Memórias de um tempo texto

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Dois fatos passados logo no início da minha primeira gestão na Prefeitura de Bagé foram determinantes para a política que construímos de recuperação do patrimônio histórico de nossa cidade. Com o Ecoarte assumi o compromisso de, entre outras coisas, olhar com atenção para esta causa. A promotora pública Luciara Robe da Silveira Pereira chamou a prefeitura, a Urcamp e a Sociedade de Beneficência Portuguesa para discutir a situação do Museu Dom Diogo de Souza. O prédio, projetado com inspiração no Palácio Queluz, de Portugual, onde nasceu e morreu Dom Pedro I, foi inaugurado em 1878 para ser a Casa de Saúde da Beneficência Portuguesa. Acabou sendo alugado para o Exército, que ali instalou o Hospital Militar da Guarnição. Em 1893, foi ocupado pelos revolucionários. No final do encontro com o Ministério Público Estadual, assinamos um Termo de Ajustamento de Conduta em que nos responsabilizávamos em encontrar uma solução para o caso, já que a memória de Bagé não poderia continuar correndo o risco de se perder, uma vez que o prédio da Beneficência, que abrigava o Museu da Urcamp, estava em situação precária, já com algumas áreas interditadas, e corria o risco de sofrer desabamento do telhado. Embora a prefeitura não tivesse uma responsabilidade Memórias de um tempo Com Gil e o sol inauguramos o primeiro restauro de Bagé direta, resolvi aceitar o desafio, pois, mesmo sendo de duas entidades privadas, o interesse era público. Começamos ali mais uma empreitada. Além do mais, não queria ver acontecer com o belo prédio, inaugurado em 1893, o mesmo que ocorrera com o imponente castelo do Visconde de Ribeiro Magalhães, na histórica Vila de Santa Theresa, que virou ruína. Formamos uma comissão tripartite, com representantes do município e das duas outras instituições envolvidas, com o objetivo de gerenciar o trabalho e fiscalizar a sua execução. O projeto foi elaborado pelo arquiteto José Torrescasana. Lembrei de um velho conhecido dos tempos em que eu era deputado federal, e trabalhava na Petrobrás. Através dele, encaminhamos o projeto em nome da Urcamp, que acabou sendo aprovado pelo setor cultural da estatal. Para minha surpresa, no último dia útil do ano de 2003, recebi telefonema daquele meu conhecido, informando que havíamos perdido a verba de R$ 1 milhão, uma vez que foram depositar o recurso na conta da Urcamp e aparecia o nome de Fundação Atilla Taborda no comprovante de depósito, o que gerou desconfiança no responsável por efetivar o repasse, já que nunca havia ouvido falar no nome da fundação. Ele acabou desistindo da

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Page 1: Memórias de um tempo texto

Dois fatos passados logo no início da

minha primeira gestão na Prefeitura de Bagé

foram determinantes para a política que

construímos de recuperação do patrimônio

histórico de nossa cidade.

Com o Ecoarte assumi o compromisso de,

entre outras coisas, olhar com atenção para

esta causa. A promotora pública Luciara Robe

da Silveira Pereira chamou a prefeitura, a

Urcamp e a Sociedade de Beneficência

Portuguesa para discutir a situação do Museu

Dom Diogo de Souza.

O prédio, projetado com inspiração no

Palácio Queluz, de Portugual, onde nasceu e

morreu Dom Pedro I, foi inaugurado em 1878

para ser a Casa de Saúde da Beneficência

Portuguesa. Acabou sendo alugado para o

Exército, que ali instalou o Hospital Militar da

Guarnição. Em 1893, foi ocupado pelos

revolucionários.

No final do encontro com o Ministério

Público Estadual, assinamos um Termo de

Ajustamento de Conduta em que nos

responsabilizávamos em encontrar uma

solução para o caso, já que a memória de

Bagé não poderia continuar correndo o risco

de se perder, uma vez que o prédio da

Beneficência, que abrigava o Museu da

Urcamp, estava em situação precária, já com

algumas áreas interditadas, e corria o risco de

sofrer desabamento do telhado. Embora a

prefeitura não tivesse uma responsabilidade

Memórias de um tempo

Com Gil e o sol inauguramos o primeiro restauro de Bagé

direta, resolvi aceitar o desafio, pois, mesmo

sendo de duas entidades privadas, o

interesse era público. Começamos ali mais

uma empreitada. Além do mais, não queria

ver acontecer com o belo prédio, inaugurado

em 1893, o mesmo que ocorrera com o

imponente castelo do Visconde de Ribeiro

Magalhães, na histórica Vila de Santa

Theresa, que virou ruína.

Formamos uma comissão tripartite, com

representantes do município e das duas

outras instituições envolvidas, com o objetivo

de gerenciar o trabalho e fiscalizar a sua

execução. O projeto foi elaborado pelo

arquiteto José Torrescasana. Lembrei de um

velho conhecido dos tempos em que eu era

deputado federal, e trabalhava na Petrobrás.

Através dele, encaminhamos o projeto em

nome da Urcamp, que acabou sendo

aprovado pelo setor cultural da estatal. Para

minha surpresa, no último dia útil do ano de

2003, recebi telefonema daquele meu

conhecido, informando que havíamos perdido

a verba de R$ 1 milhão, uma vez que foram

depositar o recurso na conta da Urcamp e

aparecia o nome de Fundação Atilla Taborda

no comprovante de depósito, o que gerou

desconfiança no responsável por efetivar o

repasse, já que nunca havia ouvido falar no

nome da fundação. Ele acabou desistindo da

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transferência.

Virou o ano e eu fui ao Rio para desfazer

o equívoco, provando que a fundação era a

mantenedora da Urcamp. Feito isso,

conseguimos recuperar a verba e, sob a

fiscalização daquela comissão, executar com

êxito a obra. Aliás, esse arranjo foi muito

elogiado pelos técnicos da Petrobras, que

ficaram surpresos com a correta e eficiente

aplicação dos recursos, tanto que usaram

como referência para outros projetos que

patrocinaram.

Mas também houve conflitos. No pátio

interno do museu havia umas estufas em que

o competente professor Norton Sampaio

desenvolvia, com sua equipe do Instituto José

Ghisolffi, alguns projetos de pesquisa.

Defensor fervoroso e apaixonado, Norton, que

encontrei, feliz, dia desses na Unipampa de

Dom Pedrito, onde dá aulas, não admitia levar

as estufas para outro lugar. O nosso “xerife”, o

presidente da Beneficência Portuguesa, Mário

Bezerra, era irredutível, porque aquela área

fazia parte do projeto de restauro do museu.

Houve todo um legítimo tensionamento entre

as partes, competentemente mediado pela

nossa secretária Jussara Carpes. No final,

tudo acabou bem.

Numa bela e ensolarada tarde do final de

2005, na presença do então ministro da

Cultura Gilberto Gil, contando ainda com a

presença do cantor e compositor Jorge

Mautner, ao som do Coral da Auxiliadora, sob

a coordenação da maestrina Gilca Nocchi

Collares, entregamos à comunidade, numa

grande festa, o restaurado prédio da

Beneficência Portuguesa, que abriga o Museu

Dom Diogo há quase 40 anos. Outro fato que

marca minha memória daquele dia foi ver a

Marcia, minha esposa, depois de muita

insistência minha, cantar o Hino Nacional. Ela

tremia como vara verde, afinal não é todo o

dia que se tem a oportunidade de cantar para

um dos seus maiores ídolos.

Ali, também se iniciou a ideia de construir

o centro cultural do museu. Mas, isso é outra

História, que contarei numa próxima edição.

Memórias de um tempo

TARSO Governador 13 - OLÍVIO Senador 131 - DILMA Presidenta 13

*Esse texto faz parte de Memórias de Um Tempo, uma série publicada no Jornal Minuano de Bagé, em que procurei resgatar fatos de nossa gestão de oito anos na Prefeitura Municipal.