Memórias de um sargento de milícias
-
Upload
octavio-da-matta -
Category
Education
-
view
65 -
download
4
Transcript of Memórias de um sargento de milícias
Memórias de um Sargento de Milícias
Manuel Antônio de Almeida
“As Memórias reportam-se a uma fase em que se esboçava uma estrutura não mais puramente colonial,
mas ainda longe do quadro industrial-burguês. E, como o autor conviveu com o povo, o espelhamento foi
distorcido apenas pelo ângulo da comicidade, que é, de longa data, o viés pelo qual o artista vê o típico,
sobretudo o típico popular.”
(Alfredo Bosi)
• O sentimentalismo exacerbado cede lugar ao romance popular de caráter humorístico.
• A crônica de costumes do Rio de Janeiro.
• As personagens são tipos sociais identificados pela profissão ou condição social - a relação com o Auto da Barca do Inferno.
• O registro social antecipa o episódio.
• Sociedade marginalizada e dividida por grupos.
As Características
• O resgate do passado social em caráter de fábula.
• A narrativa mais objetiva e o estilo jornalístico – 3ª pessoa
• Não há a idealização das personagens.
• Surge a figura do anti-herói, o malandro carioca, o vadio.
• O universo da ORDEM X DESORDEM.
Leonardo X Pícaro
• Choque áspero da realidade (mentira - roubo)
• A condição servil
• A vida ao sabor da sorte
• Aprende com a experiência
• Impassível – reage por reflexo de ataque e defesa
• Agrada aos seus superiores
• A misoginia acentuada
• O vocabulário obsceno
• O desfecho na resignada mediocridade ou na total miséria
Leonardo Pataca > meirinho
Maria da Hortaliça > quitandeira
Leonardo > vadio – soldado de granadeiro - sargento de milícias
Padrinho > barbeiro – agregado
Comadre > parteira
Cigana > tira a fortuna
Personagens
Mestre-de-cerimônias > padre – relação com a Cigana
Major Vidigal > o poder jurídico – personagem histórico Mestre de Reza > a catequese
Dona Maria > a prática das demandas - enriquecimento
Luisinha > 1ª namorada – a distorção do Romantismo
José Manuel > pretendente de Luisinha – o interesse.
Vidinha> mulata dançarina – a sexualidade
Chiquinha > filha da comadre
Toma-largura > funcionário da ucharia real
Maria Regalada > paixão do Major Vidigal
Luisinha “Era a sobrinha de D. Maria já muito desenvolvida,
porém que, tendo perdido as graças de menina, ainda não tinha adquirido a beleza de moça: era alta,
magra, pálida: andava com o queixo enterrado no peito, trazia as pálpebras sempre baixas, e olhava a furto; tinha os braços finos e compridos; o cabelo, cortado, dava-lhe apenas até o pescoço, e como
andava mal penteada e trazia a cabeça sempre baixa, uma grande porção lhe caía sobre a testa e olhos,
como uma viseira.
Vidinha"Era uma mulatinha de dezoito anos a vinte anos, de altura regular, ombros largos, peito alteado, cintura
fina e pés pequeninos; tinha os olhos muitos pretos e muito vivos, os lábios grossos e úmidos, os dentes
claríssimos, a fala era um pouco descansada, doce e afinada. “
Luisinha e Vidinha (um par simétrico)
Luisinha, no plano da ordem, é a mocinha burguesa com quem não há relação viável fora do casamento, pois ela traz herança,
parentela, posição e deveres.
Vidinha, no plano da desordem, é a mulher que se pode apenas amar, sem casamento
nem deveres, porque ela não tem nada além de sua graça e de sua curiosa família.
O sentimentalismo romântico "Tratava-se de uma cigana; o Leonardo a vira pouco tempo
depois da fuga da Maria, e das cinzas ainda quentes de um amor mal pago nascera outro que também não foi a este
respeito melhor aquinhoado; mas o homem era romântico, como se diz hoje, e babão, como se dizia naquele tempo;
não podia passar sem uma paixãozinha."
“(...)chegamos por nossas investigações à conclusão de que o verdadeiro amor, ou são todos ou é um só, e neste caso não é o primeiro, é o último. O último é que é o verdadeiro, porque é o único que não muda. As leitoras que não concordarem com esta doutrina convençam-me do contrário, se são disso capazes.”
“Diversamente de quase todos os romances brasileiros do século XIX, mesmo os que formam a pequena minoria dos romances cômicos, as ‘Memórias de um sargento de milícias’ criam um universo que parece liberto do erro e do pecado. Um universo sem culpabilidade e mesmo sem repressão, a não ser a repressão que pesa o tempo todo por meio do Vidigal e cujo desfecho já vimos. O sentimento do homem aparece nele como uma espécie de curiosidade superficial, que põe em movimento o interesse dos personagens uns pelos outros e do autor pelos personagens, formando a trama de relações vividas e descritas.
A esta curiosidade corresponde uma visão muito tolerante, quase amena. As pessoas fazem coisas que poderiam ser qualificadas como reprováveis, mas também fazem outras dignas de louvor, que as compensam. E como todos têm defeitos, ninguém merece censura.”
(Antônio Cândido – Dialética da Malandragem)
“(...) a malandragem é uma variante do ‘jeitinho’ (...), constituindo-se como uma outra forma de navegação social. O malandro, portanto, seria um agente profissional do ‘jeitinho’ e da arte de sobreviver nas situações mais difíceis: aquelas nas quais ele está claramente fora ou longe da lei. Na malandragem também temos esse relacionamento complexo e criativo entre o talento pessoal e as leis que engendram o uso de ‘expedientes’, de ‘histórias’ e de ‘contos-do-vigário’, artifícios com um alto apelo pessoal que nada mais são que modos engenhosos de tirar partido de certas situações (...)”
O que é o Brasil?, Roberto DaMatta
O Malandro – Chico Buarque
O malandro na durezaSenta à mesa do café
Bebe um gole de cachaçaAcha graça e dá no pé
O garçom no prejuízoSem sorriso sem freguêsDe passagem pela caixa
Dá uma baixa no português
O galego acha estranhoQue o seu ganho tá um horror
Pega o lápis soma os canosPassa os danos pro distribuidor
Mas o frete vê que ao todoHá engodo nos papéis
E pra cima do alambiqueDá um trambique de cem mil réis
O usineiro nessa lutaGrita ponte que partiu
Não é idiota trunca a notaLesa o Banco do Brasil
Nosso banco tá cotadoNo mercado exteriorEntão taxa a cachaça
A um preço assustador
Mas os ianques com seus tanquesTêm bem mais o que fazer
E proíbem os soldadosAliados de beber
A cachaça tá paradaRejeitada no barril
O alambique tem chiliqueContra o Banco do Brasil
O usineiro faz barulhoCom orgulho de produtor
Mas a sua raiva cegaDescarrega no carregador
Este chega pro galegoNega arrego cobra maisA cachaça tá de graça
Mas o frete como é que faz?
O galego tá apertadoPro seu lado não tá bomEntão deixa congeladaA mesada do garçom
O garçom vê um malandroSai gritando pega ladrão!
E o malandro autuadoÉ julgado e condenado culpado
Pela situação
Homenagem ao Malandro(Chico Buarque)
Eu fui fazerUm samba em homenagem
À nata da malandragemQue conheço de outros carnavais
Eu fui à Lapa e perdi a viagemQue aquela tal malandragem
Não existe maisAgora já não é normalO que dá de malandroRegular, profissional
Malandro com aparatoDe malandro oficialMalandro candidatoA malandro federal
Malandro com retratoNa coluna social
Malandro com contratoCom gravata e capitalQue nunca se dá mal
Mas o malandro pra valerNão espalha
Aposentou a navalhaTem mulher e filho
E tralha e talDizem as más línguasQue ele até trabalha
Mora lá longe e chacoalhaNum trem da Central