Loucos por filmes

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26-0111-0014 senhora M A I S VA R I E D A D E S Segunda-feira, 10 de janeiro de 2010 caderno B Inclui Saúde Eletrobrás abre inscrições para patrocínio cultural O apoio será dado a projetos de todo o País em três segmentos: teatro, audiovisual e patrimônio imaterial. Foi contemplada o ano passado a peça “Senhora dos afogados” (foto). PÁG. 3 Síndrome de Hellp Entenda a doença que matou a Diana, personagem de Carolina Dieckmann na novela “Passione”. PÁG. 8 Mochila deve ser o item número 1 da lista de materiais escolares Médicos alertam para o excesso de peso e indicam os melhores modelos para preservar a coluna das crianças. Pág. 5 Loucos por filmes Também chamados de cinéfilos, os amantes da narrativa cinematográfica contam suas experiências VALDERNIR REZENDE Um paixão que não tira férias Tantos filmes para ver Philia, teoriza Aristóteles em “Ética a Nicômano”, é um termo grego que designa o amor, mas é mais abrangen- te que este. A cinefilia portanto é um amor exagerado pela arte cinematográ- fica. Geralmente, os grandes diretores (ou outros envolvidos de alguma forma com a produção de filmes) são também grandes cinéfilos. Basta citar alguns nomes que vão de François Truffaut e Jacques Rivette a Francis Ford Coppola e Steven Spielberg. No Brasil, Glauber Rocha e Rogério Sganzerla são alguns dos amantes do cinema que decidiram criar filmes por causa desse amor. Cael Horta, de 20 anos, também decidiu que iria transformar a paixão por filmes em um modo de produzi-los. Sem medo, a jovem estudante rumou para Buenos Aires com o objetivo de fazer um curso superior em Cinema. A escolha pela capital argentina se deu por acreditar que a indústria cinemato- gráfica argentina é uma referência na América do Sul e no mundo. “Quando acontecem grandes estreias, os atores vêm para cá prestigiar. É algo que não acontece com tanta frequência no Bra- sil”, esclarece. Viciada em filmes há tempo demais para se lembrar quando e como come- çou o vício, Cael conta que assiste a pelo menos um filme diariamente. “Eu adoro viajar e ver filmes, é um tipo de viagem. Assistindo a filmes eu posso conhecer outras culturas às quais difi- cilmente teria acesso”, define. Por isso também “a forma de ver o mundo mu- da, a cabeça fica mais aberta”. Segundo ela, qualquer pessoa que assiste a fil- mes demais se transforma, deixando preconceitos de lado e aprendendo a ver o mundo com mais tolerância. De férias em Campo Grande, Cael arrumou um jeito de se manter per- to dos filmes. Arrumou emprego em uma locadora. Com acesso a um dos maiores acervos do País, que vai além dos blockbusters (termo que desig- na os grandes sucessos comerciais hollywoodianos), a estudante tem acesso a lançamentos de filmes pro- duzidos no mundo inteiro. “Filmes tai- landeses, iranianos, romenos, suecos, tudo. É o céu na terra para quem gosta de filmes”, pontua. Evitando apenas obras de terror, comédias “escracha- das” ou dramalhões, Cael assiste de tudo um pouco. “Tenho uma lista de mais de mil filmes para assistir e ela cresce um pouco a cada dia”, pontua a cinéfila. (TA) THIAGO ANDRADE Um jovem loiro americano caminha pelas ruas de Paris enquanto pensa: “Apenas os franceses, apenas os france- ses construiriam um cinema dentro de um palácio”, re- ferindo-se à Cinémathèque Française. A cena – se você é um cinéfilo já sabe que filme é esse – é de “Os sonhadores”, de 2003. Em sua ode ao ci- nema, Bernardo Bertolucci homenageou toda uma gera- ção que cresceu em frente às telas gigantescas, fascinados por todo o tipo de histórias. Apaixonados por cinema e encantados pela imagem em movimento existem desde que os irmãos Lumiere hip- notizaram a plateia ao proje- tar a imagem de um trem na primeira sala de cinema do mundo, o Eden, em 1895. Em outro momento do lon- ga-metragem de Bertolucci, o americano Matthew afirma que os verdadeiros viciados em filmes sentavam-se o mais próximo possível das telas de cinema. “Por que nos sentáva- mos tão perto? Talvez porque quiséssemos receber as ima- gens antes, enquanto ainda eram novas, ainda eram fres- cas”, completa o jovem cinéfi- lo apaixonado pela arte de Ni- cholas Ray, Jean-Luc Godard, Sam Fueller e outros grandes diretores. Assim como ele, Campo Grande também tem lugar para aqueles que amam o cinema acima de todas as coi- sas. A designer gráfica e voca- lista da banda Dimitri Pellz, Maíra Espíndola, é daquelas pessoas que, ainda na infân- cia, encontraram nos filmes uma maneira de conhecer o mundo. “Logo que ganhei mi- nha primeira televisão e um quarto só meu, pude mergu- lhar no universo do cinema. Na época, não havia internet ou televisão por assinatura, então, o jeito era partir para a Rede Globo e aproveitar os corujões. Em uma dessas, as- sisti ‘Amarcord’ e percebi que o que eu queria mesmo era assistir filmes como aque- les”, descreve a libriana de 31 anos, referindo-se à obra-pri- ma do diretor italiano Federi- co Fellini. Hoje, o filme é um de seus favoritos. Maíra conta que a obses- são cinematográfica nasceu de seu fascínio por histórias e narrativas. Segundo ela, a li- teratura tem seu charme, mas apenas o cinema é capaz de ilustrar cada uma das histó- rias que conta. “Eu gosto de filme bom! Tudo vale, desde terror e ficção científica a filmes ‘cabeçudos’ europeus em que nada acontece”, brin- ca. Como toda cinéfila que se preze, Maíra vai além do sim- ples hábito de assitir a seis filmes por dia – “dependen- do da época”, explica – mas também lê muito sobre a arte cinematográfica, assim como já produziu alguns filmes. Formada em Rádio e TV, Maíra lembra que até a esco- lha do curso de graduação foi relacionada à paixão por filmes. “Eu gosto da narrati- va, mas também me interesso pelos movimentos de câmera, pela trilha sonora, pela dire- ção de atores. Tem gente que gosta de um filme por causa da história do casal que vence tudo no final. Eu gosto dis- so também, mas ao mesmo tempo, cada escolha de um diretor me encanta”, pontua. Apesar do tempo não ter dado trégua, Maíra continua acre- ditando que assistir a filmes é uma ótima maneira de co- nhecer o mundo. “Já que não posso dar um tiro nos vilões do mundo real, pelo menos posso ver isso nas telas”. CLÁSSICOS O juiz aposentado José de Holanda Carnei- ro tem 73 anos e elegeu como livro de cabeceira “1001 filmes para ver antes de morrer”, orga- nizado por Steven Jay Schneider, e publica- do no Brasil pela Sex- tante Editora. Em seus cálculos, o cinéfilo de carteirinha acredita ter assistido a cerca de 600 das obras catalogadas no livro. “Desde garoto eu sou fascinado pelo cinema”, conta. Ele nas- ceu em uma cidade no interior do Ceará. Próxi- mo a sua casa havia um cinema. Dali em diante, José sabia, como se um anjo torto houvesse lhe dito, “Vai, Holanda! Ser cinéfilo nessa vida”. Apaixonado pelos filmes clássicos, “prin- cipalmente aqueles das décadas de 30, 40 e 50”, aproveita seu tempo li- vre para rever os seus fa- voritos e adquirir novas obras. Além das horas em frente à televisão, Jo- sé também passa algum tempo lendo revistas e livros sobre a cinema- tografia. Atores como Clark Gable e James Stewart ou Greta Garbo e Katharine Hepburn es- tão em sua lista de favo- ritos. Entre os diretores, seu grande ídolo é Alfred Hithcock, o mestre do suspense. “Insuperável até hoje”, elogia. Para ele, filme bom é aquele que merece ser assistido duas ou três vezes. Evitando frequentar cinemas, pois acredita que os ambientes de hoje tornaram-se barulhentos e cheios demais, José pre- fere assistir aos filmes que gosta no conforto de sua casa. “Eu me de- dico ao cinema. Não sei exatamente o motivo da minha paixão, mas gos- to muito de passar horas assistindo os filmes. O de que mais me agrada é o conteúdo, aquilo que a história me proporcio- na”, aponta o juiz. Por en- quanto, em meio a tan- tos filmes, José decidiu assistir a obras de ficção científica, território até hoje pouco explorado pelo cinéfilo. (TA) A designer gráfica e vocalista da banda Dimitri Pellz, Maíra Espíndola, é daquelas pessoas que, ainda na infância, encontraram nos filmes uma maneira de conhecer o mundo Cael Horta é tão apaixonada por cinema que seu hobby virou motivo de estudo e trabalho

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A cinefilia é o culto moderno por excelência e a reportagem foi atrás de quem é apaixonado por cinema.

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26-0111-0014 senhora

M A I S V A R I E D A D E S

Segunda-feira, 10 de janeiro de 2010 caderno B

Inclui Saúde

Eletrobrás abre inscrições para patrocínio culturalO apoio será dado a projetos de todo o País em três segmentos: teatro, audiovisual e patrimônio imaterial. Foi contemplada o ano passado a peça “Senhora dos afogados” (foto). PÁG. 3

Síndrome de HellpEntenda a doença que matou a Diana, personagem de Carolina Dieckmann na novela “Passione”. PÁG. 8

Mochila deve ser o item número 1 da lista de materiais escolaresMédicos alertam para o excesso de peso e indicam os melhores modelos para preservar a coluna das crianças. Pág. 5

Loucos por filmesTambém chamados de cinéfilos, os amantes da narrativa cinematográfica contam suas experiências

VALDERNIR REZENDE

Um paixão que não tira férias

Tantos filmes para ver

Philia, teoriza Aristóteles em “Ética a Nicômano”, é um termo grego que designa o amor, mas é mais abrangen-te que este. A cinefilia portanto é um amor exagerado pela arte cinematográ-fica. Geralmente, os grandes diretores (ou outros envolvidos de alguma forma com a produção de filmes) são também grandes cinéfilos. Basta citar alguns nomes que vão de François Truffaut e Jacques Rivette a Francis Ford Coppola e Steven Spielberg. No Brasil, Glauber Rocha e Rogério Sganzerla são alguns dos amantes do cinema que decidiram criar filmes por causa desse amor.

Cael Horta, de 20 anos, também decidiu que iria transformar a paixão por filmes em um modo de produzi-los. Sem medo, a jovem estudante rumou para Buenos Aires com o objetivo de fazer um curso superior em Cinema. A escolha pela capital argentina se deu por acreditar que a indústria cinemato-gráfica argentina é uma referência na América do Sul e no mundo. “Quando acontecem grandes estreias, os atores vêm para cá prestigiar. É algo que não acontece com tanta frequência no Bra-sil”, esclarece.

Viciada em filmes há tempo demais para se lembrar quando e como come-

çou o vício, Cael conta que assiste a pelo menos um filme diariamente. “Eu adoro viajar e ver filmes, é um tipo de viagem. Assistindo a filmes eu posso conhecer outras culturas às quais difi-cilmente teria acesso”, define. Por isso também “a forma de ver o mundo mu-da, a cabeça fica mais aberta”. Segundo ela, qualquer pessoa que assiste a fil-mes demais se transforma, deixando preconceitos de lado e aprendendo a ver o mundo com mais tolerância.

De férias em Campo Grande, Cael arrumou um jeito de se manter per-to dos filmes. Arrumou emprego em uma locadora. Com acesso a um dos maiores acervos do País, que vai além dos blockbusters (termo que desig-na os grandes sucessos comerciais hollywoodianos), a estudante tem acesso a lançamentos de filmes pro-duzidos no mundo inteiro. “Filmes tai-landeses, iranianos, romenos, suecos, tudo. É o céu na terra para quem gosta de filmes”, pontua. Evitando apenas obras de terror, comédias “escracha-das” ou dramalhões, Cael assiste de tudo um pouco. “Tenho uma lista de mais de mil filmes para assistir e ela cresce um pouco a cada dia”, pontua a cinéfila. (TA)

THIAGO ANDRADE

Um jovem loiro americano caminha pelas ruas de Paris enquanto pensa: “Apenas os franceses, apenas os france-ses construiriam um cinema dentro de um palácio”, re-ferindo-se à Cinémathèque Française. A cena – se você é um cinéfilo já sabe que filme é esse – é de “Os sonhadores”, de 2003. Em sua ode ao ci-nema, Bernardo Bertolucci homenageou toda uma gera-ção que cresceu em frente às telas gigantescas, fascinados por todo o tipo de histórias. Apaixonados por cinema e encantados pela imagem em movimento existem desde que os irmãos Lumiere hip-notizaram a plateia ao proje-tar a imagem de um trem na primeira sala de cinema do mundo, o Eden, em 1895.

Em outro momento do lon-ga-metragem de Bertolucci, o americano Matthew afirma que os verdadeiros viciados em filmes sentavam-se o mais próximo possível das telas de cinema. “Por que nos sentáva-mos tão perto? Talvez porque quiséssemos receber as ima-gens antes, enquanto ainda eram novas, ainda eram fres-cas”, completa o jovem cinéfi-lo apaixonado pela arte de Ni-cholas Ray, Jean-Luc Godard, Sam Fueller e outros grandes diretores. Assim como ele, Campo Grande também tem lugar para aqueles que amam o cinema acima de todas as coi-

sas. A designer gráfica e voca-lista da banda Dimitri Pellz, Maíra Espíndola, é daquelas pessoas que, ainda na infân-cia, encontraram nos filmes uma maneira de conhecer o mundo. “Logo que ganhei mi-nha primeira televisão e um quarto só meu, pude mergu-lhar no universo do cinema. Na época, não havia internet ou televisão por assinatura, então, o jeito era partir para a Rede Globo e aproveitar os corujões. Em uma dessas, as-sisti ‘Amarcord’ e percebi que o que eu queria mesmo era assistir filmes como aque-les”, descreve a libriana de 31 anos, referindo-se à obra-pri-ma do diretor italiano Federi-co Fellini. Hoje, o filme é um de seus favoritos.

Maíra conta que a obses-são cinematográfica nasceu de seu fascínio por histórias e narrativas. Segundo ela, a li-teratura tem seu charme, mas apenas o cinema é capaz de ilustrar cada uma das histó-rias que conta. “Eu gosto de filme bom! Tudo vale, desde terror e ficção científica a filmes ‘cabeçudos’ europeus em que nada acontece”, brin-ca. Como toda cinéfila que se preze, Maíra vai além do sim-ples hábito de assitir a seis filmes por dia – “dependen-do da época”, explica – mas também lê muito sobre a arte cinematográfica, assim como já produziu alguns filmes.

Formada em Rádio e TV, Maíra lembra que até a esco-

lha do curso de graduação foi relacionada à paixão por filmes. “Eu gosto da narrati-va, mas também me interesso pelos movimentos de câmera, pela trilha sonora, pela dire-ção de atores. Tem gente que

gosta de um filme por causa da história do casal que vence tudo no final. Eu gosto dis-so também, mas ao mesmo tempo, cada escolha de um diretor me encanta”, pontua. Apesar do tempo não ter dado

trégua, Maíra continua acre-ditando que assistir a filmes é uma ótima maneira de co-nhecer o mundo. “Já que não posso dar um tiro nos vilões do mundo real, pelo menos posso ver isso nas telas”.

CLÁSSICOS

O juiz aposentado José de Holanda Carnei-ro tem 73 anos e elegeu como livro de cabeceira “1001 filmes para ver antes de morrer”, orga-nizado por Steven Jay Schneider, e publica-do no Brasil pela Sex-tante Editora. Em seus cálculos, o cinéfilo de carteirinha acredita ter assistido a cerca de 600 das obras catalogadas no livro. “Desde garoto eu sou fascinado pelo cinema”, conta. Ele nas-ceu em uma cidade no interior do Ceará. Próxi-mo a sua casa havia um cinema. Dali em diante, José sabia, como se um anjo torto houvesse lhe dito, “Vai, Holanda! Ser cinéfilo nessa vida”.

Apaixonado pelos filmes clássicos, “prin-cipalmente aqueles das décadas de 30, 40 e 50”, aproveita seu tempo li-vre para rever os seus fa-voritos e adquirir novas obras. Além das horas em frente à televisão, Jo-sé também passa algum tempo lendo revistas e livros sobre a cinema-tografia. Atores como Clark Gable e James Stewart ou Greta Garbo e Katharine Hepburn es-tão em sua lista de favo-ritos. Entre os diretores, seu grande ídolo é Alfred Hithcock, o mestre do suspense. “Insuperável até hoje”, elogia. Para ele, filme bom é aquele que merece ser assistido duas ou três vezes.

Evitando frequentar cinemas, pois acredita que os ambientes de hoje tornaram-se barulhentos e cheios demais, José pre-fere assistir aos filmes que gosta no conforto de sua casa. “Eu me de-dico ao cinema. Não sei exatamente o motivo da minha paixão, mas gos-to muito de passar horas assistindo os filmes. O de que mais me agrada é o conteúdo, aquilo que a história me proporcio-na”, aponta o juiz. Por en-quanto, em meio a tan-tos filmes, José decidiu assistir a obras de ficção científica, território até hoje pouco explorado pelo cinéfilo. (TA)

A designer gráfica e vocalista da banda Dimitri Pellz, Maíra Espíndola, é daquelas pessoas que, ainda na infância, encontraram nos filmes uma maneira de conhecer o mundo

Cael Horta é tão apaixonada por cinema que seu hobby virou motivo de estudo e trabalho