Manifesto_ii Semana de Luta Antimanicomial_pe

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MANIFESTO: MELHOR QUE FECHAR É ABRIR Há séculos reproduzimos a segregação e a divisão de classes sustentando que em nome do cuidado deve-se reprimir, medicalizar e invizibilizar. Reafirma-se ainda hoje que a loucura é desvio de conduta não aceita pelo mercado, nosso maior regente. Contudo, isso se dá diante lutas, pois, também há anos resistimos, criamos, formulamos, e vivenciamos novas possibilidades de vida em liberdade. Disputamos arduamente a criação de políticas de estado antimanicomiais e o fortalecimento de uma outra sociabilidade entre homens e mulheres. Há treze anos a população brasileira conquistou a Lei 10.216/2001 - a Lei da Reforma Psiquiátrica - Lei esta que desde o seu surgimento, os trabalhadores, usuários e familiares almejam por sua efetivação. Segundo tal lei, o Brasil deveria fechar todos os leitos psiquiátricos do seu território e com eles todas as práticas segregativas, violentas e desumanizantes, propostas pelos manicômios ao longo de centenas de anos. Seguimos caminhando, resistindo e lutando, até que avancemos de fato. Afinal, o Brasil fechou grande parte dos leitos psiquiátricos, abriu outros tantos serviços substitutivos, mas o cotidiano nos grita que ainda não chegamos perto do que poderíamos denominar de tratamento (e vida) com respeito, humanidade e dignidade. Os usuários de drogas são criminalizados e vivem na iminência de serem capturados para realizarem pseudo-tratamentos e a loucura continua sendo estigmatizada fora e dentro dos serviços: o acesso ao tratamento comunitário é difícil; a Atenção Básica demonstra pouca habilidade; a Alta Complexidade diz que o problema não é de sua competência; as crises precisam acontecer de segunda a sexta, das 8 às 18h; a saúde afirma que a pessoa em situação de rua é para a assistência social e a assistência social diz que a pessoa tem transtorno mental ou é usuário abusivo de substâncias psicoativas, e por esses caminhos o CAPS capsifica, visto que outras opções são quase inexistentes! Nossos ambulatórios são superlotados e com atendimentos psi-centrados, temos raras iniciativas de geração de renda, poucos leitos integrais em hospitais gerais e uma completa ausência de Centros de Convivências! As pessoas ainda se escondem e são escondidas! Neste ano, clamamos para que a luta vá para além dos muros concretos já derrubados, para que avancemos na criação de redes de cuidado no território, na ampliação de dispositivos e que sejamos (ins)pirados e (ins)piradas para ocuparmos a cidade sem ameaças de violência, opressão e com garantia de respeito para as vidas que já corajosamente insistem! Que o direito à diferença seja potência para fortalecer processos de convivência comunitária e não elementos para (re)construção de parâmetros normais de aceitação social. Que se abram as ruas, as portas, as mentes, os olhos e os corações!!! Saudações Antimanicomias! Recife, maio de 2014. Núcleo Pernambucano da Luta Antimanicomial Libertando Subjetividades

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Apoio a luta anti manicomial

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  • MANIFESTO: MELHOR QUE FECHAR ABRIR

    H sculos reproduzimos a segregao e a diviso de classes sustentando que em nome do

    cuidado deve-se reprimir, medicalizar e invizibilizar. Reafirma-se ainda hoje que a loucura

    desvio de conduta no aceita pelo mercado, nosso maior regente. Contudo, isso se d diante

    lutas, pois, tambm h anos resistimos, criamos, formulamos, e vivenciamos novas possibilidades

    de vida em liberdade. Disputamos arduamente a criao de polticas de estado antimanicomiais e

    o fortalecimento de uma outra sociabilidade entre homens e mulheres. H treze anos a populao

    brasileira conquistou a Lei 10.216/2001 - a Lei da Reforma Psiquitrica - Lei esta que desde o seu

    surgimento, os trabalhadores, usurios e familiares almejam por sua efetivao. Segundo tal lei, o

    Brasil deveria fechar todos os leitos psiquitricos do seu territrio e com eles todas as prticas

    segregativas, violentas e desumanizantes, propostas pelos manicmios ao longo de centenas de

    anos. Seguimos caminhando, resistindo e lutando, at que avancemos de fato. Afinal, o Brasil

    fechou grande parte dos leitos psiquitricos, abriu outros tantos servios substitutivos, mas o

    cotidiano nos grita que ainda no chegamos perto do que poderamos denominar de tratamento

    (e vida) com respeito, humanidade e dignidade. Os usurios de drogas so criminalizados e

    vivem na iminncia de serem capturados para realizarem pseudo-tratamentos e a loucura

    continua sendo estigmatizada fora e dentro dos servios: o acesso ao tratamento comunitrio

    difcil; a Ateno Bsica demonstra pouca habilidade; a Alta Complexidade diz que o problema

    no de sua competncia; as crises precisam acontecer de segunda a sexta, das 8 s 18h; a

    sade afirma que a pessoa em situao de rua para a assistncia social e a assistncia social

    diz que a pessoa tem transtorno mental ou usurio abusivo de substncias psicoativas, e por

    esses caminhos o CAPS capsifica, visto que outras opes so quase inexistentes! Nossos

    ambulatrios so superlotados e com atendimentos psi-centrados, temos raras iniciativas de

    gerao de renda, poucos leitos integrais em hospitais gerais e uma completa ausncia de

    Centros de Convivncias!

    As pessoas ainda se escondem e so escondidas!

    Neste ano, clamamos para que a luta v para alm dos muros concretos j derrubados, para que

    avancemos na criao de redes de cuidado no territrio, na ampliao de dispositivos e que

    sejamos (ins)pirados e (ins)piradas para ocuparmos a cidade sem ameaas de violncia,

    opresso e com garantia de respeito para as vidas que j corajosamente insistem! Que o direito

    diferena seja potncia para fortalecer processos de convivncia comunitria e no elementos

    para (re)construo de parmetros normais de aceitao social.

    Que se abram as ruas, as portas, as mentes, os olhos e os coraes!!!

    Saudaes Antimanicomias!

    Recife, maio de 2014. Ncleo Pernambucano da Luta Antimanicomial Libertando Subjetividades