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Mortalidade infantil e alguns indicadores demográficos da população indígena do Distrito Sanitário Especial Indígena do Leste de Roraima, Brasil, 2002 a 2004 por Ipojucan Carneiro da Costa Dissertação apresentada à Pós-graduação em Saúde Pública, como requisito parcial para obtenção do Título de Mestre em Ciências na área de Saúde Pública. Profª. Dra. Maria do Carmo Leal - (Orientadora) Prof. Dr. Ricardo Ventura Santos - (Segundo Orientador) Luciene G. de Souza - (Auxiliar de Orientação) Rio de Janeiro 2006 Ministério da Saúde Fundação Oswaldo Cruz Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca

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Mortalidade infantil e alguns indicadores demográficos da população

indígena do Distrito Sanitário Especial Indígena do Leste de Roraima,

Brasil, 2002 a 2004

por

Ipojucan Carneiro da Costa

Dissertação apresentada à Pós-graduação em Saúde

Pública, como requisito parcial para obtenção do

Título de Mestre em Ciências na área de Saúde

Pública.

Profª. Dra. Maria do Carmo Leal - (Orientadora)

Prof. Dr. Ricardo Ventura Santos - (Segundo Orientador)

Luciene G. de Souza - (Auxiliar de Orientação)

Rio de Janeiro 2006

Ministério da Saúde

Fundação Oswaldo Cruz

Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca

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Mortalidade infantil e alguns indicadores demográficos da população

indígena do Distrito Sanitário Especial Indígena do Leste de Roraima,

Brasil, 2002 a 2004

por

Ipojucan Carneiro da Costa

Rio de Janeiro

2006

Ministério da Saúde

Fundação Oswaldo Cruz

Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca

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Dedicatória

A Edjane, o amor que me afaga e me dá

tranqüilidade.

Para Gabriela, minha filha, um encanto a

mais na minha vida.

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Agradecimentos

Este trabalho só foi possível, porque há por trás inúmeros colaboradores, entre

os quais estão os profissionais de saúde do serviço de epidemiologia da Coordenação de

Saúde Indígena do Conselho Indígena de Roraima sob a direção do Dr. Paulo Daniel,

que me atenderam prontamente com os dados de saúde e me incentivaram a realizar esta

dissertação.

Na coordenação Regional da FUNASA/CORE-RR, agradeço a servidora

Francesca Lopes dos Santos, por ajudar-me a entender a Codificação Internacional de

Doenças-CID 10. A Edelmo, também servidor da FUNASA, por mostrar-me as

dificuldades operacionais do Sistema de Informação da Atenção a Saúde Indígena -

SIASI.

As professoras Inês Mattos e Silvana Granado, que inicialmente me deram muita

força e entenderam minhas dificuldades durante esta etapa de minha formação.

Aos meus orientadores, Dr. Ricardo Ventura Santos e Dra. Maria do Carmo

Leal, que acreditaram na minha capacidade e conduziram-me ao caminho de novas

descobertas durante a fase de formatação desta dissertação.

À Luciene G. de Souza, aluna do Doutorado, por incentivar-me e acompanhar-

me durante todo o período de confecção desta dissertação, mostrando com sua

experiência os caminhos mais apropriados.

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Epígrafe

“Saber o que sabe e o que não sabe, são

características dos que sabem”.

Confúcio

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Resumo:

O objetivo deste estudo é descrever o perfil de mortalidade e outros indicadores

demográficos, dando maior enfoque à descrição da mortalidade infantil e seus

componentes neonatal e pós-neonatal, de uma população indígena atendida pelo Distrito

Sanitário Especial Indígena do Leste do Estado de Roraima. A população é estimada em

31.000 habitantes, com cerca de seis grupos étnicos (Macuxi, Wapixana, Taurepang,

Ingaricó, Patamona, Wai-Wai). As fontes de dados utilizadas são oriundas dos boletins

de nascimento, óbito e de estimativas populacionais no período compreendido de 2002 a

2004. A população apresentou uma composição etária predominantemente de jovens,

onde 52 por cento da população tinham menos de 15 anos de idade. Observaram-se

taxas brutas de natalidade e de mortalidade de 42,1 nascimentos e 5,2 óbitos por mil

habitantes. A mortalidade infantil foi 50,0 por mil nascidos vivos. Foi observado que 47

e 42 por cento do total de óbitos em menores de 1 ano estavam concentrados nos

componentes neonatal precoce e pós-neonatal, respectivamente. A taxa de mortalidade

perinatal observada foi de 38,9 crianças por mil nascimentos. A primeira causa de óbito

registrada é relacionada a algumas afecções originadas no período perinatal seguidas

das doenças respiratórias. Ressalta-se ser de fundamental importância o

desenvolvimento de estudos direcionados à análise de dados sobre eventos vitais, com

enfoque sobre os principais elementos da dinâmica populacional indígena no sentido de

viabilizar planejamentos mais adequados às ações de saúde.

Descritores: Demografia; Mortalidade Infantil; Mortalidade Perinatal; Natalidade;

Serviços de Saúde; Índios Sul-Americanos.

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Abstract: This thesis analyses demographic indicators, emphasizing mortality (and infant

mortality in particular) of the indigenous population of the Distrito Sanitário Especial

Indígena do Leste do Estado de Roraima (East of Roraima - Special Health Indian

District), Brazilian Amazon, from 2002 to 2004. The total size of the indigenous

population is close to 31,000, distributed in six ethnic groups (Macuxi, Wapixana,

Taurepang, Ingaricó, Patamona, Wai-Wai). The data derive from birth and death records

kept by the health services. The population is mostly comprised by young individuals;

52% are below age 15. Crude birth and death rates were, respectively, 42,1 and 5,2 per

1,000 in the time period analyzed. Infant mortality was very high (50,0 per 1,000). It

was observed that 47% and 42% of the deaths in children below age 1 took place in the

first week of life or in the first four weeks, respectively. The perinatal death rate was

38,9 per 1,000, and deaths were mostly due to perinatal causes and respiratory diseases.

It is argued that more research are needed to better understand the population dynamics

of the indigenous peoples who live in the Roraima State. Health and demographic data

are important to better plan the health services.

Keywords: Demography; Infant mortality; Perinatal mortality; Fertility; Health services;

South American Indians.

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ÍNDICE

Dedicatória......................................................................................................................... i Agradecimentos ................................................................................................................ ii Epígrafe ........................................................................................................................... iii Resumo ............................................................................................................................ iv Abstract............................................................................................................................. v Lista de Quadros............................................................................................................. vii Lista de Tabelas ............................................................................................................. viii Lista de Figuras ............................................................................................................... ix Lista de Siglas................................................................................................................... x Apresentação ................................................................................................................... xi Capítulo 1 ......................................................................................................................... 1

1.1 - Relação entre demografia e saúde pública ........................................................... 2 1.2 - Demografia dos povos indígenas no Brasil.......................................................... 3

Capítulo 2 ....................................................................................................................... 12 2.1 - Contexto político da saúde indígena no Brasil................................................... 13

2.1.1 - Política de Atenção à Saúde dos Povos Indígenas ...................................... 13 2.1.2 - Situação de saúde ........................................................................................ 18 2.1.3 - Organização dos Distritos Sanitários Especiais Indígenas no Brasil .......... 20 2.1.4 - Organização do Distrito Sanitário Especial Indígena do Leste do Estado de Roraima .................................................................................................................. 21 2.1.5 - Sistema de Informação ................................................................................ 26

Capítulo 3 ....................................................................................................................... 30 3.1 - Histórico de contato da população do DSEI-Leste de Roraima......................... 31 3.1.1 - População e Método........................................................................................ 36

3.1.2 - Questão Ética....................................................................................................39 Capítulo 4 ....................................................................................................................... 40

4.1 - Resultados .......................................................................................................... 41 4.1.1 - Composição etária ....................................................................................... 41 4.1.2 - Natalidade.................................................................................................... 41 4.1.3 - Fecundidade ................................................................................................ 43 4.1.4 - Mortalidade ................................................................................................. 45

Capítulo 5 ....................................................................................................................... 51 5.1- Considerações gerais ........................................................................................... 52

Referências Bibliográficas.............................................................................................. 58 Documentos Consultados................................................................................................64 Anexos............................................................................................................................ 65

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Lista de Quadros

Quadro 1-Terras indígenas, grupo indígena e município, DSEI

Leste de Roraima, 2006. ..........................................................................................33

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Lista de Tabelas Tabela 1 - População absoluta e relativa por grupos de idade, DSEI-Leste, RR, Brasil,

2004. ....................................................................................................................... 41

Tabela 2 - Taxa bruta de natalidade (TBN) por mil habitantes no DSEI - Leste, RR,

Brasil, 2002-2004. .................................................................................................. 42

Tabela 3 - Razão de sexo ao nascer (por 100 mulheres), DSEI-Leste, RR, Brasil, 2002-

2004. ....................................................................................................................... 42

Tabela 4 – Característica dos nascidos vivos por idade reprodutiva da mãe, tipo de

parto, da gestação, peso ao nascer e local de ocorrência do nascimento, DSEI-

Leste, Roraima, Brasil, 2002-2004......................................................................... 43

Tabela 5 - Taxa de fecundidade específica por grupo de idade, por mil mulheres, DSEI-

Leste do Estado de Roraima, Brasil, 2004.............................................................. 44

Tabela 6 - Freqüência absoluta e relativa de óbito por faixa etária e sexo, DSEI - Leste,

RR, Brasil, 2002-2004. ........................................................................................... 45

Tabela 7 - Taxas brutas de mortalidade (TBM), por mil habitantes, DSEI-Leste,RR,

Brasil, 2002-2004. .................................................................................................. 46

Tabela 8 - Distribuição absoluta e relativa dos óbitos, de acordo com a faixa de idade,

no DSEI-Leste de Roraima, Brasil, 2002-2004...................................................... 46

Tabela 9 - Taxa de mortalidade infantil no DSEI-Leste, RR, Brasil, 2002 a 2004. ....... 47

Tabela 10 - Mortalidade específica por idade, por mil habitantes, DSEI - Leste, RR,

Brasil, no período de 2002-2004. ........................................................................... 48

Tabela 11- Mortalidade infantil no DSEI-Leste de Roraima, Brasil, 2002-2004. ......... 48

Tabela 12 - Óbitos registrados e mortalidade proporcional segundo causa agrupadas

pelos Capítulos da CID (10º revisão), em menores de 1 ano de idade por

componentes neonatais, DSEI-Leste-RR, Brasil, 2002 a 2004. ............................. 49

Tabela 13 - Proporção de óbitos em menores de 1 ano por local de ocorrência no DSEI-

Leste, RR, Brasil, 2002-2004. ................................................................................ 50

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Lista de Figuras Figura 1- Distritos Sanitários Especiais Indígenas ......................................................... 16

Figura 2 - Organização do DSEI e Modelo assistencial................................................. 21

Figura 3- Distrito Sanitário Indígena do Leste de Roraima - DSL: distribuição

geográfica por pólo-base e região........................................................................... 25

Figura 4 - Fluxo de informação no DSEI-Leste ............................................................. 29

Figura 5 - Situação Fundiária, DSEI Leste, Roraima, 2006. .......................................... 32

Figura 6 - Taxa específica de fecundidade no DSEI-Leste RR, Brasil, 2004 ................ 44

Figura 7 - Curva de mortalidade proporcional no DSEI-Leste, RR, Brasil, 2002-2004. 47

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Lista de Siglas CASAI Casa de Saúde Indígena

CID-10 Classificação Internacional das Doenças - 10.ª Revisão

CIR Conselho Indígena de Roraima

CISI Comissão intersetorial de Saúde Indígena

CIS Comissão intersetorial de Saúde

CNS Conselho Nacional de Saúde

CNSPI Conferência Nacional de Proteção à Saúde dos Povos Indígenas

DESAI Departamento de Saúde Indígena

DN Declaração de Nascimento

DO Declaração de óbito

DSEI Distrito Sanitário Especial Indígena

DSEI-Leste Distrito Sanitário Especial Indígena do Leste de Roraima

DSY Distrito Sanitário Yanomami

EVS Equipe Volante de Saúde

FUNAI Fundação Nacional do Índio

FUNASA Fundação Nacional de Saúde

IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística

ISA Instituto Socioambiental

MEVA Missão Evangélica

MS Ministério da Saúde

MSF Médicos Sem Fronteiras

OMS Organização Mundial de Saúde

ONG Organização não Governamental

OPAS Organização Pan-Americana de Saúde

PIX Parque Indígena do Xingu

SAS Secretaria de Atenção à Saúde

SIASI Sistema de Informação da Atenção à Saúde Indígena

SIM Sistema de Informação de Mortalidade

SINAN Sistema de Informação de Agravos e Notificação

SINASC Sistema de Informação sobre Nascidos Vivos

SPI Serviço de Proteção ao Índio

SUS Sistema Único de Saúde

SVS Secretaria de Vigilância em Saúde

TRO Terapia de Reidratação Oral

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Apresentação

Este estudo apresenta uma análise de indicadores demográficos e de saúde no

âmbito do Distrito Sanitário Especial Indígena do Leste do Estado de Roraima no

período compreendido entre 2002 a 2004.

No período de 2000 a 2004 atuei como coordenador regional da Fundação

Nacional de Saúde – FUNASA, no Estado de Roraima. Enquanto responsável pela

execução do Subsistema de Atenção à Saúde dos povos indígenas, estive inserido no

processo de implantação e estruturação deste distrito sanitário. Compreender a dinâmica

desse processo é algo muito complexo, particularmente sob o ponto de vista

operacional, geográfico e cultural na perspectiva de sua consolidação como sistema

diferenciado. A situação de saúde dos povos indígenas na área de abrangência do

distrito sanitário em questão é ainda muito precária. Vale lembrar que este estudo não

procura fazer comparação com o período anterior à implementação do novo modelo de

atenção, sobretudo por não existirem dados sistematizados para esta população que nos

permitam conhecer a dinâmica dos eventos vitais anteriormente. Embora sejam

evidentes os avanços obtidos na organização da rede de serviço voltada a estas

populações, os resultados aqui observados demonstram uma fragilidade do sistema de

informação, o que chega a comprometer o funcionamento do modelo de atenção com

repercussões no planejamento, execução e avaliação.

O objetivo deste estudo é descrever os principais indicadores demográficos

(natalidade, fecundidade e mortalidade). O estudo dará enfoque maior à descrição da

mortalidade infantil e seus componentes neonatal e pós-neonatal.

O estudo desenvolvido nesta dissertação abrange o Distrito Sanitário Especial

Indígena do Leste do Estado de Roraima, com uma população estimada em 31.000

habitantes e cerca de seis grupos étnicos distribuídos ao norte, nordeste e sul do Estado.

As fontes de dados utilizadas são oriundas dos boletins de nascimento, óbito e de

estimativas populacionais do Distrito Sanitário Especial Indígena do Leste do Estado de

Roraima (DSEI-Leste).

Este trabalho está estruturado em cinco capítulos, a saber: o primeiro capítulo

apresenta uma revisão da literatura sobre a relação entre demografia e saúde pública, e

alguns aspectos da demografia dos povos indígenas no Brasil; o segundo descreve o

contexto político da saúde indígena no Brasil, tais como: política nacional e regional de

atenção à saúde indígena, situação de saúde da população indígena no país e sistema de

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informação; o terceiro traça um breve histórico de contato da população do distrito

sanitário do leste de Roraima, a população atual e a metodologia utilizada; o quarto

capítulo descreve os resultados encontrados; e por último são discutidos os principais

resultados.

Por fim, é de fundamental importância o desenvolvimento de estudos

direcionados à análise de dados sobre eventos vitais, com enfoque sobre os principais

elementos da dinâmica populacional indígena no sentido de viabilizar planejamentos

mais adequados às ações de saúde.

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Capítulo 1

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1.1 - Relação entre demografia e saúde pública

Historicamente, o Brasil do período colonial até um período recente não

realizou uma política populacional. A estratégia sempre foi de explorar, ocupar e povoar

o território nacional, com finalidades econômicas e político-militares. Tal procedimento

determinou como conseqüência a configuração demográfica da atual população do país

(Camargo, 1991).

A década de 50 representou para os estudos da demografia científica uma

renovação, que diferente dos estudos anteriores, foi baseada no acúmulo de dados de

estatísticas vitais produzidas nas modernas sociedades urbanas industriais, que

evidenciou a necessidade de estudos mais profundos na relação entre população e

sociedade nos países desenvolvidos e subdesenvolvidos. A preocupação maior nessa

época estava no papel do crescimento populacional como limitador do desenvolvimento

econômico. Surge então a necessidade de sistematizar de forma científica os dados

demográficos como forma de auxiliar nas políticas de planejamento voltado ao controle

do crescimento populacional. A produção científica nessa época estava intimamente

vinculada à política controlista ou Biopoder vigilante do estado (Patarra, 1991).

Hauser & Duncan (1959) dão uma abrangência maior ao estudo da demografia,

desvinculando-a da necessidade de atender o estado para constituir resultados que

servissem de base para orientar políticas públicas mais adequadas. Nesse sentido, mais

do que estudar o tamanho, a distribuição e composição da população o novo enfoque

deve dar conta de descrever variáveis que determinam a qualidade de vida de uma dada

população como: saúde, capacidade mental e nível de qualificação.

As condições de saúde pública de um país sofrem influência direta do estágio de

desenvolvimento econômico e social em que se encontra, podendo ser determinada pela

dinâmica populacional e as alterações nos níveis dos principais componentes

demográficos tais como: natalidade, mortalidade e migrações.

A demografia é, portanto elemento fundamental para o planejamento de serviço

de saúde, pois utilizam indicadores demográficos que permitem analisar o estado de

saúde de uma dada população, com objetivos claros de auxiliar nas políticas públicas

(Yunes, 1991).

Os indicadores que o autor acima se refere são representados pelos coeficientes

de mortalidade geral, de mortalidade proporcional, mortalidade por idade e sexo,

esperança de vida, além dos coeficientes específicos de mortalidade infantil e seus

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componentes neonatais. Uma análise sobre esses indicadores permitirá diagnosticar e

reorientar as políticas de saúde.

Outra contribuição relevante da demografia à saúde pública é fornecer

indicadores de proporção para adequação de número necessário de leitos hospitalares,

de equipamentos de diagnóstico, número de habitante por profissionais de saúde,

proporção da população coberta pelo sistema de saneamento básico entre outros.

A demografia dos povos indígenas no Brasil, embora tenha sido explorada por

diversos autores, ainda carece de informação sobre os diversos elementos da dinâmica

demográfica. A diversidade cultural dos grupos étnicos existentes é fator que dificulta o

conhecimento da demografia desses povos. O Instituto Socioambiental – ISA estima em

350 mil a população indígena no país, enquanto o Instituto Brasileiro de Geografia e

Estatística - IBGE, no último censo (2000) estimou em 734 mil pessoas que se

autodeclararam indígenas. Esse contingente populacional com diferentes históricos de

contato e distribuídos por quase todo o país forma uma complexa estrutura social,

política, econômica e cultural.

Pagliaro et al. (2005a), enfatiza a dificuldade de se trabalhar a demografia dos

povos indígenas a partir de dados existentes, já que não há série histórica documentada

de nascimentos, óbitos e eventos de migração para a quase totalidade dos grupos

estudados. Soma-se a estes barreiras culturais intrínsecas presentes em cada grupo

étnico com restrição a falar de morte, fecundidade entre outros. Em síntese as fontes de

informação apresentam uma precariedade com relação à qualidade e quantidade dos

dados produzidos, que dificulta a interpretação de eventos demográficos nessas

populações.

1.2 - Demografia dos povos indígenas no Brasil

Segundo Azevedo (2000) a população indígena do Brasil foi estimada com base

em diversas fontes para o início do século XVI, com cifras que variam de 2 a 4 milhões

de pessoas distribuídas por mais de 1000 grupos étnicos. Já Ribeiro (1957) estimou que

a população indígena houvesse decrescido de 1 milhão para cerca de 200 mil pessoas

nas primeiras cinco décadas do século XX.

Como amplamente divulgado, a cada contato sofrido pelas populações

indígenas, em especial da Amazônia, tem resultado em grandes perdas de população

decorrentes de epidemias, ruptura social, disputas internas e resistência à invasão de seu

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território. O produto dessa ação foi em muitos casos responsável pelo processo de

extinção de muitos grupos étnicos (Ribeiro, 1956).

Muitos são os trabalhos que relatam as experiências de contatos dos povos

indígenas no Brasil e na América, assim como suas conseqüências para sobrevivência

desses povos. No entanto, a carência de dados demográficos é patente para a maioria

das populações indígenas, a exceção de poucos estudos desenvolvidos em grupos

específicos de determinada área geográfica do país. Uma das principais razões pode

estar na grande diversidade social, política e cultural e o tempo demandado para este

tipo de estudo (Santos & Coimbra Jr., 2003).

Ainda de acordo com Santos & Coimbra Jr., (2003), a contribuição desses

estudos trouxe vitalidade ao universo da pesquisa demográfica em populações indígenas

com resultados importantes para o conhecimento da dinâmica populacional em diversos

grupos étnicos nas últimas décadas, o que tem propiciado o desenvolvimento de

projetos intersetoriais no sentido de melhorar as condições de saúde, educação e de

alimentação.

Pagliaro et al. (2005a) apresentam alguns estudos que enfocam as conseqüências

do impacto do contato na organização social das sociedades indígenas, particularmente

entre grupos tupis. Entre os quais destacamos o estudo de Charles Wagley (1973) que

pela primeira vez relacionou mudanças sociais ocorridas na população dos Tapirapé

advindas do contato com frentes expansionistas. Wagley (1973) menciona que o

tamanho da população depende da influência exercida por instituições sociais e valores

culturais adquiridos após contatos com frentes expansionistas. E que padrões culturais

próprio, como por exemplo: o conhecimento ou não de práticas de restrição de

nascimentos podem determinar se a população crescerá. Os Tapirapé neste estudo

tinham o conhecimento de prática de aborto, o que contribuiu decisivamente para anular

o crescimento diante das altas taxas de mortalidade que quase os levou à extinção

durante o período de contato com a sociedade nacional.

No final da década de 80, Gomes (1988) falando do futuro dos índios assinala

que é nítido o crescimento da população indígena, depois de um longo período de

declínio que começou com o Brasil colônia. A contribuição da medicina e algumas

ações de prevenção podem explicar esse crescimento em parte, uma vez que, outros

grupos sobreviveram sem essa assistência como os Guató do alto rio Paraguai, entre

outros. O autor relaciona três possíveis fenômenos que estariam envolvidos nesse

processo: aquisição de imunidade para grande parte de doenças trazidas do velho

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mundo; o controle da maioria das epidemias no país, eliminando consideravelmente o

risco de manutenção de certos agravos; e por último com caráter mais especulativo, ou

seja, o de que o crescimento estaria ocorrendo em todos os continentes, fruto de um

“ rearranjo de valores culturais da humanidade” .

Black (1994) afirma que a razão possível do crescimento de algumas populações

indígenas está estreitamente ligada a uma combinação de genes que permite essas

populações resistirem aos ataques de doenças infecciosas. O autor cita como exemplo os

Kaiapó, que apresentam uma diversidade genética em decorrência da miscigenação

entre os grupos indígenas da região.

Outros autores como Flowers (1994) assinalam que alguns grupos de populações

indígenas têm crescido em razão da combinação de alta fecundidade com baixa ou

moderada mortalidade.

O Instituto Socioambiental (ISA), estima que a população indígena seja

constituída por 216 povos indígenas distribuídos por todo o país. Próximo de 70% dos

contingentes populacionais é representado por pequenas sociedades constituídas por

algumas centenas a pouco mais de mil habitantes com diferentes graus de interação com

a sociedade nacional. De acordo com Franchetto (2000), o Brasil no continente sul-

americano concentra uma diversidade de línguas (180) faladas, das quais a grande

maioria está na região amazônica. A autora chama atenção também que o país tem a

menor densidade populacional por línguas faladas.

Além de estudos de caso, conduzidos em grupos específicos da Amazônia que

privilegiam a dinâmica populacional, é importante salientar que a partir de 1991, a

população indígena passou a ser uma categoria inclusa na variável cor ou raça do censo

nacional conduzido pelo IBGE. No entanto, este censo, na avaliação de alguns autores,

não conseguiu captar grande parte da população indígena do país, uma vez que, somente

foram recenseados os índios que habitavam próximos aos postos da Fundação Nacional

do Índio - FUNAI e missões religiosas, deixando de fora uma parcela expressiva de

índios com pouco contato (Pagliaro et al., 2005a).

O censo de 2000 foi muito mais abrangente ao atingir a maioria dos contingentes

populacionais aldeados, da zona rural e urbano. Além disso, as informações deste censo

permitiram traçar alguns aspectos sócio-demográficos das populações indígenas em

todas as regiões do país (IBGE, 2005). A estimativa do IBGE no Censo de 2000 para

população indígena foi de 734 mil habitantes, o que corresponde 0,4 por cento da

população total do país. O crescimento populacional indígena verificado nas últimas

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décadas tem causado surpresa a grande maioria de estudiosos e antropólogos da cultura

indígena. Esse crescimento representa cerca de 11 por cento ao ano. Enquanto, para o

mesmo período a população total do país cresceu apenas 1,6 por cento ao ano. Foi o

maior crescimento verificado considerando todas as categorias de cor e raça levantadas

pelo censo. O aumento da população em números absolutos entre censos foi de 440 mil

pessoas. A população indígena residente nas zonas urbanas foi a grande responsável

pelo crescimento observado (IBGE, 2005).

Em 1999, a FUNASA como órgão gestor da saúde indígena implantou o Sistema

de Informação de Atenção à Saúde Indígena (SIASI) como forma de consolidar dados

demográficos, epidemiológicos e de serviços. A FUNASA atua sobre uma base

populacional que abrange apenas 51 por cento do contingente registrada no censo de

2000. O Sistema de Informação de Atenção à Saúde Indígena (SIASI) cadastrou no ano

de 2002 aproximadamente 374 mil pessoas. Essa população diz respeito à somente

aqueles grupos que estão sob a administração do distrito sanitário especial indígena -

DSEI, portanto não contemplando a população desaldeada e/ou vivendo em núcleos

urbanos (FUNASA, 2000).

A diferença entre a estimativa do censo e a população registrada no SIASI

decorre também da metodologia utilizada pelo IBGE, que considerou como indígena

toda aquela pessoa que se autodeclarou indígena sem que fosse necessário o

reconhecimento oficial do órgão indigenista e/ou de ser referendado por outros grupos

indígenas (IBGE, 2005). Além disso, há que se considerar que nas últimas décadas o

movimento indígena tem alcançado vitórias importantes, quer sejam na demarcação de

terras indígenas, revalorização cultural, acesso a políticas públicas diferenciadas, tais

como educação e saúde, que tem estimulado a auto-identificação e a procura por direitos

já conquistados (Garnelo et al., 2003).

O aprimoramento das informações geradas por estes instrumentos de coleta de

dados é de grande valor para o conhecimento da demografia dos povos indígenas.

Atualmente os níveis de análise gerados por estas fontes ainda estão muito aquém do

desejado (Pagliaro et al., 2005a).

Azevedo (2000) levanta algumas dúvidas a respeito do que realmente está

exercendo influência sobre esse crescimento e quais componentes demográficos

estariam envolvidos. Além disso, a autora menciona como fator de dificuldade a

multiplicidade de experiências demográficas dos diversos grupos étnicos do país. Nesse

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sentido, há um campo aberto para as pesquisas demográficas explicarem o fenômeno

responsável por este crescimento.

Outra questão que deve ser priorizada nos estudos de demografia indígena é se

esse crescimento elevado é fruto da queda da mortalidade, da melhoria do atendimento à

saúde, ou está se dando de forma consciente e intencional, ou seja, esses povos estariam

agindo no sentido de recuperar a população que foi perdida após os diversos contatos

com a sociedade nacional. Esse fato é corroborado por Pellegrini (comunicação pessoal)

de que entre os Yanomami o crescimento populacional ocorre de forma intencional e é

muito estimulado por lideranças locais.

Azevedo & Ricardo (2002) apontam algumas possibilidades que justificam esse

crescimento, tais como: crescimento demográfico real, aumento da população indígena

vivendo nas cidades, sobre-enumeração de indígenas (relacionada à mobilidade de

determinados grupos étnicos) e surgimento de pessoas se identificando como indígenas.

Flowers (1994) alerta para os benefícios que traz o crescimento das populações

indígenas, mas também os possíveis desafios a serem enfrentados como: a escassez de

recursos naturais, quebra da estrutura social e conseqüentemente conflitos intergerações.

Algumas iniciativas têm contribuído para o conhecimento mais aprofundado

sobre a demografia dos povos indígenas e estimativas populacionais. Por exemplo, o

censo realizado com as populações indígenas do Rio Negro em 1992 com objetivo

específico de constituir-se em instrumento de apoio a demarcação das terras do alto Rio

Negro, permitiram também conhecer melhor a dinâmica demográfica dessa população

(Azevedo, 2005; Pagliaro et al., 2005a).

Em 2003, outro censo realizado nas terras indígenas Sateré-Mawé no Amazonas

envolveu vários segmentos governamentais, não governamentais, organizações

indígenas e participação ativa dos povos da região conferindo, portanto, um censo de

caráter participativo. Este censo levantou informações sócio-demográficas,

populacionais e econômicas dos Sateré-Mawé (Teixeira & Brasil, 2005).

Santos & Coimbra Jr. (2003) observam que apenas uma pequena parte dos

grupos étnicos foi estudada do ponto de vista demográfico, e mesmo assim a

consistência dos dados apresenta limitações em decorrência do curto período de análise.

No entanto, os autores enfatizam que todos esses grupos estudados têm um padrão de

população com estrutura etária jovem com elevadas taxas de mortalidade e de

fecundidade.

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Várias pesquisas têm registrado altas taxas de natalidade em populações

indígenas nas últimas duas décadas. Entre estas podem ser citados os estudos com os

Xavánte de Pimentel Barbosa (Coimbra Jr. et al., 2002; Flowers, 1994; Santos et al.,

2005), de Sangradouro-Volta Grande (Souza, 1999; Souza & Santos, 2001) e dos Kaiabi

do Parque Indígena do Xingu - PIX (Pagliaro, 2002, 2005). Estes estudos demonstram

que mesmo após anos de declínio populacional, essas taxas sinalizam uma recuperação

da capacidade de reprodução desses povos, sobretudo pelas altas taxas de natalidade

apresentadas, ou seja, superiores a 50 por mil habitantes.

Os Yanomami de Mucajaí são um exemplo de progressivo aumento da

natalidade verificado desde o período pré-contato até o chamado “período de ligação” ,

em que houve uma expressiva queda da mortalidade e um importante incremento da

taxa bruta de natalidade que saltou de 28 e 29 nascimentos por mil habitantes nos dois

períodos que antecedem o de ligação para uma taxa de 52 por mil habitantes (Early &

Peters,1990, 2000). Alguns dos fatores apontados por estes autores como essenciais para

o aumento da natalidade dessa população estão possivelmente relacionados: ao

fortalecimento do mecanismo de defesa imunológica contra algumas doenças infecto-

contagiosas, melhora na assistência a saúde e o relativo isolamento em relação à

sociedade brasileira. Já no chamado “período brasileiro” , os efeitos do contato

provocado pela invasão das terras Yanomami por garimpeiros, emigração de mulheres e

taxas elevadas de mortalidade refletiram em queda das taxas de fecundidade

ocasionando um crescimento menor do que período anterior.

A estrutura por idade e sexo de uma dada população pode fornecer informações

acerca de seu crescimento ou não, pois fatores da dinâmica demográfica como

fecundidade e mortalidade podem alterar seu crescimento natural. Outra questão de

relevância diz respeito ao equilíbrio entre sexos necessários à manutenção de uniões

conjugais possíveis. Muitas populações indígenas após sucessivos contatos com a

sociedade nacional e frentes de expansão econômica sofreram reduções de seus

contingentes populacionais que alteraram suas estruturas etárias e a razão de sexo

inviabilizando o crescimento. Em muitos casos uniões conjugais interétnica e imigração

de mulheres foram a solução para recuperação dos níveis de crescimento (Berquó,

1991).

Garnelo et al. (2003) analisando dados sobre a estrutura etária da população

indígena do Brasil a partir de uma pirâmide elaborada pela Diretoria de Saúde Indígena

(FUNASA, 2003) observaram que há certo equilíbrio entre os sexos, com vantagem

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para o sexo masculino na proporção de 51 por cento para toda população. Esse dado

carece de melhor explicação, pois na maioria das análises de pirâmide etária o sexo

feminino predomina, particularmente nas faixas de idade mais elevadas. Esta vantagem

pode explicar uma provável diferença da mortalidade por sexo, de maneira que o

excesso de homens que se verifica desde o nascimento vai sendo gradualmente

diminuído e superado nas idades mais avançadas pelas mulheres.

A pirâmide populacional verificada para o conjunto dos distritos sanitários no

Brasil, se assemelha àquelas com níveis de alta natalidade e de mortalidade, onde as

crianças e jovens representam mais de 50 por cento da população, contrastando com a

pirâmide populacional brasileira, onde a população com 29 anos ou mais apresenta uma

proporção maior que aquela da população indígena.

O resultado dessa estrutura etária configura um padrão demográfico em que

grande parte da população indígena está apresentando uma idade mediana muita baixa e

uma razão de dependência muito alta, podendo comprometer a estrutura social e a

economia de subsistência. A predominância da população masculina pode estar

refletindo uma incapacidade dos distritos em processar adequadamente as informações

ou mesmo ser fruto da inexistência de informações acerca da dinâmica demográfica das

populações indígenas (Garnelo et al., 2003).

A razão de sexo ao nascimento entre populações indígenas não evidencia um

índice de masculinidade favorável ao sexo masculino, ao contrário se tem observado

que esse índice é bastante irregular. Os Kaiabi no estudo realizado por Pagliaro (2005)

no período de 1970-1999 apresentaram oscilações na razão de sexo ao nascimento.

Vários autores atribuem a essa irregularidade do índice de masculinidade nas

populações indígenas a questões culturais como o infanticídio preferencial por sexo;

todavia entre os Yanomami do rio Mucajaí, a prática de infanticídio foi observada em

diversas situações, nas quais a preferência por sexo não foi determinante (Early &

Peters, 1990).

O desequilíbrio na razão entre sexo pode em muitos casos alterar

comportamentos demográficos. Foi o que aconteceu com os Yanomami de Mucajaí no

período pré-contato onde a união matrimonial monogâmica cedeu lugar às uniões

poliândricas, por conta do excesso de homens em relação ao número de mulheres. Os

autores chamam atenção ainda para o número de mulheres em idade reprodutiva na

população (apenas 11%), sendo que numa situação de razão de sexo mais equilibrada, a

porcentagem de mulheres em idade reprodutiva deve estar em torno de 20%. Quando

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essa população voltou ao equilíbrio entre os sexos as uniões monogâmicas foram se

restabelecendo (Early & Peters,1990, 2000).

O declínio da mortalidade verificado nas últimas décadas entre as populações

indígenas é amplamente associado a intervenções de ações de saúde preventiva e de

melhor capacidade de resposta imunológica adquirida após contatos sucessivos com a

sociedade nacional. Para citar alguns exemplos, os Xavánte de Etéñitépa apresentaram

redução da mortalidade geral e infantil no final da década de 90 (Santos et al., 2005) e

os Kaiabi que vêm experimentando redução nos coeficientes da mortalidade geral de

forma bastante acentuada nas últimas quatro décadas (Pagliaro, 2005b).

Entretanto, há que ressaltar que as taxas de mortalidade geral para ampla maioria

dos grupos indígenas estudados são elevadas se comparadas com a média da população

geral do país, lembrando que comparações como estas devem ser vistas com cautela, em

virtude de estas serem influenciadas pela estrutura etária. Os Xavánte de Sangradouro

no Mato Grosso são um exemplo disso ao apresentar no período de 1993-1997 uma taxa

bruta de mortalidade de 9.1 por mil habitantes (Souza & Santos, 2001), enquanto a taxa

para o Brasil como um todo foi de 6,7 por mil em 1996 (Departamento de Informática

do Sistema Único de Saúde. Indicadores de Saúde. Mortalidade Geral.

http://tabnet.datasus.gov.br/cgi/mortger/mibr.htm,acessado em 7/mar/2006).

A taxa média de mortalidade infantil para os 34 distritos sanitários especiais

indígenas (56,5 por mil nascidos vivos em 2001) em comparação com os coeficientes da

população não indígena (23,7 por mil nascidos vivos em 2001) são ainda consideradas

muito altas (Souza et al., 2004). Há pouco mais de dois anos atrás, ou seja, em 1999

essa taxa era superior a 96 por mil nascidos vivos. A FUNASA (2003) aponta como

responsável por esta queda a intensificação do atendimento de equipes médicas da

atenção básica de saúde iniciada a partir de 1999 com a implantação dos distritos

especiais indígenas (DSEI).

O comportamento reprodutivo de grande parte da população indígena aponta

para um crescimento da fecundidade total, tendo como idade de início da procriação o

período que ocorre logo após a primeira menarca e se estende até a menopausa. Os

grupos indígenas Kaiabi, Xavánte de Pimentel Barbosa e de Sangradouro Volta-Grande

que foram objeto de estudos nas últimas décadas apresentaram altos níveis de

fecundidade, entre 7 e 9 filhos nascidos vivos por mulher. Os níveis variam entre os

diferentes grupos populacionais. Variação que também foi observada por Gage (1989)

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em populações de fecundidade natural com taxas de 11,0 filhos nascidos vivos por

mulher.

Alguns estudos têm demonstrado que fatores ligados à constituição física da

mulher e sua idade, desnutrição, trabalhos pesados e componentes emocionais e

psíquicos ocorrendo durante a gestação podem afetar a fecundidade (Berquó, 1991).

Nos Xavánte, os intervalos interpartais curtos, estilo de vida, amamentações

prolongadas podem ser inquiridos como fatores intervenientes da fecundidade (Flowers,

1994). Esta autora supõe que entre esse grupo esteja havendo quebra de prescrição

como a abstinência sexual com alteração nos níveis de fecundidade.

Na pesquisa realizada por Camargo et al. (2005), na população kamaiurá, foram

constatados baixos níveis de fecundidade, média de 3,7 filhos por mulher, o que o autor

associou a possibilidade de interferência de normas sociais.

Bongaarts (1978) identificou como determinantes que incidem na fecundidade a

proporção de mulheres casadas, o uso de contraceptivo, aborto induzido e o período de

amamentação prolongado entre outros fatores.

Para Wood (1990) as altas taxas de mortalidade verificadas em sociedades pré-

industriais aparentemente exerciam influência sobre o desempenho reprodutivo,

aumentando a fecundidade dessas populações. O autor denominou essa relação de

“compensação reprodutiva” . Ocorre que com a interrupção da amamentação devido à

mortalidade infantil, as mulheres iniciam a ovulação mais cedo do que o normal se

tornando férteis.

Santos et al. (2005) supõem ter acontecido o fenômeno da compensação

reprodutiva na população Xavánte no período compreendido entre 1957 e 1971, período

de grande crise demográfica vivido por esta população, e no qual foram também

observadas elevadas taxas de fecundidade e redução dos intervalos interpartais em

decorrência da mortalidade infantil.

É importante observar que mudanças demográficas como a migração de

populações indígena para áreas urbanas tem provocado uma redução da fecundidade em

decorrência de assumirem comportamentos da sociedade nacional. É o que foi

verificado pelo censo participativo dos Sateré-Mawé (Teixeira & Brasil, 2005) no

Amazonas e na análise do censo de 2000 (IBGE, 2005).

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Capítulo 2

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2.1 – Contexto político da saúde indígena no Brasil

2.1.1 - Política de Atenção à Saúde dos Povos Indígenas

Os povos indígenas do continente Americano, antes da chegada dos europeus

serem descobertos detinham saberes e formas próprias de lidar com enfermidades que

lhe eram comuns. Com o processo de colonização foram introduzidas doenças como a

tuberculose e varíola até então desconhecidas entre essas populações (Verani, 1999).

No período colonial chegam às missões jesuítas e estes são os primeiros a

prestarem atendimentos de saúde as populações indígenas. De acordo com Verani

(1999), antes dos povos indígenas terem uma política oficial de “proteção” - o que só

ocorreu na primeira década do século XX quando é criado o Serviço de Proteção ao

Índio (SPI) -, o atendimento de saúde era dado como complemento assistencial da

política de catequese.

Com o SPI o governo brasileiro cria os instrumentos de controle da população

indígena e dá início à regulamentação de suas terras. A saúde é assumida por este novo

órgão que passa a oferecer uma assistência curativa (Verani, 1999).

Garnelo et al. (2003) apontam que a política criada pelo SPI para proteger os

índios teve uma atuação muito mais favorável aos interesses de agentes econômicos em

franca expansão, tais como fazendeiros, empresas de garimpo e madeireiras. Essa ação

desencadeou um processo de severa degradação das condições de vida e redução de

parte significativa das terras desses povos.

Em 1967, após intensas denúncias de improbidade administrativa e desgaste

institucional, o SPI foi substituído por uma nova instituição, a Fundação Nacional do

Índio - FUNAI, que passa então a assumir integralmente a política do SPI. No ano

seguinte, é criado o Departamento de Saúde Indígena, que passa a prestar atendimento

médico nas comunidades indígenas. Entretanto, esse modelo de atendimento calcado na

ação campanhista, aprofundava ainda mais os problemas de saúde enfrentados por estas

populações (Verani, 1999).

A década de 80, figura como um período de grande efervescência nas políticas

públicas. A saúde pública se constitui em bandeira de luta do Movimento da Reforma

Sanitária, que contou com a participação de profissionais de saúde, dos movimentos

populares e de intelectuais. Esse movimento força a realização em 1986 da VIII

Conferência Nacional de Saúde. O relatório final desta conferência consolida as

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aspirações da reforma sanitária que aponta para reestruturação do modelo de saúde no

sentido de criar um Sistema Único de Saúde (SUS) para a população brasileira. Esta

também estabelece ser imprescindível discutir especificamente a saúde indígena e

recomenda a realização de uma conferência especial, a I Conferência Nacional de

Proteção à Saúde Indígena, realizada neste mesmo ano. O respeito à cultura indígena e a

necessidade de implantação de um sistema diferenciado de saúde é a tônica desta

conferência. Surge pela primeira vez a idéia de um modelo organizacional na concepção

de Distritos Sanitários (Moreira, 2002). Tal modelo não é específico para a saúde

indígena, mas é uma forma de organização do serviço de saúde (Almeida et al., 1998).

Segundo Athias & Machado (2001) as primeiras experiências com implantação

de distritos sanitários enquanto processo de mudanças das práticas sanitárias foram

empreendidas em São Paulo, Curitiba e Salvador, por iniciativa da Organização Pan-

Americana de Saúde (OPAS) e Organização Mundial de Saúde (OMS).

A Constituição de 1988, em seu artigo 196, definiu a saúde como “direito de

todos e dever do estado garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à

redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às

ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação” .

A década de 90 é marcada por uma indefinição da política de saúde indígena que

é evidenciado pela instituição de três Decretos presidenciais. Através do Decreto 23/91,

o Ministério da Saúde por intermédio da FUNASA passa a ter a função de coordenar as

ações de saúde dos povos indígenas em articulação com a FUNAI e outras instituições

(organizações indígenas, religiosas e não governamentais). Criam-se estruturas paralelas

de atendimento à saúde nos dois órgãos, propiciando sobreposição de ações. Para

assessorar o Conselho Nacional de Saúde (CNS) e viabilizar a política de saúde

indígena são criadas no âmbito do Ministério da Saúde, a Comissão intersetorial (CIS) e

de Saúde Indígena (CISI).

A primeira iniciativa de implantação da proposta de distritos sanitários como

modelo de atenção à saúde dos povos indígenas também ocorreu por meio de Decreto

presidencial – com a criação do Distrito Sanitário Yanomami no Estado de Roraima e

Amazonas em 1991 (Decreto Presidencial 23/1991).

Em 1994 é instituído o Decreto de 1.141/94 em substituição ao Decreto 23/91.

Neste momento a FUNAI retoma a assistência curativa, enquanto a FUNASA cabe

executar ações de saneamento, imunização e vigilância epidemiológica. Este Decreto

veio na contramão das decisões tomadas na II Conferência Nacional de Saúde Indígena,

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e em 1998 é considerado inconstitucional, uma vez que, as ações de saúde são de

competência do Ministério da Saúde.

O Decreto 3.156/99 legitima a responsabilidade da saúde dos povos indígenas

como sendo uma atribuição exclusiva do Ministério da Saúde. Nesse mesmo ano é

aprovada no Senado Federal a Lei n° 9.836/99 do projeto apresentado pelo deputado

Sérgio Arouca em 1994. Esta lei foi formatada com base nos princípios gerais do

relatório final da II Conferência Nacional de Saúde para os Povos Indígenas e versa que

o modelo de atenção à saúde indígena “deve se pautar por uma abordagem diferenciada

e global” .

O atual modelo de saúde indígena, na forma de Distritos Sanitários, só se

consolidou em 1993 na II Conferência Nacional de Saúde para os Povos Indígena (II

CNSPI) quando recebeu apoio unânime das organizações indígenas e de profissionais

de saúde (Athias & Machado, 2001; FUNASA, 1998).

Em 1999, a situação de saúde dos povos indígenas é de completa desassistência,

o que abrevia as discussões sobre a implantação dos distritos sanitários. O Ministério da

Saúde por intermédio da FUNASA se reúne com todos os setores (organizações

indígenas, religiosas e ONG´s) em discussões regionais e nacional, que resulta na

criação de 34 Distritos Sanitários Especiais Indígenas (DSEI) para o atendimento de

toda população indígena brasileira. O modelo implantado descarta uma das principais

aspirações do movimento indígena: a autonomia administrativa e a indicação do chefe

do distrito pelo conselho distrital. Em 2000, todos os 34 distritos estavam implantados

(Pellegrini, 2000).

Para implantar os distritos, o modelo de administração da FUNASA foi pensado

de uma forma que atendesse as necessidades de todos que vinham contribuindo com a

saúde indígena. E para a viabilização momentânea da estrutura e organização dos

serviços para o atendimento imediato da grande maioria das populações indígenas, os

dirigentes da FUNASA optaram pela realização de convênios com instituições

indígenas, organizações não governamentais, universidades e prefeituras no sentido de

complementar a assistência, onde a FUNASA não tinha capacidade gerencial de

recursos humanos e administrativos. Todavia, as indicações dos chefes dos distritos são

de responsabilidade das Coordenações Regionais que também mantém o controle dos

recursos destinados aos mesmos, criando uma situação anômala.

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Figura 1- Distritos Sanitários Especiais Indígenas

Essa iniciativa no primeiro momento permitiu dar assistência à saúde para a

totalidade dos distritos, todavia esse modelo administrativo não se ateve às propostas

referendadas na II Conferência Nacional de Saúde dos Povos Indígenas, e nem tem dado

conta das demandas atuais, sendo necessário uma rediscussão da política de repasse de

recursos, com vista a proporcionar mais autonomia aos distritos (Athias & Machado,

2001).

A estratégia de firmar convênio foi e continua sendo importante, já que a

FUNASA não dispõe de recursos humanos com perfil adequado e, tampouco se

esforçou em criar condições para a organização dos serviços no âmbito dos distritos,

que permitissem o acompanhamento e fiscalização das ações das conveniadas. O quadro

atual de grande parte das Coordenações Regionais é de completa desorganização, não

permitindo cumprir a sua missão institucional, ou seja, dar assistência básica as

populações indígenas.

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A participação dos setores envolvidos com a questão indígena na definição deste

modelo tem permitido estruturar os distritos de acordo com as características peculiares

de cada área indígena. Athias & Machado (2001) consideram que o exercício do

controle social pelas comunidades indígenas sobre as ações de saúde depende do nível

de organização política frente à sociedade nacional. A região Amazônica, com histórico

de organização política muito mais longo, conta com dezenas de organizações que

lutam em defesa do povo indígena, o que viabiliza o envolvimento de todos na

implantação dos distritos sanitários.

O modelo de atenção definido goza de amplo apoio entre as comunidades

indígenas e organizações indígenas. Ainda que fragilizado pela ausência de articulação

intersetorial, representa os anseios do movimento indígena gerado nas três Conferências

Nacionais de Saúde Indígena e fóruns específicos sobre sistemas de saúde (Garnelo et

al., 2003).

Como subsistema de saúde, a atenção à saúde indígena ainda deve percorrer um

longo caminho para se consolidar, uma vez que, a integralidade das ações depende

enormemente de como está estruturada a rede de assistência secundária e terciária no

âmbito do distrito sanitário. Como aponta Garnelo et al. (2003) essa realidade é bastante

desfavorável, já que o Sistema Único de Saúde brasileiro não consegue atender

satisfatoriamente a população não indígena, sobretudo por dificuldades operacionais e

de custeio, além de não ter se desvinculado de um modelo centrado na demanda por

assistência emergencial e curativa.

Outra questão fundamental para a organização desse modelo é lançar mão de

experiências e saberes antropológicos sobre a concepção de saúde e doença do ponto de

vista da população indígena. Esse conhecimento é de extrema importância para a

incursão do profissional de saúde no planejamento e no serviço de atenção a saúde

desses povos. Segundo Athias & Machado (2001) o modelo de atenção distrital deve

proporcionar discussões que permitam uma aproximação dos profissionais de saúde no

sentido de permitir uma melhor compreensão e identificação dos problemas de saúde. A

prática sanitária estabelecida, não solucionará os problemas de saúde das comunidades

indígenas se não mudar sua forma de ação, atualmente centrada no atendimento

individualizado e pontual como ocorria antes da implantação dos distritos sanitários.

Passados seis anos da implantação efetiva dos distritos sanitários especiais

indígenas no Brasil, percebe-se que as dificuldades relacionadas ao atendimento

continuam e se cristalizam. Observa-se ainda o desrespeito às singularidades culturais, a

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ausência de recursos humanos qualificados para atuarem em um contexto intercultural,

o desrespeito aos valores da medicina tradicional indígena, as intervenções e ingerência

política nas decisões aprovadas pelos conselhos distritais, a descontinuidade das ações

de saúde causada pela demora no repasse de recursos financeiros e ausência de

articulação intersetorial decorrente do descaso das autoridades federal, estadual e

municipal.

Mas também há avanços que não se pode negar e que fomentam a consolidação

do modelo de atenção à saúde das populações indígenas, como o maior envolvimento

das populações nos conselhos de saúde local e distrital na discussão e elaboração do

plano de saúde.

2.1.2 - Situação de saúde

A saúde dos povos indígenas de uma forma geral é bastante precária, e decorre

de uma seqüência de processos de contato com frentes de expansão, tais como: agrícola,

de mineração e construção de rodovias, entre outros, que historicamente se estende do

período colonial até os dias de hoje causando epidemias de doenças, ruptura social,

extermínio de muitos grupos étnicos por violência e doenças e diminuição de grande

parte das terras tradicionalmente ocupadas. Nesse aspecto, o quadro de saúde é

“complexo e dinâmico” (Santos & Coimbra Jr., 2003).

Os autores acima enfatizam que o perfil epidemiológico para a ampla maioria

das populações indígenas é muito pouco conhecido devido à falta de censos regulares,

da fragilidade dos registros, da precariedade do sistema de informação e dos escassos

estudos em levantamentos epidemiológicos que envolvam a especificidade por etnia.

Dos poucos estudos epidemiológicos disponíveis na literatura nacional,

observam-se de maneira geral que os indicadores de saúde para população indígena são

piores que os encontrados para população não indígena, caracterizando a desigualdade

social que separa as duas populações.

Hokerberg et al. (2001) ao avaliar o atendimento de saúde prestado aos índios

Kaingáng do Rio Grande do Sul, verificou uma grande disparidade entre os óbitos por

causas mal definidas, desnutrição, tuberculose e o câncer cérvico-uterino. Todos

indicadores bem acima daqueles relacionados à população do estado como um todo e

que poderiam ter sido evitados pela atenção básica de saúde. Os autores atribuem à falta

de organização do serviço, o despreparo das equipes de saúde para atuarem em contexto

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intercultural e a pouca integralidade das ações com os serviços de referência do Sistema

Único de Saúde (SUS), bem como as péssimas condições de vida dos Kaingáng sendo

responsáveis pela situação de saúde vivida por esta população. Este grupo retrata a

situação de exclusão social a qual estão submetidos, embora já estejam bastante

integrados com a sociedade envolvente, vivem em condições degradantes.

Trabalho de pesquisa semelhante foi desenvolvido por Diehl (2001), antes da

implantação do DSEI-Sul, onde analisa a qualidade dos serviços de saúde prestados e os

agravos mais prevalentes. Avaliando os prontuários de atendimento médico realizado na

comunidade, a autora conclui que a medicalização por parte das equipes médicas tem

sido uma rotina, o que de certa forma vem estimulando a população a se tornar

dependente de uma série de procedimentos médicos e laboratoriais tais como: consultas,

exames e medicamentos com pouco ou nenhuma ação da medicina preventiva.

Ao longo do processo histórico de contato com a sociedade nacional, as

modificações ambientais, econômicas e sociais ocorridas contribuíram para mudanças

de hábitos alimentares, sedentarismo, dificuldade de subsistência para uma parcela

significativa desses povos afetando diretamente a qualidade de vida e de saúde com

aumento expressivo das taxas de morbimortalidade (Coimbra Jr. & Santos, 2000).

A mudança na estrutura demográfica da população indígena, caracterizada pela

redução da mortalidade combinada com altas taxas de natalidade e de fecundidade,

associada a um padrão de adoecimento marcado por doenças infecciosas e parasitárias,

assim como ascensão das doenças crônicas não transmissíveis apresenta-se como um

grande desafio para a organização dos serviços de saúde (Santos & Coimbra Jr., 2003).

Alguns estudos antropométricos em populações indígenas têm apontado para

possíveis modificações no quadro de saúde com surgimento de doenças crônicas não

transmissíveis e degenerativas (doenças cardiovasculares e diabetes mellitus tipo 2).

Estes agravos possivelmente estão associados à alteração no padrão de alimentação,

mudanças socioeconômicas, redução da atividade física por restrição territorial em

decorrência da interação permanente com a sociedade nacional envolvente (Cardoso et

al., 2001; Gugelmin & Santos, 2001).

Doenças que ainda grassam em muitas comunidades indígenas e que poderiam

ser prevenidas com ações básicas de saúde como as infecto-parasitárias e respiratórias,

se constitui em primeira causa de internação hospitalar e de óbito, demonstrando com

isso baixa capacidade resolutiva dos distritos bem como da rede de referência. Com a

atual estrutura de serviços implantados por meio dos DSEI’s não é possível vislumbrar

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uma melhora do perfil de morbimortalidade da saúde das populações indígenas.

(Escobar et al., 2003; Garnelo et al., 2003).

Como Escobar et al. (2003) demonstram no estudo sobre causas de internação

hospitalar indígena em Rondônia, os indicadores de morbimortalidade não sofreram

alterações significativas após a implantação do distrito sanitário. Os agravos por

doenças infecciosas e parasitárias, passíveis de controle por meio de medidas simples

como a adoção da terapia de reidratação oral (TRO) e ações de promoção à saúde, não

sofreram alterações após a reestruturação da atenção à saúde. O aumento do contato

com os serviços hospitalares denota uma deficiência na assistência que deveria ser

prestada no nível local.

2.1.3 – Organização dos Distritos Sanitários Especiais Indígenas no Brasil

Os distritos sanitários especiais indígenas – DSEI’s atendem a uma população

indígena estimada em 375.000 pessoas distribuídas em 24 Estados (FUNASA, 2000). O

modelo de gestão é oficialmente de responsabilidade da Fundação Nacional de

Saúde/MS que em parceria com diversas organizações indígenas, religiosas,

organizações não governamentais e uma parcela pequena de prefeituras executam

diretamente as ações de atenção básica de saúde nas aldeias.

A Coordenação Nacional de Saúde Indígena é feita pela Diretoria de Saúde

Indígena (DESAI), que em tese deveria ter as seguintes atribuições: a) gerenciar os

recursos financeiros destinados aos custeios das ações; b) acompanhar a execução das

ações pactuadas e avaliar o desempenho das mesmas por meio das equipes dos DSEI’s

sediado em cada estado sob a gestão das Coordenações Regionais da FUNASA; c)

promover a instalação da rede física e dos sistemas de saneamentos e efetuar a

capacitação de pessoal (FUNASA, 2000). Essas responsabilidades institucionais não

têm sido efetivadas de forma sistemática ao longo dos seis anos de execução das ações

de saúde, sejam por ineficiência administrativa, constantes mudanças políticas na

direção nacional da FUNASA e no direcionamento das políticas de saúde para a

população indígena. Além disso, há uma estrutura burocrática, especialmente no que diz

respeito ao repasse de recursos para custear as ações de saúde, o que tem causado

grandes transtornos para a assistência das populações indígenas no país.

O modelo assistencial para o DSEI é definido como sendo uma unidade

organizacional da FUNASA, com base territorial e populacional, sob responsabilidade

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de uma autoridade sanitária, o chefe do distrito. Com capacidade para reunir um

conjunto de ações necessárias à atenção básica de saúde, em articulação com a rede do

Sistema Único de Saúde (SUS), no sentido de integralizá-las ao sistema secundário e

terciário de atenção à saúde. O modelo construído não foi estabelecido somente por

critérios operacional e geográfico, mas respeitando valores culturais, as relações

políticas e a distribuição demográfica tradicional dos povos indígenas (FUNASA,

2000).

A rede física do DSEI é composta, nas aldeias, pelos Postos de Saúde onde

atuam os agentes de saúde e auxiliares de enfermagem; por Pólos-Base, uma unidade de

maior complexidade, comportando o pessoal de enfermagem e a visita periódica de

equipes multidisciplinares. Outra unidade importante da rede são as Casas de Saúde do

Índio (CASAI), cuja finalidade é dar apoio ao tratamento de pacientes indígenas quando

encaminhados para atendimento à rede de referência do SUS (FUNASA/MS, 2000).

Figura 2– Organização do DSEI e Modelo assistencial

Fonte: www.Funasa.gov.br, acessado em 14/03/2006.

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2.1.4 - Organização do Distrito Sanitário Especial Indígena do Leste do Estado de

Roraima

Historicamente, a população indígena do leste de Roraima vinha tendo contato

com algum tipo de atendimento de saúde realizado de maneira pontual pelas Equipes

Volantes de Saúde (EVS) da FUNAI. No final da década de 70, a Diocese de Roraima

instalou o primeiro hospital na região do Surumu, o Hospital São Camilo, e em seguida

o Hospital da Barata para atender às populações indígenas. Além de servir de

atendimento à saúde, o hospital treinava e formava agentes indígenas de enfermagem. A

Missão Evangélica (MEVA), também iniciou na mesma época o atendimento pontual de

saúde por meio de equipes de saúde que se deslocavam e permaneciam por um período

de tempo determinado em postos de saúde instalados pela missão. No início da década

de 90, os Médicos Sem Fronteiras (MSF) foram convidados para atuarem nesta área e

atender uma demanda crescente de casos de malária, ocasionada pelo deslocamento do

garimpo da área Yanomami para a região do nordeste do Estado de Roraima, área do

DSEI Leste. Uma das principais atividades dos Médicos Sem Fronteiras foi a

capacitação de agentes indígenas de microscopia de diagnóstico da malária.

O Distrito Sanitário Especial Indígena do Leste de Roraima (DSEI-Leste) foi

criado em 1999 pela portaria nº. 110/99 da FUNASA. Cobre uma vasta região (Figura

3) e uma população estimada em 31.000 habitantes. Está dividido em nove regiões

administrativas com 240 aldeias indígenas, das etnias Macuxi, Wapixana,Taurepang,

Ingarikó, Patamona e Wai-Wai. A estrutura do DSEI para a atenção básica de saúde é

organizada em 32 pólos-base, postos de saúde localizados em todas as aldeias e 69

laboratórios de microscopia. O Pólo-base é referência para atendimentos mais

complexos, entretanto, as atividades nos mesmos não têm sido permanente e se dá de

forma pontual através de visitas das equipes multidisciplinares de saúde. As equipes são

compostas por profissional médico, odontólogo, enfermeiro e auxiliar de enfermagem.

No nível das aldeias, o primeiro atendimento é realizado pelo agente indígena de saúde,

que executa atividades ligadas a diversos programas da atenção básica, tais como:

acompanhamento de gestantes, programa de aleitamento materno, acompanhamento de

pacientes em tratamento, diagnóstico e tratamento da malária, registros de eventos

vitais, entre outros.

Para viabilizar o atendimento básico nas aldeias, estruturar postos de saúde e

pólos-bases, contratar pessoal, entre outros, a FUNASA vêm mantendo convênio com a

principal organização indígena do estado, o Conselho Indígena de Roraima (CIR). Há

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também uma ação complementar dos municípios na atenção básica que mantém oito

equipes contratadas com recursos de Incentivo à Atenção a Saúde dos Povos Indígenas

por meio de repasses fundo a fundo pela Secretaria de Atenção à Saúde do Ministério da

Saúde (SAS/MS).

Assim, no Estado de Roraima a atenção básica de saúde destinada às populações

indígenas é em sua totalidade terceirizada, exceção à parte que cabe ao gestor federal no

acompanhamento, planejamento, análise e aprovação do plano de trabalho feito em

conjunto com o Conselho Distrital de Saúde Indígena do Leste de Roraima. Uma parte

importante da assistência médico-odontológica é realizada pelas prefeituras por meio

das oito equipes de saúde, compostas por nove médicos, doze odontólogos, quatro

enfermeiros, dezenove auxiliares de enfermagem, um bioquímico e um técnico de

laboratório.

Os pacientes que necessitam de exames complementares ou mesmo um

atendimento mais complexo são encaminhados para a Casa de Saúde do Índio – CASAI,

situada na capital do Estado. A CASAI recepciona e interna, presta o primeiro

atendimento médico, esse por sua vez encaminha para a equipe do serviço social e

quando há necessidade referencia a rede do SUS para consultas especializadas e

exames. A CASAI é gerenciada diretamente pela FUNASA. A rede do SUS conta com

um Hospital Geral, uma Maternidade e um Hospital Pediátrico.

A articulação com o SUS ainda é bastante problemática na abordagem ao

paciente indígena, pois a formação dos profissionais de saúde não lhes permite atuar

frente à especificidade exigida pela saúde indígena. Embora, a população indígena

represente uma parcela importante do contingente populacional do Estado, próximo de

15 por cento e proporcionalmente detenha a maior população indígena do país, não há

sequer uma preocupação na adequação de instalações prediais dos hospitais de

referência para receber e dar um atendimento diferenciado a essa população como

preconiza o Subsistema de Atenção a Saúde Indígena.

Os Conselhos Locais de Saúde, responsáveis pelo controle social estão

instalados nas nove regiões administrativas (Serras, Surumu, Baixo Cotingo, Raposa,

São Marcos, Amajari, Taiano, Serra da Lua). O Conselho Distrital de Saúde está

organizado desde 2000 e é composto paritariamente por usuários indígenas, prestadores

de serviço e profissionais de saúde que deliberam sobre a elaboração do plano de saúde

do distrito, avaliação das ações e apreciação de contas dos prestadores de serviços.

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As atividades são programadas no nível distrital em encontros anuais, onde se

reúnem representantes de todo distrito em oficinas de trabalho para planejamento e

avaliação. No nível regional as ações de saúde são planejadas pelos conselhos locais.

Cada pólo-base conta com um coordenador de saúde responsável pela organização geral

dos serviços nas comunidades de sua abrangência.

Os programas de Capacitação de Agentes Indígenas de Saúde, de Imunização,

de Controle de Endemias contam com uma equipe composta por onze enfermeiras

responsáveis pelos cursos de capacitação, supervisões e organização dos serviços de

saúde e de imunização. Para o controle de endemias há um médico que coordena uma

equipe de quatro laboratoristas responsáveis pelos cursos e supervisões aos

microscopistas indígenas. O programa de controle de vetores é dirigido por uma equipe

composta por uma bióloga e quatro auxiliares de entomologia, que executam atividades

de capacitação e atuam em conjunto com os agentes indígenas de entomologia. Dois

médicos atuam na normatização das ações e em situações de risco e emergência e três

odontólogos são responsáveis pela implantação do Programa de Saúde Bucal.

Na sede do DSEI funciona o serviço de epidemiologia que conta com um

quadro de profissionais responsáveis pelo processamento e análise dos dados. As

atividades de vigilância epidemiológica são exercidas por todos os profissionais de

campo.

Um desafio a ser enfrentado pelo gestor federal (FUNASA) é articular as ações

executadas pelos municípios, que hoje atuam precariamente muito mais em função de

suas condições, que são extremamente deficitárias em estrutura logística e de recursos

humanos, além de não seguir as normas preconizadas pelo departamento de saúde

indígena (DESAI-FUNASA).

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Figura 3- Distrito Sanitário Indígena do Leste de Roraima - DSL: distribuição

geográfica por pólo-base e região

Fonte: Coordenação de Saúde do Conselho Indígena de Roraima – CIR, 2004.

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2.1.5 - Sistema de Informação

“A informação é a representação de uma situação, que foi

selecionada, tratada, resumida e organizadas a partir de contextos

determinados: i) por alguém (profissional/gestor da informação) de

acordo com sua visão de mundo e domínio tecnológico; ii) por uma

instituição, de acordo com os interesses e objetivos que estão em

disputa pelo direcionamento da política institucional, ou seja,

refletindo determinadas relações de poder e produção de saber

(Moraes, 2002)”.

A política do sistema de informação definida na 12ª Conferência Nacional de

Saúde realizada em dezembro de 2003, considerou que o sistema deve ter os seguintes

princípios: possibilidade de ser implementado e articulado nos três níveis de governo;

garantir maior visibilidade das diretrizes do SUS, da política de saúde e suas ações,

permitindo a ampla participação da sociedade no controle social e atender as demandas

e expectativas. Tecnologicamente o sistema deve ser de fácil acesso, democrático,

garantir compatibilização e interface dos sistemas do SUS com outros sistemas de

informação de interesse para saúde pública.

A I Conferência de saúde dos povos indígenas, realizada em 1986, já

recomendava a construção de um Sistema de Informação para atender as especificidades

das populações indígenas, referendando ainda que as análises epidemiológicas

resultantes desse sistema fossem repassadas para as lideranças indígenas e autoridades

sanitárias.

A partir da transferência da responsabilidade pela política de atenção à saúde das

populações indígena ocorrida no final da década de 90 da Funai para a FUNASA, foi

criado um sistema específico para consolidar informações epidemiológicas e

demográficas para os 34 distritos sanitários especial indígena implantados no país, com

a finalidade de acompanhar, monitorar e reorientar as ações no âmbito do distrito

sanitário, sendo este sistema denominado de Sistema de Informação da Atenção a Saúde

Indígena – SIASI.

Na III Conferência de saúde dos povos indígenas foi aprovado como diretriz que

o Sistema de Atenção a Saúde Indígena, como instrumento de informação para a

organização dos serviços de saúde nos distritos deve se adequar à realidade indígena e

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permitir a intercomunicabilidade com os demais sistemas de informação do Ministério

da Saúde. Em outras palavras, o sistema deve ser diferenciado, entretanto, deve ser

compatível com os sistemas nacionais de informação em saúde.

Nesse aspecto, a criação do Sistema de Atenção a Saúde Indígena (SIASI), ainda

que seja um sistema para atender uma população específica não se enquadra no

princípio deliberado como diretriz das duas últimas Conferências Nacionais de Saúde.

Primeiro, porque é uma tecnologia de acesso restrito, segundo não é compatível e nem

permite interface com os sistemas nacionais de informação em saúde já

disponibilizados, e tampouco é flexível à modernização.

O sistema de atenção à saúde indígena foi implantado quando a FUNASA já

havia realizado dezenas de convênios com organizações indígenas e Ong´s que

mantinham sistemas próprios de registro e informação. Deste modo, no primeiro

momento, o sistema oficial da FUNASA sofreu uma forte rejeição, sobretudo por não

ser operacionalmente viável do ponto de vista do acesso tecnológico, já que o mesmo

exigia o uso de computadores em todos os Pólos-base. Cabe lembrar que em muitos

DSEI’s os Pólos-base estão localizados em aldeias que não dispõem de estrutura, tais

como, energia elétrica. Além disso, o sistema disponibilizou apenas o módulo

demográfico através do preenchimento do cadastro da família. Em Roraima, tanto o

DSEI quanto os parceiros, com bancos mais completos e em funcionamento não se

empenharam em usar o novo sistema.

Atualmente, a FUNASA faz um esforço para que o sistema seja a única

ferramenta de informação nos distritos. Mas dada às peculiaridades de muitos distritos e

também da distância deste do local onde se operacionaliza as informações, o sistema se

fragiliza. Além disso, os boletins são preenchidos, geralmente, por profissionais de nível

elementar e, portanto, com pouca capacidade diagnóstica.

O serviço de informação do Distrito do Leste de Roraima trabalha com dois

sistemas de informação: o SIASI específico da saúde indígena, e em paralelo utiliza as

bases do sistema nacional de informação em saúde do Ministério da Saúde (Sistema

Mortalidade - SIM e Sistema de Nascidos Vivos - SINASC). As bases do SIM e

SINASC foram implantadas para atender uma necessidade do fluxo estadual de

informação, uma vez que, a população indígena atendida pelo distrito está presente em

dez dos quinze municípios do estado. Toda informação é consolidada no distrito e

depois é encaminhada à diretoria de saúde indígena da FUNASA, à Secretaria Estadual

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de Saúde que se responsabiliza em alimentar os sistemas municipais de saúde onde as

ações do distrito se desenvolvem.

Os dados deste trabalho de pesquisa são oriundos das bases desses bancos de

informação implantados no DSEI. A partir de sua implantação em 2000, esses dois

sistemas vêm a cada ano aprimorando os registros de óbitos (DO) e nascimentos (DN),

garantindo uma melhor cobertura. Dado a capacidade e facilidade em gerar relatórios,

bem como permitir o fluxo de informação sobre uma mesma base de dados que atenda

aos gestores estadual e municipal, estes têm sido mais úteis do que o sistema específico

criado pela FUNASA.

No entanto, alguns campos das declarações da DO e DN como peso ao nascer,

pré-natal, escolaridade da mãe, estado civil, idade da mãe, quantidade de filhos vivos e

mortos que são fundamentais para uma análise mais refinada dos dados não têm sido

consideradas e tampouco investigadas pelo serviço de epidemiologia do distrito.

Todavia, o sistema utilizado pelo DSEI apresenta dados mais atualizados e com uma

significativa cobertura.

A operacionalização do sistema de informação no DSEI-Leste ocorre da

seguinte forma: na aldeia, no nível de atuação do agente indígena de saúde, as

informações de morbimortalidade são anotadas em boletins que são encaminhados

periodicamente. Dependendo da gravidade do agravo, a notificação é comunicada via

rádio ao setor de epidemiologia da coordenação de saúde do DSEI. Este setor processa

as informações diretamente nas bases do SIM e SINASC e as repassam às áreas técnicas

para a tomada de decisão. A utilização de vários sistemas de informação neste distrito

retrata bem a dificuldade que se tem de trabalhar com as informações geradas somente

pelo SIASI, que ainda funciona precariamente (Figura 4).

Um outro problema desse sistema é o tempo decorrido para entrada de

informação que são operacionalizados no nível local, portanto, onde se dá efetivamente

à assistência à saúde até a sede do distrito. Em muitos locais, as informações são

enviadas a cada 30 dias, o que inviabiliza qualquer ação de intervenção pelos serviços

de vigilância, somado a isso, há também morosidade na alimentação dessas informações

no sistema.

O SIASI como componente essencial para a organização dos distritos, pouco

tem contribuído para subsidiar uma ampla análise dos indicadores de saúde para a qual

foi criado (Sousa, 2005). Após quatro anos de sua implantação, o sistema ainda não é

capaz de gerar relatórios minimamente satisfatórios para todos os distritos implantados.

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Atualmente, somente o módulo demográfico vem sendo regularmente alimentado no

sistema.

Figura 4 – Fluxo de informação no DSEI-Leste

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Capítulo 3

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3.1 - Histórico de contato da população do DSEI-Leste de Roraima

Data do século XVIII a história de ocupação da área, na qual atualmente vivem

as diversas etnias que compõem o distrito sanitário, com o estabelecimento dos

portugueses vindos do rio Negro com objetivos claros de resguardar a fronteira que

estava sob ameaça constante dos Holandeses que traficavam escravos índios no limite

da fronteira das possessões espanhola e holandesa nas Guianas. Preocupados com a

invasão do vale amazônico, os portugueses trataram de construir um forte no rio Branco

– Forte São Joaquim.

Santilli (1997) afirma que a estratégia de aldeamento não fora lograda, uma vez

que as fugas eram constantes. Entretanto, há forte evidência, nos registros da época,

século XVIII, de que o recrutamento e a escravização da população indígena

continuaram e que certamente causou impacto sobre a demografia e modificação do

território tradicionalmente habitado por estes povos.

Esta época marca, portanto, a experiência dos primeiros contatos e nos imprime

a verdadeira dimensão do que foi o processo de colonização no rio Branco. Havia

diversas etnias de filiações lingüísticas, tais como: Karib, Arawak, Macu e outras

línguas isoladas que foram exterminadas ou se integraram a outros grupos.

Como observado e descrito por Farage (1991) a violação da cultura indígena

começou com os aldeamentos, uma maneira de tirar os povos nativos de suas habitações

para reuni-los em aglomerados humanos onde serviam de mão de obra na construção de

fortificações militares e religiosas. No século XIX vieram as ocupações de suas terras

por fazendas de gado, e em decorrência disso as populações indígenas que viviam nas

áreas de campos (lavrados em Roraima) migraram para as regiões montanhosas (Serras)

deixando os campos livres para a expansão da pecuária. Aos índios que permaneciam

próximos as fazendas lhes eram permitido cuidar do gado, mas não serem proprietários.

Os criadores de gado mantinham em suas posses mão de obra em regime de semi-

escravidão

Ao longo dos três últimos séculos, os povos indígenas ainda enfrentam situações

de ocupação de suas terras por não indígenas das mais diversas formas, inicialmente

marcadas por aldeamentos e migrações forçadas como já referido nos primeiros

contatos, em seguida pelo avanço de frentes extrativistas e pecuaristas e, mais

recentemente, na década de 90, sofreram com a invasão de garimpeiros e grileiros. Após

anos de luta pela demarcação de suas terras, que só foi possível à custa de muito

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sacrifício, conseguiram regularizar 27 terras indígenas dentre as 30 existentes, mas

continuam a lutar pela expulsão dos posseiros que ainda permanecem com fazendas de

gado e propriedades de monocultura do arroz. O desdobramento das várias formas de

contatos causou modificações ambientais (poluição de rios e restrição de território),

sociais, de subsistência, além de epidemias de malária, tuberculose, e o aumento do

alcoolismo, entre outras formas de desorganização social.

Há na área do Distrito Sanitário Indígena do Leste de Roraima 30 terras

indígenas em diferentes estágios de regularização fundiária, totalizando 3.250.256

hectares (Figura 5, Quadro 1). A área de maior conflito está relacionada ao processo que

demarcou a Terra Indígena Raposa Serra do Sol, com uma extensão de 1.678.800

hectares e uma população superior a 16.600 indígenas (CIR, 2004).

Figura 5 – Situação Fundiária, DSEI Leste, Roraima, 2006.

Fonte: Funai –www.funai.gov.br acessado em 08/03/2006.

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Quadro 1-Terras indígenas, grupo indígena e município, DSEI Leste de Roraima, 2006.

Nome da Terra Grupo Indígena Município

Ananás Makuxi Boa Vista

Anaro Wapixana Boa Vista

Aningal Makuxi Alto Alegre

Anta Makuxi e Wapixana Alto Alegre

Araca Makuxi e Wapixana Boa Vista

Barata Livramento Makuxi e Wapixana Alto Alegre

Bom Jesus Makuxi Bonfim

Boqueirão Makuxi e indivíduos Wapixana Alto Alegre

Cajueiro Makuxi Boa Vista

Canauanim Makuxi e Wapixana Bonfim

Jabuti Makuxi e Wapixana Bonfim

Jacamim Wapixana, Jaricuna e Makuxi Bonfim e Caracaraí

Malacacheta Wapixana Bonfim

Mangueira Makuxi Alto Alegre

Manoa/Pium Makuxi e Wapixana Bonfim

Moskow Wapixana Bonfim

Muriru Wapixana Bonfim e Cantá

Ouro Makuxi Boa Vista

Pium Wapixana Alto Alegre

Ponta da Serra Makuxi Boa Vista (BV)

Raimundão Makuxi e Wapixana Alto Alegre

Raposa Serra do Sol Wapixana, Ingariko,Taurepang e Makuxi Normandia, Uiramutã, BV

Santa Inês Makuxi Boa Vista

São Marcos Makuxi e Wapixana Boa Vista

Serra da Moca Wapixana Alto Alegre

Sucuba Makuxi Alto Alegre

Tabalascada Wapixana Cantá

Trombetas Mapuera Wai-Wai e Karafawyna São João da Baliza

Truaru Makuxi e Wapixana Boa Vista

Wai-Wai Wai-Wai, Mawayana, Xereu e outros Caracaraí, Caroebe, S.J. da Baliza e S.L.Anauã

Fonte: Funai –www.funai.gov.br acessado em 08/03/2006.

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Atualmente os campos e serras da porção nordeste do Estado de Roraima são

ocupados por Macuxi, Taurepáng e Ingarikó, grupo de filiação lingüística Carib, e os

Wapixana, de filiação lingüística Arawak. Os Wai-Wai, também de filiação Carib

ocupam uma extensa área de floresta ao sul do estado (Santilli, 1997). Todos os grupos,

uns mais outros menos, experimentaram o contato com as frentes de ocupação no século

XVIII, no rio Branco.

As etnias Macuxi, Taurepang e Wapixana em grande parte possuem bom

domínio da língua portuguesa. Em algumas aldeias próximas aos centros urbanos

existem pessoas que já não falam a língua indígena, e nas aldeias mais afastadas existe

alguma dificuldade no uso da língua portuguesa. Já a população das etnias Ingarikó,

Patomona e Wai-Wai se comunica preferencialmente na língua indígena, havendo

poucos falantes da língua portuguesa. Nas aldeias próximas a linha de fronteira com a

Venezuela e Guiana encontram-se muitos falantes da língua inglesa e espanhola (CIR,

2004).

A inter-relação étnica é muito forte, em função de arranjos residenciais entre

“parentela cognáticas” compostas por homens de diferentes procedências, sobretudo em

aldeias nas zonas limítrofes entre os grupos étnicos, em que há comunidades compostas

por famílias extensas e mistas como: Macuxi e Patamona; Macuxi e os Wapichana,

entre outros (Santilli, 1997).

A organização social desses povos se caracteriza por um tipo de agrupamento

básico que se denomina como maloca (aldeia), com número de habitantes variando de

30 a 500 pessoas, acomodados em casas que se distribuem aleatoriamente formando

conjuntos que correspondem a parentelas. As casas são de adobe, cobertura de palha de

buriti e piso de chão batido, onde reside uma única família. As relações entre as famílias

seguem a teia do parentesco, onde após o casamento o esposo vai morar próximo da

casa do sogro. Cada maloca tem um tuxaua responsável pela vida social, e oficialmente

a representa na relação com outras malocas e não índios (CIR, 2004).

Um forte movimento migratório ocorreu nas últimas décadas, principalmente

daquelas regiões próximas dos centros urbanos. Entre os municípios do Estado de

Roraima, Boa Vista foi o que recebeu um contingente expressivo de indígenas

“desaldeados” , os quais se fixaram na periferia da cidade constituindo-se na maioria dos

habitantes de alguns bairros. As mulheres, ainda que precise ser mais bem esclarecido

por um estudo específico, representam uma parcela significativa de moradoras da cidade

de Boa Vista, onde trabalham como domésticas. Além disso, as famílias que continuam

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a morar nas malocas têm uma base de apoio na cidade, para onde encaminham seus

filhos em busca de melhores condições de vida, o que muitas vezes acabam

permanecendo em definitivo. Nos últimos anos, segundo o Conselho Indígena de

Roraima, aliado aos recentes processos de homologação de terras indígenas há um

processo inverso em decorrência do agravamento da crise econômica e fortalecimento

da consciência indígena. Assim sendo, observou-se um fluxo muito forte de famílias

inteiras voltando a residir nas malocas (CIR, 2004).

Todos os povos indígenas pertencentes ao DSEI-Leste de Roraima, praticam a

agricultura de subsistência, cultivando basicamente mandioca, batata doce, ananás, cará,

banana e melancia entre outros gêneros alimentícios de menor proporção. Na divisão

sexual do trabalho, o homem é quem prepara a terra a ser cultivada (derrubada da mata,

a queima da área e o plantio), cabendo a mulher manter a roça limpa e proceder à

colheita, bem como preparar os alimentos (tratar a mandioca, fazer a farinha e o beiju) e

cuidar dos filhos. Os homens também são responsáveis pela caça e pesca. A criação de

gado está presente em quase todas as malocas, com um rebanho aproximado de 50.000

rezes. A circulação de dinheiro nas malocas é pequena, limitado a trabalhos assalariados

de professores e agentes de saúde ou proveniente de aposentadorias (CIR, 2004).

Organização política está estruturada da seguinte maneira: o tuxaua é a

autoridade máxima em cada maloca e é escolhido em reunião geral da comunidade. As

comunidades estabelecem alianças entre si, e participam das diversas formas de

articulação e organização política. Anualmente, acontece a Assembléia Geral dos

Tuxauas, momento de grande concentração de lideranças de todo o estado, assim como

Assembléias Regionais onde são realizados o planejamento e avaliação das atividades

dos conselhos regionais. Há diversas organizações indígenas no estado, sendo o

Conselho Indígena de Roraima – CIR a única com abrangência em todo o estado (CIR,

2004).

Segundo Silva (1996), por ocuparem uma vasta área do estado esses índios

experimentam diversos graus de integração com a sociedade envolvente. A autora

identificou três categorias de integração em que se encontram os índios do norte e

nordeste do Estado de Roraima: a) com contato intermitente estão os índios da etnia

Ingarikó e os Patamona, por serem considerados bravos, naturalmente restringem o

acesso de estranhos as suas terras, além da localização geográfica de difícil acesso; b)

com contato permanente estão Macuxi, Wapixana. Os Wai-Wai na parte sul do estado

também com contato permanente. O contato se dá de forma freqüente com instituições

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36

religiosas, com representantes do governo e com a sociedade regional, situadas em

municípios onde se localizam as aldeias. Esses grupos participam da vida política do

estado por meio de suas organizações. Em outro nível de integração encontram-se os

índios Taurepang que estão numa situação intermediária, localizados nas áreas próximas

às matas serranas, na transição para as áreas das serras e do lavrado.

Os diferentes graus de integração dessas sociedades implicam em abandono de

muitas tradições culturais. Os Macuxi, por exemplo, preservaram muito pouco de suas

culturas, enquanto os Ingarikó e os Patamona mantêm quase intacta sua cultura que se

reflete no artesanato, alimentação e na mitologia (Silva, 1996).

Após os contatos interétnicos, assim como aconteceu com outros povos

indígenas no restante do país, muitos desses índios quase foram extintos. Perderam parte

significativa de seu território e de sua identidade. Atualmente, há um forte movimento

para resgatar valores culturais, crenças e tradições.

Entre os povos indígenas, são poucos os estudos que tratam exclusivamente dos

componentes demográficos, em especial relacionando a mortalidade geral, mortalidade

infantil e seus componentes, estrutura etária por sexo e idade, fecundidade e natalidade.

Igualmente como ocorre em outras regiões há uma escassez de informação de qualidade

que retrate os principais elementos da dinâmica demográfica no DSEI-Leste de

Roraima.

Algumas pesquisas foram desenvolvidas neste distrito abordando, na maioria das

vezes, históricos de contatos e conflitos dessas populações com regionais, o trabalho

mais recente foi conduzido por Guerrero et al. (2003) abordando a desnutrição de um

grupo de idosos indígenas.

3.1.1 - População e Método

O Distrito Sanitário do Leste, com uma população estimada de 31.106 indígenas,

está situado ao nordeste do Estado de Roraima, na fronteira do Brasil com a Venezuela

e a Guiana, e ao sul do Estado de Roraima na fronteira com o Estado do Amazonas.

Com fins administrativos foi dividido em nove regiões: Amajari, Baixo Cotingo, Serras,

Serra da Lua, São Marcos, Taiano, Raposa e Wai-Wai.

A população segundo o grupo étnico está distribuída da seguinte forma:

aproximadamente 20.000 pessoas são da etnia Macuxi, 8.600 Wapixana, 800

Taurepang, 1.000 Ingaricó, 65 Patamona, 540 Wai-Wai (CIR, 2004).

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37

O povo Macuxi vive atualmente nas áreas de lavrado e de serras na região do

Rio Branco constituindo-se na maior população indígena do Estado de Roraima,

possuindo ainda várias aldeias na Guiana Inglesa. O povo Taurepang ocupa no Brasil

uma pequena região no alto Rio Surumu na fronteira com a Venezuela, país onde vive a

maior parte de sua população. Os Ingaricó e Patamona estão localizados no extremo

norte do estado, na região pela qual atravessa o Rio Cotingo, com a maior parte de sua

população vivendo na República Cooperativista da Guiana. Os Wapixana situam-se no

sudeste do estado, possuindo também muitas aldeias na Guiana Inglesa. Os Wai-Wai

ocupam a região de floresta ao sul do estado, em território que adentra no estado do

Pará, onde também possuem aldeias assim como no Suriname.

O estudo é de caráter descritivo e analisa dados secundários do DSEI-Leste,

provenientes dos boletins de nascimento e óbito, além de relatórios referentes ao plano

distrital de saúde. A utilização dos dados foi restrita, para fins deste estudo, à população

assistida pelo distrito sanitário (aldeada) e, portanto, foi restrita aos registros do banco

local de dados.

Por meio do banco de dados, com os registros brutos disponíveis, procurou-se

analisar a inconsistência entre os dados registrados verificando a duplicidade de

registro, e checando data de nascimento, nome da mãe e do filho. Num segundo

momento, separaram-se os óbitos fetais e natimortos dos nascidos vivos. Para os

registros de óbitos com campo de idade da mãe em branco, realizou-se pesquisa em

registros de declaração de óbito em arquivos da coordenação de saúde indígena do

Conselho Indígena de Roraima para resgatar a idade. Não foi observado no sistema

registro relativo a aborto.

Dos 119 óbitos fetais referente ao período do estudo foi considerada somente

50% destes enquanto óbitos fetais, ou seja, metade seriam óbitos fetais e o restante

seriam óbitos neonatais precoces. O entendimento foi que grande parte desses óbitos

devem ter ocorrido sem assistência ou mesmo codificados incorretamente, e, portanto,

informados provavelmente como óbitos fetais. Os óbitos foram distribuídos igualmente

nos três anos de análise. Ficaram assim distribuídos 60 óbitos fetais e 59 óbitos

neonatais precoces.

A partir dos dados revisados, procederam-se os cálculos das taxas referentes aos

indicadores demográficos, tais como: a) natalidade; fecundidade específica e total; b)

mortalidade geral ou taxa bruta; c) taxa de mortalidade em menores de um ano e de seus

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38

componentes neonatal (precoce e tardio) e pós-neonatal; d) taxa de mortalidade

perinatal e taxa de mortalidade nos menores de cinco anos de idade.

A estimativa populacional utilizada para os cálculos das taxas brutas de

mortalidade e de natalidade é proveniente de levantamentos populacionais realizados

pela coordenação de imunização do distrito. Também a partir destes dados foi possível

conhecer a composição etária da população indígena do DSEI Leste.

As taxas brutas de natalidade (TBN) e de fecundidade global (TFG) foram

obtidas a partir dos registros de nascimentos, sendo que a TBN expressa a relação do

número de nascidos vivos pelo total da população multiplicado por 1000 habitantes. A

TFG foi obtida pela razão entre o número de nascidos vivos pelo número de mulheres

em idade reprodutiva, em um ano, multiplicado por 100 ou 1000 mulheres. Também

foram calculadas taxas de fecundidade específicas e totais.

A taxa bruta de mortalidade foi obtida a partir dos dados informados nos

registros de óbito, e foi dada pelo coeficiente entre o número de óbitos por toda causa

dividido pela população, multiplicado por 1000.

A taxa de mortalidade infantil foi calculada a partir dos dados informados nos

registros de óbitos, e é obtida pelo coeficiente entre todos os óbitos ocorridos em

menores de um ano pelo total de nascidos vivos e multiplicado por 1000. A taxa de

mortalidade infantil foi ainda decomposta em neonatal precoce; neonatal tardio e pós-

neonatal. Para o cálculo da mortalidade neonatal precoce, foram relacionados os óbitos

que ocorreram nos primeiros 6 dias de vida. No cálculo da taxa de óbitos neonatal tardio

foram relacionados os óbitos que ocorreram entre 7 – 27 dias de vida. Os pós-neonatais

foram relacionados os óbitos que ocorreram entre 28 dias a um ano de vida.

O cálculo da taxa de mortalidade perinatal relaciona os óbitos ocorridos entre a

22 semanas de gestação até a primeira semana de vida, ou seja, é a razão entre a soma

das perdas fetais tardias e dos óbitos neonatais precoces e todos os nascimentos

(natimortos e nascidos vivos).

Para compreensão das condições de saúde da população foi procedido o cálculo

de mortalidade proporcional e sua representação em tabela e gráfico. Para descrever a

freqüência de óbitos e partos por local de ocorrência utilizou-se o cálculo de proporção.

O cálculo da proporção de assistência pré-natal foi realizado considerando apenas o ano

de 2004, com melhor qualidade de registro para este evento.

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39

A causa básica de óbitos no âmbito do distrito sanitário é investigada pela equipe

médica do DSEI-Leste, que as registra de acordo com a 10ª revisão da Classificação

Internacional de Doenças da Organização Mundial da Saúde (CID 10). Baseado nestas

informações se categorizou proporcionalmente as principais causas básicas de óbitos

ocorridas em menores de um ano de idade.

A opção de não se trabalhar com o sistema oficial de informação da atenção à

saúde indígena (SIASI) deve-se, em parte, ao sistema não estar sendo sistematicamente

alimentado e, portanto, apresentar um significativo número de sub-registro dos eventos

vitais. As fontes de dados deste trabalho são oriundas de bancos que utilizam as bases

dos sistemas nacionais de saúde como SIM e SINASC em uso no distrito sanitário,

alimentados por boletins de registro de óbitos e nascimentos, que por sua vez, alimenta

o banco de informação estadual de saúde.

Para o procedimento de análise dos dados foi utilizado o programa estatístico

SPSS versão 11, com base nos dados brutos dos registros de óbitos e nascimento do

DSEI-Leste, em Excel.

3.1.2 – Questão ética

O projeto de pesquisa foi submetido à avaliação e aprovado pelo Comitê de

Ética em Pesquisa (CEP) da Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca, Parecer

N.º 65/05/CEP de 22/06/2005 e Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (CONEP) em

19/09/2005, Parecer N° 1598/2005.

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Capítulo 4

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41

4.1 - Resultados

4.1.1 – Composição etária

Infelizmente a partir das bases de dados utilizadas neste estudo não é possível ter

acesso às idades ano a ano ou a população estratificada por sexo. Diante disso as

análises apresentadas são referentes à composição populacional em grandes grupos

etários.

Em 2004, 52,1% da população tinham menos de 15 anos de idade. A parcela de

indivíduos com mais de 65 anos era de 3,9%. Essa composição etária é típica de

populações com altas taxas de natalidade e de mortalidade. Ao longo do período de

2002 a 2004 a população cresceu de 27.455 para 31.111 indivíduos, ou seja, teve um

incremento natural de 3,7% ao ano (Tabela 1).

Tabela 1 – População absoluta e relativa por grupos de idade, DSEI-Leste, RR, Brasil,

2004.

Grupo etário N % Freq. acumulada

< 5 anos 5479 17,6 17,6

5 a 14 10747 34,5 52,1

15 a 59 13665 43,9 96,1

60 e + 1220 3,9 100,0

Total 31111 100,0

4.1.2 - Natalidade

A taxa bruta de natalidade média (número de nascidos vivos/total da população

multiplicado por 1000) para o período analisado foi de 42,1 por mil habitantes (Tabela

2). Em 2004 e 2002 observam-se o menor e o maior índice, quais sejam: de 39,6 e 43,5

por mil, respectivamente.

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42

Tabela 2- Taxa bruta de natalidade (TBN) por mil habitantes no DSEI - Leste, RR,

Brasil, 2002-2004.

Ano Variável

2002 2003 2004 2002-2004

Nascidos vivos 1195 1291 1231 3717

População 27455 29750 31111 88311

TBN 43,5 43,4 39,6 42,1

Os valores da “ razão de sexo” ao nascer, medida definida como o número de

homens que corresponde a 100 mulheres, estão indicados na Tabela 3. Com exceção do

ano de 2002, nota-se o predomínio do sexo masculino ao nascer.

Tabela 3- Razão de sexo ao nascer (por 100 mulheres), DSEI-Leste, RR, Brasil, 2002-

2004.

Ano Masculino Feminino Razão de sexo

2002 583 612 95,3

2003 656 635 103,3

2004 638 593 107,6

Total 1877 1840 102,0

A descrição das variáveis listadas na Tabela 4 para o período compreendido

entre 2002 a 2004 levou em consideração apenas os dados que foram registrados na

Declaração de Nascidos Vivos e considerados válidos. Cerca de 60% dos partos se

concentraram no grupo de mulheres de idade de 20 a 34 anos. Do total de 3716 partos

ocorridos no distrito sanitário, 97,26% foram normais. Mais de 99% das gestantes

tiveram gravidez única. O peso ao nascer analisado para o ano com melhor informação

dessa variável, ou seja, em 2004, registrou proporção de 67% para pesos acima de

3.000g. E cerca de 59% dos nascimentos ocorreram no domicílio.

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43

Tabela 4 – Características dos nascidos vivos por idade reprodutiva da mãe, tipo de

parto, da gestação, peso ao nascer e local de ocorrência do nascimento, DSEI-Leste,

Roraima, Brasil, 2002-2004.

Variável Nº absoluto Proporção

Idade materna 10 a 19 anos 925 27,1 20 a 34 anos 2079 60,8 35 anos e + 411 12,0 Parto Normal 3614 97,3 Cesário 102 2,7 Gravidez Única 1218 99,2 Dupla 9 0,7 Tripla 1 0,1 Peso ao nascer (ano 2004) < 1500g 2 0,3 1500g a 2499g 65 8,0 2500g a 2999g 192 23,8 3000g e + 547 67,8

Local da ocorrência do Nascimento Hospital 1116 30,1 Domicílio 2193 59,0 Posto de saúde 388 10,4 Outros 22 0,6

4.1.3 – Fecundidade

Examinando as taxas específicas de fecundidade (número de nascimentos vivos

de mães de determinada idade em um dado ano, dividido pelo número de mulheres

desta idade na população, multiplicado por cem ou por mil) por grupos etários decenais

constata-se que em 2004 o ápice da fecundidade ocorreu entre mulheres de 20-24 anos.

A taxa de fecundidade total (número médio de filhos que uma mulher teria ao terminar

o período reprodutivo, obtido a partir do conjunto de TEFs) foi de 5,8 filhos por mulher

(Tabela 5). Para o mesmo ano foi encontrada uma taxa fecundidade global (relação

entre o número de nascidos vivos ocorridos no ano e o contingente de mulheres em

idade fértil daquele mesmo ano) indica que, de cada mil mulheres em idade reprodutiva

(10-49 anos), nasceram 145 crianças vivas.

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44

Tabela 5 – Taxa de fecundidade específica por grupo de idade (TEF), por mil mulheres,

DSEI-Leste do Estado de Roraima, Brasil, 2004.

Grupo etário População *NV **TFEs/1000

10 a 14 2299 39 16,9 15 a 19 1664 313 188,1 20 a 24 1248 351 281,2 25 a 29 985 226 229,4 30 a 34 821 159 193,6 35 a 39 570 104 182,4 40 a 44 489 30 61,3 45 a 49 380 6 15,7 Total 8456 1228 1168,6 TFT 5,8 TFG 145

*Nascidos Vivos ** Taxa de fecundidade específica por mil nascimentos por mulheres pertencente a certa classe de idade.

A Figura 6 ilustra o comportamento das taxas específicas de fecundidade por

idade. A curva apresenta tendência crescente a partir do grupo etário de 15-19 anos até

atingir seu ponto máximo entre 20-24 anos, declina posteriormente, ainda que apresente

um leve incremento na faixa de 35-39 anos e em seguida passa a declinar bruscamente

até 40-49 anos.

Figura 6 - Taxa específica de fecundidade no DSEI-Leste RR, Brasil, 2004

0

50

100

150

200

250

300

10 a 14 15 a 19 20 a 24 25 a 29 30 a 34 35 a 39 40 a 44 45 a 49

Grupo etário

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45

4.1.4 – Mortalidade

A Tabela 6 apresenta a distribuição da mortalidade absoluta e relativa por sexo e

faixa etária. Observa-se no geral que o sexo masculino contribui com 20 % a mais do

que os óbitos do sexo feminino. Mas a proporção de óbitos na faixa etária de menor de

um ano foi maior para o sexo feminino.

Tabela 6 - Freqüência absoluta e relativa de óbito por faixa etária e sexo, DSEI - Leste,

RR, Brasil, 2002-2004.

2002 2003 2004 2002-2004 % Faixa

etária M F Total M F Total M F Total M F M F Total

< 1ano 33 32 65 33 25 58 32 31 63 98 88 39,0 42,5 40,6

01 a 04 7 4 11 2 6 8 3 5 8 12 15 4,8 7,2 5,9

05 a 14 3 7 10 2 5 7 5 3 8 10 15 4,0 7,2 5,5

15 a 24 7 6 13 3 3 6 8 4 12 18 13 7,2 6,3 6,8

25 a 34 7 0 7 3 2 5 4 2 6 14 4 5,6 1,9 3,9

35 a 44 3 3 6 6 1 7 4 0 4 13 4 5,2 1,9 3,7

45 a 54 7 4 11 3 2 5 3 3 6 13 9 5,2 4,3 4,8

55 a 64 3 4 7 7 4 11 1 2 3 11 10 4,4 4,8 4,6

65 e + 21 13 34 22 20 42 19 16 35 62 49 24,7 23,7 24,2

Total 91 73 164 81 68 149 79 66 145 251 207 100 100 100

No período de 2002 a 2004, as taxas brutas de mortalidade no DSEI-Leste do

Estado de Roraima oscilaram entre 4,7 e 5,9 por mil. A taxa média para o período foi de

5,2 por mil (Tabela 7).

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46

Tabela 7- Taxas brutas de mortalidade (TBM), por mil habitantes, DSEI-Leste,RR,

Brasil, 2002-2004.

Indicador 2002 2003 2004 2002-2004

N de óbitos 164 148 145 458

População 27455 29750 31106 88311

TBM 5,9 4,9 4,7 5,2

Na tabela 8, observa-se a mortalidade proporcional (número de óbitos segundo

faixa etária pelo total de óbitos multiplicado por 100) para o período de 2002 a 2004.

Nesse período analisado, destaca-se elevada proporção de óbitos para os menores de 1

ano de idade, com uma mortalidade proporcional de 40,6. Para o grupo de 50 anos e

mais ou razão de mortalidade proporcional (índice de Swaroop & Uemura) a proporção

de mortes é também elevada, correspondendo a 31% do total dos óbitos.

Tabela 8 – Distribuição absoluta e relativa dos óbitos, de acordo com a faixa de idade,

no DSEI-Leste de Roraima, Brasil, 2002-2004.

2002 2003 2004 Total Mortalidade

proporcional N % N % N % N %

< de 1 ano 65 39,6 58 39,2 63 43,4 186 40,6

1 a 4 anos 11 6,7 8 5,4 8 5,5 27 5,9

5 a 19 anos 18 11,0 10 6,8 17 11,7 45 9,8

20 a 49 anos 22 13,4 18 12,2 17 11,7 58 12,7

50 e mais 48 29,3 54 36,5 40 27,6 142 31,0

Total 164 100 148 100 145 100,0 458 100,0

A Figura 7 apresenta a curva de mortalidade proporcional indicadora de níveis

de saúde (baseada em Moraes, 1959). A curva demonstra condições precárias de saúde

para o conjunto da população do DSEI-Leste. Pela classificação de Nelson de Moraes, o

DSEI-Leste estaria entre o tipo II e III, ou seja, caracterizado pelo predomínio de óbitos

nas faixas infantis seguido de nítido aumento da proporção de óbitos de indivíduos de

50 anos ou mais.

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47

Figura 7 - Curva de mortalidade proporcional no DSEI-Leste, RR, Brasil, 2002-2004.

0

5

10

15

20

25

30

35

40

45

< 1 1 a 4 5 a 19 20 a 49 50 e +

Grupo etário

Mor

talid

ade

pro

por

cion

al

A taxa de mortalidade infantil para o período de 2002 a 2004, oscilou de 44,9 a

54,4 com uma taxa média de 50,0 óbitos por mil nascidos vivos (Tabela 9). Mesmo

considerando o curto período de tempo analisado e a instabilidade dos pequenos

números observa-se pequenas variações.

Tabela 9- Taxa de mortalidade infantil no DSEI-Leste, RR, Brasil, 2002 a 2004.

Taxa de mortalidade infantil 2002 2003 2004 Total

Óbitos em menor de 1 ano 65 58 63 186

Nascidos vivos (NV) 1194 1293 1231 3718

Taxa de mortalidade infantil/1000 NV 54,4 44,9 51,2 50,0

A mortalidade na infância apresenta taxa média para menores de 5 anos de idade

de 13,7 por mil habitantes e proporção acima de 17% em relação à totalidade dos óbitos

verificados para o período analisado (Tabela 10).

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48

Tabela 10- Mortalidade específica por idade, por mil habitantes, DSEI - Leste, RR,

Brasil, no período de 2002-2004.

Faixa etária População % Óbitos Mortalidade

específica

< 5 anos 15557 17,6 213 13,7

5 a 14 anos 30491 34,5 25 0,8

15 a 59 anos 38802 43,9 98 2,5

60 e mais anos 3462 3,9 122 34,9

Total 88312 100,0 458 5,2

A mortalidade infantil é composta pela mortalidade neonatal (precoce e tardia)

representada pelos óbitos em menores de 28 dias, e pós neonatal para óbitos de 28 dias a

um ano. Como podemos ver na Tabela 11, 46,8% e 42,5% do total de óbitos em

menores de um ano foram concentrados nos componente neonatal precoce e pós-

neonatal respectivamente. Podemos ver também que para cada mil crianças nascidas

vivas, 23 aproximadamente morreram na primeira semana de vida e 29 morreram antes

de completar 28 dias de vida. A taxa de mortalidade infantil foi de 50 por mil nascidos

vivos.

Tabela 11- Mortalidade infantil por componente neonatal no DSEI-Leste de Roraima,

Brasil, 2002-2004.

Indicador População Óbitos *MP Taxa Específica/1000

Neonatal precoce - 87 46,8 23,4

Neonatal tardio - 20 10,8 5,4

Pós-neonatal - 79 42,5 21,2

Total 3717 186 100,0 50,0

*Mortalidade Proporcional

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49

No período de 2002-2004, ocorreram 60 óbitos fetais, o que corresponde a uma

taxa de mortalidade perinatal de 38,9, ou seja, o risco de morrer antes do nascimento, no

parto e na primeira semana de vida é de 39 crianças por mil nascimentos.

A Tabela 12 apresenta o número de óbitos por componente neonatal e a

mortalidade proporcional, segundo os capítulos da 10ª revisão da Classificação

Internacional de Doenças (CID 10). Ao todo, foram registrados 186 óbitos. Destes, 94

foram devido a algumas afecções originadas no período perinatal, correspondendo a

aproximadamente 50% de todos os óbitos, ou seja, cerca de uma entre cada duas mortes

em menores de um ano registradas foram devidas às afecções originadas no período

perinatal. Em segundo lugar aparecem as doenças do aparelho respiratório, seguido

pelas doenças endócrinas, nutricionais e metabólicas.

Tabela 12 – Óbitos registrados e mortalidade proporcional segundo causa agrupadas

pelos Capítulos da CID (10º revisão), em menores de 1 ano de idade por componentes

neonatais, DSEI-Leste-RR, Brasil, 2002 a 2004.

Óbitos por componentes neonatais NP NT PN Total MP

Afecções originadas no período perinatal 83 11 0 94 50,5

Doenças do aparelho respiratório 0 2 28 30 16,1

Doenças endócrinas,nutricionais e metabólicas 0 1 15 16 8,6

Causas mal definidas 0 0 15 15 8,1

Malformação congênita 3 4 6 13 7,0

Doenças infecciosas e parasitárias 1 1 8 10 5,4

Causas externas de morbidade e mortalidade 0 1 2 3 1,6

Doenças do sistema nervoso 0 0 3 3 1,6

Doenças do aparelho circulatório 0 0 1 1 0,5

Doenças do aparelho geniturinário 0 0 1 1 0,5

Total 87 20 79 186 100,0

NP- Neonatal Precoce/ NT- Neonatal Tardio/ PN- Pós-neonatal / MP- Mortalidade Proporcional

A Tabela 13 mostra a proporção de óbitos em menor de um ano de idade por

local de ocorrência. Verifica-se que 43% do total de óbitos ocorreram na aldeia

(domicílio) e 18% no hospital. Também foi observado que 34% dos registros de óbitos

não constavam o local de ocorrência.

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50

Tabela 13- Proporção de óbitos em menores de 1 ano por local de ocorrência no DSEI-

Leste, RR, Brasil, 2002-2004.

Local de ocorrência Número de óbitos Proporção

Hospital 33 17,7

Domicílio 81 43,5

Posto de Saúde 2 1,1

Em trânsito 7 3,8

Sem preenchimento 63 33,9

Total 186 100,0

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Capítulo 5

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52

5.1 Considerações gerais

Os resultados dessa dissertação mostram que a população do Distrito Sanitário

Especial Indígena do Leste do Estado de Roraima (DSEI – Leste de Roraima) apresenta

uma composição etária predominantemente de jovens, com 52% com menos de 15 anos

de idade. Esse achado está em concordância com outros estudos em demografia

indígena no país (Camargo et al., 2005; Early & Peters, 1990; Flowers, 1994; Pagliaro,

2005; Souza & Santos, 2001; Teixeira & Brasil, 2005).

O índice de masculinidade ou razão de sexo ao nascimento mostra uma razão

média de 102 homens para cada 100 mulheres. Também nesse caso os resultados não

destoam de outros estudos de caso (ver Pagliaro et al., 2005a).

O crescimento populacional observado para a população indígena do DSEI-

Leste de Roraima ao longo do período analisado foi de 3,7% ao ano. Este achado é

muito próximo de outros estudos realizados em populações indígenas, tais como os

Kamaiurá (Camargo et al., 2005) e os Xavánte de Pimentel Barbosa (Coimbra Jr. et al.,

2002; Flowers, 1994). Se considerarmos a estimativa apontada por Azevedo (2000), que

considera as informações oriundas de estudos dos autores acima, o crescimento

observado neste distrito é superior ao da população brasileira.

Na literatura específica sobre populações indígenas é amplamente sinalizado que

os indicadores de fecundidade e de mortalidade, assim como outros parâmetros

demográficos, são consideravelmente diferentes dos observados para a população

brasileira. No DSEI-Leste de Roraima, a taxa bruta de natalidade observada entre os

indígenas foi de 42,1 por mil, e taxa de fecundidade total próxima de 6,0 filhos nascidos

vivos por mulher. Essa taxa é mais do que duas vezes superior à encontrada para a

população geral brasileira, de 2,1 filhos por mulher (IBGE, 2005). Taxas de fecundidade

total superiores àquelas indicadas neste estudo foram observadas em diversas

populações indígenas (Early & Peters, 1990; Flowers, 1994; Souza & Santos, 2001,

entre outros). As diferenças podem estar relacionadas a características dos intervalos

interpartais, momento de iniciação da vida sexual, acesso a contraceptivos, níveis de

escolaridade, permanência ou não de práticas poligínicas, entre muitos outros aspectos.

A taxa de mortalidade geral no DSEI-Leste de Roraima foi de 5,2 por mil

habitantes no período. Vale destacar que essa taxa deve ser interpretada com cautela,

uma vez que é bastante influenciada pela composição etária da população. É muito

possível que esta taxa, no caso do DSEI – Leste de Roraima esteja subestimada devido à

sub-registro. Taxa superior à observada neste distrito foi encontrada na população

Xavánte de Sangradouro-Volta Grande, com 9,1 por mil habitantes, que muito

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provavelmente apresenta melhores registros de óbito (Souza & Santos, 2001). Apenas

quatro municípios dos quinze existentes em Roraima apresentam taxas maiores que 6,5

por mil habitantes. Ainda assim Roraima tem a melhor cobertura do SIM da região

norte do Brasil (SVS/MS, 2005).

A mortalidade proporcional para o período de análise foi elevada para menores

de um ano de idade e para o grupo de 50 anos e mais, com 40,6% e 31,0%,

respectivamente. Esta situação é caracterizada pelo predomínio de óbitos nos dois

extremos etários, indicando níveis de saúde muito baixo da população atendida pelo

DSEI-Leste de Roraima.

A taxa média de mortalidade infantil calculada entre 2002 a 2004 (50,0/1000

nascidos vivos) superou em muito a estimativa para o Estado de Roraima em 2003

(17,3/1000). Além disso, foi superior à média nacional para crianças não indígenas em

1999-2000 (31,8/1000) e levemente inferior à média registrada para os 34 distritos em

2001 (56,5/1000) (Garnelo et al., 2003). Essa taxa sinaliza para uma importante

desigualdade da população indígena do DSEI – Leste de Roraima em relação não

somente à população não-indígena do Estado, como também a população nacional.

Como no caso de outras populações indígenas, os agravos por doenças infecciosas e

parasitárias passíveis de controle por ações de saneamento básico, de promoção à saúde

como, por exemplo, a adoção da terapia de reidratação oral (TRO) possivelmente foram

importantes fatores que influenciaram as elevadas taxas de mortalidade infantil

observadas (Garnelo et al., 2003; Santos & Coimbra Jr., 2003).

De acordo com Garnelo et al. (2005), em estudo realizado sobre as dimensões e

potencialidades dos sistemas de informação geográfica na saúde indígena, há uma

concentração de óbitos elevados para o conjunto dos 34 distritos sanitários do país. Há

sete DSEI que apresentam taxas inferiores à média nacional, entre os quais o DSEI –

Leste de Roraima, com 25,9/1000 nascidos vivos. Esta análise tomou como base os

dados do SIASI. Entretanto, a autora indaga se estes indicadores são produtos de sub-

registros e não de bons níveis de saúde.

A análise conduzida neste estudo demonstra uma situação bem diferente daquela

apresentada por Garnelo et al. (2003) para o DSEI – Leste de Roraima, no qual a taxa de

mortalidade infantil reportada foi de 25,9/1000 em 2001. A comparação entre os

resultados deste trabalho (50,0/1000) e essa taxa, oriunda de dados do Departamento de

Saúde Indígena, aponta para problemas particularmente sérios de registro dos

nascimentos e mortes que estão sendo encaminhados para o nível central.

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Comparando as taxas de mortalidade neonatal precoce e pós-neonatal dos

indígenas de Roraima com as estimadas para o Estado de Roraima e Região Norte do

Brasil em 2002 (Secretaria de Vigilância em Saúde/SVS/MS), notam-se diferenças

substanciais. A taxa média da mortalidade neonatal precoce observada no DSEI-Leste

de Roraima (23,4/1000 nascidos vivos) foi três vezes maior do que a taxa observada

para o Estado de Roraima (7,2/1000 nascidos vivos) e quase o dobro da taxa encontrada

para a Região Norte do país (13,5/1000 nascidos vivos). O mesmo foi verificado para a

mortalidade pós-neonatal, com taxas de 21,3/1000 nascidos vivos para o DSEI-Leste,

6,5/1000 nascidos vivos para o Estado de Roraima e 9,9/1000 nascidos vivos para a

Região Norte do país, em 2002.

Segundo Rouquayrol et al. (1996), a mortalidade fetal é influenciada pelas

mesmas circunstâncias e etiologias que a mortalidade neonatal precoce. Com uma taxa

de mortalidade perinatal em torno de 38,9/1000 nascimentos observada no DSEI – Leste

de Roraima, conclui-se que o risco de morrer nesse distrito antes do nascimento e na

primeira semana de vida é elevado. Esse achado evidencia uma deficiência na

assistência dos serviços de saúde. De acordo com Cartlidge & Stewart (1995) fatores

biológicos, sociais, econômicos, políticos, demográficos e de assistência à saúde

interagem e dificultam o controle da mortalidade perinatal.

Inquestionavelmente, com a implantação do DSEI-Leste de Roraima, ocorreram

avanços na política de assistência à saúde indígena, como o aumento do acesso aos

serviços. Entretanto, as altas taxas de mortalidade infantil neonatal e perinatal

evidenciam deficiências na assistência, principalmente de profissionais capacitados para

atuar em contextos interculturais e na assistência a gestante e ao recém nascido.

Segundo Amar et al. (1996), há disparidades significantes das taxas de

mortalidade infantil e por causas perinatais entre os diferentes níveis socioeconômicos

de uma sociedade, prevalecendo as mais elevadas taxas de mortalidade para os grupos

sociais menos favorecidos economicamente.

Analisando os óbitos por local de ocorrência, verificou-se que 65,5% dos óbitos

aconteceram nas comunidades (e no próprio domicílio) e, portanto, menos de um terço

em hospital de referência localizado na capital do Estado. Grande parcela dos óbitos no

DSEI-Leste de Roraima ocorre sem assistência médica-hospitalar, sendo assistidos

basicamente por parteiras tradicionais e agentes indígenas de saúde. Quando há redução

das mortes no período neonatal tardio, os óbitos proporcionalmente se concentram na

primeira semana de vida, estabelecendo uma relação cada vez mais próxima com

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assistência de saúde dispensada durante o período do pré-parto, parto e atendimento

imediato à criança (Lansky et al., 2002a, 2002b).

As causas perinatais se constituíram na primeira causa básica de mortalidade

infantil no DSEI – Leste de Roraima (50,5%), reforçando a constatação sobre a

precariedade da assistência na gestação e parto. A seguir aparecem as doenças do

aparelho respiratório (16,1%). Entre a população nacional, a chance de morrer por

causas perinatais em 2001 foi seis vezes maior em relação às causas infecciosas (MS,

2005). Essa relação foi quase dez vezes maior para a população indígena do DSEI –

Leste de Roraima. Outra causa observada de óbito diz respeito às malformações

congênitas.

Observa-se a partir do presente estudo que os principais indicadores de saúde,

em especial aqueles relativos à mortalidade infantil, foram piores que os apresentados

para o Estado de Roraima, assim como para a média da Região Norte e população

brasileira no período analisado, o que sugere precariedade das condições de saúde. A

desigualdade social se expressa por meio desses indicadores, demonstrando o quanto

esses grupos estão à margem dos benefícios das políticas públicas, apesar da

implantação do novo modelo de atenção a partir de 1999.

Os sistemas de informação têm importância nas ações de saúde, sobretudo

quando as partes que os constituem se relacionam de maneira integrada. Estas partes são

os componentes ligados à recepção, processamento, análise e difusão de dados, desde os

instrumentos de coleta (prontuários, fichas de vacinação) passando por todos os recursos

disponíveis para transformá-los, incluindo (mas não se limitando) os recursos

computacionais (Sanches et al., 2005:337). Nesse sentido nenhum sistema é capaz de

fornecer informações com qualidade se um dos processos de suas etapas não cumprirem

com suas atribuições de registrar corretamente os dados estabelecidos para a sua

consolidação, análise e disseminação da informação. O produto processado num sistema

deve contribuir com informações que possibilitem subsidiar políticas públicas, com o

intuito de “diminuir as desigualdades sociais e ao mesmo tempo subsidiar o processo

decisório na área da saúde visando uma atenção com efetividade, qualidade e respeito à

singularidade de cada indivíduo” , assim como deve considerar as peculiaridades de cada

população (Moraes, 2002).

A implantação do sistema de informação para atender o subsistema de atenção à

saúde indígena constitui um aspecto importante na atual Política Nacional de Atenção à

Saúde dos Povos Indígenas, gerenciada pela Fundação Nacional de Saúde (FUNASA).

Entretanto, este sistema não vem atendendo à expectativa que se criou quando da sua

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implantação, em razão de uma série de problemas relacionados à falta de infra-estrutura

observada em muitos distritos sanitários, que sem as quais não é possível

operacionalizar o sistema. A pouca valorização da vigilância em saúde tem colaborado

para baixa credibilidade do mesmo.

Como bem descreveram Sousa et al. (2006) sobre a efetividade do Sistema de

Informação da Atenção à Saúde Indígena (SIASI),

“Existem alguns aspectos extremamente frágeis na sua concepção e

operacionalização, destacando-se que a normatização da rotina de fluxo para a

notificação dos casos de doenças de notificação compulsória, como a

sistematização do uso das fichas de notificação e investigação, no sistema, dos

casos atendidos na rede do SUS, decorrentes da pouca integração e da não

incorporação dessas fontes notificadoras, embora sendo a saúde indígena um

subsistema do SUS. Cita-se ainda a subnotificação da morbidade em geral,

decorrentes da descontinuidade da assistência nas aldeias, tornando-se

praticamente impossível resgatar essa informação nos períodos de ausência das

equipes em área. A não permanência das equipes em área também ocasiona uma

demora no envio dos dados para as demais instâncias”.

Um outro problema do SIASI é o tempo decorrido para entrada dos dados desde

a coleta até a entrada no sistema informatizado. Em muitos pólos-base do DSEI – Leste

de Roraima as informações são somente enviadas a cada 30 dias, o que inviabiliza

qualquer ação de intervenção pelos serviços de vigilância. Somado a isso, há também a

questão da morosidade na alimentação dessas informações no sistema. Portanto, falta

agilidade ao sistema para subsidiar atividades de vigilância em saúde.

A análise exploratória das informações constantes no sistema de informação da

atenção a saúde indígena (SIASI) implantado no DSEI-Leste de Roraima apontou

considerável fragilidade. Assim, ainda não estavam disponibilizadas as informações de

registros de eventos vitais para os anos que compreende este estudo. Por esta razão,

trabalhou-se com as informações registradas pelos agentes indígenas de saúde e pela

equipe médica em Boletins de Eventos Vitais, os quais são regularmente alimentados

numa base de dados do Sistema de Mortalidade e do Sistema de Nascidos Vivos

implantado no DSEI. Tal como o SIASI, estas fontes apresentam limitações com relação

a variáveis relacionadas ao recém nascido, tais como, peso ao nascer; idade da mãe,

paridade e estado civil e nível de escolaridade.

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57

Sem o intuito de propor uma lista exaustiva, a partir dos resultados deste estudo,

para um efetivo desenvolvimento da atenção básica de saúde no DSEI – Leste de

Roraima podem ser sugeridas algumas estratégias:

● Para reduzir a mortalidade infantil é necessário investir na reestruturação dos

serviços de saúde já instalados nas sedes municipais, capacitar recursos humanos,

redefinir e regionalizar o atendimento à gestante, ao parto e ao recém nascido, o que

permitirá ampliar os serviços de referência à maternidade e encurtar o tempo de

atendimento e facilitar o acesso geográfico. É importante também investigar os óbitos

perinatais e neonatais no sentido de permitir a avaliação da assistência, assim como a

sua monitoração. As equipes médicas do distrito devem ter uma atuação mais

permanente nas comunidades e/ou Pólo-base, no sentido de prestar uma atenção

oportuna, principalmente àquelas relativas ao programa materno infantil.

● Realizar a capacitação das equipes de saúde, principalmente dos agentes

indígenas de saúde e de saneamento, sobre a importância do sistema de informação no

desempenho de suas atividades, com ênfase no preenchimento dos registros de eventos

vitais e o encaminhamento oportuno dos dados a central de processamento e análise

(sede do DSEI).

● Propor a adequação do Sistema de Informação da Atenção à Saúde Indígena

(SIASI) com vistas a viabilizar a interface com os sistemas de informação do Ministério

da Saúde.

● Aumentar os investimentos em ações de saneamento básico e de

abastecimento de água para todas as comunidades indígenas.

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