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LNEC QIC2006 1 METODOLOGIA FMEA E SUA APLICAÇÃO À CONSTRUÇÃO DE EDIFÍCIOS Sónia Raposo Costa e Silva Eng.ª Civil, Assistente de Investigação,LNEC/DED,Lisboa, Portugal, [email protected] Manuel Fonseca Eng.º Civil, Investigador Principal, LNEC/DED, Lisboa, Portugal, [email protected] Jorge de Brito Eng.º Civil, Professor Associado, IST/ICIST, Lisboa, Portugal, [email protected] Resumo Nesta comunicação, apresentam-se os princípios teóricos do método de análise de riscos qualitativo Failure Mode and Effect Analysis - FMEA, indicando-se as principais fases do seu desenvolvimento, campos de aplicação, vantagens e limitações. É ainda abordada a extensão do método para análises semi-quantitativas através de uma análise da criticidade dos modos de falha, designada por Failure Mode, Effect and Critically Analysis - FMECA. Por último, é apresentada a utilidade da implementação do método FMEA durante a fase de planeamento da manutenção do edifício, assim como a sua possível aplicabilidade às fases de concepção, projecto e execução da obra. Palavras-chave: FMEA, Risco,Criticidade, Manutenção, Edifícios INTRODUÇÃO O FMEA - Failure Mode and Effects Analysis, é um método de análise de risco indutivo, que permite avaliar, a partir de um determinado modo de falha, as respectivas causas e sequência de efeitos, assim como os meios de detecção e prevenção dos modos de falha e de mitigação dos seus efeitos. O símbolo C na sigla FMECA indica que, além da análise do modo de falha, é realizada uma análise da criticidade do mesmo. O método assim modificado permite caracterizar a importância no funcionamento do sistema, de cada um dos modos de falha, o impacte que estes têm sobre a sua fiabilidade e a dimensão das respectivas consequências [1]. Neste artigo, procede-se a uma análise exploratória do método, com base essencialmente na norma IEC 60812 - Analysis techniques for system reliability. Procedure for failure mode and effects analysis (FMEA), publicada em Maio de 2006 [2] e na publicação do CIB 310 que compila artigos de diversos autores sobre a aplicabilidade deste método ao sector da construção de edifícios [3], tendo em vista a sua aplicação como ferramenta de apoio à elaboração de planos de manutenção de edifícios.

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METODOLOGIA FMEA E SUA APLICAÇÃO À CONSTRUÇÃO DE EDIFÍCIOS

Sónia Raposo Costa e Silva Eng.ª Civil, Assistente de Investigação,LNEC/DED,Lisboa, Portugal,

[email protected]

Manuel Fonseca Eng.º Civil, Investigador Principal, LNEC/DED, Lisboa, Portugal, [email protected]

Jorge de Brito Eng.º Civil, Professor Associado, IST/ICIST, Lisboa, Portugal, [email protected]

Resumo Nesta comunicação, apresentam-se os princípios teóricos do método de análise de riscos qualitativo Failure Mode and Effect Analysis - FMEA, indicando-se as principais fases do seu desenvolvimento, campos de aplicação, vantagens e limitações. É ainda abordada a extensão do método para análises semi-quantitativas através de uma análise da criticidade dos modos de falha, designada por Failure Mode, Effect and Critically Analysis - FMECA. Por último, é apresentada a utilidade da implementação do método FMEA durante a fase de planeamento da manutenção do edifício, assim como a sua possível aplicabilidade às fases de concepção, projecto e execução da obra.

Palavras-chave: FMEA, Risco,Criticidade, Manutenção, Edifícios

INTRODUÇÃO

O FMEA - Failure Mode and Effects Analysis, é um método de análise de risco indutivo, que permite avaliar, a partir de um determinado modo de falha, as respectivas causas e sequência de efeitos, assim como os meios de detecção e prevenção dos modos de falha e de mitigação dos seus efeitos. O símbolo C na sigla FMECA indica que, além da análise do modo de falha, é realizada uma análise da criticidade do mesmo. O método assim modificado permite caracterizar a importância no funcionamento do sistema, de cada um dos modos de falha, o impacte que estes têm sobre a sua fiabilidade e a dimensão das respectivas consequências [1].

Neste artigo, procede-se a uma análise exploratória do método, com base essencialmente na norma IEC 60812 - Analysis techniques for system reliability. Procedure for failure mode and effects analysis (FMEA), publicada em Maio de 2006 [2] e na publicação do CIB 310 que compila artigos de diversos autores sobre a aplicabilidade deste método ao sector da construção de edifícios [3], tendo em vista a sua aplicação como ferramenta de apoio à elaboração de planos de manutenção de edifícios.

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Tema B – Qualidade na concepção, execução e utilização de empreendimentos

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CONSIDERAÇÕES PRELIMINARES

Uma das primeiras referências escritas ao método é o procedimento militar US MIL-P-1629 intitulado Procedures for Performing a Failure Mode, Effects and Criticality Analisys, desenvolvido pelo exército norte-americano em 1949, e usado na determinação dos efeitos das falhas de sistemas e equipamentos, e classificação segundo o seu impacte sobre o sucesso da missão, e sobre as condições de segurança referentes ao pessoal e aos equipamentos [4].

Na década de sessenta, o FMEA foi amplamente utilizado pela indústria e agências de pesquisa aerospacial sendo que a referência histórica mais relevante remonta à década de setenta quando a Ford Motor Company iniciou o seu uso generalizado, quer internamente, usando-o para conquistar avanços tanto nas áreas de projecto como de manufactura, quer externamente, através do fomento do seu uso pelas empresas suas fornecedoras.

No final da década de oitenta, através de um grupo de trabalho composto por representantes da Chrysler Corporation, da Ford Motor Company e da General Motors Corporation, foi desenvolvida a norma americana QS 9000 que define o sistema da qualidade exigido por estas três grandes companhias quer a fornecedores internos quer a fornecedores externos de produção e fornecimento de materiais e componentes [4].

Os métodos HACCP (Hazard Analysis Critical Control Point) - utilizado como ferramenta de controlo da qualidade em aplicações agroalimentares - e o HAZOP (Hazard and Operability Analisys), são ferramentas próximas da metodologia FMEA, sendo correntemente utilizadas no estudo e análise de problemas potenciais em diversos sectores da indústria.

As normas ISO 9000 de 2000, relativas à implementação de sistemas de gestão da qualidade em empresas, recomendam às empresas que trabalhem de uma forma essencialmente preventiva, tentando melhorar constantemente os seus processos e os seus produtos. No âmbito da lógica da melhoria contínua, o método FMEA surge como um dos instrumentos de apoio passível de ser utilizado pelas empresas [5].

ÁREAS DE APLICAÇÃO

Este método, que se encontra hoje largamente difundido nas indústrias automóvel, aeroespacial e electrónica, pode ser usado no sector da construção em diferentes fases e a vários níveis da empresa, nomeadamente: durante a fase de concepção e desenvolvimento do projecto (FMEA projecto) para optimizar e melhorar as características do produto ou analisar a concepção de produtos / sistemas inovadores, antes da fase de execução / produção deste, e durante a fase de execução (FMEA processo) tendo em vista a redução de falhas e optimização dos processos [1].

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Metodologia FMEA e sua aplicação à construção de edifícios

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FASES DE DESENVOLVIMENTO DO MÉTODO

As fases de desenvolvimento do método de análise são tipicamente as seguintes [1][2]:

1. Análise e hierarquização do sistema; 2. Selecção do sub-sistema a analisar; 3. Estudo funcional e selecção de um estado de funcionamento; 4. Identificação de um modo potencial de falha; 5. Identificação dos efeitos possíveis do modo de falha; 6. Identificação das respectivas causas; 7. Identificação dos métodos de detecção e de prevenção.

Para um FMECA, desenvolvem-se as seguintes fases adicionais [2] 8. Estimar a gravidade do modo de falha em estudo (S); 9. Estimar a probabilidade de ocorrência do modo de falha - (O); 10. Estimar a probabilidade de detecção do modo de falha - (D); 11. Análise da criticidade.

Estas fases encontram-se sumarizadas sob a forma de fluxograma representado na Figura 1 [2].

FASES DO FAILURE MODE AND EFFECT ANALYSIS (FMEA)

Análise e hierarquização do sistema (1)

Na análise do sistema, deve ser feita a identificação e hierarquização dos diversos sub-sistemas e/ou componentes do mesmo [6]. É conveniente representar o sistema através de diagramas simples realçando todas as funções essenciais do sistema [2].

Nesta fase inicial, é muito importante definir o limite do sistema e o nível de análise pretendido. O limite do sistema constitui a interface física e funcional entre o sistema e o que o rodeia e compreende, nomeadamente, os outros sistemas com os quais o sistema analisado interage.

É importante definir os critérios que vão ser utilizados para dividir o sistema para a análise. Por exemplo, o sistema pode ser dividido por funções ou em subsistemas, por unidades facilmente substituíveis ou em componentes individuais. Qualquer que seja a opção, convém que este limite seja igual ao que é utilizado para as fases de concepção, execução e manutenção.

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Tema B – Qualidade na concepção, execução e utilização de empreendimentos

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Figura 1 - Fluxograma da análise FME(C)A [2]

A disponibilidade de informação e a experiência de utilização do próprio elemento podem ser consideradas como um critério de decomposição do sistema. Pode não ser justificável um grande detalhe de análise num subsistema com uma boa fiabilidade e grande maturidade de utilização e com bons registos na área da manutenção e na área da segurança. Inversamente, exige-se maior detalhe e um nível de análise mais baixo -

Inicializar o FMEA ou FMECA

Seleccionar um item / componente do sistema em análise

Identificar os modos potenciais de falha do item seleccionado

Seleccionar um modo de falha para analisar

Identificar o efeito imediato e final do modo de falha analisado

Identificar as causas potenciais do modo de falha

Existem outros componentes para

análise?

Sim

Não

Conclusão do FMEA Definir data da próxima revisão

Não

Sim

Determinar a gravidade do efeito final

Estimar a frequência ou a probabilidade de ocorrência do modo de falha durante um período de tempo prédeterminado

A gravidade e/ou a probabilidade de

aparecimento necessita de acção?

Propor as acções correctivas de atenuação ou eliminação ou disposições de compensação.

Existem mais modos de falha para analisar?

Notas, recomendações, e acções

Sim

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maior pormenorização - para todos os sistemas concebidos recentemente ou para sistemas sem registos na área do funcionamento e manutenção (desconhecimento da fiabilidade do sistema).

Análise funcional (3)

Nesta fase, deve realizar-se uma lista das funções a desempenhar pelo elemento, tendo em conta as exigências e expectativas do cliente e os requisitos regulamentares.

Os desempenhos mínimos requeridos tanto no início do funcionamento do sistema como durante as fases de utilização e manutenção devem estar definidos. Pode ser importante definir nesta fase factores como: intervalo de tempo mínimo requerido para a função, intervalo de tempo entre ensaios periódicos, intervalo de tempo mínimo entre a ocorrência do modo de falha no sistema e a implementação de uma acção correctiva, procedimentos operacionais durante o funcionamento do sistema, tipo de controlo a realizar durante as fases operacionais, realização de manutenção correctiva e/ou preventiva e procedimentos para realização testes de rotina se estes forem utilizados [2].

Identificação dos modos potenciais de falha (4)

Conhecendo-se as funções, realiza-se então o levantamento dos chamados modos potenciais de falha. O modo potencial de falha é a forma como a disfuncionalidade se manifesta e descreve o afastamento em relação à função requerida ou requisito do cliente. Nesta fase, pretende-se responder às questões: como pode falhar um produto ou componente ou como pode falhar potencialmente um processo? O bom desenvolvimento desta fase está muito dependente do grau de pormenorização atingido durante as duas fases anteriores: divisão do sistema e análise funcional.

A informação básica para se encontrar os modos típicos de falha baseia-se em casos de estudo documentados, experiências ou testes laboratoriais, experiência em campo (prática) e opinião de peritos [6]. Pode ser ainda útil o uso de FMEA anteriores, dos relatórios da qualidade, dos relatórios das reclamações de clientes ou intervenções efectuadas durante os períodos de garantia.

Efeitos dos modos potenciais de falha (5)

Para cada modo potencial de falha, deve listar-se as consequências dos efeitos potenciais negativos, quer no rendimento do componente, quer no rendimento do sistema, quer ainda no grau de descontentamento, que a não-conformidade surgida provoca no cliente ou utilizador final, quer em termos de segurança e exigências regulamentares [6].

A análise dos efeitos pode ser feita localmente, ao nível do subsistema / componente em consideração, ou ao nível de efeitos finais sobre o sistema global.

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Causas dos modos potenciais de falha (6)

Para cada modo de falha potencial, deve identificar-se e descrever as causas mais prováveis que estiveram na origem do seu aparecimento. Dado que um modo de falha potencial pode ter origem em várias causas, as causas independentes e mais prováveis para cada modo de falha potencial devem ser identificadas e descritas. Deve procurar-se a razão pela qual a exigência ou requisito falha, procurando nomeadamente dar resposta à pergunta “O que tem que acontecer para que a função seja desempenhada correctamente?”.

Numa análise de criticidade, deve haver o cuidado de pensar já nesta fase nos efeitos e na gravidade dos modos de falha. Quanto mais graves são os efeitos dos modos de falha, mais precisas e desenvolvidas devem ser as causas das falhas identificadas e descritas. Caso contrário, o analista corre o risco de desenvolver grandes esforços não necessários na identificação das causas da falha que têm pouca influência / efeito sobre a funcionalidade do sistema [2].

Métodos de detecção e prevenção (7)

É conveniente que o analista determine, para cada modo de falha, a forma como esta é detectada e os meios através dos quais o utilizador ou o responsável pela manutenção se dá conta da ocorrência da falha. A detecção desta pode ser realizada por um dispositivo automático da concepção (ensaio integrado), pelo estabelecimento de um procedimento de verificação especial depois da entrada em funcionamento, ou através das actividades correntes de inspecção. É conveniente que o método de detecção e prevenção elimine a ocorrência de modos de falha que possam pôr em causa a segurança de pessoas e bens (funcionamento perigoso). É ainda conveniente estudar e listar outros modos de falha que dêem origem a manifestações idênticas às do modo em análise.

FASES ADICIONAIS NO ESTUDO DE CRITICIDADE (FMECA)

Estimar a gravidade do modo de falha em estudo - S (8)

A gravidade (Severity - S), é uma avaliação do impacte do efeito do modo de falha sobre o funcionamento do dispositivo que está a ser analisado. Nessa avaliação, deve ser tida em conta a gravidade do efeito para a operação seguinte, produto final e cliente. A classificação dos efeitos de gravidade deve ter em consideração inúmeros factores, nomeadamente: efeitos possíveis sobre os utilizadores e sobre o meio envolvente, o desempenho funcional do sistema ou do processo, cumprimento de exigências contratuais impostas pelo cliente e requisitos regulamentares ou de garantia [2] .

É atribuída uma classificação de gravidade ao efeito de falha, que constitui o chamado Índice de Gravidade (S). Normalmente é usada uma escala de 1 a 10, em que a

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classificação de 1 corresponde a uma gravidade nula ou imperceptível e a classificação de 10 reflecte a pior possibilidade ao nível de consequências, em que a segurança do utilizador pode estar em risco.

Na indústria automóvel, as falhas são avaliadas em termos do seu efeito no desempenho do sistema (i.e., veículo) e ainda na satisfação do cliente, factor mais subjectivo. A escala de gravidade deve ser gerada de acordo com a indústria e as necessidades da empresa apresentando-se no Quadro 1 a classificação de gravidade de efeitos de falha de Layzell e Ledbetter [10] para sistemas de revestimento de protecção vertical.

Pode ser conseguida uma maior objectividade na classificação recolhendo informação em termos de custos de reparação, custos por perda de utilização do edifício, custos devido a perdas e indemnizações (por ferimentos) [10].

Quadro 1: Exemplos de classificação da gravidade do efeito do modo de falha [10]

S Efeito(s) da(s) falha(s) Automóvel Sistemas de revestimento descontínuo de fachadas

9/10 potenciais problemas de segurança

perda de capacidade de condução

estrutural (rotura, deformações)

7/8 grande descontentamento no cliente

veículo inoperável penetração de água

4/5/6

certo descontentamento no cliente

grande esforço nos pedais

manchas, condensações, ruído

2/3 ligeiro inconveniente ao cliente aparência aparência (cor, acabamento)

1 o cliente não detecta a falha

Determinação da ocorrência - O (9)

Esta variável designa a frequência ou probabilidade de aparecimento de cada modo de falha. Para determinar a probabilidade de aparecimento dos modos de falha, além das informações publicadas sobre as taxas de falha, deve-se obter dados de ensaios da duração da vida do componente, taxas de falhas disponíveis em bases de dados, falhas ocorridas durante a exploração / funcionamento do sistema e falhas em dispositivos semelhantes [2].

Uma vez estimada a probabilidade de ocorrência, o FMEA deve indicar o período de tempo para o qual essa estimativa é feita. Normalmente é o período de garantia, ou a duração de vida predeterminada para este dispositivo ou produto.

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Geralmente, a cotação vai de 1 a 10, sendo que 1 corresponde a uma probabilidade muito remota da falha acontecer e 10 a uma ocorrência muito frequente da falha [11] (Quadro 2).

Quadro 2: Exemplos de classificação da probabilidade de ocorrência [2]

O Probabilidade de ocorrência do modo de falha

1 Probabilidade de ocorrência de falha remota (1 em 1500000)

2/3 Probablidade de ocorrência de falha muito baixa (1 em 15000; 1 em

4/5 Probabilidade de ocorrência de falha baixa (1 em 2000; 1 em 400)

6/7 Probabilidade de ocorrência de falha moderada (1 em 80; 1 em 20)

8/9 Alta probabilidade de a falha ocorrer (1 em 8; 1 em 3)

10 Muito alta probabilidade de ocorrência de falha (1 em 2)

Classificação da probabilidade de detecção - D (10)

O terceiro critério é a medida da probabilidade do procedimento de controlo não detectar a causa da falha ou o modo de falha, antes de chegar ao cliente. Baseado no controlo da qualidade implementado em fábrica, a indústria automóvel classifica a probabilidade do defeito individual de chegar ao cliente numa escala de 1 (probabilidade muito remota, de 0-5% de probabilidade) a 10 (muito alta probabilidade, de 86 a 100% de probabilidade).

Este número está classificado de ordem inversa aos restantes números de gravidade e de ocorrência: quanto mais elevado é o número de detecção, menos provável é a detecção (Quadro 3).

Quadro 3: Exemplos de classificação da probabilidade de detecção [2]

D Probabilidade de detecção pelo controlo da concepção

1 O controlo definido na concepção consegue, com quase toda a certeza, detectar a potencial causa / mecanismo e subsequente modo de falha

2/3/4 Muito alta probabilidade de o controlo definido na concepção detectar a potencial causa / mecanismo e subsequente modo de falha

5/6/7 Probabilidade moderada a alta de o controlo definido na concepção conseguir detectar a potencial causa / mecanismo e subsequente falha

8-9 Baixa probabilidade de o controlo definido na concepção detectar a potencial causa / mecanismo e subsequente modo de falha

10 O controlo da concepção não consegue detectar a causa / mecanismo e subsequente modo de falha; ou não existe controlo

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Análise da criticidade (11)

Um dos métodos para a determinação quantitativa da criticidade consiste no cálculo do Número de Risco de Prioridade (RPN - Risk Priority Number). Este número é o produto dos três factores calculados nos passos (8), (9) e (10), para cada um dos modos de falha potenciais:

DOSRPN ××=

Os valores de NPR mais altos serão tratados, em princípio, prioritariamente mas é necessário fazer uma análise dos valores parciais dos índices. A norma IEC 60812 [2] refere como uma boa prática a consideração do par de valores, índice de gravidade e RPN de cada modo de falha, para uma melhor consistência na tomada de decisões. Por exemplo, índices de gravidade de 9 ou 10 significam que os modos potenciais de falha põem em risco exigências de segurança e, como tal, exigem acções prioritárias. Neste caso, tendo o índice de gravidade valores tão altos, só é admissível a existência do processo / produto se a probabilidade de ocorrência for necessáriamente baixa (O = 1). Uma análise do valor do NPR exige assim precauções e um bom julgamento.

Com o cálculo e análise do RPN e dos índices parciais obtidos, consegue-se quantificar a amplitude relativa de cada falha e realizar uma ordenação e escalonamento das prioridades das acções a desenvolver para reduzir ou minimizar os efeitos que certas falhas podem originar [10].

O passo subsequente será elaborar um plano de resposta ao risco com a implementação de acções correctivas que se podem traduzir em várias formas de acções concertadas [10]: redução / eliminação da probabilidade de falha através da re-concepção, redução / eliminação da probabilidade de falha através da detecção (com uma lista de verificação e ordenação / priorização de causas de falhas a evitar) ou redução do impacte da falha (através de acções previstas para o efeito durante a fase de concepção - introdução de sistemas redudantes - concepção de um modo de falha seguro).

VANTAGENS E LIMITAÇÕES DO MÉTODO

Como refere o Relatório da Comissão Nacional Portuguesa das Grandes Barragens [1], trata-se de um método que pode ter uma aplicação transversal a todas as fases - concepção, projecto, construção e exploração - e aos diferentes subsistemas do empreendimento.

A sistematização e o carácter metódico de análise dos vários subsistemas, respectivos estados de funcionamento, modos de falha e sequência de efeitos podem ser considerados a grande vantagem deste método, que permite uma reflexão fundamentada sobre os meios de detecção, prevenção e de mitigação dos respectivos efeitos.

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O seu carácter exaustivo constitui, contudo, a sua principal limitação, pela morosidade e consequentes custos de aplicação [1]. Deve-se ainda ter em conta que o método não está adaptado para ter em conta as falhas dependentes ou resultando de uma sucessão de acontecimentos. Nestes casos, é necessário utilizar outros métodos e técnicas, tais como a análise de Markov ou a análise através da árvore de falhas [2].

APRESENTAÇÃO DE EXEMPLO DE UM FME(C)A

O desenvolvimento de um FME(C)A é feito com apoio a uma tabela, que permite agrupar a informação que vai sendo compilada ao logo dos passos atrás descritos de uma forma sistematizada. No Quadro 4, apresenta-se, a título de exemplo, o formato de um FME(C)A. A norma IEC 60812 permite adaptações ao formato da tabela de acordo com a situação e o tipo de informação que a empresa pretende recolher [2].

O desenvolvimento de um FME(C)A deve ser realizado por uma equipa multidisciplinar que envolva nomeadamente as áreas de: projecto, produção, manutenção, qualidade, logística e ambiente.

COMENTÁRIOS FINAIS

Apresenta-se neste artigo o desenvolvimento do método de análise de risco Failure Mode and Effect Analysis (FMEA) e sua extensão (FMECA). A associação de técnicas de fiabilidade integradas em linhas de investigação na área da análise da vida útil de componentes de edifícios e de aspectos relacionados com a análise do ciclo de vida dos produtos da construção é hoje uma realidade. Os estudos de fiabilidade permitem complementar e adicionar informação útil, para a aplicação das normas ISO 15686, de planeamento do ciclo de vida dum edifício, que importa explorar a curto e médio prazo.

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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[2] CEI - IEC 60812. 2006, Analysis techniques for system reliability - Procedure for failure mode and effect analysis (FMEA). Geneva: IEC. 93 p.

[3] CIB W080 - State of the art report on “Failures modes effects and criticality analysis research for and application to the building domain”. Grenoble: Centre Scientifique et Technique du Bâtiment, 2005. (CIB Report, 310).

[4] McCOLLIN, C. - Working around failure. Manufacturing Engineer. 78-1 (1999) 37-40.

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[9] LACASSE, M.A.; SJOSTROM, C. - Recent advances in methods for service life prediction of building materials and components - an overview. National Re-search Council Canada NRC-CNRC. Proceedings of the CIB World Building Congress, Toronto, Ontario, May, 2004.

[10] LAYZELL, J.; LEDBETTER, S. - FMEA applied to cladding systems. Building Research and Information. 26- 6 (1998) 351-357.

[11] RHEE, S. - Lifecycle cost based failure modes and effects analysis. Thesis PhD. Stanford University (UK, 2005).