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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI LUCIANA NORONHA PEREIRA MORFOLOGIA URBANA E ATRATIVIDADE DE DESTINAÇÕES TURÍSTICAS: a importância da imagem na compreensão do sistema turístico da Vila de Alter do Chão (Santarém-PA) Balneário Camboriú 2007

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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI

LUCIANA NORONHA PEREIRA

MORFOLOGIA URBANA E ATRATIVIDADE DE DESTINAÇÕES TURÍSTICAS: a importância da imagem na compreensão do sistema

turístico da Vila de Alter do Chão (Santarém-PA)

Balneário Camboriú 2007

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LUCIANA NORONHA PEREIRA

MORFOLOGIA URBANA E ATRATIVIDADE DE DESTINAÇÕES TURÍSTICAS: a importância da imagem na compreensão do sistema

turístico da Vila de Alter do Chão (Santarém-PA)

Dissertação de mestrado apresentada como requisito parcial para a obtenção do título de Mestre em Turismo e Hotelaria ao Programa de Mestrado Stricto Sensu em Turismo e Hotelaria da Universidade do Vale do Itajaí, no Centro de Educação de Balneário Camboriú.

Orientador: Prof. Francisco Antônio dos Anjos, Dr.

Balneário Camboriú 2007

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Todas as coisas exibem rostos, o mundo não é apenas uma assinatura codificada para ser decifrada em busca do significado, mas uma fisionomia a ser encarada. Como formas expressivas, as coisas falam, mostram as configurações que assumem. Elas se anunciam, atestam sua presença: ‘olhem, estamos aqui’.

James Hillman (1993)

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AGRADECIMENTOS

Primeiramente agradeço à Deus, pela vida, pela fé e a força no caminho escolhido que só é possível pela confiança que a Sua onipotência e onipresença constitui.

À minha família, em especial minha mãe Regina, que tantas vezes foi a voz de Deus ao meu coração com seu amor, força, dedicação e compreensão. Da mesma forma, agradeço também a meu irmão Daniel e minha avó Áurea pela compreensão da ausência, pelo apoio e amor incondicional. Ao meu pai João, agradeço pelos ensinamentos e pela lição de superação dados, ainda que de forma inconsciente.

Dedico agradecimentos especiais a Francisco Antônio dos Anjos, meu orientador, incentivador e crítico, cuja atenção, dedicação, paciência, confiança e oportunidades de aprendizado e aperfeiçoamento acadêmico, tornaram possíveis a continuidade deste mestrado, enquanto projeto de vida.

Aos professores, pesquisadores e alunos dos grupos de estudo e pesquisa que em muito contribuíram para a discussão, evolução e maturação de idéias que acabaram por influenciar este estudo.

Aos professores, funcionários e estagiários do mestrado em Turismo e Hotelaria, pelas contribuições, pelo apoio e paciência.

Aos membros da Banca de Qualificação que, com suas preciosas considerações, forneceram novos elementos e influenciaram novas escolhas e direcionamentos no percurso do desenvolvimento deste tema e pesquisa.

Aos colegas da turma do mestrado 2005 pelo companheirismo, por compartilharmos as mesmas ansiedades e aflições, pelos ensinamentos de persistência e segurança nos propósitos e na construção de idéias. À Roberta Oliveira, bolsista PIPG que auxiliou no desenvolvimento das pranchas e material gráfico sobre a área urbanizada da Vila. Ao Rodolfo Araújo pela amizade e pelo apoio e colaboração nas correções dos textos em inglês.

Ao Sebrae-PA pela oportunidade de conhecer e trabalhar em prol do desenvolvimento turístico da região de Santarém, e de assim ter acesso ao intrigante objeto de pesquisa que é Alter do Chão.

À Secretaria Municipal de Turismo de Santarém pela atenção e pelo material tão cordialmente cedido. À comunidade de Alter do Chão com seu amor pela Vila e por seus costumes - exemplos de cidadania e de auto-estima em ser amazônica - que sempre me recebeu e abriu as portas de seu lindo lugar, ajudando e apoiando o desenvolvimento desta pesquisa. Dentre os residentes da Vila, agradecimentos especiais à Neila Garcia e Romário Castelo por seu decisivo apoio na localização de residentes e turistas para a realização das entrevistas.

Agradecimentos também aos amigos Gabriela Roehrs, Joseane Formighieri, Daiane e Carla Bez, Thiago Hungaro, Camila Macagnan, Rodolfo e Nil Souza, Nedilo Xavier, Carla Krug, Iuri Melo, Clóvis Vargas, Daniel Junqueira, Anna Rigobello, Jô Costa e todos os que de uma maneira ou de outra participaram deste importante período, tornando essa caminhada menos solitária e mais suave e feliz.

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RESUMO

A sustentabilidade de uma destinação turística tem uma relação intrínseca com a manutenção e/ou melhoria das características e atributos que despertaram o interesse do mercado turístico e (o olhar) do turista. Uma destas características é a Morfologia Urbana, que combina elementos naturais e construídos caracterizando assim a configuração do espaço local. Esta pesquisa procurou compreender como a Morfologia Urbana interfere na atratividade de uma destinação turística, tendo sido desenvolvida na Vila de Alter do Chão, em Santarém (PA). A metodologia utilizada agregou estratégias para a compreensão espacial nas escalas regional e intra-urbana a partir das categorias e dos elementos morfológicos do espaço. Aliados a tal procedimento foi utilizado o Discurso do Sujeito Coletivo – DSC. Foi percebido a predominâncias na apropriação do espaço urbano da Vila por turistas nas porções espaciais mais próximas à área inicial de sua ocupação e em outras com vista para o Rio Tapajós e para a “Ilha”; e por residentes nas áreas mais interiores à Vila, às proximidades da Praça do Sairé, sendo que ambas as áreas possuem permeabilidade aos dois grupos. Nos resultados também é demonstrada a percepção dos residentes a respeito da importância da atividade turística para a economia local. O imaginário dos turistas à respeito de destinações amazônicas, aparece relacionando características tais como, grandes extensões de áreas naturais preservadas, pequenos aglomerados urbanos ribeirinhos de características rústicas, com pequena densidade populacional e construída, gabaritos baixos, construções que utilizam materiais regionais, entre outros. Também foi relatada pelos turistas entrevistados uma tendência à progressiva diminuição do interesse turístico pela Vila, em decorrência à crescente perda das características por eles consideradas tradicionais.

PALAVRAS-CHAVE: Morfologia Urbana. Espaço Turístico. Percepção Ambiental. Alter do Chão, Santarém (PA).

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URBAN MORPHOLOGY AND ATTRACTIVENESS OF TOURISM DESTINATIONS: the importance of image for understanding the

tourism system of Vila de Alter do Chão (Santarém-PA)

LUCIANA NORONHA PEREIRA

ABSTRACT

The sustainability of a tourist destination is intrinsically linked to the maintenance and/or improvement of the characteristics and attributes which attract the interest of the tourism market and of the tourist. One of these characteristics is the Urban Morphology, which combines the natural and built elements that make up the local space. This research, carried out in the in Village of Alter do Chão in Santarém (Pará – Brazil, seeks to understand how the Urban Morphology influences the attractiveness of the tourism destination. The methodology used combines different strategies, to gain a spatial understanding at regional and intra-urban levels, based on the morphological and spatial elements. In addition to this procedure, Discourse of the Collective Subject – DCS - was also used. A predominance was observed, of the appropriation of the urban space in the Village by tourists in areas closest to where the occupation of the village first occurred, and other areas overlooking the Tapajós River and the “Island”; and by residents, in the more interior areas of the Village, around the Praça do Sairé square. However, the two groups cross between both areas. The results also demonstrate the residents’ views on the importance of tourism for the local economy. The tourists’ image of destinations in the Amazon region appears to be related to characteristics such as: large preserved natural areas, small riverside village settlements with rural characteristics, such as low population, low density of urban buildings, constructions made from natural materials growing in the region, etc. The tourists interviewed also reported a progressive decrease in tourist interest in the Village, due to the loss of what they consider to be traditional characteristics.

KEY WORDS: Urban Morphology. Tourism Space. Environmental Perception Alter do Chão, Santarém (PA).

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LISTA DE FIGURAS

FIGURA 01: Modelo Sistêmico de Planejamento e Gestão ....................... 70

FIGURA 02: Componentes do sistema territorial ....................................... 70

FIGURA 03: Etapas do processo de compra no turismo ........................... 73

FIGURA 04: Localização de Santarém, no Estado do Pará, no âmbito da

Amazônia Legal e do Brasil ........................................................................

89

FIGURA 05: Pólos Turísticos do Estado do Pará ....................................... 90

FIGURA 06: Situa Santarém e a Vila de Alter do Chão dentro do estado

do Pará, assim como sua inserção junto às unidades de conservação e

rios mais próximos ......................................................................................

91

FIGURA 07: Evolução dos pontos de urbanização na Amazônia Legal .... 104

FIGURA 08: Correlação entre as categorias de análise propostas ............ 140

FIGURA 09: Períodos da ocupação da Vila de Alter do Chão ................... 142

FIGURA 10: Imagem LANDSAT da região de Alter do Chão .................... 170

FIGURA 11: Espaços síntese da Vila de Alter do Chão ............................. 192

FIGURA 12: Resumo esquemático do modelo teórico 196

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LISTA DE FOTOGRAFIAS

FOTO 01: Vista aérea a partir do rio Tapajós, da Ponta do Cururu, do Lago

Verde e da Ilha do Amor em Alter do Chão .....................................................

95

FOTO 02: Crianças na escola/ nível fundamental ........................................... 118

FOTO 03: Crianças participando das celebrações tradicionais da Vila: Sairé

mirim ................................................................................................................

118

FOTO 04: Vista da Ilha do Amor, a partir da praça central .............................. 129

FOTO 05: Vista da Ilha do Amor, a partir da comunidade ............................... 129

FOTO 06: Vista aérea da praia Ilha do Amor .................................................. 129

FOTO 07: Área de mesas em frente à praia e à comunidade de Ponta de

Pedras ..............................................................................................................

129

FOTO 08: Encontro das águas ........................................................................ 130

FOTO 09: Festa do Sairé: momento religioso ................................................. 133

FOTO 10: Festa do Sairé: a inclusão da disputa entre os botos ..................... 133

FOTO 11: Cuias decoradas das Comunidades do Aritapera .......................... 133

FOTO 12: Artesanato em palha de buriti das Comunidades da RESEX ......... 133

FOTO 13: Peça arqueológica com iconografia tapajônica .............................. 133

FOTO 14: Cruzeiros internacionais ................................................................. 134

FOTO 15: Expedição de veleiros ..................................................................... 134

FOTO 16: Vista aérea de Alter do Chão e seu entorno ................................... 163

FOTO 17: Foto Aerofotogramétrica de Alter do Chão ..................................... 170

FOTO 18: Igreja Matriz .................................................................................... 172

FOTO 19: Morro “Serra Piroca” ....................................................................... 172

FOTO 20: Face esquerda da Praça da Igreja Matriz ....................................... 172

FOTO 21: Face frontal da Praça da Igreja Matriz ............................................ 172

FOTO 22: Face direita da Praça da Igreja Matriz ............................................ 172

FOTO 23: Vista do Rio, Lago Verde e “Ilha” a partir da Praça da Igreja

Matriz ...............................................................................................................

173

FOTO 24: Vista da Vila a partir da “Ilha” .......................................................... 173

FOTO 25: Outra vista da Vila a partir da “Ilha” ................................................ 173

FOTO 26: Vista da Praia do Jacudá a partir do Centro de Atendimento ao

Turista ..............................................................................................................

173

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9

FOTO 27: Tipologia 1 ...................................................................................... 174

FOTO 28: Tipologia 2 ...................................................................................... 174

FOTO 29: Tipologia 3 ...................................................................................... 174

FOTO 30: Tipologia 4 ...................................................................................... 174

FOTO 31: Tipologia 5 ...................................................................................... 174

FOTO 32: Turistas fotografados pelos residentes ........................................... 177

FOTO 33: Residentes fotografados pelos turistas ........................................... 177

FOTO 34: Paisagem como pano de fundo fotografada pelos residentes ........ 177

FOTO 35: A paisagem e plano principal fotografada pelos turistas ................ 177

FOTO 36: Vista da “Ilha” fotografada por residentes ....................................... 180

FOTO 37: Vista da “Ilha” fotografada por turistas ............................................ 180

FOTO 38: Traços da cultura local fotografada pelos residentes ..................... 180

FOTO 39: Traços da cultura local apropriada e fotografada pelos turistas ..... 180

FOTO 40: Uso do espaço público fotografada pelos residentes, na década

de 80 ................................................................................................................

183

FOTO 41: Inexistência de equipamentos e apelos ao consumo, fotografada

pelos turistas ....................................................................................................

183

FOTO 42: Vivência ao ar livre e relações de compadrio fotografada pelos

residentes ........................................................................................................

183

FOTO 43: Barracas da praia fotografada pelos turistas .................................. 183

FOTO 44: Uso turístico do rio fotografado pelos turistas ................................. 185

FOTO 45: Inseto “exótico” fotografada pelos turistas ...................................... 185

FOTOS DA ENTREVISTA RESIDENTE 1 ...................................................... 209

FOTOS DA ENTREVISTA RESIDENTE 2 ...................................................... 214

FOTOS DA ENTREVISTA RESIDENTE 3 ...................................................... 222

FOTOS DA ENTREVISTA RESIDENTE 4 ...................................................... 227

FOTOS DA ENTREVISTA RESIDENTE 5 ...................................................... 236

FOTOS DA ENTREVISTA RESIDENTE 6 ...................................................... 245

FOTOS DA ENTREVISTA RESIDENTE 7 ...................................................... 253

FOTOS DA ENTREVISTA RESIDENTE 8 ...................................................... 261

FOTOS DA ENTREVISTA TURISTA 1 ............................................................ 275

FOTOS DA ENTREVISTA TURISTA 2 ............................................................ 281

FOTOS DA ENTREVISTA TURISTA 3 ............................................................ 286

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FOTOS DA ENTREVISTA TURISTA 4 ............................................................ 294

FOTOS DA ENTREVISTA TURISTA 5 ............................................................ 297

FOTOS DA ENTREVISTA TURISTA 6 ............................................................ 300

FOTOS DA ENTREVISTA TURISTA 7 ............................................................ 311

FOTOS DA ENTREVISTA TURISTA 8 ............................................................ 316

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LISTA DE PRANCHAS

PRANCHA 01: Predominância da Apropriação do Espaço por Turistas .... 149

PRANCHA 02: Predominância da Apropriação do Espaço por

Residentes ..................................................................................................

150

PRANCHA 03: Nova Orla de Alter do Chão - Projeto elaborado por Meia

Dois Nove Arquitetura e Consultoria ..........................................................

153

PRANCHA 04: Malha Viária e Pavimentação das Vias .............................. 157

PRANCHA 05: Equipamentos Comunitários e Espaços de Lazer ............. 160

PRANCHA 06: Sítio da Região de Alter do Chão ...................................... 164

PRANCHA 07: Cheios e Vazios Construtivos ............................................ 166

PRANCHA 08: Mobiliário Urbano ............................................................... 171

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LISTA DE QUADROS

QUADRO 01: Cruzeiros internacionais por ano e média de tempo de

permanência ...............................................................................................

93

QUADRO 02: DSC DA ENTREVISTA RESIDENTE 1 ............................... 213

QUADRO 03: DSC DA ENTREVISTA RESIDENTE 2 ............................... 219

QUADRO 04: DSC DA ENTREVISTA RESIDENTE 3 ............................... 225

QUADRO 05: DSC DA ENTREVISTA RESIDENTE 4 ............................... 233

QUADRO 06: DSC DA ENTREVISTA RESIDENTE 5 ............................... 242

QUADRO 07: DSC DA ENTREVISTA RESIDENTE 6 ............................... 250

QUADRO 08: DSC DA ENTREVISTA RESIDENTE 7 ............................... 258

QUADRO 09: DSC DA ENTREVISTA RESIDENTE 8 ............................... 270

QUADRO 10: DSC DA ENTREVISTA TURISTA 1 .................................... 278

QUADRO 11: DSC DA ENTREVISTA TURISTA 2 .................................... 284

QUADRO 12: DSC DA ENTREVISTA TURISTA 3 .................................... 291

QUADRO 13: DSC DA ENTREVISTA TURISTA 4 .................................... 296

QUADRO 14: DSC DA ENTREVISTA TURISTA 5 .................................... 298

QUADRO 15: DSC DA ENTREVISTA TURISTA 6 .................................... 307

QUADRO 16: DSC DA ENTREVISTA TURISTA 7 .................................... 314

QUADRO 17: DSC DA ENTREVISTA TURISTA 8 .................................... 320

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LISTA DE TABELAS

TABELA 01: PIB Santarém de 1999 à 2002 .............................................. 115

TABELA 02: Evolução do IDH de Santarém .............................................. 116

TABELA 03: Dados de residente e domicílios de Santarém no censo de

2000 ............................................................................................................

117

TABELA 04: Idade dos membros das famílias de Alter do Chão ............... 118

TABELA 05: Escolaridade dos residentes de Alter do Chão ...................... 119

TABELA 06: Ocupação dos residentes de Alter do Chão .......................... 119

TABELA 07: Renda dos residentes de Alter do Chão ................................ 119

TABELA 08: Tempo de residência em Alter do Chão ................................ 120

TABELA 09: Situação dos lotes ................................................................. 120

TABELA 10: Forma de coleta e destino do lixo .......................................... 124

TABELA 11: Tipo de pavimentação das vias ............................................. 124

TABELA 12: Origem dos visitantes de Alter do Chão ................................ 134

TABELA 13: Renda dos visitantes ............................................................. 135

TABELA 14: Tempo de permanência dos visitantes .................................. 136

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SUMÁRIO

RESUMO/PALAVRAS-CHAVE ................................................................. 05

ABSTRACT/KEY-WORDS ........................................................................ 06

LISTA DE FIGURAS .................................................................................. 07

LISTA DE FOTOGRAFIAS ........................................................................ 08

LISTA DE PRANCHAS .............................................................................. 11

LISTA DE QUADROS ................................................................................ 12

LISTA DE TABELAS .................................................................................

13

1. INTRODUÇÃO ....................................................................................... 17

1.1. Apresentação ...................................................................................... 17

1.2. Problemática de Pesquisa ................................................................... 23

1.3. Objetivos da pesquisa ......................................................................... 24

1.3.1 Geral .......................................................................................... 24

1.3.2 Específicos ................................................................................ 24

1.4. Pressupostos básicos .......................................................................... 24

1.5. Justificativa: Originalidade, Contribuições e Limitações ......................

25

2. METODOLOGIA PARA O ESTUDO DO ESPAÇO TURÍSTICO .......... 27

2.1 Abordagem metodológica ..................................................................... 27

2.2 Procedimentos metodológicos ............................................................. 33

2.3 Técnicas de pesquisa ...........................................................................

34

3. O ESPAÇO TURÍSTICO E SUA DIMENSÃO GEOGRÁFICA .............. 45

3.1 Espaço Regional .................................................................................. 50

3.1.1. As categorias do método geográfico ........................................ 51

3.2 Espaço Intra-Urbano ............................................................................ 53

3.2.1. Morfologia Urbana e os elementos morfológicos do espaço ....

56

4. TURISMO: PLANEJAMENTO E ESPAÇO ........................................... 62

4.1 Planejamento do Espaço Turístico ....................................................... 63

4.2 Sistêmica e um Novo Modelo de Planejamento e Gestão ................... 66

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4.3 Consumidor Turista ..............................................................................

71

5. ESPAÇO, IMAGEM, IMAGINÁRIO E SIGNIFICADO ............................ 77

5.1 Sistêmica e a Dimensão do Significado ............................................... 79

5.2 Imagem, Imaginário e Semiótica .......................................................... 81

5.3 Urbanidade e Imaginário Coletivo ........................................................

85

6. O DESTINO TURÍSTICO DE ALTER DO CHÃO (SANTARÉM-PA) .... 89

6.1 As Características Naturais da Região ................................................. 94

6.2 Região Amazônica: Gênese e Urbanização do Oeste Paraense ......... 96

6.2.1 A gênese de Alter do Chão (município de Santarém, Pará,

Brasil) .................................................................................................

98

6.2.2 Alter do Chão enquanto território turístico: as transformações

atuais ..................................................................................................

106

6.3 O Município de Santarém e sua Inserção Regional: a Capital do

Oeste Paraense ..........................................................................................

108

6.4 Aspectos Sócio-Culturais e Infra-estrutura da Vila de Alter do Chão

(Santarém-PA) ............................................................................................

115

6.4.1 Análise dos aspectos sócio-econômicos da população

residente .............................................................................................

115

6.4.2 Infra-estrutura básica ................................................................. 122

6.4.3 Infra-estrutura turística e perfil do turista ................................... 126

6.4.4 Atrativos Naturais ou Atrativos da Paisagem ............................ 128

6.4.5 Atrativos Culturais ..................................................................... 131

6.4.6 Análise do Perfil dos Turistas de Alter do Chão ........................

134

7. MORFOLOGIA URBANA, SUAS IMAGENS E SIGNIFICADOS POR

RESIDENTES E TURISTAS NA VILA DE ALTER DO CHÃO

(SANTARÉM-PA) .......................................................................................

139

7.1 Produção e Apropriação do Espaço de Alter do Chão (Residente e

Turista) .......................................................................................................

141

7.2 Redes Sociais e Urbanas de Alter do Chão ......................................... 155

7.3 Ambiente Urbano de Alter do Chão ...................................................... 162

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7.4 Percepção do Espaço Turístico de Alter do Chão (Urbano e Natural).. 176

7.5 Espaços Síntese da Vila de Alter do Chão ...........................................

191

8. CONSIDERAÇÕES, LIMITAÇÕES E RECOMENDAÇÕES ................. 195

8.1 Limitações da Pesquisa ........................................................................ 199

8.2 Recomendações para Estudos Posteriores .........................................

199

REFERÊNCIAS ..........................................................................................

200

APÊNDICES ...............................................................................................

APÊNDICE A ......................................................................................

APÊNDICE B ......................................................................................

APÊNDICE C ......................................................................................

APÊNDICE D ......................................................................................

APÊNDICE E ......................................................................................

207

208

209

274

275

323

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1. INTRODUÇÃO

1.1 Apresentação

O forte crescimento mundial do turismo tem criado grandes expectativas quanto ao

seu potencial, entre as quais, para a geração de emprego e renda nas destinações,

para o resgate e valorização da história e cultura local, bem como da utilização dos

recursos naturais disponíveis, tendo sido visto como uma atividade bastante

promissora. Entretanto, a prática tem demonstrado que a implantação da mesma

atividade que é vista como a grande alternativa para tantas destinações,

especialmente nas localidades que contam com poucas alternativas em recursos e/ou

desenvolvimento econômico, não deve ser entendida como panacéia para todos os

males, haja vista a possibilidade da geração também de diversos prejuízos. Estes

prejuízos podem ocorrer no âmbito do meio ambiente, da cultura local, ou ainda da

economia, pelo desequilíbrio entre a estrutura a ser mantida e o fluxo concentrado e

irregular de turistas causado pela sazonalidade. Assim, à despeito da existência de

diversas modalidades de turismo, cada qual com seu perfil e especificidades, sempre

haverão impactos (sejam eles positivos ou negativos).

Neste contexto, ao planejamento - na maioria das vezes visto separadamente à gestão

- tem sido atribuída a tarefa de “controlar” a atividade turística, seu desenvolvimento,

bem como seus impactos. A responsabilidade em perseguir os preceitos da

sustentabilidade, atribuída ao planejamento, com a finalidade de buscar um maior

equilíbrio entre as três esferas básicas citados pela OMT (2001) – aspectos

econômicos, aspectos sócio-culturais e aspectos ambientais – e assim permitir a

utilização dos recursos de forma responsável e coerente sem que seja comprometida

a capacidade de sobrevivência das gerações futuras, tem sido percebida como algo

difícil de ser alcançado através de métodos tradicionais de planejamento e de modelos

mecanicistas.

Possivelmente, a inclusão de um objetivo – sustentabilidade - e de um objeto - destino

turístico - tão amplos e tão complexos sob a égide do planejamento, não importando

quais sejam os movimentos desencadeados ou o nível de conhecimento sobre a

realidade local, muitas vezes têm feito sua utilização parecer uma ferramenta inócua.

Estando a atividade turística imbuída e permeada por relações e fenômenos sociais,

de características não-lineares e complexas, que envolvem múltiplas variáveis e atores

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sociais, representantes dos tantos segmentos envolvidos pela atividade turística,

alguns autores têm questionado a utilização de ferramentas e métodos de

planejamento tão lineares e pouco flexíveis, que não têm se mostrado capazes de

abarcar as especificidades impostas pelos fenômenos sociais.

Dentre estes autores, podem ser citados Hall (2004), Acerenza (1992), Gómez (1990),

Souza (2003), além das contribuições de Capra (2002), que, com seus modelos,

possibilitaram a construção do modelo de Anjos (2004). Dos preceitos destacados,

pode-se citar o princípio da integração do planejamento e da gestão, sua dinamicidade

e seu caráter processual, dialético e contínuo, sugerindo a existência de etapas que se

retro-alimentam, a necessidade da existência de um regulador externo à esfera

governamental. Da mesma forma, faz-se imprescindível a representatividade dos

diversos atores envolvidos no processo e de controle do processo, incluindo a

utilização de indicadores para tal, e ainda, a exigência de perspectiva sistêmica tanto

do objeto, quanto do próprio processo de planejamento e gestão.

Esta abordagem sistêmica propõe uma melhor compreensão de realidades

complexas, uma vez que, para a referida abordagem não são importantes apenas

suas partes constituintes, mas a visão do todo a partir da compreensão destas partes

e das relações entre elas.

No modelo de Planejamento e Gestão proposto por Anjos (2004), são ordenadas

sistematicamente etapas de um processo contínuo que inclui: a Compreensão do

Sistema Turístico, a definição de Estratégias de Perturbação, e a Implantação e

Viabilização. Estas etapas devem ser permeadas constantemente por outras duas: a

Territorialização e o Monitoramento e Avaliação.

Desta forma, o sistema territorial turístico é compreendido para uma espécie de

“retrato da realidade” daquele momento, a partir da qual, definem-se algumas

estratégias de perturbação que, com sua viabilização e implantação, procuram causar

reações e respostas deste sistema, em direção a uma nova configuração que exigirá

uma nova compreensão do processo.

O ponto de partida sugerido pelo autor é a etapa de compreensão do sistema turístico,

entendida para este estudo como especialmente importante, embora o autor não tenha

citado nenhuma hierarquia entre as mesmas. Essa percepção se dá pelo fato de que,

um sistema desconhecido ou ainda, com lacunas no que diz respeito à sua

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compreensão, pode permitir que algumas características importantes mantenham-se

incógnitas, pode não ser capaz de fornecer as informações requeridas para a retro-

alimentação necessária à próxima fase. Assim, não compreender, ou ainda,

compreender erroneamente ou parcialmente determinado sistema, pode direcionar a

uma forma inadequada de prosseguimento do processo de planejamento e gestão.

Fundamentado no exposto, esta pesquisa se organiza a partir do modelo de

Planejamento e Gestão proposto por Anjos (2004), particularmente na etapa de

Compreensão de um Sistema Territorial-Turístico. Este estudo pretende oferecer uma

ampliação de abordagem que possa contribuir neste sentido, incluindo de maneira

mais significativa a percepção dos usuários/consumidores destes espaços turísticos,

que também são, antes de tudo, espaços das relações sociais. Entretanto, para a

compreensão do sistema turístico e da percepção de seus usuários/consumidores,

considera-se necessário a utilização de diversas linhas teóricas, no intuito de abarcar

a complexidade do tema.

Neste sentido, devido à falta de definição e delimitação do turismo enquanto disciplina

científica, essa compreensão não tem se dado de maneira uniforme, implicando na

utilização de diversas teorias e metodologias, transpostas de outras ciências, seguindo

uma abordagem espacial, influenciada particularmente pela geografia e arquitetura,

assim como um enfoque gerencial, pela economia e administração.

Não se trata de questionar a utilização destas teorias e abordagens, mas evidenciar a

necessidade de ampliar estas transposições, assim como também de discussões e

estudos, a fim de permitir a maturação e a consolidação de um corpo teórico

pertinente aos estudos sobre o turismo.

Nesse contexto é importante destacar a então concentração da etapa denominada

Compreensão do Sistema, principalmente em aspectos geográficos, sócio-culturais,

ambientais, econômicos das destinações turísticas, de modo que o usuário - seja ele

residente ou turista - enquanto consumidor deste espaço tem sido frequentemente

relegado ao segundo plano, minimizando assim a importância de seu papel enquanto

ator social, que anima e que, inextricavelmente, faz parte do sistema turístico,

especialmente no que diz respeito à percepção subjetiva relacionada à atratividade do

destino.

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Neste estudo, far-se-á uma busca em direção à complementaridade teórico-

metodológica que possibilite a ampliação destas perspectivas através de um olhar

humanista. Tem-se a intenção de identificar os anseios e percepções dos citados

consumidores destes espaços, levando em consideração, variáveis relacionadas à

atratividade decorrentes das características físicas e da espacialidade de uma

destinação turística - da mesma maneira que as características físicas do local são

influenciadas por essa mesma subjetividade.

Para efeito deste estudo, que parte da prerrogativa da inclusão da atratividade na

perspectiva dos estudos territoriais, a análise espacial pretende incluir as escalas

citadas por Goulart (2006) - regional segundo as categorias de SANTOS, 1992; e intra-

urbana (VILLAÇA, 1998) segundo os elementos morfológicos de LAMAS, 2004. Assim

como agregar aas anteriores, uma análise fundamentada na percepção do espaço,

enquanto imagens e linguagem, possibilitando abranger as quatro dimensões

propostas por Capra (2002) para os fenômenos sociais - Forma, Matéria e Processo,

além do Significado, como dimensão exclusiva e inerente às relações sociais.

É desta maneira que foi selecionado como objeto de estudo para esta pesquisa a

interação entre o espaço regional e intra-urbano (pela morfologia urbana); assim como

entre estes e a forma como são percebidos pelos consumidores/usuários deste

espaço. Neste contexto, a morfologia congrega os aspectos mais concretos e, portanto

mais visíveis e tangíveis do espaço, e a percepção, as informações sobre como o

consumidor destes territórios turísticos se relaciona com os mesmos, ou seja, a

atratividade que o espaço exerce sobre esse usuário, a forma como é visto e o que se

espera dele.

Conforme citam Ramalho e Sarmento (2004, p.07), o turista constrói um imaginário da

destinação escolhida, construído “através da mídia, dos postais e dos guias (...) numa

construção inventiva de lugares almejados”. Assim, a construção da imagem do lugar

passa necessariamente pelas expectativas e desejos de consumo, no campo da

fantasia e da imaginação, em busca de prazer, satisfação e deleite.

Da mesma forma, segundo Hillman (1993), a beleza tem permeado as mais diversas

produções humanas desde a Antiguidade, dentre as quais a cidade, como

necessidade subjetiva inerente à condição humana e à sua percepção, destacando

que o belo não está necessariamente relacionado a questões estéticas, mas sim o

belo enquanto original, autêntico.

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A importância da paisagem, das imagens geradas pela configuração espacial no que

tange uma destinação turística e o interesse dos usuários por este espaço são

determinantes na sua escolha como destinação, de modo que os mesmos são

selecionados porque existem expectativas sobre eles, criadas através da fantasia e do

devaneio. O “olhar” tem importância fundamental na formação desta imagem e na

atração exercida pelos aspectos da paisagem que a separam do cotidiano, haja vista

que este “é construído através de signos e o turismo abrange uma coleção de signos”

(URRY, 1999, p 18).

Em corroboração, Allison (2002, p.349 e 350), faz referência a “lugares especiais em

lugares especiais” no qual o anseio de mudança do viajante de lazer constitui mais um

argumento para uma preocupação quanto ao respeito à individualidade e às

características da cultura local no momento de planejar e projetar hotéis ou quaisquer

outros espaços em destinações, especialmente em regiões com fortes singularidades.

Não se trata aqui de negligenciar as evoluções e melhorias necessárias, ou mesmo

desejáveis, à infra-estrutura, aos serviços, entre outros. Mas trata-se de atender a esta

demanda de mundialização técnico-informacional, contudo, sem excluir as

características locais, sendo necessário manter um diálogo com a identidade, com a

personalidade do destino, apesar de sua modernização.

Entretanto, a instalação da atividade turística e de todo o seu aparato, como parte das

próprias dinâmicas sociais relacionadas ao desenvolvimento de localidades e regiões,

várias vezes tem determinado a alteração da mesma configuração e de padrões antes

responsáveis pela atração que dado destino exerce (ou exercia) nos turistas, muitas

vezes em torno de uma “mesmice homogeneizadora”. O desenvolvimento da atividade

turística sem regulamentação pode ter como conseqüência a destruição dos mesmos

lugares que são os “objetos do olhar do turista” (URRY, 1993, p66). Assim, como

reflexo das próprias relações sociais que animam a matéria da qual a cidade é

constituída, a atividade turística, ou mesmo a inserção de outras atividades que

possam constituir conflitos no que tange à paisagem, têm a tendência de induzir

alterações espaciais, implicando tantas vezes, na perda da “individualidade do lugar”,

de modo que é necessário observar que:

Este lugar, identitário ou não, faz parte de um processo global, onde a circulação de capitais e mercadorias se acentuam e prevalecem as idéias, os produtos culturais e simbólicos, propicia o aumento da demanda

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mercadológica para a experimentação de novas paisagens culturais, percepções e imagens, que nascem no bojo de uma expectativa fantasiosa (RAMALHO e SARMENTO, 2004).

Portanto, entende-se que tratar da sustentabilidade de destinos turísticos, implica

diretamente na manutenção das características então capazes de fomentar a

instalação da atividade, ou seja, que determinaram o surgimento do interesse, que

foram capazes de atrair turistas, para então garantir o aumento do ciclo de vida do

produto turístico, rumo a uma estabilidade que, ao mesmo tempo, não negligencie o

caráter dinâmico do espaço e da cidade enquanto produto das relações sociais.

A Vila de Alter do Chão (parte do município de Santarém, região oeste do Estado do

Pará), é uma recente destinação turística e vem sentindo com o desenvolvimento

desta atividade. A mudança de suas características construtivas, e assim,

morfológicas e paisagísticas, de tal maneira que alguns de traços

cênicos/paisagísticos e culturais que exercem atratividade em dado segmento do

mercado turístico parecem estar sendo perdidos. É nesse sentido que a Vila de Alter

do Chão emerge a partir do contexto teórico para a problemática desta pesquisa,

sendo importante ressaltar ainda que durante o percurso desenhado por esta

pesquisa, os resultados extrapolaram a localidade da Vila de Alter do Chão,

correspondendo a um conjunto de informações relativo às destinações Amazônicas

em geral – nesse âmbito, excetuando-se as grandes cidades da Amazônia – haja vista

a freqüente afirmação do desconhecimento da existência da Vila de Alter do Chão,

especificamente conforme é possível observar nas entrevistas realizadas com os

turistas.

Cumpre registrar que para efeito deste estudo, quando da utilização do conceito de

espaço, entenda-se como o “locus da reprodução das relações sociais de produção,

isto é, reprodução da sociedade” (CORRÊA, 1995, p. 26 a), de modo que se constitui

em um híbrido que assim “participa igualmente da condição social e do físico”

(SANTOS, 1996, p. 70), assim formado por um conjunto indissociável de sistemas de

objetos e sistemas de ações (SANTOS, 2005, p. 159). Diante do exposto, considera-

se igualmente que dentro do paradigma da formação sócio-espacial estão contidos,

assim como também, contém, outros conceitos operacionais, considerados chave no

texto de Corrêa (1995, p. 27 a), dentre os quais “paisagem, região, espaço

(organização espacial), lugar e território”.

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Do mesmo modo, neste estudo, lugar será conceituado como a “base da reprodução

da vida e pode ser analisado pela tríade habitante-identidade-lugar” (CARLOS, 1996,

p. 20), entendido por Santos (1997, p. 252) como dimensão local existente através de

uma dimensão física, “corpórea”, e de outra dimensão “existencial-relacional”

(SANTOS, 2005, p. 158-159), de modo que “o lugar, aliás, define-se como

funcionalização do mundo e é por ele (lugar) que o mundo é percebido

empiricamente”. A esse respeito, acrescentam Ramalho e Sarmento (2003, p.02), “um

lugar se define como identitário, relacional e histórico, construção concreta e simbólica

do espaço, lugar antropológico (...) impregnados de percepções simbólicas, de regras

técnicas e valores culturais”, conformando o mesmo espaço da formação sócio-

espacial à dimensão do usuário e a sua fruição ao longo do tempo e da vivencia

humana.

Por fim, o conceito de paisagem, empregado ao longo deste texto, deverá ser

entendido como uma manifestação sócio-espacial temporal, portanto, de natureza

dinâmica, abarcada enquanto expressão visual. Neste sentido Corrêa (1998) contribui

afirmando que esta é uma “unidade bilateral” formada pelo sítio físico e seus recursos

naturais e a cultura, enquanto atuação humana na área, assim incluindo “qualidades

físicas da área que são importantes para o homem e nas formas do seu uso da área,

em fatos de base física e fatos da cultura humana” (p.29). Deste modo, a paisagem

não existe sem o sujeito humano, formando um conjunto integrado que “se autoproduz

e se auto-reproduz” (p.10).

1.2 Problemática da Pesquisa.

A morfologia urbana enquanto aspecto mais visível/palpável de uma localidade é, ao

mesmo tempo, produto e também produtora de seu desenvolvimento espacial-

turístico, sendo entendida como morfologia urbana o estudo das formas urbanas,

assim como, de seu conteúdo e seus processos formadores. A partir da problemática

apresentada, fica assim definida a pergunta de pesquisa:

- Como as alterações no âmbito das características morfológicas de determinado

espaço, tendo como referência a Vila de Alter do Chão, têm influência no interesse, na

atratividade que ele exerce sobre as pessoas enquanto seus consumidores/usuários?

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1.3 Objetivos

1.3.1 Objetivo Geral

O objetivo geral desta pesquisa é:

- Compreender como a morfologia urbana interfere na atratividade de uma

destinação, tendo como referência o caso de Alter do Chão, no município de

Santarém/PA.

1.3.2 Objetivos Específicos

Para alcançar o objetivo geral, foram elencados objetivos específicos abaixo descritos:

- Compreender a inserção da Vila de Alter do Chão e sua gênese nas diversas

escalas do espaço - local (Santarém), regional (Pólo Tapajós), estadual (Pará) e

nacional (como parte da Amazônia legal).

- Caracterizar a atual constituição morfológica urbana da Vila de Alter do Chão a

partir da construção de mapas e vistas fotográficas da área, incluindo as lógicas

de sua formação e de sua apropriação.

- Compreender a percepção e os interesses manifestos pelos

usuários/consumidores – residentes e turistas - deste espaço, especialmente

sobre suas características morfológicas.

- Discutir elementos morfológicos do espaço e sua percepção pelos

usuários/consumidores da Vila de Alter do Chão segundo categorias analíticas

propostas.

1.4 Pressupostos

Os pressupostos que sustentarão as reflexões propostas neste estudo relacionam

princípios da sustentabilidade, da sistêmica, do planejamento e gestão e da percepção

ambiental, conforme delineado a seguir:

- Sustentabilidade: princípio que deve reger a interação das três esferas envolvidas no

desenvolvimento turístico que são a esfera ambiental, a esfera sócio-cultural e a

esfera econômica.

- Sistêmica: abordagem a partir da qual o sistema turístico, enquanto parte do sistema

social, deve ser estudado por seus subsistemas e pelas relações entre eles. A teoria

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dos sistemas de Capra (2002) também contribui no sentido das quatro dimensões

presentes nos fenômenos sociais, dentre as quais o “Significado” (além da Matéria,

Forma e Processo) pode subsidiar mais informações a respeito das relações humanas

com o espaço.

- Planejamento e Gestão: Enquanto processo integrado e retro-alimentado, enquanto

grande área onde esta pesquisa está situada, como uma nova forma de proceder a

etapa de “Compreensão do Sistema” – segundo a proposta de modelo sistêmico de

Planejamento e Gestão de Anjos (2004).

- Percepção ambiental: Como abordagem capaz de relacionar o espaço urbano e suas

características formais, com a maneira como a sociedade se apropria e se relaciona

com ele, enquanto variável subjetiva relacionada pela dimensão do “Significado”.

1.5 Justificativa: Originalidade e Contribuições

Dentre as justificativas para essa pesquisa, pode-se citar a sua originalidade no

sentido da interdisciplinaridade pretendida para os estudos sobre o turismo, neste

caso, relacionando-o a outras áreas como, o urbanismo, a geografia, a semiótica,

entre outros.

Além disso, o estudo também tem como atributo de originalidade a busca da

compreensão da co-relação entre duas variáveis: (1) a morfologia urbana de um

destino, com (2) a sua atratividade turística. Assim, busca-se compreender de que

maneira essa configuração morfológica do espaço pode afetar a percepção dos seus

consumidores/usuários, sejam eles residentes ou turistas. No caso deste estudo,

pretende-se pesquisar essas relações em um destino na Amazônia, tendo em vista

que o simples fato de citar “Amazônia” implica na forte associação de imagens

representativas à respeito da mesma, apropriadas pelo senso comum, havendo assim

para cada perfil de demanda, conjuntos de expectativas específicas sobre o destino e

demais características da viagem.

Dentre as contribuições científicas que devem ser mencionadas, pode-se citar o

campo da metodologia escolhida para o estudo desta percepção, que inclui a

utilização de imagens e de teorias da semiótica, já aplicadas a estudos do urbanismo,

da arquitetura, da antropologia, entre outras áreas, será transposta para o campo do

turismo.

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Essa investigação também fornecerá uma contribuição prática para o planejamento

local e regional, sejam eles urbanos ou turísticos, no âmbito da inclusão e da maior

relevância das percepções e significados atribuídos ao espaço urbano e seus

elementos pelos seus consumidores e/ou usuários.

Da mesma forma, a referida investigação ainda tem como contribuição prática para a

comunidade residente na Vila de Alter do Chão e seu empresariado, bem como para

os governantes e legisladores responsáveis pela área, o esclarecimento sobre a

importância do ordenamento espacial e de sua implantação e fiscalização, como um

dos requisitos para a sustentabilidade da atividade turística na localidade. A redução

da atratividade pode desencadear um processo de sucateamento do destino,

ocasionando o aumento da sazonalidade e a baixa ocupação (ou ocupação forte em

pequenos períodos) dos equipamentos de infra-estrutura turística instalados, tornando-

os obsoletos, afetando, portanto, a sua sustentabilidade econômica.

Esse estudo também pretendeu identificar aspectos relacionados ao imaginário dos

turistas e visitantes com relação ao destino, bem como, as suas divergências ou não

com os interesses da população local, auxiliando na tomada de decisões e na

definição de estratégias de perturbação quanto ao processo de planejamento e gestão

local.

Por fim, outra contribuição prática, refere-se à identificação de possíveis contradições

entre algumas atividades econômicas que concorrem nesta mesma área, as questões

ambientais relacionadas (desmatamento, assoreamento dos rios e suas nascentes,

poluição do solo e corpos d`água), assim como também questões espaciais e de

morfologia (perda da unidade da paisagem de entorno) e em conseqüência, questões

sobre a percepção e sua atratividade.

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2. METODOLOGIA PARA O ESTUDO DO ESPAÇO TURÍSTICO

O turismo é uma área científica recente e que, enquanto ciência, ainda não está

constituída (Dencker, 2001; Rejowski, 1999). Dessa forma, para dar os suportes

teóricos necessários à realização de seus estudos, utiliza conceitos, teorias e

metodologias de outras áreas que o compõem, adaptadas ao seu contexto.

A abrangência do objeto deste estudo requer a utilização de diversos aportes das

áreas de conhecimento relacionadas ao turismo, dentre as quais a arquitetura, a

geografia, a semiótica, a administração entre outras, inclusive sob forma de

metodologias de pesquisa.

O aporte metodológico proposto possibilita que cada objetivo específico esteja

satisfatoriamente relacionado a uma metodologia capaz de viabilizá-lo em direção à

problemática da pesquisa. Assim, dentro de uma abordagem qualitativa, foram

combinadas, segundo as necessidades, as metodologias que serão relacionadas a

seguir.

Inicialmente, é importante frisar que o recorte deste objeto de estudo a uma unidade

menor que a porção municipal tem como motivadores inicialmente as grandes

dimensões do município de Santarém, que talvez em parte por isso, possui profundas

diferenciações no que diz respeito à ocupação em diversos pontos de seu território. Da

mesma forma, também são notáveis as diferenças em aspectos de sua paisagem e

morfologia urbana, além de uma notável diferenciação entre o perfil e a tipologia da

atividade turística desenvolvida em dadas localidades, especialmente quando se

refere à sede do município e às comunidades do entorno, como é o caso de Alter do

Chão.

No caso citado, pode-se observar a tendência para um turismo de negócios na sede

do município e outro, diferentemente, motivado pelo lazer e voltado para o contato

com a natureza, suas paisagens e as comunidades locais em Alter do Chão.

2.1 Abordagem Metodológica

Primeiramente, para o estudo da relação entre morfologia e atratividade, torna-se

imprescindível a compreensão do espaço em algumas categorias de análise.

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Para Goulart (2006), o espaço, para uma compreensão mais ampla e completa de

suas características, deve ser estudado em duas escalas distintas, assim classificadas

pelo autor: uma regional e outra intra-urbana. Tomando estas considerações

referenciais, optou-se pelo estudo do espaço utilizando a combinação de duas formas

de análise, uma para cada escala de estudos propostas. Deste modo, Milton Santos

(1992) e suas categorias de análise fornecerão os instrumentos necessários para a

compreensão do espaço regional e, José Ressano Garcia Lamas (2004) e seus

elementos morfológicos do espaço, para a compreensão em escala intra-urbana, de

modo que esta junção teórico-metodológica permitiu a proposição de outras quatro

categorias, que serão apresentadas posteriormente, através das quais será feita a

análise dos dados coletados em direção aos resultados deste estudo.

No caso desta pesquisa, o conceito de escala deve ser entendido muito além da

escala cartográfica, observando-se que as escalas acima propostas - o regional e o

intra-urbano - estão integradas de maneira inexorável e flexível, permitindo assim

auxiliar na compreensão de uma realidade dinâmica, de uma realidade em movimento,

do mesmo modo que a urbanização deve ser entendida como um “fenômeno social

complexo, cujas escalas de observação/concepção apontam para mudanças de

conteúdo e de sentido do próprio fenômeno” (CASTRO, 1995, p. 137).

Para Milton Santos (1992), o espaço só pode ser estudado em sua complexidade se

considerar seus aspectos formais, animados pela sociedade que lhes confere funções,

que por sua vez produzem sistemas inter-relacionados, ou seja, estruturados ao longo

de um período através do qual foram construídos tais aspectos formais no passado e

que, suas novas relações e usos no presente, produzirão outro espaço.

As categorias espaciais de Santos (1992), fundamentada na aplicação das quatro

categorias de análise espacial apresentadas no referencial teórico – forma, função,

estrutura e processo – foi utilizada para a compreensão da Vila de Alter do Chão, sua

gênese, suas relações com as áreas do entorno, bem como sua organização sócio-

econômica e sua reprodução. Vinculada a esta análise, houve uma coleta de dados

conforme será explicitado a seguir, no sentido de fornecer instrumentos para a

aplicação das categorias descritas.

O período no qual serão concentrados os esforços de pesquisa inicia-se na década de

70, momento da abertura da rodovia estadual PA-457, que liga por via terrestre a Vila

de Alter do Chão à sede do município de Santarém. Também são demarcados outros

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pontos críticos para a análise, como o seu asfaltamento em 1994 e sua reforma com a

construção de novas pontes em 2003, até o momento atual. Esta escolha não se deu

de forma aleatória e o escopo de tal relação, é o aumento do fluxo de pessoas a este

vilarejo impulsionado pela melhoria das condições de acesso e, tendo como

conseqüência, a intensificação de sua urbanização, com a construção de casas de

segunda residência, por exemplo.

No entanto, para deter-se na co-relação entre as variáveis selecionadas – morfologia

urbana versus atratividade – será utilizado mais enfaticamente o aspecto mais visível,

concreto, tangível deste espaço estudado: a forma, assim como seu conteúdo e

processo de construção, principal objeto para a análise do espaço intra-urbano,

segundo os elementos morfológicos de Lamas (2004).

Sabe-se que este recorte não abrange a complexidade do espaço, produto das

diversas relações sociais, mas não é a isso que este estudo se propõe. Após

compreender como este espaço é produzido, este estudo procurará entender como

esse sistema de objetos, essa massa construída, enquanto resultado de relações

sociais e modos de produção ao longo de sua história, afeta o interesse, ou seja, a sua

atratividade no mercado turístico, especialmente, em um destino amazônico.

Assim, ao realizar este recorte após a utilização das quatro categorias de análise

citadas por Santos (1992), não se pretende uma concentração na forma como se ela

tivesse se constituído por si mesma, alijada das relações de sua gênese, conforme

critica Santos (1996, p. 85). Ao contrário, busca-se o estudo abrangente do espaço,

para então relacionar o fragmento ‘forma’ a uma variável intrínseca ao mercado

turístico, uma vez que a forma é a base material, que apropriada pela sociedade

adquire funções e significado (conteúdo social), ou seja, converte-se em espaço, que

vai atuar nele e também sofrer esta atuação, para a modificação de ambos.

O enfoque na forma ou morfologia deu-se, entre outras coisas, pelo caráter de alta

permanência das infra-estruturas, classificada por Santos (1996, p.83) como um

“sistema material e, nessa condição, relativamente imutável” – base sobre a qual se

darão, com algumas alterações, as relações espaciais; e também por constituir seu

caráter mais notável, graças à sua visibilidade, mesmo aos que permanecem poucos

dias em uma localidade, atuando diretamente sobre sua percepção e imagem

projetada. Sobre isso, Santos (1996, p.83), afirma que o conjunto dessas formas é

“apenas a porção da configuração territorial que é possível abarcar com a visão” e se

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dá “como um conjunto de objetos reais-concretos” de caráter transtemporal

construídos transversalmente, cumulativos de diferentes momentos.

Para Lamas (2004), a análise da morfologia urbana se dá através da forma, sem que

sejam negligenciados os processos que lhes deram origem. É nesse ponto que há a

convergência de idéias entre os autores, muito embora Santos (1992) perceba as

categorias de análise, dentre as quais está incluída a forma, sem qualquer hierarquia

entre elas, e Lamas (2004, p.28) estude o espaço e as relações e processos de

origem pelo olhar feito através da forma, para o qual

As formas urbanas não têm apenas a ver com concepções estéticas, ideológicas, culturais ou arquitetônicas, mas [também] encontram-se indissociavelmente ligadas a comportamentos, à apropriação e utilização do espaço, e à vida e comunitária dos cidadãos.

Lamas (2004), em seus estudos, trata a forma urbana como objeto de estudo da

morfologia urbana, como “a ciência que estuda as formas, interligando-as com os

fenômenos que lhes deram origem” (p.37). E sendo assim, no âmbito da escala intra-

urbana citada para continuidade da análise, deter-se-á em maiores detalhes da

constituição física do espaço da Vila de Alter do Chão, através da identificação e

estudo dos elementos morfológicos do espaço citados por Lamas (2004), conforme

detalhados anteriormente, que são: (1) o Solo / o pavimento; (2) os edifícios; (3) os

lotes; (4) o quarteirão; (5) as fachadas / os planos marginais; (6) o logradouro; (7) o

traçado / a rua; (8) a praça; (9) o monumento; (10) a árvore e a vegetação; e (11) o

mobiliário urbano.

Para abordar a atratividade da combinação destes elementos, ou seja, dos lugares

conformados/configurados por eles, faz-se necessário compreender como se dá a sua

percepção, bem como, das relações estabelecidas para a atribuição de significados ao

espaço, aos lugares e elementos constituintes.

Segundo Capra (2002), o significado é a quarta dimensão presente e inerente aos

fenômenos sociais – além das dimensões do processo, da forma e da matéria. Para o

referido autor, esta dimensão é relacionada à linguagem e aos processos cognitivos

surgidos devido à “autoconsciência” e tem sua origem na consciência reflexiva, na

linguagem, no contexto social. Assim, o mundo social é em grande parte organizado

segundo a capacidade de reter imagens de objetos e acontecimentos, possibilitando a

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formulação de valores e de regras de comportamento, de modo que “o mundo interior

dos conceitos, idéias, imagens e símbolos é uma dimensão essencial da realidade

social, (...)”. Este mundo interior pode ser manifesto, externado através da “palavra

‘significado’ como uma expressão sintética do mundo interior da consciência reflexiva,

que contém uma multiplicidade de características inter-relacionadas” (CAPRA, 2002,

p.86). Em corroboração, Santanaella (2000, p.IX) afirma que “somos humanos porque

somos simbólicos”.

É neste âmbito que a semiótica, enquanto estudo da linguagem, dos processos

comunicativos – aqui a imagem como um dos possíveis signos, ou seja, como forma

de linguagem - enquanto representações, índices e signos (FERRARA, 1999 b),

fornecem os subsídios para a compreensão a respeito da apreensão dos elementos

morfológicos que compõem a Vila de Alter do Chão e da significação atribuída a estes

elementos e/ou seus conjuntos por seus diversos grupos de usuários/consumidores.

Para Santanaella (2000, p.9),

todo pensamento se processa por meio de signos. Qualquer pensamento é continuação de um outro, para continuar em outro. Pensamento é diálogo. Semiose ou autogeração é, assim, também sinônimo de pensamento, inteligência, mente, crescimento, aprendizagem e vida.

A inclusão de imagens fotográficas selecionadas e executadas por estes usuários,

para a realização de uma investigação de abordagem semiótica peirceana1, parecem

mais apropriadas a uma investigação espacial. Isto porque possibilitam um maior

apelo afetivo-relacional através do fomento à atenção, motivação e aprendizagem

(SANTANAELLA & NÖTH, 1998), permitindo também por ocasião da coleta de dados,

manifestações menos conscientes, e assim mais subjetivas, expressando relações dos

residentes com o local, da imagem projetada e imagem real, assim como, das

expectativas de viagem dos turistas.

É neste sentido que, segundo a semiótica peirceana, Santanaella e Nöth (1998, p.45)

afirmam que

a percepção da forma não é somente um processo de recepção, mas, em última análise, um processo de coordenação entre o percebido e as formas já internalizadas, ela é, no sentido da relação token-type de acordo Peirce, um processo semiótico.

1 Teoria semiótica de Peirce

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A percepção da forma – espacial, urbana, no caso deste estudo – trata-se de um

processo cultural, que considera a pré-existência de uma “bagagem” como

determinante na experiência perceptiva, apesar de ser essencialmente coletiva em sua

natureza (SANTANAELLA, 2000). Através deste processo também fica evidente a

construção de um juízo a respeito das informações ora retidas, então processadas na

conformação de juízos perceptivos, ou seja, dos mesmos significados citados por

Capra (2002).

As fotografias são consideradas instrumento amplamente utilizado na veiculação de

idéias, muitas vezes utilizadas no intuito de manipulação de opinião ou manifestação

de idéias próprias, como protesto. Entretanto, estas imagens de vasto potencial

informacional na maioria das vezes não tem tido todo seu potencial explorado, uma

vez que parte das suas informações não é decodificada, por situarem-se além da

imagem em si

As imagens fotográficas, entretanto, não se esgotam em si mesmas, pelo contrário, elas são apenas o ponto de partida, a pista para tentarmos desvendar o passado. Ela nos mostra um fragmento selecionado da aparência das coisas, das pessoas, dos fatos, tal como foram (estética/ideologicamente) congelados num dado momento de sua existência/ocorrência. (Kossoy, 2002, p. 20-21)

A fotografia é entendida por Dubois (2003) como imagem-ato, de modo que o ato inclui

desde a produção da referida imagem, assim como também, sue processo de

recepção e contemplação. Assim, ao contrário do que se costuma imaginar, a

fotografia não é um documento à prova de interpretações e questionamentos, já que

também expressão contradições, de modo que a imagem fotográfica possui uma

“realidade própria”, entendida como uma “segunda realidade” imbuída de significados,

construída a partir do real passado, como que aguardando por uma “decifração

competente” (KOSSOY, 2002, p. 22). A essa decifração compete a compreensão dos

processos cognitivos do fotografo, enquanto seu produtor, de maneira que (DUBOIS,

2003, p. 330)

A própria fotografia, em seus maiores desafios, que se encontra revelada como um dispositivo psíquico de primeira linha. Entre olho e memória, entre olhar e pensamento, entre visibilidades e latência, bate a foto. Com toda a força, bate as asas, vai e vem, escorrega incessantemente de um a outro. Ainda palimpsestos.

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33

É nessa oportunidade, dentro da perspectiva da utilização de imagens enquanto

ferramenta psíquica, que este estudo buscou converter as informações das

abordagens espaciais anteriores no sentido da valoração atribuída às suas

características, quando da ótica de um produto mercadológico oferecido e consumido

pelo turista, como também do residente e suas relações afetivas com referido espaço.

2.2 Procedimentos Metodológicos

Devido à unicidade do fenômeno, que pode ocorrer em outras localidades, mas não

com as mesmas variáveis, combinações entre elas ou ainda, não possuirão as

mesmas relações temporais, fez-se a opção pelo estudo de caso simples, segundo as

orientações de Robert Yin (2001), um dos autores com maior credibilidade nas

fundamentações sobre o estudo de caso.

Segundo o referido autor, o estudo de caso é adequado quando os limites do objeto de

estudo não estão claramente definidos, e/ou quanto estão em constante mudança, que

são características comuns em casos únicos, permitindo uma compreensão mais

aprofundada do objeto em questão, melhor identificando o problema, com suas

características e seus processos de produção. A própria complexidade do fenômeno

turístico territorial e a sua representação em dado destino, neste caso a Vila de Alter

do Chão (Santarém-PA), tendo, portanto, características únicas, por si só justificaria a

escolha do estudo de caso para a realização da análise.

Ainda assim, o autor cita outros fatores que tendem a determinar a escolha

metodológica pelo estudo de caso. São estes: o tipo das questões de pesquisa; o nível

de controle que o pesquisador detém sobre as variáveis envolvidas; assim como, a

contemporaneidade dos fenômenos estudados.

De acordo com as indicações de Yin (2001), o objetivo principal desta pesquisa atende

às questões anteriores, haja vista que: (1) a questão de pesquisa situa-se no nível de

“compreender” dado fenômeno; (2) as relações sociais envolvidos nos processos de

formação espacial, bem como de sua percepção e atribuição simbólica, são pouco

passíveis do alto nível controle imposto pelas experiências laboratoriais; (3) além de

tratar-se de um fenômeno social de origem histórica com continuidade e repercussões

atuais no âmbito da urbanidade, das relações sociais e do fenômeno turístico

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enquanto atividade social de repercussão social, cultural, ambiental, econômica, entre

outras.

É importante destacar que, embora este estudo tenha se tornado mais amplo e

abrangente - haja vista que as considerações sobre aspectos simbólicos do espaço da

Vila de Alter do Chão dizem respeito mais à Região Amazônica como um todo - a

utilização da estratégia de pesquisa chamada de estudo de caso, segundo

prerrogativas de Yin (2001), não dizem respeito apenas à uma técnica de coleta ou de

planejamento por si só, mas sim a um modelo de pesquisa que permite generalização

de conceitos e teorias através da análise, ainda que não possua representatividade

quanto à amostragem, de modo que “explanações concorrentes para o mesmo

conjunto de eventos e indicar como essas explanações podem ser aplicadas a outras

situações” (YIN, 2001, p.23). Para tal, a coleta de dados deve utilizar várias fontes,

permitindo melhor identificação e caracterização do fenômeno estudado, em

convergência para as mesmas questões.

Mais uma vez, neste caso, a estratégia da utilização do estudo de caso está coerente

com o objeto e objetivos da pesquisa ora proposta, existindo “muito mais variáveis de

interesse que pontos de dados” (YIN, 2001, p. 32) relacionados a determinado

fenômenos em um contexto, de modo que os limites dos mesmos não estão

claramente definidos.

2.3 Técnicas de Pesquisa

Conforme supracitado, para cada etapa, ou objetivo de pesquisa, foi selecionada uma

metodologia aplicável no sentido de sua realização. Assim, para dar suporte à

compreensão do espaço nas esferas regional e intra-urbana, e desta forma, à

utilização da abordagem metodológica descrita por Santos (1992) para a compreensão

do espaço regional, e de Lamas (2004) para a compreensão do espaço intra-urbano,

foi realizado levantamento cartográfico, além de outros instrumentos complementares,

tais como, plantas, levantamento aerofotogramétricos, fotos de satélite, entre outros,

assim como também, pesquisa histórica e documental, além de leis de uso do solo e

demais dispositivos legais de regulamentação em vigor.

Para a coleta das informações relativas à percepção do destino pelos diversos grupos

de consumidores/usuários do espaço da Vila de Alter do Chão, organizados segundo

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os grupos, será utilizada a combinação de duas técnicas: a utilização de fotografias

produzidas pelos participantes/entrevistados, conjugada às entrevistas semi-

estruturadas ou guiadas, aplicadas por ocasião das discussões e esclarecimentos

finais sobre as referidas imagens.

Esse procedimento pretende propiciar um entendimento mais completo dos dados

uma vez que congrega duas formas de expressão estudadas por Santanaella e Nöth,

(1998) que citam a linguagem, como ferramenta imprescindível na análise de imagens

semióticas. Os autores afirmam que “o código hegemônico deste século não está nem

na imagem, nem na palavra oral ou escrita, mas nas suas interfaces, sobreposições e

intercursos (...)” (p.69) e para Ferrara (1999), as escalas de valores são esclarecidas

mutuamente através das fotos e da fala através das quais é fornecida uma

possibilidade de interpretação.

As imagens fotográficas, consideradas “espontâneas e pré-verbais” (FERRARA, 1999

a, p.115) e têm como princípio buscar informações mais sutis, relativas à percepção

dos usuários/consumidores de um espaço e de seu relacionamento com ele,

informações estas que poder ser omitidas ou suprimidas quando da fala. Para a

referida autora, não é possível pesquisar de maneira direta a percepção ambiental,

haja vista que,

se a percepção ambiental tem como signo a informação capaz de orientar condutas, está claro que esta informação não é passível de ser registrada, mas, ao contrário, ela também se faz representar através daquilo que é fotografado e do modo como se fotografa (p.265 e 267).

De maneira que “a fotografia não foi [é] utilizada como técnica de registro, mas como

seleção que informava [informa] sobre uma ideologia ambiental” (FERRARA, 1999 b).

Em corroboração, Kossoy (2002, p. 36) afirma que “toda e qualquer imagem

fotográfica contém em si, oculta e internamente, uma história”, transpondo a realidade

visual e a dimensão espacial para um recorte do “assunto” ou tema selecionado e para

as duas dimensões do papel. Assim, a produção de imagens fotográficas implica na

construção de uma representação, segundo certa intenção, “construindo e

materializando cultural, estética/ideológica e tecnicamente, de acordo com a visão

particular de mundo do fotografo” (p. 42), “atravessada por todos os tipos de códigos”

(DUBOIS, 2003, p. 48), fornecendo através de sua interpretação, informações

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relevantes a este estudo, tanto no que concerne ao ambiente e aos locais

fotografados, quanto à forma de observá-los por cada um dos sujeitos entrevistados.

E, ainda assim, é possível afirmar que há certo nível de realismo e de valor

documental na imagem fotográfica (DUBOIS, 2003), uma vez que a foto, de certa

forma, torna-se parte constituinte e inseparável da experiência que lhe conferiu

origem, “da experiência referencial”, implicando que a mesma mantém uma relações

com seu objeto referencial, marcada por quatro princípios denominados por Dubois

(2003, p. 51) como “conexão física, de singularidade, de designação e de atestação”.

Os participantes foram selecionados aleatoriamente segundo os grupos de

consumidores/usuários do espaço posteriormente identificados, através de indicações

do conselho comunitário, disponibilidade e interesse em participar da pesquisa, além

de possuírem imagens fotográficas pré-existentes da Vila de Alter do Chão para

realização das entrevistas a seu respeito. Cada entrevistado foi convidado a selecionar

5 (cinco) imagens quaisquer, que considerassem interessantes ou relevantes sob seu

ponto de vista, imagens sobre as quais o residente ou turista gostaria de conversar,

com a única exigência e critério que estas fotografias fossem na Vila, contivessem

cenas ocorridas na localidade.

A utilização de imagens pré-existentes foi definida por diminuir as possibilidades de

interferência e indução do próprio processo de pesquisa nos resultados obtidos. É

nesse sentido que Lucrécia Ferrara (1999) cita, quando da descrição da metodologia

utilizada em sua pesquisa, a importância da utilização da imagem da maneira mais

livre possível quanto ao que fotografar e como fotografar, excluindo a possibilidade de

apresentar alternativas (fotografias previamente apresentadas pelo pesquisador) ou

mesmo o direcionamento da produção das imagens para determinados temas. Esse

processo seria por si só indutivo das respostas possíveis, limitando e objetivando as

condições de escolhas das imagens, ao contrário do que pretende-se quando tem-se

como princípio norteador da metodologia o seu caráter subjetivo e “pré-verbal”.

As entrevistas foram realizadas tendo como ponto de partida as cinco imagens

fotográficas de cada participante, a partir das quais foram realizadas conversas no

formato de entrevistas semi-estruturadas ou guiadas, constituindo um procedimento

que objetiva a coleta de informações subjetivas, durante as quais “o pesquisador

busca obter os informes contidos na fala dos atores sociais” (MINAYO, 1999, p.57).

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Segundo Richardson (1999), esta ferramenta de coleta é composta de um roteiro

básico de perguntas que foram respondidas livremente, mas que também

direcionaram o pesquisador no sentido dos temas a investigar, enfatizando os

aspectos nos quais pretende se deter. Esse é seu objetivo: “descobrir aspectos de

determinada experiência” (RICHARDSON, 1999, p.212).

Estes roteiros foram flexibilizados segundo os enfoques de pesquisa, de acordo com

subitens relacionados a cada pergunta, como lembretes, que não devem restringir o

depoimento a uma entrevista estruturada, mas somente para orientar o processo,

permitindo que o entrevistado possa expressar-se livremente.

Entretanto, para tal, o estabelecimento de uma relação de amizade e confiança, assim

como a elaboração adequada das perguntas constituem aspectos fundamentais. Para

Richardson (1999), as perguntas devem ser neutras e que favoreçam a fluidez das

entrevistas, de maneira que perguntas tendenciosas, ou seja, que induzam

determinadas respostas, terão interferência direta sobre os resultados, prejudicando

sua capacidade de observação ao objeto de estudo.

Conforme citado anteriormente, dentre os vários grupos de consumidores/usuários do

espaço identificados, estão os residentes subdivididos em três grupos menores que

são: (1) os residentes nativos, (2) os nativos que migraram criando uma nova

comunidade distante 2 km de Alter do Chão, e (3) os novos residentes, entre os quais

pessoas oriundas de outros estados e de outros países.

O segundo grande grupo é composto por turistas e visitantes, organizados segundo:

(1) proprietários de segundas residências; (2) turistas locais, vindos de Santarém e

cidades próximas, mas que utilizam a rede de hospedagem local; (3) turistas regionais,

vindos de cidades mais distantes e de outros estados da região Norte do Brasil; (4)

turistas nacionais, vindos de outras regiões do país; (5) turistas internacionais, vindos

de outros países. Este último grupo pode ainda ser subdividido e classificado em: (5.1)

participantes de cruzeiros internacionais; (5.2) mochileiros; além dos (5.3) viajantes

individuais e (5.4) viajantes em pequenos grupos.

Devido ao caráter qualitativo desta pesquisa, além da limitação de tempo e de

recursos humanos para sua realização e processo de transcrição das entrevistas,

acabam por determinar a utilização de pequenas amostras, de modo que foram

entrevistados oito (8) residentes, escolhidos aleatoriamente entre os residentes

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nativos, na Vila de Alter do Chão (grupo 1) e oito (8) turistas – de outras regiões do

Brasil ou de outros países (grupos 4 e 5). Nesse sentido é importante frisar que a

relação numérica não pode ser tomada como dado absoluto, mas sim como

indicadores a partir dos quais é possível a realização de extrapolações no sentido de

uma generalização relativa e analítica.

Apesar de ser perceptível que cada grupo possivelmente apresentará uma diferente

maneira de perceber a localidade, dados seus filtros culturais pré-existentes, devido às

limitações de tempo e recursos e também com o propósito de tornar mais significativo

o número de entrevistas realizadas, foram selecionados dois grupos de

usuários/consumidores do espaço, entre residentes e turistas que foram abordados

nas entrevistas abertas sobre imagens: dentre os residentes todos entrevistados são

do grupo de moradores tradicionais/locais; e dentre os turistas, são todos dos grupos

de turistas nacionais e internacionais.

De posse das informações, para a análise dos dados referentes à constituição do

espaço regional e intra-urbano, foi realizada tendo como auxílio, a construção e

utilização de pranchas, que ajudam a sistematizar as informações sobre a gênese, os

processos que deram origem assim como, as tendências de expansão e áreas de

pressão, além dos elementos morfológicos do espaço e sua apropriação pelas

diversas categorias de usuários identificadas, à luz do referencial teórico e da

abordagem metodológica selecionados, segundo as categorias e os elementos

propostos por Santos (1992) e Lamas (2004), respectivamente.

Já a análise das imagens fotográficas produzidas será feita através de uma

abordagem semiológica, já que a “semiótica do espaço social tem como objeto da

linguagem do espaço, o modo como se representam as suas transformações”

(FERRARA, 1999, p.106), manifestos na dimensão da linguagem pelo processo de

percepção ambiental, de forma fragmentada e localizada, segundo as características

sócio-culturais e informativas do sujeito perceptivo.

Assim, busca-se a “representação da cidade através de sua imagem, percepção e

conhecimento ambientais através da associação de idéias” (FERRARA, 1999, p.109).

Nesta perspectiva o espaço social será estudado também como manifestação

semiótica, sendo que esta estuda as imagens selecionadas pelo próprio

consumidor/usuário sobre as relações sociais como produto e produtoras de dado

espaço.

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Através da análise das imagens buscar-se-á o resgate de diversos índices urbanos

reconhecidos como informações, significados e/ou dados pelo usuário que as

seleciona fotograficamente.

Segundo Ferrara (1999), essa abordagem para a análise das imagens possui

características do método abdutivo, tratando-se de uma reflexão e uma exploração

metodológica, impondo aos estudos urbanos a consideração de uma dimensão

cultural, que é objetivada pela projeção fotográfica feita por cada um dos

consumidores/usuários deste espaço participante da pesquisa. Assim, para Ferrara

(1999, p.116), “essa interpretação é mais do que conhecer certo ambiente no sentido

de apreendê-lo descritivamente, é saber quais inferências sugere e o modo como se

processam essas inferências”.

A natureza polissêmica das imagens garante que sempre haja diversas possibilidades

na leitura/interpretação das mesmas, de modo que o receptor da mensagem possui

papel relevante nesta tarefa, estando vinculada ao seu repertório cultural em particular

(KOSSOY, 2002). Desta forma, é importante observar que a natureza sígnica da

imagem, contém “uma série de elementos icônicos que fornecem informações para

diversas áreas do conhecimento” (KOSSOY, 2002, p. 51), através da qual busca-se a

materialização, a concretização de uma idéia, de um conceito, ainda que de forma

inconsciente.

Outra vantagem da utilização da fotografia e que fornece as primeiras pistas para a

sua interpretação, é descrita por Santanaella e Nöth (1998, p. 107) como uma das

mais notáveis características semióticas da fotografia, haja vista que esta é ao mesmo

tempo ícone e índice, já que, ao mesmo tempo em que, reproduz a realidade, também

possui uma relação causal com ela.

Para a interpretação iconográfica de imagens, denominada por Kossoy (2002) de

“interpretação iconológica”, busca identificar/resgatar o assunto, a história do momento

fotografado, assim como também, das condições para a produção destas imagens. No

caso deste estudo, a ênfase das análises deu-se no resgate desta história através das

entrevistas, de forma que as condições de produção foram desconsideradas, dadas as

impossibilidades de resgatar todos os mecanismos e técnicas utilizadas. Isto em vista

o tempo de existência de algumas fotos (especialmente as produzidas pelos

residentes) e do esquecimento das suas condições de produção, assim como da

grande variedade de tecnologias aplicadas, utilizando desde equipamentos mais

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simples, com filmes e negativos tradicionais até o emprego de técnicas e câmeras

digitais profissionais.

Conforme frisado anteriormente, a análise das imagens fotográficas foi realizada de

forma integrada e paralelamente à análise das informações coletadas durante as

entrevistas, após a qual, sucede-se a sua transcrição, de maneira a viabilizar sua

análise pela metodologia qualitativa de Discurso do Sujeito Coletivo – DSC - proposta

por Lefèvre & Lefèvre (2000), bem como, as suas “interfaces, sobreposições e

intercursos” com as imagens produzidas pelos entrevistados, fundamentada através

dos princípios da semiótica. A este respeito Kossoy (2002, p. 54) nos lembra que

“desde sempre as imagens foram vulneráveis às alterações de seus significados em

função do título que recebem, dos textos que ‘ilustram’, das legendas que

acompanham (...)”, ponderando que uma análise isolada das fotografias ou das

entrevistas coletadas poderia determinar resultados diferenciados. O cruzamento das

duas fontes pretende fornecer informações a respeito do repertório cultural do produtor

das imagens fotográficas, que, conforme frisado anteriormente, faz-se essencial para o

direcionamento das interpretações possíveis, mais próximo da ótica do entrevistado e

produtor das informações, e não do pesquisador, enquanto observador das imagens

fotográficas.

Os autores (LEFÈVRE & LEFÈVRE, 2000) afirmam que, as respostas oferecidas pelos

indivíduos entrevistados, são notadamente marcadas por signos que expressam

ideologias, prioridades, ambientes culturais, ou seja, idéias representativas de diversos

conteúdos cognitivos do grupo em questão.

Para tal, foram extraídas de cada depoimento a Ancoragem, a Idéia Central (IC) e as

Expressões-Chave (ECH), segundo o Discurso do Sujeito Coletivo de Lefèvre &

Lefèvre (2000). Em complementaridade ao DSC, foi criada a categoria de Elementos

Morfológicos e Sócio-Culturais (EMS) que incluem lugares, elementos morfológicos e

sócio-culturais citados, possibilitando decompor e sistematizar analiticamente a

informação coletada individualmente, de forma a identificar um ou mais discursos-

síntese desta representação social, enquanto objeto de estudo.

Estes elementos, segundo Lefèvre & Lefèvre (2000), são essenciais para a

compreensão do conteúdo destes depoimentos, uma vez que constituem a essência, a

tradução dos relatos orais. A coleta das idéias centrais e das expressões-chave,

diretamente relacionadas, deve ser feita de forma rigorosa e atenta, devendo

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compreender que as expressões-chave são trechos da transcrição literal dos

depoimentos que idealmente devem confirmar sua idéia central.

Fica claro, que a utilização desta categoria metodológica para a análise dos dados

deve ser fundamentada sobre uma análise dos signos expressos individualmente, de

forma a identificar tantos quantos forem os discursos formadores de um dado objeto

de estudo.

Essa multiplicidade de discursos pode ser uma indicação da existência de percepções

e ideologias conflitantes dentro do grupo, ou ainda, uma segmentação interna aos

grupos em “níveis” de rejeição (ou tolerância) a respeito de determinados aspectos

relatados, possibilitando assim a contemplação da complexidade de um mesmo

discurso existente. No que se refere ao objeto de estudo pretendido, é muito provável

que exista mais de um discurso-síntese identificado, dada a complexidade do tema e a

diversidade de interesses e grupos envolvidos na atividade turística - residentes,

proprietários de segunda residência, turistas habituais e ocasionais com suas

diferentes origens (e assim, diferentes referências culturais) e perfis motivacionais. A

síntese destes relatos, chamados pelos autores (LEFÈVRE & LEFÈVRE, 2000) de

discursos-síntese, estudados à luz do referencial teórico selecionado, devem fornecer

respostas para a relação entre as variáveis morfologia urbana e atratividade, no

caso deste estudo, observadas através do caso de Alter do Chão (Santarém/PA).

Como forma de agrupar os resultados das diversas metodologias utilizadas, são

propostas a seguir, quatro categorias de análise que devem ser entendidas como

parâmetro de um esforço interpretativo para as informações apresentadas neste

estudo. Entretanto, é importante mencionar que seu caráter sistêmico exige a leitura

dos dados de maneira integrada e articulada, de forma que são categorias que

procuram sistematizar elementos interdependentes para o estudo da morfologia

urbana e de sua apreensão.

Assim, com o propósito de ordenar e permitir a fusão das análises dos dados obtidos

nas etapas metodológicas desta pesquisa são apresentadas a seguir, quatro

categorias analíticas organizadas segundo grandes temas, que são: (1) Produção e

apropriação do espaço (Urbano e Natural); (2) Redes urbanas; (3) Ambiente urbano;

(4) Percepção do espaço turístico (Residentes e Turistas).

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a) Produção e Apropriação do Espaço (Urbano e Natural): Esta categoria

inclui as lógicas ocorrentes na produção sócio-espacial ao longo do tempo,

incluindo fatores históricos, políticos e legais relacionados ao seu crescimento

urbano.

Neste âmbito também será incluído o caráter sócio-econômico dos agentes

formadores do espaço urbano enquanto determinante para sua formação

segundo uma tendência homogeneizadora - espacial e socialmente - através das

características de consumo e mesmo dos valores e desejos com suas

conseqüências culturais.

Nesta categoria também estão incluídas as lógicas de apropriação dos espaços

por seus usuários, sejam eles residentes ou turistas, procurando estabelecer a

maneira pela qual é utilizado e significado por estes referidos usuários.

Como parte dessa mesma lógica de produção do espaço, estão incluídas

também as políticas estabelecidas pelo poder constituído, dentre os quais a

legislação vigente, assim como as intervenções urbanísticas implementadas tanto

pelo Poder Público quanto pela iniciativa privada, bem como a forma pela qual a

sua atuação tem interferido na criação do espaço urbano em questão, enquanto

agente ativo de sua configuração.

Nesta categoria também está incluído o poder de decisão e organização dos

usuários deste espaço, enquanto atores na sua configuração, seja pela omissão,

pelas exigências e/ou condições reivindicadas ao Poder Público e à iniciativa

privada, seja por sua própria atuação como agentes ativos na manutenção ou

depredação de áreas e bens públicos, ou ainda, atuantes na solução de

problemas comuns. Incluem-se aqui também características de mobilização e/ou

de isenção frente aos problemas de ordem pública, com posicionamentos

paternalistas, até o papel da religião e da educação neste contexto.

Esta categoria relaciona-se com as demais uma vez que procura compreender os

processos históricos que deram origem à formação dos elementos apresentados

nas categorias ambiente urbano e sistemas urbanos; também se relaciona à

categoria de Percepção do espaço turístico (residentes e turistas) que interferirá

na apropriação que se dá.

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b) Redes Sociais e Urbanas: Esta categoria pretende sistematizar os dados

referentes aos diversos sistemas sociais urbanos, estruturadores das dinâmicas

urbanas, dentre os quais as redes de esgoto, água, a infra-estrutura viária, os

equipamentos e serviços públicos de saúde, lazer, educação, entre outros.

Neste sentido também estão incluídos os dados referentes à percepção/utilização

dos espaços públicos e de lazer, como espaços de apropriação coletiva, além de

questões da mobilidade urbana e da qualidade do ambiente urbano.

A apropriação dos espaços e serviços públicos também deve ser entendida como

conjunto e parte da análise realizada na categoria anterior – Lógica de Produção

e Apropriação do Espaço – uma vez que estão estreitamente vinculadas através

das relações estabelecidas entre os usuários e o espaço.

c) Ambiente Urbano: Esta categoria agrega os elementos presentes no

ambiente natural e cultural. No ambiente natural são incluídas as características

do sítio, tais como topografia, a hidrografia, a vegetação, entre outros. Já no

ambiente cultural, são incluídos os diversos elementos que compõem o espaço

cultural, particularmente os elementos construídos, dentre os quais as

edificações, a malha urbana, o parcelamento do solo, entre outros.

O ambiente natural e o ambiente cultural podem ser entendidos como

constituintes do urbano – semelhantemente aos fixos naturais e os fixos

construídos - agregando ainda a esta análise a maneira como se dá a relação do

cultural com o natural, incluindo de praças, áreas verdes, vegetação em

logradouros públicos e privados, bem como de áreas preservadas ou com pouca

intervenção humana.

Os elementos aqui apresentados estão fortemente relacionados às demais

categorias também, tendo em vista que estes elementos fixos são apropriados

pelas demais categorias, assim como também, originam ou são originados por

elas. Também cumpre salientar que tais elementos, como um sistema de objetos,

estão fortemente relacionados aos sistemas de ações, gerado e gerador dos

sistemas materiais. Assim, nesta categoria, busca compreender a morfologia

urbana do local, e não apenas a forma em si.

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d) Percepção do Espaço Turístico (Residentes e Turistas): Esta categoria

pretende agrupar e discutir informações à respeito dos valores urbanos

identificados através de seus usuários – residentes e turistas, incluindo

atribuições simbólicas e afetivas relacionadas ao espaço, assim como, os valores

estabelecidos pela sociedade de consumo, no que se refere à forma de construir,

de delimitar e afirmar a propriedade, de apropriar-se do público e do privado, de

preservar ou não determinados traços, locais, paisagens presentes no espaço e

na cultura local, bem como do imaginário, das expectativas dos turistas com

relação ao destino.

Esta categoria possui características etnográficas, o que tradicionalmente se

opõem às lógicas marxistas. Entretanto, através do referencial da sistêmica com

as dimensões apresentadas por Capra (2002), propõe-se uma conversa entre

estas duas escolas, no sentido da obtenção de respostas mais completas ao

problema de pesquisa deste estudo.

Nesse sentido, conforme dito anteriormente, esta categoria permeará as demais

estando relacionada à quarta dimensão dos sistemas sociais proposta por Capra

(2002): a dimensão do significado.

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3. O ESPAÇO TURÍSTICO E SUA DIMENSÃO GEOGRÁFICA

O estudo do espaço turístico não pode ser feito sem que se leve em conta as demais

relações econômicas e sociais, que nele também se manifestam e coexistem

(SANTOS, 1992). Desta forma, o espaço turístico, que também é espaço de outras

manifestações, atua como reflexo de uma condição social, no qual cada processo

social determina sua respectiva forma espacial (CORREA, 1995). Segundo Correa

(1995) este mesmo espaço deve ser contextualizado em um panorama de conflitos

sociais e que possui entre seus agentes sociais formadores os proprietários dos meios

de produção, os proprietários fundiários, os promotores imobiliários e o estado. Estes

agentes são, ao mesmo tempo, fomentadores e também elementos componentes,

partes do espaço, os quais Santos (1992) classifica em (1) Homens, (2) Empresas, (3)

Instituições e (4) Meio Ambiente/Infra-estruturas, enquanto componentes estruturados

e organizados entre si através de relações generalizadas, e não apenas bilaterais, na

conformação de um sistema composto de outros tantos subsistemas.

O turismo também está situado neste contexto, enquanto atividade econômico-social

que requer condições específicas de sua localização – como fatores de acessibilidade

e a presença ou proximidade de atrativos e/ou amenidades – e que, por sua vez,

também estimula a atuação destes agentes sociais, pela valorização de determinadas

áreas, seja através de seus modelos de produção e trabalho, seja pela intervenção do

estado criando áreas com legislação específica em favorecimento ao setor. Assim,

segundo Santos (1992) a organização do espaço é resultado do equilíbrio entre

fatores de dispersão e de concentração em um dado momento da história do espaço.

A atividade turística vem interferindo cada vez em mais localidades, convertidas em

destinações, graças aos avanços obtidos nas tecnologias de transporte, que têm

determinado a diminuição da importância da sua posição geográfica. Essas novas

técnicas e tecnologias têm possibilitado crescentemente a dissociação locacional de

diversas atividades, atuando como um dos possíveis fatores de dispersão citados

anteriormente.

No caso da localidade na qual se dará a realização deste estudo de caso, as

alterações sofridas pelo modelo de ocupação que tem no turismo um de seus

indutores, podem demonstrar que o uso do espaço passou a ser determinado pelos

interesses do capitalismo (SANTOS, 1992), atendendo aos interesses das classes

dominantes que determinam a si próprias, a ocupação das áreas que julgam mais

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atraentes (CORREA, 1995), levando à transferências dos residentes originais

(SANTOS, 1992) para áreas mais afastadas do interesse do capital, gerando certa

desculturalização da população tradicional, alijada de manter suas relações afetivas,

sociais e produtivas com este espaço.

Muitas dessas alterações devem-se ao que Santos (1992 p.29) trata quando refere-se

ao desmantelamento da organização anterior de dado espaço, haja vista que “todos os

espaços são alcançados imediatamente por um certo número de modernizações“,

peculiares ao período tecnológico, ao qual corresponde grande velocidade

informacional. Essa modernização citada pelo autor, pode ser apenas uma adaptação

das atividades existentes ao novo grau de modernização, assim como também, em

mudanças mais fortes como a inclusão ou extinção de determinada atividade. Santos

(1992) ainda frisa que “certos espaços não são objeto de todas as modernizações”

(p.32), podendo também ocorrer demora e/ou defasagem no seu aparecimento, e que

os resultados das alterações sofridas no referido espaço é determinado pelos próprios

interesses do sistema, influenciando ou sofrendo influência de outros sistemas tais nos

quais tenha havido uma concentração diferenciada destas modernizações.

Ainda segundo as referidas modernizações, Goulart (2006) destaca que a existência

destas mesmas modernizações possibilita a existência atual e crescente de novas

formas de acesso, anteriormente focadas nos aspectos físicos e no transporte. Agora

essas formas de acesso são possibilitadas em uma nova dimensão, por assim dizer

“imaterial”, de modo que o acesso está mais fortemente relacionado à informação e à

comunicação, determinantes também na atividade turística, inclusive quando do

fomento a uma imagem de referido destino.

Algumas mudanças notadamente marcadas nas tipologias das construções, nos

materiais e técnicas empregados, na configuração e ocupação dos lotes na Vila de

Alter do Chão, podem sugerir que, a chegada das “modernidades construtivas”, pode

determinar o abandono das características tradicionais, segundo o entendimento que a

sociedade local possui sobre o que deve ser tratado e implementado como “melhoria”

nas condições de vida e de habitação.

No entanto, segundo Corrêa (1995 b), em alguns casos há a cristalização de áreas

nas quais acontece a preservação da forma e conteúdo, pela força de sentimento e

simbolismo, interferindo diretamente o uso da terra. Assim, esse impacto de

sentimentos - sejam eles de retenção, atração ou resistência - se opõe à racionalidade

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econômica. Tal fenômeno pode ser identificado na Comunidade de Alter do Chão nas

poucas residências de seus habitantes nativos ainda localizadas nas proximidades do

rio e nas que ainda utilizam materiais e/ou técnicas tradicionais de construção,

manifestando a força das raízes culturais que os relacionam.

É evidente que este fenômeno é mais fortemente observado nas classes dominantes,

que detém o poder do capital e que fazem questão de preservar os “testemunhos

materiais de seus antepassados numa demonstração algo romântica ou saudosista,

constituindo tudo isso manifestações de afirmação elitista” (LEMOS, 1981, p.31). Os

próprios instrumentos legais de preservação criados pelo Estado, enquanto um dos

agentes produtores do espaço citado por Corrêa (1995 b), acabam reforçando esse

comportamento de desvalorização dos construtos populares. Da mesma forma, Santos

(1996), sobre a criação da forma urbana enquanto cristalização das transformações

sofridas pelo espaço ao longo do tempo, nos lembra que algumas destas são mais

permanentes que outras, obviamente, seguindo, na maioria das vezes, os interesses

das elites referidas por Lemos (1981) e, assim, os interesses do próprio capital.

Paralelamente a reflexão sobre o espaço e sua formação, segundo o enfoque de

nossa problemática de pesquisa, torna-se necessária a delimitação da expressão

morfologia urbana. Lamas (2004) enfatiza a importância de fazer a distinção entre

forma urbana e morfologia urbana, muitas vezes tidos como sinônimos. De acordo

com o autor, a forma da cidade é o objeto de estudo da morfologia urbana que assim é

a ciência que estuda as formas, interligando-as com os fenômenos que lhes deram origem (...), estudará essencialmente aspectos exteriores do meio urbano e suas relações recíprocas, definindo e explicando a paisagem urbana e a sua estrutura (LAMAS 2004, p.37).

Entretanto, o espaço turístico, conforme dito anteriormente, é algo mais amplo e cujo

seu entendimento precede à análise das formas aí estabelecidas, com a finalidade de

avaliar a sua implicância na atratividade de tais destinos turísticos, escopo maior deste

trabalho. Percebe-se que, mesmo o autor, com fortes tendências e inclinações ao

estudo de aspectos formais (dada sua formação), reconhece e evidencia a

necessidade de observar fatores de historicidade relacionados à configuração das

formas urbanas e de determinação da vida humana em comunidade, afirmando que

“só o cruzamento de diferentes leituras e informações poderá explicar um objeto tão

complexo quanto a cidade” (LAMAS, 2004 p.37).

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Do mesmo modo, Santos (1992), afirma que o espaço é resultado de processos

sociais e supõe a acumulação de ações ao longo do tempo, cristalizadas ou

materializadas através da forma. Assim, para este autor, o espaço não pode ser

entendido de forma fragmentada, mas apenas poderá ser estudado segundo quatro

categorias de análise, pelas quais o espaço pode ser analiticamente dividido sem, no

entanto, negligenciar a volta à síntese imprescindível que requer este objeto. As quatro

categorias sugeridas por Santos (1992), que serão abordadas com maior profundidade

posteriormente, são: forma, função, estrutura e processo.

A diferença mais sensível entre os autores, está na maneira como a ‘forma’ está

situada para a compreensão do espaço. Lamas (2004) entende que, sendo a forma

resultado de diversos conteúdos histórico-culturais materializados, constitui o único

elemento capaz de permitir tal leitura. Já para Santos (1996), essa leitura não é

possível se realizada apenas através da matéria, ou seja, da ‘forma’, mas somente

quando a mesma é animada pela sociedade, lhe conferindo um valor social, sem a

qual a ‘forma’ não tem qualquer significado, ou seja, sem a qual, não há espaço.

Estes dois posicionamentos, de certa maneira, conflitantes, possibilitarão o

enriquecimento da análise em direção à problemática da pesquisa, de forma que, as

categorias de análise de Santos (1992) parecem permitir uma visão mais completa e

mais crítica do espaço turístico, enquanto espaço social, e sua formação, e assim

também cumprindo com maior profundidade o que Lamas (2004) chamou de

“cruzamento de diferentes leituras”, fornecendo o suporte para a compreensão da

forma urbana enquanto fator de atratividade em destinos amazônicos.

A este respeito, Goulart (2006), defende que “se as configurações do espaço urbano

são suporte e resultado da vida social, as mudanças na existência social devem

compreender novas modalidades de urbanização e novas configurações” (p.19). Ele

inclui em seus estudos, duas escalas de análise “distintas e interligadas” - uma

abordagem mais relacionada ao espaço regional e outra, concernente ao espaço da

cidade em si, ou seja, ao espaço intra-urbano (VILLAÇA, 1998; GOULART, 2006) – no

sentido de uma melhor apreensão dos fenômenos espaciais sofridos.

Essa diferenciação de escala não é feita indiscriminadamente, uma vez que existem

diferenças fundamentais entre as mesmas, assim como de seus elementos e do nível

de detalhes que é possível obter, exigir de cada uma. Para Villaça (1998, p.20),

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a estruturação do espaço regional é dominada pelo deslocamento das informações, da energia, do capital constante e das mercadorias em geral (...). O espaço intra-urbano, ao contrário, é estruturado fundamentalmente pelas condições de deslocamento do ser humano, seja enquanto portador da mercadoria força de trabalho (...), seja enquanto consumidor.

Goulart (2006) destaca que o espaço regional tem sido representado, quase sempre,

segundo características abstratas e quantificáveis, e que, no caso do espaço intra-

urbano, sua apreensão não deve acontecer apenas segundo estes dados gerais e

abstratos, mas sim, “pelas condições materiais de suas configurações, em toda sua

diversidade” (p.42), lembrando ainda o autor que

o espaço intra-urbano é fundamentalmente concreto e tende a ser registrado por suas formas geométricas de divisão da propriedade e edificação (tecido urbano), pela infra-estrutura e pelos serviços de mercado e de uso. É um espaço cujo valor é dado pelas edificações e pelas obras que lhe conferem acessibilidade e condições de uso.

São estas ‘configurações formais’ destacadas pelo autor que são apropriadas pelo

principal objetivo desta pesquisa, na medida em que a ‘forma’ é a característica mais

visível do espaço, e também seu traço mais durável ou permanente, enquanto sistema

de objetos. Santos (1992) afirma ainda que, a durabilidade dessa relação determina o

rastro e/ou superposição desses momentos históricos, de maneira que cada período

poderia entao “imprimir por completo suas próprias marcas na porção do espaço

considerada” (SANTOS, 1992, p.33).

Neste sentido, bserva-se que através de um panorama regional é possível entender as

‘forças’, os sistemas de ações, os processos que conformaram dado espaço. No

entanto, é na escala intra-urbana, na escala do tecido urbano que estão definidas as

relações de propriedade do espaço, assim como a determinação de sua produção, uso

e apropriação, ou seja, é na escala do intra-urbano que se define a ‘forma’ (Goulart,

2006).

Assim, sem esquecer que a cidade “não poderá ser desligada de seu suporte

geográfico” (LAMAS, 2004, p. 63), esta pesquisa pretende utilizar os fragmentos ou

partes constituintes da ‘forma’ relacionadas por Lamas (2004) – por ele definidos como

elementos morfológicos do espaço - para o estudo da ‘forma’. Estes elementos

morfológicos serão apresentados e descritos em sessão posterior, segundo sua

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classificação e sistematização pelo autor - o solo/ pavimento; os edifícios; os lotes/

parcelas fundiárias; o quarteirão; a fachada/ plano marginal; o logradouro; o traçado/

rua; a praça; o monumento; a árvore e a vegetação; o mobiliário urbano.

3.1 Espaço Regional

Santos (1992), através de sua análise geográfica do espaço, compreende-o através de

uma visão humana, uma visão social, de maneira que o espaço humano não

corresponde apenas ao espaço construído. Ao contrário, a primeira classe – espaço

humano, segundo o autor, é mais abrangente e contém a segunda – espaço

construído. Para Santos (1992, p.2), o espaço é fator, e não apenas condição, da

evolução social, e sendo uma “instância da sociedade”, o espaço contém e ao mesmo

tempo é contido por esta, determinando assim a sua essência social.

O estudo deste espaço, enquanto expressão humana, só pode ser realizado à luz da

sua história e do seu presente, de modo que as alterações nos modos de produção,

por exemplo, certamente determinarão a ocorrência de movimentos de mudança

também no espaço. Cada localidade, para a qual seja imposto o mesmo impulso terá

reações diferenciadas, segundo cada sistema e suas condições locais próprias,

passando então a atuar também como modificador do referido estímulo externo

(SANTOS, 1992). Nestes estudos está incluído o sistema temporal possibilitando,

segundo os critérios de periodização determinados pelo pesquisador, a compreensão

analítica de um processo de formação histórica a partir do qual se deu a origem e a

formação de dado espaço.

Correa (1995) cita que as relações sociais, assim como os modos de produção, criam

e interferem na reprodução do espaço, gerando especulação e segregação entre

áreas da cidade, nas quais a ação dos promotores imobiliários, além da existência de

aspectos culturais e simbólicos peculiares, interfere diretamente na criação e

manutenção da referida segregação.

Neste contexto, o Estado pode ser percebido como um dos principais agentes de

formação e transformação espacial, podendo desempenhar papéis diferenciados e até

contraditórios: como grande industrial enquanto responsável pela implantação de

indústrias e grandes projetos, como consumidor de espaços enquanto aquisitor e

construtor em áreas de seu interesse, como proprietário fundiário enquanto detentor

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de áreas de reserva e de interesse público, como promotor imobiliário enquanto

interventor urbano na implantação de infra-estrutura e serviços, assim como também,

como agente regulador do uso do solo enquanto legislador.

Segundo o posicionamento dos autores, é possível perceber o caráter mais

abrangente utilizado na abordagem espacial, conforme denominado neste estudo

como espaço regional. Para que seja possível a realização deste estudo, a seguir, são

identificadas e definidas as quatro categorias de análise do espaço, conforme proposto

por Milton Santos (1992).

3.1.1. As categorias do método geográfico

Para a compreensão deste espaço tão complexo, conforme frisado anteriormente,

Santos (1992), em seu método geográfico, defendeu a necessidade de um enfoque

abrangente quando do estudo do espaço, possibilitando tecnicamente, a verificação de

“como os resíduos do passado são um obstáculo à difusão do novo ou juntos

encontram maneiras de permitir ações simultâneas” (SANTOS, 1996, p. 35). Para o

autor, as ‘rugosidades’ remanescentes dos sistemas técnicos anteriores constituem

mais que heranças físico-territoriais: constituem heranças “sócioterritoriais ou

sóciogeográficas” (p.36), de forma que “o valor de um dado elemento do espaço, seja

ele o objeto técnico mais concreto ou mais performante, é dado pelo conjunto da

sociedade, e se exprime através da realidade do espaço em que se encaixou”

(SANTOS, 1996, p.36).

O referido autor, em suas diversas obras, estuda a possibilidade da utilização de

algumas categorias de compreensão do espaço geográfico, tais como, os fixos e os

fluxos. Santos (1996) define “os fluxos são um resultado direto ou indireto das ações e

atravessam e se instalam nos fixos, modificando a sua significação e o seu valor, ao

mesmo tempo em que, também, se modificam” (p.50). Outro par de categorias citado

pelo autor é formado pela configuração territorial e pelas relações sociais, de modo

que a primeira possui uma existência material própria, resultado de uma produção

histórica que está permeada de relações sociais, que assim permitem que a

configuração territorial, assuma, pois, sua existência real (p.51).

Assim, o traço fundamental observado nas propostas de estudo e compreensão do

espaço de Santos (1996), incluem sempre dois sistemas, que são: os sistemas de

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objetos e os sistemas de ações. Esse conjunto formador do espaço mantém relações

dialéticas entre si, tendo como características ser “indissociável, solidário e também

contraditório” (p.51), de maneira que não fazem sentido os objetos destituídos do

sistema de ações, que também não ocorre sem os sistemas de objetos.

Assim, Santos (1992) identificou a existência de quatro categorias analíticas para o

estudo do espaço - que incluem sistemas de objetos e sistemas de ações, que nada

mais são que fixos e fluxos - que são: a estrutura, a função, a forma e o processo.

Sem nenhuma escala hierárquica entre elas, segundo o autor, a utilização das

categorias constitui um exercício dialético, que obriga ao retorno da síntese como

condição para a legibilidade do espaço.

Em seu discurso, Santos (1992) evidencia o caráter indissociável entre as citadas

categorias, e caracteriza processo como as ações contínuas desta sociedade e seus

modos de produção através do tempo, função como as atividades ou tarefas

desempenhadas por esta sociedade, então conformadas, materializadas através da

forma e que estão inter-relacionadas de maneira sistêmica em estruturas. Assim

(SANTOS, 1992, p.50):

a) A categoria forma pode ser definida como o aspecto visível de uma coisa, ou ainda,

a forma são os contornos oriundos de determinadas finalidades.

b) A categoria função determina a tarefa, o papel, a atividade que é desempenhada,

que é abrigada pela forma.

c) A categoria estrutura constitui na maneira através da qual, estes elementos estão

organizados, ou seja, pela inter-relação dos diversos componentes do espaço.

d) A categoria processo agrega a dimensão do tempo à formação do espaço,

determinando uma continuidade da ação e da mudança através do tempo.

Ainda para o mesmo autor, o tempo é uma propriedade fundamental quando se trata

da relação entre as demais categorias – tanto “o tempo como ação e o tempo como

norma” (SANTOS, 1996, p.38) – indicando a existência e a continuidade de um

movimento que vai do passado ao futuro, no qual as formas que permanecem através

do tempo, ou seja, as que têm maior durabilidade, constroem a paisagem que vai, em

certa medida, determinar, limitar e dirigir as transformações da sociedade. Essa

durabilidade e a rigidez das formas e da paisagem por elas criada são tanto maiores

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quanto mais humanizada, alterada e “repleta de artefatos e construções” (p.55) for

dada paisagem.

Conforme a abordagem geográfica do espaço, proposta por Santos (1992, p.49),

o espaço constitui uma realidade objetiva, um produto social em permanente processo de transformação. (...) Em qualquer ponto do tempo, o modo de funcionamento da estrutura social atribui determinados valores às formas (...). A paisagem é o resultado cumulativo desses tempos.

Nesta abordagem, pode-se notar que o autor se refere a esta permanência das formas

como resultado, mais também como determinante de processos mais amplos que

incluem aspectos histórico, sociais e econômicos, dando origem a paisagens,

selecionadas segundo valores atribuídos às referidas formas. No trecho citado, Santos

(1992) parece incluir uma dimensão simbólica, de valoração às formas, ainda que no

seu discurso estes valores pareçam mais relacionados a fatores sócio-econômicos, ou

seja, mais relacionados aos interesses do capital. Entretanto, parece-nos

imprescindível a observação mais detida na forma, ou seja, no que o autor denomina

como Sistemas de Objetos, para a obtenção de um maior nível de detalhes quanto à

compreensão da organização do espaço em uma escala maior, delimitando uma

porção menor do território, de forma que seja possível seu estudo intra-urbano através

de seus elementos constituintes, conforme será abordado a seguir.

3.2 Espaço Intra-Urbano

Em sua proposta de realização de estudos espaciais com o auxílio de duas escalas,

Goulart (2006) agrega à escala do espaço regional, a escala intra-regional, para

referir-se ao estudo de uma unidade urbana, segundo os critérios utilizados por Villaça

(1998).

Villaça (1998), em seu livro, posiciona-se e justifica a questão semântica relacionada à

utilização do termo intra-urbano. Naquela ocasião, o autor enfatiza a redundância do

termo, do ponto de vista semântico, haja vista que, falar de espaço urbano por si só já

determina a referência ao “intra-urbano” (p.18). Entretanto, devido à clássica utilização

da expressão espaço urbano, bem como de expressões semelhantes, para a

designação de estudos e outras ações a nível regional, o autor admite e adota a

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expressão espaço intra-urbano, diferenciando-a de espaço urbano, ou ainda, espaço

regional.

Assim, Villaça (1998) afirma que “a distinção mais importante entre espaço intra-

urbano e espaço regional, deriva dos transportes e das telecomunicações” (p.20), de

maneira que, conforme dito anteriormente, o espaço regional pode ser caracterizado

pelo fluxo de elementos mais amplos/abrangentes, tais como, de informações, de

energia, de capital e de produtos. Já o espaço intra-urbano tem como determinante o

fluxo de pessoas – seja como portadores das forças produtivas, seja como

consumidor. O autor ainda cita outra diferenciação feita entre os espaços regional e

intra-urbano, afirmando que dentro da cidade, os efeitos do espacial sobre o social são

mais fortes e claros (p.22).

Villaça (1998) ainda refere-se a tipos específicos de espaço intra-urbano que podem

ser identificados segundo a necessidade ou não de deslocamento, definindo então o

espaço das localizações e o espaço dos objetos em si. Nas localizações urbanas, o

autor ainda inclui dois atributos que são a existência de uma rede de infra-estrutura e

as possibilidades de transportes, de deslocamentos e de comunicação. Neste contexto

ainda, Villaça (1998) frisa que as condições de deslocamento se sobrepõem às redes

de infra-estrutura, já que “a acessibilidade é mais vital na produção de localizações do

que a disponibilidade de mão-de-obra” (p.23).

Assim, o espaço intra-urbano neste estudo será compreendido segundo a abordagem

de Villaça (1998), permitindo a observância mais detida na maneira como estão

estruturados seus elementos constituintes, concretizados na morfologia urbana.

Conforme já citado, Lamas (2004) entende o termo morfologia urbana como o estudo

das formas que compõem a cidade, bem como, dos fenômenos e processos que lhes

deram origem. Para o referido autor, o espaço intra-urbano deve ser estudado através

da forma, enquanto filtro capaz de permitir a “leitura” da cidade e de sua formação, de

maneira que

as formas não têm apenas a ver com concepções estéticas, ideológicas, culturais ou arquitetônicas, mas encontram-se indissociavelmente ligadas a comportamentos, à apropriação e utilização do espaço, e à vida comunitária dos cidadãos (LAMAS, 2004, p. 28).

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Entretanto, ainda segundo propõe o autor, mesmo que a morfologia suponha a

existência de processos de origem, um estudo morfológico não tem como objetivo a

análise dos fenômenos sociais, econômicos entre outros, mas sim da subdivisão do

meio urbano em seus elementos constituintes e relações entre si, os quais definem “os

lugares que constituem o espaço urbano”, neste estudo convencionado chamar de

espaço intra-urbano.

Por forma urbana, Lamas (2004, p.41) entende “um conjunto de objetos arquitetônicos

ligados entre si por relações espaciais”, e que pode ser analisada segundo seus

aspectos quantitativos, aspectos de organização funcional, aspectos qualitativos e

ainda, aspectos figurativos. Ou seja, o autor inclui além da constituição enquanto

volume, outros fatores como a função e o conforto térmico e/ou acústico, por exemplo.

Desta forma, Lamas entende que

A noção de forma aplica-se a todo o espaço construído em que o homem introduziu sua ordem e refere-se ao meio urbano, quer como objeto de análise quer como objetivo final de concepção arquitetônica. O objetivo final da concepção é a forma (LAMAS, 2004, p.41)

Assim, no contexto das formas arquitetônicas incluem-se os critérios a elas

associadas, sejam eles de natureza estética, funcional, econômica ou outra, de

maneira que a forma é “a materialização no espaço da resposta a um contexto

preciso” (LAMAS, 2004, p.48). Dentre estes critérios, o autor destaca a função, haja

vista que, a forma e a função devem estar fortemente e adequadamente vinculadas de

maneira a permitir o desenvolvimento das atividades e o desempenho dos papéis que

a forma pretende abrigar. Outro critério destacado é a figura, relacionada aos valores

estéticos que a forma é capaz de comunicar e transmitir, já que, segundo o autor, “a

intenção estética é inerente à humanidade, faz parte do nosso dia a dia, em todas as

nossas ações” (LAMAS, 2004, p.56).

A apreensão da forma urbana, com suas características e objetivos estéticos, é

essencialmente realizada através dos sentidos humanos perpassados por processos

de juízo imbricados à percepção (LAMAS, 2004, p.58), de maneira que “apesar da

forma não se resumir aos aspectos sensoriais – portanto perceptíveis -, estes são

determinantes na sua compreensão”.

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Neste sentido corrobora Lynch (1997), que em seus estudos enfatiza, sobretudo, a

percepção coletiva da forma e da paisagem urbana, principalmente através dos

sentidos, tendo como princípio a importância da qualidade visual das cidades para a

orientação e bem-estar dos usuários/consumidores deste espaço. Este autor, através

da observância aos elementos frequentemente identificados em seus estudos nos

mapas mentais elaborados pelos habitantes a respeito da percepção da cidade,

definiu cinco categorias que definem e condicionam a qualidade de sua imagem,

dentre as quais (1) os pontos nodais ou focais e (2) os marcos visuais, além de (3) as

vias ou caminhos, (4) os limites e (5) os bairros.

As cinco categorias de elementos selecionados pelo autor incluem, além das

características da forma física da cidade, as atividades e os comportamentos sociais a

elas associados.

Entretanto, apesar de ser um estudo de percepção, o autor analisa os efeitos dos

objetos físicos perceptíveis, excetuando as influências de atuação mais emotivo-

simbólicas sobre o imaginário coletivo.

No sentido da complementaridade deste aspecto, serão estudadas outras questões da

percepção urbana e ambiental com o aporte de outras linhas teóricas, como a

semiótica. Por hora, essencial é a compreensão da importância da forma nos estudos

intra-urbanos, bem como, das categorias, dos elementos que auxiliarão na realização

desta tarefa, conforme detalha Lamas (2004), quando categoriza e descreve os

elementos morfológicos do espaço.

3.2.1. Morfologia Urbana e os elementos morfológicos do espaço

Os elementos morfológicos são àqueles que constituem as “unidades ou partes físicas

que, associadas e estruturadas constituem a forma” (p.46). Ou seja, elementos

morfológicos nada mais são que os elementos e/ou variáveis do sistema forma intra-

urbana, arranjados e ordenados segundo características próprias de seu sítio, de suas

forças produtivas e sociedade, construída através de sua história.

Para Lamas (2004, p.48), o espaço intra-urbano pode ter identificados seus elementos

segundo algumas classes presentes em todas as cidades e ocupações humanas

tendo como únicas diferenças, o modo “como esses elementos se posicionam, se

organizam e se articulam entre si para constituir o espaço urbano” e essas diferenças

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têm a ver com a época de construção, mas também com uma linguagem e com a

organização do próprio espaço. Assim, segundo o referido autor, o espaço urbano é

composto por onze (11) categorias de elementos, conforme descrito a seguir:

a) Solo: constitui a base sobre a qual os demais elementos morfológicos serão

posicionados, ou seja, é o sítio. Fortemente determinante das formas de ocupação e

das características iniciais da cidade, o sítio é entendido pelo autor como “topografia e

modelação do terreno, mas também os revestimentos e pavimentos, os degraus e

passeios empedrados, os lancis, as faixas asfaltadas (...)” (p.80). O sítio também pode

ser outro grande determinante das noções de limites e marcos apontados por Lynch

em A Imagem da Cidade, conferindo particularidade locais, assim como também

orientação aos seus usuários/consumidores, assim como impedimentos e/ou

obstáculos para seu crescimento, para a continuidade do processo de industrialização.

b) Edifícios: Como elemento ‘principal’ da constituição da forma intra-urbana, as

edificações organizam e ordenam o espaço urbano segundo sua disposição. Para o

autor, eles têm grande importância por seu caráter de permanência e imobilidade,

comparado ao das árvores e oposto ao de placas, bancos, lixeiras, entre outros, sendo

também decisivos na formação da imagem de qualquer ocupação urbana. A esta

categoria de elementos morfológicos podem ser atreladas as características da

“tipologia edificada”, enquanto “tipos construtivos” (p.84), assim como o modo segundo

o qual são agrupadas de forma que

a tipologia edificada determina a forma urbana, e a forma urbana é condicionadora da tipologia edificada, numa relação dialética. (...) a forma urbana é resultado, produto, e simultaneamente geradora da tipologia edificada (LAMAS, 2004, p. 86).

c) Lote: Em primeira instância, o lote corresponde à porção cadastral sobre a qual é

construído o edifício, mais que isso, “o lote é um princípio essencial da relação dos

edifícios com o terreno” (LAMAS, 2004, p.86). A sua forma acabará por interferir

também a forma das edificações, bem como proverá a separação essencial entre

público e privado no espaço urbano, ou seja, o lote constitui a origem e as bases do

edifício, e assim, da cidade (LAMAS, 2004).

d) Quarteirão: Porção do território urbano delimitado pelo cruzamento de três ou mais

vias, o quarteirão, em geral, agrupa lotes e edifícios, “constituindo elemento da

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estética urbana” (p.94). Organizador de outros elementos da estrutura urbana, bem

como de suas relações entre espaços públicos, semi-públicos e privados,

normalmente será fundamentado na forma construída ou ainda no processo de

traçado e divisão fundiária do espaço intra-urbano, configurando um reticulado da

ocupação urbana de maneira dependente de outros elementos morfológicos e

estruturadores da cidade, tais como, o traçado das vias, as praças, os lotes e edifícios.

e) Fachada: Estabelecendo a separação, mas também o elo, entre o espaço privado,

o edifício e seu projeto com o espaço público, a cidade e seu desenho, as fachadas

têm papel fundamental na determinação da forma e da imagem da cidade. A

importância e o significado a elas atribuídos não permaneceram uniformes durante o

tempo, ocupando diferentes papéis pelos momentos da história e culturas (LAMAS,

2004).

Para o autor, as fachadas definem os espaços urbanos, constituindo o “invólucro

visível da massa construída, e é também o cenário que define o espaço urbano”

(p.96), ou seja, são as fachadas que, em menor ou maior grau, delimitam e

determinam os espaços livres, constituem desta maneira “as paredes” dos espaços

públicos e áreas livres.

As tipologias edificadas também se fazem visíveis e presentes através das fachadas,

nas quais é possível observar a existência ou não de características métricas, rítmicas

e estéticas. Kohlsdorf (1996) também cita o plano marginal dentro de duas de suas

categorias citadas anteriormente: a categoria das edificações e a categoria dos planos

verticais. Através destas, a autora pontua as características de métrica, linhas de

força, pontuações, assim como características tipológicas das construções

apresentadas tecnicamente através de skylines.

f) Logradouro: Este elemento morfológico é constituído basicamente pela parcela do

lote não ocupada pela edificação, sendo caracterizado pelo autor como

“fundamentalmente, um complemento residual” (p.98), que, no entanto, tem papel

decisivo na evolução urbana na medida que sua existência permite a “densificação,

reconstrução, ocupação” da malha urbana já constituída.

Além disso, enfatiza-se a grande importância e força de sua existência na imagem

produzida de dada ocupação humana, haja vista, que seu nível de densidade tem

papel fundamental na percepção e conformação do espaço intra-urbano, interferindo

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direta e resolutamente na leitura e nas sensações topoceptivas que o

usuário/consumidor urbano produz ao seu respeito.

g) Traçado: Relacionando e regulando as relações entre as edificações e as diversas

partes do espaço urbano, o traçado, ou seja, as vias, segundo Lamas (2004, p.100)

“confunde-se com o gesto criador”, possuindo uma maior resistência às alterações

urbanas em uma permanência que tende a não permitir sua alteração de modo

significativo.

Através das vias, que assim estabelecem uma relação mais direta entre “cidade e

território” (p.100), se dão a maior parte dos fluxos no espaço intra-urbano, haja vista

que as ruas permitem o deslocamento de pessoas, informações e produtos,

assinalando então uma das principais características e diferenciações do espaço intra-

urbano (com relação ao espaço regional) citadas por Villaça: o transporte humano,

tanto como portador de sua força de trabalho, como quanto consumidor.

Além disso, são as vias que auxiliam na determinação das condições de

acessibilidade dos espaços, sobrepujando-se à instalação de infra-estrutura, no que

tange a evolução do espaço intra-urbano e a sua expansão.

h) Praça: Elemento morfológico característico das cidades ocidentais, a praça pode

ser definida como área pública, livre, de grande permanência, que deve ser dotada de

devida qualificação e significação funcional, delimitada segundo a disposição das vias,

edificações e fachadas (LAMAS, 2004).

Tem como principal função o encontro, a permanência em torno de acontecimentos

diversos, como lugar das práticas sociais, bem como “de manifestações de vida

urbana e comunitária e de prestígio, e, consequentemente, de funções estruturantes e

arquiteturas significativas” (p.102).

Em especial nas cidades as quais o ritmo de vida, a violência urbana e a extrema

valorização da vida privada não levaram à perda do valor dos espaços públicos, a

praça também desempenha um papel fundamental no que diz respeito à convergência

de fluxos e atividades. Foi em torno destas praças que a maioria das cidades coloniais

portuguesas fundadas no Brasil se estruturou e desenvolveu, agregando e

condensando as funções e edificações oficiais, de maior status e importância em suas

imediações, induzindo nos eixos das vias existentes a extensão e expansão da área

urbana.

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i) Monumento: À princípio definido como obra de arquitetura e/ou escultura com

finalidade de transmissão de memória e história de homens e fatos notáveis, o

conceito de monumento tem evoluído, ampliado e diversificado para áreas inteiras -

como centros históricos, por exemplo – nos locais onde haja representatividade de

“conteúdo cultural” e significação. Desta maneira, os monumentos, enquanto

elementos do espaço intra-urbano, constituídos como “um fato urbano singular’

(LAMAS, 2004, p.104), assumem maior permanência nas cidades graças ao

significado, aos fatos e valores a eles atribuídos, de maneira que, segundo Lamas

(2004, p. 104) “a existência do monumento situa-se muito para lá do desempenho de

uma função e assume significados culturais, históricos e estéticos bem precisos,

mesmo quando sua função primitiva já não existe”.

O autor ainda referencia a falta de monumentos especialmente nas novas ocupações,

especialmente nas urbanizações populares, destacando sua relação com a ausência

de significados e o “vazio cultural das gestões urbanísticas contemporâneas” (LAMAS,

2004, p.104).

j) Árvore e vegetação: A importância das árvores e da vegetação na imagem da

cidade é veementemente afirmada por Lamas (2004), que atribui a elas a mesma

valoração atribuída a outros elementos construtivos, dada as suas influências e

funções relevantes no âmbito do espaço intra-urbano, situando-se “ao mesmo nível da

hierarquia morfológica e visual” (LAMAS, 2004, p.106) das edificações.

O autor referencia essa importância da árvore e da vegetação na caracterização da

imagem da cidade, na sua identidade própria, além do desempenho de funções de

definição, organização, composição e contenção de espaços, de maneira que, “as

simples árvores e vegetação existentes em logradouros privados são de grande

importância na forma urbana, no controle do clima e qualificação da cidade” (LAMAS,

2004, p.106).

l) Mobiliário urbano: Lamas (2004) chama e inclui na categoria de mobiliário urbano

todos os elementos que mobíliam e que equipam a cidade, entre os quais também

estão incluídos os elementos parasitários, que possuem relativa mobilidade entre os

quais pode-se citar: sinalização, lixeiras, bancos, os quiosques, abrigos de ônibus e

ainda, os parasitários, como placas publicitárias, luminosos, anúncios, entre outros.

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Ratifica-se que, apesar de seu caráter transitório – dada sua mobilidade – estes

elementos são essenciais dadas as suas implicações na forma do espaço intra-

urbano, ou seja, na imagem da cidade, bem como da qualificação e conforto inerente

ao mesmo, sendo notável o grau de impacto que pode assumir neste contexto.

Tomando ainda como referências as categorias elementares da morfologia intra-

urbana acima, propostas por Lamas (2004), para os quais haverá corroboração de

outros autores, propõem-se neste estudo uma compreensão de outra dimensão deste

espaço relacionada ao significado e atributos de valor a ele conferidos, de forma que

“o objetivo do desenho urbano e, por extensão, do urbanismo não será apenas

organizar o território para acolher atividades, mas também atuar na forma para que

exista comunicação estética e significação” (LAMAS, 2004, p.61).

Assim, após a próxima seção, serão abordados mais especificamente princípios

simbólicos do espaço, sua concretude no âmbito das relações e fenômenos sociais, a

semiótica peirceana como teoria de base para a compreensão da linguagem das

imagens, do espaço.

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4. TURISMO: PLANEJAMENTO E ESPAÇO

Planejar, traçar metas, objetivos, definir caminhos, meios ou estratégias para alcançá-

los, são atividades praticadas permanentemente por todos, por mais diárias e

rotineiras que sejam as atividades relacionadas. Todos os seres humanos planejam e

gerenciam suas atividades de estudo, lazer, trabalho, finanças, tarefas domésticas

entre outros, tanto quanto grandes empresas e organizações.

Assim, determinar um objetivo e traçar as maneiras de alcançá-lo, levando em conta o

tempo para sua realização os custos e os riscos envolvidos nesse procedimento, nada

mais é que utilizar processos do planejamento. Mesmo de uma forma não-consciente,

não-programada e sem procedimentos sistematizados, qualquer organização e/ou

grupos sociais tendem a utilizar estratégias, ainda que estas sejam apenas reações às

estimulações do ambiente, exclusivamente por uma questão de sobrevivência.

O planejamento, enquanto processo sistematizado, é oriundo das engenharias, mas

possui utilização em todas as ciências sociais aplicadas. Para Hall (2004, p 24), o

planejamento nada mais é que uma maneira de “tomada de decisões e elaboração de

políticas”, com a definição de ‘caminhos’, de estratégias inter-relacionadas como

componente de um processo mais amplo que inclui também sua implantação, ou seja,

um processo de “planejamento-decisão-ação”.

Assim, planejar é uma ação que pretende ordenar, compreender e criar condições

favoráveis para alcançar determinadas metas e/ou objetivos estabelecidos

(RUSCHMANN, 2003). Neste âmbito, quando se tem em foco a atividade turística, o

planejamento constitui-se no instrumento de desenvolvimento, a partir do qual define-

se as prioridades de atuação seja do ponto de vista do produto com também do

mercado, além de estabelecer as diretrizes e passo para regular e direcionar a

atividade, em busca de seu crescimento equilibrado.

Entretanto, o planejamento em geral sempre esteve muito mais relacionado com

questões econômicas, menosprezando a importância das variáveis socioculturais e

ambientais para a manutenção do produto, especialmente quando o referido produto é

diretamente dependente de um contexto mais amplo que inclui todas estas variáveis,

como é o caso do turismo.

Anjos (2004, p 57) afirma que originalmente, dentro de uma ótica mecanicista, o

planejamento se confunde com o projeto, ou seja, constitui-se em uma ação

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precedente a sua implantação e gestão. Dentro desta perspectiva, cada etapa se inicia

consecutiva à outra, não havendo sobreposição e retroalimentação, com retorno às

fases iniciais. Ora, esta simplificação de procedimentos pode ser capaz de atender a

fenômenos mais objetivos, mais lineares como uma linha de montagem ou uma

experiência química, no entanto, fica muito aquém da complexidade envolvida quando

se trata de relações e organizações sociais, como o turismo, por exemplo.

Neste sentido, Souza (2003, p 46) afirma que “planejamento e gestão são distintos e

complementares” e Anjos (2005) propõe que o planejamento e a gestão estejam

integrados em um processo mais abrangente que permite a freqüente passagem de

uma a outra, através de monitoramento, possibilitando o estabelecimento de um

processo contínuo, com permanente correção de rumos e assim, permitindo a

“superação da dicotomia entre planejamento e implementação”.

4.1 Planejamento do Espaço Turístico

O planejamento turístico tradicionalmente tem permeado mais fortemente a esfera

governamental sobre a qual pesam especialmente as responsabilidades na

regulamentação, seja do mercado ou do uso do solo, por exemplo, assim como

também, de investimentos em infra-estrutura básica. Ou seja, segundo Hall (2004, p

187) “o Estado subsidia parte do custo de produção, por exemplo, auxiliando no

fornecimento de infra-estrutura ou investimento num projeto turístico em que o capital

de risco não estaria disponível de outra maneira”, entretanto, muitas vezes esses

investimentos passam a ser direcionados segundo os interesses e protecionismos a

grupos específicos ao que Ohmae (1999) caracteriza como “uma política

comprometida com o mínimo público”.

Olivares (2000) trata da grande importância da relação territorial enquanto base para o

desenvolvimento de toda a atividade turística, a qual depende de deslocamentos e da

existência de um local de origem e um destino para a visitação, ou seja, o território

como matéria-prima para o desenvolvimento turístico enquanto recurso capaz de atrair

visitantes, de modo que “o turismo tem no território, sua principal material prima. Se os

territórios deixarem de ser uma produção de seus usuários, compromete o próprio

processo de produção de capital no turismo” (ANJOS, 2004, p 154).

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Para Goeldner et al (2002, p.339), o planejamento turístico é algo mais amplo e

abrangente e deve figurar como ator principal. No entanto, para o autor, o

planejamento espacial deve estar contido no planejamento turístico, como uma fase da

última etapa, momento no qual são definidos zoneamentos, critérios para o uso e

ocupação do solo, infra-estrutura, bem como padrões arquitetônicos, planos

paisagísticos, além de seus instrumentos reguladores. Da mesma forma, todos os

planos diretores urbanos deveriam se ater em alguma de suas fases ou etapas, ao

plano turístico da localidade, tornando-os mais coerentes e concisos.

Assim, embora planejamento espacial e planejamento turístico, não tenham

correspondência direta um no outro, são interdependentes e devem ser levados em

consideração no momento de sua elaboração, seja a observância ao planejamento

espacial quando for realizar o planejamento turístico, ou vice-versa.

No caso do turismo, enquanto um sistema extremamente complexo, o planejamento

tem sido utilizado amplamente com o objetivo de minimizar impactos negativos, gerar

desenvolvimento sustentável a prazos mais longos e, assim, possibilitar um aumento

do ciclo de vida da destinação enquanto produto turístico (HALL, 2004). É neste

âmbito que o planejamento turístico incorpora como objetivo a equidade entre os

sistemas econômico, sócio-cultural e ambiental e, assim, tem a capacidade de influir

nos critérios de sustentabilidade do produto/destino turístico.

Apesar da banalização do termo sustentabilidade, em discursos e produtos incapazes

de abranger a complexidade de seu conceito, acredita-se que a suas bases são

essenciais para todo tipo de desenvolvimento humano, especialmente/inclusive o

turismo. Para a OMT (2001), a sustentabilidade está diretamente relacionada com o

uso dos recursos de forma responsável e coerente, preservando a capacidade de

sobrevivência das gerações futuras. A OMT (2001) também cita como componentes

da sustentabilidade a sustentabilidade econômica, a sustentabilidade ambiental e a

sustentabilidade sociocultural.

A adoção dos preceitos da sustentabilidade determina antes de tudo uma mudança

ideológica, a partir da qual, o desenvolvimento humano passa a ser o objetivo a

alcançar, o que não significa a prevalência de um dos sistemas sobre os outros, muito

menos o abandono de um deles (SAMPAIO, 2000), mas passa a incluir a referida

equidade e equilíbrio no desenvolvimento da tríade econômico/sócio-

cultural/ambiental.

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Em defesa da viabilidade econômica da implantação de princípios de sustentabilidade,

pelo o respeito ao meio ambiente e às questões sócio-culturais, a OMT (2001) cita a

crescente demanda de turistas conscientes em busca de destinos bem conservados

(em cada um de seus aspectos), que possam atender a esta exigência, inclusive

estando dispostos a pagar mais pelo produto que vá ao encontro de suas

necessidades, estimulando a adoção de medidas de sustentabilidade pelas empresas

e planejadores turísticos. Esse princípio, no entanto, se choca com o conceito de ciclo

de vida das destinações turísticas. Como pensar em sustentabilidade de um produto

que já chega ao mercado com uma contagem regressiva? Como esperar que os

empresários não exerçam o máximo da exploração a fim de ver recompensados os

investimentos feitos em divulgação e infra-estrutura?

De fato, essa questão não possui uma resposta simples e muito menos uma resposta

única. Neste sentido, as possibilidades de reprogramação do produto, com isso,

aumentando o seu ciclo de vida ou ainda alcançando a sua estabilidade são algumas

das respostas possíveis, mas para tal, deve passar constantemente por processos de

planejamento e avaliação dos resultados obtidos, para a correção de seu

direcionamento conforme a necessidade (HALL, 2001).

Voltando-se às questões marcadamente relacionadas à morfologia urbana, uma das

variáveis deste estudo, deve-se observar, que da mesma maneira que os demais

componentes do sistema turístico, a forma das ocupações humanas tem um

importante papel no produto turístico, estando fortemente relacionada aos três

suportes da sustentabilidade: econômico, na medida em que é preciso oferecer ao

consumidor aquilo que satisfaça as suas expectativas; cultural, sempre que o respeito

às questões sócio-culturais se refletirá nas formas de fazer e na configuração deste

espaço; e ambiental, haja vista que estas preocupações com a forma urbana também

acabam por relacionar a paisagem natural e a sua preservação.

Estes componentes da morfologia urbana constituem apenas parte do sistema turístico

e das variáveis a considerar em seu planejamento, uma vez que

visto de forma abrangente, o relacionamento entre turismo e comunidade, estado, regiões e países exige a consideração de muitas questões difíceis [entre as quais]: a qualidade da arquitetura, paisagem e design ambiental (...) (GOELDNER et al, 2002, p.338),

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entretanto sobre a composição dialética entre aspectos territoriais, socioeconômicos e

culturais deve ser adotado o modelo mais adequado para tal comunidade, visando seu

progresso sustentável (OLIVARES, 2000).

Para tal, a determinação do planejamento turístico voltado à sustentabilidade como

eixo principal, em sua marcada complexidade, determina a necessidade da inclusão

dos diversos atores direta ou indiretamente envolvidos na atividade, através de seus

representantes, segundo cita Hall (2004, p 271) quando afirma que “é preciso haver

tanta variedade na parte controladora quanto no sistema em si”. Condição de

representatividade esta, corroborada por Anjos (2005, p 11), que ainda cita a

importância desta participação e representatividade do sistema turístico não apenas

na definição do plano, das estratégias, mas também como condição sine qua non para

o comprometimento na execução e implantação do projeto.

De fato, apesar da dificuldade já identificada de viabilizar a implantação prática do

planejamento como processo a serviço do bem-estar e da sustentabilidade, segundo

Hall (2004), é inquestionável o fato de que ele aponta na direção do futuro, da

construção de um cenário desejável e,

embora o planejamento não seja uma panacéia para todos os males, quando totalmente voltado para processos ele pode minimizar impactos potencialmente negativos, maximizar retornos econômicos nos destinos e, desta forma, estimular uma resposta mais positiva por parte da comunidade hospedeira em relação ao turismo no longo prazo. (HALL, 2004, p 29)

Para a obtenção desta resposta mais positiva citada por Hall, Whittington (2004)

sugere que o planejamento e a estratégia passem a ser vistos enquanto prática social,

já que têm implicações diretas nas várias instâncias das sociedades e que constituem

basicamente processos políticos.

4.2 Sistêmica e um Novo Modelo de Planejamento e Gestão

O processo de planejamento aplicado a realidades complexas, a estruturas e

atividades sociais, dada a sua multiplicidade de agentes, variáveis e das

possibilidades de respostas, exige que as formas de se fazer e pensar planejamento

menos lineares, mais flexíveis e integradas.

Em corroboração, Hall (2004, p 71) explica que

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a análise de sistemas é útil porque simples relacionamentos lineares e cadeias casuais (...), não podem descrever ou explicar adequadamente muitas das complexas situações encontradas em qualquer das ciências físicas ou sociais.

É preciso observar, que o sistema turístico, enquanto um sistema social, tem sua

dinâmica determinada dentro de sua própria estrutura já que “o ambiente não dirige e

nem define as mudanças no sistema, segundo a Teoria de Santiago, apenas

desencadeia os processos” (ANJOS, 2005, p 5). O autor ainda afirma que o

planejamento e a gestão, ao mesmo tempo em que são componentes deste sistema

turístico, também devem ser postos como parte do ambiente externo que gera

impulsos ou “perturbações” no sentido de potencializar respostas de aprendizado e

evolução.

A definição de um sistema deve incluir um grupo de elementos, as relações existentes

entre os mesmos, assim como o relacionamento entre eles e seu ambiente, ou seja, o

meio. O fato de que, cada sistema está incluído e/ou relacionado a outros sistemas,

faz da capacidade de analisar e definir um conjunto de elementos que possua

coerência intrínseca e um relacionamento com seu ambiente relativamente claro, uma

exigência ao estudar fenômenos complexos como o turismo (HALL, 2004).

Para Capra (2002), os sistemas sociais, dentre os quais o turismo está inserido, deve

ser estudado sob quatro perspectivas: (1) a forma, que trata do padrão de organização

do sistema, ou seja, a sua estrutura organizacional - semelhante à categoria estrutura

de Santos (1992); (2) a matéria, que se refere à materialização desta estrutura – ou a

categoria forma de Santos (1992); (3) o processo, como a conjunção dos elementos

anteriores numa perspectiva temporal, processual – do mesmo modo que a categoria

processo de Santos (1992); e (4) o significado, “como expressão sintética do mundo

interior da consciência reflexiva” (CAPRA, 2002, p 86) – sem correspondência analítica

com as categorias propostas por Santos (1992).

Esta última perspectiva, ou seja, o significado, se aplica apenas aos sistemas

relacionados ao domínio social, isto por que o autor define que

a nossa capacidade de reter imagens mentais de objetos materiais e acontecimentos parece ser uma condição fundamental para o surgimento das características da fundamentais da vida social (CAPRA, 2002, p 86).

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Os sistemas sociais têm padrão de organização em rede, constituindo também em

redes de comunicação e envolvem relações de poder, simbolismos, questões

culturais, entre outros. A característica autopoiética das redes de comunicação

determina que elas sejam auto-geradoras e surgem em resposta a uma anterior da

mesma maneira que são estímulos para sua sucessão.

Da mesma forma, a atividade turística enquanto um desses sistemas sociais, contém e

ao mesmo tempo é contido do sistema espacial funciona dentro do mesmo princípio,

inferindo que cada perturbação gerada no sistema estimula sua mudança, sua

adaptação, à procura de um novo estado de equilíbrio. Assim, ao tratar do

planejamento espacial, uma vez que seu objeto está inexoravelmente vinculado ao

turismo, também se deve fazê-lo dentro da mesma perspectiva, observando que sua

ordem contemporânea é um resultado acumulado e/ou sobreposto de reações a

perturbações anteriores, com permanente busca de um novo estado de equilíbrio,

entretanto, frisando que esta autopoiese urbana pode não encontrar esse estado de

equilíbrio em curto prazo (BERDAGUE & GRIFFITH, 2005).

Neste mesmo sentido, Capra (2002) parece fornecer algumas das possibilidades

quanto aos planejamentos inócuos e às dificuldades de implantá-los na prática, haja

vista que as mudanças impositivas, não permitem que essas redes se percebam como

tal - “o ponto central não é nem a força nem a energia: é o significado. Perturbações

significativas podem chamar a atenção da organização e desencadear mudanças

estruturais” (p 123).

Para tal, Anjos (2004) sugere em complementaridade que o planejamento e gestão

sejam permanentes, integrados e flexíveis, fornecendo respostas rápidas às

alterações de ambiente e às respostas fornecidas pelos sistemas, através do que o

autor denomina “gestão por processos”. Neste sentido, a gestão por processos está

em consonância com os preceitos da complexidade e da variabilidade dos sistemas

sociais, permitindo uma visão e revisão permanente no planejamento e gestão, pela

retroalimentação de informações, segundo os processos capazes de “agregar mais

valor ao sistema” (ANJOS, 2004, p 144).

Assim, o turismo enquanto atividade social pode não oferecer exatamente as

respostas pretendidas no momento do planejamento e/ou da elaboração das

estratégias. Cada estratégia, enquanto perturbação do sistema e não controle

sistemático, irá induzir a uma resposta dentro de conjunto possível, que nem sempre

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corresponderá às expectativas dos planejadores. Esta resposta poderá inclusive ser a

antítese do movimento esperado, em rejeição, mas é fato que sempre haverá reação.

A proposta desenvolvida por Anjos (2004) constitui um modelo integrado de

planejamento e gestão, abrangente e sistêmico, de maneira que cada processo está

embutido em um macro-processo, tem, nas suas respostas de saída, as respostas de

entrada no processo que se segue (inputs e outputs).

Partindo desse princípio, cada reação dada às perturbações aplicadas, além de atuar

diretamente no sistema, também atua na origem de tais perturbações, resultando em

uma situação final diferente da situação inicial para ambas as partes. Desta forma,

estes sistemas são abertos porque sofrem “interferências externas”, no entanto, suas

respostas são movimentos gerados internamente, possibilitando tais mudanças.

Para desencadear tais mudanças, é necessário que haja agentes, dentre os quais

residentes e turistas, enquanto usuários, consumidores e construtores desse

território/espaço turístico, durante o processo planejamento e gestão, como

representantes da diversidade que compõem o sistema, assim como também, como

co-responsáveis pela efetividade das ações propostas.

Pode-se compor este macro-processo através da integração de cinco processos

representados na figura abaixo. São estes: (1) a territorialização, (2) a leitura e/ou

compreensão do sistema, (3) a definição das estratégias de perturbação, (4)

implantação e viabilização, e (5) monitoramento e avaliação. Cada um destes

processos é abrangente e possui objetivos, agentes e indicadores relativos às

características inerentes a cada um que serão sucintamente descritos a seguir.

Para esta pesquisa, ainda que sem esquecer o caráter sistêmico, integrado e

processual do referido modelo, a etapa de concentração dentro do modelo sistêmico

de Planejamento e Gestão proposto por Anjos (2004), na qual pode ser situado este

estudo é a etapa chamada de “Compreensão do Sistema”.

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FIGURA 01: Modelo Sistêmico de Planejamento e Gestão Fonte: Anjos, 2004, p.149

FIGURA 02: Componentes do sistema territorial Fonte: Anjos, 2004, p.164

Neste sentido, a imagem e o imaginário tornam-se importantes componentes na

Compreensão do Sistema Turístico. É através da sua compreensão que faz-se

possível conhecer as expectativas e as características desejáveis no destino,

conforme o imaginário anterior ao contato dos turistas e a imagem do destino, após

seu reconhecimento. Deste modo, é possível a tomada de decisões no sentido da

definição das estratégias de perturbação, de sua implantação e viabilização, desde o

âmbito da divulgação e das mídias utilizadas, até a definição de parâmetros

urbanísticos e tipologia de serviços, indo ao encontro das necessidades específicas do

perfil dos usuários e consumidores deste espaço.

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Esta etapa tem como objetivo perceber as dinâmicas sócio-espaciais relacionadas ao

sistema territorial em questão, através de outros sistemas: os residentes e os turistas,

em uma perspectiva horizontal; e/ou ainda, fixos e fluxos, em um recorte vertical. Vale

ainda ressaltar que os sistemas de fluxos e fixos podem ainda ser desmembrados em:

Fluxos – econômicos e sócio-culturais; e Fixos - naturais e construídos. Neste caso, é

importante perceber que esta subdivisão entre fixos e fluxos como questão de método

analítico, necessária para a compreensão do sistema, apresenta duas categorias

inexoravelmente vinculadas, uma vez que os fluxos estão relacionados, assim como

também podem gerar um fixo, e vice-versa. Essa leitura da situação atual do sistema

turístico possibilita o desenvolvimento de um sistema de informação geográfica, que

deve ser atualizado permanentemente de maneira que possa acompanhar as

mudanças decorrentes da dinâmica do sistema, constituindo o processo básico para o

posterior desenvolvimento de estratégias. Os agentes podem ser o Estado, parcerias

público-privadas, ou ainda, ações conjuntas com ONGs. Dentre os indicadores pode-

se citar ecológicos, sócio-culturais, sócio-espaciais e econômicos.

Assim, a inclusão deste estudo na etapa de “Compreensão do Sistema”, parte do

pressuposto que para a definição das estratégias de perturbação existem outras

variáveis a serem consideradas, haja vista a importância da imagem do destino, bem

como, da satisfação das expectativas de viagem a este respeito. Assim, na próxima

seção serão tratadas temáticas relacionadas às características e peculiaridades dos

consumidores turistas, além dos próprios residentes enquanto usuários/consumidores

do espaço turístico, buscando incluir suas impressões, sensações, percepções e

leituras através das imagens apresentadas pela paisagem formada na morfologia

urbana do destino.

4.3 Consumidor Turista e Atratividade dos Destinos

Quando se fala de sustentabilidade econômica, como um dos componentes da tríade

da sustentabilidade, conforme expresso anteriormente, um destino turístico enquanto

produto disponível do mercado deve ‘convencer’ o consumidor, deve possuir atributos

que lhe favoreçam no momento da decisão de compra. Desta forma, a atratividade do

produto, é uma qualidade essencial para chamar a atenção do consumidor, para

despertar o seu desejo, expectativas ou necessidades, ou seja, para desencadear o

processo de tomada de decisão de compra.

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Neste sentido, o “comportamento do consumidor” é citado por Horner e Swarbrooke

(2002) como a área que procura compreender os motivos para a compra de

determinados produtos e a forma como as pessoas tomam essas decisões, e

constituirá importante instrumental teórico no estabelecimento da co-relação

fundamental deste estudo.

Determinados aspectos da destinação que foram responsáveis por sua emersão como

tal, fazem parte da composição de uma imagem que chega ao seu mercado

consumidor – aos turistas - antes mesmo do contato com o referido produto. Conforme

afirma Bigné et al (2001) em seu artigo que estuda a participação da imagem na

satisfação do consumidor turista e, consequentemente, nas indicações e intenções de

retorno ao mesmo, a imagem consiste na percepção individual e coletiva da

destinação, como interpretação subjetiva do destino pelo turista, ressaltando sua

importância para a satisfação da experiência turística, enquanto componente não-

objetiva de seu sistema. Para o autor (BIGNÉ et al, 2001), essa imagem é um

importante fator no que diz respeito ao papel dos planejadores-gestores de

destinações turísticas, devendo ser alvo de especial atenção no sentido da garantia da

comunicação das mensagens desejadas a respeito do local. Assim, ainda que suas

variáveis muitas vezes sejam difíceis de controlar, a imagem deve ser componente

essencial quando se estuda o planejamento de destinações turísticas e de seu

espaço, enfatizando que

Há de se entender, neste momento, o lugar turístico como sendo resultado interativo de vários condicionantes que o motivaram, desde o marketing e os elementos da imagem que compõem o objeto turístico, aos signos de persistência locais, diante das mudanças. (RAMALHO e SARMENTO, 2004) [grifo nosso].

Em primeiro lugar, é necessário lembrar que, embora estas decisões de compra

aconteçam por meio de processos semelhantes, o consumo de produtos turísticos tem

algumas peculiaridades que podem tornar essas relações ainda mais complexas. Uma

destas peculiaridades é relativa à intangibilidade inerente à maioria dos produtos

turísticos, determinando que a compra do mesmo não implica em levá-lo pra casa, ou

seja, implicando que o consumo se dê apenas durante a viagem, transformando-o em

um processo de decisão de compra de alto risco (HORNER e SWARBROOKE, 2002).

Este fato acaba por conformar outra peculiaridade: no turismo, a venda é um processo

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anterior ao consumo, no qual o destino turístico escolhido na maioria das vezes, não

passa de um elenco de imagens, informações e expectativas já existentes no

momento da decisão de uma viagem.

É neste momento que se pode caracterizar a quarta peculiaridade que interessa

diretamente ao nosso estudo, cuja relação de expectativas, compra e consumo, cria

uma primeira imagem sobre o produto, que não é necessariamente a imagem real,

mas sim uma imagem projetada segundo anseios do consumidor, informações

difundidas na mídia, entre outros. Essa imagem projetada é confrontada com a

imagem real do destino que só chega ao consumidor através da percepção das suas

características verdadeiras in loco, permitindo equívocos no que tange à localidade,

aos seus serviços e demais componentes do produto turístico.

Chen (2000) refere-se ainda às diferenças nas interpretações de informações diversas

- imagens, fotografias, vídeos, material publicitário em diversos tipos de mídia –

segundo a diversidade de culturas que determina níveis e padrões de comunicação

também particulares. Desta forma, a mesma mensagem, a mesma imagem, pode

suscitar várias interpretações de acordo com a bagagem, os filtros, os hábitos e os

significados por eles internalizados.

FIGURA 03: Etapas do processo de compra no turismo. Fonte: Mathieson e Wall, in Horner e Swarbrooke (2002).

Nesse sentido se faz importante associar uma imagem adequada ao produto que se

deseja comercializar, evitando lacunas e procurando atender às necessidades e

expectativas dos clientes, ou seja, a orientação ao consumidor, conforme cita

Goeldner et al (2002). Da mesma forma, Horner e Swarbrooke (2002) citam o

comportamento pós-compra, fortemente relacionado à satisfação associada à primeira

experiência, podendo haver compras repetidas e vendas repetidas, como também a

rejeição do produto.

Necessidade sentida / desejo de viajar

Coleta de informações e avaliação da imagem

Decisão de viajar (escolha entre algumas opções)

Preparo da viagem e experiência de viagem

Resultado e avaliação da satisfação obtida com a viagem

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Da mesma forma, a OMT (2001, p. 279), cita como os três princípios fundamentais do

marketing turístico “1) satisfação das necessidades dos turistas (férias, lazer, etc.)

para o que será necessário conhecimento prévio de seus motivos e comportamentos,

por meio dos estudos de mercado; 2) planejamento e promoção do produto turístico

(conjunto de bens e serviços) com elementos e características detalhadas que sejam

atrativas ao consumidor, satisfaça suas expectativas uma vez consumido e gere lucro

para a organização que o produz; 3) Função de intercâmbio, realizada por canais de

distribuição que permitem o contato da demanda com a oferta, gerando lucro”.

Assim, tão importante quanto ter um produto turístico bem planejado e bem

estruturado, é observar quais as expectativas e motivações têm os turistas na escolha

por dado destino, haja vista que a atratividade está diretamente relacionada com “o

desejo dos viajantes de ver determinadas coisas no destino” (OMT, 2001, p.121) a

partir do que se originam outros componentes do turismo.

Esses desejos e focos de interesse apresentam-se de forma mais específica quanto

se fala em especialização das atividades através da segmentação de mercado. No

caso de destinos amazônicos, o grupo mais significativo é o de turistas “verdes”2 e

suas possíveis ramificações e/ou variações. Esse perfil de consumidor, ainda segundo

Horner e Swarbrooke (2002), possui interesses bastante diversificados, entre os quais

os autores citam o interesse na conservação de paisagens, entre as quais, paisagens

urbanas.

Gerald Allison, em seu texto “Lugares especiais em lugares especiais” (In:

GOELDNER et al, 2002, p.349-352), trata do planejamento de hotéis, resorts e outras

estruturas voltadas ao turismo de lazer, relacionando a importância da elaboração de

um projeto responsável e sensível a aspectos da cultura local. O autor relata a

experiência da Malásia, que após diversos estudos de mercado e viabilidade,

constatou-se que a capacidade deste país em manter e desenvolver os seus

diferenciais históricos, culturais e de paisagem, está intimamente relacionada ao

sucesso econômico de seu programa de desenvolvimento turístico.

Jaime (2001) destaca em seu estudo, as dimensões simbólicas e culturais do

consumo, determinadas por microidentidades como segmentações que direcionam

hábitos de consumo para além de critérios tradicionais, tais como renda e região

2 Grupo de turistas interessados especialmente em aspectos naturais e culturais autênticos das destinações.

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geográfica, em direção a procura de uma dimensão simbólica atrelada a estes ditos

“lugares especiais”, conforme também citado na secção anterior que discutiu o

planejamento sistêmico segundo Capra (2002).

Será que estes mesmos princípios não podem, ou ainda devem, ser consideradas nos

estudos na escala urbana? A utilização destes critérios pode se restringir as iniciativas

privadas? É nesse sentido que pretende-se aqui, fazer uma transposição de escala, no

que se refere a todas as considerações feitas sobre a construção de superestruturas

turísticas, e sobre a necessidade de levar em consideração a imagem, para quaisquer

interferências inclusive no âmbito urbano e governamental.

Seguindo as noções de comportamento do consumidor anteriores, considera-se que

possuir um diferencial é um requisito para atrair a atenção do consumidor,

satisfazendo suas expectativas e assim, firmar-se no mercado. Oferecer ‘lugares

especiais’ tem suas premissas nos princípios do marketing, além de possibilitar a

valorização e preservação de aspectos culturais e ambientais, relacionando as três

áreas da sustentabilidade.

É importante frisar que, para efeitos dessa pesquisa, esse diferencial mercadológico

será estudado através abordagem antropológica voltadas ao consumo do espaço,

incluindo diversos níveis de detalhes que vão desde a arquitetura e a configuração

urbana determinada por seu conjunto, além do mobiliário, “das cores, da iluminação, a

climatização, as vestimentas, os transportes coletivos, os lugares de trabalho, os

espaços de lazer, as vias públicas, etc”, conforme afirma Jaime (2001, p. 70). O

mesmo autor (2001, p. 71) ainda reitera que “o fenômeno do consumo não pode ser

compreendido levando-se em conta apenas variáveis de natureza econômica (...)”, de

modo que a cultura e seus aspectos simbólicos permeiam até mesmo na sua negação

pela racionalidade econômica do capitalismo.

Portanto, permitir que uma determinada localidade, com seu conjunto de

características próprias, ou seja, sua identidade, seja transformado em qualquer outro

lugar do mundo (seja na utilização de materiais, padrões construtivos, ou formas de

ocupação), traduz-se em um risco à sobrevivência da destinação, enquanto produto

turístico:

(...) essa mesmice homogeneizadora significa, na melhor das hipóteses, uma negligência em relação ao vasto potencial que espera o desenvolvimento sensível e responsável (...) tem um efeito destruidor para a individualidade do lugar (...) acaba sendo desrespeitosa em relação ao caráter da cultura da

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comunidade anfitriã (...) o viajante de lazer busca mudança (ALLISON, 2002, p.349)

Cita o mesmo autor que, da mesma forma que os interessados em história buscarão e

serão atraídos por destinos que reflitam isso, como Paris, Roma ou Lisboa, turistas

verdes se sentirão arrebatados por destinações que incluam o foco de seus

interesses. De nada adianta oferecer um destino amazônico que não reflete seu

imaginário sobre esta região, que não é capaz de instigar curiosidade e de também,

satisfazê-la:

queremos experimentar e observar aquilo que torna essas destinações diferentes dos lugares de onde viemos (...) buscamos outras culturas, outros estilos de vida e a singularidade da região que visitamos (ALLISON, 2002, p.350).

Em suma, a capacidade de uma destinação em manter suas características originais

e diferenciais, é um movimento significativo em direção ao seu crescimento e

permanência, enquanto produto, no mercado turístico: “a atratividade e o ambiente da

estrutura física são vitais para seu sucesso econômico” (ALLISON, 2002, p.350).

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5. ESPAÇO, IMAGEM, IMAGINÁRIO E SIGNIFICADO.

Falar da cidade, como aglomeração humana, implica em tratar das relações humanas,

das coisas que vemos e da forma como elas se estruturam. Para Hillman (1993, p.42),

a relação humana que se dá ao nível do olhar “é uma parte fundamental da alma das

cidades”, de maneira que é através dos encontros realizados ao nível deste olhar que

acontece o conhecimento, a significação, o envolvimento emocional, ou seja, “o

contato de alma” (p.42). É através do olhar e, assim, dos aspectos visíveis do espaço,

que “lemos aquilo que vem ao nosso encontro” e também uns aos outros (p.42), é

desta maneira que é construído o lugar.

O fato de que a cidade não é apenas o resultado das ações sociais, mas que tem

implicações psicológicas e que, desta forma, também constrói as ações sociais por

meio de atributos psicológicos a ela associados, é lembrado por Hillman (1993, p. 2)

quando afirma que “cada coisa de nossa vida urbana construída tem uma importância

psicológica”.

De fato, as relações humanas com o espaço incluem os laços com a memória e os

lugares da “infância”, por exemplo. Mas também pode ocorrer de forma inversa

quando da busca por mudanças de cenários e de significações, como pode-se verificar

na atividade turística.

Para Urry (1999, p.16), o turismo “constitui uma manifestação de como o lazer e o

trabalho estão organizados”, assim, o autor afirma que a referida atividade tem seus

fundamentos no conceito de afastamento do lugar de origem, a partir do qual são

estabelecidas quebras de procedimentos e rotinas mais ou menos estabelecidas.

Essa ruptura, no entanto, não se dá apenas do ponto de vista das atividades, mas

também dos cenários, paisagens, culturas, entre outros. Assim, a busca de lugares

para o estabelecimento de relações turísticas fundamenta-se no mesmo princípio, no

qual determinados lugares são escolhidos para fruição porque existe alguma

expectativa, porque a seu respeito foi formado um imaginário (URRY, 1999, p.3), de

maneira que “(...) o olhar do turista (...) é construído em relacionamento com seu

oposto, com formas não-turísticas de experiência e de consciência social”.

Para o referido autor, o olhar do turista é direcionado, sobretudo, para esses aspectos

opostos às imagens do cotidiano, assim como para os aspectos que foram

despertados antes mesmo do momento da compra de determinado produto turístico,

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através do imaginário fomentado pelas imagens da mídia, pela publicidade, pelos

comentários, pelo senso comum e pelas próprias experiências:

o olhar do turista é direcionado para aspectos da paisagem do campo e da cidade que os separam da experiência de todos os dias (...) o olhar do turista é construído através de signos, e o turismo abrange uma coleção de signos (URRY, 1999, p. 18).

Assim, o desenvolvimento da atividade turística possui inesgotáveis elos com os

cenários e os significados e sentidos a eles atribuídos, na qual turistas são “praticantes

de semiótica lendo a paisagem à procura de significantes” (URRY, 1999, p. 29).

Fesenmaier e MacKay (2000), enfatizam a importância da imagem como um dos

fatores primários envolvidos nas decisões de viagem, inclusive como fator de

segmentação do mercado. Essa escolha é em grande parte determinada por imagens

visuais e em elementos simbólicos da destinação, sobre as quais as pessoas as

percebem segundo seus backgrounds culturais. Desta forma, segundo os estudos dos

autores, “a imagem de uma destinação é uma composição de diversos produtos e

atributos envolvidos em uma impressão total” (p.422).

A busca da beleza, do natural e do que é “dádiva divina”, enquanto necessidades

humanas fundamentais, alimenta as fantasias geradas no âmbito da psiquê, propicia a

formação de um imaginário específico à respeito de determinada destinação turística,

que também interferirá na forma da apreensão, da sua percepção no contato com o

objeto real. Ou seja, “a imaginação está continuamente criando e recriando a natureza

numa nova forma; a natureza é arquetipicamente psicológica” (HILLMAN, 1993,

p.123).

Urry (1999) traça o processo histórico do “descobrimento” e crescimento dos primeiros

balneários europeus utilizados com fins turísticos. Inicialmente a sua utilização dava-

se através do acesso restrito das classes dominantes, em seguida, pelo crescimento

destes balneários com sua rápida urbanização, aumento dos índices de pobreza e

excesso populacional. Desse modo, a sobrecarga de sua própria utilização gerou

também uma ocupação desordenada, tendo como uma de suas conseqüências o

declínio do produto turístico com sua desvalorização e passagem de um produto

elitista para um produto de massa.

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É nesse ponto que a preocupação central deste estudo faz-se pertinente, de maneira

que, a mudança das referências e dos significados sociais estabelecidas pelas

mudanças no espaço enquanto construção social pode determinar a deterioração

deste olhar do turista, tão citado pelo autor.

5.1 Sistêmica e a Dimensão do Significado

Conforme a teoria dos sistemas proposta por Capra (2002), citada anteriormente, na

compreensão do domínio social da vida podem ser citadas as quatro dimensões

sugeridas pelo autor que são: dimensão da forma, dimensão da matéria, dimensão do

processo e, finalmente, a dimensão do significado.

A dimensão do significado enfatiza como pertinente apenas às relações entre seres

humanos, ou seja, no âmbito das relações sociais. É nesse sentido que se torna

possível estabelecer sua relação com o espaço, anteriormente tratado: a dimensão do

significado permeia o espaço, enquanto produtor e produto social, da mesma forma

como em todos os demais fenômenos sociais.

Assim, na teoria sistêmica elaborada pelo referido autor, são relacionadas questões

estruturais, formais e concretas apresentadas pelas dimensões da matéria e da forma,

assim como, a variável temporal atribuída ao seu processo de construção apresentada

na dimensão do processo, a uma quarta dimensão essencialmente humana: a

dimensão do significado.

Essa abordagem associa, para esta pesquisa, os aspectos formais da cidade, das

ocupações humanas, ou seja, a morfologia urbana, aos aspectos psicológicos e

semiológicos despertos pelos primeiros.

Da mesma forma, nesta relação, o caráter temporal, processual não é menos

importante, já que é na dimensão do processo que está a história que lhe deu origem,

de maneira que “a cidade, então, é uma história que se conta para nós à medida que

caminhamos por ela. Significa alguma coisa, ela [cidade] ecoa com a profundidade do

passado. Há uma presença de história na cidade” (HILLMAN, 1993, p.39).

A dimensão do significado tem sua origem na autoconsciência, na linguagem, no

contexto social e na cultura. Essa capacidade de formular reflexões conscientes, ao

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mesmo tempo em que é vinculada à linguagem e seu contexto social, também emerge

como condição para a compreensão desta mesma realidade social.

O significado, constitui “uma expressão sintética do mundo interior da consciência

reflexiva” (CAPRA, 2002, p.86) a partir da qual são associadas uma multiplicidade de

características, permitindo ou exigindo a sua interpretação, de maneira que o sentido

de determinada coisa não se encerra em si.

Assim, formular conceitos, gerar idéias a partir de outras idéias pré-existentes e

associações são características necessárias à formulação de valores e regras de

comportamentos humanos, como princípios da vida social:

em específico, a nossa capacidade de reter imagens mentais de objetos materiais e acontecimentos parece ser uma condição fundamental para o surgimento das características fundamentais na vida social (...). O mundo interior dos conceitos, idéias, imagens e símbolos é uma dimensão essencial da realidade social (CAPRA, 2002, p. 86).

É assim que, por ser de natureza simbólica, a linguagem humana parte do princípio

essencial da comunicação de um significado (CAPRA, 2002, p.86) - seja essa

linguagem escrita, mental, imagética, musical, entre outras – que estimulam

determinadas ações humanas segundo a significação, ou ainda o sentido, atribuída ao

ambiente circundante.

Todas as redes sociais constituem da mesma forma redes de comunicação,

determinadas e organizadas segundo as limitações culturais, as relações de poder,

assim como a linguagem simbólica. Desta forma, os significados determinam e são

determinados, entre outras coisas, pelos valores, hábitos e cultura de determinada

rede ou grupo social, para o qual

esse sentido mais profundo do significado tem uma dimensão emocional e pode, inclusive, deixar a razão completamente de lado. Certas coisas são profundamente significativas para nós através do contexto oferecido pela experiência direta. O significado é essencial para os seres humanos (CAPRA, 2002, p.96).

Essas relações se alteram da mesma forma que a cultura, que como todo fenômeno

social, é dinâmico e autopoiético. Essa evolução também influencia e é influenciada

pelas mudanças às quais a infra-estrutura é submetida: “As influências da infra-

estrutura material sobre o comportamento e a cultura de um povo são especialmente

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significativas no caso da tecnologia (...)” (CAPRA, 2002, p.103). As alterações das

infra-estruturas, sejam elas decorrentes do turismo ou de quaisquer outros fenômenos

sociais, implicarão em uma mudança cultural na sua percepção, na sua significação,

que por sua vez gerará novas alterações infra-estruturais, aportando o caráter

processual retro-alimentado a estas relações, da mesma forma que citou Anjos (2004)

com relação ao processo de planejamento e gestão.

Assim, conforme as proposições apresentadas ainda que de forma preliminar nesta

seção, estes significados possuem intrínsecas relações com a semiótica, conforme

será abordado a seguir.

5.2 Imagem, Imaginário e Semiótica

A semiótica tem sua origem nos ensaios do americano Charles Sanders Pierce, que

faz uma abordagem mais filosófica, e do suíço Ferdinand de Saussure, que faz

contribuições mais ligadas ao campo da lingüística. Ambos são trabalhos

extremamente complexos e amplos que ainda não foram publicados na íntegra,

possibilitando a percepção de quão ampla é a semiótica e suas contribuições para a

vida humana e para as compreensões dos fenômenos sociais, portanto, não se tem a

pretensão aqui de enveredar a fundo em suas particularidades, mas tão somente de

possibilitar um melhor entendimento de como são formadas as idéias e os

significados, presentes na imagem e no imaginário, atribuídos às coisas, ao mundo, às

cidades.

Ciência atrelada ao pensamento, à comunicação e à linguagem humana, a semiótica

permeia todas as atividades de um ser humano e, assim, das relações estabelecidas

com outros seres humanos e com o mundo ao seu redor. Assim, a semiótica, ou

semiologia, estuda os signos e como estes se relacionam, ou seja, procura

compreender como se dá a interpretação das coisas concretas ao nível das idéias e

de suas representações. Para Santanaella (2000), “a semiótica peirceana é uma teoria

lógica e social do signo” (p.09) a partir da qual a semiose ou a autogeração como

princípio fundamental do pensamento, do encadeamento de idéias que geram novas

idéias, para posteriormente originar outras idéias em um fluxo retro-alimentado

indefinidamente.

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Apesar das inúmeras conceituações possíveis, existentes sobre o signo citadas por

Santanaella (2000) e Epstein (2001), inclusive várias formulações feitas pelo próprio

Pierce, uma delas citada por Epstein (2001, p.18) e Santanaella (2000, 12):

(...) um signo ou representamen é algo que, sob certo aspecto ou de algum modo, representa alguma coisa para alguém. Dirige-se a alguém, isto é, cria na mente dessa pessoa um signo equivalente ou talvez um signo melhor desenvolvido. Ao signo assim criado denomino interpretante do primeiro signo. O signo representa alguma coisa, seu objeto. Coloca-se no lugar desse objeto, não sob todos os aspectos, mas como referência a um tipo de idéia que tenho, por vezes denominado o fundamento do representamen (...)

Assim, o signo pode ser entendido como veiculador de significados, constituindo uma

idéia, uma representação mental das coisas do mundo real, ou seja, é uma imagem

como uma cópia de objetos concretos. A tríade formada pelos elementos presentes na

composição desse movimento sígnico presentes no texto de Pierce, citado pelos

autores, clarificam um processo cognitivo do qual fazem parte: (1) o signo, (2) o objeto

e (3) o interpretante.

O signo, primeiro elemento do processo triádico, está relacionado ao objeto real por

meio de um adjetivo, uma qualidade, através da qual a coisa é reconhecida. Os signos

não são capazes de abarcar a totalidade do objeto, haja vista, que o representa

apenas sob determinado aspecto (Santanaella, 2000), de outra forma, a signo seria o

próprio objeto. Assim, não é provável que haja um limite de interpretações possíveis

para um objeto, gerando sempre novos signos, de maneira que

aquilo que foi tomado como completo não passava de apenas um dos aspectos parciais do objeto, visto que este, na sua inteireza ou totalidade, não pode ser capturado por malhas de signos (SANTANAELLA, 2000. p.31).

Esse constitui o princípio da semiose ilimitada, sugerido por Charles Sanders Pierce, a

partir do qual os signos iniciais obtidos por informações básicas do objeto real, são

capazes de originar novos signos relacionados de forma sucessiva, indefinidamente.

Já o segundo elemento do modelo cognitivo triádico, o objeto, Santanaella (2000)

apresenta idéias de Pierce e inclui nessa categoria tudo aquilo no que é possível

pensar, sejam eles coisas, idéias ou ações. Assim, o objeto é algo diverso de um

signo, ao mesmo tempo em que é por ele representado, de modo que “é o próprio

objeto que determina essa representação” (p.34)

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Para a percepção destes objetos, Santanaella (2000) trás os elementos da tríade

perceptiva propostos por Pierce, que são: (1) o percepto, que é aquilo que está fora,

externo a nós; (2) o percipuum, que é a percepção imediata do objeto, anterior ao

julgamento da percepção “traduzido na forma e de acordo com os limites que nossos

sensores lhe impõem” (p. 52); e (3) o julgamento perceptivo, constituído pelo que nós

percebemos à respeito de algo externo, ou seja, de um juízo formulado a partira do

percipuum.

Finalmente, o terceiro elemento do modelo cognitivo triádico é constituído pelo

interpretante. O interpretante, juntamente com o objeto, é o agente a partir do qual o

signo é construído, “de tal modo que só pode ser definido na relação com o objeto e o

interpretante” (SANTANAELLA, 2000, p.61). É na idéia, na mente do interpretante que

se delineia o signo. Para Pierce, segundo afirma Santanaella (2000), o interpretante e

o signo são partes um do outro na medida em que constitui parte do signo que

interpreta, também compreende outro signo em si.

O processo fotográfico descrito por Kossoy (2002) parece aproximar-se do processo

triádico exposto anteriormente. Na fotografia o autor relaciona (1) o assunto, (2) a

tecnologia e (3) o fotógrafo, com ação situada em “coordenadas de situação” que

relacionam ainda o espaço e o tempo. Neste caso, parece possível estabelecer um

paralelo entre o (1) assunto situado em um contexto espacial-temporal ao objeto do

processo triádico da semiótica. Da mesma forma, a (2) tecnologia parece aproximar-se

do signo - a fotografia, por exemplo - e o (3) fotógrafo, do interpretante, enquanto

mediador da leitura, significação e representação do real, através desta dita “realidade

secundária”, por ele construída.

Os signos podem ser classificados segundo suas características, em: (1) ícones,

possuem alguma similaridade, em algum aspecto em relação aos seus objetos; (2)

índices, constituem uma espécie de amostra do objeto em si e possuem as mesmas

características, apontando, indicando para o objeto, possui uma “conexão dinâmica

com o objeto”, envolvendo uma relação efetiva com o mesmo; e (3) símbolos, é um

signo genérico, convencionado pela lei ou pelo hábito e constitui uma “mediação, um

meio geral para o desenvolvimento de um interpretante (...) É no interpretante que

reside sua razão de ser signo” (SANTANAELLA, 2000, p.132).

A mesma relação é estabelecida na semiótica da imagem, na qual o objeto passa a

ser constituído por uma imagem, como representação visual. Essa imagem então é ao

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mesmo tempo objeto e signo de outros objetos “que representam o nosso meio

ambiente visual”, ou ainda como representação mental, ou seja, as imagens em

nossas mentes (SANTANAELLA & NÖTH, 1998, p. 15).

Dubois (2003) traça o percurso da fotografia dentro da perspectiva peirciana “da

verossimilhança ao índice” (p.27). Este percurso histórico da forma como se deu a

evolução do entendimento das imagens fotográficas, é subdividido pelo autor em três

etapas: primeiramente (1) a foto como espelho do real, no qual a mesma era

entendida como mimese do objeto real; em seguida (2) a foto como transposição do

real, de maneira que era compreendida então como impressão e transposição do real;

e finalmente (3) a foto como um traço do real, que finalmente representa certos

atributos do real.

Então, se observa que neste percurso histórico, a fotografia é entendida como ícone

no momento da “verossimilhança”; posteriormente como símbolo no momento da

“interpretação-transformação do real”; chegando então a índice, assim que se passa a

compreender que a mesma “marca certo retorno ao referente, mas livre da obsessão

do ilusionismo mimético”, permitindo que assim “A foto é em primeiro lugar índice. Só

depois ela pode ser tornar parecida (ícone) e adquirir sentido (símbolo)” (DUBOIS,

2003, p. 53 – grifo do autor).

Assim, estudar a semiótica da imagem pressupõe estudar a imagem como

representação e também a percepção da imagem como forma de linguagem, de modo

que “a foto não é uma simples réplica da realidade em questão, mas sim uma

transformação visual que deve ser novamente interpretada pelo observador a fim de

assegurar a informação necessária” (SANTANAELLA & NÖTH, 1998, p. 41).

Para Santanaella e Nöth (1998), apesar das imagens serem capazes de comunicar e

significar, elas não possuem uma metalinguagem própria, estando sempre

dependentes da linguagem como ferramenta para sua análise semiótica: “enquanto a

linguagem é discursiva e apresenta a capacidade de generalização, imagens

representam holisticamente e se referem primeiramente a singularidades, e uma mídia

não é traduzível uma pela outra sem perda” (p.44).

No caso da percepção urbana, como objeto de estudo deste trabalho, os autores

lembram a importância da imagem, haja vista que a percepção da forma não é mais

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que um processo de recepção e coordenação, no qual são relacionadas as formas já

conhecidas e internalizadas ao objeto percebido.

Isso permite dizer que os signos, e assim a semiótica, são inerentes ao pensamento

humano, já que “todo pensamento se processa por meio de signos” (SANTANAELLA,

2000, p.09), sendo esse pensamento de natureza coletiva, elaborados e influenciados

a partir dos filtros culturais, do conhecimento e da bagagem de um determinado grupo,

de maneira que “a transmissão de significados constitui o fluxo inter-subjetivo pelo

qual circula a cultura” (EPSTEIN, 2001, p. 21).

Ou seja, a semiótica torna-se recurso essencial para o entendimento das imagens e

imaginários urbanos, criados, interpretados e projetados à partir de características

concretas do espaço da cidade, assim como, da morfologia urbana.

5.3 Urbanidade e Imaginário Coletivo

Muitos autores têm estudado as dimensões simbólicas atribuídas às características da

vida urbana. A caracterização da cidade como aglomeração humana e como

construção desta mesma sociedade tem como idéia fundamental, segundo Hillman

(1992), certa homogeneização a partir da qual a multidão de pessoas comuns que

forma a cidade tem na caminhada, nos encontros e na vida do espaço público.

Segundo o autor, a perda destas idéias básicas prejudica a formação da imagem

urbana e da própria concepção de lugar, tendo como reflexos a perda de um reflexo a

partir do qual o indivíduo se identifica, se reconhece no espaço, na cidade.

uma cidade é o vaivém de uma multidão de pessoas comuns na rua (...) Então, o fato de não encontrarmos rostos por não andar entre essa multidão abstém-nos de nosso próprio rosto; também nos abstém da própria cidade como foi originalmente imaginada: uma congregação de faces humanas originadas de todos os ‘caminhos da vida’ (HILLMAN, 1992, p.52).

Essa negação à identidade e ao reconhecimento da própria urbanidade acaba por

destituir o citadino do bem-estar e da necessidade estética da alma, na qual a beleza é

apresentada como aquilo que é autêntico e verdadeiro, ou seja, como aquilo que faz

sentido, que porta significados (HILLMAN, 1992, p.42). Assim, consequentemente, é

diminuída a valorização de suas formas, evidenciando essa busca de bem-estar “de

forma degradante e concreta, nas sombras desses mesmos reluzentes arranha-céus”.

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A respeito da mobilidade e vulnerabilidade da forma, da cidade, Ferrara (1997, p.193)

afirma que “as imagens urbanas são signos da cidade e atuam como mediadores de

seu crescimento”. Essa idéia expressa em boa parte a importância da paisagem

através da imagem que, depois de apreendida, torna-se signo da mesma, de maneira

que as expressões culturais de seus residentes são traduzidas na configuração do

espaço, e por que não dizer, na distribuição e relacionamento dos elementos

morfológicos de Lamas (2004). Assim, para Urry (1999, p.168), “a cidade é quase uma

definição de bom gosto e de um cenário no qual parte do capital cultural detido por

seus residentes se traduz em conhecimento que eles têm de suas condições

habitacionais”.

Por outro lado, ao entender que a cidade é também um produto a ser comercializado,

seus aspectos intangíveis, ainda que visceralmente ligados às características formais

da mesma, tornam-se elementos essenciais ao compreendermos que as imagens e

expectativas do consumidor turista são satisfeitas ou não por determinado lugar.

A busca turística da autenticidade e da ruptura com o cotidiano tem sua ênfase a um

tipo de consumo visual, no qual o turista, possuidor de uma bagagem cultural

diferenciada dos residentes, é uma espécie de observador de um espetáculo, do qual

a cidade é o cenário. A este respeito, Hillman (1992, p.164) afirma que

diante da ênfase dada ao consumo do turismo como algo visual e ao significado das edificações como objetos para os quais é direcionado o olhar, é essencial refletir sobre os padrões e formas cambiantes que tais edificações poderiam assumir (...) os arquitetos e as práticas arquitetônicas são de extrema importância na construção do olhar do turista contemporâneo (...) os turistas são socialmente diferenciados e, em conseqüência, contemplam seletivamente esses diferentes estilos arquitetônicos (...) elementos anteriormente da alta cultura são produzidos em massa e já não significam mais o que quer que seja em particular.

Através de elementos locais (da destinação) associados ao background do turista são

construídos a imagem e o imaginário coletivos à respeito de determinado lugar, de

modo que a imagem é constituída basicamente de informações espaciais concretas,

da paisagem. Para Ferrara (1997, p.194), a imagem e o imaginário abrigam as

relações mútuas, nas quais ao mesmo tempo em que a cidade é entendida como

“espaço físico construído”, também é “o lugar que se individualiza naquele espaço”.

Segundo o entendimento oferecido pela autora, que procura diferenciar as categorias

da imagem e do imaginário,

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o imaginário é um processo que acumula imagens e é estimulado ou desencadeado por um elemento, construído ou não (...) o imaginário urbano exige um juízo perceptivo (...) estimulado ou desencadeado pelas características urbanas (p.195, 196).

Já a imagem urbana, é referida por Ferrara (1997) como

resgate físico e visual de marcas memoráveis da cidade (...). Em síntese, a imagem urbana é a chancela do hábito, do cotidiano descompromissado e, por isso mesmo, fortemente enraizado na cumplicidade das crenças e valores constatados pela visão registrada coletivamente (p.195 e 196).

Assim, a imagem urbana, segundo a autora, possui apenas um significado, enquanto

que o imaginário é formado a partir da primeira imagem, com a atuação do juízo

perceptivo que gera novos significados: “pelo imaginário, a imagem urbana passa a

significar mais pela incorporação de significados extras e autônomos” (FERRARA,

1997, p.194). Essa dimensão sígnica da cidade, metaforiza-a e atesta a mediação

necessária ao seu reconhecimento, citadas pela autora como discursos não-verbais de

seus usuários/consumidores.

Esse (re)conhecimento da cidade se faz possível através da imagem e do imaginário,

determinantemente relacionados à vivência de dado espaço, na escala humana, de

forma que é com esse uso, esse caminhar que “estamos no mundo, encontramo-nos

num lugar específico e, ao caminhar nesse espaço, tornamo-lo um lugar, uma moradia

ou um território, uma habitação com um nome” (HILLMAN, 1992, p.53).

As relações humanas e sociais estabelecidas com a cidade, com seus lugares, com

seus elementos, só se fazem possível pela atribuição de significados, no processo de

criação e recriação imagem-imaginário. Essas relações simbólicas interferem

diretamente no uso e na apropriação destes espaços, conforme Lavinas e Ribeiro

(1997) referem-se em seu artigo, à medida que traçam a evolução do papel social da

mulher e das suas relações e apropriações espaciais, demonstrando apenas uma das

facetas da “materialidade simbólica” conferida ao espaço das relações sociais, neste

caso específico, de gênero.

Já com relação à cidade, do ponto de vista dos acontecimentos sociais, das decisões,

da agora, Andrade (1997, p.101) nos desperta a respeito do isolamento e da

interiorização das funções urbanas nas cidades contemporâneas, constituindo

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imagens de aglomerações humanas que têm desvalorizado, ou mesmo expropriado,

os lugares públicos, privando a cidade das importantes relações decorrentes do

encontro humano - com outros homens e com a própria urbes - e de sua significação

social. Da mesma forma, Leite (1997, p.244) lembra que

a mundialização da informação e da comunicação tornou a velocidade das mudanças sociais, econômicas, políticas muito intensas, impedindo o controle das variáveis que incidem sobre a estruturação e a configuração da paisagem

Da mesma forma que os regimes anteriores, o mundo capitalista serve à manutenção

de um poder constituído (WEIMER, 1997) e tem gerado determinada configuração

espacial segundo aos seus interesses econômicos, criando permanentes e profundas

mudanças quando da sua utilização e aumentando assim, a velocidade cambiante de

sua morfologia e de sua apropriação.

Neste cenário, percebe-se a importância da paisagem urbana na estruturação das

relações sociais entre seus habitantes, entre seus visitantes, da mesma forma que

entre estes e a própria cidade. A idealização de uma imagem e a atribuição de

significados acaba por refletir a relação estabelecida entre homem e natureza, bem

como da própria sociedade e seu espaço, enquanto objeto de intervenção: “a

paisagem é projetada e construída a partir de elaborações filosóficas e culturais que

resultam tanto da observação objetiva quanto da experiência individual ou coletiva em

relação a ele” (LEITE, 1997, p.244) e vice-versa.

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6. O CASO DE ALTER DO CHÃO (SANTARÉM-PA)

Situado no Estado do Pará, dentro da área Amazônia Legal (Figura 04), o Pólo

Turístico do Tapajós inclui municípios da região oeste do estado. Dentro do Pólo

Tapajós (Figura 05), o município de Santarém, no qual está inserida a Vila de Alter do

Chão, assume posição central na região oeste do estado, desempenhando um

importante papel enquanto centro regional. Localizada na confluência dos rios Tapajós

e Amazonas (Figuras 04, 05 e 06), a cidade de Santarém assume posição geográfica

central do município de Santarém em relação aos demais municípios do oeste

paraense e também entre as capitais Belém e Manaus. Este município concentra a

maior parte da infra-estrutura turística da região oeste paraense, bem como suas

melhores condições de acesso, atraindo o fluxo turístico e atuando como um ponto de

chegada e de distribuição para os demais municípios e micro-regiões do turístico do

Pólo Tapajós.

Como um dos distritos componentes do referido município, a Vila de Alter do Chão

está localizada à margem direita do rio Tapajós, em uma enseada que o une ao Lago

Verde, tendo como coordenadas centrais 02°30’30”S / 54°57’18” WGr e distante cerca

de 27 km do centro da cidade de Santarém, em linha reta, numa direção oeste-

sudoeste (SEBRAE, 2003).

FIGURA 04: Localização de Santarém no Estado do Pará, na Amazônia Legal e no Brasil. Fonte: SIPAM – Sistema de Proteção da Amazônia, 2005 (apud Pereira, 2004, Anexos).

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FIGURA 05: Mapa dos Pólos Turísticos do Pará Fonte: Adaptado a partir de BAHIA, Mirleide Chaar. Esporte e natureza: aproximações teórico-conceituais e impactos ambientais no Estado do Pará. 2002.

Com uma rica variedade cênica e cultural, o Pólo Tapajós também permite uma vasta

segmentação de mercado e das atividades propostas, abrangendo desde o turismo de

praia e sol às margens do Rio Tapajós e visitas à comunidades tradicionais, até

atividades mais especializadas como o turismo de aventura em trilhas de longa

duração dentro da Floresta Nacional do Tapajós, a pesca esportiva nos lagos dos

Municípios de Oriximiná e Itaituba, ou ainda a observação de pássaros na

Comunidade do Jarí (situada em frente à Comunidade de Ponta de Pedras, Santarém,

na margem oposta do rio Tapajós).

Neste contexto, a Vila de Alter do Chão é a referência turística mais marcante, na qual

também está concentrado, além do acesso à cultura da região, grande número de

instituições de pesquisa, organizações governamentais e não-governamentais, que

constituem importantes reservas intelectuais e financeiras.

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Localizada em posição central na região, nas proximidades de duas grandes áreas de

preservação ambiental (ver figura 06), a Vila de Alter do Chão tem um importante

papel tanto no contexto amazônico, quanto como destinação turística na região.

Atualmente a vila é parte integrante de roteiros das mais importantes operadoras de

eco-turismo do país, além dos roteiros propostos pelo Governo Federal através do

Ministério do Turismo, além de ser ponto de parada previsto nas rotas de cruzeiros

internacionais que transitam pelo rio Amazonas.

FIGURA 06: Situa Santarém e a Vila de Alter do Chão dentro do estado do Pará, assim como sua inserção junto às unidades de conservação e rios mais próximos

Fonte: Adaptação pela autora a partir de

imagens cedidas no formato PDF, pelo

Conselho Nacional dos Seringueiros na sede

em Santarém, em Setembro de 2003.

Fonte: Adaptação da autora a partir de figura disponível em: <http://www.sespa.pa.gov.br/Estado/geografia.htm> Acessado em 20/02/2006

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Devido à particularidade de suas paisagens intermitentes - diferenciada nos períodos

de seca e cheia do rio - formada pelo Lago Verde, Rio Tapajós e as demais formações

geológicas, com sua enseada, suaves elevações e a formação de uma península,

chamada pelos locais de “ilha”, suas praias e águas límpidas, além de suas

manifestações culturais, artesanatos e a população local, têm transformado-a em

emergente destinação turística (SEBRAE, 2003).

No entanto, sua crescente valorização, aliada ainda ao advento da monocultura da

soja na região, à venda das propriedades, à destruição de ambientes naturais e ao

aumento da dificuldade para ter acesso aos materiais locais tradicionais da cultura do

caboclo ribeirinho, tem resultado um crescimento desordenado do plano urbano da

Vila, na mudança dos padrões construtivos, na perda de referências culturais materiais

e imateriais e de seu ordenamento econômico predominantemente agrícola e

extrativista.

Essas transformações também acarretam conflitos fundiários e especulação

imobiliária, pela excessiva valorização dos terrenos, deslocamento da população

nativa para áreas mais distantes da margem do rio, induzindo a formação de novas

comunidades ao longo da rodovia, como por exemplo, a Comunidade de Caranazal,

distante cerca de 2 km de Alter do Chão.

Paralelamente a esse fenômeno, foi possível observar um crescente número de novos

residentes oriundos de países Europeus e outros estados do Brasil, que estiveram na

região como visitantes e ali fixaram novas residências.

No centro das preocupações deste estudo estão as profundas alterações ocorridas na

Vila de Alter do Chão, especialmente após a abertura da estrada, em face à grande

diminuição da demanda dos navios de cruzeiros internacionais (Quadro 01) enquanto

um possível indicador para a perda da atratividade turística do destino.

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TEMPORADA LOCAL N° DE NAVIOS

TEMPO MÉDIO DE PERMANÊNCIA (em Horas)

Alter do Chão 19 5,74 1986/1987 Área Urbana de Santarém 19 6,53

Alter do Chão - - 1987/1988 Área Urbana de Santarém 18 5,77

Alter do Chão 7 8,43 1988/1989 Área Urbana de Santarém 16 9,75

Alter do Chão 99 3,8 1989/1990 Área Urbana de Santarém 14 5,35

Alter do Chão - - 1990 Área Urbana de Santarém - -

Alter do Chão 2 - 1991 Área Urbana de Santarém 6 -

Alter do Chão 23 7,18 1991/1992 Área Urbana de Santarém 27 6,40

Alter do Chão 6 - 1992 Área Urbana de Santarém 4 -

Alter do Chão 2 - 1993 Área Urbana de Santarém 2 -

Alter do Chão 1 11 1994 Área Urbana de Santarém 1 4

Alter do Chão 21 7,48 Área Urbana de Santarém 10 9,4

Rio Curua 5 6,4

1996/1997

Comunidade de Ponta de Pedras

1 4

Alter do Chão 15 8,6 Área Urbana de Santarém 11 8,9

1997/1998

Rio Curua 4 7 Alter do Chão 9 11,33

Área Urbana de Santarém 12 10,83 1998/1999

Rio Curua 4 11,5 Alter do Chão 17 8,88

Área Urbana de Santarém 13 10,38 1999/2000

Rio Curua 2 8,5 Alter do Chão 16 -

Área Urbana de Santarém 23 - 2000/2001

Rio Curua 2 - Alter do Chão 25 9,8

Área Urbana de Santarém 20 6,7 2001/2002

Rio Curua 2 7,5 Alter do Chão 17 7,41 2002/2003

Área Urbana de Santarém 19 8,21 Alter do Chão 17 16,35 2003/2004

Área Urbana de Santarém 19 8,26 Alter do Chão 17 8,70 2004/2005

Área Urbana de Santarém 24 12,37 Alter do Chão 7 7,43 2005/2006

Área Urbana de Santarém 25 8,36 QUADRO 01: relação dos navios de cruzeiros por ano e seu tempo médio de permanência. Fonte: Quadro criado pela autora a partir das referências fornecidas por MC Náutica Equipamentos Navais LTDA, 2006.

De maneira a propiciar um entendimento e análise mais amplos à respeito do espaço

estudado, torna-se necessário levantar algumas importantes considerações sobre os

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aspectos naturais e a formação geomorfológica da localidade, que certamente têm

implicações diretas sobre a origem e o crescimento da região, em especial quando da

sua ocupação inicial, uma vez que, da mesma forma que o espaço não pode ser

desvinculado das ações sociais que a animam, também não pode ser desvinculado de

suas condições naturais que constituem a base geográfica sobre a qual foi erguida –

ainda que para ser transformada (Pereira, 2003).

6.1 As Características Naturais da Região

Tendo em vista o exposto, localizada na planície amazônica, à altura da sub-bacia do

Médio Amazonas, a Vila de Alter do Chão tem características predominantemente

planas, com suaves ondulações no terreno, inclusive a denominada Serra Piroca que

compõem a paisagem local. Essas formações foram elaboradas em “litologias

paleozóicas e/ou cenozóicas, eventualmente unida à superfície tabular mais alta”

(ALBERNAZ et al, 1999, p.3).

A formação geológica da região descreve suas rochas como predominantemente

siltitos argilosos vermelhos e arenitos médios à finos, possuindo raros conglomerados

e ausência de sedimentos químicos. O solo da área é do tipo latossolo amarelo

distrófico e areias quartzosas distróficas, caracterizada por intensa arenosidade e

baixa presença de nutrientes, além das grandes concentrações de alumínio, tóxico a

uma grande variedade de plantas (SEBRAE, 2003).

Apresentam-se algumas planícies fluviais inundáveis às margens do rio Tapajós, Lago

Verde, assim como os igarapés que o alimentam.

Com relação às características climáticas, pode-se dizer que todo o município de

Santarém apresenta clima enquadrado como clima tropical úmido, tendo um ou dois

meses de precipitações inferiores à 60mm, de maneira que a média anual entre 1970

e 1988 foi de 1950mm, 75% concentradas entre os meses de dezembro e junho, tendo

nos demais meses caracterizado o período de estiagem, sendo que as temperaturas,

sofrem pequenas variações.

Conforme citado anteriormente, toda a área de Alter do Chão situa-se às margens do

Rio Tapajós. O nível da água oscila cerca de 10 metros ao longo do ano, tendo o

momento de pico da cheia no mês de junho e em novembro o mês com nível de água

mais baixo.

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O Lago Verde possui cerca de 165 hectares e margeia a Vila de Alter do Chão.

Caracteriza-se como uma “ria”, pois é formado pelo represamento da bacia pelo Rio

Tapajós. Este lago é alimentado por dois igarapés principais, Jutuarana e Sonrisal,

que desembocam nas cabeceiras do macaco e Cuicuera e são formados por vários

outros igarapés. O Lago Verde recebia pelo menos mais um igarapé, na cabeceira do

Mucaim, que secou nos últimos dez anos, após o desmatamento das áreas de entorno

(ALBERNAZ et al, 1999; SEBRAE, 2003).

As águas do rio Tapajós são classificadas como claras, o mais transparente entre os

tipos de rios da Amazônia, permitindo a entrada de luz até níveis mais profundos e

possuindo tonalidade esverdeada.

No que tange as características da vegetação que pode ser encontrada em Alter do

Chão e seu entorno estão incluídas savanas, florestas, igapós e campinaranas3, além

de capoeiras, que são as florestas secundárias. A maioria das espécies arbóreas as

savana é adaptada ao fogo, como o murici (Byrsonima crassifólia), Salvertia

convallariaeodora e Qualea grandiflora. O solo é coberto por capins, e os mais

abundantes são Trachypogon plumosus e Paspalum caranatum. Na savana, é

freqüente a formação de “moitas” com arbustos e árvores.

Dentre as espécies arbóreas encontradas na área, em fragmentos de remanescentes

florestais que surgem dentro da savana foram identificadas mais de 117 espécies de

diâmetro e altura maior que as árvores encontradas nas florestas imediatamente 3 Sinônimo de Campina, Campinarana é um “falso campo”, com vegetação de influência pluvial, de altas temperaturas (médias de 25º graus Celsius), ocupando áreas de solo arenoso (Disponível em: <http://www.ambientebrasil.com.br > Acessado em: 31 de julho de 2007.

FOTO 01: Vista aérea a partir do rio Tapajós, da Ponta do Cururu, do Lago Verde e da Ilha do Amor em Alter do Chão Fonte: A autora, 2003.

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contíguas às savanas, dadas às facilidades de acesso, tendo sido estas áreas mais

alteradas. Muitas delas foram utilizadas como plantações de seringa para a extração

do látex.

Nas áreas inundáveis periodicamente pelas cheias do rio, aparece a vegetação de

igapó, formando buritizais e caranazais. Também pode ser observada com menor

participação, a presença de campinaranas, que possuem uma vegetação de dossel

bastante regular, com árvores mais baixas, de menor diâmetro e mais abundantes que

na floresta (ALBERNAZ et al, 1999).

6.2 Região Amazônica: Gênese e Urbanização do Oeste Paraense

Para que seja possível a compreensão do espaço turístico, que também é o espaço

das manifestações das demais relações sócio-econômicas, antes há que se deter na

compreensão do espaço enquanto produto destas mesmas relações sociais, ou seja,

buscar a compreensão da complexidade inerente à formação deste espaço.

Para Santos (1992), a compreensão do espaço relaciona obrigatoriamente quatro

categorias de análise, não hierarquizadas entre si, que tratam das relações entre os

diferentes elementos deste espaço. Assim, segundo o mesmo autor, o espaço é

construído a partir de processos sociais, ou ainda das relações entre homens, firmas,

instituições e infra-estrutura, assim como suas acumulações através do tempo. Desta

forma, conforme já discutido anteriormente no referencial teórico, a compreensão do

espaço sugerida por Santos (1992) dá-se através do estudo das formas, suas funções,

sua estrutura e processo, relacionando variáveis materiais, concretizadas no espaço, a

variáveis sócio-econômicas, bem como a maneira como se deu historicamente.

Assim, a necessidade de compreender o espaço desde suas origens, através dos

processos que determinaram a sua configuração atual como primeiro passo para a

apreensão do espaço turístico.

A região amazônica no decorrer de sua ocupação tem atravessado períodos de

diferentes características no que diz respeito às relações sociais e, desta forma, à

produção do espaço, confluindo para a instalação de um panorama bastante

complexo, no qual a crescente urbanização, inclusive no sentido de sua interiorização,

deu origem a uma rede urbana integrada à floresta, a “floresta urbanizada” (Câmara et

al, 2001).

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Assim essa ocupação complexa não teve sua origem, sua gênese a partir de um único

processo linear. Dentre os períodos mais notadamente distintos no que diz respeito às

relações sócio-econômicas e sua materialização no espaço pode-se segmentar

(CÂMARA et al, 2001): (1) o primeiro anterior à ocupação luso-portuguesa do território;

(2) um segundo período constituído pelas primeiras ocupações pelas expedições luso-

portuguesas e missões jesuíticas; (3) um terceiro momento relativo à mudança na

dinâmica sócio-econômica e espacial ocasionada pela exploração e comercialização

da borracha, desde sua origem, apogeu e declínio, e; (4) o quarto momento no qual as

grandes intervenções do Estado brasileiro determinaram nova alteração na dinâmica

sócio-espacial relacionada. Essa periodização é adotada no sentido da organização e

análise dos referidos períodos, que procurando evidenciá-los pelo estudo de suas

conseqüências e reflexos na conformação das relações sócio-espaciais intrínsecos a

cada um destes momentos históricos de sua ocupação.

Apesar da intensificação do processo de urbanização nos últimos anos, é importante

frisar que esta ocupação e crescimento não se constituiu, necessariamente, de um

maior desenvolvimento da região, haja vista que muitas vezes esta urbanização não

veio acompanhada de melhorias estruturais dos assentamentos humanos com a

implantação de infra-estrutura básica e de serviços, condição essencial para a

melhoria da qualidade de vida de suas populações. Nos dias de hoje, conforme cita

Câmara et al (2001), os baixos índices de escolaridade, as precárias condições de

saúde, as baixas remunerações e índices de empregos formais, a precariedade dos

sistemas de abastecimento de água e coleta de esgoto, são indicadores que apontam

as inadequadas condições de vida de suas comunidades como um dos mais graves

problemas ambientais da Amazônia.

É salutar observar ainda, que a região amazônica como um todo ainda se constitui em

um ambiente de fronteira, em formação, de dinâmica sócio-econômica acentuada e

assim, extremamente mutável. A existência de muitas áreas pouco exploradas e

outras preservadas, assim como as condições de acesso à região, não implantadas

em sua totalidade, dão conta de um espaço mutante ainda percorrendo os estágios

iniciais no sentido de sua consolidação.

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6.2.1 A gênese de Alter do Chão (município de Santarém, Pará, Brasil)

A Vila de Alter do Chão, já era ocupada antes mesmo da chegada dos portugueses,

segundo as referências de que a região amazônica possui registros de sua ocupação

que datam de 7.000 e 8.000 anos, em avaliações feitas a partir de fragmentos de

cerâmica encontrados em sítios arqueológicos nas proximidades de Santarém, por

exemplo. Outros registros como as pinturas rupestres em Monte Alegre, além das

cerâmicas e das iconografias Marajoara e Tapajônica espalhadas em vários pontos da

planície amazônica, inclusive em cidades como Itaituba e na Ilha do Marajó,

demonstram a dimensão da ocupação silvícola na região. Entretanto, ainda existem

muitas controvérsias a respeito da definição destes povos e seus respectivos

territórios, mas o fato é que mesmo antes da ocupação européia, a produção do

espaço já se fazia, uma vez que haviam “agrupamentos de dezenas de milhares de

pessoas, divididas em classes sociais e com o domínio das técnicas com o trabalho

manual de cerâmicas” (FONSECA, 1996, p. 14).

Entretanto, o modelo de ocupação característico destas formas de organização social

determinava a criação de formas de baixa permanência, dadas as suas características

técnicas primitivas, da mesma forma que suas relações econômico-sociais baseadas

sociedades comunais, sem propriedade privada ou de terra, organizados em

pequenas aldeias e sítios agrícolas, modelo no qual a economia se desenvolvia

basicamente no sentido de prover a subsistência da comunidade como um todo.

Estas relações sócio-espaciais têm o início de sua transformação a partir da ocupação

lusa na região amazônica, que tem seu início em 1540 (CÂMARA et al, 2001). A

princípio, a motivação para o surgimento das ocupações na região amazônica foi de

assegurar e defender a conquista e o domínio do território português. Essa ocupação

se caracterizou por uma interiorização com relação ao modelo de ocupação do litoral

presente na região nordeste, através das calhas dos rios mais importantes e/ou

significativos aos seus interesses, conforme aponta Fausto (2000) em seu livro, em

cujo primeiro período da história do Brasil por ele proposto, tem como características o

“reconhecimento e posse da nova terra”. Esses assentamentos lusos eram

fundamentalmente missões jesuíticas e pequenas fortificações de defesa instaladas

junto às maiores aglomerações de populações indígenas (CÂMARA et al, 2001).

Mas ora, refletir sobre a ocupação da planície amazônica com suas características de

impermeabilidade por seus povos nativos já habituados às suas condições, é coisa

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bastante distinta que tratar das primeiras incursões dos povos civilizados nestas terras

– seja pela existência da densa floresta, seja pelos riscos atribuídos a animais

peçonhentos e doenças desconhecidas pelos exploradores europeus. Os fatores já

citados aliados aos obstáculos cumulativos relativos às diferenças climáticas, à

existência de uma vascularização fluvial intensa, que ora possibilitava o acesso a

novas áreas, ora concretizavam-se como obstáculos à continuação da viagem, assim

como as grandes distâncias entre os pontos de apoio e abastecimento das naus e a

existência de tribos numerosas e defensoras de seus territórios, em tudo dificultavam a

sua ocupação pelo colonizador.

O interesse português no território amazônico só foi manifestado após a invasão

francesa no Maranhão em 1612, com a fundação de São Luiz, conforme cita Fausto

(2000). A partir desse momento, de fato inicia-se a ocupação do território amazônico

com a luta contra os franceses e a fundação de Belém em 1616 e a instalação de um

posto avançado no local onde atualmente está a cidade de Manaus, no ano de 1690.

As missões tinham também o intuito de “domesticar” os índios através da dominação

cultural religiosa, tornando-os mais susceptíveis às ordens e à dominação da colônia,

assim como ao regime de trabalhos compulsório. Diante de populações fortes e de

diferentes referências sócio-culturais, o colonizador utilizou-se do subterfúgio do

relacionamento religioso e de amizade em direção à utilização dos índios, sua força de

trabalho e seu conhecimento sobre a floresta com seus perigos e riquezas, na

consolidação do poderio português na porção norte do território brasileiro.

É com a chegada dos colonizadores portugueses que se iniciam as alterações nas

relações sócio-econômicas, bem como nas forças de produção, de maneira que a mão

de obra indígena passou a caracterizar a principal força produtiva. Desta forma, o

modo de produção era predominantemente extrativista e as relações comerciais

baseadas quase exclusivamente no escambo de mercadorias, que tinham dentre os

principais produtos as “drogas do sertão” (baunilha, salsaparrilha, o cacau nativo, etc.),

além de uma pequena produção de arroz e algodão e algum gado, muitas vezes

vinculados às missões jesuítas (FAUSTO, 2000). É importante ressaltar, que no

mesmo momento em que a Europa já começa a viver as mudanças estruturais,

produtivas, econômico-sociais decorrentes da Revolução Industrial, a recém “ocupada”

colônia portuguesa ainda vivia relações mercantilistas, pré-capitalistas, com algumas

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características feudais, especialmente nas áreas onde a colonização não era

direcionada à grande produção açucareira para exportação.

É neste contexto que surgem as ocupações portuguesas, através da implantação

primeiramente das missões, em locais nos quais atualmente estão a cidade de

Santarém e a Vila de Alter do Chão (distrito integrante do município de Santarém).

Conforme referido anteriormente, a ocupação primitiva destas áreas está registrada na

existência de sítios arqueológicos e áreas de terra preta (antigas ocupações

indígenas) em várias porções do território deste município, inclusive em áreas

atualmente urbanizadas. No entanto, os primeiros registros de contatos com os

portugueses datam de 1542, sobre os quais relata Fonseca (1996), citando o contato

das tropas de Francisco Orellana com os índios Tupaius. Outros registros também

falam de contatos em 1626 e 1639, através de tropas de resgate e, somente em 1659,

a atual Santarém recebeu o padre jesuíta Antônio Vieira.

A fundação da missão Tapajós, atual Santarém, se deu em 22 de junho de 1661 com

a chegada do padre jesuíta João Felipe Bettendorf, ordenado pelo padre Antônio

Vieira, para instalar a citada missão, de sua responsabilidade, na desembocadura do

rio Tapajós (ponto o qual o referido rio deságua no Amazonas). Ainda segundo o

mesmo autor, a Vila de Alter do Chão, também abrigou uma missão jesuíta nomeada

Missão de Nossa Senhora da Purificação, antes de ser elevada à condição de Vila

pelos colonizadores portugueses, o que ocorreu antes da cessão do mesmo título à

Santarém.

Mesmo com o passar do tempo, o território não estava ocupado segundo as intenções

portuguesas. As necessidades de efetivar a ocupação do território, além dos

constantes conflitos entre os jesuítas, missões religiosas e a coroa portuguesa

acabaram por determinar a extinção das missões com a expulsão dos jesuítas e o

reconhecimento do indígena como ser humano, livre, durante o governo do Marques

de Pombal. Fica evidente que a questão trata de uma disputa de poder e interesses

entre as classes dominantes – a aristocracia e o clero. Por um lado, o reconhecimento

do índio como “possuidor de alma” (ao contrário do que ocorria com relação aos

negros, destaque-se escravos) nada tinha a ver com a benevolência e compreensão

do colonizador e sim com o interesse da coroa em assegurar a posse do território

fragilmente ocupado e permanentemente ameaçado por corsários franceses,

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holandeses e espanhóis: se os índios dali em diante, são homens, são livres e

nascidos neste território está aí assegurada a sua posse.

Por outro lado, do ponto de vista das questões de poder pertinentes à relação jesuítas

e Coroa portuguesa, observa-se que o cunho político estava sempre presente nas

referidas missões. Ora, com a crescente catequização dos índios e sua dominação, os

jesuítas passaram a ter muito mais poder do que interessaria à Coroa. Esse poder não

era só político, no que diz respeito ao comando dos indígenas, mas também poder

econômico no que tange o intermédio de relações comerciais, assim como a

implantação de áreas de produção agrícola e pecuária, ainda que em pequena escala.

É então neste período que, a mando do Marques de Pombal, seu irmão Mendonça

Furtado, o então governador da província do Grão-Pará, elevou à condição de Vilas

vários assentamentos humanos ao longos dos rios da região Amazônica, inclusive

várias missões, conferindo a estas, nomes de cidades e localidades portuguesas.

Dentre as missões elevadas à categoria de vilas, estão a Vila de Alter do Chão (no dia

6 de março) e a Vila de Santarém (dia 14 de março), assim constituídas no ano de

1758 (FONSECA, 1996).

Ainda assim, durante o segundo período da ocupação da região amazônica (de 1540

até 1850), das formas de organização e ocupação do território, restritas a alguns

pequenos e esparsos vilarejos e fortificações ao longo das calhas dos rios, poucos

permaneceram como cristalizações ou rugosidades (CORREA, 1995; SANTOS, 1992)

deste momento histórico para a formação do atual contexto urbano da região

(CÂMARA et al, 2001).

Com o ciclo da borracha (início em 1851, apogeu a partir de 1892 e declínio após

1913), as alterações induzidas pela nova dinâmica sócio-econômica no espaço se

materializam no desenvolvimento de um modelo de urbanização constituído de

cidades primaz, a partir do qual as cidades de Belém e Manaus adquirem um

importante papel no panorama regional (CÂMARA et al, 2001). Essa mudança de

ordem estabelece novas aglomerações urbanas, bem como, determina a hierarquia

entre elas, segundo o modelo econômico ditado pela borracha, sua extração e

comercialização.

Com relação ao ciclo da borracha, é importante mencionar o momento histórico

mundial, no qual as invenções da 2ª. Revolução Industrial (o automóvel, por exemplo),

gerava uma demanda crescente pela borracha como matéria-prima. Essa conjuntura

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mundial fez crescer cidades pujantes em meio à Amazônia brasileira, até então com

uma economia frágil e dependente e um território vagamente ocupado. O que não se

altera, no entanto, é a forma de produção, de caráter meramente extrativista (da

mesma forma que acontecia com as drogas do sertão) e beneficiamento artesanal.

Ainda neste momento da ocupação da planície amazônica, o surgimento de núcleos

de povoamento ocasionado pela intensa migração para a região, continua tendo

importante vínculo com a possibilidade de acesso através de sua bacia hidrográfica,

que permitia o transporte da borracha entre os portos de cabotagem até o porto de

Belém, o qual já possuía autonomia para as exportações. Isso gerou de fato, uma

grande concentração de capitais em Belém primeiramente, e em Manaus em um

segundo momento, ocasionando uma urbanização de grandes contrastes nas relações

centro-periferia, tanto no que se refere à própria cidade, quanto no que se refere às

relações entre cidades (CÂMARA et al, 2001). Neste momento, Belém e Manaus

gozam de uma infra-estrutura que até então poucas cidades brasileiras dispunham –

rede elétrica, bondes, teatros, sistema de água e esgoto (SANTOS, 1999), no entanto

conforme já citado anteriormente esse desenvolvimento não aconteceu de forma

homogênea nem mesmo dentro da própria cidade e também não induziu o surgimento

de uma nova estruturação econômica, de novos modos de produção, permanecendo

Belém caracterizada como centro político-administrativo e de serviços.

Em 1912, em conseqüência à biopirataria que possibilitou a criação de plantações

racionalizadas de seringa na Malásia, que possuíam maior produtividade dadas as

condições de ausência de pragas e predadores naturais, além das vantagens de uma

cultura sistematizada, deu-se a decadência do ciclo da borracha brasileira.

Segundo a nova tendência de crise, alguns centros produtores de borracha se

esvaziaram e a conseqüente estagnação econômica, com a migração de sua

população, deu origem a novos núcleos de ocupação. É então que, a partir da década

de 60, as contínuas intervenções do Estado passam a atuar de forma decisiva na

ocupação e nos modelos de urbanização mais recentemente implantados na região “o

Estado desenvolveu um papel essencial no povoamento e valorização das terras

amazônicas seja através dos planos de desenvolvimento ou através de investimentos

em infra-estrutura” (CÂMARA et al, 2001, p.4): dá-se o início do quarto período

proposto para a análise sócio-espacial.

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Neste período, programas como o PDN (Plano de Desenvolvimento Nacional), PIN

(Plano de Integração Nacional), RADAM, entre tantos outros, que instalaram uma

infra-estrutura de incentivos a grandes projetos, assim como uma rede rodoviária de

maneira a permitir melhores condições de acesso a eles, alteraram de maneira notável

a forma de ocupação do território amazônico, território este que teve como

característica de suas ocupações e crescimentos mais expressivos até então a

penetração do território ao longo dos cursos dos rios, passa agora a ter um novo eixo

de maior atração sócio-econômico-espacial: as rodovias (CÂMARA et al, 2001).

Os centros ribeirinhos têm diminuída a sua importância exceto quando estes também

são cortados pelos novos eixos de acesso e transporte, conforme Câmara et al (2001)

e Machado (2003). A esse respeito o último autor afirma que a alteração da forma de

organização da produção que até então estava assentada sobre “o valor da floresta e

não da terra”, teve como conseqüência “a desarticulação das comunidades que tinham

o território como opção de vida, caso das populações ribeirinhas e dos ‘povos da

floresta’” (p. 704).

Segundo Câmara et al (2001), aí surge uma transposição do modelo de ocupação

anterior baseada na cidade primaz, para um novo modelo de urbanização regional, de

modo que a hierarquia entre as cidades é minimizada e há o surgimento de novas

aglomerações de pequeno e médio porte, especialmente a partir da década de 70,

contexto regional no qual está inserida a consolidação da cidade de Santarém,

enquanto entreposto urbano, entre as regiões metropolitanas. Estas aglomerações

urbanas e cidades, também citados por Machado (2003), “adquirem uma dinâmica que

depende pouco ou quase nada de do seu entorno e mais da própria economia urbana

e/ ou das interações com outras cidades”, criando núcleos até certo ponto auto-

suficientes.

Becker (2003, p.653), em seu artigo, refere-se às mudanças estruturais ocorridas na

Amazônia brasileira após a década de 70 já mencionadas, sintetizando-as em um

quadro no qual é possível listar a mudança na estrutura de articulação do território,

também chamada de conectividade pela autora; a industrialização, ou ainda a

alteração na sua estrutura econômica; transformações também presentes na estrutura

do povoamento e, assim, de sua urbanização; assim como também na estrutura da

sociedade; na malha sócio-ambiental (estrutura da apropriação do território);

determinando também uma nova escala.

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As figuras abaixo demonstram a concentração de municípios e as tendências de

urbanização ao longo do tempo, na região amazônica.

Até 1850

Até 1912

Até 1965

Até 1985

Até 1990

Até 1997

FIGURA 07: Evolução dos pontos de urbanização na Amazônia Legal. Fonte: Câmara et al (2001) p. 8 a 10.

Pereira (2004) classifica segundo a tipologia de produção diversas cidades

amazônicas, - (1) centros com predomínio das atividades industriais; (2) centros com

combinação de atividades comerciais e industriais; (3) centros com atividades ligadas

aos produtos agropecuários; (4) centros com atividades ligadas aos produtos

extrativos vegetais e ainda; (5) centros com atividades ligadas aos produtos

agropecuários e extrativos vegetais – classificação na qual Santarém se enquadra

como centro com combinação de atividades comerciais e industriais, de forma que

também é uma das quinze cidades que constituem importantes centros de distribuição

de bens e serviços (PEREIRA, 2004). Santarém constitui dentro do estado do Pará,

um dos três vetores de crescimento enquanto centros sub-regionais, referenciado pelo

autor como “novos vetores de crescimento econômico e demográfico fora da Região

Metropolitana de Belém” (PEREIRA, 2004, p. 70).

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Assim, os modelos de ocupação determinados por seus processos históricos, bem

como por suas relações sócio-econômicas se refletiram em uma ocupação que se

iniciou mais intensamente ao longo da costa e ao longo dos rios. Com a sucessão dos

ciclos apontados neste trabalho, a tendência de urbanização na região foi

notadamente sendo deslocada para o interior, além das margens dos rios, e para o

oeste, ou seja, para a fronteira da região. Esse movimento é reforçado e intensificado

com a alteração das relações de transporte e acesso, dadas pela construção das

rodovias e de grandes projetos agro-minerais, madeireiros e posteriormente, a Zona

Franca de Manaus. Observa-se aqui a importância das condições de acesso no

direcionamento das tendências de ocupação.

Ao mesmo tempo, esse deslocamento do eixo de urbanização acaba por determinar o

surgimento de novos núcleos urbanos de importante papel regional, dentre os quais as

cidades médias como Santarém, reforçando os vetores de descentralização desta

ocupação do território.

Essas mudanças de densidade (municípios, assim como de fluxos – humanos,

econômicos, entre outros) e de importância das capitais da região amazônica, a partir

do qual há uma alteração de ordem hierárquica entre Belém e Manaus, segundo os

processos históricos analisados, talvez explique a relação sócio-econômica muito mais

intensa de Santarém com a cidade de Manaus, que com Belém (apesar de fazer parte

da mesma unidade da federação brasileira da qual a última é a capital).

Segundo as tendências observadas e já citadas, também nota-se como determinante

a construção da rodovia Santarém-Cuiabá, a partir da qual se criou um novo eixo de

crescimento da cultura de soja em direção a Santarém. Todas essas tendências

podem se acentuar consideravelmente no caso do asfaltamento da referida rodovia,

diminuindo ainda mais a dependência desta cidade de Belém (que ficaria isolada de

Santarém pela inexistência de rodovias entre as duas); aumentando a urbanização, o

crescimento e o vigor econômico de Santarém e outras cidades situadas ao longo da

rodovia; o fortalecimento do vínculo de Santarém com Manaus e Cuiabá, mais uma

vez deslocando o eixo regional; além do aumento dos investimentos na cultura da soja

e ainda; a possível intensificação da destruição de áreas florestadas, inclusive

aumentando a pressão sobre algumas unidades de conservação.

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6.2.2 Alter do Chão enquanto território turístico: as transformações atuais.

Situado mais especificamente dentro do último período sócio-econômico referido, a

cidade de Santarém e assim também Alter do Chão iniciam sua trajetória de território

turístico somente na década de 70, quando a referida desconcentração da

urbanização da Amazônia, assim como a e disseminação das cidades médias, altera

mais determinantemente a dinâmica dos deslocamentos regionais.

Mais precisamente no que se refere à Alter do Chão, os primeiros movimentos

turísticos estiveram notadamente marcados por um fluxo local direcionado do centro

da cidade de Santarém e outras cidades do entorno, para Alter do Chão, que

inicialmente ocorria pelas vias fluviais, teve na construção da estrada PA-457 ou

ainda, Rodovia Everaldo Martins, ligando Santarém à Vila de Alter do Chão por 32 km

de percurso terrestre. Tomando como referência que “(...) o desenvolvimento das

tecnologias de transporte [entre outros] (...) foram fatores fundamentais para a

democratização do turismo” (LUCHIARI, 2001, p.113) a sua construção na década de

70, se tornou o marco mais sensível na alteração da dinâmica urbana da referida

localidade. A facilidade de acesso valorizou a Vila e todas as áreas e comunidades

dispostas ao longo de seu trajeto – manifesta-se aí o Estado enquanto um dos

agentes produtores do espaço, pela implantação de infra-estrutura de acesso,

conforme é citado por Correa (1995) – e possibilitou o conhecimento da localidade por

um maior número de pessoas, dadas inclusive a diminuição dos custos e do tempo de

transporte até Alter do Chão.

Uma vez que “a urbanização turística coloca as cidades no mercado de paisagens

naturais e artificiais” (LUCHIARI, 2001, p. 108), esse crescente interesse local pelo

consumo das paisagens desta Vila fica registrado na venda dos lotes, especialmente

os localizados em áreas de amenidades (CORREA, 1995), ou seja, com vista para o

rio, ocasionando a expulsão dos moradores tradicionais para áreas periféricas e

induzindo o surgimento de novos agrupamentos humanos ao longo da citada rodovia.

Posteriormente à construção da referida rodovia, verifica-se a intensificação do

movimento de construção de segundas residências. Esses efeitos são ainda

claramente potencializados em dois outros momentos: o asfaltamento da rodovia no

ano de 1992 e a sua reforma com a substituição das pontes em madeira de faixa

simples, por outras em concreto, de faixa dupla, ocorrida no ano de 2003.

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Esse quadro de crescente especulação imobiliária e venda das propriedades dos

moradores nativos, corriqueiro em localidades de crescente interesse turístico, pode

ser ainda agravado pelas condições de renda e educação desta população – Pereira

(2004, p. 74) reitera que, apesar do crescimento urbano, para “grande parte das

cidades médias da região não significou novas oportunidades de emprego para a

população” - aliada quase inexistência de infra-estrutura de saneamento básico

(SEBRAE, 2003), entre outros, versus a crescente valorização dos lotes e à iniciada

especulação imobiliária na Vila de Alter do Chão.

A mudança de proprietários acaba por determinar também uma forte alteração dos

padrões construtivos e formais das edificações quando comparadas às construções

anteriormente implantadas nesses lotes. As mudanças mais significativas podem ser

percebidas no tamanho (taxa de aproveitamento) e altura (gabarito) das construções,

na inclusão de muros altos e fechados, na utilização de materiais (como concreto,

telhas de amianto, entre outros).

Dentro deste contexto, pode-se observar mais detidamente que há um movimento da

população local em direção à periferia da Vila, que também conta com menos infra-

estrutura urbana. Esse movimento induz o surgimento de novos bairros que mais se

assemelham a favelas, ou ainda, induzindo o surgimento de outras comunidades,

como a comunidade do Caranazal, basicamente formada por antigos moradores de

Alter do Chão que venderam suas propriedades e compraram outros terrenos ao longo

da rodovia, no entanto distantes das margens do rio.

Nessas áreas também é possível observar a alteração dos padrões construtivos que,

abandonando as técnicas e materiais tradicionalmente utilizados por essa população,

passam a buscar certa identificação com as segundas residências construídas, sem,

no entanto ter a capacidade de alcançar padrões mínimos de conforto e salubridade,

devido às precárias condições de renda dos residentes.

No que tange a valorização dos lotes, deve-se destacar o fato de que essa valorização

não se deu (ou, não se dá) de forma homogênea, mas sim houve “uma revalorização

seletiva no uso do solo urbano” (LUCHIARI, 2001, p.125). Isso se dá segundo suas

características de acessibilidade – vias asfaltadas ou não – assim como também, às

áreas próximas ao rio. No caso das vistas, também observa-se certa hierarquia de

modo que a vista mais valorizada é a da “ilha” de Alter do Chão, seguida pelas vistas

da praia do Cajueiro, e posteriormente a valorização das vistas abertas para o Tapajós

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(fora da enseada). Além disso, os lotes mais valorizados e os primeiros a terem suas

relações de propriedade alteradas têm fortes relações com a proximidade da praça e

da igreja matriz, com o comércio, assim como também, com o suposto ponto inicial de

ocupação da Vila de Alter do Chão.

Poucos moradores tradicionais permanecem nas áreas de orla e em suas

proximidades, e quando isso ocorre, ocorre em áreas mais afastadas da praia principal

e de sua vista, como também das áreas de acesso mais restrito e em ruas sem

pavimentação.

Com a aquisição destes lotes por pousadas, hotéis, segundas residências, entre

outros, o comércio começa a tornar-se eminentemente voltado ao turista e às suas

necessidades, tanto no que se refere aos produtos e serviços oferecidos como no que

tange a questão de preços. Essa alteração nas relações sócio-econômicas se

manifesta na existência de duas centralidades na Vila: um mais pertinente e

permeável aos turistas, especialmente no que se refere à moradia e comércio básico –

localizado ao longo da orla, e no entorno da praça da igreja matriz; e um outro mais

permeável aos habitantes locais – localizado no entorno da Praça do Sairé e ao longo

da rua asfaltada que dá acesso a mesma. Neste caso também se pode observar a

possível influência da linha de transporte urbano coletivo, retirado das áreas de maior

interesse turístico, reforçando essa forma de uso, uma vez que o turista e o

proprietário de segundas residências se utilizam em menor número deste serviço.

Entretanto, faz-se relevante levantar o questionamento de Luchiari (2001, p. 121) que

resgata a construção como o resultado de múltiplas determinações:

O que é analisado como declínio dos lugares turísticos pelo adensamento das residências, das infra-estruturas, [etc] (...) pode ser sinal de uma transformação histórica dos lugares, os quais deixam para trás a determinação turística para produzir um novo lugar (...)

6.3 O Município de Santarém e sua Inserção Regional: O Centro Regional do Oeste Paraense

O processo de ocupação e urbanização da região amazônica já citadas anteriormente,

é enfatizado por Pereira (2004) pelo seu importante papel na construção do atual

cenário sócio-espacial na região. A referenciada forma de ocupação gerou a

concentração de grandes contingentes populacionais carentes de serviços públicos

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adequados, bens e trabalho, em cidades tradicionais, cidades “produzidas” pela

instalação dos grandes projetos mineradores, entre outros.

Conforme observou-se anteriormente, no que diz respeito à gênese de Santarém, o

seu papel regional tem origem nas características das cidades estabelecidas no

período colonial com localização estrategicamente voltada à função de conquista e

defesa do território, estando estas cidades visceralmente relacionadas às cidades

primaz, no caso do Pará, constituída por Belém.

Com a mudança das formas de produção, circulação e consumo, o sistema urbano

amazônico passara ser condição e produto de seu sistema de povoamento, conforme

cita Pereira (2004). A implantação da rede rodoviária, conforme já citado, também

desempenhou fundamental fator para que as cidades dotadas de melhores condições

de infra-estrutura, bens e serviços adquirissem e consolidassem sua centralidade.

Ainda segundo Pereira (2004, p. 61), “A dimensão das mudanças aqui ocorridas, vão

para além de novas relações econômicas. A reestruturação urbana e regional implica

também em uma reestruturação do modo de vida”. É neste cenário que o autor refere-

se à perda de importância econômica de cidades como Belém, bem como da

ascensão de novos centros regionais que desempenham uma complexidade de

funções dentre as quais, de produção, distribuição e gestão, como, por exemplo, o

caso de Santarém, que desempenha funções diversas que combinam atividades

comerciais e industriais, classificada hierarquicamente como Sub-Centro Regional

(PEREIRA, 2004).

Referenciada como uma das três cidades médias no âmbito do Estado do Pará, além

de Castanhal e Marabá, o município de Santarém desempenha um importante papel

regional no que diz respeito à porção oeste do território paraense (PEREIRA, 2004),

de maneira que estas cidades são citadas “como novos vetores de crescimento

econômico e demográfico fora da Região Metropolitana de Belém”.

Entretanto, suas características são diferenciadas das demais cidades médias4 em

outras regiões do país. Caracterizada como desempregada, com baixos índices de

rendimentos e baixa qualificação e escolaridade, segundo demonstrado pelos

números apresentados por Pereira (2004), a população destas cidades tem difícil

4 Segundo dados populacionais/demográficos, assim como também disponibilidade de determinados tipos de serviços e comércio, distância de outros centros maiores, entre outros, conforme caracteriza Pereira (2004).

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110

acesso à qualidade de vida, diferentemente de cidades médias de outros estados

brasileiros, tais como os Estados de São Paulo e Santa Catarina, por exemplo.

Ainda assim, devido aos grandes vazios, às grandes distâncias aliadas às dificuldades

de acesso e deslocamento à capital assim como a outras cidades, pela insuficiência e

precariedade da infra-estrutura instalada, Santarém, assim como as demais cidades

médias localizadas na região amazônica, passa a atuar como centro regional, suprindo

as necessidades dos demais municípios da região em serviços, comércio, centro

político, entre outros.

Assim Santarém, a mais antiga cidade média da Amazônia, constitui uma referência

para outros núcleos urbanos existentes em sua proximidade, especialmente no pólo

Tapajós ou ainda na Meso-Região do Baixo Amazonas (PA), tornando-se mediadora

em questões políticas, econômicas e sociais, exercendo liderança e tornando-se

formadora de opiniões na região, constituindo “ponto de ligação” através da qual

circulam os mais diversos fluxos de pessoas, mercadorias, informações, entre outros

(PEREIRA, 2004).

Santarém tem em sua posição geográfica favorável, uma das características das

cidades médias citadas por Pereira (2004, p. 76). O referido autor ainda traça uma

análise, inicialmente demográfica, passando por fatores tais como a produção de bens

e serviços exigidos por elas próprias e para as cidades menores de seu entorno, a sua

localização em relação aos eixos principais, a situação geográfica favorável, a

representação política frente a outras cidades da região, a existência de redes de

transmissão de informação, os antecedentes históricos, a capacidade de receber e

fixar migrantes, bem como o distanciamento de áreas metropolitanas, que

caracterizam o município de Santarém como cidade média e contextualizam sua a

importância no desenvolvimento sócio-espacial urbano regional.

Segundo Pereira (2004), em consonância com as categorias do espaço propostas por

Santos (1992), a importância regional de Santarém foi construída durante todo o

processo histórico de sua ocupação, de forma que, sempre foi sede política, religiosa e

militar no contexto regional. Sendo assim, Santarém desde 1828, quando já ocupava a

posição de maior centro urbano de sua região, já desempenhava a função de uma

espécie de entreposto dos estados do Pará e do Amazonas.

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111

Durante esse processo, Santarém teve fortalecida sua posição regional em diversos

momentos tais como, no momento da adesão do Pará à Independência do Brasil,

durante o movimento da Cabanagem e posteriormente, durante a ascendência e o

declínio do ciclo da borracha, da produção da juta e finalmente, através dos

investimentos governamentais na implantação de infra-estrutura e instalação de

grandes projetos e, ainda mais recentemente, pela implantação da cultura da soja.

O município de Santarém é atualmente o município mais populoso de sua meso-região

e o terceiro no estado, ficando atrás apenas de Belém e Ananindeua, ambos na

Região Metropolitana de Belém. O porte populacional e a representatividade da

arrecadação propiciada pela mineradora de Porto Trombetas e da produção dos

garimpos no rio Tapajós, entre outros fatores, deram fôlego para o surgimento de

debates e disputas políticas em torno da idéia da criação de uma nova unidade da

federação brasileira: o Estado do Tapajós, cuja capital seria Santarém.

As dificuldades, pelo menos em curto prazo, no que diz respeito ao alcance destas

idéias separatistas estão apresentadas nas divergências internas, na desconfiança

dos demais municípios formadores do novo estado com relação ao posicionamento de

Santarém, além da extrema centralização do movimento no referido município. Assim,

conforme apresentado por Pereira (2004, p. 88),

sede de instituições importantes, religiosas e militares, o município foi, ainda, palco político das ações pró-adesão do Pará à Independência do Brasil, anti-Cabanagem e anti-revolta de Jacareacanga e, mais recentemente, aparece como principal defensora e sede da futura capital do estado do Tapajós, caso a proposta venha se tornar realidade.

Outro fator citado por Pereira (2004), que garante a importância de Santarém no

contexto regional e também contribui para sua classificação como cidade média, é a

questão locacional.

Com a relativa distância das duas maiores aglomerações urbanas da região norte,

Manaus e Belém - a última distante mais de 690 km, aumentada pelas dificuldades de

acesso terrestre devido às condições de trafegabilidade das rodovias da região

(Transamazônica, BR-163 ou Santarém-Cuiabá e BR-316), o referido município tem

nos transportes fluvial e aéreo (aproximadamente uma hora de vôo das capitais) suas

melhores formas de acesso. Para o município de Santarém, os rios ainda constituem

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as principais vias de acesso às cidades menores, seja de sua mesorregião ou ainda

outras do oeste paraense.

Se por um lado, isso representa a preponderância de Santarém em relação ao conjunto das cidades do Baixo Amazonas, garantindo a esta o porte de cidade média, por outro lado, representa um entrave para a comunicação entre esta região e o conjunto do Estado, devido à precariedade das rodovias de acesso à região (PEREIRA, 2004, p. 118)

Santarém abriga em seu território áreas preservadas de floresta, cuja parte forma a

Reserva Extrativista Tapajós-Arapiuns, com mais de 647 mil hectares que abriga 3500

famílias que vivem de atividades extrativistas diversas. Além da citada RESEX,

Santarém já abrigou como parte de seu território a Floresta Nacional do Tapajós com

cerca de 600 mil hectares, que atualmente é parte do município de Belterra.

Entretanto, a proximidade destas Unidades de Conservação não implica na diminuição

do grande potencial econômico do município, especialmente no que tange o

escoamento da produção de soja da região, assim como também da produção de

grãos proveniente do Estado do Mato-Grosso, escoada pelo porto da multinacional

Cargil Agrícola S.A. instalado em Santarém, acessado através da BR-163, a Rodovia

Cuiabá-Santarém.

Assim, Santarém é entendida por Pereira (2004, p. 119) como “nova fronteira

econômica para ação do capital; como tal, geradora de novas realidades, palco de

novos conflitos por conta dos interesses envolvidos no processo”, de maneira que a

cultura da soja devido a sua exigência de grandes contingentes territoriais instala na

região a tendência de deslocamento de famílias rurais a partir da venda de suas

propriedades para grandes produtores, para as periferias urbanas de Santarém ou

outros municípios da mesorregião.

Segundo cita Pereira (2004), existem estudos que demonstram as grandes vantagens

locacionais do porto de Santarém para as exportações através do Oceano Atlântico,

possibilitando transporte a menores custos para mercados consumidores nos Estados

Unidos, na Ásia e na Europa.

Estudos realizados pelo governo federal, através do Ministério dos Transportes, dão conta que o porto de Santarém apresenta privilegiada situação geográfica, pela facilidade do escoamento da produção para os Estados Unidos e por apresentar significativas reduções de distâncias para a Ásia e Europa (PEREIRA, 2004, p. 91/92).

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Para possibilitar o desenvolvimento e utilização máxima do potencial do referido porto,

assim como da localização de Santarém, têm sido travados duros debates no

concernente ao asfaltamento da referida rodovia Cuiabá-Santarém. Embora este

asfaltamento constitua importante fator de integração regional e nacional, ele também

deve incentivar o avanço da fronteira agrícola na região, assim como aumentar

significativamente a pressão populacional, econômica e agrícola sobre as áreas de

floresta ainda preservadas, inclusive sobre as Unidades de Conservação existentes no

oeste paraense ao longo da rodovia, ocasionando conflitos entre movimentos

ambientalistas, ONG`s, interesses políticos e outros.

Dentre os argumentos contra o asfaltamento e a ocupação das referidas áreas para

uso agrícola podem ser citadas as características do solo amazônico para a produção

agrícola e o alto poder de devastação da cultura da soja nos locais onde sua

implantação pode ser observada, haja vista a definição de parte de seu território como

áreas de “altíssima importância” e “alta importância”, no que diz respeito à

conservação da biodiversidade, mas ao mesmo tempo pertencendo a uma área

considerada de alta potencialidade sócio-econômica (SECTAM, 2006).

Segundo o Macrozoneamento Ecológico-Econômico do Estado do Pará (Secretaria

Especial de Produção e SECTAM, 2006), o município de Santarém está dentro da

área de expansão e consolidação da fronteira de ocupação do estado, fazendo parte

dos eixos de desenvolvimento atribuídos à Transamazônica e ao Tapajós. Ainda

segundo o mesmo documento, com relação aos subsídios à gestão territorial, o

município conta com zonas de uso sustentável e zonas de consolidação e expansão

de atividades produtivas, devendo-se incluir também o destacado potencial madeireiro

(PEREIRA, 2004).

O referido município também assume papel de destaque na região quando se trata da

sua capacidade na oferta de bens e serviços segundo suas necessidades internas,

bem como, dos demais municípios menores de seu entorno. Dentre estes serviços,

conforme demonstra Pereira (2004), pode-se citar a existência de: Instituições de nível

superior, cinema, estação de rádio FM, geradora de TV, teatros ou salas de

espetáculos, provedor de Internet, aeroporto, agências bancárias, clínicas

especializadas ou serviços especializados, entre outros.

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No que diz respeito ao atendimento em saúde, Pereira (2004) relata que os demais

municípios da Mesorregião do Baixo Amazonas são dependentes da rede existente

em Santarém, exercendo forte pressão sobre aqueles equipamentos e serviços no

referido município.

Já sobre o saneamento básico, o mesmo autor lembra que Santarém (20%) ocupa a

terceira posição na mesorregião quanto a existência de saneamento adequado, atrás

de Almerim (45%) e de Oriximiná (21,8%). Em contraposição, Santarém é o município

da mesorregião com menor percentual de construções com saneamento inadequado

(28,5%), seguido por Almerim (29,9%) e Oriximiná (33,5%).

A sobrecarga da infra-estrutura instalada e dos serviços públicos ofertados é ainda

agravada pelos altos níveis da migração (36%), do qual o município de Santarém é o

maior retentor na mesorregião em que se localiza, agravando ainda as condições de

falta de empregos e baixa remuneração no local, sendo que o maior número de vagas

ofertadas está no setor de comércio e serviços (PEREIRA, 2004).

Desta forma, Santarém assume localização privilegiada na região, seja do ponto de

vista da disponibilidade de bens e serviços, da infra-estrutura instalada, seja da

disponibilidade de recursos naturais, ou ainda da maior facilidade de acesso a grandes

mercados internacionais e da perspectiva de aporte de recursos público e privados

investidos na melhoria da infra-estrutura local, destacando-o dos demais municípios

próximos. Entretanto, conforme lembra Pereira (2004, p.98), é preciso que Santarém

determine “regras claras de exploração dos recursos naturais e de preservação”, sob

pena do desmantelamento dos sistemas de produção tradicional, da destruição da

biodiversidade local, da perda da atratividade turística, da intensa favelização das

periferias, entre outros, de maneira que

a ausência de um ordenamento territorial e a omissão do poder de polícia do Estado podem trazer conseqüências graves, em curto e médio prazo ao Município, podendo, inclusive, vir a se repetir situações semelhantes às que ocorreram na Transamazônica e no Sudeste do Pará.

A Vila de Alter do Chão está inserida neste panorama, beneficiando-se da infra-

estrutura, dos serviços e das vantagens locacionais ofertadas pela sede do município

de Santarém para o seu crescente desenvolvimento turístico, de maneira que, Alter do

Chão atua como captador e distribuidor do fluxo de turistas que chegam à região

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amazônica principalmente através de Manaus ou de Belém, para os demais

municípios da mesorregião, ou ainda para as unidades de conservação e

comunidades tradicionais existentes em seu entorno.

6.4 Aspectos Sócio-Econômicos e Infra-estrutura da Vila de Alter do Chão

(Santarém-PA)

Para a análise do destino, ou ainda, para a compreensão do sistema, serão

observados todos os elementos que o compõem, segundo sugere o modelo de Anjos

(2004, p.164), anteriormente apresentado na Figura 02. No referido modelo, são

incluídos os fixos naturais e construídos e os fluxos econômicos e sócio-culturais,

ambos permeados tanto por turistas como por residente, dentro de uma perspectiva

sistêmica visando à compreensão de fenômenos e realidades complexas,

especialmente quando o objeto de estudo em questão relaciona estruturas e

atividades sociais (ANJOS, 2004). Estes elementos referenciados para a compreensão

do sistema, segundo propõe Anjos (2004), serão analisados no âmbito da Vila de Alter

do Chão.

6.4.1 Análise dos aspectos sócio-econômicos da população residente

Para a análise dos dados de Alter do Chão, acredita-se importante destacar também

alguns outros dados municipais, não disponíveis na escala dos distritos e vilas, haja

vista a forte influência da sede do município na Vila de Alter do Chão, além da

dependência da última pela primeira.

Entre os dados relacionados, cita-se a evolução do PIB do município de Santarém no

período de 1999 à 2002, segundo o IBGE (ver Tabela 01).

1999 2000 2001 2002 Município

Preço de mercado corrente (R$1.000)

Per capita

(R$)

Preço de mercado corrente (R$1.000)

Per capita

(R$)

Preço de mercado corrente (R$1.000)

Per capita

(R$)

Preço de mercado corrente (R$1.000)

Per capita

(R$)

Santarém 409.904 1.565 431.809 1.636 524.213 1.9771 645.114 2.406

TABELA 01: PIB Santarém de 1999 à 2002.

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116

Fonte: adaptado pela autora a partir dos dados do IBGE – Produto Interno Bruto à preço de mercado e Produto Interno Bruto per capita segundo as grandes regiões, unidades da federação e municípios: 1999-2002).

Com relação ao IDH médio do município de Santarém, é importante citar seu

crescimento, segundo divulgado pela SESPA e apresentado na Tabela 02.

IDH Médio em 1991 IDH Médio em 2000 Santarém

0,66 0,75

TABELA 02: Evolução do IDH de Santarém. Fonte: adaptado pela autora a partir dos dados disponibilizados pela SESPA em: <http://www.sespa.pa.gov.br/ >, acessado em: 31 de fevereiro de 2006.

Desta forma, o crescimento e desenvolvimento econômico de Santarém, através das

melhores condições de pelo menos parte de sua população, acabam por determinar

uma maior disponibilidade de recursos para o lazer e o turismo de segundas-

residências, que têm em Alter do Chão seu destino preferido. Por sua vez, a vila

possui uma economia basicamente dependente do turismo em diversas modalidades

entre as quais o turismo de fim de semana, o de férias, os grandes cruzeiros

internacionais, além das festas populares (ALBERNAZ et al, 1999).

Além da renda e trabalho direto gerado pela atividade turística para 26% dos

residentes de Alter do Chão que desempenham funções diversas como barraqueiros,

cozinheiros, garçons, catraieiros, artesãos, vendedores, dançarinos, camareiras,

comerciantes locais, entre outros (SEBRAE, 2003), também é gerada renda para a

sede de Santarém, enquanto fornecedoras de mercadorias e alguns serviços como

ônibus urbano e as agências de turismo e as que intermedeiam a vinda dos navios.

Além do turismo enquanto atividade econômica, Albernaz (2001) também identifica

atividades como a pesca e a agricultura de subsistência presentes na comunidade de

Alter do Chão. Dentre as lavouras identificadas a principal é a mandioca, que pode

tanto aparecer sozinha quanto combinada com arroz, milho, abóbora, ou ainda pasto

ou pomar. As propriedades identificadas foram na maioria de tamanho pequeno

(menor que 100 ha) e apenas 8 em tamanho médio. Assim o modelo agropecuário em

Alter do Chão, baseado em modelo tradicional, com propriedades de pequeno porte e

produção com ênfase na subsistência, caracteriza-a como de baixa pressão territorial

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sobre os recursos naturais. Mais uma vez, é enfatizada a importância turística da Vila

de Alter do Chão quando admite que esta citada pressão territorial seja maior pela

inserção da atividade turística, uma vez que

enquanto as áreas mais favoráveis para atividades agropecuárias ocorrem predominantemente no interior, o turismo desenvolve-se principalmente nas comunidades às margens dos rios (ALBERNAZ 2001, p. 80).

A população de Alter do Chão é composta basicamente de descendentes indígenas,

segundo afirmam Albernaz et al (1999), que também enfatizam a importância do

turismo na alteração recente da composição de sua população, tendo muitos

estrangeiros – tanto de outras regiões do país, assim como de outros países – se

estabelecido nos últimos 25 anos sem, no entanto ser significativo no universo da

população.

Segundo dados IBGE referentes ao último censo, a Vila de Alter do Chão abrigava no

ano de 2000, 2905 habitantes, distribuídos em 1.096 domicílios, conforme apresentado

na Tabela 03.

Homens residentes

Mulheres residentes

Total de Residentes

Total de domicílios

(incluindo também segundas-residências)

1.508 1.397 2.905 1.096

TABELA 03: Dados de residente e domicílios de Santarém no censo de 2000. Fonte: adaptado pela autora a partir dos dados do censo do IBGE, do ano 2000.

Nos dados levantados pelo Sebrae (2003), é identificada a chefia das famílias que tem

nas mulheres residentes na Vila, uma pequena maioria em relação às famílias

chefiadas por homens – 53% mulheres e 47% homens. Ainda sobre esses chefes de

família, a maioria (51%) tem entre 26 e 45 anos, 25% têm mais de 55 anos, 15% entre

46 e 55 anos e apenas 9% com faixa etária entre 18 e 25 anos.

Na formação destas famílias, a média do número de pessoas é de 4,93, dentre os

quais, 28% destes geram renda e 12% recebem assistência de programas sociais do

Governo Federal. Excetuando-se os chefes de família, os demais membros das

famílias segundo suas faixas etárias são apresentadas na Tabela 04.

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0-12 anos 13-18 anos

19-30 anos

31-50 anos

51-60 anos

mais de 60 anos

Membros das famílias

29%

16%

23%

20%

6%

6%

TABELA 04: Idade dos membros das famílias de Alter do Chão. Fonte: adaptado pela autora a partir dos dados disponíveis em Sebrae (2003).

A partir desses dados é possível observar a tendência de uma população jovem, com

prováveis altos índices de natalidade e pequena expectativa de vida, tomando como

referência os percentuais relativos às faixas extremas, nas quais observa-se que

quase um terço da população possui 12 anos ou menos e apenas 6% possui 60 anos

ou mais.

Esse perfil jovem, aliado ainda à baixa escolaridade – mesmo que observando o

pequeno número de analfabetos citado por ALBERNAZ et al (1999) e confirmado nos

dados do Sebrae (2003) que indica 5% de analfabetos – e à conseqüente ocupação

com atividades pouco especializadas e valorizadas, acabam por determinar baixo

rendimento destas famílias (ver Tabela 05).

FOTO 03: Crianças participando das celebrações tradicionais da Vila: Sairé mirim Fonte Celivaldo Carneiro, 2003.

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Nível fundamental Nível médio Nível superior Analfabetos

incompleto completo incompleto completo incompleto completo

Pós-graduação

5% 52% 8% 13% 17% 2,5% 2% 0,5%

TABELA 05: Escolaridade dos residentes de Alter do Chão. Fonte: adaptado pela autora a partir dos dados disponíveis em Sebrae (2003).

Quanto às atividades desempenhadas pelos chefes de família, quase metade (45%)

desempenham atividades como zelador/caseiro, catraieiros, ajudante na construção

civil, serviços de limpeza de terrenos, caracterizadas por serviços sempre temporários

(Tabela 06).

Serviços esporádicos

autônomos Aposentados/ pensionistas

Servidores públicos

agricultores artesãos empresários

45% 21% 19% 6% 4% 3% 2%

TABELA 06: Ocupação dos residentes de Alter do Chão. Fonte: adaptado pela autora a partir dos dados disponíveis em Sebrae (2003).

As faixas de renda pelas quais a estão a população se distribui, são apresentados na

Tabela 07.

Renda Até 1 salário mínimo

De 1-3 salários mínimos

4-6 salários mínimos

7-10 salários mínimos

Mais de 10 salários mínimos

% da pop 19% 69% 9% 2% 1%

TABELA 07: Renda dos residentes de Alter do Chão. Fonte: adaptado pela autora a partir dos dados disponíveis em Sebrae (2003).

Com relação ao transporte, a maioria da população utiliza a bicicleta no transporte

dentro da Vila (cerca de 72%) e a linha de ônibus urbano (88%) para deslocamentos

maiores, como por exemplo, até a sede do município de Santarém, principal sede de

serviços e fornecedor de mercadorias da Vila. Afirmaram possuir carro próprio 7% dos

entrevistados pelo Sebrae (2003), 3% moto ou bicicleta, além de 2% que citaram

outros tipos de transporte.

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Quanto ao transporte, também é importante observar que, segundo a opinião de

62,5% dos entrevistados, deveria haver um aumento na disponibilidade de ônibus para

a Vila, além da ampliação dos horários de funcionamento do mesmo.

Mesmo com o crescente interesse de pessoas provenientes de outras localidades em

fixar residência em Alter do Chão, percebe-se que muitos utilizam os imóveis na vila

como casas de veraneio, haja vista o grande percentual de residentes entrevistados

que moram na Vila há 13 anos ou mais, dos quais 34% afirmam morar a mais de 30

anos na Vila, caracterizando as suas famílias tradicionais (ver Tabela 08).

Tempo de residência

Menos de 1 ano

De 1-5 anos

De 6-12 anos

De 13-20 anos

De 21-30 anos

Mais de 30 anos

População 10% 19% 21% 5% 11% 34%

TABELA 08: Tempo de residência em Alter do Chão. Fonte: adaptado pela autora a partir dos dados disponíveis em Sebrae (2003).

Ao mesmo tempo, é possível perceber uma tendência recente, na última década –

coincidindo com o período de asfaltamento da estrada (1994), da inclusão de novos

residentes no referido distrito.

Com relação à regularização dos lotes, o Sebrae (2003) levantou que quase metade

dos lotes (47%) possui título definitivo e 19% possuem recibos de compra e venda.

Seria importante observar em futuros levantamentos um cruzamento de informações,

nas quais possa ser observada a relação entre o tempo de residência e as

características de regularização dos respectivos lotes, o que pode fornecer

informações importantes quanto à existência de uma tendência de fixação ou de

deslocamento das famílias tradicionais da Vila de Alter do Chão. Dados à respeito da

titularidade dos lotes, são apresentados na Tabela 09.

Situação do lote

Título definitivo

Recibo compra-venda

Alugadas Cedidas por

amigos ou familiares

Sem documentação

Invasões

% 47% 19% 6% 11% 16% 0,5%

TABELA 09: Situação dos lotes Fonte: adaptado pela autora a partir dos dados disponíveis em Sebrae (2003).

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Existem cerca de 430 imóveis residenciais na vila, sendo que metade dos quais

pertencem a veranistas. Dos imóveis pesquisados pelo Sebrae (2003) em Alter do

Chão, 92% atendem somente à função de residência unifamiliar e os 8% restantes

atendem simultaneamente a funções residenciais e comerciais, seja com a disposição

do comércio no piso térreo e a residência no piso superior, seja com o

estabelecimento comercial à frente e residência em área contígua, aos fundos ou ao

lado.

Estas moradias, no que tange sua tipologia construtiva e materiais, têm sido

substituídas em suas características tradicionais, exemplificadas nas casas de

barro/taipa (no momento da pesquisa apenas 1%) e palha (também apenas 1%), por

construções em alvenaria que constituem metade dos imóveis visitados. Ainda existem

30% de construções mistas (madeira e alvenaria), que parecem estar em

transitoriedade, aguardando a possibilidade da conversão do próximo cômodo de

madeira em alvenaria; e ainda 18% totalmente construídas em madeira.

Sobre esta alteração nas construções, Albernaz (2001) relaciona o fenômeno da

substituição das casas de taipa e das formas de produção, à construção e

asfaltamento da Rodovia Everaldo Martins (PA-457), citando que anteriormente “a

maioria das famílias tinha suas próprias plantações de mandioca, para fazer sua

farinha e derivados” (p. 87).

Outra característica importante de relacionar no que diz respeito aos aspectos sócio-

culturais dos residentes na Vila de Alter do Chão, é a intensa organização social

indicada nas associações, conselhos e sindicatos, além de uma forte presença

institucional marcada por organizações governamentais e não-governamentais. Foram

levantadas pelo Sebrae (2003) treze associações e entidades de classe, dentre as

quais pode-se citar o conselho comunitário, dois clubes esportivos, a associação dos

catraieiros, o clube de mães, o conselho nacional dos seringueiros, a associação de

barraqueiros, entre outros. Também verifica-se na vila a presença de ONG`s e outras

instituições, seja em sede ou em programas desenvolvidos, tais como o INPA, o

CNS/PNUD, Saúde&Alegria, Sebrae, Ibama.

Apesar desses números, Albernaz (2001) afirma que

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122

a presença do poder institucionalizado está crescendo, enquanto a organização comunitária está enfraquecendo. (...) Muitas vezes este papel de fortalecimento comunitário e político é desempenhado pelas ONG`s (p.99).

Dados estes que confirmam a proposição de Ohmae (1999), que entende que nos

locais ou setores nos quais o poder público não se faz presente, são

institucionalizadas outras formas de poder e territorialização exercidas, seja pela

população local, seja instituições e/ou ONG`s, para o preenchimento das lacunas

existentes.

O lazer da população mantém fortes relações com o rio nas praias fluviais, além as

festas da comunidade. Também é possível observar a intensa apropriação da rua e da

praça matriz especialmente pelas crianças. Com alguma freqüência são realizadas

festas, shows, apresentações folclóricas no barracão comunitário e na quadra do

Sairé, além das atividades lúdico-recreativas – como cinema e números circenses -

voltadas especialmente às crianças, realizadas por ONG`s e pela escolhinha do

Cajueiro na praça central. Dentre os entrevistados pelo Sebrae (2003), praticamente

65% manifestou desejo de ver implantado mais áreas, assim como incentivo às

práticas esportivas, devendo ainda ser mantidas os parques e áreas verdes, segundo

aproximadamente 60% dos abordados pela pesquisa.

6.4.2 Infra-estrutura básica

Relacionados à infra-estrutura básica estão os problemas mais significativos da Vila de

Alter do Chão, isso porque além de afetar diretamente as condições de vida dos

residentes na localidade, também dificultam a implantação de infra-estrutura e

equipamentos turísticos, prejudicando o pleno desenvolvimento da sua principal

atividade econômica contemporaneamente. Além disso, esses problemas, caso não

sejam tratados com a devida importância e atenção, podem culminar na perda da

atratividade do destino, fortemente relacionada às praias, que podem atingir níveis

insalubres.

Isso se deve aos péssimos níveis de coleta e tratamento de esgoto no destino, não

havendo rede pública que desempenhe estas funções. Assim, das propriedades

visitadas pelos Sebrae (2003), 66% afirmou utilizar fossas sépticas, 23% utilizam

fossas rudimentares, 7% utilizam valas especificamente escavadas com esta função,

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além de outros 4% que são despejados a céu aberto. Neste casso, a única

modalidade que ofereceria algum nível de filtragem e tratamento seriam as fossas

sépticas, no entanto foi identificado por Ferreira (2004) que algumas destas fossas

foram construídas de maneira inapropriada, sem a necessária vedação ao fundo,

perdendo assim a sua capacidade de atuação, infiltrando os efluentes diretamente no

solo.

Esse quadro seria menos preocupante se não fosse levado em consideração os dados

do abastecimento de água. Neste caso, apenas pouco mais da metade dos domicílios

(55%) era atendido pela rede pública de tratamento e distribuição de água, dos quais

43% dos entrevistados utilizam água proveniente de poços artesianos e 2% de poços

rústicos.

A análise em conjunto dos dois últimos dados apresentados, sugere um crítico

problema de contaminação das águas para consumo identificado por Ferreira (2004),

sem que até o momento a contaminação atinja níveis críticos no que diz respeito à

balneabilidade das praias.

Entretanto, no sentido de encontrar uma solução eficaz e exeqüível, do ponto de vista

da restrição de recursos para a implantação de um sistema tradicional de coleta e

tratamento de esgoto para toda a área em questão, o Sebrae, através de seus

técnicos e pesquisadores, viabilizou o desenvolvimento de um modelo de uma unidade

de tratamento biológico de efluentes, utilizando a tecnologia de zona de raízes,

desenvolvida na Alemanha, já adaptada para uso no Brasil, em Santa Catarina, agora

também adaptada à realidade paraense por Ferreira (2004). Este módulo adapta-se às

condições climáticas e de zona de marés que caracterizam toda a área em questão,

utilizando mecanismos simples quanto ao seu dimensionamento, implantação e

custos. Esta parece ser a solução mais viável em curto período de tempo, exigindo

muito mais em treinamento da mão-de-obra da construção civil local para a sua

adequada execução e a educação/esclarecimento da população quanto aos benefícios

de sua implantação, que propriamente da alocação de quantias vultosas de recursos

financeiros.

A ausência de banheiros públicos, citada como problema para mais de 75% dos

entrevistados, também deve ser solucionada com a adequação deste sistema de

tratamento, permitindo a sua construção mais próxima às áreas de forte concentração

de turistas pelo poder público e sendo concedida a sua guarda e manutenção ao

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conselho comunitário ou a outra associação representativa dos residentes na Vila,

especialmente aquelas que relacionam interesses no desenvolvimento da atividade

turística.

No que concerne ao lixo, os problemas iniciam-se na coleta, uma vez que esta é

realizada apenas três vezes na semana e ainda que, caso o volume de lixo ultrapasse

a capacidade do caminhão enviado, o lixo sobressalente permanece no local, ou seja,

não é coletado. Nas principais vias e áreas de maior fluxo e interesse turístico foram

implantadas lixeiras implantadas pela prefeitura e por instituições não-governamentais

em parceria com a comunidade.

Quanto à destinação do lixo produzido nos domicílios e demais estabelecimentos, a

grande maioria dos residentes entrevistados (71%) afirmou que é atendido pela coleta

urbana que é direcionada ao aterro sanitário de Santarém. Outros destinos para o lixo

identificados pelo levantamento do Sebrae (2003) são queima, enterra, ou despejo a

céu aberto (ver Tabela 10).

Destino do lixo Coleta pública Queima Enterra Deposita à céu

aberto

% 74% 26% 2% 1%

TABELA 10: Forma de coleta e destino do lixo. Fonte: adaptado pela autora a partir dos dados disponíveis em Sebrae (2003).

No que diz respeito à pavimentação das vias pública de transporte, no momento da

pesquisa realizada pelo Sebrae, haviam apenas 21% de vias com pavimentação

asfáltica (ver Tabela 11).

Tipo de cobertura Nenhuma

pavimentação

Pavimentação em

piçarra/saibro

Pavimentação em

concreto asfáltico

% 52% 27% 21%

TABELA 11: Tipo de pavimentação das vias. Fonte: adaptado pela autora a partir dos dados disponíveis em Sebrae (2003).

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Pode-se perceber que o predomínio das vias asfaltadas se dá em áreas de maior

interesse turístico, ou ainda na rota do serviço de transporte coletivo, provavelmente

por pressão da empresa concessionária de transporte e dos demais interessados nas

áreas turísticas e/ou valorização dos lotes com amenidades.

No caso da rede de distribuição da energia elétrica, bem como da iluminação pública,

a Vila tem a disponibilidade deste serviço deste a década de 80, sendo que, naquele

período toda a região inclusive a sede de Santarém sofriam sérios problemas de

abastecimento e racionamento, problema este solucionado a partir da implantação da

linha de transmissão chamada Tramoeste, que passou a abastecer toda a área com a

energia produzida em Tucuruí no ano de 1999. Assim, em Alter do Chão, 99% dos

residentes são atendidos pelo serviço de distribuição de energia elétrica da Rede

Celpa e apenas 1% da população não conta com esse serviço. Este serviço, no

entanto, ainda não satisfaz aos entrevistados (quase 52%) que indicaram a

necessidade da ampliação do fornecimento de energia elétrica, bem como de sua

qualidade, além da iluminação pública.

O sistema de comunicações disponível na Vila inclui os serviços da Agência de

Correios e Telégrafos, que possui um posto de atendimento atualmente vinculado a

uma das pousadas, além dos serviços de telefonia fixa e móvel. Na ocasião da

execução da pesquisa realizada por Albernaz et al (1999), haviam 7 telefones públicos

distribuídos na vila, além disso tem se disseminado a utilização da telefonia móvel,

assim como de linha de telefone fixo particular. Os entrevistados na pesquisa do

Sebrae (2003) indicaram a necessidade da ampliação e melhoria também nos serviços

de telecomunicações (quase 73%).

Quanto aos equipamentos de saúde pública, como médico-hospitalar e farmacêutico,

a vila conta apenas com o posto de saúde que funciona diariamente das 8h às 17h

prestando atendimento de emergência e assistência ambulatorial básica. No momento

da realização do levantamento de dados de ambas as pesquisas (ALBERNAZ et al,

1999 e SEBRAE, 2003), não havia farmácias na vila, serviço citado como importante

segundo mais de 80% dos entrevistados (SEBRAE, 2003).

Naquela ocasião também era deficiente o serviço de salva-vidas na vila, que só era

disponibilizado nas praias de Alter do Chão em feriados, festas e dias de maior

movimento, entretanto, atualmente há um posto do Corpo de Bombeiros

permanentemente instalado, posto esse capaz de suprir essa demanda por serviço de

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salvamento, citado como deficiência da vila por quase metade dos entrevistados

(48%).

A comunidade conta com duas escolas de nível fundamental mantidas pela prefeitura,

que abrigam um total de 634 alunos.

Com relação à segurança, a Vila de Alter do Chão conta com uma delegacia e apenas

uma viatura. Nos fins de semana mais movimentados, nas férias e nas festas esse

policiamento é reforçado com contingente deslocado da sede de Santarém. Nos dados

fornecidos pelo Sebrae (2003) há alguma contradição nos dados levantados a este

respeito, já que 57% dos entrevistados se dizem satisfeitos com a segurança, mas

posteriormente 59% citam a necessidade da implantação de serviços de vigilância,

não esclarecendo no referido documento se há alguma distinção na proposta entre as

duas ou qualquer outra consideração a respeito da interpretação destes dados. Talvez

pela tranqüilidade e bucolismo da vila que trás em si uma atmosfera de segurança, a

comunidade não vê riscos - já que a maioria dos residentes se conhece - mesmo que

a delegacia disponha de tão poucos recursos, inclusive para a realização de rondas,

pela falta de combustível para a viatura, muitas vezes é abastecida em cotas pelos

comerciantes locais, a fim de possibilitar a sua realização constante.

Com o objetivo de melhor atentar apara as necessidades desta comunidade, assim

como de melhor atende-la há uma sub-prefeitura instalada na Vila de Alter do Chão,

entretanto, no momento do levantamento de dados feitos pelo Sebrae (2003), essa

sub-prefeitura foi citada pela população como inoperante, talvez pela falta de recursos

ou ainda pela falta de autonomia para a solução de problemas estruturais como, por

exemplo, a coleta de lixo.

6.4.3 Infra-estrutura turística e perfil do turista

Tendo Alter do Chão enquanto destinação turística, faz-se imprescindível analisar

aspectos pertinentes à infra-estrutura especificamente implantada para o turista,

enquanto equipamentos turísticos, bem como, também ter em foco os principais

atrativos e o perfil do turista atualmente atraído para o local.

Dentre a infra-estrutura turística existente pode-se citar a existência de hotéis,

pousadas, restaurantes e outras construções que abrigam serviços de alimentos e

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bebidas, agências de receptivo turístico, além do CAT Alter do Chão – Centro de

Atendimento ao Turismo, equipado com trapiche.

No total levantado pelo Sebrae (2003) são onze estabelecimentos de hospedagem

que, naquela ocasião, ofereciam 226 leitos. No entanto, é necessário observar que

poucos destes meios de hospedagem estão adequados às exigências das legislações

em vigor, ou mesmo que possuem nível de conforto adequado, mesmo levando em

consideração que sejam de categoria econômica, com características rústicas.

Os leitos existentes são muito procurados por mochilleiros de diversos países, para os

quais o mais importante é viabilizar financeiramente uma maior permanência no

destino, ou mesmo a utilização prioritária do recurso em passeios e expedições. Outro

público atendido é o veranista de fim de semana, oriundo de Santarém ou de cidades

vizinhas, que normalmente viaja com a família em busca de lazer e procura baixos

custos.

Em verdade, poucos hotéis e pousadas conseguiram desmistificar o conceito de

rusticidade, aliando-o a princípios de conforto e higiene. Por ocasião da realização da

referida pesquisa, havia dois novos pequenos hotéis em construção, entretanto os

mesmos não foram capazes de se diferenciar no que tange o atendimento de uma

nova porção do mercado.

No que tange os serviços de restauração, ou seja, o setor de alimentos e bebidas

(A&B), na vila de Alter do Chão foram identificados um total de 26 estabelecimentos no

momento do levantamento realizado pelo Sebrae (2003). Dentre estes, pode-se citar

quatro restaurantes, três lanchonetes e/ou bares, além de dezoito barracas que

fornecem estes serviços nas praias. Destas barracas, distribuídas entre as praias do

Cajueiro e da Ilha do Amor, metade mantém seu funcionamento durante todo o ano,

sendo que os demais funcionam segundo os períodos de cheia/seca do rio, com a

formação das praias – entre março e agosto funcionam as barracas da praia do

Cajueiro e entre setembro e fevereiro, as barracas da Ilha.

Nestes estabelecimentos são disponibilizados pratos à base de carne bovina, frango e,

principalmente, peixes - em especial, espécies como tucunaré, pirarucu e tambaqui,

todos de águas doces, além de sobremesas, sucos e sorvetes de frutas regionais, tais

como cupuaçu, taperebá, murici, graviola, caju, entre outros.

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No caso das agências de turismo receptivo, foram identificadas naquela ocasião,

quatro agências que oferecem serviços de guias, transporte na vila e passeios nos

atrativos situados no entorno da Vila de Alter do Chão. Curiosamente, a maior parte

destas agências (3 das 4) são iniciativas de empresários de outros países que

visitaram a localidade q acabaram fixando residência ou ainda que moraram muitos

anos fora do país (um italiano, um argentino e um descendente de japoneses), apenas

um dos empresários é oriundo da região, mais especificamente da cidade de

Santarém.

6.4.4 Atrativos Naturais ou Atrativos da Paisagem

Loureiro & Loureiro (1987), citam a Vila de Alter do Chão e suas praias, bem como

suas principais festas, seus traços sócio-culturais entre os mais importantes atrativos

turísticos de Santarém.

No caso específico de Alter do Chão, dentre seus atrativos, os mais explorados

comercialmente no que diz respeito à sua utilização enquanto produtos turísticos são

os atrativos naturais, especialmente as praias de Alter do Chão e as áreas de florestas

no entorno.

A “Ilha” do Amor e as praias por ela formadas elementos marcam profundamente a

paisagem, a partir da ocupação humana existente na Vila de Alter do Chão, sendo

considerada paisagem-signo da localidade. Esta “ilha” é na realidade um banco de

areia com alguma vegetação que separa a enseada de Alter do Chão formada pelas

águas do Tapajós, do Lago Verde ou Lago dos Muiraquitãs, já citados anteriormente

quando da análise das características naturais da localidade. Estas praias têm sua

apropriação turística determinada pelos períodos de cheia e seca do Tapajós, apesar

de haverem locais de praias perenes ao longo da referida “ilha”. A grande variação do

nível d`água (cerca de 10m de altura) determina a submersão de parte das praias,

vegetação e barracas durante boa parte do ano, normalmente entre os meses de

março e agosto.

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Outra praia bastante apreciada dentro da Vila de

Alter do Chão é a praia do Cajueiro, mais

intensamente visitada e utilizada durantes os

meses de submersão de partes das praias da Ilha

e praticamente abandonada no período da seca,

dada a alteração do piso em areia fina e branca

das áreas de banho por outra mais

argilosa/lamacenta no referido período.

Dentro da área de Alter do Chão ainda existe a

possibilidade do percurso de trilhas até o alto da

Serra Piroca, de onde se avista toda a ocupação

urbana da Vila, além de toda a paisagem do

FOTO 06: Vista aérea da praia Ilha do Amor Fonte: Jorge Bassi, 2003.

FOTO 04: Vista da Ilha do Amor, a partir da praça central Fonte: A autora, 2003.

FOTO 05: Vista lateral da Ilha do Amor, a partir de uma das vias da comunidade Fonte: A autora, 2004.

FOTO 07: Área de mesas em frente à praia e à comunidade de Ponta de Pedras Fonte: A autora, 2003.

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entorno incluindo a Ponta do Cururu. Na Ponta do Cururu, atualmente pertencente à

ACM-YMCA (Associação Cristã de Moços ou “Young Man Catolic Association”) no

Brasil, também existem trilhas nas quais é possível observar savanas e fragmentos

florestais, além da fauna rica em aves, répteis, e alguns mamíferos como preguiças.

Ainda neste local, durante o período de seca do Rio Tapajós, surge uma “língua” de

areias brancas que aponta em direção à outra margem do Tapajós (Foto 01), com

cerca de 2km de extensão, em local de água muito limpa, clara e calma, propícia para

banho.

Além da ilha e sua praias, o Lago Verde e seus dois igarapés formadores – Igarapé do

Macaco e Igarapé do Cuicuera - são também grandes atrativos, nos quais é possível

observar a presença de aves aquáticas, de peixes ornamentais em suas águas

límpidas, além das possibilidades de passeios de canoa através de trilhas dentro das

florestas de igapó, ou seja, a floresta inundada. Outros lagos existentes nas

proximidades da Vila são o Miritiapina (com 5,1 ha), o Piracuri (0,2 ha), Carauari (1,1

ha), Piranha (12,5 ha), Jacaré (2,3 ha), Tapari (39,4 ha) e Preto (4 ha) interligados,

Jacundá (2,3 ha), Mureta (4,4 ha) e o Jurucuí (16,6 ha) (ALBERNAZ et al, 2003, p.8).

A partir da cabeceira do Igarapé do Macaco é possível iniciar uma trilha por entre

áreas de savana, bosques, campinaranas e ao lado de um buritizal até a comunidade

de Ponta de Pedras. Nesta comunidade também poderão ser encontradas serviços de

alimentação na praia da comunidade aberta diretamente para o rio Tapajós, também

bastante apreciada pelos turistas. Esta comunidade dista de Alter do Chão por via

terrestre cerca de 30 km, sendo que parte do percurso é feito em estrada sem

pavimentação.

A organização da Comunidade de Ponta

de Pedras, associada à contribuição de

um empresário local e do intenso

investimento em capacitação de infra-

estrutura e de mão-de-obra, torna a

localidade ainda mais especial, sendo a

primeira a dispor de banheiros públicos

especialmente construídos para o

atendimento ao turista, além do resgate da

FOTO 08: Encontro das águas Fonte: A autora, 2003.

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cultura local pela tipologia construtiva de uma grande maloca comunitária (cerca de

20m de diâmetro) construída em madeira e palha pela própria comunidade.

Em frente à comunidade de Ponta de Pedras, situado na margem oposta do rio

Tapajós, distante cerca de duas horas de travessia em barco regional, está localizado

o Canal do Jarí, local propício para a observação de fauna, especialmente pássaros,

botos e jacarés.

Em frente à sede do Município de Santarém ocorre o fenômeno do encontro das

águas, onde a foz do Rio Tapajós força a mistura que não acontece de suas águas

claras com as águas barrentas do Rio Amazonas.

Apesar de estarem situados um pouco mais distantes, é importante citar outros

atrativos, uma vez que Alter do Chão, além de destinação turística, também

desempenha um importante papel de entreposto e re-distribuição do fluxo de turistas

para outras áreas e outros municípios que integram o Pólo Tapajós: Belterra e

Fordlândia, em Aveiro (cidades americanas implantadas por Henri Ford para produção

de borracha), Oriximiná com o melhor índice de piscosidade da região (procura se

especializar em pesca esportiva) e comunidades quilombolas, Monte Alegre com a

Cidade dos Deuses e as pinturas rupestres, Alenquer com suas cachoeiras, Óbidos

com um dos mais ricos patrimônios histórico-arquitetônicos da região, além de Itaituba

com suas águas sulfurosas, cavernas, campo dos perdidos e garimpos, além do

Parque Nacional da Amazônia (Unidade de Conservação com 864.047 ha).

Além dos municípios, Alter do Chão está imediatamente vizinha à duas unidades de

conservação: a Floresta Nacional do Tapajós (com aproximadamente 600.000ha) e a

Reserva Extrativista Tapajós – Arapiuns (com aproximadamente 647.610,74ha). A

existência destas UC`s abre novas possibilidades ainda no que tange à conversão da

destinação a um perfil fortemente eco-turístico.

6.4.5 Atrativos Culturais

No destino turístico de Alter do Chão, além dos atrativos da paisagem natural, também

são marcantes suas características culturais expressas, estejam elas presentes na

paisagem urbana, na forma da ocupação urbana ao longo dos rios, na tipologia das

construções históricas e/ou tradicionais que vem aos poucos se perdendo, seja na

confecção de produtos artesanais, comidas e festas. Estes aspectos culturais aliados

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às características naturais fazem desta área um local diferenciado, onde está presente

o modo de vida dos “povos da floresta”, incluindo seus hábitos, sua música, comida e

atividades rotineiras.

Entretanto falta a infra-estrutura necessária para dar suporte e valorização a estes

aspectos. Até meados da década de 90, havia na Vila uma infra-estrutura que

abrigava cerca de 1700 peças de mais de 70 grupos indígenas, então conhecida como

Museu do Índio. As peças eram acompanhadas de textos explicativos com dados

sobre sua confecção, origem, utilização e etnia indígena em quatro idiomas

(português, francês, alemão e inglês), atraindo um grande número de turistas e

visitantes que também podiam adquirir réplicas das peças expostas. De propriedade

particular, o referido Centro de Preservação da Arte e Cultura Indígena fechou as

portas com o falecimento de seu proprietário, que foi seguida de processos de disputa

de herança que perduram até a atualidade.

Outra construção importante na Vila de Alter do Chão, é a singela igreja matriz, que

tem sua construção datada do século XVIII, provavelmente do mesmo período da

instalação da missão jesuítica na aldeia Borari, mesmo local onde atualmente situa-se

o centro da ocupação da Vila.

Dentre as festas populares, as mais importantes são a de Nossa Senhora da Saúde,

realizada em janeiro; o festival Borari realizada em julho e a festa do Sairé, que ocorre

em outubro. A última é a maior festa das realizadas na referida comunidade, atraindo

milhares de visitantes, especialmente de Santarém, Manaus e das cidades vizinhas

(fluxo regional), sendo a única das festas que conta com infra-estrutura

construída/instalada especialmente para esta finalidade. O complexo da praça do

Sairé é composto de área para apresentações folclóricas, arquibancadas para os

espectadores, além do palco para shows e outras apresentações.

O Sairé também foi a festa que sofreu mais profundas alterações. Tradicionalmente a

sua realização ocorria no mês de julho e possuía rituais essencialmente religiosos,

como um agradecimento pela colheita/fartura. A mudança de data se deu em função

do turismo e do alto nível das águas do Rio Tapajós durante o mês de julho,

diminuindo a sua rentabilidade para a comunidade com o funcionamento das barracas

da Ilha do Amor. Em substituição à realização da festa do Sairé em julho, uma vez que

foi transferida para setembro, foi criado o já citado festival Borari.

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Além disso, podem ser citados como outros atrativos culturais as músicas e danças

típicas da região, a piracaia (espécie de lual amazônico), bem como a gastronomia

regional predominantemente com base em derivados da mandioca e peixes, os doces,

sucos, sorvetes e compotas de frutas regionais, o artesanato em sementes restos de

madeira coletados na floresta em Alter do Chão e em Ponta de Pedras. Nas

comunidades da Reserva Extrativista Tapajós-Arapiuns destaca-se o artesanato em

palha de buriti, o mel silvestre e a criação de quelônios e tambaquis para consumo;

nas comunidades do Aritapera (na região dos alagados do Amazonas) destacam-se as

cuias decoradas; nas comunidades da Flona são encontrados artesanatos em látex,

velas e óleos vegetais; e em Santarém é possível encontrar réplicas das peças

arqueológicas da cerâmica tapajônica.

FOTO 11: Cuias decoradas das Comunidades do Aritapera

FOTO 12: Artesanato em palha de buriti das Comunidades da RESEX

FOTO 13: Peça arqueológica com iconografia tapajônica

Fonte: A autora, 2005.

FOTO 09: Festa do Sairé: momento religioso Fonte: Celivaldo Carneiro, 2004.

FOTO 10: Festa do Sairé: a inclusão da disputa entre os botos Fonte: Ronaldo Ferreira, 2002.

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6.4.6 Análise do Perfil dos Turistas de Alter do Chão

Conhecer o perfil do turista que se interessa pela destinação é importante para auxiliar

na percepção do desempenho da infra-estrutura existente. Desta forma fica mais fácil

observar que tipo de público o destino e, consequentemente, sua infra-estrutura estão

sendo capazes de atrair e/ou manter, mas principalmente propicia a percepção do

quanto e em que prioridades estruturais são necessários os investimentos.

Com relação à origem, do total dos turistas entrevistados pelo Sebrae (2003), 55,5%

são estrangeiros e 44,5% são brasileiros, distribuídos conforme é demonstrado na

Tabela 12.

País de origem % Estado de origem % Itália 13% Amazonas 9,5% Inglaterra 8% Rio Grande do Sul 6,5% Suíça 8% São Paulo 5,5% Alemanha 5,5% Paraná 5,5% Escócia 4% Rio de Janeiro 5,5% Guiana Francesa 4% Mato Grosso 4% Holanda 4% Outras cidades do

Pará

4% França 3% Pernambuco 1% Espanha 3% Mato Grosso do Sul 1% EUA 1% Minas Gerais 1% Outros 1% Santa Catarina 1%

TABELA 12: Origem dos turistas de Alter do Chão, exceto visitantes de Santarém. Fonte: adaptado pela autora a partir dos dados disponíveis em Sebrae (2003).

A maioria dos turistas abordados é do sexo masculino (67,5%) e possuem encontram-

se na faixa etária dos 26 aos 35 anos de idade (57%), sendo também representativa a

faixa etária entre 36 e 45 anos (21%). A maioria viajava com amigos (61%), mas

também aparecendo o que viaja com a família (26%) e, em menor número, o que viaja

sozinho (13%).

FOTO 14: Cruzeiros internacionais Fonte: Helvécio Magalhães, 2002.

FOTO 15: Expedição de veleiros Fonte: A autora, 2003.

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Mais da metade dos entrevistados (55%) afirmou ter a viagem organizada pelos

próprios, o que pode ser um indicador da fragilidade da distribuição e disponibilidade

do destino enquanto produto turístico nas agências de viagens. Ou este dado deveria

ser cruzado em pesquisas futuras, buscando esclarecer se há uma relação deste

comportamento com o restante dos dados do perfil já identificado, ou seja, grupos de

homens jovens que viajam com os amigos. Também foram citadas as viagens

organizadas por agências (27%) ou outros meios alternativos (18%).

Com relação à ocupação destes turistas, as mais citadas foram professores e

empresários (8%), autônomos, administradores e engenheiros (5%), Agricultores,

estudantes e enfermeiros (4%), advogados, agrônomos, biólogos, servidores públicos,

jornalistas, pedagogos, arquitetos, agentes de viagem, arqueólogos (3%),

economistas, publicitários, profissionais de marketing, marinheiros, odontólogos,

químicos, vendedores, bibliotecários, editores, consultores (1%), aposentados (3%) e

outros (17%). Esse perfil de especialistas e autônomos gera um quadro-perfil de

turistas com alta renda familiar, conforme se verifica na Tabela 13.

Renda familiar em salários mínimos

%

4-6 6% 7-8 3% 9-10 6% 11-12 5% 12-15 8% 16-20 34% 21-25 8% 26-30 10% 31-40 12% 41-50 3% Mais de 50 5%

TABELA 13: Renda dos visitantes Fonte: adaptado pela autora a partir dos dados disponíveis em Sebrae (2003).

Quanto ao meio de transporte utilizado pelos visitantes, 79% chegam de avião a

Santarém, outros 9% utilizam veículo próprio, 5% utilizam ônibus, 4% utilizam barco e

3% utilizam veículo locado.

A motivação para a viagem mais freqüente é o lazer (84%), também tendo sido citados

outros motivos entre os quais as viagens por negócios (8%), interesses por aspectos

ecológicos e/ou cênico-paisagísticos (4%), viagens de turismo científico (3%) e ainda,

visita aos familiares (1%). Seja qual for a motivação, a maior parte dos entrevistados

visitava a Vila de Alter do Chão pela primeira vez (71,5%), sendo que 26,5%

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afirmaram estar visitando a comunidade pela segunda à quinta vez e apenas 2% já

retornaram ao destino seis vezes ou mais.

Os dados relativos ao tempo de permanência destes turistas são apresentados na

Tabela 14.

Tempo de permanência

1 noite 2-3 noites 4-7 noites 8-15 noites Mais de 15 noites

% 14% 37,5% 24,5% 12% 12%

TABELA 14: Tempo de permanência Fonte: adaptado pela autora a partir dos dados disponíveis em Sebrae (2003).

Segundo os dados do Sebrae (2003) na ocasião de sua coleta, os visitantes foram

questionados sobre a existência de alguma particularidade que poderia tornar Alter do

Chão um destino mais atrativo. Foram obtidas respostas afirmativas de 67,5% e

negativas de 32,5%. Entre as respostas afirmativas foram relacionadas as seguintes

problemáticas: melhoria no serviço de limpeza na Vila, criação de espaço cultural,

implantação de serviços de informações turísticas, implantação de áreas de lazer para

crianças, implantação de banheiros públicos, ampliação e diversificação dos serviços

de hospedagem, implantação de sinalização turística, implantação de coleta e

tratamento de esgoto, entre outros.

Assim, conforme os dados expostos, observa-se um turista majoritariamente jovem, do

sexo masculino, oriundo de diversos países da Europa – quando internacional - ou dos

estados do Sudeste/sul e Amazonas – quando nacional. Esse turista, também na

maioria, possui renda familiar acima de 15 salários mínimos e está

predominantemente em busca de lazer. Entretanto, apesar das altas condições de

renda, parecem estar cientes das deficiências da infra-estrutura do destino, embora

tenham sido relatadas na pesquisa do Sebrae (2003) algumas indicações que

poderiam melhorar o destino turístico da Vila de Alter do Chão, evidenciando sua

percepção quanto às fragilidades já identificadas e discutidas neste estudo.

Assim, segundo os dados apresentados anteriormente, observa-se que dentre os

fatores que podem contribuir para o desenvolvimento e consolidação da vila de Alter

do Chão enquanto destinação turística, é possível citar a existência situação de praias

perenes, o estado de bucolismo do lugar representado por seus residentes, a beleza

cênica da região propiciada por sua formação geomorfológica (lago verde e “ilha”), a

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pouca oscilação de clima, a existência de vôos provenientes do nordeste, a posição

central com relação aos demais municípios da região turística do Tapajós, a existência

da APA na área de Alter do Chão, bem como de outras unidades de conservação, no

que tange a manutenção do patrimônio natural e seus aspectos paisagísticos, além da

força da marca “Amazônia”, entre outros.

No entanto, a existência do atrativo, do potencial, sem o aporte da infra-estrutura

necessária não faz o devido aproveitamento do mesmo, ou seja, não o converte em

recurso, em produto turístico. Segundo Blasco (1996), o uso de cada atrativo natural é

potencializado pela infra-estrutura, da mesma forma que acaba por determinar as

modalidades e características deste uso, de modo que a implantação de infra-estrutura

gera um espaço turístico.

Atualmente, a deficiência de infra-estrutura básica e saneamento constitui o maior

problema para Alter do Chão, tanto no que diz respeito a sua utilização enquanto

destinação turística, quanto para as próprias condições de saúde e qualidade de vida

de sua população. Aí estão incluídos problemas tais como o acumulo de lixo nas vias

públicas, juntamente com o serviço de coleta deficiente, a ausência de sistemas de

coleta e tratamento de efluentes, assim como de tratamento e distribuição de água.

No que tange à infra-estrutura turística, cita-se a ausência de infra-estrutura turística

na orla, bem como de posto de informações e sinalização turística, a ausência de

banheiros públicos e de outros serviços de apoio ao turista tais como bancos, câmbio,

farmácias, acesso internet, entre outros.

A poluição visual com a inclusão de edificações em desacordo com o entorno físico da

área, a ausência de um plano diretor, a favelização da Vila, especialmente em sua

periferia, também podem ser listados entre as preocupações concernentes à infra-

estrutura e aos aspectos paisagísticos de Alter do Chão.

Todos estes problemas acabam sendo agravados pela ineficiência da gestão turística

pública e privada, juntamente com a divergência de interesses das organizações que

atuam no destino e a pouca integração e organização da comunidade em relação à

atividade turística, bem como a baixa atuação do Conselho Comunitário e demais

formas daquela comunidade organizada, o alto custo para a implantação da infra-

estrutura necessária, a falta de recursos e/ou vontade política dos governantes locais,

acabam tornando a resolução destas questões ainda mais difícil.

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Investimentos em pesquisa e em iniciativas criativas, mais adequadas às condições e

característica locais – como o novo sistema modular de tratamento biológico de

efluentes pela tecnologia de zona de raízes, bem como o estabelecimento de algumas

parcerias público-privadas tem se demonstrado as alternativas mais viáveis no sentido

de contornar as dificuldades citadas em direção à implantação da infra-estrutura

necessária.

Outras medidas que podem concretizar conquistas para o alcance das referidas metas

são a promoção do fortalecimento da articulação e proposição junto aos governos

municipal e estadual, bem como às organizações de apoio e fomento às atividades

produtivas dos setores econômicos para implementação de ações visando a melhoria

na infra-estrutura básica da localidade, a implementação de ações de fomento para a

melhoria do nível organizacional da comunidade e suas relações com a atividade

turística, o estabelecimento de uma relação mais forte com os demais municípios e

comunidades da Região Turística do Tapajós - empresarial e institucional, a criação de

um grupo de articulação e representação dos distintos atores envolvidos no turismo

local (comunidade, empresários e setor público) para elaboração, apresentação e

análise de propostas, fechamento de acordos, desenvolvimento e monitoração de

ações de melhoria da atividade turística no destino, dentre os quais a elaboração da

proposta de planejamento e gestão territorial e turístico da Vila e seu entorno,

incluindo temas tais como harmonização das edificações, vias e paisagismo de acordo

com o ambiente natural local.

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7. MORFOLOGIA URBANA, SUAS IMAGENS E SIGNIFICADOS POR RESIDENTES

E TURISTAS NA VILA DE ALTER DO CHÃO (SANTARÉM-PA)

Conforme expresso anteriormente durante a secção de metodologia, para a

congregação das diversas modalidades utilizadas e para a análise final dos dados,

foram estabelecidas cinco categorias inter-relacionadas propostas segundo o

pressuposto da sistêmica.

Estas quatro categorias - (1) Produção e apropriação do espaço turístico – urbano e

natural; (2) Redes Sociais e Urbanas; (3) Ambiente urbano; (4) Percepção do espaço –

residentes e turistas – podem ser a priori, relacionadas às quatro dimensões que

Capra (2002) aplica aos fenômenos sociais, de forma que cada uma das categorias

aqui sugeridas, pode ser vinculada à uma das dimensões.

A dimensão da matéria que trata dos constituintes em si (Capra, 2002), no caso de

nosso objeto de estudo, parece trazer em seu bojo os elementos constituintes da

morfologia urbana (Lamas, 2004) e assim relacionando-se melhor com a categoria

ambiente urbano.

Já a dimensão da forma que inclui a forma de estruturação, de organização em rede

dos elementos da dimensão da matéria entre si (Capra, 2002), e assim relacionando-

se mais aproximadamente com a categoria proposta das redes sociais e urbanas. A

dimensão do processo trata da origem da matéria e da forma, incluindo seu estudo ao

longo do tempo, estando assim vinculada à categoria que inclui as lógicas de

produção e apropriação do espaço por residentes e turistas.

E por fim, a quarta dimensão de Capra (2002), aplicada apenas aos fenômenos

sociais, a dimensão do significado, vem relacionada no caso deste estudo, à imagem e

à percepção dos usuários/consumidores deste espaço, sua matéria e forma e os

significados associados, vinculando-se à categoria de percepção do espaço turístico,

seja ele urbano ou natural (Figura 08).

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FIGURA 08: Correlação entre as categorias de análise propostas. Fonte: A autora, 2007.

Da mesma forma, as demais contribuições metodológicas expostas (Ferrara, 1999 a;

Santos, 1992; Lamas, 2004), estão parcialmente relacionadas com as quatro

categorias criadas, segundo a forma de estudar o espaço proposta por cada um

desses autores. Os elementos morfológicos apresentados por Lamas (2004)

relacionam-se fortemente à duas categorias, denominadas Ambiente Urbano e Redes

Sociais e Urbanas. Já as teorias de Santos (1992) se aproximam mais das categorias

Produção e Apropriação do Espaço – por residentes e turistas. No caso da categoria

de Percepção do Espaço Turístico – urbano e natural, o autor que mais contribui é

Ferrara (1999 a).

É possível observar a junção de duas linhas de pensamento que habitualmente não

“conversam” entre si: uma mais voltada ao materialismo dialético e outra mais

fenomenológica. O pressuposto da sistêmica adotado permitiu, e mais ainda, tornou

necessária a junção destas duas abordagens, de forma a tornar o estudo de uma

realidade complexa, mais ampla e assim, mais completa.

Considera-se, no entanto, que todas as categorias estão integradas entre si, uma vez

que a sistêmica também parte desse princípio, e que é notória a interdependência

entre as mesmas. São as lógicas de produção e apropriação do espaço e as políticas

e intervenções urbanas que originam, modificam ou mantém o ambiente e os sistemas

urbanos, que por sua vez implicam em diferenciados valores da percepção ambiental

a elas associadas, que, por sua vez, também implicam e coadunam com as mesmas

Ambiente Urbano (Matéria)

Redes Socias e Urbanas (Forma)

Produção e Apropriação do Espaço – Residente e Turista (Processo)

Percepção do Espaço Turístico – Urbano e Natural

(Significado)

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lógicas de produção e a apropriação, gerando correlações cruzadas e/ou diretas, em

movimentos de ida e volta, como parte de um único sistema de relações dialéticas.

7.1 Produção e Apropriação do Espaço da Vila de Alter do Chão (Urbano e

Natural)

Com relação à produção do espaço turístico, pode-se dizer que um marco nesse

processo é a abertura da estrada PA-457, conforme citado anteriormente. Marcado

notadamente por uma economia voltada à subsistência, com modos de produção

associados ao extrativismo e à agricultura e relações comerciais baseadas no

escambo de mercadorias e na utilização de vales, a Vila de Alter do Chão, tinha seus

acessos principais através do rio, caracterizando uma localidade ribeirinha como

muitas na Amazônia.

É após a abertura da rodovia Everaldo Martins (PA 457), e especialmente após seu

asfaltamento, que há uma aceleração acentuada no ritmo de mudanças e da produção

do espaço, conforme os próprios residentes relatam nas entrevistas.

Conforme a sessão que trata da gênese da região amazônica, e assim, da Vila de

Alter do Chão, a ocupação da área em questão é anterior à chegada dos

colonizadores luso na região. Na porção inicial da ocupação estabelecida pela missão

jesuíta de Nossa Sra. da Saúde, admite-se que também estava a porção central da

ocupação indígena pela aldeia Borari, conforme é possível observar na Figura 09.

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FIGURA 09: Períodos da ocupação da Vila de Alter do Chão Fonte: A autora, 2007.

Assim, este núcleo populacional em torno da igreja matriz e da praça foi a primeira

porção ocupada de seu território, em torno do qual se deu o seu lento crescimento até

a década de 70, quando foi aberta a estrada que faz a ligação entre a Vila e a sede do

município de Santarém. Neste período, a área urbana restringia-se à igreja e à quatro

ruas paralelas à margem do rio/Lago Verde, bem em frente à “Ilha”. Neste período,

todo o transporte era fluvial, determinando maiores intervalos de tempo necessários

para o acesso à Santarém. O fluxo de visitantes e moradores existia, mas estava

restrito a uma freqüência bastante menor, dados os custos de acesso, a irregularidade

da disponibilidade de transporte, assim como o tempo de duração entre as viagens.

Nesse período as viagens a Santarém costumavam ser realizadas com pernoites na

sede do município e retorno no dia seguinte.

Observa-se que neste período da ocupação, o rio que regia aos transportes e acessos

para a comunidade, também polarizou em suas margens a ocupação humana e suas

intervenções no meio natural.

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Já no período da década de 70 à 80, logo após a abertura da estrada de terra, já é

possível perceber o aumento dos fluxos locais de visitantes e mercadorias, assim

como o aumento das velocidades de ocupação do seu território. Nesse período o

crescimento se deu no sentido do Lago do Jacundá, ou seja, em direção oposta à

estrada, posicionando uma nova frente de ocupação para a margem do Rio Tapajós,

em direção à saída da enseada. As viagens para a sede de Santarém passam a

acontecer diariamente em veículos automotores de grande porte, com maior

resistência e capacidade de transposição de obstáculos, iniciando um movimento de

melhoria de acesso aos serviços e produtos.

Entre as décadas de 80 à 90, a expansão começa a acontecer no outro sentido, agora

em direção às margens do Lago Verde. Neste período começam a surgir as primeiras

pousadas, estabelecidas com objetivo de assentamento dos visitantes, indicando a

relevância do fluxo permitido pela nova estrada já neste período. Anteriormente, as

visitas à Alter do Chão restringiam-se aos que possuíam amigos ou familiares na

localidade, ou ainda à visitas diárias, comportando um fluxo basicamente local

(oriundo da sede de Santarém).

Na década de 90, com o primeiro asfaltamento da estrada, o fluxo é novamente

intensificado, ocasionando a explosão da construção de segundas residências, o inicio

do movimento de “expulsão” dos moradores nativos das margens do rio para áreas

mais interiores. Nesta década a Vila inicia um lento movimento de adensamento e de

urbanização em direção à estrada, ocasionando inclusive o surgimento de uma nova

comunidade distante apenas 2 km de Alter de Chão (a comunidade de Caranzal).

Nesse período, outros marcos em construções que podem ser citados são: a

construção do Beloalter Hotel, o asfaltamento das primeiras vias no interior da Vila, a

construção da Casa do Idoso, entre outros.

A partir de 2000, a ocupação da Vila estende-se para o interior e continua seu

movimento em direção a estrada, acentuando o processo de adensamento das áreas

centrais e das áreas com vistas privilegiadas do rio Tapajós, do Lago Verde e da “Ilha”.

A estrada passa por seu segundo asfaltamento, tendo sido renovada toda sua

sinalização, da mesma forma que as pontes – antes em madeira de faixa única –

tornando-a mais segura e diminuindo o tempo de deslocamento. Neste momento, o

acesso à Santarém passa a acontecer diariamente, aproximadamente de hora em

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hora, em ônibus urbanos, contando inclusive com horários especiais para o

atendimento dos estudantes.

Assim, nesse período observa-se uma intensificação das intervenções urbanas

realizadas pelo Poder Público - seja na esfera municipal, estadual ou federal, tais

como o Centro de Atendimento ao Turismo (CAT), a estação rodoviária de

passageiros, a reforma da orla e da praça da igreja matriz, além do asfaltamento de

novas vias na Vila, anualmente sempre próximo à Festa do Sairé. Dentre as iniciativas

privadas realizadas no período pode-se destacar, como importância no que tange a

mudança da paisagem urbana da Vila, a construção do Hotel Mirante.

Assim, observa-se que após a abertura da estrada (PA-457) houve uma aceleração

progressiva na ocupação e urbanização da Vila, provavelmente em função das

melhorias nas condições de acessibilidade, da crescente visibilidade da destinação e

sua conseqüente valorização turística. Entretanto, esse crescimento pouco significou

em termos de melhorias das condições infra-estruturais básicas, tais como coleta e

tratamento de esgoto e abastecimento de água potável. A população local tem

experimentado a melhoria das condições de vida por uma ampliação, ainda que

considerada modesta, possibilidade de trabalho e geração de renda, circulação

monetária e de mercadorias, assim como de incremento no acesso à informação e aos

serviços de educação e saúde, ainda que estes ainda estejam notavelmente ligadas à

sede do município de Santarém.

Os moradores entrevistados afirmam que naquela ocasião nem a população e nem

mesmo a estrutura física da Vila estava preparada para tal aceleração, para o

aumento do interesse dos visitantes pela área, para a valorização da terra, entre

outros.

Assim, a construção da estrada é referenciada de forma geral como melhoria das

condições de vida dos nativos, através da chegada da energia elétrica, da melhoria

das condições de transporte e conseqüentemente de acesso à saúde, educação e

demais produtos e serviços disponíveis em Santarém. Da mesma forma, permitiu

maior e melhor acesso de turistas e visitantes, de modo que este aumento de fluxo

permitiu também a ampliação das possibilidades de trabalho e renda, da circulação

monetária e de mercadorias.

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Da mesma forma, esse crescente interesse na Vila de Alter do Chão, propiciou o

aumento do interesse na terra, sua conseqüente valorização, e com isso, a expulsão

dos moradores tradicionais da Vila para áreas mais periféricas, passando assim a

ceder espaço para as casas de segunda residência, os hotéis e pousadas, as lojas e

restaurantes. Os residentes afirmam que a venda de seus lotes mais valorizados tem

relação direta com um desejo de “melhorar de vida”, de construir uma casa “melhor”,

segundo sua percepção destas noções, conforme discutido na categoria de percepção

do espaço turístico.

Assim, após a abertura da estrada, a Vila tem uma drástica mudança de suas relações

e modos de produção, assim como da circulação monetária e de mercadorias. Tendo

passado do extrativismo – baseado na seringa/borracha e na pesca - e agricultura –

da lavoura da mandioca e outras espécies para a subsistência - para o turismo, assim

como passou das relações de compadrio e escambo de mercadorias para o

capitalismo, que ainda se fortalece no local, atualmente, os próprios residentes

afirmam que todos na Vila são, de forma direta ou indireta, dependentes do turismo.

Essas relações de trabalho incluem desde funcionários de estabelecimentos voltados

ao atendimento dos visitantes, assim como proprietários de empresas tais como

hotéis, pousadas, restaurantes, bares, agências de turismo receptivo, entre outros,

além de artesãos, grupos folclóricos e condutores locais. No caso dos mais jovens,

atividades relacionadas aos grupos folclóricos e aos condutores locais5 são entendidas

como fonte de renda complementar para as famílias locais.

Conforme já frisado, a atividade turística tem se tornado a base da economia local,

mesmo que haja relatos de diversas atividades praticadas durante o ano, segundo as

condições naturais e a própria sazonalidade da atividade turística. Assim, os

residentes passam a incluir entre suas necessidades locais, também as necessidades

dos turistas (a instalação de farmácias e caixas eletrônicos), para a progressiva

melhoria dos produtos e serviços ofertados, contribuindo sobremaneira na produção

do espaço.

Assim, tudo passa a ser “comercializado” para o turista, inclusive os valores, as

impressões, as vistas, as paisagens, as características locais (culturais e naturais) tais

como, o ambiente natural conservado como “prova” de qualidade de vida, a água, a

5 Condutores Locais são uma espécie de guias locais treinados pelo Sebrae, CNS e outras ONG’s, sem autorização e credenciamento junto à Embratur.

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praia, a floresta, o pôr-do-sol, as catraias, os catraieiros, entre outros. Confirmando e

reforçando essa lógica de produção espacial, os turistas relatam que a Vila tem perfil

para atender a diversas modalidades de turismo de baixo impacto.

Essa valorização e crescente ascensão dentro do cenário turístico, além das

condições de acesso à saúde e educação, têm aumentado também o interesse dos

moradores de comunidades rurais próximas pela Vila, de maneira que o êxodo rural foi

uma das preocupações expressas pelos residentes de Alter do Chão como um dos

maiores problemas na atualidade. Esse êxodo tem contribuído para a especulação

imobiliária, para o inchaço especialmente das áreas periféricas da Vila, para o

aumento da pressão sobre os equipamentos públicos e as áreas naturais, a invasões

de terrenos, diminuindo ainda a integração comunitária local.

Já com relação às áreas com predominância de apropriação espacial pelos dois

grandes grupos estudados por esta pesquisa, são apresentadas duas áreas de maior

interesse para turistas e residentes. Entretanto, há de se observar que existem

diferenças nessas formas de apropriação, inclusive internamente a estes grupos que

poderiam ser subdivididos, podendo determinar variações nas respostas fornecidas,

assim como é preciso perceber que embora existam predominâncias, não há exclusão

de nenhum dos grupos, sendo todas as áreas da Vila permeáveis a ambos os grupos.

Neste caso, o que determina a prevalência de apropriações é muito mais uma relação

de interesse e de atratividade que tais áreas exercem sobre a população residente ou

sobre os turistas.

As Pranchas 1 e 2 demonstram a predominância na apropriação de algumas das

áreas da Vila (duas centralidades identificadas) por residentes ou turistas. Pode se

observar que na Prancha 1 é apresentada a área com predominância de apropriação

dos turistas e na Prancha 2, a área de predominante apropriação dos residentes. Em

cada figura são incluídas fotografias imagens representativas de cada um dos dois

tipos de apropriação auxiliando assim na diferenciação das mesmas.

Na Prancha 1, estão exemplificadas cenas fotografadas na área definida como de

apropriação predominante pelos turistas. Os turistas parecem se apropriar

principalmente das áreas com amenidades, próximas às margens do rio Tapajós e do

Lago Verde e à praça da igreja matriz local do centro da ocupação de toda a Vila,

correspondente à área de maior concentração de edificações na Vila.

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A “Ilha”, por exemplo, caracterizada nos relatos dos residentes antes como uma das

áreas mais utilizadas pelos mesmos no passado, tem se tornado cada vez mais um

espaço de apropriação predominante pelos turistas. Cada vez mais, os residentes que

costumam freqüentar a “Ilha” o fazem por trabalho, afirmando já não se sentir à

vontade para dividir o espaço com os visitantes, especialmente quando este fluxo é

mais intenso.

É perceptível que nesta área está instalada a maior parte dos equipamentos turísticos

locais, tais como, pousadas, hotéis, restaurantes, bares, agências de receptivo, lojas

de artesanato, entre outros. Observa-se que a instalação do Centro de Atendimento ao

Turista na margem do Rio Tapajós, na praia do Jacundá; a reforma da orla e da praça

da igreja matriz e da Praça do CAT; assim como a implantação do Beloalter Hotel na

margem do Lago Verde, podem gerar duas novas tendências de expansão das

atividades e negócios turísticos, bem como da sua apropriação pelos mesmos, assim

como também, favorecer o adensamento das áreas existentes ao longo destes dois

pontos.

Entretanto, é possível afirmar que mesmo esta área com predominância de

apropriação e utilização turística, é permeável aos residentes uma vez que alguns

deles ainda mantém suas residências nesta área, assim como também da existência

de equipamentos e prestadores de serviços públicos instalados nesta área como, por

exemplo, o posto de saúde, a igreja matriz e o salão comunitário.

Nesta área, também estão situadas a maioria das segundas residências de habitantes

de Santarém. Essas construções, em geral, têm tipologia urbana utilizando materiais

como a alvenaria, o vidro, o ferro e as telhas de fibro-cimento ou ainda cerâmicas.

Surgem muros e gradis altos com o argumento da segurança e proteção do

patrimônio, mas que para Ferrara (1999), também deve estar relacionados ao

estabelecimento, à confirmação e à ostentação das relações de propriedade.

Algumas dessas residências também acabam por interferir diretamente na privatização

irregular de áreas públicas, quando adquiridas por moradores de Santarém e outras

cidades da região, em locais onde a inclusão dos muros e gradis determinam a

restrição de acesso à praia e à partes de algumas vias, em alguns casos.

Algumas das construções turísticas, demonstram maior preocupação com a paisagem

local, assim como com questões de pertinência no uso de materiais e sua adequação

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às condições climáticas locais e com questões simbólicas relacionadas à origem

indígena da referida ocupação. Estas construções utilizam abundantemente a

madeira, a palha e o barro, em tipologias mais abertas e rústicas, seguindo uma

tendência de aprimoramento nas construções tradicionais, procurando, no entanto,

manter seus principais valores paisagísticos.

Contraditoriamente, as construções tradicionais de propriedade dos residentes, que

conseguiram manter suas características originais conciliando-as com certo grau de

melhoria, estão predominantemente situadas nesta área, embora essas características

não sejam homogêneas.

Da mesma forma que explicitado anteriormente, na Prancha 5 são apresentadas

imagens fotografadas nas áreas consideradas por esse estudo de apropriação

predominante pela população residente de Alter do Chão. Sinalizada pela mancha

presente na referida figura, esta área ocupa predominantemente o entorno da Praça

do Sairé; a rua que liga a Praça do Sairé à Praia do Cajueiro, passando pelo colégio; a

rua que liga a praça da igreja matriz ao interior da Vila, onde concentram-se diversos

equipamentos públicos da Vila, comércio de gêneros de uso domésticos; entre outros.

A vida social, o local de encontro para os residentes é principalmente a Praça do Sairé

– embora também possa acontecer na Praça da igreja matriz, onde costumam

acontecer os campeonatos de futebol da comunidade, onde alguns caminham e fazem

exercícios físicos. Na margem oposta das vias que circundam a referida praça,

observa-se presença de um comércio mais local caracterizado por bares e

restaurantes mais populares, mercadinhos, entre outros, normalmente atendendo de

forma diversificada às necessidades de consumo da população local. Este comércio

instalado no local, também parece ter forte relação com o percurso das linhas de

transporte publico.

Essas áreas parecem não despertar significativamente o interesse dos turistas,

podendo-se dizer que são áreas de menor atratividade, inclusive dadas características

construtivas, de limpeza, manutenção, além do distanciamento das amenidades. No

entanto, ainda assim estes locais não podem ser considerados impermeáveis aos

turistas haja vista que não há nenhum risco associado à circulação nestas áreas,

assim como também, da ocorrência deste fluxo de turistas pelo menos em um período

do ano: durante a Festa do Sairé que é realizada na praça de mesmo nome.

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No caso das construções existentes na área de apropriação predominante por

residentes da Vila de Alter do Chão, observa-se a falta de manutenção nas vias, os

sinais de desgaste e erosão de algumas das suaves ondulações no relevo do terreno

devido ao seu desmatamento e utilização indevida. Percebe-se também o acúmulo de

lixo e entulho às margens das vias, assim como a existência de casas mais simples,

algumas ainda mantendo as características tradicionais e o uso de materiais locais.

Outras, com alteração de tipologia e materiais, são amostras de uma tentativa de

construir semelhantemente às casas de segunda residência, na maioria das vezes não

conseguindo alcançar um mínimo de conforto, dada a precariedade ou inexistência

dos acabamentos, das dimensões e das instalações, tomando ares de favela.

Entretanto, apesar da crescente utilização de muros e gradis e do aumento de sua

altura, muitas dessas construções mantém forte relação com os lotes vizinhos, nestes

casos não havendo separação entre os mesmos. Essa dinâmica no interior das

quadras, ao mesmo tempo em que dificulta a percepção das relações de propriedade

e dos limites das unidades, por outro lado favorece a integração social, através de

áreas mais abertas e de áreas ao ar livre, utilizadas por quase toda a população local.

É usual entre os residentes manter malocas abertas (construção sem paredes), com

estrutura em madeira e cobertas de palha, onde são desenvolvidas diversas atividades

domésticas e que também serve como refúgio do calor por manter um clima mais

brando. Muitas vezes essas malocas concentram os moradores inclusive durante a

noite, em redes, de forma que a casa principal fica com sua utilização muitas vezes

restrita à guarda dos objetos e bens da família.

No caso das construções dos residentes que seguem os mesmos padrões dos

visitantes e que conseguem finalizar a obra, percebe-se uma tendência à utilização de

dois pavimentos em tipologias áridas, do ponto de vista de sua humanização. Com

poucas aberturas, com vedação em madeira, poucas varandas e beirais, resultando

em edificações pouco harmoniosas e de estética questionável, agregam também

problemas relacionados a um baixo desempenho de conforto térmico e lumínico,

conforme foi citado na categoria de análise Ambiente Urbano.

Com relação às intervenções do Poder Público Municipal na produção do espaço, na

Prancha 3 é apresentado o projeto de reformulação da orla e da praça de Alter do

Chão, que teve a conclusão de sua obra no final de 2006, aqui apresentando .

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O referido projeto acaba por reforçar a valorização já existente da área em questão,

que coincide com a área central da Vila, bem como, com a presença de amenidades

como a vista da “Ilha”, a proximidade do rio, entre outros.

Na implantação deste projeto foi alterado todo o mobiliário urbano (bancos, lixeiras,

quiosques, coreto), da mesma forma que foram retirados elementos da praça tais

como a vegetação de pequeno porte ali existente, cultivada pela comunidade através

de suas associações, e o painel de avisos comunitários, confeccionado em madeira

entalhada com motivos indígenas e naturais (flora e fauna).

A mudança do mobiliário aliada ainda à inclusão de grandes volumes de concreto, de

elementos em ferro e policarbonato, gerou polêmica entre turistas e moradores, dadas

questões de pertinência com a localidade, questões simbólicas relacionadas ao

destino turístico na Amazônia e, também, questões de adequação ao clima local,

conforme foi observado na etapa de campo realizada em dezembro de 2006.

Essa obra também determinou a pavimentação da via ao longo da margem do Rio

Tapajós, com a criação de áreas para estacionamento na mesma, sendo este situado

em posição privilegiada (de frente para a vista), reforçando a utilização de veículos

automotores nesta área.

Situada na área de apropriação predominante por turistas, segundo as referências dos

equipamentos instalados e das demais informações coletadas em campo entre

residentes e turistas, esta obra reforça a centralidade e a valorização de uma área tida

como de maior interesse turístico, mantendo e incentivando a permanência da atual

lógica de produção do espaço.

Os residentes parecem ter essa percepção quando afirmam nas entrevistas que essa

e outras obras e intervenções levam pouco em consideração as necessidades da

comunidade e a cultura local. Mesmo os turistas, conforme analisado na categoria

sobre percepção do espaço turístico, vêem a obra como incoerente com a paisagem

local.

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A população tem relatado problemas recorrentes quanto ao cumprimento da legislação

vigente, onde as relações de poder têm permitido a alteração da legislação com

relação ao limite do número de pavimentos permitidos, inclusive tendo permitido além

do novo limite estabelecido pela alteração citada, como no caso do Hotel Mirante.

A referida legislação (de 24 de março de 1975) permitia inicialmente dois pavimentos

e, em 1992, após sua alteração, passou a permitir três pavimentos, apesar do que o

hotel em questão possui quatro. A legislação vigente (Lei № 6.859 – Do Uso e

Ocupação do Solo) ainda não é o Plano Diretor – que está entre elaboração e

aprovação, apesar do município de Santarém ser parte dos municípios com esta

obrigatoriedade dado seu número de habitantes.

Nesse sentido, os residentes referem-se nas entrevistas de uma necessidade de

ordenamento do crescimento da Vila e o desenvolvimento do turismo para a

sustentabilidade local. Essa comunidade se vê e é vista pelos turistas entrevistados

como politizada e consciente, adotando uma postura pró-ativa, entretanto, ainda assim

os residentes vêem sua politização, educação e conscientização como uma

necessidade premente.

O papel do Conselho Comunitário e da escola nesse sentido é destacável, uma vez

que estes têm feito crescer as discussões em torno das necessidades da comunidade.

O desempenho destes papéis se dá através de ações de conscientização e educação

como no caso da escola, ou ainda na tentativa de interferência direta junto ao poder

público na reivindicação de melhorias e no compromisso desse mesmo poder no

sentido da satisfação das necessidades locais.

Dentre as ações citadas durante as entrevistas pode-se destacar as atividades

escolares que promovam o conhecimento e a discussão sobre os problemas da Vila e

suas possíveis soluções, assim como as campanhas de conscientização quanto à

limpeza pública, coleta e destino do lixo, ainda que acreditem que seja necessário um

maior esforço nesse sentido.

Também podem ser referenciadas como iniciativas políticas da população enquanto

agentes produtores do espaço são incluídas as manifestações acerca da proibição do

tráfego de veículos automotores nas praias, além da resistência ao caso de grilagem

de terras por uma única pessoa, que se diz dona de mais da metade do território da

Vila.

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A população tem buscado então soluções alternativas a esse problema, uma vez que

estão envolvidas pessoas detentoras de grande poder político e econômico da sede

do município de Santarém, na implantação do movimento indígena Borari, que através

da declaração de sua população como indígena, pretende reaver as terras griladas,

além de seus rituais e outros traços culturais.

7.2 Redes Sociais e Urbanas da Vila de Alter do Chão

A categoria de redes sociais e urbanas inclui todos os sistemas estruturadores das

dinâmicas urbanas. Uma dessas redes é constituída pelo sistema viário, que para

Lamas (2004), está relacionado ao elemento morfológico solo, já que este também

inclui, além da topografia e hidrografia presentes no sítio, a sua superfície, ou seja, o

seu material de constituição e revestimento, mas também está relacionado ao

elemento morfológico do traçado, que também determina outro elemento constituído

pelas quadras.

Nesse contexto, o sistema viário é uma das redes urbanas mais significativas, uma

vez que ao seu eixo são associadas outras redes - tais como, esgoto, abastecimento

de água, energia elétrica, entre outros – e que também é esse sistema que permite o

acesso a outras redes sociais – como saúde, educação, segurança, entre outros.

Assim, na Prancha 4 podem ser observadas as características do sistema viário e da

organização e forma das quadras dentro de seu tecido urbano que podem ser

relacionados à outros dos elementos morfológicos propostos por Lamas (2004) , tais

como: o traçado e as quadras.

No que diz respeito ao sistema viário local, pode-se afirmar que estas seguem um

partido predominantemente ortogonal em toda a Vila, podendo ter como origem a

influência espanhola pela qual Portugal passava no momento da ocupação destas

áreas na Amazônia, ou ainda, ser resultado de expansões posteriores às primeiras

formas de ocupações ali surgidas.

Apesar de a ortogonalidade ser aparentemente homogênea em toda a extensão

ocupada da Vila, é possível identificar alguns tipos de malhas, sutilmente diferenciados

entre si, conforme se observa nas manchas apresentadas ainda na Prancha 4. A

mancha 1 caracteriza a malha viária próxima à primeira área de ocupação de Alter do

Chão, bastante consolidada, composta de quadras mais estreitas e longas, área muito

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valorizada, possuindo lotes com frente para duas vias; a mancha 2, que inclui a região

central da Vila com vias que determinam quarteirões mais quadrados, apresentado

alguma consolidação, assim como, algumas vias pavimentadas; as manchas do tipo 3

existente nas áreas de expansão ainda pouco consolidadas da Vila, que não possuem

nenhum tipo de pavimentação e que - embora tenham traçado aproximadamente

ortogonal - possuem quadras mais alongadas, delimitação mais orgânica e vias tipo

“rua sem saída”, sendo estas características de configuração repetidas em quatro

segmentos urbanos periféricos à ocupação inicial; e finalmente, a mancha 4 que

determina grandes quadras com acesso bastante restringido pela existência de um

obstáculo natural - o Lago do Jacundá, podendo indicar uma tendência futura de

surgimento de condomínios fechados no local.

Na Prancha 4, observa-se a existência de uma concentração de vias pavimentadas

junto às áreas mais valorizadas da Vila – ao longo da margem do Rio Tapajós,

especialmente nas proximidades da “Ilha”- que coincidem com as áreas da sua

ocupação inicial, conforme citado no item anterior, assim como nas áreas de maior

apropriação por turistas.

Outras vias pavimentadas estão localizadas em áreas mais interiores da Vila, onde se

dá predominantemente a apropriação por residentes, coincidindo com os trajetos das

linhas de transporte coletivo existentes, sendo possível que as empresas de transporte

tenham definido tal trajeto em decorrência da existência de vias pavimentadas, ou

ainda que tenham interferido junto ao Poder Público Municipal, no sentido de sua

pavimentação.

Também é perceptível que todas as vias pavimentadas até o momento do

levantamento de campo desta pesquisa (realizado em dezembro de 2006), estão

situadas à Oeste da Rodovia Dr. Everaldo Martins (PA-457).

Dentre os materiais utilizados nessas pavimentações, estão a pavimentação asfáltica,

a pavimentação em blocos de concreto pré-fabricados, a pavimentação em cimento

e/ou concreto. Com relação às vias não-pavimentadas, foram incluídas as vias que

não receberam nenhum tipo de “tratamento” e permanecem com o solo original do

local, predominantemente arenoso; ou ainda as vias que receberam camadas de

aterro, saibro, piçarra ou pedregulhos.

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O aumento das áreas pavimentadas com cimento e asfalto é referenciado pelos

residentes durante as entrevistas, atribuindo a este fato – aliado ainda à construção de

muros altos - a sensação do aumento do calor, do desconforto térmico na Vila, bem

como das necessidades de aquisição e utilização de ventiladores e aparelhos de ar-

condicionado, antes dispensáveis na localidade, segundo os relatos.

Diretamente vinculadas ainda ao sistema viário, outras redes que devem ser aqui

discutidas são a de esgoto, abastecimento de água, distribuição da energia elétrica e

rede de telecomunicações.

Conforme apresentado no item sobre a infra-estrutura básica da Vila de Alter do Chão,

não existe rede de coleta e tratamento de esgoto instalada na Vila de Alter do Chão

atualmente. Esse problema já repercute negativamente na saúde da população da Vila

uma vez que a utilização de fossas sépticas construídas de forma inadequada

relacionado ao grande número de famílias que utilizam como forma de abastecimento

de água os poços artesianos são um forte indicador de doenças parasitárias, por

exemplo.

A rede de abastecimento de água existente atende pouco mais da metade da

população da Vila, entretanto a abundância de água doce e a pequena profundidade

do lençol freático possibilitam a utilização de poços artesianos, desde que haja um

esforço em solucionar os problemas relacionados ao esgoto. A maior atenção com

relação ao esgoto torna-se questão emergente sob pena de prejudicar inclusive os

índices de balneabilidade das águas do rio Tapajós e do Lago Verde.

Outras redes que apresentam-se associadas ao sistema viário são rede de distribuição

de energia elétrica, sistemas de telecomunicações, a coleta de lixo e o transporte

coletivo. A distribuição de energia elétrica atende a praticamente toda a Vila,

concomitantemente ao serviço de telefonia fixa e móvel (sendo que a última não

depende das mesmas redes para distribuição). Entretanto, as falhas no fornecimento

de ambos os serviços são relatadas pelos residentes e, no caso dos telefones

públicos, há uma concentração nas praças e nas áreas de maior centralidade,

conforme pode-se observar também na Prancha 3 já apresentada na categoria de

análise Ambiente Urbano.

No caso do lixo, são relatados problemas com relação à insuficiência da coleta em

termos de volume coletado, mas não de rota. Assim, pode-se dizer que a maior parte

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da Vila é atendida pelo serviço de coleta de lixo através das vias públicas. As vias com

pavimentação asfáltica parecem determinar (ou será o oposto?) a rota do transporte

público para Santarém, abrangendo praticamente toda a área urbanizada, exceto os

extremos, incluindo as áreas mais próximas do Lago Verde e as próximas ao Lago do

Jacundá. A mobilidade interna à Vila se dá majoritariamente à pé ou de bicicletas,

permitindo acesso à todas as áreas da Vila, inclusive no que diz respeito à

permeabilidade e segurança, com exceção de algumas vias públicas apropriadas por

residências e outras em condições de nivelamento e tráfego inadequado.

A rede de segurança restringe-se ao policiamento público e aos zeladores das casas

de segunda residências, responsáveis por sua manutenção e segurança. Dada a

tranqüilidade ainda existente no local, a delegacia e a única viatura costumam ser

suficientes, sendo deslocado reforço da sede de Santarém sempre que estão previstos

eventos e maior fluxo de visitantes. Nesse caso, a segurança também se estende ao

Corpo de Bombeiros que presta serviços de salvamento nas principais praias da Vila.

Já com relação à rede de lazer e serviços públicos como educação, saúde,

policiamento, entre outros, os mesmos estão assinalados na Prancha 5, incluindo

equipamentos comunitários e espaços de lazer existentes na Vila de Alter do Chão.

No caso dos equipamentos comunitários, nota-se uma concentração dos

equipamentos comunitários ao longo da via de acesso à praça da igreja matriz. Esses

dados demonstram a importância, a força da referida via dentro do contexto da Vila de

Alter do Chão, mais especificamente no que se refere aos maiores usuários destes

equipamentos comunitários: os residentes.

No caso do Posto de Saúde, não se pode dizer o mesmo, apesar do mesmo estar

localizado também próximo à praça da igreja e próxima às amenidades, em uma das

áreas mais valorizadas da Vila. Assim, o sistema de saúde em Alter do Chão restringe-

se ao referido posto que presta assistência ambulatorial básica e atendimento de

emergência, apenas de 8 às 17h, encaminhando casos de maior complexidade para a

sede de Santarém. Essa pequena estrutura é ainda agravada pela ausência de

farmácias na Vila, tornando-a dependente da sede do município em tais casos.

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No caso da rede de ensino público, a existência dos dois colégios e as afirmações

feitas durante as entrevistas fazem parecer que, de uma forma geral, a comunidade é

atendida e tem acesso à educação, especialmente os jovens, seja na própria Vila seja

ainda em Santarém, com a facilidade de horários especiais do transporte público para

atender a esta demanda. A estrutura de gestão escolar parece interessada em

conhecer os alunos, suas famílias e conseqüentemente os problemas da comunidade,

demonstrando adotar e incentivar uma postura pró-ativa, educativa e crítica nos

estudantes.

Já no caso das áreas de lazer, relacionadas ao elemento morfológico praça segundo

Lamas (2004), pode-se observar a presença de duas praças, uma na área de maior

valorização – às margens do Tapajós, em frente à “Ilha” e à Igreja matriz; e a outra

localizada mais no interior da Vila.

É perceptível também a existência de diferenças nas formas de apropriação destas

praças, de maneira que praça da igreja matriz possui maior estrutura, ou seja, é mais

urbanizada, e apesar de ser utilizada pela população local, observa-se a existência de

uma intensa apropriação turística desses espaços. Esta praça e a área da orla

sofreram intervenções urbanísticas recentes, conforme verifica-se no projeto

implantado pelo Governo do Estado do Pará apresentado na Prancha 3.

A Praça do Sairé, tem sua apropriação predominante pela população residente,

conforme foi discutido, e conforme confirmam as entrevistas realizadas em campo que

também serão analisadas posteriormente, embora sua apropriação por turistas se dê

de maneira intensa durante a Festa do Sairé. Esta praça possui pouquíssima infra-

estrutura de utilização, ajardinamento ou qualquer outro tipo de urbanização,

restringindo o equipamento existente às duas traves que configuram um campo de

futebol, além de algum mobiliário sem a devida manutenção, entre os quais bancos,

telefones públicos, lixeiras e as árvores.

Para Lamas (2004), o elemento morfológico praça constitui o símbolo maior das

ocupações humanas como lugar do encontro e das relações sociais, do lazer, entre

outros. Entretanto, a existência da praia e do cais na orla acaba conformando outras

áreas também utilizadas com as mesmas finalidades, embora não possuindo a mesma

definição. É importante destacar também que, graças ao bucolismo local, as ruas

ainda são vistas como lugares de encontro e lazer nas quais as conversas entre

vizinhos e as brincadeiras das crianças ainda vivificam a rua como espaço público.

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Assim, também foram identificados como locais para a prática de lazer o importante

papel de toda a área do cais da orla e da praia enquanto marcantes áreas de lazer

para a população local e para o turista, mais uma vez reforçando o importante papel

do rio e das condições naturais na localidade. Dentre as surpresas verificadas estão o

apontamento da diminuição da utilização do rio pelos residentes enquanto fonte de

lazer – na medida em que torna-se fonte de renda associada à prestação de serviços

aos turistas – e a inclusão e reconhecimento pela comunidade da escola como fonte

de atividades de lazer dos jovens e crianças matriculados, além das visitas às

comunidades e praias próximas, das festas, comemorações e confraternizações

locais.

Outras redes sociais estabelecidas dizem respeito às cooperativas, conselhos e

associações amplamente presentes na estrutura de organização social percebida em

Alter do Chão. Essa organização por um lado demonstra a identificação e o poder de

mobilização de grupos locais, e por outro, pode indicar o intenso fracionamento e

discordâncias internas à comunidade, imbricando diferentes ideologias a tais

organizações. Entretanto, o que parece de fato é que este expressivo número de

associações, embora algumas vezes impliquem sim em orientações opostas, na

maioria das vezes parece indicar um senso de identidade e força coletiva, no sentido

da mobilização, pressão política e desencadeamento de ações para a melhoria das

condições de vida locais.

7.3 Ambiente Urbano da Vila de Alter do Chão

No processo de ocupação da Vila de Alter do Chão, pode-se dizer que o sítio tem sido

um de seus mais fortes elementos determinantes, conforme é possível verificar na

Prancha 6. A predominante presença de massas de água, assinalada através do Rio

Tapajós e do Lago Verde, além de outros rios, lagos e igarapés, marcam notadamente

o elemento morfológico Solo, segundo a classificação proposta por Lamas (2004),

bem como a paisagem e a forma da apropriação do referido espaço (foto 16).

Neste caso, o rio ainda é dotado de significativos apelos turísticos, dada sua crescente

valorização por este mercado enquanto amenidade local, além das demais relações

estabelecidas com a população local que incluem desde questões de acesso –

principalmente antes da implantação e asfaltamento da Rodovia Everaldo Martins (PA-

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457) – até questões simbólico-afetivas de uso, costumes, lendas e do imaginário

coletivo a seu respeito.

O sítio da Vila de Alter do Chão (formação que inclui o Rio Tapajós, a “Ilha”6 e o Lago

Verde) também tem sido divulgado e percebido, como o ícone da localidade, dadas as

particularidades da paisagem originada por seu conjunto, onde são enfatizados seus

aspectos naturais.

Tendo sido as primeiras vias de acesso para a interiorização do acesso na região

Amazônica, igualmente o Rio Tapajós, através de sua enseada em frente à “Ilha”,

constituiu o ponto inicial de sua ocupação, permitindo o acesso aos primeiros

colonizadores lusos.

Além do Rio Tapajós e do Lago Verde, outros limites do sítio que parecem

determinantes ao estágio atual da ocupação da área da Vila, podem ser citados o

Lago do Jacundá como obstáculo à Sudoeste da área central da Vila, e o morro do

Mingote com cotas de até 100 metros à Sudeste da mesma área. Ao Norte, Nordeste

e Sudeste, o limite físico é o próprio Rio Tapajós e o Lago Verde, e no sentido Sul, o

único limite de crescimento é o próprio limite municipal, não havendo, no entanto,

nenhuma barreira natural. A esse respeito, parece ser mais forte a tendência de

crescimento ao longo da Rodovia (PA- 457), do que propriamente nas áreas interiores

da Vila, ou seja, as áreas mais afastadas das margens do Tapajós e do Lago Verde,

possivelmente por questões de acessibilidade.

6 A referida formação é rotineiramente denominada de ILHA, principalmente pelos residentes, apesar de tratar-se de um banco de areia ligado ao continente, coberto com alguma vegetação.

FOTO 16: Vista aérea de Alter do Chão e seu entorno Fonte: A autora, 2005.

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Com relação aos cheios construtivos de Alter do Chão, conforme as informações

disponíveis apresentadas pelas plantas da COHAB7, observa-se a existência de uma

área de concentração construtiva nas áreas próximas à praça principal e à Igreja

Católica local, onde deu-se sua ocupação inicial, conforme frisado anteriormente

(Prancha 7). Esta área também coincide com parte das áreas mais valorizadas da Vila

pela vista da “Ilha” e por estar às margens do rio Tapajós.

Da mesma forma, observou-se, dada a crescente valorização imobiliária destas áreas,

uma tendência de adensamento nos lotes localizados ao longo das margens do Rio

Tapajós próximas à praia do Cajueiro e à praia do Jacundá, assim como, nos lotes

localizados ao longo das margens do Lago Verde, principalmente nas áreas mais

próximas ao centro da Vila.

Outras áreas que parecem apresentar algum adensamento são as áreas relativas ao

trecho final da estrada Dr Everaldo Martins (PA-457), já dentro da Vila de Alter do

Chão; e na área de predominância de apropriação por residentes no entorno da Praça

do Sairé, sendo que neste caso o que se observa por enquanto é apenas uma

tendência de adensamento.

Estes dados de concentração de construções e cheios e vazios construtivos podem

ser relacionados a três outros elementos morfológicos, segundo a classificação de

Lamas (2004), que são: o edifício, o lote e o logradouro. De forma que, com relação

aos edifícios, outro dado a considerar seria a altura dos mesmos.

No caso da área de análise deste estudo, há a predominância de construções térreas

e com dois pavimentos, sendo que, nas áreas apontadas como mais densas, há

também uma maior concentração de construções de dois pavimentos. Nesse aspecto,

destaca-se igualmente a existência de algumas construções compostas de três ou

quatro pavimentos, todas localizadas em áreas de amenidades e vinculadas à

atividade turística, seja por caracterizar infra-estrutura de hospedagem, seja por

caracterizar edifícios voltados à utilização como segunda residência de alguns

habitantes de Santarém.

7 Companhia de Habitação do Estado do Pará, cedidas pela Prefeitura Municipal de Santarém,

documento no qual são sinalizadas as projeções em planta das edificações existentes na Vila na ocasião do vôo realizado em Setembro de 1997.

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Da mesma forma em que, no caso do logradouro, enquanto elemento morfológico

constituído pela relação entre a área do lote e do edifício, também é possível verificar

a tendência de adensamento em áreas de amenidades, ou seja, com vistas para o rio

e sua paisagem, assim como, nas áreas próximas ao início de sua ocupação ao redor

da praça da igreja, espraiando-se em direção oposta ao rio e também na direção

oposta aos mais significativos eixos de transportes no local, na medida em que o

elemento Logradouro seria correspondente aos vazios construtivos (Prancha 7).

Com relação aos lotes, pode-se deduzir que os mesmos tendem a seguir as

características de adensamento observadas com relação às construções e com a

diminuição dos logradouros privados, conforme citado anteriormente, sendo

diminuídos também nestas áreas mais densas e seguindo o mesmo princípio de

concentração junto às margens do rio, às áreas do início da ocupação e às vias de

maior fluxo, diluindo-se no sentido oposto.

Informações mais precisas com relação aos lotes foram inviabilizadas possivelmente

pela falta de registro e oficialização quanto ao desmembramento dos lotes. Inclusive

pela tendência cultural de construir novas edificações nas áreas ainda desocupadas

do terreno para os filhos ou parentes.

No que diz respeito ao mobiliário urbano, muitas vezes visto como elemento de menor

importância no contexto urbano dada a sua relativa mobilidade e possibilidade de

câmbio, é possível perceber sua força expressiva na conformação da paisagem

urbana. Seja o mobiliário mais fixo - como quiosques, coretos, pontos de ônibus, entre

outros – ou ainda seja aquele com porte de acessórios - como placas, lixeiras, bancos,

entre outros - podem ter efeitos bastante significativos em dada paisagem e também

constituem uma das categorias dos elementos morfológicos definidos por Lamas

(2004).

No caso da Vila de Alter do Chão, o mobiliário está distribuído de uma forma bastante

heterogênea onde pode-se observar sua concentração nas praças e na orla,

especialmente no trecho da intervenção, conforme observa-se na Prancha 8. Neste

caso também é possível perceber que o mobiliário existente em outras áreas da Vila

se restringe aos telefones públicos que estão mais bem distribuídos pela Vila,

normalmente em frente à estabelecimentos comerciais ou equipamentos públicos. As

lixeiras disponíveis em outros locais (que não as praças), em geral são instaladas por

estabelecimentos privados, inclusive na Praia da “Ilha” e na Praia do Cajueiro, onde

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estes lixeiros são de responsabilidade dos barraqueiros. Pode-se afirmar que o

mobiliário urbano está mais densamente instalado nas áreas mais valorizadas da Vila,

coincidindo com a área de maior concentração de edificações.

O mobiliário existente nas duas praças é de tipologia diferenciada, não seguindo um

padrão, de forma que na Praça do Sairé o mobiliário existente é mais antigo, carente

de manutenção e substituição de peças destruídas tanto por vandalismo quanto pela

ação do próprio tempo. Seus bancos são em peças de madeira robustas pintadas em

um tom terracota, as lixeiras são metálicas em forma de paralelepípedo e os telefones

públicos tradicionais nas cores da empresa de telefonia que possui a concessão local

(observar fotos na Prancha 8).

Já no caso da praça da igreja matriz, o mobiliário existente encontrava-se em boas

condições mesmo antes da reforma realizada. Possuía bancos com assentos em

madeira com estrutura em ferro, lixeiras utilizando os mesmos materiais e o coreto em

ferro num estilo mais bucólico em ferro fundido; este mobiliário foi substituído por

bancos em ferro e concreto, lixeiras em plástico e ferro e coreto em ferro, concreto e

policarbonato. Esta brusca mudança no mobiliário, juntamente com outras

características locais, gerou forte polemica entre residentes e turistas, conforme já foi

citado anteriormente e conforme será abordado com mais detalhes na análise das

entrevistas.

Os telefones públicos distribuídos no local podem ser do tipo tradicional, mas também

se observa a presença de modelos diferenciados, com formas de animais da região,

como a arara azul, por exemplo, conforme é possível ver na Prancha 8.

Outra questão importante no que tange o mobiliário urbano é a presença abundante e

desordenada de placas e outdoors, especialmente nas vias de acesso, de maior fluxo

de veículos e do trajeto do transporte público, contribuindo para a degradação e

poluição da paisagem visual (ver fotos na Prancha 8).

Outras três categorias de elementos morfológicos que Lamas (2004) inclui em seu

estudo e que estão relacionadas à categoria de análise Ambiente Urbano, são: (1) a

árvore ou a vegetação, (2) o monumento e (3) a fachada ou o plano marginal, que

serão discutidas a seguir, segundo suas características na Vila de Alter do Chão.

No que se refere ao primeiro elemento morfológico, à vegetação existente na Vila, é

atribuída em grande parte o forte apelo natural da paisagem local, especialmente

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quando se trata da vista principal a partir da Vila, enquadrando a “Ilha”, a praia e o

morro.

Já na parcela urbanizada da Vila, a vegetação está distribuída especialmente na praça

da igreja matriz, em parte da Praça do Sairé, no cais da orla e nos logradouros,

especialmente nos privados, ou seja, nas áreas livres dos terrenos, dos lotes.

Assim, dado o parcelamento dos lotes e o adensamento construtivo nos mesmos,

especialmente nas áreas mais valorizadas e com esta tendência de aglomeração, tem-

se observado uma diminuição considerável da presença de vegetação através das

fotos de vários períodos e conforme os depoimentos de alguns residentes.

Além disso, outro fator agravante para sua diminuição permanente nas ruas e

logradouros públicos está relacionado à pavimentação e urbanização destas áreas,

apontando no sentido de sua perda gradual, bem como das conseqüências à

paisagem da Vila e ao conforto térmico local. Neste sentido, pode-se citar como

exemplo a retirada de duas “castanholeiras” durante a execução das obras do projeto

orla, para a construção de um abrigo em ferro e telhas cerâmicas, para os catraieiros.

Mesmo assim, a presença deste elemento ainda é significativa conforme pode ser

identificado nas Foto 17 e Figura 10. A região amazônica relaciona de maneira muito

significativa a vegetação no imaginário humano, especialmente no caso dos turistas,

onde a floresta densa é a mais presente relação apresentada à respeito da localidade

em questão, apesar da grande presença de áreas de savana e solos arenosos no

município de Santarém.

No que tangem as relações de memória que Lamas (2004) atribui aos monumentos

enquanto elementos morfológicos, pode-se afirmar que na Vila de Alter do Chão não

existe um monumento intencionalmente constituído. Os residentes foram questionados

a esse respeito e apontaram como monumentos para a comunidade local a igreja

(Foto 18) e o conjunto da “Serra Piroca” com a cruz instalada em seu topo (Foto 19).

Percebe-se, em alguns casos, que os residentes confundem a noção de

monumento/memória com a de marco visual. Outra possibilidade ainda, é que estes

locais realmente tenham o papel de lembrar aos habitantes atuais sobre a chegada

das missões jesuítas e a ocupação lusa no local.

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FIGURA 10: Imagem LANDSAT da região de Alter do Chão. Fonte: SECTAM, 2004.

FOTO 17: Levantamento Aerofotogramétrico de Alter do Chão. Fonte: COHAB/PA, 1999.

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No que diz respeito às fachadas, foram realizadas montagens fotográficas de maneira

a obter uma vista aproximada do plano marginal de alguns pontos da Vila, entre os

quais a Praça da Igreja Matriz e a frente da Vila. Observa-se no caso das fotos 20, 21,

22, 23, 24, 25 e 26, sendo possível constatar que os elementos de maior destaque em

cada uma delas (marcadas em vermelho), quebram o ritmo seja por sua altura e

volume, ou ainda, por sua tipologia diferenciada, além do uso de materiais e cores.

Pode-se afirmar que atualmente estas presenças ainda se diluem na paisagem,

especialmente em função da existência de arborização abundante, quem propicia

certa camuflagem das construções mais altas, todas localizadas às margens do Rio

Tapajós.

FOTO 19: Morro “Serra Piroca” Fonte: A autora, 2006

FOTO 18: Igreja Matriz Fonte: A autora, 2006

FOTO 21: Face frontal da Praça da Igreja Matriz Fonte: A autora, 2006

FOTO 20: Face esquerda da Praça da Igreja Matriz. Fonte: A autora, 2006

FOTO 22: Face direita da Praça da Igreja Matriz Fonte: Luciana Noronha Pereira, 2006

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Neste sentido torna-se evidente a preocupação com a manutenção da vegetação e

com o cumprimento da legislação vigente, no sentido da preservação do aspecto

rústico e bucólico da Vila, enquanto destinação turística na Amazônia. Essa

preocupação é pertinente na medida em que há um histórico de desobediência à

legislação municipal, segundo os interesses político-econômicos envolvidos, assim

como, um histórico de alteração da legislação em favor do mercado imobiliário, sem a

participação da comunidade nestas decisões desvinculadas de um planejamento de

longo prazo. Essas desobediências à legislação aliadas à introdução de novos

materiais e anseios construtivos na cultura habitacional da população local e de seus

investidores tem favorecido a alteração da paisagem urbana da Vila, assim como, tem

feito surgir novas formas de construir, novas tipologias

FOTO 26: Vista da Praia do Jacudá a partir do Centro de Atendimento ao Turista. Fonte: A autora, 2006

FOTO 25: Outra vista da Vila a partir da “Ilha” Fonte: A autora, 2006

FOTO 24: Vista da Vila a partir da “Ilha” Fonte: A autora, 2006

FOTO 23: Vista do Rio, Lago Verde e “Ilha” a partir da Praça da Igreja Matriz Fonte: A autora, 2006

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Deste modo, tomando como referência as paisagens urbanas apresentadas

anteriormente e tendo observado em campo tais características construtivas (incluindo

manutenções e alterações nestas edificações) puderam ser identificadas cinco (5)

tipologias básicas em de Alter do Chão. Estas tipologias podem ser descritas como:

- (1) Casa térrea, com cobertura tipo duas águas, com porta e janela na fachada

principal. Essa tipologia pode apresentar variações como, por exemplo, no número de

janelas na fachada, segundo a largura do lote e da construção. Construção

tradicionalmente em barro (taipa), ou ainda madeira, coberta em palha ou telha

cerâmica, possuindo variações mais atuais em alvenaria e cobertura em telhas de

fibro-cimento. É a tipologia mais observada na casa dos residentes, especialmente os

de famílias locais. Esta tipologia, especialmente quando em alvenaria, vem

frequentemente associada a uma maloca construída em área livre do terreno, com

estrutura em madeira e coberta de palha. Neste caso, quando existem muros e grades

eles costumam ser de altura moderada (Foto 27).

- (2) Casa térrea, com varandas e edículas com churrasqueira e convívio, com maior

quantidade de portas e janelas nas fachadas, normalmente construídas em alvenaria.

São em sua maioria casas de turistas de segunda residência, possuindo em geral,

muros e grades mais altos que os dos residentes (Foto 28).

- (3) Casa de dois pavimentos, normalmente com cobertura em duas águas, utiliza a

alvenaria e as telhas cerâmicas ou em fibro-cimento como materiais de construção,

costuma não possuir acabamentos – ou utiliza acabamentos simples. Construída

predominantemente por residentes, essa tipologia parece associar a planta da casa

tradicional, aumentando o número de quartos agora localizados no pavimento

superior, tendo normalmente uma pequena área por pavimento e pés direitos acima do

usual, fazendo-as parecer “desengonçadas”, desproporcionais (Foto 29).

- (4) Casa de dois pavimentos, com cobertura tipo duas ou mais águas, incluindo

varandas, com maior número de portas e janelas nas fachadas. Normalmente

construídas em alvenaria e cobertas com telhas de fibro-cimento ou cerâmicas,

cercadas com grandes muros ou grades, são quase sempre casas de segunda

residência (Foto 30).

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- (5) Construção com mais de dois pavimentos, em alvenaria e cobertura em telhas de

fibro-cimento ou cerâmicas. Tipologia associada também aos visitantes, seja como

condomínios multi-familiares de segundas residências, seja como meio de

hospedagem. Utilizam cores fortes e/ou acabamento cerâmico nas fachadas (Foto 31).

Nas entrevistas com os residentes, confirma-se a percepção das alterações nos

padrões, materiais e tipologias construtivas citadas anteriormente, de forma que boa

parte das pequenas casas de taipa, madeira e palha vêm sendo progressivamente

substituídas por construções maiores (inclusive prédios) em alvenaria.

Mesmo entre os turistas, especialmente os que já visitaram o destino mais de uma

vez, também existe a percepção do aumento da densidade construtiva, do número de

construções e da área construída, destacando ainda que a maioria destas não segue

os padrões tradicionais da cultura local, contribuindo para a descaracterização das

paisagens locais.

De forma geral, os residentes citam alterações nas apresentações dos elementos

morfológicos por eles observadas relatando nas entrevistas: o adensamento das

construções, a divisão de lotes, a supressão da vegetação dos terrenos, a construção

de cercas e muros altos, a ocupação de todo o lote com a construção, a

FOTO 27: Tipologia 1 Fonte: A autora, 2006

FOTO 28: Tipologia 2 Fonte: A autora, 2006

FOTO 31: Tipologia 5 Fonte: A autora, 2006

FOTO 30: Tipologia 4 Fonte: A autora, 2006

FOTO 29: Tipologia 3 Fonte: A autora, 2006

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desobediência aos parâmetros legais para construções, a construções no limite do lote

para a rua, entre outros.

Outra questão relacionada à categoria do Ambiente Urbano, presente nas entrevistas

são as conseqüências das interferências das obras realizadas no meio urbano na

qualidade do ambiente natural, bem como na preservação de suas características

elementares. Um dos problemas mais citados é o aumento dos sedimentos em

suspensão no Rio Tapajós e no Lago Verde, ocasionado pela erosão dos aterros

utilizado na terraplenagem das vias públicas pela chuva.

7.4 Percepção do Espaço Turístico da Vila de Alter do Chão (Residentes e

Turistas)

Sendo as mudanças na atratividade do destino e o papel da morfologia urbana para tal

o objeto central deste estudo, esta seção vem contribuir sobremaneira em direção à

resposta de nossa questão de pesquisa, uma vez que discorre sobre a percepção dos

usuários do espaço da Vila de Alter do Chão, sobre seus elementos constituintes,

sejam eles fixos ou fluxos.

As fotografias cedidas por residentes e turistas, além das próprias entrevistas abertas

semi-estruturadas, realizada sobre o argumento das imagens fotografadas,

forneceram informações diretas e indiretas sobre significados, imagens, imaginário

relacionados à Vila.

Dentre os residentes, a maioria das fotografias registra momentos em família ou

amigos, em festas de família ou da própria Vila, da comunidade, com ênfase às festas

de cunho religioso, dentre as quais Festa do Sairé, Dia do Índio, procissões católicas,

7 de Setembro, confecção do bolo de aniversário da Vila, danças folclóricas, entre

outros. Observou-se que momentos de procissões e festividades católicas são

bastante presentes nas imagens, fornecendo indícios da relevância cultural da religião

católica, tendo fundido-se aos costumes locais e a alguns traços da cultura indígena -

mescla notadamente presente na Festa do Sairé e nas comemorações do Dia do

Índio.

Assim, as pessoas costumam aparecer nas imagens dos residentes, como plano

principal, como objeto a ser fotografado. Apesar das pessoas em questão serem

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frequentemente amigos e familiares, muitas vezes o próprio turista é incluído como ou

entre os amigos e familiares nas cenas escolhidas para a realização das entrevistas.

No caso das fotografias apresentadas por turistas, também aparecem amigos que

viajam junto, alguns dos residentes da Vila com os quais foi estabelecido algum laço

afetivo, ou ainda algum personagem tradicional mais como registro de figuras típicas

de uma aventura amazônica, tais como catraieiros e pescadores. Também aparecem

os residentes em apresentações nas festas e seus ensaios e rituais – Festa do Sairé,

Dia do Índio – assim como as crianças em ambiente escolar ou em suas brincadeiras

e atividades ao ar livre.

Outras vezes, as fotografias apresentadas pelos residentes mostram os locais de

trabalho e atividades realizadas em seu âmbito – posto de saúde, cartório, escola e

festas e atividades internas - parecendo forma de exaltá-las, registrar seu

acontecimento, seu sucesso e os resultados alcançados.

FOTO 32: Turistas fotografados pelos residentes Fonte: Residente entrevistado 6, 2006.

FOTO 33: Residentes fotografados pelos turistas Fonte: Turista entrevistado 1, 2006.

FOTO 34: Paisagem como pano de fundo fotografada pelos residentes Fonte: Residente entrevistado 1, 2006.

FOTO 35: A paisagem e plano principal fotografada pelos turistas Fonte: Turista entrevistado 5, 2006.

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É nessa relação que se mantém o senso de lugar, através da memória coletiva

relacionadas aos rituais simbólicos e ao cotidiano de atividades comunitárias, de

maneira que o residente passa a entender a própria história através da história do

lugar, assegurada ao sentimento de vínculo, de pertencimento (RAMALHO e

SARMENTO, 2004).

No que diz respeito à paisagem, apesar de amplamente citada a característica de

orgulho de viver em Alter do Chão como paraíso natural, raramente estas mesmas

paisagens ocupam posição central, de destaque nas fotografias, apresentando-se

muito mais como cenário, pano de fundo das cenas registradas. Esta atitude pode

denunciar que estes residentes estejam mais habituados à paisagem, convertendo-a

assim em mero componente das festas ou mesmo das atividades cotidianas.

Essa relação inverte-se no caso das imagens selecionadas pelos turistas. Em sua

maioria, constituem registros de paisagens locais, cenas de pesca, pôr-do-sol, barcos,

rio, “Ilha”, morro, Ponta do Cururu, igapós, trechos da orla, igarapés, entre outros. Tal

é sua importância neste contexto que o turista muitas vezes apresenta a paisagem

sozinha, como argumento principal do registro, e quando o turista procurar fazer parte,

incluir-se nesse registro, ele procura integrar-se ao contexto natural mais como

registro de que lá esteve e que usufruiu do lugar.

Da mesma forma, nestes registros fotográficos (do turista) também são incluídos

animais e plantas coloridos, esquisitos, em tamanhos e formas não imaginados, além

de frutas, árvores gigantes. Também são objetos da atenção de suas câmeras a

intermitência da paisagem natural e sua transformação gradual à medida que o rio

enche ou seca.

Em todos os casos anteriores das fotografias de paisagens e elementos naturais dos

turistas parece haver embutida, caso as observemos simultaneamente à entrevistas,

uma preocupação ambiental, como registro do que está se perdendo, se acabando,

como se através destes registros fosse possível a “idéia da preservação integral e

inalterável do passado” a que se refere Dubois (2003), quando traça um paralelo entre

teorias Freudianas e a fotografia.

Nos poucos casos dentre os residentes onde a paisagem aparece como principal

argumento da foto, as imagens mais recorrentes são a “Ilha”, do morro da Serra

Piroca, do Lago Verde e seus igarapés, do pôr-do-sol, trechos da orla. Ainda sobre as

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imagens dos residentes, a paisagem também pode ser apresentada como registro ou

protesto das agressões ambientais observadas nas áreas do entorno, como o caso de

queimada em área de terras griladas e o tráfego de veículos na praia, que estaria

gerando a compactação da areia, a perda da altura da “Ilha” e o assoreamento do seu

canal, entre outros problemas ambientais.

Além destes problemas, que são muito mais apresentados como denúncia, como

protesto, do que propriamente como registro das mazelas locais, observa-se a

inexpressividade de imagens deste conteúdo, especialmente daquelas geradas

internamente à comunidade. Dentre problemas observados pelo pesquisador e não

apresentados nas imagens ou entrevistas estão o acúmulo de lixo, queimada de lixo,

problemas sanitários (abastecimento de água e coleta e tratamento de esgoto),

problemas de erosão, desmatamento de terrenos, escavação de morros para

construção ou retirada de areia e barro, entre outros existentes.

Essa omissão pode denunciar a não-consciência de sua existência, ou ainda uma

tentativa de esconder tais problemas, como Dubois (2003) também discute, também

com relação às teorias de Freud, sobre a analogia do recalcamento/enterramento, de

modo que a realidade assumida é anterior ao problema, quase como “congelada” do

tempo. Isso fica especialmente notável quando a população local mostra-se

plenamente esclarecida sobre a importância do fluxo de visitantes para a economia e

geração de trabalho e renda no local. Isso demonstraria a percepção pelos residentes

de que imagens negativas, especialmente de falta de cuidado ambiental, poderiam

afugentar os turistas.

Isso pode ser confirmado com as entrevistas, já que nesta oportunidade estes

residentes demonstram entendimento de que o turista vai à localidade em busca do

cenário natural e rústico e das sensações de tranqüilidade e fuga do estresse e dos

problemas cotidianos. São valorizadas pelos residentes certas paisagens que

consideram de maior interesse e atrativo para o turista, tais como a “Ilha” e sua a

praia, o Lago Verde e seus igarapés, o Rio Tapajós e o morro.

Essa relação com o turista é registrada em atividades que parecem demonstrar quase

um clima de festa em trabalhar e receber os turistas, alguns chegam a citar nas

entrevistas as cartas e presentes que recebem dos visitantes, os filhos e parentes que

casaram com estrangeiros e vivem em outros países reforçando ainda mais o tom de

satisfação e amizade.

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Essa relação parece ser recíproca, uma vez que vários dos turistas entrevistados

estavam no destino além da primeira vez, tendo citado entre os motivos de tantos

retornos, as amizades feitas. Os turistas também incluem imagens de pessoas da

comunidade, em um respeitoso tom de afeto, amizade, ou admiração.

Talvez em nome desta admiração e amizade conquistadas, as fotografias dos

residentes também parecem demonstrar – ou ainda procurar reafirmar – o orgulho de

suas tradições, em participar das festas e eventos, especialmente nos mais

importantes, onde receber personalidades ilustres ou ainda de outros países,

destacaria ainda mais seu senso próprio de orgulho e valorização.

Por diversas vezes as fotos apresentam traços marcantes da cultura local entre os

quais, redes, barcos, malocas, lavação de roupa nos rios, lazer das crianças e das

famílias nos igarapés e praias da região, entre outros. Entretanto, nas fotos dos

residentes isso parece acontecer de forma desavisada, impensada, já no caso das

fotos dos turistas, essas cenas são enquadradas propositadamente, como objeto

FOTO 36: Vista da “Ilha” fotografada por residentes Fonte: Residente entrevistado 2, 2006.

FOTO 37: Vista da “Ilha” fotografada por turistas Fonte: Turista entrevistado 5, 2006.

FOTO 38: Traços da cultura local fotografada pelos residentes Fonte: Residente entrevistado 5, 2006.

FOTO 39: Traços da cultura locai apropriada e fotografada pelos turistas Fonte: Turista entrevistado 6, 2006.

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principal de suas lentes. Ao que parece, esse registro das vivencias e experiências

junto à população local se dá num esforço de registrar, coletar amostras da vida local,

do desempenho das atividades cotidianas, de seu ritmo e de capturar

simultaneamente as sensações descritas como paz, tranqüilidade, o clima receptivo e

amistoso, a sensação de estarem “isolados”, “perdidos”, “esquecidos” dos seus

mundos e dos problemas e estresses que vêm com eles.

Os residentes argumentam a utilização das fotos como registro, como prova das

mudanças seja através das pessoas que participaram de determinados eventos, ou

mesmo das que não são mais vivas, das casas que foram modificadas, ou das que já

não existem mais. Já entre os turistas, embora esse argumento de registro também

apareça, essa característica de memória parece estar mais vinculada às alterações na

paisagem natural e no crescimento desordenado da Vila. Em ambos os casos as

fotografias parecem passar de “imagens latentes a imagens manifestas, estas

podendo ser imagens (ou lembranças) de projeção, imagens deslocadas, transferidas,

condensadas, manipuladas por todas as formas de trabalho da dinâmica psíquica”

(DUBOIS, 2003, p. 321).

No caso das imagens selecionadas pelos turistas, observa-se o comportamento

oposto ao hábito percebido nas imagens dos residentes. No caso dos turistas, as

fotografias parecem mais que simplesmente registrar paisagens ou cenas cotidianas,

parecem sim descobrir o lugar de diferentes ângulos, parecem testar a luz dos

diversos momentos do dia, parecem procurar detalhes especiais, enfatizar as

diferenças com relação ao seu local de origem, especialmente através de tudo que

lhes parecer inusitado, diferente ou desconhecido.

Esse olhar pouco acostumado parece denotar nas cenas fotografadas certo

encantamento com a paisagem, com a exuberância da natureza, com a simplicidade

da vida local, chegando algumas vezes a ser praticamente uma descrição poética,

romântica do lugar, implicando em que “sempre haverá invisível na imagem. (...) a foto

sempre será assombrada. Sempre será em (boa) parte, uma imagem mental”

(DUBOIS, 2003, p. 326 – grifo do autor)

Tanto no caso dos residentes como no caso dos turistas entrevistados, nas imagens

selecionadas pelos entrevistados são quase inexistentes os apelos ao consumo ou ao

capitalismo, expressos normalmente através da apresentação e exibição das posses,

roupas, acessórios, equipamentos, eletrodomésticos e eletroeletrônicos, veículos,

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casas, móveis, etc. No caso dos turistas, esse fato ganha um reforço de significado

com fotografias que parecem pretender “defender” o lugar, o “paraíso” local, com

poucas necessidades materiais agregadas, exceto as próprias câmeras fotográficas.

Isso pode nos fornecer um novo indício do motivo pelo qual a maioria das cenas

registradas e selecionadas por residentes se dá ao ar livre, no espaço público. Este

fato pode ainda indicar que na Vila de Alter do Chão, o espaço público de alguma

forma ainda se sobrepuje à propriedade privada (neste caso, não se está levando em

conta os proprietários de segunda residência que parecem ter comportamento

contrário, e que não foram abordados nas entrevistas).

Da mesma forma, as fotos de residentes que são registros de propriedades privadas

são frequentemente nas áreas livres ou nas malocas existentes nos lotes, nunca no

interior das casas. Numa tentativa de “saber ver além, ao lado, através” (DUBOIS,

2003, p. 326) da imagem fotográfica, pode-se inferir que a casa é menos utilizada que

suas áreas externas, ou mesmo que os residentes preferem omiti-las, escondê-las, ou

ainda, que a vida social, em comunidade ainda é mais significativa.

E como, “no processo fotográfico, os processos psicológico e social das personagens

fluem das imagens visíveis e nítidas dos seres em movimento constante para as

imagens amareladas (...)” (LEITE, 2001, p. 48), essa afirmação das relações sociais

pode ser observada na intensidade dos hábitos de uso do espaço urbano, de modo

que a rua, as praças, a praia, a sombra das árvores são algumas das possibilidades

de locais de encontro, de prática e convívio social. O envolvimento comunitário local

pode ser justificado pelas relações de compadrio ainda visíveis entre os residentes –

onde todos parecem se conhecer e ter algum tipo de aproximação ou grau de

parentesco – ainda que estas relações venham perdendo força dado o aumento das

noções de capital, de acumulação, de consumo, propriedade entre sua população.

No caso dos turistas também predominam as cenas ao ar livre, apresentando

conforme já dito, em sua maioria com argumento natural ou cultural local, mostrando a

satisfação, a felicidade, a liberdade dessas descobertas. Entretanto, apesar de serem

imagens ao ar livre, ao contrário dos residentes, poucas vezes aparecem as áreas

urbanas da Vila, e quando estes locais aparecem normalmente estão restritos à praça,

à casa de hospedagem, às barracas da “Ilha”, ou no máximo aos locais próximos

como, por exemplo, a esquina do açaí.

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Com relação às festas, os residentes percebem o crescente caráter comercial da

Festa do Sairé, mesmo afirmando que ainda participam maciçamente do evento,

denotam que a comemoração vem se tornando muito mais um compromisso com os

visitantes, com os turistas. Por sua vez, os turistas também percebem esse

compromisso crescentemente comercial, demonstrando certo repúdio à sujeira, ao

lixo, ao barulho, à superlotação, às barracas na praça, afirmando que a festa deixa

muito poucos benefícios à Vila e à comunidade, sendo esta festa usufruída

predominantemente pela população de Santarém e Manaus.

O intenso envolvimento e participação da população local nas festas religiosas,

inclusive na Festa do Sairé, demonstram a religiosidade da comunidade e seus

hábitos de vida, ainda que, como religião imposta, o catolicismo tenha se fundido a

algumas características da religiosidade indígena. Essa fusão parece ter criado uma

combinação cultural da qual a população residente afirma orgulhar-se, demonstrando-

o através da valorização e incentivo de esforços em geral com o objetivo de

FOTO 40: Uso do espaço público fotografada pelos residentes, na década de 80 Fonte: Residente entrevistado 7, 2006.

FOTO 41: Inexistência de equipamentos e apelos ao consumo, fotografada pelos turistas Fonte: Turista entrevistado 8, 2006.

FOTO 42: Vivência ao ar livre e relações de compadrio fotografada pelos residentes Fonte: Residente entrevistado 1, 2006.

FOTO 43: Barracas da praia fotografada pelos turistas Fonte: Turista entrevistado 8, 2006.

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divulgação, resgate e fortalecimento da cultura local. A comunidade tem demonstrado

interesse em especial, ao resgate da cultura indígena pré-existente, na aldeia Borari.

Essas iniciativas são valorizadas no depoimento dos turistas que afirmam a

necessidade de manutenção da cultura local e das tradições, inclusive em sua vida

cotidiana. Conforme frisado anteriormente, esses turistas demonstram interesse pelo

ritmo de vida menos apressado e estressado da Vila, pela simplicidade das

construções e do modo de viver, valorizando e reconhecendo na comunidade esse

esforço em resgatar e fortalecer sua cultura, entre outras coisas, através das festas e

do artesanato.

A receptividade aos turistas, seus hábitos, religiões e todo o tipo de intercâmbio

cultural, afirmada pelos residentes durante as entrevistas, é citada pelos turistas como

uma importante característica local para o interesse turístico, chegando a descrever

estabelecer laços afetivos semelhantes aos laços familiares com alguns dos

residentes e vice-versa.

Uma preocupação de cunho sócio-cultural foi citada igualmente por um turista e um

residente, relatando os problemas especialmente relacionados aos jovens do local

como o alcoolismo. O turista chega a traçar um paralelo sobre diversos episódios

históricos onde o alcoolismo atingiu algumas populações indígenas pelo mundo. A

complexidade deste tema exigiria um profundo estudo histórico e antropológico das

relações estabelecidas entre populações indígenas colonizadas e o alcoolismo, o que

não é objeto deste estudo.

Como monumentos representantes da função de memória para a comunidade da Vila,

foram citados a igreja – como construção mais antiga, que utilizou mão-de-obra

comunitária imposta pelos padres – além do conjunto formado pelo morro da Serra

Piroca com a cruz em seu cume. Nesse caso, os residentes confundiram as noções de

monumentos de memória com as noções de marcos visuais ou ainda monumentos

naturais.

Dentre os elementos da paisagem mais marcantes como identificadores de Alter do

Chão, foram destacados por residentes e turistas a “Ilha” com sua praia e o morro da

Serra Piroca ao fundo, tendi sido incluídas pelos turistas também as barracas e todo o

restante do conjunto cênico formado pelo Lago Verde e pela enseada do Rio Tapajós.

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O rio é um dos elementos mais fortes pelas citações nas entrevistas realizadas com

turistas. A primeira referencia feita tem relação com o impacto visual do tamanho de

um rio e torna-se recorrente a sua comparação com o oceano, com o mar,

incorporando aí a beleza da cor da água e também associando idéias de abundância

em água doce, já escassa em diversas localidades do mundo. Além disso, são feitas

observações à respeito das diversas formas pelas quais este rio determina o ritmo e o

modo de vida no local, seu papel determinante nos fluxos, no transporte, na

acessibilidade à própria Vila e aos locais no entorno. Nos depoimentos dos turistas é

enfatizado que o rio é, ao mesmo tempo, atração turística com a praia de águas

mornas “como um banho”, e de outro lado, é também fonte de alimento, subsistência

da população.

Os turistas afirmaram nas entrevistas gostar de fotografar, registrar e observar plantas

e animais e sua existência presente, incluindo o registro das mudanças para

comparações futuras das perdas ambientais, talvez também como tentativa de resistir

ao tempo e aos lapsos de memória, de modo que o “tempo fotográfico recompõem o

tempo da memória, alheio ao tempo cronológico” (ROCHA e ECKERT, 2001, p. 12).

Se dá, assim, uma valorização destacada dos cenários naturais, quase não referindo-

se à parcela urbana da Vila, sendo que, quando essa referência acontece, é

majoritariamente negativa.

A população demonstra certo entendimento com relação à importância desse cenário

natural para o desenvolvimento da atividade turística, aparentando uma crescente

consciência da necessidade da preservação de habitats em prol da biodiversidade e

do turismo, especialmente em ambientes amazônicos citados pelos turistas como

FOTO 44: Uso turístico do rio fotografado pelos turistas Fonte: Turista entrevistado 6, 2006.

FOTO 45: Inseto “exótico” fotografada pelos turistas Fonte: Turista entrevistado 6, 2006.

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“especiais” tais como os igapós que tem amostra nas proximidades da Vila de Alter do

Chão.

Provavelmente essa percepção negativa da porção urbana da Vila por parte dos

turistas entrevistados, tenha íntima relação com a declaração dos residentes que

relata a perda do patrimônio construído da Vila, especialmente no caso das formas de

baixa permanência, ou seja, nas casas de taipa, palha e madeira normalmente

propriedade dos locais.

Alguns destes residentes chegam a demonstrar certo saudosismo dos tempos de

infância, da maior tranqüilidade de vida, do ritmo mais lento, da maior rusticidade da

Vila, da praça, das casinhas tradicionais outrora existentes. Essa descrição coincide

com a abordagem feita por Leite (2001, p. 46-47) que discute o ato de

contemplação da fotografia como culto da imagem e fixação da lembrança. (...) [de modo que] O movimento de semi-esquecimento para lembrança viva e dolorosa é intermediada pela fotografia que ora se inviabiliza, pela constância da percepção, ora ganha contornos nítidos e chega a sair da moldura e se alastrar em três dimensões, através da evocação intensa de que a contempla

A fantasia da permanência e da continuidade da vida acima relatada foi interrompida

com a abertura da estrada PA-457 ou Rodovia Everaldo Martins na década de 70, que

trouxe aos residentes grandes facilidades de transporte e acesso à energia elétrica

distribuída continuamente, à saúde, à educação, aos insumos para a atividade turística

que então se intensificaria, assim como a todo tipo de produtos e serviços aos quais

Santarém já dispusesse. A estrada possibilitou o aumento significativo do fluxo de

visitantes, induzindo assim a uma mudança nos modos de produção locais – onde o

extrativismo e a agricultura foram progressivamente cedendo espaço ao turismo – e a

um incremento na geração de trabalho e renda e mudanças das relações com o

capital – um comércio baseado em escambo e vales dando espaço à circulação

monetária.

Entretanto, a construção da estrada também foi descrita como risco no que diz

respeito ao aumento no trânsito de veículos e de pessoas desconhecidas, incorrendo

na diminuição da tranqüilidade local, especialmente no quem se refere às crianças que

ainda utilizam a rua como espaço de lazer e à segurança das casas.

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Os residentes também citaram que a abertura e o posterior asfaltamento da estrada,

acabou determinando a valorização dos lotes de posse dos residentes tradicionais, em

especial os localizados em áreas de vista e acesso privilegiado, culminando na sua

venda pelos locais que fixavam-se no argumento da venda para uma melhoria de vida,

construindo uma casa “melhor” em áreas onde o preço do solo fosse menor.

Neste caso é também possível observar que, construir uma casa “melhor” esta

diretamente relacionado à uma tentativa de “imitar”, copiar as casas de segunda

residência, passando a abandonar as técnicas tradicionais de construção e

valorização ao uso da alvenaria e de outros materiais industrializados e

estandardizados, sem no entanto conseguir finalizar acabamentos e certo nível de

conforto e adequação.

Esse desejo da alteração dos materiais e padrões construtivos parece muito mais

associado à idéia de que as casas tradicionais da comunidade são propriedades de

pessoas pobres. As pessoas com boa situação financeira teriam casas construídas em

alvenaria (segunda residência ou semelhantes). Essa noção parece dominar seu

imaginário mais do que propriamente o conforto ou desconforto das casas tradicionais,

uma vez que essas são citadas inclusive como de melhor desempenho e conforto

térmico.

Assim sendo, a população nativa parece entender, segundo seus depoimentos nas

entrevistas, que viver melhor significaria uma conseqüente construção de casas de

alvenaria, mesmo que para isso seja necessária a saída do lote mais valorizado e a

conseqüente alteração das então estreitas relações com o rio. Entretanto, alguns

percebem que muitas vezes essa tentativa acabou gerando ainda mais pobreza,

dificuldade de acesso aos meios de subsistência, favelização da Vila, fora os casos

onde os recursos advindos da venda dos lotes foram gastos para outros fins, não

permitindo sequer a permanência na Vila, induzindo ao surgimento posterior de outras

comunidades ao longo da rodovia.

A perda de identidade construtiva e urbana gerada por essas mudanças e a

conseqüente tendência de homogeneização da paisagem urbana, é aparente em

alguns discursos de residentes. Esse discurso passa então a sugerir, no caso da

reafirmação do desejo de substituição das construções tradicionais pelas de alvenaria,

a utilização de uma maloca aberta em madeira e palha na porção frontal dos lotes,

diminuindo a homogeneidade das fachadas e identificando os moradores nativos.

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Essas mudanças nas paisagens urbanas e as tendências homogeneizadoras são

citadas pelos turistas como causas de uma progressiva perda de interesse pelo lugar.

Dentre as mudanças citadas estão a perda da identidade e das belezas naturais, o

excesso de uso de asfalto, cimento, entre outros afirmando que querem ver no destino

“o verde” e não concreto.

Os comentários mais negativos no que tange às construções e suas características

morfológicas foram feitos por turistas, de forma que houveram recorrentes referencias

negativas às construções mais altas, às que ocupam todo o lote e retiram toda a

vegetação, assim como as construções que não levam em consideração a utilização

de uma linguagem tida como regional em sua tipologia e partido. Dentre as

construções que mais aparecem citadas dentro desse discurso, pode-se citar o Hotel

Mirante, localizado na orla de Alter do Chão, com vista para a “Ilha”.

Com relação às obras da praça da igreja matriz e da orla da Vila, existem discursos

diferenciados entre os turistas, mas principalmente entre os residentes. Entre os

residentes, existem dois discursos síntese dentre os quais o primeiro (1) acredita que

as obras são boas, importantes para a comunidade, que são conseqüência do

progresso e do qual não é possível escapar, nesse caso os materiais utilizados são

considerados bons por uma suposta durabilidade. O segundo discurso observado

entre os residentes (2) percebe a obra como necessária, entretanto, frisa que a

mesma deveria ter sido planejada em maior consonância com a cultura local,

utilizando materiais e linguagem regionais, de forma que neste caso os materiais

utilizados na obra são considerados inadequados ao clima e à composição com o

cenário natural do entorno.

No caso dos turistas, os discursos apresentam-se mais homogêneos, variando, no

entanto, sua intensidade. O primeiro discurso aparece em consonância com o

segundo grupo de residentes, entendendo a obra como necessária, mas sem a

preocupação com os apelos locais e naturais que a referida obra requisitava. O

segundo discurso apresenta um posicionamento pouco mais radical, afirmando que a

obra está descontextualizada e em desacordo/contradição com o local e sua paisagem

natural. Seja qual for o discurso dos turistas, em sua opinião a obra da forma que foi

feita, destrói o “charme” da Vila.

Com as entrevistas realizadas foi observado que a simples opção da utilização mais

abundante de vegetação e de materiais regionais, naturais, mudaria

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consideravelmente o posicionamento da maioria dos entrevistados respeito da obra.

Entre os turistas, o argumento para tal valorização negativa a esta obra, reside em um

anseio de diferenciação, uma espécie de rejeição à homogeneização. Presente na

afirmação de que Alter do Chão precisa manter-se diferente de Belém, Manaus ou

Santarém, esse argumento indica um desejo de que a Vila não cresça tanto e tão

desordenadamente, não sendo muito urbanizada e assim mantendo as características

naturais e certa rusticidade, mais próximas do imaginário de Amazônia descrito

posteriormente.

Assim, observa-se nos discursos dos turistas que estes não são contrários às

melhorias, desde que estas sejam realizadas dentro de um planejamento e execução

mais condizente, adequada e integrada à realidade local, assim como ao cenário

natural.

Neste âmbito, são valorizadas as construções que conseguem manter e associar-se a

parte da vegetação do lote, considerando negativo o atual hábito local de desmatar

todo o lote para inserção da construção. Estes logradouros arborizados, mesmo

quando existem construções nos lotes, favorecem um estilo de vida também

valorizado pelos turistas entrevistados. Voltado para a realização de tarefas e

encontros ao ar livre, as construções consideradas com linguagem regional adequada,

deveriam privilegiar o uso de redes, as áreas de varandas, as construções abertas, o

uso de materiais construtivos e de acabamento regionais - dentre os quais a madeira,

a taipa e a palha - mantendo traços culturais como argumento fundamental de seu

partido. Desta maneira a Vila manter-se-ia, na opinião dos turistas entrevistados, mais

natural e mais rústica.

Da mesma forma, os turistas ainda acreditam que essas características deveriam

transbordar o interior das casas e propriedades privadas, para o espaço público

através da valorização e do incentivo ao caminhar à pé, à utilização de bicicletas e

canoas em contraposição aos automotores, lanchas, jet-skis e o conseqüente aumento

da área asfaltada/cimentada e dos riscos aos banhistas.

Apesar de todas as características citadas como ideais por estes turistas

entrevistados, a maioria destes antes de ir à Alter do Chão, nunca tinha sequer ouvido

falar da destinação, tendo afirmado ter decidido ir conhecer a Vila somente quando,

em Belém ou Manaus, alguém falou à respeito do lugar, ou porque estavam em

Santarém por outros motivos e atividades.

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O imaginário precedente da região amazônica de uma forma geral referenciado por

esses turistas incluíam uma floresta mais densa, mais exuberante à encontrada nos

arredores da Vila de Alter do Chão, o rio de águas barrentas e escuras, maior

quantidade e visibilidade de animais silvestres, maior presença de comunidades

indígenas e caboclas, maior pobreza e isolamento da população residente.

A ênfase dada a essas características mais rústicas do modo de vida, de produção, de

moradia e transporte do indígena e do caboclo, também criaram um imaginário

associado a uma população que ainda mantivesse vínculos mais fortes com a terra, o

extrativismo e a agricultura, ou seja, menos turística como nesse caso.

Assim, essa expectativa relacionada ao modo de viver amazônico e à exuberância do

cenário natural, relaciona-se com as declarações que destacam que as paisagens da

localidade, tanto naturais quanto urbanas, devem ser preservadas da homogeneização

e da imitação dos demais destinos balneários existentes em qualquer lugar do mundo.

Sob esse fato pesa a ameaça de torná-lo apenas mais um destes destinos, como

outro qualquer, só que com uma grande periferia pobre e com enormes problemas de

ordem socioeconômicos sobre os quais a administração pública de uma região pobre

tem pouca inferência.

Ainda segundo os relatos dos turistas, o que mais chama a atenção na Vila de Alter do

Chão, que não era esperado em uma destinação amazônica, é a água clara e as

areias brancas. A esse respeito também destaca a beleza, as luzes e as cores do pôr-

do-sol quase como “espetáculo” que acontece todos os dias, alguns chegam a

descrever o pôr-do-sol e o nascer da lua que acontecem simultaneamente.

Entre os aspectos positivos também é citada a busca pelo sossego, pela paz,

tranqüilidade e contato com a natureza. Entretanto, essa expectativa pode ser

prejudicada por problemas citados como a poluição sonora causada pelo alto volume e

pela competição das fontes sonoras e músicas, gerada principalmente por bares e

veículos automotores dos proprietários de segunda residência e dos visitantes de

Santarém.

Outra expectativa frustrada citadas pelos turistas é a falta do Museu do Índio, cuja

estrutura ainda existe na Vila, que era bastante valorizado e procurado especialmente

pelos turistas internacionais, que atualmente encontra-se fechado, dadas disputas por

herança, uma vez que o museu era de propriedade privada.

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Ainda assim, nas entrevistas com turistas, Alter do Chão é descrita como um dos mais

interessantes destinos da Amazônia, uma vez que agrega aos atrativos tradicionais da

Amazônia e a possibilidade de diversificação dos atrativos naturais em áreas

próximas, às características balneárias tais como água clara e areia branca. Alguns

turistas chegam a referir-se a algumas modalidades de baixo impacto, entre os quais

retiros de meditação, lua-de-mel, ecoturismo, observação de pássaros, descanso e

relaxamento, entre outros.

7.5 Espaços Síntese da Vila de Alter do Chão

Nesta sessão serão apresentadas as idéias síntese desse estudo, conforme análise

das categorias exposta anteriormente. Com relação aos espaços síntese do espaço na

Vila de Alter do Chão, eles parecem estar associados às duas praças, assim como

também às duas centralidades identificadas (ver figura 11).

O primeiro aparece incluindo a área da igreja matriz e sua praça e da orla. A área

considerada de apropriação predominante por turistas, ainda assim é amplamente

utilizada por residentes, não havendo segregação, especialmente nos períodos de

menor fluxo de visitantes. É nesta área e em suas proximidades que a vida urbana da

Vila de Alter do Chão parece mais condensada, mais diversificada, com a variedade

de comércio, casas, pousadas e restaurantes, e relacionada a grande maioria dos

comentários e citações nas fotografias e entrevistas realizadas.

Por estes motivos, pode-se considerar que este espaço síntese também gera em torno

de si, a principal centralidade da Vila, concentrando além das construções, também os

serviços públicos e turísticos, além do comércio local.

O segundo espaço síntese observado, é aquele o qual abrange a Praça do Sairé,

localizada mais ao centro geográfico da Vila com maior apropriação dos residentes

uma vez que não costuma exercer atratividade nos visitantes – exceto durante a Festa

do Sairé – mas que ainda assim não é impermeável aos mesmos. Neste espaço,

apesar da pouca estrutura e manutenção, acontecem diversas atividades esportivo-

recreativas da comunidade, entre os quais torneios de futebol e caminhadas.

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FIGURA 11: Espaços Síntese da Vila de Alter do Chão. Fonte: A autora, 2007.

Em torno desta praça também se desenvolveu um comércio mais voltado ao

atendimento de necessidades básicas da população local, tais como gêneros

alimentícios e materiais de limpeza, criando ao redor da praça o que é aqui

considerado como uma centralidade secundária.

As principais vias da localidade, paralelas às margens do rio, passam por estes

espaços síntese e são asfaltadas. Outras vias importantes a serem ressaltadas nesse

conjunto são a via do transporte urbano coletivo que passa mais próximo à primeira

centralidade – uma vez que não circulam ônibus pela via da orla – além da própria

estrada e de mais duas vias perpendiculares às margens do rio que fazem a ligação

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entre as citadas anteriormente. Uma destas, passa em frente ao principal colégio da

Vila e a outra, dá acesso à grande parte dos equipamentos públicos instalados em

direção à praça da igreja matriz.

Nesse sentido faz-se importante ressaltar que parece haver uma concentração dos

equipamentos públicos ao longo da via que dá acesso à praça da igreja, apontando

para a centralidade e importância local, indicando também a permeabilidade desta

área aos residentes. Essa área também concentra a maior quantidade de vias

asfaltadas e a maior densidade construtiva de toda a Vila, fazendo emergir questões

relacionadas às vias pavimentadas e sua possível relação/interferência na densidade

construtiva ou ainda na definição do trajeto do transporte público.

Dentre os locais mais citados, mais recorrentes como temas das entrevistas e

fotografias apresentadas, estão a própria “Ilha” de Alter do Chão e o conjunto

paisagístico formado pelo Lago Verde, o rio Tapajós, o morro da Serra Piroca, a

vegetação preservada e as barracas rústicas na praia da “Ilha”. Fora essa

predominância do ambiente natural nestas referências, também são fortemente

citadas as duas praças e alguns elementos de destaque, de referência na paisagem

urbana, inclusive alguns de maneira negativa, tal como o Hotel Mirante.

Além do Hotel Mirante, aparecem como outros elementos de destaque e referência

urbana o Centro de Atendimento ao Turista (CAT), o Beloalter Hotel, a Igreja matriz e

o colégio municipal.

O Rio Tapajós também constitui elemento de destaque e referência, tendo sido citado

por diversas vezes, ora pelo impacto visual de seu tamanho, pela recorrente

comparação com o oceano, pela cor da água considerada clara, por sua temperatura

agradável - morna para alguns. O rio também é destacado por sua importância no

ritmo e no modo de vida impresso na Vila, por sua importância no transporte e na

acessibilidade local, além de seu papel como recurso turístico e como provedor da

subsistência em um modo de vida tradicional. Fesenmaier e MacKay (2000), em seu

artigo ressaltam a importância da água como dimensão visual embutidas nas imagens

de destinações para diferentes grupos culturais. Os autores referem-se aos diversos

significados atribuídos a este elemento segundo o backgroud dos entrevistados, tendo

sido a água relacionada à natureza, a sentimentos como a paz, além de aspectos

“espirituais”, relacionando-a como “desconhecido e natural” (p. 421).

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O turismo é destacado como forma de sustento entre os residentes entrevistados. Já

no caso dos turistas, a idéia síntese parece relacionar a importância das

características naturais e da rusticidade da Vila de Alter do Chão, para seu interesse

turístico pelo destino.

Neste caso, é enfatizado que a Vila procure guardar suas diferenças das cidades

grandes, buscando manter as raízes tanto na tipologia das construções e utilização de

materiais regionais, quanto no artesanato, ritmo e modo de vida. Para o turista, a

aproximação com a natureza e com a população local através do andar a pé, de

bicicleta ou de canoa é desejável, possibilitando um maior relaxamento e saída da

rotina, além de uma nova maneira de ver as paisagens urbanas e naturais e a vida em

Alter do Chão.

As transformações atuais, da forma como vêm acontecendo, têm implicado em uma

diminuição do interesse turístico pelo destino, pela percepção de que estas mudanças

seguem tendências de homogeneização já observadas em diversas outras

destinações turísticas pelo mundo. Dentre as características citadas como negativas e

fora das expectativas sobre a Vila estão a destruição/descaracterização das paisagens

naturais, a crescente urbanização com o aumento da densidade construtiva, dos

gabaritos e taxas de ocupação, o desaparecimento das construções tradicionais que

têm cedido lugar para um número cada vez maior de construções urbanas, perda de

identidade, excessivo uso de asfalto, concreto e cimento, entre outros.

O principal argumento para interesse pela destinação turística da Vila de Alter do Chão

é o fato relacionar os atrativos tradicionais da Amazônia – cultura cabocla e indígena,

floresta, rio barrento, animais, entre outros - em seu entorno e da existência de

características balneárias – águas claras e areia branca, sendo referenciado também

como um local de distribuição de fluxo, uma vez que é vista como um bom local para

começar e terminar expedições a locais mais primitivos.

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8. CONSIDERAÇÕES, LIMITAÇÕES E RECOMENDAÇÕES.

Conforme foi possível observar ao longo desta pesquisa, podem ser inúmeras as

características que determinam a atratividade exercida pela destinação sobre o seu

público consumidor. A maioria destas características tem relação com o imaginário

formulado pelo turista a partir de imagens da mídia, de fotografias, filmes, além de

seus próprios filtros culturais.

Nesse imaginário são relacionados fragmentos que formam um conjunto mais ou

menos conciso, incluindo dados sobre as pessoas, as paisagens – tanto as naturais

quanto as construídas, o modo de viver, entre outros. É no contexto das paisagens

que está relacionada a morfologia urbana - já que a constituição e combinação dos

elementos morfológicos determinam a configuração da paisagem - enquanto um dos

fatores capazes de exercer atração ou repulsa nos usuários/consumidores deste

espaço.

O suporte teórico utilizado na base da pesquisa integrou diversas linhas teóricas inter-

relacionadas, de modo que originaram um modelo teórico multidisciplinar que inclui os

pressupostos propostos, combinando idéias dos diversos autores apresentadas ao

longo deste trabalho, conforme é possível observar na Figura 04 a seguir:

Segundo este modelo, o espaço é estudado como base territorial sobre a qual as

atividades humanas se desenvolvem, inclusive o turismo. O pressuposto da

sustentabilidade adere-se ao modelo enquanto princípio de equilíbrio, longevidade e

continuidade deste espaço enquanto produto turístico. A semiótica inclui a este

desenho teórico o princípio de geração, auto-geração e associação de idéias sobre os

aspectos concretos do espaço (neste caso, a partir de imagens), relacionando-os a

características afetivo-simbólicas.

Nesta perspectiva, a busca da sustentabilidade espacial se dá através do

planejamento e da gestão; a atratividade é um fator imprescindível à sustentabilidade

de qualquer produto turístico relacionando expectativas de seus

consumidores/usuários; e a percepção e o significado do espaço, relativos às suas

características especificas, apoiados e relacionados pelo mesmo processo de geração

e associação de idéias propostas pela semiótica.

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FIGURA 12: Resumo esquemático do modelo teórico Fonte: A autora, 2007

No caso da Vila de Alter do Chão enquanto uma destinação amazônica tornou-se

perceptível que não havia um imaginário específico da Vila, mas sim uma expectativa

relacionada à Amazônia em geral. Desta maneira, a percepção do ambiente

amazônico como majoritariamente natural, ocupado por populações indígenas ou

caboclas, que convivem e integram-se harmonicamente ao meio natural, determinam

um imaginário de urbanidade mais simples, esparsa, rústica, mais suave e imbricada

às características naturais.

Cabe aqui ressaltar as considerações apresentadas na sessão sobre “Procedimentos

Metodológicos” (YIN, 2001) na qual fica registrada a importância e a possibilidade de

generalização analítica, a partir de um estudo de caso. No que diz respeito a esta

pesquisa, foi possível observar a evolução do objeto de pesquisa, inicialmente

fundamentada nas relações simbólicas do espaço da referida Vila, tendo ganhado o

SISTÊMICA

Capra (2002)

ATRATIVIDADE

Horner & Swarbrooke (2002)

SUSTENTABILIDADE

OMT (2001) Horner &

Swarbrooke (2002)

SEMIÓTICA Santanaella e Nöth (1998) Santanaella (2000) Epstein (2001)

ESPAÇO

Lamas (2004) Santos (1992) Goulart (2005)

PLANEJAMENTO E GESTÃO

Anjos (2004)

Hall (2004) Goeldner et al (2002)

PERCEPÇÃO E SIGNIFICADO Capra (2002) Ferrara (1997) Hillman (1993) Urry (1999)

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corpo de um estudo mais abrangente, relacionado à destinações amazônicas de uma

forma geral.

Deste modo, muitas das expectativas com relação às construções nestas destinações

turísticas localizadas na Amazônia, estão relacionadas à presença e conciliação com

as árvores e a vegetação, com adensamento baixo à moderado e com a utilização de

materiais regionais. Assim, toda a composição dos elementos morfológicos passa pelo

estabelecimento de uma paisagem bucólica, de vilarejo.

Entretanto, muitas dessas características vêm se perdendo com o advento da mesma

atividade que as valoriza: o turismo. A ascensão da localidade enquanto destinação

turística impulsionada pela melhoria das condições de acessibilidade determinou a

valorização da terra, a construção das casas de segunda residência e a mudança dos

modos de produção local, contribuindo no sentido de uma tendência homogeneizadora

de paisagens.

No caso da Vila de Alter do Chão, ainda assim, a segregação entre residentes e

turistas não se faz marcada. O território apresenta ampla permeabilidade a ambos os

grupos, muito embora sejam observadas tendências, predominâncias na apropriação e

no uso deste espaço. Nesse sentido, é apontada a existência de áreas que despertam

menos interesse aos turistas pela ausência de atrativos e amenidades naturais (como

a proximidade do rio, da floresta, uma vista especial, etc.), assim como locais de

inibição do residente quando do convívio com o visitante, o turista.

Estas apropriações são marcadas notadamente por dois espaços síntese, assinalados

pela existência das duas praças e das duas centralidades que giram em torno das

mesmas. Consensualmente, o principal marco, referencia local, descrito pelos grupos

de usuários/consumidores do espaço que adquire tal relevância a ponto de ser visto

como índice iconográfico de Alter do Chão é constituído pela paisagem da “Ilha” a

partir da orla, incluído todo o conjunto do Lago Verde, do Rio Tapajós, do morro da

Serra Piroca, da vegetação nativa e das barracas na praia.

Desta forma, a prerrogativa do desenvolvimento turístico, em modalidades de baixo

impacto, deveria levar em consideração os princípios de manutenção das

características originais da localidade, assim como de suas características naturais.

Para tal, o estabelecimento de áreas de proteção – de preferência em unidades de

conservação implantadas, geridas e fiscalizadas – e do plano diretor municipal que

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leve em conta os limites da sustentabilidade natural e cultural e também estabeleça

limites e critérios para a ocupação da área urbana da Vila.

Estabelecer uma política de incentivos à utilização de materiais e linguagem regional,

adequados à cultura local, também parece ser salutar. Mas, inicialmente faz-se

necessário que o próprio Poder Público como principal agente na formação do espaço,

planeje mais cuidadosamente as intervenções a serem construídas e as implicações

que estas intervenções causarão na paisagem local. Da mesma forma, é necessária a

ampliação e integração dos esforços de gestão associados a um planejamento urbano

adequado como um modo de impedir abusos de autoridade e poder, através de um

processo de educação e fiscalização que façam valer a legislação vigente.

É claro que estas considerações particulares podem ser extrapoladas para outras

realidades, sendo necessário nestes casos, observar as particularidades da localidade

em questão, bem como o perfil e as expectativas determinantes no imaginário dos

turistas e demais usuários/consumidores do espaço. Em suma, a manutenção das

características que despertaram interesse no público principal é o principal requisito.

Assim a imagem e o imaginário passam a ser objetos para esse entendimento,

podendo estar vinculados à morfologia urbana ou a outros elementos componentes do

sistema turístico, plausíveis de investigação. Para tal, a utilização de diversas

metodologias convergentes à investigação da imagem da destinação mostrou-se

abrangente no fornecimento de informações diversas sobre impressões dos

consumidores/usuários do espaço.

Assim, a realização de estudos e considerações a respeito do imaginário e da imagem

relacionados à destinações turísticas são extremamente relevantes na discussão da

sustentabilidade dessas destinações. Essa abordagem vem ganhando força inclusive

com investigações de diferentes leituras das mesmas imagens segundo filtros

culturais, de grupos específicos, segmentados por países ou preferências de

consumo.

Este estudo procura ampliar as discussões à respeito da sustentabilidade em

destinações turísticas no Brasil, trazendo à tona questões inerentes ao consumo de

produtos intangíveis no caso do turista, sem no entanto negligenciar o espaço como

produto da cultura de uma população e de sua territorialidade.

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Pode-se assim afirmar que, uma vez que o interesse e a decisão por dado destino

turístico, é dado em função de expectativas presentes em um imaginário construído a

partir de imagens, informações e filtros culturais precedentes. Assim, discutir sobre o

aumento do ciclo de vida de determinado produto/destinação turística, cumpre tratar

de sua sustentabilidade econômica e, torna obrigatório o respeito pelas características

culturais e naturais que a fizeram emergir como tal, incluindo assim a sustentabilidade

nas esferas ambiental e sócio-cultural, completando a tríade da sustentabilidade.

8.1 Limitações da Pesquisa

Como limitação deste estudo é possível citar a imprecisão dos dados obtidos, no que

diz respeito ao acesso de imagens e mapas que permitissem estabelecer uma série

histórica quanto à ocupação da Vila de Alter do Chão. Neste sentido, não foi possível

acessar tal material, tendo sido utilizadas como alternativa a esta deficiência de fontes,

as entrevistas e relatos orais complementares as fontes das informações então

mapeadas, para uma aproximação dos períodos de ocupação da área urbana da Vila

por décadas, a partir da abertura da estrada PA-457 (Rodovia Everaldo Martins),

destacando ainda outras referências urbanas construídas nos mesmos períodos.

Outra limitação tange o discurso à respeito das redes urbanas e sociais da Vila de

Alter do Chão que, por não estar diretamente relacionada à questão de pesquisa

central deste estudo, foi abordada de forma menos intensa que as demais categorias

aplicadas à realidade da localidade estudada.

8.2 Recomendações para Estudos Posteriores

Por questões de viabilidade de tempo na realização deste estudo, conforme

explicitado na sessão sobre a metodologia optou-se pela seleção de dois grupos para

a realização das entrevistas. Assim, como possibilidade para futuras pesquisas

sugere-se a investigação acerca do mesmo tema, entretanto, com diferentes

subgrupos de residentes e turistas.

Outras possibilidades de pesquisa relacionam o detalhamento da ocupação da Vila e

sua cronologia; aprofundamento nas tipologias construtivas tradicionais locais e suas

alterações até a atualidade; pesquisas aplicadas sobre a o desempenho e a eficiência

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dos materiais construtivos regionais; e ainda, a conversão dos indicadores obtidos por

esse estudo, no sentido da definição dos parâmetros urbanísticos considerados

aceitáveis pelos usuários/consumidores deste espaço.

Também seria salutar investigar nas principais origens dos turistas a respeito do

conhecimento ou não do destino, do interesse pelo local, do imaginário e das

expectativas envolvidas caso fossem ao lugar. Outra possibilidade é entrevistar

turistas de determinado grupo/perfil na chegada dos vôos, navios de cruzeiros e

barcos em Santarém (que costumam fazer a ligação entre Belém e Manaus com

Santarém para muitos turistas internacionais), antes da chegada e posteriormente a

sua visita, no intuito de buscar melhor estabelecer comparações entre o imaginário

(anterior) e a percepção da imagem (posterior).

Além disso, outras inúmeras possibilidades de pesquisa estão na ampliação da

utilização de imagens fotográficas, ou mesmo outras categorias de imagens, nas

pesquisas sobre a percepção urbana e as atribuições simbólicas relacionadas.

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APÊNDICES

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APÊNDICE A

ROTEIRO PARA ENTREVISTAS ABERTAS, SEMI-ESTRUTURADAS REALIZADAS COM RESIDENTES EM ALTER DO CHÃO (SANTARÉM/PA).

PARTE I - Ancoragem do entrevistado: 1. Apresentação, dados gerais do participante: nome, idade, tempo de residência na Vila, escolaridade, profissão/formação, instituição na qual trabalha, entre outros. PARTE II – Sobre as Imagens fotográficas (estas questões devem se repetir a cada imagem apresentada): 2. Descreva a imagem fotográfica apresentada/selecionada por você? Podem ser incluídas informações sobre o local, a circunstância, tempo/período, entre outros. 3. Por que você achou importante ou relevante incluir esta cena na nossa conversa? 4. Quais os principais elementos que você pode destacar nesta imagem fotográfica apresentada? PARTE III – Sobre a percepção da Vila de Alter do Chão 5. Qual a sua opinião sobre a alteração da Praça da Igreja Matriz e da orla de Alter do Chão, realizadas durante as obras do Governo do Estado? 6. Em sua opinião, onde acontecem as atividades de lazer da Vila de Alter do Chão? Da sua população residente? 7. Em sua opinião, existe em Alter do Chão alguma coisa, lugar, construção entendida por você e pela população local como MONUMENTO? Com o qual sejam estabelecidas relações de memória? Qual? 8. Em sua opinião, qual é a obra, o lugar, a construção, a vista, a paisagem – qualquer coisa – que pra você é a mais marcante de Alter do Chão?

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APÊNDICE B Entrevista 1 E – Entrevistador R1 – Residente entrevistado 1 FOTOS DO ENTREVISTADO:

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4 5 6 E- Então vamos começar a conversa com o senhor Antônio Cestário... Há quanto tempo o senhor mora aqui em Alter do Chão? R1 – Eu nasci aqui. Eu tenho 54 anos... moro a vida inteira aqui em Alter do Chão. E- E qual é a sua ocupação? O seu trabalho? R1- Agora assim, eu trabalho aqui no meu comércio, mas antes eu trabalhava no Centro de Saúde... trabalhei 16 anos no Centro de Saúde... Hoje em dia, devido à mudança no governo, eles tiraram agente, aí eu fiquei aqui em casa mesmo trabalhando... aí eu trabalho neste comércio aqui. E- E qual a sua escolaridade? O senhor chegou a estudar até que série? R1- Eu fiz até o segundo grau, né. E- Então vamos lá, sobre as fotos né. Na sua foto 1, me diga o que é que o senhor... descreva essa foto, por favor. R1- Essa aqui, está a minha mãe, a minha mãe viveu 98 anos e aqui ela tava com 97... aqui era um... aqui era uma comemoração dum aniversário dela, e a nossa casa antes era essa aqui... era toda de barro... esse aqui é meu sobrinho, minha cunhada e minhas filhas... sou pai de 10 filhas mulheres, e... como você vê aqui na foto, tudo era mais amplo, né, você vivia à vontade... não precisava como hoje em dia, ter as portas de ferro, né... cê vê as redes aqui postas ao ar livre, sem problema nenhum, que podia ficar, passar dia e a noite que não tinha problema nenhum… ninguém mexia, ninguém pega nada… as portas, por exemplo, que você ta vendo aqui, portas de madeira... ou mesmo abertas, olha aqui... mas ninguém mexia nada com ninguém. E- E a sua casa? O senhor pode repetir aquilo que o senhor tava me dizendo antes de eu começar a gravar? R1- Era é... era toda de barro coberta de palha né, agente vê aqui nas fotos, ó... É de barro coberta de palha... era aqui mesmo no local aqui. E- Era bom? Era ruim? Como que era, na sua opinião?

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R1- Era bem mais... era melhor antes por causa da, da... assim, digamos, que agente ficava mais à vontade não é. Hoje você vive mais preso, mas vive com mais quentura, com mais calor, né... naquele tempo era mais ventilado... vivia mais à vontade... Essas fotos aqui também, é do 7 de Setembro, quando... onde agente vê aqui um clube desfilando, né, as casas... é aqui em frente de casa... E- Essa aí é a foto 2 (Fotos 2 e 3)? R1- Deixa ver se eu tenho alguma mais antiga aqui... Essa aqui é quando eu trabalhava no Posto de Saúde, aqui eu tava dando palestra, sobre é... verminoses, e aparece aqui na foto isso. Essa aqui é uma das minhas filhas que ta nos braços de uma doutora aqui. E- E o que o senhor acha de importante nessas fotos do Posto de Saúde e do 7 de Setembro? Por que o senhor acha importante usar essa imagem na nossa conversa? R1- É... existiram muitas mudanças, por exemplo, este ano o desfile já foi à noite... Foi totalmente ao contrário do que era antes... todo 7 de Setembro... sempre era 7 de Setembro o desfile, né, esse ano fizeram já à noite... então mudou do jeito que era antes. Agente vê também na outra foto, eu trabalhando no Posto de Saúde... comecei em... dia 13 de março de 1977... e... que eu não tinha colecionado antes, eu fazendo uma sutura na cabeça de... dum cidadão lá... (Foto 4) Aqui uma... muito importante essa foto aqui também... A minha mãe é... com uma senhora é... bem idosa daqui, viveu 128 anos de idade, tá, essa senhora aqui, amiga dela... e eles tavam no barracão do Sairé, lá na praça, na antiga praça. A praça do Sairé era naquela época na praça da igreja, e eles tão aqui dentro do barracão, ta, e elas... fui eu que tirei essa foto das duas, cortou um pouquinho aqui, e essa senhora viveu 128 anos... era a parteira antiga. E- E como era o Sairé antes e agora? R1- Mudou muito. Mudou muito, porque antes agente brincava com mais... mais vontade, sabe. Eu, por exemplo, eu brincava em diversos grupos folclóricos, de danças, pássaros... e, agente comprava tudo, agente não pedia nada de ninguém... e hoje em dia a pessoa vai dançar, mas se for pago, se não for pago ele não vai... tem que ser dado todo o material... roupas... é... tudo, tudo… ele só vai se tiver tudo pago pra ele dançar... então antes, era... agente brincava com todo o gosto, sabe, eu participava só num ano, participava de 8, 10 brincadeiras no mesmo tempo, só fazia trocar de roupa... eram compradas as roupas com o próprio suor. E- E seus filhos hoje participam do Sairé ou não? Melhor agora ou melhor antes, na sua opinião? R1- Eles participam, participam sim… Ahhh, agora é muito comercial, é como eu to acabando de explicar, é... só é comercial, não é mais aquele folclore como era antes... que eu sempre brincava com gosto mesmo, hoje em dia você vai porque é pago, então, sinceramente eu, eu digo que é comercial. E- Eu só preciso fotografar essas fotos que o senhor me mostrou depois, pode ser? (Foto 5) R1- Tá, claro! Essa aqui já é mais recente. Essa foto é recente já, na praça, aparece aqui a praia, as bandeirinhas... aqui é o desfile... é 7 de Setembro... 7 de setembro... Deixa eu ver se encontro outras mais antigas... aí eu separo essas aqui também. Existem também muitas mudanças aqui na forma de você adquirir dinheiro, né... essa foi uma forma que a Vila, há 20 anos atrás, não existia essa facilidade que agora existe hoje, né, e... há 20 anos atrás ou mais, agente não pegava quase em dinheiro... é... ce via é... dependendo do produto, como farinha e outras coisas, você recebia em vale... um pedaço de papel, que você ia, que você tinha que gastar tudo naquele comércio... hoje em dia não, você gasta onde você quer... pega o dinheiro q compra onde quer. E com isso, com essas mudanças que houve, eu acho que melhorou pra muita gente também, né, em forma de dinheiro.

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E- Me diga assim da Vila. Antes da estrada era uma coisa, né, e agora? O que mudou? R1- Agora melhorou muito... que antes nem existia a estrada por aqui... quer dizer, por aqui não existia estrada... Pragente ir pra Santarém, tinha que ir por aqui, pegar essa estrada que vai pra Pindobal, ir até Belterra, rodar tudo por lá pra chegar... ou então ia de barco, passava 3,4 horas pra chegar em Santarém... e hoje existe essa facilidade que com meia hora você ta em Santarém, né, por essa estrada aqui. E- E a Vila? Mudou depois da estrada? R1- Mudou muito, cresceu… só existia rua até aqui, e essa rua era bem perto né… e hoje em dia, com asfalto né... aí pra cima não tinha rua, era só o caminho... aí você poderia pegar terrenos e fazer casa em qualquer lugar... e não tinha dono... hoje em dia não, tem dono em toda a parte... você não consegue mais nenhum terreno... é o que um... o pessoal que tinha mais dinheiro, comprava e... normalmente agora são só de terceiros... não existe mais o primeiro dono, só de terceiros... então eles exploram demais, existe muita exploração nessa parte de terrenos. Muitas vezes tentam comprar os nossos terrenos, as nossas casas, só que, eu mesmo daqui dessa, dessa... dessas casas aqui por perto, só quem reside ainda é eu, né... aqui em frente é do meu sobrinho, que era dos pais dele, eles não venderam também... mas esses outros tudinho por aqui não tem mais o mesmo dono, e vendem e vão embora aí pra dentro, aí pra trás... aí tem que comprar lá pra trás também... mas é bem longe, bem longe mais da Vila... eles, tem uns que sabem é... olha, essa foto, essa casa dessa foto é essa pousada aí da frente hoje.... ele melhorou ela, ele derrubou em fez uma pousada, do meu sobrinho esse daí... esse também ele não vendeu, mas a maioria, a maioria das pessoas aí vendem os terrenos e tem uns que vendem... tem uns até que sabem fazer as coisas, né, por exemplo, vendem e fazem uma casa melhor e outros acabam tudo e acabam até indo embora porque não tem mais condições de sobreviver aqui. E- E pro senhor, seu Antônio, qual é o lugar mais marcante aqui de Alter do Chão? O lugar, ou a vista, ou a paisagem, ou a construção... qualquer coisa que o senhor ache a cara de Alter do Chão. R1- Pra mim é a paisagem... a paisagem da praia. Porque ela é o... ela é feita pela natureza, né, e… e nunca mudou assim, é... uma mudança assim é... feita pelo homem, né, ela continua, desde quando existe, ela continua com a mesma paisagem. Inclusive eu tenho uma foto aí (foto 6), tirada já faz tempo já, e ele continua sendo o mesmo... você olhando de lá, então ela mantém a mesma paisagem. E- Se o senhor tiver essa foto, seria legal de olhar também. R1- Vou ver se... essa foto aqui, é uma foto aérea, sabe, você daqui olha… nós tamos bem aqui nesse local, e vindo pra cá você vai bem em frente à “Ilha”, ta... daqui dá pra ver a Serra Piroca e por sinal, essa Serra Piroca que deu o nome de Alter do Chão, né... por causa desse monte, que antigamente os... eles chamavam “alto do chão” por causa deste monte... ta, “alto do chão” , depois passou à ser “Alter do Chão”, então a Vila é denominada esse nome por causa desse monte, tá. E- O senhor falou que dessa foto não mudou... o senhor pode me explicar melhor o que foi que não mudou? R1- Exatamente. Não mudou nada esse formato aqui, ó... sempre continua sendo o mesmo, por isso que eu acho que a principal coisa aqui de Alter do Chão é esse modelo dessa “Ilha”, que realmente ela está no mesmo sentido e... essa foto aqui foi tirado no meio de julho, tá, e ela ta com esse formato… agora ela ta mais ampliada porque é mais verão aqui… aqui agente já pode observar que essas ruas aqui já são asfaltadas, né... aqui é o Centro Comunitário, aqui é a Igreja, tá, nós estamos mais ou menos bem aqui, ó... mais ou menos não, nós tamos bem aqui, tá…. E aqui pra trás a Vila continua, né, continua crescendo. E- Tem alguma construção aqui em Alter do Chão que o senhor acha que tem algum valor como monumento, ou algum valor pra memória?

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R1- A igreja, a igreja… ela foi construída ainda... em 1880... e por sinal, essa senhora aqui que eu lhe mostrei a foto, ajudou a construir ainda... ela contava a história da construção... então ela é a única... ela serve de um símbolo pra nós, pragente, né. E- O senhor acha que as pessoas percebem isso, se isso é visto só pelos mais antigos...? Como é isso? R1- Eles observam sim porque, por sinal, o altar, é todo feito de madeira é... artesanal... Você pode olhar de perto, parece pintura, mas não é, é feito na madeira mesmo as... então isso é uma coisa marcante pra comunidade... até os turistas vão lá pra ver de perto o altar... eu vejo isso. E- Legal. Mais uma coisinha só que eu tenho pra lhe perguntar... é... Na opinião do senhor, onde se dá o lazer aqui da Vila? Como é esse lazer? Onde é que as pessoas que moram na Vila tem a diversão, o descanso? R1- Tem sim... é... é a praia né, primeiro… e tem nos colégios, tem os treinamentos no colégio, tem as práticas de futebol, tal... tem na praça do Sairé, à noite... à noite tem jogos de campeonato, que fazem o futsal, o vôlei... então tem diversão, nunca falta... E- Nos colégios outras pessoas também podem usar ou só quem estuda? R1- Só quem estuda... agora na praça do Sairé é os alunos e outras pessoas também. Tem inclusive um time de master, de futsal, de vôlei… por sinal ta tendo agora um campeonato, quase toda noite, só não tem quando chove muito que não tem... E- Tudo bem então. Só pra finalizar, eu queria que o senhor me dissesse o que era melhor antes e o que é melhor hoje. R1- O melhor antes era a tranqüilidade. O melhor hoje, é o que eu falei, que é a facilidade de você é... adquirir dinheiro. Porque, hoje em dia, a vida daqui, do povo de Alter do Chão, é o turismo... o povo vive do turismo. Todos. Não tem esse que não diga que não vive do turismo. Antes era... era a lavoura. Hoje em dia não tem mais quem trabalhe em lavoura aqui em Alter do Chão... era lavoura e seringa... hoje em dia não tem mais ninguém que corte seringa. E- E se não tiver turista? O que faz? R1- Não, agora é a vida toda... tem sempre. Inverno e verão... é todo o tempo. Então, seja o comércio, seja o que vende o peixe na praia, todos vivem do turismo. E- E o que o senhor acha que os turistas vêm procurar aqui? R1- Eles, é... eles se sentem mais à vontade, ta... agente às vezes conversa com eles, e eles dizem que aqui eles estão num paraíso... que eles tão mais à vontade... enquanto que nas grandes cidades, eles não vivem essa tranqüilidade... é o que eles comentam. E- Então é isso. A não ser que o senhor queira comentar mais alguma coisa, do que o senhor acha, do que o senhor gosta ou não gosta… o senhor fique à vontade pra falar. R1- É… eu acho que ainda falta mais, é... o Governo olhar pra Alter do Chão, né, que hoje em dia é que tão olhando assim, em parte... fazendo algumas benfeitorias, né, como ruas e é... esgotos, né... que antes não tinha e hoje ta tendo... mas que continuasse olhando, pra não deixar esquecido... que isso tava muito esquecido... então, o povo vendo isso ele num, num vem quase também, né, mas... agente espera que eles continuem olhando, pra que possa melhorar cada vez mais. E- E o que o senhor acha da obra nova aí da orla? R1- Eu to gostando... to gostando sim, com certeza... ta ficando maravilhosa. Antes não tinha, né, e antes tinha muita é… é… erosão pra dentro do rio, todo tempo, sempre eles vinham colocando a piçarra, e a piçarra e a areia ia todo pra dentro do rio... e hoje em dia não vai mais não, vai só a água. Antes, se você visse antes, no verão, ficava só praia limpa, limpa, limpa mesmo... mesmo desse lado da Vila... poderia jogar bola à vontade aí, hoje você já não joga mais bola aí como jogava antes... porque agora tem muita pedra, muito vidro, e... sujeira mesmo... fica cheio de buraco... antes não, era limpinho que era um campo de futebol mesmo... cheguei a brincar muito ainda, até hoje gosto de bola ainda (risos).

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E- E o que o senhor acha da praça? De como ela ficou? R1- Ta boa... melhorou sim, com certeza... apesar de ter algumas pessoas que não gostaram, mas eu gostei... os bancos são bem reforçados, são de concreto... acho um absurdo o pessoal querer coisa de madeira, não tem condições, madeira sempre estraga e concreto não estraga assim, fácil. E- Legal... Mais alguma coisa? Obrigadão, seu Antônio!! ANC - Ancoragem

Residente nascido em Alter do Chão. Focado nas facilidades que as mudanças e o progresso trouxeram pra Alter do Chão.

ECH – Expressões-Chave (Negrito)

- tudo era mais amplo, né, você vivia à vontade... não precisava como hoje em dia, ter as portas de ferro, né - Hoje você vive mais preso, mas vive com mais quentura, com mais calor, né... naquele tempo era mais ventilado... vivia mais à vontade... - existiram muitas mudanças, por exemplo, este ano o desfile já foi à noite... - A minha mãe é... com uma senhora é... bem idosa daqui, viveu 128 anos de idade - Mudou muito, porque antes agente brincava com mais... mais vontade, sabe. Eu, por exemplo, eu brincava em diversos grupos folclóricos, de danças, pássaros... e, agente comprava tudo, agente não pedia nada de ninguém... - agora é muito comercial - Existem também muitas mudanças aqui na forma de você adquirir dinheiro, né... essa foi uma forma que a Vila, há 20 anos atrás, não existia essa facilidade que agora existe hoje, né - E com isso, com essas mudanças que houve, eu acho que melhorou pra muita gente também, né, em forma de dinheiro - hoje existe essa facilidade que com meia hora você ta em Santarém, né, por essa estrada aqui - só existia rua até aqui, e essa rua era bem perto né - aí pra cima não tinha rua, era só o caminho aí você poderia pegar terrenos e fazer casa em qualquer lugar... e não tinha dono... - Muitas vezes tentam comprar os nossos terrenos, as nossas casas - dessas casas aqui por perto, só quem reside ainda é eu, né - vendem e vão embora aí pra dentro, aí pra trás... aí tem que comprar lá pra trás também... mas é bem longe - a paisagem da praia - ela é feita pela natureza, né, e… e nunca mudou assim, é... uma mudança assim é... feita pelo homem - Não mudou nada esse formato aqui, ó... sempre continua sendo o mesmo, por isso que eu acho que a principal coisa aqui de Alter do Chão é esse modelo dessa “Ilha” - E aqui pra trás a Vila continua, né, continua crescendo. - a igreja… ela foi construída ainda... em 1880... - então ela é a única... ela serve de um símbolo pra nós, pragente, né - é a praia né, primeiro - tem os treinamentos no colégio - tem na praça do Sairé, à noite - O melhor antes era a tranqüilidade. O melhor hoje, é o que eu falei, que é a facilidade de você é... adquirir dinheiro. Porque, hoje em dia, a vida daqui, do povo de Alter do Chão, é o turismo... o povo vive do turismo. Todos - era lavoura e seringa - eles dizem que aqui eles estão num paraíso... que eles tão mais à vontade... enquanto que nas grandes cidades, eles não vivem essa tranqüilidade... - o Governo olhar pra Alter do Chão, né, que hoje em dia é que tão olhando assim, em parte... fazendo algumas benfeitorias, né, como ruas e é... esgotos, né... que antes não tinha e hoje ta tendo... - Antes não tinha, né, e antes tinha muita é… é… erosão pra dentro do rio, todo tempo, sempre eles vinham colocando a piçarra, e a piçarra e a areia ia todo pra

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dentro do rio... - melhorou sim, com certeza... apesar de ter algumas pessoas que não gostaram, mas eu gostei... os bancos são bem reforçados, são de concreto...

ID – Idéias Centrais

- casa, família/lugar da moradia, da segurança - segurança e tranqüilidade da Vila ainda maior no passado - mudança do clima/aumento do calor - posto de saúde local/ trabalho - comemorações na Vila, 7 de Setembro/ na Praça da Igreja Matriz - atuais facilidades financeiras/ forma de comércio anterior (escambo/vales) - noção do limite da Vila até a rua do cemitério em tempos passados/ crescimento da Vila após a estrada - questão fundiária com o crescimento/ posse de terrenos “sem dono” e atual especulação de valores das propriedades - a paisagem natural da praia da ““Ilha”” como elemento marcante que não sofreu alterações - Igreja / memória, construção mais antiga - Lazer nas praias, colégio, praça do Sairé - Obras públicas na orla, instalação de esgotos, asfaltamento de vias - Bancos em concreto entendidos como bons por sua durabilidade

EMS - Elementos Morfológicos e Sócio-culturais

- residência e família - Praça da Igreja Matriz - Rua do cemitério - “Ilha” - Morro da Serra Piroca - Centro Comunitário - Praça do Sairé - Posto de Saúde (relações de trabalho)

QUADRO 02: DSC da Entrevista Residente 1 Fonte: A autora, 2007. Entrevista 2 E – Entrevistador R2 – Residente entrevistado 2 FOTOS DO ENTREVISTADO:

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E- Então vamos começar, Mário? R2 - Vamos E- Parte inicial, apresentação e dados gerais. Seu nome todo? R2 - Mário Branco Maranhão E- Qual tua idade, Mário? R2 – 50. E- Quanto tempo tu moras aqui? R2 – Também 50. E- E a escolaridade e profissão? R2 - Eu estudei na época até a 7° série, o que seria 7° série... Profissão, eu trabalho como guia... turístico. E- Mais alguma coisa, assim importante, que tu achas de apresentar, dessas outras atividades que tu já tiveste? pode ser também... R2 - Eu trabalhei numa... eu trabalhei também em 3 equipes químicas da Petrobrás, de pesquisa, né. Trabalhei também como credenciário de pesquisa no IBGE no ano de 80... no senso econômico... é... Hoje eu tô trabalhando com a produção de quelônios da Amazônia, né. E- É isso aí? Então agora a gente vai falar um pouquinho das fotografias, ta. Essa é a Foto 1 então, né. Por favor Mário, tu podes descrever pra mim o que é essa foto? que lugar? R2 – sim... é... essa foto aqui é que... a gente sempre que quer passar o dia fora, a gente vai pra ilha, e a gente sempre freqüenta essa barraca, tem essas crianças, a gente leva as crianças daqui também... Lá agente se... agente se junta lá e acaba passando o dia nesse local e... almoça por lá com as crianças e o pessoal da barraca... a gente tem uma certa amizade com eles lá e a gente sempre procura essa barraca... É uma das razões da gente fica aí. E- E o que é o mais importante pra ti dessa cena? R2 – É... a amizade que a gente tem com esse pessoal, agente se dá bem com eles, e o tratamento da barraca é bom... a união das crianças, né, que é uma das formas de eles tarem juntos lá... É uma das coisas que a gente sempre procura... quando vai à praia, sempre procura fazer esse tipo de coisa... E- O que tu destacarias na foto? Elementos, coisas que aparecem na foto que tu achas que são as coisas mais importantes da foto que tu fizeste? R2 - Eu gosto de registrar... porque daqui há mais tempo, essas pessoas vão ta tudo adultas, e vê como que era a praia, vê como funcionava na época, né. E eu não sei, mas com certeza daqui a 10 anos vai ta totalmente diferente isso, então eu gosto de registrar essas coisas... pra mais tarde você ter o... comparar assim... E- E tu achas que já mudo muito? R2 - Já. Já mudo bastante já. E- Em que sentido tu achas... mais? R2 - Bom, eu acho que... ela ta se assoreando, cada ano que passa... ela vai se assoreando mais... Esse local, aqui já teve muitas árvores... vários tipos... hoje já não tem mais... você observa que já tem pouca árvore... e esse local aqui já teve bastante árvore... esse local... inclusive era fechado aí, hoje você já caminha, arma a rede, já faz tudo ali que não tem mais árvore... Com o tempo isso vai se perdendo. Então é uma das razões de eu registrar porque daqui a 10 anos, por exemplo, não vai ter mais algumas dessas que ainda se encontram lá nesse local... É uma das razões que eu registro. E- Mais alguma coisa pra falar dessa? Vamos pra segunda então? Na foto 2, Mário, descreve pra mim o que tem, o que é isso, o que aparece? R2 - Bom, aqui é uma manifestação da festa do Sairé... esso aqui é na segunda-feira, é a derrubação dos mastros... aqui ta fazendo a seculiara, que é falado... aqui já foi derrubado o mastro, agora vão fazer a seculiara, que é o passeio de barraca em barraca, que eles vão recolhendo bebida, gratuita, e depois é... é distribuída pro pessoal participante da seculiara,

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né... Essa é uma forma de juntar todos os barraqueiros e os participantes que permanece... mais o pessoal da vila que fica pra segunda-feira, que é feita a festa dos barraqueiros, então eles fazem, participam diretamente... é... começa 8 da manhã isso... e rola o dia todo. E a bebidas arrecadada é pra eles usarem, pra eles beberem... é... é cachaça, é vodka, é tarubá, é tudo... eles misturam tudo no caldeirão e, quem quiser, que... que entra lá no meio da folia, né... e aqui, você observa que o mastro já ta derrubado, que foi tirado o juiz, a juíza do barracão, e eles tão na cerimônia aqui dentro do, dentro do barracão... e isso faz parte do ritual... essa foto é recente... é desse ano. E- E qual é a importância pra ti, dessa cena aí? R2- É... é... por enquanto eles tão ainda na... fazendo o... o ritual que... o ritual original que foi resgatado, e eles tão ainda, né, fazendo esse ritual aí... esse da, da Festa do Sairé, da parte religiosa que ainda tem, né... porque a maioria já é profana, mas ainda preservam essa parte aí, religiosa... E- E o que tu achas, dos elementos aí, quais são os mais importantes? Das coisas que tão na foto, o que tu destacas? R2- É... como eu já falei, eu gosto de registrar... aqui tem várias pessoas da Vila, então daqui mais 10 anos, eu volto a dizer, olha “esse aqui ainda ta vivo, esse aqui Já morreu...” , assim, alguma coisa mais ou menos assim, sabe, então é por isso que eu registro... aqui tem várias pessoas, por exemplo, meu tio ta aqui, meu vizinho bem aqui do lado ta bem aqui... então, por aqui você observa muitas coisas, então eu acho isso interessante. Então, é as pessoas, né... as pessoas participando do... da manifestação, né. E- Vamos pra próxima então? Na foto 3, Mário, tu podes, por favor, descrever ela pra mim? R2- Bom, essa aqui também, no período do Sairé, em setembro... essa aqui é a rua que dá acesso à praça... e já mudou muito... aqui tem uma pousada, há anos atrás não tinha nada disso... a Festa era feita na praça, né, ali na beira... na frente da igreja, na frente da igreja... já duns 5 anos pra cá mudaram, porque se tornou pequena, a praça... então esse é o acesso que você tem pra... você observa que as pessoas estão subindo, tão indo tudo pra praça do Sairé hoje... então, eu achei por bem tirar uma foto pra mostrar... o tráfego de pessoas ali, né... seguindo em direção à praça, da Festa, né. E- E como tu preferes? Como é hoje ou como era? Tu já me falaste que mudou muito, que já trocou de lugar... então, me diz o que tu preferes? Falaste que mudou o cenário também, né, como por exemplo, as coisas que não estavam construídas... R2- Antigamente quando era... quando era feita essa Festa, ela era mais... mais participada pelo povo da comunidade, hoje já é menos, em função da necessidade, né, aumentou muito, e... e o fluxo de pessoas é muito grande... então, dificilmente você encontra pessoas da comunidade pra... exercer alguma função, ou pra fazer algum trabalho, da, da própria Festa. Por razão de eles terem outras ocupações, trabalharem na praia, ou vende lá, monta barraca... então, isso daí mudou muito... Hoje em dia você já tem uma mão-de-obra quase que de fora pra suprir a necessidade do evento que é muito grande... reúne eu acho que uma média de 20, 30 mil pessoas em Alter do Chão, num período muito curto, né.... que seria de quinta à segunda... à domingo... então, é... é um fluxo de pessoas muito grande, e isso fez com que houvesse necessidade de mudar muita coisa da comunidade... mas eu acredito que antes era bem melhor, era mais participado pelo povo da comunidade. E- E a praça? E as outras coisas que o senhor também falou? Como é que o senhor vê essas mudanças? O fato de ter mais construções, o fato da praça ter mudado? Ta tendo uma obra grande aí... todo mundo comenta um pouco... qual a sua opinião sobre essa? R2- Eu diria que eu fico até contrariado quando alguém chega e fala que é o “Caribe da Amazônia”... eu acho que pra ser o “Caribe da Amazônia” teria que ta bem arrumado a comunidade, sabe... a Vila, a frente... por exemplo, a frente, ta bem arrumado... e... e uma coisa que ficou... que não ficou muito bom, no meu ponto de vista, é na praça, é a questão daquela obra lá... é muito concreto ali, sabe... por ser na Amazônia, sabe, eu

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acho que pelo menos os bancos deviam ser de madeira... é, o coreto devia ser um pouco mais trabalhado... coisa mais rústicas assim, sabe... por isso, que é uma Vila que recebe turista do mundo inteiro, então, por esse lado, eu acho que devia ser mais trabalhado em cima disso... E- Mas e o senhor como morador? O senhor ta pensando no turista não é? Eu quero aqui a sua opinião como morador mesmo... Pro senhor é melhor como? R2- Não, eu gosto mais como... eu sou de acordo com o turista... Por viver aqui na Amazônia, eu tenho muito contato com... nas florestas, e eu me baseio sobre isso, e eu acho que essa parte de concreto muito assim, ta muito... ta muito espantoso assim, sabe... Eu sou meio que contra isso... eu gostaria que fosse mais natural, mais rústico assim... de uma forma bem trabalhada, bem feita, eu acho que seria muito mais aceito, sabe. E- Mais alguma coisa sobre essa foto? Vamos pra próxima então? Na foto 4, Mário, descreve pra mim o que tem na foto 4, o lugar... o que tu estás fotografando aqui... R2- Bom, é... como eu trabalho como guia de turista, eu faço um trabalho de produção de quelônios da Amazônia nesse local. E pra completar, eu to seguindo... aqui você observa as capivaras, uns filhotes bem aqui... quatro que tem, mas na foto só pegou uma ou duas que tem aqui... e as adultas tão aqui em volta. E é interessante que pro turista tenha, que continue neste local, animais, pássaros e... é o trabalho que agente faz, é amostrar pássaros, animais... então, essa foto tem tudo, tem bastante pássaros nesse local, tem a desova de tracajás nesse local, tem desova de jacaré nesse local... então eu acho bom que permaneça... que seja preservado... e enquanto você preservar, você vai manter essas espécies nesse local... Aqui é o Lago do Piranha, aqui próximo da Vila... bem próximo da Vila... é ali do outro lado, indo pro Cururu... e tem bastante jacaré lá... então é muito interessante esse lago, ele é próximo da Vila, é pequeno mas tem... tem muita coisa aí... é muito interessante. E- E tu percebes alguma mudança nessa coisa dos animais, dos pássaros por aqui? Tinha mais, ou era igual? R2- É... com as caçadas... muito pessoal caçando... é... hoje com a consciência do turismo, da preservação, o pessoal parou mais de caçar... você já observa que tem alguns animais que agente não via mais por aqui, então, que já tão se reproduzindo por aqui... então as capivaras... é... nessa aqui aparece... isso aqui é pato do mato que são 12, que também tavam lá e... teve uma época que eu não via mais nada disso, mas hoje você já ta voltando a ver... já vê macaco em volta do Lago... porco catitú em volta do Lago... tem alguns lavatórios de porco... bebedouros... Isso pro outro lado da “Ilha”... desse lado aqui até tem mas muito pouco... pro outro lado já tem bem mais... então, eu acho muito interessante que permaneça esse lago, do jeito que ta que vai ter, no futuro, eu acho que vai ter muita coisa pra se observar. E- Por que tu achas importante então essa foto, essa imagem? R2- Ahh... eu acho muito importante... como eu já disse, pragente trabalhar com o turismo, tem que ter essas coisas... por exemplo, o turista quer observar os jacarés, agente vai à noite que tem bastante, quer tentar ver um macaco ou um outro animal, agente vai de dia por lá, com calma, agente observa alguma coisa... e é um local também de reprodução de pombos do mato... é... macáua, jacús... tem bastante pássaro lá nesse local... é interessante isso aí. E- E o que tu destacarias como elementos principais nessa cena, nessa imagem? Das coisas que aparecem na foto, que tu... R2- Eu destaco é... é... bom, essas árvores que tu estás observando aqui são genipapeiros, que dão os frutos e que servem como alimento pra tracajá, pra pato, pra alguns animais... eu destaco elas como elemento fundamental nesse local. E- Legal. Só isso? Podemos passar pra próxima então? Foto 5, então. Descreve pra mim, Mário, o que é a foto 5. R2- Esse local aqui é a antiga praça, de Alter do Chão... e você vê que o fluxo de pessoas é muito grande aqui, que foi essa a razão de mudar a Festa do Sairé lá pra outra área, porque

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aqui tava ficando muito... muito apertado... é muito pequena a praça, você vê que tem várias barracas, com os jambeiros que tem, isso aí você não conseguia nem andar... isso é um dia que teve muito poucas pessoas e você já observa que o espaço já tava ficando muito pequeno... já ficava na época... então, foi a razão de ser mudado, pelo tamanho disponível pra... que se tornava muito pequeno pra essa... pra esse evento. E- Qual é a importância pra ti dessa cena? De trazer ela pra nossa conversa? R2- é... foi interessante ver a mudança dali... acho que foi bom porque aqui no meio dessa dança tinha o jardim... sempre a comunidade manteve o jardim, e ao término da festa, o jardim ia pro beleléu... acabava assim tudo... que o pessoal pisava e acabava... entao foi interessante a mudança daí. Mesmo assim hoje, como de dia não tem nenhuma atividade lá pra cima, então, o pessoal permanece na praça. Mas já aí, é com algum controle... o pessoal já vai pra “Ilha”, já não tem mais aquele... aquela destruição que tinha antes, sabe. E- E quais os elementos que tu destacas aqui? Das coisas que aparecem na foto aqui, o que tu achas que são as coisas importantes? R2- Olha, dessa praça aí, você observa a “Ilha”... eu acho muito interessante essa visão que você tem da “Ilha”, sabe. É... hoje, atualmente, hoje... eu não sei como é que vai ficar com essa mudança que tão fazendo, com quiosque na frente da praça, quando... a visão... acho que você não vai mais ter aquela visão... eu não sei até que ponto isso foi bom pra Alter do Chão... você, de certa forma, vai ter um embaço assim, na vista da praia de Alter do Chão... então eu não sei até que ponto isso vai ser bom ou não... só o tempo vai dizer. E- Tá ok então. Agora pra completar, Mário, eu tenho mais umas três perguntinhas aqui que não são sobre as fotos especificamente, ta. A primeira delas é: O que tu lembras que era diferente em Alter do Chão, antes da rodovia, antes do seu asfaltamento, e agora, depois da rodovia? O que mudou? O que é melhor na tua opinião? R2- Bom... Em relação a isso, na época, agente ia pra Santarém de barco... e... você saia daqui tipo... final da tarde, 3 horas da tarde... você só ia pra Santarém mesmo de barco, não tinha outra locução, era mesmo de barco, ta... aí já dormia na cidade, no outro dia, no dia seguinte, você passava tipo o dia e já retornava de tarde pra Alter do Chão... chegava 5 horas, 6 horas em Alter do Chão... A mudança depois, quando veio a estrada, é que você ia pra Santarém de caminhão... quando era época da chuva, não tinha cobertura, você ia de caminhão e molhava tudo... era um pau-de-arara, naquela época e... bom, hoje a mudança foi pra melhor, porque nós temos ônibus aqui, quase que de hora em hora né, você gasta 30 minutos pra ir pra Santarém... vai a hora que quer, volta a hora que quer... eu acho que melhorou por esse lado, eu acho... E- E a Vila 20 anos atrás e agora? R2- Há 20 anos atrás tinha a política do bom vizinho, você emprestava café, você emprestava açúcar... tinha essa política... hoje não existe mais isso... a... o progresso traz certas coisas que destrói a... aquela boa parceria, porque era legal isso daí, sabe... é você emprestar uma xícara de café pro vizinho, depois você ia lá e pagava... mas era legal, sabe, isso daí, sabe... muito bom... hoje em dia, ninguém é de ninguém, sabe... você só cumprimenta as pessoas, mas acabou aquela... mesmo Alter do Chão do tamanho que ta, não existe mais aquela afinidade como era naquela época... você ia, você pegava peixe, você distribuía com os vizinhos porque você tinha bastante, você dava, não era vendido... hoje já é comercializado... isso mudou bastante... Descaracterizou também a Vila né... naquela época as casas eram todas feitas de taipa, né, e hoje você já observa prédios, casas de alvenaria, casarões... e também mudou muito, nesse aspecto. E- Na tua opinião, tem em Alter do Chão, algum lugar, algum monumento, alguma construção... algo que tenha o valor de monumento pra Vila? R2- Eu diria que a igreja... a igreja. A igreja e a Serra Piroca, eu diria que é outro marco muito forte de Alter do Chão, são as duas coisas que...

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Alter do Chão tinha uma senhora que morreu com, dizem, com 130 anos, que ela falava... só ela que falava, porque outras pessoas jamais... que quando teve a Guerra do Rosa, ela devia ter 14, 15 anos e essa igreja tava assim com 2 metros de altura, e que colocavam essas pedras que ainda não tinha marreta... iam só colocando as pedras, com barro e cinza... não tinha cimento... parece que cal também era usado... tanto é que as paredes dessa igreja são um absurdo e ainda tem umas pontas de pedra do lado de fora, porque não encaixava bem, então... e ela comentava, mas era só ela mesmo, porque outras pessoas, não sabiam de nada... eu diria que isso é um dos marcos de Alter do Chão... diria te que histórico, né, como patrimônio que tem que se preservar, não é. E- Com relação ao lazer, onde tu achas que acontece o lazer dos moradores aqui na Vila? R2- Na praia... o lazer aqui é na praia... as famílias quando, uma vez ou outra é... vai pras praias, passa o dia na praia... Não tanto a praia da “Ilha”, mas outras praias... a praia da “Ilha” fica mais pro turista, o visitante né... o nativo da Vila, ele se afasta pra uma outra praia, ou em volta do Lago, ou pra beirada do... pra beira do Tapajós... Dificilmente fica na “Ilha”... a “Ilha” fica mais para os visitantes. E- Mas por quê? Vocês acham ruim ir com o turista ou tem outros motivos? R2- É porque você fica mais à vontade, mais distante do turista... essa que é a verdade... e é... muitas das vezes você já leva um peixe, ou uma carne, ou alguma coisa... procura um local bom, e você como nativo sabe onde tem os lugares bons, mais afastados, e você... passa o seu dia nesse locais, mais afastados da Vila, porque tem vários locais bonitos em volta do Lago e só você que sabe... o turista que chega aqui, ele não sabe... não sabe qual é o acesso pra lá, não sabe que existe aquilo bom também de você passar um dia com sua família. E- Tudo bem então, a minha última pergunta: Na tua opinião qual é o lugar, ou a vista, ou a construção, ou a paisagem... o que for... que tu achas que é mais marcante em Alter do Chão? R2- Olha, eu sempre me preocupo com... com a... com as barracas da “Ilha”. Porque eu acho que é um lugar que recebe todos os turistas que passam por Alter do Chão, eles visitam esse local... então, é uma preocupação você manter elas num padrão bom, de boa qualidade, é... trabalho bem feito nelas, pra que o turista chegue lá e pelo menos ele tenha uma... um negócio bem apresentado pra recebê-los, sabe... Então, eu diria que as barracas... eu diria que o conjunto todo, sabe... a barraca, o estilo delas e o tratamento, isso daí é muito interessante, porque é... é bom que o turista chegue e vá lá e... seja bem tratado, tenha um negócio limpo, bonito, pra que ele saia de lá “ahh pô, eu fui na “Ilha” e realmente as barracas são boas... e o tratamento é bom”, sair realmente falando alguma coisa de bom... eu me preocupo com isso lá, assim eu acho que é fundamental em Alter do Chão... Já pensou você vir em Alter do Chão e é bonito, tem uma praia bonita, mas não tem umas barracas boas, não tem um tratamento bom? Não vale à pena ter uma praia boa se você não tem um... um equipamento bom lá... eu diria pessoas, barracas e atendentes... isso daí que tem que ser conjunto. E- Legal. Acho que é isso, Mário. Tens mais alguma coisa à acrescentar? Pode também fazer um consideração sobre qualquer coisa mais que tu aches importante sobre as mudanças que aconteceram na Vila... ou ainda sobre coisas que não mudaram e que tu achas que tem que mudar, ou que não tem... R2- É que Alter do Chão, com a demanda de turismo que é grande, você tem que se aparelhar com isso, queira ou não queira, hoje há a necessidade de você se aperfeiçoar, se aparelhar com o turismo, por exemplo. Alter do Chão recebe turista do mundo inteiro e isso é indiscutível... e você não tem aqui um banco, um caixa eletrônico... isso se faz necessário que tenha pra manutenção do próprio turismo... e você mesmo... Alter do Chão, tudo que tem que fazer, tem que ir pra Santarém... eu acho que já era tempo de ter aqui em Alter do Chão alguma coisa dessa natureza, que você, aqui mesmo resolvesse certas coisas... eu diria que se faz necessário isso, sabe. E- Muito legal! Obrigada então, Mário!

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ANC - Ancoragem

Residente nascido em Alter do Chão. Trabalha como condutor de eco-turismo e trilhas.

ECH – Expressões-Chave (Negrito)

- a gente sempre que quer passar o dia fora, a gente vai pra ilha, e a gente sempre freqüenta essa barraca - a gente tem uma certa amizade com eles lá e a gente sempre procura essa barraca... - É... a amizade que a gente tem com esse pessoal - E eu não sei, mas com certeza daqui a 10 anos vai ta totalmente diferente isso, então eu gosto de registrar essas coisas... pra mais tarde você ter o... comparar assim... - cada ano que passa... ela vai se assoreando mais... Esse local, aqui já teve muitas árvores... vários tipos... hoje já não tem mais... - Essa é uma forma de juntar todos os barraqueiros e os participantes que permanece... - e isso faz parte do ritual... essa foto é recente... é desse ano. - o ritual original que foi resgatado, e eles tão ainda, né, fazendo esse ritual aí (...) porque a maioria já é profana - eu gosto de registrar... aqui tem várias pessoas da Vila - a Festa era feita na praça, né, ali na beira... na frente da igreja, na frente da igreja... já duns 5 anos pra cá mudaram, porque se tornou pequena - Antigamente quando era... quando era feita essa Festa, ela era mais... mais participada pelo povo da comunidade, hoje já é menos, em função da necessidade, né, aumentou muito, e... e o fluxo de pessoas é muito grande - ... é um fluxo de pessoas muito grande, e isso fez com que houvesse necessidade de mudar muita coisa da comunidade... mas eu acredito que antes era bem melhor, era mais participado pelo povo da comunidade. - e uma coisa que ficou... que não ficou muito bom, no meu ponto de vista, é na praça, é a questão daquela obra lá... é muito concreto ali, sabe... por ser na Amazônia, sabe, eu acho que pelo menos os bancos deviam ser de madeira... é, o coreto devia ser um pouco mais trabalhado... coisa mais rústicas assim, sabe... - eu gostaria que fosse mais natural, mais rústico assim... de uma forma bem trabalhada, bem feita, eu acho que seria muito mais aceito, sabe - E é interessante que pro turista tenha, que continue neste local, animais, pássaros e... é o trabalho que agente faz, é amostrar pássaros, animais... - hoje com a consciência do turismo, da preservação, o pessoal parou mais de caçar... você já observa que tem alguns animais que agente não via mais por aqui, então, que já tão se reproduzindo por aqui - eu acho muito importante... como eu já disse, pragente trabalhar com o turismo, tem que ter essas coisas - bom, essas árvores que tu estás observando aqui são genipapeiros, que dão os frutos e que servem como alimento pra tracajá, pra pato, pra alguns animais - foi interessante ver a mudança dali... acho que foi bom porque aqui no meio dessa dança tinha o jardim... sempre a comunidade manteve o jardim, e ao término da festa, o jardim ia pro beleléu - dessa praça aí, você observa a “Ilha”... eu acho muito interessante essa visão que você tem da “Ilha”, sabe. É... hoje, atualmente, hoje... eu não sei como é que vai ficar com essa mudança que tão fazendo, com quiosque na frente da praça, quando... a visão... - Em relação a isso, na época, agente ia pra Santarém de barco (...)A mudança depois, quando veio a estrada, é que você ia pra Santarém de caminhão - hoje a mudança foi pra melhor, porque nós temos ônibus aqui, quase que de hora em hora né, você gasta 30 minutos pra ir pra Santarém... vai a hora que quer, volta a hora que quer - Há 20 anos atrás tinha a política do bom vizinho (...) você ia, você pegava peixe, você distribuía com os vizinhos porque você tinha bastante, você dava, não era vendido... hoje já é comercializado... isso mudou bastante...

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- Descaracterizou também a Vila né... naquela época as casas eram todas feitas de taipa, né, e hoje você já observa prédios, casas de alvenaria, casarões... e também mudou muito, nesse aspecto. - A igreja e a Serra Piroca (...)eu diria que isso é um dos marcos de Alter do Chão... diria te que histórico, né, como patrimônio que tem que se preservar, não é. - as famílias quando, uma vez ou outra é... vai pras praias, passa o dia na praia... Não tanto a praia da “Ilha”, mas outras praias... a praia da “Ilha” fica mais pro turista, o visitante né - porque você fica mais à vontade, mais distante do turista... essa que é a verdade... - eu sempre me preocupo com... com a... com as barracas da “Ilha”. Porque eu acho que é um lugar que recebe todos os turistas que passam por Alter do Chão, eles visitam esse local (...) Então, eu diria que as barracas... eu diria que o conjunto todo, sabe - É que Alter do Chão, com a demanda de turismo que é grande, você tem que se aparelhar com isso, queira ou não queira, hoje há a necessidade de você se aperfeiçoar - e você não tem aqui um banco, um caixa eletrônico... isso se faz necessário que tenha pra manutenção do próprio turismo

ID – Idéias Centrais

- Relações de amizade com proprietários de barracas na “Ilha”, reforçando sua utilização no lazer da família; - O uso da fotografia como registro, como memória do que era, de quem vivia, de quem participou, para a comparação com o futuro (mudanças, mortes, etc); - Participação ainda grande dos moradores na Festa do Sairé (na Praça do Sairé) , apesar de se referir a uma diminuição da participação comunitária na festa (sendo na atualidade, mais comercial); - A superlotação da Festa do Sairé forçando sua mudança da Praça da Igreja Matriz para a Praça do Sairé; - Pposiciona-se contra a utilização de materiais como ferro e o concreto na obra da Praça e da Orla, apesar de não ser contra a reforma. Enfatisa a necessidade de se manter as características do lugar através de certa rusticidade; - Defende a presevação da fauna e da flora enquanto atrativos turísticos, onde a diminuição das caçadas e a manutenção de árvores frutíferas têm contribuido; - Manifestou dúvida e preocupação quanto ao futuro da vista para a “Ilha”; - Destacou a melhoria no ttransporte com a abertura da estrada e seu asfaltamento; - Citou as mudanças nas relações de vizinhança e de compadrio, assim como também, a alteração dos padrões construtivos; - Cita como monumentos a Igreja Matriz e a Serra. Onde a igreja deve ser preservada como monumento histórico; - Refere-se ao lazer da população local em outras praias (que não a “Ilha”), por julgar que os residentes sentem-se mais à vontade longe dos turistas, inclusive preparando a alimentação no local; - Destaca como mais marcante a vista das barracas na “Ilha”; - Fala da necessidade de aperfeiçoamento para a atividade turrística, inclusive com a ampliação de serviços, como o caixa eletrônico (banco), por exemplo.

EMS - Elementos Morfológicos e Sócio-culturais

- ““Ilha”” - Festa do Sairé - Rua de acesso à Igreja Matriz - Praça da Igreja Matriz - Igraja Matriz - Morro Serra Piroca - Praça do Sairé

QUADRO 03: DSC da Entrevista Residente 2 Fonte: A autora, 2007.

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Entrevista 3 E – Entrevistador R3 – Residente entrevistado 3 FOTOS DO ENTREVISTADO:

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4 5 E- Vamos começar então? Primeiramente, eu gostaria que tu te apresentasses: nome, atividade, tempo de moradia na Vila, idade, escolaridade. R3 – Meu nome é Cristina Sardinha, eu to com 34 anos e nasci aqui... Minha formação é... eu tenho nível superior, fiz curso de direito, só mesmo o bacharelado em direito e a minha profissão, eu to como oficial aqui do cartório... oficial de registro civil. E- Então, com isso agente vai conversar um pouquinho sobre essas fotos que tu escolheste. Tu podes descrever pra mim a tua primeira foto? Dizer pra mim direitinho onde é, o que é… R3- Essa daqui é quando nós fazíamos... que nós ainda fazemos... essa daqui é das procissões da Vila, principalmente aqui da nossa padroeira que é Nossa Senhora da Saúde, e ela é bem antiga mesmo... aqui não diz a data... é de 81, é de 81. Aqui o cartório ainda era coberto de palha, e as ruas eram chão mesmo… agente carregava a imagem no... os homens carregavam a imagem no ombro, agora já ta mais moderno, agora é só empurrado... então é uma foto bem aqui que agente sempre guarda pragente recordar aqui da praça, aqui já chegando na igreja. E– O que tu achas de mais importante nessa foto? Porque tu achas legal essa imagem e escolheste ela pra agente conversar? R3- Essa foto aqui eu sempre guardo como recordação de como era aqui o cartório e como era também o andor, que agente chama aqui, né, a berlinda aqui é o andor, que aqui ainda era feito de madeira, agora não, já é ferro... as pessoas já não tem mais, vamos dizer, aquele sacrifício de carregar nos ombros, já é empurrado, né. Então, ela marca muito principalmente daqui, do nosso trabalho, do nosso local de trabalho, como era aqui... Que não era rebocado, era de taipa mesmo, pode ver que ainda era feito de pauzinho, né… E- E o que tu achas dessa questão da construção? Dessas mudanças? R3- Mudou pra melhor. Mudou pra melhor, muito melhor... aqui do cartório, sempre meus pais, eles mantinham aquele estilo antigo... as pessoas que vinham aqui gostavam, principalmente os turistas. Só que, por ela ser coberta de palha, na época faziam aqueles balões de festa junina, então, várias vezes quase cai aqui, vai que pega fogo... aí tem os livros, né. O meu pai que era o tabelião foi, né, no Fórum, eles aconselharam também a mudar...

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a colocar de brasilit, por causa da preservação dos livros, mas se não fosse por isso, até hoje seria de palha porque as pessoas até... muitas pessoas que casaram na época, quando chegam aqui perguntam “poxa, porque mudaram, né?” , e agente explica mas... então, agente sempre diz que o progresso traz o desenvolvimento... mas era muito bom, as pessoas gostavam quando era assim. E- E a questão da praça? Tiveram algumas mudanças, teve uma obra agora bem recente… Qual a tua opinião à respeito dela? R3- A praça, vamos dizer, ta sendo muito bom pra chamar os turistas, antes os turistas reclamavam, principalmente ali da orla... agora que eles já tão terminando, já tão concluindo, dia 22 vai ser a inauguração, eu espero que seja... espero que agrade a todos, né. Já teve uma polêmica, que não queriam esses banquinhos, queriam que fosse de madeira, ou que fosse de um outro material que num esquentasse, mas ta saindo... pelo menos houve uma mudança muito boa... apesar de ter mudado, né, algumas características que tinha... o coreto era diferente... até mesmo os jardins que tinha, que tiraram e ficaram esses vagos aí, né, mas no meu, no meu ponto de vista ta bom. E- Então podemos ir pra tua segunda foto? Descreve a foto 2 pra mim, por favor. R3- Essa daqui também é uma outra foto da padroeira, só que num outro estilo... essa daqui já não tinha mais a berlinda, né, e também tem várias pessoas... agente sempre conta, que tinha várias pessoas, principalmente esse senhor aqui que era da minha família, que não está mais... então, a única foto que ele saiu é essa daqui, sempre minha mãe guardava como recordação, e outras pessoas também que tão aqui que no momento, não existem mais, então sempre que... essa daqui é da padroeira, só que é outra... já é mais nova né. A importância dela é de recordação... aqui é a igreja, já aparece a igreja... na outra não aparece, mas nessa aqui já... e aqui do lado esse salão aqui que agente chama de Centro Comunitário, da comunidade... esse é o salão daí. E- E na foto 3? R3- Essa daqui agente guarda porque é como era o cartório... é como tavam demolindo, né... tirando a palha, que aqui já não aparece mais a palha, né, e passando pro... pra telha né, mas a parede ainda era como antigamente era, agora já tá também mudada... Mas continua sendo de taipa, nós só rebocamos a parede… continua de taipa, continua um embarreado de barro, né... então, ainda é assim, só fizemos mesmo rebocar pra tirar essa... R3- Aqui já era a... a quarta foto, já é ela coberta né, aqui ainda ta fazendo, aqui já é a coberta... E- E o que tu achas também dessa coisa da mudança do tipo de arquitetura? Isso aconteceu só no cartório? Como que tu vês isso? R3- Não... isso aconteceu na Vila toda, né. Eu sinto muita falta do que era... até que o modelo assim da arquitetura, não tem pra mim, muita importância, mas eu gostava como era, principalmente, como eu tava falando, na época da... na nossa antiga praça tinha um coreto, né, eu não sei se isso daí pode-se chamar de coreto, mas o estilo dele era muito bonito... pena que eu não tenho... eu procurei foto, mas não encontrei pra mostrar como era o coreto aqui na frente... e aqui mesmo na, aqui dentro da Vila, aqui descendo já houve muitas mudanças... já não tem mais aquelas casas no estilo antigo... que aqui na praça, o que ainda tem mesmo das, do tempo, somente a igreja, que até o próprio cartório foi modificado, apesar de... do estilo dele ainda continuar o mesmo, só que já foi rebocado, já foi, já ta com telha... mas a... o estilo da arquitetura em si, da Vila, eu sinto mais saudade do meu tempo de criança ainda... Até aqui mesmo o salão era de madeira, não era assim… era tudo diferente. E- E já que tu achavas melhor, qual era a vantagem que tu vias? Era melhor por algum motivo ou só porque sente saudade? R3- É porque é o que agente tem guardada, né, aquela lembrança... eu tinha, pelo menos eu tinha aquela lembrança de que não ia mudar assim, muito né... ta certo que meus pais diziam “não minha filha, tu vais ver que daqui com um tempo não vai ser mais... com o tempo

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talvez até o cartório aqui não exista mais aqui, vá pra outro local”... mas sempre eu ficava crendo que não, né, que tinha que preservar, que tinha que ficar naquele jeito... muitas casas daqui, até ali que é uma Dona Luzia, chama tia Luzia, que agora já ta até mudando a casa dela, que agente dizia que era ainda a única casa que ainda era da antiguidade é da tia Luzia, mas agora até a tia Luzia já ta construindo uma casa já, de alvenaria, né, então, já mudou... que também que os turistas vinham pra ir lá conhecer a casa dela que ainda era de palha, de taipa tudinho... que aqui agente não vê... aqui mesmo centro da Vila, até agente indo assim é difícil encontrar... eu só sei dizer que eu sinto muita saudade desse tempo que era assim... não tinha essas casas aí, não tinha essas barraquinha na praia, né, era livre... agente podia curtir à vontade... agora agente já tem aquela coisa de ter essas barracas na praia. E- E a tua quinta foto? Podes descrever pra agente? R3- A minha quinta foto é dessa praia aqui. É lá no Lago Verde, na “Ilha”, que chamam... que essa aqui né, essa praia aqui é da “Ilha”. Nessa ilha, agente sempre, agente tem a recordação que essa ilha fazia parte da minha família e que a minha irmã, ela nasceu nessa ilha, né... nós moramos também... eu passei a minha infância lá... nós morávamos mais pra lá... e a minha irmã nasceu lá nessa ilha, e depois, por motivo de saúde do meu pai, nós tivemos que... aí foi divido a herança, aí meus tios repartiram e a parte que coube a meu pai, nós vendemos porque ele tava muito doente, aí nós vendemos. Então sempre tenho uma recordação de lá, dessa ilha, que agente chamava de Ilha da Santa Ana, que agora ta com um outro pessoal aí que eu não lembro... então sempre o... o nosso lazer era pra lá, né, final de semana agente ia embora daqui, ou então ia dormir pra lá, fazer Piracaia, levava os amigos, os parentes... então, também tenho muita recordação de momentos muito bons nessa ilha... essa é a minha quinta foto. E- E me diz outra coisa, o que é pra ti hoje a tua forma de lazer? Já que tu disseste que aí era o teu lazer... R3- Agora o nosso lazer é aqui na estrada. Nós temos um sítio, passando ali a comunidade do Caranazal, né, que tem um igarapé que deságua aí no Lago, então nosso lazer agora é pra lá... todo o final de semana, os meus irmãos vêm de Santarém, que eles moram pra lá, só a minha irmã que trabalha aqui, só que ela ta de licença por causa de uma cirurgia, né... aí, então, sempre quando pode, agente... agora nas férias o meu irmão ta até pra lá, direto... só ta esperando as crianças dele saírem de férias lá de Santarém, pra ele ir pra aí... o nosso lazer agora é pra lá, ou então aqui mesmo, na praia... mas é mais assim, mesmo no meio da semana à tardinha, né, porque domingo agente já acha que é muita gente, aí já pra levar criança... ou então num sábado... mas lazer tem mais é lá pro igarapé no nosso sítio. E- Agora, além das fotos, eu queria que tu me falasses um pouquinho de como era Alter do Chão tipo, 20 anos atrás, antes do asfaltamento da rodovia, e hoje... e o que tu achas que piorou e que melhorou. R3- Eu não tenho assim nem muita lembrança, mas com o asfaltamento melhorou muito, porque agente sofria muito com a poeira, né, poeira... e quando chovia, o carro que nós íamos pra lá sempre ficava atolado... aí demorava pra chegar em Santarém, era cansativo... agora com o asfalto não né... melhorou. Apesar de, como meus pais diziam, trouxe muita gente, às vezes como se diz, que não presta pra Alter do Chão... facilitou mais que a pessoa não tinha nem quase transporte, era... era... o transporte pra cá era 5 horas da manhã, e ia pra Santarém e depois retornava só à tardinha... agora não... passava o dia passando lá em Santarém... agora não, a hora que quer, volta né, então melhorou por isso também, que deu acessibilidade ao transporte pra cá... e antes era só... o ônibus vinha só duas vezes... a primeira vez de manhã e só retornava à noite... 6 horas da tarde... aí também com o asfaltamento veio a energia elétrica também, que melhorou muito pra nós, que aqui funcionava com luz mas era até... era de 7 à 9 da noite... e agora já temos energia elétrica. As ruas eram terra mesmo, agora já tem umas que tão asfaltadas, mas ficou muito quente… eu achei

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que ficou muito quente com o asfalto... mas é o progresso né, é o desenvolvimento, agente tem que acompanhar esse desenvolvimento. E- E o que tu achas? Melhor como ta hoje ou melhor como era? R3- Facilitou muito... então pra mim ta melhor como ta agora. E- Na tua opinião aqui em Alter do Chão, tem algum lugar, alguma construção, alguma coisa que tenha o valor de monumento histórico? Algo que tenha um significado de memória pras pessoas? R3- Eu acho que é somente a igreja... é... a igreja. Ela ta até tombada pelo Estado, né, por isso que não pode mexer muito, não pode abrir uma... como é... uma reconstrução, uma reforma dela, a não ser que peça autorização do Estado porque ela ta tombada... não pode mexer muito nela... apesar de que ela tava caindo, lá atrás já tava desmoronando um pouquinho... aí ajeitaram mas não mexeram em nada, nada-nada-nada. Então o nosso monumento aqui histórico, na minha opinião, e que as pessoas também acham, é aí a igreja. E- E além do lazer da família de vocês, que é uma coisa mais particular, quais são as formas de lazer e os lugares do lazer da população da Vila? R3- Tem a praia... e agora tem a quadra, né, o local ali onde fazem o Sairé, que as pessoas fazem o torneio de futebol... a escola também faz as suas diversões lá, então... e aqui até que eu saiba... lazer aqui em Alter do Chão é a praia, é. E- E por último, na tua opinião, Cristina, qual é o lugar, a paisagem, a construção, a vista, qualquer coisa que pra ti é a cara de Alter do Chão? O que é a coisa mais marcante de Alter do Chão, na tua opinião? R3- A praia. A praia e principalmente o morro onde tem aquela cruz, né, que foi o primeiro sinal dos padres aqui em Alter do Chão né, dos jesuítas... então esse morro, tem a cruz lá no alto... então também é um marco muito importante aqui de Alter do Chão. Mas o que, qualquer lugar que mostrar uma foto aqui da “Ilha” do Amor, que chamam né, com o Lago, principalmente quando ta seco, é a praia. Uma vista aérea aqui de Alter do Chão é muito bonita. Então qualquer lugar assim que eu for, se eu sair um dia daqui, é a praia. E- Legal Cristina. Se tu quiseres falar mais alguma coisa, completar mais alguma coisa que eu não te perguntei e de repente tu queiras, até protestar, ou dizer, ou dizer que é legal... R3- Eu acho que é isso mesmo... foi bom conversar, contar alguma coisa pra você aqui de Alter do Chão. E- Então, muito obrigada Cristina! ANC - Ancoragem

Residente nascido em Alter do Chão. Trabalho no cartório e os aspectos religiosos da Vila. Ter que se acompanhar o progresso.

ECH – Expressões-Chave (Negrito)

- essa daqui é das procissões da Vila, principalmente aqui da nossa padroeira que é Nossa Senhora da Saúde - Aqui o cartório ainda era coberto de palha, e as ruas eram chão mesmo - eu sempre guardo como recordação de como era aqui o cartório e como era também o andor, que agente chama aqui, né, a berlinda aqui é o andor, que aqui ainda era feito de madeira, agora não, já é ferro - Mudou pra melhor, muito melhor... aqui do cartório, sempre meus pais, eles mantinham aquele estilo antigo... as pessoas que vinham aqui gostavam, principalmente os turistas - O meu pai que era o tabelião foi, né, no Fórum, eles aconselharam também a mudar... a colocar de brasilit, por causa da preservação dos livros, mas se não fosse por isso, até hoje seria de palha - Já teve uma polêmica, que não queriam esses banquinhos, queriam que fosse de madeira, ou que fosse de um outro material que num esquentasse (...) apesar de ter mudado, né, algumas características que tinha... o coreto era diferente... até mesmo os jardins que tinha, que tiraram e ficaram esses vagos aí, né, mas no meu, no meu ponto de vista ta bom - agente sempre conta, que tinha várias pessoas, principalmente esse senhor aqui

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que era da minha família, que não está mais - A importância dela é de recordação... aqui é a igreja... - Essa daqui agente guarda porque é como era o cartório... é como tavam demolindo, né... tirando a palha, que aqui já não aparece mais a palha, né, e passando pro... pra telha né - então, ainda é assim, só fizemos mesmo rebocar pra tirar essa... - Eu sinto muita falta do que era... até que o modelo assim da arquitetura, não tem pra mim, muita importância, mas eu gostava como era, principalmente, como eu tava falando, na época da... na nossa antiga praça tinha um coreto... (...) já não tem mais aquelas casas no estilo antigo... - É porque é o que agente tem guardada, né, aquela lembrança... eu tinha, pelo menos eu tinha aquela lembrança de que não ia mudar assim, muito né - que agente dizia que era ainda a única casa que ainda era da antiguidade é da tia Luzia, mas agora até a tia Luzia já ta construindo uma casa já, de alvenaria, né, então, já mudou... que também que os turistas vinham pra ir lá conhecer a casa dela que ainda era de palha, de taipa tudinho - Nessa ilha, agente sempre, agente tem a recordação que essa ilha fazia parte da minha família e que a minha irmã, ela nasceu nessa ilha, né... nós moramos também... eu passei a minha infância lá... nós morávamos mais pra lá... - Nós temos um sítio, passando ali a comunidade do Caranazal, né, que tem um igarapé que deságua aí no Lago, então nosso lazer agora é pra lá... - o nosso lazer agora é pra lá, ou então aqui mesmo, na praia... mas é mais assim, mesmo no meio da semana à tardinha, né, porque domingo agente já acha que é muita gente, aí já pra levar criança... - mas com o asfaltamento melhorou muito, porque agente sofria muito com a poeira, né, poeira... e quando chovia, o carro que nós íamos pra lá sempre ficava atolado... aí demorava pra chegar em Santarém, era cansativo (...) agora não, a hora que quer, volta né, então melhorou por isso também, que deu acessibilidade ao transporte pra cá - As ruas eram terra mesmo, agora já tem umas que tão asfaltadas, mas ficou muito quente… eu achei que ficou muito quente com o asfalto... mas é o progresso né, é o desenvolvimento, agente tem que acompanhar esse desenvolvimento. - Então o nosso monumento aqui histórico, na minha opinião, e que as pessoas também acham, é aí a igreja. - Tem a praia... e agora tem a quadra (...) a escola também faz as suas diversões lá - A praia e principalmente o morro onde tem aquela cruz, né, que foi o primeiro sinal dos padres aqui em Alter do Chão né, dos jesuítas...

ID – Idéias Centrais

- Ressalta a participação, registro e importância das procissões católicas na Vila; - Fala das características antigas da Vila, da praça da Igreja Matriz duas antes da reforma, das características das construções. Nesse âmbito destaca o cartório (como local de trabalho) que era em taipa de mão e cobertura de palha; - Vê nas fotografias o registro, a memória com relação às mudanças e às pessoas que viveram/morreram, que participaram de eventos e procissões; - Cita que os turistas preferiam o antigo cartório e justifica as alterações com questões relacionadas à segurança; - Diz que gostou das obras da orla e da praça, apesar de ter feito ressalvas quanto ao novo coreto (o anterior era mais bonito) e aos jardins (que estavam bem cuidados e não existem mais); - Fala das mudanças e reformas ocorridas na Igreja Matriz, enfatisando as limitações impostas pelo tombamento dadas as características históricas do bem; - Sente saudades da Vila em sua infância, retomando a fala sobre as mudanças nas casas da Vila, na praça, na igreja, no coreto. Fantasia que esperava que a mudança não ocorresse em tal velocidade; - Cita que as alterações construtivas aconteceram até mesmo na casa de Dona Luzia, que sempre foi referência local e ponto de parada de visitantes e turistas; - Cita que sua família morava/era proprietária de uma ilhota no Lago Verde, onde

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viviam durante sua infância, com maior isolamento mas que possuia maiores componentes de lazer e do convívio com os amigos; - No lazer da família, referencia um pequeno sítio localizado na comunidade de Caranazal (2 km de Alter do Chão), ou ainda a própria praia como alternativa desde que fora dos momentos de pico da movimentação dos turistas; - A percepção da abertura e asfaltamento da estrada como melhoria de acessibilidade; - Percebe o asfalto necessário ao desenvolvimento local ainda que também o cite como fator de aquecimento térmico da Vila; - Referencia a Igreja Mariz como monumento local; - E como elementos mais marcantes da Vila, destaca a vista da “Ilha” com o morro ao fundo.

EMS - Elementos Morfológicos e Sócio-culturais

- Procissões católicas; - Construção do cartório (local de trabalho); - Igreja Matriz; - Centro Comunitário; - Coreto da Praça da Igreja Matriz; - Casa de Dona Luzia; - Antiga ilhota da família no Lago Verde; - Sítio na comunidade de Caranazal; - Praia da “Ilha”; - Morro da Serra piroca.

QUADRO 04: DSC da Entrevista Residente 3 Fonte: A autora, 2007. Entrevista 4 E – Entrevistador R4 – Residente entrevistado 4 FOTOS DO ENTREVISTADO:

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E- Então vamos começar a entrevista com a Rosa, Rosa Castelo... Vamos começar, Rosa, falando um pouco de ti. Quantos anos tu tens? Há quanto tempo vc é moradora da Vila? R4 – Eu tenho 44, moro aqui desde que nasci... os mesmos 44 (risos). E- Pra completar a nossa ancoragem, eu queria ainda que tu falasses um pouco sobre teu trabalho, até que série tu estudaste... As tuas atividades hoje... R4- Eu... eu parei na sétima... Eu parei na sétima, mas foi pra trabalhar... continuo indo na escola porque eu trabalho na escola (risos)... Também tenho barraca a praia, trabalho em casa diário fazendo doces e o trabalho de casa mesmo... tenho... trabalho na escola... trabalho com docinho... trabalho com eventos... tudo que se envolve ganhar dinheiro eu estou... no meu “se vira nos trinta” (risos). E- Legal! Daí agente vai falar um pouquinho das fotos que tu escolheste, ta. Então, na tua foto número 1, diz pra mim o que é, onde é... Descreve pra mim essa foto o melhor que tu puderes. R4- Essa foto aqui, ela é uma foto antiga, na praça, onde ainda se vê muita tranqüilidade, não tem essa movimentação que hoje já tem... os catraieiros todos sentados aqui esperando que desça um passageiro pra ir na praia, pra atravessar pra “Ilha”... E se via uma paisagem muito mais... assim que eu digo... mais caracterizada com a Vila mesmo né, que não é o que ta hoje ne. Por exemplo, hoje, a praça tá muito mais modernizada, cheio de ferro... aqui ainda se pode ver que ainda tinha as barraquinhas de palha, de madeira... E ainda se vê uma tranqüilidade bem melhor aqui, nessa daqui né. E- O que tu achas que é importante dessa foto? Dessa cena? R4- Olha, de importante eu vejo assim que... que ainda ta... por exemplo os catraieiros aqui... eles tão sentados, batendo um papo, não sei se eles, se eles tão aqui esperando passageiro ou se fizeram uma reunião aqui... não sei o que ta havendo aqui... sei que eles estão todos aqui, como aparece... ne, todos sentados… ainda não tem aquele fluxo de movimentação que ta hoje já… E- E das coisas que aparecem na foto, o que é que tu destacas? Podem ser coisas, pessoas, objetos, construções, lugares... R4- As pessoas... esse bar aqui, que é aqui no canto, que é um bar tradicional, que agora foi retirado... as barraquinhas de venda, que são todas de palha aqui... essa castanholeira aqui que é uma tradição também, que ainda continua lá... o poste que ainda era de madeira mesmo. E- Então vamos pra segunda foto? A foto 2, Rosa, descreve de novo – é o mesmo procedimento que se repete em todas as fotos e depois tem mais umas perguntinhas no final. R4- Uhum... aqui é... esse bolo aqui é tradição da Vila, por exemplo, no aniversário dia 6 de março, que cada vez vai aumentando a metragem de bolo... começou com cinco metros e... até aqui nessa, ela tava assim... acho que com 40 metros, eu acho aqui... Que Dona Zica ainda tava viva... ainda tava aqui, já tava aqui com 40 metros, então. E isso daqui é... essa unidade que faz a... essa parte de fazer o bolo, tudo... tem muitos patrocínios, prefeitura e outros... outras pessoas que patrocinam também... e a comunidade se intera a fazer o bolo, e onde tem senhoras idosas que gostam de participar... aqui onde ta sendo feito o bolo é na casa dos idosos, onde eles fazem as reuniões deles... as festinhas deles... e ta sendo feito aqui pelo espaço, ne, que tem. E- E por que tu achas que é importante essa foto? Essa cena pra falarmos sobre ela? R4- É só... é pra mim uma recordação assim... olha o que acontece, tem essa senhora aqui que já morreu, e... por essa foto, agente vê que ela era uma das que participava desse... dessa confecção do bolo. Então, se não tivesse essa foto, se não tivesse sido registrado, agora, por exemplo, jamais, quem poderia dizer que ela era uma das que confeccionava os bolos né? E... eu acho que é muito interessante agente sempre ter registro das coisas ne, porque aqui tem como provar que... que tem uma tradição, né, no caso a tradição do bolo... que esse bolo é tradição de todos os anos... já quando chega o mês de março, as pessoas já sabem que... e tem muitas pessoas que vem até de Santarém mesmo, exclusivamente pra essa festa... já sabem que vai ter o bolo e pra fazer passa dois dias, dois dias e meio, mas pra repartir é

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rapidinho… é relâmpago (risos). Então tem muita gente que faz questão, “ah porque”... muitos podem até dizer “ahh bolo por bolo...” , mas tem muitos que fazem questão de comer um pedaço desse bolo... por mais que o bolo seja gostoso ou não seja... tem muita gente que faz questão, que quer porque quer um pedaço do bolo. E– E na tua opinião, quais são as coisas mais importantes da foto? Os elementos de destaque? Que nem agente fez na outra, as coisas ou os elementos que mais te chamam atenção nessa cena. R4- Ahhh as coisas mais importantes, é você ver que as pessoas trabalham com gosto, tão trabalhando de espontânea vontade... e... e realmente, onde ta sendo trabalhado, é um espaço que se contar, na comunidade, que é o espaço dos idosos... e... o bolo aqui que você sabe que vai ser repartido mais tarde. E- É isso? Legal! Então vamos pra foto três? R4- Aqui essa festa é aqui em casa... é uma festa aqui em casa que agente faz uma também... uma... uma tradição da festa de Santa Ana, dia de Santa Ana, 26 de julho... essa... essa festa é de família, por exemplo, muito embora tenha... tem cidades, tem comunidades que tem essa santa como padroeira ne, e... Alter do Chão, não é padroeira de Alter do Chão, mas é uma tradição de família... e vem dos avós da vovó, dos pais... aí veio pra ela... ela se foi e a família continua fazendo a tradição... e... e é uma tradição de família que vai continuando... então, essa festa foi feita aqui em casa, tem vezes que vai pra... agora, por exemplo, tá quase individual, mas imagem assim tem várias, mas a festa tem uma... como é de família, às vezes, toda família tem sempre uma intriga né, e a Santa Ana era... ficava com a mamãe, aí depois de... como é que se diz... depois de uma desunião na família, veio a causar uma separação da mamãe com as outras... como tios, que fazem parte da herança da santa... aí a mamãe já tem uma outra imagem e agente continua fazendo... tem a imagem que é mesmo da família que vem sendo feita também e agente já tem outra imagem que continua também. Então, é isso que eu vejo… aqui ainda se vê coisa que aqui tem uma casa de barro… coisa que já é difícil você ver... que agora já ta diferente, que era aqui da comadre Dió... Porque se vê que hoje já é difícil encontrar uma casa que ainda seja de barro assim... assim como ta sendo essa daqui, aparecendo essa daqui... então, os convidados ainda tão começando a chegar, e a festa continua assim... E- E tu falaste agora na casa que era de barro... Como é que tu vês essa mudança? Que tu dizes que ta desaparecendo as casas de barro que agora ta difícil de achar? R4- É porque a... ahhh... eu to com 44, eu acho que uns 35 anos atrás, ainda era difícil ver uma casa em Alter do Chão de... alvenaria ou duma madeira muito boa... e... não tinha... era mais mesmo a casa era de barro ou de palha... de palha das paredes à cobertura e as que era melhorzinha eram de barro coberta de palha... ou com cavaco... e hoje não, hoje você já vê que já teve uma mudança muito grande, evoluiu muito, que... que tem muito mais casa de barão que casa de pobrezinho mesmo... então que é difícil você ver uma casa que seja mesmo de... 35 anos, de 40 anos... conforme o tempo que eu já conheço de lã pra cá, vê que não tem mais... é difícil... se você for fazer uma pesquisa na comunidade de, se ainda existe alguma casa, é difícil você encontrar... difícil mesmo... Ta? E- Ta. E o que era bom e o que era ruim dessas casas? Pra hoje assim? Compara do que era pro que é hoje. R4- Ahh o que era bom, era porque... o clima, né. O clima era um clima muito mais gostoso, mais frio um pouco, pela coberta de palha… hoje as casas já cobertas de telha, já todas de alvenaria, então já muda... e então, essa era uma... eu acho que... as pessoas que tinham essas casinhas se sentiam muito melhor, até na saúde mesmo, do que as que hoje que já tão numa casa mais... mais sofisticada assim, de... que tem que ta usando um ventilador, quem tem condições, é ar-condicionado e tudo... e antes o clima era bem diferente. E- Esse era o ponto positivo, mas e o que era ruim?

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R4- O que era ruim é que a palha de... quando não é bem coberta, não demora tem que ta trocando, porque chove tudo (risos) e... esse era um dos pontos... e, por exemplo, quando as paredes começavam a ficar velhas, tinha que ta trocando, tinha que ter muito cuidado com criança por causa de risco de pegar fogo... a criança... como aconteceu até na nossa mesmo... a nossa era toda de palha e já pegou fogo... não sobrou nada porque era tudo de palha (risos) ne, era tudo de palha então... triscou na palha... ainda mais quando ta velho... E- Então ta. Vamos pra foto quatro então? Descreve essa foto pra gente então Rosa. R4- Essa foto é... essa foto aqui ela é... na frente de Alter do Chão... aonde ainda se vê que a água, por exemplo, aqui o rio ta bem... ta bem mesmo... assim... como é que se diz... sem poluição, uma água clara e... e os turistas aqui, são duas, dois passageiros que moram em Brasília... esse catraieiro que é daqui... e se vê que eles tavam bem mais à vontade, né... aqui é a frente da Vila... e se vê que eles tão bem mais à vontade e que a água não tinha tanta poluição como já tem hoje. E- Qual a importância pra ti dessa foto? R4- A importância é que... como eu acabei de dizer que ainda se tinha mais... uma água bem clara que você podia tomar banho, no rio desse lado daqui... porque hoje pode tomar banho no rio mas mais na margem do Lago Verde e... e tem pontos que você quase não pode mais cair n’água... porque é suja, é lama... é risco de arraia... e que, por exemplo, cada vez que se... cada vez que se botava uma carrada de terra, principalmente nas travessas... a... aquela terra, com o barro mesmo, aquela tabatinga, quando se tinha forte chuva, ia diretamente pro rio. E hoje é por isso que ta mais essa poluição que tem, porque colocavam barro... é descida né... aí, cada vez que chovia, ia tudo pro rio mesmo... não é que nem agora, por exemplo, ta já asfaltada, já vai parar um pouco, mas depois do “caldo derramado” é que ta se… ta? E- E algum elemento? Alguma coisa que tu destacarias na imagem, na foto, que te chama mais atenção? R4- Aqui é... a frente que aqui ainda ta... mais à vontade... num tinha essa... tinha, tinha o cais aqui porque foi feita a barragem né, aquele cais velho, agora não... agora já se vê, vai ter outra visão... Aqui ainda podia ver que as casas da frente, ainda eram casas antigas, só tem uma aqui que era uma que agente trabalhava, que é... essa casa aqui de altos-e-baixo, ta… E- Ta, e tu falastes agora na frente ali que ta mudando, que ta diferente... como é que tu estás vendo essa coisa da reforma lá? No cais e na praça... R4- Olha, tem gente que... tem coisas que tem que melhorar, agente não pode continuar do jeito que tava, porque antes, quando não tinha nenhuma barragem, depois já tinha o cais velho, agora veio esse outro cais renovado, era... quando dava fortes chuvas, ficava aqueles, tipo aqueles... barrancos, aquelas... sabe, aquelas entradas de água... não tinha um paradeiro... tinha parte que ia a água até mesmo no... ali, na casa do... ali por perto da casa do Laudeco, por exemplo, a água chegava até na cozinha... como esse ano a enchente foi muito também, a água foi até lá... entrou... então já... com essa agora, essa nova estrutura que tão fazendo, isso daí vai modificar um pouco a visão da frente... a praça, por exemplo, a praça tem muita gente que acha que quando era a praça antiga, a visão era bem melhor, porque não tinha... era mais madeira, não tinha tanta ferragem como ta tendo, os bancos, por exemplo, eram de madeira, não esquentavam tanto... agora esses bancos que tão, quando der um sol tão forte, as pessoas, mesmo já de tardinha já, não conseguem sentar porque fica muito quente... mas como o progresso tem que ir pra frente né... é aquilo, que tem gente que acha que naquilo que tava, tava bom... se melhorar estraga, mas... (risos) mas tem que sempre ir pra frente e não pra trás né. E- Falta só uma então ne? Foto cinco, o que é a foto cinco aí Rosa? Descreve pragente. R4- A foto cinco, ela… Aqui é na praia, eu acho que uns 18 anos atrás, eu diria que tem essa foto aqui... Que as barracas da praia aqui... uns 18 ou 20 anos, por aí... as barracas da praia

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ainda eram com lona, era só feito mesmo a... a... fincado os paus pra que agüentasse as lonas… aparece aqui né... aí as pessoas iam pra praia, ficavam... atavam rede debaixo das barracas mesmo, ficavam... aqui parece até que tem uma melancia em cima de uma toalha, de uma mesa... não sei nem bem o que é aqui... acho que é uma mesa né... Ainda não tinha essa evolução toda... tinha, aparecem umas árvores… e eu acho... era uma outra, uma outra visão que agente via sem movimentação, a praia... agente sentia que quando... quando agente andava agente sentia que a praia meio roncava nos pés, não tinha tanta caminhada na praia, tantas pisadas, né, que... como, por exemplo, agora… há uns… até uns cinco anos atrás, era um perigo dormir na praia porque era carro, era moto, era tudo que tava... que ficavam na praia... era de dia, era de noite... e como aparece aqui nessa foto, ainda não tinha essa movimentação toda que tem agora. E- E isso era bom? Ou era ruim? Tu gostavas de ser calmo ou tu preferes agora com essa movimentação? R4- Não... é... Bom era, bom era… porque o pessoal da Vila mesmo freqüentavam mais, o pessoal não tinha aquela preocupação de ir pra praia e dizer que uma moto ia passar, um carro ia passar, mas... agora... eu acho bem melhor pela... porque em Alter do Chão, o emprego que tem é pouco, né, assim prefeitura... então as pessoas trabalham mais é por conta própria, e se o movimento que ta aqui... aqui, por exemplo, na época eles vendiam duas caixas de cerveja, hoje tem barraca que vende, no movimento bom mesmo, até na semana mesmo, tem barraca que consegue vender até quase 80 grades de cerveja... movimento de férias principalmente... esse movimento do visitante, do turista é importante porque sem os turistas, sem os visitantes num... tirou, por exemplo, um pouco o sossego porque você vivia mais assossegado, então você... era mais tranqüilo. Agora não, agora é mais agitação… você tem que batalhar mesmo... porque assim, as vezes aqui você colocava um peixe na grelha e ficava esperando alguém passar, ver aquele peixe... perguntar quanto era... Agora não, agora você, movimento bom, você põem peixe, tira peixe, põem peixe, tira peixe e... às vezes ainda tem muito freguês que sai reclamando porque não consegue ser atendido, né, muito freguês que vai embora até com raiva porque chega 10 horas pede um peixe, quando ele vai comer já é duas, três horas... porque na frente dele já chegou bastante e já pediram, então ele vai ser atendido conforme a chegada dela na praia... E- Só isso? Ou ainda queres incluir mais alguma coisa dessa? R4- Aqui nós éramos muito preguiçosos, nós ainda ficávamos dormindo (risos)... não... eu acho que era isso mesmo... E- Ta bem, então eu tenho mais umas coisinhas pra te perguntar que não tem mais a ver com as fotos, não diretamente... são coisas mais gerais sobre a Vila. Como que era pra ti Alter do Chão, antes da estrada, dos asfaltamento da estrada? Mudou pra melhor ou pra pior? R4- Claro que era... é... foi pra melhor porque antes, eu lembro que, mesmo antes do asfalto, por exemplo... antes do asfalto você ia pra Santarém de manhã, tinha um ônibus que era... um ônibus, um caminhão... um transporte que era de manha das 5 horas da manhã e só voltava 4, 5, 6 horas de lá, porque a estrada era péssima, principalmente em época de chuva... às vezes era vala daquelas mesmo, que carro passava porque tinha que passar... tinha trecho que você tinha que se segurar pra num... ficar nenhum tremendo de medo porque era muito horrível a estrada, ne. Então não tinha essa, não tinha condições de ter transporte duas três vezes no dia, não, era só uma mesmo. Era uma de ida e uma de volta. E com o asfalto não, com o asfalto foi outra coisa, você tá em Alter do Chão hoje, por exemplo, vai em Santarém a hora que você quer... tem ônibus quase que de hora em hora... não são lá esses transporte confortável, mas você tem transporte pra ir a hora que você quer... e tem pessoas que moram aqui que são de Santarém, que vão trabalhar, vão de manhã, voltam de noite e a hora que se precisa... de repente uma emergência, você sabe que você encontrando um carro você vai ter uma estrada boa pra ir... então, foi muito melhor o asfalto. E- E a Vila mudou muito depois disso?

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R4- Mudou, mudou muito sim, porque o fluxo de gente, de visitante é bem maior, né. Alter do Chão ta cada vez mais evoluindo, como você mesmo que já parou uns tempos aqui, você sabe que o fluxo de gente no final de semana, férias é bastante né. Então, claro que melhorou. Pousadas, tem várias pousadas, tem ferias ou a época da Festa do Sairé que dois, três meses antes de chegar a... as pousadas já estão todas lotadas, porque… Já tão todas lotadas porque não… porque quando chega mais próximo, não tem mesmo como ter espaço, então as pessoas já reservam muito antes, pra poder chegar naquela data e elas estarem com lugar seguro pra que elas possam vim... Aliás, quando foi feita essa estrada, a sinalização... eu acho que não tinha uma outra estrada aqui na, na, na... até mesmo as ruas de Santarém não eram sinalizadas como era essa estrada de Alter do Chão. A estrada foi muito bonita, agora não né, porque já ta toda assim… o pessoal avacalha, não tem aquele cuidado, mas quando iniciou... poxa! Quem conhecia Alter do Chão uns anos atrás e quando veio depois que a estrada, tava, tava recente... ôôô... era uma maravilha! E até hoje, mesmo com a sinalização mais destruída, mas a Estrada continua... já faltando fazer uns reparos, mas... pelo menos não é mais aquela buracada que tinha. E- E na tua opinião, tem algum monumento, alguma construção histórica, alguma coisa na Vila de Alter do Chão que tenha esse peso de monumento, de memória? R4- Como assim? E- É... tu já viste em algumas cidades que tem assim, no meio de uma praça, aquela estátua que é monumento à “não sei o que lá” , “monumento à revolução não sei das quantas”, “monumento ao cara lá que descobriu não sei o que”...? Alguma coisa aqui em Alter do Chão tu achas que tem esse peso de... de as pessoas verem isso como um monumento assim? R4- O que eu acho que tem, não sei, é só a igreja mesmo, porque pra marcar, marcar, eu não vejo uma outra estrutura assim que tenha, por exemplo, que tivesse ali na praça central, que as pessoas... Eu acho que a Igreja e a Serra da Piroca, é... e a Serra da Piroca que as pessoas tem curiosidade de subir lá... Então a igreja eu acho que marca, porque as pessoas falam... o coreto que tinha também, que era um coreto bem simples... isso daí eu não vejo mais que nada tem, tinha... ter tinha, mas agora não tem mais e... a única coisa que desde que eu me entendi que eu vejo ali naquela área da praça, são aquelas árvores em jambeiro... só isso que... outras coisas que marcam, marcam num... não tem. E- Tudo bem. E as pessoas da Vila, na tua opinião, Rosa, tem lazer onde? R4- Trabalhando (risos)... o lazer da Vila é quando se tem... não, o lazer da Vila é mais quando chega o final de ano... Que tem as confraternizações dos clubes, das escolas, das famílias, porque esse que são lazer... porque assim diariamente, anualmente, as pessoas se dedicam mais mesmo a trabalhar... E- Mas nem fim de semana tem, Rosa? E as crianças? R4- Ahh as crianças têm... elas ficam na escola, brincam, tem tempo de jogos olímpicos, vai pra quadra do Sairé... é uma tradição também, já que vão pra lá brincar... agora tem... tem o... no esporte, como é, canoagem… E tem assim sabe, esporte deles… às vezes as pessoas levam pra praia pra brincar... mas das famílias, das famílias mesmo, é só mais final de ano que as pessoas se reúnem e tem... quer dizer, vão pra praia e tem uma comemoração de... de professores, vão pra praia. E- Na tua opinião, a comunidade ainda usa a praia como área de lazer? R4- Usa. Não sempre, mas usa. Porque quando chega o final de semana, as pessoas se dedicam no trabalho mesmo, mais assim pra ganhar... porque no meio da semana, tem os trabalhos, tem gente que trabalha na casa de família, tem gente que trabalha fazendo as coisas mesmo pra vender... e quando chega final de semana, por exemplo, sexta já, tem, tem barraqueiro que tem a barraca na praia e já contrata outras pessoas pra ajudar, pra ir limpar, pra ir ajeitar pro sábado e pro domingo, então... não tem assim aquela, “ahhh porque”... é... o

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lazer é isso... tem muita gente que ainda tem aquilo de sair, de ir na casa dos outros, mas... é isso aí. E- E a última, pra ti qual é o lugar, a paisagem, a construção, a vista de Alter do Chão que é marcante? Que é na tua opinião o mais importante, que é a cara de Alter do Chão? R4- Hoje eu vejo a “Ilha”. A “Ilha” com suas barracas, quando chega em Alter do Chão, pra quem... principalmente quem chega assim a primeira vez, que chega e olha pra frente do rio e se depara com aquelas barraquinhas... eu acho que isso que é a tradição de Alter do Chão, pra mim... tem muita gente que às vezes questiona de ter energia ali na “Ilha”, é bom? É bom porque muitas das vezes precisa, chega à noite, as pessoas já... mas aí eu acho também que não vai muito... assim, combinar sabe. Porque as barracas, por exemplo, quando chega seis horas, as pessoas já tão se... e se for ter energia as pessoas vão ter que dobrar o trabalho, por exemplo, tem muitas pessoas que não vão querer sair seis horas da praia, vão querer ir até muito mais tarde... vão querer já usar à noite... muitas vão querer usar à noite, e não usar o dia e... e também é as canoas né... que quando ta um fluxo de gente muito grande, você… eu acho tão bonito aquilo… ir e voltar aquelas canoas… aquele vão e vêm… acho que é um encanto também. E- Então é isso aí, Rosa... tem mais alguma coisa que tu queiras comentar assim da Vila... Pode ser das mudanças, das obras, ou de antigamente… o que tu… se tu quiseres comentar mais alguma coisa... R4- Acho que o que... você tem várias outras entrevistas né, cada pessoa... cada um ponto de vista, é de cada um, né... então... o que eu relatei aqui foi sobre, combinando com as fotos que estão aí, e... com as coisas que eu vi que dava de falar, né... agora numa hora dessas muitas vezes apaga muita coisa da memória dagente (risos) , quando é depois, agente “ah porque que eu não falei tal coisa” , mas... eu acho que ta mais ou menos, com a entrevista dos outros que você tem aí, você vai poder... E- Mas é isso, não é nada for a do comum… é a opinião de vocês que me interessa. Muito obrigada então, Rosa! ANC - Ancoragem

Residente nascido em Alter do Chão. Trabalha com alimentação, tanto na escola quanto para venda aos turistas, e vê nessas atividades oportunidades de sustento familiar. Idéia de que é preciso acompanhar o progresso.

ECH – Expressões-Chave (Negrito)

- E se via uma paisagem muito mais... assim que eu digo... mais caracterizada com a Vila mesmo né, que não é o que ta hoje ne. Por exemplo, hoje, a praça tá muito mais modernizada, cheio de ferro... aqui ainda se pode ver que ainda tinha as barraquinhas de palha, de madeira... E ainda se vê uma tranqüilidade bem melhor aqui, nessa daqui né. - ainda não tem aquele fluxo de movimentação que ta hoje já… - E isso daqui é... essa unidade que faz a... essa parte de fazer o bolo, tudo... tem muitos patrocínios, prefeitura e outros... outras pessoas que patrocinam também... e a comunidade se intera a fazer o bolo - é pra mim uma recordação assim... olha o que acontece, tem essa senhora aqui que já morreu - E... eu acho que é muito interessante agente sempre ter registro das coisas ne, porque aqui tem como provar que... que tem uma tradição, né, no caso a tradição do bolo... - é você ver que as pessoas trabalham com gosto, tão trabalhando de espontânea vontade - uma tradição da festa de Santa Ana, dia de Santa Ana, 26 de julho... essa... essa festa é de família - aqui ainda se vê coisa que aqui tem uma casa de barro… coisa que já é difícil você ver... que agora já ta diferente, que era aqui da comadre Dió... - era mais mesmo a casa era de barro ou de palha... de palha das paredes à cobertura e as que era melhorzinha eram de barro coberta de palha... ou com

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cavaco... e hoje não, hoje você já vê que já teve uma mudança muito grande, evoluiu muito, que... que tem muito mais casa de barão que casa de pobrezinho mesmo... - O clima era um clima muito mais gostoso, mais frio um pouco, pela coberta de palha… - quando as paredes começavam a ficar velhas, tinha que ta trocando, tinha que ter muito cuidado com criança por causa de risco de pegar fogo... - e se vê que eles tão bem mais à vontade e que a água não tinha tanta poluição como já tem hoje - ainda se tinha mais... uma água bem clara que você podia tomar banho, no rio desse lado daqui... - cada vez que se botava uma carrada de terra, principalmente nas travessas... a... aquela terra, com o barro mesmo, aquela tabatinga, quando se tinha forte chuva, ia diretamente pro rio - num tinha essa... tinha, tinha o cais aqui porque foi feita a barragem né, aquele cais velho, agora não... agora já se vê, vai ter outra visão... - tem coisas que tem que melhorar, agente não pode continuar do jeito que tava, porque antes, quando não tinha nenhuma barragem, depois já tinha o cais velho, agora veio esse outro cais renovado - com essa agora, essa nova estrutura que tão fazendo, isso daí vai modificar um pouco a visão da frente... a praça, por exemplo, a praça tem muita gente que acha que quando era a praça antiga, a visão era bem melhor - agora esses bancos que tão, quando der um sol tão forte, as pessoas, mesmo já de tardinha já, não conseguem sentar porque fica muito quente - Ainda não tinha essa evolução toda... tinha, aparecem umas árvores… e eu acho... era uma outra, uma outra visão que agente via sem movimentação, a praia... agente sentia que quando... quando agente andava agente sentia que a praia meio roncava nos pés - Bom era, bom era (…) mas... agora... eu acho bem melhor pela... porque em Alter do Chão, o emprego que tem é pouco, né, assim prefeitura... então as pessoas trabalham mais é por conta própria (...)esse movimento do visitante, do turista é importante porque sem os turistas, sem os visitantes num... tirou, por exemplo, um pouco o sossego porque você vivia mais assossegado, então você... era mais tranqüilo. Agora não, agora é mais agitação… você tem que batalhar mesmo - E com o asfalto não, com o asfalto foi outra coisa, você tá em Alter do Chão hoje, por exemplo, vai em Santarém a hora que você quer... tem ônibus quase que de hora em hora... não são lá esses transporte confortável, mas você tem transporte pra ir a hora que você quer - Mudou, mudou muito sim, porque o fluxo de gente, de visitante é bem maior, né - Aliás, quando foi feita essa estrada, a sinalização (...) A estrada foi muito bonita, agora não né, porque já ta toda assim… o pessoal avacalha, não tem aquele cuidado, mas quando iniciou... poxa! - Eu acho que a Igreja e a Serra da Piroca, é... e a Serra da Piroca que as pessoas tem curiosidade de subir lá... - Que tem as confraternizações dos clubes, das escolas, das famílias, porque esse que são lazer... porque assim diariamente, anualmente, as pessoas se dedicam mais mesmo a trabalhar... - (as crianças) ficam na escola, brincam, tem tempo de jogos olímpicos, vai pra quadra do Sairé... - Usa (a praia da “Ilha”). Não sempre, mas usa. Porque quando chega o final de semana, as pessoas se dedicam no trabalho mesmo, mais assim pra ganhar - Hoje eu vejo a “Ilha”. A “Ilha” com suas barracas, quando chega em Alter do Chão, pra quem... principalmente quem chega assim a primeira vez, que chega e olha pra frente do rio e se depara com aquelas barraquinhas...

ID – Idéias Centrais

- Percepção de intensas mudanças na Vila e na movimentação local, especialmente na Praça da Igreja Matriz;

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- Destaca atividades de envolvimento comunitário, como a confecção do bolo de aniversário da Vila, realizada pelos moradores; - Vê fotografias como registro, como prova da participação de pessoas (inclusive pessoas já mortas) e como prova da existência do evento, do fato ocorrido; - Destaca as festas de cunho religioso realizadas no âmbito familiar, segundo tradições, de uma padroeira da família; - Aponta a alteração nos cenários das fotos, como por exemplo, as casas da vizinhança, na subsitituição das casas de barro; - As fotos, para o entrevistado, também registram as alterações construtivas ao longo do tempo, tais como a substituição das casas de barro e palha dos residentes, por casas de alvenaria dos visitantes; - Atribui a propriedade das casas de barro aos “pobrezinhos” e as casas de alvenaria aos “barões”; - Demonstra a noção de que as casas cobertas de palha, apesar das dificuldades de manutenção e dos riscos de incêncio (principalmente quando a palha envelhecia), possuia melhor desempenho térmico; - Cita a qualidade da água do Rio em frente à Vila, afetada pelos sedimentos erodidos através das chuvas das vias públicas, niveladas e compactadas com piçarra; - Perceção de que a obra realizada na orla e na praça alteram a vista da “Ilha”, a partir da Vila, apesar de citar a referida obra como uma necessidade; - Referencia a inadequação dos novos bancos da praça ao clima local; - Cita alterações percebidas na Praia do Cajueiro, em suas barracas e em sua areia; - Vê como positivo nas mudanças ocorridas, o aumento do fluxo de turistas, como possibilidade de incremento no trabalho e na renda dos locais; - Valoriza a estrada e sua sinalização, enfatisando a melhoria de acesso que trouxe e o aumento de fluxo de visitantes; - Como monumentos, cita a Igreja Matriz e o Morro da Serra Piroca; - Quanto ao lazer, cita as confraternizações de fim de ano e, para as crianças, a escola, a Praça do Sairé e a praia (às vezes); - Associa a praia da “Ilha” e do Cajueiro com trabalho e renda, não mais como lazer; - Cita a “Ilha” e suas barracas como as coisas mais marcantes de Alter do Chão.

EMS - Elementos Morfológicos e Sócio-culturais

- Praça da Igreja Matriz; - Árvores, pessoas, o antigo bar na orla; - Bolo do aniversário da Vila; - Festas católicas nas famílias (na família do entrevistado); - Vista da “Ilha”; - Praia do Cajueiro; - Igreja Matriz; - Morro da Serra Piroca; - Escola; - Praça do Sairé; - Barracas da “Ilha”.

QUADRO 05: DSC da Entrevista Residente 4 Fonte: A autora, 2007.

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Entrevista 5 E – Entrevistador R5 – Residente entrevistado 5 FOTOS DO ENTREVISTADO:

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4 5 E- Bom dia Laudeco! Agente ta começando a entrevista com o Laudeco. E eu queria começar contigo te apresentando, falando de ti, teus dados: nome, idade, formação ou profissão, o tempo que tu vives em Alter do Chão... R5 – Meu nome é Laudelino Sardinha Vasconcelos, o pessoal chama mais Laudeco... eu nasci em 1957, aqui em Alter do Chão, e desses quase 50 anos, eu acho que pelo menos 40, 45 anos eu morei em Alter do Chão... moro em Alter do Chão... Teve uma... eu saí duas vezes, mas eu saí pouco tempo e... a partir de 1982 eu fiquei definitivamente em Alter do Chão. É... Eu não tenho o ensino fundamental completo ne, e... tive várias atividades né, tipo… no, na... até em 77, os primeiros anos que eu comecei a trabalhar né, mais assim extrativismo, eu fui assim seringueiro, e... depois eu trabalhei em roça também, e… depois eu fui pra Santarém, passei quatro anos, trabalhei lá como gráfico, né, e voltei pra Alter do Chão já, já assim... é... eu fiquei um pouco na construção civil, um pouco como artesão, mas a minha atividade foi mais assim na minha vida pública mesmo, sabe... uma questão mais comunitária, mais partidária... então muitas vezes eu tô numa atividade, depois eu tô na outra assim... já tive barraca em Alter do Chão, trabalhei em restaurante, trabalhei em mercearia... já tive várias atividades, dependendo todo do momento, que que dava pra mim fazer... por exemplo, geralmente eu trabalhava assim, ou trabalho, tentando conhecer aquela atividade, no caso, como que o pessoal se organiza, sabe... então no começo, eu, eu fiz assim várias coisas, justamente pra tentar organizar aquela categoria, aquela, aquele segmento, então eu acabava indo pra lá peluma determinação, política, então... então eu, eu sou muito cumpridor de... de... e acreditava e acredito até hoje na organização dos trabalhadores, não.. não, não defendo muito… não sou… é… assim apaixonado por, por sigla partidária mas, eu ainda acredito na organização do povo... por isso que tem várias atividades que eu exerci até hoje. E- Então agora vamos conversar a partir das fotos ta Laudeco. Eu vou te fazer umas perguntas que meio que vão se repetir pra cada foto na seqüência que você estabelecer, de um a cinco... Na tua foto 1, eu queria que tu me dissesses o que é, o que tem nessa imagem... me descreve ela. Na foto 1, na verdade tu escolheste um duo de imagens que se complementam, não é... R5- é uma foto... na primeira tem uma, uma senhora lavando roupa, e isso era muito comum há, há, há 30... até há 20 anos atrás isso era, era comum, sabe. Talvez até 10 anos... E já 10 anos pra cá você já não percebe mais algumas coisas... mulheres, algumas pessoas, elas... elas as

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vezes se arriscam a lavar roupa no rio, isso às vezes no meio da semana eles lavam lá na “Ilha”, lá na praia... mas na margem que fica pra Vila, você não vê mais quase as pessoas lavando roupa... quando elas lavam, lavam pouco e as vezes tão lavando dentro de uma canoa, por que é... a qualidade da água já não é a mesma, teve muita alteração, tem lama... e isso daí faz com que as pessoas, elas não, elas não se sintam mais motivadas pra fazer esse tipo de atividade que é uma questão cultural da Vila... acho que a foto ao lado, que é também uma senhora com uma criança... essa foto tem mais de 20 anos, e... é... você percebe, é próximo de casa, e você percebe que não tem o muro no entorno dessa região, dessa, dessa... não tem o cais, não tem é... é... asfalto... então, e a paisagem da Vila era, era muito diferente, inclusive com bastante verde, é... os terrenos eram maiores, é… as pessoas, elas não construíam tanto né, não usavam todo o terreno assim e isso... geralmente... é... o... acabava sobrando mais verde no terreno né. E- Pra ti qual que é a importância dessas duas fotos? R5- É... eu vejo assim na questão, na questão da qualidade da moradia, na questão da qualidade de vida... por que é... eu, eu acho que hoje, existe várias pessoas né, que já até concordam no... nessa questão de pensamento, por exemplo, eu, eu sempre acreditei que a qualidade de vida ela não ta relacionado à questão do poder aquisitivo das pessoas, não… então quando, quando… logo que apareceu a televisão, e um dos itens que media a qualidade de vida e de renda das pessoas, era as fábricas de automóveis... quando se vendia muito carro era porque as pessoas estavam melhorando de vida... e hoje os institutos que fazem essa, essa medição, essas pesquisas de qualidade de vida, elas já não levam muito em consideração essa... é... o poder aquisitivo... a renda familiar, e sim a segurança e, eu acho, que em primeiro lugar hoje a qualidade de vida é segurança... e agente percebe que essas duas fotos elas são muito assim, uma qualidade de vida onde tinha segurança, onde tinha tranqüilidade, onde as pessoas não precisavam murar os seus terrenos pra, pra dormir mais seguro... então, eu vejo assim que, mesmo as pessoas tendo menos poder aquisitivo na época, ele tinha uma qualidade de vida melhor. E- E quais os elementos, coisas que aparecem nas fotos, que tu destacarias como as coisas mais importantes dessas imagens? R5- É... eu vejo assim a questão da... do terreno como era, como era... cercado de madeira... não tinha, não tinha asfalto... não tinha o cais... e também é... as praias eram mais, mais limpas né, e numa foto é essa… que tem essa mulher lavando roupa, é que ela ta ali à vontade... ela ta sentada na areia lavando roupa, sentada na praia... então isso daí demonstra que ela tem, que ela ta com uma certa segurança de que ali não ta poluído, não ta suja a água... então eu vejo assim que é... essa foto me mostra muito assim... é... o que nós já perdemos de qualidade da água, da praia, sabe... e hoje as pessoas, as pessoas de Alter do Chão, eu acredito que a maioria não toma banho de rio. E- Ta... e tu falaste aqui um pouco na questão do cais, do asfalto... então pra complementar essas perguntas da primeira foto, eu queria que tu me falasses como tu estás vendo essa obra de intervenção na orla e na praça. Como tu vês essas mudanças todas, Laudeco? R5- é… existe na, na, na...hoje, no próprio formato, é… do modelo de governo no Brasil, ela, ela geralmente... as, as, as obras que são construídas pelo governo estadual, municipal e federal, elas não levam em consideração muito as necessidades da comunidade, ou do povo que vive lá... ela é medida pelo que ela pode trazer de voto pra esse, ou pra aquele governo, sabe... então eu vejo que a...a... o que o governo do estado e a prefeitura... é, mais o governo do estado, ta colocando em Alter do Chão, é uma obra pra ser vista por pessoas quem venham, por turista, e talvez nem, nem, nem... a maioria dos turistas não vão olhar essa obra com bons olhos... por que eu já penso que dentro... por exemplo, nós vivemos no centro da Amazônia, e agente... essa obra ta sendo colocado um montão de cimento, um monte de ferro, e pouco a questão cultural da Vila... que é o que tá em jogo... então quer dizer, tiram árvore, colocam esgoto, sabe, não perguntam pra comunidade se ela quer que

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passe carro ou não passe carro, sabe... então, é, é uma... eu vejo assim que essa obra, é uma... é um afronto pra comunidade... quer dizer, o estado pode e vai implantar a obra... e ninguém perguntou pra comunidade... ninguém foi consultado... se foi trabalhado isso aí, se é isso que NÓS queremos, sabe. Por exemplo, entre a obra e uma questão de geração de renda como uma profissionalização, sabe... é... uma escola de ensino médio... é... um posto de saúde com mais decência, sabe… Não, coloca três milhões numa obra que não vai gerar renda, que não vai trazer benefício, sabe direto pra comunidade. E- Tu preferias que a obra não existisse então? É uma questão di tipo da obra ou uma questão de não ter a obra mesmo e investir em outras coisas como tu falaste ainda agora? R5- Eu, eu... num tô dizendo que eu não quero uma obra... até porque tem umas coisas que mesmo que você não queira, ela vai acontecer, ta... mas é uma questão de que, por exemplo, é… Alter do Chão, como ela vive da beleza natural, e que você não vende, você não vai... é... cobrar pedágio pra pessoas entrar e ver a praia, sabe... mas ela precisa, sabe, se completar, por exemplo a... a... essas, esse, essa orla, ela ta trazendo um impacto muito grande, sabe, onde é uma contradição na beleza natural com uma obra... uma obra arquitetônica que não tem nada a ver com a Amazônia... hummm... que bom! Essa obra é muito bonita, mas que fosse fora de Alter do Chão... e fizesse uma coisa mais, mais, mais doméstica, mais a cara de Alter do Chão, sabe… então eu vejo assim até a questão do, do, de eles não se preocuparam em ter uma paisagem melhor... sabe, não tão preocupados nem com o tipo de pintura, parece que não tem um... um... não tem espaço de jardinagem, sabe, então, as pessoas acham que quanto mais uma janela pras pessoas olharem, melhor... sabe, parece que não interessa quem vai olhar da praia pra Vila, sabe, parece que Alter do Chão se reduz àquela “Ilha” com as barracas lá... eu acho que não. Alter do Chão, ela é tudo isso, sabe. Se você não zelar pela Vila, parte do povo, num vai ter outras coisas. E- Então ok! Vamos pra foto 2?? Tu podes, Laudeco, descrever pra mim o que é na foto 2, da mesma forma que fizeste na primeira? R5- A foto 2 é um... é um... é um intercâmbio cultural né, com o pessoal lá do Tibet, e... o pessoal mais... é... do budismo... e que confunde com a questão religiosa, com a questão mais, mais é... católica aqui de Alter do Chão... o Sairé como mito, como uma coisa mais religiosa e com a mistura com a questão cultural, a questão folclórica da Vila... Então, eu vejo assim que essas duas coisas, elas se… elas se dão muito bem em Alter do Chão, a parte religiosa, a parte cultural... então, num existe... agente num sente assim, uma ciumeira muito de religião e muito de, de, de intercâmbio cultural... ela, Alter do Chão por si, ela já é uma Vila que ela vive da cultura como uma fonte de renda, com o folclore, com as tradições, então ela absorve muito bem esse tipo de intercâmbio. E- E por que tu achaste importante escolher esta foto pra agente conversar? R5- eu... eu achei importante assim é... que existe várias pessoas, ne, nessa foto, por isso que eu coloquei aqui essa questão religiosa, cultural, e pessoas de várias idades participando. Quer dizer que os mais velhos, colocando essa importância desse intercâmbio, dessa aproximação, e que também, a cultura ela... a cultura em Alter do Chão, o folclore e o modo de viver em Alter do Chão, ela gera renda... então por isso que eu coloquei essa foto assim... é... é... como uma coisa chamativa aqui na questão de que as pessoas não dançam, sabe, aqui... não vão pro Sairé, não vão pro Cheiro do Sarié, sabe, não vão pro Boto só simplesmente por prazer de dançar... Não. Tem prazer na dança, mas tem uma parte, que mesmo que não seja profissional, mas também tem uma parte semi-profissional que as pessoas acabam tendo renda. Então por isso que eu acho importante esse intercâmbio cultural, por causa dessa... e ai você vê que tem várias, vários seguidores do Lama, né, e... e também ele trouxe uma população de Santarém... Que queira ou não, participou, que gastou, que contribuiu pra, pra o consumo em Alter do Chão... Esse lugar é na praia do Cajueiro, aqui próximo tá… na Vila... aqui a praia... é em Alter do Chão mesmo.

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E- Podemos ir pra foto três então? Da mesma forma eu queria que tu me descrevesses a foto três. R5- É... Alter do Chão ela é... ela ta... ela tinha uma história de integração, de comunidade... e a questão comunitária muito forte... e com o inchaço da Vila, agente sentiu que a comunidade tava diminuindo e o que tava aumentando era a população, mas a vida comunitária tava diminuindo... e... agente começou a trabalhar na questão do bolo de aniversário da Vila, exatamente pra que agente integrasse é... pessoas ou grupos pra participar comunitariamente, não só da confecção do bolo, mas do consumo, da distribuição do bolo, da repartição do bolo... então, essa foto, ele representa assim é... várias idade né... tem umas senhoras bem mais de idade, tem adolescente e tem criança participando da festa, aqui na confecção do bolo... Então é uma questão de você ir ensinando essa sabedoria popular, essa questão de as pessoas... o pessoal da Vila, ela ter amor nas coisas dela... então, eu sempre digo que Alter do Chão tem uma população bem cidadã... dificilmente você vai ter uma Vila, você vai ter um lugar, principalmente na Amazônia, que tenha cidadania como tem em Alter do Chão, sabe… então o povo de Alter do Chão, ele tem orgulho de ser de Alter do Chão... isso ai, você... eu posso dispensar esse comentário que você já conhece várias pessoas e você sabe que a pessoa fala de Alter do Chão, sabe, com orgulho, sabe, com uma convicção de que aqui é o lugar par viver... então eu acho que essa foto ela representa assim é... a vida comunitária daqui. E- E aí o que tu destacas como coisas importantes que aparecem na foto? Elementos ou coisas?? R5- É.. eu, eu vi essa questão das, das mulheres, das pessoas não só mulheres, tem menino, tem... e... que eles estão trabalhando na confecção do bolo, e pra mim a foto ela representa aí um sentimento... sabe, ela representa assim uma questão da, do orgulho de ser da Vila, de participar e você é... até nos últimos anos do bolo ele foi dividido em vários pedaços, pras associações fazerem exatamente pra ter mais participação sabe, então é um dos momentos assim, festivos, que tem muita participação da comunidade... então eu vejo assim, essa foto ela apresenta, ela representa aí a participação comunitária nos eventos da nossa comunidade. E- Legal! Então podemos passar pra foto 4? Que é novamente um conjunto de duas fotos, né? Descreve pra mim, Laudeco, o que é, onde é… R5- Essa é… é uma foto... então essa é uma foto onde tem as crianças né, aqui é um boi... é uma foto do, duma festa da escola, e... agente vê assim a preocupação, inclusive da escola, em dar esse, esse incentivo, pra divulgar a cultura local e também pra essa cultura continuar viva, né... e outra foto do lado é o Cheiro do Sairé, que é um grupo que já se apresenta regularmente, que eles tem cachê, que quando chega um grupo de turista em meia hora eles montam um show... então, é um grupo que, que já sabe que ele ta ali e que ele vive da questão cultural... então, eles zelam por isso... então, também é um grupo, ele, ele é meio limitado né... às vezes só entra um quando sai outro de lá... mas eu não acho que ta errado, mesmo pra incentivar o grupo, sabe, pra que ah... “eu saio quando eu quero, quando eu quiser ir lá eu vou”… então é uma questão de você até disciplinar o grupo, né... então, eu vejo aqui dois momentos, um que é muito espontâneo que tem as crianças, e que faz parte da vida cultural, do folclore de Alter do Chão, que eles tão aí e eles não estão ganhando nada... e tem outro grupo, que já se apresenta, e que tem... já, já, já tem um preço pra se apresentar... então eu vejo essa questão... e essa questão folclórica de Alter do Chão ela é muito forte, ce vê que tem pessoas que vive… vive de articular isso aí… vive de arranjar contratos, são pessoas que já trabalham como agenciadores deles, desse tipo de atividade. E- E por que tu achaste importante escolher essas fotos pra conversar sobre elas? R5- Eu achei aí, a importância da foto, eu achei a questão do, do, do... dessa foto das crianças, do boi, que as crianças estão muito espontâneas aí… elas não tão aí com a intenção de dar show, de se apresentar... elas tão aí com a questão muito pura mesmo, com a questão de participar e tal... e a outra foto, é um grupo mais profissional, que ele tem que ensaiar, e ele

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ensaia, sabe, ele monta show, ele já é mais disciplinado. Então tem dois, tem duas coisas bem diferentes que eu acho, né, uma que é espontânea, que até quando eles erram é bonito que é criança, e tal... mas já o outro ali não pode tanto errar porque ele ta dando show, né, então são duas mostragem bastante diferente. E- Ta bom, então vamos pra tua última foto, Laudeco, que é a foto 5, descreve pragente o que é, onde é... R5- Essa foto é um barracão, né, ela já tem mais ou menos uns 18 a 20 anos, essa foto... e, é uma comunidade próxima aqui de Alter do Chão, mas era e ainda continua sendo um retrato né, da questão da educação no Brasil... eu vejo assim que a questão no Brasil, é... de educação, ela ta longe de ser prioridade, eu não to condenando nem esse nem aquele governo, talvez nem o que vai entrar, mas eu vejo assim que ta faltando mais aproximação do estado como um todo e da sociedade, né, da parte mais interessada na questão da educação... e isso que eu tava colocando, até coloquei nas fotos aí, a questão de que precisa trabalhar a cidadania das pessoas, então se aquela pessoa não conhece nem os seus direitos nem os seus deveres, então dificilmente ela vai ser sensível à questão educação, à questão da parceira, né, da... do Poder Público com a sociedade, com a comunidade. Então eu vejo assim, é… um abandono, né... a casa e a própria comunidade, ela cobrando do governo uma coisa que ela pode ser... ela é parte disso aí. Então é uma, eu tenho uma preocupação com essa, essa falta de aproximação com o estado e a comunidade no que se refere à educação. E- Ta Laudeco... Acho que das fotos são essas perguntas, a menos que tu tenhas mais alguma coisa pra comentar sobre elas… Se não, eu tenho mais umas perguntas gerais sobre a Vila pra agente concluir. Na tua opinião, existe na Vila de Alter do Chão algum lugar, alguma construção, alguma coisa que tenha o peso de monumento de Alter do Chão? Que tenha essa referência de memória pra população? Na tua opinião, existe isso ou não? R5- Eu acho que não... dessas fotos é isso. Ela, eu acho que, por exemplo, que aqui tem a Escola Dom Macedo Costa, que ela foi construída em 1969... ela foi construída pelos comunitários, e... até por questões políticas ela... ta sendo mais do município do que da comunidade, inclusive eles trocaram, por questão estrutural e falta de responsabilidade do Poder Público, eles trocaram uma telha de barro e colocaram tela brasilit em cima. Então, eu acho que isso daí tirou, sabe, tirou um pouco do esforço, é... é... e também da representação que a comunidade teve é... com muito menos recurso, mas em 69, quase 40 anos atrás, né, já... já... já pensava em fazer uma escola mais decente pra Alter do Chão. Então, eu vejo a obra como de uma escola, como uma obra mais ligada à questão da educação. A outra obra, uma das mais antigas, a mais antiga, é a igreja. Ela passou 20 anos em construção, ela foi de 1886 a 1906, então ela passou, passou vários, passou 20 anos em construção, e ela nesses anos de construção, ela teve umas alterações na fachada, né, eu tive oportunidade de trabalhar na restauração da fachada, e agente percebeu que tinha algumas molduras que chegavam no fim, né, e o pessoal achava que tava baixa a igreja e começavam a... então, mas mesmo assim, por exemplo, ela tem… ela tem uma cara… ela tem um simbolismo na mão-de-obra, sabe, no esforço da comunidade... mas foi uma obra imposta pelos padres portugueses, mais pelos religiosos europeus, de que pelos próprios moradores de Alter do Chão, tanto é que a obra não tem... na tem no... ela é uma obra única desse tipo em Alter do Chão. Eu, eu vejo assim que, no modelo de construção, eu vejo que agente perdeu nos últimos anos várias casas de taipa, que eram casas de comércio, eram... o próprio cartório que é uma das últimas casas que é de taipa, mas pegaram e já fizeram um revestimento de cimento, o cartório era coberto de palha e agora colocaram brasilit... então, é... até por questão de segurança... mas eu vejo assim que trocar uma cobertura de palha, pelo menos assim por uma... trocar por uma cobertura de barro... uma coisa mais da nossa região e não colocar amianto... então, eu vejo que nós, Alter do Chão, tamo perdendo a nossa característica, a nossa cara, sabe, é... é... muito rápido.

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Então, nós temos perdido ultimamente, nos últimos 10 anos, é… casa assim... é... eu vejo assim o pessoal derrubando as casas antigas, né, e vou me dando conta que esse patrimônio da Vila ta indo embora, sabe... se não vê assim uma Alter do Chão pobre assim que se identificasse com a Vila, sabe, eu não to exagerando não, mas eu não vejo assim, eu não vejo... talvez lá, mais afastado, tipo aqui no centro não vejo fazer duas, três casas... tipo a nossa casa aqui, que agente... uma parte é de palha a outra é de amianto e também de alvenaria... mas eu tenho desse lado aqui, que é quando tavam fazendo essa outra casa, e a minha mulher falou “olha, eu não vou querer minha casa de palha” aí eu, “então eu vou fazer uma pra vocês e vou fazer outra pra mim”... e acaba que o pessoal acaba usando mais a minha do que a deles. Mas eu vejo assim que hoje, a própria… meus filhos eles ja pensam nessa... eles já vê essa preocupação, né… então eu vejo que, que, que... primeiro as pessoas, elas dividem um terreno, com plantas, assim uma cerca viva e tal, e hoje os muros são 2 metros e meio, quase três metros... Então são, são coisas que pra mim, é muito frustrante, sendo morador da Vila, sabe, o tanto que essa Vila tem potencial e acho que ela nem, nem ta enxergando esse potencial, ela já ta morrendo. E- Além disso, onde o senhor vê se realizar o lazer na Vila de Alter do Chão? Das crianças, das famílias? R5- É… olha é muito difícil Alter do Chão quando você fala na questão de lazer, porque é como se você é... ce tem um lugar muito bonito como Alter do Chão, mas a parte estrutural da Vila é muito periférica, sabe, então você vai ver um lugar promissor, como se tivessem implantado, tivesse no centro de uma grande favela... que as crianças precisam adaptar rua, adaptar praça, sabe, precisam é... é... é... talvez brincar no quintal dos outros... então, não existe assim, por exemplo, Alter do Chão, com toda essa importância você não vê um parque infantil... você não vê uma praça de leitura, você não vê uma praça arborizada e com jardim, sabe, uma coisa chamativa pra você é... contemplar a beleza... então, eu vejo assim uma questão muito carente de lazer. Aqui tem uma praça do Sairé, que se limita aos jogos de futebol, esporte, né, mas com uma organização mais voltada pela comunidade, sabe, que é o que existe e limites de logística... a praia que o pessoal gosta de tomar banho, gosta de... e as vezes as pessoas, uma parte da população, ela pesca com uma... uma coisa mais esportiva, mais de lazer que de obrigação de pegar o peixe... mas eu não vejo assim uma preocupação de zelar esse lugar e você, você ter pra onde sair... talvez seja isso que faz com que os jovens parem pela praça e passem a noite inteira bebendo. E- Além disso, qual é na sua opinião o lugar, a construção, a vista... o que o senhor acha que é a cara de Alter do Chão, a coisa mais marcante da Vila? R5- Eu... é isso que eu to falando... é muito difícil hoje você dizer que tem uma coisa que identifique com Alter do Chão. Por exemplo, na primeira rua, é… se você olhar como de quem vem aqui da “Ilha”, aqui da praia, você vê estampas absurdas e gostaria, por exemplo, de ver as mangueiras, as árvores em uma estampa de um hotel que eu acho que vem, que vai ser implantado aí, que ta perto da praia, que o turista gosta de ta olhando pra praia... então, eu não vejo assim... eu não vejo... eu não vejo esse tipo de estampa como uma cara de Alter do Chão... tem até algumas casa que elas, elas tem assim... já no lugar tem uma cara mais da Vila, e uma das casas que eu... eu sempre visitava, que hoje ela ta sendo substituída por uma de alvenaria, é a casa da Dona Luzia. A casa da Dona Luzia ela foi um dos símbolos de resistência... Por exemplo, nesse ano, a prefeitura ia asfaltar as primeiras ruas e… exatamente o quarteirão da Dona Luzia não foi asfaltado porque ela brigou e disse que não ia ter asfalto na casa dela... mas o pessoal não respeitou a resistência da Dona Luzia, eles respeitaram a característica da casa, porque era uma casa de taipa e porque era visitado por várias pessoas, turistas, pesquisadores e tal. Hoje ela não vai ter a mesma... por exemplo, no ano que vem, próximo do Sairé, que a prefeitura vá escolher umas novas ruas pra asfaltar, com certeza vai ser asfaltado esse pedaço da Dona Luzia, sabe... então, eu não tenho medo de errar, ela pode ficar na frente do trator, mas ela não vai impedir, porque ela descaracterizou... tirou a

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característica da casa, e com isso levou a rua também com ela. Então é uma... é o preço que você paga porque é um conjunto de coisas, então... Casaria, ficaria muito bom colocar uma casa coberta de palha, de taipa, com uma mangueira na frente, com uma areia e tal, sem asfalto, assim... agora não casaria uma casa de alvenaria e coisa com uma... E- É isso? Então pra finalizar, Laudeco, eu gostaria que tu me falasses um pouquinho de como tu vês a Vila a 20 anos atrás, por exemplo, e a Vila hoje... antes do asfaltamento e depois do asfaltamento. O que tu vês como positivo e negativo e por que? Como tu achas que é melhor? R5- Eu... eu vejo assim que 20 anos atrás, pouquíssimas pessoas tinham ventilador, e ninguém tinha ar-condicionado em Alter do Chão... então as pessoas dormiam na varanda da casa, no verão, muitas vezes até dormiam na praia... e não tinha necessidade de ter ventilador, porque não tinha muro, porque não tinha asfalto, porque não tinha grandes construções, porque o vento circulava sem... sem nenhum impedimento. Hoje não, hoje todas as casas, principalmente aqui no centro, tem que ter no mínimo um ventilador em cada quarto, e muitas delas já tem ar-condicionado... é isso daí, eu acho que é uma das... um dos... um dos termômetros, uma forma de medir o que já perdemos de qualidade de vida. É... com o asfalto, você perde a segurança, porque tem… a maioria das pessoas que dirige carro são irresponsáveis, né. Então, é... você tem que ficar... é... às vezes ta aqui na frente, aí você vê que você não pode mais ficar conversando tranqüilo porque o seu filho, o seu neto, as crianças tão brincando e você... você não sabe quem é que vem dirigindo ali. Então, o asfalto, ele… ele… pra uns ele é benefício, que acham que asfalto é uma coisa bonita, mas pra mim, eu vejo assim que ele trouxe uma certa insegurança no que se refere ao tráfego de veículos... mesmo que as pessoas, elas... elas tendo essa facilidade, elas podem vir qualquer hora... aí você não sabe mais quem chega e quem sai. Então eu vejo que Alter do Chão, a Vila a 20 anos atrás ela tinha um poder econômico muito menor, mas também tinha uma disputa muito menor, sabe. Então com esse… com esse falso desenvolvimento, ela trouxe várias pessoas, principalmente com o êxodo rural, e também tem várias pessoas de outros estados, de outros países... mas eu vejo que, que a maior preocupação minha não é nem as pessoas quem venham de fora, é as pessoas que vem do êxodo rural, porque essas pessoas não conseguem, muitas delas não conseguem melhorar de vida, e na estatística ela perde, ela contribui muito pra, pela queda de... qualificação, de qualidade de vida das pessoas, porque, por exemplo, aqui as meninas que nasceram aqui, o pessoal de Alter do Chão, mesmo com um poder aquisitivo mais baixo, ta, elas conseguem ter filho mais tarde, 18, 20, 22 anos, né... aquelas que vieram do êxodo rural, tem umas que ta com 15 anos e ta com o segundo filho. Então, isso daí, é uma somatória muito negativa, enquanto no outro… enquanto no resto da população, ta aumentando a taxa de idade e a perspectiva de você ter filho mais tarde e cursar uma faculdade e tal, e os que vêm do interior não conseguem... não conseguem fazer nem o fundamental já ta grávida, entendeu. É uma... é um bloqueio de você, de você… você acaba matando esse seu sonho de… melhorar a vida, e alguns, até por questão cultural, eles não se importam muito com isso, eles acham que é o destino, que foi Deus que permitiu que aquela menina teve uma criança, ta, então tem uma série de coisas que são cultural de lá do interior... “Ahh então se Deus deu, Deus vai dar jeito de ajudar a criar” e isso assim, é uma coisa bem natural. E- Então é isso, Laudeco, eu queria te agradecer muitão... ANC - Ancoragem

Residente nascido em Alter do Chão. Preservação da cultura e tradições, inclusive arquitetura e características urbanas da Vila. Presidente do Conselho Comunitário.

ECH – Expressões-Chave (Negrito)

- a qualidade da água já não é a mesma, teve muita alteração, tem lama... e isso daí faz com que as pessoas, elas não, elas não se sintam mais motivadas pra fazer esse tipo de atividade que é uma questão cultural da Vila - você percebe que não tem o muro no entorno dessa região, dessa, dessa... não tem o cais, não tem é... é... asfalto... então, e a paisagem da Vila era, era muito diferente, inclusive com bastante verde, é... os terrenos eram maiores, é… as pessoas, elas não construíam tanto né, não usavam todo o terreno assim e isso...

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geralmente... é... o... acabava sobrando mais verde no terreno né. - na questão da qualidade da moradia, na questão da qualidade de vida - uma qualidade de vida onde tinha segurança, onde tinha tranqüilidade, onde as pessoas não precisavam murar os seus terrenos pra, pra dormir mais seguro... - do terreno como era, como era... cercado de madeira... não tinha, não tinha asfalto... não tinha o cais... e também é... as praias eram mais, mais limpas né - as obras que são construídas pelo governo estadual, municipal e federal, elas não levam em consideração muito as necessidades da comunidade, ou do povo que vive lá - a maioria dos turistas não vão olhar essa obra com bons olhos... por que eu já penso que dentro... por exemplo, nós vivemos no centro da Amazônia, e agente... essa obra ta sendo colocado um montão de cimento, um monte de ferro, e pouco a questão cultural da Vila - Alter do Chão, como ela vive da beleza natural (...) essa orla, ela ta trazendo um impacto muito grande, sabe, onde é uma contradição na beleza natural com uma obra... uma obra arquitetônica que não tem nada a ver com a Amazônia - sabe, parece que não interessa quem vai olhar da praia pra Vila, sabe, parece que Alter do Chão se reduz àquela “Ilha” com as barracas lá... eu acho que não. Alter do Chão, ela é tudo isso, sabe. Se você não zelar pela Vila, parte do povo, num vai ter outras coisas - agente num sente assim, uma ciumeira muito de religião e muito de, de, de intercâmbio cultural... ela, Alter do Chão por si, ela já é uma Vila que ela vive da cultura como uma fonte de renda, com o folclore, com as tradições, então ela absorve muito bem esse tipo de intercâmbio - a cultura em Alter do Chão, o folclore e o modo de viver em Alter do Chão, ela gera renda - com o inchaço da Vila, agente sentiu que a comunidade tava diminuindo e o que tava aumentando era a população, mas a vida comunitária tava diminuindo - Então é uma questão de você ir ensinando essa sabedoria popular, essa questão de as pessoas... o pessoal da Vila, ela ter amor nas coisas dela (...)o povo de Alter do Chão, ele tem orgulho de ser de Alter do Chão... - que eles estão trabalhando na confecção do bolo, e pra mim a foto ela representa aí um sentimento... sabe, ela representa assim uma questão da, do orgulho de ser da Vila, de participar - agente vê assim a preocupação, inclusive da escola, em dar esse, esse incentivo, pra divulgar a cultura local e também pra essa cultura continuar viva, né - um grupo que, que já sabe que ele ta ali e que ele vive da questão cultural... então, eles zelam por isso - e essa questão folclórica de Alter do Chão ela é muito forte, ce vê que tem pessoas que vive… vive de articular isso aí… vive de arranjar contratos, são pessoas que já trabalham como agenciadores deles, desse tipo de atividade. - eu vejo assim que a questão no Brasil, é... de educação, ela ta longe de ser prioridade - e isso que eu tava colocando, até coloquei nas fotos aí, a questão de que precisa trabalhar a cidadania das pessoas, então se aquela pessoa não conhece nem os seus direitos nem os seus deveres, então dificilmente ela vai ser sensível à questão educação, à questão da parceira, né - Escola Dom Macedo Costa, que ela foi construída em 1969... ela foi construída pelos comunitários (...) A outra obra, uma das mais antigas, a mais antiga, é a igreja (...) ela tem um simbolismo na mão-de-obra, sabe, no esforço da comunidade... mas foi uma obra imposta pelos padres portugueses, mais pelos religiosos europeus, de que pelos próprios moradores de Alter do Chão, tanto é que a obra não tem... na tem no... ela é uma obra única desse tipo em Alter do Chão - eu vejo assim o pessoal derrubando as casas antigas, né, e vou me dando conta que esse patrimônio da Vila ta indo embora, sabe - primeiro as pessoas, elas dividem um terreno, com plantas, assim uma cerca viva

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e tal, e hoje os muros são 2 metros e meio, quase três metros... Então são, são coisas que pra mim, é muito frustrante, sendo morador da Vila, sabe, o tanto que essa Vila tem potencial e acho que ela nem, nem ta enxergando esse potencial, ela já ta morrendo. - então você vai ver um lugar promissor, como se tivessem implantado, tivesse no centro de uma grande favela... que as crianças precisam adaptar rua, adaptar praça, sabe, precisam é... é... é... talvez brincar no quintal dos outros - Aqui tem uma praça do Sairé, que se limita aos jogos de futebol (...)a praia que o pessoal gosta de tomar banho, gosta de... e as vezes as pessoas, uma parte da população, ela pesca com uma... uma coisa mais esportiva, mais de lazer que de obrigação de pegar o peixe - talvez seja isso que faz com que os jovens parem pela praça e passem a noite inteira bebendo - e não tinha necessidade de ter ventilador, porque não tinha muro, porque não tinha asfalto, porque não tinha grandes construções, porque o vento circulava sem... sem nenhum impedimento - Então, o asfalto, ele… ele… pra uns ele é benefício, que acham que asfalto é uma coisa bonita, mas pra mim, eu vejo assim que ele trouxe uma certa insegurança no que se refere ao tráfego de veículos... mesmo que as pessoas, elas... elas tendo essa facilidade, elas podem vir qualquer hora... aí você não sabe mais quem chega e quem sai - que a maior preocupação minha não é nem as pessoas quem venham de fora, é as pessoas que vem do êxodo rural, porque essas pessoas não conseguem, muitas delas não conseguem melhorar de vida

ID – Idéias Centrais

- Percepção da diminuição da limpeza/cristalinidade da água; - Percepção de mudanças gerais na paisagem da Vila, citada através de vários elementos morfológicos: lote, vegetação, edifício, fachada, solo, etc; - Destaca a qualidade de vida, de moradia que havia; - Referencias as cercas, os terrenos, a perda da vegetação, o cais da orla, a praia; - Cita o descolamento das obras públicas das necessidades locais, comunitárias; - Observa a importância da paiisagem da Vila como um todo; - Cita a Festa do Sairé e a religiosidade local como fatores de integração e de receptividade a outras culturas (ao intercâmbio); - Se refere ao folclore e à cultura local, incentivados pela escola e praticados como geradores de renda através do turismo; - Demonstra preocupação com a diminuição da vida comunitária local e com o inchaço da Vila devido ao êxodo rural; - Cita a confecção do bolo de aniversário da Vila como uma atividade de resgate da integração comunitária e do orgulho de morar em Alter do Chão; - Destaca a falta de prioridade dada à educação e à cidadania no Brasil; - Como monumentos, destacou a igreja matriz e a escola construída pelos comunitários; - Preocupa-se com a perda do patrimônio construído e dos valores construtivos da Vila; - Com relação ao lazer, observa a falta de estrutura de lazer para a população da Vila, que costuma utilizar a Praça do Sairé e o rio (para prática da pesca); - Cita o crescente problema do alcoolismo, especialmente entre os jovens; - Destaca as mudanças no clima da Vila devido às drásticas alterações na morfologia da Vila (seus padrões construtivos, materiais, entre outros); - Refere-se ao asfalto como um facilitador de acesso, mas também como um potencializador de riscos de trânsito e segruança (criminalidade).

EMS - Elementos Morfológicos e Sócio-culturais

- Água do rio, da praia; - Segurança, tranqüilidade da Vila; - Terrenos, cercas e muros, o cais de arrimo, a praia; - Festa do Sairé; - Folclore e cultura;

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- Praia do Cajueiro; - Escola construída pelos comunitários; - Igreja Matriz; - Praça do Sairé; - Centro dos Idosos; - Bolo da Vila.

QUADRO 06: DSC da Entrevista Residente 5 Fonte: A autora, 2007. Entrevista 6 E – Entrevistador R6 – Residente entrevistado 6 FOTOS DO ENTREVISTADO:

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3 4 E- Então vamos começar a entrevista com a Neila... Primeiro Neila, eu queria que tu fizesses a tua apresentação com nome, idade, formação, quanto tempo tu moras na Vila... R6 - Bem, eu sou Risoneila da Silva Correia, conhecida por Neila na comunidade, ninguém me conhece por Risoneila... e... eu moro aqui desde que eu nasci, sempre viajo mas sempre volto pra cá... tenho 33 anos, é... trabalho com turismo mas sou formada em letras… trabalho com turismo, diretamente com os turistas e é isso aí. E- Se tu quiseres falar um pouco das tuas experiências de viagem, já que sempre viajaste muito e que isso muda um pouco a forma como se vê e observa as coisas... R6- Antes da minha primeira viagem par Inglaterra a quatro anos atrás... em... 2001, que eu fiquei um ano na Inglaterra, mesmo pra conhecer um outro mundo e... e aprender o idioma que era de primeiro... e... realmente muda muito a visão do nosso local, da nossa vida é... a concepção que nós temos né, os valores também mudam muito... então... que o outro mundo não tem nada a ver com nós, a Inglaterra, não tem nada a ver, nada, nada é igual... as pessoas, culturas, a paisagem ne, as riquezas são diferentes... pra eles, eles tem umas riquezas, nós temos outras riquezas, e... mas sempre gosto também de ver, gosto de conhecer pessoas, já q eu trabalho com turismo, né, ter novas visões, ter entendimento de tudo e... principalmente o idioma que é importante pra mim né, comunicação… no nosso ramo, comunicação e apresentação de um modo geral, e... é, e a partir dessas viagens, eu sempre morei em Alter do

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Chão e gosto muito, me sinto bem aqui em Alter do Chão né, pra morar, e eu agradeço a Deus por ter nascido aqui (risos), num lugar muito bonito, lindo mesmo... então já viajei pra Europa, já fui pra Inglaterra... rodei a Inglaterra... Espanha... é... Barcelona é uma cidade q eu gosto muito né, é muito. Linda a cidade... França... e também já voltei duas vezes pra esses lugares mas Alter do Chão é uma beleza única mesmo, realmente diferente... já vi outras paisagens, outras praias… bonito mas é… realmente Alter do Chão é única, é diferente... cada vez eu valorizo mais o que nós temos. Já saí do país três vezes, já voltei aos mesmos lugares e... e cada... e entristece assim um pouco agente vê que Alter do Chão, ta mudando muito rápido, algumas coisas agente já esta perdendo né, que é... ahhh... é, além das belezas naturais, agente ta tendo um pouco de modificação na paisagem... e na forma que as pessoas estão tratando, nós mesmos brasileiros, estamos tratando nossa, nossa vila... agente ta perdendo muita coisa, então agente ta sendo acelerado né, e a cultura, a mentalidade das pessoas... das pessoas de Alter do Chão, tem muitas pessoas que não tem consciência, que não valorizam o espaço que tem, talvez por falta de visão mesmo, entendeu? É isso... E- Então vamos falar um pouco das fotos, Neila? A primeira foto que tu tens aí “foto da casa 11”... descreve pra mim o que é, o que vês na foto e... por que tu achaste importante escolher ela pra conversar? R6- Bem, essa foto aqui agente foi mesmo pra... pra passear nós aqui: eu, meu irmão, minhas sobrinhas... e... aqui é no Lago Verde e... é uma... essa paisagem nos temos só na estiagem, né… é... aqui é um canal, a água é bem limpa, transparente, tem muitos peixinhos e... depois q eu baixei essa foto, eu fui ver assim a cena, né, da Vivi aqui, que é minha sobrinha... que é uma criança muito ativa, e... gosta, ela sempre teve dinâmica, ela gosta de conhecer, todos os lugares onde agente convida ela vai... e depois fui ver aqui essa cena, olha aqui a liberdade dela, o prazer dela ta... assim tocando na água… aqui ela ta tentando pegar um peixinho… claro que não consegue com a mão, né (risos) é só uma diversão... então, olha só, assim tão é... tão natural essa cena dela aqui, tão nossa entende? Tem muitas pessoas que não tem oportunidade... muitas crianças que vivem assim no apartamento, presas né, e... vão conhecer lugares, claro, depois de adultas… mas entao a liberdade que as crianças tem aqui... de ter essa nossa natureza... ter essa qualidade de vida assim... ter essa água limpa q nós temos no Lago Verde ne... então é isso. E- Essa é a importância p ti? E tem coisas que tu destacas nessa foto? objetos, coisas, pessoas?? Elementos da foto... R6- Sim... essa é a importância. R6- É a água... é a transparência da água, entendeu... Que aqui agente pode mergulhar, pode tomar banho... e a minha sobrinha tocando, né, a Viviane tocando... com a mão dentro da água. E- Podemos ir pra segunda foto então? “foto da casa 029”... descreve pra mim também Neila... As perguntas são mais ou menos as mesmas pra todas as fotos ta? R6- Bem, essa foto aqui, pra mim, basicamente, é a representação de Alter do Chão... que eu tenho aqui o morro, que ele ta presente na foto panorâmica de Alter do Chão, você vê que sempre tem o morro... a Serra Piroca... aqui eu tenho o lago Verde e a praia, aqui no fundo... é a praia da “Ilha” aqui no fundo... então é um... é... é quase a essência de Alter do Chão, né, que é o Lago Verde, o morro e a “Ilha”. E- Por que tu achaste importante escolher essa foto? R6- Por esse conjunto, que nós temos aqui da representação de Alter do Chão, e por ela apresentar, ela ta um pouco assim... assim é... calma, ela apresenta uma, uma… ela traz uma, como eu posso dizer? Uma... uma calmaria pragente, posso dizer assim… é… bem plena… ela tá bem nítida também a água, ta azul... também não tem onda, ta bem calmo, bem... E- Pra ti então a vista de Alter do Chão é representada por essas coisas mais naturais ou não tem nada a ver? R6- Sim... muito mais natural.

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E- E a Vila nisso tudo? Como é que tu enxergas a vila nesse conjunto, nesse espaço, como parte disso? R6- É que isso aqui é Alter do Chão né, se agente vê o que os turistas vem buscar é... basicamente a praia, tomar banho, ne, e ter essa imagem da, da, da, do... da Serra da Piroca e que Alter do Chão, que mais eu posso dizer que... é... preservar né, Alter do Chão, por que essa é a nossa riqueza, é a riqueza que nós temos em Alter do Chão... é a água, praia e floresta... e que nós, nos vivemos disso ne, nossa qualidade de vida, esta representada, é... é isso. E- Elementos que tu queiras destacar ai nessa imagem? R6- Deixa eu ver... eu posso dizer que aqui é... justamente a água calma aqui... o azul do Lago Verde... por que agora está azul, mas muda de cor, por meio-dia... agente pode ver uma foto bem... bem tirada ela parece realmente verde... mas um contraste de verde com uma parte azul... essa... ela passa uma tranqüilidade assim como ela está tirada aqui... E- Se tu quiseres passar pra próxima foto então... Terceira foto da Neila chama-se “jamaraquá jungle 005”... R6- Essa daqui é uma foto de uma comunidade próxima de Alter do Chão, e... que agente ta numa excursão que agente leva no trabalho com turismo, levamos esse grupo de quatro jovens, e aqui eles tão no lago, no lago de Jamaraquá, também um lago muito bonito, diferente do Lago Verde, menor, mas muito bonito... água transparente e aqui eles tão mergulhando... tem um pouco de chuva molhando mais... mas parece que a água ta bem fresquinha, né... eles tão... todos parecem que estão felizes aqui nesse lago... depois de uma caminhada nada melhor que uma água fresca, não é... E- E qual a importância dessa foto pra ti? Por que tu escolheste essa imagem pragente conversar? R6- Eu acho que ter é... assim... pelo prazer de poder mostrar pras pessoas de fora né, de fazer elas conhecerem... de sentirem o local... então parece que eles tão mesmo, como eu vou dizer, além de conhecer, eles tão sentindo mesmo... que eles tão dentro da água né, e é o prazer de trazer as pessoas, pra mostrar nossas riquezas, nossas belezas daqui, né, o lago, tudo... E- Então diz pragente os elementos que tu destacarias aí, nessa foto... R6- Eu acho que é o sorriso dessas pessoas aqui, né... se você ver tem duas pessoas sorrindo... e é... o que mais... a... a chuva, a chuva também porque eles tão além de, eles tão dentro da água, ta um pouco de chuva e nem por isso eles saíram... eles ficaram aqui tomando banho... felizes aí. E- Legal! Então podemos passar pra próxima? Ou se ainda tiveres algo a acrescentar... R6- Não... acho que podia ver a quarta foto. E- Ta bem... Quarta foto então... a foto “1010093”... Descreve pragente Neila, o que é, onde é... R6- Olha, essa aqui, é uma foto que é no Lago Verde, aqui é o espaço é... do... CNS né, na época… e uma outra, uma visita que… que a minha família fez aqui, que eu não estava aqui mas eles vieram e foram aí visitar o peixe-boi... foram visitar o peixe-boi, e aqui é a união dos três que tão... que foram nessa visita... e aqui é uma outra imagem, também é do Lago Verde, mas essa aqui é uma outra imagem... bastante água, e a floresta aqui né... a floresta baixa que é característica aqui do Lago Verde. E- Qual é a importância pra ti dessa cena aí? Dessa foto? Por que tu achaste importante colocar? R6- eu acho que é... eu acho que é pela união dos meus três sobrinhos, juntos ainda poderem conhecer, é... ver ali o peixe-boi que pra eles três aqui, com o Harry, é novo... que eles nunca tinham visto o peixe-boi, a Vivi já tinha visto, mas ele também não... o Samuel não tinha visto antes... e aqui num, num lugar tão bonito, né, tão no meio da natureza... num centro de preservação... é! Essa união deles aqui, das crianças. E- E tu destacarias algum elemento? Ou alguns??

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R6- Acho que eu posso dizer... Acho que também aqui é... como nós estamos rodeados de lagos, de rios, de igarapés, né,... aqui uma outra imagem do Lago Verde... é eu acho que aqui é numa época de cheia ne, e ta um contraste do Lago Verde com a floresta aqui, e essa... e também essa... também esse cercado aqui tão natural, tão simples e natural, entendeu... e que deu uma harmonia aqui com a natureza do Lago Verde. E- Vamos pra última foto então? Quinta foto é a “1010110”... R6- Ahhh essa foto aqui é por que eu sempre gosto do pôr-do-sol, né, e aqui em Alter do Chão agente tem... de todos os ângulos agente pode ver o pôr-do-sol, e... todos os dias, quase todos os dias nós temos um lindo pôr-do-sol… então todo mundo que eu acho que mora em Alter do Chão, gosta e representa também assim a paz... pra mim o pôr-do-sol representa esse momento de paz... de tranqüilidade... é o que essa foto ta passando, entendeu, e de vida também... Essa foto foi tirada aqui da “Ilha” então na direção de quem vai pra Ponta do Cururu... essa é uma paisagem que agente sempre tem, quase todos os dias, do pôr-do-sol... e... às vezes ta diferente, às vezes ta mais calmo… aqui ele ta bem vermelho... se pondo quase em cima da árvore, com o contraste aqui, né... os catraieriros aqui que representa também o nosso, também uma marca de Alter do Chão, né, as canoinhas, e as pessoas aqui ó, tranqüilas... é isso. Eu gosto muito dessa foto. E- E porque tu achaste importante incluir essa? Comentar essa? R6- Por que é uma imagem que faz parte de Alter do Chão, quase que diariamente né, e... que nós temos uma coisa que nós é... por exemplo lá na Europa agente nem tem pôr-do-sol, né… é muito raro ver né, só no verão algumas vezes... e aqui nós temos todo dia... e aqui também, as catraias, os rapazes eu acho que estão pescando, tão tranqüilos...aqui eu acho que é isso... tranqüilidade, paz que nós temos todos os dias. É isso. E- Das perguntas relacionadas às fotos, eu acho que é isso Neila... agora eu queria te perguntar um pouquinho sobre a questão das mudanças né. A primeira pergunta: de quando tu te lembras, da tua infância sei lá, pra hoje. Como tu lembras essas mudanças do que era pra o que ta hoje...? E o que tu achas de positivo e de negativo nisso? R6- Bem, o que eu lembro mesmo da minha infância é que agente tomava banho muito... (risos) assim, mergulhava muito nessa praia… é, da beira do rio né, nós somos caboclos nativos né, então, a maior diversão era ir a praia final de tarde, tomar banho, brincar na areia... e aqui, por exemplo, é... ali onde é... aqui onde agente ta vendo ali na ponta do... agente chama depósito, a praia era bem alta, era bastante alta, então ela tinha uma queda assim, onde todo mundo ia pra lá pra rolar na areia e cair lá embaixo, então várias pessoas que eu comento também fizeram a mesma coisa, e hoje agente pode observar ta mais baixa essa parte, a região, ta bastante baixa, então agente não pode mais fazer isso, de brincar, de ter essa diversão que nós tínhamos antes e... as pessoas comentam que é por causa do... dos carros que passam... quem hoje é proibido, mas antes passava muito carro aí e às vezes, raramente, quando as pessoas não vêem à noite, no verão, ainda passam uns carros, mas não é permitido mais... então baixou muito, baixou muito essa, essa ponta aí... Outra coisa também é aqui em frente, que tão fazendo a orla né, é... a água, as canoas elas vinham mais aqui… aqui quase no quintal, não tinha o cais, e daqui mesmo agente pegava a canoa e atravessava o rio... então... agora que tão fazendo a orla pra ter uma nova imagem, é, fica bom, melhora um pouco, mas… Tem umas coisas que não são aprovadas né, pela comunidade e pra nós que dependemos da imagem de Alter do Chão no trabalho... esses ferros, esses... o resto não... se fosse madeira... com esses ferros que colocaram agente não pode mais bater uma foto daqui de onde eu moro mesmo pra lá, por que não é a imagem que nós tínhamos de uns dez anos atrás... atualmente, que eu lembre... E- Tu lembras alguma coisa com relação à questão do asfaltamento? O que mudou antes da estrada asfaltada e depois? R6- Ah eu lembro antes da estrada asfaltada, tinha os horários, poucos horários de ônibus pra comunidade... e era bastante difícil uma viagem pra Alter do Chão mesmo... era estrada de

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chão, de chão mesmo... e... depois que asfaltaram melhorou muito a qualidade de vida aqui pra agente, pra agente trabalhar, por que sempre as pessoas estão buscando mais Alter do Chão… então agente começou a trabalhar no ramo, naturalmente, e também trabalhamos com restaurante, então o acesso ficou bem melhor pra agente, pra ir fazer compras, pra voltar, mais rápido... foi uma coisa importante pra nós de princípio foi o asfaltamento da rodovia, que facilitou bastante a... é... o acesso, pragente trabalhar e também pros turistas virem com mais conforto. E- Bem, como tu já falaste um pouco sobre a obra, tinha aqui uma pergunta mas eu acho que eu não vou me repetir, de como vc estaria vendo essa obra da praça e da orla, não sei se tu gostarias de acrescentar alguma coisa? R6- Não, eu acho que a orla é importante pra agente assim né... pra... ter uma nova visão também por que nós temos os efeitos da natureza... as enxurradas... no inverno chuvas fortes, então, como a comunidade ta crescendo, então, tão desmatando lá pro final, lá pra trás da Vila né... então a erosão é maior, então desce muita coisa pra cá já, ela é mais forte, muita água, então vai danificando muito a frente de Alter do Chão né, e trazendo muita terra e agora é bom... é também bom por que melhora isso, mas o que é realmente é a imagem... acho que é o material que utilizaram... é somente isso... o que não combina com Alter do Chão é isso... o resto não, vai melhorar e... e essa erosão vai ficar mais controlada né, então… simplesmente é a imagem, a paisagem né... que nós vivemos da paisagem aqui de Alter do Chão. E- Na tua opinião, onde que acontecem os momentos de lazer hoje da população da Vila? Seja das crianças, seja das famílias… pode ser inclusive da tua família... R6- Olha, aqui nós não temos shopping, nós não temos cinema, não temos... os momentos de lazer é na praça, que é um local que nós saímos né, na praça encontrar os amigos, conversar... e... e a praia também, acho que de todo mundo a praia ainda é um dos principais lazeres que nós temos né... à noite, de dia, às vezes agente reúne todo mundo pra fazer piracaia... agente não só mostra mas agente desfruta também de Alter do Chão, então quando agente conhece bem certo local agente pode mostrar melhor pras outras pessoas... é isso, fazer piracaia, passar a noite... cada vez visita uma praia, um local diferente... visita outras comunidades pra conhecer outras pessoas... o pessoal da própria comunidade... então é isso, é a praia e a praça. E- E com relação a monumentos? Agente não tem em Alter do Chão nenhum monumento constituído, mas teria algo – um lugar, uma construção, sei lá - que na tua opinião tem essa força? exerce a função de monumento na comunidade? R6- É... o que nós temos é a frente de Alter do Chão que é a “Ilha” e a Serra Piroca que é o nosso monumento... a nossa... o nosso monumento mais importante. Nós tínhamos o Museu do Índio que também representava muito por que era a união da cultura indígena local, da Amazônia, de Alter do Chão também, mas que agora não existe mais... até a estrutura dele também era muito bonita... mas ta desativado, então o que nós temos agora é somente a... nós temos a “Ilha” e a Serra Piroca que se isso acabar, se for destruído, se agente não cuidar, né, se os visitantes não preservarem... nós vamos acabar com essa... com esse nosso monumento. E- Por fim Neila, qual seria pra ti o lugar, ou a paisagem, ou a vista, ou a construção, mais importante, mais marcante de Alter do Chão? e descreve um pouquinho... R6- Ahhh sem dúvida de novo é a “Ilha”, a “Ilha” do Amor, e o Lago Verde... o Lago Verde... é... Por que quem chega em Alter do Chão se depara logo com a paisagem que é a “Ilha” e o Lago Verde né, que ta na frente de Alter do Chão... E quem vem pela água, pelo rio, que não é uma praia tradicional, que tem uma enseada, que entra pelo rio… então quem vem pela estrada se depara logo com a imagem, quem vem pelo rio é a enseada... que também dá na praia...

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Por exemplo quando agente viaja, quando agente volta, sempre pede pro motorista pra ele descer a rua direto que eu quero passar pela frente, pra ver a paisagem, é a primeira coisa que eu quero ver... então o marcante mesmo é a “Ilha” né... E- É Neila... era isso... se tu quiseres complementar alguma coisa... comentar alguma coisa... R6- Ó o que eu quero comentar mesmo é sobre... é que como Alter do Chão é muito visitada né, e.... agente tem que desfrutar disso no máximo e da melhor maneira possível... eu, como trabalho com turismo, tenho que é... o que eu vendo? São imagens né e serviços... eu tenho que ter o meu melhor serviço, qualidade no serviço, e a paisagem... então uma coisa que deve ser preservada e que eu acho que a... a administração local teria que dar muito mais importância, ter essa visão de, de... por que esse é o nosso desenvolvimento... com isso agente pode crescer, ter uma qualidade de vida melhor do que o que nós já temos.... então ta acontecendo assim um crescimento desenfreado aqui de Alter do Chão... muitos “Ah Alter do Chão... eu vou pra lá...” ou então o pessoal de outra comunidade vem par cá, vem muito turista, vem afim de trabalhar, de conseguir uma renda... que acha que vai conseguir mais do que tem nas comunidades por aí... pescam, fazem roça, é... acredito que fome eles não passam né, então vêm pra Alter do Chão, muitas vezes não tem o local, pega um local aí, um terreno, que já houve várias invasões... então uns vão chamando outros e aí vem, vem, vem... e o que? Tem que ter educação pra eles, tem que melhorar a escola, tem tudo... então se a administração vê e investe na infra-estrutura pra que Alter do Chão cresça adequadamente né, pela qualidade de vida das pessoas, e que não vai afetar essa beleza natural pra desenvolver o turismo né, então eu acho que isso ta faltando mais... investir nas coisas mais necessárias em Alter do Chão, pra que... não encher de pessoas, e todo mundo trabalhe, consiga viver, tranqüilos, né... Por exemplo, aqui nós precisamos, aqui basicamente agente precisa muito aqui, farmácia, nós não temos uma farmácia, nós não temos uma feira onde agente possa comprar os produtos, não temos um caixa, um banco... Ah agora já temos uma caixa econômica, já pode pagar talão de água, luz, telefone... mas para o turista... ele vem pra cá, ele não anda com muito dinheiro, se ele quer sacar ele tem que ir em Santarém... entendeu? Então pra girar... ele encontra essas dificuldades, ele não vai deixar dinheiro aqui na comunidade... ele evita um pouco... ele tem que um dia ir a Santarém pra sacar o dinheiro... ele já perde um dia de lazer e de descanso que ele tem que ter pra ir a Santarém... tem muitos que reclamam disso, muitos, várias pessoas reclamam... Brasileiro, estrangeiro… então eles já deixam de fazer um serviço com agente, já economizam na comida, já não vão gastar o mesmo no restaurante... e não vão fazer um passeio que eles gostariam por falta de dinheiro também... Também são poucos os que aceitam cartão de crédito... tem um hotel, acho que uma ou duas pousadas, e um restaurante que eles aceitam... o restante não... E- Obrigada então Neila! Obrigadão!

ANC - Ancoragem

Residente nascido em Alter do Chão. Trabalha com ecoturismo e já viveu por alguns períodos em países da Europa.

ECH – Expressões-Chave (Negrito)

- Já saí do país três vezes, já voltei aos mesmos lugares e... e cada... e entristece assim um pouco agente vê que Alter do Chão, ta mudando muito rápido, algumas coisas agente já esta perdendo né, que é... ahhh... é, além das belezas naturais, agente ta tendo um pouco de modificação na paisagem... e na forma que as pessoas estão tratando, nós mesmos brasileiros, estamos tratando nossa, nossa vila - aqui é no Lago Verde e... é uma... essa paisagem nos temos só na estiagem, né… é... aqui é um canal, a água é bem limpa, transparente, tem muitos peixinhos (...) e depois fui ver aqui essa cena, olha aqui a liberdade dela, o prazer dela ta... assim tocando na água - Tem muitas pessoas que não tem oportunidade... muitas crianças que vivem assim no apartamento, presas né, e... vão conhecer lugares, claro, depois de adultas… mas entao a liberdade que as crianças tem aqui... de ter essa nossa natureza... ter

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essa qualidade de vida assim - é quase a essência de Alter do Chão, né, que é o Lago Verde, o morro e a “Ilha”. - Por esse conjunto, que nós temos aqui da representação de Alter do Chão, e por ela apresentar, ela ta um pouco assim... assim é... calma - preservar né, Alter do Chão, por que essa é a nossa riqueza, é a riqueza que nós temos em Alter do Chão... é a água, praia e floresta... e que nós, nos vivemos disso ne, nossa qualidade de vida, esta representada - ela passa uma tranqüilidade assim como ela está tirada aqui - todos parecem que estão felizes aqui nesse lago... depois de uma caminhada nada melhor que uma água fresca, não é (...) pelo prazer de poder mostrar pras pessoas de fora né, de fazer elas conhecerem... de sentirem o local - foram visitar o peixe-boi, e aqui é a união dos três que tão... que foram nessa visita... e aqui é uma outra imagem, também é do Lago Verde, mas essa aqui é uma outra imagem... bastante água, e a floresta aqui né... a floresta baixa que é característica aqui do Lago Verde - eu acho que é pela união dos meus três sobrinhos (...) e aqui num, num lugar tão bonito, né, tão no meio da natureza... num centro de preservação - como nós estamos rodeados de lagos, de rios, de igarapés, né (...) ta um contraste do Lago Verde com a floresta aqui (...) esse cercado aqui tão natural, tão simples e natural, entendeu... e que deu uma harmonia aqui com a natureza do Lago Verde - eu sempre gosto do pôr-do-sol (...) pra mim o pôr-do-sol representa esse momento de paz... de tranqüilidade (...) os catraieriros aqui que representa também o nosso, também uma marca de Alter do Chão, né, as canoinhas, e as pessoas aqui ó, tranqüilas (...) tranqüilidade, paz que nós temos todos os dias. - da minha infância é que agente tomava banho muito... (risos) assim, mergulhava muito nessa praia (…) a praia era bem alta, era bastante alta, então ela tinha uma queda assim, onde todo mundo ia pra lá pra rolar na areia e cair lá embaixo - a água, as canoas elas vinham mais aqui… aqui quase no quintal, não tinha o cais, e daqui mesmo agente pegava a canoa e atravessava o rio... - Tem umas coisas que não são aprovadas né, pela comunidade e pra nós que dependemos da imagem de Alter do Chão no trabalho... esses ferros, esses... o resto não... se fosse madeira... - depois que asfaltaram melhorou muito a qualidade de vida aqui pra agente, pra agente trabalhar, por que sempre as pessoas estão buscando mais Alter do Chão (...) o acesso ficou bem melhor pra agente, pra ir fazer compras, pra voltar, mais rápido - a orla é importante pra agente assim né... pra... ter uma nova visão também por que nós temos os efeitos da natureza... as enxurradas (...) mas o que é realmente é a imagem... acho que é o material que utilizaram... é somente isso... o que não combina com Alter do Chão é isso... o resto não, vai melhorar - nós vivemos da paisagem aqui de Alter do Chão. - os momentos de lazer é na praça (...) e a praia também, acho que de todo mundo a praia ainda é um dos principais lazeres que nós temos né... à noite, de dia, às vezes agente reúne todo mundo pra fazer piracaia (...) cada vez visita uma praia, um local diferente... visita outras comunidades pra conhecer outras pessoas - é a “Ilha” e a Serra Piroca (...) Nós tínhamos o Museu do Índio - Ahhh sem dúvida de novo é a “Ilha”, a “Ilha” do Amor, e o Lago Verde... o Lago Verde... é... Por que quem chega em Alter do Chão se depara logo com a paisagem que é a “Ilha” e o Lago Verde né, que ta na frente de Alter do Chão - então uma coisa que deve ser preservada e que eu acho que a... a administração local teria que dar muito mais importância, ter essa visão de, de... por que esse é o nosso desenvolvimento... com isso agente pode crescer, ter uma qualidade de vida melhor do que o que nós já temos.... então ta acontecendo assim um crescimento desenfreado aqui de Alter do Chão - então vêm pra Alter do Chão, muitas vezes não tem o local, pega um local aí, um terreno, que já houve várias invasões

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QUADRO 07: DSC da Entrevista Residente 6 Fonte: A autora, 2007.

- então se a administração vê e investe na infra-estrutura pra que Alter do Chão cresça adequadamente né, pela qualidade de vida das pessoas, e que não vai afetar essa beleza natural pra desenvolver o turismo né - Ah agora já temos uma caixa econômica, já pode pagar talão de água, luz, telefone... mas para o turista... ele vem pra cá, ele não anda com muito dinheiro, se ele quer sacar ele tem que ir em Santarém... entendeu? Então pra girar... ele encontra essas dificuldades, ele não vai deixar dinheiro aqui na comunidade

ID – Idéias Centrais

- Percepção da aceleração das mudanças e da falta de cuidado das pessoas, especialmente dos brasileiros, com o lugar; - Acredita que a água do Lago Verde ainda é limpa e clara; - Relata a intimidade e a naturalidade que as crianças de Alter do Chão têm no ambiente natural; - Caracteriza como “essência” de Alter do Chão o conjunto formado pela “Ilha”, o morro e o Lago Verde; - A sensação de calma transmitida pela paisagem; - Fica satisfeita em observar a satisfação de seus clientes (turistas) no banho de igarapé após a caminhada; - Fica feliz em ter a oportunidade de reunir a família (os sobrinhos), inclusive parte que não reside no Brasil, às margens do Lago Verde, para ver o peixe-boi; - Descreve a paisagem de por-do-sol como tranqüila e associa a ela, canoas, catraieiros e pessoas; - Descreve mudanças na altura da faixa de areia da “Ilha” de suas memórias de infância para a atualidade; - Constata as mudanças na orla, desde antes da construção do primeiro cais até a obra atual, à respeito da qual acha necessária, mas desaprova os materiais escolhidos, dentre os quais o ferro; - Percebe o asfalto na estrada como melhoria de acesso para os visitante e maiores oportunidades de trabalho para os moradores; - Acredita que os moradores de Alter do Chão vivem da paisagem da Vila e do entorno; - Cita como áreas utilizadas para o lazer a Praça da Igraja Matriz e na praia, além das praias e outras comunidades próximas; - Cita como monumentos da Vila a “Ilha”, o morro Serra Piroca e o Museu do Índio; - Acredita na necessidade de um maoir planejamento e ordenamento para o crescimento da Vila, sob pena de perder os seus atrativos turísticos; - Refere-se ao êxodo rural com preocupação, por entende-lo como relacionado às invasões de terra que têm ocorrido na Vila; - Fala da necessidade de investir de forma mais consciente e correta na infra-estrutura, buscando a manutenção das belezas naturais; - Denuncia a falta de serviços de banco (caixa eletrônico), feira e farmácia, para atender tanto a moradores quanto a turistas, dificcultando o desenvolvimento da atividade turística no local.

EMS - Elementos Morfológicos e Sócio-culturais

- “Ilha”, morro Serra Piroca e Lago Verde; - Família; - Água; - Areia; - Turistas; - Peixe-boi; - Pôr-do-sol; - Canoas e pessoas; - Praça da Igreja Matriz; - Museu do Índio; - Outras comunidades e praias.

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Entrevista 7 E – Entrevistador R7 – Residente entrevistado 7

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6 E- Eu queria que vocês se apresentassem... falassem um pouco de vocês, o nome, a formação/trabalho, quanto tempo vocês moram na Vila... R7- Meu nome é Dórisson Mingote... eu estudei até a quarta série mesmo aqui em Alter do Chão, era só o que tinha aqui na época... na quinta série eu fui pra Santarém, estudar no seminário, de lá fui pro Dom Amando, aí e de lá fiz faculdade de engenharia, mas sempre fiquei morando aqui... fui pra Santarém estudar mas voltei, pra ficar trabalhando por aqui, né, fiquei trabalhando com comércio, restaurante... Aí depois agente resolveu abrir a pousada né, começou a trabalhar com pousada... é, mudamos do ramo de alimentação pra esse, né, mas o comércio continua... R7- O meu nome é Conceição, eu sou natural de Belterra, minha formação toda foi lá, só que há 17 anos eu fui trabalhar na escola onde eu to até hoje... eu to na direção da escola, há 12 anos, sou pedagoga, especialista em geografia ambiental e gestão educacional e, hoje, to cursando ciências sociais... e... também ajudo aqui, trabalho com hotelaria, na parte de gestão... Sou casada, tenho dois filhos... E- Vamos então começar a entrevista com a Conceição. E a primeira foto dela é a “005”... Conceição, tu podes descrever pra mim essa imagem? R7 – É… essa foto aparece um efeito, um fenômeno que aparece... hoje agente percebe mais no rio Tapajós, ele. Aí é uma foto que ta quase lá em frente de Ponta de Pedras... O rio, então chega essa época agora, de final de ano, quando começa a enchente, o limo se desprende das margens, né, e entra no rio... então, tem dias que agente passa e ta parece uma abacatada assim, aquele verde assim bem... isso chega até a sufocar os peixes, né. Já aconteceu dagente passear por lá e encontrar vários peixes boiando, morto, principalmente pescada que é um peixe mais sensível e... e antigamente isso dava muito aqui dentro do Lago, isso… e chegava

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uma época que nem todo mundo tinha condição de tomar banho, que o pessoal quase não tomava banho em casa, né, tomava mais mesmo no rio... ia pra lá tomar banho, e nessa época, junto com o limo dava muito sanguessuga… Agente tinha que tomar banho rapidinho, sair correndo passar limão assim pra tirar o sanguessuga, que agente ficava olhando assim na beira, né... então tinha dias que ficava totalmente verde o Lago desse limo... algumas pessoas dizem até coisa, que passou a se chamar Lago Verde por causa desse fenômeno... e agente observa que hoje em dia aqui dentro do Lago num... se observa, mas muito pouco. E no Tapajós não, você passa de lancha… dá pra ver. É um fenômeno natural, né, que acontece... e agente passa e percebe assim a divisa... parece o encontro das águas mesmo... uma parte verde, verde parece uma abacatada e no outro, normal. E- A segunda foto que vocês escolheram é a foto “0056”... Vocês podem descrever? R7- Essa aí é uma foto dos vários igarapés que tem lá no fundo do Lago, esse aí provavelmente é o Igarapé do Camarão, a entrada... então é um lugar que também seria muito bom essa época do ano, é muito bom pra passeio... ele vai... conforme até as pessoas vão entrando e saindo, ele vai ficando mais limpo, o canal dele, né... e então agente pode entrar na floresta, na floresta mesmo pelo igarapé, caminhando por dentro dele né, na borda é raso, tem várias piscinazinhas naturais... fica muito bonito assim pra levar turista... tem parte que agente chama de sulapa também, sulapa... que é uma lama, parece um mangue quase, e ficam uns peixes... alguns peixes que ficam por lá escondidos, nesses locais e... e... e o pessoal usa pra pescar nessas partes aí. E- E o que tu achas importante deste cenário aí? De escolher esta foto, especificamente, pragente conversar? R7- Porque ele é um atrativo turístico que aqui é pouco... até utilizado e explorado, né... é... o turista que vem pra conhecer a região, muitos poucos tem a oportunidade de chegara até lá, de ser apresentado assim, né... também tem um período certinho, né... tem que saber o período certinho pra ir pra lá... porque esse é um cenário que modifica muito né... são os primeiros que são modificados... começa a encher... aí tem períodos que agente passa que ta totalmente diferente, porque encheu, porque ta só as árvores aqui, de fora , né... e agora, quando chega o período da seca, fica só alguns igarapés... o cenário modifica bastante. E- Qual é a terceira foto de vocês, então (foto 00045 e foto 00042)? E- Essa foto aí, foi praticamente o primeiro comércio que teve aqui em Alter do Chão... só que ta mal-fotografada... era o papai ali na época, novo... agente tinha aí onde é o D’Itália agora, então, tinha só uma pracinha do lado, ali na frente da igreja, e desse comércio pra cá tinha um restaurante, que foi também o primeiro restaurante que teve... de palha com areia no chão e... aí nesse comércio vendia de tudo ali, vendia desde bebidas, e material pra pesca, comprava sernambi, comprava bola de seringa, comprava milho... então o papai saía aí na beira do rio fazendo troca de mercadoria, com esse pessoal... eles tinham barco, ne, e praticamente não se usava estrada... ia todo dia pra Santarém de barco, ou de bajara... E- Nessa época já tinha a estrada? R7- Já tinha um caminho... nessa época eu acho que o papai já tinha um... era um jipe que agente tinha que era o único tipo de carro que podia passar nessa estrada... mas a maioria do comércio era feito de barco. E- Será que tu podias me falar um pouco dessa diferença que tinha de antes pra agora? R7- Olha, pela… é… pela… assim, era um comércio que, que... eram poucos moradores da Vila, então todo mundo ia pra lá... eu gostava, de pequenininho, de ir pra lá pra ficar ouvindo os fatos, as histórias dos pescadores que chegavam assim vários, pediam cachaça e ficavam conversando, contando história... então era um comércio assim bem variado e isso aí não se compara com o que tem agora nas lojas, com esse comércio que tinha. E- E a Vila mesmo? O que mudou mais dessa época pra cá?

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R7- Hummm... da Vila, eu lembro bem em frente daí... era o que eu tava comentando ontem, agente não tinha preocupação ambiental nem com nada... bem na frente, era o lixeirão da Vila... bem na frente, ali onde é o D’ Itália que aterraram, que fizeram aqueles quiosques que... lá era um buracão que tinha, então todo mundo vinha e jogava o lixo dentro... aí, eu lembro que no final da tarde, agente ia brincar por lá... saia espalhando o lixo, brincando, jogando pra cima com pedaço de papelão... e... de tempo em tempo agente tacava fogo lá pra queimar tudinho lá e plantava um bocado de patichouli, essas coisas... então era um buracão lá, que iam jogando lixo, foi queimando e foi tapando ele... que antes era uma vala enorme aí, não passava nada nessa rua da frente, aí foi o vovô que quando chegou plantou essas mangueiras da frente, entende, foi aterrando, foi fechando, fechando... era um buraco enorme ele e foi fechando jogando lixo... não tinha preocupação de coisa nenhuma... tinha uma época que nem tinha esse cais aí às vezes caia direto lá pro rio. E- Então, faltam 3 fotos… E a terceira foto de vocês é a “06938”. Vocês poderiam descrever essa foto pra mim? R7- Essa foto foi o seguinte, eu saí com o Dórisson pra passear na praia e vimos que... que tava um pouco poluído, então os jovens, mais a iniciativa dos comunitários de alguns, e mais o Dórisson e o Dorinei, eles providenciaram equipamentos tipo luva, saco plástico, é... e convidamos a escola, que tem o grupo de… de alunos que chama “Guardiões da Limpeza”, é um projeto... e os jovens da comunidade então fizemos uma campanha pra limpar o ambiente da praia... então, numa manhã, foram pra praia e coletaram esse lixo pra mostrar um ambiente limpo, pra que o turista chegue, como já vai chegar de férias, né, então, que se apresente num ambiente legal... então eu acho, isso é muito importante essa atitude, independente de esperar por Governo, eles foram e tomaram uma atitude comprando luvas, e fizeram doações pra que eles pudessem fazer esse trabalho. E- E isso é uma coisa freqüente na comunidade? R7- Sim, a comunidade com a escola, sempre nós fazemos, assim, esse tipo de trabalho... a campanha, gincanas, é... limpeza com a comunidade... então, é uma das preocupações muito grandes da comunidade, de manter. Porque isso aqui era uma segunda-feira, geralmente no sábado e no domingo, tem muitos turistas né, então tem que cuidar aqui... tem que jogar o lixo no coletor e vai juntando pela praia. Então, agente fica observando e não é pouco as pessoas que jogam pela rua… então os jovens e a escola tomaram essa decisão... durante o primeiro semestre agente faz duas ou três vezes numa campanha geral e no final do ano também. E- Qual a importância nessa imagem pra ti? Por que escolheste essa cena pra comentar? R7- Eu acho que é importante pela atitude dele e demonstrar a questão do ambiente, ne, ambiental... que hoje se a comunidade não zelar pelo que tem, como tempo vai acabar. Então, se eu arrumo minha casa pra esperar as pessoas, visita... então eu tenho que ta preparado... e a comunidade, como os jovens e a escola, também tem... já que a comunidade é um pólo turístico... então é importante ficar consciente disso. E- Tu destacarias algum elemento nessa foto? Alguma coisa que apareça nela que te chama atenção? R7- Foi as crianças que... que tavam lá no meio. Inclusive nós selecionamos pela idade também... e eles, mesmo assim, eles queriam participar e nós deixamos eles irem lá... Então, tem mais crianças, no momento dessa foto, esses que tavam por perto, mas tinha uma média de umas 35 crianças. E- Podemos então passar pra foto seguinte? A quarta foto de vocês é a “imagem 019”. Vocês poderiam descrever pra mim o que é? R7- Essa foto, esse daí foi o seguinte... desde que nós entramos lá na escola nós fazemos projetos... então selecionamos todos os alunos que passassem, que não ficassem pra recuperar, então nós temos que cumprir com uma carga horária... então, como esses alunos já tinham sido aprovados, mas teriam que estar na escola, pra que eles não ficassem juntos dos

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alunos pra recuperar... então isso foi uma proposta assim de incentivar fazer um projeto sobre os grafismos... os grafismos com o Borari. Então tem dois professores voluntários que vieram à escola, só pra passar… depois do quarto bimestre, todas as crianças que foram aprovadas, fizeram parte desse projeto... E com isso eles vendem as cuias pros turistas, e foi muito importante que eles aprenderam toda a técnica de como pintar a cuia, como fazer esse grafismo, que eu olhava assim, eu achava particularmente muito difícil... e com uma habilidade de uma semana essas crianças tavam fazendo cada trabalho... perfeito... e hoje tem alunos que fazem a imagem da igreja... qualquer desenho através do grafismo. Então... e por que o grafismo? Por se tratar do turista e o artesanato, então ta resgatando essa cultura que nós trabalhávamos com educação patrimonial resgatando toda... o artesanato da comunidade, né. Então, tinha outros tipos de grafismo só que aqui o objetivo era o grafismo Borari... a aldeia aqui de Alter do Chão é a Borari, então, nós távamos trabalhando e esses... teve aqueles que fizeram pra completar a carga horária mas a maioria já ficou assim, aprendeu mesmo... e conseguem fazer... como a cuia ficar preta, que ninguém sabia... então tudo isso tem uma técnica muito boa. E- E por que vocês acharam importante incluir essa foto na nossa conversa? R7- Ahhh porque também estamos trabalhando na escola, a questão da valorização do artesanato local. E- Que elementos vocês destacariam nessa imagem? R7- As cuias e o design delas. E- Agente pode então ir pra última foto de vocês? Vocês podem descrever pra mim a foto “Jan Fev 06 016”? R7- Ta... Essa foto aí também é um trabalho da escola, nós fazemos atividade aos sábados... então isso aqui, a Semed, a Secretaria de Educação, ela inclui algumas atividades que pelas experiências anteriores, aulas sábados, muitos alunos faltavam... já essa foto aí, o tema é “conhecendo a nossa Vila”, então até 2 mil e... até 2000, a Vila era pequena, não tinha esses bairros, tanto que tem crianças que não conhecem a Vila... então o nosso objetivo era sair, fazer a parte de ciclismo, que eles gostam muito de bicicleta, e também conhecer todas as ruas, os novos bairros da Vila... e pragente saber onde os nossos alunos moram. Então, saímos da escola pelo bairro novo, e lá, vê a parte de erosão, vê aquelas serras... em cada momento agente, o professor de geografia, estudos amazônicos e história, vão e trabalham matemática com eles... eles ficam observando, aí eles explicam sobre a questão do clima, a questão da arborização que precisa trabalhar... então voltando de lá, eles vão pra escola e vão questionar qual é o bairro que precisa arborizar, o que precisa manter, além deles conhecerem o bairro de outros colegas, que aqui é tão pequeno mas ta se desenvolvendo muito, e... e faz a parte também do ciclismo, e aprende uma aula diferente, extra-classe. Então, é um sábado pela manhã todinho, sai 7 e meia da manhã e volta umas 11 e meia, pra dar tempo de conhecer todos, por isso que agente vai de bicicleta. Aí eram mais de 200 alunos... essa é só uma parte que saiu na foto né, mas... também tem as trilhas... conhecendo as novas trilhas, que muitos deles trabalham com o turista. Então, a partir daí também já vão conhecendo mais, e quando chega alguém já, desses que foram treinados pra trabalhar com trilhas, já leva lá pro turista conhecer... então tudo tem um objetivo. E- E por que vocês escolheram essa foto? Por que vocês acharam importante colocar essa imagem no trabalho? R7- Essa foto eu achei importante, também pela questão da valorização, de se tratar com crianças, né, e mostrar pra eles que também eles já tem que ter essa preocupação de zelar, cuidar, não deixar poluir. E daí eles passarem pros pais, porque eles chegam em casa e aí comentam “eu fui na rua tal, vi a coisa tal”... e depois, deles também sugerirem da questão da arborização necessária. E- Que elementos tu destacarias nessa cena?

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R7- Os elementos que eu destacaria é a questão do envolvimento da criança... agente percebe a alegria deles, o contentamento... e... e a questão do lazer. Que já une o útil ao agradável, junta um passeio e depois que termina, que chega na escola, vão almoçar e depois vão brincar de bola, assistir filme... e quem não vai, fica na escola fazendo outra atividade. E- Agora eu tenho só mais umas 3 perguntinhas gerais sobre a Vila pra fazer pra vocês, que não são especificamente sobre as fotos ta. A primeira delas é: do tempo que vocês estão em Alter do Chão, como perceberam as mudanças na Vila, por exemplo, do asfaltamento da rodovia pra cá? E como vocês avaliam essas mudanças? R7- Olha, quando eu cheguei pra cá, há 17 anos, a última rua era aquela que hoje é o terminal... mas era pouquinhas casas... De lá pra cá já... Então era muito pacato aqui Alter do Chão, a vida das pessoas, então, eu to há 17 anos e já mudou bastante coisa. O que eu vejo assim de positivo, pra questão do desenvolvimento, mas tem os seus negativos. Se não fizer um trabalho de... vamos dizer assim, a questão do impacto não for trabalhado, então é esse o nosso objetivo de trabalhar com a escola e já conscientizar... porque vai crescendo cada vez mais sem um... um direcionamento, sem um planejamento, então, vai ficar difícil... as pessoas vêem... ahh... vai crescendo, por exemplo, esses novos bairros que surgiram... aí cresceu escola, cresceu tudo... pra questão do sócio-econômico, algumas pessoas que chegam agora, se não estiverem preparadas... se já ta ruim pra quem está, imagina que vai ser muito difícil... porque é a questão do... do crescimento, mas não vai crescer de qualquer jeito... que aí aumenta... vão ter aquelas pessoas que vão querer vir com aquela empolgação, e chega aqui não é como eles imaginam... agente observa assim, muitas pessoas que chegam na comunidade, época de alta temporada, porque “ahhh vem muita gente”, aí se empolga, às vezes compra terra, abre um baita de um negócio, sem saber como é que funciona isso, depois se decepciona, fica aí não gosta, aí fica aquela coisa... e tem aqueles que retornam... e quando eles fazem que dá, com o negócio, ainda pode dar certo... e tem aqueles que depois culpam a comunidade “ahh porque aqui não tem nada, não sei o que mais...” é devido a essa questão que não tão preparado... aí vem criança, aí aumenta escola... então tem que ter esse planejamento... e hoje a comunidade, ela já está mais preparada pelo seguinte, já tem a preocupação de fazer um plano gestor, tem uma equipe da qual eu faço parte, que estamos fazendo calendário... essas coisas tudo pra organizar, Alter do Chão tem que estar preparada pra isso e de uma forma ordenada, porque senão... vai ter um impacto muito grande, aí o turismo vai se acabar... então essa questão, como nós trabalhamos na escola, e muitas pessoas tão chegando, e desconhecem... nós tamos orientando. E- Na opinião de vocês, esse crescimento ta acontecendo de que forma hoje? Ele já é planejado na opinião de vocês? R7- Não, não é planejado não... E- Com relação à que? R7- Porque assim, as construções chegam e vão assim... eu vejo assim, a hora que tiver esse planejamento, pelos órgãos... tipo assim, o município, tem que fiscalizar... tipo quem é que ta chegando... que faça, mas que seja uma coisa com planejamento, com... pra ver a questão do impacto... pra depois não precisar ver esses transtorno... porque o crescimento desde o momento, tem uns 3 anos atrás que nós fizemos um levantamento sócio-econômico... e ta crescendo e já tem essa preocupação... já tem a pesquisa, nós já fizemos pesquisa, temos base. E a questão, já fizemos uma outra pesquisa sobre a questão da violência... ainda não temos, mas já temos alguns casos, então... essas coisas, essas questões que levantamos, tenha preocupação pra que possa receber, pra Alter do Chão ser um ambiente turístico, porque é um ambiente turístico, que seja agradável mas que o turista que chegue aqui se sinta confortável né, que venha, seja bem recebido em todos os aspectos. E que a pessoa que vai vir morar pra cá já tenha essa consciência que vai vir, mas que também vai ter que contribuir... eu não posso só vir aqui e tirar e não deixar nada. Eu vejo por aí... também os

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governos... ta tendo estudos... o plano diretor... eles já vieram aqui, fizeram um estudo de uma semana... então agente já percebe que já há uma preocupação muito grande e os comunitários já tem essa visão já hoje... antes tava um pouco adormecido né, mas hoje agente já tem as pessoas que tão se preocupando. E- Na opinião de vocês, como vocês vêem essa obra aí? Essa mudança na praça, no cais...? R7- Sim... aqui essa obra foi um impacto muito grande pra comunidade, na verdade foi um choque assim... quando veio o projeto, falaram e tal, a comunidade toda aceitou e todos, como era um objetivo como “ahh vamos arrumar a casa pra esperar o turista...”, que aqui eles vivem de turismo, os catraieiros, todo mundo... então que fique bonito o ambiente. Aí quebraram toda a praça, depois que começou a aparecer como ia ficar, foi um impacto muito grande pra todos os comunitários... aí... e hoje já estão um pouco assim aceitando, mas num ta... foi um impacto muito grande. Eu percebi que teve um... esse impacto... antes, a antiga pracinha, a caracterização dela, que quando eu cheguei já era essa que tava, eu gostava mais do ambiente... daria mais a característica local, do que nós tínhamos na comunidade, e hoje agente vê já mais como cidades grandes né... e de qualquer forma, quem conhecesse... que fizesse só uma restauração, que melhorasse, mas num tirar tudo que tem e colocar... então a minha opinião é essa aqui, eu gostava mais da outra praça, do outro ambiente que tinha que era mais característico daqui da comunidade. E- Vocês acham que tem algum lugar, alguma construção, alguma coisa que tenha esse valor de monumento pra comunidade, que tenha esse apelo de memória? R7- Eu vejo só assim, não sei se... mas a Serra Piroca que eles colocaram lá o símbolo do Sairé mas tiraram... que credito que lá é um... é um... é como um monumento de Alter do Chão. E- Com relação ao lazer, onde vocês acham que o lazer da comunidade acontece, de uma forma geral? R7- É quando tem jogos à noite, na praça do Sairé... é... algumas atividades da escola... que agente observa... a festa da padroeira... a Festa do Sairé... alguma coisa assim que, é onde é o lazer... aí quando tem festa também assim, dos clubes... mas tirando isso, a praia... lá é difícil você ver as famílias da comunidade porque eles tão lá, mas é trabalhando... Aí você vê pelo meio da semana eles descerem mas é pra tomar um banho rápido, não vão assim pra lazer. E- E por último, na opinião de vocês qual é o lugar, a paisagem, a vista, a construção, qualquer coisa, que vocês acham que é a cara de Alter do Chão? Que é mais marcante em Alter do Chão? R7- Ali a “Ilha”... é a “Ilha” de Alter do Chão... essa vista, pegando essa parte da “Ilha” com a ponta da Serra. E- Bem, era isso. Não sei se vocês gostariam de acrescentar mais alguma coisa... Senão, muito obrigada!

ANC - Ancoragem

Casal de residentes, ele Engenheiro, nascido em Alter do Chão; e ela pedagoga, diretora da escola municipal, nascida em Belterra as moradora de Alter do Chão há mais de 17 anos. Ambos são proprietários de uma pousada e de um pequeno estabelecimento de comércio localizados na região central da Vila.

ECH – Expressões-Chave (Negrito)

- então agente pode entrar na floresta, na floresta mesmo pelo igarapé, caminhando por dentro dele né, na borda é raso, tem várias piscinazinhas naturais... fica muito bonito assim pra levar turista - é um atrativo turístico que aqui é pouco... até utilizado e explorado, né (...) tem que saber o período certinho pra ir pra lá - foi praticamente o primeiro comércio que teve aqui em Alter do Chão (...) e desse comércio pra cá tinha um restaurante, que foi também o primeiro restaurante que teve... de palha com areia no chão e... aí nesse comércio vendia de tudo ali, vendia desde bebidas, e material pra pesca, comprava sernambi, comprava bola de

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seringa, comprava milho - a maioria do comércio era feito de barco - não tinha preocupação ambiental nem com nada... bem na frente, era o lixeirão da Vila (...) foi o vovô que quando chegou plantou essas mangueiras da frente, entende, foi aterrando, foi fechando, fechando - chama “Guardiões da Limpeza”, é um projeto... e os jovens da comunidade então fizemos uma campanha pra limpar o ambiente da praia - que se apresente num ambiente legal... então eu acho, isso é muito importante essa atitude, independente de esperar por Governo - então os jovens e a escola tomaram essa decisão... durante o primeiro semestre agente faz duas ou três vezes numa campanha geral e no final do ano também - então isso foi uma proposta assim de incentivar fazer um projeto sobre os grafismos... os grafismos com o Borari - E com isso eles vendem as cuias pros turistas, e foi muito importante que eles aprenderam toda a técnica de como pintar a cuia, como fazer esse grafismo (...) Por se tratar do turista e o artesanato, então ta resgatando essa cultura que nós trabalhávamos com educação patrimonial resgatando toda... o artesanato da comunidade, né - Ahhh porque também estamos trabalhando na escola, a questão da valorização do artesanato local - já essa foto aí, o tema é “conhecendo a nossa Vila” (...) então o nosso objetivo era sair, fazer a parte de ciclismo, que eles gostam muito de bicicleta, e também conhecer todas as ruas, os novos bairros da Vila... e pragente saber onde os nossos alunos moram (...) também tem as trilhas... conhecendo as novas trilhas, que muitos deles trabalham com o turista - mostrar pra eles que também eles já tem que ter essa preocupação de zelar, cuidar, não deixar poluir (...) e depois, deles também sugerirem da questão da arborização necessária - há 17 anos, a última rua era aquela que hoje é o terminal... mas era pouquinhas casas (...) porque vai crescendo cada vez mais sem um... um direcionamento, sem um planejamento, então, vai ficar difícil... - pra questão do sócio-econômico, algumas pessoas que chegam agora, se não estiverem preparadas... se já ta ruim pra quem está, imagina que vai ser muito difícil... - e hoje a comunidade, ela já está mais preparada pelo seguinte, já tem a preocupação de fazer um plano gestor (...) Alter do Chão tem que estar preparada pra isso e de uma forma ordenada, porque senão... vai ter um impacto muito grande, aí o turismo vai se acabar - as construções chegam e vão assim... eu vejo assim, a hora que tiver esse planejamento, pelos órgãos... tipo assim, o município, tem que fiscalizar... - pra Alter do Chão ser um ambiente turístico, porque é um ambiente turístico, que seja agradável mas que o turista que chegue aqui se sinta confortável né, que venha, seja bem recebido em todos os aspectos (...) então agente já percebe que já há uma preocupação muito grande e os comunitários já tem essa visão já hoje - aqui essa obra foi um impacto muito grande pra comunidade, na verdade foi um choque assim (...) Aí quebraram toda a praça, depois que começou a aparecer como ia ficar, foi um impacto muito grande pra todos os comunitários (...) antes, a antiga pracinha, a caracterização dela, que quando eu cheguei já era essa que tava, eu gostava mais do ambiente... daria mais a característica local, do que nós tínhamos na comunidade, e hoje agente vê já mais como cidades grandes né - (monumento) não sei se... mas a Serra Piroca que eles colocaram lá o símbolo do Sairé mas tiraram... - (lazer) na praça do Sairé... é... algumas atividades da escola (...) a festa da padroeira... a Festa do Sairé... - (lazer) mas tirando isso, a praia... lá é difícil você ver as famílias da comunidade porque eles tão lá, mas é trabalhando... Aí você vê pelo meio da semana eles

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QUADRO 08: DSC da Entrevista Residente 7 Fonte: A autora, 2007.

descerem mas é pra tomar um banho rápido, não vão assim pra lazer. - essa vista, pegando essa parte da “Ilha” com a ponta da Serra

ID – Idéias Centrais

- Falam da atividade turística nas paisagens intermitentes da região; - Caracteriza as formas antigas de comércio na Vila (através de escambo e vales); - Enfatizar a importância do rio no transporte e no comércio, especialmente antes da estrada; - Cita a forma de depósito de lixo no passado em um grande buraco próximo à orla; - Estabelece uma relação afetiva, quase de parentesco com as mangueiras plantadas pelo avô; - A escola local como agente na participação, no incentivo e na conscientização quanto à limpeza, através de campanhas regulares organizadas, especialmente no caso das praias, incluindo participação infantil; - Acredita que as ações e iniciativas comunitárias nnão devem esperar pelas ações do Governo; - A escola incentivando o resgate cultural, através do artesanato e dos grafismos e, assim, de sua utilização como fonte de renda e como produto turístico local; - A aproximação da escola aos seus alunos, através do conhecimento da Vila toda e da discussão de seus problemas segundo bairros/áreas; - Noção do tamanho da Vila em anos anteriores e a percepção da grande velocidade das mudanças; - Cita os problemas sócio-econômicos gerados pela migração para a Vila; - Fala da falta de planejamento e fiscalização das construções - Cita a consciência crescente na comunidade sobre os cuidados com a Vila para a manutenção e crescimento do turismo; - Trata do grande impacto da mudança da Praça da Igreja Matriz, que parece “cidade grande” e a preferência pela antiga pracinha; - Como monumento destaca o Morro da Serra Piroca; - No lazer cita a Praça do Sairé, a escola, as festas (principalmente a Festa do Sairé) e a praia; - No entanto, cita a diminuição do uso da praia para o lazer da população; - Como mais marcante da Vila, cita a vista da “Ilha” com o morro.

EMS - Elementos Morfológicos e Sócio-culturais

- LagoVerde, floresta e igarapés; - Lixo; - Mangueiras; - Escola; - Grafismos (de origem Borari para as cuias); - Praça da Igreja Matriz; - Morro da Serra Piroca; - Praça do Sairé; - Festa do Sairé; - Praia da “Ilha”; - Vista da “Ilha” com o morro.

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Entrevista 8 E – Entrevistador R8 – Residente entrevistado 8

E- Vamos então começar a entrevista coma Dona Neca. Vamos começar apresentando a senhora, com informações como idade, tempo de moradia na Vila, formação/atividades... R8 – Eu sou Ludinéia Gonçalves Marinho, mas sou mais conhecida como Neca Borari, faço parte desse povo né, não nasci aqui, mas... eu creio que foi por... a minha mãe teve que viajar e... eu não sei se foi sorte, mas eu creio que foi uma grande sorte né, ela teve que sair daqui pra ir até Nova Olinda no Amazonas, eu creio que eu tinha que nascer mais no meio da mata né, e eu nasci em Nova Olinda do Norte, no Amazonas. E de lá, a mãe voltou, eu bem pequena né… e to aqui até hoje. Em nome de Jesus, esse ano eu vou fazer 50 anos, e to aqui cuidando do que eu posso aqui em Alter do Chão né. E- Daí eu gostaria que a senhora falasse também um pouco de suas atividades, até mesmo da questão da associação que a senhora... R8- Eu trabalho aqui como... eu sou artesã e ajudo na comunidade nessa questão da terra, eu gosto muito da questão cultural, falando do folclore ne, trabalhando com folclore... na Festa do Sairé, agente é envolvido muito na Festa né, faço parte deste trabalho, gosto muito né, defender a cultura do povo Borari, e a atividade essa de defender Alter do Chão né, correr pra praia que tem que defender né, pra terra, pra cultura... e tudo aquilo que agente tem direito né. Também trabalho com alimentação aqui na praia né, tudo é muito por temporada né... Na época que ta pra cá, tá pra cá na praia com alimentação... é... tem a época de tu cuidar da questão da terra né. Geralmente aqui agente faz assim: no verão, você colhe ne, colhe o teu trabalho... você tem um trabalho, você ta ganhando ne, levantando algum troco. E já no inverno você corre mais de cuidar da questão da terra ne, assim, da... do... do... da roça né, dessas coisas... porque ta meio... a “Ilha” ta no fundo, e quase não ta correndo... mas quando ela sai né... eu acho que Alter do Chão, ela é muito bem feita, sabe, ela é pra lá de bem feita... ela foi feita com muito cuidado, porque numa época ela ta dentro d’água, agente ta numa atividade, e durante o ano tu vais trabalhando nestas temporadas... tudo por temporada... hoje tu ta aqui na praia, daqui em março agente já ta saindo daqui, já ta em outra atividade né,

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vai trabalhar com artesanato... vai colher material, ou com o que eu já colhi, eu já vou trabalhar... pra armazenar pra quando o navio começar, eu já tenho bastante material... é tudo muito bem cuidadinho né, cada um tem sua hora. E- E qual é mesmo o nome e o seu papel naquela associação que trata da questão das terras indígenas? R8- É Associação Indígena Borari do Baixo Tapajós. Nós temos... nós temos uma direção indígena que é o Cacique, o primeiro e o segundo Tuchauá... e o Pajé. E nós temos a associação... o próprio movimento criou a associação na forma jurídica né, que tem presidente, tesoureiro, secretário ne, e dentro dessa diretoria eu sou a Diretora Cultural e de Assuntos Comunitários. Esse é meu trabalho lá. E- Então ta bem Dona Neca. Podemos então começar com as fotografias que a senhora escolheu pra agente conversar? A primeira foto que a senhora separou... Nesssa foto 1 Dona Neca, a senhora pode descrever pra mim o que é, onde é, que situação? Detalhes que a senhora puder dar sobre a foto... Fale um pouquinho sobre ela. R8- Essa foto é de quem vem de Santarém pra praia, na margem do rio Tapajós né, quando você chega a Alter do Chão. Essa é a Ponta do Cururu. Ela é uma ponta muito, é... é uma praia muito, muito… desrespeitada pelos jipeiros, que agente chama.... agente chama aqui jipeiros ne, quando eles fazem as viagens deles, as aventuras deles, deixa muito, muito destruído né, e eu sou uma pessoa que não concordo com isso... eu não concordo porque destrói muito... eu não entendo porque, não tem uma estrada ne? não foram abençoados com asfalto ne? Porque vem pela praia? Né? Eu acho isso uma falta de respeito, eu nao concordo, essa praia, ela não era assim... ela era uma praia bem bonita né... bem... o vento cuidava dela né!? Ela vai a areia tudo... aí dá o vento e ela vai se ajeitando né... a própria natureza, ela cuida dela, mas só que olha da maneira que ta né. Essa foto aqui... essa foto aqui, se eu não me engano, eu tenho marcado aqui atrás, ela é de 2000... essa foto aqui ela já é de 2001, 2001 é! E- E ainda passam esses carros aí? R8- Passa. Esse ano eles tão... eles tão fazendo a mesma coisa que eles sempre fizeram... Essa época agora já ta enchendo então já não vai mais passar... porque a água já não deixa tanto espaço né... mas agora que o verão foi bem forte, eles tão fazendo direto, ne mana. Ninguém não consegue fazer eles parar... essa foto aqui na verdade não é o Cururu... é a Ponta do Tauá. Aqui ta o Cururu, mas essa aqui é a Ponta do Tauá. Entre Alter do Chão e o Cururu... Essa aqui é essa ponta... ela forma pra cá né. Aqui tu dobra aqui, tu vai fazer assim já pro Cururu... Eles deixaram essa praia desse jeito. Nós já fizemos assim, varias coisas pra impedir, mas… é muito difícil né, logo que são pessoas que tem um poder ne, maior ne, ai fica difícil... Nos já jogamos pedras aqui na passagem deles... já fomos... nós já... porque por aqui tem um atalho também né, quando fecha o atalho não dá pra passar muitas vezes por aqui... nós já fizemos mas não conseguimos... já colocamos tábua com prego nas praias mas não conseguimos... E assim, essa luta até hoje ela continua… e eu não concordo com isso, acho uma falta de respeito, muita falta de respeito com a natureza assim, né. E- E porque a senhora acho importante escolher essa foto? Discutir ela aqui? R8 – eu acho importante porque nós trabalhamos na questão da defesa da terra né, um movimento indígena e de luta pela defesa da terra né, e pra mim ela ta bem clara né... sobre essa questão da praia... nós não vamos querer essa praia né, você não vai querer essa praia né... nessa praia eu não quero tar e nem quero meus filhos, nem meus netos, e nem o povo de Alter do Chão e nem quem vem pra cá, eu não quero oferecer aqui em Alter do Chão uma praia dessas... essa não é a nossa praia né... não é isso que eu quero mostrar não... As pessoas tem que vir pra ver uma coisa bonita, mas essas pessoas não entendem assim... E- Quais são as coisas que aparecem nessa foto que mais chamam a atenção da senhora? Quais são esses elementos? Que pode ser positiva ou negativamente.

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R8- Isso aqui, antes essa praia, era muito bem arrumadinha, muito limpinha, não tinha nada disso aqui... aqui eu vendia... os navios ficam aqui e aqui nós fazíamos a nossa exposição... hoje ela não agrada mais... dos navios que passavam aqui, de turistas, que agente vende bem o artesanato, eles não ficam mais aqui que a praia não é mais saudável e isso me chama atenção... Porque em 80 e... em 79, 80 isso aqui era uma beleza... tu podia ta aqui, não tinha... eles chamam de praia, praia deserta do Cururu né, era conhecida no roteiro turístico. Hoje tu ta aqui, os turistas já não querem mais ta aqui, porque a praia já não agrada, né... e, de repente nós tamo lá com mil turistas e passa esse jipe lá, o que eles vão dizer ne? até a agência vai se comprometer ne, porque ela ofereceu… mentiu na propaganda dela ne… então isso me chama a atenção… essa… esse rastro que o carro deixa… me chama muita atenção isso daí , depois, vai ficando assim, aí na época do inverno, a lama, a água... vai descer direto aqui né... aí não tem mais como... isso fica muito feio, muito sujo... e essa água suja vai escorrer pra cá, e aí não vai prestar também... ele vem destruindo com tudo, quando os carros passam eles vem destruindo com tudo. E outra coisa, daqui, saem tartaruguinhas, tracajazinho ne… e se eles passam em cima de uma ninhada de ovos? Tudo... ele vem destruindo tudo... que me chama atenção nesses rastros é que ele vem destruindo tudo, são rastros de destruição e eu não concordo. Não concordo mesmo! E- Então Dona Neca, a senhora pode ver a próxima foto enquanto eu fotografo essa aí? Então Dona Neca, descreva pra mim a sua foto dois. O que é? Onde é? Quando? E também por que a senhora achou importante discutir essa foto? R8- Essa área aqui, ela ta entra a área do Lago do Jacundá, da margem do Lago do Jacundá, até a Serra do Muiracaiçara que agente chama, é um nome indígena ne, Muiracaiçara. Essa área aqui pra nós, como eu lhe falei, ela é considerada uma área sagrada... Aqui era que os Boraris, eles… eles fortificavam a aldeia deles, quando vinham os ataques dos outros ne, do inimigo, eles ficavam aqui nessa área... Quando você vara lá no Cururu, você enxerga isso aqui. Então os inimigos vinham atacar aqui, só que eles tavam escondidos pra cá, era uma estratégia... eles montavam uma aldeia pra dizer que eles tavam lá... então agente nunca quis tocar nessa terra aqui, ela era todo o tempo guardadinha ali, entendeu, a invasão daquele cidadão que eu te comentei ainda agora também, ele que fez isso aqui... tudo que agente tinha ali, que agente tinha casa de forno, tirava mel de abelha... remédio... daqui tudo agente tirava ne, remédio é a planta medicinal né... pra fazer o nosso remédio agente tirava daqui. Ele destruiu tudo, tudinho... tudo o que era nosso ele acabou... E- A senhora pode só repetir como foi a coisa da invasão só pra incluir isso na parte gravada da entrevista? R8- Foi em março de 97. Ele foi, ele foi colocado no setor de terras da prefeitura. E ele apresentou um documento, ele alegou… ele alegava pragente o seguinte: que ele trabalhou com um cidadão que comprou uma área pra lá do Muretá. Depois do Muretá não tem uma ponta depois, pois é o Caxambú aquela área, que ele comprou essa terra lá... Tinha um senhor aqui em Alter do Chão de nome Nilo Colares, ele trabalhava lá... esse Nilo Colares vendeu pra ele 400 de frente por 400 de fundo... vendeu pra ele... segundo ele, ele trabalhou em Manaus com o homem que comprou desse, desse Nilo Colares... e pra indenização dele, ele deu pra ele esse terreno de Alter do Chão. Só que ele pegou este documento, ele aumentou, colocou um zero lá... ficou 4 mil por 4 mil. Que deu até no campo do cemitério, tudo, 4 mil… Alter do Chão tem 6 mil e 500 por 6 mil e 500... Então assim todos nós estaríamos dentro da terra dele. Foi aí que começou a luta né... E essa área aí, é uma área pra nós... e ele achou de ficar justamente nesta área. Aqui tudo que tu imagina, ele fez... tudo que tu pode imaginar ele fez aqui... agente vinha lutando, lutando, desde 97... começava aquelas famílias, aí vinham pra cá... como que tu sabes esses movimento... quando começa aí vai e fraqueja né, Aí ficava aquela turminha, eu, Dona Ana... uns onze... nós nunca largamos. Quando já foi em 2000... em 2003, dia 28 de junho de 2003, ele… nós tivemos um confronto com ele mesmo né, saiu um rapaz nosso baleado... nós ficamos duas horas na mira dos capangas dele, conseguimos

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chamar a polícia, e tal.. ta, isso foi em junho, a prefeitura tava inaugurando esse colégio aí... ta que eu sei que foi um dia de sufoco. Nisso aí o pessoal ficou meio desestimulado, com medo né, porque já tava confrontando nós com, com... com os pistoleiros dele né... aí nós paramos um pouco... mas como resolver essa situação? Eu tenho uma Mundurucu que trabalha de vez em quando aqui comigo, aí chegou uma antropóloga aqui... ela é de Brasília, e essa Mundurucu me convidou pra nós ir falar com ela da questão dessa terra aqui, tratar dessa situação aqui... essa conversa com essa antropóloga, ela começou era por volta das sete da noite acabou era três da madrugada. E ela contou, disse pra nós, como seria possível… só se nós resgatasse a nossa identidade, nós se identificasse... e ela conhecia a história dos Borari, que esse povo existe, que tem uma terra e que é muito bonita... e começou a contar pra nos aquilo que ninguém sabia, que não era conhecedor do nosso direito ne, como podia... aí que começou a questão indígena... isso foi dia 23... dia 27 de setembro quando nós conversamos com ela, quando foi dia 30 foi feito o nosso reconhecimento... então muito rápido, aí nós já entramos na questão indígena... ai agente já tem um pouco da nossa história porque aí agente se interessou mesmo, em zelar pela nossa cultura, e aí nos interessamos mais de saber sobre nós né, saber nossas raízes... e já a luta só sossegou quando passou pra cá já, ele parou de vender, a polícia parou de nos perseguir, ele deixou de nos perseguir – ele trabalhava com a polícia também, com a polícia civil... e melhorou muito pra nós, deu assim... nós tivemos uma luz né, pragente buscar dentro do nosso direito né, a partir que tu te reconheceu, tu tem que ser amparado pela lei ne, e é melhor, porque é mais força pra ti andar né… e hoje agente ainda luta, nós tamo esperando... vamos mexer nessa questão de novo e eu creio que nós vamos conseguir essa terra de volta... justamente pra isso acontecer lá ne, porque já tem a Praça do Sairé né, e nós temos o Festival Borari que acontece em julho, temos o Dia do Índio... então, nós temos que ter tudo na mão... nós não podemos fazer um ritual desse no ar, sem... assim ninguém consegue se segurar... nós temos que lutar por essa terra sagrada... que eu não quero que ela seja queimada como ele fez aqui. Só que a natureza com certeza se nós deixarmos ela natural, ela vai devolver... vai demorar, mas ela vai devolver, pra que isso aconteça mais lá. E- E que elementos a senhora destacaria nessa foto? Que coisas chamam atenção? R8- O fogo... ele queimar... porque isso tudo, isso tudo era... você conhece aqui a... a savana né? Ela é uma planta que ela é bem rala ne, ela é bem rala... então ele ainda queimou!?? Eu não gosto... eu gosto do fogo mas não nesse sentido aqui... não assim porque ele destrói né... ele é bonito ne, quando ele ta assim... todos os elementos podem destruir se usar errado... e ele parece que ainda vem mais forte ne e ele destrói mesmo... ele juntava todinho assim e nesses coisa, tinha madeira de casa, tinha de poço artesiano, e ele juntava tudinho pra queimar... então me chama a atenção... a foto que eu queria te mostrar eu não tenho aqui... foi um recado que ele deixou pra nós lá, essa foto tá lá na... no Ministério Público... é que ele deixou a cruz e os cartuchos aqui embaixo tudinho... derrubou uma casa de forno, uma casa de farinha e deixou lá pra nós né, então o que me chamou muita atenção é ele tacar fogo né... e ela é tão bonita essa área... no inverno ela é linda que ela fica bem cheinha mesmo, e ele fez isso aqui. E- Então vamos pra próxima? A senhora pega a próxima foto enquanto eu fotografo essa? De novo, Dona Neca, na sua Terceira foto eu gostaria que a senhora descrevesse pra mim o que é, qual a situação, onde é... E- Isso aqui acontece no Festival Borari, um ritual dos índios né, a questão cultural aqui... todos os anos nós fazemos o Festival Borari, são três dias e essa aqui é a questão da abertura que é mais importante pra nós... Isso aqui é um ritual que ta agradecendo aqui o alimento, nós agradecemos o alimento, com a dança, com o fogo, com a água né, tudo que nós colhemos durante aquele ano, agente agradece no Festival Borari, na abertura... nós fazemos a partilha, fazemos o ritual da fartura... lá nós temos a farinha, nós temos o tarubá, temos as frutas, temos raízes... tudo de alimento, né, as bebidas... são tudo levado pra cá...

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Aqui nós agradecemos a natureza por tudo que ela deu, à fartura que ela deu, que ela nos alimentou durante o ano... porque pra nós a terra é nossa mãe, tudo vem dela né, então sem ela nós não podemos viver... e é ela que nos alimenta, é nela que nós pisamos pra viver... então aqui nós fazemos o ritual de agradecimento e toda essa alimentação que agente faz aí ainda é seguido do ritual da partilha... todos que tão na praça, não importa quantos sejam, ainda que seja um pedacinho, mas todos tem que comer né... nós repartimos com todos, agradecemos e repartimos com todos. Esse acontece aqui, na praça de baixo, só que agora, com a questão da construção, agente ta fazendo lá em cima na praça do Sairé... mas a nossa vontade é fazer aqui... é por isso que é a luta, pra isso tudo vim pra cá, né... por causa disso, tem que vim pra cá essa festa... essa é nossa terra sagrada, por isso nós queremos ela de volta... Por isso que eu gosto muito... O que me destaca aqui é a questão do fogo, né... que aqui eles vão levando tudo né, vão levando água, vão levando o fogo, o vento ta com certeza presente nessa hora ne, e a terra. E– E por que a senhora achou importante conversar sobre essa foto, sobre essa imagem? R8- Ahh porque eu gosto do ritual. Eu gosto de agradecer né, tudo que a terra dá pra nós né... é muito importante esse momento pra nós... que você come 365 dias e muitas das vezes não agradece né... e essa é uma hora pra quem não agradeceu esses dias, agradecer... e eu gosto muito do ritual indígena, ele contagia muito, ele... fica bem pra cima também... porque aqui tu vai fazer o agradecimento, a água... quando tu toca na água... tu vais ver, quando tu vier um dia tu vai participar desse ritual... tu... tu... primeiro, antes de começar aqui, tu lava tuas mãos, teu rosto na água perfumada de raízes, que é o banho que agente chama o banho da cabeceira... com raízes aromáticas né, aí aquela água fica bem cheirosa, toda perfumada... aí tu entra pro ritual... tu toma o teu tarubá, tu come o teu peixe... tudo tem lá, o peixe... tudo tem lá... tu come bem... tu te prepara né. E ele acontece hoje de verdade, porque antes ele tava muito na questão folclórica, né, que é só uma apresentação muito rápida... hoje nós fazemos de verdade... nós voltamos lá atrás, e nós conseguimos... tinha dois... nós conseguimos resgatar dois rituais: o da fartura né, que acompanha o do agradecimento, e o da... e o banho, que é a questão da cura né.. que tem um banho de ervas que pode curar muita coisa, tem o chá... Na primeira quinzena de julho. E- Se não tiver mais nada pra acrescentar nessa, pode ver a outra, a próxima. R8- Eu queria falar essa aqui que é sobre a questão do turismo... do folclore e do turismo... que agente recebe os turistas, aqui... fazemos nossas apresentações e como nós, como nós convivemos com eles né. Elas tão apagadas já, né… Olha, é mais ou menos isso aqui, como agente brinca com eles, como agente deve... olha como eles tão aqui... essa foto é bem antiga... E- Ta, descreva então essa pra mim. R8- Essa aqui, é a questão do folclore né, da comunidade né... Então o nosso folclore ele é muito importante, e ele também, ele gera uma renda, porque agente faz apresentações no Sairé, no Borari também né, alguns grupos se apresentam e este folclore, as nossas danças, elas são levadas... elas são levadas até o turista internacional, nessas apresentações. Ó, esse daqui é no Sairé… e agente faz as apresentações de folclore e chega até aqui... por isso que eu acho que em Alter do Chão, tudo depende do turismo pra sobreviver... mas tu precisas zelar por esse lugar em todos os sentidos, pela terra, pelas tradições ne... Senão, como que nós vamos viver aqui? Isso é… isso é o nosso ouro! É... então isso aqui, o folclore que tem em julho e em setembro no Sairé, ele chega aqui também. Ali sempre os turistas, nós fazemos as nossas apresentações. Nós começamos com a apresentação da cabocla, cabocla Borari né, com o boto... e aí no final da festa, o que mais me chama atenção depois da nossa apresentação, é quando agente... eles se envolvem com agente, na questão de dançar sabe... pode chamar eles pra festa. Aqui eles tão dançando ritmo de carimbó, mas tá muito lento né, porque tão dançando com eles, porque eles já são na

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maioria idosos né, agente tem que ser muito rápido com eles pra eles não se cansarem, mas eles dançam... eles gostam muito de... E- E por que a senhora achou importante incluir essa imagem? R8- tu sabes por que eu acho importante? Eu acho assim, que... eu vejo como que nós conseguimos chegar e... né, de tão longe, tu conseguir te envolver com eles na hora da dança... eu fico olhando quando os meninos tão dançando, eles chamam os turistas pra dançar... você ganha, eles ganham o troquinho deles, os rapazes, as mocinhas, eles ganham... através da dança né... é... é... um momento de alegria com o turista, e eu creio que o turista, ele... é.... nós... é a nossa mercadoria... se nós não cuidar bem deles né, e o que me chama muita atenção nessas apresentações é isso, o contato deles... e olhe, eu te digo mesmo, que esse contato... esses grupos assim, não só de fora, brasileiros também claro, é eles que mantém o nosso grupo. Porque eles que vem, eles pagam pra nós um valor né, através da agência ou deles mesmos... esse ano nós recebemos dois grupos que veio diretamente da empresa do navio, que veio o presente dos meninos... agente já ta trabalhando com eles já faz cinco anos né... então as crianças, eles se envolvem muito bem com eles... é muito rápido que eles... eles acham triste quando vão embora né, na hora de eles irem embora, que é tão rápido aquele momento com eles né... aí com o decorrer do ano agente recebe fotos né, recebe carta, cartão que eles mandam, e isso me chama muita atenção na foto... é muito rápido que agente fica com eles, é rápido mesmo, mas é tão bom né... tu te diverte... tu trabalha te divertindo né, conhecendo pessoas né... eles trabalham, se divertindo com eles, brincando, e ganhando né... ganhando aquela amizade, ganhando com certeza algum troco que já ajuda com certeza na renda familiar, né... e isso me chama muita atenção. E eles, eles são muito bem tratados… as crianças são muito bem tratados por eles e agente procura tratar bem eles também né… Tem certas coisas também que não me agrada da hora que o turista ta aqui né, que ta errado né. E- Agora então, veja enfim qual é a sua quinta foto. R8- Eu quero achar uma foto aqui da questão aí da frente da Vila né... Bora ver se eu acho né. Eu acho que eu tenho uma aqui... olha! Acho que tem uma outra mais no final... Que tava mais... eu não tenho nada contra essa obra. E- Então Dona Neca, descreva de novo pra mim essa foto, me diga por que a senhora achou importante conversar sobre ela... R8- eu vou falar agora sobre a questão da frente da Vila onde ta a orla né. Eu acho assim, eu não tenho nada contra eles virem arrumar né, mas na minha opinião ela devia ser arrumada com mais cuidado... eu vejo assim, por exemplo, aqui eu não concordava com esse asfalto aqui... por que não uma outra coisa? Eu acho que é muito agressivo né... eu não gosto muito não... aqui eu creio que não era pra eles terem tirado isso daqui era pra deixar como tava... eu acho que ela veio muito, muito forte pra... eu acho que essa orla, na minha opinião, ela não combina muito com Alter do Chão né… devia ter mais… como eu quero dizer… mais rústica, é! é, eu acho que ela devia ser mais rústica, assim, mais... eu acho que tem muito concreto aí, muita coisa que não era pra ser assim né, era pra ser mais delicada né... não tenho nada contra como ela tá, mas eu acho que devia ser melhor... e o que me chama atenção é que... é que não combina com Alter do Chão como ela tá, não combina com Alter do Chão, deveria ser mais... engraçado... pra mim os bancos, por exemplo, eu vejo igual uma grelha... de uma churrasqueira (risos)... eu acho que de madeira ficava mais bonito né... não tem tanta madeira que cortam e prendem? Por que não trouxeram pra fazer banco pra nós? né, tudo de madeira, não ficava… nós tamos no meio da Amazônia, por que nós tamo usando ferro? Por que nós não usamos madeira? Tanto rolo de madeira que prendem, que prendem, que prendem… por que não trouxeram pra arrumar Alter do Chão? Não ta muito combinando não e eu não concordo... eu... a primeira pracinha que tava, ela até tava engraçadinha, mas agora não me agrada não... eu não gosto da praça, eu não gosto da praça... era mais bonitinha aquela nossa né, eu acho... era mais engraçadinha né... se bem que

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a nossa primeira praça é que era bonitinha né... essa já vem ser pra nós a quinta praça... e ela não é bonita, mas a primeira era muito bonitinha né... ela era só mesmo na frente da igreja... era pequena mas ela tinha uns banquinhos, ela tinha umas pedras assim, era tipo umas pedras assim comprida, toda cheia de jardim... o coretinho lá em cima pra brincar da pira, lá em cima né... o jardim era tão bonitinho... dentro era chão mesmo, era terra mesmo, não era piso, não era cimento... mas agora tem hora que eu me envergonho dessa praça, o que já teve de gente... teve colega meu que veio aqui que viu a praça, como é que... “por que que fizeram isso?? Ta muito feio!!...” E eu que fico com vergonha né, porque não fiz nada pra não fazerem… será que um dia nós vamos conseguir mudar? Mas como? Né... mas também se já mudou cinco vezes, pra muda sei não custa né, pra prestar... Pois é... eu não concordo com essa orla não... eu queria que... antes não me agradava, mas agora é que não me agrada... eu queria que ela fosse mais rústica. E- Agente ta falando um pouco de mudanças aqui né, então será que a senhora poderia falar pra mim um pouquinho de como a senhora percebe da estrada pra hoje, tipo 20 anos atrás, antes do asfaltamento pra hoje. O que mudou na Vila? E, na sua opinião, o que é ponto positivo e o que é ponto negativo disso? R8- Ahhh mas... Olha, mudou muito, um ponto positivo na questão financeira... antes era mais difícil pra nós sem a estrada. O acesso pra Santarém era muito difícil, eu tinha que sair daqui 1 hora da tarde de segunda-feira, de barco, e chegar pra cá terça-feira de madrugada pra amanhecer quarta já... quer dizer quarta já, pra amanhecer quarta-feira... e eu tinha que levar pra Santarém o que? Cernambi, a borracha né, leva o cumarú, levar o jutaicica, tudo pra vender... porque aqui não tinha nada... turismo nunca, não sabia nem o que era turismo né... era isolado pra cá né... desde que abriu a estrada, aí começou né... mesmo o artesanato já tinha os... os... já tinha descoberto dentro deles que ele sabiam trabalhar com... aproveitar a natureza morta, fazer seus arranjos, pra vender, transformar em artesanato né. Mas não tinha assim uma boa escoação né, até mesmo pra ti transportar não tinha como né. A estrada ela trouxe isso pra nós, o acesso mais rápido pra Santarém, a facilidade das nossas crianças estudarem, irem pra lá né... hoje eu vou em Santarém, eu saio daqui 15 pras 6 quando é 8 horas eu já to em casa de volta, né... ela beneficiou o turista chegar até aqui agora né... então, só que eu acho assim que abriu a estrada, e foi tudo muito rápido... nós não tavamos preparados, entendeu, agente não tava preparado... agente foi aprendendo assim... eu posso falar o português claro? Nós fomos aprendendo na porrada as coisas, porque muito embora os órgãos eles procuravam nos ajudar, mas agente ainda era muito leigo na coisa né, “como que Meu Deus!?? O que é que nós vamos fazer com esse pessoal né?” eles vinham pra cá e ninguém sabia como explorar o local né, agente ainda não ta nem muito bem arrumado até hoje, tu imagina como era naquela época né, as crianças é que carregavam eles pra cá… não tinha catraia, as crianças mesmo que colocavam eles na canoa, e qualquer canoa, eles vinham trazendo... eles remavam às vezes com tábua, com pedaço de pau, e eles vinham trazendo... assim era... mas eles já ganhavam, né, eles já viam que ia dar, entendeu. Aí que começaram então a se organizar... nesta parte foi muito bom, porque meu filho pode estudar na cidade, eu pude ganhar mais, melhorou um pouco né. Mas por um outro lado, a invasão da terra né... a construção civil, ela veio assim com tudo né, e tudo assim... creio que tu conheces que é raro o lugar bonito que é... é... a sobrevivência é o turismo, que um nativo não dá o lugar dele prum outro... eu pego corda com isso daí. Eu acho muito bonito o Laudeco, a família do Laudeco, a família da Neila, a família da minha mãe, a Mônica, sabe... o Seu Heitor... eles seguraram sabe, eles seguraram a onda ali no lugar deles, não saíram né... eles tão aí, tão na beira do rio... tão no lado do muro, tão pegando, mas eles tão lá... acredito que pelo menos cinqüenta por cento devia fazer isso... mas não, sabe, ele foi vendendo o que ele tinha aí hoje ela ta muito longe... pra mim isso foi muito negativo né, e aí foram destruindo né... e volta lá na questão da terra... foi destruindo... foram derrubando as árvores, foram

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construindo os muros, as casas grandes... e o nativo ele foi se espremendo, né... eu acho que por um lado foi muito bom... mas tudo é assim né, o progresso ele traz sua vantagem e sua desvantagem né... então nós temos que se acostumar assim agora né, mas não deixar de lutar, porque hoje tá assim, ta... mas existe uma pequena esperança, existe. Por que? Se eu ainda lutar, pra deixar pra alguém que saiba lutar e que vença que deixe pra outro assim mais na frente, ainda é muita coisa... tu já imaginou tu olhar prali e ver prédio ali na frente? Eu não fico mais aqui... eu não fico mais aqui porque eu não quero viver num lugar assim... é por isso que eu luto, é por isso que eu brigo, porque eu tô lutando por um lugar que não existe em lugar nenhum... eu digo muito pros meus filhos que não tem nenhum lugar igual a esse... não tem lugar nenhum... tu já ouviu falar de outro igual? Não tem. É esse daqui. E se nós não zelar? Quem vais zelar? né, quem vai zelar? Eu acho que o progresso traz isso também, o lixo, porque Alter do Chão, o residente, o turista, o morador nem todos é consciente desse lixo… tem horas que me aborrece. Agora eu fiz uma reunião com meus vizinhos, por causa disso, “gente umbora cuidar da nossa rua!”, “umbora demonstrar, será que os outros não vão ver e vão fazer?”, o lixo na rua né... o governo, tem coisas que ele faz, tem coisas que ele não faz... mas quando ele faz às vezes o povo não sabe ajudar... Alter do Chão não tem que se queixar hoje, nem do governo anterior nem desse agora, o que eu falo que essa política... mas não tem que se queixar que o carro do lixo não entra aqui... eu não sei pra onde ele ta levando, mas que segunda, quarta e sexta tem carro de lixo aqui... por que que o povo não separa o seu lixo? Aqui na praia mesmo agente não consegue separar? O resto da comida, o vidro, o descartável… por que lá a comunidade do outro lado não faz? Porque eu fico olhando e fico com muita vergonha aqui na praia... tem uma japonesa rodando aqui... eu já passei duas vergonhas com essa japonesa, eu não quero mais olhar pra ela... uma coisa eu não concordei com ela, que a água é suja, e ela não gostou... eu não concordei... ta, mas dela falar do lixo ela tem razão. E ela veio pedir pra ir no banheiro aqui na praia, e agora? Heim? E ela não é a primeira... então nesse lado o governo é culpado. Por que Alter do Chão em todo o lugar é a praia, é ou não é? Ela não é a primeira aqui que aparece... quando fala em praia... falam: olha a enxerida já ta lá, me chamam de enxerida... por que não tratam de trabalhar num banheiro pra cá? Um banheiro pra sete meses, porque não tem o que fazer que isso aqui vai pro fundo, né, vai pra dentro d’água né, não pode... por que? Que quem passa vergonha aqui é nós, aqui na praia... A nossa luta aqui na praia é por causa da água, que nós temos que carregar de lá pra cá, e o banheiro é emergência isso aqui... então eu acho que assim, ela é bonita, ela era mais bonita, mas ela, o progresso, ela não se preparou pra receber... ela não se preparou, ela não foi preparada... é por isso que eu vejo ela assim muito sufocada, tentando sair de uma situação difícil... ela não foi preparada em nada... ela foi transformada nesse lado aí, era pra ter feito tudo direitinho não é? Tudo arrumadinho... pra poder... a minha mãe que dizia que tinha que primeiro cuidar dela pra depois abrir a estrada e não abrir a estrada pra depois cuidar dela... né? Porque ficou... mas mudou muito... agora uma coisa ainda acho que a comunidade ainda consegue segurar, é a questão do sossego, porque de segunda à sexta ainda é calmo né... se tu anda aí na rua tu vê pouca gente andando... movimento geralmente é final de semana não é? Tu ainda consegue dormir sossegado... eu acho que... e é por isso que nós não queremos energia aqui, na “Ilha”, porque se tu por energia, vão querer colocar um som aqui... o vizinho vai chegar e vai querer colocar o som dele e eu não vou poder dizer que não, a minha vizinha vai querer botar o som dela mais alto que o meu, que vai querer botar mais alto que do outro... e sabe lá dali onde agente vai parar... e no inverno, a fiação vai ficar toda dentro d’água, é arriscado né... Deus o livre! Então agora ainda não é pra trazer... enquanto nós tiver aqui, ninguém não vai deixar. E- Na sua opinião, onde é que acontece o lazer da população da Vila? Das famílias, das crianças… onde elas brincam, passeiam, descansam? R8- Olha, primeiro é a praia né, é a água e a praia... até agente trabalha se divertindo... é tão bom assim... Mas tem a praça do Sairé né, que as crianças vão muito pra lá, os idosos que

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vão né... brincam de bola e fazem os jogos das crianças... e depois a escola né, agente vai pra escola, as crianças tão lá brincando... quando não tão lá vão pra quadra, ou vão pra dentro d’água... ali os idosos, os jovens... também vão fazer sua ginástica, sua natação né... que vem fazer suas brincadeiras pra cá... Eu vejo então assim, as praças, por isso que eu acho que as praças deviam ser mais... e a quadra também ali pra terminar né, porque agente não tem uma quadra boa... tu já imaginou? Então, com uma quadra bem feita assim… mas poxa vida! E- E do ponto de vista de monumento. Agente sabe que aqui não tem assim nenhum monumento propriamente dito. Tem alguma coisa na Vila que a senhora ache que tem essa, essa força de monumento, de memória, de... de lembrar as pessoas de alguma coisa? R8- Eu acho que tem... eu acho que tem sim, é a Serra Piroca. Com a cruz né… que a cruz lembra a passagem dos padres que catequizaram né... é... pra mim é a cruz... é a Serra com a cruz. E- Legal! E por último, Dona Neca, na sua opinião, qual é a coisa que é a cara de Alter do Chão? vista, construção, paisagem, lugar... seja o que for que na sua opinião, pensou em Alter do Chão, lembrou tal coisa? R8- Mas é a praia... é a “Ilha” né. E do nativo... é... é a praia né... pra ele tudo é a praia né. Porque Alter do Chão com suas casinhas já tá bem pouco né. Que era a cara do pessoal daqui né, casinha de barro e tal… e tão se acabando tudo né. E- Então fale um pouquinho dessas mudanças aí também, das casinhas. R8- Olha, isso veio na questão da construção civil... por isso que eu te digo que foi muito rápido, o pessoal não tavam preparado… quando ele viu a casa do outro bonita, ele também quis fazer a dele, mas como? Eu converso muito assim com o Laudeco, sabe… o… o caboclo ele se virou né, trabalhou pro outro, conseguiu fazer... conseguiu começar a casinha dele, mas ele não conseguiu terminar, né... não conseguiu colocar um móvel mais bonito lá dentro né... eu acho que ele perdeu a identidade dele nisso daí né, uma parte né, da identidade dele, eu pensava assim, eu queria poder fazer a casa deles tudinho, eu fazia a casa deles lá atrás... eles queriam de alvenaria? Ta... morar entre tijolo? tá, ta certo... mas eles deviam se identificar com sua maloca na frente de sua casa né, ficava muito bonito pra nós se identificar né... é uma forma de resistência, pra não perder assim... mas eu acho assim que eles perderam um pouco né... tudo bem que agente quer, que agente quer viver melhor né, quem não quer né? Mas eles também não tavam preparados pra fazer... tiveram muitas vezes que dispor da própria terra de onde ele sobrevivia pra ter uma casinha melhor né. Outra coisa que eu acho que tem muita ajuda essa coisa das crianças estudarem, foi uma coisa que com o progresso mudou muito... hoje nós temos o ensino médio né, nós temos aqui o ensino médio né... nossos rapazes, nossos filhos conseguiram se formar né, já tem alguns formados aqui de Alter do Chão, na biologia, engenheiros, médicos né, e isso foi muito bom com o progresso né, porque abriu assim uma porta... é a tal coisa que prum lado vem bom, prum lado... tu vai ver se asfaltar a Santarém-Cuiabá... isso aqui vai ser um fole né, que vai vim coisa de tudo o lado né, é isso que eu me preocupo com isso daqui... eu ainda queria que essa demarcação de terra, esse estudo preliminar, quando esse estudo preliminar acontecesse logo, agente conseguia ter pelo menos um portão... lá onde termina a nossa terra... pragente ter um controle né, como era lá em Belterra né, quem passava você vê que tava lá pra dentro, dava pra saber se já tinha saído ou não... e aqui era muito bom pra nós né... porque isso aqui vai ser, vai ser difícil segurar né... e com a questão do progresso também, as comunidades vizinhas do Tapajós, da margem do Rio Tapajós e do Rio Arapiuns, eles imigraram muito pra cá... que facilitou pros filhos estudarem, é mais seguro do que deixar em Santarém... é mais fácil, atravessa de canoa de lá né, pode atravessar e vim estudar... Eu acho que na questão educacional facilitou muito, eu acho que foi a questão número um... E- Então Dona Neca, é isso aí. Muito obrigada.

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ANC - Ancoragem

Residente da Vila. Artesã e envolvida com a questões culturais, fundiárias e indígenas da Vila e da população local. Proprietária de um pequena infra-estrutura em atendimento turístico na praia da “Ilha”.

ECH – Expressões-Chave (Negrito)

- gosto muito né, defender a cultura do povo Borari, e a atividade essa de defender Alter do Chão né, correr pra praia que tem que defender né, pra terra, pra cultura... e tudo aquilo que agente tem direito né - hoje tu ta aqui na praia, daqui em março agente já ta saindo daqui, já ta em outra atividade né, vai trabalhar com artesanato... vai colher material, ou com o que eu já colhi, eu já vou trabalhar... pra armazenar pra quando o navio começar, eu já tenho bastante material... -Essa é a Ponta do Cururu. Ela é uma ponta muito, é... é uma praia muito, muito… desrespeitada pelos jipeiros, que agente chama.... agente chama aqui jipeiros ne, quando eles fazem as viagens deles, as aventuras deles, deixa muito, muito destruído né, e eu sou uma pessoa que não concordo com isso - ela não era assim... ela era uma praia bem bonita né... bem... o vento cuidava dela né!? Ela vai a areia tudo... aí dá o vento e ela vai se ajeitando né... a própria natureza, ela cuida dela, mas só que olha da maneira que ta né - Eles deixaram essa praia desse jeito. Nós já fizemos assim, varias coisas pra impedir, mas… é muito difícil né, logo que são pessoas que tem um poder ne, maior ne, ai fica difícil - eu acho importante porque nós trabalhamos na questão da defesa da terra né, um movimento indígena (...) nessa praia eu não quero tar e nem quero meus filhos, nem meus netos, e nem o povo de Alter do Chão e nem quem vem pra cá, eu não quero oferecer aqui em Alter do Chão uma praia dessas... essa não é a nossa praia né - Isso aqui, antes essa praia, era muito bem arrumadinha, muito limpinha, não tinha nada disso aqui... aqui eu vendia... os navios ficam aqui e aqui nós fazíamos a nossa exposição... hoje ela não agrada mais... - Tudo... ele vem destruindo tudo... que me chama atenção nesses rastros é que ele vem destruindo tudo, são rastros de destruição e eu não concordo. Não concordo mesmo! - Essa área aqui pra nós, como eu lhe falei, ela é considerada uma área sagrada - então agente nunca quis tocar nessa terra aqui, ela era todo o tempo guardadinha ali, entendeu, a invasão daquele cidadão que eu te comentei ainda agora também, ele que fez isso aqui... tudo que agente tinha ali, que agente tinha casa de forno, tirava mel de abelha... remédio... daqui tudo agente tirava ne, remédio é a planta medicinal né... pra fazer o nosso remédio agente tirava daqui. Ele destruiu tudo, tudinho... tudo o que era nosso ele acabou... - Só que ele pegou este documento, ele aumentou, colocou um zero lá... ficou 4 mil por 4 mil. Que deu até no campo do cemitério, tudo, 4 mil… Alter do Chão tem 6 mil e 500 por 6 mil e 500... Então assim todos nós estaríamos dentro da terra dele. Foi aí que começou a luta né - ai agente já tem um pouco da nossa história porque aí agente se interessou mesmo, em zelar pela nossa cultura, e aí nos interessamos mais de saber sobre nós né, saber nossas raízes... - justamente pra isso acontecer lá ne, porque já tem a Praça do Sairé né, e nós temos o Festival Borari que acontece em julho, temos o Dia do Índio... então, nós temos que ter tudo na mão... nós não podemos fazer um ritual desse no ar, sem... assim ninguém consegue se segurar... nós temos que lutar por essa terra sagrada... que eu não quero que ela seja queimada como ele fez aqui. Só que a natureza com certeza se nós deixarmos ela natural, ela vai devolver... vai demorar, mas ela vai devolver, pra que isso aconteça mais lá - Isso aqui acontece no Festival Borari, um ritual dos índios né, a questão cultural aqui (...) Isso aqui é um ritual que ta agradecendo aqui o alimento, nós agradecemos o alimento, com a dança, com o fogo, com a água né, tudo que nós

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colhemos durante aquele ano, agente agradece no Festival Borari, na abertura... nós fazemos a partilha, fazemos o ritual da fartura - todos que tão na praça, não importa quantos sejam, ainda que seja um pedacinho, mas todos tem que comer né... nós repartimos com todos, agradecemos e repartimos com todos (...) e eu gosto muito do ritual indígena, ele contagia muito, ele... fica bem pra cima também - nós conseguimos resgatar dois rituais: o da fartura né, que acompanha o do agradecimento, e o da... e o banho, que é a questão da cura né - fazemos nossas apresentações e como nós, como nós convivemos com eles (turistas) né -Então o nosso folclore ele é muito importante, e ele também, ele gera uma renda, porque agente faz apresentações no Sairé, no Borari também né, alguns grupos se apresentam e este folclore, as nossas danças, elas são levadas... elas são levadas até o turista internacional, nessas apresentações - por isso que eu acho que em Alter do Chão, tudo depende do turismo pra sobreviver... mas tu precisas zelar por esse lugar em todos os sentidos, pela terra, pelas tradições ne -tu conseguir te envolver com eles na hora da dança... eu fico olhando quando os meninos tão dançando, eles chamam os turistas pra dançar... você ganha, eles ganham o troquinho deles, os rapazes, as mocinhas, eles ganham... através da dança né... é... é... um momento de alegria com o turista -eles acham triste quando vão embora né, na hora de eles irem embora, que é tão rápido aquele momento com eles né... aí com o decorrer do ano agente recebe fotos né, recebe carta, cartão que eles mandam, e isso me chama muita atenção na foto - Eu acho assim, eu não tenho nada contra eles virem arrumar né, mas na minha opinião ela devia ser arrumada com mais cuidado... eu vejo assim, por exemplo, aqui eu não concordava com esse asfalto aqui... por que não uma outra coisa? - eu acho que essa orla, na minha opinião, ela não combina muito com Alter do Chão né… devia ter mais… como eu quero dizer… mais rústica, é! é, eu acho que ela devia ser mais rústica, assim, mais... eu acho que tem muito concreto aí, muita coisa que não era pra ser assim né, era pra ser mais delicada né - pra mim os bancos, por exemplo, eu vejo igual uma grelha... de uma churrasqueira (risos)... eu acho que de madeira ficava mais bonito né... não tem tanta madeira que cortam e prendem? Por que não trouxeram pra fazer banco pra nós? né, tudo de madeira, não ficava… nós tamos no meio da Amazônia, por que nós tamo usando ferro? - mas agora tem hora que eu me envergonho dessa praça, o que já teve de gente... teve colega meu que veio aqui que viu a praça, como é que... “por que que fizeram isso?? Ta muito feio!!...” (...) antes não me agradava, mas agora é que não me agrada... eu queria que ela fosse mais rústica - Olha, mudou muito, um ponto positivo na questão financeira... antes era mais difícil pra nós sem a estrada (...) não tinha assim uma boa escoação né, até mesmo pra ti transportar não tinha como né. A estrada ela trouxe isso pra nós, o acesso mais rápido pra Santarém, a facilidade das nossas crianças estudarem, irem pra lá né... - ela beneficiou o turista chegar até aqui agora né... então, só que eu acho assim que abriu a estrada, e foi tudo muito rápido... nós não tavamos preparados, entendeu, agente não tava preparado... agente foi aprendendo assim... - nesta parte foi muito bom, porque meu filho pode estudar na cidade, eu pude ganhar mais, melhorou um pouco né. Mas por um outro lado, a invasão da terra né... a construção civil, ela veio assim com tudo né, e tudo assim... creio que tu conheces que é raro o lugar bonito que é... é... a sobrevivência é o turismo, que um nativo não dá o lugar dele prum outro... eu pego corda com isso daí - tu já imaginou tu olhar prali e ver prédio ali na frente? Eu não fico mais aqui... eu não fico mais aqui porque eu não quero viver num lugar assim... - o lixo na rua né... o governo, tem coisas que ele faz, tem coisas que ele não faz... mas quando ele faz às vezes o povo não sabe ajudar (...) Porque eu fico olhando e

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fico com muita vergonha aqui na praia... - mas dela falar do lixo ela tem razão. E ela veio pedir pra ir no banheiro aqui na praia, e agora? Heim? E ela não é a primeira... então nesse lado o governo é culpado - então eu acho que assim, ela é bonita, ela era mais bonita, mas ela, o progresso, ela não se preparou pra receber... ela não se preparou, ela não foi preparada (...) agora uma coisa ainda acho que a comunidade ainda consegue segurar, é a questão do sossego, porque de segunda à sexta ainda é calmo né... - primeiro é a praia né, é a água e a praia... até agente trabalha se divertindo (...) Mas tem a praça do Sairé né (...) também vão fazer sua ginástica, sua natação né... que vem fazer suas brincadeiras pra cá... Eu vejo então assim, as praças, por isso que eu acho que as praças deviam ser mais... e a quadra também ali pra terminar né, porque agente não tem uma quadra boa... - eu acho que tem sim, é a Serra Piroca. Com a cruz né… - Mas é a praia... é a “Ilha” né (...). Porque Alter do Chão com suas casinhas já tá bem pouco né - quando ele viu a casa do outro bonita, ele também quis fazer a dele, mas como? (...) o caboclo ele se virou né, trabalhou pro outro, conseguiu fazer... conseguiu começar a casinha dele, mas ele não conseguiu terminar, né... - eu acho que ele perdeu a identidade dele nisso daí né, uma parte né, da identidade dele, eu pensava assim, eu queria poder fazer a casa deles tudinho, eu fazia a casa deles lá atrás... eles queriam de alvenaria? Ta... morar entre tijolo? tá, ta certo... mas eles deviam se identificar com sua maloca na frente de sua casa né, ficava muito bonito pra nós se identificar né... - tudo bem que agente quer, que agente quer viver melhor né, quem não quer né? Mas eles também não tavam preparados pra fazer... tiveram muitas vezes que dispor da própria terra de onde ele sobrevivia pra ter uma casinha melhor né. - hoje nós temos o ensino médio né, nós temos aqui o ensino médio né... nossos rapazes, nossos filhos conseguiram se formar né, já tem alguns formados aqui de Alter do Chão

ID – Idéias Centrais

- Valoriza e procura manter a cultura da Vila; - Trabalha por temporadas, conforme a época do ano, uma atividade diferente; - A destruição natural causada pelo tráfego de veículos motorizados nas praias; - As tentativas frustadas da população local em impedir esse tipo de acesso, haja visto o grande poder dos envolvidos nessas práticas; - Luta pela defesa da terra, e os casos de grilagem de Alter do Chão; - A diminuição da atratividade da praia para turistas e residentes; - Fala de uma área considerada sagrada pelas populações indígenas que habitavam a região; - Relata sobre o resgate de rituais indígenas: da partilha e da fartura onde tudo é dividido por todos; - Cita o convívio harmônico entre o residente e o turista; - Fala da importância do folclore local, citando datas como a Festa do Sairé, o Festival Borari e o Dia do Índio; - Acredita que a população local atualmente depende do turismo, que está interessado na cultura e nas tradições locais; - Vê o folclore como alegria e trabalho/geração de renda nas danças para os turistas; - Não concorda com as características da obra da orla e da praça, contra o uso do concreto e à favor da rusticidade. Faz crítica aos bancos e à praça, que deveriam ser mais rústicos; - Associa a melhoria da estrada com a melhoria dos aspectos financeiros, educacionais, de acesso e de ampliação de visitantes, entretanto, referencia a aceleração das mudanças após sua abertura e, principalmente, após seu asfaltamento; - Fala da especulação imobiliária, valorização dos lotes e saída dos nativos que se

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QUADRO 09: DSC da Entrevista Residente 8 Fonte: A autora, 2007.

mudam para a periferia da Vila e passam a tentar imitar as tipologias construtivas das casas de segunda residência; - Com a valorização dos lotes e o adensamento construtivo, refere-se à supressão da vegetação; - Demonstra insatisfação com o aumento do gabarito das construções na orla; - É consciente da necessidade de união de esforços entre a população e o Poder Público para a solução do problema do lixo; - Cita a falta de banheiros na “Ilha” como deficiência de infra-estrutura turística; - Enfatiza que apesar das mudanças, a Vila ainda mantém o seu sossego; - O lazer acontece na praia, na Praça do Sairé e na escola; - Como monumento destaca o morro da Serra da Piroca e sua cruz; - Como mais marcante, destaca a “Ilha”; - Cita que as mudanças construtivas acontecem também na casa dos nativos, agregando o entendimento da existência da vontade de viver mais confortavelmente, e as dificuldades e conseqüências financeiras disso; - Afirma que essas mudanças construtivas implicam na perda da identidade local, e sugere a utilização/manutenção de uma maloca em madeira e coberta de palha na frente das casas como forma de identificação; - Cita a oportunidade de melhoria do nível educacional da população local.

EMS - Elementos Morfológicos e Sócio-culturais

- “Ilha”, praia; - Ponta do Cururu; - Ponta do Tauá; - Área do Muiracaiçara; - Festa do Sairé, o Festival Borari, o Dia do Índio; - Morro da Serra Piroca; - Orla; - Lixo.

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APÊNDICE C

ROTEIRO PARA ENTREVISTAS ABERTAS, SEMI-ESTRUTURADAS REALIZADAS COM TURISTAS EM ALTER DO CHÃO (SANTARÉM/PA).

PARTE I - Ancoragem do entrevistado: 1. Apresentação, dados gerais do participante: nome, idade, tempo de residência na Vila, escolaridade, profissão/formação, instituição na qual trabalha, entre outros. PARTE II – Sobre as Imagens fotográficas (estas questões devem se repetir a cada imagem apresentada): 2. Descreva a imagem fotográfica apresentada/selecionada por você? Podem ser incluídas informações sobre o local, a circunstância, tempo/período, entre outros. 3. Por que você achou importante ou relevante incluir esta cena na nossa conversa? 4. Quais os principais elementos que você pode destacar nesta imagem fotográfica apresentada? PARTE III – Sobre a percepção da Vila de Alter do Chão 5. Qual a sua opinião sobre a alteração da Praça da Igreja Matriz e da orla de Alter do Chão, realizadas durante as obras do Governo do Estado? 6. Em sua opinião, qual é a obra, o lugar, a construção, a vista, a paisagem – qualquer coisa – que pra você é a mais marcante de Alter do Chão? 7. Qual a sua imagem projetada que você possuía sobre Alter do Chão antes de conhecê-la? Por quê? Qual a diferença entre essa imagem e a sua percepção atual à respeito da Vila de Alter do Chão?

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APÊNDICE D Entrevista 9 E – Entrevistador T1 – Turista entrevistado 1

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4 5 E- Sim Roman, vamos começar o comentário sobre as tuas fotos. Preferes sentar lá? Então vamos... E- Então Roman, é como eu te expliquei, a pesquisa vai partir do princípio de entender como as pessoas percebem Alter do Chão, ta, a partir dessas imagens que você já tem. A primeira parte das perguntas, são... dizem respeito a ti mesmo. E- Nome? T1- Nome Roman... E- Local de origem? T1- France E- Escolaridade ou profissão? T1- Sou tatuador... E- E no caso, tu trabalhas em alguma instituição? T1- Eu tenho uma empresa lá, com mais duas pessoas... E – Ok! Então agora sobre as fotos: Sobre essa tua foto 101, eu gostaria que tu me descrevesses a imagem. O que te chama atenção, como tu descreves a imagem que tas apresentando? T1 – Viu, quando eu vem aqui, eu gosta de tomar essas fotas, por exemplo, aqui a Ponta do Cururu, quando a água ta cheia, pra ver os pescador... e si, penso que quando eu venho aqui gosta de tirar fotos dos povres daqui, das pessoas que mora aqui... Então... é veja eles pescando, como dizer... eles não perde as tradição tá... e pescá pra comer... não é só pescá so pra brincá... ai por isso eu gosto esse tipo de foto, coloco isso em minha loja, lá na frente, pra que as pessoas vej como é ir pra outro lugar, non. E- Então, na tua opinião, qual a importância dessa foto pra ti?

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T1- humm a importância é per... guardar e mostrar que Alter do Chão é um lugar que na, em minha opinion e, tem que ficar o mais natural possível, certo, e mais pessoas tão chegando, normal né... faz pra mim mais sete anos que vim aqui, eu vejo a diferença muita grande e... E- Na tua opinião, pra melhor ou p pior? T1- eu acho que... é... minha opinion não vai mudar muitas coisas, quer dizer, é normal que um lugar bonito assi... tem tudo anho mais pessoas que cheguem, isso é normal, as pessoas gosta desse lugar. É minha opinion é que aqui é Alter do Chon, non é Santarém, non é Manaus, non é Belém... a coisa que eu acho importante que Alter do Chon fique, como assim dizer, non se bem as palavras... fica natural, fica com essas beleza tudo, no muda muito. Eu vou falar francamente, eu ver que a cidade de Santarém faz esforça pra essa irrigação, por exemplo, eu acho coisa muita boa porque precisa de irrigação, porque as rua quebra, tem buraco, é perigoso pras criança, pras pessoas daqui... só que depois eu acha que tem um jeito de arquitectura, de estrutctura que non concorda com Alter do Chon... bem coisa de ferro, sabe... a frente aqui só ferro, non sei se vai ser pintado, mas, ferra no concorda com esse água, com esse areia branca, non. E, tem que fazer as coisa ecológica... o mundo interro agorra ta, como dizer, preocupada com isso ne, e aqui a natureza é... é a principal coisa, então tem que respeitar isso. E- Q elementos tu destacarias nessa fotografia? Coisas... Coisas q aparecem ai que tu achas que são o mais importante da foto, da imagem? T1- O mais importante são os pescador daqui, que tão la nessa Ponta do Cururu, é um pouco savage, eles estão morando la e tu vês que a água ta linda, ta... com esse por-de-sol, tranqüilo pescando pra comer, mais uma vez... não estão estressado de fazer aquilo que estão fazendo, ne. Dá de ver a embarcação que tem, todo mundo tem isso aqui, todos pescador usa essas canoa aqui, colonial eu acha... E- Ta, a próxima pergunta já vai além da foto. Qual a imagem que tu tinhas de Alter do Chão de conhecer, antes de vir aqui? T1- Ahhh tahh, não há idéia... E- Como vieste parar aqui então? T1- Eu estava passeando pra Salvador de Bahia, da Guiana Francesa pra Salvador de Bahia, e na volta eu queria ver essa floresta, só que não tinha muita tempo, na volta eu encontrei um francês que queria ver aqui, só um livro, um guio francês... e mi convidou e passo cinco dias aqui... foi com ele, eu vi que era bonito, então eu voltei 3 meses depois pra passar 3 meses aqui... e eu passo três meses aqui e... foi uma descoberta então... eu gosto de pescar aqui, gostei de descobrir o Lago Verde, o Tapájos... eu comprei aqui um barquinho também, igual dos pescador, pra passear, pra ver como era aqui, aqui agente non usa de carro, mais de barco ta, é diferente, non tem muitas asfalto... a rodoviária é esse rio... E- Então tu não tinhas uma expectativa anterior, ne, porque não sabias que vinhas. Mas alguma coisa te chamou a atenção quando chegaste aqui que era diferente do que imaginavas ou igual como tu pensavas da floresta? T1- Non, non, eu conheço já a floresta lá na Guiana... uma floresta grande, mais tropical, quer dizer, que aqui mais seco, é mais saavana, mas eu goste, porque esse ritmo aqui tá interresante, as pessoas são tranqüilo, fala tranqüilo, dá tempo de conversar, non tão estressadas, é por isso que eu fiquei um pouco aqui também, pra descansar primeira vez... E- Então, vamos pra tua próxima foto? A tua foto 001? A mesma coisa, descrever a imagem... T1- Ta, essa foto representa Alter do Chon, essa foto é a imagem mais, como dizer??, eu usa essa foto pra minha loja porque ela mostra o lado, o lado bonito de Alter do Chão, ela é muita turística também. Que tu vês, a praia com a água de Alter do Chon, mia cheia e... tem a serra atrás, em esse lado o Lago Verde e nesse o Tapajós... é... essa foto representa bem, como dizer, a frente de Alter do Chão. E- E a importância dela p ti? Dessa cena?

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T1- A importância, como dizer... as fotos pra mim não tem tanta importância, pra mim é um jeito de comunicar, porque la onde eu morro ta frio e chuva, ne. Quando eu mostro essa foto dá pra outras pessoas de sonhar um pouco de é possível de ir pra outro lugar, um lugar bonito que são assim, bom... que é ao contrário, que é muito quente... é importante essa foto pra mim, pra mostrar, pra comunicar... E- E os elementos que tu podes destacar como os mais importantes nessa foto? T1- É o que disse, do lado água do Lago e o outro lado água do Tapajós, essa serra... tem as baraca das pessoas que trabalham lá, também, do povo daqui, que eu acho uma coisa muito importante que fica muita simples, que funciona muita bem, que elas não precisa mais modernização... non, se o povo quer, é importante... mas pra mim ta bom, só isso... a simplicidade daqui, a beleza também... E- Então vamos lá. Outra foto, a foto 024. Descreve pra mim, por favor? T1 – Esse é... esse é um bicho esquisito que eu vi aqui... eu pego essa foto pra, também pra comunicar lá na Francia, pra mostrar... e ate pra pessoal do Brasil, que tem muitas pessoas que non conhece... é eu acho que só a metade são já conhecido, aqui na Amazon, e que nunca viu na vida um bicho tão esquisito com olho vermelho, um corpo cinza que voa e um rabo parece uma, um pincel, branco... é... Pra mim é muito artístico, mostra, como dizer, a natureza... mostra como o homem pode encontrar muitas coisas na natureza, ela já inventou tanta coisa... Essa foto é... eu acho engraçado... tudo as pessoas que viu essa foto la na Francia non acreditar que isso podria existir... E- E o que chamou mais atenção nela? O que é o elemento, de novo né, o elemento da foto? T1 - éééééé... esse bicho, como dizer em português... pode ser exótico, non conhecido, uma coisa nova pra mim que eu já andei no mundo, ne, numa boa parte do mundo... mas isso é um bicho, eu viu depois de cinco anos, de... quando eu volte cinco ano depois, porque todo o ano eu venho mas, depois de cinco ano depois... eu gosto de pegar foto de bicho, passar um tempo atrás... E- Então vamos pra próxima. Na foto 035? T1- Ahh!! Essa foto não muda muito da foto 001... é a praia de Alter do Chon também, eu peguei daqui da frente, queria mostrar esse tipo de planta também aqui do lado, vermelho. Eu acho isso muito bonito também, porque não são flora, são folha ne, lá é igual... Queria fazer a diferença no meu país e aqui, lá tudo ta verde, só no outono muda as plantas, mas essas plantas lá tem, na Francia, se vende, são importada lá eu acho, nao sei como é que eles faz, só que aqui ta natural, então... essa é a diferença de pegar essa foto aqui, mostrar também os barquinhos que tão aqui e a Praia de Alter do Chon, aquela água do lagon, essa praia atrás, tem o Lago Verde... E essa foto, igual da outra, ela tem uma importância muita forte só pra mostrar mesmo a beleza aqui... eu quer guardar essas fotos porque, mais uma vez ta mudando muita rápido aqui, eu quer guardar lembrança que, dessa época... eu acho que antes era mais, como dizer, antigo, eu não conhecer venti anos atrás, eu já falei com muitas pessoas daqui que conhecer aqui 80, 85, que era já diferente... E- Então, e a foto 053? T1- Essa foto eu gosto porque é um menino que eu gosto muito daqui, que se chama Samuel, e... mostra uma criança que eu vejo crescer, tem outra também aqui, criança que eu vejo crescer, que estão muito feliz de crescer aqui, que não tem idéia de como pode ser pra outro lugar, pra cidades também, do Brasil, e pra outro país... eles cresce aqui é... como dizer, com tempo, com... as pessoas não precisam estressar muito aqui, que eles tem tudo na frente dele, tem de novo essa água, esse sol, essa comunidade aqui ta, simples... e vão pra escola, é uma escola tranqüila, non precisa pegar três ônibus, levantar 3 de manhã, de pegar muitas coisa... a escola ta perto, vão perto pra aprender e depois vai voltar pra casa, eu acho que é um ritmo importante pra criança... a ter, non sei, qualidade... bom depois, vão ficar mais grande, maior, pode escolher o caminho deles, só que nessa idade é importante

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criança cresce com tempo, non precisa ir demais rápido... bom, representa pra mim Alter do Chon, uma parte de Alter do Chon... aqui podemos ver as meninas que tão fazendo cerâmica, que quer guardar cultura daqui, a cultura daqui antigamente, a cultura tapajônica, faz escultura e cerâmica, com forma índia daqui, tapajônica... eu gosta que ela faz isso porque tem as pessoas que deixa, que esquece, que nunca aprendeu a fazer isso, ela se informa se documenta e tenta vender um pouco... desse lado é bom, eu acho que é muito bom. E- Mais alguma coisa? Dela, que tu queiras destacar? T1- sobre essas foto não... acho que igual, é uma lembrança pra mim... E- Então pra finalizar, na tua opinião, qual é o lugar, a vista ou a paisagem que é mais forte, mais marcante pra Alter do Chão? Mais importante de manter, não sei, que tu vês como uma coisa única... T1- é... pra mim Alter do Chon é com certeza uma coisa única, tem muito lugar muito bonito no mundo e na Amazônia também, só que aqui tem uma energia diferente de outro lugar, bonita, e eu acho realmente muito importante de não confunder a cidade de Santarém e Alter do Chão, eu acho muito importante... eu acho que tem muitas pessoas que, como dizer... é... aproveitar e usar dessa beleza aqui, você sabe porque, o mundo inteiro é assim... pra fazer dinheiro, pra... como dizer, simplesmente pessoas que não precisa ter aqui... aqui tem um povo que ta morando aqui, que é um povo, guarda um o outro, mas que é muito bom... que, que ta aqui faz muita tempo, que tem que ficar aqui, com a cultura daqui, com as tradição, entende, que volta pra essas tradição que eles estão perdendo, isso com certeza... Eu vejo muita bem, porque eu chego na Francia e vejo cada vez, essas coisas di, eu vou falar a verdade direta, ne, mas a bebida aqui é uma coisa que acaba, que acaba com o poble daqui... eu vejo essas publicidade pra cerveja, a cachaça, essas coisa... e isso é um problema muito importante porque, no mundo inteiro, a cultura, quer dizer, ocidental, mas não só ocidental ne, a cultura do dinheiro, acaba com a cultura índia... vai na Austrália, na Mongólia, na Europa, América do Norte, África e já aqui com álcool traz pra essa cultura índia, não sei porque que ele gosta tanto, porque é uma droga e acaba rapidinho e o povra não tem mais depois o que fará, não tem mais poder pra se revoltar, pra guardar a terra que eles tem, que se faz roubar, sempre assim, se faz ate matar... aqui tinha 6 milion de índio fez matar aqui, foi igual América do Norte, o mundo inteiro assim... Se ninguém diz isso, se ninguém se revoltar um pouquito, ne, vai acabar, aqui vai ser poluado, com certeza. É... tem pouca sorte que não vai ser assim, mas, talvez... Só pra finalizar, pra mim, aqui cada ano que eu venho é mais difícil de dizer que vou chegar no próximo anho, eu venho aqui porque eu tenho amigos aqui, do coração, igual que minha família, por isso que eu venho, eu volto... eu gosto que eles va me visitar em França, eu gosto de visitar aqui, é uma forma de respeito, mas raramente daqui há uns anhos eu vou, não vou mais chegar aqui, porque fica muito chateado, muito de coração chateado... bom... por enquanto, ainda ta bonito. ANC - Ancoragem

Turista que já visitou o destino algumas vezes. Tem origem francesa, trabalha com tatuagem, se interessa por natureza e já possui amigos residentes na Vila.

ECH – Expressões-Chave (Negrito)

- e si, penso que quando eu venho aqui gosta de tirar fotos dos povres daqui, das pessoas que mora aqui... Então... é veja eles pescando, como dizer... eles não perde as tradição tá... - guardar e mostrar que Alter do Chão é um lugar que na, em minha opinion e, tem que ficar o mais natural possível -É minha opinion é que aqui é Alter do Chon, non é Santarém, non é Manaus, non é Belém... a coisa que eu acho importante que Alter do Chon fique, como assim dizer, non se bem as palavras... fica natural, fica com essas beleza tudo, no muda muito - só que depois eu acha que tem um jeito de arquitectura, de estrutctura que non

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concorda com Alter do Chon... bem coisa de ferro, sabe... a frente aqui só ferro, non sei se vai ser pintado, mas, ferra no concorda com esse água, com esse areia branca, non. E, tem que fazer as coisa ecológica... - os pescador daqui (...) a água ta linda, ta... com esse por-de-sol, tranqüilo pescando pra comer, mais uma vez... não estão estressado de fazer aquilo que estão fazendo, ne - eu comprei aqui um barquinho também, igual dos pescador, pra passear, pra ver como era aqui, aqui agente non usa de carro, mais de barco ta, é diferente, non tem muitas asfalto... a rodoviária é esse rio... - mas eu goste, porque esse ritmo aqui tá interresante, as pessoas são tranqüilo, fala tranqüilo, dá tempo de conversar, non tão estressadas - o lado bonito de Alter do Chão, ela é muita turística também. Que tu vês, a praia com a água de Alter do Chon, mia cheia e... tem a serra atrás, em esse lado o Lago Verde e nesse o Tapajós... - as fotos pra mim não tem tanta importância, pra mim é um jeito de comunicar, porque la onde eu morro ta frio e chuva, ne (...) é importante essa foto pra mim, pra mostrar, pra comunicar... - É o que disse, do lado água do Lago e o outro lado água do Tapajós, essa serra... tem as baraca (...) non, se o povo quer, é importante... mas pra mim ta bom, só isso... a simplicidade daqui, a beleza também... - Pra mim é muito artístico, mostra, como dizer, a natureza... mostra como o homem pode encontrar muitas coisas na natureza, ela já inventou tanta coisa... Essa foto é... eu acho engraçado... tudo as pessoas que viu essa foto la na Francia non acreditar que isso podria existir (...) esse bicho, como dizer em português... pode ser exótico, non conhecido, uma coisa nova pra mim que eu já andei no mundo, ne, numa boa parte do mundo... - queria mostrar esse tipo de planta também aqui do lado, vermelho. - essa é a diferença de pegar essa foto aqui, mostrar também os barquinhos que tão aqui e a Praia de Alter do Chon, aquela água do lagon, essa praia atrás, tem o Lago Verde... - ela tem uma importância muita forte só pra mostrar mesmo a beleza aqui... eu quer guardar essas fotos porque, mais uma vez ta mudando muita rápido aqui, eu quer guardar lembrança que, dessa época. - mostra uma criança que eu vejo crescer, tem outra também aqui (...) que estão muito feliz de crescer aqui, que não tem idéia de como pode ser pra outro lugar, pra cidades também, do Brasil, e pra outro país (...) as pessoas não precisam estressar muito aqui, que eles tem tudo na frente dele, tem de novo essa água, esse sol, essa comunidade aqui ta, simples (...) eu acho que é um ritmo importante pra criança... a ter, non sei, qualidade... - aqui podemos ver as meninas que tão fazendo cerâmica, que quer guardar cultura daqui, a cultura daqui antigamente, a cultura tapajônica, faz escultura e cerâmica, com forma índia daqui, tapajônica... - pra mim Alter do Chon é com certeza uma coisa única, tem muito lugar muito bonito no mundo e na Amazônia também, só que aqui tem uma energia diferente de outro lugar, bonita, e eu acho realmente muito importante de não confunder a cidade de Santarém e Alter do Chão, eu acho muito importante... - aqui tem um povo que ta morando aqui, que é um povo, guarda um o outro, mas que é muito bom... que, que ta aqui faz muita tempo, que tem que ficar aqui, com a cultura daqui, com as tradição, entende, que volta pra essas tradição que eles estão perdendo, isso com certeza... - eu vou falar a verdade direta, ne, mas a bebida aqui é uma coisa que acaba, que acaba com o poble daqui (...) e isso é um problema muito importante porque, no mundo inteiro, a cultura, quer dizer, ocidental, mas não só ocidental ne, a cultura do dinheiro, acaba com a cultura índia... - pra mim, aqui cada ano que eu venho é mais difícil de dizer que vou chegar no próximo anho, eu venho aqui porque eu tenho amigos aqui, do coração, igual que

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minha família, por isso que eu venho, eu volto (...) mas raramente daqui há uns anhos eu vou, não vou mais chegar aqui, porque fica muito chateado, muito de coração chateado... bom... por enquanto, ainda ta bonito.

ID – Idéias Centrais

- Gosta e admira a manutenção das tradições de pesca artesanal para subsistência; - Enfatiza a necessidade de manter Alter do Chão o mais natural possível, diferenciando-a de cidades como Belém, Manaus e Santarém; - Vê as obras do Governo Estadual como em descompasso com as características da Vila; - Destaca o ritmo tranqüilo da vida local como um atrativo, como ideal para o descanso; - Cita a paisagem natural como o “lado bonito” de Aletr do Chão; - Vê nas fotografias registros e memória para comparações posteirores (percepção das mudanças) e para mostrar na França as diferenças e peculiaridades do lugar; - Diz entender que a populaçao nativa queira melhorias, mas aponta a necessidade de fazê-las com cuidado; - Chama a sua atenção a biodiversidade através de insetos coloridos e “esquisitos” e plantas de folhas coloridas; - Gosta de registrar traços locais como a água do lago, os barcos, a praia, mas também registrar a diferença das paisagens, seja pela sua destruição, seja pela sua intermitência; - Aprecia e acha saudável a vida das crianças da Vila, sua liberdade, segurança e proximidade da escola, entre outros; - Valoriza a população local e suas tradições, destancando o artesanato, o resgate da cerâmica tapajônica; - Refere-se como mais marcante na Vila a “energia” diferente de Alter do Chão; - Cita o problema do alcoolismo entre as populações indígenas; - Fala das mudanças na Vila e da perda das características naturais originais, como fatores para a perda de interesse pelo local.

EMS - Elementos Morfológicos e Sócio-culturais

- Pesca; - Ritmo de vida da população local; - Lago Verde, Rio Tapajós, morro Serra Piroca, barracas - Moradores locais; - Artesanato em cerâmica; - Água do Lago, barcos, praia; - Biodiversidade: fauna e flora.

QUADRO 10: DSC da Entrevista Turista 1 Fonte: A autora, 2007.

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Entrevista 10 E – Entrevistador T2 – Turista entrevistado 2

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4 5 E- Então vamos começar a conversa com a Mariana Martinez Quiroga, como turista: Eu queria, Mariana, que tu falasses um pouco de ti, tua origem, tua formação, pra agente contextualizar as tuas opiniões. T2 – Ta bem, eu sou argentina, eu morava no nordeste da argentina, Saco é o nome da cidade... e... eu sou médica... e vim pra Santarém a primeira vez em fevereiro de 2002, passar um mês. E- Certo, então sobre as fotos, agente tem algumas perguntas que vão se repetir, às vezes aparecem outras coisas que agente vai incluindo e depois mais duas perguntas de fechamento, mais gerais, sobre a vila. Então não tua foto 1, na tua primeira foto, eu gostaria que tu descrevesses pra mim o que é, onde é... T2- Isso era no rio Tapajós, atravessando desde a vila de Alter do Chão pra ilha, de catraia, catraia é a canoa qur eu uso pra atravessar. Então aparece a ilha e aparece também o catraieiro. E- o que tu achas de importante dessa foto, dessa imagem pra ti? O que ela tem de relevante pra ti? De valores que tu... T2- bom, eu acho que foi... agente achava muito legal essa experiência de atravessar com os catraieiros, atravessar até a ilha... é... e que dava pra ver uma parte da Vila, o que era nessa época, que não tinha nada da estrutura que tem agora, ne, na construção... nessa época era tudo bem mais rústico, menos organizado... E- Quais elementos tu destacarias na foto? Coisas que aparecem que tu dizes assim “essas tais coisas são as que mais sobressaem”, que são mais importantes na imagem, que te chamam mais atenção... T2- Bom, além do rio que pra mim, é como chamam, é a pérola daqui, o... o catraieiro como uma figura daqui bem forte, que hoje em dia já tem uma associação dos catraieiros, ne, e... acho que isso ne, por essa volta ne, o rio e a árvore que ta mais conservado... E- Você falou um pouquinho na mudança da estrutura do cais, não é? Tu já deves ter visto aqui a obra da praça e do próprio cais, como tu percebes essa mudança? Como que isso é pra ti?

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T2 – Bom, pra mim foi um choque ta, a construção, primeiro pela quantidade de concreto que eles botaram na obra. A obra está totalmente desvirtualizando o que era a Vila, eles... eu não sou contra o que eles chamam de progresso ne, a maioria do pessoal aqui, fala que isso é bom, que foi um avanço pra eles, pra Vila, que asfaltaram a rua e tudo mais... mas poderiam ter feito de um jeito que fique mais dacordo com o resto da comunidade, ne... a pracinha, por exemplo, da vila antigamente era uma praça que era todo grama, flores plantadas pelos mismos comunitários e árvores... hoje em dia só... hoje em dia é tudo concreto, tiraram as plantas, tiraram os banquinhos que antigamente eram banquinhos de madeira, colocaram bancos de concreto... a parte da orla também que dá pra ver na foto, a orla era a praia e continuava naturalmente, assim praia, mato e já vinha a rua principal... agora eles fizeram a construção da orla que também colocaram tudo concreto... concreto e ainda aquele, sabe... sei la, aquilo metálico... pelo menos poderiam ter utilizado uma estrutura, sei lá, de madeira, non sei, seria más acordine com que é Amazônia... eu... eu não gostei dessa mudança e eu vivenciei tudo isso... bem, bem ruim, na verdade... tiraram o coreto, a praça tinha um coreto antigo, acorde com a igreja, um coreto lindo de madeira, eu acho que era c ferro... tiraram e colocaram essa construção bem mais moderna, pra mim nada a ver com o que é o conceito da vila. E- Então agente pode ir p tua segunda foto? Na segunda foto, de novo, descreve pra mim um pouquinho da situação, do lugar... T2 – bom... Essa é a parte final da “Ilha”, é onde agente vai quando começa a enchente, a parte da ponta da ilha é... ela fica embaixo d’água, então agente vai pra essa área que é mais, mais virgem, que você vai ver que tem mais árvores e tudo mais... então eles põem pra funcionar essas barraquinhas que ficam no final... e aí estoi com dois estagiários que estavam trabalhando em Santarém, no núcleo, então são dois estagiários, acho que almoçando... E- Qual que é a importância pra ti? Dessa cena, da imagem? T2 – Ahhh... da imagem... é o que pra mim é Alter do Chão que é... é um... sei la, é um relax total assim p mim, é paz... é paz e contato c a natureza... você fica totalmente esquecido de se tinha algum problema lá, ou em Santarém ou alguma outra coisa e geralmente você vem pra cá com algum amigo, sente um clima muito legal mesmo... E - E tu destacarias algumas coisas na foto? O que é importante, dos elementos que aparecem na foto? T2 – Eu acho que é assim, o que é... agente se sente mais atraído, ou se sentia mais atraído nessa época, até agora que eu falo que tão desvirtualizando, é a conservação da ilha, porque você vê a foto o único que ta agregando aí são as mesinhas pra agente almoçar e as barracas... eles conservam as árvores, eles conservam a praia do jeito que é, só fazem a limpeza, mas... acho que isso é o que mais gosto do lugar que ta aí... ainda parte da praia esta bastante conservada... E- Podemos ir pra terceira? Então a terceira foto... T2- A terceira foto é a maravilha da paisagem daqui, dá pra ver a ilha quase toda, a água bem azul do Tapajós, aqui na orla... essa parte que ta hoje em dia ta todo transformado em concreto, colocaram a orla de concreto agora... antes era tudo grama... a praia continuava com grama e a areia... a primeira imagem de Alter que você tinha quando chegava era, quando descia a rua aqui da entrada de Alter do Chão era essa. Essa foto foi tirada na curva quando você faz... Alter do Chão te recebia com esta imagem que pra mim é fantástica, assim, toda vez que eu tentei convencer alguém de vir pra cá eu mostrei essa foto... E- O que tu vês de importante na foto? Eu acho que na verdade tu já falaste, mas reforça o que tem de importante nessa cena, nessa imagem, pra ti. T2- Bom, o rio de água trasparente, limpa, areia branca, uma coisa que acho que agente não tem que se esquecer nunca que é isso foi assim, que meu medo que agente vai vendo

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que um dia eu acho que vai contaminando mais... e... essa é uma beleza que agente tem que tentar conservar, ne... E- Bem, se é isso, acho que agente pode ir pra a tua quarta foto já... Da mesma forma, eu queria que tu descrevesses... T2- Bom, essa também é uma foto tirada no rio Tapajós, mas essa foi aqui na Praia do Cajueiro, no pôr-do-sol que tem duas pessoas da vila, que são pescadores que estão voltando nessa hora da, da pescaria e... sei lá... eu queria retratar essa simplicidade da vida das pessoas aqui, que eu acho que isso é que se mantém muito do... assim, isso não foi atendido ainda pelo nosso progresso, ne, as pessoas aqui mantém a sua simplicidade, mantém su dia a dia e... inalterado que eles mismos parecem buscar otras fontes de renda mas eles continuam, os homens vão pra pescaria, as mulheres continuam indo lavando a roupa no rio... então essas imagens, eu sempre tento captar assim, da... do dia a dia dos moradores da vila, assim... muito legal ver, de assistir... E- Destacarias algum elemento da foto? Ou alguns? T2 – Hummmm... acho ue... mais uma vez o rio, o rio como o centro, ne. Agente viu na anterior o rio como centro turístico, que tem as barracas, o movimiento e aqui o rio como fonte de subsistência ne. E- Certo... Podemos passar p quinta então? T2 - Aqui também um pôr-de-sol, é também uma das maravilhas daqui de Alter do Chão, agente nunca sai da praia antes de assistir o pôr-de-sol e... também com um grupo de amigos, então... quer dizer agente sempre vem aqui como uma maneira de relaxar, de ficar c amigos, de ficar na boa mesmo... e... também o rio como fundo né, e a Vila lá atrás... E- A importância pra ti, dessa foto, dessa imagem, dessa cena especificamente? T2- Ahhh... eu definiria tudo numa palavra que é paz... é... paz e amizade, assim... é... eu vengo pra cá em busca de sossego mesmo, e aqui encontra, pode esquecer de tudo... ainda na ilha que não dá pra ver aí, de um lado vê o pôr-de-sol e no outro lado ta vendo o nascer da lua... e isso não tem como pagar... espero que negum prédio fique no meio pra atrapalhar isso... E- Bem, essa foi a quinta, né. Não sei se queres fazer mais alguma... T2- Não... acho que estão bem representadas, porque repete muito... E – Então posso te fazer as últimas perguntas mais gerais? Qual a imagem que tu tinhas de Alter do Chão antes de conhecer Alter do Chão? T2 – Assim, eu não conhecia nada da região amazônica quando eu cheguei aqui, eu tava morando em SP, e vim aqui pra passar um mês, na verdade em Santarém... assim não tinha referência nenhuma, já tinha ouvido falar na verdade, de pessoas que já tinham vindo na mesma situação mas não tinha uma imagem formada do que era... agente pensa Amazônia como mato, na verdade... E- E qual a diferença... quer dizer, como que foi a tua percepção? Tua primeira impressão de Alter do Chão, já que tu não tinhas uma imagem anterior, a não ser essa de que Amazônia era floresta? No que se diferencia o que tu viste com essa percepção primeira? T2 – É... antes que eu tinha uma imagem de que era tudo mais... é... abandonado, que tinha mais pobreza, que... é... mais isolamiento, mais pobreza no sentido das pessoas ficarem isoladas... mas eu vi que, assim, é uma realidade totalmente diferente da que eu conhecia no Brasil... eles vivem, uma realidade, um mundo que é totalmente diferente, mas que acaba te surpreendendo porque é uma vida boa... toda... é... a maioria das comunidades, Alter do Chão é mais conhecida turisticamente, a maioria das comunidades ta bem organizada, não tem pobreza assim que vai faltar alguma coisa pra eles... e isso me supreendeu bastante e eu gostei muito do que encontrei aqui... E- Qual na tua opinião a vista ou a paisagem de Alter do Chão que é, assim, a marca de Alter do Chão?

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T2 – Aí... pra mim é aquela imagem que te mostrei da foto, de quando você chega no... na estrada e vai virar e dá de cara com aquela praia do Tapajós, pra mim é a imagem mais marcante... E- Então, basicamente era isso... Se tiveres mais alguma coisa pra acrescentar ou comentar sobre a vila, que gostes ou não gostes... T2- Não... a única coisa é a transformação que estão... assim... não entendo o que passa na cabeça das pessoas que estão planejando isso, que na minha visão estão destruindo o que era o charme de Alter do Chão... só falta plantarem palmeiras lá de Miami Beach, ne, essa orla é um absurdo o que eles estão fazendo aí... não sou contra melhorias, eles asfaltarem algumas ruas aqui é uma coisa boa, porque na época das chuvas tem atoleiros e coisas que complicam, mas... é... acho que não precisava prédio aqui, eu sabia que tinha uma lei que não podia construir mais de dois andares, agora já tem prédios de 3, 4 andares... tudo isso e mais que trocaram o que era antigo... tinha a pracinha com o coreto que era antigo por uma coisa totalmente moderna, nada a ver com a estrutura que tem aqui na vila ... e... eu acho que é isso... eu espero que pare por aí... ANC - Ancoragem

Turista de origem argentina, com fomação em medicina.Já visitou o destino mais de uma vez, se interessa pela população e pela natureza local.

ECH – Expressões-Chave (Negrito)

- Isso era no rio Tapajós, atravessando desde a vila de Alter do Chão pra ilha, de catraia (...) agente achava muito legal essa experiência de atravessar com os catraieiros, atravessar até a ilha (...) nessa época era tudo bem mais rústico, menos organizado... - além do rio que pra mim, é como chamam, é a pérola daqui, o... o catraieiro como uma figura daqui bem forte (...) o rio e a árvore que ta mais conservado... - Bom, pra mim foi um choque ta, a construção, primeiro pela quantidade de concreto que eles botaram na obra. A obra está totalmente desvirtualizando o que era a Vila (...) poderiam ter feito de um jeito que fique mais dacordo com o resto da comunidade, ne (...) hoje em dia é tudo concreto, tiraram as plantas, tiraram os banquinhos que antigamente eram banquinhos de madeira, colocaram bancos de concreto... - agora eles fizeram a construção da orla que também colocaram tudo concreto... concreto e ainda aquele, sabe... sei la, aquilo metálico... pelo menos poderiam ter utilizado uma estrutura, sei lá, de madeira, non sei, seria más acordine com que é Amazônia... eu... eu não gostei dessa mudança e eu vivenciei tudo isso... bem, bem ruim, na verdade (...) pra mim nada a ver com o que é o conceito da vila - é o que pra mim é Alter do Chão que é... é um... sei la, é um relax total assim pra mim, é paz... é paz e contato com a natureza... - agente se sente mais atraído, ou se sentia mais atraído nessa época, até agora que eu falo que tão desvirtualizando, é a conservação da ilha, porque você vê a foto o único que ta agregando aí são as mesinhas pra agente almoçar e as barracas... - é a maravilha da paisagem daqui, dá pra ver a ilha quase toda, a água bem azul do Tapajós, aqui na orla... essa parte que ta hoje em dia ta todo transformado em concreto, colocaram a orla de concreto agora... antes era tudo grama... a praia continuava com grama e a areia... - Essa foto foi tirada na curva quando você faz... Alter do Chão te recebia com esta imagem que pra mim é fantástica, assim, toda vez que eu tentei convencer alguém de vir pra cá eu mostrei essa foto... - Bom, o rio de água trasparente, limpa, areia branca, uma coisa que acho que agente não tem que se esquecer nunca que é isso foi assim - no pôr-do-sol que tem duas pessoas da vila, que são pescadores que estão voltando nessa hora da, da pescaria e... sei lá... eu queria retratar essa simplicidade da vida das pessoas aqui (...) do dia a dia dos moradores da vila, assim... muito legal ver, de assistir... - mais uma vez o rio, o rio como o centro, ne. Agente viu na anterior o rio como

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centro turístico, que tem as barracas, o movimiento e aqui o rio como fonte de subsistência ne. - Aqui também um pôr-de-sol, é também uma das maravilhas daqui de Alter do Chão, agente nunca sai da praia antes de assistir o pôr-de-sol - eu definiria tudo numa palavra que é paz... é... paz e amizade, assim... é... eu vengo pra cá em busca de sossego mesmo - de um lado vê o pôr-de-sol e no outro lado ta vendo o nascer da lua... e isso não tem como pagar... espero que negum prédio fique no meio pra atrapalhar isso... - Assim, eu não conhecia nada da região amazônica quando eu cheguei aqui, eu tava morando em SP, e vim aqui pra passar um mês, na verdade em Santarém (...) agente pensa Amazônia como mato, na verdade... -É... antes que eu tinha uma imagem de que era tudo mais... é... abandonado, que tinha mais pobreza, que... é... mais isolamiento, mais pobreza no sentido das pessoas ficarem isoladas (...) eles vivem, uma realidade, um mundo que é totalmente diferente, mas que acaba te surpreendendo porque é uma vida boa... - pra mim é aquela imagem que te mostrei da foto, de quando você chega no... na estrada e vai virar e dá de cara com aquela praia do Tapajós, pra mim é a imagem mais marcante... - a única coisa é a transformação que estão... assim... não entendo o que passa na cabeça das pessoas que estão planejando isso, que na minha visão estão destruindo o que era o charme de Alter do Chão (...) não sou contra melhorias, eles asfaltarem algumas ruas aqui é uma coisa boa, porque na época das chuvas tem atoleiros e coisas que complicam, mas... é... acho que não precisava prédio aqui, eu sabia que tinha uma lei que não podia construir mais de dois andares, agora já tem prédios de 3, 4 andares... tudo isso e mais que trocaram o que era antigo...

ID – Idéias Centrais

- Cita a esperiência da travessia do rio para a “Ilha”de catraia; - Destaca na paisagem os elementos naturais melhor “conservados”, na sua opinião; - Critica as obras da orla e da praça, especialmente no que concerne aos materiais utilizados. Vê essa alteração de forma muito negativa e em desacordo com a imagem/ o conceito que tinha da Vila; - Associa à Alter do Chão sensações tais como: paz, tranquilidade, relaxamento, contato com a natureza; - Preza a manutenção dos valores naturais da “Ilha”; - Refere-se às mudanças e às suas preferências da imagem do rio, da “Ilha” , sem o concreto da obra; - Diz que a vista da “Ilha”, do rio e do morro é a imagem com a qual a Vila te recebe; - Descreve a paisagem destacando a água limpa e transparente do rio e a areia branca nas praias; - Descreve o pôr-do-sol na Vila, com o sol se pondo de um lado e a lua nascendo do outro; - Cita a simplicidade da vida da população local e seu ritmo; - Gosta de perceber o rio com duas possibilidades incluindo a perspectiva do turista e a perspectiva de subsistência para os locais; - Busca na Via o sossego, a paz e a amizade de seus residentes; - Refere-se ao gabarito das edifições quando afirma que espera que nenhum atrapalhe a vista do pôr-do-sol; - Descreve a imagem que tinha da Amazônia como “mato”; - Imaginava Alter do Chão com mais pobreza, abandono e isolamento de sua população; - Entende como mais marcante da Vila, a imagem de recepção: “Ilha” e o rio; - Caracteriza como destruição do “charme” de Alter pelos planejadores e pelo Poder Público; - Manifesta-se à favor das melhorias, mas defende que estas sejam melhor estudadas e posiciona-se contrariamente à construção de prédios com mais de dois

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pavimentos ao longo da orla.

EMS - Elementos Morfológicos e Sócio-culturais

- Rio Tapajós; - Catraias e catraieiros; - Orla e praça; - “Ilha”; - Água transparente e areia branca; - Pôr-do-sol; - Simplicidade da vida dos locais; - Tranquilidade, calma, paz.

QUADRO 11: DSC da Entrevista Turista 2 Fonte: A autora, 2007. Entrevista 11 E – Entrevistador T3 – Turista entrevistado 3

1 2 3

4 5 E- Vamos começar a conversa com Gabriel... Gabriel tu podes te apresentar um pouquinho pra agente? Nome, idade, formação... T3- Meu nome é Gabriele Paduano, tenho 41 anos, é... sou italiano e já estive em Alter do Chão há mais de 3 anos e meio... já tive uma agência de turismo Amazon Planet... E- Gostarias de falar algo sobre a sua atuação profissional neste momento? T3- Bem, atualmente, nesse ano de 2006 eu to concentrando num projeto de exportação de polpa de fruta, atualmente... E- Então agora sobre as imagens, a tua imagem primeira, a foto número 1. Eu gostaria que tu descrevesses essa imagem, como ela te parece, porque cada um vai descrever de uma forma diferente, e depois, qual é a importância dessa cena pra ti. T3- Do punto de vista pessoal, assim, ne... assim, essa imagem aqui, é a imagem clássica de Alter do Chão né, então tem a praia bem grandona, a “Ilha” do Amor, chama-se... bem grandona... é uma imagem aérea, muito bonita e a coisa especial é que uma cena desse tipo,

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então uma praia de areia branca, fina, com água azul encontra-se no meio da Amazônia, isso é uma coisa especial, porque normalmente a idéia das pessoas em geral é que a Amazônia é só Amazônia clássica então, rio barrento, igapó, comunidades regionais, assim... não praia bonita tipo como tem no Caribe, né... Então uma foto linda e... não sei... um lugar especial sendo na Amazônia, particularmente sendo na Amazônia. E- Quais elementos tu destacarias nessa foto? T3- Bom, os elementos, basicamente a coisa mais interessante aqui são dois, são essa praiona grande de areia branca e a água que é azul, ne... normalmente as pessoas acham que a água dos rios da Amazônia é só uma água barrenta, marrom ne... mas aqui a água é bem azul... destaca mais aqui é esses dois elementos. E- Então agente pode ir pra segunda imagem? T3- Ta... Essa imagem aqui é ainda mais simples, ne... que tem basicamente é o Lago com então, essa mata que aparece verde, ne... totalmente assim uniforme... ahhh... bem espessa, bem densa, sem sinal de desmatamento, de... de utilização, de outra, de nada... de novo uma imagem linda, quem sabe um pouco mais “Amazônia”, assim mais como se pensa Amazônia no exterior, e no sul do país... ahhh... aqui tem só dois elementos né... então tem o verde, né, tem a mata e tem o lago né... então... E- E qual a importância dessa imagem p ti? Por que tu achaste legal discutir ela? Conversar sobre ela? T3 – Bom, legal porque, mostra assim, um, dois dos atrativos mais, maiores da região né, então... que são a mata né, intocada, importante... e naturalmente também os lagos, através aqui do Lago Verde, que são lugares que possa basicamente não só fazer turismo de observação, mas também mesmo turismo físico, então mergulhar, ir de caiaque, fazer passeio de barco, então é um lugar bem aconchegante, é um lugar bem... ahhh... bem bonito ne... bem suave. E- Podemos passar para a próxima então? Terceira foto... T3- O pôr-do-sol né, então essa imagem muito bonita, eu acho... fotógrafo é muito bom (risos)... bom mas então a imagem... esse aqui é o clássico pôr-do-sol tirado da Ponta do Cururu, ne... uma ponta onde, no final da tarde passam os botos assim... e... bom... imagem muito romântica né, o rio calmo, o pescador que ta voltando pra casa, esse rio que aqui, esse rio Tapajós é o ponto mais largo do rio, são mais ou menos 13 km até a outra, até o outro lado... assim... essa aqui pra mim demonstra a beleza romântica dessa região, ne. E- Essa imagem é importante pra ti por que? T3- É importante pra mim porque eu acho que é essa aqui... que enquanto as outras duas fotos demonstravam mais as possibilidades de... de... de turismo de balneário, né, tal com praia, ne assim, esse aqui também demonstra a possibilidade de um turismo dum outro tipo, tipo exemplo, lua-de-mel e outros tipos de turismo que, pra os quais também é importante um lugar romântico, uma aspecto desse tipo... então... o pôr-do-sol é uma coisa linda aqui, é uma coisa linda aqui, é um pôr-do-sol muito lindo de Alter do Chão, particularmente aqui desse lado que dá pra o rio... E- E os elementos que tu apontas? T3- Aqui é o pôr-do-sol mesmo e tem esse pescador que ta voltando pra casa, que demonstra assim uma tranqüilidade, uma paz, uma serenidade particular ne, assim, uma adaptação ao seu meio ambiente, que é... que é completo né... muito coerente, muito adaptado ao meio ambiente... a paz e a tranqüilidade, eu acho. E- então vamos pra quarta foto, Gabriel? T3- Essa aqui é a outra, o outro lado da Amazônia, ne, então essa aqui é mais ou menos mais a Amazônia clássica, ne, a Amazônia de floresta alagada, de igapó né, de... então, esse aqui é um igapó, ta por perto daqui, chama-se Caranazal, floresta alagada de Caranazal, e esta misma pode talvez ser uma das coisas mais especial, mais lindas aqui da região, ne, porque floresta tem em vários lugares do mundo, assim, mata fechada, tudo... mas mata

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assi, alagada como aqui tem em pouquíssimos lugares do mundo... é uma coisa bem especial assim da Amazônia e... ta, os elementos que eu gosto mais aqui são dois, basicamente, é di nuovo, esssa pessoa, di nuovo esse pescador que... hmmmm... aparece muito assi... muito... hmmm... muito adaptado ao seu meio ambiente, ne, muito, muito sabendo bem exatamente como se virar nesse meio ambiente, porque nesse ambiente de igapó é muito fácil de se perder... mas essa pessoa parece saber exatamente onde está indo, ne, e depois a beleza, ne, a beleza cênica particular, basicamente... hmmm... desse chão de água, ne, uma floresta com o chão de água, onde dentro quando você vai pra lá, você vai ver que é hmmm... é um lugar muito tranqüilo... eeee... a água é paradinha... hmmm... ta, é trasparente, dá pra ver platas aquáticas, peixinhos mergulhando... eeee... dá pra ver ocasionalmente uns macacos, dá pra ver tb uns pássaros... às vezes... é um lugar, é um lugar assim meio místico, muito interessate, muito bonito assim... bem... bem especial, ta. Porque praia é bonita, mas, ta, tem de monte, em todo lugar, agora igapó é uma coisa particular da região da Amazônia, que eu acho muito especial, ne. E- Ta legal, então agente pode ir pra quinta? quinta imagem? T3 – Bom, essa aqui demonstra um pouco assi, da cultura da região, ne, tal, das origens indígenas da região, né... esse aqui é o Dia do Índio, acontece eu acho que é 29 de abril todo ano e... aqui em Alter do Chão fazem todo ano assim, uma, uma, uma... uma dia de... como é que chama... dia de atividades, de... de danças. Então aqui é a chegada, ne, dos índios, que chegaram com as canoas la do lago, ne e... bom que é o que eu disse aqui... acho que é primeiramente importante porque tão, assim, é uma tentativa de resgatar a cultura que foi perdida um pouquinho acho, então tentando resgatar, reviver essa cultura bem indígena, borari, assim chama-se os índios aqui, borari, e... essa festa foi muito bonita, fizeram além de essa apresentação aqui, fizeram uma comida indígena lá... e... várias danças, regionais mais também indígenas, ne... e esse é um aspecto que nos atrai, assim, muitos turistas quando eles vêm na Amazônia, eles, eles gostariam de conhecer mais da cultura indígena, que não tem praticamente aqui na região, não tem muita cultura viva desse tipo aqui, só mais assi, dias especiais como esse Dia do Índio e... tinha, por exemplo, aqui um museu muito famoso aqui em Alter do Chão, muito bonito... gente de todo lugar do mundo vinha pra visitar esse museu do índio aqui, mas fechou parece faz uns 4, 5 anos... foi uma coisa negativa, ne, foi porque, bom, era uma coisa onde a cultura vivia, ne, e trazia muito turista pra cá, então eu acho uma coisa que tem que ser feita ainda mais, ser trabalhada mais, sabe, esse resgate da cultura... E- E os elementos de destaque, pra ti, dessa imagem? T3- Ah bom, claramente assim, são as pessoas, ne, particularmente... assim como as pessoas estavam pintadas, ne, com essa saia feita de, de, de palha, ne, as tochas que dão, e essa fumaça que dão todo um místico pra ocasião. E- Ta bem Gabriel, então, além do comentário das fotos como eu te falei, agente tem algumas questões mais gerais sobre a Vila e a primeira delas é: tu tinhas uma imagem, quando tu ouviste falar de Alter do Chão? Antes de conheceres? Como que era essa imagem? T3- Não, antes de conhecer não tinha imagem... E- Como que tu chegaste até aqui? T3- Eu estava em Belém e um amigo me falou: olha lá tem, no meio da Amazônia, entre Belém e Manaus, tem um lugar chamado Santarém e tem lá uma vila Alter do Chão, com assi, praias magníficas... como assi o “Caribe da Amazônia”, ele dizia que era o Caribe da Amazônia... então eu quase não acreditei, “bem, mas no meio da Amazônia vai ter praia assim bonitas?” e ele disse: sim, vai, vai... então eu vim p cá pra ficar 2 dias e em final gostei tanto que acabei voltando 3 anos e meio, achei que tinha potencial turístico, tem potencial turístico, vai se desenvolvendo todo ano, vai crescendo mais ou menos 15, 20% por ano e... ahh tá, a única coisa que falta de verdade, sempre falo isso, aqui pra divulgar cada vez mais o turismo, é divulgação, nem tanto infra-estrutura, mas divulgação... ninguém conhece Alter do

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Chão, como eu não conhecia... mesmo as agências de turismo no sul, falam: eu não conheço esse lugar, e merece. E- Então, um pouco difícil te pedir um comparativo entre o que tu imaginavas de um lugar no meio da Amazônia e o que tu encontraste... T3- não, não... mas é isso... o que eu imaginava era mais assim: rio barrento, mata fechada... vilas indígenas... isso que eu achava assim, Amazônia, bichos e... a verdade um pouco diferente... a verdade é que mata fechada tem, vilas são mais caboclas, não indígenas, né, aquela mistura de índio com branco, ne, mais pescador assi... porque os índios são reservas, ne, que são fechadas pro turismo, ne, e... um pouco decepcionante era que... a fauna, ne, então tem menos animais, é mais difícil ver animais do que alguém acha, ta. As pessoas chegando aqui acham que vão assi, ver milhares de macacos pulando, onça, assi... não é assi, ne. Dá pra ver alguns animais em lugares e tempos certos assi, tem que ter bem definidos... mas não é aquela coisa... em outros lugares do Brasil mesmo, às vezes dá p ver mais bichos, o Pantanal. Agora, eu não achava assi, que o punto positivo como surpresa era toda aquela parte de, de... de rio de águas claras e praia, ne. Então, não sabia e quando cheguei aqui achei muito interessante porque tinha basicamente as duas coisa, ne, tinha um lado a Amazônia clássica com seu igapó, que eu falei ne, com suas vilas caboclas, com a mata fechada, mesmo que comm um pouco menos animais que eu achava, mas tinha também esse outro aspecto de praia, balneário... E- Como que foi a tua percepção com relação à Vila, daí? Por que essa tua imagem, assim, imaginavas uma ocupação amazônica mais como uma aldeia, uma coisa indígena, e quando encontraste, encontraste uma vila cabocla. Isso teve algum... T3- ... não, não... quando eu falo vila cabocla eu não falo Alter do Chão, Alter do Chão já é urbanizada, já bastante urbanizada... não, vila cabocla, assim, falo mais daquelas vilas nas margens do rio Tapajós, tipo Maguari, Jamaraquá... agora Alter do Chão já ta bem desenvolvido, né, faz 14 anos que tem estrada, acesso asfalto, que é assim asfaltado... fazem 20 e poucos anos que tem energia... então Alter do Chão praticamente é um balneário hoje em dia, ne, um balneário... eu não tinha idéia pra dizer como comparei assi, não tinha idéia de como ia ser Alter do Chão, mas, bom, não é aquela vila... mudou muito, assi, eu vi umas fotos, já tem foto de como era Alter do Chão faz uns 20, 30 anos e mudou muito sim... uma vez era mesmo vila cabocla, hoje não é mais, hoje Alter do Chão é mais uma vila balneária, tem hotéis, pousadas, restaurantes... E- E sobre a questão da obra da orla? Como tu enxergas essa mudança na praça, ali no cais, na orla toda ali, da Vila? T3- Então, assi... eu acho duas coisas... acho a praça não ta muito coerente com a imagem que teria que ser apresentada pro mundo né. Então acho que uma praça que seria mais estilo regional, com muito verde com proteção de madeira, palha, plantas teria sido muito mais bonito e muito mais coerente com as expectativas do turista... ela só tem ali só basicamente cimento e metal, metal... eu acho a praça... eu acho e a maioria da gente aqui, bem feia... não fizeram um bom trabalho não, agora a orla ta ficando mais bonita, ne. Deixaram uma grande parte para grama, um gramado lá, bonito... eu acho que a orla ta ficando mais bonito, a praça não... a praça era mais bonita antes, um pouco mais assi, mais regional, talvez não sofisticada, mas tinha mais verde e menos cimento. Agente não vem aqui pra ver cimento, vem aqui pra ver o verde, cimento na cidade. E- Qual o lugar pra ti, ou a paisagem, ou a vista ou a construção... o que pra ti, em Alter do Chão, é a cara de Alter do Chão? Fala em Alter do Chão e te lembra tal coisa? T3- edifício ou natural? E- Qualquer coisa, na tua opinião. T3- Alter do Chão?? É a “Ilha” do Amor. É aquela primeira foto que te mostrei, aquela cara de Alter do Chão, ne... a ilha, a praia, a praiona grande, com a vista da Serra Piroca... essa pra mim é a cara de Alter do Chão, ne.... acho que é isso... Acho que pra maioria da gente, porque

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Alter do Chão é conhecida, aqui a foto conhecida, a imagem de Alter do Chão que é divulgada mais, é aquela da “Ilha” do Amor no verão... a “Ilha” do Amor bem grande no verão quando a água ta baixa. E- Bem, Gabriel, as perguntas eram essas, não sei se tu terias mais alguma coisa pra comentar ou acrescentar sobre a Vila... Ate porque não é a primeira vez que estas aqui, tu acompanhaste um pouco das mudanças... T3- Olha, tem muitas coisas, mas agora... em relação ao turismo mais assi? E- Bem, como a pesquisa é sobre percepção urbana, como o turista percebe essa vila, esse lugar... quem acompanhou algumas mudanças pode, de alguma forma, fazer um comparativo, entende, como “prefiro assim ou assado”, ou ainda uma outra coisa que tu consegues perceber... não fica restrito exclusivamente ao turismo não... T3- Ah! Não fica restrito somente ao turismo?? Então assi, bom, Alter do Chão esta mudando muito, nos últimos, só nos últimos três anos e meio acho que foram construídos dezenas, senão centenas de casas, tem muita construção... uma boa parte da construção, infelizmente, não é aquele tipo de construção que, com a qual Alter do Chão ficaria mais bonita, ficar até mais atrativa pro turismo. Então são prédios grandes, utilizando muito cimento e pouca madeira, palha... assi, são construções urbanas e não, e não.... não regionais, então... assi, digamos assi, que a beleza natural de Alter do Chão é indiscutível, o jeito, o jeito, assi... o desenvolvimento urbano ta sendo feito um pouco assi... um pouco sem se cuidar muito do aspecto estético, ne, ta da vila assi, tal... Aquele casarão grande que ta aqui, no Tapajós, ne, quatro andares, em cima de tal, aparecendo uma coisa bem urbana... o novo hotel tb, la no Mirante da “Ilha”, assi... a maioria das constrições não são assi, feitas dum, dum, dum jeito muito bonito, muito regional, ne... então acho que isso, pode no futuro... assi... pode baixar o nível de atrativo pro turista... agora isso é construção, depois tem algumas coisas de infra-estrutura que estão faltando, mas não é aquela coisa importante, não é a coisa mais importante, bom, falta também um caixa... eeee... pro turista sacar dinheiro, que o turista sempre precisa, coisa que não tem em Alter do Chão, só tem em Santarém, pa-pa-pa... faltam os banheiros na “Ilha” do Amor, ne, tem gente que precisa e tem que ir pra praça, passar de novo da “Ilha” pra Vila, pra, pra... ter acesso a banheiro, na praça tem... ahhhh... mas basicamente isso, porque depois assi, como hospedagem, alimentação, serviços turísticos tipo passeios assi, tem bastante, eu penso, hoje em dia... acho que lá nunca vi um turista, particularmente de fora, não de Santarém, mas de fora, se queixar sobre isso. Então o que falta de verdade assi pra desenvolver o lugar é mais, assim, um turismo ecológico, ne, não tamos falando de um turismo de massa, pra turismo de massa não tem infra-estrutura, não tem hotel de 500 quartos, no tem, não tem e acho que dificilmente vai ter... vai desenvolver mais o turismo aqui ecológico, que tem hoje em dia, falta basicamente assi, tarifas aéreas mais baratas, mas acho que já foi feito um bom passo na frente com a chegada da Gol, ne, e... divulgação basicamente, a coisa principal é divulgação... então, ninguém, mesmo os agentes, das agências de viagem lá no Sul, quando alguém em SP, RJ vai pra uma agência e fala “olha, quero ir pra Amazônia”, que tem, a única coisa que oferece, que o agente de viagens conhece é basicamente só os hotéis da selva pra Manaus e Belém-Marajó, Santarém-Alter do Chão assi não entra no mapa, no mapa da Amazônia, então esse é... por enquanto, por isso que acho que tem que ter divulgação... mas assi, nas palavras, assi, o lugar aqui tem uma beleza natural especial, tem um povo geralmente muito aconchegante, honesto, trabalhador, então, a base, assi, a fundamenta pra desenvolver o turismo, tem, agora tem que ter também ajuda do governo ne particularmente, ne, estadual, acho, federal-estadual, governo municipal não tem aquela verba pra fazer muita coisa, mas federal e estadual, pra desenvolver esso que pode ser uns dos principais assi da Amazônia, senão do Brasil inteiro. Não imagina que um dos guias, lá, o guia mais famoso da Lonely Planet falou eee... que na capa dele, tem um mapa do Brasil e tem os atrativos principais do país, acho que são uns 10 ou 12 atrativos, um desses 12

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é Alter do Chão, ne, então, isso, isso dá pra.. demonstra a beleza e a particularidade desse lugar. Só que é longe, caro pra chegar e pouca gente conhece, ainda. Mas tem futuro. ANC - Ancoragem

Turista de origem italiana. Já visitou o destino várias vezes e já trabalhou com ecoturismo e com exportação de produtos da Amazônia. Valoriza os aspectos naturais da Vila e da cultura local.

ECH – Expressões-Chave (Negrito)

- Do punto de vista pessoal, assim, ne... assim, essa imagem aqui, é a imagem clássica de Alter do Chão né, então tem a praia bem grandona, a “Ilha” do Amor - então uma praia de areia branca, fina, com água azul encontra-se no meio da Amazônia, isso é uma coisa especial, porque normalmente a idéia das pessoas em geral é que a Amazônia é só Amazônia clássica então, rio barrento, igapó, comunidades regionais, assim (...) são essa praiona grande de areia branca e a água que é azul, ne... normalmente as pessoas acham que a água dos rios da Amazônia é só uma água barrenta, marrom ne... - que tem basicamente é o Lago com então, essa mata que aparece verde, ne... totalmente assim uniforme... ahhh... bem espessa, bem densa, sem sinal de desmatamento, de... de utilização, de outra, de nada... de novo uma imagem linda, quem sabe um pouco mais “Amazônia”, assim mais como se pensa Amazônia no exterior, e no sul do país (...) dois dos atrativos mais, maiores da região né, então... que são a mata né, intocada, importante... e naturalmente também os lagos, através aqui do Lago Verde - O pôr-do-sol né, então essa imagem muito bonita, eu acho (...) imagem muito romântica né, o rio calmo, o pescador que ta voltando pra casa, esse rio que aqui - esse aqui também demonstra a possibilidade de um turismo dum outro tipo, tipo exemplo, lua-de-mel e outros tipos de turismo que, pra os quais também é importante um lugar romântico, uma aspecto desse tipo... - Aqui é o pôr-do-sol mesmo e tem esse pescador que ta voltando pra casa, que demonstra assim uma tranqüilidade, uma paz, uma serenidade particular ne - então essa aqui é mais ou menos mais a Amazônia clássica, ne, a Amazônia de floresta alagada, de igapó né, de (...) e esta misma pode talvez ser uma das coisas mais especial, mais lindas aqui da região, ne, porque floresta tem em vários lugares do mundo, assim, mata fechada, tudo... mas mata assi, alagada como aqui tem em pouquíssimos lugares do mundo... - esssa pessoa, di nuovo esse pescador que... hmmmm... aparece muito assi... muito... hmmm... muito adaptado ao seu meio ambiente, ne - e depois a beleza, ne, a beleza cênica particular, basicamente... hmmm... desse chão de água, ne, uma floresta com o chão de água, onde dentro quando você vai pra lá, você vai ver que é hmmm... é um lugar muito tranqüilo... eeee... a água é paradinha... hmmm... ta, é trasparente, dá pra ver platas aquáticas, peixinhos mergulhando... eeee... dá pra ver ocasionalmente uns macacos, dá pra ver também uns pássaros... às vezes... é um lugar, é um lugar assim meio místico, muito interessate, muito bonito assim... - Bom, essa aqui demonstra um pouco assi, da cultura da região, ne, tal, das origens indígenas da região, né... esse aqui é o Dia do Índio - acho que é primeiramente importante porque tão, assim, é uma tentativa de resgatar a cultura que foi perdida um pouquinho acho, então tentando resgatar, reviver essa cultura bem indígena, borari, assim chama-se os índios aqui, borari, e... essa festa foi muito bonita, fizeram além de essa apresentação aqui, fizeram uma comida indígena lá... e... várias danças, regionais mais também indígenas, ne... e esse é um aspecto que nos atrai, assim, muitos turistas quando eles vêm na Amazônia, eles, eles gostariam de conhecer mais da cultura indígena, que não tem praticamente aqui na região, não tem muita cultura viva desse tipo aqui, só mais assi, dias especiais como esse Dia do Índio - ahh tá, a única coisa que falta de verdade, sempre falo isso, aqui pra divulgar cada vez mais o turismo, é divulgação, nem tanto infra-estrutura, mas divulgação... ninguém conhece Alter do Chão, como eu não conhecia... mesmo as agências de

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turismo no sul, falam: eu não conheço esse lugar, e merece. - rio barrento, mata fechada... vilas indígenas... isso que eu achava assim, Amazônia, bichos (...) um pouco decepcionante era que... a fauna, ne, então tem menos animais, é mais difícil ver animais do que alguém acha, ta. As pessoas chegando aqui acham que vão assi, ver milhares de macacos pulando, onça, assi... não é assi, ne. Dá pra ver alguns animais em lugares e tempos certos assi, tem que ter bem definidos... mas não é aquela coisa... - Agora, eu não achava assi, que o punto positivo como surpresa era toda aquela parte de, de... de rio de águas claras e praia, ne. Então, não sabia e quando cheguei aqui achei muito interessante porque tinha basicamente as duas coisa, ne, tinha um lado a Amazônia clássica com seu igapó, que eu falei ne, com suas vilas caboclas, com a mata fechada, mesmo que com um pouco menos animais que eu achava, mas tinha também esse outro aspecto de praia, balneário... - não, não... quando eu falo vila cabocla eu não falo Alter do Chão, Alter do Chão já é urbanizada, já bastante urbanizada... não, vila cabocla, assim, falo mais daquelas vilas nas margens do rio Tapajós - mudou muito, assi, eu vi umas fotos, já tem foto de como era Alter do Chão faz uns 20, 30 anos e mudou muito sim... uma vez era mesmo vila cabocla, hoje não é mais, hoje Alter do Chão é mais uma vila balneária, tem hotéis, pousadas, restaurantes... - Então, assi... eu acho duas coisas... acho a praça não ta muito coerente com a imagem que teria que ser apresentada pro mundo né. Então acho que uma praça que seria mais estilo regional, com muito verde com proteção de madeira, palha, plantas teria sido muito mais bonito e muito mais coerente com as expectativas do turista.. - a praça era mais bonita antes, um pouco mais assi, mais regional, talvez não sofisticada, mas tinha mais verde e menos cimento. Agente não vem aqui pra ver cimento, vem aqui pra ver o verde, cimento na cidade. - É a “Ilha” do Amor (...) a ilha, a praia, a praiona grande, com a vista da Serra Piroca (...) a imagem de Alter do Chão que é divulgada mais, é aquela da “Ilha” do Amor no verão... - Então assi, bom, Alter do Chão esta mudando muito, nos últimos, só nos últimos três anos e meio acho que foram construídos dezenas, senão centenas de casas, tem muita construção... - Então são prédios grandes, utilizando muito cimento e pouca madeira, palha... assi, são construções urbanas e não, e não.... não regionais, então... - Aquele casarão grande que ta aqui, no Tapajós, ne, quatro andares, em cima de tal, aparecendo uma coisa bem urbana... o novo hotel também, la no Mirante da “Ilha”, assi... a maioria das construções não são assi, feitas dum, dum, dum jeito muito bonito, muito regional, ne... então acho que isso, pode no futuro... assi... pode baixar o nível de atrativo pro turista... agora isso é construção, depois tem algumas coisas de infra-estrutura que estão faltando - falta também um caixa... eeee... pro turista sacar dinheiro (...) faltam os banheiros na “Ilha” do Amor, ne - Então o que falta de verdade assi pra desenvolver o lugar é mais, assim, um turismo ecológico, ne, não tamos falando de um turismo de massa, pra turismo de massa não tem infra-estrutura, não tem hotel de 500 quartos, no tem, não tem e acho que dificilmente vai ter... vai desenvolver mais o turismo aqui ecológico, que tem hoje em dia, falta basicamente assi, tarifas aéreas mais baratas, mas acho que já foi feito um bom passo na frente com a chegada da Gol, ne, e... divulgação basicamente, a coisa principal é divulgação... - mas assi, nas palavras, assi, o lugar aqui tem uma beleza natural especial, tem um povo geralmente muito aconchegante, honesto, trabalhador, então, a base, assi, a fundamenta pra desenvolver o turismo, tem, agora tem que ter também ajuda do governo ne particularmente, ne, estadual, acho, federal-estadual - Não imagina que um dos guias, lá, o guia mais famoso da Lonely Planet falou eee... que na capa dele, tem um mapa do Brasil e tem os atrativos principais do

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país, acho que são uns 10 ou 12 atrativos, um desses 12 é Alter do Chão, ne, então, isso, isso dá pra.. demonstra a beleza e a particularidade desse lugar. Só que é longe, caro pra chegar e pouca gente conhece, ainda. Mas tem futuro.

ID – Idéias Centrais

- Citou como imagem clássica de Alter do Chão, a vista da “Ilha” no período da seca; - Acredita que Alter do Chão, de certa forma, contradiz a imagem tradicional que se tem da Amazônia: rio barrento, igapó, comunidades ribeirinhas, etc; - Destaca na localidade o fato das águas serem claras e as areias brancas, em contraposição à maioria dos lugares na Amazônia; - Cita que a vista aérea do Lago e da mata sem sinais de desmatamento condiz mais com a imagem da Amzônia mais presente no imaginário das pessoas; - Refere-se ao cenário do pescador e sua canoa ao pôr-do-sol como um cenário romântico, ideal para a diversificação de produtos turísticos (lua-de-mel, por exemplo); - Diz que embutidos na paisagem também estão as sensações de tranqüilidade e paz; - Descreve o igapó e sua beleza como “chão de água”, da integração do homem amazônico com esse ambiente; - Diz que o igapó tem relação mais freqüente com o imaginário sobre a Amazônia, mas de qualquer forma, só existe na Amazônia, sendo uma forte marca; - Valoriza e defende o resgate da cultura local cabocla e indígena, e ainda, sua utilização como produto turístico; - Demonstra vínculo e respeito pela população residente; - Destaca como maior problema da destinação turística de Alter do Chão, a falta de divulgação e diz que apesar da infra-estrutura ser pequena, esta é suficiente por enquanto; - Tinha como imaginário de Amazônia antes de chegar, o rio barrento, mata mais fechada, maior quantidade/visibilidade de bichos. Isso porque ele afirma que a visualização de animais é mais difícil do que se imagina; - Surpreendeu-se com as praias e as águas claras, o que, na sua opinião, junta um pouco da imagem clássica da Amazônia, com as de um balneário; - Já não vê a Vila como cabocla, mas sim como uma Vila balneária, uma vez que a considera bastante urbanizada, especialmente após as intensas mudanças que se seguiram à abertura da estrada; - Observa como incoerência as obras da orla e da praça, especialmente na escolha dos materiais, preferindo algo mais regional, afirmando que o turista que procura Alter quer ver verde e não cimento: “cimento é na cidade”; - Destacou como mais marcante e mais divulgada a vista da “Ilha”, da praia, com a vista do morro; - Demosntra preocupação com as rápidas mudanças, com o adensamento e as construções cada vez mais urbanas e menos regionais, citando a utilização de materiais (abandono dos materiais locais rústicos) e a construção de prédios altos; - Acredita que a atratividade para todos os turistas, de forma geral, pode ser diminuida pelas construções não-regionais; - Cita ainda como problemas para o desenvolvimento da atividade, a falta de caixas eletrônicos (bancos) e de banheiros na praia da “Ilha” , além co alto custo das passagens aéreas (o que já vem melhorando); - Afirma que Alter do Chão não possui perfil para a realização de turismo de massa; - Valoriza como atrativos a beleza natural e o povo local; - Destaca a importância internacional do destino, haja vista a sua presença na capa de um importante guia internacional (somente 12 destinos na capa do “Lonely Planet”); - Por fim, enfatiza a necessidade de um maior apoio governamental;

EMS - - “Ilha”

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Elementos Morfológicos e Sócio-culturais

- Água clara e areia branca; - Lago Verde; - Mata intacta; - Pôr-do-sol; - Pescadores; - Tranqüilidade e paz; - Igapó; - Cultura cabocla e indígena; - Mata fechada e animais; - Construções altas; - Uso de materiais construtivos não-regionais.

QUADRO 12: DSC da Entrevista Turista 3 Fonte: A autora, 2007. Entrevista 12 E – Entrevistador T4 – Turista entrevistado 4

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4 5 E- Então vamos fazer o background dela? Nome, idade, origem... A ancoragem, pra saber a bagagem que interfere na percepção. T4- Meu nome é Stephanie, idade... ahhh... 28. E... formação? Ahhh... Master in Internacional Business... como comércio internacional... comércio exterior... My nacionalitè inglesa e... ela é inglesa mas ela morra na France, in Parris. E- Eu gostaria que você escolhesse a primeira foto e fizesse uma descrição dela... Falasse da importância da imagem pra agente. T4- Na primerra... a tranqüilidade... ela não esperrava de achar um lugarr assim no meio da Amazônia, seja com água clarra... hummm... com arreia... isso não tem nada a ver com a idéia que mas é mais a idéia da Amazônia... a imaginação é mais... não tem nada a ver

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com Alter do Chon... pra ela é mais a Amazônia um rio com água escurro, e muitas árvorres fechada... muito surpresa de encontrarrr um lugarr assim... E- Então a primeira foto dela é uma imagem da “ilha do amor”, não é? Da praia com a vista pra ilha? T4- Si. Que mais? Então essa primerra... primerra vista aqui, é a ilha de Alter do Chon... é a primerra imagem de quando agente chego de táxi... que acho muitooooo... muito calmo, né... tranqüilo... E- E o que chamou a atenção dela nesta imagem? Que coisas? Quais elementos? T4- A mistura da luz, arreia... o verde, o morrô no fundo e... o lago. E- Ahhh, ok, então são duas fotos da ilha... Duas vistas diferentes, a primeira e a segunda... E- Vamos pra terceira imagem então... T4- Ahhh... Aqui também é o morrô, a florresta e a água... E... a vida... Essa foto, ela gosta porque... assi... as atividades, a pesca, o barco... em resumo, la culturra local... o modo de viver... E- A quarta foto então... T4- Bom ela também... ela... o que chama atenção pra nós, é... o... o... betum... o concreto... ai que agente entender o concreto lá... mas depois agente achar que é muito, muito concreto... e que ver aqui num país de naturreza e esse cheio de concreto... também porque fica muito quente e... ahhh... ela fala, é um... uma contradiçon! Uma contradiçon essas foto, que são imagem da naturreza, de praia... de água e... acho muito legal aqueles lugarres, aquelas casinhas... e se vê... agente perguntou como que vai ser quando acabo? Como que vai ser aqui daqui alguns anos? E... E- Na opinião de vocês, isso muda o interesse na Vila? T4- Pra nós, perde muito. E outra coisa também, que nós ficamos decepcionada aqui... é que, bom... pra mi foi uma amiga que me falou disso, pra eles foi outras pessoas... que tinha um museo muito interressante aqui, e agorra não tem mais... fechado... aí... mas também, ficamos decepcionados com o... todos concreto e... mas non andamos muito... eu si andei mais, mas eles non... E- Mais alguma foto que vocês queiram comentar? T4- É só três dias... nós temos poucas fotos pra mostrar... O caiaque, o peixe-boi não deu certo... não deu tempo... também o primerro dia, agente viajou, ta cansado... não quer pensar nada, fazer nada... acho que se fosse terceirro dia já tem coisa diferrent... E- Essa aqui é a quinta foto? T4- Então, essa ela falou que é porque... é o fim do dia, também pra ela como turrista, é... tranqüilidade... não sabe mais de onde vem e... e esqueça de tudo, de tudos problema... di lá e... por isso que ela gostou essa foto. Como a primerra foto que ela achou que aquela vista que ela viu lá... que relaxada... então a última, confirma a primerra... a última confirma a primerra. E- Como a pesquisa é sobre a imagem, a percepção... Então eu queria saber sobre o que vocês imaginavam do lugar e a diferença com o que vocês encontraram aqui? T4 – Como é que se fala... Então, ela não tinha, eles não tinha nenhum idéia porque non... non se informarram... foe alguém que, já em Manaos, falar pra eles “ah!! Você vai im Santarrem di barco?! Então vai lá Alter do Chon... você chega Alter do Chon, você pega um barco, atravessa o rio, vai do outro lado, tem a praia.. e você coloca a sua rede lá” (risos)... É meio esquisito, né?... Aí ela pensava que aqui ela ia chega, ver um rio, atrar... eu acho que atar em baixo de lá... atravessar de barco, chegar do outro lado, colocar a rede, comer e... tava bem. Então, aí falou isso. Então quando ela chegou, ela não sabia que tinha arreia e tudo isso, ela não sabia... e por isso ela pensava bem o rio escurro, a florresta e... muito diferrente. E também o museo do índio... só. Ela falou isso... é... a segunda decepção foi o museu. E- A primeira decepção o que foi?

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T4- Ahhh... O concreto... dimais de concreto. E- E na opinião de vocês qual é o lugar, ou a vista, ou a paisagem, ou a construção mais marcante de Alter do Chão? Que você vai lembrar de Alter do Chão em qualquer lugar? T4- A caipirrinha (risos)!! A paz... a tranqüilidade, a paz... é isso. E- Alguma coisa concreta? Algum lugar? T4- Quando agente ficou na mesa, na água... no beirra da água, dentro da água... a água quente que nem um banho... E- Então, acredito que é só isso. Obrigada! ANC - Ancoragem

Turista de origem inglesa, residente na França. Primeira visita ao local e primeiro dia da viagem.

ECH – Expressões-Chave (Negrito)

- Na primerra... a tranqüilidade... ela não esperrava de achar um lugarr assim no meio da Amazônia, seja com água clarra... hummm... com arreia... isso não tem nada a ver com a idéia que mas é mais a idéia da Amazônia... - pra ela é mais a Amazônia um rio com água escurro, e muitas árvorres fechada... muito surpresa de encontrarrr um lugarr assim... é a primerra imagem de quando agente chego de táxi... que acho muitooooo... muito calmo, né... tranqüilo... - A mistura da luz, arreia... o verde, o morrô no fundo e... o lago - as atividades, a pesca, o barco... em resumo, la culturra local... o modo de viver... - ai que agente entender o concreto lá... mas depois agente achar que é muito, muito concreto... e que ver aqui num país de naturreza e esse cheio de concreto... também porque fica muito quente e... ahhh... ela fala, é um... uma contradiçon! (...) agente perguntou como que vai ser quando acabo? Como que vai ser aqui daqui alguns anos? E... - Pra nós, perde muito (...) que tinha um museo muito interressante aqui, e agorra não tem mais... fechado... - é o fim do dia, também pra ela como turrista, é... tranqüilidade... não sabe mais de onde vem e... e esqueça de tudo, de tudos problema (...) então a última, confirma a primerra... a última confirma a primerra. - Como é que se fala... Então, ela não tinha, eles não tinha nenhum idéia porque non... non se informarram (...) Então quando ela chegou, ela não sabia que tinha arreia e tudo isso, ela não sabia... e por isso ela pensava bem o rio escurro, a florresta e... muito diferrente. E também o museo do índio... só. Ela falou isso... é... a segunda decepção foi o museu. (...) [a primeira decepção] O concreto... dimais de concreto. - a tranqüilidade, a paz... é isso (...) Quando agente ficou na mesa, na água... no beirra da água, dentro da água... a água quente que nem um banho...

ID – Idéias Centrais

- Destacou a sensação de tranqüilidade inspirada pela paisagem natural; - Não esperava encontrar em Alter do Chão rio de águas claras e praias de areia branca; - Afirmou que a imagem de Amazônia para ela está mais relacionada ao rio escuro e à floresta fechada; - Destacou a primeira imagem de Alter do Chão, na sua chegada, como calma e tranqüila (vista da “Iha”); - Se interessou e gostou do modo de viver local e das atividades tradicionais, como a pesca; - Demonstrou insatisfação na declaração de contradição entre o lugar, a natureza e o clima local, e o excessivo uso de concreto nas obras; - Mostrou-se preocupada com o futuro do lugar, frente àas mudanças tão evidentes; - Decepcionou-se com o Museu do Índio que está fechado há alguns anos; - Busca e sente no lugar uma tranqüilidade qua a faz esquecer dos problemas; - Nunca tinha ouvido falar de Alter do Chão até chegar a Manaus; - Entre as divergências de expectativas e contato foram citadas como positivas a praia, a areia e as águas, e como negativas o museu fechado e o excesso de concreto;

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- Destacou ainda a sensação de relaxamento atribuída ao fato de terem sentado-se em uma mesa às margens do rio de “água quente como um banho”.

EMS - Elementos Morfológicos e Sócio-culturais

- Tranqüilidade; - Água clara e areia branca; - Vista da “Ilha”; - O verde, a luz, o morro, o Lago Verde; - Museu do Índio; - Praia e mesas à beira d’água.

QUADRO 13: DSC da Entrevista Turista 4 Fonte: A autora, 2007. Entrevista 13 E – Entrevistador T5 – Turista entrevistado 5

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E - Antes de começar eu gostaria de saber informações gerais sobre o entrevistado como nome, origem, formação/área de atuação profissional... T5- Sou Max e... meu orrigem é France, eu chego agorra... e to começando uma pousada... trabalho com turrism, entende... E- Vamos falar um pouquinho das imagens então. São três perguntas sobre as imagens que vão se repetir em todas elas e depois tem mais umas três perguntinhas gerais, assim, sobre a Vila. Podemos começar? Então em cada foto, eu gostaria que você descrevesse a foto e falasse da importância dela. T5- Si... entendo... é uma foto que... é o pôr-do-sol... si pôr-do-sol... eu não falar bem português... esse foto tiro um amigo turrista aqui em praia...

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E- E porque que essa foto é importante pra vc? Por que vc escolheu ela para falar sobre? T5- Porque é bonita ham... a naturreza... a cor... E- E o que vocês destacariam aqui, pra vocês que chamam atenção nesta imagem? O que se destaca mais aqui? T5 – essa bonita aguá... ta o barco e o sol... E- Então na sua segunda foto que é “alter do chão max 012”... são as mesmas perguntas: o que é a foto, por que você achou importante, e o que se destaca nela. T5- essa ai é bom porque ta cheia... a aguá... si, non tem nada di arreia... aqui só aguá agorra... e a soliti... a arvorre sola... hummm... a soliti... é esse hammm... E- E na terceira foto, foto “014”?? T5- É a mesma cosa... mesma cosa que... que... solo aguá... nada di arreia... aparrece a Vila aqui... E- Como tu vês a vila? A questão da obra da orla? Da praça? T5- Agorra quer saber do trabalho lá? Hummm... é milhor pa Alter do Chon... é milhor eu achar que é milhor... E- Então na tua foto 4, que é a “191”... T5- Aqui bonito que... a água que abaixo... diferente di outra ne... acho isso bonita porque ta as duas fotas a mesma coisa... mas diferente né. E- O que te chamou mais atenção no caso dessa?? O que nela é o mais importante na tua opnião? T5- Porque eu achar isso bonito... não é bonito?... eu gostar da praia, da água... da verde... hummm... porque é Alter do Chon também (risos)... a otra também é mesma coisa... tem montanha... atrás... Tapajós... é isso. E- Quando você chegou em Alter do Chão já tinha uma imagem, fazia alguma idéia, imaginava algo de como era Alter do Chão? Antes de vir... T5- Primerra vez? Antes de vir? Hammm... non... non... eu solo... eu vir aqui solo pra beber e relaxar com amigos (risos)... solo parra isso... io vim aqui solo parra isso... depos eu vi como é... e volta muito vezes e fiquei la um poco agorra... E- Como tu vês essa questão de alguém que não conhece Alter do Chão e chega aqui pela primeira vez? Alter do Chão é como esperado ou é diferente em alguma coisa? Pra melhor ou pra pior... Alguma coisa te supreendeu? T5- eu? Na vila, na praia... tudo, tudo... tem muita barrulho... muita musica... in France, non né... aqui in Brasil muito forte... muita musica... obrigaçon de gritarr parra falar... aqui em casa non... non tem... essa impressão... então, muito tranquilo poder andar... na rua... mas tarde, de noite, de madrugada... non dar problema aqui né. E- Ok! Na tua opinião, qual que é o lugar, a vista, a construção, ou a paisagem - qualquer coisa – que tem a cara de Alter do Chão, que é mais marcante pra ti? Que vai te lembrar Alter do Chão sempre? T5- essa... essa língua... língua da praia... a ilha de Alter do Chon... que non é ilha porque ilha, ao redor, é tudo água... non é ilha... E- Bem, não sei se tu teria mais algum detalhe par acrescentar, mais alguma coisa sobre a vila, sobre seu crescimento... T5- Eu achar que vai crescer, non? Non tem como parar... porque todo mundo que parar aqui achar bonito... ai vai crescer... E- E tu achas que isso pode influenciar ou não? Que poderá mudar o interesse? T5 – Acho que sim... mas acho que turista vai vim assim também... não sei o que eles prefere porque eu non poder falar por eles, mas acho que preferre mais tranqüilo... todo mundo que vem aqui, que passa aqui, acha aqui tudo muito bonito, muito lindo, ta... e tranqüilo também... porque é depois aqui outra coisa, porque eu falei muito turista vem aqui comigo.. outra coisa... E- Muito obrigada! Eu acho q é isso...

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T5- Eu só non gosta daquele hotel... feio... quando você quiser da ilha foto, você vê esse... por que fazer isso? Aqui??? Porque ta muito, é... é lajota... até no chon... feio... é alto, quadrado, né... non, non, non... se fazer outra coisa... outra... como se chamar??... cum madeira, o cum paia, cum, cum... né... como todo o cidade daqui, acho que é mió... ninguém gostarr desse... acho que toda mundo fala isso, non? enton, porque dexar fazer isso?? E- Obrigada de novo então! ANC - Ancoragem

Turista de origem francesa. Recém-chegado a Alter do Chão e demosntrou interesse em permanecer e estruturar uma pousada.

ECH – Expressões-Chave (Negrito)

- é o pôr-do-sol (...) Porque é bonita ham... a naturreza... a cor... - essa bonita aguá... ta o barco e o sol... - essa ai é bom porque ta cheia... a aguá... si, non tem nada di arreia (...) a arvorre sola (...) solo aguá... nada di arreia... aparrece a Vila aqui... - [quanto à obra] é milhor eu achar que é milhor... - Aqui bonito que... a água que abaixo... diferente di outra ne... acho isso bonita porque ta as duas fotas a mesma coisa... mas diferente né. - Porque eu achar isso bonito (...) eu gostar da praia, da água... da verde... - eu vir aqui solo pra beber e relaxar com amigos (risos)... - Na vila, na praia... tudo, tudo... tem muita barrulho... muita musica... - então, muito tranquilo poder andar... na rua... mas tarde, de noite, de madrugada... non dar problema aqui né. - a ilha de Alter do Chon... que non é ilha porque ilha, ao redor, é tudo água... non é ilha... - Acho que sim... mas acho que turista vai vim assim também... não sei o que eles prefere porque eu non poder falar por eles, mas acho que preferre mais tranqüilo... - Eu só non gosta daquele hotel... feio... quando você quiser da ilha foto, você vê esse (...) Porque ta muito, é... é lajota... até no chon... feio... é alto, quadrado, né... non, non, non... se fazer outra coisa (...) cum madeira, o cum paia, cum, cum... né...

ID – Idéias Centrais

- Destacou cena do pôr-do-sol, com sua cor e a natureza presente; - Citou a paisagem da praia na seca e na cheia, destacando suas diferenças absolutas em diferentes épocas do ano no mesmo local (paisagens intermitentes); - Inclui nas descrições de cenas de natureza, elementos humanos como os barcos e a própria vista da Vila; - Acredita que as obras da orla e da praça são boas para a localidade e para a sua população; - Demonstra apreciação pelas características naturais do local: a água, a praia, o verde; - Foi buscar em Alter do Chão um local para relaxar e estar com os amigos; - Gosta da tranqüilidade e da segurança para a circulação na Vila; - Reclama dos sons, do excesso de música e do volume nas áreas públicas (em carros, bares e restaurantes); - Acredita que os demais turistas, tanto quanto ele próprio, preferem maior tranqüilidade quanto aos ruídos; - Afirma não ter gostado da construção de um hotel na orla da Vila e refere-se a ele como “feio, alto, quadrado” e ainda faz considerações negativas com relação ao uso do revestimento em cerâmica esmaltada na fachada; - Gosta e defende a utilização de materiais regionais.

EMS - Elementos Morfológicos e Sócio-culturais

- Pôr-do-sol; - Natureza, luz, barco; - Paisagem da praia na cheia: água, árvores, Vila; - Paisagem da praia na seca; - Tranqüilidade e segurança; - Hotel na orla: alto, feio, quadrado, lajota; - Materiais regionais

QUADRO 14: DSC da Entrevista Turista 5 Fonte: A autora, 2007.

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Entrevista 14 E – Entrevistador T6 – Turista entrevistado 6

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E- Então vamos conversar a conversa c a Virgínia... Virgínia, primeiro de tudo eu queria q tu te apresentasses um pouquinho, dizer de onde tu vens, das tuas atividades... é oq agente chama da ancoragem do entrevistado, é oq vais direcionar as tuas respostas... T6 – Meu nome é Virginia Salgado Calábria, eu tô aqui em Santarém, na Vila de Alter do Chão desde janeiro... a primeira vez que eu vim pra cá foi em 2004 e... eu fiquei encantada com a região... hoje em dia eu trabalho no Ipam, na verdade participo de uma pesquisa do CNPq, pra trabalhar com manejo de pesca, com acordo de pesca. E- Tua origem? De onde tu vens? T6 – Eu sô nascida nos Rio de Janeiro. E- Então Virginia, eu queria, por favor, que tu começasses a falar um pouquinho dessa tua primeira foto, que é Alter do Chão 1, descreve pra mim a imagem e porque tu escolheste essa imagem pra conversar, porque tu achaste que ela é importante? T6- Porque eu acho que assim, um dos motivos que me fez gostar daqui, foi a qualidade de vida, e essa foto do menino aqui segurando o pexe, quando eu vim a primeira vez aqui, eu alugava um pedaço de varanda na casa de um pessoal local e um dia agente tava tomando café da manhã e aí agente viu esse pexe passando, e aí a Mônica falou “nossa! Olha o tamanho daquele Tucunaré!! Imagina esse pexe assado, assim, assado, como não ficaria gostoso...”, aí eu falei “então ta bom, eu vou comprar o peixe e você prepara”, e aí foi o nosso almoço, foi no dia da copa... e eu acho que esse tipo de coisa só acontece aqui, né... quer dizer numa cidade grande tu não tens mais essa oportunidade do pexe saindo do rio você comprar na mão do pescador... E- Me diz assim, o que tu achas de elementos ou de coisas que aparecem na imagem que tu destacarias como os centrais, os mais importantes, sei la... que tu destacarias?? T6 - O pexe e o menino. E- Então agente pode ir pra segunda? T6 - Pode. E – A segunda foto é denominada “jamaraquá-samaúma”... T6- É, essa aí é aqui perto, um turismo que tem bem próximo aqui de Alter do Chão, no Maguari e... essa é uma árvore gigantesca que tem lá e que realmente impressiona... eu já fui lá 3 vezes e toda vez que eu vou lá é tão impressionante que eu esqueço o quanto impressionada eu fiquei da última vez. E essa é uma amiga minha que veio me visitar, que veio passar um final de semana comigo. E- E por que tu achaste importante, legal de trazer essa imagem pra agente conversar? T6- Porque eu acho que é uma coisa muito impressionante realmente, né, o tamanho da natureza, o poder da natureza, essa é uma árvore que se agente olha pra cima e não consegue ver o fim dela, e eu acho isso impressionante, é uma coisa que só tem aqui, que tem super-valorizar e, graças à Deus, eu acho que o pessoal já ta vendo o valor dela, eu acho que essa árvore traz renda pra população local, né, é uma caminhada puxada, mas eu acho que vale à pena, eu duvido que uma pessoa caminhe, caminhe, camainhe e ache, e chegue lá e ache que não valeu à pena tanto esforço porque realmente, é muito impressionante. E- E o que tu destacarias nessa foto? T6- A própria árvore, e assim, acho importante ter as pessoas na frente só porque dá pra ver o tamanho, né... dá pra ter uma noção melhor do que é, né, que isso aqui é só um lado da árvore, né, são três desses. E- Então é isso? Vamos para a próxima? A terceira foto da Virgínia é o “ensaio do Sairé 12”... T6 – Isto... o Sairé é uma festa é... local, realizada pela população... não sei direito a história do Sairé, mas isso aí, eu acho... essa foto aí pra mim, é a melhor parte de toda a festa porque é quando você, você consegue ter contato realmente com a população e só as pessoas que moram, participam da festa. E esse daí, particularmente, é o ensaio duuu... du grupo dos idosos da Vila de Alter do Chão.

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E- Ta, e a importância pra ti, dessa cena? T6 - Ahh... eu acho que é a união da Vila né, a união das pessoas, a organização do grupo das pessoas da terceira idade e que continuam participando da manifestação cultural da Vila... É uma festa bastante importante mas que ta tomando um outro rumo, eu acho, né... e ta perdendo um pouco da parte cultural, ta entranduuu... muito no comercial e eu acho que a população mesmo, não ta lucrando com isso, porque é ilusório eles acharem que tão ganhando dinheiro... monta-se um monte de barracas, vai muita gente de fora, que não é só de Alter do Chão, e depois a sujeira fica toda pra trás né... e acontecem muitos roubos nessa data, porque invadem as casas vazias, tem vários casos, assim, de amigos meus, 3, 4, 5 casas que agente conhece, que estavam vazias e que entraram... com certeza são pessoas de fora... então, acho que tem um lado bom que é essa parte cultural aí, que devia ser mais valorizada, mas tem o lado ruim também que é da festa, da... da bandalha, né, da bebedeira que é quando eles montam as barracas lá em baixo... aquela quantidade de barracas também é um absurdo, aqui nessa próxima foto... E- E o que tu destacarias de elementos? T6 – Nessa foto? As pessoas, as cores, a dança... a união né, porque aí é legal ver essas pessoas de mão dada, bem legal, essa foto é muito legal. E- Ta Virgínia, essas perguntas meio que vão se repetir em todas as fotos, ta? No final vai ter alguma coisa mais específica sobre a Vila. T6- Essa aí, essa outra foto aí, também da festa, só... são aquelas pessoas que tavam dançando ali, o mesmo grupo, só pra ter um foco mais perto... Esse daí é o que eu falei da praça que é a parte que não tem nada de folclórico, que muitas vezes nem ta tocando o carimbó, ta tocando só o brega, que entra essa coisa da bebedeira, né, é um monte de som ligado, é muito barulho, muita sujeira... que não tem necessidade de tantas barracas, pessoas acampando pela praça, né... não tem banheiro... então, assim, os próprios moradores reclamam que... quando acordam... tem xixi na porta, a padaria não abre, algumas pessoas do comércio fecham, né, porque acham que não vale à pena mesmo... essa é a parte ruim. E- Então vamos p tua próxima foto, “alter do chão- caju 3”? T6 – ah!! Essa é uma das coisas muito legais que tem aqui, que são as frutas, né, em cada época, uma fruta diferente, né. Essa daí foi do caju, que eu descobri que é a fruta que eu mais gosto, mas tem a manga também... e eu fico muito impressionada porque aqui as pessoas realmente não tem fome, porque tem pexe e fruta o ano inteiro, quando acaba uma fruta entra outra, e não é que tem, é que sobra, que estraga mesmo, tanto que se você quiser comprar manga ou caju, é difícil, porque... num tem né... cê ta com vontade de comer caju, cê vai ali, pega um saquinho e volta com a sacola cheia... E- Eeee... Qual a importância pra ti de comentar essa imagem? T6- Eu acho que isso é qualidade de vida também, né... você saber que... você de fome, você não vai morrer. E que talvez, nem eles mesmo... a população mesmo não valorize, mas as pessoas de fora valorizam, e que talvez isso que tenha que ser mostrado pra eles. Porque assim, é uma forma que eles teriam de ganhar dinheiro também, porque as pessoas que vem há pouco tempo pra cá, adoram manga, adoram caju... muitas vezes querem tomar um suco e não encontram, entendeu? Várias vezes eu quis tomar um suco de manga e não tinha, como pode?? Então assim, geléia de manga nas pousadas também, assim... doce de caju, que é uma coisa muito barata que não tem... as coisas regionais você encontra pouco, eu acho, pra venda, né, pro turista. E- O que tu destacarias aí? T6- Ahh! O caju!! O tamanho do caju (risos). E- Então vamos para a foto “alter do chão-ponta do cururu 14”? Descreve um pouquinho essa imagem pra agente.

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T6- Isso é... um lugar que tem aqui perto, dá uma hora de caminhada... e que também eu acho que é muito impressionante, porque cada vez que você passa por lá, a vista é completamente diferente... Nessa parte especificamente eu fiquei muito impressionada porque, assim, se você não bota o dedo dentro da água, você não acredita que é água doce, que parece mar... dá pra, dá pra achar que tá numa das praias de Fortaleza, assim... e... isso é uma das coisas que me encanta, né... pode ver que você pode fazer o passeio quantas vezes você quiser que nenhuma vez vai se repetir, vai ser sempre diferente... essa foto, eu voltei lá uma semana depois e não tinha mais água, era só areia, já tava totalmente seco... as paisagens daqui também são muito impressionantes é tudo muito grandioso, não só as árvores e as frutas, né, mais a paisagem, o mar, né, é tudo muito grande, imenso, deserto e essas coisas eu gosto bastante, por isso eu escolhi essa aqui... E- E a importância, na tua opinião, de incluir essa imagem, de comentar... T6- Ahh é pra agente ver que tem lugares muito bonitos ra serem valorizados mesmo, ah... tem isso mesmo, então eu acho que de alguma forma tem que preservar isso, porque se acaba esse tipo de paisagem, vai perder a graça, vai entrar e vai ficar igual a todos os outros lugares, assim, então... e infelizmente eu acho que é isso que ta acontecendo, né. Se você olhar já as bordas lá de Alter do Chão, a forma como eles tão construindo, como eles construíram a orla, que tem... que derrubaram 2 árvores pra botar uma armação de ferro com telha de brasilit, quando na verdade, eu tenho certeza que se é pra ser um ponto turístico, que o turista ia ficar muito mais maravilhado se tivesse um banco simples debaixo de uma árvore, porque é muito melhor você falar “aí que delícia...”, e você ta aqui sentado debaixo dessa mangueira, do que tá aqui sentado num banco de ferro que é o que eu encontro na grande cidade, não tem a ver... Então eu acho que eles estão descaracterizando bastante Alter do Chão, acho que você olha pra orla, é a maior prova disso... a praça... Alter do Chão eu não conheci a praça que tinha antes, mas os próprios moradores dizem que era toda de madeirinha, cheia de flores e que um belo dia eles acordaram e que tava lá, aquela praça, toda de cimento, aquele coreto que eles dizem que é horroroso, os bancos feitos de cimento, quando dá oito da noite ninguém consegue sentar porque esquentou... foi assim, muito mal feito, acho que eles aproveitam... tão perdendo... eles poderiam caracterizar as coisas com... com materiais mais característicos mesmo, né, que é a madeira e a palha, que é o que fica mais bonito, mas não... já tem aquele hotel horroroso também, que agente costuma chamar de banheirão, que quem ta de fora é o que você vê, e eles acham que esse que é o progresso, né... e assim, alguns moradores acham, mas eu acho que não é a maioria... e esse monte de asfalto que jogam em Alter do Chão, que só faz esquentar e que é totalmente desnecessário... deviam valorizar um pouco o andar à pé, andar de bicicleta, pra que esse monte de asfalto??? Desnecessário também, nem cabe dentro da vila, né. E- Bem, legal que tu já falaste sobre a orla, que era uma coisa que eu iria te perguntar depois... Na tua foto “ponta de pedras 040”, descreve, por favor. T6- Ta... Essa daí tb foi uma... é porque aqui as coisas são super... é... tudo é meio assim imprevisível, tudo é sempre uma surpresa. Agente... eu tava passeando com esses meus dois amigos, agente tinha ido fazer um passeio de barco, tava ventando muito, então agente resolver ir à pé enquanto o vento não passava e depois uuu... o... a pessoa da catraia encontraria com agente. E agente caminhou, caminhou, caminhou e aí agente achou uma casa e foi pedir água e tava o seu Vivaldo que tomava conta dessa casa... ele tava lá, todo vestido de soldado, até achei que fosse uma coisa meio militar, assim, mas na verdade não era, era só o caseiro... E aí agente explicou pra ele o que tinha acontecido, e ele tava comendo um peixe que ele mesmo tinha pescado, serviu peixe pragente, delicioso, esse meu amigo é da Finlândia e ficou super-impressionado, disse que foi o melhor peixe que ele comeu na vida dele, assim, foi uma delícia, e... mesmo agente dizendo pro seu Vivaldo que não queria, que não queria, ele dizia que se agente não comesse ele ia dar pro cachorro, porque tinha pescado muito... e aí depois agente ia continuar a caminhada e ele falô “não, mas eu vou levar vocês por

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uma trilha no meio da floresta”. Então assim, o passeio que agente ia fazer que era só um passeio de canoa até Ponta de Pedras, na verdade, foi um passeio de barco, depois uma longa caminhada pela praia, depois uma caminhada pela floresta... agente ainda tomo banho de igarapé e, aí sim, que agente chegou no ponto final, assim... mudou completamente o programa e foi muuuito legal. Aí é isso. E- Mais alguma coisa que tu queiras comentar como importância? T6- Acho que isso pro turismo, é muito importante, né. Eu acho que as pessoas que procuram, que querem conhecer a região amazônica tão procurando é isso aí que agente viveu nesse dia, que assim, agente foi querer fazer uma coisa e aconteceu outra completamente diferente, não muito programada, mas que foi super-divertido e bem diferente mesmo... Pragente tudo foi uma novidade. E acho que a população local fosse assim... tivesse uma educação visando isso, né, mostrando pra eles que não precisa trazer pra cá o que agente vê do lado de fora, que tem que aproveitar o que agente tem aqui, pra ele seria muito bom, e não essa comunicação massiva de que o modelo que ta lá fora é que é o modelo importante, quando na verdade não é. Agente sabe que o que ta sendo valorizado aqui, agora, é o que agente tem aqui, se agente copiar o que ta lá fora, agente vai ser igual... o importante é ser diferente e não igual o que a mídia passa pragente, do que é bom e do que não é, né... que o certo é o jeito como eles vivem, isso é que é o bom agora, q é isso que todo mundo ta procurando. E- Tu destacarias alguma coisa nessa foto? Dos elementos? T6- Não... não... Só o seu Vivaldo. Aí é a caminhada, é a continuação daquela foto, a caminhada que ele levou agente pra fazer por dentro da floresta (foto 045). E- Então a tua próxima foto é a foto “alter do chão 006”, descreve um pouquinho, por favor. T6 – Ahh essa aí é só um... esse aí é um estilo de vida, né, eu acho, também que é bem diferente, que é... essa coisa de dormir na rede, de ta sempre na rede, na sacada... essa aí é na casa de umas amigas... e eu acho legal assim essa coisa de, dentro da casa, essa rusticidade, essa simplicidade... elas também são de fora, são de SP, são duas pessoas, e assim... conversá sentada na rede, né, depois do almoço cada um vai pruma rede, muitas redes espalhadas pela casa, tudo muito aberto... aqui ninguém usa muito a sala... é tudo muito na varanda, o tempo todo na varanda. Eu acho isso bem legal. E- E a importância pra ti de escolher essa imagem pra discutir? T6- Não... é só porque é uma forma de vida que é bem diferente, né, eu acho, do que eu tinha lá em outros lugares, né, e que essas pessoas aqui não conseguem imaginar, né, e que eu acho ruim... que é assim, é... eu acho que isso mostra que agente precisa de muito menos do que agente acredita q precisa, né. E- E tu achas que isso aqui tem um valor turístico também?? T6- Ahh eu acho que tem um valor turístico muito grande, porque isso é qualidade de vida, e eu acho que qualidade de vida o turista gosta de ver, né, gosta de saber... tudo bem que dormir na rede, muitas pessoas não acham que não é muito difícil, mas quem não gosta de dar uma deitadinha na rede? de dar uma relaxadinha na rede, né? Eu acho que tem valor turístico. E- Tu achas que, por exemplo, esse tipo de construção... T6- Eu acho que esse tipo de construção devia ser super-valorizada, eu acho que dentro da Vila deveria ser só esse tipo de construção que deveria existir, ser permitido... assim, pode até mudar um pouco o telhado de palha, porque às vezes tem que ficar trocando, mas eu acho que esse deveria ser o tipo de construção... o máximo de palha, o máximo de madeira, tudo muito aberto... porque assim, eu num entendo como é que na frente da praia, com aquele vento, você vai, você precisa de janela e ar-condicionado... pra mim não faz nenhum sentido aqui... aqui se tiver árvore, não tiver tanto asfalto, não precisa de... debaixo de uma árvore, sem asfalto não tem a menor necessidade de um ar-condicionado, né... pra mim não faz nenhum sentido. Tanto que agente fica aí, e fica muito bem, e eu acho que o turista

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também, não ta aqui pra... pra encontrar igual o que ele tem de fora, né, ele ta aqui pra ver isso, o que é diferente... é isso que tem que ser valorizado. E- Queres destacar algum elemento? T6- Não... E- Então podemos ir pra próxima foto? “alter do chão 051”... descreve pragente? T6- Ahh isso daí é um banho de igarapé, mais um desses programas inesperados que agente foi num... num festival do açaí... essas pessoas todas aí também são de fora, elas são do Rio Grande do Sul... agente tava numa comunidade próxima e o Rodrigo encontrou um amigo que falou “vamo lá em casa fazê um pexe”. Agente chegou lá e no fundo do quintal tinha esse igarapé, que quando ele comprou o terreno tava totalmente desflorestado, então todas essas árvores que você ta vendo aqui atrás, todas essas palmeiras que são plantas regionais, ne, que é açaí, bacaba... foi ele que plantou de novo, ele que refloresto, ele é biólogo, trabalha com isso e aí ele colocou de volta... assim, é uma coisa super-simples e que todo mundo adora, na verdade, que a população daqui não dá o valor que tem. Então quer dizer que se o cara tem um lugar desse ele pode perfeitamente convidar os turistas, faz um restaurante com direito a banho de igarapé, olha que coisa deliciosa, qual o turista que não gostaria, né, e eu acho que isso é que tem que ser incentivado, não aterrarem os igarapés como tão fazendo aqui, né... muito pelo contrário. E- Tu destacarias alguma coisa, algum elemento, nessa foto? T6- Não... també é... é tudo né. É o igarapé em si, a surpresa do igarapé, as plantas atrás que é muito mais bonito do que um prédio, porque aqui todo mundo tira... olha aqui como é muito mais gostoso estar debaixo dum monte de planta do que debaixo de um telhado, né, de brasilit ainda por cima... E- Então vamos para a foto “ilha do amor 002”. Descreverias pragente, por favor? T6- Ah isso é aquela parte ali da frente, né. Tem... é... tem duas coisas que eu acho que tem que ser destacadas aí: uma, que... é a surpresa que agente tem a cada dia em Alter do Chão quando agente acorda e vê a água subindo e descendo, então, é uma coisa muito impressionante... e isso é bem legal também de mostrar pro turista, entendeu, de... acho que impressiona só de você mostrar ali da ilha, né, eu mostro essas barraquinhas cê fala “ó, ta vendo essa barraquinha? Vai até o topo”... assim, é uma coisa que só você vendo pra você acreditar... acreditar que agora tu atravessa à pé e que em três meses você tem que pegar uma canoa e você ta pulando do deck, aqui, que a água sobe-desce três, quatro metros, acho muito legal. E a parte ruim disso tudo, eu acho que é também um pouco da educação assim, também a educação ta muito mal feita, porque com esse monte de banhista, é... aqui ta vendo que tem uma criança, e parte barco à motor, né, fica aquela banana-boat enlouquecidamente de um lado pro outro, assim uma coisa super-anti-ecológica, banana-boat devia ser totalmente proibido aqui, aquela lancha pra cima e pra baixo... porque não colocar umas canoinhas de madeira, né, como são as canoas do Tapajós, porque não dar uma valorizada nas coisas locais mesmo? Acho que o turista ia adorar e... fora o perigo que é, né, um motor cruzando com as pessoas, com os banhistas, o tempo inteiro. Aqui nesse canalzinho às vezes tem engarrafamento de barco à motor... Não... não tem área delimitada... Na verdade, deveria ser proibido passar barco a motor aqui, entendeu. Quer passar o barco a motor, devia passar desligado, no remo, e depois é que... que ligaria. E inclusive eu acho que devia ser proibido jet-ski... e a lancha, desse lado do rio, desse lado do lago... porque num bota do outro lado, né? E- Qual a importância, pra ti, de discutir essa imagem? De trazer essa imagem aqui pra nós? T6- Ah... porque eu acho que tem que ser uma coisa organizada mesmo, né. O turismo ta crescendo muito, acho que Alter do Chão ta sendo cada vez ta mais... acho que ta sendo mais procurada, e eu acho que tem que ter uma coisa organizada mesmo, pragente evitar acidente, né, segurança... isso é importante. E- Tu destacarias alguns dos elementos, pragente, nessa imagem?

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T6 – Não, só a própria imagem mesmo, que é uma imagem muito bonita, né... aqui, eu acho legal também, essa coisa deles botarem a cadeira dentro d`água... eu acho que isso tudo é muito relaxante, é bem... isso, esse tipo de coisa tem que ser bem valorizada. Eu nem gosto quando tem muita barraca não, eu prefiro uma coisa mais deserta, mas aí eu acho ue você tem que respeitar poque tem muita gente que gosta da moleza mesmo, né... então, acho bem legal. E acho também que ta muito sujo, né, acho que tem que ter um programa bem forte de educação ambiental aqui em relação à limpeza e lixo mesmo, porque aqui não tem nenhuma consciência. E acho que o próprio turista, mais até os turistas locais, não tem nenhuma consciência. Tem muitas vezes que você vai lá, você sai, no fim do dia... tem garrafinha plástica pra todo lado... a água, né... que aqui eles vendem aquela garrafinha pequena... aquilo devia ser proibido (risos), aquela garrafa é um absurdo porque qualquer pessoa bebe muito mais do que aquilo... então não tem a menor necessidade de uma água daquele tamanho, né... agora eu levo a minha água, só pra não consumir aquela garrafa... E- Podemos avançar? T6- Podemos. E- Então na foto, “alter do chão- chá de bebe denise 006”, o que você descreve? T6- Essa aí é uma menina, Fernanda, é filha de uma professora da UFPA... não, essa foto eu acho legal porque assim, eu observo muito as crianças quw vem de fora, né, que moram aqui porque os pais escolheram morar aqui, que poderiam ta num grande centro como Rio, SP, Recife, Salvador... e como eles tem uma vida completamente diferente... então, um desses bichinhos que, imagina uma criança que não convivesse aqui, ia pegar desse jeito, numa lagarta... nem sei se é uma lagarta, acho que parece um camaleão, um filhote de camaleão e pega com a maior naturalidade e eu acho... acho isso muito legal nas crianças que vão de bicicleta sozinhas pra casa, né, vão pra escola, cê vê as crianças circulando, não tem aquele stress das grandes cidades, né... eu acho isso bem importante... é qualidade de vida mesmo... e acho que isso pro turista também é muito válido, isso é uma coisas assim que meus sobrinhos mais querem vim pra cá é quando eu falo que eles vão poder andar sozinhos, ir na sorveteria sozinhos... já tem sete anos e no RJ não podem fazer nada sozinhos. E isso também tem que ser mantido aqui... acho que tem que se pensar muito nisso aqui, que a violência vai chegar, ta chegando, e é importante que os moradores tejam, fiquem bem conscientes mesmo, porque se chegar mesmo vai ser uma porcaria, tipo vai ser uma porcaria pra todo mundo, entendeu, tanto pro turista quanto pra eles mesmos, né, porque vão perder essa tranqüilidade. E- Destacarias alguma coisa nessa cena? T6- Ahh a naturalidade que a Fernanda ta segurando o bicho, né. Que eu imagino assim, que uma outra criança de fora, jamais pegaria num camaleão... com essa amizade, acho que com esse jeito... olha como é que ela ta pegando nele (risos). E- Então agora deixa te fazer só mais algumas perguntinhas mais gerais, ta. Duma forma geral, tu falaste que tu vistes em 2004 pela primeira vez, antes de tu chegares em Alter do Chão, o que tu imaginavas assim “vou encontrar numa cidade no meio da Amazônia... tal coisa”? E qual a diferença disso pro que tu encontraste? T6- Eu não vim pra Alter do Chão, eu vim porque eu fui participar de um projeto de turismo comunitário, que chama Projeto Bagagem, e eu vim porque o projeto saia daqui, então, eu não esperava absolutamente nada... eu esperava... entrar na Amazônia, assim... eu queria conhecer a região amazônica, eu gosto muito de viajar e esse era o meu objetivo, e aí como o projeto bagagem tinha uma proposta legal, que era de contato com as comunidades, conhecer um pouco a parte social, foi por isso que eu vim. Quando eu cheguei, fiquei muito surpreendida em Alter do Chão, achei muito bonito. E- Mas tu não tinhas nenhuma imagem, por ser na Amazônia? Tipo “numa cidade da Amazônia eu ia encontrar tais coisas...”?

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T6- Não, não tinha nenhuma noção, não tinha nenhuma idéia, nem parei pra pensar nisso... eu queria entrar dentro do barco, encontrar as pessoas... então, não esperava nada... E- Alguma coisa te surpreendeu? Tipo, “nunca imaginei que podia ter tal coisa...”? T6- Ahhh nunca imaginei que pudesse ter uma vista tão linda realmente, nunca imaginei que tivesse, um, uma... um lugar tão bonito como Alter do Chão... fiquei bem surpresa desde o primeiro momento, tanto que eu falei assim, botei minha vida... mas assim, eu não vim pra cá denovo só por Alter do Chão, porque eu sempre quis uma forma mais alternativa, e aqui foi um lugar, como eu trabalho com essa parte de desenvolvimento social... então por isso eu vim parar aqui... não foi só pela beleza... mas é um lugar bem surpreendente que eu consigo imaginar qualquer pessoa visitando e gostando, é certo. E- E alguma coisa te surpreendeu negativamente? T6- Na primeira vez, não... foi pouco tempo, fiquei uma noite só... Depois que voltei, eu fico muito triste que... que Alter do Chão ta crescendo de uma forma super-desorganizada... acho que as grandes lideranças, o governo ta fazendo de uma forma totalmente errada, não entendo como pode ser um lugar tão lindo e que ta sendo descaracterizado da forma como está sendo... não consigo entender, eu acho que se continuar desse jeito, em dois, três, quatro... no máximo cinco anos, num tem mais Alter do Chão como é, entendeu. Vai virar um turismo banal, vai perder, não vai ter mais o diferencial, vai ficar igual a qualquer outro balneário... o sistema de esgoto também ta indo tudo pra dentro do lago, assim, quanto tempo vai durar então? Ou seja, ta ganhando dinheiro os donos, né, algumas poucas pessoas tão ganhando dinheiro e a população mesmo não ta. Depois essas pessoas vão sair daqui, vão pra outro lugar, ganhar dinheiro em outro lugar... eu acho que isso muito, bastante problemático... E- Por fim, mais uma questaozinha que é: pra ti, o que é Alter do Chão, a imagem? Seja paisagem, vista, construção, lugar... que te lembra “isso é Alter do Chão”? Que em qualquer lugar que te falarem Alter do Chão, você vai lembrar? T6- Ahhh eu acho que é a ilha do amor com as barraquinhas de palha... que eu espero que pelo menos isso eles preservem, porque se acabarem as barraquinhas de palha aí... né, aquela ilha, com as barraquinhas e a serra Piroca no fundo, acho que é bem marcante. Que eu acho que é uma visão bastante impactante, pena que construíram aqueles quiosques também, que é um absurdo, aqueles quiosques da orla... em vez de fazer uma coisa aberta, né, com madeirinha, palhinha... que tem muito mais a ver com a orla e com o visual, aquela coisa de cimento, ferro, uma coisa horrorosa... então assim... mas, pelo menos assim, da orla olhando pra frente agente não vê o ferro que ta embaixo dagente, então eu acho que isso é bem marcante... E- Bom, é basicamente isso, não sei se tu tens mais alguma coisa a acrescentar até sobre a orla, ou sobre... sobre qualquer coisa... T6 – Não, acho que é isso... ANC - Ancoragem

Turista do estado do Rio de Janeiro. Trabalha com pesquisa em instituição governamental voltada para a sustentabilidade, para o meio ambiente.

ECH – Expressões-Chave (Negrito)

- um dos motivos que me fez gostar daqui, foi a qualidade de vida (...) e eu acho que esse tipo de coisa só acontece aqui, né... quer dizer numa cidade grande tu não tens mais essa oportunidade do pexe saindo do rio você comprar na mão do pescador... - essa é uma árvore gigantesca que tem lá e que realmente impressiona... eu já fui lá 3 vezes e toda vez que eu vou lá é tão impressionante que eu esqueço o quanto impressionada eu fiquei da última vez. (...) Porque eu acho que é uma coisa muito impressionante realmente, né, o tamanho da natureza, o poder da natureza, essa é uma árvore que se agente olha pra cima e não consegue ver o fim dela, e eu acho isso impressionante, é uma coisa que só tem aqui, que tem super-valorizar - você consegue ter contato realmente com a população - a organização do grupo das pessoas da terceira idade e que continuam participando da manifestação cultural da Vila... É uma festa bastante importante

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mas que ta tomando um outro rumo, eu acho, né... e ta perdendo um pouco da parte cultural, ta entranduuu... muito no comercial e eu acho que a população mesmo, não ta lucrando com isso - As pessoas, as cores, a dança... a união né - que não tem necessidade de tantas barracas, pessoas acampando pela praça, né... não tem banheiro... então, assim, os próprios moradores reclamam - Essa é uma das coisas muito legais que tem aqui, que são as frutas, né, em cada época, uma fruta diferente, né. (...) e eu fico muito impressionada porque aqui as pessoas realmente não tem fome, porque tem pexe e fruta o ano inteiro, quando acaba uma fruta entra outra, e não é que tem, é que sobra, que estraga mesmo (...) Eu acho que isso é qualidade de vida também, né... - as coisas regionais você encontra pouco, eu acho, pra venda, né, pro turista. - e que também eu acho que é muito impressionante, porque cada vez que você passa por lá, a vista é completamente diferente... Nessa parte especificamente eu fiquei muito impressionada porque, assim, se você não bota o dedo dentro da água, você não acredita que é água doce, que parece mar... - as paisagens daqui também são muito impressionantes é tudo muito grandioso, não só as árvores e as frutas, né, mais a paisagem, o mar, né, é tudo muito grande, imenso, deserto e essas coisas eu gosto bastante, por isso eu escolhi essa aqui... - então eu acho que de alguma forma tem que preservar isso, porque se acaba esse tipo de paisagem, vai perder a graça, vai entrar e vai ficar igual a todos os outros lugares - e você ta aqui sentado debaixo dessa mangueira, do que tá aqui sentado num banco de ferro que é o que eu encontro na grande cidade, não tem a ver... Então eu acho que eles estão descaracterizando bastante Alter do Chão, acho que você olha pra orla, é a maior prova disso... a praça (...) foi assim, muito mal feito, acho que eles aproveitam... tão perdendo... eles poderiam caracterizar as coisas com... com materiais mais característicos mesmo, né, que é a madeira e a palha, que é o que fica mais bonito, mas não... já tem aquele hotel horroroso também, que agente costuma chamar de banheirão, que quem ta de fora é o que você vê, e eles acham que esse que é o progresso, né... - deviam valorizar um pouco o andar à pé, andar de bicicleta, pra que esse monte de asfalto??? Desnecessário também, nem cabe dentro da vila, né. - E aí agente explicou pra ele o que tinha acontecido, e ele tava comendo um peixe que ele mesmo tinha pescado, serviu peixe pragente, delicioso, esse meu amigo é da Finlândia e ficou super-impressionado, disse que foi o melhor peixe que ele comeu na vida dele, assim, foi uma delícia - Acho que isso pro turismo, é muito importante, né. Eu acho que as pessoas que procuram, que querem conhecer a região amazônica tão procurando é isso aí que agente viveu nesse dia, que assim, agente foi querer fazer uma coisa e aconteceu outra completamente diferente, não muito programada, mas que foi super-divertido e bem diferente mesmo... - Agente sabe que o que ta sendo valorizado aqui, agora, é o que agente tem aqui, se agente copiar o que ta lá fora, agente vai ser igual... - esse aí é um estilo de vida, né, eu acho, também que é bem diferente, que é... essa coisa de dormir na rede, de ta sempre na rede, na sacada... essa aí é na casa de umas amigas... e eu acho legal assim essa coisa de, dentro da casa, essa rusticidade, essa simplicidade (...) muitas redes espalhadas pela casa, tudo muito aberto... aqui ninguém usa muito a sala... é tudo muito na varanda, o tempo todo na varanda. Eu acho isso bem legal. (...) é só porque é uma forma de vida que é bem diferente - Eu acho que esse tipo de construção devia ser super-valorizada, eu acho que dentro da Vila deveria ser só esse tipo de construção que deveria existir, ser permitido... assim, pode até mudar um pouco o telhado de palha, porque às vezes tem que ficar trocando, mas eu acho que esse deveria ser o tipo de construção... o máximo de palha, o máximo de madeira, tudo muito aberto...

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- Agente chegou lá e no fundo do quintal tinha esse igarapé, que quando ele comprou o terreno tava totalmente desflorestado, então todas essas árvores que você ta vendo aqui atrás, todas essas palmeiras que são plantas regionais, ne, que é açaí, bacaba... foi ele que plantou de novo, ele que refloresto, ele é biólogo, trabalha com isso e aí ele colocou de volta... assim, é uma coisa super-simples e que todo mundo adora, na verdade, que a população daqui não dá o valor que tem. (...) a surpresa do igarapé, as plantas atrás que é muito mais bonito do que um prédio (...) olha aqui como é muito mais gostoso estar debaixo dum monte de planta do que debaixo de um telhado, né, de brasilit ainda por cima... - é a surpresa que agente tem a cada dia em Alter do Chão quando agente acorda e vê a água subindo e descendo, então, é uma coisa muito impressionante... - porque não colocar umas canoinhas de madeira, né, como são as canoas do Tapajós, porque não dar uma valorizada nas coisas locais mesmo? Acho que o turista ia adorar e... fora o perigo que é, né, um motor cruzando com as pessoas, com os banhistas, o tempo inteiro. - O turismo ta crescendo muito, acho que Alter do Chão ta sendo cada vez ta mais... acho que ta sendo mais procurada, e eu acho que tem que ter uma coisa organizada mesmo - aqui, eu acho legal também, essa coisa deles botarem a cadeira dentro d`água... eu acho que isso tudo é muito relaxante, é bem... isso, esse tipo de coisa tem que ser bem valorizada - E acho também que ta muito sujo, né, acho que tem que ter um programa bem forte de educação ambiental aqui em relação à limpeza e lixo mesmo, porque aqui não tem nenhuma consciência. E acho que o próprio turista, mais até os turistas locais, não tem nenhuma consciência - eu observo muito as crianças que vem de fora, né, que moram aqui porque os pais escolheram morar aqui, que poderiam ta num grande centro como Rio, SP, Recife, Salvador... e como eles tem uma vida completamente diferente (...) acho isso muito legal nas crianças que vão de bicicleta sozinhas pra casa, né, vão pra escola, cê vê as crianças circulando, não tem aquele stress das grandes cidades, né... eu acho isso bem importante... é qualidade de vida mesmo... - Alter do Chão ta crescendo de uma forma super-desorganizada... acho que as grandes lideranças, o governo ta fazendo de uma forma totalmente errada, não entendo como pode ser um lugar tão lindo e que ta sendo descaracterizado da forma como está sendo (...) Vai virar um turismo banal, vai perder, não vai ter mais o diferencial, vai ficar igual a qualquer outro balneário... - Ahhh eu acho que é a ilha do amor com as barraquinhas de palha... que eu espero que pelo menos isso eles preservem, porque se acabarem as barraquinhas de palha aí... né, aquela ilha, com as barraquinhas e a serra Piroca no fundo, acho que é bem marcante. - pena que construíram aqueles quiosques também, que é um absurdo, aqueles quiosques da orla... em vez de fazer uma coisa aberta, né, com madeirinha, palhinha... que tem muito mais a ver com a orla e com o visual, aquela coisa de cimento, ferro, uma coisa horrorosa...

ID – Idéias Centrais

- Referencia a qualidade de vida local por conseguir comprar o peixe fresco, direto do pescador; - Se diz impressionada com a força da natureza quando vê a Samaúma. Para ela, na região tudo é impressionante: as paisagens, as árvores, as paisagensç - Destaca seu contato com a população local, assim como a união das pessoas especialmente para eventos como a festa do Sairé com suas cores, música e dança; - Critica as mudanças que vêm ocorrendo na Festa do Sairé que está se tornando cada vez mais comercial, assim como também a falta de infra-estrutura de suporte para a festa que tem crescido muito; - Impressiona-se pela abundância de frutas e peixe na região, tendo a imagem de que as pessoas não passam fome;

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- Destaca a quantidade e a diversidade de frutas em cada época do ano e decepciona-se em não encontrar seus derivados para a venda aos turistas; - Gosta de perceber as alterações diárias na paisagem, a sua intermitência; - Enfatiza a necessidade de preservar as paisagens naturais locais sob pena de homogeneizá-los e de fazê-los parecer com qualquer outro lugar. Inclui nessa crítica a obra da orla e da praça e de seus materiais, como uma obra que poderia esta em quanquer cidade grande, e ao hotel da orla, ao qual se refere como “banheirão”; - Sugere que a Vila não comporta o fluxo de veículos automotores e que deveria ser incentivado o uso de bicicletas e as caminhadas como alternativas ao excesso de asfaltamento das vias públicas locais; - Destaca a necessidade de valorizar tudo que é regional, sugerindo inclusive a maior utilização dos materiais regionais, como o que o mundo está buscando nestes lugares (suas diferenças e identidades); - Valoriza a hospitalidade da população local, a relação de partilha do alimento até mesmo com desconhecidos; - Valoriza e acredita que deveriam ser incentivadas as construções mais abertas, com materiais locais (cita a madeira e a palha), que permitam o estilo de vida tradicional do local nas varandas, utilização de redes; - Encanta-se com os igarapés como possibilidade de uso turístico e para o lazer, mantendo sempre a vegetação ciliar; - Acredita que o fluxo de barcos à motor deveria ser proibido no Lago Verde próximo à praia; - Acha especialmente relaxante ficar nas cadeiras e mesas à beira d’água; - Afirma a necessidade de organizar a Vila para o crescimento da procura turística e de sua própria área urbana, incluindo programas de conscientização com relação ao lixo, visando tanto a população local quanto os visitantes; - Percebe como qualidade de vida a liberdade e a segurança que as crianças possuem em Alter do Chão; - Acredita que a Vila está crescendo desordenadamente e sendo descaracterizada, podendo chegar a tornar-se um turismo comum, como em qualquer balneário; - Destaca a “Ilha” , as barracas e o morro como a imagem mais marcante de Alter do Chão.

EMS - Elementos Morfológicos e Sócio-culturais

- Peixe, pescador; - População local; - Samaúma; - Festa do Sairé; - Frutas; - Rio, a água; - Hotel na orla; - Estilo de vida, rede, varanda, ao ar livre; - Construções abertas, uso de palha e madeira; - Igarapés e vegetação; - Lixo; - Liberdade e segurança das crianças; - “Ilha” e barracas; - Novos quiosques.

QUADRO 15: DSC da Entrevista Turista 6 Fonte: A autora, 2007.

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Entrevista 15 E – Entrevistador T7 – Turista entrevistado 7

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4 5 E- Então vamos lá, a primeira coisa que eu gostaria é que tu te apresentasses, nome, de onde tu vens, mais ou menos a tua idade, formação/atuação, assim, que tipo de atividade, né... T7- Eu sou... meu nome é Chantau Vitória, eu sou de SP, to aqui desde esse ano e... sô pedagoga... vim pra cá pra contribuir na fundação de uma escola... comunitária que é das fotos que eu escolhi e que é o motivo de eu ter vindo pra cá. E- Então, agente pode partir pras tuas fotos? Qual é a primeira que tu queres...? T7- Hummm... então, eu acho que agente pode... deixa eu ver aqui... sim, sim, eu acho que agente pode começar com essa aqui que é da escola, que foi... que eu coloquei ela aqui porque foi o motivo de eu ter vindo pra cá... esse é o espaço que agente ta, é a Escolinha do Cajueiro, e ela já funcionava com a educação infantil e agente foi chamada pra tá aqui agora, eu e uma amiga, a Fernanda, pra fazer, pra... pra montar a parte de ensino fundamental. E aí agente veio, é um lugar de Alter do Chão que eu gosto muito, tem muito cajueiro lá, tem uma sombra gostosa... e... não é muito comum né, o pessoal quando vai limpar os terrenos, acaba derrubando todas árvores, então, esse aqui é graças à Deus um terreno que manteve... E- Qual é o nome desse arquivo, só pra depois eu saber qual é a foto? T7- Ta escrito aqui 07.JPG... E- Agora que tu descreveste um pouco a foto, eu queria que tu falasses um pouco sobre a importância de ter escolhido essa imagem pra conversar. T7- Acho que foi justamente porque foi ela que me trouxe pra cá... Por conta disso que eu vim... E- E tu destacarias algum elemento, alguma coisa que aparece nessa imagem que pra ti é forte dentro da imagem? T7- A escola, né... a própria escola e esse, essa coisa que eu tava te falando dos terrenos, que esse é um terreno preservado, o que não são muitos aqui, né... como o... o próprio ambiente assim, fica gostoso, quando... é fresquinho... todo mundo gosta de ficar lá, né... mas

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ninguém pensa nisso na hora de derrubar... as árvores, né... então, eu destacaria a própria escola... essa mistura da construção com esse terreno desse jeito, preservado. E- Legal! Então agente pode ir pra segunda imagem? T7- Essa aqui, a 53, eu também escolhi... E- Descreve pra agente um pouquinho, Chantau, a imagem, o que é a ocasião... T7- Uhum... Essa é a foto de uma sala de aula e... em Maripá, que é aqui na frente, no outro lado do rio... e é uma das comunidades que ta participando do projeto, que agente aprovou de formação de professores... então eu escolhi porque... porque eu acho que a minha vinda pra cá teve muito a ver com isso né... com a minha formação... e... isso foi e é muito forte, então eu acho que foi por isso que eu escolhi... as imagens são, em relação à educação... então essas são as crianças que agente vai trabalhar com os professores deles, agora... por isso que eu escolhi essa imagem. E- Destacas alguma coisa na imagem? Nessa foto? T7- Eu acho que as próprias crianças mesmo, a organização da sala, que é uma sala multi-seriada, como a maioria das que agente vai visitar... até pelo fato de ser uma sala de aula das comunidades daqui, bem junto. E- É isso? Se você quiser então, nós podemos passar pra próxima... A terceira foto da Chantau... T7- Bom... É... a terceira foto da Chantau, é de um amigo daqui... porque... que é o Hermes, é um amigo daqui... porque assim, eu acho que representando o que eu destacaria da foto... as amizades que agente fez aqui, um representando os outros... e... que eu acho que agente foi muito bem acolhido, as pessoas são muito... legais assim... em geral né... como em todo lugar tem de tudo né, agente fez muito... umas amizades muito boas então eu escolhi por causa disso... eu acho que isso é um aspecto interessante aqui do... da Vila. E- E qual foi essa situação aqui? Descreve um pouco o que era, onde era... T7- Isso aí, agente tava fazendo um passeio, aqui perto, pra dentro do Jacundá... no igarapé do Jacundá, e... estávamos em alguns amigos, eu e a Fernanda aqui, que não tá aqui, a Diana, e... e o Hermes, e... e aí foi isso... tavamo dando risada (risos). E- Se não tiveres mais nada pra acrescentar, acho que podemos passar pra próxima porque tu já falaste da importância, do elemento, já pedi pra tu descreveres... T7 – os laços, a amizade, né... essa coisa... E- Vamos pra quarta foto então. T7 – Bom, a quarta foto... vamos lá... a quarta foto é a nossa canoa que quando agente comprou ela aqui foi... mudou a nossa vida (risos)... foi ótimo e... acho que pensando assim na... na geografia do lugar... um pouco do teu trabalho né... morfologia urbana né, que você falou... é... a canoa é um transporte interessante aqui, né. Ela permite sair pra vários lugares assim, próximos, e meio que tem... né, sair pra pescar, sair pra passear, né, muito mais facilmente, né... então, agente ganhou muita mobilidade quando agente comprou a canoa... muito legal... né, mudou bem o nosso jeito assim, de circular... pela cidade... então, por isso que eu escolhi... Nesse dia agente tava num passeio com a nossa cachorra, ainda não tava doente, e... e aí eu escolhi essa foto por isso... que ela representa esse, essa outra possibilidade de circulação... essa mobilidade... é uma outra forma de circulação na cidade. E- E essa tua outra opção de circulação te deu, digamos, novas formas de ver a... talvez a Vila? Alguma coisa te chamou ateção que mudou? T7- Aham... Ahhh... muda a perspectiva, né... a... acho que mudou assim, agente conseguiu ir pra muitos mais lugares, e... enfim... acho que foi... mudou o jeito de ver assim, a Vila... Também agente começou a circular mais pela orla, e... e vê os problemas, né, lá da orla, essa história toda do esgoto, e tudo mais, que todo mundo já deve ter falado... E- Mas na verdade, tu podes... Na verdade, tu vais falar o que é importante pra ti, entendeste, até porque é uma questão bem subjetiva...

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T7- Claro, lógico... enfim, então acho que pra mim foi muito bom assim ter... quando agente comprou a canoa... foi uma coisa que deu uma visão bem mais completa, melhor da Vila... das coisas boas agente conseguiu conhecer mais, quanto agente tem visto alguns problemas mais de perto... E aí, até pra falar disso, posso passar? E- Claro! Pode falar. T7 – A próxima... aqui é o rio, né... na verdade, é... a foto é só do rio... o rio aqui não tem como falar de Alter do Chão sem falar do rio... e o rio é uma coisa muito forte, né, muito presente... as águas, dominam o jeito, né, de funcionar, da Vila... e... e aí é assim... tanto o deslumbramento com ele, né, e a delicia de ta no lugar, nessas águas... essa quantidade de água, doce, né, é uma coisa impressionante assim, quando se pensa no planeta, na falta de água que se tem... e então talvez me evoca automaticamente a preocupação, né, com essa, com essas águas e com... eu acho que o rio aqui pra mim também, assim, levanta, me chama pra beleza natural aqui do lugar, e que essa mesma preocupação, né... aberta, né, no coração dagente... aí agente pensa nesse problema de esgoto, de... do descaso na verdade, que eu... agente ta aqui, e agente já viu muitas reuniões da comunidade com a prefeitura, pra falá do problema dessas obras, dessa praça, e... muitas vezes, a comunidade disse o que queria, essa comunidade é impressionantemente consciente, assim, alguns membros dela, que acabam movimentando, e... e simplesmente todas as vezes a prefeitura passa, passa por cima, fala que vai fazer, que não, que tem razão, que vamos lá, que... e tal... e depois simplesmente passa por cima, não quer nem saber, constrói um banco de cimento num lugar com um sol de rachar, então... a primeira vista, né, quem vê essas obras pode pensar que “ah essas pessoas simples querem o progresso...” , mas aqui não foi o caso, a comunidade não isso desse jeito, e isso não foi respeitado, foi feito... aleatoriamente, assim, uma coisa inacreditável, né, inacreditável mesmo... Aquele banheiro da praça, horrível, o banheiro que ta sendo construído ali na, na obra embaixo do palco... e aí... nem o banheiro da praça central, da obra que ta sendo feita em 2006... ele tem um processo de saneamento absolutamente primário, e joga os detritos praticamente que direto no rio... então, é duro né... E- Já que falamos nisso, deixa eu te perguntar um pouco assim, tu falaste um pouco da visão da comunidade à respeito da obra na orla, de como a comunidade reivindicou isso, mas e tu? Como tu enxergas essa obra? Tu como uma pessoa de fora, que chega numa obra no meio da Amazônia e encontra essa obra da orla e da praça... T7- Ahhh... eu enxergo como perigo, como descaso, como desrespeito... se eu não soubesse nada da história, eu enxergaria ela como estranha, como fora de lugar... aquele coreto meio modernista... eu ia achar uma coisa meio feia, que não aproveita os recursos locais... descontextualizada. Mas sabendo da história, eu... pra mim ela... é o símbolo do desrespeito do poder público com a população. E- Bom, então além dessas fotos que agente conversou um pouquinho, eu queria te fazer mais umas perguntinhas gerais sobre a Vila, ta? Então, a primeira delas seria: antes de tu vires pra cá tu tinhas alguma imagem, alguma expectativa, alguma coisa que passava pela tua cabeça de o que era aquela localidade do meio da Amazônia pra onde tu ias? T7- É... tinha... com certeza... como eu vim pra cá por causa do trabalho, minha expectativa girava um pouco em torno do trabalho, mas o que eu imaginava daqui... eu não imaginava que fosse tão turístico, eu tomei um susto quando eu cheguei e vi que era tão turístico, e... é, eu imaginava que fosse ainda um pouco mais... um pouco mais uma localidade qualquer, depois que eu fui vendo que não é, que é um ícone, né, do turismo na região, e... uma coisa que ta ficando conhecida nacionalmente, tudo mais, eu não tinha essa noção quando eu vim... E- Além disso, tem alguma outra coisa que diferenciou entre o que tu imaginavas e o que tu viste? Que tanto pode ser positiva como negativamente? Que você pensava de um jeito, imaginava de um jeito e encontrou aqui outra coisa?

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T7- Que diferenciou?... Talvez eu imaginasse que as pessoas ainda tivessem uma ligação mais... hummm... de proução com a terra, na terra... uma coisa mais assim, roça, que não tinha mais, né, que já não é tão forte, e... é, acho que foi isso assim, mais... imaginava uma coisa mais primitiva assim, com relação à urbanização e ao modo de vida... da população e tudo mais... e isso foi meu primeiro impacto, né, mais turistica, menos ligada à terra e tudo mais... mas depois de um tempo, eu fui percebendo o quanto esses hábitos ainda tão nas pessoas, apesar deles não viverem mais necessariamente da roça, de pescá e tudo mais, o quanto ainda os hábitos tão nas pessoas, né, assim, de ir pescá, de... o jeito de cozinhar, o jeito de se organizar mesmo... ainda tem uma coisa... ainda bem, né, ainda não, não é totalmente... o quanto essas coisas resiste. E- Existe algum lugar, ou alguma construção, alguma paisagem, alguma coisa que pra ti é uma marca maior de Alter do Chão? T7- ... Eu acho que é a “Ilha”, né... a “Ilha”... é... pra mim o rio também, eu acho... eu acho que é a “Ilha” e o rio... é o que mais... as praias e o rio, assim, é o ícone. E- Seriam essas as perguntas, não sei se na tua experiência aqui tu terias mais alguma coisa pra acrescentar... T7 - Não, eu acho que não... agente acabou conversando tudo, e... enfim... espero poder contribuir... E- Com certeza! Já contribuiu! Obrigada Chantau! ANC - Ancoragem

Turista paulista. Já visitou Alter do Chão mais de uma vez. Conhece e tem amizade com pessoas da população local. É educadora.

ECH – Expressões-Chave (Negrito)

- é um lugar de Alter do Chão que eu gosto muito, tem muito cajueiro lá, tem uma sombra gostosa... e... não é muito comum né, o pessoal quando vai limpar os terrenos, acaba derrubando todas árvores, então, esse aqui é graças à Deus um terreno que manteve... - a própria escola e esse, essa coisa que eu tava te falando dos terrenos, que esse é um terreno preservado (...) eu destacaria a própria escola... essa mistura da construção com esse terreno desse jeito, preservado - as amizades que agente fez aqui, um representando os outros... e... que eu acho que agente foi muito bem acolhido, as pessoas são muito... legais assim... em geral né... - a canoa é um transporte interessante aqui, né. Ela permite sair pra vários lugares assim, próximos, e meio que tem... né, sair pra pescar, sair pra passear, né, muito mais facilmente, né... então, agente ganhou muita mobilidade quando agente comprou a canoa (...) Ahhh... muda a perspectiva, né... a... acho que mudou assim, agente conseguiu ir pra muitos mais lugares (...) Também agente começou a circular mais pela orla, e... e vê os problemas, né, lá da orla, essa história toda do esgoto, e tudo mais, que todo mundo já deve ter falado (...) das coisas boas agente conseguiu conhecer mais, quanto agente tem visto alguns problemas mais de perto... - o rio aqui não tem como falar de Alter do Chão sem falar do rio... e o rio é uma coisa muito forte, né, muito presente... as águas, dominam o jeito, né, de funcionar, da Vila... e... e aí é assim... tanto o deslumbramento com ele, né, e a delicia de ta no lugar, nessas águas... essa quantidade de água, doce, né, é uma coisa impressionante assim, quando se pensa no planeta, na falta de água que se tem... - agente ta aqui, e agente já viu muitas reuniões da comunidade com a prefeitura, pra falá do problema dessas obras, dessa praça, e... muitas vezes, a comunidade disse o que queria, essa comunidade é impressionantemente consciente, assim, alguns membros dela, que acabam movimentando, e... e simplesmente todas as vezes a prefeitura passa, passa por cima, fala que vai fazer, que não, que tem razão, que vamos lá, que... e tal... e depois simplesmente passa por cima (...) constrói um banco de cimento num lugar com um sol de rachar (...) Aquele banheiro da praça, horrível, o banheiro que ta sendo construído ali na, na obra embaixo do

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palco... e aí... nem o banheiro da praça central, da obra que ta sendo feita em 2006... ele tem um processo de saneamento absolutamente primário, e joga os detritos praticamente que direto no rio... então, é duro né... - Ahhh... eu enxergo como perigo, como descaso, como desrespeito... se eu não soubesse nada da história, eu enxergaria ela como estranha, como fora de lugar... aquele coreto meio modernista... eu ia achar uma coisa meio feia, que não aproveita os recursos locais... descontextualizada. (...) Mas sabendo da história, eu... pra mim ela... é o símbolo do desrespeito do poder público com a população. - eu não imaginava que fosse tão turístico, eu tomei um susto quando eu cheguei e vi que era tão turístico - Talvez eu imaginasse que as pessoas ainda tivessem uma ligação mais... hummm... de proução com a terra, na terra... uma coisa mais assim, roça, que não tinha mais, né, que já não é tão forte, e... é, acho que foi isso assim, mais... imaginava uma coisa mais primitiva assim, com relação à urbanização e ao modo de vida... - eu acho que é a “Ilha” e o rio...

ID – Idéias Centrais

- Refere-se à sombra existente no terreno da escola, citando a destruição total da vegetação na maioria dos logradouros privados no momento da construção; - Valoriza a conciliação entre a vegetação existente e as construções no lote; - Demonstra o estabelecimento de vículos afetivos com a população local, que caracteriza como amiga; - Afirma que a aquisição e utilização de uma canoa permitiu, além de ser um novo meio de transporte, uma nova forma de ver a Vila, de circular pelos lugares, de acessar lugares antes não conhecidos, assim como também perceber problemas e paisagens antes não percebidos; - O rio como via de acesso, como uma forte presença que interfere no modo de vida da comunidade local; - Mostrou-se impressionada com a enorme quantidade de água doce; - Percebeu a organização e o posicionamento da população local contra algumas das características da obra da orla e da praça; - Acreditou então no desrespeito e de resposta do Poder Público à população local; - Teceu críticas ao banco em concreto e sua inadequabilidade ao clima local, além de problemas com relação aos banheiros construídos na praça e preocupações com a forma de saneamento utilizda; - Refere-se ao novo coreto como horrível e da obra em geral como descontextualizada, fora do lugar, desconexa com a realidade e a paisagem local; - Destaca como mais marcantes em Alter do Chão a “Ilha”e o rio Tapajós; - Antes de conhecer a localidade, a imaginava menos turística, mais rústica, mais primitiva, com uma relação maior/mais forte com a terra, com a roça.

EMS - Elementos Morfológicos e Sócio-culturais

- Escola do Cajueiro; - Vegetação e lotes; - Ressidentes locais; - Canoas; - Rio e água doce; - Novos bancos da praça; - Saneamento; - Novo coreto da praça; - “Ilha” e o rio.

QUADRO 16: DSC da Entrevista Turista 7 Fonte: A autora, 2007.

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Entrevista 16 E – Entrevistador T8 – Turista entrevistado 8

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4 5 E- At first Christian, can you talk a little bit about you? About your background? T8 - My background ok… My background: my name is Christian… ahhh… I’m from Norway… second country far from de north… much mounts land, every river effort mount land… ahhh… hold countries are made of rocks… there is not sand like here… it’s hard rock… and trees are very different, they are not big and with live like this… are many trees have smiles… which never loose its smiles… and it get cold, it’s very cold there… ahhh… I work there as a therapist… I work with knowing teachers… ahhh… with how people are actually… how people, the nature, in the expression… so the same process that control the nature, the same cycle which you see in nature… is the same cycle which you see in people… the people tend to forget that they’re nature… they think they are people… ahhh… so ahhh… that’s my work, that’s what I do… I work with therapy, reminding people that they are not people, they are nature… and remember the deal… that’s meaningful of my work therapies… for this I came here to the Amazon area, because it’s one the most vibrant places on the planet… the soul full of life and its vibrant energy is everywhere… and since I also worked anthiopathic medicine, trouble medicine, this is like… ahhh… like a joy and a pain of God, in the medical earth… ahhh… like learn, how the energy up this bombs works in the body… so that’s a many focus for come here is actually more, expand and disagreed the relationship with the nature, live in… ahhh… be in and interact all the time… become so to degreed into this, that will be the perfect expression of the nature, all the time… and its ahhh… more like a life proportions… not just in this life ‘cause know lives… and many nice experiences here… well I was here I remember many lives that I can live in the jungle, in the rainforest… ahhh… and many experiences, many… much knowledge can back to me, so this place is not usually… its like a contact place I’ve taken before… ahhh… At this time I’ve seen from different eyes, then when I was there before, so I… and also the accomplishment that we have from Itaituba to Alter do Chao, was very ahh… hardly not just physically but emotionally, mentally and spiritually… ahhh… this is a main for coming here… ahhh… and I’ll be back… (laugh) E- We said that everyone who swimming in the “Lago Verde”, come back another time (laugh)…

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T8 – That’s good!! (laugh) Are you sure that everyone come back?? Are you sure?? (laugh)… Yeah!! The water… this river here… it’s very special because it’s… it captures energy of the river and it captures also energy on the boats… and it’s not like ordinary river, so… it’s so big… it’s fantastic… it’s like the ocean because when you see… if you close your eyes you can see no land, ‘cause in ordinary rivers you can see the land all the time… ahhh… waste your energy when you are in… just being through… just felling a force… like when you see the ocean… just close your eyes and feel the ocean… just the same feeling… and it bricks so slowly… it’s really nice… ahhhh… ok!!? E- Ok… Can you choose some pictures? Five pictures at least? T8- Sure! Yea… This is a very nice place to see the hold area… E- Ok Cris, lets see your first photo… can you describe this situation? The place and all the sensations, feelings you had? T8- That would be great because was the most successful day I‘ve ever watched at that moment… so I… ok… ahh… I walked there ahhh… The day I had an oscar ceremony… ahhh… I wouldand, after we walk… we walked first to the beach, had some coconut, then we walked to the mountain top… and we just kept looking around area… ahhh… everyone have said (laugh) when I said, “ahhh its just five minutes, just five minutes”, it means that was between about a half hour, forty minutes… when they said twenty minutes it was close to an hour… they said “it’s just twenty minutes to walk”… but I think we have walked for an hour… So… that’s why I went there, just to look the area… really nice. E- And… Why do you think it’s important to you? This, this looking, this… image, this view? T8- Uhum… Well… humm… it’s a good question! Why it’s important?... ahhh… this is a difficult answer because every area is important, you know? Ahhh there is important… and there is important, so… ahhh… Well, personally, it’s important because is a very good place to have an over view… yes… you can see the hold area… well… ahhh… more spacious… bigger… bigger space… yes, this. E- And… ahhh… There is something that you would like to… something in this photo that have gotten your attention? T8- Ahhh… Yes! The shortness of light… ahhh… well, I don’t know what to say really, because the mountain’s top is good to see around… (laugh) E- Ok! So, Can we ee the other picture? The next? T8- Ok, the other picture… We can take this one now… Ramira’s… It’s a very good place to sit and drink coconuts, yeah!! And it has a very good fish and I recommend the place! Eat a very good fish there… yes… and the people that work there is really nice! Yes… E- And, would you like to describe other sensations or feelings about this moment? This place? And, again, why do you think it’s important? T8- Well… I was hungry!! (laugh)… yes… I think that I was hungry and I was thrist… And it was shadow… and it’s warm… It’s a good resting place… ahhhh… and the particular importance… hummmm… Yes, well, I think it’s a very nice to sit and weakness, probably look some beautiful women on the beach, in the weekend, you know… yeah! This is important too. E- And what things gotten your attention in this picture? T8 – What got my attention in this picture?... ahhh… well, my first feeling will be to say the colors… blue and white… nice colors… it’s very, kind of cool and relaxing… ahhh… When I went there, I was so relaxing, so… I didn’t creating I had no notice about things like that… you know?... yes… ahhh… ask me more questions and easier answers… ask more, ask more… I’ll tell, yeah? E- Well, so we can take another, the next photo? Describe to us? T8- Yes, of course! This one, it’s the place of Açaí… You see? I like açaí!!! (laugh) Açaí of course, really nice… it’s my food to full dinner… Wow!! So good! We have tasted açaí in the… jungle… ahhh… I don’t remember the name… the name sir is so difficult to remember, for me… ahhh… but he climbs the açaí palm… and he picks some fresh açaí and we spread, he

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made it in front of us… I climbed the açaí palm, too! But I couldn’t get it now… ahhh… well, if you go to Alter do Chao, it’s the best place to go to have açaí… ask more, ask more… E- Well, I’ll repeat the same question, why do you think it’s important? This moment? This picture or this place…? T8- I was hungry!! (laugh) For me?? After some days in the jungle, in the river?? (laugh) yes… For me, you know, the most… I think the most important thing for me in this picture, is Alter do Chao, for me is like a resting place where I just rest and relax, then I go to the jungle, because for me the most important thing is to be in the nature, in the jungle… in the deep jungle, ‘cause I work with nature… that’s is how I work… I work with therapies also… and… I work with nature… ahhh… I co-creation with nature so, for me, is the most important… so, for me, the best thing is actually be in a place with no civilization, no houses, nothing… you know?... ahhh… But Alter do Chao is a very nice place to come back to, and to start from… it’s comfortable all the time, to come back also… and rest and relax… ahhhh… You know, many nice people in Alter do Chao… ahhh… this is a place where I brought my friends, I walked into there every day, drinking açaí, and… actually in this day we are also playing the music here… I was playing the drums and singing, and the… the other people singing and playing… and we have a small concert, yeah… (laugh) there was a small concert there that day, actually… ahhhh… yes… that’s what I remember mostly from… ahhh… from that place… that is the concert was very nice… E- And something there have gotten your attention, in this picture or situation? T8- hummm…well… for me, when I sit down in a place like this and relax, I like just look at people… the people going, just observe situations, so watch people… just see how people move, how they interact, how they talk… of course I don’t understand what they talk about, because I don’t talk portuguese, so I have to see body’s language… and some… pick of the emotion expressions much more… ahhh… it’s a very quiet place, that açaí place… is little of from peace room, it’s a very quiet place. E- Another?? Can we go ahead, to another picture? T8- Ok… You know? I would take it… I will take one more picture for you, to show, actually, because yesterday, I was sitting… have you seen the boat, out there?… I was sitting there ahhh… in meditation for two hours… and singing also and… and then a dolphin came… when I was sitting… it’s just swimming around and… I went into the water and… I just opened my heart, I just talked to the dolphin of the heart… and it came closer, it came ten meters away from me… yes… I don’t even have touched, no… Just… ahhh… I just felt it in my heart, just joy… because, because how it speaks… But, yes, of course we have some contact… Everything is alive, we have contact with everything… ahhhh… dolphin is very gorgeous when it plays, it joys… when I talk dolphin, when I started the contact, to talked to your heart, it starts to laugh… like “ha ha ha”, it starts to laugh… it’s so gorgeous, because it’s very playful bean… because this play and joy of living, so ahhh… so yes… I talked to the dolphin certainly laugh… perhaps. E- And… Can we talk about the last one? Describe it for us, please? What do you think about this and this situation, the place… Why do you think it’s important? Why this got your attention? T8- I think this one…because I don’t have any other picture of Alter do Chao… It’s a very beautiful caterpillar that I’ve seen when I was walking… on the mountain… very nice caterpillar… humm… well… because it was culling in the middle at the pass… just cross, me like this… so it got my attention… I notice its nice colors, so how can’t I see it? Yeah!?... any choice to, choice to treaky , choice the teller… this is the head, this is the head… and this is treaky, it seems it’s telling all the word “this is the head and this is ‘tchuck, tchuck’”… well.. ahhh… I don’t know about the importance of it, well… it’s all important because I notice it… so… since I notice it, this probably important… ahhh… E- And… What if it was not there? would change anything for you?

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T8- No… then I would think the lives on the sand are important (laugh)… well, ahhh… well, it’s difficult to tell because for me everything is important. When I notice it, it’s important… When I see it, if I see it, in the wood… and I really notice it, it’s important… so, I think important it’s just where… what you choose to be important for you… so, if you aware to your surrounding, everything is important so… this is important… ahhh… I don’t know how often you see it… probably all the time; did you see it many times? Not usually?... hummm… well… I don’t know if I can say any more about this picture… E- Ok!! Now, can we talk a little bit about the Village? Some general questions? T8- Yes… ok. E- When you came here for the first time, what did you think about Alter do Chão before knowing it? And how is it different from this idea? T8- Yes… ahhh… some positive, and some negative… I have seen pictures, you know, from Nelson, Nelson from the Norway, you see?... I saw pictures from Alter do Chão… ahhh… and… well, one thing, I… before I came, I thought the jungle here was bigger, you know?... I thought it is a big jungle, but the area around, the jungle is small, it’s not noise jungle, is not so deep jungle… ahhh… so I had an impression that maybe there was a bigger jungle in here… ahhh… one thing which I noticed very false, that I didn’t like, it was the construction work… how they use concrete and metal and I don’t understand it!! What, in the world, they do that!!? They should put fans, they should put wood there… This should make of natural material and wood… because how it looks like that? With the hotels? And this things? It looks like any ordinary place!! In Spain or anywhere… Where they stop thinking about tourists… ok will be the local things, the constructors local, but then, the place loose its originality, it loose its spirit, it’s just… it’s sad, you know? I don’t want to walk on concrete!! I walked in the jungle there for five hours, you know? I’ve been walking there since I came… and I don’t wanna walk on concrete… No… I don’t wanna napo pences, it’s really… it’s not nice… I should think, think about the buildings, not just think shortly like expanding very false… Thinking and putting a little more resources in…ahh… and keeping the natural, with the wood and everything, it’s the much nicer… yeah… ahhh… I liked how it looks like sand’s beaches, just like Caribbean, like Caribbean is… ahhh… I want to see more area, I haven’t seen much more around area yet… I’m going to Macacos… ahhh… we will have a ceremony there, in the jungle… and… I’m really afford to that… really… yeah… I think if you want to come and… if you come and relax and just enjoy the beach, and the beach life, relaxing and maybe swimming a little, watch people, eat nice dinner, shop souvenirs, Alter do Chao is perfect, a perfect place for that… if you wanna come and have ecotourism, jungle trips, boats trips, looking at dolphins… ahhhh… looking at wild life, Alter do Chao is perfect, is perfect for that of all… if you want come and have meditation retreat, and just focus in works, in meditate, a focus some spiritual… Alter do Chao is perfect to that also. Like this house… This is perfect for meditation retreats, really, because you have many people here… and we have groups’ meditations, you have the beach… you have… the privacy… in all that land over there, you can swimming too which probably no one goes to… so, it’s a very, very, very good place… It’s really, really nice! I have everything here, just what you want. I’d better it’s also to the tourist just sit on the beach, just drink to the drinks and… maybe doesn’t do so much to other people come and have many nice experiences… so, it’s just what you want… The city, the name is Alter do Chao, the upper of the earth, it’s really ahhh… it’s a nice name… (laugh) special… It’s a nice name… yeah!! (laugh) E- Do you think that in Alter do Chão there is some place, some landscape… anything that remember to you Alter do Chão, always? What is this? T8- What more impressed me are the long beaches, the lakes and the long beaches… how the lagoon, and how the river does in here… that’s what I remember… ahhhh… yes… and I remember the lights… on the boats, in Santarem, to the boats from Santarem to Itaituba, and

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I remember in the evening the lights from Alter do Chao… I was watching the lights in the back… remember “Oh!! There!! It’s Alter do Chao!!”… and I liked it… I think what I remember most, it’s the nice people I met… just it’s a more… ahhh… maybe more impression of the people than just place… ahhh… and ow! I remember de fruits… I’ve never had some many delicious fruits… ever… and… yes… hummm… ok… I’ll take another picture, because I’ve had a very nice experience yesterday… so I’ll tell you more history about my experience yesterday. And… If you want, you can walk with me… I think in over there, we can take a picture from there, then I can tell you the history… so you have all… (Christian vai tirar a foto que acredita faltar para complementar a entrevista) T8- It’s everything in a several parts. One thing: this place here, is a very, very, very nice place to sit and see the summer storms. Because in the night, when you see the summer storms over here, and the lightening, the flashing… and it’s far to the sound of the cities, the insects makes “tcxi, tcxi, tcxi”, the sound… and all are in controls, it’s like a concert of the nature, sit there and just, just watch… I reached that mountain top, I saw all… from here… ahhh… that’s just have the experience… ahhhh… just watching, which can also have many other experiences, yeah?… when I was sitting here yesterday, and I’m working with nature and I was sitting in meditation and… in work, then the wind stoped, and mosquitos came, and becomes difficult control well, difficult to keep the focus for me… I just think it’s possible open it… I didn’t demand it, I just ask also gently, if it’s possible make a little local wind, just where I was sitting… and then, immediately, slow wind came, just around me, and the mosquitos was gone, then after a little while… then after a little while, I could hear the nature telling me, to my heart, said “Christian the wind needs to go to another place, have a wind anymore”… and it exchange the wind go backs, and all this back came, it was just for to my head… they back fling around me and I tried eating all mosquitos (laugh)… I could see and hear in this meditation, I was involved by mosquitos, the nature is very noisier here, very much… ahhh… different from the Norway… more life, more wild… so this is a place you can had everything… actually, communicate. Very nice! E- Someone who have this kind of contact so closer to the nature, to this… I’d like to have this… Have we to develop this, maybe? T8- it’s practices, takes practices ever… ahh… Dedication… is ahhh… a very easy way to get this is just sit-down every day and just be thankful, just glad to, just brief (Christian inspira e exprira) and “it’s a gift!”, so gladful and every day you get more sensitive, more sensitive… if can stop for a while, the nature here speaks… you can hear the water, how it talks… hear how the winds actually are the brief of God… it’s not wind, it’s the brief of God… so… it’s ahh… takes practices: and if you want, you can (laugh)… all you want, you can (laugh)… yes… ahhh… E- Ok!! Thank you a bunch! T8 – For nothing! ANC - Ancoragem

Turista de origem norueguesa. Valoriza e busca contato com a natureza, com foco na relação humana com a mesma e com a população local. Trabalha com terapias alternativas e meditação.

ECH – Expressões-Chave (Negrito)

- I work with therapy, reminding people that they are not people, they are nature (…) for this I came here to the Amazon area, because it’s one the most vibrant places on the planet… the soul full of life and its vibrant energy is everywhere… - this river here… it’s very special because it’s… it captures energy of the river and it captures also energy on the boats… and it’s not like ordinary river, so… it’s so big… it’s fantastic… it’s like the ocean because when you see… - This is a very nice place to see the hold area (…) So… that’s why I went there, just to look the area… really nice. (…) Well, personally, it’s important because is a very good place to have an over view… - The shortness of light…

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Eat a very good fish there… yes… and the people that work there is really nice! - It’s a good resting place… - well, my first feeling will be to say the colors… blue and white… nice colors… it’s very, kind of cool and relaxing… - but he climbs the açaí palm… and he picks some fresh açaí and we spread, he made it in front of us… I climbed the açaí palm, too! - is Alter do Chao, for me is like a resting place where I just rest and relax, then I go to the jungle, because for me the most important thing is to be in the nature, in the jungle… in the deep jungle, ‘cause I work with nature (…) But Alter do Chao is a very nice place to come back to, and to start from… You know, many nice people in Alter do Chao… - I like just look at people… the people going, just observe situations, so watch people… just see how people move, how they interact, how they talk… - I was sitting there ahhh… in meditation for two hours… and singing also and… and then a dolphin came… when I was sitting… it’s just swimming around and… - very nice caterpillar… humm… well… because it was culling in the middle at the pass… just cross, me like this… so it got my attention… I notice its nice colors, so how can’t I see it? (…) I don’t know how often you see it… probably all the time; did you see it many times? Not usually?... hummm… well… I don’t know if I can say any more about this picture… - before I came, I thought the jungle here was bigger, you know?... I thought it is a big jungle, but the area around, the jungle is small, it’s not noise jungle, is not so deep jungle… - one thing which I noticed very false, that I didn’t like, it was the construction work… how they use concrete and metal and I don’t understand it!! What, in the world, they do that!!? (…) It looks like any ordinary place!! In Spain or anywhere… Where they stop thinking about tourists… - I don’t want to walk on concrete!! I walked in the jungle there for five hours, you know? I’ve been walking there since I came… and I don’t wanna walk on concrete… No… I don’t wanna napo pences, it’s really… it’s not nice… I should think, think about the buildings, not just think shortly like expanding very false… Thinking and putting a little more resources in…ahh… and keeping the natural, with the wood and everything, it’s the much nicer… - Like this house… This is perfect for meditation retreats, really, because you have many people here… and we have groups’ meditations, you have the beach… you have… the privacy… i - The city, the name is Alter do Chao, the upper of the earth, it’s really ahhh… it’s a nice name… (laugh) special… It’s a nice name… yeah!! (laugh) - What more impressed me are the long beaches, the lakes and the long beaches (…) and I remember the lights… on the boats, in Santarem (…) think what I remember most, it’s the nice people I met… just it’s a more… ahhh… maybe more impression of the people than just place (…) I remember de fruits… I’ve never had some many delicious fruits… ever… - this place here, is a very, very, very nice place to sit and see the summer storms. Because in the night, when you see the summer storms over here, and the lightening, the flashing… and it’s far to the sound of the cities, the insects makes “tcxi, tcxi, tcxi”, the sound… and all are in controls, it’s like a concert of the nature, sit there and just, just watch… - (…) the nature is very noisier here, very much… ahhh… different from the Norway… more life, more wild… so this is a place you can had everything… actually, communicate. Very nice!

ID – Idéias Centrais

- Veio buscar na Amazônia a “energia”, a “atmosfera” do lugar, já que trabalha com terapias; - Destaca a força do rio e descreve-o “grande como o oceano”; - Gostou da vista de cima do morro da Serra Piroca, de onde é possível observar

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toda a área do entorno; - Descreve experiências que teve ao compartilhar a vida dos ribeirinhos, como subir na palmeira do açaí; - Para ele, a Vila é um ótimo lugar de descanso e relaxamento, ideal para iniciar e finalizar uma profunda imersão na floresta; - Se refere à população local como amigos e diz gostar de apreciar seu modo de vida, de interagir entre si e com o local, de se mover; - Relatou experiências de meditação e “contato/ comunicação” com animais em situações de integração com o mundo, com a natureza; - Descreve o exotismo da biodiversidade local através de um inseto, uma lagarta, que nunca havia visto, com destaque ao seu colorido; - Afirma que imaginava a floresta em Alter do Chão e seus arredores maior, mais densa e fechada; - Faz duras críticas às obras da orla e da praça, ao uso excessivo de concreto e metal, afirmando que a mesma banaliza a Vila, podendo estar sendo construída em qualquer lugar; - Afirma que veio à Vila e à região amazônica para estar em contato com a floresta e a natureza e que não quer “andar no concreto”; - Enfatiza a necessidade de um maior controle e ordenamento, podendo inclusive caber a utilização de mais recursos, de forma a manter o local o mais natural possível, utilizando mais materiais locais como a madeira; - Em sua opinião Alter do Chão atende à diversas modalidades de turismo de baixo impacto, entre os quais retiros para meditação; - Gosta do nome “Alter do Chão”, que para ele tem a ver com estar longe, flutuando acima, fora do mundo como um lugar especial, no alto de toda a terra; - Falou que as coisas que mais o marcaram na Vila foram os lagos, as praias, as luzes dos barcos, as pessoas que conheceu, a diversidade das frutas; - Destacou e descreveu lugares às margens do Lago Verde como ideais para ouvir a natureza e ver os raios no céu. Refere-se a isso como sentar para assistir um concerto da natureza; - Afirma que a vida em Alter do Chão é muito “viva”, muito ruidosa, mais selvagem e que tudo isso é muito diferente de seu local de origem.

EMS - Elementos Morfológicos e Sócio-culturais

- A energia e a atmosfera do lugar; - O rio; - Morro Serra Piroca; - Luzes e cores; - Descanso e relaxamento; - Floresta; - População local; - Animais, biodiversidade (boto e alguns insetos); - Lagos, as praias, as luzes dos barcos, as frutas.

QUADRO 17: DSC da Entrevista Turista 8 Fonte: A autora, 2007.

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APÊNDICE E

TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO Você está sendo convidado(a) para participar, como voluntário, em uma pesquisa. Após ser esclarecido(a) sobre as informações a seguir, no caso de aceitar fazer parte do estudo, assine ao final deste documento, que está em duas vias. Uma delas é sua e a outra é do pesquisador responsável. Em caso de recusa você não será penalizado(a) de forma alguma. INFORMAÇÕES SOBRE A PESQUISA: Título do Projeto: MORFOLOGIA URBANA E ATRATIVIDADE DE DESTINAÇÕES TURÍSTICAS - o caso da Vila de Alter do Chão (Santarém-PA). Pesquisador Responsável: Luciana Noronha Pereira Telefone para contato: (47) 3264 7701 e (47) 9968 6030 Esta pesquisa refere-se ao teste metodológico da pesquisa acima, que objetiva a compreensão da percepção dos participantes expressa através de imagens a respeito de determinada localidade. A localidade escolhida para esse teste é o Município de Bombinhas por características de porte, existência de praia, assim como a vida urbana girando predominantemente em função do turismo. A saída de campo está programada para sexta-feira dia 08 de setembro, a partir das 8:30 da manhã, para a qual será disponibilizado o material a ser utilizado em campo assim como o transporte de ida e retorno às respectivas residências. Você receberá uma câmera fotográfica se fácil utilização com filme de 36 poses que deverão distribuídas segundo sua escolha e critério incluindo os seguintes temas: Moradia, Trabalho, Transporte, Compras, Lazer e diversão, Educação, Saúde, Infra-estrutura, Turismo e Paisagem. Você deve fotografar tudo aquilo que julgar importante, segundo os assuntos relacionados aos temas acima, e que você queira compartilhar, mostrar e conversar posteriormente. Suas fotos serão utilizadas em entrevista futura, por ocasião da sua exposição, onde incluiremos suas impressões e comentários a respeito delas. Sua participação assim, inclui uma saída de campo, o preenchimento de um perfil com seus dados básicos e uma entrevista aberta realizada sobre as fotografias produzidas por você durante a etapa de campo. Os resultados deste teste possibilitarão sua avaliação e a realização de ajustes para sua posterior aplicação em Alter do Chão, município de Santarém, PA. Todas as informações prestadas pelo participante serão utilizadas apenas para fins de pesquisa, sendo garantida a sua liberdade de retirar o consentimento, a qualquer momento. _________________________________

Luciana Noronha Pereira

CONSENTIMENTO DE PARTICIPAÇÃO DO SUJEITO Eu, ________________________________, RG_____________, CPF ____________ abaixo assinado, concordo em participar do presente estudo como sujeito. Fui devidamente informado e esclarecido sobre a pesquisa, os procedimentos nela envolvidos, assim como os possíveis riscos e benefícios decorrentes de minha participação. Foi-me garantido que posso retirar meu consentimento a qualquer momento, sem que isto leve à qualquer penalidade ou interrupção de meu acompanhamento/assistência/tratamento. Local e data: _____________________________________________________________ Nome: __________________________________________________________________ Assinatura do Sujeito ou Responsável: ________________________________________ Telefone para contato: _____________________________________________________