Maputo, Moçambique * Maio * 2016 * Nº 14 O...

12
O prestigiado leitor do PlataformAGIR recebe a presente edição num mês especial para a mulher moçambicana. No dia 07 de Abril, o país celebrou mais uma data dedicada à mu- lher e, como é de praxe, para assinalar a efeméride, políticos, acadé- micos, organizações não-governamentais e sociedade no geral ape- laram ao respeito pelos direitos da mulher, vista como vulnerável a todas as adversidades da vida. A classe política diz que tudo está a ser feito no sentido de me- lhorar as condições de vida da mulher. Fala de aprovação de vários instrumentos legais que garantem a protecção da mulher, combate a casamentos prematuros, criação de facilidades para o acesso à edu- cação e saúde para além de tantas outras oportunidades. No entanto, a realidade mostra que, apesar do aparente esforço governamental, a situação da mulher continua preocupante e, como consequência, a mulher moçambicana celebrou o dia 07 de Abril rodeada de adversidades de vária ordem. Em Moçambique, são as mulheres que mais sofrem a discrimina- ção contra os segmentos pobres e vulneráveis. A mulher moçambicana continua exposta às violações sexuais, ca- samentos prematuros, violência doméstica, aos efeitos nefastos das mudanças climáticas e da tensão político-militar, para além de ser excluída dos órgãos de tomada de decisão assim como no acesso à saúde e educação. Apesar dos temas relacionados com a mulher terem merecido um Pelo respeito dos direitos da mulher Nota de Abertura tratamento especial, a presente edição aborda ainda outras questões como é caso das mudanças climáticas, cujos últimos acontecimen- tos indicam para a necessidade de tomada de medidas urgentes sob risco de se cair no abismo. Situações de secas prolongadas, cheias e inundações, aquecimen- to, ciclones e tempestades são exemplos claros das consequências directas da destruição da natureza e do meio ambiente pelo homem. A tensão político-militar, que cada dia ganha novos rumos com a tendência de agravamento, também está a constituir móbil de preo- cupação de moçambicanos que tanto querem a paz. Além do acima referido, outras empreitadas sócio-políticas, igual- mente relevantes, acham-se reflectidas no presente número do Pla- taformAGIR, designadamente: a marginalização dos camponeses no Corredor de Desenvolvimento de Nacala, no quadro do programa ProSAVANA, e a não materialização do instrumento legal contido no Código Penal que despenaliza o aborto. Não poderíamos terminar a presente nota sem nos referirmos ao regulamento da Lei do Direito à Informação, aprovado pelo Governo moçambicano com um ano de atraso. Neste capítulo, a Associação Centro dos Direitos Humanos procu- ra discutir o Contencioso do Direito à Informação no Regulamen- to da Lei que aprova o Direito à Informação, os litígios emergentes do exercício do direito preconizado pela mesma lei, bem como os meios processuais do regulamento do referido dispositivo legal. As opiniões e posicionamentos registados neste espaço não reflectem necessariamente as posições dos intermediários e dos doadores do Programa AGIR Associação Centro de Direitos Humanos O Contencioso do Direito à Informação no regulamento da LDI Maputo, Moçambique * Maio * 2016 * Nº 14 N o cumprimento das suas prerrogativas constitu- cionais, a Assembleia da República (AR) conferiu ao Governo a competência originária para, no prazo de 180 dias, aprovar o regulamento de execução da Lei n.º 34/2014, de 31 de Dezembro – Lei do Direito à Informa- ção (LDI). A aprovação do regulamento da LDI visava responder à orientação do Direito que defende que os actos legislati- vos cuja regulamentação está a cargo do poder executivo são inexequíveis antes da aprovação dos respectivos re- gulamentos, porque estes actos actuam como condição suspensiva dos actos legislativos que visam regulamen- tar . Pelo que, em termos práticos, a LDI manteve-se inexe- quível durante um ano, já que o respectivo regulamento, o Decreto n.º 35/2015, de 31 de Dezembro, só apareceu exactamente um ano depois da publicação da LDI. O mesmo também se verifica quando o poder regu- lamentar excede o prazo dentro do qual uma lei deve ser regulamentada, como aconteceu neste caso em que o Governo aprovou o Regulamento da Lei do Direito à Informação (RELDI) seis meses depois do fim do prazo fixado na lei. No Direito, o tempo é um acontecimento natural com relevância jurídica e é controlado através de prazos fixa- dos na lei por acordo dos interessados. No Direito Civil, por exemplo, a falta de exercício de um direito por certo lapso de tempo determina a sua pres- Continua pág. 2

Transcript of Maputo, Moçambique * Maio * 2016 * Nº 14 O...

O prestigiado leitor do PlataformAGIR recebe a presente edição num mês especial para a mulher moçambicana.

No dia 07 de Abril, o país celebrou mais uma data dedicada à mu-lher e, como é de praxe, para assinalar a efeméride, políticos, acadé-micos, organizações não-governamentais e sociedade no geral ape-laram ao respeito pelos direitos da mulher, vista como vulnerável a todas as adversidades da vida.

A classe política diz que tudo está a ser feito no sentido de me-lhorar as condições de vida da mulher. Fala de aprovação de vários instrumentos legais que garantem a protecção da mulher, combate a casamentos prematuros, criação de facilidades para o acesso à edu-cação e saúde para além de tantas outras oportunidades.

No entanto, a realidade mostra que, apesar do aparente esforço governamental, a situação da mulher continua preocupante e, como consequência, a mulher moçambicana celebrou o dia 07 de Abril rodeada de adversidades de vária ordem.

Em Moçambique, são as mulheres que mais sofrem a discrimina-ção contra os segmentos pobres e vulneráveis.

A mulher moçambicana continua exposta às violações sexuais, ca-samentos prematuros, violência doméstica, aos efeitos nefastos das mudanças climáticas e da tensão político-militar, para além de ser excluída dos órgãos de tomada de decisão assim como no acesso à saúde e educação.

Apesar dos temas relacionados com a mulher terem merecido um

Pelo respeito dos direitos da mulherNota de Abertura

tratamento especial, a presente edição aborda ainda outras questões como é caso das mudanças climáticas, cujos últimos acontecimen-tos indicam para a necessidade de tomada de medidas urgentes sob risco de se cair no abismo.

Situações de secas prolongadas, cheias e inundações, aquecimen-to, ciclones e tempestades são exemplos claros das consequências directas da destruição da natureza e do meio ambiente pelo homem.

A tensão político-militar, que cada dia ganha novos rumos com a tendência de agravamento, também está a constituir móbil de preo-cupação de moçambicanos que tanto querem a paz.

Além do acima referido, outras empreitadas sócio-políticas, igual-mente relevantes, acham-se reflectidas no presente número do Pla-taformAGIR, designadamente: a marginalização dos camponeses no Corredor de Desenvolvimento de Nacala, no quadro do programa ProSAVANA, e a não materialização do instrumento legal contido no Código Penal que despenaliza o aborto.

Não poderíamos terminar a presente nota sem nos referirmos ao regulamento da Lei do Direito à Informação, aprovado pelo Governo moçambicano com um ano de atraso.

Neste capítulo, a Associação Centro dos Direitos Humanos procu-ra discutir o Contencioso do Direito à Informação no Regulamen-to da Lei que aprova o Direito à Informação, os litígios emergentes do exercício do direito preconizado pela mesma lei, bem como os meios processuais do regulamento do referido dispositivo legal.

As opiniões e posicionamentos registados neste espaço não reflectem necessariamente as posições dos intermediários e dos doadores do Programa AGIR

Associação Centro de Direitos Humanos

O Contencioso do Direito à Informação no regulamento da LDI

Maputo, Moçambique * Maio * 2016 * Nº 14

No cumprimento das suas prerrogativas constitu-cionais, a Assembleia da República (AR) conferiu

ao Governo a competência originária para, no prazo de 180 dias, aprovar o regulamento de execução da Lei n.º 34/2014, de 31 de Dezembro – Lei do Direito à Informa-ção (LDI). A aprovação do regulamento da LDI visava responder à

orientação do Direito que defende que os actos legislati-vos cuja regulamentação está a cargo do poder executivo são inexequíveis antes da aprovação dos respectivos re-gulamentos, porque estes actos actuam como condição suspensiva dos actos legislativos que visam regulamen-tar . Pelo que, em termos práticos, a LDI manteve-se inexe-

quível durante um ano, já que o respectivo regulamento, o Decreto n.º 35/2015, de 31 de Dezembro, só apareceu exactamente um ano depois da publicação da LDI.O mesmo também se verifica quando o poder regu-

lamentar excede o prazo dentro do qual uma lei deve ser regulamentada, como aconteceu neste caso em que o Governo aprovou o Regulamento da Lei do Direito à Informação (RELDI) seis meses depois do fim do prazo fixado na lei. No Direito, o tempo é um acontecimento natural com

relevância jurídica e é controlado através de prazos fixa-dos na lei por acordo dos interessados. No Direito Civil, por exemplo, a falta de exercício de um

direito por certo lapso de tempo determina a sua pres-

Continua pág. 2

2 Plataforma - AGIR

Cont. da pág. 1

crição. O mesmo acontece com o Direito Público em que o tempo também não é indiferente porque as normas dão-lhe relevância jurídica, como é o caso das normas constitucionais que fixam mandatos em função do tem-po. Investido num mandato, um órgão público só pode

exercer regularmente as suas competências dentro do prazo de duração da sua investidura num determinado cargo, findo o qual e antes da sua substituição só pode exercer os chamados poderes de gestão corrente .No que à regulamentação da LDI diz respeito, o Gover-

no dispunha de uma competência a ser exercida dentro do prazo de cento e oitenta dias. Não tendo sido exercido dentro do prazo fixado na lei,

será que opera a caducidade da competência de regula-mentador do Governo? A prática jurisprudencial do di-reito comparado considera que, quando a lei fixa prazo para a sua própria regulamentação, decorrido esse prazo sem publicação do decreto regulamentar, os destinatá-rios da norma legislativa podem invocar os seus precei-tos e auferir todas as vantagens dela decorrentes, por entender-se que a omissão do poder executivo não tem o condão de invalidar os mandamentos legais do poder legislativo . Não há caducidade do poder regulamentar. No entanto, a falta de exercício do poder regulamentar

pelo poder executivo pode ser objecto de litígio pelos interessados na aprovação da norma regulamentar. Portanto, o poder conferido pelo legislador ao Governo

para regulamentar a LDI não é um poder ilimitado, antes pelo contrário é um poder vinculado à Constituição e ao próprio conteúdo da LDI.A ausência do conteúdo normativo, constitucional, do

direito à informação pode indiciar a inexequibilidade deste direito, já que o poder de delimitação e confor-mação das permissões legais correspondentes ao seu conteúdo normativo foi deixado a cargo do legislador ordinário. Deste ponto de vista, as posições jurídicas do cidadão

face ao Estado no que diz respeito ao direito à infor-mação ficaram necessariamente dependentes “de uma optimização legislativa”. Contudo, em termos práticos, esta aparente fraqueza constitucional do direito à infor-mação pode traduzir-se num ganho, na medida em que o legislador ordinário ficou com maior liberdade para fixar o seu conteúdo. Só que esta técnica legislativa constitu-cional comporta um risco associado a possíveis omis-sões do legislador ordinário.

Do Contencioso administrativo do DI

Ao abrigo do disposto no n.º 3 do artigo 253 da CRM, é assegurado aos cidadãos o direito ao recurso fundado em ilegalidade de actos administrativos prejudiciais aos

seus direitos. Por esta norma constitucional, o direito a recurso contra

actos administrativos é uma garantia fundamental do ci-dadão, ou seja, traduz-se num modo específico no direi-to de acesso à justiça administrativa contra as decisões administrativas dos órgãos da administração estadual e autárquica no domínio da informação. Neste sentido, o RELDI adopta um modelo judicialista de protecção do direito à informação, o que no plano da Declaração Uni-versal dos Direitos do Homem (DUDH) corresponde ao direito de ser julgado por um tribunal independente e imparcial . Igualmente, a opção de remeter os litígios do direito à informação ao contencioso administrativo ma-terializa o direito de acesso à justiça, previsto no artigo 8.º da DUDH, segundo o qual toda a pessoa tem direito a recurso efectivo para jurisdições nacionais competentes contra actos que violem os direitos fundamentais reco-nhecidos pela Constituição ou pela lei. Esta garantia é formalmente reconhecida pelos arti-

gos 69 e 70 da CRM, assegurando o direito de impugna-ção contra actos que violem os direitos protegidos pela Constituição e demais leis; e, por outro, expressando o direito de o cidadão recorrer aos tribunais contra actos que violem os seus direitos reconhecidos pela Constitui-ção e demais leis.A justiça administrativa é definida pela sua finalidade,

como o conjunto das garantias dos cidadãos contra as actuações ilegítimas da Administração que ofendem os seus direitos , mas porque o direito à informação não é exclusivamente dirigido ao cidadão uma vez que pode ser exercido mesmo por entidades públicas, é correcta a crítica de José Vieira de Andrade, segundo a qual já não é possível, no contexto de um Estado Social com uma administração descentralizada, reduzir a justiça admi-nistrativa à garantia dos particulares. A justiça adminis-trativa deve ser vista como substantivamente dirigida ao julgamento de recursos e acções emergentes de relações jurídicas administrativas .

Litígios emergentes do exercício direito à informação

Atendendo ao disposto na LDI, os litígios emergentes do exercício do direito à informação podem ser de índole civil, criminal, disciplinar e administrativo. Perante esta diversidade de domínios processuais em que se pode traduzir a litigiosidade ligada ao exercício do direito à informação, é legítimo perguntar se o legislador reme-teu-os todos ao contencioso administrativo. Face ao dis-posto nos artigos 228 e 230, ambos da CRM, a resposta é obviamente negativa. Os litígios emergentes de relações jurídicas adminis-

trativas no âmbito do exercício do direito à informação não se limitam, obviamente, aos casos de indeferimento

Continua pág. 3

3Plataforma - AGIR

Os deputados da Assembleia da República têm um papel fundamental na fiscalização do cumprimento da Lei de Direito à Informação

Cont. da pág. 1

Continua pág. 4

de pedido de informação, consulta de processo ou pas-sagem de certidões. Eles podem resultar, por exemplo, da deficiente prestação de informação, situação a que o legislador se refere expressamente no n.º 2 do artigo 9 da Lei n.º 14/2011, de 10 de Agosto, segundo a qual A Administração Pública é responsável pelas informações prestadas por escrito aos administrados, mesmo que não sejam obrigatórias. Em conclusão, deve-se afirmar que o regime de conten-

cioso do direito à informação previsto no artigo 36 da LDI e artigo 18 do RELDI não esgota, nem o leque de litígios que podem emergir de relações jurídicas admi-nistrativas de direito à informação, nem a diversidade de meios processuais de que o interessado pode lançar mão em defesa dos seus direitos e interesses.

Meios processuais no RELDI

O recurso contencioso é um meio processual de garan-tia judicial do direito à informação que tem por objecto a anulação ou a declaração de nulidade ou inexistência desse acto. Portanto, para que se possa dar como admis-

sível ou procedente o recurso contencioso, será neces-sário demonstrar a ilegitimidade do acto administrativo em causa, por padecer de qualquer ilegalidade geradora da sua invalidade . Nem a LDI, nem o RELDI elencam as ilegalidades que podem inquinar o acto de indeferimen-to de pedidos de informação com invalidade, devendo ser aplicado o regime geral do contencioso administra-tivo, constante do artigo 34 da LPPAC, onde o legislador fixou as ilegalidades aplicáveis a todos os actos adminis-trativos.Outro meio processual de garantia judicial do direito à

informação é a intimação para informação, consulta de processo e passagem de certidão que consiste na conde-nação ou imposição à administração pública para uma especial prestação: a prestação de informação, a dispo-nibilização de processos para consulta e a emissão de certidões . Diz-se meio processual de condenação porque, con-

trariamente aos meios impugnatórios como é o caso do recurso contencioso, a intimação para informação, con-sulta de processo ou passagem de certidão é de plana jurisdição porque o juiz administrativo detém o poder de ordenar a Administração a prestar a informação so-

4 Plataforma - AGIR

licitada e fixar o prazo dentro do qual a intimação deve ser cumprida .Por último temos a intimação de órgão administrati-

vo, particular e concessionário para prestar informação que tem por finalidade a condenação da Administração Pública para adoptar determinada conduta positiva (ac-ção) ou negativa (abstenção). Lança-se mão deste meio processual urgente quando os órgãos administrativos, os particulares ou os concessionários violem normas de direito administrativos ou deveres decorrentes de acto ou contrato administrativo ou quando a actividade des-tes entes viole um direito fundamental como é o caso do direito à informação . Concluindo, é importante fri-sar que o regime do contencioso do direito à informação previsto no RELDI é um reenvio para o regime geral do contencioso administrativo actualmente constante da Lei n.º 7/2014, de 28 de Fevereiro, do qual já constam meios processuais aplicáveis à defesa do direito à infor-mação. A consagração formal dum contencioso do direi-to à informação traduz o reconhecimento da titularidade

de uma posição juridicamente activa do cidadão merece-dora de garantias judiciais próprias e típicas. Os meios escolhidos pelo legislador no RELDI para a

defesa do direito à informação perante a Administração tem um potencial muito grande para garantir o acesso à informação de interesse público não subtraída do co-nhecimento público. Porém, a eficácia destas garantias jurisdicionais depende de muitos factores, desde logo, o facto de os tribunais terem de lidar com os processos relativos ao acesso à informação como verdadeiras ga-rantias jurisdicionais de um direito humano fundamen-tal porque previsto na Constituição da República, DUDH, no Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos, na Carta Africana dos Direitos Humanos e dos Povos e no Protocolo da SADC sobre Cultura e Desporto. Em segun-do lugar, é necessário que o cidadão esteja ao corrente da disponibilidade destes meios processuais como ga-rantias que o legislador lhe proporcionou para a defesa dos seus direitos. A própria Administração Pública deve estar consciente de que o recurso ao contencioso admi-nistrativo não é um litígio contra ela, mas sim contra os seus actos de recusa de informação.

Cumprindo o ritual programático, as quatro intermediá-rias do Programa Acções para uma Governação Inclusi-

va e Responsável (AGIR), mormente a Diakonia, IBIS, Oxfam e We Effect, rastrearam de forma mais abrangente os con-tornos do Programa com vista a diagnosticar os pontos po-sitivos e negativos do mesmo cuja segunda fase está a ser implementada desde 2015 e prolongar-se-á até 2020.

No rastreio, apesar de se ter denotado algumas fraquezas, conclui-se que, no cômputo geral, o Programa está num bom caminho.

Dados contidos no informe abrangente do AGIR II referem que o Programa conta com cerca de 64 parceiros baseados em diferentes pontos do país, trabalhando numa variedade de temas e usando uma diversidade de métodos e aborda-gens, mas com a mesma visão.

Assim, as quatro intermediárias do AGIR trabalham, jun-to com seus parceiros, no sentido de garantir que cidadãos moçambicanos, especialmente mulheres e grupos marginali-zados, participem activamente na economia dos recursos na-turais e no processo de democratização, reclamando e exer-cendo os seus direitos humanos e de cidadania, com ganhos sócio-económicos tangíveis e num ambiente de paz.

Como tal, contribuem para fortalecer a capacidade de res-posta, prestação de contas e transparência das instituições públicas e dos decisores políticos e económicos.

O AGIR II definiu que um dos mecanismos de financiamen-to disponíveis para as organizações da sociedade civil é o de Pequenos Financiamentos, que são destinados a movimen-tos, organizações ou grupos de cidadãos nacionais que ac-tualmente não beneficiam dos fundos do Programa.

Em 2015, no âmbito da primeira chamada de proposta, fo-ram recebidas um total de 192 propostas que foram assim distribuídas pelas IPOs, de acordo com a especificidade das mesmas em relação aos diferentes sub-programas.

Após a distribuição das propostas pelas IPOs, foram ela-borados os critérios de selecção e aprovação das propostas, tendo em consideração as três modalidades de financiamen-to de small grants que são: Financiamentos para acções ágeis, financiamento para acções inovadoras e financiamento para apoio institucional.

Nesta análise, foram também identificados alguns desafios, destacando-se a falta de clareza no formulário de aplicação em termos de orientar os aplicantes no tipo de financiamen-to requerido e o entendimento entre as quatro intermediá-rias em relação ao tipo de proposta e critérios de enquadra-mento/avaliação não são os mesmos.

No quadro da potenciação em termos dos recursos huma-nos, destaque vai para a contratação de um oficial de moni-toria e avaliação que terá a função de coordenar a recolha e disseminação de mudanças mais significativas do programa e aconselhar os implementadores sobre as melhores estra-tégias para alcançar os resultados bem como o oficial de comunicação e informação que terá o papel de facilitar as comunicações dentro e fora do programa.

Destaque vai também para o lançamento da página web que, para além de ter um carácter meramente informativo, serve como um mecanismo de facilitação e articulação entre os diferentes intervenientes do programa – parceiros, doado-res, organizações intermediárias.

O AGIR e as realizações das intermediárias

Cont. da pág. 3

5Plataforma - AGIR

Difusão da Lei do Direito à Informação chega à Administração Pública

No quadro da promoção, formação e difusão da Lei do Di-reito à Informação (LDI), aprovada em finais de 2014 pela

Assembleia da República, o Governo, através do Ministério da Administração Estatal e Função Pública (MAEFP) e a IBIS, uma Organização Não-Governamental Dinamarquesa, assinaram no passado dia 14 de Abril, em Maputo, um Memorando de Entendimento.

Assim, a partir deste acordo, funcionários públicos e outros agentes de Estado vão beneficiar, nos próximos três anos, de acções de capacitação em matérias ligadas ao direito à infor-mação, uso estratégico das Tecnologias de Informação e Co-municação (TICs) para efeitos de facilitação do acesso à infor-mação como direito fundamental em Moçambique.

Os treinamentos que serão desenvolvidos em todo o país alastram-se ao Regulamento da mesma Lei, aprovado pelo De-creto número 35/2015, de 31 de Dezembro.

O acordo abrange ainda a divulgação do Prémio de Jornalis-mo em Administração Pública e Acesso à Informação, de que a IBIS é parceiro desde o seu lançamento, há quatro anos.

O Prémio de Jornalismo em Administração Pública visa ga-rantir que um número considerável de profissionais de comu-nicação social se interesse pelas temáticas nele compreendi-das.

Para tal, através do Memorando de Entendimento, as partes irão juntar esforços na disseminação das cartas de serviço das instituições públicas em línguas nacionais, recorrendo às rádios locais e comunitárias, possibilitando deste modo que

cidadãos não alfabetizados e com limitações visuais possam melhorar o seu conhecimento relativamente aos serviços pres-tados pela Administração Pública ao cidadão e respectivos pa-drões de qualidade.

Falando na cerimónia do acordo, o Secretário Permanente (SP) do MAEFP, António Tchamo, disse estar esperançado e convicto de que, com a operacionalização do memorando, seja estabelecida uma plataforma fluída de disseminação de men-sagens sobre os direitos dos cidadãos e as obrigações dos ser-vidores públicos, à luz da LDI e os mecanismos de monitoria da efectividade da sua implementação.

Sublinhou que, ao fim dos próximos três anos, tempo previs-to de duração do programa, espera que sejam efectivadas vá-rias acções de formação de quadros da Administração Pública em matérias da LDI.

Por sua vez, Ericino de Salema, director do Programa de Acesso à Informação e Engajamento dos Cidadãos (AICE), con-gratulou a disponibilidade do Governo para ajudar a dissemi-nar a Lei do Direito à Informação, tida como pedra angular da democracia.

Realce-se que o Programa AICE faz parte do Programa AGIR (Acções para uma Governação Inclusiva e Responsável), que tem como principal doador a Embaixada da Suécia em Moçam-bique.

Além da IBIS, são também intermediárias do Programa AGIR (cuja segunda fase iniciou em 2015, com término previsto para 2020) outras três organizações internacionais, designa-damente a Diakonia, Oxfam e We Effect.

Ericino de Salema, director do Programa de Acesso à Informação e Engajamento dos Cidadãos (AICE) e António Tchamo, Secretário Permanente do MAEFP, durante o acto da materialização do Memorando de Entendimento

O AGIR e as realizações das intermediárias

6 Plataforma - AGIR

Actores do AGIR fazem acompanhamento das actividades

Dos parceiros na província de Tete

A fim de fazer o acompanhamento e monitoria das actividades das organizações intermediárias e suas parceiras, no quadro do Programa AGIR, a Embaixada da Suécia deslocou-se à província de Tete.

Na entrevista concedida ao PlataformAGIR, Claire Smellie, Primeira secretária e Gestora de Programas de Democracia e Direitos Humanos na Embaixada da Suécia em Maputo e Luísa Fumo, Oficial de Progra-

mas e Desenvolvimento Social na Embaixada de Suécia, resumem os contornos da viagem.

A Embaixada visitou alguns projectos implementados com apoio do Programa AGIR na província de Tete. Qual é que era o objectivo, quantos dias durou a visita e com que impressão ficaram?

A visita faz parte do acompanhamento e monitoria nor-mal que damos as organizações intermediárias e suas par-ceiras. Neste caso concreto, pela primeira envolveu a Em-baixada, as organizações intermediárias (We Effect e IBIS) e suas organizações parceiras/implementadores (Sekelekani e CAICC). Por outro assegurar uma aprendizagem dentro do programa AGIR para criar sinergias para além de com-preender a situação dos Direitos Humanos na Província de Tete.Foram quatro dias e a impressão com que ficamos é bas-

tante positiva. Visitamos comunidades que estão informa-das e conscientes dos seus direitos, estão organizadas e com uma participação de jovens, homens e mulheres que dão voz e reclamam os seus direitos.

Sendo Tete uma província com um potencial invejável em termos de recursos naturais e minerais, o que pro-voca apetites das multinacionais, como é que os pro-gramas financiados pelo AGIR estão a contribuir para o equilíbrio do meio ambiente, protecção dos recursos naturais e que as comunidades locais tenham benefícios sobre esses recursos?

Todas empresas mineradoras extraem carvão mineral em minas abertas e tem causado poluição ambiental e contri-buído para aumento de doenças pulmonares nas comuni-dades circunvizinhas. A AAAJC, um do parceiros do AGIR, junto com a comunidade tem desenvolvido acções para persuadir as empresas compensarem às famílias pelos da-nos ao ambiente e à sua saúde e reassentá-lo em locais mais seguros. Algumas empresas depositam resíduos quí-micos em locais próximo de rios dai que a UPCT está, jun-to com a comunidade, a pressionar a empresa para parar de depositar lixo tóxico em rios e fazer o tratamento do mesmo de outro modo. Tanto a AAAJC como a UPCT tem pugnado por assegurar que as comunidades afectadas pela

mineração sejam devidamente compensados.

4 . Quantos distritos foram visitados na província de Tete e trabalharam com quantas associações? Visitamos três distritos: Changara, Marara, Moatize in-

cluindo a Cidade de Tete. Trabalhamos com a Associação de Apoio e Assistência Jurídica (AAAJC) e visitamos três comunidades com quem estes trabalham: Mualaze, Canco-pe e Cassoca. A AAAJC é uma organização de paralegais que prestam apoio às comunidades afectadas pelo sector mineral do carvão assistindo-as colectivamente nas nego-ciações com o governo e sector privado.Trabalhamos igualmente com União Provincial de Cam-

poneses de Tete (UPCT), onde visitamos a comunidade de Inhangoma. UPCT trabalha com advocacia para o direito a terra dos camponeses, segurança alimentar, acesso aos serviços de agricultura e mercado para os camponeses.Fizeram parte da visita mais duas organizações parceiras:

Sekelekani e CAICC.

Que mais valias o AGIR está a trazer naquelas organi-zações.

A mais valia do programa AGIR é a apoio institucional e multianual que esta da às organizações. Isto permite que as organizações tenham mais autonomia para decidir como usar os seus fundos o que torna-se um desafio quan-do o apoio é baseado em projectos. Outra mais valia esta ligada ao fortalecimento da capacidade institucional que as organizações intermediarias fornecem através das capaci-tações, on-the-job coaching, fazendo dos subprogramas e do Programa dá as organizações a oportunidade para inte-ragir em rede.

7. Quais os pontos fortes e fracos que constataram?

Pensamos que a grande lição desta viagem foi constatar a complementaridade das organizações parceiras que em-bora sejam de subprogramas diferentes dentro do AGIR, conseguiram encontrar sinergias para uma maior eficácia

ENTREVISTA

7Plataforma - AGIR

Actores do AGIR fazem acompanhamento das actividades

das suas actividades junto ao grupo alvo. Como os diferen-tes tipos de organizações trabalhando em áreas diferentes podem ser benéficas uma para outra. Ex. como um institu-to de pesquisa pode assistir a uma união de camponeses e vice-versa e tudo dentro do mesmo programa.Constatamos como ponto forte o facto da sociedade civil

já se fazer ouvir. Não chamaríamos pontos fracos mas sim aspectos a melhorar, a inclusão do género, embora tenha-mos constatado uma participação massiva das mulheres em quase todas actividades visitadas, sentimos que ainda é um desafio sairmos dos números aos reais impactos da participação da mulher, tornando-a líder e com um papel activo no processo de decisão ao invés de meramente de representação. A nível das rádios comunitárias, sentimos que não há muita liberdade/autonomia desta decidirem so-bre os conteúdos de informação que passam.

8. Como é que avaliam a relação entre as organizações da sociedade civil parceiras do AGIR e o governo da Pro-víncia de Tete?

Infelizmente não tivemos a oportunidade nos reunir com os representantes do governo provincial e/ou distrital con-tudo, sentimos que de modo geral estão num bom cami-nho.

Que recomendações deixaram as organizações com que trabalharam?

Muitas das recomendações dadas são para as intermediá-rias para fortalecer os sistemas de monitoria e seguimento do trabalho das organizações parceiras. Muitas das reco-mendações estão ligadas a gestão baseada em resultados bem como a integrado de abordagem baseada em direitos humanos. Existem igualmente recomendações ligadas ao género: como assegurar que as diferentes intervenções te-nham impacto positivo na vida das mulheres e que não sejam vistas como beneficiarias mas actores importantes

em todos os processos. Como nos referimos antes houveram sinergias identifi-

cadas entre as diferentes organizações e as encorajamos a dar seguimento com especial destaque para o uso das TIC´s que contribuem para o aumento do acesso a infor-mação, monitoria e prestação de contas.

Daqui para frente qual será a periodicidade das visitas?

É preciso ter em mente que o número de organizações parceiras do Programa excede 70 a nível nacional. Obvia-mente, não poderemos visitar cada parceiro o quanto dese-jarmos, a nossa grande aposta nesta segunda fase do pro-grama AGIR é fazer um acompanhamento mais regular das actividades junto aos parceiros de implementação. E a cada um dos oficiais ligados ao Programa foi imposto um desa-fio de pelo menos uma vez por trimestre fazer estas visitas de monitoria. Os outros colegas dentro da Embaixada, que não estão necessariamente ligados ao dia-a-dia do AGIR, farão igualmente um esforço para fazer a monitoria deste grande programa quando se dirigem ao campo em outras missões. Algumas vezes viajaremos com outros doadores do Programa, por exemplo já esta planificada para breve uma monitoria desta natureza.

Dos encontros que mantiveram com as comunidades quais as principais reclamações que apresentaram?

Foi comum em quase todas comunidades que visitamos e circunvizinhas aos mega-projectos ligados à indústria extractiva reclamações ligadas as compensações que con-sideram injustas, a qualidade de casas nas zonas de reas-sentamento, e o facto de estas estarem em áreas onde há escassez de água, a terra não é fértil para agricultura e com vias de acesso deficitárias e circulação limitada dos mem-bros da comunidade devido a segurança armado nos pon-tos de entrada e saída da comunidade.

ENTREVISTA

Claire Smellie e Luísa Fumo falando ao PlataformAGIR

8 Plataforma - AGIR

Vinte anos após a Quarta Conferência Mundial sobre a Mulher, realizada na capital chinesa, Beijing, em 1995, a si-tuação da mulher e da rapariga continua preocupante em Moçambique. Esta constatação resulta de um estudo de rastreio sobre a

situação da mulher e da rapariga realizado pelo Fórum Mu-lher durante os anos 2005 a 2015.O estudo, que visava determinar o cumprimento dos ob-

jectivos adoptados na Declaração e Plataforma de Acção de Beijing, cujo epicentro é a igualdade de género, desenvol-vimento e paz, constatou que, no cômputo geral, há uma larga banalização do valor da vida da mulher e da rapariga moçambicana.Os resultados constatados no inquérito apontam que, em

mais de 80% do conteúdo apresentado, o destaque vai para problemas relacionados com o conflito armado, violência doméstica, tráfico de mulheres e raparigas e o crime nos seus diferentes horizontes.Nessa senda, entende o Fórum Mulher que a situação da

mulher e da rapariga agravou-se.Esta situação resulta do facto de a mulher e a rapariga se-

rem usadas como reféns destas disputas.Olhando para uma vertente mais global, o estudo do Fó-

rum Mulher aponta o crescimento da procura e controlo dos recursos, o avanço dos movimentos extremistas como uma das grandes ameaças da mulher em todo o mundo.Na vertente interna, aparece a tensão político-militar como

um mal que torna as mulheres e as raparigas mais expostas e vulneráveis à violência física e sexual, para além de limitar o acesso à educação e saúde, factos que representam um grande retrocesso no avanço dos direitos humanos das mu-lheres e raparigas.Para explicar os factos acima arrolados, o estudo do Fórum

Mulher recorre a dados estatísticos inseridos no Inquérito Demográfico de Saúde (IDS) de 2011 que aponta que cerca de 41% das mulheres nas zonas rurais não frequentaram ne-nhuma escola contra 18% dos homens. Nos centros urbanos, cerca de 13% das mulheres nunca foram à escola contra 4% dos homens.Por seu turno, os dados do Inquérito aos Orçamentos Fa-

miliares (IOF) na versão 2004/15 indicam que as mulheres estão em desvantagem quando comparadas com os homens que sabem ler e escrever, ao apresentarem taxas de analfa-betismo na ordem de 57.8% contra 30.1% dos homens.

Liderança e participação política

O estudo aponta que, no que concerne à liderança e par-ticipação política, apesar da mulher em Moçambique estar a ganhar espaço, sobretudo depois das eleições gerais de

1994, o crescimento não se reverte na efectiva mudança de comportamento no que tange à mudança das relações so-ciais de género.Sublinha que, nos últimos anos, o país tem registado uma

enorme corrida rumo à exploração dos recursos minerais e energéticos através dos mega-projectos, contudo, essas transformações beneficiam mais os homens em detrimento das mulheres que no fim é que assumem as consequências resultantes dos danos ambientais, económicos e sociais.Avança o Fórum Mulher que o estudo constatou ainda que,

apesar dos esforços multi-sectoriais visando garantir a equi-dade de género, a violência contra a mulher continua a ser um dos principais flagelos da sociedade. Em Moçambique, uma em cada três mulheres entre 15-49

afirma ter sofrido violência física por parte do parceiro e 12% das mulheres relatam ter sofrido violência sexual desde os 15 anos de idade. Algumas práticas costumeiras como os casamentos prema-

turos perpetuam a violência directa ou indirecta contra a mulher com práticas tradicionais nocivas, em termos numé-ricos. O estudo dirigido pelo Fórum Mulher sublinha que durante

o período 2009-2013, por exemplo, houve um aumento do número de casos atendidos, passando de cerca de 20.000 casos em 2009 para 23.948 em 2013, dos quais 15.290 mu-lheres e 4.942 crianças. Diante deste negro cenário, as organizações que compõem

o Fórum Mulher e os seus parceiros mantêm como priorida-de o desenvolvimento de acções concretas para o empodera-mento da mulher, alívio da pobreza nas mulheres e rapari-gas e, acima de tudo, a garantia dos Direitos Humanos.

Situação da mulher continua preocupante Vinte anos após a Declaração de Beijing

- Constata Fórum Mulher

Apesar de desempenhar um papel fundamental na sociedade, as mulheres continuam a ser

descriminadas

9Plataforma - AGIR

A ESTAMOS, uma organização comunitária não-gover-namental sem fins lucrativos sediada em Lichinga, capi-tal provincial do Niassa, está a desenvolver uma iniciativa que consiste na delimitação e demarcação de áreas comu-nitárias para mulheres de diferentes comunidades dos distritos de Chimbonila, Lago e Mandimba, na Província do Niassa. O projecto que está a ser implementado em parceria

com a iniciativa para terras comunitárias resume-se na atribuição de DUATs (Direito de Uso e Aproveitamento de Terras).Para tal, as mulheres foram definidas como classe prio-

ritária, principalmente viúvas e chefes de agregados fa-miliares, pelo facto de ser o grupo mais vulnerável.Neste processo, foram delimitadas áreas de 27 comuni-

dades num total de 275.237.208 hectares (ha). Na mesma linha, foram também atribuídos 14 DUATs a igual núme-ro de associações, nos três distritos, ocupando uma área de 474.971.8 ha. Dado que parte dessas áreas esteve nas mãos dos in-

vestidores privados, a ESTAMOS desempenhou um papel fulcral na mediação e gestão de conflitos, facto que pos-sibilitou a desanexação das terras das comunidades.Para levar a cabo esta iniciativa, a ESTAMOS iniciou com

um processo de advocacia junto de instituições gover-namentais, com destaque para a Direcção Provincial de Agricultura do Niassa, onde propôs as linhas mestras do projecto, o que foi imediatamente acolhido pelas partes. Antes da materialização do projecto, a ESTAMOS enco-

mendou um estudo de base para aferir o impacto da atri-buição dos DUATs às mulheres viúvas e chefes de agre-gados familiares cujos resultados foram encorajadores. Para permitir maior envolvimento das comunidades, fo-

ram realizados vários encontros com os líderes das co-munidades abrangidas para o esclarecimento dos objec-tivos e vantagens do programa.

Na identificação e sensibilização do grupo alvo, para além dos líderes comunitários, foram também envolvidas estruturas do governo ao nível distrital.O programa que culminou com a entrega de 224 DUATs

a mulheres viúvas e chefes de agregados familiares en-quadra-se no Plano Estratégico da ESTAMOS.Refira-se que a parceria entre a ESTAMOS e o Governo

trouxe múltiplas vantagens para as duas partes na me-dida em que, para além de permitir o executivo alcançar as suas metas no que concerne à atribuição de DUATs, permitiu a desburocratização na tramitação processual.

Situação da mulher continua preocupante Mulheres do Niassa recebem DUATsSob égide da ESTAMOS

ESTAMOS presta atenção especial as mulheres de Niassa

10 Plataforma - AGIR

O ProSAVANA continua a marginar camponeses residentes nas áreas abrangidas pelo Programa

ProSAVANA: uma forma de marginalização do sector familiar?

O ProSAVANA é um mega programa agrícola a ser im-plementado ao longo do Corredor de Desenvolvimento de Nacala onde vai abranger um total de 19 distritos, nas províncias de Nampula, Zambézia e Niassa. O Corredor compreende uma extensão de 107.002 km2

(13.4% da área total do território nacional) e com uma população estimada em 4.287.415 habitantes (aproxima-damente 17% da população total do país). Esta região tem verificado um grande fluxo de investi-

mento estrangeiro, embora se verifique alguns casos de investimento nacional. O ProSAVANA foi concebido através de um programa de

cooperação triangular entre os governos do Japão, Brasil e Moçambique. Contudo, apesar de se apregoar uma vertente desenvol-

vimentista, todo o processo de comunicação, concepção e elaboração da primeira Versão Zero do Plano Director do ProSAVANA foi caracterizado pela falta de transpa-rência e inclusividade, principalmente devido à margina-lização do sector familiar. O Plano Director Zero possui um conjunto de discrepân-

cias relacionadas principalmente à segurança de posse de terra pelos pequenos agricultores, ameaçando deste modo as actividades agrícolas do sector familiar. Não obstante a actual estagnação deste programa, exis-

tem ao longo Corredor indícios do modelo de desenvolvi-

mento defendido por este programa, como por exemplo a entrada massiva de capital estrangeiro assim como ac-tividades de investigação pelo IIAM virados para a produ-ção de soja, a cultura de rendimento prioritária do Plano Director do ProSAVANA. Estes investimentos são direccionados ao agronegócio

e, consequentemente, provocam um aumento de procura de terras ao longo do Corredor que resultam em conflitos de terra com as comunidades locais. Em resposta ao processo de sensibilização para o al-

cance de um desenvolvimento sustentável resultante dos diferentes movimentos sociais promovidos pelas Orga-nizações da Sociedade Civil e às evidências fornecidas por académicos e mídia, deu-se início a um processo de reformulação do Plano Director deste programa com ob-jectivo de adopção de um modelo que permita a maior inclusividade do sector familiar tendo em conta os direi-tos das comunidades em relação à posse de terra, acesso à informação e maior participação. Este processo está sendo dirigido por um Mecanismo

de Coordenação da Sociedade Civil, que articula com a sociedade civil das três províncias.

*Natacha Bruna, Mestre em Economia. Investigadora assistente no Observatório do Meio Rural. Docente da Universidade Politécnica.

11Plataforma - AGIR

OXFAM

IBIS

WE EFFECT

DIAKONIAProSAVANA: uma forma de marginalização do sector familiar?

Emba

ixad

a da

Din

amar

ca

Rua Fernao Melo e Castronº 124, MaputoTel: +258 21 49 95 22/3Cell: +258 82 30 30 022 +258 82 30 95 250 +258 21 49 95 36E-mail: [email protected]: www.ibismo.org

Rua do Parque nº 19, MaputoTel: +258 21 49 29 48Fax: +258 21 48 87 16Cell: +258 82 30 67 839E-mail: [email protected]: www.oxfam.org/mozambique

Bairro Sommershield 2, Rua 3510, Nº 188, MaputoTel: +258 21 496053Fax: +258 21 496053Cel: +258 82 9859505E-mail: [email protected]: www.diakonia.se

Av. Paulo S. Kamkhomba nº 280 | Tel: +258 2149 7861Fax: +258 2149 7862 | E-mail: [email protected]

Maputo - Moçambique

Nada de novo! Quinze meses após a entrada em vigor da Lei que despenaliza o aborto em Moçambique

Moçambique aprovou em Julho de 2014 um novo regi-me jurídico do aborto, o qual vem contido no novo Có-digo Penal aprovado pela Assembleia da República. Esta alteração expandiu as circunstâncias em que a prática do aborto não é considerada crime, substituindo a dis-posição bastante restritiva do anterior Código Penal, que apenas permitia a prática do aborto para salvar a vida da mulher grávida, caso esta estivesse em risco.Porém, quinze meses após a entrada em vigor deste

importante instrumento legal, pouco ou quase nada foi feito pelo Governo, a fim de permitir a aplicação práti-ca deste importante dispositivo de garantia do respeito dos direitos das mulheres, através da aprovação de regu-lamentos e de protocolos médicos e clínicos para a sua operacionalização.É que, de acordo com o artigo 168 do novo Código Pe-

nal, não é punível o aborto efectuado por um médico ou outro profissional de saúde habilitado para o efeito, ou sob sua direcção, em estabelecimento de saúde oficial ou oficialmente reconhecido em certas circunstâncias e até determinados limites gestacionais permitidos por lei.Isto é, com a aprovação deste novo regime legal, passa-

-se a permitir o aborto, a pedido da mulher grávida até às 12 semanas.O limite das 12 semanas poderá ser ultrapassado em de-

terminadas situações, como foi acima referido. Tais são os casos das gravidezes resultantes de violação e incesto, em que o aborto pode ser permitido até às 16 semanas, em caso de má formação fetal, em que o aborto pode ser efectuado até às 24 semanas e em face de certas condi-ções de saúde como seja a necessidade de remover o pe-rigo de morte ou de lesão grave e irreversível da mulher grávida, no caso de o feto ser inviável ou em caso da mu-lher grávida com doenças crónicas degenerativas, casos em que não se impõe um limite de idade gestacional para que o aborto possa ser realizado.A aprovação deste novo quadro legal surge na sequência

da ratificação por Moçambique, em 2005, do Protocolo à Carta Africana Sobre os Direitos Humanos e dos Povos Relativo aos Direitos das Mulheres em África, que reco-nhece explicitamente o acesso ao aborto seguro como um direito humano das mulheres.Foi no âmbito deste e de outros instrumentos interna-

cionais e regionais de defesa dos direitos humanos das

mulheres e ainda face à necessidade de reduzir as mortes por aborto inseguro, que se estima situarem-se em 11% da mortalidade materna, que foi efectuada a revisão das disposições relativas à penalização do aborto, de modo a permitir que um maior número de mulheres tivesse aces-so a serviços de aborto seguro.Daí que Organizações da Sociedade Civil comprometi-

das com o bem-estar da mulher apelam à necessidade urgente da aprovação de regulamentação adicional que permita as mulheres o gozo efectivo desse direito.

CARTOON