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LÁZARO

REDIVIVO

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FRANCISCO CÂNDIDO XAVIER

LÁZARO

REDIVIVO

Pelo Espírito

IRMÃO X

FEDERAÇÃO ESPÍRITA BRASILEIRA

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Sumário

Lázaro Redivivo 9

1 – Ante o Amigo sublime da cruz 132 – A escrava do Senhor 173 – Carta aberta 234 – Aos médiuns 295 – Doce nome 336 – Quem avisa... 397 – Em ação de graças 438 – Conquista e liberdade 499 – Por amor a Deus 53

10 – O diabo 5711 – Grande Além 6312 – Mãe 6713 – Rogativa e ação 71

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14 – Assim passa... 7715 – Resposta do Além 8116 – O caso do rico 8717 – Lição em Jerusalém 9318 – Espírito farisaico 9919 – Caridade 10320 – Ouvindo o Mestre 10921 – Proteção e realidade 11522 – O sábio juiz 12123 – Advertência fraterna 12724 – No estudo da fé 13325 – A palavra do morto 13926 – Na edificação 14527 – Identificação do Espírito 14928 – Depois da ressurreição 15529 – Espírito desencarnado 16330 – Intercâmbio 16931 – Com franqueza de irmão 17532 – Buscando a verdade 18133 – Definindo rumos 18734 – Em aditamento 19335 – Retirou-se, Ele só 19936 – Na luta contra a morte 20537 – Aos espiritistas 21138 – Questão de provas 21739 – Serviço de investigação 22340 – O júri negativo 22741 – Adivinhações 233

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42 – Filosofia da dúvida 23943 – Desfazendo acusações 24344 – Resposta leal 24945 – O anjo da saúde 25546 – Desajustado 26147 – Parábola moderna 26748 – O discípulo ambicioso 27349 – Preparação familiar 27950 – Oração de um morto pelos

mortos 285

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Lázaro Redivivo

Conta-se que Lázaro de Betânia, depois deabandonar o sepulcro, experimentou, certo dia, fortessaudades do Templo, tornando ao santuário de Jerusalémpara o culto da gentileza e da camaradagem, emboraestivesse de coração renovado, distante das tricas infin-dáveis do sacerdócio.

Penetrando o átrio, porém, reconheceu a hosti-lidade geral.

Abiud e Efraim, fariseus rigoristas, miraram-nocom desdém e clamaram:

— É morto! É morto! Voltou do túmulo, insul-tando a Lei!...

Ambos os representantes do farisaísmo teocráti-co demandaram os lugares sagrados, onde se venerava

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o Santo dos Santos, num deslumbramento de ouro eprata, marfim e madeiras preciosas, tecidos raros e per-fumes orientais, espalhando a notícia. Lázaro de Betânia,o morto que regressara da cova, zombando da Lei e dosprofetas, trazia, ali, afrontosa presença aos pais da raça.

Foi o bastante para revolucionar fileiras compactasde adoradores, que oravam e sacrificavam, supondo-senas boas graças do Altíssimo.

Escribas acorreram apressados, pronunciando lon-gos e complicados discursos; sacerdotes vieram, furiosose rígidos, lançando maldições, e aprendizes dos misté-rios, com zelo vestalino, chegaram, de punhos cerrados,expulsando o irreverente.

— Fora! Fora!

— Vai para os infernos, os mortos não falam!...

— Feiticeiro, a Lei te condena!

Lázaro contemplava o quadro, surpreendido. Ob-servava amigos da infância vociferando anátemas, escri-bas que ele admirava com sincero apreço, vomitandopalavras injuriosas.

Os companheiros irados passaram da palavraà ação. Saraivadas de pedras começaram a cair em der-redor do redivivo, e, não contente com isso, o argutoAbsalão, velha raposa da casuística, segurou-o pela tú-nica, propondo-se encaminhá-lo aos juízes do Siné-drio para sentença condenatória, depois de inquéritohumilhante.

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O irmão de Marta e Maria, contudo, fixou noscircunstantes o olhar firme e lúcido, e bradou sem ódio:

— Fariseus, escribas, sacerdotes, adoradores daLei e filhos de Israel: aquele que me deu a Vida, temsuficiente poder para dar-vos a morte!

Estupor e silêncio seguiram-lhe a palavra.

O ressuscitado de Betânia desprendeu-se das mãosdesrespeitosas que o retinham, recompôs a vestimenta etomou o caminho da residência humilde de Simão Pedro, onde os novos irmãos comungavam no amorfraternal e na fé viva.

Lázaro, então, sentiu-se reconfortado, feliz...

No recinto singelo, de paredes nuas e coberturatosca, não se viam alfaias do Indostão, nem vasos doEgito, nem preciosidades da Fenícia, nem custosos ta-petes da Pérsia, mas ali palpitava, sem as dúvidas daCiência e sem os convencionalismos da seita, entre co-rações fervorosos e simples, o pensamento vivo de JesusCristo, que renovaria o mundo inteiro, desde a Teologiasectária de Jerusalém ao absolutismo político do Impé-rio Romano.

IRMÃO X

Pedro Leopoldo (MG), 22 de dezembro de 1945.

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LÁZARO REDIVIVO

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1Ante o Amigo sublime

da cruz

Hoje, Senhor, ajoelho-me diante da cruzonde expiraste entre ladrões...

Amigo sublime, digna-te abençoar as cruzes quemereço!...

De ti anunciou o profeta que te levantarias juntodo povo de Deus, como arbusto verde em solo árido;que não permanecerias, entre nós, como os príncipesencastelados na glória humana, e sim como homem dedor, experimentado nos trabalhos e sofrimentos; quepassarias na Terra, ocultando tua grandeza aos nossosolhos, à maneira de leproso humilhado e desprezível,mas que, nas tuas chagas e nas tuas pisaduras, sararíamos

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as nossas iniqüidades, redimindo nossos crimes; quepoderias revelar ao mundo a divindade de tua ascendên-cia, demonstrando o teu infinito poder e que, no entan-to, preferirias a suprema renúncia, caminhando como aovelha muda para o matadouro; e que, embora assina-lado como o Escolhido celeste, serias sepultado comoladrão comum... Acrescentou Isaías, porém, que, depoisde teu derradeiro sacrifício, novas esperanças desabro-chariam no plano escuro da Terra, através daqueles queseriam os teus continuadores, na abnegação santificante!...

E as tuas lágrimas, Senhor, orvalharam o desertode nossos corações, e as abençoadas sementes de teus ensi-namentos vivos germinaram no solo ingrato do mundo.

Mais de dezenove séculos passaram e tenho aindaa impressão de ouvir-te a voz compassiva, suplicandoperdão para os algozes...

Ah! Jesus, compadece-te de minhas fraquezas evem, ainda, balsamizar-me o coração ferido e desalenta-do! Ensina-me a despir a última roupagem de mundanaesperança, dá-me forças para olvidar as últimas ilusões!

Sem que merecesses, atravessaste o caminho dedor, suportando o madeiro da ignomínia! Ajuda-me,pois, a suportar o madeiro de lágrimas que mereço, noresgate de meus imensos débitos!

Amigo sublime, que subiste o monte da crucifi-cação, redimindo a alma do mundo, ensinando-nos, docume, a estrada de teu Reino, auxilia-me a descer parao vale fundo do anonimato, a fim de que eu veja as minhas

LÁZARO REDIVIVO

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próprias necessidades, na solidão dos pensamentoshumildes.

Mestre, que representa minha dor diante da tua?Quem sou eu, mísero pecador, e quem és tu, Mensa-geiro da Luz Eterna?

De quantas chagas necessita o meu frágil coraçãopara expungir os cancros seculares do egoísmo, e dequantos açoites precisarei para exterminar o orgulhoimpenitente?

Abre-me a porta de tuas consolações divinas,para que me renove à luz de tua bênção!

Não te peço, Senhor, como o rico da parábola, apermissão de voltar ao mundo, a fim de anunciar aosque ainda amo a grandeza de teu poder; entretanto,rogo o teu auxílio, para que me não falte visão no cami-nho redentor. Não posso precipitar-me no abismo quesepara a minha fragilidade da tua magnificência; toda-via, posso atravessá-lo, passo a passo, como peregrinode tua misericórdia. Coração oprimido e cansado pelassombras de minha própria alma, dá que me desfaça, semcusto, dos derradeiros enganos, antes de seguir maisfirmemente a teu encontro! Despojado de meus transi-tórios tesouros, mãos limpas das jóias que me fugiramdos dedos trêmulos, concede-me o bordão dos cami-nheiros aparentemente sem rumo, por se destinaremaos países ignorados do Céu!

Rendo-me, agora, sem condições, ao teu amorinfinito, confio-te minhas ansiedades supremas e meus

ANTE O AMIGO SUBLIME DA CRUZ

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sonhos mais ternos de lutador, e já que é necessárioabandonar o meu velho cântaro de fantasias, troca-mea túnica das últimas vaidades literárias pelo burel humil-de do viajor, interessado em atingir o berço distante,embora os atalhos difíceis e pedregosos!

Enche a solidão de meu espírito com a tua luz,como encheste de perdão, um dia, a noite de nossa igno-rância! Desvenda-me a tua vontade soberana, para que eume retire, sem esforço, das grades infelizes do caprichoterrestre! Ainda que eu não possa divisar todos os escani-nhos da nova senda, dá-me tua claridade misericordiosa,para que meus olhos imperfeitos não andem apagados.

Mestre, atende ao peregrino solitário que te fala,ao pé da cruz, com a dor sem revolta e com a amargu-ra sem desesperação!

Amigo sublime, Tu, que preferiste o madeiro dosacrifício, entre o mundo que te repelia e o Céu que tereclamava, por amor aos homens e obediência ao Pai,orienta-me na jornada nova! Se é possível, retira da cruza destra generosa que cravamos no lenho duro da ingra-tidão com as nossas maldades milenárias e abençoa-mepara o longo roteiro a percorrer!

Tenho a alma sombria e enregelado o coração!

E enquanto passam, inquietas, as multidõesociosas do mundo, no turbilhão de poeira envenenada,fala-me, Senhor, como falavas aos paralíticos e cegos deteu caminho:

— Levanta-te e vai em paz! A tua fé te salvou!...

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2Aescrava do Senhor

Quando João, o discípulo amado, veio ter comMaria, anunciando-lhe a detenção do Mestre, o coraçãomaterno, consternado, recolheu-se ao santuário da pre-ce e rogou ao Senhor supremo poupasse o filho querido.Não era Jesus o Embaixador divino? Não recebera anotificação dos anjos, quanto à sua condição celeste?...Seu filho amado nascera para a salvação dos oprimidos...Ilustraria o nome de Israel, seria o rei diferente, cheio deamoroso poder. Curava leprosos, levantava paralíticossem esperança. A ressurreição de Lázaro, já sepultado,não bastaria para elevá-lo ao cume da glorificação?

E Maria confiou ao Deus de Misericórdia suaspreocupações e súplicas, esperando-lhe a providência;entretanto, João voltou em horas breves, para dizer-lheque o Messias fora encarcerado.

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A Mãe Santíssima regressou à oração em silêncio.Em pranto, implorou o favor do Pai celestial. Confiarianele.

Desejava enfrentar a situação, desassombrada-mente, procurando as autoridades de Jerusalém. Mas,humilde e pobre, que conseguiria dos poderosos daTerra? E, acaso, não contava com a proteção do Céu?Certamente, o Deus de bondade infinita, que seu filhorevelara ao mundo, salvá-lo-ia da prisão, restituí-lo-ia àliberdade.

Maria manteve-se vigilante. Afastando-se da casamodesta a que se recolhera, ganhou a rua e intentoupenetrar o cárcere; todavia, não conseguiu comover ocoração dos guardas.

Noite alta, velava, súplice, entre a angústia e aconfiança.

Mais tarde, João voltou, comunicando-lhe as no-vas dificuldades surgidas. O Mestre fora acusado pelossacerdotes. Estava sozinho. E Pilatos, o administradorromano, hesitando entre os dispositivos da lei e as exi-gências do povo, enviara o Mestre à consideração deHerodes.

Maria não pôde conter-se. Segui-lo-ia de perto.

Resoluta, abrigou-se num manto discreto e tor-nou à via pública, multiplicando as rogativas ao Céu,em sua maternal aflição. Naturalmente, Deus modifica-ria os acontecimentos, tocando a alma de Ântipas. Nãoduvidaria um instante. Que fizera seu filho para receber

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afrontas? Não reverenciava a Lei? Não espalhava subli-mes consolações? Amparada pela convertida de Magdala,alcançou as vizinhanças do palácio do tetrarca. Oh! infi-nita amargura! Jesus fora vestido com uma túnica deironia e ostentava, nas mãos, uma cana suja à maneirade cetro e, como se isso não bastasse, fora tambémcoroado de espinhos!... Ela quis aproximar-se a fim delibertar-lhe a fronte sangrenta e arrebatá-lo da situaçãodolorosa, mas o filho, sereno e resignado, endereçou-lheo olhar mais significativo de toda a existência. Com-preendeu que ele a induzia à oração e, em silêncio, lhepedia confiança no Pai. Conteve-se, mas o seguiu em pran-to, rogando a intervenção divina. Impossível que o Painão se manifestasse. Não era seu filho o escolhido paraa salvação? Não era Ele a luz de Israel, o sublime reve-lador? Lembrou-lhe a infância, amparada pelos anjos...Guardava a impressão de que a Estrela brilhante, quelhe anunciara o nascimento, ainda resplandecia no Alto!...

A multidão estacou, de súbito. Interrompera-sea marcha para que o governador romano se pronuncias-se em definitivo.

Maria confiava. Quem sabe chegara o instante daordem de Deus? O Supremo Senhor poderia inspirardiretamente o juiz da causa.

Após ansiedades longas, Pôncio Pilatos, num es-forço extremo para salvar o acusado, convidou a turbafarisaica a escolher entre Jesus, o Divino Benfeitor, eBarrabás, o bandido. O coração materno asilou espe-ranças mais fortes. O povo ia falar e o povo devia muitas

A ESCRAVA DO SENHOR

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bênçãos ao seu filho querido. Como equiparar o Men-sageiro do Pai ao malfeitor cruel que todos conheciam?A multidão, porém, manifestou-se, pedindo a liberdadepara Barrabás e a crucificação para Jesus. Oh! — pensoua mãe atormentada — onde está o Eterno que não meouve as orações? Onde permanecem os anjos que me fala-vam em luminosas promessas?

Em copioso pranto, viu seu filho vergado ao pesoda cruz. Ele caminhava com dificuldade, corpo trêmu-lo pelas vergastadas recebidas e, obedecendo ao instintonatural, Maria avançou para oferecer-lhe auxílio. Conti-veram-na, todavia, os soldados que rodeavam o conde-nado divino.

Angustiada, recordou-se repentinamente deAbraão. O generoso patriarca, noutro tempo, movidopela voz de Deus, conduzira o filho amado ao sacrifício.Seguira Isaac inocente, dilacerado de dor, atendendo arecomendação de Jeová, mas eis que, no instante derra-deiro, o Senhor determinou o contrário, e o pai deIsrael regressara ao santuário doméstico em soberanotriunfo. Certamente, o Deus compassivo escutava-lheas súplicas e reservava-lhe júbilo igual. Jesus desceria doCalvário, vitorioso, para o seu amor, continuando noapostolado da redenção; no entanto, dolorosamentesurpreendida, viu-o içado no madeiro, entre ladrões.

Oh! a terrível angústia daquela hora!... Por quenão a ouvira o Poderoso Pai? Que fizera para não lhemerecer a bênção?

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Desalentada, ferida, ouvia a voz do filho, reco-mendando-a aos cuidados de João, o companheiro fiel.Registrou-lhe, humilhada, as palavras derradeiras. Mas,quando a sublime cabeça pendeu inerte, Maria recor-dou a visita do anjo, antes do Natal divino. Em retrospectomaravilhoso, escutou-lhe a saudação celestial. Misterio-sa força assenhoreava-se-lhe do espírito.

Sim... Jesus era seu filho, todavia, antes de tudo,era o Mensageiro de Deus. Ela possuía desejos humanos,mas o Supremo Senhor guardava eternos e insondáveisdesígnios. O carinho materno poderia sofrer, contudo,a vontade celeste regozijava-se. Poderia haver lágrimasem seus olhos, mas brilhariam festas de vitória no Reinode Deus. Suplicara aparentemente em vão, porquanto,certo, o Todo-Poderoso atendera-lhe os rogos, nãosegundo os seus anseios de mãe, e sim de acordo comos seus planos divinos!...

Foi então que Maria, compreendendo a per-feição, a Misericórdia e Justiça da vontade do Pai, ajoe-lhou-se aos pés da cruz e, contemplando o filho morto,repetiu as inesquecíveis afirmações:

— Senhor, eis aqui a tua serva! Cumpra-se emmim, segundo a tua palavra!

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A ESCRAVA DO SENHOR

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3Carta aberta

Meu amigo, soube que vocês esperaram,em Sebastianópolis, um escritor já morto, com grandeestardalhaço jornalístico.

À maneira do viajante que volta de longe, estra-nho na própria terra e irreconhecível aos seus, deveriaele descer de algum ônibus invisível e aparecer como fan-tasma autêntico, relacionando novidades e anedotas dopaís das sombras.

Segundo a tradição venerável do Evangelho, Jesusapareceu numa sala de portas cerradas, em Jerusalém,depois da ressurreição, mas somente aos discípulosamados, à luz da confiança na intimidade do coração,contando-se, ainda, que um deles, transformando-se,de chofre, em investigador renitente, avançou para o

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Mestre, apalpando-lhe as chagas ainda vivas, como se oCristo só pudesse ser identificado pelas feridas da cruz.

O escritor que vocês aguardavam, porém, era cha-mado a testemunho maior. Exigiam que ele retomasseos ossos carcomidos no apartamento de subsolo, ondeseu corpo descansa, e viesse para a via pública discutircom os sacerdotes, confundir os médicos, esclarecer ta-beliães e serventuários da justiça e mostrar, não somenteas úlceras exclusivamente a um amigo, mas todas as suasvísceras à curiosidade popular.

Francamente, a expectação de vocês estarrecia aqualquer, embora compreenda com que naturalidadeos vivos provocam os mortos, dentro do véu da carne,velho manto das ilusões.

Vocês, aí no mundo, enviam tantos amigos parao Céu e tantos inimigos para o inferno, tentando sub-verter a Justiça Divina, que não era demais requisitar apresença de um comentarista morto, recorrendo à justiçahumana. E, observando os apuros do escritor desencar-nado, recordei o artigo vigésimo das famosas instruçõesde Torquemada, segundo Llorente, que, por espírito decaridade na salvação dos hereges, recomendava aosinquisidores a exumação dos cadáveres dos escrevinha-dores impenitentes, para responderem aos processos delesa-fé, embora os réus só pudessem comparecer em ati-tude pouco higiênica, em virtude dos vermes que selhes apossavam dos ossos. Felizmente, porém, para atranqüilidade de todos nós, que já atravessamos as

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águas turvas do Aqueronte, e para honra da civilização,Tomás de Torquemada também já restituiu os despojosao campo de cinzas, há 447 anos. Não obstante esta cer-teza confortadora, impressionava-me o volume de opi-niões desconcertantes e das acusações lançadas a esmo.

Reclamavam vocês a presença do morto, comtodos os pormenores anatômicos e características psico-lógicas e, para tanto, pediam o apoio da organizaçãojudiciária, apesar da dificuldade para encontrar um mei-rinho habilitado a entregar mandados no “outro mundo”.

Muitos afirmavam que a providência estabeleceriaa vitória definitiva da verdade, como se a ressurreiçãodo Cristo não tivesse felicitado o espírito humano háquase vinte séculos. Outros queriam ver para crer, con-vencidos de que a fé representa construção fenomênica,sem bases no raciocínio e no coração. Não faltaram osque lambiam os beiços, esperando a surpresa final,transformando o respeitável estudo das questões dodestino e do ser em ruidosa luta de boxe, com o menos-prezo de todos os patrimônios espirituais que a civiliza-ção ajuntou, devagarinho, vertendo sangue e lágrimasnos conflitos evolutivos.

Dissuadam-se, porém, se é que ainda conservaminjustificável expectativa quanto aos demais.

Os mortos têm voltado em todos os tempos paraacalentar a esperança dos vivos de boa vontade, mas oshomens de má vontade estão cegos e é impossível curara cegueira voluntária, não obstante nossa dedicação

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CARTA ABERTA

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afetuosa aos companheiros de luta. Ainda mesmo queos desencarnados surgissem de inopino aos olhos dascriaturas humanas, em vista do entendimento rudimen-tar em que se encontram, recorreriam sem demora àsteorias de negação, criando recursos para novos ensaiosde dúvida palavrosa e brilhante.

Os fenômenos não saciam a sede espiritual, e asensação não substitui o trabalho necessário ao desen-volvimento. Convençam-se de que nenhum de nós con-fundirá as leis eternas. Nem a exigência de vocês e nema nossa afetividade poderão perturbar a ordem estabe-lecida. Todas as realizações legítimas pedem preparo eserviço, e você já pensou nas graves conseqüências dofato que pleiteavam, apaixonadamente? Que seria dosvivos, atolados até o pescoço nos interesses mesquinhosdo imediatismo terrestre, se os mortos andassem agoramaterializados, publicamente, exigindo-lhes a renovaçãoinstantânea que só o trabalho, o tempo e a experiênciapodem fornecer?

Desiluda-se, meu caro. Imensurável é a compai-xão do Senhor que jamais nos fulminará a pequenezde vermes com a revelação inopinada e integral de suagrandeza.

Além disso, vocês todos virão para cá. Ninguémfaltará na passagem silenciosa que alguns companheirosalegres costumam apelidar pitorescamente de “defunto-lândia”. Sem exceção de um só, lançar-se-ão às águaspesadas do velho rio da morte. Não importa a identifi-cação dos necrotérios onde vocês deixarão as vísceras

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cansadas... Conforta-nos, sobretudo, a certeza de quenos reuniremos uns aos outros, a fim de crescermos emsabedoria e compreensão.

Entretanto, recordando as antigas ilusões quetambém me dominaram, quando perambulei no vale desombras da carne, e notando a desvairada paixão comque se reclamava a presença do morto, ouso terminaresta carta com uma interrogação. Teriam vocês, de fato,bastante desassombro e serenidade para ver tranqüila-mente o fantasma e ouvir as revelações da morte?

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CARTA ABERTA

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4Aos médiuns

Desde o momento em que as irmãs Fox, emHydesville, começaram a suportar a ironia e a suspeitado próximo, por haverem estabelecido uma nova mo-dalidade de comunicação com o Além, vocês todos, meusamigos, foram assinalados pelo mesmo destino.

Para os cristãos dos tempos apostólicos, não che-gavam as cordas e as cruzes; para vocês, é preciso inven-tar novo gênero de sarcasmo e zombaria. Não basta oridículo, faz-se necessária a perseguição.

Os soldados, no campo de batalha, mormente osque suportam a metralha da frente, adquirem vantagensperante as forças políticas que representam e, se feridos oumutilados, recebem especial consideração. Vocês, toda-via, combatentes pela vitória da espiritualidade, não

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gozarão semelhantes prerrogativas no mundo, porquea tarefa representativa de que são portadores obedece atítulos que vêm de mais alto.

Os sacerdotes das várias confissões religiosas daTerra, diplomados na cultura do século, desfrutarão ga-rantias sociais respeitáveis em seu ministério de orientaçãodas almas, ligados aos interesses temporais das facções aque servem, mas vocês lutarão nas vanguardas de trabalhopela restauração da fé viva e não terão horas de lazer,nem privilégios estabelecidos. Em atividade permanen-te para reduzir a invasão das sombras, chorarão em si-lêncio porque, como poucos, vocês conhecem as doresindizíveis e irremediáveis que não podem ser narradaspela boca para serem extintas no coração. Servirão semtréguas, observados atentamente pela crueldade dos inimigose ameaçados pela imprudência de muitos amigos, quenão sabem onde situar o entusiasmo e o retraimento.

Porque os olhos de vocês divisam outros domí-nios vibratórios e os ouvidos registram sons que a maio-ria dos mortais não percebe, a calúnia lhes rondará aporta do lar, o ridículo seguir-lhes-á o nome. Por umamigo sincero, terão mil adversários gratuitos, e se caí-rem exânimes no combate silencioso, devido às defi-ciências e limitações corporais, muitos daqueles quelhes sorriam ontem perguntarão, maliciosos, se vocêsatraiçoaram o mandato recebido. Muitas vezes, se osono e as exigências do organismo dilatarem a pausa derepouso, indispensável ao mecanismo das células físicas,serão acusados de maus irmãos.

LÁZARO REDIVIVO

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Por isso, muitos de vocês se retraem ao santuáriodoméstico, onde as glórias da confiança e do amor sãolauréis imperecíveis da alma. Entretanto, sempre chegaráo dia de enfrentar a longa e espessa floresta humana,onde os encarnados, em maioria, se batem como javalisferozes, uns com os outros.

Não duvidem. As horas difíceis soarão sempre e énecessário armar o coração para os grandes testemunhos.

Consolem-se na certeza de que não sofrem inu-tilmente. Tempo virá em que os homens compreenderãoque a mediunidade não está circunscrita a determinadosseres. Todas as criaturas são instrumentos do bem oudo mal, médiuns do plano superior ou inferior, nocampo infinito da vida. Ninguém foge à corrente deinspiração com que sintoniza. E todos os que marcha-ram na vanguarda da verdade e da luz sofreram o assé-dio da mentira e da treva, não obstante a sua condiçãode instrumentos da Providência Divina para o aperfei-çoamento e felicidade do mundo.

Localiza-os a História, em todos os tempos.

Giordano Bruno foi queimado por ensinar as Leisda Natureza. Galileu morreu cego, depois de sofrer, jáseptuagenário, escandalosas acusações por divulgaralguns detalhes das maravilhas celestes. Jan Hus, o pre-cursor da Reforma, experimentou a fogueira. Gutenbergfoi processado, entre dissabores e vicissitudes, termi-nando a existência em extremo infortúnio, na compa-nhia de um clérigo que o recolheu caritativamente.

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AOS MÉDIUNS

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LÁZARO REDIVIVO

Pestalozzi, a princípio, era considerado mau aluno.Edison suportou o sarcasmo de técnicos e acadêmicosdos últimos tempos. Pasteur, em certa ocasião, nacadeira de Química do Instituto de Dijon, foi tido pormedíocre. Para que intensificar as citações? Quase to-dos os que pugnaram com Jesus pelo mundo melhor,nos primeiros séculos do Cristianismo, receberam bofe-tadas e açoites, devassas e confiscações, pedradas de ingra-tos e insultos de ignorantes, servindo de pasto a feras,gemendo nos cárceres ou atados em postes de martírio.E como só a objetiva do tempo consegue fixar as verda-deiras imagens do bem, as gerações posteriores exalta-ram-lhes os sacrifícios, aureolando-lhes o nome de glóriauniversal.

Trabalhem e sofram, pois, amando a tarefa a quese consagraram, não só pelo resgate do passado, senãotambém pela sublime alegria de iluminação do presente.Lutem e esperem. Não somente vocês, mas todos oshomens devotados ao trabalho construtivo e redentordo mundo, estejam na pobreza ou na prosperidade, nasArtes ou nas Ciências, nas letras dos livros ou nas leirasdos campos, são missionários da elevação da Terra, nãoa serviço das dominações efêmeras do planeta, mas emvaliosa cooperação com aquele Rei coroado de espinhos.