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    A REPRESENTAÇÃO DO ÍNDIO EM TERREIROS DE SÃO LUÍS-MAMundicarmo Ferretti Pesquisa em Foco, São Luís, v. 5, n. 5, p. 47-57, 1997.

     

    A REPRESENTAÇÃO DO ÍNDIO EM TERREIROS DE SÃO LUÍS-MA1

     Mundicarmo M. R. Ferretti 2

     

    RESUMO: Análise da representação do índio em terreiros de Mina da capital maranhense. Mostra que, no

    Tambor de Mina, as entidades espirituais indígenas são “acabocladas mas que elas podem ser recebidascomo “sel!agens, no Tambor de "ndio, #orá ou $an%er&, reali'ados em terreiros que t&m linhas de Mina ede $ura ()a%elança*. $hama a atenção que, naqueles rituais, elas são associadas a santos cat+licos ein!ocadas para combater “orças negati!as. 

    1. INTRODUÇÃO -os terreiros da capital maranhense, especialmente nos que se deinem como Mina, as entidades

    espirituais caboclas raramente são caracteri'adas como índio (ao contrário do que acontece com os deoutras maniestaçes religiosas aro/brasileiras*. 0, embora muitas tenham alguma ligação mitol+gica comíndio e possam aparecer em alguns rituais como índio, insiste/se em airmar a dierença entre índios ecaboclos.

    A partir de 1234 tem sido reali'ado anualmente, em alguns terreiros de Mina da capitalmaranhense, um ritual denominado Tambor de "ndio ou #orá, para as entidades espirituais indígenas.-esse ritual, que geralmente acontece em tr&s noites consecuti!as, antecedidas e sucedidas por um toquede Mina para caboclo, “para mudança de corrente, as entidades indígenas maniestam/se com suas

    características especiais.Ti!emos oportunidade de ou!ir um relato do ritual original entre!istando 0l'ita, mãe/de/santo queoi guia (mãe pequena* no Terreiro de 5enhora 5antana (de 6enira Ferreira de 7esus, %á alecida*, onde elesurgiu, e que reali'a atualmente este ritual em sua casa. 8u!imos a descrição do Tambor de "ndio noterreiro de Maria'inha, tamb9m alecida (tal!e' o segundo a reali'ar aquele ritual*, eita por um de seusilhos, e i'emos quator'e obser!açes de #orá em quatro terreiros de 5ão :uís; na $asa Fanti/Ashanti em12* e 12 (>*? no Terreiro F9 em 6eus em 12 (1*, 12

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    (F0RR0TTC,M.R,.1224*. )retendemos retomar aqui nossa descrição do Tambor de "ndio ou #orá, alar desuas !ariaçes e analisar como o índio 9 representado naquele ritual e como se dierencia dos caboclosnos terreiros onde obser!amos aquele ritual.

    2. O TAMBOR DE ÍNDIO EM TERREIROS DE MINA DE SÃO LUÍS 

    0m primeiro lugar, gostaríamos de inormar, ou de lembrar, que Mina 9 uma religião de origemaricana surgida na capital maranhense, onde 9 predominante e inluencia todas as maniestaçesreligiosas aro/brasileiras. @ amplamente diundida na região -orte e tamb9m muito conhecida nos0stados para onde oi grande a migração de “nortistas como; Rio de 7aneiro e 5ão )aulo. 8s terreiros deMina mais antigos oram organi'ados em 5ão :uís, em meados do s9culo passado, por aricanas do6ahom9 e outras conhecidas como nag e angola, continuam em uncionamento. 5ão eles; a $asa dasMinas/7e%e, consagrada a Iomadonu, e $asa de -ag, consagrada a Jang (#ad9*.

    Tem/se noticia de pelo menos um terreiro antigo, de nação cambinda, em $od+, no interior doMaranhão. 0ste terreiro, ha muito desaparecido, tinha grande comunicação com a $asa das Minas/7e%e e,segundo relato de 6a. 6enil, !odunsi que está K rente da casa nos Lltimos anos, de lá !eio para a $asadas Minas o !odum Arrono!issa!á. Mas a religião aro/brasileira tradicional de $od+ 9 conhecida porTambor da Mata, Terec ou #arbassu&ra (termo atualmente menos utili'ado* e apresenta muitasdierenças, tanto em relação K Mina 7e%e, quanto em relação K Mina -ag.

    -o Tambor de Mina as entidades aricanas cultuadas são mais conhecidas por !odum mas, otermo !odum ou !odunso 9 tamb9m utili'ado para designar entidades espirituais antigas e recebidas pelosm9diuns como “senhor ou senhora, patrão ou patroa / “donas da cabeça. Fora da $asa das Minas/7e%esão tamb9m recebidas em transe mediLnico, nos toques reali'ados nas estas de santo (5ão 5ebastião,5ão #enedito, 5anta #árbara e outros*; gentisD nobres europeus (como 6.:uís e Rei 5ebastião*?gentilheiros / termo usado na $asa Fanti/Ashanti para designar nobres que !em na corrente de caboclo(como os turcos*? e caboclos (uns de origem nobre, geralmente ligados a $aboclo Belho, da #arra do$ariri, outros da mata, como 5urrupira do angá, e :9gua/#o%i/#oá, entidade angolana ou cambinda, damata de $od+DMA*. Alguns terreiros de Mina recebem tamb9m índios em toques especiais, denominadosTambor de "ndio, #orá ou $an%er&, de que nos ocupamos, mais particularmente, neste trabalho. Asentidades indígenas não incorporam nos toques de Mina, a não ser que se maniestem como caboclo(como ci!ili'adoN*.

    8 Tambor de "ndio surgiu em terreiros de Mina de 5ão :uís por !olta de 1234, para entidadesindígenas da linha de $aboclo Belho, que não costumam ser recebidas nos toques reali'ados nas estas desanto, ou que s+ podem se maniestar ali acabocladas (sem suas características especiais*.

    Oá unanimidade de que o #orá começou a ser reali'ado por 6enira / mãe/de/santo de B+ Miçã(-anã* iniciada por Iacarias, eE/alab& (tocador de cabaça* da $asa de -ag, preparado no Terreiro do0gito com uma entidade da mata denominada Rei 5urrupira. 5egundo Mãe 0l'ita, na casa de 6enira eleera precedido por obrigação no mar e longo período de acampamento. 0ra reali'ado para a linha indígenade $aboclo Cta (ilho de $aboclo Belho / da “#arra do $ariri*, sem nenhuma relação com $uraD)a%elança enem com 5urrupira / apesar de 6enira ter sido iniciada em terreiro de 5urrupira e de receber 6a.5urrupira. A corrente !inha “no balanço, de 5ão Miguel para $aboclo Cta, passando pela balançacarregada nas mãos por aquele. 8u!imos tamb9m alar da reali'ação ali, durante o #orá, de pro!asse!eras de coragem e de incorporação, como mergulhar a mão em panela de a'eite de dend& er!endo.

    -os anos 4P o #orá passou a ser reali'ado tamb9m por outros pais/de/santo de 5ão :uís como;Maria'inha, 7os9 7oão, 0uclides (a partir de 1243*, para índios e entidades da mata, especialmente5urrupiras. Ap+s o alecimento de 6enira, em 12Q4, passou a ser reali'ado tamb9m em dois terreirosoriundos daquele; no de 0l'ita (guiaDmãe/pequena do terreiro de 6enira* e no de Rem9dios (ilha da casaque tornou/se esposa do !iu!o de 6enira*. -a maioria desses terreiros o #orá passou a ser conhecidotamb9m denominado $an%er& / termo que aparece no dicionário da língua portuguesa de Aur9lio(F0RR0CRA,A.12G4* associado a bruEaria e eitiçaria. )ai 0uclides parece conirmar aquela interpretaçãoquando eEplicando o caráter secreto do $an%er& airma os toques são precedidos por rituais de “magia reali'ados no acampamento (troca de cabeça / transer&ncia de maleícios para animais* e a oerendasreali'adas para o “po!o da rua, tradicionalmente eEcluídos da Mina (F0RR0CRA,0. 12

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    8 Tambor de "ndio ou de #orá 9 reali'ado geralmente em 5etembro, em torno do dia de 5ãoMiguel Arcan%o (=2D2*, patrono dos índios que, segundo )ai 0uclides (da $asa Fanti/Ashanti*, 9 !encedorde batalha contra o demnio / inimigo combatido pelos espíritos indígenas na luta tra!ada durante o$an%er&. @ tamb9m reali'ado em 8utubro, pr+Eimo ao dia de 5ão 7os9 dos "ndios, no Terreiro das )ortasBerdes (do inado 7os9 7oão*. 5endo reali'ado para entidades indígenas apresenta características nãoencontradas nos rituais de Mina onde se recebem caboclos;

    9 toque anual / para a linha de $aboclo Belho?acelerado e direto (com um inter!alo mas sem interrupção, pois nele não se doutrina*?com muitos instrumentos; abatas, tambores de crioula, cabaça, erro, gan'á, marimba, garraas

    com água e outros?com mLsica quase sem letra, com coros “gritados?com dança pulada, com as entidades bradando e gesticulando? com uso de borá para chamar as

    entidades / bu'ina eita de chire ou de bL'io?uso de lechas, adereços de pena e lutas de espada? precedido por acampamento na mata (sítio*

    para puriicação quando os m9diuns se alimentam apenas de mel, batata doce e rutassil!estres?

    com obrigação dentro dágua (principalmente no mar*?com armação de tocaia no terreiro (abrigo de olhas de palmeira*?com procissão de 5ão Miguel (chee da corrente, no Terreiro F9 em 6eus* ou de 5ão 7os9 dos

    "ndios (patronos dos índios*?com bebida especial (Ks !e'es denominada “cauim* oerecida em cuia e obrigação (comida*

    especíica para o pessoal da casa?com roupas pr+prias (geralmente de seda e com brilho* / sem toalhas, panas (lenços de seda* e

    rosários (colares de !ários ios* usados por !oduns, gentis e caboclos nos toques deMina?

    com entidades quase sem comunicação com a assist&ncia, sem alar ou com ala quaseincompreensí!el (!ocabulário pr+prio e “língua do tr&*?

    com desconhecimento do nome de muitas das entidades incorporadas.com pro!as de coragem (mergulhar a mão no dend& er!endo, pisar em brasa*.

    2.2 Ta&'#r "e Í("# c#& S$rr$)ras *(a Casa "e +#s, +## $omo %á nos reerimos anteriormente, o Tambor de "ndio ou #orá 9 organi'ado em alguns

    terreiros para índios (corrente de $aboclo Belho, tamb9m conhecida na $asa Fanti/Ashanti por 7urema#ranca* e para entidades da mata, como os 5urrupira. -o Terreiro das )ortas Berdes (de 7os9 7oão* 9reali'ado para índios Srubu “da região do Ctapecuru (como ala a letra de uma das mLsicas recolhidas* epara 5urrupiras, conhecidos como da mata do angá, de locali'ação geográica por n+s desconhecida(mata aricanaN*. 5egundo Mãe 0l'ita, essa associação não eEistia na casa de 6enira e nem ocorre no seuterreiro, apesar dele ter 5urrupirinha como chee espiritual. Ali o tambor de 5urrupiras 9 reali'ado no5ábado de Aleluia (ap+s QH eira de paiEão*, para eles e para os Fulupa, entidades comandadas por5urrupirinha, de quem pretendemos nos ocupar em outro trabalho.

    -o Terreiro das )ortas Berdes (de 7os9 7oão* a %unção de índios e 5urrupiras no Tambor de #orá 9eEplicada por um “mito contado pelo pai/de/santo incorporado pelo índio Aguncha (pai dos outros índiosrecebidos ali*, que nos oi reprodu'ido por 6a. Maria, !iu!a de 7os9 7oão;

     “Sm grupo de índios Srubu esta!a atra!essando a baia numa canoa, em busca de rem9dio para oseu pai, que encontra!a/se doente, quando em meio a uma tempestade a canoa nauragou e os índiosoram encantados por Rei 5urrupira. )or essa ra'ão os índios do #orá são da mata mas, sua orça !em domar, e na noite que antecede o #orá se a' uma obrigação no mar.

    -a casa do inado 7os9 7oão o Tambor de #orá apresenta algumas características especiais;

    o toque 9 anual mas, reali'ado para índios Srubu (miscigenadosN* encantados por Rei 5urrupira(negro*?

    a procissão 9 para 5ão 7os9 dos "ndios?

    alem de antecedido por acampamento, 9 precedido por ritual na praia?

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    durante o ritual as entidades deitam em cama de espinho (característicos da mata dos 5urrupiras*e apagam brasa com os p9s?

    as entidades espirituais são agressi!as (%ogam tição em incr9dulo, a'em eEig&ncias e ameaças* eanti/sociais (icam isoladas em tucueiros, al9m da segregação em acampamento etocaia*.

    -o Terreiro das )ortas Berdes o Tambor de #orá 9 tamb9m denominado $an%er& e os índiosaparecem como guerreiros da mata (“o primeiro eE9rcito brasileiro, como nos eEplicou uma pessoa ligadaa casa* mas tamb9m como eiticeiros, como pudemos constatar analisando letras de mLsicas recolhidasdurante o ritual ou cantadas para n+s, depois do #orá, por 6a. Maria (!iu!a de 7os9 7oão*;

     “Marimba, 9 chegadoo índio eiticeiro da mata quando eu chego no terreiro eu quero guia 

     “-+s somos índios guerreiros ilho do índio Srubu e lá na mata onde eu moro, 9 perto de Ctapecuru 

     2./ Ta&'#r "e Ca(0er *(a Casa a(t-As3a(t 8 $an%er& começou a ser reali'ado na $asa Fanti/Ashanti em 1243, quatro anos antes da

    inauguração do seu barracão de Mina, para pagar uma promessa de )ai 0uclides a Taba%ara, cheeespiritual de terreiro, de a'er aquele ritual durante sete anos. Mas oi reali'ado ali durante =2 anosconsecuti!os (1243/12* e, em 12Pani!ersário do terreiro.

    $onorme )ai 0uclides, o $an%er& 9 uma batalha de espíritos da mata contra espíritos “poucoe!oluídos (0Eus e Uiubas* e se undamenta em inormação recebida de sua mãe/de/santo, no Terreiro do0gito, e em ritual reali'ado ali por Rei 5urrupira, incorporado em Iacarias, pai/de/santo de 6enira.5egundo conta;

     “Oou!e um tempo em que os espíritos pouco e!oluídos esta!am ameaçando dominar a terra e Rei5urrupira !eio para controlá/los. )ara reali'ar sua missão, con!ocou os espíritos da mata e, incorporadoem Iacarias, reali'ou um ritual desconhecido, tocando em cabaças emborcadas dentro dágua...

    -a $asa Fanti/Ashanti, a ligação do #orá com 5urrupira s+ aparece em seu “mito de origem. -asseis obser!açes de $an%er& que reali'amos ali não registramos a presença de olha de tucum (palmeirados 5urrupiras* e nem a alusão a espinhos (símbolos do 5urrupiras* nas letras das mLsicas cantadas ounas alas ou!idas no $an%er&. As reer&ncias a rituais de eitiçaria durante o #orá (apresentado comoreligião ou como obrigação ligada a entidade indígena*, que aparecem mais claramente no discurso dopai/de/santo daquele terreiro, são associadas não a entidades da mata (índios e 5urrupiras* mas, a “po!ode rua. 5egundo )ai 0uclides estes, não s+ recebem oerenda (para deiEarem de aligir as pessoasN*,como tamb9m, Ks !e'es, se aproEimam dos m9diuns (quando icam de olhos !idrados e parecemdesalecer* para mostrar que receberam o presente e estão ali.

    -a $asa Fanti/Ashanti o #orá ou $an%er& eEibe as seguintes características especiais;

    9 reali'ado com índios comandados(N* por Taba%ara, turco que entrou na aldeia de $aboclo Belhoe que lutou na uerra do )araguai (de onde se origina a índia #artira, com quem secasou, e #alanço, ilho de #arão de uar9, que oi por ele adotado como ilho*?

    com oerenda para “po!o de rua e possibilidade de in!asão desses espíritos (o que se airmaacontecer quando um m9dium ica de olhos !idrados e parece desalecer durante otoque*?

    com rituais de eitiçaria (troca de cabeça*?com ritual iniciado dentro de rio (tocando em cabaças emborcadas na água* e toque em garraas

    com água?com batalha de índios, comandados por turco, contra espíritos “não e!oluídos (nos primeiros

    le!a!am em procissão 5ão 7orge que 9 representado “pisando o demnio*?

    com demonstração de sel!a%aria (a!ançar contra pintos querendo com&/los cru, perseguircriança*? e coragem (mergulhar a mão no a'eite er!endo e deitar em espinho*?

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    entidades com comportamento ora semelhante ao caboclo (umando, tomando chá*, ora dierentedele (doutrinando pouco, sem toalha e rosário*.

    cantos com elementos do catolicismo, da “cultura banto e em “língua indígena(N*;

     “Vuem tá em cima de n+s 9 o que Iambi mandou...

     “W & & #obo%ira assobiou / & & & #ombo%ira dd / & & &  

     “7á !im de orar a 6eus Bim saudar santo primeiro... @ ele, 9 ele, da balança do iel X, mas 9 ele, lá nos p9s de 5ão Miguel  

     “TatuUuap9 tapira taEaruá, taEaruá, miEará 

     “Satumã tarumá açu Uu%eira )erY Uamaná uru 

     “Jetin batatatá, tin, tin 

     

    2.4 Ta&'#r "e Í("#s #$ B#r5 (# Terrer# , e& De$s 8 Terreiro F9 em 6eus, de Mãe 0l'ita, se originou de di!isão do Terreiro 5enhora 5antana ap+s o

    alecimento de sua undadora, Mãe 6enira. $omo 0l'ita oi mãe/pequena do terreiro de 6enira e, ao abrirsua casa, oi acompanhada por 1G irmãs/de/santo, o Terreiro F9 em 6eus 9 apresentado por esta comoum prolongamento da casa de sua mãe/de/santo. 8 Tambor de "ndio reali'ado no Terreiro de Rem9dios,sua irmã de santo 9 muito dierente e merece um estudo K parte pois, apresenta muitos elementos queogem ao padrão aqui apresentado. -ele são encontrados 5aci, $abeça de $uia, e outros elementos doolclore de origem indígena? mão santa, cru' e coroa de espinho e outros elementos do catolicismopopular? e a aranha, que segundo )ai 0uclides, quem a conirmou na Mina, 9 o totem dos Fanti/Ashanti.

    $omo Mãe 0l'ita pertence a $aboclo Belho mas, tem 5urrupirinha como guia (principal entidadecabocla*, no Tambor de "ndio reali'ado em sua casa se homenageia $aboclo Belho e se recebe a corrente

    indígena. -o Tambor de #orá, se homenageia 5urrupira. 0l'ita tem ainda como senhora de$uraD)a%elança, 6ona Troirinha / a princesa 6oralice, ilha do Rei da #andeira (nobre portugu&s*. Mas,como %á oi airmado mais de uma !e', o Tambor de #orá 9 um ritual da Mina para entidades indígenas enão tem ligação com a $uraD)a%elança, a qual se liga o #aião, ritual reali'ado na $asa Fanti/Ashantipr+Eimo ao dia de 5anta :u'ia (1>D1=*, para moças e princesas encantadas.

    -o Terreiro F9 em 6eus as entidades do Tambor de "ndio usam roupa de cetim e uma aiEa ondese l&; Rei #alança, em alusão a 5ão Miguel, representado na iconograia cat+lica com uma balança nasmãos, “por ser o encarregado de pesar as almas no %uí'o inal e separar as que merecem o c9u das que!ão para o inerno. A mesma iconograia eEplica o porque do uso de espada pelos índios do #orá, noscombates representados durante o ritual.

    2.6 A(5%se "#s "a"#s et(#!r57c#s

     Analisando os dados aqui apresentados obser!amos, em primeiro lugar, que na Mina maranhense

     “nem todo dia 9 dia de índio e que, enquanto os caboclos podem se maniestar em quase todos ostoques, os índios s+ são recebidos uma !e' por ano (no #orá*, em alguns terreiros, e são comandados por5ão Miguel ou tutelados por caboclo (turco ou 5urrupira*. )ara se maniestarem nos toques de Mina t&mque !ir como caboclos (a eEemplo do índio 5apequara, que oi integrado K Mina como $aboclo Belho*,reprimindo seus traços de sel!ageria.

    8 índio aparece primeiro nos terreiros de Mina como caboclo, ora da mata. $aboclo Belho (o índio5apequara*, apresentado como a “primeira entidade cabocla a bradar no tambor de Mina, 9 “da barra do$ariri. -o “mito do #orá, contado por )ai 0uclides, os índios oram chamados por 5urrupira (caboclo*, noTerreiro do 0gito, batendo em cabaça emborcada dentro dágua / orma descrita na mitologia teneteharade chamada da di!indade da água, Z[án (\A:0Z,$ e A:B]8,0. 12Q1;1>4*. 5e pensarmos em “barra 

    como; banco ou croa de areia ormado no mar ou lagoa por rios que ali desembocam (F0RR0CRA,A. 12G4*,podemos entender porque o caboclo da Mina maranhense 9 mais ligado ao !odum A!erequete (do mar* do

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    que ao oriEá 8Eossi (da mata* e porque o Tambor de "ndio 9 precedido por obrigaçes no mar eacampamento / longe da cidade e pr+Eimo K mata (onde !i!em os índios não transormados em caboclo*.

    8s índios do #orá aparecem ligados aos santos (5ão Miguel e 5ão 7os9* e, Ks !e'es, comandadospor 5ão Miguel. A associação de índios a 5ão Miguel 9 muito antiga e parece ter a !er com a catequesedos %esuítas (:0CT0,5 1243*. Tanto 5ão Miguel, este%ado em =2D2, quanto 5ão 7os9 dos "ndios, este%adoem 8utubro (no dia ==D1P / dia das MissesN* oram patronos de índios maranhenses, como se pode !er

    na denominação de alguns po!oados; 5ão 7os9 dos "ndios (município de Ribamar* e 5ão Miguel dos "ndios(município de Rosário*, ambos pr+Eimos K capital. Mas a presença de 5ão Miguel nos oi eEplicada em umterreiro de 5ão :uís, durante um #orá, como sendo de!ido índio gostar de pena e 5ão Miguel ter asas,pois 9 um an%o...

    -o #orá o acampamento surge como um espaço intermediário entre a cidade e o terreiro(ci!ili'ação* e a mata ou aldeia (sel!ageria*, onde os índios podem eEibir comportamentos consideradossubumanos, como atacar a!es para de!ora/las... A segregação do acampamento parece a!orecer aprática de ati!idades de eitiçaria, temidas pela população aro/brasileira e reprimida pela classedominante (e pela polícia*. Mas a eitiçaria dos índios s+ aparece mais claramente no #orá deinido como$an%er&, quando os índios são comandados por turcos (!istos no olclore como inimigos dos cristãos* ou5urrupiras (negros !istos req^entemente como eiticeiros*.

    )or causa de 5ão Miguel, o índio do #orá luta de espada, usa saiote que lembra soldado romano e

    tem balança (símbolos de 5ão Miguel na iconograia cat+lica*. A relação dos índios do #orá com santos,especialmente com 5ão Miguel, desencora%a a interpretação das entidades indígenas como espíritospagãos, ligados K “magia negra ou a trabalhos “para a esquerda (como são !istas muitas entidades aro/brasileiras*. @ preciso lembrar que no $an%er& eles aparecem como uma orça quase incontrolá!el,perigosos e pr+Eimos, ou misturados, ao “po!o de rua mas, lutando contra os espíritos ineriores (“eEus eUiubas*.

    Sm certo nLmero de características apresentadas pelas entidades indígenas no #orá pareceresponder a eEig&ncias do conteEto em que ele se reali'a / o terreiro de Mina. @ deste modo queinterpretamos o uso de roupa de cetim pelas entidades indígenas / tecido usado tradicionalmente na Minapor !oduns e caboclos. -o ritual de $uraD)a%elança 9 cantada uma toada onde um encantado di' “quandoeu chego em terra de branco, eu boto o meu cordão de ouro. $olocando essa mensagem na boca do índiodo #orá poderíamos interpretá/la; “quando eu chego em terreiro de Mina, tiro minha tanga e !isto roupade cetim... Vuem conhece o Tambor de Mina sabe que diicilmente um m9dium incorporado com entidade

    indigena poderia dançar em um terreiro de Mina !estido como índio; nu ou seminu (aos olhos do “branco*e com roupa mais pobre do que a usada no cotidiano pela população do terreiro.

    Algumas características do #orá acentuam sua distinção da Mina; pluralidade de instrumentosmusicais e presença entre eles de instrumentos rLsticos ou ligados K mLsica olcl+rica tradicional (garraascom água, tambores de crioula*? aus&ncia de rosários (colares rituais*, toalhas e panas usados por !odunse caboclos nos toques de Mina, etc.. 0 algumas características apresentadas pelas entidades indígenas no#orá marcam as dierenças eEistentes nos terreiros de Mina entre elas e entidades espirituais de outrascategorias que são ali recebidas. “Mineiro em transe com !odum ou caboclo dança e doutrina (puEamLsicas nos rituais*, em transe com índio pula e grita...

    )arece que na Mina a grande distinção entre índios e caboclos reside na linguagem. 8 índio 9apresentando como destituído de linguagem compleEa, alando portugu&s errado e comunicando/se maispor gritos do que por pala!ras, o que o impede de doutrinar e, em Lltima análise, de dançar Mina (onde

    !oduns e caboclos $antam*. )or essa ra'ão ningu9m indaga por que os terreiros não dispem de umrepert+rio musical em língua indígena, quando tem um repert+rio tão !asto em línguas aricanas (no #oráda $asa de Fanti/Ashanti são cantadas algumas mLsicas “ensinadas pelas entidades espirituais que seacredita serem em tupi mas a Antrop+loga e :ing^ista baiana Z&da )essoa de $astro constatou que umadelas era em Uibundo e ala!a; “os tambores %á começaram a tocar...*.

    A ineEist&ncia de cançes indígenas tradicionais (dos Srubu/_aapor, dos ua%a%aras ou de outrosgrupos do Maranhão* reorça nossa tese de que o #orá 9 uma produção cultural aro/brasileira e não umaperpetuação de tradição indígena. 8 que se chama ali de “ala de índio 9 mais uma deturpação doportugu&s (“língua do tr&* ou um pequeno !ocabulário aro/brasileiro que tal!e' pouco tem a !er com alíngua dos grupos sociais representados pelas entidades espirituais indígenas recebidas no ritual (dosSrubu/_aapor, por eEemplo*. @ bom tamb9m lembrar que a denominação grupal das entidades indígenasrecebidas no #orá, não corresponde K autodenominação dos grupos indígenas por elas representados.

    8s índios do #orá do Terreiro das )ortas Berdes são Srubu e não _aapor, do mesmo modo que asentidades espirituais ciganas recebidas em terreiros de 5ão :uís não são denominadas calen (calon, no

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    singular, e cali, no eminino / RC#0CR8,R. 122=*. -o caso das entidades indígenas, alem da categoriaSrubu ser eEterna, o termo usado tem um sentido pe%orati!o entre “os brasileiros ci!ili'ados. 5e a pala!ra_aapor, para o grupo indígena de mesmo nome, signiica “moradores da mata (RC#0CR8, 6. 12G3*, apala!ra Srubu signiica para os “brasileiros ci!ili'ados; su%o, comedor de carniça, e de!e ter alguma coisaa !er com a sua associação K eitiçaria (“linha negra* encontrada no #orá. A locali'ação da mata dasentidades espirituais indígenas classiicadas como Srubu recebidos no #orá, no CtapecurL, parece tamb9m

    não corresponder K dos _aapor, que !i!em na região do )indar9 (RC#0CR8, 6. 12G3*.)elas ra'es apresentadas, o índio do #orá parece representar mais a população aro/brasileira

    maranhense (miscigenada biol+gica e culturalmente* do que o índio propriamente dito. -este sentido, oíndio Srubu pode ser encarado tanto como um índio negro (“talhado K moda aro/brasileira* como umsímbolo do lado indígena da população aro/brasileira, lado este reconhecido com orgulho por uns(segundo estrat9gia de branqueamento* e negado por outros (numa estrat9gia de aricani'ação*. 

    /. CONCLUSÃO 0m trabalhos anteriores (F0RR0TTC, M.R. 122>? 1223* mostramos que a classiicação de

    entidades espirituais no Tambor de Mina 9 elaborada le!ando/se em consideração !ários crit9rios e queapresenta grande maleabilidade. 0mbora ha%a enquadramentos em categorias %ulgadas erradas ou

    impossí!eis, uma entidade pode ser classiicada em categorias dierentes, em um mesmo terreiro.A constatação de que entidades espirituais como $aboclo Belho, que 9 apresentado como o

    primeiro caboclo da Mina, como o índio 5apequara e como !odunso no Terreiro F9 em 6eus (onde 9 odono da cabeça da mãe/de/santo*, longe de nos le!ar K conclusão de que o po!o/de/santo maranhensenão a' distinção entre !oduns aricanos, índios e caboclos, nos mostra a necessidade de compreender osigniicado que cada termo classiicat+rio tem em um terreiro e os crit9rios por ele adotados naclassiicação de suas entidades espirituais. Tentamos demostrar em 6esceu na uma(F0RR0TTC,M.R.1221* que no Tambor de Mina caboclo não 9 uma categoria 9tnica e que 9 deinido maispela posição da entidade espiritual no terreiro ou `na cabeça` do ilho/de/santo e pela sua relação comoutras entidades recebidas nos terreiros.

    Sm dos crit9rios deinidores da identidade e classiicação de uma entidade no Tambor de Mina 9 omomento e o ritual em que se maniesta. 5egundo esse crit9rio, índio, por eEemplo, 9 quem dança #orá, o

    que não signiica que se um !odum aricano osse recebido nesse ritual passaria a ser classiicado comoíndio brasileiro. Bimos, por eEemplo, que há “mistura de correntes no #orá, que caboclos da mata, como5urrupira, e turcos podem participar do ritual e que, no $an%er&, pode ha!er in!asão do “po!o da rua.

    8 índio representado nos rituais obser!ados e analisados neste trabalho, embora apresentemdierenças em relação ao caboclo e este%am abaiEo dele em termos de ci!ili'ação (em sociabilidade,linguagem, autodeterminação*, são moldados a partir de !alores dos “mineiros;

    usam roupas de cetim, dierentes das usadas nos toques de Mina (em !e' de tanga de palha oualgodão rLstico*?

    adotam denominaçes a eles atribuídas pelos “brancos (Srubu, em !e' de _aapor, como noslembrou 6idier de :a!eleYe*?

    aceitam 5ão Miguel e combatem com as armas dele (espada em !e' de lecha*?são organi'ados em amília mas subordinam/se a um caboclo, ilho de $aboclo Belho ou ligado a

    ele (Cta, Taba%ara*, ou chee de outra mata (5urrupira*.

    A análise dos #orás obser!ados mostra a diiculdade de identiicação da concepção de índio nosterreiros de Mina obser!ados uma !e' que, na maioria dos casos, eles são recebidos em rituais onde háparticipação de não índios (caboclos, 5urrupiras* e não há, pelo menos para n+s, uma caracteri'ação claradessas entidades que nos permita identiicar seus traços deinidores. Csso mostra a necessidade deprosseguimento do trabalho etnográico, nos terreiros obser!ados e em outros onde se reali'a Tambor de"ndio.

    $omo no Terreiro F9 em 6eus eEiste uma separação mais nítida entre as entidades da mata dacorrente de $aboclo Belho ou de 5ão Miguel / indígenas /, e entidades caboclas de outras matas,pretendemos tornar nossas obser!açes ali mais sistemáticas e direcionadas para as duas comparaçes;uma de índio com 5urrupira e Fulupa (comparando #orá e Tambor de Fulupa* e outra entre caboclo e índio

    (comparando o toque da primeira e da Lltima noites da esta de 5ão Miguel (que são para caboclos*, como reali'ado nas tr&s outras noites, no #orá (para índio*.

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    0m nossa pesquisa sobre caboclo temos utili'ado a analise das letras das musicas cantadas nosterreiros para aquelas entidades espirituais como complementado dos dados de obser!ação e dasentre!istas. -o caso do Tambor de #orá esse recurso apresenta/se ainda mais escasso. Sma dascaracterísticas da mLsica do Tambor de "ndio 9 o ritmo muito acelerado, os longos períodos sem inter!alo(o primeiro no mínimo com 2P minutos de ritual* e a quase aus&ncia de letras. 8utros atores contribuempara a diiculdade do canto. -a Mina este ou 9 puEado pelo pai, mãe/de/santo, “guia ou mãe pequena, ou

    9 puEado por um m9dium em transe e a musica 9 repetida por todos os que estão na roda, incorporadosou não. -o #orá as entidades espirituais pouco alam ou t&m uma linguagem quase incompreensí!el e adança pulada, alem de cansati!a, diiculta a respiração e o canto.

    )elas ra'es apresentadas, consideramos que a pr+Eima etapa da nossa pesquisa sobre entidadesespirituais indígenas do Tambor de Mina de!e se apoiar mais na análise de rituais. $omo essa análise nãopode prescindir da interpretação das pessoas que dele participam e como os “mineiros alam pouco arespeito de suas entidades espirituais, o trabalho de análise de letras de mLsicas de!e prosseguir, tantodas mLsicas do Tambor de "ndio, quanto nas cantadas para entidades indígenas em outros rituaisreali'ados nos terreiros pesquisados (ligados K Mina, K $ura ou a outra corrente mediLnica*.

    BIBLIO8RAIA CONSULTADA 

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