Mecanismos de estruturação textual.

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Maria Helena Mira Mateus Linguísta portuguesa e Professora Catedrática Jubilada de Linguística na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa (FLUL). Licenciou-se em Filologia Românica (1954), tendo-se doutorado vinte anos mais tarde (1974) em Linguística. Notabilizou-se na área de Fonologia Portuguesa, sendo a principal responsável por adaptar a Fonologia Generativa (ou gerativa) de Noam Chomsky à língua portuguesa. Foi também co-autora da importante obra de referência nos estudos linguísticos do português, a Gramática da Língua Portuguesa, Lisboa:

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Estrutura da frase a partir da coesão e coerência textuais.

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Maria Helena Mira Mateus

Linguísta portuguesa e Professora Catedrática Jubilada de Linguística na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa (FLUL).

Licenciou-se em Filologia Românica (1954), tendo-se doutorado vinte anos mais tarde (1974) em Linguística.

Notabilizou-se na área de Fonologia Portuguesa, sendo a principal responsável por adaptar a Fonologia Generativa (ou gerativa) de Noam Chomsky à língua portuguesa.

Foi também co-autora da importante obra de referência nos estudos linguísticos do português, a Gramática da Língua Portuguesa, Lisboa: Caminho,1983.

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Maria Helena Mira Mateus/ Ana Maria Brito/ Inês Duarte/ Isabel Hub Faria: Gramática da Língua Portuguesa (5ª edição)

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Mecanismos de estruturação textual

Conectividade sequencial (coesão textual)

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“Qualquer falante sabe (empiricamente) que a comunicação verbal não se faz através de palavras isoladas, desligadas umas das outras e do contexto em que são produzidas. De facto, as manifestações naturais da linguagem humana são configurações de uma qualquer língua natural, dotadas de sentido, e visando um dado objectivo comunicativo. A tais configurações chamamos de Textos ou Discursos”.

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Ingredientes presentes, explícitas ou implicitamente no texto:

“Materialidade linguística, ou seja, a língua natural em que está configurado,

Códigos simbólicos em presença na formação social (e, no seio dela, na instituição) em que é produzido, circula e é interpretado,

Processos cognitivos a que a sua estruturação deve ser conforme para que produza sentido,

Hipóteses e pressuposições do LOC sobre o saber que ele e o ALOC partilham a cerca do mundo [...]”

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“TEXTUALIDADE - conjunto de propriedades que uma manifestação da linguagem humana deve possuir para ser um texto (discurso).”

• Principal propriedade da Textualidade :

Conectividade – “existe conectividade entre uma ocorrência textual A e uma ocorrência textual B se as interpretações de A e B forem semanticamente interdependentes”.

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Exemplos:

a- “Alinhei com a esperança de vencer, mas só se vence quando se corta a linha de chegada”.

b- “(...) gritou, quase implorando para o chefe da banda: _ Música, música mestre Camoesas”!

c- “Se esse animal respira por pulmões, não é peixe”.

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Conectividade divide-se em:

Conectividade sequencial ou coesão

“A interdependência semântica das ocorrências textuais resulta de processos linguísticos (universais, tipológicos ou particulares) de sequencialização - de ordenação linear - dos elementos linguísticos”. (exemplos (a) e (b))

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Conectividade conceptual ou coerência

“A interdependência semântica das ocorrências textuais resulta dos processos mentais de apropriação do real, e da configuração e conteúdo dos esquemas cognitivos que definem o nosso saber sobre o mundo [...]” (exemplo (c) )

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Conectividade – “Consideramos, portanto, a conectividade no seu duplo aspecto - coesão e coerência - a componente linguística essencial da textualidade”.

Intencionalidade – “designa a propriedade que caracteriza a atitude do locutor segundo a qual uma certa configuração de elementos linguísticos é produzida com a intenção de ser coesa e a coerente”.

Propriedades da Textualidade:

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Aceitabilidade – “designa a atitude do alocutário que consiste em considerar que uma dada configuração de elementos linguísticos que lhe cabe interpretar (ou reconhecer) deve ser coesa ou coerente”.

Situacionalidade – “designa os factores que fazem com que fazem com que um texto seja relevante para uma dada situação, explícita ou recuperável”.

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Intertextualidade – “designa a relação entre um determinado texto e outros textos relevantes, que fazem da experiência anterior do locutor e do alocutário”.

Informatividade – “designa o grau de incerteza das ocorrências textuais”.

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Conectividade sequencial (coesão textual)

“Todos os processos de sequencialização que asseguram (ou tornam recuperável) uma ligação linguística significativa entre os elementos que ocorrem na superfície textual podem ser encarados como instrumentos de coesão”.

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Os mecanismos (linguísticos) de coesão textual se agrupam da seguinte forma:

Coesão lexical

Coesão gramatical

Coesão frásica

Coesão interfrásica ( ou junção)

Coesão temporal

Coesão referencial

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Coesão frásica

“Designa os processos de sequencialização que asseguram, a nível sintagmático e oracional, uma ligação significativa entre os elementos linguísticos que ocorrem na superfície textual”.

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“Os que asseguram os nexos sequenciais entre categorias nucleares e os seus especificadores e complementos”:

a) a ordem das palavras interna dos sintagmas;

b) “fenómenos de concordância interna ao SN, que exprimem, através da presença de marcas idênticas de número e género, a dependência de determinantes, quantificadores e adjectivos relativamente ao núcleo nominal”;

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“Os que asseguram a identificação ( ou recuperabilidade) da estrutura de argumentos de um dado predicador, marcando a relação gramatical que cada argumento mantém, na superfície, com o predicador - ou seja, os processos que permitem identificar a relação gramatical de cada argumento.

a) a ordem básica de palavras de cada língua natural; b) no português, o uso das várias formas casuais dos

pronomes pessoais;

c) as preposições que assinalam relações gramaticais”;

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“Fenómenos de concordância que exprimem, através de marcas idênticas de pessoa e número, ou de género e número, o nexo relacional entre, respectivamente, sujeito e predicador verbal e sujeito e predicador adjectival”.

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Coesão interfrásica ( ou junção)

“Designa os processos de sequencialização que exprimem vários tipos de interdependência semântica das frases que ocorrem na superfície textual”. São eles:

Conectores frásicos Pausas (ponto, ponto e vírgula, vírgula etc.)

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Os conectores linguísticos podem exprimir vários valores juntivos.

O conectivo e

a) “A cortina ergueu-se devagarinho e a criança loura espreitou”. > exprime uma conjunção (com valor aditivo)

b) “Estava mau tempo e decidimos ficar em casa”. > exprime uma relação causal

c) “Não trabalhes agora e depois logo vês como é". > exprime uma relação do não factual / hipotética (se/então)

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As pausas podem assumir valores diferentes.

• Exemplos:

a) “A Escola que temos está em crise, o País está em crise, o mundo ocidental está em crise”. > conjunção (relação de adição)

b) “11 e meia! Tenho de ir para casa. A Joana come ao meio-dia”. > relação causal ( = porque)

c) “Estás com tosse... Toma um xarope”. > relação hipotética ( se/então)

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Tipos de junção:

Tipos de junção

Conjunção (ou junção aditiva)

Disjunção (ou junção alternativa)

Contrajunção ( ou junção contrastiva)

subordinação

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Conjunção

“Designa o tipo de junção que articula sequencialmente frases cujos conteúdos proposicionais se verificam no It Mi selecionado por um dado texto. A relação semântica em que se baseia a conjunção é a compatibilidade”.

Compatibilidade: “duas frases são compatíveis se a verdade do conteúdo proposicional de uma delas não exclui a verdade da outra, numa situação definida pelo par relevante It Mi”.

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A conjunção linguística não é, de uma maneira geral, comutativa.

Exemplos:

a)“Cheguei, vi e venci”.

b) *“Vi,venci e cheguei”.

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Disjunção

“Designa o tipo de junção que conecta sequencialmente frases exprimindo conteúdos proporcionais alternativos, sendo a sequência válida desde que o conteúdo proporcional de uma das frases se verifique no par relevante It Mi”.

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As disjunções podem ser inclusivas ou exclusivas

Disjunção inclusiva: são sequências de alternativas compatíveis.

Exemplos:

P: “Queres queijo ou preferes fruta”?

R: “Quero as duas coisas”.

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Disjunção exclusiva: exclusão de uma das proposições.

Exemplos:

a) Esta noite, vamos ao teatro ou ficamos em casa a jogar xadrez.

b) A esta hora, ou estou na faculdade ou estou no Centro.

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“Expressa a relação semântica de oposição entre conteúdos no interior de uma frase”.

Contrajunção (ou junção contrastiva)

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a) Todos os passageiros do avião morreram, mas o piloto escapou ileso.

b) Embora não esteja com pachorra para os aturar, eles vêm cá jantar esta noite.

c) Apesar de não ter um tostão, o João quer comprar o andar.

Exemplos:

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“Designa o tipo de junção que conecta sequencialmente frases cujos conteúdos proposicionais mantêm entre si uma relação hierárquica de dependência semântica”.

Subordinação

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“Chamamos antecedente ao membro da sequência de cujo conteúdo proposicional depende semanticamente o conteúdo proposicional do outro membro – o consequênte”.

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“Às sequências formadas por subordinação (semântica) chamamos de condicionais. Numa sequência condicional, o antecedente pode exprimir a causa ou a razão do estado de coisas descrito pelo conseqüente, ou pode implicar necessariamente o estado de coisas descrito pelo consequente”.

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a - O vinho azedou porque não estava rolhado.

b - Formulo essa hipótese dado que ela permite generalizações interessantes.

c - Se ele é viúvo, então já foi casado.

Exemplos:

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• Factuais (ou reais)

• Não –factuais (ou hipotéticos)

• Contrafactuais (ou irreais)

Podem distinguir-se três tipos de condicionais:

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“Condicionais factuais ou reais – também designadas causas – caracterizam-se semanticamente pelo facto de os conteúdos proposicionais expressos pelo antecedente e pelo consequente deverem ambos verificar-se no (s) I e relevante (s) do mundo real”.

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a- O Pedro não estudou e chumbou no exame.

b- O Pedro não estudou; por isso chumbou no exame.

c- O Pedro chumbou no exame porque não estudou.

d- Foi por não ter estudado que o Pedro chumbou no exame.

Exemplos:

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a - O Luís foi à exposição e comprou o catálogo.

Exemplo:

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“Os condicionais não factuais ou hipotéticos são sequências em que o conteúdo proposicional do antecedente específica o (s) mundo (s) epistemicamente não acessíveis [...]” “em que se verifica o conteúdo proposicional do consequente”.

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a - Se faltar outra vez a água, queixa-se à EPAL.

b - Vais à rua e compra-me cigarros, é?

c - Ou acabas com essa conversa ou zangamo-nos a sério.

Exemplos:

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“Os condicionais contrafactuais ou irreais estabelecem relações iguais entre proposições que se verificam em mundos alternativos ao mundo real”.

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a - Se ele fosse simpático, teria mais amigos.

b - Tivesse eu dinheiro e compraria um veleiro.

Exemplos:

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Coesão temporal

“Qualquer sequência textual só é coesa e coerente se a sequencialização dos enunciados satisfizer as condições conceptuais sobre localização temporal e ordenação relativa que sabemos serem características dos estados de coisas no mundo seleccionado pela referida sequência textual”.

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Exemplos:

a - Cheguei, vi e venci

b - *Vi, venci e cheguei

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- a utilização (correlativa) de certos tempos verbais;- o uso de conectores de valor temporal;- os adverbiais temporais localizadores;- expressos de valor temporal e expressões que assinalam a ordenação de um conjunto.

Ex: numerais ordinais

Processos que também asseguram a coesão temporal:

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a - Ela não contactou conosco. Mais tarde soubemos que tinha perdido a nossa morada e o número de telefone.

a - Primeiro vi o automóvel, depois reparei no condutor.

Exemplos:

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“O capítulo anterior procurou já sugerir as possibilidades e as finalidades de (...) Vamos agora ocupar-nos da primeira abordagem ao cálculo proposicional (...) E nos capítulos seguintes entraremos na análise intra-oracional (...)”. (Óscar Lopes, 71, p. 13)

Exemplo

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Coesão referencial

Exofórica(ou referência)

Endofórica (co-referência)

Anáfora

Catáfora

Elipse

Coesão referencial

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Exofórica (ou referência)

Exemplos de referente fora do texto:

a) _ Bolas! Este é mesmo chato!

b) O meu não funciona. Empresta-me o teu?

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Endofórica (co-referência)

Exemplos de cadeias anafóricas (ou referentes expressos no texto):

Anáfora:

a) O João feriu-se com o abre - latas.

b) O Luís disse à Maria que esperava por ela no café.

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Elipse:

c) O João adoeceu e [ - ] foi para o hospital. (categoria sintática vazia)

Catáfora:

d) Ao pé dela, a rapariga loura, viu o homem que a perseguia.

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Este processo de coesão opera por contiguidade semântica. As expressões linguísticas que entram numa relação de coesão lexical caracterizam-se pela co-presença de traços semânticos (total ou parcial) idênticos ou opostos.

Coesão Lexical

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COESÃOLEXICAL

REITERAÇÃO

SUBSTITUIÇÃO

SINONÍMIA ANTONÍMIA HIPERONÍMIA HIPONÍMIA

COESÃO LEXICAL

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“Elas são quatro milhões, o dia nasce, elas acendem o lume. Elas cortam o pão e aquecem o café. Elas picam cebolas e descascam batatas. Elas migam sêmeas e restos de comida azeda.” (MARIA VELHO DA COSTA, Cravo, Lisboa, Moraes Ed.,1965)

Exemplos de Reiteração:

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Exemplos:

a- A criança caiu e desatou a chorar._ O miúdo nunca mais aprende a cair! _ disse

a empregada.

b- Disseste a verdade? Essa história é uma mentira pegada.

Substituição: sinonímia, antonímia, hiperonímia e hiponímia

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c- Gosto imenso de peixe. Então salmonetes adoram.

d- O gato arranhou-te? Ora, o que é que esperavas de um felino?

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Bibliografia

LIVRO:

MATEUS, Maria Helena Mira et al. Gramática da Língua Portuguesa. Lisboa: Caminho, 1989.

SITES:

Disponível na www: <URL: http://www.infopedia.pt/$maria-helena-mira-mateus>.

Disponível na www: <URL: http:// www.novacultura.de/0303gramatical.html

Disponível na www: <URL: http:// www.infopedia.pt/$maria-helena-mira- mateus#