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MEXSAR10 DE AliTE MODERNA :i,

REDACÇÃO E ADMINISTRAÇÃO^ _ ^ ^ ^ i gala 5

ASS1GNATURAS - Anno 12$000 ^^ ^ __ 1|0l)ü

REPRESENTAÇÃO: andaEIO DE JANE1 RO - Sérgio Buajque

(Rua 8. Salvador, i--A.)

17RANCA - L. Charles Baudouin (Paris).

S ¦^An,rtCiana,ieuel>raRanll,.1,l11Tr,Ue),,5v cicv - Boger Avermaete (Antuérpia -BEL0RA Avenue d^Amèriqufe n. 100,

• . iric íIp aeifs colliiboradores. Todos

A Redacçâo náo se responsabiliza Sj^j^*^ E> pernntü-« «*. *»» * -_££"SEI '„ tf--* do ..ter, »do o pseudonymo, uma vez que fique regu

- x.-.,» rp devolvem manu»CJ»iptos.¦""^ SÜMMARIO

A ESTRELLA de ABSYVI1ÍO. CWldo de AndradeA ^l Mario de Andrade

CREPÚSCULO ^uz.,. .^,- mjpapaidF . Ribeiro CoutoCINEMAvD'V""o

' Claudi». C.ligarU

SDIMII TRENÓ c_rlo, A. de Areujo

SfZfrv ".'.:'.'. J«ephBUH«.PAYSAGb Serg.MillietRÊVERIIL4 Guilherme de AlmeidaARSLONGA A. C. Couto de Barro.XADREZ Pedro R. de AlmeidaCARNAVAL CHRON1CAS:

Mario de AndradeMUSICA LIVROS & REVISTASv. ^ .

CINEMA Vl$(Hfe

LUZES & REFRACÇÕES ; ^ JEXTRA-TEXTO *anr__;_n___^

d -.«rmbléa 56-56 —S.Faüi.oTyp. Paulista —/*• Attemoiea,

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fl Estreito de flbsyntho

*t(FRAGMENTO)

O cadáver nu, de cabellos ata-dos numa toalha, foi levado cau-telosamente até a parede do ima-ginario atelier.

Elle apanhára-lhe o dorso,despencado em ligeira curva. Ovelho felino, barbudo e de boccafurada que conduzia de costas ocortejo, tomando-a pelas axillas,era Rodin. E o grande diabo os*sudo, Mestrovic, recém-chegadoda Servia, o que levava as pernasgeladas para sempre.

Depuzeram-na no estrado depáu, inerte e dura» murcho o ven-tre acima do triângulo negro esymbolico. Depois, começaram acrucifixão.

Para lá, na vastidão respeito-sa da sala, havia grandes esta-tuas, atadas aos punhos para

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traz, com retorcimentos fixos,todas recobertas como imagensem Semana Santa.

E haváa amphoras e flares.Iam crucifica-la na parede nua

e branca. Rodin, levantando-a pe-los inúteis seios, dava ordens im-passíveis. Mestrovic batia Já oseu longo prego. E apenas o bra-co que lhe haviam entregue a ei-Ie, endurecera e resistia, empur-rando-o para longe.

Rodin esperava. Mestrovic tí-nha a cabeça de fúria em ataquedo Sérgio monumental de Kos-SOVO.

Era preciso dominar a conscl-ente resistência do braço. Aosrepelões o membro em angulocedeu, acceitou a linha recta da

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cruz, num crac-crac de ossos in-ternos.

Elle tomou o martello e o pre-go longo, bateu a primeira pan-cada inútil na palma cartilagino-sa. E Rodin dizia que era preci-so haver martyres para haverarte.

Mestrovic atravessara victo-riosamente a mão que segurava.Rodin baixára-se a perfurar osdois pés na mesma agulha deferro.

Elle então bateu. E houve umtinir repetido de aços, apagadopela repulsa de borracha dosmembros ankilosados e murchos.

Salpicaram gottas glaciaes co-mo remorsos nos braços nús doscrucificadores.

E a cabeça de frango virou, ocorpo suspenso desceu num pe-so bruto, alargando as chagasnos pregos e pondo em relevoestrias de músculos, de nervos,de costellas.

Então abriu-se a porta e umesplendido ephebo nú, coroadode myrrha, appareceu e gritoucomo um arauto de consciênciasheróicas:

— Sangue frio.EHa permanecia, toda estylisa-

_ \ s

da na parede que ficara comouma cruz de mil braços.

E Jorge de Alvellos viu que erao cadáver de Alma que Unha cru-cifiçado para estudar anatomia...EHa despregou as grandes pos-tas rachadas, viva, soluçante, pa-ra elle!

O esculptor abriu os olhos naescuridão de seu quarto. E per-cebeu a madrugada neutra, numsilencio de vidas estranhas.

Onde estava? Escorregára-lhedos braços afflictos. Onde esta-va? Levantou-se de um salto. El-Ia fugira...

Atirou-se para a porta: per ma-necia fechada na noite. Voltou,bateu os ângulos desertos, foi aoleito. Pareceu-lhe vel-a ainda. Le-

-"vafitou os lençóes, o colchão: nãoestava.

Estava longe. Onde? Na enfer-maria? Não. Mais longe. No ne-croterio? Não. Mais longe. Nacova.

Jorge d'Avellos sentou-se. Viudescer, descer, no escuro, numdesequilíbrio, sobre os hombrosque tinha aconchegados, ummundo apagado de formas.

E ficou alli, numa concentra-ção musculosa de cariatide.

OswaM da Andrade.

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Poemaeu gôso profundo ante a manhã Sol

a vida carnaval!Amigas

AmoresRisadas

E as crianças emigrantes me rodeiam, pedindoretratinhos de artistas de cinema desses quevêm nos maços de cigarros...Sinto-me a "Assunção" de Murilo!Libertei-me da dor...Mas todo vibro da alegria de viver!Eis porquê minha alma inda é impura.

MARIO OE ANDRADE.

OepusealoPantheon de cimento armado

A luz tombaRefluxo de cores ^Mel e âmbarHa íyras de Orpheu em todos os automóveisRezes das nuvens em tropelCéu matadouros da ContinentalTodas as mulheres são translúcidasAndo !;",!¦,%Músculos elásticosAndar com a força de todos os automóveisCom a força de todas as usinas ^Com a força de todas as associações commerciaes e In

dustriaesCom a força de todos os bancosCom a força de todas as empresas agrícolas e as explora

ções de linhas férreas

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Os capitães amontoados em pilhas electrlcasForças presWenclaes e forças diplomáticasA forca do horizonte vulcânico .As forças violentas as forças tumultuosas de VernaerenSou um tremUm navioUm aeroplano _; ...Sou a força centrifuga e centripedaTodas as forças da terraTodas as distenções e todas as »*««•*•• m . .Sinto a vida cantar em mim uma alvorada de metal0 meu corpo é um clarimMuita luzMuito ouroMuito rubroMeu sangueEu sou a tinta que colore a tardei

^ ARANHA.

Cinema de ArrabaldeAo sr. preeidente da Academia de Letras

este modesto cinema de arrabalde

a

vêm famílias burguezas, todasas noites, com os chefes pezadosá frente do bando. Trazem me-ninos de collo que choramingam.E ficam attentas, derramadas

nas cadeiras, vendo as tramas da tela. per-seguições e turlrolencias,

vivendo angustiosamente a illnsao da-

quellas vidas.

vem o sr. subdirector da 3.a Repartiçãode Águas, com a senhora e os cinco filhos,

e outras famílias vagarosas d* visinhança* .? *

* i* •

A este modesto cinema de arrabaldevêm as famílias burguezes da visinhança,

todas as noites,para ver costumes, para ver terras, para

ver povos, . t_para ver esse mundo distante, vago, tele-

^ÍÍlica além dos navios de passagenscaríssimas

* .* •

A este modesto cinema de anabaWe, todasas noites,

A sala sempre cheia é estreita e compridaNa frente fica uma criançada barulhenta

q".\taraS!aperdidos pela penumbra dos can-

t0disfac*m-se pares de namorados cochi-

chantes.

E pelas largas portas lateraes vê-se a ruaonde passam a cada momento os bondes

illuminados, .levando famílias enormes em que ha mo-

tinhas vestidas com um orgulhoso mau

R°familias que só freqüentam os cinemat*

graphos do centro da cidadee se presumem a aristocracia do arra-

balde- RIBEIRO COUTO"Um Homem m Multidão"

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So di un trenóA EUGÊNIO TREVES.

• o so di un trenó,

1 corre su rotaie infinite in mezzo ad

un buio infinito.Dietro ha una lâmpada grande cheillumina il mondo.Fuochisti: due titani. Braccia ferrigne, torsorosso; sudati. InstancabililNel trenó pochi passegieri.Ánsiosi. Spiano le tenebre. La meta?

No. Illusione. Ritorno a sedere. Ansiosi.Un vecchio:10 muoio. Guardate lá nella mia valigia.Ci son perle tolte dagli abissi dei maré.Prendete.Un giovane frontealta:

No.— Prendete. Hanno luccicori straordinari.

Hanno aggiunto un raggio alia lâmpadadei mondo.Un gruppo di giovani.

Sono arruginite. Le nostre splendono.Sono soli.

Ho buttato tanto car boné nella macchina-Piu' di te, meglio di te.Prenktete.** — No.

U vita gli sfugge. Saggrappa ad uncordone dello sportello. Si rompe.

11 vecchio cadê. Alleggerire H trenó. Piu' leggiero,

andrá piu9 forte.Un colpo solo. Uomo e valigia.Io so di un trenó che corre.

CUnmNus Caligarte.* ax on

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6SALVAR

ais um desejo, amigo!E' preciso soltar,

pelas florestas frias e adormecidas,todos os nossos desejos tímidos,procurando mesmo assombral-ospara que fujam, para que corrame se desviem por todos os lados...

Mais um desejo!E' preciso que a pallida vida,

nos seus longos passeios desoladores,encontre sempre um desejo perdidoque ella saiba salvar...

\

CARLOS ALBERTO DE ARAÚJO.

PAYSAftüne terre peu vêtue,qui ondule lentement,tourne un visage embrasévers le soleil pâle.

La campagne au bord du cieise rétracte sans un gesteet ne touche plus au cieiqiTavec des doigts sans désir.

La route osseuse se plie.Un arbre au bord du cheminpalpe le ciei gris e f roidavec une feuille unique.

i

D'autres arbres au loíntain,des deux côtés de Ia terre,encadrent, fixes et noirs,deux beíles joues, couleur de feuilles.

klaion

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?Comme on voit, passant su. Ia route,derrière les vitres mates,entre des mains en oeillères,un visage qui regarde,un beau visage animedeux yeux ouverts d'oü ruisselle,

sans un regard pour le ciei,toute Ia chaleur du coeur.

JOSEPH BILLIET.

REVERII)e plus sentir penser ses yeux caméléons...Mais tant de pitié me fait mal

J%\ m Caméléons

M$\ AventurinesCouleur de merettraitresMais si doux'STAIME SES YEUX COULEUR D'AVENTURINE"

Quel befu sonnet je pourrais fairesi ie n'étais un "futuriste".Quatre par quatre les rimeset deux tercetset un salut "Trois Mousquetaires"

Au cinema les d'Artagnan sont ridicules

et }*aime mieux HayakawaAh! le siècle automobile

aéroplane75Rapidité surtout RAPIDITE'

Mais moi \e suis si ROMANTlQUESes yeuxses yeuxses yeux caméléons...C'«t bien le n.«llle«r adjertlf ^^

1 axon

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§ ..«.

A.rs Longa•••

a

arte é anterior á vida.Isto é uma convicção minha,

perfeitamente serena. Eu naotenho escripto os meus versos ámargem da minha vida: eu te-nho escripto a minha vida á

margem dos meus versos. Minha existênciaé um plagio da minha arte.

A vida de todos os artistas tem sido umommentario á sua arte. Um eommentarioaplicativo. E isso pela razão muito sim-

pies de que um grande, verdadeiro artistacolloca a sua arte acima da sua vida. Ellenão vive um caso para exploral-o depois:•elle faz arte primeiro, arte que elle incons-cientemente vae viver mais tarde. Si paraum homem qualquer o simples contactocom uma obra de arte é uma tentação ir-risistivel de imital-a na vida, o que nãoserá para o seu próprio autor?

• • •

Assim, a arte é uma prophecia. Um lindovaticinio.

Realiza-se ou não? — Só os artistas osabem, mas bem intimamente.

* * *

Quando se afíirma uma cousa sualqueré preciso concluir qualquer cousa. Do queaffirmei concluo isto: estou absolutamenterevoltado contra esse preconceito geral deque só a obra de um artista pertence aopublico; a sua vida, não.

Mentira. A sua vida pertence também aopovo. O povo tem o direito de devassal-a Avontade.

Que nenhum artista grite contra isto! Eupensaria que elle se envergonha da suavida, isto é, do resultado da sua arte.

Desde que um homem dá publicidade ásua arte, despe-se em publico de certos di-reitos. E' o que se entende por "cahir nodominio publico». Prostitue-se. Vende-se. A

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boa gente que compra um livro, que compraum quadro, que compra uma estatua, com-pra também um pouco a alma do seu autor.Não é absolutamente negociável «ma almaseparada do corpo. A arte é a alma; a vidaé o corpo. Um homem que paga uma mu-lher paga um só instante da sua alma, comdireito, evidentemente, a todos 09 segredosdo seu corpo.

E? preciso não se ter vergonha do corpo,si não se teve vergonha da alma. Ttydos oscorpos parecem-se com. as almas.

Pudor? — Mas o pudor é a virtude dosimperfeitos.

? • •

Não ha nada dç inconfessável atraz deuma grande arte.

* # •

Um artista é mais ou menos um DoutorFausto. Vende a um gênio máo a sua ai-ma, para ter perfeições moças para o seucorpo.

Questão de conforto: uma obra de artevendida produz geralmente uma cheviótebem cortada num corpo tractado, um ei-garro agradável num pedaço de âmbar finoe um perfume de grande estylo num linhopuro. *

Isto parece querer insinuar qne o pu-Mico é uma espécie de Meíistófetes. Eis umelogio extraordinário qüeellé nunca teve.

#.• •

Que bem pouca importância tem para oartista a obra de arte concluída! E' porissomesmo que elle a vende.

O artista é artista apenas emquanto crea:tira do nada, è igual a Deus. Para elle, aobra de arte tem um valor ephemero, qnevae do momento da concepção ao momentoda conclusão. Depois... ella fica sendouma pobre cousa desgraçada, bem morta ebem imprestável, na sua vida. 86 repre-senta uma utilidade toda sentimental: a de

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9recordar aquelle instante divino e feliz daprocreaçüo.

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• • •

Todo artista dá sempre á luz um filhomorto. E entrega-o bem simplesmente áterra deste mundo.

Elle precisa chorar sósinho, maternal-mente. Elle dispensa as consolações impôs-giveis das comadres serviçaes da visinhança,que vêm clamar assim:

Xadrez

_ «O menino é tüo lindo! Elle P<><^*r*,!,ser 11 m bailarino russo!»

- «O menino 6 t»o feio! Elle poderiaficar corcunda!» . .

Não. Klle não é nem poderia ser: elle foi.Eis tudo.

Ah! os críticos!Guilherme de Almeida

Neste domingo, 1.° de Outubro, 1922.

o s poetas comparam as illusões ásnuvens. Depois dizem de uma ai-ma illudida que é feliz, que trazo céo comsigo... Analogia enga-nosa. Basta que se considere queaquella alma vive, para acredi-

tarmos logo que é, de algum modo, desgra-cada. As illusões não nos impedem de viver^;ao contrario, a custa dellas é que vivemos.Ingenuidade suppôr que uma nuvem possaformar o céo. Nem uma, nem duas, nem to-das as nuvens...

sas que outros nao viram, não sentiram, nãoimaginaram... Por isso é que se força opróximo a vêr o que vimos, a sentir o quesentimos, a fim de que o próximo se torneum pouco de nós mesmos... Porque serdifferente é soffrer; é não multiplicar-se;O morrer pouco a pouco...

? ? •

A alegria de uma criança, o riso de umamulher fazem tremer nas estantes sabias ossombrios volumes de Schopenhauer...

a * *• • •

? ? •

O artista quer communicar aos outros asua commoçâo. Quer imprimir a sua ima-gem momentânea ao maior numero possívelde seres, e, assim fazendo, multiplica-se. Oartista é o multiplicador, de si próprio. E'o instincto de conservação que nelle age demaneira nova, differente. Arte-anthropo-^jmtrismo. O artista é a realização máxima,requintada, dessa tendência commum do es-pirito humano, em virtude da qual se pro-cura unidade entre o objectivo e o subjecti-vo; entre o subjectivismo próprio e o alheioA falta de unidade, de identidade redundaem desgosto e soffrimento. O artista soffre,quando não consegue, pela sua magia, mo-delar os homens â sua semelhança. Como acriança, elle chama os outros para verem aestrella que brilha, o pássaro que vôa, ocortejo que passa... A gente se torna dif •ferente quando viu, sentiu ou imaginou cou-

A nossa dor è sempre normal. E' a pintanegra que se alterna com a branca, sobreo grande fundo verde do tecido da vida...Ella é da própria essência do tecido, parteintegrante delle; nunca uma nódoa. O ten-po, que tudo desbota, transforma, ás vezes,as pintas negras em brancas. FeHzmente,essa reducção chromatica não é extensivasenão ás pintas escuras: o fundo verde per-manece inviolável como o próprio mistérioda vida...

. a •

Os gregos faziam com as suas verdadeso mesmo que com as suas taças definho:coroavam-nas de rosas. Assim, ninguém seassustava com ellas. E a especulação philo-sophica tomava o aspecto de uma orgia si-lenciosa e embriagadora...

A musa de certos poetas dá-me a impres-güo da moça qne poe papelotea para ondular

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os cabellos, estylisal-os. Mas o que me in-quieta é que ella nunca tira os paipelotes...

lizador. Em geral, todos tomam a sombrade um objecto como exacta medida delle.

• • •

• • •

Si soubéssemos normalizar os «valores»que nós inconscientemente exageramos, ouque nos foram impostos já exagerados, anossa vida mudaria de aspecto, seria maistranquilla. Poucos têm esse sentido norma-

A vida é como um taboleiro de xadrez,em que os quadrados brancos se alternamcom os pretos: seria verdadeiramente fastidioso, senão impossível jogar-se em tàbò-loiro de uma côr só...

A. C. Couto de Barro*.

Carnavalria primeiramente ao Appol-

1

Io. Caminhou por instinto,e, dirigindo-se certo, entrouna Rua Onze de Junho. Emfrente ao theatro, accu-

mulava-se muita gente. No em-purra-empurra, da bilheteria, en-contraram-se gorros bicudosde palhaços, cocos de caricatura,chapéos de palha, panamás, plu-mas brancas de "travesti" decorte antiga. Af entrada, no pas-sador acanhado em que a multi-dão se esmagava, radiosa e feliz,o verde triste, empoeirado e es-curo dos pinheiros allemães, emmeias-barricas pintadas, contras-tava com o colorido intenso, atre-vido e carnavalesco das flores depapel, encarnadas, verdes, ama-rellas, enlaçadas a fios de arame,cruzando-se, fazendo festões deapparato, para ornamento e pom-pa das paredes em festa. A filapassava, lenta e ruidosa, emquan-to os porteiros agitavam os bra-ços e esganiçavam a voz. E, nomeio delia, contrafeito e calado,

Clemente passou. Quando encon-trou um pedaço de vácuo, paroue tomou fôlego: tinha entrado. Aprimeira cousa que o feriu foi umrapaz alto, de casaca, com sapa-tos polidos e meias muito trans-parentes, o chapéo de pello com-plicado de reflexos; o peito bran-co da camisa brilhava também.Entalava ao olho esquerdo ummonoculo que parecia definitivoe eterno naquelle olho. Sobre obeiço superior, em leve proemi-nencia, um f ilete de bigode a tintapreta, um fio apenas, quasi im-perceptível na espessura, e longocomo um bigode de chim; nasmaçãs do rosto liso, um poucode "rouge" - e nada mais. Ria,fazia pilheiras, dizia graçolas atodo mundo, executava piruet»e curvaturas; simiesco e irrequie-to, distribuía galanteios és da-mas e ensaiava, maneiroso, pas-sos de valsa e " poses" de tango.Parecia feliz, parecia á vontade,como que sentindo melhor affir-mada, sob o pseudo disfarce, a

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própria personalidade. Clementeespantou-se: um homem que nãotinha medo de ser conhecido![De certo a mulher não lhe erainfiel; elle, de certo, não sahirapara matar. E, interessado, atto-nito, achando-o engraçado e ab-surdo, poz-se a olhal-o com umacuriosidade ingênua de menino.0 rapaz deu uma gargalhada,mostrou-lhe a ponta da língua egritou-lhe, esfusiante:- Nunca viu, bobo alegre! ?.•Clemente, mudo, fez, sem sa-

ber porque, dous passos paradeante. "Bobo alegre..." Na suacabeça atordoada passou toda asynonimia da palavra: bobo, to-Io, ingênuo, simplório, pateta,idiota... E que era elle de factosinão, isso, elle, ludibriado assimsob o seu próprio tecto? E quemo visse phantasiado havia de Jul-gal-o alegre. E uma porção deraciocínios, confusos, atrapalha-dos, paradoxaes, obsedantes so-bre esse pobre thema borbotean-do no seu cérebro cançado: Iame vinham, surgiam e apagavam-se, renasciam e tornavam a mor-rer, emquanto elle, vagaroso,deslocava para a frente a exhau-rida carcassa. E, quando entrouno salão movimentado do^tftea-tro, sob punhados de confetti epor entre o cipoal das serpenti-nas, sentia, pensava e agia expe-rimentando, bem funda, bemamarga, bem cortante, toda a in-finita tristeza de ser bobo.

A banda grande executava, us

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metaes, de boccas escancaradas,faziam, tocados da febre •»Me'J"te, uma luxuria sonora, larga,halucinada, que se Intensificava,tornava-se estuante e condensa-da, na represa abafadlça das pa-redes e do tecto. E parecia queera o maxixe que sacudia as maspendentes e equilibrava no espa-ço a papelada minúscula, recor-tada e esvoaçante; que agitavaos tricornios, fazia mover os do-minós, desegoncava os AHequ|n*»dava relevo ás marquezas em-poadas, punha tremuras nos tu-fos de renda, intensidade no*perfumes e vertigem nas cabe-ças. Nos corredores, nos cama-rotes, o povo hurrava frenético;homens e mulheres, esfregan-do-se, no simulacro de uma luctade morte, fazendo-se engulir mu-tuamente mãos cheias de con-fetti, cosinhando os olhos comesguichos de ether causticante,enrolando os pescoços em rodi-lhas de papel, viviam por um an-no inteiro. Na platéa, o movi-mento canalha, sacudido, ntvro-tico, unia corpos a corpos, mix-turava as animalidade** fundiaas vontades com as chammasdo sangue, egualava os desejosem grupos de carne; e a totalUdade das cores, - das cores co-nhecidas, das cores combina-das, das cores sonhadas, - ves-tia com uma túnica só essa mas-sa requebrada e una em quetodos queriam intermesclar-se,confundir alma e músculos, co-

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ração e banhas, espirito e pel-los, para formar um mesmo cor-rupio de delírio, uma mesma pai-pitaçáo de dynamismo animal,um único e immenso novello deloucura*

A musica parou c uma tempes-tade de palmas ensurdeceu a sa-Ia; depois, o voierio cresceu ereboou como o barulho de umacachoeira.

Clemente, quebrado de triste-za, moido, ignorado e ridículo,bobo triste e só, não parava deperscrutar a assistência, os pa-res, os que entravam, os que sa-hiaim

Três pancadas fortes cortaramo theatro - e a banda bisou omaxixe.

Qual! Não estavam alli. Asaberturas pequeninas da masca-ra operavam prodígios: eram co-mo vidros de augmento, óculosde alcance - faziam crescer tudoe penneiravam a mascarada, á

procura dos Pierrots. Não esta-vam alli. Elle tinha andado, dilui-ra-se na multidão dos corrcdo-res, roçara nos que dançavam...Não estavam alli. E um odlo ven-cido contra aquella gente toda oimpelliu para a rua e, emquantocortava o soalho coalhado degente, deslumbrado pelo kalel-doscopio colossal da dança, emque lhe Iam perdidos e arrasta-dos, como num suppllcio, olhose ouvidos, sentindo cahirem osconfetti na saraivada da cor, pa-recia-lhe que tudo gritava: ostrombones e os clarinetes, ospannos revoltos e os braços le-vantados.

Um frescor o reanimou. Olhoupara cima: o céo era uma pellu-cia negra de ioalhelro coberta depedras.

Pedro Rodrigues da Almeida.é Do livro "Carnaval'*, a appare-cer brevemente.

Chronicas•

MUSICAF. M1QN0NE

eve gosar férias em São Paulo o com-positor Francisco Mignone que a-ctualmente aperfeiçoa seus eotu-dos na Europa. Trouxe consigo u-ma opera: aO Contractador de Dia-'mante*". Tive ensejo de ouvir ai-guns trechos dela na "Sociedade

de Concertos Sinfônicos" e em audição particu-

lar ;e me é grato afirmar, como amigo e comoartista, a boa impressão que senti.

Certamente seria o cúmulo da má vontade exi-glr dum músico que apenas Inicia ai» carreiradotes de originalidade Já francamente determl-nada, bem como especialização de modernismoem quem ainda é estudante e caminha sob asvistas dum professor. Existe porém noa trechosque ouvi aquela chama benéfica, reveladora dosbons artistas de amanha. Mignone deade sua*primeiras obras, ainda composta* aqui, revê-Iara uma acentuada predileção pela sinfonia. Eessa predileção se acentua agora, tornando-se

1 a x oi í

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.im oue o que mais me prendeu nos trechos ou-vidos foi a parte puramente sinfônica. Nos dia-wos de amor, nos monólogos de Fellsberto Cal-dPlra embora imperfeitamente ouvidos pelatransposição «o Plano, sem partitura que me-niasse, desconfio que o joven mus co se dei-;" um pouco levar pela expontaneidade, pelafacilidade melódica que possui e que em todos

. temnós foi a glória e a Infelicidade da escolaLiana Gloria em Monteverdl, Scarlattl. Ros-

„i Verti e tantos outros. Mas Infelicidade por-Se'foi uma das razões da decadência da escola

?Lmana decadência essa que perdura, entre, rSncas apesar das Investidas de VerdKos sinfonlstas do fim do século passado e dos

modernos, com Pizzettl e Maliplero á frentedignei descobrir, mal encoberto, na obra vocalde Misnone o lirismo fadl e bastante vulgar dal--uns compositores vertetas. Satisfez-me porém

«„hmiasmou-me o quadro sinfônico das dansa*;oCn2o âc" Essas dansas tao característica-mente brasileiras, pelo ritmo enervante, pelamelodia melosa e sensual silo uma ela forteviv, ao mesmo tempo que equilibrada. E ex-

; «llnorio como Mlgnone está firme ao traçar'sa

à*ina trepida, envolvente, entusiástica e^Desaparece inteiramente a eloqüência

£•,, Z"'trechos dramáticos: é eloqüênciavi e sumo de fruta nacional e sensualidadele* negras escravos. E' admirável. Quem ainda

,o uoço e estudante ainda pinta sinfonicamen-t« nm ambiente com a firmeza com que T. »;snone pintou essa parte do seu «Contractador

será sem dúvida, quando encontrar inte ramentesua personalidade, coisa que só se ,completa comos anos, um músico possante e feliz. Pigo feliz,porque sinto uma tristeza universal pelosmi-lbares de compositores musicais que escrevemsons sem nunca poderem traduzir num acordeou numa melodia uma parcela mínima de belezae ideal. Mignone será feliz.

Mario de Andrade

LIVROS& REVISTAS

"Os Condemnadot". — Osw»ld de An-drade, edição JVtonteiro Lobato.

acontece

com "Os Condemnadc*" o in-verso do que acontece com as pin-turas impressionista». Nestas é ne-ceeaario a distancia, para ver cia-ro e bem, para se poder comprehen-der a sua geometria e o seu colori-do, que directamente e*tao relacio-

nados com o espaço entre espectador e °bjectocontemplado. Ao contrario, no livro de Ob«wode Andrade presclnde-ee perfeitamente do espa-

ço; é preciso olhar de perto, muito de perto. Oprincipal no romance, nao tem importao»»,enredo. O que huporta, então? Os detalhe», a»é que Oswaldo se revela prodigioso, seu «**?de milagre faz surgir, como no» conto» ae »das. — castellos, luzes, apotheose», atravésttna^8quaes passam os «eus per*onagen» de caouvohouc, impermeáveis á alegria de viver, mona-dos de miséria e de fatalidade. Com espantosaeconomia de traces, Olwald arma um ambiente,articula seres, derrama vida vermelha sobre arealidade chlorotica, de gelatina...

O livro Inaugura em nosso meio tecnmcaabsolutamente nova, imprevista, clnematogra-phica. Ao leitor é deixado adivinhar o que oromancista nJo diz, ou nao devia dizer.

O romance conta a tragédia de seres acti-vos, que querem agir, precisam agir, mas queeatfto presos, nflo por correntes, mas por ela»-ticos, — força centrifuga que os faz desequiu-brados, dando-nos a sensação physlca de umesforço sempre contrariado. E os elástico», asvezes, pela propriedade que os caracteriza, osempurram além do limite que aquelles se-res desejariam attingir. Dahi o suicídio do te-legraphista. Dahi, a mórbida paixão de Alma.

Oswald também sabe vibrar a nota humn.nstica. Elia caça o ridículo das situações, nomomento em que a rCde das attitudes vae sedesfazer. Assim, mais propriamente, pode-sedizer que Oswald nfto caça o cômico da vida:o cômico da vida é que se entrega a Oswald,no momento em que pode escapar, sem que nln-guem perceba...

O animatographo d'"Os Condemnados" nâoapresenta a tragédia de seres Teflexivos, preoc-cupados com problemas metaphysicos mais oumenos insoluvels. Os sonhos, as ancias dos oin-demnados sfto humilde», instintivos. A almadesses seres é uma planície irremediavelmenieverde, onde os maiores accidentes s&o montinhosde cupins cinzentos, em que, de vez em quando,pousam corpos mornos e enigmáticos de coru-jas E Oswald, com elles, conseguiu uma pe-quena obra de arte. Obra de arte?! Sim, ape-zar dos defeitos. Felizmente, o livro tem defei-tos. Nunca soube de artista que fosse pruden-te, que nao errasse. O que ha de divino nosartistas é justamente esse "élan" estourado,esse eterno caminhar, que os impedem de pa-rar e refiectir si o caminho que seguem é certo,bom, firme e valioso, como uma escripturapublica...

Entretanto, ha* temperamentos, para osquaes o que importa é o defeito, a cinca, a con-tradicçao. Esses homens s8o como os "tourlt-tes" que, ao se approximarem de Nlagára «rade Paulo Affonso, se/ preoocupam 4em|a8Íadocom as gottas d'agua, que, fugindo à vertigemda caudal que se de*penha, lhes salpicam ae fa-ces. os ternos bambos de xadrez, e perturbam

k a x o

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«** 14^m insolencia a visão tranquüla daquelles phe-£_JETE«-t-W-. Elles têm « opinião va-Hostaslms de qne a torrente perdeu um pouco„T«u volume, eom a falta daquellas gôttas...Esse» homens conta-gôttea silo os críticos. Paraelles nio ha remédio. Xâo ha cura. Pai» elleso nue serve, o que vae a calhar, o que é abso-luttmente Indispensável, é, n8o ha duvida, umbom guarda-chuva...

A. COUTO DE BÁRROS.

S. Paulo, 20—9 1922."Suave Convívio" — Andrade Mnrlcy. —

Edição AniMwrio do Brasil. — Rio. —1922.

Andrade Muriey reúne critica» exparsas no-Suave Convívio". Nesta visüo de conjuncto po-

•se com mal* nitidez observar sua personali-Io de critico. Cora efflcaeia. no conjnn-

co mais ou menos disparatado de figuras edéas que observou, appareceu no "Suave Con-rivio" a erudição firme e larga do autor. Mui-t- serenidade. Multo amor. Demasiado mes-nio quando se trata de observar eseriptores pa-ranaense*. Apesar disso o estudo sobre Emi-

ano Pernetta é a melhor cousa do livro. Aguc de que faz uso Andrade Muricy é fa-

ciliar, sincera, agradável. Um bom livro.M. de A./ V \ IRecebemos: ,

'La Nouvelle Revue Française", numerode agosto, com collaboraçao de WilliamBlake, Paul Fierens, Charles du Bos.<M1 Robln, Jacques de Lacretelle. Comosempbe> magníficas reflexões sobre nlitteratura, por Thibaudet. Chronica»,etc."La vie dea lettres", revista modernafrancesa, publicada sob a direeçfto do

Nicolas Bauduin. Optimot* trabalho* doDirector de Max-Jacob. Fernand Divoire

e Mlle. Claire Goll."La Criée", numero de agosto da interes-

sante revista marselheza. A destncar.como sempre, as eollaboracões de Mar-cel Milliet, Léon Frane, etc.

CINEMAA certos problemas, referentes ao ei-

nema. que aparentemente pouconos Interessam, pois nílo ha por aquiartistas e fábricas que se dediquemespeciallzadamente a produzir fitasde ficção. Essa desimportúncia po-rém é apenas aparente; tais proble-

mas, quando não tenham artistas para preocu-par, tem sempre público para educar e orientar.

O cinema realisa a vida no que esta apreaen-

ta de movimento e slmultaneldade visual. Dl-

ferença-se pois multo do teatro em cuja baseestá a observação sobjectiva e a imkjTra .O ei-néma é mudo; e quanto mala J>rmc)»A\T

da oalavra escrita mala ae «»»"»»* "V*",^^aoa aeua meloa de <-onstruçHo «tlatlca 8e«ue-aed'ahl que tanto mal. clnematlca twjj» obw dearte cinematográfica quanto mala ae livrar da palavra que é grafia Imóvel. As acenas por ai. devem possuir a clareza demonstrativa da acçao.i por ai, revelar todas «a mlndcla» do*

caracteres e o dinamismo trágico do facto sem

que o artista criador se sirva de l»lav™ q™esclareçam o espectador. A fita que. aMmJaIndicação Inicial da* personagens. "'o tivessemais dizer elucidativo nenhum. "**«£"£*mente artística e, ao menos nesse sentido^ umaobra-nrima. E' evidente também que um sem£.£ de qualidades deriv.otes M*»dade primeira nobilltarlam a _PWWgJConsegulr-se-hla mesmo a «mpH«^ *«£da simultaneldade - o que da riaj»obra dearte cinematográfica um valor *fâg»Jfccepclonnl. O que falta em geral 4s fitas americanas é a simplicidade de acçao. vital e sugestlva, que nos eleva á grandes* serena e azuld„ classiclsmo. (Bxceptuo Ruralmente

" " »cômicas, especialmente as de Chaplln e de C y,i* rnívk As de Llovd também). O que mes so

braé a complicação, nue imprime a quast todasÜm caraS vaudevlllesco multo pouco ou ra-ra mente vital.

E os americanos sô têm decaído a esse respel-to AVdltlmas fitas importantes sparecldas es-

ao cheias de dlzeres, multas veses pretendo-„lent?ilr.coes ou cômicos. B' Já um vlclo^uem

observar com atenção quaíquer fl£j°go «co.uhecerá a Inutilidade de muitos

J««8" J^8explicativos, cujo maior mal é «^'J^™5"te a acçao, seccloaando a visão e conseqüentemente a sensação estética.

E nao se diga que tirar a palavra ewrlta*>cinema seja priva-lo dum »*°/* «^^IPrimeiramente: quanto mala uma arte se conservar dentro dos meios que lhe *• Prfg*tanto mais se tornará pura. *^™*%J**Z"sao os meios de eipressáo *°fâ*$*5Jffde que pouco ainda se utillsa a cinematografia.

A cinematografia é uma arte. Ninguém mais,sensato, discute Isso. A. empresas^P^tatamde fitas i que náo se Incomodam_em prod»^'obras de arte. mas objectoa de PM«I«*"menos discutível que atraiam o maior numerode basbaques possível.

A cinematografia t uma arte que possui multo

poucas obras de arte.

1 a x oa ét N.n

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15LUZES& REFRACÇOES

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a

Influencia do modernismo theratho-lógico dos klaxistas é tão grandeque já attlngin o "Estado de S.Paulo" jornal. Começaram a brotarnessas fecundisshnas terras floresde estranho e variegado aspectoque contrastam beneficamente com

m junquilhos, as margaridas e os nao-me-delxesfamiliares, que sempre foram tilo abundantes„os desertos relvndos desse popular jardim. As-,im é que num artigo sobre Granam Bell. o so-nofeò orgHo de 200 rs. relembra num dado mo-

„ ito á encontro de D. Pedro II com o inventor,lo telephonio que até então B* encontrara na vi-L homens que eram verdadeiros telephonistas.

Podre, porém ligou. E o jornalista commovi-

r *«

Audácia feliz do engenheiro, instincto divi-„a»or!o do mouarcha affeito a descobrir soffn-mental subterrâneos, seja o que for, o facto C*V» 'mperador... " Estes «soffrinientos subter-

nvte» cheiram fortemente aos "eavallos so-orebumanos", ás mulheres torriformes de algunscollahoradores nossos. E* possiveq que a redac-«¦ao proteste contra o termo. E com effeito, -ste«subterrâneo" é tfto aéreo, tao vago, que multopouco se coaduna com os epithetos officiaes dobom pensante diário. KLAXON que gosta dascousas no «eu logar, substitue pois a catleia albapoi u. ¦> humilde violeta e restabelece a expres-,5o racionai o qualificativo exacto — único quepoderia sahir de um bem pensante jardlneiro dasvastas e clássicas aléas daquelle jardim. Assim,em vez de soffrimentos subterrâneos, leia-ee"soffrimentos subeutaneos". KLAXON gastaráaté seu ultimo sangue, em restabelecer a honradas viuvas, das creança* e dos macrohlos.

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Duma nota do numero de Abril da NouvelleRevue Françaiie; MA OPERA" montou o Marty-rio de S. Sebastião, no qual collaboraram ummusico de gênio, Cláudio Debussy, um prestigiosocreador de imagens varbaes, Gabriel D'Annunzio,um pintor no qual a imaginação exhuberantemas regrada se aVlia uma pericia infallivel, LeãoBakst, etc". Se a noticia sanisse numa revistaitaliana leriamos sem duvida:... no qual colla-boraram um prestigioso creador de imagens sono-ras Cláudio Debussy, il piú gr*n poeU vivo deimondo, Gabriele D'Annunzio, e um pintor assaicurioso, Leon Bakst. Si a noticia fosse dada porum aUemflo teríamos talvez maior independen-Ha. E' curioso de observar-se a fria razão e a

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sympathia humana com que os críticos aU*m*£|estudam e acolhem os artistas estrangeiros.Jjque os allemfles tem a curiosidade cheia de amorque faz as grandes comprehensões e as l™""cias efficazes. Walter von Bathenan a™™0"sem covardia que os allemfles nilo sao PW™'mente creadores. mas que nüo ha talvez nenMimpovo como o allemio para aprender e desenvoi-ver as creações alheias. Exemplo: Wagner.

Imaginemos porém a representação contadapor um noticiarista indígena. E' preciso agoradistinguir. Se os autores do Martyrlo viessemao Brasil, visitassem as redacções, distribuíssemconvites e retratos dedica toriados t«riamos«... collaboraram o genial Debussy, D Anmm-zio, o sublime, o genial poeta e o maravilhosogênio de Bakst. Os coros foram genialmente «-rigidos pelo maestro X. V. e todos os demattartistas até o mais Ínfimo corteta foram gen aes

na execução da obra estupenda. Até os mine-teiros foram genialmente delicados na Prestezacom que serviram os pretendentes de !**"">•A sala de espectacnlo estava M«eralmef * «r?:O serviço de buffet e buvette... etc. Mas, se

como de facto se dá, os creadores do'Marty rioforem desconhecidos... è certo que oa quallfl-catiros de bestas, cabotinos^e «8»«»f;.f

^riam na dansa e mais a repetida /Utorla

do

caso therathologlco. B seria raaoavel. Como qua-Uficar os artistas que nflo procuraram compre-hender os críticos!.. Â A *

* a */

.**?

Ha gente que grita contra as modas de hoje,contra o quasl nú. Terá razão? Vejamos:

AdSo e Eva viviam nús no paralzo terrestree nao tinham o sentimento da vergonha. Umdia, (fora melhor que um anjo lhes tivesse pre-gado as boccas com um prego deste tamanho!)comeram aquella maça e logo, sentindo-se en-vergonhados, começaram a vestir-se... Os et-feitos da maça eram simples: constrangiam-osa vestir-se...

Agora, entretanto, a vergonha dlmlnue. Oseffeitos da maça attenuaram-se, desapparece-ram. Nós começamos a ser como os nossos pãesantes do famosissimo acontecimento. Por isso,a gente que berra contra a nudez deve ter co-mido outras maçãs, ás escondidas de todos. Nãoha outra explicação...

a a a

Por uma folha-da-nolte de 25 de agosto, emletras redactorlaes o recente livro de Oswald deAndrade foi condemnado. (Perdão!). O ártico-lista pesquisou e achou o que grammaticalmente

o

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16observado seria mais ou menos uma ambigui-dade. A grammatica está para o critico acimada naturalidade de expressão. E' homem que decerto raciocina assim: MPedro matou Paulo. Foipreso... Qnem foi preso Paulo que está maispróximo. E* preciso corrigir: Pedro matou Paulo.Aquelle foi preso..." Salvou-se a grammatica.0 Brasil sabe respeitar as gloriosas usanças avi-tas, em que com mão diurna e nocturna, os cul-tores do bem faliar, nos clássicos antigos, a lusalinguagem, tersa e numerosa, isenta ainda dapoluição dos francelhos. daquelles que, no dizersempre isento de Cândido de Figueiredo, diccio-narista insigne, no dizer do nosso Ruy Barbo-sa, aprenderam."•» disso ainda o critico faz umas graças,

isso nos divertiu.xia no artigo era a citação fran-homem:

ljú. critique est facile

s l'art est difficile"

ae a tortura da rima. Certamente>íha-da-noite é um Banville ou umFontes que desabrocha. Pois nãot,onto de bipartir o alexandrino sô

e intromeíter no verso de Boileauprimeiro hemistichio. E' costumee Martins gloriosos" não descobri-

e em linguagem portugueza se cha-'trouvaille". Mas, nós Klaxistas,convictos de muitas tradições aqui

para gáudio dos nossos leitores, o he-- „acnio no seu logar destruindo a innovação

do articulista.MLa critique est aisée. et l'art est difficile".Ah! querido critico, Ia critique est aussi três

difficile!..'

-

* » *

Eis um trecho de ouro do sr. Gilberto Amado,do seu recente livro "Apparencias e Realidades".Vai sem refracções. KLAXON As vezes se com-praz em mostrar unicamente a luz. E é mesmodo que mais precisa a arte no Brasil. Ao fallarsobre literatura brasileira diz o sensato ensaísta:

"O que nos calharia no momento actual se-ria, por assim dizer, uma agitação romântica nosentido que essa expressão pudesse comportarde exaltação febril da imaginação creadora, dodesprezo ostensivo das formas consagradas, dearrancada gloriosa para o novo, o nunca dito, ointeressante. A nossa literatura está ainda todapor fazer... (o que, para KLAXON não é pro-priamente a verdade nua)... é evidente quenão pode ser com academicismo, linguismos ebobagismos que havemos de constituil-a com avida, isto é, com as concepções, com o calorfecundo do sentimento."

1 a

Uma refracção zinha só. Ouvimos «ontar quea Akademia Brasileira de Lettras. a dlrectorado Grupo Escolar da nossa literatura, mandou osnr. Gilberto Amado para o canto, de Joelhossobre milhos de uso quotidiano e alimentar, coma obrigação de copiar 50 vezes as-annas-e-os-barões.

• e tbr

E* interessante observar a ignorância dos cri-ticos, cujos vaticinios cream ou destroem repu-

vações. Ignorância crassa. Ignorância revoltan-te acompanhada sempre de uma impertinenciacômica e de uma erudição de almanach. Então

quando falam dos modernos, esses senhores de

óculos prudentes e calvlcle* afflrmativas per-dem completamente o pé. Assim é que, critlcan-

do o romance de Oswaldo de Andrade, um no-

mem muito acatado, apôs haver passado varias

rasteiras na lógica e embrulhado emphraees ca-

belludas um punhado de idéias contradictorias,diz que o nosso collaborador só se salva pelas

qualidades da» velhas escolas que ainda se per-cebem nelle: simultaneidade, synthese etc.!!!

Que pândego!O snr. Hermes Fontes também é desses. Pelo

"Imparcial'!, uma vez, affirmou que um livro

éra moderno... porque? Porque... era "bou-

levardier"... — L*o até parece d'BLLE...Pois não sabe o snr. Hermes Fontes que o ge-nero "boulervardier" é velho como Victor Hugo?

Hoje ninguém acredita em "boulevards", comoninguém crê, tão pouco, em symbolismo. Sãocoisas essas que, mesmo «i existissem, deveriamser negadas.

Em musica acontece o mesmo. Has pessoasque incommodoam seus vizinhos, aplaudindo ouvaiando compositores, que elles não comprehen-dem. Num dos últimos concertos realisado» no"Municipal", um homem comprido, de intelli-

gencia magra, uivava bravos ridiculamente

peremptórios. Ao meu lado, nm amigo espirituo-so perguntou-me: quem é aquelle homem bra-vo?

Todos esses homens teém, no emtanto, umarazão de ser. São mesmo indispensáveis. Fazemrir. Desengorgitam o figado. São homens medi-cinaes e, portanto, recomendáveis como a Gna-ranfi Espumante, o Lacta Nutritivo e o Elixir deNogueira.

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De Mario de diHridc I De QswaMo de Mdridc

Paulicèa•

Desvairada il [ÉllÉim j44im todas as

'ivranasEm todas as

;*VV',

livrarias

II

ilherme de Alarida De Vln. Ragogaettl

BREVEMENTE IIEIEME1TENatalika «diçâo KLAXON

Me s sido r, traducçio

franceza da Ur& WILtlCT

GazarraCittadina

<**'JH-

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