Milton Santos

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TRABALHO COMPLETO PARA APRESENTAÇÃO NO EDP – XVI ENG Nome: Dante Chiavareto Pezzin Apoio: CNPq Projeto: “CONTRIBUIÇÃO PARA A ANÁLISE DOS PROCESSOS DE FORMAÇÃO DAS CRISES ECONOMICAS NO CAPITALISMO – UM ESTUDO SOBRE O CONCEITO DE “ACUMULAÇÃO POR ESPOLIAÇÃO” EM DAVID HARVEY” RESUMO A crise econômica, ou como alguns cientistas sociais vêm chamando, a Grande Recessão de 2007-2009, evidenciou que, apesar das últimas décadas do século XX terem se caracterizado pela complexificação das estratégias de acumulação de capital, delineou-se um novo ciclo de desvalorização produtiva, impulsionado pela contração de crédito e o aumento do desemprego, ocasionando uma série de efeitos como a concentração de capitais e a socialização dos prejuízos. Tal ciclo apresentou semelhanças e algumas particularidades em relação aos ciclos anteriores, e neste sentido, a presente pesquisa expõe a análise contemporânea sobre a relação entre crise econômica, processos sócio-espaciais , e a influência do poder do Estado. Posteriormente será apresentado como a geografia se insere dentro de um “terceiro corte” à teoria das crises, e de que modo o Estado, ao possuir o monopólio da violência e de uma instância jurídico-política atua para efetivar o conjunto de práticas denominado por “acumulação por espoliação”. O objetivo desta pesquisa é demonstrar como a conjugação destes fatores assume um caráter central para a compreensão dos mecanismos de formação e resolução das crises econômicas no capitalismo. 1. Um inevitável comentário sobre a obra Limits to capital Em seu estudo sobre o Novo Imperialismo, David Harvey busca sintetizar os pontos fundamentais de uma análise iniciada há mais de trinta anos e ainda inconclusa. É constante em sua obra a referência e a evolução deste debate, onde o autor procura compreender os nexos entre geografia e economia dentro do capitalismo, a partir da leitura dos clássicos da Economia Política, em especial, a obra de Karl Marx. Segundo Rosdolsky (1968: 88-9), a estrutura inicial do plano de trabalho de Marx consistia em apreender os aspectos fundamentais do capitalismo, a saber: o capital, o trabalho assalariado, a propriedade fundiária, o Estado, o comércio exterior e o mercado mundial. Como o próprio autor assinala, Marx não conseguiu realizar um estudo sistematizado sobre os três últimos temas. Contudo, no que se refere à questão da natureza do Estado capitalista, com as exceções de Lênin e Gramsci, pode-se afirmar que a partir da obra de Ralph Miliband, o tema foi trabalhado com maior intensidade na perspectiva materialista-dialética, gerando um debate subseqüente ainda em curso. Realizado de 25 a 31 de julho de 2010. Porto Alegre - RS, 2010. ISBN 978-85-99907-02-3 1

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Análise da obra Por uma outra globalização, de Milton Santos

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  • TRABALHO COMPLETO PARA APRESENTAO NO EDP XVI ENG

    Nome: Dante Chiavareto PezzinApoio: CNPqProjeto: CONTRIBUIO PARA A ANLISE DOS PROCESSOS DE FORMAODAS CRISES ECONOMICAS NO CAPITALISMO UM ESTUDO SOBRE OCONCEITO DE ACUMULAO POR ESPOLIAO EM DAVID HARVEY

    RESUMO A crise econmica, ou como alguns cientistas sociais vm chamando, a Grande Recesso de

    2007-2009, evidenciou que, apesar das ltimas dcadas do sculo XX terem se caracterizadopela complexificao das estratgias de acumulao de capital, delineou-se um novo ciclo dedesvalorizao produtiva, impulsionado pela contrao de crdito e o aumento do desemprego,ocasionando uma srie de efeitos como a concentrao de capitais e a socializao dosprejuzos. Tal ciclo apresentou semelhanas e algumas particularidades em relao aos ciclosanteriores, e neste sentido, a presente pesquisa expe a anlise contempornea sobre a relaoentre crise econmica, processos scio-espaciais , e a influncia do poder do Estado.Posteriormente ser apresentado como a geografia se insere dentro de um terceiro corte teoria das crises, e de que modo o Estado, ao possuir o monoplio da violncia e de umainstncia jurdico-poltica atua para efetivar o conjunto de prticas denominado por acumulaopor espoliao. O objetivo desta pesquisa demonstrar como a conjugao destes fatoresassume um carter central para a compreenso dos mecanismos de formao e resoluo dascrises econmicas no capitalismo.

    1. Um inevitvel comentrio sobre a obra Limits to capitalEm seu estudo sobre o Novo Imperialismo, David Harvey busca sintetizar os pontos

    fundamentais de uma anlise iniciada h mais de trinta anos e ainda inconclusa. constante emsua obra a referncia e a evoluo deste debate, onde o autor procura compreender os nexosentre geografia e economia dentro do capitalismo, a partir da leitura dos clssicos da EconomiaPoltica, em especial, a obra de Karl Marx.

    Segundo Rosdolsky (1968: 88-9), a estrutura inicial do plano de trabalho de Marx consistiaem apreender os aspectos fundamentais do capitalismo, a saber: o capital, o trabalhoassalariado, a propriedade fundiria, o Estado, o comrcio exterior e o mercadomundial. Como o prprio autor assinala, Marx no conseguiu realizar um estudo sistematizadosobre os trs ltimos temas. Contudo, no que se refere questo da natureza do Estadocapitalista, com as excees de Lnin e Gramsci, pode-se afirmar que a partir da obra de RalphMiliband, o tema foi trabalhado com maior intensidade na perspectiva materialista-dialtica,gerando um debate subseqente ainda em curso.

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  • Jessop destaca bem em seu comentrio sobre a obra de Harvey, a idia original do autor,evidenciando sua tentativa de contribuir para uma anlise sistematizada do comrcio exterior edo mercado mundial, os quais se originam do prprio conceito do capital, de modo semelhanteaos outros temas no plano de trabalho de Karl Marx:

    Harvey began to develop a theory of foreign trade and the worldmarket in his arguments about spatial fixes and the general dynamics ofimperialism. Having incisevely analysed how the credit system promoteda provisional, contradictory, and eventually crisis-magnifying temporalfix for capital accumulation in his second cut at crisis theory, Harveyoffers a third cut analysis based on capital s attempts to secure aspatial fix overcome the barriers to accumulation. It is quite logical,following Marx s scheme in this regard, that the final chapter of Limitsintroduces a third cut at crisis theory, the role and the limits of externalmarkets in temporarily resolving capital s crisis tendencies, and the coreof dialectics of imperialism (Antipode, 2004: 488-9).

    Assim, Harvey conclui na obra Limits to capital, ambos os temas no conceito deintegrao espacial, onde ocorre o enlace da produo de mercadorias em diferentessituaes atravs do intercmbio que constitui o processo de realizao do valor em trabalhoabstrato. Deste modo, a temtica da integrao espacial ponto fundamental do modo deproduo capitalista, em um grau de importncia semelhante ao Estado ou a propriedadefundiria. O estudo sobre o tema desenvolvido de modo detalhado e, neste sentido, o autorprope o terceiro corte teoria das crises econmicas, no qual, existe uma relao diretaentre as crises econmicas e o desenvolvimento geogrfico desigual, uma vez que este ltimopossui um papel crucial para a mobilidade de capital e trabalho. A integrao espacial docapitalismo amplia a escala do desenvolvimento geogrfico desigual, em sua tendncia deunificar os fatores produtivos sob a lgica de mercado. Pretende-se analisar nesta pesquisa deque forma este movimento contribui para a formao e a resoluo de crises econmicas.

    Em O novo imperialismo, o autor vai alm em seu estudo sobre os fatores geogrficos dosprocessos de formao e resoluo das crises, destacando o debate sobre a acumulaoprimitiva, em seus fundamentos, em seu carter contnuo ou diferenciado, e em suasdecorrncias, como as prticas imperialistas.

    2. Acumulao por espoliao e Desenvolvimento geogrfico desigualCom o objetivo de compreender o processo de integrao espacial no capitalismo, o autor

    inicia ento o que anos mais tarde afirmaria ser a maior batalha intelectual de sua vida(Antipode, 2004: 545), dado o grau de complexidade de sua pesquisa. Neste trabalho, foiabordada uma diversidade de temas, incluindo o imperialismo enquanto um processo que implicana desvalorizao produtiva, decorrente da expanso do capital financeiro, at os processosenfatizados pelos clssicos da geografia econmica, constituindo as teorias das vantagens

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  • locacionais. A abrangncia da anlise obriga esta pesquisa a ignorar alguns temas relevantes dolivro, que, contudo, no esto diretamente ligados proposta do conceito de acumulao porespoliao, desenvolvido recentemente pelo autor. Dentre os temas fundamentais da obra deMarx, utilizados por Harvey para a compreenso da centralidade dos processos de integraoespacial no capitalismo, destacam-se os seguintes:

    a) Lei da queda tendencial da taxa de lucroEste processo, definido por Mazzucchelli (1985) como a condensao das leis imanentes

    do capital, parte da formao do dinheiro e da circulao mercantil, que fraturam a unidadeexistente na troca direta. Neste processo, separa-se a produo da circulao, de modo queestas passam a manter uma independncia relativa, apesar de sua unidade. Segundo a anlise deambos os autores, durante as fases de expanso das relaes de produo, o desenvolvimentodas foras produtivas tende a se autonomizar em relao demanda, uma vez que a produode valores-de-uso dentro do capitalismo (mercadorias), no realizada para a satisfao denecessidades sociais, mas sim, para a prpria valorizao do capital. Desta forma, cria-se umacontradio baseada na relao entre uma tendncia a desenvolver as foras produtivas deforma absoluta e as condies especficas nas quais o capital se movimenta, condies estas,que determinam os limites materiais de sua valorizao. Este movimento, associado redundncia do trabalho vivo (a tendncia aludida por Marx de se aumentar o capital constantena composio orgnica do capital), resume o primeiro corte teoria das crises econmicas paraHarvey (1982).

    b) A assim chamada acumulao primitivaKarl Marx desenvolve a anlise deste processo a partir de um comentrio de Adam

    Smith sobre a necessidade de uma acumulao originria como ponto de partida para odesenvolvimento do modo de produo capitalista. O resultado final da acumulao primitiva,consiste na separao entre os trabalhadores e a propriedade das condies de seu trabalho. Deacordo com o prprio autor, este processo transforma por um lado, os meios sociais desubsistncia e de produo em capital, por outro, os produtores diretos em trabalhadoresassalariados (MARX, 1867: 262). Corresponde, portanto, ao processo histrico de formaodas pr-condies do modo de produo capitalista. Alm de evidenciar a contradio entrecapital e trabalho, este processo tambm resultou na formao de um mercado internonecessrio ao processo de realizao do valor da mercadoria. Neste sentido, a expulso daspopulaes rurais para as grandes cidades no apenas concentra a fora de trabalho para osproprietrios dos meios de produo, como tambm realiza a separao dos trabalhadores deseu meio de subsistncia, tornando-os dependentes da aquisio de mercadorias.

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  • Um ltimo momento fundamental para a acumulao primitiva, refere-se a formao deum mercado mundial em escala crescente. De acordo com Marx:

    os diferentes momentos da acumulao primtiva repartem-se ento,mais ou menos em ordem cronolgica, a saber pela Espanha, Portugal,Holanda, Frana e Inglaterra. Na Inglaterra, em fins do sculo XVII,so resumidos sistematicamente no sistema colonial, no sistema dadvida pblica, no moderno sistema tributrio e no sistema protecionista(...) Todos porm, utilizaram o poder do Estado, a violncia concentradae organizada da sociedade, para ativar artificialmente o processo detransformao do modo feudal de produo em capitalista e paraabreviar a transio. (1867: 285-6)

    Destes fatores, destaca-se a participao do sistema da dvida pblica para a efetivaode prticas colonialistas que expandiram a integrao espacial do capitalismo (atravs docomrcio externo e do mercado mundial). Alm de fazer prosperar as sociedades por aes, ocomrcio com ttulos negociveis de toda espcie, a agiotagem, em uma palavra: o jogo da Bolsae a moderna bancocracia (idem: 288), a criao de um sistema internacional de crdito deuorigem difuso do capital financeiro em escala cada vez mais ampla.

    Em seu comentrio sobre a acumulao primitiva, Harvey parte da anlise de RosaLuxemburgo sobre um duplo aspecto da acumulao de capital. Para o autor, apesar da teoriado subconsumo como causa da tendncia crise geral do capital estar superada h algumtempo, Rosa conseguiu elucidar a importncia da expanso geogrfica do capitalismo como ummecanismo de resoluo das crises econmicas, a partir da relao orgnica entre os momentosde reproduo expandida do capital e os momentos de espoliao (acumulao primitiva) emformaes sociais no-capitalistas.

    O processo de expanso geogrfica do capitalismo atravs das prticas de espoliaopermite resolver temporariamente os momentos de crise na reproduo expandida do capital,uma vez que um conjunto de ativos colocado sob a lgica do mercado (destacam-se amatria-prima e a fora de trabalho), forando uma concorrncia que tende queda dos preosdos fatores de produo e a conseqente ampliao do lucro final na produo da mercadoria, apartir da desvalorizao do capital constante e varivel. A acumulao primitiva, portanto, emseu movimento que tende expanso geogrfica das relaes capitalistas, contribui para ampliara escala de seus limites materiais de valorizao, ao passo em que promove a concorrnciaentre os antigos e os novos fatores de produo, atuando para a recomposio da unidadeentre produo e circulao, e reduzindo os custos produtivos.

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  • Ao estudar as origens da assim chamada acumulao primitiva, Harvey se prope acompreender tambm suas decorrncias at os dias atuais. Na busca das novas prticasimperialistas surgem as questes cruciais: os mecanismos da acumulao primitiva estariamsendo utilizados de forma contnua ou diferenciada? A acumulao primitiva umprocesso de permanente integrao espacial das formaes sociais no-capitalistas ourefere-se apenas acumulao originria que permitiu a hegemonia deste modo deproduo? De que forma se d a relao entre a acumulao primitiva e os momentosde reproduo expandida do capital? O debate sobre estas questes ainda est em abertonesta pesquisa. Contudo, um ponto fundamental esclarecido definitivamente por Brando(2009) quando este resume a proposta de Harvey em O novo imperialismo, que procuradiscernir criteriosamente entre a acumulao primitiva, que abre caminho reproduo ampliadada acumulao por espoliao que faz ruir e destri um caminho j aberto (idem: 7). Com isto,a primeira tende a ampliar os horizontes para a acumulao do capital, enquanto a segundapassa a ocorrer no momento em que tais horizontes se tornam escassos. Tal processo comparado pelo mesmo autor com a lgica de J. Schumpeter dos momentos de destruiocriativa do capitalismo e da etapa das estratgias empresariais (as prticas monopolistas).

    No livro Spaces of global capitalism, Harvey avana em sua anlise sobre as novasprticas imperialistas. Em um primeiro momento distingue criteriosamente as quatro formas deacumulao por espoliao, definindo este conceito como um conjunto de mecanismos variadosde transferncia de ativos e redistribuio de renda das massas de trabalhadores para as classesmais altas, ou dos pases mais vulnerveis para os mais ricos. Tal processo se intensifica a partirde 1973, com o que o autor chamou de restaurao do poder de classe da burguesia, atravsda flexibilizao das leis trabalhistas, do enfraquecimento das organizaes sindicais, dentreoutros fatores. A partir da dcada de 1990 este processo se deu com maior intensidade, com ahegemonia do conjunto de prticas neoliberais. Segundo o autor, as principais prticas daacumulao por espoliao referem-se s: privatizaes , transformando em commodities todasas formas no capitalistas como os direitos pblicos, as prticas tradicionais e os recursosnaturais; a financeirizao da economia, como um instrumento de redistribuio de renda eespoliao de ativos atravs da manipulao do crdito (fundos de penso, etc); asredistribuies do Estado, atravs do corte de gastos, impostos regressivos, subsdios sgrandes empresas.Nestes mecanismos de esplio da classe trabalhadora, percebem-se algumas prticastradicionais ou semelhantes s observadas no momento de acumulao primitiva. Contudo, umadiferena fundamental reside em que, boa parte destas prticas atuais no contribuem para a

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  • integrao espacial do capitalismo, sendo que esta a resultante ltima das prticas deacumulao primitiva. Portanto, de fato a acumulao por espoliao no se trata de ummomento de destruio criadora, como apontado por Brando, mas de uma destruioestril, em um movimento de busca por oportunidades lucrativas para o capital em crise devalorizao que coloca sob a lgica do mercado, ativos formados aps a consolidao deformaes sociais capitalistas. Exemplos concretos destas prticas so percebidos nasprivatizaes de empresas e servios estatais, nos arrochos salariais (reformas trabalhistas), nasformaes dos fundos de penso. Por fim, o ltimo mecanismo citado por Harvey, refere-se aogerenciamento das crises (formao de crises econmicas localizadas), que demonstra olimite destas prticas predatrias, como o prprio autor afirma:

    El inters de apropriar y controlar los excedentes de otros, noes en este caso absorberlos dentro de la circulacin de capital[acumulao primitiva], sino tener el poder de devaluarlos, e inclusodestruirlos (militarmente si es necesario) para restringir los impactos dela devaluacin del capital en otros lugares. (HARVEY, 2006: 36)

    No mesmo livro, Harvey prope que a acumulao por espoliao seja tratada dentrode um conjunto unificado de condicionantes que indicariam a possibilidade de uma teoria geraldo desenvolvimento geogrfico desigual. Para esta teoria geral, seria necessrio levar emconta os nexos entre a acumulao por espoliao, as bases materiais das relaes sociaiscotidianas (a integrao entre estudos especficos com processos gerais no capitalismo), a lgicainter-escalar da luta de classes e a relao entre acumulao de capital no espao-tempo e suainstncia jurdica. Conclui-se deste ltimo a importncia do papel do Estado para a execuo dasprticas de acumulao por espoliao, e sobre este tema que o autor inicia um dilogo comGiovanni Arrighi.

    3. Crise econmica, processos scio-espaciais e o poder do EstadoA acumulao por espoliao foi desenvolvida, portanto, como decorrncia da anlise de

    Harvey sobre os processos impulsionadores da integrao espacial do capitalismo e de suaexpanso geogrfica. Resume as novas prticas imperialistas deste modo de produo, levandoem conta suas transformaes ao longo do ltimo sculo. Por se tratarem de mecanismos deformao e resoluo de crises econmicas, constitudos sob uma lgica territorial,necessariamente so executados com o auxlio do poder do Estado capitalista. Neste sentido,Harvey e Arrighi iro debater de que forma se d a relao entre as lgicas territorial ecapitalista de poder. A origem do debate entre os autores, de acordo com a bibliografialevantada at o presente momento da pesquisa, se d a partir das consideraes de Arrighisobre a anlise de Harvey referente s transformaes no modo de produo capitalista a partir

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  • da dcada de 1970. O autor italiano parte do estudo de Fernand Braudel, acerca dos cicloshistricos de desenvolvimento do capitalismo. Ao ampliar o horizonte espao-temporal deanlise, Braudel evidenciou padres de repetio e evoluo no capitalismo, os quais socomentados por Harvey em sua explanao. A acumulao primitiva o processo que permite aexpanso das relaes de produo capitalistas, ou como Arrighi resume, a lgica D-M(dinheiro-mercadoria), que propicia a expanso material. J a acumulao por espoliao,constitui os momentos onde este horizonte se esgota, uma situao em que o investimento damoeda na expanso do comrcio e da produo no mais atende, com tanta eficincia quanto snegociaes puramente financeiras ao objetivo de aumentar o fluxo monetrio que vai para acamada capitalista (ARRIGHI, 1994: 8). Prevalece ento a fase da expanso financeira, algica D-D (dinheiro-dinheiro ampliado). Para Arrighi, as transformaes do final do sculo XXanalisadas por Harvey, evidenciadas pela centralidade da expanso das relaes financeiras noperodo, denunciam a maturidade de um ciclo do desenvolvimento capitalista, ou como Braudelresume um sinal [de seu] outono (Braudel apud Arrighi, 2004: 246).

    Ao analisar os ciclos sistmicos de acumulao, Arrighi observa a expanso geogrficada influncia do poder do Estado no decorrer da histria do modo de produo capitalista e desua relao cada vez mais prxima com os processos de acumulao de capital. A anlisedestes dois processos no de tempo recente na teoria social uma vez que, ao menos em doisperodos do sculo XX, foram questes de intenso debate. Contudo, o dilogo entre os autores seconstitui em uma novidade, pois alm de elucidar as prticas contemporneas referentes a estalgica, incorpora diversos elementos da Geografia contempornea no debate sobre oImperialismo. Arrighi ressalta a importncia da produo do espao, por exemplo, para a resoluo dascrises econmicas no capitalismo: atravs da diferenciao temporal (a utilizao do capitalem crise de superacumulao para disponibilizar um novo ambiente construdo) e da expansogeogrfica (a formao de oportunidades lucrativas neste novo ambiente), o capital excedente absorvido. Neste processo, os fluxos de capital so redirecionados, necessariamente alterando oequilbrio de poder poltico e econmico mundial, ao promover a concorrncia e a conseqentedesvalorizao dos ambientes construdos em perodo anterior. Uma relao direta entreproduo do espao e acumulao primitiva, pela definio de ambos os processos, mostra-seinevitvel. Sobre essa relao, so diversas as questes de Arrighi em seu debate com Harvey.Teria a acumulao por espoliao chegado ao seu limite? Em que medida estaria se dandoatualmente a fuso da lgica imperialista e a capitalista? Qual a natureza da relao entre aslgicas territorial e capitalista de poder? Quais so as reais lacunas da teoria marxista sobre aanlise do espao geogrfico?

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  • 4. Perspectivas de concluso da pesquisaDevido ao grau de importncia deste ltimo debate para o resultado final da pesquisa,

    ainda no destacamos algumas concluses, uma vez que textos fundamentais ainda no foraminseridos para a anlise da acumulao por espoliao. Este relatrio parcial procurou elucidaras principais questes referentes bibliografia abordada at o presente momento. Destaca-seneste sentido, que, para Harvey a acumulao primitiva um processo utilizado de formacontnua no capitalismo, nas fronteiras de expanso geogrfica de suas relaes produtivas. Emformaes sociais capitalistas consolidadas, uma forma diferenciada, de estilo predatrio, predominante em perodos onde o horizonte para a reproduo expandida se torna escasso.Arrighi, a princpio, discorda de algumas conceituaes de Harvey, apesar de aceitar a influnciada produo do espao (que originou a noo de ordenao ou ajuste espacial [spatial fix] paraHarvey) como um mecanismo que altera a configurao geopoltica mundial e influenciadecisivamente para a formao e resoluo das crises econmicas.

    Existem algumas lacunas na bibliografia utilizada at o momento, no que se refere obra deHarvey, em especial, alguns textos publicados recentemente. Para a caracterizao do perodoatual, sero utilizados tambm alguns autores de forma introdutria, que destacam o papel dafinanceirizao para as transformaes da economia mundial.

    Sobre a natureza das crises, pretendemos abordar de forma introdutria o quanto a mudanade perspectiva (se o capitalismo caminha para uma crise estrutural ou se esta cclica)influencia a dinmica da acumulao por espoliao e das prticas imperialistas. Para isto, seroutilizados tambm alguns comentadores de obras (como Rosdolsky e Mazzucchelli).

    Por fim, alguns comentadores sobre o conceito de Harvey podero ser utilizados, de acordocom a concluso da pesquisa: Leda Paulani, em sua anlise sobre as crises, a geografia, e opoder do Estado. Carlos Brando, na utilizao deste conceito para a elucidao das prticaslucrativas em pases subdesenvolvidos. E Moishe Postone, em sua caracterizao sobre omundo contemporneo.

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  • 5. BibliografiaANTIPODE A radical journal of geography. (2004) Vol. 36, issue 3.ARRIGHI, Giovanni. (2008) Adam Smith em Pequim: origens e fundamentos do sculo XXI.So Paulo, Boitempo.________________. (1994) O longo sculo XX: dinheiro, poder e as origens de nosso tempo.So Paulo, Editora Unesp.________________. (2009) The winding paths of capital: interviewed by David Harvey. NewLeft Review, 56.ARROYO, Mara Monica. (2001) Territrio nacional e mercado externo: uma leitura do Brasilna virada do sculo XX. Tese de doutoramento FFLCH-USP.BRANDO, Carlos. (2009) Acumulao primitiva permanente e desenvolvimento capitalistano Brasil contemporneo. In: ACSELRAD, Henri (org.). Capitalismo globalizado e recursosterritoriais fronteiras da acumulao no Brasil contemporneo. Rio de Janeiro.CHESNAIS, Franois. Tobin or not Tobin? So Paulo, Editora Unesp, 1999.HARVEY, David. (1982) Los limites del capitalismo y la teoria marxista; traduccion de MariluzCaso. Mexico DF, Fondo de Cult. Econmica, 1990._______________. (2003) O novo imperialismo. So Paulo, Loyola, 2004_______________. (2005) Spaces of global capitalism. London, Verso._______________. Notas hacia una teoria del desarollo geogrfico desigual. GeoBaires,Cuadernos de geografia, UBA-FFyL, maio de 2007.HUNT, Edward K. Histria do pensamento econmico: uma perspectiva crtica. Rio de Janeiro,Editora Campus, 1981.MARX, Karl. (1867) O capital: crtica da economia poltica. So Paulo, Abril Cultural, 1983.MAZZUCCHELLI, Frederico. (1985) A contradio em processo: o capitalismo e suas crises.So Paulo, Editora Brasiliense.ROSDOLSKY, Roman. Gnese e estrutura de o Capital de Karl Marx. Rio de Janeiro,Contraponto, 2001.SAMPAIO JR, Plnio Soares de Arruda. (2009) Capitalismo do sculo XXI: crise e barbrie.In: BEOZZO, Jos Oscar; VOLANIN, Cremildo Jos (organizadores). Alternativas crise -Por uma economia social e ecologicamente responsvel. So Paulo, Cortez Editora.SANTOS, Milton. Da totalidade ao lugar. So Paulo, Edusp, 2002.

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