Medard Boss - O Caso Da Dra. Combling

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7/21/2019 Medard Boss - O Caso Da Dra. Combling http://slidepdf.com/reader/full/medard-boss-o-caso-da-dra-combling 1/33 O caso da Dra. Cobling 1  The case of Dr. Cobling  Medard Boss  O quadro clínico A paciente, a quem chamaremos Dra. Cobling, cresceu na atmosfera de uma comunidade rigorosamente ascética, caracterizada por uma excessiva preocupação com a morticação da carne e com tudo o que a ela se relacionava. !ma auto"imagem extremamente r#gida, inculcada desde a sua inf$ncia, impunha"lhe total abnegação e ilimitado sacrif#cio ao dever. %ob imposiç&es cruéis, em virtude de sua excepcional intelig'ncia, por uma indom(vel vontade e uma resoluta autodisciplina, conseguira chegar ) direção médica de um importante sanat*rio psiqui(trico, o que lhe exigiu a superação de consider(veis diculdades externas. Durante muitos anos, havia se sacricado, sem limites, a serviço dessa instituição, cu+os benef#cios eram amplamente aproveitados por outros. esse processo, entretanto, havia se desgastado tanto que, aos trinta e seis anos - um pouco antes do in#cio da an(lise -, estava ) beira de um colapso total. Como era de se esperar, sofrera desde a +uventude repetidas crises depressivas com v(rios meses de duração, que os médicos atribu#ram a distrbios end*genos. /odavia, até certo ponto, tinha, de alguma maneira, conseguido superar essas crises sem assist'ncia externa. !m ano antes do in#cio da an(lise, tinha perdido seu idoso pai. Desse momento em diante, começou a piorar de forma evidente. %ua vida interior sofreu também um extremo empobrecimento0 tornou"se incapaz de qualquer tipo de sentimento, até chegar a uma espécie de petricação espiritual1 não conseguia mais pensar, era incapaz de reter ou captar o que lia1 perdeu toda a iniciativa e toda a capacidade de concentração, podendo car horas a o tando xamente o espaço, vazia de pensamento e fora de qualquer noção de tempo. %ofria de ins2nia e tensão. Com muita diculdade, conseguia exercer apenas as atividades rotineiras devido ) sua surpreendente força de vontade e com a a+uda de fortes sedativos. !m acentuado tremor das mãos, no e r(pido, e uma dilatação m(xima das pupilas evidenciavam um alto n#vel de ansiedade. A pr*pria paciente relutava em admitir esses fatos. !ma estranha compulsão ao suic#dio dominava"a, tornando"se quase irresist#vel devido ) insist'ncia da idéia. 3stava, sem dvida, em um estado pré" psic*tico altamente prec(rio. 4uando começou a an(lise, o mero esforço

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O caso da Dra. Cobling1

 

The case of Dr. Cobling

 

Medard Boss

 

O quadro clínico

A paciente, a quem chamaremos Dra. Cobling, cresceu na atmosfera deuma comunidade rigorosamente ascética, caracterizada por uma excessivapreocupação com a morticação da carne e com tudo o que a ela serelacionava. !ma auto"imagem extremamente r#gida, inculcada desde a suainf$ncia, impunha"lhe total abnegação e ilimitado sacrif#cio ao dever. %obimposiç&es cruéis, em virtude de sua excepcional intelig'ncia, por umaindom(vel vontade e uma resoluta autodisciplina, conseguira chegar )direção médica de um importante sanat*rio psiqui(trico, o que lhe exigiu asuperação de consider(veis diculdades externas. Durante muitos anos,havia se sacricado, sem limites, a serviço dessa instituição, cu+os

benef#cios eram amplamente aproveitados por outros. esse processo,entretanto, havia se desgastado tanto que, aos trinta e seis anos - umpouco antes do in#cio da an(lise -, estava ) beira de um colapso total. Comoera de se esperar, sofrera desde a +uventude repetidas crises depressivascom v(rios meses de duração, que os médicos atribu#ram a distrbiosend*genos. /odavia, até certo ponto, tinha, de alguma maneira, conseguidosuperar essas crises sem assist'ncia externa. !m ano antes do in#cio daan(lise, tinha perdido seu idoso pai. Desse momento em diante, começou apiorar de forma evidente. %ua vida interior sofreu também um extremoempobrecimento0 tornou"se incapaz de qualquer tipo de sentimento, até

chegar a uma espécie de petricação espiritual1 não conseguia mais pensar,era incapaz de reter ou captar o que lia1 perdeu toda a iniciativa e toda acapacidade de concentração, podendo car horas a o tando xamente oespaço, vazia de pensamento e fora de qualquer noção de tempo. %ofria deins2nia e tensão. Com muita diculdade, conseguia exercer apenas asatividades rotineiras devido ) sua surpreendente força de vontade e com aa+uda de fortes sedativos. !m acentuado tremor das mãos, no e r(pido, euma dilatação m(xima das pupilas evidenciavam um alto n#vel deansiedade. A pr*pria paciente relutava em admitir esses fatos. !maestranha compulsão ao suic#dio dominava"a, tornando"se quase irresist#vel

devido ) insist'ncia da idéia. 3stava, sem dvida, em um estado pré"psic*tico altamente prec(rio. 4uando começou a an(lise, o mero esforço

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exigido para dominar os impulsos autodestrutivos tinham exaurido tanto asua força f#sica, que ela mal podia andar.

5nicialmente, o terapeuta encora+ou a paciente a parar de levar o seuorgulho e a autoviolentação a tais extremos e a admitir sua incapacidade

para trabalhar, permitindo"se, por uma vez, dar"se ao luxo de não trabalhar. /endo seguido esse conselho, mal desistira de suas atividades prossionais,desligando"se, portanto, do ltimo vest#gio do seu modo de viver anterior,os primeiros sintomas psic*ticos manifestos começaram a aparecer. 3mplena luz do dia, rostos e um rebuliço de 6m(scaras elétricas6 deformadascomeçaram a mover"se diante de seus olhos. 5nicialmente, essas gurastinham as feiç&es daquelas senhoras rabugentas com quem conviveradurante a +uventude e que eram companheiras de sua mãe. 78igs. 9 e :.;<ogo ap*s, vis&es sinistras de pregadores sect(rios, que ela havia conhecidotão bem, con+uravam"se a m de atorment("la. 78ig. =.; A dança dessas

m(scaras deformadas tornou"se mais ca*tica e frenética. A g. > capta ummomento dessas danças selvagens e rodopiantes.

 

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Figura 4 

3ntretanto, não s* a 6visão6 da paciente foi afetada por elementosestranhos e misteriosos, também a sua 6audição6 não era como antes. Diziaa seu psiquiatra que os mais simples sons tinham um signicado misterioso0o zunido de um avião distante, o estrondo de uma motocicleta passandopela rua, o cair dos pingos de chuva sobre o telhado, o rangido da cadeiraquando o psiquiatra se mexia. ?uvia, o tempo todo, press(giosameaçadores de um desastre iminente, de uma cat(strofe pendente ehorripilante. @odia sentir o mundo prestes a entrar em dissolução. 63u nãoconsigo fazer mais nada, a não ser escutar ansiosamente cada som até queele tenha sumido. 3sses sons me consomem totalmente. /odo o meu serest( concentrado nos meus ouvidos, e estou tão comprimida neles quemeus ouvidos chegam literalmente a doer1 meus msculos temporais e damastigação e o meu pescoço cam tensos como pedras.6 3sta era a suapr*pria descrição.

Algumas semanas depois, a paciente queixou"se de que havia um murmriode beatas no ar. 63las estão dizendo6, dizia a paciente, 6que eu sou m(,

que sou uma mulher de rua e uma prostituta6. A paciente tentouinsistentemente defender"se dessas severas acusaç&es, chegando até a

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colocar cera nos ouvidos. @orém, as vozes das beatas sempre venciam.<ogo ela também começou a queixar"se de ser perseguida por homens.

!ma noite, a paciente telefonou para o terapeuta. al ousava cochichar nobocal do aparelho. 3xplicou que não podia falar mais alto porque as beatas

tinham interceptado seu aparelho e podiam ouvir. @referia escrever o queiria acontecer exatamente ) meia"noite, e colocaria o que havia escritodiretamente na caixa do correio do analista. ? seguinte registro, tendo comot#tulo 65mportantes Documentos Altamente %ecretos6 foi o que eleencontrou0

A invasão será à meia-noite. E estou preparada. Vou fcar acordada. Hoje àtarde eu vi algumas das tropas de ataque deles, disar!ados emmotociclistas, e usando grandes "culos vermel#o-alaranjados, como seossem máscaras.

$uem são eles% Ac#o que pertencem aos vermel#os, pelo menos a essacategoria, mas vindos do espa!o. Eles podem se transormar em seres tãomin&sculos como piol#os para se infltrar atrav's de rac#aduras nas

 paredes( mas estou alerta e ten#o cuidado com eles, especialmente noscantos e de)ai*o da mesa. +á ouvi algumas )atidas e sons que são seussinais secretos. reparada, então, fquei ol#ando no espel#o por algumtempo. meu rosto está morto. sso ' )om. Eles podem acreditar que euesteja morta, at' que eu ten#a tempo para ver como eles são. /alve0 eu me

 junte a eles mais tarde. enteei e escovei )em meu ca)elo. 1 uma )oa prepara!ão. ca)elo protege a ca)e!a 2 o c're)ro. $uando escovei o

ca)elo, tive uma vaga no!ão de outros rostos atrás desta min#a máscaramorta.

 Agora, voc3 e os outros psiquiatras estão tentando me impedir deso)reviver a essa invasão. Voc3s estão me di0endo que tudo isso ' um

 produto de min#as or!as inconscientes reprimidas( os outros me di0em para controlar a min#a imagina!ão ou perguntam quem eu penso que soucom as min#as id'ias megaloman4acas.

5eus est&pidos. 1 que simplesmente voc3s perderam a sensi)ilidadeinterior para perce)er os sistemas de 6eiger e 7adar deles, ou a capacidade

de en*ergar as suas ormas dissimuladas . 1 necessário ter um certo treino.1 como perce)er escorpi8es assim que se entra em um quarto.

/alve0 eu me junte a eles a fm de proclamar ao mundo o poder( um poderque nos invadirá, mais orte do que qualquer mente #umana possaimaginar, um )il#ão de ve0es mais orte que a energia at9mica.

curto sono era negro comparado com esta nova realidade que,entretanto, ainda não se desenvolveu em todos os detal#es e em toda suae*tensão: o poder de penetrar nos segredos mais proundos e ocultos do;niverso. sso possi)ilita um poder maior que o de <eus. Essa ' umaquestão para te"logos, mas talve0 eles d3em algumas dicas. <eus come!oualgo que não pode mais controlar, te"logos constr"em sistemas de

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 pensamento para salvar a sua cara( Ele, voluntariamente, limitou o seu poder ao dar ao #omem o livre ar)4trio( Ele está em guerra com 5atã e umdia Ele o destruirá completamente, no dia da vit"ria.

=as eu sei de algo muito mais importante e a)rangente em suas

conseq>3ncias( ap"s a invasão estar conclu4da, quando o poder do ;niverso puder ser livremente usado, então, será poss4vel ser maior que <eus, porque se estará acima do )em e do mal, quando isso nos invadircompletamente, então n"s seremos tão poderosos e grandiosos como <eus,ou mais ortes ainda. A rea!ão em cadeia irá nos enc#er de uma energiaque os cientistas #umanos ainda não con#ecem. ?ão será preciso dormir oucomer.

poder dos invasores não ' perigoso% Eles são realmente destruidores equem luta com eles se destr"i. =as eles não são inteligentes. ortanto, voc3a0 ami0ade com eles e con#ece os seus segredos. sso anula seu poder dedomina!ão. A fnalidade desse poder ainda não oi revelada.

@oss fcará sa)endo disso porque, em)ora a sua percep!ão seja limitada,ele tem um certo entendimento e uma disposi!ão para aprender, e sintoque temos certas coisas em comum. Ainda #á alguns te"logos an3micos e)eatas por aqui, tentando desco)rir o que está acontecendo. ortanto, eunão posso contar por teleone. Eles estão interceptando a lin#a. 1desnecessário entrar em uma luta a)erta com eles, no momento, uma ve0que eles já estão adados a morrer.

 2. O desao da acien!e

o in#cio, o psiquiatra esperava poder falar racionalmente com essainteligent#ssima paciente e colega, mesmo em sua psicose, usando ométodo de 6persuasão6 de Dubois. 3le tentaria fazer com que a paciente seafastasse dos horr#veis fen2menos visuais e auditivos, chamando"os demeras alucinaç&es sem nenhuma realidade. 3le chegou até a dar um passoa mais, em seu esforço racional, e classicou as express&es alucinat*rias dedistrbios metab*licos nos tecidos cerebrais. Acrescentou que se a paciente

quisesse ter provas de sua explicação, bastaria examinar as curvas bastanteagitadas do seu eletroencefalograma.

@ara espanto do médico, a paciente simplesmente riu dessas explicaç&esnaturalistas e, desdenhosamente, deu de ombros. 6Como se poderiapensar6 - retrucou ela insolentemente - 6que uma simples percepção oupensamento humano, se+a comum ou incomum, pudesse serinteligivelmente derivado de processos siol*gicos do metabolismocorporal, de quaisquer funç&es nervosas ou das assim chamadas6atividades nervosas superioras6 que acontecem simultaneamenteB6 3 elacontinuou perguntando0 6como o médico conseguia visualizar taltransformação dos processos f#sicos em fen2menos imateriais e mentaisB

 /alvez como um tipo de evaporação m(gicaB6

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? médico retrucou que não era exatamente isso, a m de salvar a situação.Dizendo"lhe de outra forma, armou que o metabolismo siol*gico nosistema nervoso central e os fen2menos mentais podem ser vistos comodois aspectos diferentes de uma mesma coisa. 3nquanto a siologia abordaas funç&es do sistema nervoso central em termos de espaço e tempo, a

psicologia os estuda enquanto v(rios fen2menos sub+etivos, que são,entretanto, somente os ree*os su)jetivos de processos fsiol"gicos. @arafortalecer a sua posição, comparou esse reexo sub+etivo com o reexo dasondas luminosas de um ob+eto, criando uma imagem sobre uma chapafotogr(ca.

? psiquiatra estava realmente orgulhoso de sua explicação cient#ca, umavez que a lera recentemente em um dos mais modernos e importanteslivros de medicina psicossom(tica. as, logo depois, teve de render"senovamente, pois a paciente perguntou"lhe0 6De que natureza deveria ser o

c*rtex cerebral a m de que - como tecido org$nico material - pudessecompreender e manter relaç&es desveladoras de sentido com o mundoexternoB Ademais, em que deveriam os processos siol*gicos se reetirsub+etivamenteB /alvez na consci'ncia de um su+eitoB as de que naturezadeveria ser tal su+eito a m de que pudesse possuir uma consci'nciaB 3poderia o doutor explicar o que é consci'ncia e onde ele acha que aconsci'ncia humana pode ser encontradaB /alvez dentro da cabeça ou emalgum outro lugarB 3ra essa consci'ncia que acabara de comparar com achapa fotogr(caB 3ntretanto, ser( que alguma chapa fotogr(ca +( foicapaz de perceber o que nela se reete e identic("lo com a coisa que éB6

Ap*s o fracasso de suas interpretaç&es siol*gicas, o psiquiatra recolheu"seinteiramente na psicologia pura. Admitiu que as alucinaç&es de sua pacientenão eram simplesmente nada. 3ntretanto, armou que elas nãocorrespondiam a uma realidade externa, mas representavam apenas umarealidade interna puramente ps#quica, consistindo em emoç&es ocultas etend'ncias da pr*pria paciente. 3ssas realidades ps#quicas internas estavamsendo pro+etadas das camadas de seu inconsciente sobre ob+etos externos.

5nfelizmente, o conhecimento psicol*gico do médico foi recebido de umaforma ainda pior do que a explicação siol*gica de sua psicose. 3la

precipitou"se furiosamente sobre ele0 6ão me venha novamente com estasbaboseiras psicol*gicas tentando transformar em cção estes espi&es emotociclistas1 dispondo deles como meras alucinaç&es e pro+eç&es do meuinconsciente ou qualquer outra realidade ps#quica. De qualquer maneira, oque voc's, psiquiatras, sabem da realidadeB ada, absolutamente nada. 3depois, voc's continuam e subdividem ordenadamente algo sobre o qualvoc's não t'm nenhuma noção. 8icam tagarelando sobre sub+etivo eob+etivo, sobre uma realidade ps#quica interior e uma realidade real,vinculada ao mundo exterior, pretendendo +ogar uma contra a outra comose a primeira fosse real e a ltima puramente ct#cia e alucinat*ria. as o

que é que voc' quer realmente dizer com a palavra alucinação,considerando que voc' ignora totalmente o que é a assim chamada

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realidade não"alucinat*riaB @alavras, nada mais que palavras, e atr(s delasnada, precisamente nada, nenhum conhecimento real de qualquer espécie6.

Como poderia a psicologia tradicional do médico, em toda sua fragilidade,resistir a tal ataque frontal constitu#do de ob+eç&es totalmente

incontest(veis, apesar da esquizofrenia da advers(riaB De qualquermaneira, o psiquiatra viu"se obrigado a empreender uma reavaliação detodo o seu modo de pensar.

@rimeiramente, buscou a+uda estudando as psicologias européias modernas,baseadas em concepç&es de um su+eito ou de uma pessoa. 3ntretanto, elenão conseguiu achar qualquer descrição ou elucidação da natureza deste tal6su+eito6 ou 6pessoa6, que o capacitasse a entender o simples fato de quea sua paciente podia perceber e vivenciar alguma coisa, sendo essa6alguma coisa6 algo signicativo, não importando se essa experi'ncia fosseou não de car(ter alucinat*rio. 3m outras palavras, o psiquiatra continuoutão ignorante quanto antes, em relação a qualquer entendimento real sobrea possibilidade de um encontro desvelador de sentido de um su+eito comum ob+eto, ou de uma pessoa com uma coisa, ou com um outro ser humano.

?bviamente, o médico teve que abandonar as psicologias tradicionais, todosub+etivismo e personalismo, e ver a paciente em si. Certamente, nuncateria tido a coragem de fazer algo tão simples, e aparentemente nadacient#co, se não tivesse tido acesso, pouco antes, aos ensinamentos daAn(lise do <asein que muito o impressionaram comseus insig#ts fundamentais sobre a verdadeira ess'ncia da exist'ncia

humana. A partir desse momento, os desenhos da paciente começaram aocupar o lugar mais importante do seu pensamento. 3ra extraordin(ria aforma como surgiam. Como se aparecessem espontaneamente, m(scarasfeias e diab*licas emergiam sobre um pedaço de papel branco, sem ainterfer'ncia da paciente. 63las surgem6, a paciente dizia, 6de nenhumlugar, aparecem repentinamente, emergem de algum lugar por tr(s dopapel de desenho, e de repente elas estão l(, olhando para mim. ?sdesenhos sempre começam do ponto central, entre as sobrancelhas. Depoisdisso, aparecem os olhos. Algumas vezes, não h( qualquer contorno dacabeça, delimitando esses primeiros traços e diferenciando"os do universo )

sua volta, ou talvez do nada, do qual emergem.6

3m seguida, o médico recordou a primeira aparição das assim chamadasalucinaç&es auditivas da paciente. esse aspecto também tinha esperançade poder penetrar mais profundamente em sua condição psic*tica. 3la tinhaque se concentrar para poder ouvir de forma mais atenta poss#vel o menorru#do, como se pairasse no ar uma mensagem pronta para ela, predizendoum inomin(vel horror, algo repleto de desastres. 3sse algo, pavoroso eindiz#vel, soterrava"a na forma de uma crescente tensão, invadindointensamente seus ouvidos, até que, nalmente, casse reduzida a eles. ?ouvido e a região corporal circundante tornavam"se doloridos eespasticamente contra#dos. a verdade, não era nada espec#co, mas umhorror indescrit#vel, e uma iminente transformação de tudo em nada que,

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nalmente, libertaria o murmrio dos pingos de chuva, que a repreendiamcom insinuaç&es sobre a sua devassidão.

%e formos honestos, devemos admitir que em nenhuma dessas experi'nciasimediatas da paciente encontramos qualquer evid'ncia que permitisse

supor a real presença de representaç&es instintuais prim(rias dentro dosn#veis mais profundos da psique, e armar que elas se pro+etariam a partirde uma espécie de recipiente intraps#quico chamado 6inconsciente6 parafora e sobre os ob+etos do mundo exterior. %e deixarmos de assumir, a

 priori e no lugar da observação, a presença de entidades ps#quicas napaciente, sobre as quais 7conforme +( admitimos; não temos nem nuncateremos qualquer conhecimento 7caso contr(rio não ser#amos obrigados ausar o termo 6inconsciente6 quando nos referimos a elas - 6representaç&esinconscientes6 ou 6inconsciente individual e coletivo6, por exemplo;, entãoveremos que a realidade da paciente indica algo bem diverso daquilo que a

psiquiatria e a psicologia t'm nos feito acreditar, até o presente momento.eremos que alguma coisa se acerca da paciente, dirige"se a ela de nenhumlugar e de todo lugar, mas nunca do interior de uma psique individual. 3stealgo se comunica emergindo do papel de desenho, da grande dist$ncia deum avião noturno, dos ru#dos da rua, do ranger da cadeira do analista. Algolhe est( sendo enviado, tenta ser admitido em sua consci'ncia e a#aparecer. E algo do seu futuro que se dirige a ela, vem ao seu encontro,busca ser inclu#do em seu presente. 3sse 6algo6, para essa paciente, é,sobretudo, o $mbito de fen2menos que se revelam em modos er*tico"corporais de relacionamento humano com o mundo. E verdade que, em

primeiro lugar, foram as severas beatas sect(rias e os pregadores ascéticosque pediram admissão ) consci'ncia da paciente embora nas assimchamadas alucinaç&es. 3ntretanto, +ustamente por proibirem, asalucinaç&es se referem exatamente ) coisa que pro#bem, por exemplo, )esfera er*tica"corporal da vida humana. Como a paciente nunca fora capazde apropriar"se dessas possibilidades er*ticas de amor, não tinha sido capazde aceit("las como realmente pertencentes ao seu sel  respons(vel.@ortanto, um relacionamento livre com todos estes fen2menos do nossomundo, mais especialmente com um homem enquanto parceiro sexualamado, permanecera inating#vel. Desde a sua inf$ncia, fora rigorosamente

treinada para se alienar dessas possibilidades de relacionamento, quetodavia constitu#am parte de sua exist'ncia. 3las haviam sido consideradasincompat#veis com a dignidade humana, pecaminosas, perigosas. 8oraestimulada a ser pragm(tica, desapegada, desapaixonada e ob+etiva,inteiramente ocupada em perseguir de forma competente ob+etivos que s*poderiam ser atingidos por um exerc#cio sistem(tico de pensamento. ?resultado inevit(vel foi uma exorbitante sobrecarga das suas faculdadesintelectuais.

osso encontro livre e aberto com certos $mbitos do mundo humano pode

ser enormemente obstru#do por imposiç&es de nosso obstinado ego#smo, oupor uma cega e extr#nseca pressão alienadora, imposta por uma atmosfera

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inadequada em nosso ambiente de inf$ncia. @orém, nenhum ser humanopode +amais silenciar completamente o desao de tudo o que est(destinado a aparecer e vir a seu ser ) luz de uma dada exist'ncia. Assim, os$mbitos f#sico"sensuais do mundo humano que não tinham sido admitidoslivremente por nossa paciente, importunavam somente sua audição e visão,

reclamando cada vez mais insistentemente por sua consci'ncia, embora demodo extremamente restritivo. /udo o que, até esse momento, a pacienterecusara"se a ver, escancarava"se e a encarava, na forma de m(scaras6alucinat*rias6, ou a espionava de modo 6paran*ico6 nos mais #ntimosrecessos de sua vida.

Animado pelos insig#ts que obtivera com essas observaç&es, o terapeutasentiu"se capaz de arriscar uma abordagem nova com essa pacienteostensivamente irada e alucinada. 3le admitiu com delicadeza0 6oc' temtoda razão. ão tem sentido dar a uma realidade prioridade sobre outra.

%eria bastante ftil de nossa parte sustentar que esta mesa diante de n*s émais real que os seus espi&es sobre as motocicletas, pelo fato de iludiremminha percepção e serem percept#veis somente a voc'. @or que nãodeixamos que ambos existam como os fen2menos que revelam serB 3ntão,s* h( uma coisa digna da nossa atenção. E necess(rio considerar ocontedo signicativo pleno de tudo o que se desvela para n*s. %e voc'continua encontrando espi&es em cada esquina, e se um psiquiatra tentassereduzir essas percepç&es a meras alucinaç&es ct#cias ou a invenç&es dasua imaginação, se ele tentasse imputar"lhes somente uma realidadeps#quica como pro+eç&es do seu inconsciente, então eu teria que concordar

com voc' que ele estaria falando coisas sem sentido, sem darem qualquercontribuição para a nossa compreensão das suas experi'ncias. @ois, quem écapaz de determinar o que signica basicamente 6ps#quico6, e o que éimaginaçãoB 4ual é a natureza das imagens das assim chamadasimaginaç&es ou ilus&es, e onde se espera encontr("las dentro de uma6psique6B as talvez voc' concorde comigo se eu disser que ve+o arealidade dos seus espi&es primordialmente no que eles fazem. 3 o que elesfazem senão espionarB as espionagem ocorre somente como forma depreparação para a guerra1 portanto, somente quando existe um confrontoentre dois inimigos entrincheirados e quando uma parte quer aniquilar aoutra, ou pelo menos conquist("la e domin("la. ? que aconteceria se voc'permitisse a tudo que existe o direito de existir e se mantivesse aberta atudo o que quer vir até voc', mesmo que a estrutura de sua exist'nciaantiga se tornasse muito pequena e tivesse que ser despedaçada e morrerB@or que não tentar desistir de toda esta luta e de defender"seB Deixe que osespi&es venham e d'"lhes pleno poder para fazer o que dese+am, e apenasve+a o que acontece6.

 

3. " descober!a do !eraeu!a

<ogo ap*s, foi bastante espantoso ver como a paciente se sentiacompreendida por completo nas profundezas de seu mais #ntimo ser e como

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depositava uma indestrut#vel conança em seu terapeuta. 3m função disso,seguia seus conselhos com uma energia e perseverança incomuns.%uportou, com uma abertura devota e cordial,, tanto as beatas com seusinsultos 76%ua mulher assanhada, sua prostituta6;, quanto os espi&es comsuas armas secretas. 3les a torturavam, perfuraram seu corpo com

correntes elétricas de alta voltagem, serravam suas pernas na altura dos +oelhos. Conseguiu agFentar tudo isso graças a sua conança no terapeuta.

? psicanalista, por sua vez, foi recompensado com uma descobertatotalmente nova. @rimeiramente, a paciente p2de sonhar que tinha queassumir a direção do serviço de neurologia de um grande hospital. <(,encontrou uma menininha com meningite. o sonho, a paciente percebeude imediato que a nica esperança de salvar a menina seria através de umaprolongada drenagem do uido cérebro"espinhal. o estado de vig#lia, apaciente, surpreendentemente, viu um paralelo entre essa drenagem do

sonho e a drenagem anal#tica ) qual estava se submetendo. Dois curtosaspectos desse sonho chamaram a atenção do analista. 3le notou queaquela que no sonho se encontrava tão doente e tão necessitada detratamento era uma criança e que, além disso, a doença localizava"se emsua cabeça0 ela sofria de meningite. 3le se absteve temporariamente decomentar o fato. o entanto, pouco tempo depois, rostos de meninascomeçaram a se misturar com as percepç&es *ticas de seu estado de vig#liae, em seguida, rostos de sadios beb's começaram a aparecer. 78igs. G e H.;

 

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Figura # 

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Figura $ 

@ara o analista, isso signicou um benvindo sinal, indicando as tremendasdiferenças entre as m(scaras distorcidas e maliciosas dos adultos, e os

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semblantes das crianças, radiantes de fé e de conança. @erguntou entãocautelosamente ) paciente se aquelas crianças, que davam gosto de ver,não pertenciam de certa forma )quela parte de seu mundo que haviapermanecido saud(vel e feliz. !ma vez que ela estava aberta para perceberessas crianças normais, não seria poss#vel presumir que,

fundamentalmente, ela também poderia viver como uma criança normal efelizB I( que essa maneira de comportamento talvez correspondesse aseusel  pr*prio e aut'ntico, o que aconteceria caso, na an(lise, ela sepermitisse ser essa pequena criança, totalmente despreocupada e semrepress&esB %e ao agir assim ela se su+eitasse ) regra b(sica da an(lise, dedizer tudo, ser( então que não teria in#cio a necess(ria drenagem da criançadoente de seu sonhoB /alvez, dessa maneira, a inamação de seu cérebro -devida muito provavelmente ) estafa intelectual - pudesse tambémdesaparecer.

@ermitir que ela fosse uma criança pequena foi o 6abre"te %ésamo6 quedescerrou as comportas que durante tanto tempo haviam impedido quesuas verdadeiras potencialidades se expressassem. 3ra como se ela tivesseesperado por essa permissão durante toda a vida. /oda a fachada de seuantigo modo de vida - os padr&es excessivamente conscienciosos dededicação ao trabalho, de esforço ilimitado para atingir determinadosob+etivos nela inculcados durante tanto tempo - desmoronou com toda aforça de sua prodigiosa vitalidade, dando lugar aos impulsos infantis dechupar os dedos, dar pontapés e gritar. 3m casa, ela começou a brincar comseus pr*prios excrementos, usando"os para pintar enormes folhas de papel

de rascunho, que se tra#am de longe por seu odor. 78ig. J.; Dentro dabanheira, também besuntava todo o corpo com suas fezes.5nesperadamente, trouxe uma mamadeira para a sessão de an(lise, quechupava deitada no divã, como se fosse criancinha. A seu pedido, o analistateve que aliment("la com a mamadeira, enquanto ela permanecia encolhidacomo um beb' no divã.

 

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Figura % 

@ara dar continuidade ) terapia, era vital permitir"lhe a mais completaliberdade de ação em sua 6encenação6 infantil, como também aceit("latotalmente e sem reservas, exatamente como ela se revelava. /udo estariaperdido se o analista, através de um m#nimo gesto ou tom, insinuasse

qualquer aversão, ou até mesmo sorrisse um tanto indulgentemente ) vistada mamadeira. Caso zesse isso, ele teria, inevitavelmente, assumido omedonho papel daqueles pais ascéticos, privando para sempre a pacienteda possibilidade de encontrar seu pr*prio caminho.

3la tinha certeza de que se lambuzar com as fezes era, de alguma formam(gica, extraordinariamente benéco para o universo. 3stava apenasesperando car menstruada para também poder se besuntar com seusangue. %entia que isso provocaria a liberação total da ssão at2mica.

%e não trouxe um benef#cio para o universo, essa permissão trouxe"o pelo

menos para a paciente. Até esse momento, ela tinha sido atormentada pordores de cabeça intoler(veis, como se a parte superior de seu cr$nio

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estivesse aberta, e o cérebro exposto repleto de dor. Agora sua cabeçaestava muito leve, livre de pressão. @ela primeira vez, sentia"se completa einteiramente bem consigo mesma. as esse contentamento infantil durouapenas alguns dias. 3ra muito evidente que a atitude permissiva doterapeuta, combinada com a virtual redenção a ela concedida por esse

benéco intervalo infantil, estava começando a evocar na pacientesentimentos de amor e gratidão por ele. ?casionalmente, enquanto sugavaa mamadeira, levantava os olhos e olhava para o analista. 3m taismomentos, o brilho caloroso de uma criança pequena substitu#a o olharvago e vazio que havia em seus olhos. 3sses sentimentos envolviam"nacompletamente. 3les não tinham relação alguma com seus estudosaltamente especializados e nem podiam ser relacionados com a atitudealtru#sta r#gida e recatada que sua educação reforçara. @ortanto, s* podiamser vivenciados como algo alarmantemente estranho, perigoso epecaminoso. Como conseqF'ncia, seguiu"se uma série de experi'ncias

muito penosas e perturbadoras.

3le havia comprado um ingresso para assistir a um concerto e, na noite, daapresentação, deparou"se com uma sosticada senhora vestida de pretoenquanto esperava em um ponto de t(xi, a caminho do audit*rio. @odiasentir o olhar desdenhoso daquela mulher sobre ela, o que lhe provocouuma estranha sensação. ão queria perder a mulher de vista, mas elaconfundiu"se com a multidão. 4uando desceu do t(xi, sentiu alguém pux("lapelo braço. irou"se para ver quem era, mas não havia ninguém. Devia tersido a diab*lica senhora vestida de preto. Chegando ao teatro, aquela

mesma senhora sentou"se a seu lado, a mesma que tanto a atemorizara nocaminho. A paciente cou horrorizada, r#gida, e não conseguiu ouvirpraticamente nada da msica. Assim que começou o concerto, teve certezade que, no minuto seguinte, aquela senhora, ou o maestro de seu p*dio,dariam o sinal para o destruição do mundo. 8ugiu do local com todas assuas forças. o dia seguinte, uma amiga de outra cidade quis visit("la, masa paciente negou"se a v'"la. 3stava convencida de que a amiga estavaimplicada em uma trama que alme+ava destru#"la.

o outro dia, a paciente foi ao restaurante costumeiro. /eve de usar *culosescuros, pois supunha que os malfeitores haviam feito algo a seus olhos,

fazendo"a car quase cega. Assim que experimentou a comida, teve umaforte dor de est2mago. @ara ela, era um sinal de que havia sidoenvenenada. 3ntão, as apariç&es das m(scaras, que a tinham deixado empaz no per#odo em que estava em seu para#so infantil, retornaram.ovamente, o analista pediu"lhe que desenhasse os rostos. Kapidamente,entre as sombrias feiç&es daquelas velhas tias puritanas e rostosdemon#acos deformados, começaram a aparecer os primeiros esboços deuma bonita mulher, sedutora e sensual, disfarçada com uma m(scara pretanos olhos 78ig. L.; A pr*pria paciente não havia notado esse elemento novoe o analista chamou sua atenção para esse detalhe deliciosamente

saud(vel.

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Figura & 

3la desculpou"se por ter negligenciado esse detalhe, dizendo que nenhumde seus desenhos realmente emanava dela, mas que somente u#amatravés de suas mãos. 4uando desenhava, nunca tinha a impressão de algoparticular que pudesse ser transmitido ao papel. Disse, conrmando assimsuas armaç&es anteriores, que era como se rostos viessem em sua direçãode algum lugar do espaço, emergindo da branca extensão do papel ) suafrente. %ua mão começava a desenhar, e os rostos começavam a aparecer ea olh("la do bloco de desenho. ão podia dizer de onde eles vinham. Iuntos,a paciente e o analista encontraram um nome para essa bonita m(scara06Dama do Carnaval6. ? terapeuta ousou perguntar se este novo rosto nãopoderia representar uma esfera da vida da qual ela sempre havia se

exclu#do 7o lado relacionado com as potencialidades er*ticas e femininas demulher adulta; e que agora estaria tentando se revelar. <ogo depois, foi

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invadida por rostos de meninas, nebulosos e indenidos, parecendo abertosa tudo, e que sua mão transmitiu automaticamente ao papel. A seguir, parasua grande surpresa, guras de prostitutas esboçaram"se no bloco dedesenho 78igs. M, 9N e 99.;

 

Figura ' 

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Figura 1( 

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Figura 11 

Como acontecera com as anteriores maneiras infantis de comportamento,esta abertura de si mesma para um $mbito feminino mais maduro trouxe

uma enorme sensação de al#vio. 3xperimenta uma grande onda de novasenergias, começa a fazer excurs&es, cursos, consegue ler novamente, falacom estranhos sem medo, dorme ininterruptamente oito ou nove horas pornoite, sem qualquer medicação pela primeira vez em vinte anos. as opoder tir$nico de uma mentalidade familiar parental ascética provavelmentenão aceita uma derrota com tanta facilidade. Assim, ap*s um curto per#odode G dias, a paciente começa a mover"se furtivamente, queixando"se que asbeatas estavam novamente atr(s dela, sussurrando"lhe que ela era umamulher das ruas, e que a primeira coisa que se sabia era que ela semasturbaria em pblico.

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Apesar da evid'ncia da resist'ncia 7e depois de um sonho na mesma sessãoapontar"lhe o caminho; o analista aventurou"se a dar um novo passo.

A paciente sonhou que uma colega sua havia passado por uma série detratamentos de choque de insulina, durante os quais ela sofre um ataque

epiléptico, sentindo"se depois especialmente bem. ? terapeuta lembrou"aque, estando acordada, ela muitas vezes expressara o dese+o de receber umchoque de insulina, para que pudesse sofrer um ataque, uma explosãoinduzida de forma médica, farmacologicamente determinada, na qual elapudesse se soltar em um selvagem abandono passional, mas onde fossemantida a impessoalidade, e sua responsabilidade completamente eximida.@or que é que ela não podia, mesmo em seus sonhos, deixar"se levarvoluntariamente, pelo menos uma vez, por um verdadeiro acesso de del#rioloucoB @or que é que ela s* podia proporcionar"se algo articial e plane+ado,esse choque insul#nico substitutivoB 3 além disso, ela não ousava nem

mesmo assumir a responsabilidade por esses ataques induzidos de insulina.3la os renegava, imputava"os a outra pessoa, deixando que sua colegafosse convulsionada por eles.

Como uma reação esclarecedora a essa questão, veio a primeira explosãoimpulsiva0 6Cale a boca, seu idiota. 3u quero gritar6. 6@or que voc' não fazisso, entãoB6perguntou o analista. 6%e eu gritasse do +eito que quero,pessoas viriam e pensariam que alguém estaria sendo morto6, foi o que elarespondeu.

6oc' realmente acha necess(rio submeter"se ) opinião dos outros a esse

ponto tão extremoB 5sso não seria levar longe demais o cuidado e a cautelapara com os outrosB6 perguntou o terapeuta.

6%im nunca z nada em minha vida, a não ser aquilo que os outrosesperavam de mim6, ela admitiu. 6unca tive coragem de agirespontaneamente, não da maneira que eu sentia.6

? terapeuta deu"lhe um pouco mais de coragem, dizendo0 6/ãoterrivelmente boa, sempre.6 Depois disso, a paciente realmente conseguiudar um grito meio sufocado.

? terapeuta ousou dar um incentivo nal0 6uito bem. 4uase tão altoquanto uma criança de verdade6.

6Cale a boca6, ela gritou novamente, dessa vez mais zangada que antes.Disse então, depois de um breve sil'ncio0 63u quase me sinto um poucoexcitada sexualmente agora6.

64uaseB6 retrucou ceticamente o terapeuta. 3la começou a se debater nodivã, mas teve que se levantar, pois a sessão havia terminado.

Ao ir embora, disse0 6ão me reconheço mais. 4uem sou euB6

6E para isso que voc' veio ) an(lise6, respondeu o analista.

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Dois dias depois, a paciente iniciou a sessão dizendo que tinha sealimentado com a mamadeira naquela dia 7coisa que vinha fazendo h(meses; para fugir das sensaç&es sexuais em sua pélvis. 6Oostaria de medesculpar pelo meu comportamento na ltima sessão, por ter"lhe dito cale aboca.6

? analista op2s"se a essa apreensão e a essa manifestação de decoroperguntando0 6oc' acha realmente que tal desculpa é necess(ria entren*sB Além disso, fui eu quem lhe pediu que fosse absoluta e francamenteaberta e honesta aqui6

<ogo ap*s, a paciente espreguiçou"se relaxadamente e disse0 63u não mesentia tão forte e em tanta harmonia comigo mesma h( décadas6. ãohavia mais qualquer vest#gio de sentimentos de estar sendo pressionada oude alucinaç&es auditivas no ltimos dois dias. 3la tinha conseguidoencontrar pessoas nas ruas, nos restaurantes e no teatro, de forma bastantediversa de seus sintomas psic*ticos. as as risadas duraram pouco. Durantea sessão, a sensação de bem"estar foi abruptamente interrompida por umsil'ncio apreensivo e tenso. Ap*s uma longa pausa, disse com hesitaçãoque sentiria um impulso para se despir e para sair correndo nua pela rua.Chocara"se enormemente com esse impulso0 6ou me sentar6, continuou,6uma sensação horr#vel que vem de baixo toma conta de mim, se eu sentar,posso forç("la melhor a voltar para baixo. @ercebo que anatomicamente souperfeita l( embaixo, mas tenho a sensação de que ali existe senão umgrande e repugnante buracoP.

Deixou a sessão anal#tica muito tensa e deprimida. Durante a noite,telefonou ao analista, queixando"se0 63xiste em mim uma tensãoamedrontadora, é mais intensa do que qualquer um possa agFentar. 3usimplesmente não consigo agFentar isto6. ? médico aconselhou"a a livrar"seum pouco dessa tensão desenhando. ais tarde, em um segundotelefonema, a paciente gritou ao telefone0 64uero rasgar meu ventre comuma faca de entalho. 4uero talhar minhas artérias e sugar meu pr*priosangue. %* de pensar nisso co com (gua na boca6. ? terapeuta foirapidamente a seu encontro. 3ncontrou"a sentada sobre sua cama, comuma expressão perturbada. %ua chegada mal foi notada, ela ouvia

atentamente aqui e ali, como fazem normalmente esquizofr'nicosalucinados. Kecuava alarmada ao m#nimo som. 8inalmente, deixou claro aoanalista que cada som tinha novamente um signicado misterioso.

3sse pavor intoler(vel de um desastre recém"iniciado e o inomin(vel nalcatacl#smico exigiam uma intervenção imediata0 6Como alguém poderiamelhorar6, perguntou o terapeuta, 6sem que o antigo mundo, neur*tico,entrasse em colapso durante o processoB 3le é muito estreito e r#gido parasobreviver. 3 se esse tipo de destruição da antiga prisão neur*tica est(acontecendo com voc', ser( isso tão pavorosoB 3star tão cheia deapreensão como voc' est(, e nada ouvir exceto morte e destruição, podeapenas signicar que a pessoa ainda est( aprisionada no erro de acreditarque seu pr*prio mundo, egoc'ntrico e neur*tico, é a nica possibilidade de

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exist'ncia e que, quando ele d( sinais de desmoronar, isso signica achegada do +u#zo nal. @ara o ser real, essencial que é voc', o que est(acontecendo agora est( muito longe de ser o m. E uma mera modicaçãoocorrendo na sua forma de se mostrar.6

Ainda um tanto cética, mas readquirindo conança, ela conseguiu dar umsorriso p(lido. as isso durou apenas um breve momento. Depois, seu olharcaiu sobre uns desenhos sanguin(rios, que ela havia espalhado pelo chãodurante a noite 7g. 9:;, solicitando novamente sua atenção por completo,e ela se encolheu para dentro de si mesma.

 

Figura 12 

6Ah6, observou o terapeuta imediatamente, 6voc' pensa que deve termedo desses impulsos sanguin(rios. Qem, esse é apenas um segundo errode sua parte. ? suic#dio é sempre apenas um erro, no sentido de utilizar umrecurso inadequado. oc' se sente compelida a efetuar um corte f#sico emseu corpo. E um #mpeto para ver seu sangue correr, porque voc' ainda não

ousaria abrir seu coração e deixar seus sentimentos u#rem. oc' gosta demim porque eu tento apoi("la6.

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3ssas explicaç&es foram rapidamente seguidas por uma enorme diminuiçãoda sua tensão. 6%e voc' diz isso, talvez eu possa tirar o nariz de toda estasu+eita e respeitar um pouco mais livremente. as pode alguém gostarrealmente de voc'B 5sso não é pedir demaisB %e eu car dependente devoc', não serei um pesoB6

63 uma pequena criança, cada recém"nascido, não tem leg#timo direito aocuidado dos paisB 3 voc', que no seu mais #ntimo ser é uma pequenacriança, não teria um duplo direito de ser protegida, por ter sidodolorosamente privada do que tanto necessitava tempos atr(s, no momentocerto, quando era sicamente pequenaB ão seria correto voc' ser agoraamplamente recompensada por issoB6

@ara fazer essas armaç&es, o terapeuta recorreu ao material biogr(co queela lhe havia fornecido, que revelavam o fato de que sua mãe fora alguémmuito eciente, tendo transformado sua pr*pria casa em uma hospedaria.3stranhos necessitados, oitenta ou noventa a cada vez, eram acolhidos ecuidados na casa. 3ra somente para seus pr*prios lhos que a mãe nãotinha tempo. A paciente cou tocada com esse convite. o dia seguinte,trouxe sua mamadeira novamente, e deixou"se de novo ser uma criançapequena. %eu pr*prio coment(rio foi o seguinte0 64uando estou assim, sourealmente eu mesma. Agora não tenho mais nenhum barulho ou vozes emmeus ouvidos. 8oi muito exaustivo ter que ouvir tal d#namo de sons vindosdo além6.

@or duas semanas nada mais ocorreu, exceto que a paciente deitava"se na

posição fetal e era alimentada com a mamadeira pelo analista. R noite,dormia maravilhosamente bem, oito ou nove horas seguidas. 63stapermissão de ser uma criança pequena é como uma base rme para mim,um chão s*lido onde eu posso me estabelecer. %e voc' não me tivessepossibilitado isso na semana passada, sei que teria enlouquecido parasempre.

Kealmente necessito ter uma base s*lida como essa antes de ousar deixar"me envolver por sentimentos mais intensos. 3 eu preciso saber que possovoltar sempre para essa base, caso as coisas se tornem muito dif#ceis. ?uterei que car sem isso de uma s* vez logo que crescerB Ao dizer isto, seusolhos abriram"se em uma expressão horrorizada.6

? terapeuta confortou"a imediatamente. 6ão se preocupe em crescer.Apenas se permita ser exatamente o que voc' é, tão inteiramente quantoposs#vel e por quanto tempo quiser. %e seguir esse conselho, oamadurecimento vai se dar por si mesmo, no devido tempo6.

Ao ouvir essas palavras, o medo surge novamente em seu rosto. Depoisdessa fase terminou a sessão com um misto de espanto e de apreensão06Ah, agora esses sentimentos por voc' estão aorando novamente6.

a noite seguinte, teve um sonho muito obsceno e incestuoso com seu pai.8alou do sonho, no dia seguinte, de forma tão casual e desafetada que era

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de se suspeitar. Além disso começou, repentinamente, a discutir um assuntomédico. Algumas horas depois, telefona em um estado desesperador064uando eu estava indo embora ho+e, tive uma sensação misteriosa.4uando estava falando aquelas coisas médicas, não era eu que estava l(.4uem estava falando era uma enorme mulher estranha, parada de pé a

meu lado. 3u me perdi novamente naquele papel tão articial de médicaadulta, e o pior de tudo é que não conseguia mais v'"lo, apesar de voc' terme dado a mão quando fui embora. /ive a sensação de ter repentinamenteperdido a ambos, meu pai e minha mãe. 3u estava novamente tentandoenganar"me, e fazer o papel do grande adulto. Depois da sessão, fui )cidade comprar algumas roupas bonitas para poder car atraente paraalguém, mas havia um homem parado diante da lo+a para a qual me dirigi.3le olhou para o prédio e escreveu algo em uma caderneta. %ei queescreveu algo a meu respeito e sobre o que pretendia fazer, e ele tinha querelatar isso ) pol#cia. 8iquei terrivelmente assustada e corri

atabalhoadamente para casa. 3ntão aquela terr#vel tensão voltou a meusouvidos e também aquelas dores de cabeça na base do cr$nio, como se elafosse explodir. 3 ouço os barulhos de d#namo novamente, e tenho queescutar cada carro que passa para descobrir o signicado pavoroso que eletem. 3stou toda presa a meus ouvidos novamenteS6

A+udado por sua experi'ncia anterior com a paciente, o analista p2de dizer06/alvez essas sensaç&es que voc' teve com relação a mim, e que voc' tevepor seu pai durante o sonho, assim como seu dese+o de ter roupas bonitas ede ser atraente, ainda se+am um tanto grandes demais e incontrol(veis para

voc'. ão acho que a pequena menina, que voc' realmente é, +( possacomeçar a enfrentar essas sensaç&es. /alvez se+a melhor voc' não fazernada, ou querer começar a fazer nada, ou querer começar a fazer algo, semantes perguntar ) pequena menina dentro de voc' se est( bem para ela6.Assim que ela se permitiu ser uma criança novamente, a sensação desegurança voltou e as manifestaç&es psic*ticas desapareceram.

ais ou menos nesse per#odo, os desenhos bidimensionais da paciente esuas pinturas foram substitu#das por uma modelagem tridimensional. oin#cio, ela se mantinha continuamente obrigada a modelar uma gurafeminina na forma de um r#gido crucixo. 78ig. 9=.; Assim que foi terminada,

essa modelagem transformou"se 7aparentemente de forma espont$nea emsuas mãos; em uma graciosa dançarina. 78ig. 9>;. Kepentinamente, a cruz ea dançarina lutavam por um lugar em seu mundo. Como ela poderiaresolver esse conito por meio da argilaB A solução veio somente bem maistarde, em um exerc#cio de meditação plane+ado pela pr*pria paciente,quando ela repentinamente se deu conta de que Deus penetra em tudo,mesmo em uma dançarina prostituta.

 

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Figura 13 

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Figura 14 

as, por dezenas de vezes, estas faces opostas ainda se alternaram0 a facede uma criança feliz, livre de sintomas, e a psic*tica atormentada. A fase

psic*tica podia ser prevista, com uma precisão emp#rica, toda vez que eraconfrontada com o $mbito de sua feminilidade sensual e emocionalmenteamadurecida. A mais veemente exacerbação esquizofr'nica que a pacienteiria enfrentar durante sua an(lise foi por exemplo antecipada por tr'ssonhos que pressagiavam essa confrontação. o primeiro sonho, umaserpente rodeava"a. A cobra aproximava"se 6como um gato, permanecendoao redor de uma tigela de leite quente, da qual ela não se afastariaenquanto não tivesse devorado tudo. 3u estava terrivelmente assustada.@ensei que a nica coisa a fazer seria pular para escapar desse c#rculo.@ulei, mas a cobra parou de serpentear e foi atr(s de mim. 5nvestiu contra

mim v(rias vezes, e cada vez eu tinha que saltar. Depois ela estava sobmim, e rodopiava, cando novamente atr(s de mim. 3u tinha que car

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pulando para evitar que ela arremetesse contra mim. 3la manteve esse +ogocomigo, até que acordei, por absoluto cansaço e medo6.

? terapeuta perguntou se era tão surpreendente para a paciente que elaestivesse tão cansada o tempo todo e sem forças para qualquer tipo de

trabalho, se tinha que usar toda sua energia nesse incessante pular fora docaminho da serpente, a mensageira do campo sensual e terreno de suavida.

6%imS6 ela continuou ansiosamente, 6mas não seria horr#vel se serpentescomeçassem a sair de mim, ou se eu mesma me tornasse uma cobraB @oracaso voc' seria capaz de me dizer como é que é eu poderia me comportarentãoB6

6@or acaso não seria caracter#stico de sua parte6, interveio o terapeuta,6que mesmo quando voc' se imagina como uma serpente, a primeira coisa

que lhe vem ) mente é determinar qual o comportamento corretoB6

? segundo sonho estava ligado ao ditador Titler, que veio a seu quarto. 3lelhe era particularmente repulsivo, devido ) sua testa baixa, que lhe davauma apar'ncia estpida e selvagem. @ara puxar assunto, a sonhadoracomeça a falar a respeito de estudos estat#sticos sobre a incid'ncia dedoenças mentais na Alemanha. ? sonho acaba nesse ponto. ? terapeutapergunta por qual razão, dentre todos os homens poss#veis, somente umditador inferior tinha permissão para entrar no seu mundo dos sonhos. Alémdisso, notou como era curioso o fato de que o nico relacionamento com ele

fosse através de uma conversa cient#ca.%im, os homens ainda são totalmente incompreens#veis para mim6,concordou a paciente. 6@or exemplo, eu nunca ousaria tomar aulas dedança . orreria de medo se alguém me convidasse para dançar. %* mesinto ) vontade com meus colegas se puder falar de medicina com eles.6

o terceiro sonho, ela viu irromper um inc'ndio numa lo+a. 3ra a lo+a ondelevara suas roupas de verão para serem remodeladas. Algumas horasdepois de acordar desse sonho, teve uma severa urtic(ria, que se alastroupor todo o corpo, mas que atingiu especialmente a parte interna das coxas.

? analista registrou em sil'ncio essa comunicação f#sica, e depoisrecapitulou o sonho, comentando0 6Algo pegou fogo e est( queimando1 algoque, de certo modo, est( relacionado com seu dese+o feminino de seratraente. as, em primeiro lugar, não foi voc' mesma que queimou comseu dese+o de atrair. 5sso seria ousar demais. ? sonho não mostra voc'queimando. %omente a lo+a, isto é, algo an2nimo. 3m segundo lugar, o fogoda vitalidade aparece para voc' apenas na forma de uma conagraçãodestrutiva, um perigo6.

5nfalivelmente, a fase alternada de bem"estar podia ser restabelecidatrazendo a paciente de volta ao $mbito pré"sexual de uma criança. as essaexperimentação estava longe de ser um +ogo cient#co. 3rafundamentalmente a nica e indispens(vel medida terap'utica pela qual

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alguém poderia tornar acess#vel a ela uma genu#na maturação, uma lenta6reunião6 de todas as pontencialidades de sua vida, e a integração dasmesmas em um ser maduro, independente e autoconante. %* eranecess(rio expor gradativamente o que era pedido a ela, no sentido desustentar suas exposiç&es aos ataques das (reas da vida inerentes aos

fen2menos do amor adulto.

o in#cio da fase nal da terapia, apareceu um sonho que apontou um novocaminho ) paciente. A sonhadora entrou em sua casa, que era grande eespaçosa, mas vazia, parecendo demolida e ameaçada de desabar.5nicialmente, a paciente estava desanimada. Depois ela notou que doistrabalhadores estavam ocupados com as reformas. @ara sua grandesurpresa, reconheceu"os como sendo ninguém menos que os artistasichel$ngelo e @icasso. esse momento, sentiu que tudo caria bem.

Ap*s esse sonho aventurou"se, em sua vida acordada, a dar import$ncia aseu consider(vel talento para o desenho, levando"o a sério e apreciando"o.5niciou seu treino como escultora. ?usou também, progressivamente,apropriar"se das pontencialidades sensuais e er*ticas da vida, que até entãotinham sido tão repelidas. 5sso ocorreu como em qualquer terapia bemsucedida que usasse a linha anal#tica cl(ssica. ovamente foi um sonhoque, de forma impressionante, iluminou o terapeuta com relação a essedesenvolvimento. A paciente relatou da seguinte forma tal sonho0 6%ou umaconferencista universit(ria e estou para dar uma palestra a uma classe demulheres universit(rias estudantes de medicina, sobre o Amp#io*uslanceolatus. Assim que entro no anteatro, percebo imediatamente que +(

tinha dado aquela confer'ncia para todas aquelas alunas. ão fazia sentidorepetir a palestra. 3ntão, começo a rir, e de repente todas estão rindocomigo. *s todas esquecemos a confer'ncia. 5nstaura"se uma atmosferacordial e aconchegante, e n*s todas conversamos alegremente a respeitoda vida sexual6.

E verdade que, no in#cio, no pr*prio sonho, a relação com os prim*rdiosrudimentares da vida sexual 7 Amp#io*us lanceolatus é o mais primitivo dosvertebrados; é ainda remota, intelectual e ob+etivada, resultando em umt*pico de uma confer'ncia cient#ca. as a paciente abandona rapidamente

esta velha atitude de 6+( ter estado aqui antes6 e abre"seconsideravelmente para a esfera da sexualidade.

!m ano antes, uma aproximação nessa (rea do nosso mundo teria, semdvida, precipitado uma nova reca#da em severas alucinaç&es psic*ticas.Como testemunha disso, h( o sonho com Titler, para quem a paciente deuuma palestra. 3sse sonho foi seguido de uma severa crise psic*tica.

? presente sonho, pelo contr(rio, trouxe a esperança de que brevemente apaciente seria capaz de, também estando acordada, relacionar"se com osfen2menos er*tico"sensuais de uma maneira aberta e livre, e que esse

$mbito da realidade também apareceria em sua exist'ncia sob a forma defen2menos correspondentes a nosso mundo cotidiano, e nunca mais como

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coisas 6alucinadas6. Desde esse sonho, ocorreram sete anos de observação,e durante tal per#odo +amais reapareceu qualquer vest#gio de sintomatologiaesquizofr'nica.

o nal de sua ltima sessão anal#tica, a paciente perguntou

espontaneamente ao seu médico0 6? que, em seu trabalho, realmente mecurouB6 5mediatamente, ela mesma deu a resposta0 63m primeiro lugar, foio simples fato de poder telefonar e encontr("lo a qualquer hora, dia ounoite, sempre que eu achasse necess(rio. @or muito tempo não acrediteique alguém pudesse estar sempre a meu lado. <entamente, aprendi aconar em voc', pois dezenas de experi'ncias provaram que voc' não medesapontaria. %omente então ousei viver através de voc', por assim dizer,até sentir minha pr*pria força crescer. Desta crença em sua conabilidade,nasceu uma crescente fé no mundo todo, que eu nunca sentiria antes.Anteriormente, eu vivia apenas pela minha força de vontade, e estava

sempre me puxando para cima pelas cordas de minhas pr*prias botas, atécar suspensa no ar. A conança em voc' deu"me a coragem de enraizar"me interiormente no verdadeiro fundamento de minha exist'ncia. ?segundo fator terap'utico eciente, igualmente importante, foi suacompreensão de meus del#rios e alucinaç&es paran*icos, o fato de voc'lev("los a sério. ? reconhecimento de seus signicados e valores genu#noscapacitou"me a perceber a totalidade de meu pr*prio ser e a unidade entreeu e o mundo6.

@ode"se alegar que muitos bons terapeutas e psicanalistas teriam seconduzido com tal paciente intuitivamente de maneira similar, sem estarem

familiarizados com a a)ordagem daseinsanal4tica. ão negamos que istopossa ocorrer, embora o autor, de sua parte, provavelmente estariacompletamente perdido com este caso se acompreensãodaseinsanal4tica do homem não o tivesse a+udado a tempo. De qualquermaneira, pelo menos até o presente momento, somente os insig#tsdaseinsanal4ticos foram capazes de nos proporcionar um entendimentoexpl#cito da ec(cia dessas técnicas intuitivamente aplicadas, que v'm maisao encontro das genu#nas necessidades de nossos pacientes do que aquelasmais tradicionais. Dessa forma, a compreensão daseinsanal4tica nos tornamais independentes de nossos ocasionais vislumbres intuitivos,

aumentando assim, consideravelmente, a conabilidade de nosso trabalho.

 

 /radução0 <uda Barval#o Ara&jo Kevisão0 =art#a 6am)ini

 

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9 /radução do cap.9, PA @atient Uho /aught the Author to %ee and /hinVDiWerentlXP, de Qoss, enard 9MH=sCc#oanalCsis and <aseinanalCsis. eY

 ZorV, Qasic QooVs.