Milton santos

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“O mundo é formado não apenas pelo que já existe, mas pelo que pode efetivamente existir.” Encontro com Milton Santos ou o Mundo visto pelo lado de cá Por: Mara Rute Lima "O sonho obriga o homem a pensar" Milton Santos Primeiras Palavras: Esse documentário não servirá apenas para você “passar na prova”, mais que isso, é uma contribuição para o entendimento do nosso mundo pós-moderno numa perspectiva de alguém que vê nossos problemas sem o olhar viciado da mídia, e mais, tem em sua visão a possibilidade de um mundo melhor. Milton defende que o Brasil precisa saber para onde ir para poder participar de um processo global e que o mundo é um conjunto de possibilidades, não apenas um conjunto de realidades, e guarda uma convicção - claramente vista nesse documentário - de que outros mundos poderiam ser criados a partir dos mesmos materiais. Além do que ele pensa, o próprio Milton é um exemplo para nós baianos - nosso conterrâneo que se transformou num dos mais importantes geógrafos do século XXI e, sobretudo superando questões como de raça e academicismo. Espero que vocês assistam ao documentário que nos oferece um novo olhar sobre assuntos tão discutidos em nossas aulas de redação, atualidades e em nossos noticiários. Assuntos como a fome, má distribuição de renda, desigualdade social, a questão da água, o desafio de ser ético no século XXI são revisitados e seguramente você terá, com ajuda do olhar de Milton, um novo olhar. Conhecendo Milton Santos Milton Santos nasceu no município baiano de Brotas de Macaúbas em 3 de maio de 1926. Aos 13 anos, Milton dava aulas de matemática no ginásio em que estudava, o Instituto Baiano de Ensino. Aos 15, passou a lecionar Geografia e, aos 18, prestou vestibular para Direito em Salvador. Enquanto estudante secundário e universitário marcou presença na militância política de esquerda. Formado em Direito, não deixou de se interessar pela Geografia, tanto que fez concurso para professor catedrático no Colégio Municipal de Ilhéus. Nesta cidade, além do magistério, desenvolveu atividade jornalística, estreitando sua amizade com políticos de esquerda. Nesta época, escreveu o livro Zona do Cacau, posteriormente incluído na Coleção Brasiliana, já com influência da Escola Regional francesa. Em 1958, concluiu seu doutorado na Universidade de Estrasburgo, na fronteira da França com a Alemanha. Ao regressar ao Brasil, criou o Laboratório de Geomorfologia e Estudos Regionais, mantendo intercâmbio com os mestres franceses. Após seu doutorado, teve presença marcante na vida acadêmica, em atividades jornalísticas e políticas de Salvador. Em 1960, o presidente Jânio Quadros o nomeia para a subchefia do Gabinete Civil, tendo viajado a Cuba com a comitiva presidencial - o que lhe valeu registro nos órgãos de segurança nacional após o golpe de 1964. A TRAJETÓRIA E O RECONHECIMENTO Embora pouco conhecido fora do meio acadêmico, Santos alcançou reconhecimento fora do país, tendo recebido, em 1994, o Prêmio Vautrin Lud, (conferido por universidades de 50 países). Milton Santos foi dos poucos cientistas brasileiros que, expulsos durante a ditadura militar (naquilo que foi conhecido por êxodo de cérebros), voltaram depois ao país. Foi disputado por diversas universidades, que o queriam em seus quadros. Sua obra O espaço dividido, de 1979, é hoje considerada um clássico mundial, onde desenvolve uma teoria sobre o desenvolvimento urbano nos países subdesenvolvidos. Apresenta a contribuição de Milton Santos à busca de uma teoria do espaço e da urbanização no terceiro mundo. O geógrafo considera que o fenômeno do subdesenvolvimento carece de um esforço de compreensão global, sem o qual a solução de problemas particulares é impossível. É um esforço original de interpretação sistemática e interdisciplinar da evolução econômica social, política e ao mesmo tempo geográfica do conjunto dos países do terceiro mundo. Partindo da análise de inúmeras variáveis, e apoiado num vasto elenco de exemplos baseados na África, América latina e na Ásia, o autor chega a interpretações próprias sobre o fenômeno complexo que é o subdesenvolvimento e suas repercussões na vida das populações a ele submetidas, sobretudo nos comportamentos espaciais e suas leis em uma situação de dependência. Suas idéias de globalização, esboçadas antes que este conceito ganhasse o mundo, advertiam para a possibilidade de gerar o fim da cultura, da produção original do conhecimento - conceitos depois desenvolvidos por outros. Por uma Outra Globalização, livro escrito por Milton Santos dois anos antes de morrer, é referência hoje em cursos de graduação e pós- graduação em universidades brasileiras. Traz uma abordagem crítica sobre o processo perverso de globalização atual na lógica do capital, apresentado como um pensamento único. Na visão dele, esse processo, da forma como está configurado, transforma o consumo em ideologia de vida, fazendo de cidadãos meros consumidores, massifica e padroniza a cultura e concentra a riqueza nas mãos de poucos. ESPAÇO: ABORDAGEM INOVADORA A obra de Milton Santos é inovadora ao abordar o conceito de espaço. De território onde todos se encontram, o espaço, com as novas tecnologias, adquiriu novas características para se tornar um conjunto indissociável de sistemas de objetos e sistemas de ações. As velhas noções de centro e periferia já não se aplicam, pois o centro poderá estar situado a milhares de quilômetros de distância e a periferia poderá abranger o planeta inteiro. Daí a correlação entre espaço e globalização, que sempre foi perseguida pelos detentores do poder político e econômico, mas só se tornou possível com o progresso tecnológico. Para contrapor-se à realidade de um mundo movido por forças poderosas e cegas, impõe-se, para Santos, a força do lugar, que, por sua dimensão humana, anularia os efeitos perversos da globalização. Estas idéias são expostas principalmente em sua obra A Natureza do Espaço (Edusp,2002) www.geledes.org.br/geografia/milton-santos.html

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“O mundo é formado não apenas pelo que já existe, mas pelo que pode

efetivamente existir.”

Encontro com Milton Santos ou o Mundo visto pelo lado de cá

Por: Mara Rute Lima "O sonho obriga o homem a pensar"

Milton Santos

Primeiras Palavras: Esse documentário não servirá apenas para você “passar na prova”, mais que isso, é uma contribuição para o

entendimento do nosso mundo pós-moderno numa perspectiva de alguém que vê nossos problemas sem o olhar viciado da mídia, e mais, tem em sua visão a possibilidade de um mundo melhor. Milton defende que o Brasil precisa saber para onde ir

para poder participar de um processo global e que o mundo é um conjunto de possibilidades, não apenas um conjunto de

realidades, e guarda uma convicção - claramente vista nesse documentário - de que outros mundos poderiam ser criados a partir dos mesmos materiais. Além do que ele pensa, o próprio Milton é um exemplo para nós baianos - nosso conterrâneo que se transformou num dos mais importantes geógrafos do século XXI e, sobretudo superando questões como de raça e academicismo.

Espero que vocês assistam ao documentário que nos oferece um novo olhar sobre assuntos tão discutidos em nossas aulas de redação, atualidades e em nossos noticiários. Assuntos como a fome, má distribuição de renda, desigualdade social, a questão da água, o desafio de ser ético no século XXI são revisitados e seguramente você terá, com ajuda do olhar de Milton,

um novo olhar.

Conhecendo Milton Santos Milton Santos nasceu no município

baiano de Brotas de Macaúbas em 3 de maio de 1926.

Aos 13 anos, Milton dava aulas de matemática no ginásio em que estudava, o Instituto Baiano de Ensino. Aos 15, passou a lecionar Geografia e, aos 18, prestou vestibular para Direito em Salvador. Enquanto estudante secundário e universitário marcou presença na militância política de esquerda. Formado em Direito, não deixou de se interessar pela Geografia, tanto que fez concurso para professor catedrático no Colégio Municipal de Ilhéus. Nesta cidade, além do magistério, desenvolveu atividade jornalística, estreitando sua amizade com políticos de esquerda. Nesta época, escreveu o livro Zona do Cacau, posteriormente incluído na Coleção Brasiliana, já com influência da Escola Regional francesa.

Em 1958, concluiu seu doutorado na Universidade de Estrasburgo, na fronteira da França com a Alemanha. Ao regressar ao Brasil, criou o Laboratório de Geomorfologia e Estudos Regionais, mantendo intercâmbio com os mestres franceses. Após seu doutorado, teve presença marcante na vida

acadêmica, em atividades jornalísticas e políticas de Salvador. Em 1960, o presidente Jânio Quadros o nomeia para a subchefia do Gabinete Civil, tendo viajado a Cuba com a comitiva presidencial - o que lhe valeu registro nos órgãos de segurança nacional após o golpe de 1964.

A TRAJETÓRIA E O RECONHECIMENTO Embora pouco conhecido fora do meio acadêmico, Santos alcançou reconhecimento fora do país, tendo recebido, em

1994, o Prêmio Vautrin Lud, (conferido por universidades de 50 países). Milton Santos foi dos poucos cientistas brasileiros que, expulsos durante a ditadura militar (naquilo que foi conhecido

por êxodo de cérebros), voltaram depois ao país. Foi disputado por diversas universidades, que o queriam em seus quadros. Sua obra O espaço dividido, de 1979, é hoje considerada um clássico mundial, onde desenvolve uma teoria sobre o

desenvolvimento urbano nos países subdesenvolvidos. Apresenta a contribuição de Milton Santos à busca de uma teoria do espaço e da urbanização no terceiro mundo. O geógrafo considera que o fenômeno do subdesenvolvimento carece de um esforço de compreensão global, sem o qual a solução de problemas particulares é impossível. É um esforço original de interpretação sistemática e interdisciplinar da evolução econômica social, política e ao mesmo tempo geográfica do conjunto dos países do terceiro mundo. Partindo da análise de inúmeras variáveis, e apoiado num vasto elenco de exemplos baseados na África, América latina e na Ásia, o autor chega a interpretações próprias sobre o fenômeno complexo que é o subdesenvolvimento e suas repercussões na vida das populações a ele submetidas, sobretudo nos comportamentos espaciais e suas leis em uma situação de dependência.

Suas idéias de globalização, esboçadas antes que este conceito ganhasse o mundo, advertiam para a possibilidade de gerar o fim da cultura, da produção original do conhecimento - conceitos depois desenvolvidos por outros. Por uma Outra Globalização, livro escrito por Milton Santos dois anos antes de morrer, é referência hoje em cursos de graduação e pós-graduação em universidades brasileiras. Traz uma abordagem crítica sobre o processo perverso de globalização atual na lógica do capital, apresentado como um pensamento único. Na visão dele, esse processo, da forma como está configurado, transforma o consumo em ideologia de vida, fazendo de cidadãos meros consumidores, massifica e padroniza a cultura e concentra a riqueza nas mãos de poucos.

ESPAÇO: ABORDAGEM INOVADORA A obra de Milton Santos é inovadora ao abordar o conceito de espaço. De território onde todos se encontram, o espaço,

com as novas tecnologias, adquiriu novas características para se tornar um conjunto indissociável de sistemas de objetos e sistemas de ações.

As velhas noções de centro e periferia já não se aplicam, pois o centro poderá estar situado a milhares de quilômetros de distância e a periferia poderá abranger o planeta inteiro. Daí a correlação entre espaço e globalização, que sempre foi perseguida pelos detentores do poder político e econômico, mas só se tornou possível com o progresso tecnológico.

Para contrapor-se à realidade de um mundo movido por forças poderosas e cegas, impõe-se, para Santos, a força do lugar, que, por sua dimensão humana, anularia os efeitos perversos da globalização.

Estas idéias são expostas principalmente em sua obra A Natureza do Espaço (Edusp,2002) www.geledes.org.br/geografia/milton-santos.html

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Sobre o documentário...

O documentário Milton Santos ou: O Mundo Global Visto do Lado de Cá (2006, 89 min) toma como base uma entrevista com o geógrafo, feita em janeiro de 2001, pouco antes de sua morte, para discutir de maneira crítica o processo da globalização, do ponto de vista da periferia. Dirigido por Silvio Tendler, também responsável por Os Anos JK, uma Trajetória Política (1980) e Jango (1984), o filme faz um panorama do mundo atual, em que a antiga batalha entre capitalistas e comunistas foi substituída pelos conflitos entre ricos e pobres e entre grandes empresas e três quartos da população mundial. Premiado como Melhor Filme pelo júri popular no Festival de Brasília, no ano passado, também traz entrevistas com colegas, discípulos, amigos e intelectuais de outros países que falam sobre o pensamento desse expoente do século 20.

O diretor, que projetava fazer um filme a partir das idéias do professor desde 1995, só conseguiu entrevistá-lo seis anos depois. A conversa é o ponto central da produção, estabelecendo as fundações do panorama apresentado ao longo da obra.

www.usp.br/jorusp/arquivo/2007/.../pag16.htm

O documentário... O documentário começa com uma reflexão de Jean Paul Sartre: É preciso explicar por que o mundo de hoje, que é horrível, é apenas um momento do longo desenvolvimento histórico

e que a esperança sempre foi uma das forças dominantes das revoluções e insurreições, e eu ainda sinto a esperança como minha concepção de futuro. (in prefácio dos Condenados da Terra de Frantz Fanon)

Em seguida já ouvimos Milton Santos apresentando o conceito de clarividência. Segundo ele essa é uma virtude que se

adquire pela intuição, mas, sobretudo pelo estudo. É tentar ver a parte do presente que se projeta no futuro. Tal habilidade é a que rege o principio do documentário e das teorias de Milton. Há idéia de um mundo possível no futuro.

Após o convite para sermos também clarividentes começamos a ser apresentados as teorias. A primeira delas é que que Descolonizar é olhar o mundo com os próprios olhos, pensá-lo de um ponto de vista próprio. O centro do mundo está em todo lugar. O mundo é o que se vê de onde se está. Tal conceito nos permite entender que um dos desejos de Milton é a retirada do vício de olhar o mundo com os olhos dos países desenvolvidos, por exemplo. Ressalta-se que tal idéia se faz presente também na obra “pau-brasil” do Oswald. O “ver com os olhos livres”.

Mas vamos a história: Preste atenção nessa questão para usar numa redação sobre a questão indigena!

O olhar sobre a primeira globalizaçao vem das viagens de descobrimento e conquista. Os imensos territórios conquistados encontrados não estavam desocupados. Em apenas um século, entre 1500 a 1600, dos 80 milhões de nativos existentes na América Pré-Colombiana, 70 milhões foram exterminados, duas mil línguas desapareceram com eles. Tupis e Macutis tiveram seus territórios ocupados e demarcados arbitrariamente ignorando se povos, culturas, línguas, religiões para facilitar a dominação e o saque de suas riquezas.

Os 10 milhões de africanos transplantados para o Brasil, depois de séculos de escravidão nas plantações de cana, de café e nos garimpos das Minas Gerais, ficaram abandonados à própria sorte.

Assim, segundo o documentário: A primeira Globalização do colonialismo se caracterizou pela ocupação territorial. A segunda Globalização começa no fim do Século XX, marcada pela fragmentação dos territórios.

E sobre essa segunda, marca do século XX, o documentário diz:

O Século XX foi o século das revoluções. As revoluções tecnológicas transformaram as novas conquistas num sonho de um mundo melhor. Logo começa o desmonte do Estado de Bem Estar Social. O Humanismo como motor do desenvolvimento e do progresso é substituído pelo modelo do consumo voraz. Em seguida temos mais uma aparição de Milton Santos agora definindo o consumo como o grande fundamentalismo de hoje e acrescentando que as técnicas são implantadas nas sociedades e nos territórios a partir de uma política, hoje a política das empresas Globais amanhã ( num mundo melhor) a partir das políticas dos Estados impulsionados pelas nações.

Não deixe de estudar a diferença entre Estado e Nação. Acha que vou dizer? Vai pesquisar... Depois dessas reflexões o documentário apresenta vários recortes como uma forma de apresentar “um pouco de Milton”

para os que estão assitindo. Segundo Milton ele é um intelectual que não pertence a nenhum partido, a nenhum grupo de intelectuais, não responde a nenhum canto e não participa de qualquer militância, coisa rara no Brasil. Diz também que é díficil ser negro e ser intelecutal aqui porque o negro, fora das situações de evidências, no cotidiano, vive uma vida muito pesada e é também difícil ser intelecual porque não faz parte da cultura nacional ouvir tranquilamente uma palavra critica. Afirma que escolheu a geografia na verdade por ter optado pelo “movimento”. Acha que se relaciona com o fato dele ter, quando garoto, se impressionado pelas populações que mudavam e se transportavam de um lugar para outro. E seu gosto pela história, sobretudo pela do presente, lhe levou também a valorizar todo o processo contraditório. Afirma não ser um marxista ortodoxo diz tem medo dos que são porque toda a doutrina não renovada pode se transformar numa religião, num dogma e por conseguinte tem a capacidade de emburrecer e não esclarecer.

"Estamos convencidos de que a mudança histórica em perspectiva provirá de um movimento de baixo para cima, tendo como atores principais os países subdesenvolvidos e não os países ricos; os deserdados e os pobres e não os opulentos e outras classes obesas;

O indivíduo liberado partícipe das novas massas e não o homem acorrentado; O pensamento livre e não o discurso único. Os pobres não se entregam e descobrem a cada dia formas inéditas de trabalho

e de luta; A semente do entendimento já está plantada e o passo seguinte é o seu

florescimento em atitudes de inconformidade e, talvez, rebeldia."

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O documentário retoma o tema da Globalização tratando de uma das formas que se tem de mensurar o nivel de desenvolvimento do planeta: através da observação das luzes que as cidades emitem à noite.

A foto ao lado, como na do documentário, revela o nítido contraste entre as

luzes que aparecem no norte e no sul da terra. Sobre esses constrastes os dados do documentário são:

A renda dos 500 individuos mais ricos do mundo é superior aos ganhos 416 milhões mais pobres.

Em 1990 um norte-americano ganhava 38 vezes mais que um tanzano. Hoje ganha 61 vezes mais.

Então Milton Santos diz: Nunca houve uma oposição tão grande entre o

grupo de países ricos e a maioria esmagadora da humanidade. E mais, nós temos um terceiro mundismo em germe muito mais forte do que antes e uma realidade da dependência muito maior do que antes. Talvez por aí é que vá surgir essa possiblidade de construir o mundo de outra forma.

E mais: “De fato, se desejarmos escapar à crença de que esse mundo assim apresentado

é verdadeiro, e não querermos admitir a permanência de sua percepção enganosa, devemos considerar a existência de pelo menos três mundos num só. O primeiro seria o mundo tal como nos fazem vê-lo: a globalização como fábula; o segundo seria o mundo tal como ele é: a globalização como perversidade; e o terceiro, o mundo como ele pode ser: uma outra

globalização”. E... “Nunca na história da humanidade houve condições técnicas e científicas tão

adequadas a construir o mundo da dignidade humana. Apenas essas condições foram expropriadas por um punhado de empresas que decidiram construir um mundo perverso. Cabe a nós fazer destas condições materiais a condição material da produção de uma

outra política.” O documentário passará a tratar então do Consenso de Wasghinton definido a

globalização como peversidade

Segundo o documentário, em 1989, uma reunião organizada pelo Instituto Intermacional de Economia em Washington propôs reformas para que os países da America Latina retomassem a trilha do crescimento e do desenvolvimento. Nasceu aí o consenso de Washington. Uma espécie de bula com austeridade fiscal, elevação de

impostos, juros altos para atrair investimentos estrangeiros e privatizações, essas em nome da boa adminsitração do setor privado e da incapacidade dos Estados.

Após, o documentário apresenta reflexão de Milton: O mesmo sistema ideológico que justifica o processo de globalização, ajudando a considerá-lo o único caminho

histórico, acaba, também, por impor certa visão da crise e a aceitação dos remédios sugeridos. Na verdade, porém a única crise que os responsáveis desejam afastar é a crise financeira, não qualquer outra1.

E o documentário traça então um perfil do caos criado na América Latina com o Consenso de Washington como no Equador – por causa da privatização de serviços estatais e da dolarização da economia. Na Bolívia - propostas de privatização da água, revolta popular comandada por uma nação de maioria mestiça e de índios, morte de um jovem que comoveu o país. A Argentina - destruída pelos experimentalismos do neoliberalismo, pelas privatizações e abertura da economia. Ainda no América Latina os bolivianos ensinam que a apesar da globalização nos fazer esquecer do poder da democracia eles descobriram que ele existe.

Em seguida aparece um pronunciamento de Joseph Stiglitz, prêmio Nobel de economia e economista chefe do Banco Mundial de 1997 a 2000. Ele afirma que esse receituário proposto pelo consenso de Washington não provem de análise econômica, mas de postura ideológica. Ainda afirma que tal consenso não foi necessário nem suficiente para o crescimento já que países como Bolívia seguiram os mandamentos e seguem até hoje esperando os lucros em oposição a países como a China que não seguiu o consenso e cresceu.

Também aparece no documentário Celso Amorim ex-ministro das Relações Exteriores que afirma ser essa história de que os Estados Nacionais estão diminuindo de importância uma história da carochinha que os países ricos nos contam porque o Estado Nacional, por exemplo, Norte-americano vai muito bem. Inclusive bem do ponto de vista de força do Estado com gastos militares como nunca houve antes, com o empenho direto dos agentes comerciais do governo americano para defender os interesses das empresas americanas. Isso é normal. Mas aí eles nos dizem: “o Estado não tem importância”. Logo, eles querem nos enganar.

O território como matriz da vida social, econômica e política.

A Boeing, maior montadora de aviões do mundo é um bom exemplo desse fornecimento em rede planetária. Ela, para criar o modelo 777, recebe 322 componentes em 38 países e suas três milhões de peças são fabricadas por mais de 1700 intermediários em 37 nações. De lá prosseguem para Everest onde a Boeing tem o maior edifício industrial do mundo. Na montagem final o Brasil fornece uma peça do leme vertical.

Sobre a Boeing e essas empresas globais Milton afirma que elas são esse centro do mundo que escapam ao controle dos Estados e se distanciam de uma relação mais obrigatória com os territórios e acabam por lhes permitir uma ação sem responsabilidade. Elas não têm responsabilidade social nem moral e por isso desorganizam os territórios tanto sociamente como moralmente.

1 Aí está, na verdade, uma causa para maior aprofundamento da crise real _econômica, social, política, moral_ que caracteriza o nosso tempo.

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O documentário também cita o filme The Corporation que trata da exploração de mão de obra no Terceiro Mundo. O filme diz que há uma divisão internacional de trabalho injusta e desigual, ou seja, distribuição de mais pobreza para

os pobres e concentração de mais riqueza para os ricos. Também cita a NIKE como exemplo de empresa exploradora dessa mão-de-obra.

A questão do trabalho já foi tema do Enem

E novamente cita Milton Santos : “De fato para a grande maioria da humanidade a globalização está se impondo

como fábrica da perversidade. O desemprego crescente torna-se crônico. A pobreza aumenta e as classes médias perdem em qualidade de vida. O salário médio tende a baixar. A fome e o desabrigo se generalizam em todos os continentes.

No caso do Brasil o documentário mostra a fila na Marques de Sapucaí para a conquista de uma vaga como gari.

Revelando a luta pelos que buscam um emprego estável e seguro na globalização onde os de baixo, a cada dia que passa, trabalham mais com menos direitos.

E Milton Santos diz: O desemprego aparece já como uma coisa normal. Os arautos da globalização e o aparelho de Estado explicam que o

desemprego é uma condição para chegarmos a mais globalização e, por conseguinte aumentam também o número de pobres. Há mais 600 milhões de pobres hoje do que em 1960. 1,5 bilhão de pessoas ganham menos de um dólar por dia e diante disso a pobreza é tratada com naturalidade.

A questão da fome no documentário:

Milton Santos diz: Produzimos muito mais comida do que podemos comer. Tanto que na Europa a Comunidade Européia dá

prêmio a quem deixa de produzir comida e castiga quem produz mais do que as cotas estabelecidas. Logo, a questão da fome não é

uma questão de produção de alimentos é questão de distribuição. Isso a gente viu quando de certas epidemias de fomes na África e

na Ásia os Estados Unidos recusando a dar ajuda alimentar se certas condições políticas não fossem preenchidas. No caso do

próprio Brasil se há uma parte da população que não come adequadamente isso é culpa unicamente da forma como organizamos a

sociedade. Não é que não haja alimentos, não é que não se possa distribuir os alimentos, apenas nós decidimos que alguns não

devem comer. O que acaba por ser uma decisão porque depois de tantos anos a gente aceita tranquilamente continuar discutindo a

questão da fome. O que me parece uma vergonha.

A questão da água

Segundo o documentário: Hoje mais de milhões de pessoas em todo o planeta não tem acesso a água. Mais de 3 milhões

utilizam água sem tratamento, o que provoca diariamente a morte de 30 mil indivíduos.

Nos últimos 10 anos as transnacionais da água arquitetam uma forma de controle da água

no planeta. Empresas do setor tem suas ações fixadas em bolsas de valores dentro da

lógica financeira que nada tem a ver com a lógica da solidariedade.

O documentário cita o III Fórum Mundial da Água ocorrido em março de 2003 em

Kyoto. Nesse evento estava em pauta a questão da privatização dos recursos hídricos. Lá se

apresentou dois lados da questão: os que vêem a água como um bem econômico para ser

negociado no mercado pelo maior preço e do outro os que vêem a água como um bem

comum global que deve ser conservado por todos os governos do mundo.

Os movimentos sociais protestam e defendem valores como a água como patrimônio da humanidade que não deve ser

usado para o lucro.

A imigração não desejada - As Muralhas do Capitalismo –

TEMA ENEM 2012

O filme faz um paralelo entre as muralhas socialistas visíveis como as muralhas da China (vista do espaço), os muros de

Berlin e as muralhas do capitalismo que permite a livre circulação das mercadorias, dinheiro e serviço, mas proíbem o livre tráfico

dos indivíduos. A Europa faz isso inclusive impedindo que os descendentes dos povos escravizados pelo colonialismo possam provar

do banquete da globalização. Cita também os Estados Unidos que muitas vezes não pune somente com a prisão, mas também com

a morte os que tentam ultrapassar seus muros. O filme cita o elogio do presidente americano as ações que diminuíram a imigração

dos brasileiros.

“A humanidade se divide em dois grupos:

O grupo dos que come

E o grupo dos que não dormem com receio da revolta dos que não comem”.

Josué de Castro. Geopolítica da Fome.

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Sobre isso Milton Santos diz: temos que recomeçar os debates das civilizações que a gente abandonou. Passamos a

debater o crescimento econômico...se vamos aumentar os juros, se vamos diminuir... Mas a civilização, ela própria, quase que não

é objeto de discussão e isso abre espaço para qualquer forma de barbárie como essa pela qual a gente deixa morrer crianças,

velhos e adultos tranquilamente.

Mídia – A Fábula da Globalização

Segundo Milton: o que estamos vivendo hoje é que o homem deixou de ser o centro do mundo. O centro do mundo hoje é

o dinheiro, mas o dinheiro no estado puro. O dinheiro em estado puro só é o centro do mundo por causa dessa geopolítica que se

instalou proposta pelos economistas e imposta pela mídia.

Para fundamentar o que diz Milton o documentário apresenta o dado de que 06 empresas controlam 90% do mercado de

mídia mundial.

Milton continua: a chamada mídia tem um poder de intermediação que talvez não se possa dizer

que é inocente, mas não parte dela ou não é dela o poder. O poder é de um pequeno número de

agências internacionais da informação estreitamente ligadas ao mundo da produção material, ao

mundo das finanças que controla de maneira extremamente eficaz a interpretação do que está se

passando no mundo e de uma forma que se torna clara quando pegamos os jornais e vemos a

repetição quase que servil dos fatos: as mesmas fotografias, as mesmas manchetes, as mesmas

idéias, os mesmos debates que indicam que alguma coisa está por trás de tudo isso.

O filme dá um exemplo bem claro de como

uma notícia pode ser manipulada propondo como o

editor distorce uma notícia para demonizar a figura do árabe.

O documentário ainda afirma que segundo Milton Santos não há produção

excessiva de informação, mas de ruído. Existem os fatos. As notícias são

interpretação deles. Como as agências de notícias pertencem às grandes empresas,

os acontecimentos são analisados de acordo com interesses predeterminados. Muitos

economistas que escrevem em jornais, por exemplo, publicam diariamente o desejo

de empresas das quais são consultores.

Milton diz, no entanto que há uma REVANCHE, pois a informação é o grande instrumento no processo de produção de

novas formas totalitárias de vida, mas que manejada por pequenos grupos de forma inteligente produz exatamente o efeito oposto.

Acha inclusive que esse fenômeno vai se multiplicar, apesar de por enquanto existir uma coerção muito grande contra essas formas

que hoje são limitadas pela falta de recursos financeiros, pela legislação que favorece a vida dos gigantes produtores de mídia. Mas

ele crê que há uma demanda de baixo muito forte e explosiva vai gerar certamente outra coisa.

A técnica como plataforma para a liberdade

Questão indígena – grande potencial na prova do Enem esse ano – foi tema de feira de Santana

Segundo Milton olhando em sua própria vida ele percebe que hoje é muito mais fácil ser universal aqui mesmo.

Ele diz: A primeira vez que eu entendi que eu comecei a entender o mundo foi quando eu deixei a Bahia para ir estudar na

França lendo os jornais em que me apresentaram o mundo de uma outra forma. Hoje não, qualquer pessoa com a curiosidade mais aguçada acaba percebendo como o mundo é. Acho que essa é outra grande novidade do nosso tempo e que vai permitir que sem abandonar o que a gente é – indígena. A gente seja perfeitamente universal.

“Para o começo do século XXI, essas trocas de Novas Tecnologias que não fomos nós que criamos e nem somos nós que

fabricamos vai ser o grande evento para nossos povos. [...] em alguns casos, do ponto de vista político vai significar a libertação de comunidades que eram controladas porque não sabiam o que estava acontecendo no mundo”. Ailton

O documentário registra então a chegada do acesso a internet para uma tribo indígena sem que isso fira sua identidade. Os índios consideram que a importância da rede é maior porque eles moram distante e isso se torna precioso, inclusive, para a denúncia do que ocorre em suas terras. Além de para eles significar, de certa forma, uma libertação porque certas comunidades eram controladas por não saber o que estava acontecendo no mundo.

E Milton diz: é a primeira vez na história em que a gente convive com um futuro possível. Acho que essa é uma grande novidade de nossa geração. Essa capacidade que nos foi dada de conviver com o futuro possível. E não é nada do domínio dos filósofos é algo que tanto nós que imaginamos ser intelectuais sabemos que existe, como o rapaz pobre da periferia que inventa uma música revolucionária que explica o seu mundo.

“Não existe cultura pura. toda cultura está sempre se

modificaNdo em coNtato com outras culturas.” lévi-Strauss

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O filme conta então a história de Adirley que com uma câmara digital documenta a cultura da periferia da Ceilândia em Brasília.

Milton diz: hoje, com uma pequena aparelhagem informática, eletrônica, com meios limitados também se faz opinião. Também se produz coisas centrais na reelaboração da história.

Milton ainda acrescenta que nosso olhar para favela é só o de ver nela a produção da violência, mas há outras produções nas favelas inclusive culturais. Elas não aparecem porque há uma áurea sobre a cultura privilegiada que não permite que os outros façam cultura e política ao mesmo tempo. Para fundamentar isso o documentário apresenta uma forma de fazer cinema na baixada fluminense com baixo custo e por jovens carentes.

SOBRE A REVANCHE:

Há a possibilidade, cada vez mais freqüente, de uma revanche da cultura popular sobre a cultura de massa quando por exemplo ela se difunde por instrumentos que na origem são próprios da cultura de massa.

Nesse caso a cultura popular exerce a qualidade de discurso dos de baixo pondo em relevo o cotidiano dos pobres, dos

excluídos, das minorias por meio da exaltação da vida de todos os dias

O periodo Popular da História:

Milton acredita que o período tecnológico da história do homem está chegando ao fim e que chegamos a um período

demográfico. Segundo ele, os atores que vão mudar a história são os de baixo: os pobres em cada país; os países pobres dentro dos seus continentes e os continentes pobres face aos continentes ricos.... Haverá explosões aqui e ali que serão impossíveis de conter. Cita, para isso, as explosões terroristas, as religiões mulçumanas, o combate silencioso dos povos das índias, a china que usa o capitalismo ao seu modo. Assim, essas mudanças vão garantir a produção de mundo novo.

A china uma nação que tem mais de 1000 universidades que forma por ano mais de 450 mil engenheiros 50 mil mestres e 8 mil

doutores. O governo incentivou a industrialização rural e ocupou o mercado mundial com produtos produzidos abaixo custo. Essa China abriu mão se seu projeto ideológico em troca do desenvolvimento econômico.

África e América Látina: os gigantes despertando

Devemos recusar categoricamente a situação a que os países ocidentais querem nos condenar. O colonialismo e o imperialismo

não pagaram suas contas quando retiraram suas bandeiras e suas forças policias dos nossos territórios. Durante séculos, os

capitalistas (estrangeiros) se conduziram no mundo subdesenvolvido como verdadeiros criminosos.

Esses problemas são causados por pessoas fora da África, que chegam fazendo isso e aquilo. Colocando um grupo contra o outro, para que eles comecem a brigar. E enquanto estão brigando, estrangeiros chegam dominando. Você traz armas, você as dá para um grupo e faz com que ele passe a odiar o outro grupo. Então eles começam a brigar, a matar uns aos outros. E quando a briga e a matança, realmente tem inicio. Eles chegam

como pacificadores.

A áfrica ainda é o continente mais rico da face da terra, mas ainda assim vejam o sofrimento...

TUDO VAI BEM PARA TODOS MENOS NO CONTINENTE AFRICANO

Vamos nos converter a triste caricatura do norte? Vamos ser como eles? Vamos repetir os horrores da sociedade de consumo que está devorando o planeta? Vamos ser violentos? Vamos crer que estamos condenados a guerra incessante? OU VAMOS GERAR OUTRO MUNDO DIFERENTE? Mas o quadro real, segundo o documentário é que temos sido a reprodução desse modo de vida destrutivo e os que estão no poder tentam nos convencer que há nada melhor modelo. Milton diz: nós decidimos ser europeus e insistimos em ser europeus. Nos recusamos a pensar como nós próprios porque

achamos ser mais “chic” pensar como os europeus e os americanos. Aí temos uma enorme dificuldade de compreender o mundo e essa enorme dificuldade nos deixa meio atarantados, meio tolos, diante da história que está se passando. Daí a própria política brasileira fica perdida porque, na hora, não sabemos muito o que fazer com o mundo novo porque não descobrimos as formas de pensar esse mundo novo a partir de nós próprios.

“Os problemas da África não começaram na África”

O desafio da América Latina segundo Eduardo Galeano

Page 7: Milton santos

O documentário apresenta o caminho inverso dos pobres que vão ao shopping e dos ricos que

visitam a favela carioca.

Já foi tema do Enem

Diz Milton: o problema que me parece importante para a globalização é a

segmentação da formulação dos códigos éticos. Ou seja, há uma ética dos poderosos

que não chega a ser ética. E há uma outra ética, dos que não tem nada. Como

também há uma ética dos que desesperados, tomam o caminho do que a gente chama

de violência. Eu creio que essa outra ética, não dos desesperados que praticam a

violência gratuita, mas dos que querem grandes mudanças é cada vez mais

compreendida nas camadas mais baixas da sociedade, mas ela tem contra ela toda

uma formulação dessa ética dos poderosos, do direito escrito, da concepção dos juízes

e da justiça quanto o que é a convivência social...Mas o que importa é que a mudança tem uma base histórica muito forte e ela está

ganhando as suas formas de ação que são inovadoras, supresivas, eficazes e algum de nós decidimos apoiá-los, apesar de nossa

herança dessa ética que envelhece, por incapaz de atender os interesses da maioria.

Os sem-terra tratados como fato policial não impede de alguns intelectuais independentes de apoiá-los e a população de

desejar que eles tenham sucesso.

O DOCUMENTÁRIO DENUNCIA A FORMA EQUIVOCADA QUE O MST É

APRESENTADO NA MÍDIA

A gente é chamado a pensar na violência como ela é definida

tradicionalmente, mas a gente não entende, não compreende o mecanismo

intelectual dessas novas formas de Solidariedade e Reivindicação.

“O BRASIL JAMAIS TEVE CIDADÃOS. NÓS, A CLASSE MÉDIA, NÃO QUEREMOS DIREITOS, NÓS QUEREMOS

PRIVILÉGIOS. OS POBRES NÃO TEM DIREITOS. NÃO HÁ POIS CIDADANIA NESSE PAÍS. NUNCA HOUVE.

Milton Santos

As formas tradicionais de democracias já não convencem os mais pobres. Assim grupos buscam alternativa para uma globalização solidária.

O mundo possível deve vir do Estado. Segundo Milton a desorganização que estamos vivendo pode não ser ruim se ela for acompanhada por intelectuais na compreensão das condições nas quais estamos vivendo. Acredita que certas formas de mudanças só acontecerão a partir do Estado. Não serão ONGs nem o Terceiro Setor a fazê-las porque o Estado é indispensável, sobretudo porque ele é abarcativo, ou seja, só ele

pode cuidar do conjunto das pessoas que precisam de cuidados. O Estado se torna cada vez mais indispensável porque as fontes criadoras de indiferenças são muitos maiores do que no passado então é necessário que o Estado intervenha, um estado socializante.

E Saramago cuja obra que lhe deu o Nobel “Ensaio sobre a cegueira” é

também cobrada no processo da UESB através de adaptação cinematográfica,

aparece no documentário dizendo:

Tudo se discute neste mundo, menos uma única coisa: a democracia.

Ela está aí, como se fosse uma espécie de santa no altar, de quem já não se

espera milagres, mas que está aí como referência. E não se repara que a

democracia em que vivemos é uma democracia seqüestrada, condicionada,

amputada.

O poder do cidadão, o poder de cada um de nós, limita-se, na esfera política, a tirar um governo de que não se gosta e a

pôr outro de que talvez venha a se gostar. Nada mais. Mas as grandes decisões são tomadas numa outra grande esfera e todos

sabemos qual é. As grandes organizações financeiras internacionais, os FMIs, a Organização Mundial do Comércio, os bancos

Page 8: Milton santos

mundiais. Nenhum desses organismos é democrático. E, portanto, como falar em democracia se aqueles que efetivamente

governam o mundo não são eleitos democraticamente pelo povo? Quem é que escolhe os representantes dos países nessas

organizações? Onde está então a democracia?

Então Milton diz:

A questão é essa: a gente esvaziou a palavra democracia de conteúdo. Falam de democracia sem saber muito bem do que

estão falando. Utilizamos uma série de conceitos de outro tempo que se tornaram vazios porque o tempo mudou. O que é

conveniente. O que ficou foi o eleitoral. O resto, a representatividade a responsabilidade...Tudo isso perdeu força. A coerência com

idéias. Essa transparência só é possível se o partido tivesse claramente idéias, senão de que é que a gente tá falando se a gente

não souber o que os partidos querem fazer de nós.

Nós reclamamos contra os totalitarismo e caímos noutro.

Noutras formas de totalitarismo onde nos é exigindo um

comportamento estenda, onde, para ser eficaz temos que seguir

um mesmo modelo, uma mesma bula, onde os caminhos parecem

ser marcados de forma rígida e todo escape é punido na primeira

esquina. Então acho que nunca houve um mundo que espalhasse

que a liberdade é a forma suprema de vida e ao mesmo tempo

suprimisse a verdadeira liberdade. Porque essa carência de

liberdade que compromete inclusive o exercício da cidadania que

creio que é uma marca de nosso tempo e, mais cedo ou mais

tarde, vai se mostrar insuportável como os totalitarismos que

tiveram os seus dias contados.

A globalização produz esses globalitarismo. Globalitarismo que existe para reproduzir a globalização. Acho que esse ciclo

de coisas que a gente vai ter que quebrar através da produção de formas democráticas que sejam realmente democráticas.

Utopia para o século XXI

Eu creio que as condições da geografia atual nos permitem ver que outra realidade é possível. Essa outra realidade é boa

para a maior parte da sociedade. Nesse sentido sou é otimista. Sou pessimista quanto ao que está aí, mas otimista quanto ao que

pode chegar. Virá outra globalização!

Estamos fazendo ensaios do que será a humanidade. Nunca houve...

... ...

Milton santos morreu em 24 de junho de 2001...mas

Page 9: Milton santos

Terra

Caetano Veloso

Composição: Caetano Veloso

Quando eu me encontrava preso

Na cela de uma cadeia

Foi que vi pela primeira vez

As tais fotografias

Em que apareces inteira

Porém lá não estavas nua

E sim coberta de nuvens...

Terra! Terra!

Por mais distante

O errante navegante

Quem jamais te esqueceria?...

Ninguém supõe a morena

Dentro da estrela azulada

Na vertigem do cinema

Mando um abraço prá ti

Pequenina como se eu fosse

O saudoso poeta

E fosses a Paraíba...

Terra! Terra!

Por mais distante

O errante navegante

Quem jamais te esqueceria?...

Eu estou apaixonado

Por uma menina terra

Signo de elemento terra

Do mar se diz terra à vista

Terra para o pé firmeza

Terra para a mão carícia

Outros astros lhe são guia...

Terra! Terra!

Por mais distante

O errante navegante

Quem jamais te esqueceria?...

Eu sou um leão de fogo

Sem ti me consumiria

A mim mesmo eternamente

E de nada valeria

Acontecer de eu ser gente

E gente é outra alegria

Diferente das estrelas...

Terra! Terra!

Por mais distante

O errante navegante

Quem jamais te esqueceria?...

De onde nem tempo, nem espaço

Que a força mãe dê coragem

Prá gente te dar carinho

Durante toda a viagem

Que realizas do nada

Através do qual carregas

O nome da tua carne...

Terra! Terra!

Por mais distante

O errante navegante

Quem jamais te esqueceria?

Terra! Terra!

Por mais distante

O errante navegante

Quem jamais te esqueceria?

Terra! Terra!

Por mais distante

O errante navegante

Quem jamais te esqueceria?...

Na sacada dos sobrados

Da velha são Salvador

Há lembranças de donzelas

Do tempo do Imperador

Tudo, tudo na Bahia

Faz a gente querer bem

A Bahia tem um jeito...

Terra! Terra!

Por mais distante

O errante navegante

Quem jamais te esqueceria?

Terra!