Maria Angelina Educação de Infância como Tempo Fundador · Educação de Infância como Tempo...

459
i Universidade de Aveiro 2012 Departamento de Educação Maria Angelina Sanches Educação de Infância como Tempo Fundador Repensar a Formação de Educadores para uma acção educativa integrada Dissertação apresentada à Universidade de Aveiro para cumprimento dos requisitos necessários à obtenção do grau de Doutor em Didáctica e Formação, realizada sob a orientação científica da Professora Doutora Idália da Silva Carvalho Sá-Chaves, Professora Associada (aposentada) do Departamento de Educação da Universidade de Aveiro.

Transcript of Maria Angelina Educação de Infância como Tempo Fundador · Educação de Infância como Tempo...

  • i

    Universidade de Aveiro

    2012

    Departamento de Educao

    Maria Angelina Sanches

    Educao de Infncia como Tempo Fundador

    Repensar a Formao de Educadores para uma aco educativa integrada

    Dissertao apresentada Universidade de Aveiro para cumprimento dos requisitos necessrios obteno do grau de Doutor em Didctica e Formao, realizada sob a orientao cientfica da Professora Doutora Idlia da Silva Carvalho S-Chaves, Professora Associada (aposentada) do Departamento de Educao da Universidade de Aveiro.

  • ii

    minha me

    Professora Doutora Idlia S-Chaves

  • iii

    o jri

    presidente Prof. Doutor Joaquim Arnaldo Carvalho Martins

    professor catedrtico da Universidade de Aveiro

    Prof. Doutora Maria da Conceio de Oliveira Lopes professora associada da Universidade de Aveiro

    Prof. Doutora Idlia da Silva Carvalho S-Chaves professora associada aposentada da Universidade de Aveiro

    Prof. Doutora Teresa Maria Sena de Vasconcelos professora coordenadora principal da Escola Superior de Educao do Instituto Politcnico de Lisboa

    Prof. Doutora Deolinda Alice Dias Pedroso Ribeiro professora adjunta da Escola Superior de Educao do Instituto Politcnico do Porto

    Prof. Doutor Henrique da Costa Ferreira professor adjunto da Escola Superior de Educao do Instituto Politcnico de Bragana

  • iv

    agradecimentos

    A concretizao deste trabalho s se tornou possvel com o apoio e incentivo

    que muitos me proporcionaram e a quem, neste momento, agradeo com

    gratido.

    Professora Doutora Idlia S-Chaves pelo constante encorajamento, a

    orientao rigorosa e atenta, as palavras de afecto e de reconforto em

    momentos mais sinuosos do percurso, facilitando o rasgar de nvoas e aceder

    a novas e diferentes compreenses. Neste percurso pude ampliar

    conhecimentos, mas sobretudo a admirao por algum que envolve, exige e

    nos faz prosseguir.

    Professora Doutora Nilza Costa pelos momentos de reflexo em conjunto e

    abertura a diferentes caminhos de investigao, de formao e de relao que

    como docente e coordenadora do curso de Doutoramento nos proporcionou.

    A todos os colegas da rede de cooperao cientfica Novos saberes Bsicos de todos os cidados no sculo XXI e novos desafios formao de professores, pelas possibilidades de partilha de saberes, amizade e apoio nos momentos menos bons com que ao longo deste percurso nos confrontmos. A todos os colegas e professores do curso de doutoramento, que directa ou indirectamente envolvidos no curso, contriburam para que este trajecto fosse percorrido. Um agradecimento particular para a Ana Filipa, a Olga, a Carlota, o lvaro, a Celeste e a Ilda pelas discusses teis e pela amizade que entre todos floresceu. Ao Professor Cordeiro Alves pelas palavras de incentivo e apoio ao aprofundamento da reflexo. Aos colegas da Escola Superior de Educao e, em particular aos que integram o departamento de Superviso da Prtica Pedaggica, pela compreenso e incentivo manifestados. Aos directores dos Agrupamentos de Escolas, directores e coordenadores das instituies pr-escolares, educadores e pais das crianas, pela sua disponibilidade e colaborao preciosas e fundamentais para que este trabalho pudesse ter sido concretizado.

  • v

    agradecimentos

    Aos profissionais da aco social do Centro Regional de Segurana Social e

    da ex-Coordenao da rea Educativa pela colaborao na fase inicial do

    estudo

    mestre Celeste Morais pelo apoio e resposta s minhas dvidas e inquietaes no mbito da estatstica. Aos meus amigos que colocaram minha disposio os seus conhecimentos,

    compreenso e afecto, ajudando a superar os momentos de maior ansiedade

    e desnimo. Uma palavra de particular amizade para a Alice, a Adelaide, a

    Isabel Portela, o Hermnio e o Carlos pela fora, confiana e apoio

    incondicional manifestados.

    minha famlia pelos momentos de que os privei da minha companhia, em

    particular minha me, meu marido, irms e os mais novos Gabriela, Adriana,

    Rafael e Henrique

    Estou ainda grata Escola Superior de Educao do Instituto Politcnico de

    Bragana que permitiu e apoiou a frequncia do Doutoramento.

    A todas as crianas e, em particular, quelas que, atravs da sua famlia e

    educadores, contriburam para este trabalho.

    .

  • vi

    palavras-chave

    Educao de infncia; saberes bsicos; formao de educadores;

    competncias profissionais; interaco instituio pr-escolar e famlia.

    resumo

    O estudo Educao de Infncia como tempo fundador: Repensar a

    Formao de Educadores para uma aco educativa integrada inscreve-se

    no processo de reflexo acerca das finalidades da educao bsica e da

    qualidade da formao e da interveno dos profissionais de educao de

    infncia.

    Considerando as condies de instabilidade, crescente insegurana e grande

    imprevisibilidade que caracterizam as sociedades contemporneas e,

    considerando tambm, os avanos cientficos que vm ocorrendo nas ltimas

    dcadas, fundamentando e alertando para a importncia decisiva das

    aprendizagens realizadas na Infncia nos processos de desenvolvimento

    subsequentes, releva-se neste estudo a necessidade de dar continuidade e

    aprofundar essa reflexo procurando responder, tambm pela investigao,

    aos desafios que as mudanas sociais suscitam. Nesta linha e tendo como

    referente o significado que, em termos de estruturao identitria pessoal e

    colectiva, reconhecido educao de infncia, enquanto contexto primeiro

    de educao bsica e complementar da aco educativa da famlia, o principal

    objectivo do estudo consiste em aprofundar o conhecimento acerca da

    natureza e qualidade dos saberes bsicos a promover na educao pr-

    escolar e das competncias reconfiguradoras do perfil de desempenho

    profissional dos educadores de infncia para que, em articulao com as

    famlias das crianas, se tornem facilitadores do seu desenvolvimento, no

    quadro de uma ampla perspectiva de cidadania e de sucesso para todos.

    Os eixos investigativos que se cruzam no estudo pressupem uma dimenso de pesquisa (terica, documental e emprica) de natureza complexa, na qual, se procura tornar compreensveis as interaces entre os participantes anteriormente referidos, no sentido de uma possvel coerncia conceptual e funcional, que regule e sustente a qualidade dos processos de desenvolvimento. Do ponto de vista metodolgico, a investigao inscreve-se numa abordagem de natureza qualitativa, de matriz complexa e com caractersticas de estudo de caso, centrado nos processos de formao e de interveno dos educadores de infncia em exerccio de funes, no distrito de Bragana. No sentido de construir uma viso integrada do objecto de estudo foi desenvolvida uma reviso temtica de literatura e de anlise documental e, na dimenso emprica do estudo, foram promovidos processos mistos de recolha de dados, com recurso inquirio por questionrio e por entrevista (semi-estruturada).

  • vii

    resumo (cont.) A inquirio por questionrio foi feita a 229 educadores de infncia e a 1340 pais (ou seus representantes), das crianas que frequentavam a educao

    pr-escolar e a entrevista a 6 educadoras, que integravam os conselhos

    executivos dos Agrupamentos de Escolas e, cujas funes de gesto e

    administrao, lhes permitiam ter uma perspectiva mais global das

    problemticas em estudo. Os instrumentos de recolha e de anlise da

    informao foram validados de modo a garantir-lhes fiabilidade e credibilidade.

    Os resultados do estudo podem ser lidos em dois nveis, considerando a sua

    abrangncia e especificidade. Num primeiro plano, numa leitura mais global e

    transversal s questes em estudo e, num segundo plano, como enfoque mais

    especfico em funo de quatro dimenses temticas decorrentes do quadro

    de fundamentao terica e organizadoras do processo de reflexo e de

    pesquisa. Assim, globalmente, os resultados confirmam a importncia que

    todos os inquiridos reconhecem, quer s aprendizagens ocorridas na Infncia,

    como factor importante no desenvolvimento pessoal e social das crianas ao

    longo da vida, quer ao papel que, nele, os educadores e respectiva formao

    (inicial e contnua) devem desempenhar.

    Com algumas variaes, as representaes dos educadores de infncia e dos

    pais inquiridos neste estudo, embora diferentes em algumas das questes

    especficas, apresentam-se maioritariamente coerentes e prximas das

    perspectivas tericas mais actuais, que consideram a natureza processual das

    aprendizagens e a importncia que a qualidade dos contextos e das

    transies, que neles ocorrem, assumem nos processos de desenvolvimento.

    Ou seja, inscrevem-se na linha das teorias socioconstrutivista e ecolgica

    tambm subjacentes s orientaes curriculares, ao nvel nacional e aos

    quadros tericos de referncia, ao nvel internacional. Identificam a

    aprendizagem da cidadania (ou do aprender a ser em sociedade) como o

    saber mais estruturante a ser desenvolvido no conjunto da aco educativa e

    perspectivam-na como processo de responsabilidade partilhada e cooperado.

    Tratando-se de uma amostra extensa e de um distrito geograficamente

    marcado pela interioridade, e sem esquecer que os dados se referem a

    representaes expressas ao nvel dos discursos, importante reconhecer os

    sinais de actualidade das perspectivas e das sugestes apontadas para dar

    continuidade aos processos de desenvolvimento integrado de todos os

    participantes no processo educativo.

  • viii

    resumo (cont.)

    Ainda numa leitura global, as principais diferenas, genericamente observadas

    entre educadores e pais, evidenciam, da parte destes, uma perspectiva de

    cidadania mais restrita e, da parte dos educadores, uma viso mais alargada

    do conceito. Com efeito, so os pais com mais elevada qualificao acadmica

    que partilham com os educadores esta perspectiva ampliada e transformadora

    de cidadania.

    Numa leitura mais enfocada e mais detalhada, e tal como referido

    anteriormente, os resultados podem ser lidos no cruzamento de quatro

    dimenses que interligam as questes de pesquisa: os saberes bsicos, as

    estratgias de interveno para o seu desenvolvimento; a formao e

    interveno dos educadores de infncia e a identificao de competncias que

    possam vir a aprofundarem a sua formao.

    No que se refere aos saberes bsicos, e no obstante a ocorrncia de

    variaes, quer quanto aos prprios saberes, quer quanto terminologia

    usada, so considerados como fundamentais:

    1. O aprender a ser na perspectiva do desenvolvimento da identidade;

    2. O aprender a exercer a cidadania na linha da aprendizagem e da vivncia

    democrtica na relao com o mundo e com o outro;

    3. O aprender a aprender como ferramenta indispensvel aprendizagem ao

    longo da vida;

    4. O aprender a desenvolver o pensamento crtico, enquanto possibilidade

    de criteriosa escolha pessoal entre alternativas possveis e

    5. O aprender a comunicar como condio relacional inalienvel nos

    processos de interaco com os contextos e com as pessoas.

    A segunda dimenso tem a ver com as estratgias consideradas facilitadoras

    do desenvolvimento destes saberes e so considerados trs nveis da

    interveno educativa: a aco dos educadores propriamente dita, a

    cooperao dos pais no processo de aprendizagem das crianas e a

    interaco da instituio pr-escolar com os pais/famlia. A aco dos

    educadores surge, tendencialmente perspectivada como facilitadora do

    desenvolvimento dos saberes bsicos, embora em relao a algumas prticas

    essa perspectiva surgisse pouco evidente e distingue-se quanto ao

    desenvolvimento da aco e relao educativa, manifestando os educadores

    mais experientes uma opinio mais favorvel. No que se refere cooperao

  • ix

    resumo (cont.)

    dos pais no processo de aprendizagem das crianas, os resultados indicam

    que a maioria dos pais manifesta uma opinio favorvel a prticas

    configuradoras de um clima facilitador do desenvolvimento dos saberes

    bsicos enunciados, mas variando os seus pontos de vista. So os pais de

    habilitaes acadmicas mais elevadas, de idade intermdia e situados em

    contexto urbano os que apresentam opinies mais favorveis.

    Por fim, e no que diz respeito interaco com as famlias, os resultados

    evidenciam uma opinio positiva com os meios de interaco utilizados, mas

    deixando perceber a necessidade de melhorar o processo de cooperao,

    manifestando os pais uma opinio menos positiva do que os educadores sobre

    esse processo.

    A terceira dimenso diz respeito s representaes sobre a formao e

    interveno profissional dos educadores, evidenciando os resultados que a

    maioria dos educadores atribuiu muita relevncia aos contributos do curso de

    formao inicial para o desenvolvimento da maioria das competncias

    necessrias para o seu desempenho profissional. Permitem ainda verificar que

    os educadores de formao mais recente manifestaram uma opinio mais

    favorvel desses contributos, quanto ao desenvolvimento de conhecimentos

    em reas, tais como a matemtica, conhecimento do mundo e expresso

    musical, o que significa um avano relativamente ao reconhecimento da

    necessidade de fazer investimento nessas reas sugeridas em alguns estudos

    e projectos. Quanto ao desenvolvimento da actividade profissional, os

    resultados relevam que a maior preocupao dos educadores se centra em

    torno do seu desempenho profissional e das condies de exerccio da

    actividade profissional. No que se refere ao incio de carreira, esta ltima

    dimenso assume maior evidncia, sendo ainda possvel perceber que a

    entrada na vida profissional tem vindo a ocorrer, nos ltimos anos, atravs da

    rede privada.

    A quarta dimenso tem a ver com as competncias profissionais a

    desenvolver pelos futuros educadores, e no obstante algumas diferenas nas

    opinies manifestadas pelos trs grupos de participantes, surgem relevadas

    competncias que a literatura e os perfis de desempenho profissional docente

    apontam como devendo ser promovidas e includas nos programas de

    formao de educadores de infncia/professores. Estas podem ser vistas,

    quer numa dimenso geral relativa ao grupo docente, quer numa dimenso

    mais especfica da interveno em educao de infncia, tal como

    especificado ao longo do trabalho.

  • x

    keywords

    Childhood Education; Basic Learning; Educators Course/Training; Professional Skills; Institutional Interaction between Nursery School and Family.

    abstract

    The research on Childhood Education as a Time of background: Teachers

    training revisited aiming an educational and integrated action is enrolled

    on a thoughtful process about the aims of Basic Education, as well as of the

    training quality and the intervention of professional nursery school teachers.

    Bearing in mind not only the conditions of instability, the growing insecurity and

    the high unpredictability which describe the present-day societies, but also the

    scientific developments that have been happening for the last decades, we

    have to stress the need of going on, with this kind of quest, by searching for an

    answer to the challenges that are caused by social changes. In this way, it is

    necessary to support and to call the attention to the importance of the process

    of learning through childhood, which often makes the difference in the inferred

    processes of the development. So, it is emphasized that we need to follow up

    with this reflexive work and get deeper in our conclusions, trying to respond, by

    scientific research, to the challenges of these unstoppable social trends.

    In this train of thought, by taking as reference the meaning that is

    acknowledged to the childhood education (in terms of personal identity and

    collective structuring) as both the first context of Basic Education and the one

    that completes the educational action in the scope of family context, the main

    target of this study is based on the effort of being an expert not only in the

    knowledge of the nature and quality of Basic Learning, that must be promoted

    in education of nursery school, but also into the skills that rearrange the profile

    of the nursery school teachers professional performance, which is supposed to

    be done in articulation with childrens families. We are positive that those skills

    become facilitators of childrens development, taking into account a wide

    perspective of citizenship and success for everyone.

    The research axles, which are crossed in the study, imply a research

    dimension (Theoretical and practical) of a complex nature, in which we try to

    explain the interactions among the participants, mentioned above, aiming a

    conceptual and functional coherence that can rule and bear the quality of the

    children development processes.

    In the methodological point of view the research follows a qualitative approach,

    using a complex matrix and with case-study features, focused on training

    processes and on the nursery school teachers intervention, who are working in

    the district of Bragana.

    In order to build an integrating perspective of the object in study; we have

    developed a topic review concerning the bibliography and documents analysis,

    as well. In what practical study is concerned, we have promoted mixed

    processes of data collection, making use of resources such as: inquiries and

    interviews (semi-structured).

  • xi

    abstract (cont.)

    The enquiries were addressed to 229 nursery school teachers and to 1340 childrens parents or tutors, whose children were attending nursery school. The interview was carried out within 6 nursery school teachers who belong to their headmasters school office team and whose task of both management and administration enable them to have a global perspective of the issues to be studied. The collection and data analysis tools were both evaluated in order to make sure that this study can be trustful and believable. The study results can be understood at two levels, considering their wide range

    and singularity. There is a first perspective, much more global and cross

    curriculum to the issues of the study. In a second perspective, there is a more

    detailed focus subordinated to four subject matters dimensions which are

    underlying the context and basis of the study.

    So, the major part of the results validate the fact that all the poles recognize the

    importance of the learning process in childhood as an essential factor in the

    personal and social growth of children along their lives. The studies also

    confirm the idea that the teachers and their educational curriculum (in the

    beginning and through professional life) play a crucial role in the childrens

    development.

    Although there are some differences, the concepts of both teachers and

    parents who were inquired, are coherent and close to the most updated

    theoretic perspectives, which are concerned with the nature of the process of

    learning and the importance that is given to the quality of contexts and the

    implied changes that occur in the development of children.

    That is, these theories have to do with the social and ecological ones, which

    are also obeying to curriculum guidance, at a national level and to the

    theoretical frames of reference, at an international level. They identify the

    learning of citizenship (How to be/behave in society), as the most structural

    know how to be developed in the whole of the educational action; what is

    more, they consider it as a process of responsibility that must be shared and

    cooperative.

    As it is a broaden sample and it is located in a district far away from the biggest

    urban areas, adding to this that the data refers to concepts expressed ins

    specific contexts and experiences, it is crucial to recognise the signs of the

    points of view in current days and the given suggestions in order to follow up

    with the integrated development processes of every participant in the

    educational process.

    Still, in a global understanding, the main differences generically spotted out by

    teachers and parents, highlight a parents citizenship idea that is more limited

    and, as teachers are concerned, a wider vision of that concept. In fact, the

    parents who have a higher Education qualification are the ones that share this

    wider and changing perspective of citizenship. If we try to focus and find

    details, as it was said before, the results can be read by crossing four

    dimensions that are linked to the research issues: Basic Learning; the

    Interventional Strategies for its Development; the Training and evolvement of

    nursery school teachers and the identification of skills which can be useful to

    improve their training.

  • xii

    abstract (cont.)

    In what concerns the Basic Learning, though there are variables, either about

    the learning itself or the used terminology, here are the most important:

    1. know how to be, in the sense of identity development;

    2. Learn how to live in society and use both the rights and duties as a

    citizen, living in a democratic, multicultural society when ones is in

    touch with the Other and Outer world;

    3. Know how to learn as a vital tool in the lifetime learning;

    4. Learn to develop critical thought, as an ability of establishing a

    personal criteria to decide among possible choices;

    5. Know how to communicate as a condition that is always present in

    relationships no matter the contexts.

    The second one is related with the strategies that are considered facilitators of

    the development of this Basic Learning. The strategies are studied in three

    levels of the educational intervention: The nursery school teachers, parental

    cooperation in childrens learning process and the interaction within the

    families. The teachers action appears with a tendency of being understood as

    facilitator of the development of this basic learning, although in certain cases of

    some praxis that perspective is not so emphasized and stands out easily at the

    time of the action development and educational relationship. In this point, the

    most experienced teachers support a more positive opinion.

    Finally, concerning the interaction within the families, the results show the

    evidence that there is a positive opinion about the means that are used, but

    they let us realize that there are improvements to do in the field of cooperation,

    being so, parents are more pessimistic than teachers in this topic.

    The third dimension in analysis regards to the representations about training

    and nursery school teachers professional activity. This part of the research

    highlights the results that the majority of the teachers emphasize the

    importance of the course to the development of the essential skills for their

    professional performance. The results let us know that the most recent

    trainings receive a more favorable evaluation concerning the areas such as

    Math, Knowledge about the world and musical expression, which means that

    theres a step forward regarding the recognition of the necessity of investing in

    these areas that are suggested in some studies and projects. As far as

    difficulties are concerned and the matters that worry more the teachers have to

    do with their professional performance and with the conditions of work. About

    the start of a career, this last dimension is greatly noticed and you can perceive

    that the new teachers have only been finding places in private school, lately.

    The fourth dimension has to do with the professional skills to be developed by

    future teachers. Despite some disagreements, The group of teachers

    emphasize the knowledge of curriculum orientations, the knowledge of

    himself/herself, the ability of solving problems in new situations or

    unpredictable ones and the learning skills throughout his/her life.

    These positions can be taken into account either in a general dimension that

    concerns the teachers or in a specific one related to the childhood education

    intervention, as it is explained throughout this study.

  • INDICE GERAL

    xiii

    Abstract . X

    ndice de figuras ... XVII

    ndice de quadros . XVII

    ndice de grficos ........ XVII

    ndice de Tabelas . XVIII

    ndice do volume de Anexos em CD ROM .... XIX

    INTRODUO . 1

    Contextualizao e identificao do objecto de estudo .... 1

    Organizao e apresentao do estudo ..... 5

    PARTE I - ENQUADRAMENTO TERICO-CONCEPTUAL

    CAPTULO UM

    Educao de infncia: um tempo fundador no contexto das sociedades contemporneas ..... 7

    Introduo ..... 7

    1. Mudanas sociais e educao ....................... 7

    2. Perfil desejvel de cidadania/contributos da educao para a sua (re)configurao .... 16

    2.1. No horizonte de um conceito pluridimensional de cidadania ... 18

    2.2. Ampliando o perfil de cidadania ..:.... 24

    3. (Re)definindo o conceito de aprendizagem ao longo da vida .............. 29

    3.1. Aprendizagem ao longo da vida: um abrir de fronteiras ... 34

    4. Educar para o desenvolvimento humano sustentado .... 35

    CAPTULO DOIS

    Educao de infncia: um tempo fundador dos saberes bsicos e das modelizaes curriculares ..

    Introduo ..... 39

    1. Perspectivas sobre a educao de infncia ....... 39

    1.1. Expectativas de educadores de infncia e de pais acerca da educao de infncia .. 45

    2. A educao de infncia no sistema educativo: breve resenha histrica ............... 49

    3. Educao de infncia: finalidades e saberes bsicos ........ 53

    3.1. Finalidades da educao de infncia ..... 53

    3.2. Saberes bsicos na primeira etapa da educao bsica . 57

    3.2.1. O conceito de saberes bsicos .... 57

    3.2.2. Saberes bsicos: contributos de estudos e relatrios .................. 59

    3.2.3. Contributos das Orientaes Curriculares para um referencial relativo aos saberes bsicos 62

    Resumo ... VI

  • INDICE GERAL

    xiv

    4. Modelos e estratgias de desenvolvimento curricular ...... 67

    4.1. Perspectiva transmissiva ........ 69

    4.2. Perspectiva socioconstrutivista e ecolgica .. 72

    4.3. Uma abordagem curricular integradora ......... 79

    CAPTULO TRS

    Educao de infncia: um tempo (re)fundador das interaces instituio pr-escolar/famlia ..

    85

    Introduo ..... 85

    1. A educao de infncia e a famlia: uma viso integradora da aco educativa .................. 85

    2. Interaco escola-famlia: uma abordagem complexa ..... 89

    3. Estratgias de interaco instituio (pr)escolar-famlia .... 94

    3.1. Contributos de alguns estudos sobre a interaco escola-famlia . 100

    CAPTULO QUATRO

    Educao de infncia: um tempo (re)fundador da identidade e da formao profissional .. 109

    Introduo..... 109

    1. A formao e desenvolvimento profissional de professores/educadores..... 109

    2. Identidade profissional dos educadores/professores .... 115

    2.1 Cultura(s) e especificidade(s) profissionais em educao de infncia ... 119

    3. A formao de educadores de infncia no actual quadro legislativo .. 124

    4. Perfil de competncia profissional para contextos de incerteza ...... 127

    PARTE II - QUADRO METODOLGICO DO ESTUDO

    CAPTULO CINCO

    Enquadramento e opes .............. 137

    Introduo ..... 137

    1. Abordagem metodolgica ........ 137

    2. Natureza do estudo ....... 139

    3. Contextualizao do estudo .. 142

    3.1 Identificao e delimitao do objecto de estudo.... 143

    4. Questes e hipteses do estudo......... 145

    5. Constituio da amostra ....... 147

    6. Procedimentos e instrumentos de recolha e de tratamento da informao ...... 149

    6.1. A inquirio por questionrio .... 150

    6.1.1. Caractersticas dos questionrios ........ 155

    6.1.2. Procedimentos de recolha e tratamento de dados ...... 158

    6.1.3. Descrio das variveis... 159

  • INDICE GERAL

    xv

    6.2. A entrevista .... 161

    6.3. Anlise documental ....... 166

    6.4. Procedimentos de anlise estatstica ..... 167

    6.5. Anlise de contedo ...... 171

    7. Validade(s) e credibilidade(s)... 174

    PARTE III- ESTUDO EMPRICO

    CAPTULO SEIS

    Apresentao e discusso crtica dos dados dos questionrios .... 177

    Introduo ..... 177

    Apresentao e anlise crtica da informao ...... 177

    1. Caracterizao da amostra inquirida por questionrio ..... 177

    1.1. Caracterizao do grupo de educadores de infncia ..... 178

    1.2. Caracterizao do grupo de pais ........ 182

    2. Representaes dos educadores e dos pais das crianas ...... 187

    2.1. Representaes sobre a educao pr-escolar: educadores e pais ..... 187

    2.1.1. Finalidades da educao pr-escolar... 188

    2.1.2 Saberes bsicos a desenvolver pelas crianas ..... 194

    2.1.3. Factores de interferncia no desenvolvimento dos saberes bsicos: representaes dos

    educadores .... 198

    2.1.4.Estratgias de aprendizagem: representaes dos educadores .... 201

    2.2. Papel dos pais/famlia na construo dos saberes bsicos a desenvolver pelas crianas . 212

    2.3. Interaco instituio pr-escolar e pais/famlia ....... 219

    2.3.1. Meios de interaco instituio pr-escolar e pais/famlia ..... 220

    2.3.2. Cooperao solicitada aos pais/famlia ...... 225

    2.3.4. Representaes dos educadores sobre o processo de interaco .... 229

    2.3.4.1. Cooperao proporcionada pelos pais ..... 229

    2.3.4.2 Experincias de interaco com pais 231

    2.3.5. Representaes dos pais sobre o processo de interaco ... 238

    2.3.5.1. Contedo(s) do processo de interaco ... 238

    2.3.5.2. Expectativas sobre o contedo de interaco .. 239

    2.3.5.3. Expectativas dos pais sobre os meios de interaco ........ 245

    2.3.5.4. Conhecimento do que as crianas fazem e aprendem na educao pr-escolar .. 251

    2.3.5.5. Regularidade do contacto dos pais com os educadores ... 259

    3. Formao e a actividade profissional dos educadores .. 261

    3.1.Contributos da formao inicial para o desempenho profissional ......... 261

  • INDICE GERAL

    xvi

    3.2. Dificuldades profissionais ..... 264

    3.2.1. Dificuldades sentidas em incio da actividade profissional .... 268

    3.3. Estratgias para ultrapassar dificuldades e aprofundar saberes profissionais ... 272

    4. Expectativas sobre a(s) competncia(s) e formao de educadores de infncia .. 275

    4.1. Competncia(s) a desenvolver pelos futuros educadores de infncia: expectativas dos

    educadores 275

    4.2. Formao dos educadores de infncia: expectativas dos educadores ... 281

    4.3. Competncia(s) a desenvolver pelos futuros educadores de infncia: expectativas dos pais .. 292

    CAPTULO SETE

    Apresentao e discusso crtica dos dados da entrevista .. 307

    Introduo .... 307

    Apresentao da informao recolhida .... 307

    Bloco I. Caracterizao dos sujeitos participantes ... 308

    Bloco II. Dificuldades profissionais e estratgias para super-las ... 311

    Bloco III. Articulao curricular/continuidade educativa .... 326

    Bloco IV. Linhas estratgicas de reconfigurao do perfil de desempenho profissional ... 332

    CAPTULO OITO

    Anlise transversal dos resultados: para articular perspectivas .... 349

    Discusso global dos resultados ... 349

    1. Saberes bsicos e estratgias para desenvolv-los ... 350

    1.1. Saberes bsicos a desenvolver na educao pr-escolar ... 350

    1.2. Estratgias para o desenvolvimento dos saberes bsicos .. 355

    1.3. Papel dos pais/famlia na construo do saberes bsicos a desenvolver pelas crianas .. 358

    1.4. Interaco instituio pr-escolar e pais/famlia: estratgias para uma aco educativa

    integrador .... 360

    2. Formao e competncias profissionais dos educadores de infncia ..... . 365

    2.1. Formao e actividade profissional .... 365

    2.2. Competncia(s) a promover e processos de formao de educadores de infncia 368

    PARTE IV CONSIDERAES FINAIS

    CAPTULO NOVE

    Consideraes finais, limitaes e sugestes: para (re)pensar novos percursos .. 373

    Introduo .... 373

    1. Consideraes finais .... 373

    2. Limitaes do estudo e orientaes para futuras investigaes ..... 382

  • INDICE GERAL

    xvii

    2.1. Limitaes do estudo ........ 382

    2.2. Sugestes para futuras investigaes .... 383

    2.3. Implicaes do estudo a nvel institucional e pessoal ... 385

    BIBLIOGRAFIA . 387

    ANEXOS .

    Anexo 1. Questionrio aos educadores

    Anexo 2. Questionrio aos pais

    Anexo 3. Guio da entrevista

    NDICE DE FIGURAS

    Figura 1- Configurao da interaco instituio (pr)escolar-famlia .. 88

    Figura 2. Algumas determinantes socioculturais da educao familiar .. 101

    Figura 3. Processos de construo e desenvolvimento profissional ... 113

    Figura 4: Representao da localizao de cada Agrupamento de Escolas no contexto distrital 162

    NDICE DE QUADROS

    Quadro 1. Referenciais de aprendizagens bsicas para todos 66

    Quadro 2. Dimenses do desenvolvimento curricular dos modelos transmissivos e

    construtivistas e ecolgicos 78

    Quadro 3. Referenciais de competncias para o desempenho profissional do educador/

    professor . 134

    Quadro 4. Estrutura da entrevista ... 165

    Quadro 5. Caracterizao dos educadores membros dos conselhos executivos dos

    agrupamentos de escola . 309

    Quadro 6. Saberes bsicos a desenvolver na educao pr-escolar: viso transversal dos contributos

    emergentes do estudo 352

    Quadro 7. Competncias profissionais a desenvolver pelos futuros educadores de infncia:

    viso transversal das sugestes emergentes do estudo 370

    NDICE DE GRFICOS

    Grfico1: Satisfao dos educadores com a cooperao proporcionada pelos pais/famlia 230

    Grfico 2. Caracterizao do modo como os pais conhecem o que as crianas fazem e

    aprendem em contexto na educao pr-escolar 252

    Grfico 3. Regularidade do contacto entre pais e o educador de infncia . 259

  • INDICE GERAL

    xviii

    NDICE DE TABELAS

    Tabela 1. Idade, tempo de servio e rede de enquadramento do grupo de educadores de

    infncia ... 178

    Tabela 2. Tempo de servio na actual instituio pr-escolar e rede nacional ... 180

    Tabela 3. Situao profissional e rede nacional de educao pr-escolar .. 180

    Tabela 4. Contexto sociogeogrfico de actividade profissional e rede de educao pr-escolar 181

    Tabela 5. Idade e habilitaes acadmicas dos pais ... 182

    Tabela 6. Actividade profissional dos pais . 183

    Tabela 7. Rede de educao pr-escolar frequentada pelas crianas e grau de

    parentesco que os respondentes tm com elas ... 184

    Tabela 8. Contexto sociogeogrfico em que se integra a instituio frequentada pelo(a) filho(a) 185

    Tabela 9. Idade com que as iniciaram a educao pr-escolar e idade actual .... 185

    Tabela 10. Finalidades da educao pr-escolar em funo ... 188

    Tabela 11. Saberes bsicos a desenvolver na educao pr-escolar . 195

    Tabela 12. Factores de interferncia no desenvolvimento dos saberes bsicos ... 199

    Tabela13. Estratgias de organizao dos espaos . 203

    Tabela14. Planificao e avaliao da aco educativa . 205

    Tabela 15. Aco e relao educativa 207

    Tabela 16. Estratgias de interaco com os pais/famlia .. 209

    Tabela 17. Resultados globais das representaes dos educadores sobre as estratgias de

    aprendizagem . 211

    Tabela 18. Acompanhamento da aco educativa .. 213

    Tabela 19. Relao com a criana ...... 215

    Tabela 20. Organizao do ambiente educativo . 216

    Tabela 21. Resultados globais das estratgias de cooperao dos pais no processo de

    aprendizagem das crianas . 218

    Tabela 22. Meios de interaco utilizados na comunicao instituio pr-escolar e

    pais/famlia: representaes de educadores e pais ......... 220

    Tabela 23. Cooperao solicitada pela instituio pr-escolar aos pais, representaes de

    educadores e pais .................................................................................................... 226

    Tabela 24. Caracterizao da satisfao manifestada pelos educadores em funo da

    cooperao solicitada aos pais 230

    Tabela 25. Experincias de interaco com os pais/famlia ... 232

    Tabela 26. Contedos abordados entre pais e educadores . 239

    Tabela 27. Contedos que deveriam ser mais abordados entre pais e profissionais da

    instituio pr-escolar 240

    Tabela 28. Meios de interaco que deveriam ser mais utilizados para a partilha de

    informaes e saberes entre a instituio pr-escolar e os pais/famlia .. 246

    Tabela 29. Caracterizao do modo como os pais conhecem o que a criana faz e aprende

    na educao pr-escolar . 253

  • INDICE GERAL

    xix

    Tabela 30. Cruzamento da regularidade do contacto dos pais com os educadores e

    caracterizao do conhecimento do processo de aprendizagem pr-escolar... 260

    Tabela 31. Contributos da formao inicial para o desempenho profissional .... 262

    Tabela 32. Dificuldades colocadas pela prtica profissional em educao de infncia 266

    Tabela 33. Dificuldades profissionais em incio da actividade profissional .. 270

    Tabela 34. Caracterizao das estratgias utilizadas para ultrapassar as dificuldades

    sentidas e aprofundar saberes profissionais 273

    Tabela 35: Expectativas dos educadores acerca da(s) competncia(s) a desenvolver na

    formao inicial 276

    Tabela 36. Resultados globais de apreciao das dimenses de competncias profissionais. 280

    Tabela 37. Sugestes sobre os saberes/competncias a promover para melhoria da

    formao inicial de educadores de infncia e sua organizao .. 282

    Tabela 38. Caracterizao global das sugestes dos educadores para melhoria da formao

    inicial de educadores de infncia e sua organizao . 291

    Tabela 39. Expectativas dos pais sobre as competncias a promover e processos de

    formao dos educadores de infncia 293

    Tabela 40. Caracterizao geral das expectativas dos pais sobre as competncia(s) a

    promover e processos de formao dos educadores de infncia. 305

    Tabela 41. Saberes bsicos a promover na educao pr-escolar indicados pelas educadoras

    membros dos Conselhos Executivos dos Agrupamentos de Escolas 334

    Tabela 42. Caracterizao geral das opinies das representantes dos Agrupamentos de Escolas

    sobre as competncias a promover na formao dos educadores de infncia 340

    Volume de ANEXOS em CD-ROM

    Anexo 1. Instrumentos de recolha de dados

    Anexo 2. Carta Conselhos Executivos e Directores das Instituies

    Anexo 3. Tabelas 1 a 42 de resultados de anlise estatstica

    Anexo 4. Transcrio das respostas das questes abertas dos questionrios

    Anexo 5. Quadros 1 a 6 do sistema de categorizao dos dados relativos s questes de

    resposta aberta dos questionrios

    Anexo 6. Quadros 1 a 7 da anlise de contedo das respostas abertas dos questionrios

    Anexo 7. Protocolos 1 a 6 das entrevistas e convenes de transcrio

    Anexo 8. Quadro Sistema de categorizao da informao - Entrevistas

    Anexo 9. Quadro de Anlise do contedo das entrevistas

  • INTRODUO

    1

    Um bom comeo vale para

    toda a vida1

    Contextualizao e fundamentao do estudo

    Este estudo inscreve-se no processo de reflexo acerca das finalidades da educao

    bsica, com particular incidncia na discusso acerca das perspectivas que informam e

    determinam a natureza e a qualidade da formao e da interveno profissional dos

    educadores de infncia, integrando a Rede de Cooperao Cientfica, Novos Saberes

    Bsicos de todos os cidados no sculo XXI e novos desafios Formao de Professores,

    do Centro de Investigao em Didctica2 e Tecnologia na Formao de Formadores

    (CIDTFF), da Universidade de Aveiro.

    Um dos pressupostos que informam esta rede tem a ver com as implicaes das

    vertiginosas mudanas sociais, que caracterizam as sociedades contemporneas, no

    deflagrar de novos saberes essenciais a todos os cidados e a urgncia de,

    continuadamente, repensar a relao entre os sistemas sociais e os sistemas educativos,

    nomeadamente quanto qualidade da formao dos agentes responsveis pelo

    desenvolvimento humano, nas suas mltiplas dimenses. Congregando esta rede estudos

    em todos os nveis de escolaridade, pretende-se, no caso presente, aprofundar esta mesma

    questo no caso da Educao de Infncia, mais especificamente ao nvel da etapa educativa

    pr-escolar.

    Considerando as condies de instabilidade, crescente insegurana e grande

    imprevisibilidade que caracterizam a contemporaneidade e, considerando tambm, os

    contributos dos avanos cientficos que vm ocorrendo nas ltimas dcadas e que

    fundamentam a importncia decisiva das aprendizagens nesta fase do desenvolvimento,

    compreende-se a urgncia em dar continuidade e aprofundar a investigao na procura de

    conhecimento, que permita enfrentar, com mais segurana, os desafios que as referidas

    mudanas sociais suscitam.

    Neste quadro, e tal como sugere o relatrio temtico conduzido pela OCDE (2006),

    fundamental repensar o papel, as finalidades e as prticas educacionais de modo a que

    1 Ministrio da Educao/Ministrio da Solidariedade e Segurana Social: Gabinete para a Expanso e

    Desenvolvimento da Educao Pr-escolar (1997). 2 Na redaco do presente estudo utilizado o registo pr-acordo ortogrfico.

  • INTRODUO

    2

    possam promover nos educandos a criatividade e a abertura aos outros, num mundo

    caracterizado pelas dinmicas de mudana, pela emergncia e pela diversidade. Como

    tambm alerta Papadopoulos (2005), preciso ter em conta que para ser eficaz, a escola

    deve apoiar-se nos anos decisivos da educao pr-escolar, buscando a colaborao

    estreita de pais e comunidade (p. 26).

    Importa, pois, compreender e aprofundar o conhecimento acerca da natureza dos

    saberes e das aprendizagens estruturantes que se julgam promotores e facilitadores dos

    percursos pessoais e educativos das crianas. Assim, e dada a relao de

    complementaridade que esta etapa educativa assume com a aco educativa da famlia,

    fundamental compreender tambm a dimenso educativa/formativa que a qualidade desta

    relao assume nos processos de desenvolvimento.

    Entre ns, tambm Cachapuz, S-Chaves e Paixo (2004) relembram que atravs

    da formao de professores que se educam as crianas (p. 84), o que pressupe a

    constante preocupao com o investimento na formao destes profissionais. Confirmando

    esta ideia, Papadopoulos (idem) afirma que h um reconhecimento unnime de que um

    corpo docente bem formado e motivado um elemento essencial de um ensino de

    qualidade oferecido nos estabelecimentos escolares ou em qualquer outro mbito

    estruturado (p. 28).

    Nesta perspectiva, o principal objectivo deste estudo consiste em aprofundar o

    conhecimento acerca da natureza e qualidade dos saberes bsicos a promover na

    educao pr-escolar e das competncias reconfiguradoras do perfil de desempenho

    profissional dos educadores de infncia para que, em articulao com as famlias das

    crianas, se tornem facilitadores do seu desenvolvimento, no quadro de uma ampla

    perspectiva de cidadania e de sucesso para todos. Em concordncia, pretendemos saber:

    1. Quais os saberes a desenvolver na educao pr-escolar para que sejam construdas,

    pelas crianas, as estruturas basilares de uma educao e formao ao longo da vida?

    2. Quais so as representaes dos educadores de infncia relativamente:

    2.1. Aos saberes bsicos?

    2.2. s estratgias para o seu desenvolvimento?

    2.3. Aos contributos/limitaes da formao inicial para o seu desempenho

    profissional?

    3. Quais so as representaes dos pais relativamente:

    3.1. aco educativa pr-escolar?

  • INTRODUO

    3

    3.2. Ao seu prprio papel na construo dos saberes bsicos a desenvolver pelas

    crianas?

    4. Que competncias promover na formao dos futuros educadores de infncia para que

    estes profissionais se tornem facilitadores da construo de ambientes educativos

    favorveis ao desenvolvimento dos saberes considerados bsicos?

    De um modo que nos parece coerente, os objectivos especficos que nortearam o

    processo investigativo apresentam-se formulados para cada uma das dimenses que

    atravessam a problemtica em estudo:

    1. Identificar a natureza dos saberes bsicos a construir pelas crianas ao nvel da

    pr-escolaridade.

    2. Analisar as representaes dos educadores de infncia acerca das aprendizagens

    curriculares a realizar pelas crianas em idade pr-escolar e das estratgias para

    desenvolv-las.

    3. Identificar as concepes e prticas/modelos de formao que informam as

    prticas desenvolvidas pelos educadores de infncia.

    4. Analisar as representaes e expectativas dos pais quanto s aprendizagens a

    realizar na educao pr-escolar e ao papel que lhes cabe assumir no

    desenvolvimento das mesmas.

    5. Aprofundar a natureza do perfil de competncias a promover na formao dos

    futuros profissionais de educao de infncia.

    Em sntese, o estudo pretende cruzar a reflexo sobre os saberes bsicos, entendidos

    como competncias fundacionais coerentemente integradas e consideradas fundamentais

    para aprender ao longo da vida e para o exerccio activo e responsvel da cidadania, a

    natureza das estratgias que podem favorecer o seu desenvolvimento e o perfil de

    competncias a desenvolver pelos futuros educadores de infncia para que se tornem

    potencialmente capazes de concretizar esse desgnio.

    Admite-se, assim, como hiptese geral que importante compreender quais as

    competncias configuradoras do perfil de desempenho profissional, que contemple a

    articulao da instituio (pr)escolar e da famlia, ou seja, que englobe uma viso

    ecolgica dos sistemas enquadradores da infncia.

  • INTRODUO

    4

    A natureza sistmica, que pretende organizar de forma integrada esta tripla dimenso

    do estudo situa-o no mbito de uma perspectiva investigativa de matriz complexa (Le

    Moigne, 1999); S-Chaves, 2002; Ambrsio, 2004; Caetano, 2004; Morin, Motta &

    Ciurana, 2004).

    Do ponto de vista metodolgico a investigao inscreve-se numa abordagem de

    natureza qualitativa (Bogdan & Biklen, 1994), de matriz interpretativa, com caractersticas

    de estudo de caso (Yin, 2005; Stake, 2007), centrado nos processos de formao e de

    interveno dos educadores de infncia em exerccio de funes no distrito de

    Bragana e recorre a mtodos mistos de recolha de dados (Johnson & Onwuegbuzie, 2004;

    Miles & Huberman, 2005).

    Quanto aos procedimentos metodolgicos, o estudo integrou a construo, validao

    e aplicao dos instrumentos de recolha de dados, que incluem a inquirio por

    questionrio a 229 educadores de infncia e a 1340 pais/famlia3 das crianas que

    frequentavam a educao pr-escolar. A opo por um estudo desta natureza inscreve-se na

    inteno de aprofundamento do estudo exploratrio4, que realizmos no mbito da

    investigao do curso de Mestrado5, sobre a situao da educao pr-escolar em trs

    concelhos deste mesmo distrito.

    Assim, no presente estudo pretendemos conhecer as representaes6 dos educadores

    e dos pais/famlia das crianas sobre a educao pr-escolar e sobre as possibilidades de

    enriquecimento da interaco entre uns e outros, questo que no estudo anterior deixou em

    aberto espao a novas interrogaes. J com o objectivo de recolher elementos que

    permitissem aprofundar algumas das questes emergentes da anlise da informao

    3 O termo pais inclui, no presente estudo, um significado abrangente reportando-se no apenas aos

    progenitores biolgicos (pai e me), mas tambm aos encarregados de educao, familiares ou outros com

    responsabilidades na educao e cuidado das crianas e que se constituem como interlocutores junto da

    instituio (pr)escolar. Da que, com igual sentido, seja utilizado o termo famlia. 4 Nesse estudo procedemos caracterizao da situao da educao pr-escolar em concelhos do distrito de

    Bragana, nomeadamente Bragana, Mogadouro e Mirandela. 5 Sanches, A (1998). Educao pr-escolar: Novas concepes de formao para contextos

    sociologicamente instveis e pouco previsveis. Tese de Mestrado. Universidade de Aveiro. 6 No sentido de explicitar o que pode entender-se por representaes, importa considerar que, de acordo com

    Ana Silva (2003), e tomando a autora por referncia vrias definies de representaes sociais, se trata de

    um fenmeno psicossocial complexo e multidimensional, no qual se entrecruzam noes de natureza

    sociolgica, incluindo ideologias, culturas, normas e valores e noes de natureza psicolgica que tm a ver

    com as imagens, pensamentos, opinies e atitudes. Como afirma a autora (idem) as representaes

    estruturam-se por referncia no s s teorias cientficas, mas tambm aos grandes eixos culturais,

    ideologias formalizadas, condies sociais de existncia do sujeito e experincias de vida quotidiana. So em

    sntese, produto e processo de uma actividade de apropriao da realidade exterior ao pensamento e de

    elaborao psicolgica dessa realidade pelo sujeito, articulando dinamicamente instncias sociolgicas e

    psicolgicas (p.80).

  • INTRODUO

    5

    recolhida por questionrio e obter uma outra perspectiva sobre as questes em estudo,

    foram feitas entrevistas semi-estruturadas (Pardal & Correia, 1995; Eisman, 1998)

    dirigidas a seis educadores de infncia, membros dos conselhos executivos de

    Agrupamentos de Escolas7.

    Quanto s tcnicas e instrumentos de organizao e anlise da informao recolhida

    privilegiaram-se, para anlise das questes de resposta aberta do questionrio e das

    entrevistas, a anlise de contedo (Bardin, 1995; Quivy & Campenhoudt, 1998; Giglione

    & Matalon, 2001; Esteves; 2006) e para questes fechadas e semi-fechadas, procedimentos

    estatsticos (Pardal & Correia, 1995), com recurso ao software SPSS (Muijs, 2004;

    Maroco, 2007).

    Complementarmente, foi desenvolvida uma consulta documental da legislao e de

    outros documentos pertinentes educao de infncia e formao de educadores no

    sentido de aceder a um tipo de informao que contextualizasse o estudo do ponto de vista

    normativo aos nveis nacional e internacional.

    Organizao e apresentao do estudo

    O estudo encontra-se organizado em quatro partes interligadas, atravs das quais se

    procura fundamentar e caracterizar o projecto de investigao desenvolvido.

    A primeira parte apresenta o enquadramento terico-conceptual do estudo e

    inclui quatro captulos. No primeiro, e atravs de uma reviso de literatura tematicamente

    seleccionada, procuramos conhecer a natureza e caractersticas das mudanas nas

    sociedades contemporneas e quais as suas implicaes na educao, no quadro dos seus

    contributos para o desenvolvimento de um perfil desejvel e ampliado de cidadania, de

    aprendizagem ao longo da vida e de desenvolvimento humano sustentado. No segundo

    captulo damos relevo s principais perspectivas e caractersticas que procuram configurar

    o desenvolvimento da educao de infncia, ao conceito de saberes bsicos e aos modelos

    e estratgias de desenvolvimento e respectivos contributos para uma viso integradora da

    abordagem curricular. Procurando ampliar esse sentido, procedemos no terceiro captulo a

    um conjunto de reflexes que dizem respeito a estratgias de interaco com a famlia, no

    quadro de uma perspectiva que englobe a dimenso formal, no formal e informal da aco

    educativa. Por fim, no quarto captulo centramos a reflexo nas questes da formao e do

    7 Os critrios de seleco dos sujeitos entrevistados encontram-se explicitados no captulo cinco.

  • INTRODUO

    6

    perfil de competncias a desenvolver para uma interveno em contextos de natureza

    incerta, tal como hoje se apresentam e tendero a apresentar-se no futuro.

    A segunda parte refere o enquadramento metodolgico do estudo e integra um

    nico captulo (cinco), no qual procedemos fundamentao da abordagem metodolgica,

    da natureza do estudo, delimitao das questes e hipteses de investigao. Procuramos,

    ainda, explicitar os mtodos e tcnicas de recolha de dados adoptados, bem como os

    processos de construo, validao e aplicao dos instrumentos utilizados e os

    procedimentos para o seu tratamento e anlise e, ainda, para garantir a sua validade e

    credibilidade.

    A terceira parte corresponde dimenso emprica do estudo e constituda por

    trs captulos, nos quais se procede apresentao e descrio crtica dos dados. No

    captulo seis apresentam-se os dados obtidos atravs dos dois questionrios, dirigidos,

    conforme j referido, um a educadores e outro aos pais das crianas. No captulo sete

    apresentam-se e discutem-se os dados obtidos a partir da entrevista que, como tambm

    referimos, foi dirigida a educadores membros dos conselhos executivos dos Agrupamentos

    de Escolas do distrito. No oitavo captulo, procedemos leitura cruzada dos resultados

    obtidos atravs dos questionrios e das entrevistas, tendo por referncia as questes e

    objectivos do estudo.

    Por fim, na quarta parte apresentam-se as consideraes finais do estudo, numa

    das possveis leituras globais dos resultados, procurando uma viso coerente entre o

    enquadramento terico e metodolgico e os contributos do estudo emprico. Apresentam-

    se ainda algumas limitaes encontradas, bem como possveis sugestes para futuros

    estudos, que possam dar continuidade reflexo e produo de conhecimento nas reas

    que configuram este estudo.

  • PARTE UM ENQUADRAMENTO TERICO-CONCEPTUAL

    CAPTULO UM Educao de infncia: um tempo fundador

    no contexto das sociedades contemporneas

    7

    Introduo

    Neste captulo comeamos por caracterizar, num quadro de complexidade, algumas das

    transformaes de natureza cultural, econmica, poltica e social e as inerentes

    incertezas com que as sociedades actuais se confrontam, bem como os desafios e

    exigncias que essas mesmas mudanas colocam aos sistemas educativos.

    De seguida fazemos uma reflexo acerca das questes relacionadas com a aprendizagem

    da cidadania, procurando equacionar as dimenses a considerar no desenho de um perfil

    amplo, que sustente os fundamentos de uma construo identitria promotora de um

    tipo de participao activa e responsvel na comunidade ou, no dizer de Morin, Motta e

    Ciurana (2004), um conceito de cidadania que pode entender-se na relao do local ao

    universal.

    Reflectimos tambm sobre os modos de encarar a aprendizagem para que cada qual

    possa continuar a desenvolver-se ao longo da vida, desde a mais tenra infncia e, dentro

    das suas efectivas capacidades e possibilidades, realizar com sucesso a sua vida pessoal,

    social e profissional, no quadro de um desenvolvimento humano sustentado.

    1. Mudanas sociais e educao

    As mudanas substanciais ao nvel das formas de vida, de trabalho e de convivncia,

    com que as sociedades actuais se confrontam, requerem respostas dos sistemas educativos

    e formativos que permitam a construo de saberes capazes de estimular o

    desenvolvimento de novas concepes e prticas de cidadania promotoras de mais

    elevados nveis de coeso social e de sucesso para todos.

    Para uma melhor compreenso da natureza e ritmo com que ocorrem essas mudanas

    e das suas implicaes na educao e na formao, torna-se importante tomar em

    considerao as possibilidades de mudana definidas por Fernndez Enguita (2004, 2007)

    como de tipo suprageracional, intergeracional e intrageracional. Estes tipos de mudana

    correspondem, segundo o autor (idem), a trs pocas diferentes da histria da humanidade,

    apesar da passagem de uma a outra no ser datvel com grande preciso e de diferentes

    grupos sociais poderem, numa mesma sociedade, pas ou regio encontrar-se em diferentes

    fases do processo de modernizao. Importa, assim, efectuar uma breve abordagem a cada

    um desses tipos de mudana.

    O conceito de mudana suprageracional reporta a um conjunto de transformaes,

    que no so perceptveis de uma gerao para outra, por decorrerem de forma lenta e

    incidirem em dimenses com pouca evidncia para grande parte da populao. Refere-se

    s mudanas que caracterizam as sociedades primitivas ou pr-industriais, encaradas estas

    como contextos estveis, pelo que uma gerao, ao crescer, deveria integrar-se no

  • PARTE UM ENQUADRAMENTO TERICO-CONCEPTUAL

    CAPTULO UM Educao de infncia: um tempo fundador

    no contexto das sociedades contemporneas

    8

    ambiente sociocultural da gerao anterior. A tarefa educativa era assumida pela famlia ou

    comunidade imediata e o papel dos agentes educativos determinado pela sua idade e

    experincia e no por uma formao especializada. A funo da educao era, neste

    contexto, de reproduo da estrutura social e dos saberes dominantes.

    Por sua vez, o conceito de mudana intergeracional diz respeito a transformaes

    que se tornam claramente perceptveis de uma gerao para outra, ainda que estas ocorram

    em diferentes momentos e geraes. Trata-se de mudanas que caracterizam as sociedades

    modernas e em que as geraes mais velhas j no podem introduzir as mais novas no

    ambiente cultural que as espera, passando a famlia a partilhar a tarefa educativa com

    outras instituies, nomeadamente a escola e agentes educativos especficos, imbudos de

    poder para assumir a referida tarefa. Nesta perspectiva a formao e crditos iniciais

    obtidos pelo professor so encarados como suficientes para lhe assegurar o estatuto de

    membro das foras vivas da sociedade (Fernndez Enguita, 2007, p. 32), sem que tenha

    de demonstr-los e revalid-los no decurso da actividade profissional.

    Por fim, o conceito de mudana intrageracional refere-se aos processos de

    transformao que ocorrem de forma rpida, generalizada e intensa, tornando-se

    perceptvel dentro da mesma gerao e abrangendo dimenses fundamentais da

    experincia humana, tais como a economia, a poltica, a cultura, a famlia, a cidade, entre

    outras. Trata-se de um tipo de mudana que leva as sociedades actuais a confrontarem-se

    com um clima de crescente incerteza, instabilidade e imprevisibilidade de situaes e

    problemas e com a necessidade de criar respostas educativas e formativas capazes de

    ajudar todos a acompanharem e a enfrentarem, de forma positiva e responsiva, uma

    realidade que muda continuamente e se apresenta cada vez mais complexa.

    Reconhecendo a complexidade e abrangncia do cenrio de mudana merecem

    reflexo os desafios e condicionalismos decorrentes do fenmeno de globalizao

    emergente, da transformao na natureza do mercado de trabalho, da evoluo das

    tecnologias da comunicao e informao, da evoluo demogrfica e da reorganizao da

    estrutura familiar, entre outros.

    Quanto ao fenmeno de globalizao1, como afirma Gimeno Sacristn (2003),

    entende-se a interligao que existe entre pases ou diferentes partes do mundo,

    1 O conceito de globalizao no consensual (Gimeno Sacristn, 2003; Sarmento et al. 2004; Morgado &

    Ferreira, 2006), porm, ningum pe em dvida que vivemos num mundo cada vez mais globalizado e que

  • PARTE UM ENQUADRAMENTO TERICO-CONCEPTUAL

    CAPTULO UM Educao de infncia: um tempo fundador

    no contexto das sociedades contemporneas

    9

    intercambiando-se as formas de viver das suas gentes, o que estas pensam e fazem,

    gerando-se interdependncias aos nveis da economia, defesa, poltica, cultura, cincia,

    tecnologia, comunicaes, hbitos de vida, formas de expresso, etc. (p. 91). Trata-se de

    uma dinmica de natureza multidimensional e complexa, em franca expanso, influenciada

    largamente pelos desenvolvimentos cientficos e tecnolgicos e pela abertura das fronteiras

    livre circulao de informao, pessoas e produtos, a nvel mundial. Essa dinmica tem

    vindo a tornar as sociedades, por um lado, mais interculturais e, por outro, mais plurais.

    Tem vindo ainda, a favorecer a debilitao do protagonismo dos Estados nacionais,

    enquanto entidades reguladoras dos interesses e das relaes econmicas, sociais e

    culturais de um determinado pas, cujos efeitos se fazem sentir em diversos sectores, com

    particular evidncia na educao e formao (Morgado & Ferreira, 2006)2. Releva-se, neste

    sentido, o papel determinante que certas entidades supranacionais, como por exemplo a

    OCDE e a UNESCO3, tm vindo a exercer na construo de uma corrente de pensamento

    sobre educao e polticas educativas, atravs de estudos e publicaes, com directrizes,

    indicadores de comparabilidade e recomendaes nos quais cada Estado pode apoiar-se

    para promover iniciativas facilitadoras do acesso a nveis superiores de qualidade e de

    eficincia dos seus sistemas de educao e de formao. A Unio Europeia exerce, por sua

    vez, outro tipo de poderes regulatrios, entre os seus Estados-membros, definindo reas

    prioritrias comuns de interveno e estratgias de actuao, num quadro de construo de

    um Espao Europeu de Educao.

    Todavia, o processo de globalizao tem sido acompanhado do crescimento da

    insegurana, o que, como lembra Hargreaves (2003, citando Vail, 1999), tem efeitos

    fortemente destrutivos sobre o potencial humano e sobre a justia social, dando origem a

    nveis elevados de medo, de ansiedade, de falta de esperana e de sentimentos de

    impotncia em relao aos mltiplos e complexos problemas, que as sociedades

    contemporneas enfrentam. Esses sentimentos so experienciados pela crescente

    estamos perante um fenmeno que atingiu propores impensveis at h bem poucos anos (Morgado &

    Ferreira, idem), realando Morin, Motta e Ciurana (2004) tratar-se de uma dinmica multidimensional, ou

    seja: ecolgica, cultural, econmica, poltica e social, tudo isto numa relao de interdependncia mtua (p. 69). 2 Segundo os autores a expresso de Estado nacional utilizada no sentido que lhe confere Antnio Vitorino

    (2003, citado por Morgado & Ferreira, 2006) para referir no o estado que corresponde a uma nao, mas o

    Estado que corresponde ao poder de um povo, autnomo, soberano num determinado territrio (p. 62). 3 Trata-se de organizaes internacionais (OCDE - Organizao para a Cooperao e Desenvolvimento

    Econmico; UNESCO - Organizao das Naes Unidas para a Educao, a Cincia e a Cultura) que, apesar

    da sua importncia e poder de influncia na orientao das polticas educativas dos Pases-membros ou ainda

    para alm deles, no assumem um papel regulador de cariz aplicativo ou prescritivo.

  • PARTE UM ENQUADRAMENTO TERICO-CONCEPTUAL

    CAPTULO UM Educao de infncia: um tempo fundador

    no contexto das sociedades contemporneas

    10

    instabilidade no emprego, a devastao ambiental, as ameaas de crime e destruio

    terrorista, o colapso das redes de segurana social, a eroso do apoio comunitrio e das

    relaes interpessoais. De acordo com Torres Santom (2006) esse clima de incerteza e de

    insegurana estende-se tambm s escolas e ao trabalho dos professores, tal como a

    comunicao social tem vindo a ilustrar com grande frequncia.

    O modo como esses problemas so percebidos e conceptualizados depende dos

    cdigos culturais de cada qual, pelo que os desafios que a globalizao coloca consistem

    em repensar o modo como devemos conduzir a nossa vida e o tipo de mundo para o

    qual devem ser educadas as novas geraes. Segundo Hargreaves (2003) a ateno deve

    ser colocada na criao de relaes interpessoais e de interesse pela comunidade e pela

    vida pblica, favorecendo o desenvolvimento de uma identidade cosmopolita e de uma

    responsabilidade humanitria na comunidade nacional e mundial, tal como o recente

    processo de salvao dos mineiros do Chile4 constitui um claro exemplo deste lado

    melhor da globalizao.

    No que diz respeito actividade econmica, a acelerada e profunda transformao

    tecnolgica, a globalizao e a forte competio pela conquista dos mercados tm vindo a

    alterar os modos de produo e de organizao do trabalho (Tedesco, 2000) e as relaes

    entre os trabalhadores. O contexto em que a actividade produtiva se move tornou-se,

    tambm ele, visivelmente mais competitivo, incerto e imprevisvel, exigindo uma fora de

    trabalho cada vez mais qualificada, produtiva e flexvel. As garantias de um emprego

    estvel para toda a vida tendem a desaparecer e a aumentar os vnculos contratuais

    precrios e os nveis de desemprego, provocando a necessidade de uma contnua

    (re)construo de saberes e de elevao do nvel de qualificaes para que a populao

    activa possa aceder a melhores oportunidades de empregabilidade, progresso, mobilidade

    profissional e de realizao pessoal. Por sua vez, observa-se um prolongamento da idade

    de acesso aposentao, o que faz com que se ampliem as necessidades de uma continuada

    actualizao e renovao de saberes. Da que, mais do que em tempos passados, a

    aprendizagem seja encarada, hoje, como uma necessidade contnua e o conhecimento

    como um recurso essencial para enfrentar a competitividade econmica internacional

    4 Designao que reporta ao caso de mobilizao global de esforos para salvar o grupo de 33 mineiros que, no

    dia 5 de Agosto/ 2010 ficaram presos a 700 m de profundidade, numa mina situada no deserto do Atacama -

    Chile.

  • PARTE UM ENQUADRAMENTO TERICO-CONCEPTUAL

    CAPTULO UM Educao de infncia: um tempo fundador

    no contexto das sociedades contemporneas

    11

    (Comisso das Comunidades Europeias [CCE], 2007)5 e para evitar a excluso social.

    Atribui-se, por isso, grande nfase econmica (in)formao e qualificao dos

    cidados, pela importncia que estes processos representam para o progresso das

    sociedades e das pessoas a nvel individual. , assim, de considerar que a riqueza e a

    prosperidade dependem, na actualidade, no tanto da produo, mas sobretudo da

    capacidade que as pessoas possuem para inventarem e serem perspicazes na procura e

    desenvolvimento de respostas, que acompanhem os desejos e as exigncias do mercado de

    consumo e de produo. Como lembra Hargreaves (2003) vivemos numa economia

    baseada no conhecimento, a qual no funciona assente no poder das mquinas, mas sim

    no dos crebros o poder de pensar, de aprender e de inovar (p. 37). Por conseguinte, se

    quisermos que as pessoas se integrem e tenham sucesso nestas novas economia e

    sociedade, baseadas no conhecimento6, os sistemas educativos tm que favorecer o

    desenvolvimento desse tipo de qualidades. Trata-se de competncias que no so de menor

    importncia para garantir uma maior equidade, participao cvica, bem-estar, auto-estima

    e realizao das pessoas (Miguns, 2007), pelo que nos parece razovel pensar que o

    desenvolvimento das mesmas representa no apenas o investimento num capital

    econmico, mas tambm num capital social (Altheit & Dausien, 2006). Torna-se,

    ento, relevante o papel social e cultural da educao e da formao, quer no que diz

    respeito ao desenvolvimento de cada um em ordem sua autonomia e convivncia social,

    quer no que se refere integrao e uso social do conhecimento. , contudo, de considerar

    que, tal como alerta Hargreaves (2003):

    De um modo geral, as escolas no esto a preparar os jovens para trabalharem bem

    na economia baseada no conhecimento, nem para viverem bem numa sociedade civil

    dinmica. Em vez de promoverem a criatividade econmica, a integrao social,

    muitas escolas esto a ser sufocadas pelos regulamentos e pelas rotinas de uma

    estandardizao sem alma (p. 14).

    Nesta linha de pensamento, e corroborando a opinio do autor, sublinhamos a

    importncia de educar as novas geraes para alm da economia baseada no conhecimento,

    o que implica favorecer o desenvolvimento de valores e de atitudes positivas, dar relevo

    5 Considerando que vai ser feita referncia vrias vezes Comisso das Comunidades Europeias, passamos a

    utilizar a sigla CCE ou CE, quando os documentos indicarem Comisso Europeia. 6 Segundo Hargreaves (2003) seria mais correcto utilizar a expresso sociedade da aprendizagem,

    entendendo que uma sociedade baseada no conhecimento , realmente, uma sociedade da aprendizagem,

    contudo, mantm a utilizao da expresso sociedade do conhecimento por esta se apresentar largamente

    aceite (p. 16).

  • PARTE UM ENQUADRAMENTO TERICO-CONCEPTUAL

    CAPTULO UM Educao de infncia: um tempo fundador

    no contexto das sociedades contemporneas

    12

    aprendizagem emocional tanto quanto cognitiva, apostar no trabalho em parceria e em

    grupo, cultivar uma inteligncia cosmopolita, que permita a cada um ser tolerante para com

    as diferenas de raa, de gnero e que desperte a curiosidade, o desejo de aprender com os

    outros e o sentido de responsabilidade para com os grupos excludos da prpria sociedade e

    das outras (Hargreaves, 2003). Uma linha particular desta perspectiva assegura que tais

    competncias devem ser desenvolvidas precocemente nos processos de desenvolvimento

    humano integral.

    Outra dimenso de mudana diz respeito acelerada evoluo das tecnologias de

    informao e comunicao, com impacto no apenas ao nvel da produo de bens e

    servios, como tambm ao nvel das relaes entre as pessoas escala mundial, permitindo

    acumular e aceder rapidamente a um leque alargado de informao e comunicar, em tempo

    real, sem entraves de distncia geogrfica e cultural. Sublinham-se, neste sentido, os

    contributos da televiso, do telefone e da internet, entre outros meios de comunicao e de

    informao, para esbater barreiras entre diferentes comunidades culturais (Fukuyama,

    1999, citado por Day, 2004) e para revelar e observar os males que assolam o mundo

    (Morin, Motta e Ciurana, 2004). Num mundo interligado, como o de hoje, emergem novas

    possibilidades de aprendizagem e de relaes interpessoais, mas tambm novos riscos

    sobre os quais se tem pouco controlo e que afectam, sobretudo, os utilizadores menos

    preparados para processar e gerir criticamente a informao e o conhecimento que esses

    meios (in)formativos disponibilizam. Importa, por isso, que os contextos educativos, em

    particular a escola e a famlia, de acordo com os respectivos nveis de possibilidade e

    responsabilidade, favoream o desenvolvimento de uma atitude crtica sobre as imagens e

    valores a que hoje estamos expostos, como receptores e emissores de informao, no

    sentido de ajudar as crianas e jovens a tornarem-se utilizadores conscientes e

    responsveis dos meios tecnolgicos disponveis.

    Ao nvel das transformaes demogrficas registam-se, hoje, novos fluxos

    migratrios da populao mais jovem entre pases, bem como no interior de cada pas, de

    contexto rural para os contextos urbano e medianamente urbano. Nas sociedades ocidentais

    verifica-se, tambm, um decrscimo do ndice de natalidade, o que faz com que se d uma

    crescente desertificao e envelhecimento de determinadas zonas rurais, como o que se

    observa no interior do nosso pas. Da que, nestes contextos, as crianas tenham mais

    probabilidades de crescerem isoladas de outras crianas (OCDE, in ME/DEB, 2000) e que

  • PARTE UM ENQUADRAMENTO TERICO-CONCEPTUAL

    CAPTULO UM Educao de infncia: um tempo fundador

    no contexto das sociedades contemporneas

    13

    tenham de deslocar-se para fora do contexto de residncia para poderem frequentar a

    escola, percorrendo por vezes distncias considerveis e estarem separadas da famlia

    durante o dia7. Por outro lado, o crescimento populacional das cidades, bem como a

    frequente mobilidade de rea de residncia e de trabalho fazem com que tendam a

    desaparecer as pequenas comunidades tradicionais, onde todos se conheciam e as crianas

    podiam sentir-se protegidas e seguras. Da que, o cuidar da criana, antes assumido sem

    problemas por alguns elementos da famlia ou comunidade local, tenha passado a

    constituir uma grande preocupao para muitas famlias.

    Apesar das vantagens que a concentrao populacional urbana trouxe, como maiores

    oportunidades, opes e a liberdade do anonimato, trouxe tambm, como anota Fernndez

    Enguita (2004), riscos acrescidos, tais como a ausncia de regras e a violncia e ainda,

    como refere Carneiro (2003), o aumento do desemprego e todo o conjunto de problemas

    que lhe esto associados, como a pobreza e a excluso social.

    Por sua vez, a integrao das mulheres no mercado de trabalho, o crescente nmero

    de divrcios, de novas unies e de novas separaes, a frequente opo do casal por uma

    unio de facto em vez do casamento, o aumento de famlias monoparentais, a redefinio

    dos estilos de vida e as conquistas democrticas no campo dos direitos individuais

    favoreceram uma profunda alterao do quadro de vida familiar e de relaes entre os seus

    membros. E, tal como os membros adultos da famlia, tambm as crianas passaram a ser

    encaradas como sujeitos a quem se deve proporcionar, dentro e fora da famlia,

    oportunidades de realizao pessoal, autonomia, descoberta de si e da sua prpria

    identidade (Almeida, 2004)8. Esse novo olhar sobre o direito de cada um definir a sua

    prpria vida tem importantes consequncias na aco educativa familiar, favorecendo, de

    acordo com Tedesco (2000), que os pais adoptem, em relao aos filhos, uma conduta

    menos autoritria, menos impositiva (p. 39). Por outro lado, as crianas comeam a

    frequentar a escola cada vez mais cedo e por um tempo mais alargado, o que, como refere

    7 Veja-se o processo de Reordenamento da Rede Escolar, o que deu origem ao encerramento de muitas

    escolas do 1 ciclo do Ensino Bsico e jardins-de-infncia de localidades rurais e concentrao de alunos

    em determinadas escolas ou Centros Escolares. A este propsito considere-se o estudo referente nossa

    dissertao de Mestrado (Sanches, 1998), no qual foi possvel observar que os baixos ndices de taxa de

    natalidade em contexto rural do distrito de Bragana deixavam ver a necessidade de encontrar respostas pr-

    escolares mais ajustadas s necessidades socioeducativas das crianas e famlias, bem como das realidades

    sociogeogrficas em que se inseriam, no sentido de salvaguardar a possibilidade de usufrurem da frequncia

    desta etapa educativa, o que nem sempre se verificava. 8 Para tal, muito contribuiu a aprovao da Conveno dos Direitos da Criana pelas Naes Unidas (1989).

  • PARTE UM ENQUADRAMENTO TERICO-CONCEPTUAL

    CAPTULO UM Educao de infncia: um tempo fundador

    no contexto das sociedades contemporneas

    14

    Tomaz (2007) leva a famlia a transferir para esta instituio muitas das responsabilidades

    que tradicionalmente lhe pertenciam, enquanto instncia de socializao primria (p. 11).

    Trata-se de transformaes, que alguns interpretam como sintoma de crise da instituio

    familiar, e que para outros tm um sentido adaptativo (Abreu-Lima, 2005), mas que,

    independentemente do ponto de vista adoptado, tm importantes implicaes na educao

    e cuidado das crianas.

    Reflectindo sobre os factores que influenciam a qualidade do ambiento educativo

    familiar, Bronfenbrenner (2005, retomando Bronfenbrenner & Morris, 1997) lembra que

    os estudos recentes revelam que um dos factores mais perturbador na vida das famlias e

    dos seus filhos a instabilidade crescente, a inconsistncia e a presso da vida familiar

    quotidiana (p. 86). Acrescenta ainda, dizendo que essa tendncia tanto se manifesta nos

    pases desenvolvidos como nos pases em vias de desenvolvimento, embora com origens

    diferentes, mas com um efeito enfraquecedor semelhante nos processos e nos resultados

    alcanados na educao das crianas. No entender do autor (idem) uma das principais

    fontes de tenso e de perturbao na vida das famlias e das suas crianas assenta na

    dificuldade em coordenar as exigncias do emprego e as necessidades da famlia.

    Como resposta a este tipo de inquietaes, no podemos deixar de sublinhar algumas

    medidas, que tm vindo a ser promovidas nos ltimos anos no nosso pas, tais como as que

    integram o Programa designado pelo Ministrio da Educao de Escola a Tempo Inteiro,

    com incio no ano lectivo de 2005/2006. Assinalamos, entre outras, a que define o

    alargamento do horrio de funcionamento dos estabelecimentos escolares9, passando estes

    a manter-se abertos at s 17h30m e no mnimo oito horas dirias sem prejuzo da normal

    durao semanal e diria das actividades educativas na educao pr-escolar e curriculares

    no 1 ciclo do ensino bsico (ponto 5)10

    . Assim, para l da normal durao diria das

    actividades educativas/curriculares passou a ser assegurado, na educao pr-escolar, o

    desenvolvimento de actividades de animao e apoio famlia e no 1 ciclo do Ensino

    Bsico as actividades de enriquecimento curricular, incidindo estas ltimas sobre o

    domnio desportivo, artstico, cientfico, das tecnologias da informao e comunicao, de

    ligao da escola com o meio, de solidariedade e voluntariado e da dimenso europeia da

    educao. Essas actividades devem contemplar apoio ao estudo; ensino do ingls; ensino

    9 Conforme o previsto no Despacho n 12591/2006, de 16 de Junho.

    10 O horrio de funcionamento de algumas instituies pr-escolares vai para alm deste perodo, no sentido

    de respostas s necessidades dos pais/famlia das crianas.

  • PARTE UM ENQUADRAMENTO TERICO-CONCEPTUAL

    CAPTULO UM Educao de infncia: um tempo fundador

    no contexto das sociedades contemporneas

    15

    de outras lnguas estrangeiras; actividade fsica e desportiva; ensino da msica;

    experincias artsticas; e outras actividades que incidam nos domnios identificados (idem,

    ponto 9). No podemos deixar de assinalar tambm, a determinao da plena ocupao

    dos alunos do ensino bsico e secundrio durante o tempo de permanncia no

    estabelecimento escolar (Despacho n 13599/2006, de 28 de Junho, art.s 1 e 12), pelo

    que, no caso de falta do professor, esses tempos lectivos passarem a ser orientadas por

    outro professor com formao adequada e, quando tal no for possvel, a serem ocupados

    com actividades de enriquecimento e complemento curricular11

    .

    So de relevar os benefcios que apresentam estas mudanas no funcionamento das

    instituies escolares, mas tambm as limitaes, como as que se referem ao facto de as

    actividades de animao e apoio famlia no representarem, em muitos casos, novas e

    diferentes oportunidades de recreao e socializao das crianas e de serem orientadas por

    pessoal sem formao profissional adequada. No que se refere s actividades de

    enriquecimento curricular, como sublinham Ferreira e Oliveira (2007), tm contribudo,

    por um lado, para uma compartimentao do currculo do 1 ciclo do Ensino Bsico, sendo

    organizadas com uma forte incidncia na aprendizagem de contedos escolares, em

    detrimento da actividade ldica, da convivncia e da relao entre pares e comunidade

    local e, por outro, para a precarizao da actividade profissional docente, pois, no s o

    processo de contratao e remunerao dos professores, que as desenvolvem, obedece a

    lgicas diferentes das previstas na carreira docente, como tambm so bastante mal pagas.

    Por sua vez, muitas escolas no se encontram devidamente equipadas, em termos de

    espaos e de materiais, para desenvolver essas actividades com a qualidade desejvel. Da,

    ser importante e necessrio continuar a desenvolver novos esforos para que as medidas

    implementadas, e outras que venham a ser institudas, contribuam para que as jovens

    geraes possam usufruir de respostas educativas facilitadoras do bem-estar, integrao

    social, sucesso e realizao pessoal e profissional de todos.

    A concretizao dessa tarefa pressupe, necessariamente, que todos os cidados

    possam usufruir de possibilidades de aceder a conhecimentos que fundamentem novas

    atitudes e apropriao de valores orientados para um tipo de cidadania e construo

    11

    Trata-se de actividades orientadas em sala de estudo, clubes temticos, de uso das tecnologias da informao e

    comunicao, de leitura, pesquisa bibliogrfica, desportivas, oficinais, musicais e teatrais (art. 12, n 8).

  • PARTE UM ENQUADRAMENTO TERICO-CONCEPTUAL

    CAPTULO UM Educao de infncia: um tempo fundador

    no contexto das sociedades contemporneas

    16

    identitria coerentes e consistentes com o cenrio de mudana e de acrescida complexidade

    com que a contemporaneidade se apresenta.

    2. Perfil desejvel de cidadania/contributos da educao para a sua (re)configurao

    O conceito de cidadania, desde finais da dcada de noventa do sculo passado, tem

    vindo a ganhar uma crescente centralidade nos discursos e documentos orientadores das

    polticas de educao e de formao, verificando-se, no entanto, alguma ambiguidade em

    torno da sua definio (Azevedo et al., 2007). Uma ideia unificadora parece, no entanto,

    estar nele contida, nomeadamente a de pertena a uma comunidade poltica, juridicamente

    organizada, a qual confere s pessoas o poder de agirem como politicamente iguais

    (Sanches & Seia, 2007)12

    . Porm, a ideia de pertena comunidade, como tambm

    anotam as autoras (idem), no unvoca nem linear e muito menos esttica, podendo

    ganhar configuraes mltiplas e remeter para outras ideias, igualmente complexas, como

    sejam as ideias de participao, como membro dessa comunidade, de identidade e de

    relacionamento, sobre as quais podem ser feitas interpretaes mais restritas ou mais

    alargadas da concepo de cidadania (pp. 71-72).

    Numa interpretao mais restrita e tradicional da concepo de cidadania entende-se

    a comunidade poltica organizada sob a forma de Estado-nao e a participao das

    pessoas na vida comunitria orientada para a assuno de um mnimo de compromissos,

    como sejam os que se referem ao exerccio do voto e ao cumprimento de obrigaes

    fiscais. Por sua vez, a identidade percebida como um estatuto, que proporciona s

    pessoas o sentido de pertena a uma comunidade poltica e lhes garante, legal e

    juridicamente, igualdade de direitos e de obrigaes. O relacionamento entre as pessoas

    entendido como orientado por valores, que induzem assuno de responsabilidades, num

    quadro de aco local ou nacional, como as que se referem a aces de auxlio voluntrio.

    De acordo com Tomaz (2007, retomando a ideia de Cogan, 1998), podendo ser

    considerada ajustada uma perspectiva de cidadania mais centrada na dimenso nacional,

    quando a realidade do mundo era mais simples, no o para a exigente e complexa

    realidade do mundo contemporneo, pois, como vimos anteriormente, os Estados-nao

    esto cada vez mais interdependentes, interligados, multiculturais e multilingues, o que

    12

    O facto de os cidados poderem agir como politicamente iguais, pressupe associar cidadania a ideia de

    democracia, admitindo que nenhuma pessoa ou grupo seja legalmente privilegiado ou excludo.

  • PARTE UM ENQUADRAMENTO TERICO-CONCEPTUAL

    CAPTULO UM Educao de infncia: um tempo fundador

    no contexto das sociedades contemporneas

    17

    requer a adopo de uma perspectiva de cidadania mais ampla, no limitada s fronteiras

    nacionais, e que tenha como quadro de referncia a declarao universal de Direitos

    Humanos13

    e a necessria participao de todos para promoo de um desenvolvimento

    sustentado e equilibrado do mundo em que vivemos.

    Assim, e numa interpretao mais ampla e alargada do conceito de cidadania, a

    participao encarada no sentido de um envolvimento activo em iniciativas cvicas e

    assuno de idnticas responsabilidades em relao aos problemas de natureza local e aos

    de natureza global. Ainda de acordo com Tomaz (idem), a identidade percebida como a

    tomada de conscincia de cada um como membro de mltiplas comunidades, que se

    alargam num continuum do local, ao regional, ao nacional, ao multinacional, at ao global,

    passando como cidado a possuir referenciais que remetem para vrias identidades, dando

    a ideia de cidado nacional lugar ideia de cidado do mundo. Os factores identitrios

    nacionais vo-se, assim, diluindo no confronto com os valores globais e transnacionais,

    pelo que se torna aparentemente maior a necessidade de aprofundar e afirmar as

    identidades regionais e grupais (Sanches & Seia, 2007). Como tambm sublinha Maj

    (2002) importante que o cidado conhea bem as suas razes e contexto prximo, bem

    como que tenha uma clara conscincia dos problemas globais e de que possvel deixar de

    viver numa ilha isolada sem perder a identidade local. Enfatiza-se, assim, um

    relacionamento norteado por valores, que favoream o bem comum e se traduzam em

    aces que contribuam para uma diminuio progressiva das desvantagens sociais e a

    promoo de esperana, paz e uma superior qualidade de vida para todos os cidados do

    mundo, no quadro de uma efectiva igualdade de direitos, mas tambm de deveres

    humanos.

    Nesta linha de pensamento pode entender-se o conceito de cidadania planetria

    desenvolvido por Morin, Motta e Ciurana (2004) e de cidadania mundial expressa nos

    documentos da ONU, de 2