao coinvestigado SergioCabral, mas sim que isto tenha ocorrido porque osfatos teriam sido praticados necessariamente em

HC 383.336/RJ 15

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divisão de tarefas entre os diversosparticipantes, tendo o juiz mencionado outrospara contextualizar a questão.(grifos aditados)

28. Em verdade, as circunstâncias do fato, o cargo

ostentado pelo agente, os elevados valores movimentados e

a possibilidade da reiteração e do desaparecimento das

provas revelam, inquestionavelmente, a existência de

risco concreto para a ordem social, de forma a justificar

a prisão processual. Assim, uma vez apresentada

fundamentação concreta para a decretação da prisão

preventiva, evidenciada na prática de delitos por uma

rede de pessoas, na gravidade concreta da conduta do

Paciente e na facilidade de movimentação de valores, além

da possibilidade de persistência nos ilícitos - o que

inclui a lavagem de ativos -, não há que se falar em

ilegalidade a justificar a concessão da ordem de habeas

corpus presentemente postulada.

29. Não está configurada, portanto, qualquer

ilegalidade ou abusividade nas decisões proferidas na

origem. Com efeito, o que se verifica é que as teses

agitadas no presente writ não têm o condão de demover o

entendimento firmado nas instâncias ordinárias quanto à

necessidade de se manter a prisão preventiva em causa.

30. De outra parte, estando presentes os requisitos

para a decretação da prisão preventiva, não se afigura

cabível a aplicação das medidas alternativas à prisão,

consoante determina o art. 282, §6º, do Código de

Processo Penal1.

1Art. 282. As medidas cautelares previstas neste Título deverão ser

aplicadas observando-se a:

[...]

HC 383.336/RJ 16

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31. Ademais, cumpre observar que as condições pessoais

favoráveis relativas à primariedade, bons antecedentes,

ocupação lícita e residência fixa, não têm o condão de,

por si sós, garantir ao Paciente a revogação da prisão

preventiva se há nos autos elementos hábeis a recomendar

a manutenção da sua custódia cautelar - o que ocorre, in

casu.

- V -

32. Merece destaque o fato de que o Paciente Hudson

Braga não figura mais na condição de mero investigado. Em

seu desfavor foi oferecida denúncia pelo Ministério

Público Federal, lastreada em fartos elementos de

informação a sustentar a imputação da prática dos crimes

previstos nos arts. 317, § 1º, do CP – Fato 2; art. 1º,

§ 4º, da Lei n. 9.613/98 – Fato 15; art. 1º, § 4º, da Lei

n. 9.613/98 – Fato 16; art. 1º, § 4º, da Lei n. 9.613/98

– Fato 17; art. 1º, § 4º, da Lei n. 9.613/98 – Fato 18;

art. 1º, § 4º, da Lei n. 9.613/98 – Fato 19; e art. 2º, §

4º, II, da Lei n. 12.850/2013 – Fato 21 (e-STJ fls.209,

213-215):

No período compreendido entre os anos de 2008 e2011, por pelo menos 25 vezes, em razão (I) dotratado em número de ocasiões indeterminadas noRio de Janeiro entre 2008 e 2010 por WILSON CARLOS e HUDSON BRAGA com o executivo ALBERTO QUINTAES; (II) das 24 parcelas mensais deentregas em espécie realizadas por ALBERTOQUINTAES E RAFAEL CAMPELLO a WAGNER JORDÃO entre 2008 e 2011, os denunciados SÉRGIO CABRAL, WILSONCARLOS, HUDSON BRAGA e WAGNER JORDÃO, de modoconsciente e voluntário, solicitaram, aceitarampromessa e receberam vantagem indevida (calculadaem 1% do valor faturado relativo às contratações

§6º A prisão preventiva será determinada quando não for cabível a

sua substituição por outra medida cautelar (art. 319).

HC 383.336/RJ 17

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realizada - “taxa de oxigênio”) em razão doexercício da chefia do Poder Executivo do ESTADODO RIO DE JANEIRO e da atuação da Secretaria deEstado de Obras Públicas, ofertados por ação dosrepresentantes da empreiteira ANDRADE GUTIERREZ,praticando-se ou retardando-se atos de ofício,com infração de deveres funcionais, notadamenteem relação à licitação, contratação e execução,inclusive em regime de consórcio com outrasempresas, das obras de: urbanização do Complexode Manguinhos – PAC Favelas, construção do ArcoMetropolitano (Segmento C – Lote 01) e reforma doMaracanã para a Copa de 2014 (CorrupçãoPassiva/Art. 317, § 1º, do CP – FATO 02).[…]Consumados os delitos antecedentes de corrupção,os denunciados LUIZ PAULO REIS e HUDSON BRAGA,com auxílio de JOSÉ ORLANDO, entre 2013 e 2016,por intermédio de organização criminosa,ocultaram e dissimularam a propriedade de HUDSONBRAGA de uma lancha de nome Retcha, avaliada empelo menos R$ 150.000,00, registrada em nome deLUIZ PAULO REIS (Lavagem de Ativos/Art. 1º, § 4º,da Lei 9.613/98 – FATO 15).Consumados os delitos antecedentes de corrupção,HUDSON BRAGA, com anuência de LUIZ PAULO REIS e aparticipação de JOSÉ ORLANDO, por intermédio deorganização criminosa, entre outubro de 2015 ejulho de 2016, ocultou a origem, a natureza, adisposição, a movimentação e a propriedade de R$329.254,35, através de sua aplicação como receitasem origem comprovada na empresa SULCONCONSTRUÇÕES MATERIAIS E EQUIPAMENTOS LTDA, deresponsabilidade dos denunciados (Lavagem deAtivos/Art. 1º, § 4º, da Lei 9.613/98 – FATO 16).Consumados os delitos antecedentes de corrupção,HUDSON BRAGA e LUIZ PAULO REIS, com aparticipação de JOSÉ ORLANDO RABELO, porintermédio de organização criminosa, em 2015,ocultaram a origem, a natureza, a disposição, amovimentação e a propriedade de R$ 169.083,50,através de sua retirada como lucros e dividendossem origem comprovada da empresa R-2 POSTO DEABASTECIMENTO DE GÁS VEICULAR LTDA., deresponsabilidade dos denunciados (Lavagem deAtivos/Art. 1º, § 4º, da Lei 9.613/98 – FATO 17).Consumados os delitos antecedentes de corrupção,HUDSON BRAGA e LUIZ PAULO REIS, por intermédio deorganização criminosa, em 2016, ocultaram aorigem, a natureza, a disposição, a movimentaçãoe a propriedade de R$ 66.000,00, através de sua

HC 383.336/RJ 18

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aplicação, sem que se tenha origem comprovada, naintegralização em nome de terceira pessoa decotas da empresa BL POSTO DE ABASTECIMENTO DE GÁSVEICULAR LTDA., de responsabilidade do denunciadoLUIZ PAULO REIS (Lavagem de Ativos/Art. 1º, § 4º,da Lei 9.613/98 – FATO 18).Consumados os delitos antecedentes de corrupção,HUDSON BRAGA e LUIZ PAULO REIS, por intermédio deorganização criminosa, entre 2015 e 2016,ocultaram a origem, a natureza, a disposição, amovimentação e a propriedade de R$ 695.000,00,através de sua retirada em nome de terceirapessoa como lucros e dividendos sem origemcomprovada da empresa TERRAS DO PINHEIRALEMPREENDIMENTOS IMOBILIÁRIOS LTDA (Lavagem deAtivos/Art. 1º, § 4º, da Lei 9.613/98 – FATO 19).[…]Pelo menos entre 1º de janeiro de 2007 e 17 denovembro de 2016, SÉRGIO CABRAL, WILSON CARLOS,HUDSON BRAGA, CARLOS MIRANDA, CARLOS BEZERRA,WAGNER JORDÃO, JOSÉ ORLANDO, ADRIANA ANCELMO,PAULO FERNANDO, PEDRO RAMOS, CARLOS BORGES, LUIZIGAYARA e LUIZ PAULO REIS, além de outras pessoasimunes em razão de colaboração premiada e deterceiros a serem denunciados oportunamente ouainda não identificados, de modo consciente,voluntário, estável e em comunhão de vontades,promoveram, constituíram, financiaram eintegraram, pessoalmente, uma organizaçãocriminosa que tinha por finalidade a prática decrimes de corrupção ativa e passiva, fraude àslicitações e cartel em detrimento da ESTADO DORIO DE JANEIRO, bem como a lavagem dos recursosfinanceiros auferidos desses crimes(Quadrilha/Art. 288 do CP – Pertinência aOrganização Criminosa/Art. 2º, § 4º, II, da Lei12.850/2013 – FATO 21).

33. As investigações deram ensejo à ação Penal nº

0509503-57.2016.4.02.5101, cujo objeto são as práticas

delitivas de corrupção passiva, lavagem de dinheiro,

ocultação de patrimônio, quadrilha e organização

criminosa por parte dos réus Sérgio de Oliveira Cabral

Santos Filho, Wilson Carlos Cordeiro da Silva Carvalho,

Hudson Braga, Carlos Emanuel de Carvalho Miranda, Luiz

Carlos Bezerra, Wagner Jordão Garcia, Adriana de Lourdes

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Ancelmo, Pedro Ramos de Miranda, Paulo Fernando Magalhães

Pinto, José Orlando Rabelo, Luiz Paulo Reis, Carlos

Jardim Borges e Luiz Alexandre Igayara.

- VI -

34. Verifica-se, portanto, ser descabida a alegação da

defesa de que não há fundamentos concretos que

justifiquem a prisão do acusado. Estão presentes e

demonstrados na decisão questionada motivos suficientes

para a manutenção da prisão do Paciente, a fim de se

preservar a ordem pública e para assegurar a aplicação da

lei penal.

35. O poder econômico, a complexidade da atuação e o

grau de infiltração da organização criminosa em setores

do Estado não torna críveis o seu desmantelamento e a

interrupção das atividades criminosas após o período

descrito na denúncia. A necessidade de desarticulação

definitiva do esquema fraudulento constitui fundamento

suficiente para a manutenção da prisão cautelar do réu.

36. A gravidade concreta das condutas, caracterizada

pelo significativo valor objeto das operações de lavagem

de ativos após a consumação dos crimes de corrupção

antecedentes deve ser considerada para proteção da ordem

pública, mantendo-se a prisão preventiva do acusado

Hudson Braga.

37. Nesse contexto, esse Superior Tribunal de Justiça

tem admitido a prisão preventiva para garantia da ordem

pública, considerando o peculiar modo de atuação do

esquema criminoso organizado e a necessidade de

interromper a reiteração na prática de delitos. Essa

HC 383.336/RJ 20

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Corte Superior também considera a avaliação da gravidade

concreta dos delitos, de excepcional repercussão danosa

ao meio social:

RECURSO EM HABEAS CORPUS. PECULATO, ORGANIZAÇÃOCRIMINOSA E LAVAGEM DE DINHEIRO. PRISÃOPREVENTIVA. GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA E DA ORDEMECONÔMICA. CUSTÓDIA CAUTELAR DEVIDAMENTEJUSTIFICADA. MANIFESTO CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃOEVIDENCIADO. RECURSO NÃO PROVIDO.1. A gravidade concreta dos delitos em tesecometidos e a complexidade da organizaçãocriminosa da qual o recorrente é supostamenteintegrante - bem estruturada, com ramificações nafacção criminosa denominada Comando Vermelho eque, em princípio, envolveu a administraçãopública de municípios da Região dos Lagos doEstado do Rio de Janeiro e estava em plenofuncionamento - revelam que a constrição cautelarse mostra medida adequada e necessária parafragilizar a própria estrutura organizacional daqual fazia parte e, dessa forma, cessar a práticade novas infrações penais.2. Na dicção do Supremo Tribunal Federal, "Acustódia cautelar visando à garantia da ordempública legitima-se quando evidenciada anecessidade de se interromper ou diminuir aatuação de integrantes de organização criminosa.Precedentes." (RHC n. 122.182/SP, Rel. MinistroLuiz Fux, 1ª T., DJe 15/9/2014).3. A custódia do recorrente também se faznecessária para garantir-se a ordem econômica,tendo em vista a magnitude dos valores oriundosda complexa organização criminosa que foramocultados e dissimulados, versando a espéciesobre um sofisticado esquema criminoso voltado àreciclagem de dinheiro, por meio de vultosaquantia de numerário movimentado e de elevadoslucros auferidos por meio, inclusive, de desviosde recursos públicos.4. A manutenção da atuação de grupos organizadoscomo o dos autos interfere, sobremaneira, nodesenvolvimento econômico do País, seja em termosmacroeconômicos, prejudicando as políticasestabelecidas e a estabilidade do mercado, sejaem termos microeconômicos, em que a atuaçãocriminosa dá azo a situações de concorrênciadesleal e de perturbação na circulação de bens nomercado.

HC 383.336/RJ 21

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5. Em razão das especificidades do caso concreto,das evidências de prática de crimes contra aAdministração Pública, de lavagem de dinheiro ede organização criminosa - e sem olvidar que acustódia preventiva deve ser imposta somente comoultima ratio -, fica evidenciado que o recurso àcautela extrema se mostra a única medida apta aafastar o periculum libertatis e, portanto,desaconselhada se torna a imposição de quaisquerdas medidas cautelares alternativas à prisão.6. Recurso em habeas corpus não provido.(RHC 69.351/RJ, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTICRUZ, SEXTA TURMA, julgado em 20/09/2016, DJe04/10/2016).(grifos aditados)

38. Conforme destacado no pedido de prisão, é preciso

considerar terem sido constatadas práticas insistentes e

sistemáticas de corrupção e lavagem de dinheiro do

patrimônio ilícito, as quais perduram até o momento. A

única forma de interrupção destes crimes de lavagem de

dinheiro e de desmantelar a organização criminosa em

comento é a manutenção da prisão do P aciente .

39. Considerado o modo de atuação do Acusado/Paciente e

dos demais membros da organização criminosa, voltada para

escamotear os negócios espúrios, é possível afirmar a

probabilidade de que, caso sejam soltos, venham eliminar

provas da prática delitiva e se articular para encobrir

os delitos praticados, dificultando as apurações em

curso.

40. Em suma, demonstrados os pressupostos e os motivos

autorizadores da custódia cautelar, elencados no art. 312

do CPP, não se vislumbra constrangimento ilegal a ser

reparado por esse Superior Tribunal de Justiça. E assim

porquanto o risco concreto de reiteração delitiva,

associado aos indícios suficientes de autoria e à

materialidade dos delitos, além da gravidade concreta da

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conduta e periculosidade do agente, conferem legitimidade

inconteste à prisão processual, ora guerreada por meio do

presente mandamus.

- VII -

41. Diante do exposto, o Ministério Público Federal

manifesta-se, preliminarmente, pelo não conhecimento do

writ. No mérito, opina pela denegação da ordem.

Brasília, 9 de fevereiro de 2017

ROGÉRIO DE PAIVA NAVARROSubprocurador-Geral da República.

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