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Paradigmas constitucionais e limites ao poder de tributar: o livre convencimento dos Magistrados contraposto à Constituição e ao art. 489 do CPC Renato Renck

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Paradigmas constitucionais e limites ao poder de tributar:

o livre convencimento dos Magistrados contraposto à Constituição e ao art. 489 do CPC

Renato Renck

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o livre convencimento dos Magistrados contraposto à Constituição e ao art. 489 do CPC

Renato Renck

9 788539 204557

ISBN 853920455-X

Esta obra busca demonstrar que o Supremo Tribunal Federal, em algumas de-cisões relativas à aplicação do Direito Tributário, não adota um padrão científico de racionalidade, justificado por paradigmas específicos decorrentes dos limites constitucionais opostos ao poder de tributar. As decisões analisadas não adotam uma metodologia de interpretação seguindo regras hermenêuticas prescritas na Constituição.

Parte-se de um axioma inarredável: a intencionalidade normativa é da Cons-tituição, e esta não foi entregue a uma prestação jurisdicional ordenada a partir do subjetivismo individualista dos julgadores, apoiado apenas no irrestrito e livre convencimento dos magistrados.

A obra se divide em cinco partes integradas por via de uma transdisciplinarie-dade. Na primeira, apresenta-se o status quo da insegurança plena decorrente das decisões subjetivas adotadas pelos componentes da Corte Suprema; na segunda parte, apresenta-se os paradigmas históricos da filosofia, que são fundamentais para ordenar um “pensar coerente”, a partir de uma estrutura de justificação cien-tifica; na terceira parte tem como objetivo realçar os direitos constitucionais do contribuinte diante do fisco, que historicamente são relativizados; na quarta parte, discute-se a questão da Hermenêutica, aprofundando o debate relativo à supera-ção do dogma do “direito puro”; e na quinta e última parte, integra-se todo o estu-do – em forma de conclusões – sugerindo a desconstrução de dogmas da doutrina tributária nacional por via da superação da sua metodologia metafísica – carte-siana-kantiana – indicando um viés reconstrutivo justificado pela Fenomenologia.

Competências Tributárias (2018) – Humberto Ávila

Contribuições e Imposto sobre a Renda (2015) – Humberto Ávila

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Curso de Direito Constitucional Tributário (32a ed., 2019) – Roque Antonio Carrazza

Curso de Direito Tributário (40a ed., 2019) – Hugo de Brito Machado

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Estudos de Direito Tributário – Homenagem a Roque Antonio Carrazza (3 volumes – 2014) – Fernanda Parisi, Heleno Taveira Torres e José Eduardo Soares de Melo (coords.)

Hipótese de Incidência Tributária (6a ed., 18a tir., 2019) – Geraldo Ataliba

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Teoria da Segurança Jurídica (5a ed., 2019) – Humberto Ávila

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OUTRAS OBRAS DESTA EDITORA

Renato Romeu Renck é Mestre e Doutor em Direito Tributário pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo-PUC/SP. É Conselheiro do CONTEC/FIERGS – Federação das In-dústrias do Rio Grande do Sul há mais de 20 anos. Membro colaborador da Fundação Escola Superior de Direito Tributário – FESDT e conferencista em eventos empresariais. Advogado em Porto Alegre.

É autor dos livros:• Imposto de Renda da Pessoa Jurídica

– Critérios Constitucionais de Apura-ção da Base de Cálculo (Livraria do Advogado, 2001) e

• O Lucro Real no Contexto da Cons-tituição (Malheiros Editores, 2018).

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RENATO RENCK

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O livre convencimento dos Magistrados contraposto à Constituição e ao art. 489 do CPC

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e-mail: [email protected]

Composição: PC Editorial Ltda.

CapaCriação: Vânia Lúcia Amato

Arte: PC Editorial Ltda.

Impresso no BrasilPrinted in Brazil

09.2019

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

R396p Renck, Renato. Paradigmas constitucionais e limites ao poder de tributar: o livre

convencimento dos Magistrados contraposto à Constituição e ao art. 489 do CPC / Renato Renck. – São Paulo : Malheiros, 2019.

672 p. ; 23 cm.

ISBN 978-85-392-0455-7

1. Direito tributário - Brasil. 2. Hermenêutica (Direito). 3. Juízes - Decisões. 4. Brasil. Código de Processo Civil (2015). 5. Brasil. Constituição (1988). I. Título.

CDU 34:336(81)CDD 343.8104

Índice para catálogo sistemático: 1. Direito tributário : Brasil 34:336(81)

1. Hermenêtica (Direito) 340.132 (Bibliotecária responsável: Sabrina Leal Araujo – CRB 8/10213)

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Sumário

Prefácio – .................................................................................... 9Agradecimentos ................................................................................................................... 13Introdução ........................................................................................................................... 15

O STATUS QUO DO DIREITO TRIBUTÁRIO BRASILEIRO

1. Reflexão Preliminar .................................................................................................... 292. A Contextualização da Racionalidade ........................................................................ 613. A Função Jurisdicional Tributária e o Caso Concreto ............................................. 744. As Formas de Pensar: o Bom Senso e o Pensamento Científico como Preâmbulos

do Conhecimento ......................................................................................................... 865. O Significado Subjetivo e o Direito Puro ................................................................... 1016. Reflexos da Objetivação na Doutrina Tributária ...................................................... 1087. O Pensamento Ideológico ........................................................................................... 1138. A Realidade Singular Subjacente ao Signo ............................................................... 1249. Análise Estrutural da Racionalidade das Decisões Atuais das Cortes Superiores de

Justiça .......................................................................................................................... 135

HISTÓRIA DO PENSAMENTO FILOSÓFICO NA PERSPECTIVA DE UMA EPISTEMOLOGIA CONSTITUCIONAL TRIBUTÁRIA

1. Das Matrizes de Racionalidade ................................................................................... 1652. As Fronteiras entre a Ciência, a Metafísica e a Mística ........................................... 1933. Os Pré-Socráticos ........................................................................................................ 209

3.1 De Tales de Mileto a Heráclito ........................................................................... 2103.2 Anaxímenes e Anaximandro ............................................................................... 2103.3 Heráclito ............................................................................................................. 2113.4 Demócrito ........................................................................................................... 2123.5 Parmênides ......................................................................................................... 2163.6 Os sofistas ........................................................................................................... 218

4. Sócrates, Platão e Aristóteles4.1 Sócrates ............................................................................................................... 2214.2 Platão .................................................................................................................. 222

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4.3 Aristóteles ........................................................................................................... 2285. A Escolástica Cristã ..................................................................................................... 234

5.1 Escola de Chartres ............................................................................................. 2445.2 Escola de Oxford ................................................................................................ 2535.3 Universidade de Paris ........................................................................................ 2615.4 Tomás de Aquino ................................................................................................. 2645.5 John Peckham ..................................................................................................... 2685.6 Duns Scot ............................................................................................................ 2695.7 Guilherme de Ockham ........................................................................................ 2775.8 Nicolau de Cusa .................................................................................................. 281

6. A Renascença e as Bases do Surgimento do Cidadão ............................................... 2827. De Descartes a Hegel

7.1 Descartes ............................................................................................................ 2877.2 Espinosa .............................................................................................................. 2977.3 Gottfried Wilhelm Leibniz ................................................................................... 3017.4 Christian Wolff .................................................................................................... 3077.5 Immanuel Kant ................................................................................................... 3087.6 Hegel ................................................................................................................... 321

8. A Liberdade e a Herança Histórica da Filosofia ....................................................... 3319. Conformação Científica dos Paradigmas .................................................................. 33710. A Fenomenologia ........................................................................................................ 343

10.1 Franz Brentano ................................................................................................... 34410.2 Husserl ................................................................................................................ 346

O SER HUMANO COMO CIDADÃO-CONTRIBUINTE DIANTE DO ESTADO

1. O Homem como Ser Total ........................................................................................... 3672. A Linguagem Verbal e seus Efeitos ............................................................................ 3843. A Formação da Cidadania .......................................................................................... 3924. O Estado Absolutista e o Cidadão Contemporâneo ................................................... 4025. O Surgimento do Estado Republicano ....................................................................... 4086. A República e a Prestação Jurisdicional Tributária .................................................. 4217. O Cidadão-Contribuinte e o Desenvolvimento Econômico ....................................... 4318. A Sociedade Civil Ético-Pluralista .............................................................................. 4359. A Liberdade Econômica .............................................................................................. 44310. O Direito à Propriedade no Contexto Tributário ....................................................... 447

A HERMENÊUTICA COMO ESTRUTURA DE COMPREENSÃO

1. Introdução .................................................................................................................... 4512. A Hermenêutica como Estrutura da Compreensão ................................................... 453

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3. Os Paradigmas como Estruturas Centrais da Racionalidade ................................... 4794. Metodologia de Justificação da Hermenêutica Jurídica Tributária ......................... 4875. Como se Formam as Relações Sistemáticas .............................................................. 5046. Modelos Hermenêuticos e sua Correlação com o Estado de Direito Republicano e

Democrático ................................................................................................................. 5197. Os Tipos de Linguagem e a Interpretação da Norma Tributária .............................. 5308. A Vinculação entre o Conceito e o Nome ................................................................... 5399. Quebra de Paradigmas e Novos Caminhos ................................................................ 55810. Novos Caminhos da Hermenêutica Jurídica Tributária ........................................... 57611. Procedimento Verificatório no Contexto da Fenomenologia .................................... 590

A DOUTRINA TRIBUTÁRIA NACIONAL ATUAL EM QUESTÃO (UMA PROPOSTA DE DESCONSTRUÇÃO E RECONSTRUÇÃO)

1. A Fenomenologia diante da Doutrina Tributária Nacional ...................................... 6052. O Dogma do Conceito Cerrado ................................................................................... 6133. O Formalismo e a Doutrina Tributária Nacional ..................................................... 6224. A Doutrina Atual e a Separação de Sujeito e Objeto ................................................. 6315. Verdade Formal ou Verdade Substancial ................................................................... 6446. Contraponto entre a Doutrina Tributária Atual e a Fenomenologia ....................... 6507. Da Reconstrução da Matriz de Racionalidade ........................................................... 659

Referências Bibliográficas ................................................................................................. 665

SUMÁRIO 7

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Prefácio

Tenho muita satisfação de apresentar o novo livro do jurista gaúcho Renato Renck, meu caro amigo, sob o convidativo título Paradigmas Constitucionais e os Limites ao Poder de Tributar: o livre convencimento dos Magistrados contraposto à Constituição e o art. 489 do CPC. Uma obra significativa, densa nas reflexões e inovadora nas construções que apresenta, ao encarar com desenvoltura o desafio de entabular as limitações ao poder de tributar como controle do livre convencimento dos juízes, no julgamento de lides tributárias.

O Autor é um inquieto pensador do Direito Tributário. Não se basta com o prees-tabelecido. Testa premissas permanentemente, articula distintas correntes teóricas e vivencia o verdadeiro sentimento filosófico da liberdade, ao não se deixar submeter a qualquer doutrina ou autor. Daí o resultado construtivo que opera nas suas eluci-dações.

Desde sua tese doutoral o Autor tem procurado demonstrar que o Supremo Tribunal Federal, assim como outras cortes superiores, nas suas decisões, não adota algum padrão científico de racionalidade, por paradigmas ou mesmo por coerência, com aplicação de metodologia de interpretação constitucional tributária específica, quanto ao Imposto sobre a Renda. E isso se estende a outros tributos e respectivas dinâmicas.

O exame da metodologia científica para estruturar a prestação jurisdicional justifica-se, segundo uma interpretação constitucional tributária epistemológica e filosoficamente coerente, para assegurar controlabilidade dos atos do poder judiciá-rio e racionalidade na aplicação das limitações ao poder de tributar. Assim, reputa que o STF deveria assumir alguma linha argumentativa racional na prestação juris-dicional, por metodologia hermenêutica que supere o subjetivismo individualista dos julgadores.

Desse modo, evidencia-se a urgência de superação da insegurança jurídica mediante a existência de padrões estáveis e consistentes na prestação jurisdicional. E para evitar o enrijecimento metodológico, sugere buscar na Teoria dos Atos da Fala a distinção dos discursos constatativos ou performativos para promover tal ade-quação. Tudo para demonstrar que a prestação jurisdicional não pode ser promovida com base apenas no irrestrito e livre convencimento dos magistrados, como sugere o artigo 489 da Lei 13.105, de 16 de março de 2015, o novo Código de Processo Civil.

O que o Professor Renato Renck pretende, no fundo, é construir uma teoria da segurança jurídica da decisão jurisdicional, mediante a determinação de meios de

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controle. Na sua concepção, aduz que o Direito não se pode pensar sem uma ordena-ção científica, justificada numa metodologia específica, que vincule o intérprete na prestação jurisdicional, com as normas constitucionais interpretadas a partir de um pensar racional, filosófica e doutrinariamente justificado em paradigmas epistemolo-gicamente válidos.

Nas palavras do nosso Autor:

para efetivamente podermos viver num Estado constitucional, será necessário estabele-cer uma metodologia que imponha a Constituição nos seus próprios termos, por meio de uma metodologia que consagre o princípio da realidade substancial.

Esta condição somente pode ser atendida por critérios seguros de demarcação da certeza jurídica na aplicação do Direito Tributário, ou seja, com decisões tomadas segundo uma estrutura de interpretação por “paradigma, cientificamente aceito como forma única de representação da situação real (existencial)”.

Contudo, parece pouco provável sustentar algum discurso sobre a legitimação do direito e das decisões judiciais com base apenas no agir ético do juiz ou suas livres con-vicções. Isso é insuficiente. Na medida em que a ordem jurídica incorpora valores inte-grados às normas que cria ou aplica, por serem estes fins aos quais o direito propõe-se atingir, o valor passa a ser origem e o conteúdo do “dever ser” jurídico. Daí o cabimento de algum parâmetro consistente para testar sua efetividade. A racionalidade científica do método, porém, não pode impedir essa adequada axiologia presente no ato de julgar. O intérprete do direito tributário deve acompanhar os valores do seu tempo.

É justo no âmbito das finanças públicas onde as contradições e paradoxos dessa era desvelam o melhor ou o pior dessa época de incertezas. Como disse Eurípedes, poeta grego: “O esperado não se cumpre, e ao inesperado um deus abre o caminho”. É neste momento que entram em choque valores como individualismo e solidarieda-de; isolacionismo e cooperativismo; liberdade e protecionismo.

Com a crise econômica de 2007, a estrutura do Estado e seu modo de relacio-namento na cadeia global foram radicalmente alterados. O modelo de distribuição e acumulação de riquezas viu-se fortemente questionado. Basta pensar que da defesa do sigilo bancário e da proteção dos planejamentos tributários passou-se à era da transparência e da integração dos fiscos para combater todo tipo de economia de tri-butos por simples expedientes interpretativos. É uma clara mudança de paradigmas e de valores da sociedade. Por óbvio, também a prática jurisdicional deve compreender todo esse processo de mutação e adotar paradigmas seguros para seu enfrentamento.

Nesse contexto, o capítulo dos direitos e liberdades fundamentais não se pode converter em catálogo de regras desprovidas de eficácia técnica e social, mas deve ser o único parâmetro de atuação do Estado Democrático de Direito, como limite imanente segundo os valores que incorpora. Se queremos um Estado de justiça, esta terá que valer para todos, com aplicação nas suas máximas possibilidades.

A obra que se apresenta ocupará um lugar de destaque dentre aquelas que res-pondem por critérios qualificados de controle metateórico das decisões judiciais.

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Não quer tolher, mas aperfeiçoar a liberdade de valoração e a técnica de livre con-vencimento dos magistrados. E numa era onde o direito dos precedentes, mormente daqueles com repercussão geral, prevalece sobre qualquer outro ato jurídico do poder estatal, é fundamental amparar sua construção em metodologia rigorosa e racional-mente controlada. Eis a utilidade do estudo que ora se apresenta.

Professor Titular de Direito Financeiro da Faculdade de Direito da USP. Advogado.

PREFÁCIO 11

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Agradecimentos

Agradeço aos sócios do Escritório de Advocacia - a concessão do tempo em que foi elaborada a presente obra que

busca contribuir no aperfeiçoamento da Ciência Jurídica nacional tributária.Agradeço à –

onde há de vinte anos integro o Conselho de Assuntos Tributários Legais e Cíveis – que me oportuniza acompanhar, sugerir caminhos e discutir a dinâmica das ino-vações legislativas e jurisprudenciais em nosso País. A participação neste Conselho consolidou meus conhecimentos e me permitiu pensar o Direito como um patrimônio jurídico e cultural essencial à toda sociedade civil.

Agradeço à que foi essencial na correção e estruturação da obra publicada cabendo reconhecer que sem o seu profissionalismo, empenho e dedicação – durante anos – não teria sido possível chegar a bom termo.

Agradeço a – Advogado e Professor Titular de Direito Financeiro da Faculdade de Direito da USP – autor de diversas obras essências ao Direito Público – pelo precioso prefácio que muito contribuirá para que o texto seja divulgado e bem compreendido.

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Introdução

O presente estudo é um aprofundamento da Tese de Doutorado do autor, com o título Paradigmas de Racionalidade e as Decisões do STF em Imposto sobre a Renda, defendida na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo no final de 2006. Nessa tese concluímos que o Supremo Tribunal Federal, nas decisões sobre este tema, não adota um padrão científico de racionalidade justificado em paradigmas, nem fundamenta suas decisões com coerência. Em outros termos, a banca examinadora de uma das mais conceituadas universidades brasileiras concordou com a tese de que a Suprema Corte brasileira não adota uma metodologia de interpretação constitucional tributária específica nas suas decisões quando julga questões relativas a este impor-tante imposto.

Ao longo dos estudos, que resultaram na mencionada Tese de Doutorado, foram analisados mais de um milhar de acórdãos, para discutir objetivamente menos de uma dezena, e não encontramos qualquer consistência lógica reiterada que pudesse fun-damentar a cientificidade das decisões: todas partiam do que entendia, apriorística e subjetivamente, cada Ministro e, ao final, a decisão era contabilizada nos votos pelos dizeres: “Dou provimento” ou “Nego provimento”.

O primeiro ponto a destacar é que o processo de entendimento na prestação ju-risdicional deve estar doutrinária e cientificamente justificado em uma metodologia que imponha o determinado pela Constituição e não o que pensa subjetivamente cada Ministro. A grande maioria das decisões é baseada no pensar apriorístico – apoiada numa perspectiva genérica e universal já superada no plano da epistemologia – que mescla as teorias cartesiana, kantiana e hegeliana – sem identificar uma linha de pa-drão de entendimento que determine o que pode constitucionalmente ser tributado e o que é proibido tributar. Vale afirmar, então, que a identificação da realidade existen-cial subjacente a cada julgamento não foi levada em conta em cada situação singular discutida nos autos dos processos; cada julgador imaginou o que é renda com base em noções superficiais guardadas na sua consciência, formada por mera experiência subjetiva.

Cabe realçar que neste estudo não enfrentaremos de forma específica a formação da base de cálculo do Imposto sobre a Renda, tal como na Tese de Doutorado; esta matéria será examinada em outra oportunidade. O que enfrentaremos é o exame da metodologia científica por via da qual se estrutura a prestação jurisdicional, segundo uma interpretação constitucional tributária, que julgamos epistemológica e filosofi-camente coerente, em contraponto com a forma de julgar atualmente adotada pelas Cortes Superiores de Justiça.

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16 PARADIGMAS CONSTITUCIONAIS E LIMITES AO PODER DE TRIBUTAR

No presente estudo verificamos novamente que nas decisões das Cortes Supe-riores de Justiça, quando julgam as questões relativas aos impostos e contribuições em geral, a falta de coerência justificada num esquema de racionalidade científica se repete em muitos casos. Na maioria das vezes, os magistrados escolhem os elementos que querem considerar e rejeitam outros, igualmente importantes, exatamente porque estes contrariam a definição apriorística que pretendem estabelecer. Dessa forma, adotam definições que desconstroem a realidade econômica estabelecida pelo texto da Carta, para autorizar e limitar o poder de tributação dos entes públicos. Nessa linha de pensamento, não é a Constituição, em primeira mão, que, para a Suprema Corte, determina os limites rígidos ao poder de tributar: os magistrados – que compõem a Corte de Justiça num determinado momento – escolhem o que deve ou não deve ser tributado.

Por essa forma de julgar, a Corte Suprema não adota qualquer padrão uniforme e estável de definição, justificado em um paradigma permanente e único, que organiza cientificamente as inter-relações de elementos materiais econômicos reais que podem ser tributados. Em face disso, estabelece-se a insegurança jurídica quanto à definição dos valores a serem recolhidos pelos contribuintes aos cofres públicos, chegando a casos em que o contribuinte não tem condições de identificar quais valores deve in-cluir nos montantes a serem tributados. Consideramos que a inexistência de padrões estáveis e consistentes de constatação das bases de cálculo dos impostos e contribui-ções – que devem ser definidos pelas Cortes Superiores – constitui a causa da insegu-rança jurídica no contexto tributário e do atraso na prestação jurisdicional brasileira. Esta insegurança decorre da carência de definição durável quanto ao significado dos conceitos jurídicos tributários, o que ocasiona dúvidas sobre temas importantes e abarrota os tribunais de processos a serem julgados.

Vale referir que na citada Tese de Doutorado foi aprofundada a questão relativa à determinação do significado dos conceitos por paradigmas científicos, ou padrões de inter-relação de elementos materiais, os quais substituem o que a Filosofia clássica denomina de essência. A Filosofia contemporânea, à sua vez, está sendo reconstruída, para absorver as novas pesquisas científicas justificadas nas descobertas da física quântica, passando a exigir a adoção da lógica da complexidade ao lado da lógica clássica. Nesse contexto emergem duas epistemologias: uma que adota a matriz de racionalidade subjetiva, expressa por uma linguagem linear, e outra que adota o processo de conhecimento circular dialético objetivo, que, na verdade, é a forma de pensar sistemática desde a Filosofia clássica grega. Contudo, na justificação subja-cente à doutrina tributária nacional – e também na prestação jurisdicional tributária – continuam sendo adotados os paradigmas filosóficos formulados por Descartes e Kant, que estão superados há mais de dois séculos, como fundamentação filosófica de entendimento. Por isso se tornou absolutamente necessário estabelecer um novo embasamento filosófico para fundamentar objetivamente, tanto a jurisprudência como a doutrina tributária nacional, notadamente para demonstrar a inconsistência da matriz de racionalidade apriorística/metafísica que esteia a prestação jurisdicional tributária na Suprema Corte brasileira e também do Superior Tribunal de Justiça.

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Posta esta contextualidade, é mister realçar que a banca examinadora da tese acima referida reclamou quanto ao objeto do estudo, classificando-o como “essencialmente de cunho filosófico”, afirmando que mais de 60% dos temas discutidos se incluíam na disciplina objeto da Filosofia e, como tal, estranhos ao objeto de temas relacionados com o Direito Tributário, e, por isso, por unanimidade, cada um dos examinadores atribuiu à tese a nota 8,5.

As ponderações aqui feitas mostram que, no entendimento de uma banca de tra-dicional universidade brasileira, quando o assunto é racionalidade, a ênfase de estudo não deve ser nem a Filosofia nem a doutrina. Isso mostra porque a forma de pensar e de revisar as estruturas filosóficas de nosso próprio pensar – pessoal e coletivo – está desprestigiada, onde a disciplina de Filosofia quase se transformou num cosmético pelo qual são enfeitados temas disciplinares aparentando uma certa cultura universal.

Cabe lembrar que a Filosofia cuida da organização do conhecimento, o que a insere na questão que estrutura o convencimento dos magistrados. De outra parte, interpretação envolve questões objetivas (científicas) e subjetivas que brotam da consciência do intérprete. Forma-se, então, uma contextualidade multiobjetal onde interagem diversos objetos disciplinares (científicos) que buscam determinar a rea-lidade: a Neurociência, que estuda o organismo humano e suas reações químicas inconscientes diante do fluxo das vivências que formam o pensamento; a Psicologia e a Psiquiatria, que tratam das reações intra e extrapsíquicas diante da manifestação do discurso linguístico; as estruturas das matrizes de racionalidade, consciente e in-consciente, que afloram na formação de um pensamento espontâneo; a Hermenêutica, que impõe regras de interpretação; etc.

Esta questão da demarcação disciplinar para manter “puro” o objeto de cada Ciência, em face da complexidade, deve ser combatida pela transdisciplinaridade, o que já se mostra evidente pelo aqui exposto, incluindo uma nova frente de discussão. Ao contrariar a doutrina tributária nacional, introduzimos uma discussão transdisci-plinar, incluindo no plano científico objetos de outras disciplinas, para definir contex-tos jurídicos específicos. No curso do estudo ficará evidente que o mundo não pode ser transformado numa realidade universal única e plana, dissolvendo a realidade singular para compor uma linguagem genérica, dentro de quadrados lógicos forjados por uma metodologia que impõe a interpretação linear, a qual está, historicamente, sendo utilizada como forma de imposição do poder do Estado. Para combater esta racionalização, que permite decidir com base no princípio do livre convencimento, deverão ser coibidas as livres escolhas e rejeições de elementos factuais que funda-mentam cada decisão na prestação jurisdicional tributária.

A Filosofia da Linguagem contemporânea já desenvolveu a Teoria dos Atos da Fala, a qual faz uma distinção dos discursos constatativos ou performativos, sejam eles promovidos pelo ato da fala ou pela escrita. Este tema é relevante no presente estudo, uma vez que restringimos a discussão fundamental em torno do núcleo que busca definir objetivamente a realidade subjacente aos pressupostos constitucionais de incidência tributária. Para este efeito, as definições terão que ser feitas pela cons-

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tatação e narração de elementos, utilizando a linguagem performativa para ordenar o discurso como um todo.

De outra parte, a Teoria da Fala, como ordenada principalmente por John Lang-shaw Austin (1911-1960) e Henry Paul Grice (1913-1988), impõe ao falante e ao ouvinte (da mesma forma ao autor e ao leitor) o Princípio da Colaboração, que se desdobra em subprincípios. O primeiro impõe ao falante transmitir as informações necessárias e suficientes para que o ouvinte compreenda o que está sendo dito, por uma explicação consistente e adequada; o segundo determina a inclusão no discurso somente do que é verdadeiro, oferecendo evidências adequadas por meio de demons-tração do que afirma; o terceiro restringe o discurso ao que é relevante para que a fala seja compreendida; o quarto impõe o modo de falar com clareza, evitando expressões obscuras e ambíguas.

Diante desse contexto, lembramos que a realidade é composta por uma estrutu-ra material estável que organiza cada evento. Esta realidade não pode ser superada para impor uma decisão estabelecida de forma subjetiva. A adoção de determinada matriz de racionalidade e metodologia de interpretação constitui o primeiro ponto fundamental de toda forma de transmissão do pensamento por via da linguagem. Pela demarcação de uma linguagem performativa se estabelece, além dos padrões de definição, o ponto de partida de uma ideia uniformizadora da atividade racional.

Na primeira base de entendimento de um texto está a identificação da justifica-tiva primordial, de onde parte e fundamenta-se cada um que pensa, fala ou escreve, denominada de “matriz de racionalidade”; trata-se da forma pela qual a imaginação admite o emergir de cada pensamento que se converte em linguagem. Ou seja, quan-do o sujeito intui uma significação subjetivamente – através da linguagem discursiva –, usando para tanto sua imaginação, ou inclui também as suas vivências pessoais, está categorizando de forma a priori, adotando um pensar metafísico em forma de pré-ideia. Caso o falante – ou intérprete – examine o objeto singular narrando as suas qualidades e quantidades, identificando os princípios de relação, articulação e orga-nização de suas partes, estará adotando uma identificação performativa, promovendo uma constatação em que a intencionalidade é compreender e explicar o existencial a partir da metodologia empírica.

Os princípios que ordenam a linguagem colaborativa, bem como as duas meto-dologias, caracterizam as diferenças entre as teorias e as metodologias científicas; mostram-se essenciais em qualquer interpretação de textos doutrinários e também na interpretação das normas jurídicas ou de decisões judiciais. Há, no entanto, uma terceira matriz de racionalidade – a fenomenológica –, que entendemos ser a mais coerente com a prestação jurisdicional tributária, destacando-se no mundo cultural e científico notadamente a partir de Husserl. Neste processo de cognição, o sujeito integra o significado do termo que identifica uma pré-ideia e, por via performativa, partindo dela, examina a realidade singular de forma constatativa, numa circularida-de Hermenêutica, onde a pré-ideia, que brota do plano intrapsíquico do intérprete, é reconstruída para se conformar com a realidade e representar cada coisa como ela existe.

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Historicamente, apesar da sucessão de paradigmas filosóficos e científicos, toda a discussão tem girado em torno de duas matrizes de racionalidade: a metafísica, se-guindo os passos de Platão, e a empírica, justificada por Aristóteles. Somente a partir de Husserl a Fenomenologia passou a ser conformada mais objetivamente como uma terceira matriz de racionalidade, formada, grosso modo, pela desconstrução de parte da Metafísica e parte da Empiria, unificando estas duas matrizes – ou formas diferen-tes de organizar o pensamento – e compondo o esquema de um processo de cognição apoiado em duas estruturas: o pensamento performativo posto em linguagem, em que o existencial é constatado empiricamente para ser representado pela narração de seus elementos empíricos. Estes dois elementos, ao se unirem, formam um só sistema pela dupla estrutura da linguagem. É esta matriz de racionalidade que adotamos como for-muladora do método epistemológico, segundo a qual justificamos e fundamentamos as conclusões que serão apresentadas neste estudo.

Adotada uma matriz de racionalidade específica, torna-se necessária a análise de como ela se estruturou no tempo, o que impõe o exame sucinto da corrente universa-lista – caracterizada como metafísica – e da nominalista – que adota a metodologia empirista. Como estas duas formas de pensar se combateram desde a antiga Grécia e tiveram seus paradigmas de justificação alterados no curso da história milenar pela Escolástica Cristã, terão que ser explicitadas sinteticamente para que, ao final, possa-mos entender como se formou a Fenomenologia por via da qual iremos transmitir a compreensão do que pretendemos expor neste estudo.

Lembramos que – em face da metodologia adotada – se impõe a desconstrução da desconexão do sujeito e do objeto, compondo o entendimento através da transdis-ciplinaridade ou interdisciplinaridade, tema que será esclarecido gradativamente no curso do texto. Para se caracterizar um pensamento complexo se impõe a introdução, em paralelo com a Lógica clássica, da lógica da complexidade, em cujo entendimento dialético os elementos contrários, ao invés de se excluírem mutuamente (como deter-mina a Lógica clássica), ordenam-se numa síntese. Esta forma de pensar compõe os avanços da Ciência atual, decorrente da evolução da Física Quântica, e refletir-se-á, mais cedo ou mais tarde, na Hermenêutica jurídica, quando passará a alterar funda-mentalmente a justificação do processo de entendimento da realidade de cada Ente singular, no plano epistemológico a ser adotado como forma de decidir das Cortes de Justiça.

Quando iniciamos as pesquisas deste estudo, a questão acima exposta era aca-dêmica e um dos objetivos que buscávamos era a comprovação de que a Constitui-ção republicana democrática brasileira exigia a adoção de uma nova epistemologia interpretativa, que mantivesse os intérpretes e operadores do Direito nos limites do existencial. Desse modo, pretendemos demonstrar que a prestação jurisdicional não pode ser promovida com base em um plano apriorístico e genérico, justificado no irrestrito e livre convencimento dos magistrados. Este quadro deixa de ser acadê-mico para se impor como prescrição legal – contida no art. 489 – da Lei 13.105, de 16.3.2015 (CPC, vigente a partir de 16.3.2016), que estabelece a estrutura material e

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formal da fundamentação das decisões, regulamentando o disposto no art. 93, X da Constituição.1

O referido artigo impõe ao julgador, como elementos essenciais da sentença, entre outras exigências: (a) explicar a causa real e o efeito da implicação da relação jurídica que irá reconhecer; (b) não justificar a decisão num conceito indeterminado, sendo obrigatória a explicação concreta – e não imaginária – da incidência da lei no caso singular, objetivamente demonstrado nos autos; (c) enfrentar todos os argumen-tos deduzidos pelas partes, de maneira a infirmar os conteúdos contrários à conclusão adotada pelo julgador; (d) demonstrar, ao invocar a jurisprudência e as súmulas, que o caso que está sendo julgado objetivamente se enquadra nos fundamentos dos paradigmas jurisprudenciais invocados para justificar a decisão; (e) demonstrar obje-tivamente, no caso de não aplicar jurisprudência ou súmula invocada pela parte como paradigma de solução da questão posta, que aquela não se aplica ao caso.

Este elenco de exigências já decorria – no caso da prestação jurisdicional tribu-tária – da Constituição, que enumera exaustivamente, no sistema tributário, diversos pressupostos de incidência que, ao mesmo tempo, permitem a imposição de impostos e contribuições por via constitucional e impõem rígidos limites ao poder de tributar, para proteger e garantir os direitos individuais do contribuinte. A limitação de poder se estabelece a partir da realidade factual e deverá ser demonstrada cientificamente para que constitucionalmente possa ser exigido o tributo.

Como podemos notar, o preceito processual acima comentado estabelece a de-monstração material e processual desses pressupostos, de modo a conformar a dupla estrutura constitucional e processual de todo o processo de cognição aplicado na prestação jurisdicional tributária. Neste ponto se localiza o postulado composto pelo princípio da realidade, identificada pelas situações factuais em que se encontra cada contribuinte, e que constitui a base fundamental da metodologia de interpretação constitucional tributária de um Estado Democrático Republicano.

1. Lei 13.105, de 16.3.2015, Código de Processo Civil:“Art. 489. São elementos essenciais da sentença: I – o relatório, que conterá os nomes das partes,

a identificação do caso, com a suma do pedido e da contestação, e o registro das principais ocorrências havidas no andamento do processo; II – os fundamentos, em que o juiz analisará as questões de fato e de direito; III – o dispositivo, em que o juiz resolverá as questões principais que as partes lhe submeterem.

“§ 1o. Não se considera fundamentada qualquer decisão judicial, seja ela interlocutória, sentença ou acórdão, que: I – se limitar à indicação, à reprodução ou à paráfrase de ato normativo, sem explicar sua re-lação com a causa ou a questão decidida; II – empregar conceitos jurídicos indeterminados, sem explicar o motivo concreto de sua incidência no caso; III – invocar motivos que se prestariam a justificar qualquer outra decisão; IV – não enfrentar todos os argumentos deduzidos no processo capazes de, em tese, infir-mar a conclusão adotada pelo julgador; V – se limitar a invocar precedente ou enunciado de súmula, sem identificar seus fundamentos determinantes nem demonstrar que o caso sob julgamento se ajusta àqueles fundamentos; VI – deixar de seguir enunciado de súmula, jurisprudência ou precedente invocado pela parte, sem demonstrar a existência de distinção no caso em julgamento ou a superação do entendimento.

“§ 2o. No caso de colisão entre normas, o juiz deve justificar o objeto e os critérios gerais da pon-deração efetuada, enunciando as razões que autorizam a interferência na norma afastada e as premissas fáticas que fundamentam a conclusão.

“§ 3o. A decisão judicial deve ser interpretada a partir da conjugação de todos os seus elementos e em conformidade com o princípio da boa-fé.”

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Para expor o conteúdo do estudo a que nos propomos, optamos por dividi-lo em cinco partes, cada uma correspondendo a objetos específicos, os quais poderiam ser considerados como cinco livros distintos. Assim, todos estes objetos são apresen-tados como totalidades individualizadas, interconectadas com outras ordenadas da mesma forma. Em face da adoção do paradigma da transdisciplinaridade e da lógica da complexidade, devem ser integradas num todo indivisível, uma vez que, no plano da operacionalidade jurídica, estão, desde sempre, integradas sem perder sua indivi-dualização.

Seguindo esta linha de desconstrução metodológica, buscamos ver reconhecido, ao final, que a doutrina tributária nacional – apoiada no conceitualismo que se define como cerrado – deve ser superada: sugerimos a adoção de um pensar sistêmico que integre, em dupla estrutura, a percepção apriorística e a empírica, compondo um pro-cesso de conhecimento epistêmico.

De outra parte, buscamos demonstrar que, pela Constituição Republicana Demo-crática, o livre convencimento dos magistrados na prestação jurisdicional tributária deve estar preso a uma Metodologia Constitucional Tributária priorizando a expli-citação da realidade existencial. Esta, à sua vez, terá que ser identificada por uma Hermenêutica cientificamente fundamentada em paradigmas ou padrões de decisão, postos como axiomas, justificados em regras de interpretação vinculativa que com-põem um sistema único.

Para tanto, na primeira parte apresentamos o contexto em que ocorre a presta-ção jurisdicional do STF (ou Suprema Corte) e do STJ. Antes, porém, de destacar e criticar as decisões que entendemos demonstrar um julgar subjetivo, apriorístico, sem fundamentação coerente, sem adoção de epistemologia contemporaneamente reconhecida como válida, promovemos um debate, nos capítulos iniciais, que visa a estabelecer os contornos gerais das questões discutidas em toda a obra. Nesta abordagem inicial buscamos compor, gradativamente, núcleos de conhecimento e de razões científicas para que – seguindo um fio condutor do pensamento – tenhamos elementos coerentes e efetivos que permitam entender as críticas feitas às decisões das Cortes Superiores de Justiça postas no último capítulo desta parte inicial.

Nesta primeira parte formulamos e estruturamos a contextualização de todo o es-tudo, enfrentando questões amplas de linguagem, de processo de entendimento, com vistas a contemplar dois objetivos específicos: construir uma espécie de estrutura de entendimento e entrelaçamento dos elementos que compõem diversas disciplinas para que, à medida que o tema flui, formemos uma base de compreensão crítica da dou-trina; seguindo esta linha de cognição, pretendemos elaborar um núcleo de questões transdisciplinarmente subjacente à abordagem da matéria tratada nas quatro partes seguintes. Assim, ao propormos a delimitação de um espaço amplo de contextualida-des e intercontextualidades, estaremos introduzindo os temas que serão examinados nas quatro partes que seguem.

Desse modo, na primeira parte apresentamos o status quo jurídico decorrente da base filosófica da doutrina tributária, há muito superada pela Ciência contemporânea.

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Nesta discussão demonstramos a inércia da Suprema Corte na condução dos cami-nhos de vanguarda de justificação científica da metodologia de interpretação consti-tucional tributária que proteja, além da segurança jurídica, os direitos e as garantias individuais do contribuinte em um Estado Democrático Republicano. Especificamen-te, buscamos integrar o ser humano, na condição de contribuinte, no núcleo duro da interpretação constitucional tributária.

Na segunda parte repassamos os paradigmas históricos da Filosofia que são fundamentais para pensar sobre uma estrutura de justificação que, em primeiro lugar, permita conhecer como nós mesmos pensamos, para após entender os demais inter-locutores.

A doutrina que expressa as bases filosóficas de cada época está contida nas estru-turas do pensar jurídico contemporâneo, como qualquer ancestral está contido do flu-xo das heranças genéticas das gerações atuais, e que deve ser conhecida porque dela herdamos o que somos, o que sabemos, como entendemos e como sustentamos nossas identidades pessoais e culturais diante dos demais segundo nossas bases de formação. Trata-se de um (re)conhecimento prévio necessário para que possamos sobre ele con-tinuar construindo e, essencialmente, desconstruindo o que já foi e ainda está sendo superado por novos conhecimentos. Tal discussão filosófica é mesclada aos comen-tários em todas as partes, exatamente para rememorar e até conhecer melhor algumas formas filosóficas de conceber ideias, que, na maioria dos casos, não podemos obter nos bancos das universidades, inclusive nos cursos de Mestrado e Doutorado.

Entendemos que somente conhecendo como pensamos e como os outros pensam podemos propor críticas justificadas a quem fala das cátedras e entender melhor os pontos de vista de nossos interlocutores, notadamente as justificações racionais (ou irracionais) dos que produzem obras que compõem a doutrina tributária nacional. Devemos, pois, ter uma base filosófica consistente, para não sermos advogados ames-trados, à mercê de uma teoria dogmática. Teremos de deixar de ser leitores ou fre-quentadores de cursos que acreditam no que leem e ouvem, sem que o conhecimento seja compreendido e absorvido através de uma crítica fundamentada e contestada na sua origem. Toda esta gama de preparo é necessária ao profissional do Direito no seu labor diário, especialmente àquele que atua junto aos tribunais.

A terceira parte tem como objetivo integrar o cidadão – ser humano – no con-texto da prestação jurisdicional tributária, buscando reivindicar seus direitos cons-titucionais, que estão na base da cidadania e da sociedade civil e que foram sendo superados em face da teoria simplificadora subjacente à doutrina tributária nacional. Para enfatizar notadamente os termos da Constituição-Cidadã de 1988, torna-se necessário reordenar algumas premissas republicanas e democráticas e rememorar questões de Teoria Geral do Estado; estas questões não são teóricas, e terão de ser levadas em conta na prestação jurisdicional tributária, uma vez que foram dissolvidas por uma prestação jurisdicional autoritária do Estado. Os direitos individuais se com-põem a partir de uma dupla estrutura: de um lado, garantem a cada cidadão uma vida com dignidade no meio social e de respeito à sua identidade num plano de liberdade;

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de outro, estes mesmos direitos constituem o patrimônio de cada sociedade civil em forma de bloco, em torno do qual giram tanto os relacionamentos no plano privado quanto no contexto do direito público. Há que se impor a amplitude da liberdade e da dignidade do contribuinte no plano das decisões jurisdicionais tributárias, para des-construir a noção de “interesse público de hierarquia superior”, que, arbitrariamente, está sendo utilizado para justificar definições – nas Cortes Superiores de Justiça – em favor do Fisco.

Na quarta parte, com os elementos formulados nas primeiras três, passamos a dispor dos dados e elementos necessários para discutir a questão da Hermenêutica, aprofundando o debate relativo à superação do dogma do “Direito puro”, para nele introduzir uma linha de entendimento que conecta, gradativamente, a literalidade dos textos legais à contextualidade, para, finalmente, consagrar a pragmática da intencio-nalidade dos preceitos constitucionais.

Na quinta e última parte apresentamos a integração de todo o estudo em forma de conclusões, sugerindo a desconstrução radical da doutrina tributária nacional e mostrando, de um lado, a superação da sua metodologia metafísica e, de outro, sua substituição pela Fenomenologia.

A divisão em cinco partes serve para que possamos falar em cada uma delas sobre determinada perspectiva disciplinar fragmentada, sem perder de vista sua inte-gração num todo complexo que compõe a Ciência Jurídica Tributária. Por via de um olhar segmentador, podemos afirmar que são cinco “livros” que tratam, cada um, de objeto relevante na formulação de uma teoria de interpretação constitucional. Mas a exposição está posta de forma tal que cada parte, na medida do possível, componha com as outras o todo orgânico de um objeto que, complexamente, se reflita como uma totalidade. Esta composição orgânica e complexa, ao mesmo tempo fragmenta-da em disciplinas, está unificada por um fio condutor que não pode ser cortado. Em outros termos: a prestação jurisdicional tributária não está composta por fragmentos: constitui uma unidade sistemática posta metodologicamente pela Constituição. Esta unificação nada mais é do que uma forma genuína de transdisciplinaridade e que, muitas vezes, compõe a multidisciplinaridade.

O presente estudo se estrutura sobre uma base diferente da que está posta pela doutrina tributária atual: visa a propor uma metodologia diferente daquela enraiza-da na consciência dos profissionais do Direito. Em face disso, nossa proposta de exposição segue uma metodologia em que as ideias gradativamente compõem uma estrutura de entendimento até atingir um patamar que permita formar ideias mais amplas quanto ao sistema constitucional. Dessa forma, para que possamos construir um discurso cooperativo conformador, coerente com a Teoria dos Atos da Fala, bus-camos estabelecer um texto conformado com o princípio da realidade e que destaque um cunho de verdade.

Com efeito, os temas que transdisciplinarmente se projetam para o interior do pensamento jurídico tributário deverão ser levados em conta e considerados na for-mulação de um discurso racional; para tal efeito, devem ser enfrentados nos mais

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diversos conteúdos e a partir das mais diversas perspectivas, as quais não conseguem ser dominadas por uma só pessoa. Por isso surge o desafio – para cumprir o requisito da veracidade, da sinceridade, da inteligibilidade e da justificabilidade – de apresentar estas questões que convergem de outras disciplinas para o interior da teoria jurídica tributária no presente estudo.

Para tanto, torna-se fundamental transpor os limites pessoais que impedem o conhecimento amplo da cientificidade, citando estudos reconhecidos, para integrar todas estas questões engendradas de forma transdisciplinar. Buscamos, pois, superar esta lacuna promovendo extensas citações de conhecidos e respeitados autores, de modo que permita ao leitor receber a informação que lhe queremos transmitir de forma consolidada na literatura científica. Neste contexto, adotamos como critério estruturar o discurso em forma de citação – também reiterada – de alguns autores específicos exatamente para manter uma linha de coerência filosófica e científica já reconhecida.2

Nesse sentido, procuramos introduzir a discussão com vistas a que a comu-nidade científica, que está continuamente construindo e desconstruindo a doutrina tributária, possa ter outra perspectiva ao contestar antigos dogmas sobre os quais não há qualquer dúvida. Intentamos mostrar que parte daquilo em que acreditavam os mestres dos nossos mestres, a partir dos ataques radicais promovidos pelo andar da Ciência, transformou-se em algo sem justificação e fundamentação, e que mesmo assim muitas destas mesmas ideias mortas continuam sendo repetidas nas cátedras das universidades, com o cunho de certeza absoluta.

Nesta discussão se incluem temas como os abalos impostos à certeza científica pelos teoremas godelianos e laplacianos, que desconstruíram essa certeza, pondo em seu lugar o princípio da incerteza; como as constatações da Neurociência, da Psiquiatria, da formação natural das cadeias de pensamento do ser humano etc., de-monstrando que o organismo humano é um todo que não pode ser dividido entre uma superconsciência e um corpo animal.

Por esta forma de apresentação, pretendemos mostrar que não há como pensar no Direito sem adotar uma ordenação científica – coerente e atual, justificada numa metodologia específica – que vincule o intérprete na prestação jurisdicional. Não podemos admitir a prestação jurisdicional sem considerar as normas constitucionais interpretadas segundo um pensar racional, filosófica e doutrinariamente baseado em paradigmas epistemologicamente válidos; não podemos pensar no ser humano tendo sua dignidade e liberdade postas a julgamento sem estruturar a prestação jurisdicio-nal conforme seus direitos e garantias individuais; não podemos pensar em toda a matéria apresentada sem uma forma integrada de interpretar as normas com justifi-cação científica, com regras de Hermenêutica compatíveis e adequadas aos diversos planos de realidade que se imponham vinculativamente nos julgamentos judiciais;

2. Todas as biografias de autores, escritores e filósofos foram elaboradas com base nas infor-mações retiradas de Wikipédia – A Enciclopédia Livre (disponível em https://pt.wikipedia.org/wiki/Wikipedia:Pagina_principal).

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finalmente, não podemos pensar numa doutrina de Direito Tributário como um todo orgânico que não inclua de forma integrada entre si todas as questões que compõem sua contextualidade.

O leitor verá que não poupamos esforços de desconstrução do que se denomi-na filosoficamente de pensamento puro, para limpar a prestação jurisdicional desta ideologia apriorística subjetivista, que permite às Cortes Superiores de Justiça jul-garem as questões tributárias na medida de suas posições pessoais, desprezando as prescrições constitucionais. Para tanto, damos combate à permissão de o magistrado fazer as escolhas de elementos e de estruturas de argumentação retórica; pretendemos demonstrar que a prestação jurisdicional está vinculada a paradigmas científicos de determinação da realidade, o que, aliás, está literalmente prescrito a partir da vigência do Código de Processo Civil de 2015. A insegurança jurídica que se instalou no seio da prestação jurisdicional, em que se aplica o Direito Tributário nacional, decorre deste núcleo de justificação doutrinária que entendemos deve ser desconstruído.

Dessa forma, nosso intuito é demonstrar que uma doutrina que considera irre-levantes os objetos singulares na sua formulação teórico-metodológica não pode se prestar a concretizar o texto constitucional em defesa dos direitos e garantias indivi-duais. No máximo, o que alcança com esta justificativa é a universalização genérica dos direitos, o que conduz o olhar prioritariamente ao interesse público, que ipso facto dissolve as garantias asseguradas a cada cidadão.

Para arrematar esta “Introdução”, o centro de atenção de toda a prestação juris-dicional tributária, segundo entendemos, terá que ser revisado por meio da descons-trução da sua estrutura de racionalidade embasada na metodologia lógico-positivista.

Reiteramos que temos noção clara e objetiva da gravidade do que afirmamos e assumimos o dever de comprovar o que é dito neste estudo não por via retórica, mas criticando as metodologias com base nas decisões postas em diversos acórdãos.

Nesse sentido, enfocamos desde o início, inclusive no título, a construção de paradigmas não como luxo para enfeitar o discurso, mas como fundamental para a identificação de um padrão científico que se imponha na prestação jurisdicional, sem o qual não haverá nem certeza, nem segurança jurídica.

Dessa forma ficam mais evidentes todos os argumentos estruturais que propo-mos neste estudo. O que visamos, primordialmente, é que o leitor, ao final da leitura, tenha colhido elementos que lhe permitam repensar, se assim o desejar, a própria estrutura formuladora do seu processo de entendimento das verdades que aceita e das que rejeita, e que tenha se apropriado da necessária justificação e da fundamentação para promover críticas ao que entende ser irracional manifestado nas prestações ju-risdicionais tributárias.

INTRODUÇÃO 25

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O STATUS QUO DO DIREITO TRIBUTÁRIO BRASILEIRO

1. Reflexão Preliminar. 2. A Contextualização da Racionalidade. 3. A Função Jurisdicional Tribu-tária e o Caso Concreto. 4. As Formas de Pensar: o Bom Senso e o Pensamento Científico como Preâmbulos do Conhecimento. 5. O Significado Subjetivo e o Direito Puro. 6. Reflexos da Objeti-vação na Doutrina Tributária. 7. O Pensamento Ideológico. 8. A Realidade Singular Subjacente ao Signo. 9. Análise Estrutural da Racionalidade das Decisões Atuais das Cortes Superiores de Justiça.

Acho que na sociedade atual nos falta filosofia. Filosofia como espaço, lugar, método de reflexão, que pode não ter um objetivo determinado, como a Ciência, que avança para satisfazer objetivos. Falta-nos reflexão, pensar, pre-cisamos do trabalho de pensar, e parece-me que, sem ideias, não vamos a parte nenhuma. (José Saramago)

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Reflexão Preliminar

Nestas últimas décadas instalou-se uma crise de racionalidade no cenário jurí-dico nacional em enfrentamentos nos litígios judiciais em matéria tributária. Exa-tamente nestes casos de carência de fundamentação científica encontra-se a raiz da violência jurisdicional institucionalizada em nosso País.

Objetivamente, na metodologia atualmente adotada para interpretar as normas jurídicas tributárias situa-se a questão que conduz à carência de justificação das decisões: torna-se necessário, então, identificar a matriz de racionalidade que está subjacente a esta forma de pensar. Ou seja, nesta matriz adotada pela jurisprudência e pela doutrina tributária nacional se encontra configurado um espaço para estabelecer uma espécie de ditadura do Judiciário, que impõe ao cidadão-contribuinte obrigações tributárias vedadas pela Constituição.

Esta imposição das diretrizes científicas e da normatização do Estado, ancora-das na linguagem e sua interpretação lógica, está sendo desconstruída já há algumas décadas pela Filosofia. Estas novas ideias, contudo, ainda não foram absorvidas pela doutrina tributária nacional. No contraponto destas posições, partimos de uma perspectiva prática, mesclando gradativamente temas filosóficos, pois a Filosofia se ocupa exatamente de examinar as estruturas teóricas – ou processo de entendimento e conceptualidade – que justificam as formas de pensar no plano da prática científica. Um dos pontos essenciais para estruturar um entendimento preliminar, objetivando avançar no processo cognoscitivo, é levar em conta que existem diversos níveis de conceptualidade sobre os quais se estrutura uma teoria, destacando-se, num primeiro momento, a crítica que questiona os princípios de sua organização.

A propósito, Edgar Morin1 leciona que:

Assim, pois, vemos que existem vários níveis de concepção: o primeiro é o da concepção dentro de uma teoria que permite conceber; o segundo é o da concepção que permite conceber uma teoria nova, adequada aos dados ou aos fenômenos a serem conce-

1. Edgar Morin, pseudônimo de Edgar Nahoum (Paris, 1921), antropólogo, sociólogo e filósofo francês, considerado um dos principais pensadores contemporâneos e um dos principais teóricos da complexidade. Busca uma transformação epistemológica ao questionar o fechamento ideológico e para-digmático das Ciências, além de apresentar uma alternativa à concepção de “paradigma” encontrada em Thomas Kuhn. La Méthode (em Português, O Método), constituída de seis volumes, é considerada uma das maiores obras de Epistemologia disponíveis. Morin afirma que, diante dos problemas complexos que as sociedades contemporâneas hoje enfrentam, apenas estudos de caráter inter-poli-transdisciplinar poderiam resultar em análises satisfatórias.

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bidos; o terceiro nível é o da concepção da concepção, em que se concebem e questionam os princípios organizadores das teorias. A permanência e o sentido de um conhecimento decidem-se ao nível da concepção; a pertinência e o sentido de uma concepção decidem--se não somente ao nível empírico e lógico, mas também ao nível da concepção da concepção.2 (Grifamos)

Em primeiro lugar, para formular um procedimento de concepção não basta ado-tar uma teoria para formular a conceptualização; é necessário verificar se esta teoria efetivamente tem fundamentação que permita afirmar um discurso coerente com o plano de realidade adotado como objeto. Em segundo lugar, é necessário construir uma teoria nova, adequada aos eventos que queremos comprovar, quando a teoria existente é insuficiente; e, em terceiro lugar, devemos formular o teste experimental da teoria quanto à adequação dos princípios organizadores da conceptualidade a ser afirmada. Nestes três níveis situam-se os primeiros temas a serem definidos para estruturar um esquema de ordenação científica.

Neste ponto concentra-se a desconstrução da estrutura das teorias que se sucede-ram desde a Filosofia clássica grega, predominando a estrutura proposta por Platão, que partia do pressuposto de que o Universo era composto por uma inteligência cósmica única, formada por ideias que se manifestavam – por um núcleo de inteligibilidade me-taempírico – como núcleos eternos dos padrões das coisas, denominadas de essências.

Além disso, deve-se observar que os termos idea e eidos derivam de idein, que sig-nifica ver e, portanto, indicam o objeto do ver. Antes de Platão, eram empregados sobre-tudo para indicar a forma visível das coisas, ou seja, a forma exterior, ou a figura física que se capta com os olhos, portanto a visão sensível. A partir de Platão, ao contrário, são empregados para indicar a forma interior das coisas, sua essência. Em consequência de sua “Segunda navegação”, isto é, em consequência da descoberta do mundo inteligível (...), a forma passa do plano físico ao metafísico.3 (Grifos no original.)

Nesse sentido, transcrevemos a seguir Carlos Cirne-Lima, que aponta a virada científica já identificada na Idade Média, em que os filósofos negavam a influência das formas de Platão como causas das coisas na configuração existencial da realidade.

Mas a grande virada ocorre quando os nominalistas, em seu apogeu, como em Ockham, pura e simplesmente negam a existência nas coisas, das formas platônicas. Só as palavras são universais, as coisas são singulares e não existe nelas nada que seja universal; coisas são sempre e somente singulares. Não se trata, pois, de procurar a es-sência universal ínsita nas coisas: isso não existe. Trata-se de elaborar uma teoria sobre como formamos, em nosso conhecimento subjetivo, conceitos que são universais porque aplicáveis a diversas coisas.4

2. Edgar Morin, O Método 3: o Conhecimento do Conhecimento, 3a ed., trad. de Juremir Machado da Silva, Porto Alegre, Sulina, 2008, p. 206.

3. Giovanni Reale, O Saber dos Antigos: terapia para os tempos atuais, 4a ed., São Paulo, Loyola, 2014, p. 156.

4. Carlos Cirne-Lima, Depois de Hegel. Uma Reconstrução Crítica do Sistema Neoplatônico, São Paulo, EDUCS, 2006, p. 101.

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REFLEXÃO PRELIMINAR 31

Importa destacar que a Ciência, notadamente a partir de Descartes, no Discurso do Método (1637), introduziu uma nova teoria que fragmenta os objetos da Ciência em pequenas partes independentes para resolver os problemas dentro de uma gradua-ção hierárquica: primeiro enfrentava os problemas mais simples para, gradativamen-te, resolver os mais complexos. Esta metodologia impôs uma simplificação como forma de solução das questões científicas, ocasionando a dispersão de disciplinas, estudadas como se fossem temas absolutamente isolados.

Sobre esta questão, Edgar Morin refere:

Mais ainda: como previmos (na introdução de La Méthode 3), o conhecimento, no estado atual de organização dos conhecimentos, não pode refletir sobre si mesmo, pois: (1) o cérebro de onde provém é estudado nos departamentos de Neurociências; (2) o espírito que o constitui é estudado nos departamentos de Psicologia; (3) a cultura da qual deriva é estudada nos departamentos de Sociologia; (4) a lógica que o controla é estudada em um departamento de Filosofia; (5) esses departamentos institucionalmente não têm comunicação. Por isso, o conhecimento científico não conhece a si próprio: não conhece o seu papel na sociedade, o sentido de seu devir, ignora as noções de consciência e de subjetividade e, assim, se priva do direito à reflexão, que supõe a auto-observação de um sujeito consciente tentando conhecer o seu conhecimento.5 (Grifamos)

A Ciência em geral, a partir da Renascença, fragmentou o conhecimento em objetos menores, a ponto de se conhecer profundamente, v.g., a Microbiologia, a Mi-crofísica, sem que estes estudos tenham sido integrados no todo ao qual pertencem. Então, conhecemos o detalhe mas desconhecemos, ou pouco conhecemos, o todo em que este detalhe está integrado. Esta falta de integração – das partes no todo e do todo nas partes – tem causado grandes problemas na moldura do estudo sistemático jurídico. Nesse sentido, Edgar Morin é contundente ao se referir à Ciência em geral, naquilo que se reflete no plano da doutrina jurídica:

Assim, os desenvolvimentos disciplinares das Ciências não só trouxeram as vanta-gens da divisão do trabalho, mas também os inconvenientes da superespecialização, do confinamento e do despedaçamento do saber. Não só produziram o conhecimento e a elucidação, mas também a ignorância e a cegueira.6

A Ciência, a partir do século XVII, tem justificado a certeza científica basica-mente num determinismo matemático de definições estruturadas newtonianamente. Esta certeza científica decorre da exigência de formulação de uma hipótese de causa e efeito que explique os fenômenos e permita seja promovida sua demonstração crítica.

A esse propósito, Armindo Trevisan – citando Grosseteste – descreve a estrutura inicial da teoria científica formada a partir da Empiria e que considera a essência – núcleo fundamental do pensamento platônico – algo que não existe. Nesta transcrição

5. Edgar Morin, O Método 4: as Ideias – “Habitat”, Vida, Costumes, Organização, 5a ed., trad. de Juremir Machado da Silva, Porto Alegre, Sulina, 2011, pp. 85-86.

6. Edgar Morin, A Cabeça Bem-Feita: Repensar a Reforma, Reformar o Pensamento, 14a ed., trad. de Eloá Jacobina, Rio de Janeiro, Bertrand Brasil, 2008, p. 15.

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observamos a enunciação dos três níveis de conceptualidade da Ciência experimental, acima mencionados:

Segundo Grosseteste, sempre deve-se partir dos fenômenos naturais, os quais exi-gem acurada atenção. Uma vez concluídas as observações, é preciso deduzir as causas dos fenômenos analisando-lhes os elementos constantes e variáveis, capazes de interferir na determinação das causas. Num terceiro estágio, cumpre formular uma hipótese de explicação dos fenômenos, que deverá ser testada. Com tal método, Grosseteste formulou “a base essencial de toda a Ciência experimental”.7

O terceiro nível exige a fase de testes experimentais para que a teoria seja re-conhecida como científica; neste nível é formulada a explicação do fenômeno como princípio da Ciência experimental. Nesta contraposição identificamos duas formas distintas de formulação do pensamento: Platão partia de uma ideia apriorística e a demonstrava num plano metaempírico; Grosseteste justificava suas afirmações cientí-ficas a partir da constatação empírica, indicando a forma estrutural interna das coisas singulares – duas formas de organizar a racionalidade que passam a se confrontar em toda história da Filosofia.

Explicando o que são as bases da Ciência empírica, Trevisan continua citando Roger Bacon, autor das seguintes linhas importantíssimas para a evolução científica no Ocidente:

Quero ocupar-me agora dos princípios da Ciência experimental, pois sem experiên-cia nada se pode saber suficientemente. Há duas maneiras de adquirir o conhecimento: pelo raciocínio e pela experiência. Raciocinar leva-nos a tirar uma conclusão que temos por certa, mas raciocinar não elimina a dúvida e o espírito não repousará na luz da ver-dade se não a adquirir através da experiência. São numerosos aqueles que têm provas do que pode ser conhecido mas, como não praticam a experiência, ignoram as provas, e tanto são incapazes de evitar o que é nocivo como são capazes de seguir o que é bom.8

Seguindo a trilha indicada por Roger Bacon para compor o conhecimento cien-tífico, é necessária a justificação experimental. A partir desta conclusão, sugerimos a adoção de um paradigma, que desde logo empregamos como postulado a ser demons-trado no curso da presente obra, que pode ser assim resumido: sem declarar a verda-de – ancorada em paradigmas científicos – sobre o que constituem empiricamente os pressupostos constitucionais de incidência tributária não fazemos Ciência Jurídica Tributária e nem conseguimos alcançar a justiça.

Também Capra traça um perfil elucidativo de como opera a teoria da Ciência mecanicista newtoniana, que se desenvolveu a partir das bases compostas por Gros-seteste e Roger Bacon:

7. Armindo Trevisan, Uma Viagem Através da Idade Média: o que a Europa Deve à Idade Média, Porto Alegre, AGE, 2014, p. 231.

8. Idem, pp. 231-232.

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