MANÇANO FERNANDEZ - Entrando en Los Territorios Del Territorio

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  • 7/26/2019 MANANO FERNANDEZ - Entrando en Los Territorios Del Territorio

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    Entrando nos territrios do Territrio

    Bernardo Manano Fernandes UNESP

    Introduo

    Este artigo um ensaio terico sobre o Territrio. E com base nesta reflexo proponhoum debate sobre os tipos de territrios e as disputas territoriais. O que me motivoupensar sobre estes objetos o fato de o Territrio ter sido escolhido por cientistas dediversas reas do conhecimento como conceito central para o estudo de diferentesescalas e tipos de espaos geogrficos. O conceito tambm passou a ser tema principalmuito utilizado por distintas instituies na elaborao de projetos de polticas pblicas,principalmente voltados para o desenvolvimento rural. Neste ensaio sobre o Territrio,procuro ir alm da significao clssica mais utilizada do conceito como espao degovernana. Proponho uma tipologia de territrios a partir de referencial bibliogrfico ede pesquisas de campo realizadas em diferentes pases. O objetivo neste artigo ampliaro debate sobre o Territrio e defender a idia que a definio de sua significao umarelao de poder que precisa ser constantemente debatida. Este poder hoje muitoutilizado pelas instituies e pelos estudiosos na realizao de projetos de pesquisa e dedesenvolvimento territorial rural que atinge milhes de pessoas em seus habitats.

    Este ensaio um dos resultados da reflexo terica que venho fazendo h pelo menosdez anos estudando os movimentos camponeses vinculados Via Campesina. Umconjunto de atividades me possibilitaram as condies para chegar a estas idias que oraapresento. As atividades que me motivaram a esta reflexo referem-se pesquisa, aoensino e extenso. Em 1998, com a criao do Ncleo de Estudos, Pesquisas eProjetos de Reforma Agrria NERA1, produzimos nosso territrio onde passamos aelaborar e executar diversas linhas e projetos de pesquisa, como por exemplo oDATALUTA Banco de Dados da Luta pela Terra e o RIST Relatrios de ImpactosSocioterritoriais. Neste espao, junto com meus orientandos construmos as condiesde trabalho para pesquisas empricas, ensaios tericos e contribuies cientficas paradiferentes instituies e organizaes. importante registrar que as idias aquiapresentadas so de minha inteira responsabilidade, pois so frutos de meus exercciosintelectuais. Mas quero registrar tambm que eu no teria construdo esta reflexo sem arealizao das atividades descritas nesta parte e na seguinte, em que muitas pessoas meajudaram. Sou grato a essas pessoas de distintas organizaes e diversos pases que dediferentes formas me ofereceram as condies para pensar o Territrio e os territrios.

    Desde 2002, com o incio do projeto de pesquisa A Formao da Via Campesina:espacializao, territorializao e mundializao dos movimentos camponeses2", naspesquisas de campo, tenho observado os diferentes territrios que se formam comconflitualidade expressa pelas relaes de subalternidade e resistncia do campesinatoao agronegcio. Desde 2005, quando iniciei a coordenao do Grupo de TrabalhoDesenvolvimento Rural da Amrica Latina e Caribe do Conselho Latino-americano deCincias Sociais CLACSO, em diversas reunies, tenho debatido uma parte das idias

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    aqui expostas. Eu tambm me beneficiei de diferentes experincias na realizao detrabalhos de extenso e assessorias. Na primeira metade da dcada de 1980, comecei aestudar o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra MST. Esta foi sem dvidaa mais rica experincia, a partir das realidades da luta pela terra, que me levou a suscitaras idias para a construo de outras significaes para o Territrio. Comecei acompreender que a luta pela terra a luta por um determinado tipo de territrio: o

    territrio campesino3

    . Esta compreenso est presente em meus trabalhos da dcada de1990, em que o Territrio aparece como conceito central. No desenvolvimento de meustrabalhos, esta compreenso se fortaleceu ainda mais com as pesquisas sobre a ViaCampesina em diversos pases, como por exemplo: Brasil, Canad, Estados Unidos,Mxico, Guatemala, Espanha e Portugal. Tambm, minha experincia com asassessorias para a Comisso Pastoral da Terra CPT no Brasil e Pastoral de la TierraInterdiocesana na Guatemala, na realizao de pesquisas e as visitas a vrios territriosem conflitos tm fortalecido os sentidos das significaes que tenho empregado aodiscutir os diferentes tipos de territrios.

    Nos ltimos dois anos, tenho debatido intensamente meus ensaios a respeito dos tiposde territrios e dos movimentos socioterritoriais4. Um espao importante onde tenhoexposto e desenvolvido esta reflexo a sala de aula. Quer destacar a disciplina Teoriasdos Territrios e dos Movimentos Socioterritoriais, que ministro no Programa de PsGraduao em Geografia da UNESP, campus de Prudente e a disciplina Estructuraagraria y estado en Amrica Latina que ministrei no Programa de EstudiosLatinoamericanos de la Universidad Andina Simn Bolvar, Sede Ecuador (UASB).Tenho muito a agradecer aos alunos destas duas disciplinas que me ajudaram com seustrabalhos e distintas leituras a pensar melhor sobre os diferentes tipos de territrios. Em2007, com o incio do projeto de pesquisa Estudo comparativo das transformaesrecentes nos campos brasileiro e cubano (1994 2005)5, tive a oportunidade dediscutir os conceitos Espao e Territrio com gegrafos cubanos. Agradeo aos colegasRoberto Gonzales, Angelina Herrrera, Eduardo San Marful e Silvia Diaz pelo amplodebate realizado em reunies e em pesquisa de campo.

    Os eventos cientficos so espaos fundamentais onde podemos expor nossas idias edebater com nossos colegas. Sou grato aos pesquisadores, professores e alunos queleram e ou debateram parte das idias em desenvolvimento que foram apresentadas noEncontro de Gegrafos da Amrica Latina, realizado em Bogot, 2007, no LatimAmerican Studies Association Congress, realizado em Porto Rico, 2006, no VIICongreso Latino-Americano de Sociologa Rural, realizado em Quito, 2006, NoCanadian Association for the Study of International Development (CASID), realizadoem Saskatoon, 2007, no Simpsio Internacional de Geografia Agrria, realizado emLondrina, 2007, No Seminrio do Programa Nacional de Educao na Reforma Agrria PRONERA, realizado em Braslia, 2007 e no VII Encontro Nacional da Associao

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    Nacional de Ps-Graduao em Geografia, realizado em Niteri, 2007. Pelas crticas econsideraes agradeo aos meus colegas: Cliff Welch, Ariovaldo Umbelino deOliveira, Jorge Montenegro, Antonio Thomaz Jr, Norma Giarraca, Miguel Teubal, PilarLizarraga, Carlos Vacaflores, Harry Vanden, Srgio Leite, Luis Hocman, Carlos WalterPorto Gonalves, Marcos Saquet, Edgar Kolling, Roseli Caldart, Monica Molina,Wilder Robles, Marcelo Jos Lopes de Souza, Ana Clara Torres Ribeiro, Joo Clps Jr,

    Joo Fabrini e aos meus orientandos: Matuzalem Cavalcante, Eduardo Girardi, EraldoRamos, Nelson Pedon, Anderson Antonio da Silva e Janaina Francisca de Souza,Herivelto Fernandes e Estevan de Freitas.

    1 Os territrios do Territrio

    O ponto de partida para uma reflexo sobre o Territrio o Espao. O espao amaterializao da existncia humana (LEFEBVRE, 1991, p. 102). A amplitude destasignificao exige muita ateno de nossa parte, para no reduzirmos o espao a um

    fragmento . O espao uma totalidade. assim que Milton Santos define o espao:como conjunto de sistemas de objetos e sistemas de ao, que formam o espao demodo, indissocivel, solidrio e contraditrio (SANTOS, 1996, P. 51). Nesta definioesto contempladas a natureza e a sociedade. Por sistemas de objetos socompreendidos os objetos naturais ou elementos da natureza e os objetos sociais ouobjetos produzidos por meio das relaes sociais, que modificam e transformam anatureza, explicitando ento a indissociabilidade. A indissociabilidade uma palavra-chave porque une os sistemas de objetos e os sistemas de aes de modo contraditrio esolidrio expresso pelas conflitualidades geradas pelas diferentes intencionalidades .Ao analisarmos o espao no podemos separar os sistemas, os objetos e as aes, que secompletam no movimento da vida, em que as relaes sociais produzem os espaos e osespaos produzem as relaes sociais. Desde esse ponto de vista, o ponto de partidacontm o ponto de chegada e vice-versa, porque o espao e as relaes sociais esto empleno movimento no tempo, construindo a histria. Este movimento ininterrupto oprocesso de produo do espao e de territrios.

    Partimos do princpio que o territrio construdo a partir do espao geogrfico, ou queo espao anterior ao territrio (RAFFESTIN, 1993, p. 144). As transformaes doespao acontecem pelas relaes sociais no processo de produo do espao. Os objetosnaturais ou elementos naturais tambm transformam o espao, mas so as relaessociais que impactam o espao com maior intensidade. Os sistemas de aes e ossistemas de objetos so indissociveis, todavia possvel analisar as distintasintensidades de seus movimentos. A tcnica e a tecnologia dinamizaram os sistemas deaes, impactando a natureza com maior intensidade. A formao de territrios sempre um processo de fragmentao do espao. Os seres necessitam construir seusespaos e territrios para garantirem suas existncias (GOTTMANN, 1973, p. 1 - 15).Espao e Territrio so categorias geogrficas e so indiferentes, pois a diferena estna definio de Espao e Territrio (SANTOS, 2004, p. 34). A definio do significadodo conceito um exerccio intelectual do movimento entre o abstrato e o concreto ou domovimento entre o mtodo (pensamento pensante), a teoria (pensamento pensado) e arealidade. a intencionalidade que vincula o sujeito ao objeto, ou o pensador e oconceito pensado (SANTOS, 1996, P. 74). O mtodo e a teoria so pensamentos,portanto, carregados de intencionalidade. Quando um pensador define a significao naconstruo de um conceito, est agindo com uma determinada intencionalidade pormeio do mtodo e da teoria. A intencionalidade caracterizada pela direcionalidade do

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    pensamento (SEARLE, 1995, p. 223-250), constituda em diferentes tendncias pelaexperincia histrica dos sujeitos, que trabalhando com o rigor das teorias e dosmtodos, define o significado do conceito.

    A intencionalidade compreendida como propriedade do pensamento e da ideologia emque o sujeito delibera, planeja, projeta, dirige e prope a significao e por conseguinte

    a interpretao, se realiza atravs das relaes sociais no processo de produo doespao e na compreenso desse processo. Deliberar, planejar, projetar, dirigir, propor,significar, interpretar so verbos que explicitam ao e poder. O poder de significar einterpretar expressa a inteno, a pretenso do sujeito. A intencionalidade expressa,portanto, um ato poltico, um ato de criao, de construo. Este ato poltico exprime aliberdade da criao, da significao e da interpretao. Esta uma forma de construodo conhecimento. Os sujeitos utilizam suas intencionalidades criando, construindo,produzindo suas significaes dos conceitos, suas interpretaes ou enfoques darealidade, evidenciando aspectos de acordo com interesses, definindo seus espaos eseus territrios, concretos e abstratos, materiais e imateriais. As interpretaes,enfoques, pontos de vista ou abordagens acontecem por meio das intencionalidades querepresentam interesses de diferentes classes organizadas em diversas instituies.Embora esta questo me parea evidente, penso ser importante lembr-la: os estudiosos,pesquisadores e outros profissionais trabalham os conceitos e as teorias de acordo com aintencionalidade dessas instituies.

    Ainda, a proposio da amplitude da significao ou da restrio da significao de umconceito definida pela intencionalidade. Assim, os conceitos ganham significadosdiferentes, de acordo com as teorias, os mtodos e as instituies. Pensadoresvinculados a diferentes correntes tericas, como por exemplo o Positivismo, oNeopositivismo, o Materialismo Histrico, a Fenomenologia elaboram distintassignificaes dos conceitos de Espao e Territrio para realizarem diferentesinterpretaes. De acordo com as tendncias das intencionalidades, os territrios podemser vistos de diversas formas, por diferentes sujeitos. Dar significados mais amplos oumais restritos depende da intencionalidade do sujeito que elabora e ou que usa oconceito. Eu defendo uma significao mais ampla para o conceito de territrio. Oprincpio da multidimensionalidade pode ser considerado como uma propriedade dosignificado do conceito de territrio. Este um grande desafio, porque por mais que sedefenda a multidimensionalidade na acepo do conceito de territrio, as teorias,mtodos e prticas a fragmentam. Mas esta fragmentao no ocorre somente namultidimensionalidade dos territrios, acontece tambm na sua multiescalaridade.

    Nas abordagens territoriais predominam anlises da dimenso econmica e dadimenso social numa acepo de territrio como uma unidade geogrfica determinada,quase sempre como espao de governana. A definio de territrio por rgosgovernamentais e agncias multilaterais no consideram as conflitualidades dosdiferentes tipos de territrios contidos territrio de um determinado projeto dedesenvolvimento territorial. Ao se ignorar propositalmente os distintos tipos deterritrio, perde-se a multiescalaridade, porque estes territrios esto organizados emdiversas escalas geogrficas, desde a local at a escala internacional. O conceito deterritrio passa a ser instrumentalizado para atender aos interesses de instituies eexpressa ento sua mais cara propriedade: as relaes de poder. Por essa razo, parece-nos que a multidimensionalidade, embora presente na significao do conceito deterritrio em muitos artigos e documentos, no se realiza, porque implicaria na

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    socializao das tomadas de deciso. Assim tambm a multiescalaridade completamente desprezada, porque significaria reconhecer os territrios das diferentesclasses sociais.

    interessante observar que neste contexto que o conceito de territrio usado comoinstrumento de controle social para subordinar comunidades rurais aos modelos de

    desenvolvimento apresentados pelas transnacionais do agronegcio. Em suas diferentesacepes, o territrio sempre foi estudado a partir das relaes de poder, desde o Estadoao capital, desde diferentes sujeitos, instituies e relaes. Na essencialidade doconceito de territrio esto seus principais atributos: totalidade, multidimensionalidade,escalaridade e soberania. Portanto, impossvel compreender o conceito de territriosem conceber as relaes de poder que determinam a soberania. Quando nos referimosao territrio em sua multiescalaridade, ou seja em suas diversas escalas geogrficas,como espao de governana de um pas, de um estado ou de um municpio, o sentidopoltico da soberania pode ser explicitado pela autonomia dos governos na tomada dedecises. Quando nos referimos ao territrio como propriedade particular individual oucomunitria, o sentido poltico da soberania pode ser explicitado pela autonomia de seusproprietrios na tomada de decises a respeito do desenvolvimento desses territrios.

    Sempre importante enfatizar a relao entre os territrios como espao de governanae como propriedades. Esta relao determinada por polticas de desenvolvimento,portanto quem determina a poltica define a forma de organizao dos territrios. Aqui necessrio lembrar seus atributos: cada territrio uma totalidade, por exemplo: osterritrios de um pas, de um estado, de um municpio ou de uma propriedade sototalidades diferenciadas pelas relaes sociais e escalas geogrficas. Essas totalidadesso multidimensionais e s so completas neste sentido, ou seja, relacionando sempre adimenso poltica com todas as outras dimenses: social, ambiental, cultural, econmicaetc. Compreender essas relaes essencial para conhecermos as leituras territoriaisrealizadas por estudiosos de diversas reas do conhecimento e por diferentes instituiesque impem seus projetos de desenvolvimento s comunidades rurais.

    Cada instituio, organizao, sujeito etc., constri o seu territrio e o contedo de seuconceito, desde que tenha poder poltico para mant-los. Esses criadores de territriosexploram somente uma ou algumas de suas dimenses. Isto tambm uma decisopoltica. Todavia, ao explorar uma dimenso do territrio, ele atinge todas as outras porcausa dos princpios da totalidade, da multiescalaridade e da multidimensionalidade. Acompreenso de cada tipo de territrio como totalidade com sua multidimensionalidadee organizado em diferentes escalas, a partir de seus diferentes usos, nos possibilitaentender o conceito de multiterritorialidade. Considerando que cada tipo de territriotem sua territorialidade, as relaes e interaes dos tipos nos mostram as mltiplasterritorialidades. por essa razo que as polticas executadas no territrio comopropriedade atingem o territrio como espao de governana e vice-versa. Amultiterritorialidade une todos os territrios atravs da multidimensionalidade e pormeio das escalas geogrficas, que podem ser representados como camadas sobrepostas(layers), em que uma ao poltica tem desdobramento em vrios nveis ou escalas:local, regional, nacional, internacional.

    Neste sentido, ao se pensar polticas territoriais necessrio compreender suamultiescalaridade e sua multidimensionalidade. Quando o territrio concebido comouno, ou seja apenas como espao de governana e se ignora os diferentes territrios que

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    existem no interior do espao de governana, temos ento uma concepo reducionistade territrio, um conceito de territrio que serve mais como instrumento de dominaopor meio das polticas neoliberais. Nesta condio, uma determinada regio escolhidapara a aplicao de polticas de desenvolvimento, em grande parte, a partir dosinteresses do capital. Evidente que pelo fato das comunidades camponesas terem menorpoder poltico, tero pouco poder de deciso na determinao das polticas, por mais

    que o discurso das instituies defenda o empoderamento das comunidades rurais.Desse modo, as polticas promovem o fortalecimento das relaes capitalistas emdetrimento das relaes no capitalistas ou familiares e comunitrias. Intensifica-se,dessa forma, as polticas de expropriao das comunidades rurais, que perdem seusterritrios para o capital que necessita se apropriar continuamente dos territrioscamponeses para se expandir.

    Temos ento uma disputa territorial entre capital e campesinato. As propriedadescamponesas e as capitalistas so territrios distintos, so totalidades diferenciadas, ondese produzem relaes sociais diferentes, que promovem modelos divergentes dedesenvolvimento. Territrios camponeses e territrios capitalistas como diferentesformas de propriedades privadas disputam o territrio nacional. Para se compreenderessa disputa importante uma anlise dos nveis e escalas territoriais: o primeiroterritrio e o segundo territrio. O primeiro territrio formado pelos espaos degovernana em diferentes escalas: nacional, regional, estadual, municipal, distrital. Osegundo territrio formado pelos diferentes tipos de propriedades particulares. Porexemplo: o segundo territrio uma frao do primeiro territrio, ou seja os diferentestipos de propriedades so fraes do territrio municipal, que uma escala do primeiroterritrio. Este frao do territrio estadual, que por sua fez frao do territrionacional. Na figura 1, procuramos ilustrar esse exemplo.

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    Figura 1 Tipos de territrios Org. Bernardo Manano Fernandes/Eduardo Paulon Girardi

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    A partir dessa tipologia pode-se compreender as conflitualidades entre modelos dedesenvolvimento que disputam territrios, condio essencial para a sua expanso.Estamos nos referindo especialmente aos modelos de desenvolvimento do agronegcio,resumidamente a partir da produo de monoculturas em grande escala, com trabalhoassalariado, intensamente mecanizado e com utilizao de agrotxicos e sementestransgnicas. E ao modelo de desenvolvimento do campesinato ou agricultura familiar,

    resumidamente a partir da produo de policulturas, em pequena escala, compredominncia do trabalho familiar, com baixa mecanizao, em sua maior parte, combase na biodiversidade sem a utilizao de agrotxicos. Esses modelos disputamterritrios, produzindo o segundo territrio no interior do primeiro territrio. A disputado segundo territrio tambm a disputa do primeiro territrio. Embora sejamdiferentes, esto no mesmo espao geogrfico municipal, que est no espao geogrficoestadual e este, por sua vez, est no espao geogrfico nacional, formando amultiterritorialidade. Esses modelos de desenvolvimento determinam a organizao doespao geogrfico, por meio da produo de territrios, gerando e intensificandoconflitualidades que so insolveis por causa da hegemonia do modo capitalista deproduo.

    Reafirmamos, o territrio uma totalidade mas no uno. Conceber o territrio comouno compreend-lo apenas o espao de governana, que um tipo de territrio eignorar os outros tipos de territrios. Mais uma vez importante lembrar quecompreender o territrio como totalidade fundamental para se entender suamultidimensionalidade e sua multiterritorialidade. Enfatizamos que todas as unidadesterritoriais formam totalidades por conterem em si todas as dimenses dodesenvolvimento: poltica, econmica, social, cultural e ambiental. Como os territriosso criaes sociais, temos vrios tipos de territrios, que esto em constanteconflitualidade. Considerar o territrio como uno uma opo para ignorar suasconflitualidades.

    2 Tipos de territrios

    Para superar a compreenso do territrio como uno, singular, discutimos diferentesformas do territrio, como pluralidade. Temos territrios materiais e imateriais: osmateriais so formados no espao fsico e os imateriais no espao social a partir dasrelaes sociais por meio de pensamentos, conceitos, teorias e ideologias. Territriosmateriais e imateriais so indissociveis, porque um no existe sem o outro e estovinculados pela intencionalidade. A construo do territrio material resultado de umarelao de poder que sustentada pelo territrio imaterial como conhecimento, teoria eou ideologia. Em nossa anlise, consideramos trs tipos de territrios materiais: oprimeiro territrio formado pelo pas, estados e municpios; o segundo territrioformado pelas propriedades privadas capitalistas ou propriedade privadas nocapitalistas; o terceiro territrio formado por diferentes espaos que so controlados porrelaes de poder. Estes so territrios fluxos ou mveis controlados por diferentessujeitos e so produzidos nos territrios fixos do primeiro e do segundo territrio.

    Primeiro territrio o territrio do Estado e suas unidades territoriais internas: pas,estados e municpios. So nestes que se organizam todos os outros territrios:propriedades particulares individuais e propriedades comunitrias (segundo territrio),que so territrios fixos. Nos territrios dos municpios so organizados territriosfluxos, cujas fronteiras se movimentam de acordo com as aes institucionais e as

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    conflitualidades. Exemplos de territrios fluxos ou mveis so espaos controlados pordiferentes formas de organizao, por exemplo: narcotrfico, prostitutas, etc6. Outrostipos de territrios mveis ou fluxos so navios e outras embarcaes e os diferentestipos de meios de transporte.

    Neste artigo destacamos a formao do segundo territrio. O princpio da

    multidimensionalidade permite a compreenso que o processo de formao do territrioimplica em conceber sua rea, seus recursos e as relaes que os transformam. Osegundo territrio pode ser contnuo ou descontnuo, pertencer a uma pessoa ouinstituio ou a diversas pessoas ou instituies. A caracterizao fundamental arelao social que o produz. O segundo territrio pode ser um todo ou parte, pode seruma casa ou parte dela; uma empresa ou parte, uma universidade ou parte, uma igreja,um sindicato etc. Descontnuo, pode estar organizado em redes, ou as redes podem ligardiferentes territrios. A constituio desses tipos de territrios acontece por relaes depoder em disputa no primeiro territrio. A soberania uma qualidade ou propriedadeexclusiva de todos os tipos de territrio. Embora no seja ininterrupta, a soberania estsempre em questo por meio da conflitualidade na disputa territorial no interior doterritrio da nao. A conflitualidade concebida como um conjunto de conflitos queconstitui um processo gerador e indissocivel do desenvolvimento na disputa territorial. um processo de enfrentamento permanente que explicita o paradoxo das contradiese as desigualdades do sistema capitalista, evidenciando a necessidade do debateconstante, nos planos tericos e prticos, a respeito do controle poltico produzindoespaos e territrios heterogneos.

    Os territrios dos pases so disputados pelas empresas transnacionais que controlam ouparticipam do controle de imensas reas do primeiro e do segundo territrio. Doisexemplos podem ser observados nas figuras abaixo.

    Figura 2 crtica territorializao dastransnacionais, por meio de compra de terras

    para controle do mercado de agrocombustveis.Fonte: Jornal Brasil de Fato, 4 de dezembro de 2007.

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    Figura 3 Propaganda da Transnacional Syngenta representando rea de quatro pases

    onde predomina o monocultivo da soja.Fonte: Evia, 2006.

    Os movimentos camponeses e indgenas tm resistido a esse processo, disputandoterritrios com as empresas capitalistas. No Brasil, a Via Campesina ocupou umapropriedade da transnacional Syngenta como forma de protesto ao processo deterritorializao da empresa. Na figura 4, observa-se a ocupao de uma propriedade daSyngenta no municpio de Santa Teresa do Oeste no Estado do Paran.

    Figura 4 Movimentos campesinos vinculadoa Via Campesina ocupam propriedade da Syngenta.

    Fonte: arquivo MST.

    Uma classe no se realiza no territrio de outra classe. Por essa razo, os territrios doagronegcio e os territrios campesinos e indgenas so distintos. Os territrios docampesinato e os territrios do agronegcio so organizados de formas distintas, a partirde diferentes relaes sociais. Um exemplo importante que enquanto o agronegcio

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    organiza seu territrio para produo de mercadorias, o grupo de camponeses organizaseu territrio, primeiro, para sua existncia, precisando desenvolver todas as dimensesda vida. Esta diferena se expressa na paisagem e pode ser observada nas distintasformas de organizao dos dois territrios. A paisagem do territrio do agronegcio homogneo, enquanto a paisagem do territrio campons heterogneo. A composiouniforme e geomtrica da monocultura se caracteriza pela pouca presena de pessoas no

    territrio, porque sua rea est ocupada por mercadoria, que predomina na paisagem. Amercadoria a expresso do territrio do agronegcio. A diversidade dos elementos quecompem a paisagem do territrio campons caracterizada pela grande presena depessoas no territrio, porque neste e deste espao que constroem suas existncias,produzindo alimentos. Homens, mulheres, jovens, meninos e meninas, moradias,produo de mercadorias, culturas e infra-estrutura social, entre outros, so oscomponentes da paisagem dos territrios camponeses.

    Compreender essa tipologia de territrios fundamental para o uso mais amplo doconceito. Se por um lado, o uso do conceito de territrio possibilitou a superao deleituras setoriais, por outro lado, predominam as leituras de territrios nicos queignoram as conflitualidades, que promovem as disputas territoriais.

    3 Territrios em disputa

    Em um ensaio publicado em 2002, Milton Santos fez a seguinte afirmao:

    A Geografia alcana neste fim de sculo a sua era de ouro, porque a geograficidade seimpe como condio histrica, na medida em que nada considerado essencial hoje se

    faz no mundo que no seja a partir do conhecimento do que Territrio. O Territrio o lugar em que desembocam todas as aes, todas as paixes, todos os poderes, todasas foras, todas as fraquezas, isto onde a histria do homem plenamente se realiza a

    partir das manifestaes da sua existncia. A Geografia passa a ser aquela disciplinamais capaz de mostrar os dramas do mundo, da nao do lugar (SANTOS, 2002, p. 9).

    Como destacamos na introduo deste ensaio, o Territrio passou a ser conceito centralde temas de estudos de algumas cincias como sociologia, economia, histria emedicina. A antropologia, direito, cincia poltica e biologia, em geral, utilizam oTerritrio como conceito central em suas anlises. Mesmo na geografia, o Territrioganhou mais espao que o Espao, a Regio e o Lugar. Um dos ltimos livrospublicados por Milton Santos tem como ttulo: O Brasil: Territrio e sociedade noincio do sculo XXI. Enquanto nos anos 1980 e at meados de 1990, dedicou-sepredominantemente s reflexes sobre o Espao. Questionado sobre esta mudana,afirmou que:

    O territrio com muita freqncia e fora usado pelos homens da cincia poltica, pelos juristas, pelos antroplogos -, sempre visto como uma coisa inerte, onde asaes dos homens se do. Mesmo quando se considera o territrio como contendo

    populao, produo econmica, movimento dos homens e das mercadorias etc.,quando falamos na relao sociedade-espao, sociedade-territrio, no vamos oterritrio realmente como condicionante. Isso me preocupou porque, sobretudo com aglobalizao, com a competitividade, as empresas so terrivelmente sequiosas delocalizaes que lhes aumentem o lucro e o poder (SANTOS, 2004, p. 34).

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    Estes dois fatos chamaram minha ateno: a intensificao da territorializao do capitalcom a globalizao e a emergncia do conceito de territrio, que em muitos estudospassou a substituir o conceito de espao. Em meus estudos sobre a formao da ViaCampesina tambm os elegi em minha agenda de pesquisas como tema de reflexoterica. Compreendo que estes dois fatos esto associados. O avano das polticasneoliberais e seus ajustes estruturais provocaram pelo menos duas mudanas

    significativas na sociedade: a minimizao do Estado e a maximizao do capital natomada de decises a respeito das polticas de desenvolvimento e por conseguinte dosterritrios. Esta realidade mais bem compreendida com a crise do socialismo econseqentemente dos governos de esquerda, cujas polticas de desenvolvimento estoatreladas expanso do mercado capitalista globalizado como a possibilidadeeconmica para o desenvolvimento. O capital maximizado determina ainda mais osrumos das polticas de desenvolvimento, enquanto o Estado minimizado assiste, muitasvezes passivo, a criao de leis e polticas que beneficiam muito mais os interesses dasempresas capitalistas nacionais/transnacionais do que os interesses da sociedade.Especialmente no campo, as tomadas de decises para o desenvolvimento tm sidodeterminadas pelos interesses das empresas nacionais/transnacionais. Por meio de suasthink tanks so elaborados projetos de desenvolvimento e leis que viabilizam a suaexecuo, contando com apoio poltico e muitas vezes com o apoio econmico doEstado. Esta realidade tem gerado e intensificado as desigualdades sociais, por meio daexcluso, expropriao territorial e controle social da maior parte da populao rural,com a precarizao das relaes de trabalho, desemprego estrutural e destruio deterritrios camponeses e indgenas.

    Tomamos essa conjuntura poltica como referncia para discutir a emergncia doTerritrio no mbito das polticas neoliberais. Esta urgncia do conceito de territriopode ser associada a precarizao das relaes de trabalho, ao desemprego estrutural e adestruio dos territrios camponeses e indgenas, por meio da acumulao porespoliao (HARVEY, 2004, p. 121). A utilizao do conceito de territrio a partir dosprincpios e da significao defendidas neste artigo nos possibilita compreender osprocessos que transformam os diferentes tipos de territrios. Isto significa ter umacompreenso e posio terica e poltica na interpretao dessas realidades. Com aemergncia e a expanso dos estudos sobre os territrios, diferentes interpretaes econtrovrsias geraram uma panacia, j que o conceito de territrio passou a serutilizado como frmula mgica para tratar de projetos de desenvolvimento regionais. Namaior parte dos estudos que hoje denominado de territrio so espaos geogrficosque j foram chamados de microrregies7. A Cincia Geogrfica tem a responsabilidadede contribuir intensamente com o com as leituras das diferentes anlises. Alguns dessesestudos que tm o Territrio como conceito central so influenciados por gegrafos queparticiparam ou so referncias tericas8. Em outros, os estudos geogrficos soignorados e o Territrio, muitas vezes, usado apenas como metfora9.

    Nas dcadas de 1980 e 1990, principalmente, muitos gegrafos viveram uma tristeexperincia no uso conceitos sociolgicos e econmicos como metforas. Essautilizao inconseqente resultou numa dependncia terica da geografia s outras

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    disciplinas. Para aplicao de um conceito de outra cincia preciso compreender seusfundamentos e seus princpios. So poucos os estudos sobre territrios que se utilizamdas teorias geogrficas. Em alguns casos h ate mesmo a proposta de utilizao doterritrio no como conceito, mas como instrumento. Por exemplo, Schneider eTartaruga defendem

    a necessidade de se distinguir o uso e o significado do territrio como um conceito deanlise, tal como lhe confere a geografia e outros disciplinas como a antropologia ou abiologia, dos sentidos instrumentais e prticos que lhe so atribudos pelos enfoques ouabordagens territoriais [...]A diferena fundamental entre o uso e o significadoconceitual e instrumental do territrio que o sentido analtico requer que seestabeleam referncias tericas e mesmo epistemolgicas que possam ser submetidasao crivo da experimentao emprica e, depois, reconstrudos de forma abstrata eanaltica. O uso instrumental e prtico no requer estas prerrogativas e, por isso, pode-se falar em abordagem, enfoque ou perspectiva territorial quando se pretende referir aum modo de tratar fenmenos, processos, situaes e contextos que ocorrem em umdeterminado espao (que pode ser demarcado ou delimitado por atributos fsicos,naturais, polticos ou outros) sobre o qual se produzem e se transformam.

    Neste sentido, comum que o territrio perca seu sentido heurstico e conceitual e passe a ser utilizado como sinnimo de espao ou regio, conforme o caso. [...] oterritrio passa a ser utilizado numa perspectiva de desenvolvimento; ou seja, comouma varivel a ser considerada quando se pretende fazer algum tipo de intervenosobre o espao e as populaes que resultem em alteraes do quadro existente. Dessemodo, a abordagem territorial do desenvolvimento pressupe a ao sobre o espao e amudana das relaes sociais nele existentes. Portanto, seus objetivos so,

    prioritariamente, instrumentais e prticos e, por esta razo, no se pode reivindicar oureclamar das perspectivas ou abordagens territoriais por serem a-tericas, (sic) pois

    foi exatamente com esta finalidade que foram elaboradas. A tentativa de buscar referncias espaciais e conferir-lhes poder de explicao causal parece ser uma tendncia recente (talvez uma moda) que cresce em vrias disciplinasdas cincias sociais, notadamente na economia, na sociologia e na cincia poltica. (SCHNEIDER & TARTARUGA, 2005, p. 14)

    De acordo com a reflexo apresentada na primeira parte deste texto, a distinopretendida por Schneider e Tartaruga em isolar o significado do conceito de seu usoseria como separar a teoria da prtica ou o sujeito do objeto. O sujeito por meio de suaintencionalidade determina o significado que determina o uso. Esses procedimentos soindissociveis, so diferentes e inseparveis. Como explicitamos, a intencionalidadetambm se manifesta nas opes que os cientistas fazem na definio do significado doconceito de territrio. Antroplogos exploram mais a dimenso cultural, bilogosestudam mais a dimenso ambiental. Socilogos e economistas tambm estoexplorando apenas algumas das dimenses do territrio, principalmente as dimenseseconmicas e sociais. Como salientamos cada dimenso possui as outras, de modo quemesmo que enfatizamos uma dimenso fundamental considerar os desdobramentosnas outras dimenses. As dimenses s so completas neste sentido, ou seja,relacionando sempre a dimenso poltica com todas as outras dimenses: a social, aambiental, a cultural, a econmica etc. Neste mesmo sentido pode se compreender asformas de organizao dos diversos tipos de territrio em vrias escalas geogrficas.Estes procedimentos constituem a multidimensionalidade e a multiescalaridade quecaracterizam a sustentabilidade dos territrios. A partir desses princpios no difcil

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    compreender o uso do conceito de territrio ao se falar dos monoculturas paraexportao que se territorializam rapidamente em todo o mundo, desterritorializandocamponeses e indgenas. Para defender grandes extenses de monocultivo, as empresasno se podem utilizar o princpio da multidimensionalidade. Por esta razo, o conceitode territrio aqui utilizado um obstculo para as empresas que exploram grandes reasmonocultoras, porque se preocupam apenas com as dimenses poltico-econmicas de

    seus territrios, como discute Porto-Gonalves, 2007.Afirmar que se pode utilizar o Territrio apenas como recurso instrumental e prtico nasabordagens e enfoques soa um tanto estranho. O territrio no um instrumento.Instrumentos so objetos da metodologia. O Territrio um conceito e uma categoria, um objeto do mtodo e da teoria, portanto no so a-tericos. Vale reafirmar que oTerritrio espao apropriado, espao feito coisa prpria, enfim, o territrio institudo por sujeitos e grupos sociais que se afirmam por meio dele. Assim, h,sempre, territrio e territorialidade, ou seja, processos sociais de territorializao.

    Num mesmo territrio h, sempre, mltiplas territorialidades (PORTO-GONALVES, 2006, p. 5. O Territrio no uma tcnica, muito menos uma noofechada, acabada, determinada. No pode ser naturalizado, instrumentalizado,aparelhado. O sentido do uso do uso do conceito de territrio o poltico, que tem comoessncia a liberdade. esta liberdade que oferece condio para que Schneider eTartaruga afirmem ser necessrio instrumentalizar o territrio. Esta condio tambmpermite que os autores revelem suas intencionalidades.

    A emergncia do conceito de territrio ainda necessita de uma reflexo profunda. Porque o conceito de territrio passou a ser mais usado que o conceito de espao? Pararesponder esta pergunta necessria uma ampla pesquisa sobre polticas, teorias emtodos. Portanto, neste ensaio pretendo apenas apontar algumas idias construdas apartir de ampla bibliografia e trabalho de campo10. Os estudos sobre o desenvolvimentoterritorial rural podem ser classificados em duas tendncias: aqueles que partem doParadigma do Capitalismo Agrrio (PCA) e os que partem do Paradigma da QuestoAgrria (PQA). Para o PCA, as crticas ao capitalismo no ultrapassam os limites dosistema. As perspectivas do desenvolvimento territorial rural so compreendidas a partirdos modelos do modo de produo capitalista. Assim predominam estudos em que asreferncias so somente as relaes capitalistas. As perspectivas de modernizao sopara atingir modelos do sistema para as empresas, mercados, tecnologias e outraspolticas tendo como referncia a reproduo das relaes capitalistas. O PCA analisa ecria procedimentos metodolgicos para classificar as desigualdades sociais, mas noutiliza conceitos e procedimentos para estudar a conflitualidade gerada pelo confrontoentre as classes sociais. Por essa razo o conceito de territrio do PCA muito prximoao conceito de espao ou de regio, principalmente pela ausncia das anlises sobre ascontradies e as conflitualidades. Para o PQA, as crticas ao capitalismo ultrapassamos limites do sistema. As perspectivas do desenvolvimento territorial rural socompreendidas a partir da crtica aos modelos do modo de produo capitalista. Osestudos do PQA utilizam como referncias as contradies e as conflitualidades entrerelaes capitalistas e as relaes no capitalistas. As perspectivas de modernizaoprocuram criar modelos alternativos de organizaes, mercados, tecnologias e outraspolticas para superao da reproduo das relaes capitalistas. Esta condio coloca oPQA em desvantagem com relao ao PCA. Enquanto o PCA acompanha o movimento

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    da roda, o PQA procura reinvent-la. Neste ponto tem encontrado obstculos de ordemterica e poltica, por essa razo aprofunda suas criticas ao sistema que intensifica asdesigualdades sociais, explorando conceitos e procedimentos para estudar aconflitualidade gerada pelo confronto entre as classes sociais. Por essa razo o conceitode territrio do PQA tem maior relevncia sua dimenso poltica, do enfrentamentoentre as classes, distinguindo-se dos conceitos de espao e regio. Salvo, os casos em

    que os pensadores do PQA trabalham com o significado clssico de territrio comoespao de governana.

    Quando se desenvolve as anlises sobre uma realidade hegemnica, o conceito deterritrio s tem sentido como espao de governana, como territrio do Estado. Todosos outros espaos produzidos so espaos, regies e lugares. Portanto, ao se aceitar ahegemonia de neoliberalismo ou a hegemonia do Estado, desconsiderando ascontradies e as conflitualidades dessas realidades, melhor valer-se da significaoclssica de territrio. Uma anlise da realidade em que se considere o movimentocontnuo da conflitualidade pode-se observar diversos territrios e espaos. Osignificado de espao to amplo quando o de realidade, porque esta sua origem. Oespao e o tempo formam a realidade. Da, as mltiplas possibilidades de compreendere usar o espao. O Territrio no to flexvel. A abstrao do espao e a concretude doterritrio aparece nas reflexes de diversos gegrafos como por exemplo esta afirmao.Do ponto de vista epistemolgico, transita-se da vaguidade da categoria espao ao

    preciso conceito de territrio (MORAES, 2000, p. 17). Esta vaguidade pode serobservada nas consultas aos dicionrios, onde o verbete espao contm maisinformaes para explic-lo que o verbete territrio. A vaguidade a que se refereMoraes, confirmada por Santos, quando este entende que:

    A palavra espao utilizada em dezenas de acepes. Fala-se espao da sala, doverde, de um pas, de um refrigerador, espao ocupado por um corpo etc. (...) Palavrascomo vermelho, duro slido no tm seus significados colocados em dvida, estoassociados a experincias elementares. O que no acontece com a palavra espao,

    freqentemente substituda por lugar, territrio etc. A palavra mesmo muito utilizadacomo substantivo, assim espao do homem, do migrante, do sedentrio etc. (SANTOS, 1988, p. 71).

    O espao passou ser adjetivado pelo significado de suas dimenses. Por exemplo,utiliza-se o espao social como uma totalidade isolando-o de suas outras dimenses,como a cultural, econmica, ambiental, poltica etc. Esta fragmentao do espao podeacontecer com o territrio ao utiliz-lo tambm apenas por uma de suas dimenses, porexemplo territrio econmico, quando se considera a dimenso econmica do territriocomo uma totalidade, ignorando-se as outras dimenses. Nesta acepo, o Espao e oTerritrio muito se aproximam em suas significaes. So diferentes pelas definiesdadas pelos tericos. Mas as definies que determinam a significao tambmobedecem a imanncia das caractersticas e qualidades ou propriedades produzidas pelasrelaes na histria. Por exemplo, o poder uma caracterstica do espao e do territrio,todavia, a soberania uma qualidade ou propriedade exclusiva do Territrio. Com autilizao do conceito de espao, pode-se abordar as relaes de poder a partir dediferentes anlises dos sistemas de objetos e de aes. Na dcada de 1970, a publicaodo livro Espao e Poder do gegrafo Paul Claval foi uma importante referncia muitoutilizada para discutir esse tema (CLAVAL, 1979). Em 2007, Richard Peet publicouGeography of Power abordando as relaes de poder e espao. Nos dois livros, embora

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    os autores tratem do Estado, das relaes de poder, do capital e do trabalho, o Territriono aparece como conceito importante. Os conceitos de espao e territrio possibilitamleituras e compreenses distintas. Um no substitui o outro. Todavia, em algunstrabalhos esses conceitos no esto bem definidos e pode-se perder as diferenas.

    A globalizao com a hegemonia das polticas neoliberais provocou a emergncia do

    conceito de territrio em duas direes. Pelo PCA em que o significado de Territrio utilizado muito prximo ao conceito de espao ou de regio, principalmente pelaausncia das anlises sobre as contradies e as conflitualidades. Alguns exemplosdesse paradigma so os estudos financiados pelo Banco Mundial. Esta definio ocultauma forma de controle social das populaes que vivem nos territrios, com arealizao de polticas de subalternidade. Pelo PQA em que o ponto de partida doTerritrio a soberania, explicitada pela resistncia desterritorializao queacontecem por meio das polticas de desenvolvimento, evitando similitudes com oconceito de espao. Um excelente exemplo desse paradigma o livroLos Refugiadosdel Modelo Agroexportador: impactos del monocultivo de soja en las comunidadescampesinas paraguayas , coordenado por Toms Palau. As polticas neoliberais tmintensificado o processo de desterritorializao dos territrios no capitalistas dascomunidades campesinas e indgena ou de subalternidade dos territrios no capitalistaspor meio de empreendimentos realizados em parcerias entre o capital e o Estado. Noprimeiro caso, as empresas do agronegcio se territorializam por meio da monoculturapara exportao. No segundo caso, mantm o controle pelos empreendimentos,principalmente pelas tecnologias e pelo mercado. O capital administra o processo dedesterritorializao dos camponeses e tambm a sua reterritorializao com amercantilizao das polticas pblicas, como por exemplo a reforma agrria. O capitalvende territrios capitalistas para a produo de territrios no capitalistas. Este umexemplo do processo acumulao por espoliao (HARVEY, 2004, p. 115-148).

    Para discutirmos este processo de disputa territorial apresentamos um estudo sobre aparticipao dos territrios capitalistas e no capitalistas no campo brasileiros, ou seja oprimeiro e segundo territrios. Com a tabela 1, iniciamos nossa anlise sobre o primeiroterritrio e os diferentes espaos que o compem, entre eles o segundo territrio. Deacordo com Oliveira (2003, pp. 126-127), com base nos dados do Sistema Nacional deCadastro Rural, em 2003, o territrio brasileiro de 850,2 milhes de hectares teria aseguinte composio: 15% ou 128,5 milhes de hectares eram terras indgenas; 12% ou102,1 milhes de hectares eram unidades de conservao ambiental; 3,5% ou 29,2milhes de hectares formavam as reas urbanas, e as reas ocupadas por rios, rodovias eas posses. 69,5% ou 590 milhes de hectares eram ocupados por propriedades rurais,sendo 49,5% ou 420,4 milhes de hectares dos imveis cadastrados no InstitutoNacional de Colonizao e Reforma Agrria e 20% ou 170 milhes de hectaresformados por terras devolutas.

    Tabela 1 Brasil: ocupao das terras em milhes de hectaresTerras indgenas 128,5 15,0%

    Unidades de conservao ambiental 102,1 12,0%Imveis cadastrados no INCRA 420,4 49,5%

    reas urbanas, rios, rodovias e posses 29,2 3,5%Terras devolutas 170,0 20,0%

    Total 850,2 100%Fonte: adaptado de Oliveira (2003, pp. 126-127)

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    Na tabela 2, nos deteremos anlise do segundo territrio, ou seja os imveis ruraiscadastrados para compreendermos melhor as mudanas ocorridas na estrutura fundiriaentre 1992 e 2003. Considerando o cancelamento 93 milhes de hectares de ttulos deterras griladas em 1999, conforme anunciado no Livro Branco da Grilagem de Terra noBrasil, a rea das propriedades rurais cresceu 89 milhes de hectares entre 1992 e 2003.

    Tabela 2 Brasil: mudanas na estrutura fundiria 1992-2003Imveis em hectares 1992rea em milhes de ha. % 2003

    rea em milhes de ha. % Com mais de 200 (capitalista) 245 74 297 71

    Com menos de 200 (campesinos) 86 26 123 29Total 331 100 420 100Fonte: Atlas Fundirio Brasileiro, 1996; II PNRA, 2003. (Org.: Bernardo Manano Fernandes)

    Como defendemos neste artigo, os imveis capitalistas e os campesinos produzemrelaes sociais distintas: capitalistas e no capitalistas, sendo, portanto, territriosdistintos. Compreendemos que as relaes sociais produzem os territrios e soproduzidas por estes. Que os territrios so multidimensionais, onde se realizam todasas dimenses da vida, desde que, lgico, sejam desenvolvidas por projetos polticos.Nestes territrios temos diferentes formas de organizao do espao e do trabalho, comodemonstraremos adiante. Temos, portanto, duas relaes sociais que produzem doisterritrios distintos e, que para se expandirem, precisam destruir um ao outro ou sereproduzir ou se territorializar em outros territrios. Portanto, o territrio capitalista seterritorializa destruindo os territrios camponeses, ou destruindo territrios indgenas ouse apropriando de outros territrios do Estado. Os territrios camponeses seterritorializam destruindo o territrio do capital, ou destruindo territrios indgenas ouse apropriando de outros territrios do Estado. Enquanto a fronteira agrcola estiveraberta, esse processo continuar. Com o fechamento da fronteira agrcola, oenfrentamento entre os territrios camponeses e do capital ser intensificado.

    A tabela 2 nos possibilita uma boa noo desse enfrentamento. Em 1992 o capitalcontrolava 245 milhes de hectares ou 74% da rea dos imveis. Observe que esta reaaumentou para 297 milhes em 2003, mas a participao relativa caiu para 71%.Enquanto a participao relativa do territrio campons passou de 26% para 29%, ouem nmeros absolutos de 86 para 123 milhes de hectares. Como afirmamos, esteaumento de rea de ambos os territrios s foi possvel por que a fronteira agrcola estaberta. Um fator importante da territorializao do campesinato , sem dvida, a lutapela terra e as polticas de reforma agrria que possibilitaram a expanso dos territrioscamponeses. Todavia, a expanso e o refluxo dos territrios so resultados deconjunturas econmicas e com a nova onda da agroenergia, h a tendncia de expansoprincipalmente do territrio capitalista. Mas alm desta tendncia, o capital tem o poderde se territorializar mais rpido que o campesinato por causa das desigualdades geradaspelo modo de produo capitalista, que expropria o campesinato de seus territrios. Aterritorializao do campesinato ocorre predominantemente por meio da luta popular ede polticas pblicas.

    Por tudo isto, utilizamos o conceito de territrio como um espao de vida, ouparafraseando Ratzel, como um espao vital, compreendido pela suamultidimensionalidade. Como salientamos, a luta pela terra e a reforma agraria formamo principal fator de territorializao do campesinato no territrio nacional. Odesenvolvimento territorial e reforma agrria so processos indissociveis. Portanto, a

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    obteno de terras e o desenvolvimento dos assentamentos so processos inseparveis.O capital forma os seus territrios e se territorializa, ou seja, se expande multiplicando ocontrole de enormes reas em todas as regies. Na atualidade, no campo brasileiro, ocapital tem o nome de agronegcio, que procura se apropriar das terras e subalternizar ocampesinato atravs da terceirizao da produo (que muitos chamam de integrao)ou expropri-lo atravs da verticalizao da produo, controlando todos os sistemas

    que o compe.Pensar o territrio nesta conjuntura, deve-se considerar a conflitualidade existente entreo campesinato e o agronegcio que disputam territrios. Esses compem diferentesmodelos de desenvolvimento, portanto formam territrios divergentes, comorganizaes espaciais diferentes, paisagens geogrficas completamente distintas. Nestacondio temos trs tipos de paisagens: a do territrio do agronegcio que se distinguepela grande escala e homogeneidade da paisagem, caracterizado pela desertificaopopulacional pela monocultura e pelo produtivismo para a exportao; o territriocampons que se diferencia pela pequena escala e heterogeneidade da paisagemgeogrfica, caracterizado pelo freqente povoamento, pela policultura e produodiversificada de alimento principalmente para o desenvolvimento local, regional enacional; o territrio campons monopolizado pelo agronegcio, que se distingue pelaescala e homogeneidade da paisagem geogrfica caracterizado pelo trabalhosubalternizado e controle tecnolgico dascommodities que se utilizam dos territrioscamponeses.

    Esta realidade nos coloca, pelo menos, uma questo: o que desenvolvimento territorialpara esta diversidade de territrios? Por suposto, necessitamos de vrios modelos.Todavia, a tendncia dos governos pensar o desenvolvimento desde a perspectiva doagronegcio, porque este compreendido como a totalidade da qual a agriculturacamponesa ou familiar faria parte. Partir desta viso comear perdendo e terminarderrotado. O desenvolvimento territorial e a reforma agrria devem estar contidos noconjunto de interesses dos diferentes tipos de camponeses e, no que se refere reformaagrria, pensar os projetos de assentamentos como territrios. Um princpio importante pensar o desenvolvimento territorial como uma totalidade, em que se desenvolvemtodas as dimenses: poltica, social, cultural, ambiental e econmica, nonecessariamente nesta ordem, mas como um conjunto indissocivel. Desenvolvimento eterritrio so conceitos multidimensionais. Neste sentido, a reforma agrria um projetode desenvolvimento territorial. E ao mesmo tempo, a reforma agrria uma questonacional.

    Observando a tabela 1, compreendemos o controle territorial do agronegcio e docampesinato. Grosso modo, relacionando a tabela 2 e a tabela 3, podemos analisar queos tipos de assentamentos corresponderiam a aproximadamente metade da rea dosterritrios camponeses. Essa anlise enfatiza a importncia da luta pela terra e dareforma agrria da criao e recriao do campesinato e tambm nos coloca umconjunto de preocupaes.

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    Tabela 3 - Tipologia dos Assentamentos Brasil - 1985-2006Tipos N Assentamentos % N Famlias % rea %

    FLONA 12 0.15 3.675 0.41 4.268,006 6.85PE 612 7.68 49.957 5.55 2.373,453 3.81

    PAE 194 2.44 45.411 5.04 6.503,154 10.43PDS 77 0.97 22.875 2.54 2.912,305 4.67RDS 6 0.08 2.000 0.22 5.673,710 9.10

    RESEX 35 0.44 28.555 3.17 9.073,096 14.55PA 6.727 84.45 731.059 81.16 30.804,272 49.40

    OUTROS 303 3.80 17.267 1.92 742,627 1.19TOTAL 7.966 100.00 900,799 100.00 62.350,623 100.00

    Fonte: DATALUTA, 2007Florestas Nacionais FLONA; Projeto de Assentamento Estadual PE; Projetos Agroextrativistas PAE; Projetos deDesenvolvimento Sustentvel PDS; Reservas de Desenvolvimento Sustentvel RDS; Reservas Agroextrativistas RESEX;Projeto de Assentamento Federal PA; Outros correspondem diversos tipos projetos, por exemplo: projetos de colonizao eprojetos municipais de assentamentos.

    As RESEX, FLONA e RDS so projetos reconhecidos pelo INCRA como beneficirios dareforma agrria. Nestes projetos mais os projetos agroextrativistas foram assentadas 119.783famlias, apenas 13% das famlias assentadas no perodo, em 627 projetos, abrangendo uma reade 29 milhes hectares, 47% do total da rea destinada a reforma agrria. Os projetos deassentamento federal e estadual, que tm como caracterstica principal a desapropriao deterras para reforma agrria, foram responsveis pela criao de 92% dos assentamentosimplantados em todo pas, utilizando 53% da rea destinada a reforma agrria e assentando 87%das famlias. Os projetos estaduais e federais utilizaram apenas 4 milhes de hectares a mais doque os outros cinco projetos. Portanto, para este perodo compreendido desde o governo Sarneyao governo Lula, predominou a criao de projetos de assentamentos federais e estaduais.Observe-se que pelas prprias caractersticas dos tipos de assentamentos: agroflorestais eagropecurios, que as reas de seus territrios so quase equivalentes. A maior parte dosassentamentos agroflorestais e dos projetos reconhecidos est na Amaznia.

    Na tabela 4, pode-se observar que no primeiro mandado, o governo Lula implantou 2.270assentamentos onde foram assentadas 244.873 mil famlias em 29 milhes de hectares. Somenteos projetos agroextrativistas e os projetos reconhecidos pelo INCRA foram responsveis peloassentamento de 104.969 famlias, em 489 Projetos de Assentamento PAs, abrangendo umarea de 24 milhes de hectares. Estes projetos correspondem a 21% dos assentamentos criados,com 42% das famlias assentadas em 81% da rea total.

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    Tabela 4 - Tipologia dos Assentamentos Brasil - 2003-2006Tipos N Assentamentos % N Famlias % rea %

    FLONA 11 0.48 3.075 1.26 3.248,006 10.95PE 277 12.20 18.224 7.44 827,116 2.79

    PAE 177 7.80 39.103 15.97 4.976,843 16.77

    PDS 73 3.22 22.330 9.12 2.820,379 9.51RDS 5 0.22 1.500 0.61 4.341,239 14.63RESEX 29 1.28 27.341 11.17 8.046,392 27.12

    PA 1.504 66.26 121.680 49.69 4.753,188 16.02OUTROS 194 8.55 11.620 4.75 657,259 2.22TOTAL 2.270 100.00 244.873 100.00 29.670,422 100.00

    Fonte: DATALUTA, 2007Florestas Nacionais FLONA; Projeto de Assentamento Estadual PE; Projetos Agroextrativistas PAE; Projetos deDesenvolvimento Sustentvel PDS; Reservas de Desenvolvimento Sustentvel RDS; Reservas Agroextrativistas RESEX;Projeto de Assentamento Federal PA; Outros correspondem diversos tipos projetos, por exemplo: projetos de colonizao eprojetos municipais de assentamentos.

    Atravs desta leitura podemos constatar que o atual governo optou pela intensificao datendncia da poltica de assentamentos em reas da Amaznia. Esses projetos so criados pormeio de desapropriao, mas predominantemente pela regularizao fundiria. Esses projetosafetam lentamente a desconcentrao de terras no pas. Por outro lado, estes assentamentosimpedem, ao menos no mbito legal, o avano do agronegcio nas regies onde foramimplantados, pois as famlias assentadas nestas reas so responsveis pela preservao emanejo destas terras. Por outro lado, nas regies Nordeste e Centro-Sul as ocupaesintensificam a luta pela terra, pois so nessas regies que 90% das famlias lutam pela terra.

    Consideraes finais

    Neste artigo, procuramos contribuir com uma definio mais ampla de territrio queaquela que o compreende apenas como espao de governana. Neste sentido,desenvolvemos uma crtica e uma proposio a partir de uma tipologia de territrios. Apartir de diferentes exemplos, analisamos as disputas territoriais e conceituais. As idiasaqui apresentadas esto em aperfeioamento e so referncias importantes para seestudar o desenvolvimento territorial rural. Acreditamos ser importante oacompanhamento dos processos de territorializao dos diferentes tipos de territriosaqui apresentados para mapear as conflitualidades geradas pelas desigualdades dosistema capitalista.

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