Livro Lit. Brsileira III

download Livro Lit. Brsileira III

of 117

Transcript of Livro Lit. Brsileira III

LITERATURA BRASILEIRA III

ConselhoEditorialEAD DrisCristinaGedrat(coordenadora) MaraLciaMachado JosdildeLimaAlves AstomiroRomais AndreaEick Obra organizada pela Universidade Luterana do Brasil. Informamos que de inteira responsabilidade dosautoresaemissodeconceitos. A violao dos direitos autorais crime estabelecido naLein.610/98epunidopeloArtigo184doCdigo Penal. ISBN:9788578384401 EdioRevisada

APRESENTAO

Descortinar o panorama dos principais acontecimentos histricos, sociais e culturais do incio do sculo XX at a psmodernidade o quesepropenestelivroLiteraturaBrasileiraIII. A teia, tecida por seus autores, apresenta fatos, reflexos e consequn ciasdesseperodoquecorroboraram,semprecedentes,paracomsigni ficativas mudanas no mapeamento, credibilidade e solidificao das artesemgeraledaculturabrasileira. umdiriodeviagemdescritocomlinguagemclara,objetivaedidti ca,queconvidaoleitoraumaanlisecrticadaARTEESOCIEDADE, primeiro captulo, cujo foco inicia no princpio do sculo XX, enfati zandoasconquistasdamodernidade,possibilitandoaoleitorummo mento de reflexo sobre a cultura brasileira e as diversas formas de interpretla, atravs de produes importantes como Casagrande e senzala,deGilbertoFreyre,RazesdoBrasil,deSrgioBuarquedeHo landaeEvoluopolticadoBrasil,deCaioPradoJnior. ASDIFERENASREGIONAISDOBRASIL,segundocaptulo,detm senasdiversasmanifestaesculturaisdecadaregiodoBrasilesua representaonaobraliterria.Sotambmanalisadasnestecaptuloo romance de trinta como uma espcie literria; sua caracterizao e evoluo, bem como o romance como elemento representativo da sociedadebrasileira,estabelecendoumaleituraestticadahistriado inciodosculoXX. Noterceirocaptulo,ARENOVAODOMODERNISMO,verificase o contexto mundial do psguerra e sua influncia no Brasil, o surgi mento do pensamento conversador, oriundo do perodo da Ditadura Vargas e sua representao em obras como Memrias do crcere, de GracilianoRamos,bemcomooressurgimentodoformalismonaestti ca nacional, especialmente atravs de autores mais voltados para a poesiaconfessionalereflexiva.

6

A RENOVAO DA POESIA, quarto captulo, apresenta as relaes entreliteraturaeartesvisuais,jpresentesempocasanteriores,inten sificadasnoreferidomomentoeteorizadaspormanifestosegruposde poetasemdefesadaquebradalinearidadedapoesiatradicional,assim como os desdobramentos dessa tendncia, que resultaram em experi ncias ricas, em elementos inovadores como o concretismo, a poesia prxis o neoconcretismo. Tambm so contempladas neste captulo a teorizao do carter plstico da poesia e sua permanncia, transfor mada,nacontemporaneidade. Na sequncia, A RENOVAO DO ROMANCE, quinto captulo, expe que, aps passar pelo experimentalismo da Semana de Arte Modernaepeloregionalismode1930,oromancebrasileiroserenovou, principalmente pela experimentao da linguagem em Guimares Rosa e pela perspectiva sociolgica centrada em Jorge Amado. Nesse contexto, a contribuio da narrativa de Erico Verissimo foi muito importantenosentidodeformaodepblicoleitor.Oclimadeeufo ria intelectual que reinou no pas na dcada de 1950 e incio de 1960 influenciou o surgimento de uma literatura mais engajada social mente. Nosextocaptulo,APSMODERNIDADEsinalizaqueastendncias surgidas na Europa e Estados Unidos chegaram ao Brasil de forma incipienteequeaquiseadaptaramculturanacional.Aconceituao depsmodernidadedeveserrevistaquandoaplicadasartesbrasilei ras,dadasascaractersticaslocaiseadefasagemcomquesemanifes tamaqui. O ROMANCE CONTEMPORNEO, stimo captulo, deixa evidente que o Brasil psmoderno conviveu com o momento mais trgico de suahistria,oRegimeMilitar.Sobclimadecensuraerepressopolti ca, a literatura brasileira buscou caminhos para a sobrevivncia e ao mesmotemporesistnciaaoregime.Tantoapoesiacomoaprosaeo teatrotornaramsecontidosemseusaspectosformais,masaomesmo temporicosemmetaforizaodoambientesombrioquepairavasobre asociedade. A abordagem contida no captulo O CONTO CONTEMPORNEO apregoaque,apsaaberturapolticanadcadade1980,oBrasilresta beleceuvnculosmaisprofundoscomosmovimentosestticosestran geirose,comisso,recuperouumpoucodoexperimentalismodaps modernidade que, para ns, no tinha exercido uma influncia to decisiva. O romance nacional toma duas direes importantes uma derevisohistricadoperodorevolucionrioeoutradeinvestigao sobreosgrandesproblemasdasociedadebrasileira.

7No nono captulo, constatase que A POESIA CONTEMPORNEA passa por um momento de crise, tanto no que tange formalidade como aos temas abordados. Entre a permanncia de uma perspectiva poticacentradanasubjetividadeeumaperspectivainovadora,espe cialmentenocampoformal,osnossospoetascontemporneosbuscam seuscaminhos,muitasvezesdistanciadosdopblicoleitor.Poroutro lado, a poesia de carter popular, e mesmo folclrico, permanece e atraileitores,comoosrepentistaseautoresdecordeldonorteepoe tasderuaemoutrasregies. LITERATURA, TEATRO E CINEMA, dcimo e ltimo captulo, apre senta um vigor muito grande e ao mesmo tempo uma popularidade bastanteexpressiva.Oteatroeocinemafizeramcomque aliteratura atingisseumpblicomuitoamploeheterogneo.Anovelalucroucom a televiso e mais uma vez tomou formas diferenciadas e, com isso, sobreviveu aos impactos da sociedade de consumo. O romance no teatro,diversificadoeprospectivo,buscoutemassociaisforadasclas sesdominantes,revelandosociedade,grupossociaisatentoigno rados, como marginais e prostitutas. A violncia, como um grande dramasocialcontemporneo,tambmassumepapelcentralnasinves tigaesdenossosromancistasnocinema. Esperasequeastemticasaquicontidasnosuscitemsensaofinda de abordagem, mas incentivo para vrias outras leituras e investiga es cientficas, capazes de descortinarem possibilidade de novos es tudossobrealiteraturabrasileira. Boaleitura! SantaInsPavinatoCaetano

SOBRE O AUTOR

Luana Soares de Souza

graduada em Letras pela Pontifcia Universidade Catlica do Rio Grande do Sul PUCRS (1984), bem como mestre (1992) e doutora (1998) em Letras pela mesma instituio, tendo como produes co nhecidas na rea os trabalhos A intertextualidade em Memorial do convento, de Jos Saramago e Narrando a nao portuguesa. Atu almente,professoradaUniversidadeLuteranadoBrasilUlbra.Maria Alice da Silva Braga

formada em Letras pela Pontifcia Universidade Catlica do Rio GrandedoSulPUCRS(1997),bemcomomestreemTeoriadaLitera tura (2000) e doutora em Crtica Gentica (2005), ambas na mesma instituio.,atualmente,professoradeLnguaPortuguesaeLiteratu raBrasileiradaUniversidadeLuteranadoBrasilUlbra.Nessauniver sidade,trabalhanoscursosadistncianocampusdeCanoas.Orienta trabalhos de concluso de curso, bem como monografias do curso de especializao. autoradevriosartigosedecaptulosemobrascomo:EricoVeris simo: provinciano e universal (org. Jos Edil de Lima Alves); Mrio Quintana:ironia,cotidianoelirismo(org.JosEdildeLimaAlves)e Narrativa:novosrumos(org.EdgarRobertoKirchof);ecoautorado livroCemanossemMachadodeAssis.Odiombar do Amaral Rodrigues

formado em Letras pela Universidade federal de Santa Maria UFSM,RS(1970).PossuimestradoemTeoriadaLiteraturapelaPonti fcia Universidade Catlica do Rio Grande do Sul PUCRS (1986) e doutorado em Literatura Brasileira pela Universidade Federal do Rio GrandedoSulUFGRS(1998).professordeLiteraturaBrasileirada Universidade Luterana do Brasil Ulbra e professor aposentado da UFSM.Orientatrabalhosdeconclusodecurso,bemcomomonografi

10

asdocursodeespecializao.autordevriosartigosedecaptulos emobrascomo:Otempoeovento:personagens(org.CceroGaleno Lopes);VertentespoticasdeMrioQuintana(org.JosEdildeLima Alves);Etamundovelhosemporteira(org.JosEdildeLimaAlves) eEvaLuna:aguerrilheiradapalavra(org.MrciaHoppeNavarro). Temdiversostrabalhospublicadosemcongressosnacionaiseinterna cionais.

SUMRIO

1 ARTE E SOCIEDADE ........................................................................................ 15 1.1 O Brasil contemporneo .......................................................................... 16 1.2 Estilos contemporneos .......................................................................... 19 Ponto final .................................................................................................... 22 Atividades .................................................................................................... 23 2 AS DIFERENAS REGIONAIS DO BRASIL .......................................................... 24 2.l A narrativa de transio............................................................................ 24 2.2 A dcada de 1930 e a literatura brasileira ............................................... 27 2.3 O romance de trinta................................................................................. 28 Ponto final .................................................................................................... 34 Atividades .................................................................................................... 35 3 A RENOVAO DO MODERNISMO ................................................................... 36 3.1 A poesia brasileira aps a Semana de Arte Moderna ................................ 36 3.2 A periodizao ....................................................................................... 39 3.3 Contexto histrico e cultural .................................................................... 41 3.4 A poesia em renovao ........................................................................... 42 Ponto final .................................................................................................... 45 Atividades .................................................................................................... 45 4 A RENOVAO DA POESIA .............................................................................. 47 4.1 Aspectos tericos.................................................................................... 48

12

4.2 Principais autores ................................................................................... 52 4.3 A poesia na mdia .................................................................................... 54 Ponto final .................................................................................................... 55 Atividades .................................................................................................... 56 5 A RENOVAO DO ROMANCE .......................................................................... 57 5.1 Escritores alm do modernismo ............................................................... 57 5.2 O romance na segunda fase do modernismo ............................................. 60 Ponto final .................................................................................................... 66 Atividades .................................................................................................... 67 6 A PS-MODERNIDADE.................................................................................... 68 6.1 A nova prosa brasileira ........................................................................... 68 Ponto final .................................................................................................... 74 Atividades .................................................................................................... 75 7 O ROMANCE CONTEMPORNEO ...................................................................... 76 7.1 Contexto histrico ................................................................................... 76 Ponto final .................................................................................................... 85 Atividades .................................................................................................... 86 8 O CONTO CONTEMPORNEO ........................................................................... 87 8.1 O conto contemporneo e suas caractersticas ......................................... 87 Ponto final .................................................................................................... 92 Atividades .................................................................................................... 93 9 A POESIA CONTEMPORNEA .......................................................................... 94 9.1 O potico na contemporaneidade............................................................. 95 9.2 Poetas e textos ....................................................................................... 96 Ponto final .................................................................................................. 101 Atividades .................................................................................................. 101 10 LITERATURA, TEATRO E CINEMA.................................................................. 103

1310.1 Histrico............................................................................................. 103 10.2 Literatura e cinema ............................................................................. 106 10.3 Literatura e teatro ............................................................................... 109 Ponto final .................................................................................................. 111 Atividades .................................................................................................. 111 REFERNCIAS NUMRICAS ............................................................................. 113 REFERNCIAS ................................................................................................ 114 GABARITO ...................................................................................................... 116

1Luana Soares de Souza

ARTE E SOCIEDADE

Aarteumreflexodasociedadeecomelamantmumdilogocons tante, refletindo e influindo em seus destinos. Atravs dela o homem expressaoseucontextosocial,marcadopelasconquistasedesventuras noscampospoltico,socialeeconmico.Aartenoapenasumcom ponentedasociedade,tratasetambmdeumelementopromotordos avanossociaiseumregistrodessaevoluo. Para falarmos em ARTE CONTEMPORNEA, devemos estabelecer marcos referenciais. Consideramos como tal a arte produzida aps a Segunda Guerra Mundial, portanto, a rigor, ela se estende do ano de 1945ataatualidade.Mesmoassim,estenoumperodomonoltico, e sim um momento repleto de distines, oposies e mesmo involu esemtermosestticos.Oartistamostra,porsuaarte,acapacidade decompreensodomundoqueocercaedosconflitosqueasociedade estabelece.Assim,aarteps1945repletadecontrastesquerevelamo mundodivididoqueaSegundaGuerraMundialnoslegou. O que mais caracteriza essa arte a sua receptividade com o velho, situao impensvel para um artista modernista. No modernismo, a palavradeordemeraadestruiodopassadoeacriaodealgoque, muitas vezes, no estava bem definido para o artista. A arte ps modernaseposicionaemumaposturadereleituradopassado,recons truindooquelheinteressaerecriandotudoquepossadarnovosenti doproduoartstica.Nosepode,comisso,imaginarqueelapro movaqualquersaudosismo;pelocontrrio,elaestvigilantenaobser vaodopassadoafimdelhetrazerganhoesttico. A arte contempornea nada mais que um processo de integrao entre as diversas linguagens, revelando uma mistura de tendncias e produes artsticas. O pblico, por sua vez, tem modos de acesso arte atravs de instalaes, performances e tecnologias que se afastam,

16

emmuito,dosambientestradicionaisdasgaleriasdearte.Emgeralela tomaoespaopblico,vaiasruasedialogadiretamentecomoapreci ador. Com esse sentido, os artistas contemporneos promovem uma democratizaodaarteeumacessouniversalaosbensculturais. Mesmonadenominao,essaarteapresentaconflitos.Nosounni mesoscrticoseartistasnahoradedenominaresseperododaHist ria da Arte. Para alguns, o termo arte contempornea suficiente para anunciar esse grande movimento artstico. Outros preferem o termo psmodernismo para definir este mesmo movimento. Sobre cada uma dessas denominaes recaem objees, pois em ambas no h um referencialnaterminologiadaesttica,quesecentramemparmetros detemporalidade. AcrticaapontaacriaodaBienaldeVenezacomoomarcoreferenci al da divulgao da arte contempornea. A rigor, podese apontar ainda o sculo XIX como incio do movimento da Bienal de Veneza, poisnoanode1895foiorganizadaaprimeiraamostra,comrepercus so apenas local. Em 1907, ela adquiriu frum internacional com a participaodediversospases,massapsaSegundaGrandeGuerra (19391945)elaobteveoseucarterdepromotoradaartecontempor nea.apartirdessemarcoqueelapassouainfluirnaproduoartsti caanvelmundial. Estecaptulotemporobjetivoenfocarasociedadebrasileiranoincio dosculoXX,revelandomuitosaspectosdasrealizaesdamoderni dadeeapassagemparaapsmodernidadenoBrasil.Acompanhara evoluoculturaldoBrasil,aolongodosculoXX,umatarefacom plexa,poisnesseperodoonossopaspassouporprofundastransfor maes a fim de acompanhar o desenvolvimento artsticocultural da EuropaeEstadosUnidos.

1.1 O Brasil contemporneoParasefalaracercadaartecontempornea noBrasilnecessrioque se faa algumas consideraes em termos de evoluo da sociedade brasileira. O Brasil que surgiu aps a Segunda Guerra fruto de um processo que se iniciou bem antes. Foram diversos movimentos que traaramosrumosdasociedadebrasileiraaolongodosculoXX. Retornandoumpouconotempo,vamosnossituarnadcadade1930, que foi decisiva para o desenvolvimento do Brasil contemporneo. Aquele momento foi marcado pelo esgotamento das turbulncias da SemanadeArteModerna,quejseencontravaemplenaacomodao aospadresmaistradicionaisdaartenoBrasil.Essefoiummomento

17dereflexosobreasociedadebrasileira,principalmenteemfunodas interpretaesquegrandespensadoresproduziram. O grande evento da dcada de 1930 foi a Revoluo Getulista, que rompeucomumatradiodedomnionacionalpelosgruposeconmi cos,dominadospelosprodutorespaulistasdecafepelaindstriade laticnios mineira, a chamada poltica do caf com leite. A entrada de Getlio Vargas no cenrio poltico nacional renovou as estruturas de podere,aomesmotempo,promoveuummovimentodeindustrializa onacional.OBrasilpassouporgrandestransformaes,oquemoti vou diversos pensadores a refletirem sobre a histria e o destino do pas. Podemosconsiderarcomoobrasfundamentaisdessainterpretaodo BrasiloslivrosdeGilbertoFreyre,comCasagrandeesenzala,deSrgio BuarquedeHollanda,comRazesdoBrasiledeCaioPradoJnior,com EvoluopolticadoBrasil.Essestrsgrandestextosforamfundamentais na questo de perceber o Brasil que despontou no sculo XX, bem como para compreender os rumos que a sociedade brasileira deveria tomarnasuacaminhadaemdireoaocontextomundial.Compreen der essas trs grandes obras fator decisivo para a compreenso de temas que hoje norteiam as discusses na sociedade brasileira, como polticasdeintegraoracial,polticasdeserviospblicoseoutras. MuitosoutrosestudiosospassaramarefletirsobreoBrasilapartirdas propostas desses trs grandes pensadores. No que eles no tenham recebido revises, mas com certeza eles so um marco referencial, de sortequenohcomopensarnoBrasilsemumarefernciaespeciala eles, quer para ouvir seus ensinamentos, quer para contrapor seus argumentos.

CASA-GRANDE E SENZALA, de Gilberto FreyreGilberto Freyre (19001989) o escritor mais conhecido e ao mesmo tempoomaisquestionadopelossocilogosbrasileiros,principalmente devido aos seus posicionamentos polticoideolgicos, tendo sido membrodoConselhoFederaldeCulturanogovernodoGeneralMe dici, o que no retira em nada o brilho de suas interpretaes. Pode mos dizer que Casagrande e senzala (1933) sua obra de referncia, seguida de Sobrados e mucambos (1936) e Ordem e progresso (1959). As trsformamumatrilogiaconhecidacomoIntroduohistriadasocie dadepatriarcalnoBrasil. AobradeFreyreumaprofundasondagemantropolgicasobrenossa formao como sociedade, revelando os processos de miscigenao

18

com os quais o Brasil construiu (e ainda constri) a sua identidade. Nesses estudos, o autor pernambucano trouxe para a discusso ques tescomoaimportnciadonegroedondionaformaodafamliae dasociedadebrasileira.Umdospontosmaiscontroversosdateoriade FreyreaquestodaDEMOCRACIARACIAL,pois,paraalguns,essa visodedemocraciananossaformaomaisummodoideolgicodo que um resultado de pesquisa e reflexo. Em tempos de POLTICAS AFIRMATIVAS, esse tema se torna candente e objeto de muitas dis cusses.

RAZES DO BRASIL, de Srgio Buarque de HollandaSrgio Buarque de Hollanda (19021982) lanou Razes do Brasil em 1936, inovando o ensasmo no Brasil, pois sua obra um marco na passagemdalinguagempedante,dofinaldosculoXIX,paraorigor da pesquisaeo exame acurado dos textoshistricos,desde as nossas origens.AvisohistricapresenteemRazesdoBrasilcontemplauma posturamarxistasobreainterpretaodasrelaessociaisnahistria brasileira,trazendoparadiscussoumdosassuntosmaisempolgantes naanlisedopovobrasileiro:aquestodacordialidade. A cordialidade no pode ser interpretada como passividade ou qual queroutraformadedisplicnciadopovobrasileiro,poisopensamen to de Buarque de Hollanda tem uma dimenso mais abrangente e profunda. O que se deduz da obra desse pensador paulista que a cordialidade deve ser interpretada como uma certa dificuldade que o povo brasileiro tem para lidar com a esfera pblica e tornar pessoais assuntos coletivos. Podese afirmar que essa cordialidade tem mais a vercomapaixodesmedidaqueosbrasileirosvivenciamdoquecom questes de polidez social. O termo cordial, aqui, conceituado pela suaprpriaetimologia,ouseja,relativoaocorao,aoimpulsoemo tivo.Poressarazonosexemplificaoautorqueodesconhecimentode qualquerformadeconvvioquenosejaditadaporumaticadefun doemotivorepresentaumaspectodavidabrasileiraquerarosestran geiroschegamapenetrarcomfacilidade1. Assim,aconcepovulgardecordialidadeficadesfeita,poisaadver tnciadoautornosdeixaconscientesdequehumtraoemotivoem nossaformaocultural,oquejustificanosalgunsextravasamentos, comocertaspaixesoumesmo,emumplanomaior,algumasmazelas econcordncias.

19

EVOLUO POLTICA DO BRASIL, de Caio Prado JniorApreocupaodeCaioPradonessaobra,publicadaem1933,estabe lecerasrazesdenossaevoluoculturalepolticaapartirdasrelaes coloniais. O modo de colonizao portuguesa influiu decididamente naformaodeumaelitedirigentenoBrasile,comisso,acomodouno novo mundo um tanto das mazelas da corte portuguesa com uma incipienteburocraciacolonial. Entender as relaes entre colonizador e colonizado fundamental paraquesecompreendaosmodosderelaesentreopodereoscida dosnonovomundo.Segundooautor,omodoautoritrioedesleixa do do colonizador portugus produziu se no todas, pelo menos em parte,asdistoresqueseobservanoBrasilcontemporneo.

1.2 Estilos contemporneosAcontemporaneidadesenotabilizapelaproduodediferentesestilos deformaintegrada,evidenciando,assim,umatendnciaaoecletismoe quebradeprincpiosdedivisoentreasartes.Asbarreirasentrearte enoarte,bemcomoentreelasaexemplodapintura,dodesenhoe daescultura,passamaserquestionadospelacontemporaneidadeque promove uma participao ativa da arte na sociedade e, com isso, rompe barreiras de tcnicas e estilos e passa a utilizar todo o recurso tecnolgicodisponvelafimdepromoverumamaiorintegraocomo pblicoecirculaodevaloresestticos. Muitassoastendnciasquepodemserapontadascomoresponsveis pelagranderevoluodasartes.Paraonossopropsitovamoseleger algumastendnciasquesomaisrepresentativase,aomesmotempo, ilustrativas.

Hard edgeEsta uma tendncia que nos vem dos Estados Unidos e tem como fator principal o uso intensivo dos contrastes no contorno do objeto artstico.Elausaformassimples,abstratasecomfortecolorido.Man tmcertodistanciamentoeproduzaimpressodequetudoestsendo reproduzido,quaseemumsentidodepassadoalimpo.Essasensa o que levou alguns crticos de arte a considerla como uma arte queprenunciavaofimdasartes.

20

Arte conceitualA chamada arte conceitual um esforo do artista no sentido de pro mover uma maior integrao com o pblico. Dessa forma, ele atribui aosseustrabalhosadenominaodeobjetocomaintenoderessaltar aofertadealgoparaqueoapreciadorcontribuacomainterpretao. Oquevaleaconcepoquemotivaacriaoenooprprioobjeto acabado. A obra de arte sai da posio de OBJETO EXPOSTO para adquirir o conceitodeINSTALAO quepermite ao pblico partici pardaarteeinteragir.Comessaparticularidadeaartetornase,tam bm, mais provocativa e atinge os grandes espaos da cidade como praas,edifcioseavenidas.

FotorrealismoA tendncia fotorrealista um esforo para recuperar o realismo na arte contempornea, porm isso no significa um retorno simples ao figurativo,masumaformadeutilizaratecnologiadisponvelafimde produzirpeasartsticasquepossamterumacomunicaovisualmais diretacomopblico.Ecomoauxliodecmarasfotogrficas,docom putador e de outros aparatos que o artista produz o seu objeto e, a partir disso, age sobre a imagem e imprime o seu conceito, fazendo comqueofruidordesseobjetotambmparticipeaocomplementaras interpretaespossveis.umaarteque,partindodatecnologia,pro moveumareleituradasimagensjreconhecidaspelopblico. Muitas outras tendncias podem, aqui, serem apontadas, mas para o objetivo de nossa exposio esses movimentos so suficientes, em especial,pelaformacomoelesinteragemcomopblicoeosmodosde integraoentreosdiversoscamposdasartes.importanteobservar, tambm, que esses movimentos citados so responsveis por uma maiorinteraoarte/pblico.

1.3 A arte contempornea no BrasilOBrasilestatentoaosgrandesmovimentosinternacionaisepromove emnossopasasrevoluesqueseprenunciamlfora,pormfazuma reflexosobreaculturabrasileiraerespeitaosespaosdemarcadosde nossaevoluocultural.Noumameratransposiodetendncias, masumaconscienteproduodearteinterligadaaosgrandestemasda sociedade. Diramos que o Brasil partilha muito mais das tcnicas do quedoscontedosexpostos. Alm de acompanhar os grandes movimentos internacionais, aqui se produziu uma gama de tendncias que refletem a nossa histria e

21nossosproblemassociais.Emconsonnciacomorestantedomundo,o Brasil comeou, a partir dos anos 1950, a promover uma profunda transformaonasartes.Entretantosmovimentosimportantedesta caralgunsqueinfluenciaramdecisivamentenocampoartsticonacio nal. Dois grandes eventos podem ser apontados como direcionadores dasartesnoBrasil:aBIENALDESOPAULOeoTROPICALISMO, queatingiram,deformageral,todasasartes,partindodasartesplsti casedamsica,respectivamente. Adcadade1950foiomomentodachegadadessagranderevoluo noBrasil,principalmentepeloinciodaBienal,em1951.Adcadade 1960 foi marcada pelo surgimento do tropicalismo e o domnio da irreverncia.Adcadade1970contrastouprofundamentecomaante rior, pois estava subordinada ditadura militar. Isso fez com que ela adquirissearesdedistanciamentoeassimilaodeconceitosetecnolo gias.Dosanos1980emdiante,apsoRegimeMilitareaConstituio de1988,oBrasilretomouoseucarterfestivo.Aartesetornou mais populareengajada.Tambmcontriburamparaistoasnovastecnolo giasquesefirmaramnomercado,possibilitandomdiasmaisinterati vasepopulares.

Bienal de So PauloAsbienaisemSoPaulosoreferenciaisimportantssimosemtermos deartecontemporneanoBrasil.Issoporqueelaspropiciaramainter relaodemundos,divulgandoaartebrasileiranoexterioretrazendo aarteinternacionalaoBrasil. A1BienaldeSoPaulo,idealizadaporFranciscoMatarazzoSobrinho (18981977), foi aberta ao pblico no dia 20 de outubro de 1951, con tando com a participao de 1.854 expositores de 23 pases. Esse pri meiro grande evento pode ser considerado modesto em comparao comadimensointernacionalqueaBienalassumiunaatualidade.Ela teve sua origem e inspirao na Bienal de Veneza e hoje tem tanta expressoquantooeventoitaliano.

TropicalismoOmovimentotropicalistasurgiunadcadade1970sobalideranade um grupo de artistas baianos como Gilberto Gil, Caetano Veloso e Maria Bethnia. O clima carnavalesco e descontrado do movimento atingiu o Brasil inteiro de imediato. Por sua irreverncia e posiciona mentos polticos, os tropicalistas tiveram problemas com o Regime Militar,oque resultounoexliodeseusprincipaislderesenosurgi mentodeumatemticaderesistnciapolticanamsicabrasileira.

22

Muitossoosexemplosdetextosmusicaisque,deformaveladadevi docensura,conseguirampassarparaograndepblicomensagensde resistncia. S como um exemplo desse momento, podese apontar a msica Clice de Chico Buarque e Gilberto Gil2. Essa msica parte de um trocadilho possvel entre clice e calese. Dessa forma cifrada elaconseguiucircularetransmitirseuprotesto. OversoPai,afastademimesteclicepodeterumaleituradiferenci ada se trocarmos clice por calese, ficando evidente o desejo de livrarsedarepressopolticadapoca.Noversoqueaparecelogona sequncia,surgeumafusodosdoissentidos:[...]tintodesangue.O autorexplicitaocontedodoclicecomosendosangueenovinho. Outrocasojnoteveamesmasorte.GeraldoVandr,deformadireta e veemente lanou Pra no dizer que no falei de flores3. Abordando a mesmaquestodaresistncia,aletradamsicamuitomaiseloquen te, o que resultou em forte perseguio do regime militar. A letra da msica traz, de forma bastante explcita, algumas provocaes ao po derinstitudonoBrasil,comonoverso:Somostodossoldadosarma dosouno.umaformadiretadeconvocaropovoresistncia;por essaeoutrasrazes,essamsicasetornouhinodequalquermovimen topopulardelutasocial.

Ponto finalA posio do Brasil, como pas colonizado, torna a nossa literatura comprometidacominterpretaeseesforosparaevidenciarasdiver sasformasdesuperaodosentimentodeinferioridade. O Brasil, hoje, desfruta de uma posio privilegiada no concerto das naes. umpas respeitado pelassuas tradies e ao mesmo tempo admirado pela criatividade de seus artistas. A arte brasileira contem pornea conquista espao nos palcos, nas prateleiras de livrarias ou nasgaleriasdearte,competindoemigualdadecomartistaseuropeuse norteamericanos. A literatura brasileira consistente e permeada por uma posio de plenoreconhecimentodenossaidentidadeenossocontextopolticoe social. Isso seevidencia no s pelos prmios e tradues que nossos escritoresrecebem,mastambmpelaposiodedestaquequealngua portuguesa,faladanoBrasil,adquiriunocontextomundial.Hoje,alm de sermos o maior pas de lngua portuguesa, podemos em p de igualdadecomPortugaletodaacomunidadelusfonadefender,am pliaredivulgaraomundoalnguadeCames.

23Estudaraliteraturabrasileiracontemporneaum modo deinsero navidabrasileiraeparticipaonasgrandesdiscussesquedominam a vida nacional. Mantendo o posicionamento inicial de que o artista est integrado com a sociedade em que vive, podemos afirmar que a literaturaumadasmaisfecundasfontesparaexercermosacidadania enoscomprometermosdeformaativacomosdestinosdanao.

Atividades1) Assinale a alternativa INCORRETA sobre a relao literatura e sociedade: a) Aarterefleteasociedadeemqueestinserida. b) Aarteacompanhaaevoluopolticaesocialdasociedade. c) Aartenodeverepresentarasociedade,poisissoumaao poltica. d) Assimcomoaarterepresentaasociedade,elatambminflui sobreasociedade. O tropicalismo foi um movimento musical liderado por artistas baianos,EXCETO: a) MariaBethnia. b) GilbertoGil. c) CaetanoVeloso. d) RobertoCarlos. Aarteconceitualtemcomocaractersticaprincipal: a) Presenadefigurashumanasbemdelineadas. b) Usodeespaospblicoscominstalaesprovocantes. c) Usodecoresfortesetraosbemdefinidos. d) Recursosdafotografiacomoprojetodedesenho. AprimeiraBienaldeSoPaulofoiidealizadapor: a) FranciscoMatarazzoSobrinho. b) GilbertoFreire. c) AntnioCndido. d) MriodeAndrade. IndiquearelaocorretaentreautoreobraqueinterpretaoBrasil nadcadade1930: a) GilbertoFreyreCasagrandeesenzala. b) CaioPradoJniorRazesdoBrasil. c) SrgioBuarquedeHollandaEvoluopolticadoBrasil. d) SrgioBuarquedeHollandaSobradosemucambos.

2)

3)

4)

5)

2Luana Soares de Souza

AS DIFERENAS REGIONAIS DO BRASIL

O Brasil um pas continental, o que evidencia as suas grandes dife renasregionais.Apesardaforteunidadelingusticaesentidodeiden tidadecomum,obrasileiropercebeopasporsuaregio,estabelecen dovnculosmuitofortescomacomunidadeaquepertence.Estecap tulo se destina a discutir as diversas manifestaes culturais de cada regio do Brasil e sua representao na obra literria. O ROMANCE DETRINTA,comotipoliterrio,atravsdesuacaracterizaoeevolu o,ofocoprincipaldestecaptulo. Antes de ingressar no estudo do romance de trinta importante exa minaraproduoliterriaqueoantecede,evidenciandooscaminhos propostos por escritores que j no mais obedeciam aos ditames da SemanadeArteModerna,mastambmaindanohaviamencontrado um direcionamento esttico em comum. Esses autores so considera dosindependentesemrelaoaescolas.

2.l A narrativa de transioAo se extinguir o fervor da poesia modernista, a prosa iniciou um percursoexperimental,produzindotextosque,senosomuitopopu lares, so significativos como ensaio para a evoluo que o romance nacionaldesenvolveulogoaps. Neste estudo, vamos enquadrar trs autores: Mrio de Andrade, Os walddeAndradeeAlcntaraMachado.Cadaumteveumposiciona mentoemrelaonarrativanacional,mas,emcomum,elesestavam preocupadosemdesenvolvertextosqueestivessemligadosrealidade brasileira. Esse momento que antecede o romance de trinta foi domi nado pela viso mais unitria, ainda no estava imbudo da viso regionalistaquelogotriunfaria.AlcntaraMachado,MriodeAndra de e Oswald de Andrade, ao lado de outros autores, produziram um conjunto de textos que marcou muito bem o melhor da narrativa do

25modernismo e, ao mesmo tempo, um momento de transio do ro mance tradicional para o grande movimento do romance de trinta. Veremos outros detalhes da produo desses autores no captulo 5, sobrearenovaodoromancenoBrasil,sobretudonasegundafasedo modernismo.

Mrio de Andrade (1893-1945)Ainda nocalor das discusses da Semana de Arte Moderna, Mrio j seposicionavaafavordeumprojetomodernistaquerefletisseacons cincianacional.Paraele,ocaminhofoiabuscadacoletividade,trazer asociedadeparadentrodotexto,anulandoumpoucoavisodeheri isolado. Para obter esse resultado, ele buscou temas no conhecimento popular,nofolclore. Por outro lado, a pesquisa resultou, tambm, em uma renovao for maldoromance,poisotextodeMrioquebrouatradiodoromance de base realista do sculo XIX. A forma se tornou fragmentada e, em muitos casos, um tanto desconexa. Com muita nfase, Mrio promo veu uma reavaliao de romancistas nacionais, procurando apontar valores e defeitos que, segundo ele, estavam presentes em obras de seusantecessores. OMriodeAndradequesurgecomoprosadorbastantediferentedo poeta da Semana de 1922, pois em 1930 ele estava mais preocupado comumarenovaodoromancedoquecomumalideranaentreseus contemporneos. Mrio publicou Amar, verbo intransitivo, em 1927, que inaugurou essa fasedanarrativabrasileira.Tratasedeumtextodedennciadaestru tura familiar paulista, muito preocupada em preservar uma moral conservadora,masqueconvivecommazelassociais.Anarrativagira emtornodeumgrandeindustrialquecontrataumagovernantaalem paraensinaralemoaosfilhosCarlos,MariaLusa,LauritaeAldinha. Porm,oobjetivorealiniciaroadolescenteCarlosnavidasexual.O conflitoqueseestabeleceentreumagovernantadefunodupladen trodafamliamotivoparaquestionarocomportamentodaclasserica paulista. OseusegundotextonarrativoMacunama,publicadoem1928.Identi ficado inicialmente como rapsdia, considerado sua obraprima. uma representao do choque cultural entre um ndio amaznico e a cultura urbana, requintada e de influncia europeia. Macunama conhecido como o heri sem nenhum carter, o que no significa despersonalizao,massimabuscadeidentidade.Macunamasecasa

26

comCi,amedomato,edelarecebeumamuleto.Perdidooamuleto, ele parte para sua grande aventura atravs do Brasil, acompanhado pelosirmosJigueMaanape.Depoisdemuitasperipciasedereen contraroamuleto,eleretornaaoAmazonas,ondemorreesobeaocu, transformadonaconstelaodeUrsaMaior. Assim,possvelafirmarqueanarrativadeMriodeAndradeum esforo pela revelao da conscincia nacional e pela preservao de nossas lendas e costumes. Nas duas obras descritas, temos as suas principaiscontribuies:osentidodepreservaodatemticapopular eacrticamoralburguesapaulista.

Oswald de Andrade (1890-1953)Oswald de Andrade, que foi parceiro de Mrio na Semana de Arte Moderna de 1922, rompeu relaes com o amigo em 1929 e iniciou umacarreiraindependente,maisdirecionadaparaamilitnciapoltica no Partido Comunista Brasileiro (PCB). A vida turbulenta o tornou conhecido como um autor irreverente, mas ao mesmo tempo funda mentalparaacompreensodomodernismonoBrasil. Dois textos podem ser destacados: Memrias sentimentais de Joo Mira mar,de1924,eSerafimPonteGrande,de1933.Essesdoisromancesso revolucionriosemtermosdenarrativanacional,vistoqueempregam tcnicasexperimentaisepromovemumarevisodospostuladosest ticos do incio do sculo XX. Oswald de Andrade pode, tambm, ser apontadocomooescritorquemelhorassumiuoprojetomodernistade 1922, trazendo para a produo os princpios pregados nos discursos acadmicos. Memrias sentimentais de Joo Miramar considerada a grande obra modernistaporexemplificartodososprincpiosdefendidospelogru podeautoresdaSemanadeArteModerna.Otextorompecomanar rativatradicionalporserorganizadoemblocosjustapostos,semuma ordenaosequencialdecaptulosenarraepisdiosisolados,repletos deironiaehumornavidadeMiramar.Aestruturadotextoaproxima oromancedatcnicacinematogrfica,revelandocertaantecipaodas convergncias entre artes que vo ser intensificadas na ps modernidade. O romance Serafim Ponte Grande muito mais do que uma crtica burguesia: revelase como um projeto de produo de uma literatura social,engajadanalutadeclasses.Emrelaopoca,umromance devanguarda,tantopelostemasabordadoscomopelatcnicaempre gada.AlgunscrticospercebememSerafimPonteGrandeumacontradi

27o, pois o autor, pertencente burguesia paulistana, revelase um crticoferozdessasociedade,oquedenota,tambm,aposturaparado xalmuitopresentenomodernismobrasileiro.

Alcntara Machado (1901-1935)OpaulistaAlcntaraMachadoparticipoudaSemanadeArteModerna eengajousenosmovimentospolticosdapoca,chegandoasereleito deputado pelo Rio de Janeiro. Sua obra principal, Brs, Bexiga e Barra Funda, de 1928, um compromisso do escritor com a colnia italiana dessesbairrosdeSoPaulo.umaobraquemisturaambienteeper sonagensdaperiferiapaulistacomoutrosespaosepersonagensficci onais. Brs, Bexiga eBarra Funda retrata o cotidiano decomunidadesdeimi grantesitalianos,revelandolinguagemecostumesdessesgrupossoci aisempequenosrelatosqueregistramomododevidadessascomuni dadeseoconflitodeadaptaoaonovomundo.Namaioriadostextos surgemoperriospobreseemlutapelasobrevivncia.

2.2 A dcada de 1930 e a literatura brasileiraARevoluode1930foiumarespostabrasileiragrandedepressode 1929,quereformulouoordenamentopolticoeeconmicodoOciden te. Essa revoluo foi a convergncia de diversos movimentos que vinhamagitandooBrasil,desdeoinciodosculo,comooMovimento Tenentistade1922eaColunaPrestes,ocorridaentreosanosde1924e 1927. De um modo amplo, podese dizer que a Revoluo de 1930 marca a entrada do Brasil no sculo XX, pois at ento convivamos com uma estrutura de poder chamada de Repblica Velha, que no se distanciavamuitodoBrasilImperial. Emumaavaliaopreliminar,podeseapontarumasriedeconquis tas sociais que a sociedade obteve com o governo de Getlio Vargas, masoprocessodeindustrializaoocasionouumaatraomuitoforte dacidadesobreocampo,oquecontribuiuparaumaumentodoxodo rural.EsseofocodasdiscussesnochamadoROMANCEDETRIN TA, que to bem representou esta fase da nossa histria. O governo Vargas,nesseprimeiromandato,podeserapresentadoemdoisgran desperodos:umde1930at1937comumarelativademocracia,eo segundoperodoabrangeosanosde1937at1945quandoafaceda ditadurafoimaisexplcita. A literatura retrata esses movimentos sociais e, ao representlos, de nuncia os desmandos e a censura vigente na poca. Os intelectuais

28

passaram por momentos difceis e alguns tiveram de ir para o exlio. Jorge Amado se exilou no Uruguai, Graciliano Ramos conheceu a priso e Dyonlio Machado enfrentou a tortura. Como fruto de sua experincianapriso,GracilianoRamosescreveuMemriasdocrcere, romancepungenteeautobiogrfico. AgeraodaSemanadeArteModernateveemseuprojetoanfaseno planoesttico,jageraodetrintapriorizavaosproblemassociaise ideolgicos. A viso regionalizada do Brasil permite que o pas seja retratadoemumamplopaineldenorteasul,evidenciandoasdiferen ase,aomesmotempo,questionandoosproblemascomunsdasocie dadebrasileira.Avivnciaeconvivnciadosproblemassociaispor parte dos escritores propiciou tomadas de posio ideolgicas defini das. Alguns andaram em direo esquerda, como Jorge Amado e GracilianoRamos,enquantooutrosseuniramaoconservadorismode direita,comoPlnioSalgadoeMenottiDelPicchia.

2.3 O romance de trintaEm primeiro lugar importante que se examine a denominao RO MANCE DE TRINTA, pois alguns crticos tm oferecido resistncia paraaadoodessaterminologia.Duasordensdequestionamentosse apresentam:essadenominaonomarcanenhumfatoresttico,ape nasvinculaaproduoliterriadapocaaummomentohistricoeo fato de que esses romances no mantm vnculo forte com a Semana de Arte Moderna. Assim, se os poetas que produzem na dcada de 1930 tm conscincia de sua filiao ao modernismo, o mesmo no acontece com os prosadores. Esses romances so tambm conhecidos comoROMANCESREGIONALISTAS,oquelevaaumainterpretao mais apressada a identificar o sentido de regionalista com rural. Essa postura atenta contra a presena de romances urbanos dentro dessa mesmatendncia. Outroquestionamentopossveloperododeabrangnciadessaten dncia.Paraalguns,operodoseestendede1930atadcadade1960, um perodo muito grande da nossa literatura e, ao mesmo tempo, ignora a produo inovadora de Guimares Rosa. Salvo melhores explicaes, para o nosso propsito, o perodo da publicao de A bagaceira,em1928,deJosAmricodeAlmeida,atGuimaresRosa, comapublicaodeGrandeserto:veredas,em1956,podeserconside radocomopredomniodochamadoROMANCEREGIONALISTADE TRINTA. essa fase da literatura brasileira que consagra grandes nomes como Graciliano Ramos, Jos Lins do Rego, Jorge Amado e EricoVerissimo.

29difcilestabelecerparmetrosqueenquadremasobrasliterriasem gruposconsideradosescolas,poisaspeculiaridadesdecadaartistase encarregam de desfazer essa unanimidade esttica. Porm, com uma finalidade didtica, passamos a enumerar alguns elementos que so recorrentesnasobrasdesseperodo.

VEROSSIMILHANA: o romance de trinta retoma a tradio do romancerealistanaturalistadosculoXIX,aoreproduzir,notex to, os fatos histricos e sociais, se no reais, pelo menos veross meis. A obra um retrato da realidade, revelando o homem em suas lutas e angstias, bem como a explorao do poder sobre o indivduo. LINEARIDADE NARRATIVA: a organizao do texto mantm a lgicadosfatoseestabeleceumasequnciacronolgicacomode terminante. No h retrocessos narrativos e muito menos experi mentalismoformal. COMPROMISSOSOCIAL:umromancequeseengajanaslutas sociaisdapocaepromoveumaconscientizaodeclasse.Todos os grandes escritores dessa poca assumem compromisso com a lutadeclassenosentidodepromoverajustiasocial. TOTALIDADE: tanto as personagens como os temas abordados no refletem individualidades ou subjetividades. Cada persona gem um representante de sua classe e por ela luta. Cada tema abordadoteminteressecoletivo.

Tomandocomorefernciaapenasosprimeirosanosdevignciadessa esttica composta por esses elementos, podemos apontar o seguinte conjuntodeexpressivasobrasdaliteraturanacional: Quadro 2.1 Obras e autores do perodo1928 1930 1932 1933 1934 1935 Abagaceira Oquinze Meninodeengenho Cacau Caets Clarissa SoBernardo Suor Msicaaolonge Osratos JosAmricodeAlmeida RacheldeQueiroz JosLinsdoRego JorgeAmado GracilianoRamos EricoVerissimo GracilianoRamos JorgeAmado EricoVerissimo DyonlioMachado

30

O perodo inicial do romance de trinta apresentou um fenmeno in comumnaliteraturabrasileira.Umconjuntodeautoresproduziu,em curto espao de tempo, uma quantidade muito grande de obras com grandevalorestticoemuitoafinadasemtermosideolgicos.

Jos Amrico de Almeida (1887-1980)JosAmricodeAlmeidapublicouReflexesdeumacabra,em1922e,no ano seguinte, A Paraba e seus problemas. Porm, foi com A bagaceira, publicado em 1928, que alcanou projeo nacional. Por essa obra o autor considerado o introdutor dessa moda literria, romance que traa um panorama muito fiel dos engenhos do Nordeste, entre os anosde1898e1915.Sendoassim,essaobraapontadacomoanteces sora da grande corrente de textos sobre engenhos e dramas da seca naquelaregiodoBrasil. Oromanceambientadoemumengenho,noperodoentreosanosde 1898 e 1915. Expulsos pela seca no serto, Soledade e seu pai (Valen tim) vo para a regio dos engenhos e so acolhidos por Dagoberto, dono do Engenho Marzago. Lcio, filho de Dagoberto, um jovem estudante que se apaixona por Soledade, mas os desencontros so decisivosparaqueoamornoseconcretize.Emlugardeumahistria deamor,otextosetransformaemumatragdiaemqueDagoberto morto por vingana, por ter seduzido Soledade. Lcio fica impedido decasarcomSoledadeporsereconheceremcomoprimos. A bagaceira um romance que antecede toda a literatura regionalista quelogotomariacontadosleitoresnoBrasil.EssaobradeJosAmri coantecipaautorescomoJorgeAmadoeEricoVerissimo.

Jos Lins do Rego (1901-1957)Dentre os autores nordestinos, Lins do Rego merece destaque pelo grandepainelquepintasobreosgrandesengenhosdecanadeacar. TalfeitoresultanadenominaodeCICLODACANADEACAR, atribudaaumconjuntodeobrasqueexploramasrelaesdetrabalho eadecadnciadosgrandesengenhos.Fazempartedessecicloasobras Meninodeengenho(1932),Bangue(1934),OmolequeRicardo(1935),Usina (1936)eFogomorto(1943). Fogomortomerecedestaqueporseraobramaisexpressivaeabrangen te.Nelaoautortraaumgrandepaineldadecadnciadeumafamlia e,concomitantemente,asrelaesentregrupossociaisnocontextode violnciaeexploraoaquesosubmetidosostrabalhadoresnaslides doengenhodeSantaF.AobrasedivideemtrspartesOmestreJos

31Amaro,OengenhodoseuLulaeCapitoVitorinoqueseintercomunicam atravsdapersonagemCapitoVitorino,umherivisionrioemdefe sadospobres.Oromancedescreveadecadnciadafamliatradicional de Lula de Holanda e ao mesmo tempo contrape com as injustias sofridasporZAmaroeoscangaceiros.ComodizDacanal4,emFogo morto h uma revolta tanto contra a ordem econmica injusta quanto contraaordempolticainaceitvel. CapitoVitorinoobservaLulapassarnacarruagem,cumprimentaoe ficaapensar:OcachorrodoLulapensavaqueelefosseumcamum bembeaqualquer.Botaraoumavezforadesuacasa.Aquiloerauma leseirab de marca. Trepado naquele carro, e com o cercado vazio, as vrzeasnomato,oengenhoparado5. A observao de Vitorino tem um sentido de vingana, pois o seu grande desafeto e opressor agora passa, ainda mantendo a aparncia, mascomocercadovazioeoengenhoparado,oquesignificaque est completamente arruinado. Esse contraste revela, tambm, uma crticaaosistemaeconmicovigentequejseprenunciavaemcrisena poca da narrativa, mais ou menos 1915. O romance escrito em 1943 recuperaoperododaRepblicaVelha,comsuatruculnciaeexplora o.

Graciliano Ramos (1892-1953)consideradooautormaisrepresentativodoromancedetrinta,prin cipalmentepelaobraVidassecas,de1938.Umdetalheimportanteque Gracilianoaomesmotempoemqueaprofundaatemticaregionalista, mantmnoromanceumtratamentouniversalparaosgrandesdramas humanos.OconjuntodaobradeGracilianomarcadopelanarrativa gil, detalhada, levando o leitor reflexo sobre os problemas sociais doNordeste.Memriasdocrcere,publicadoem1954,umrelatoauto biogrficodesuapassagempelaprisoduranteogovernodeGetlio. otextomaispolticodoautore,apesardorelatopessoal,mesclado compassagensdefico. Vidassecasanarrativadasdesventurasdeumafamliaderetirantes que fogem da seca em direo ao sul. Fabiano, personagem central, umhomemdesprovidodetudo,inclusivedalinguagem,oqueotorna isolado,poisparaeleafalaumentrave.Comunicasepormonossla bosesentesemaisprximodosanimaisdoquedoshomens.Nogru poderetirantes,almdamulher(SinhVitria)edosdoisfilhos,ha a b

Camumbembe:vadio,vagabundo. Leseira:preguia,dolncia.

32

cachorraBaleiaqueprotagonizacenasincomparveisemnossalitera tura.Oromancefornecemomentosdealvioparaastenses,paralogo em seguida restabelecer o clima de violncia e desespero pelos quais passaafamlia.Aseca,naobra,maisdoqueumfenmenodanatu reza, ela fator determinante na narrativa e sentencia o caminho das personagens,porissoelapodeserapontadacomoumapersonagem. O pequeno fragmento que segue revela dois fatores importantes na obra:aintegraodaspersonagenscomaterraeapercepodeFabia no de sua condio de homembicho. Aps se instalar em uma casa abandonada,fazumexamedesuacondioderetirante.Vocumbicho,Fabiano. Isto para ele era motivo de orgulho. Sim senhor, um bicho, capaz de vencer dificuldades.[...] Entristeceu.Consideraseplantadoemterraalheia![...]Deuestaloscomosdedos. AcachorraBaleia,aossaltos,veiolamberlheasmosgrossasecabeludas.Fabiano recebeuacarcia,enterneceuse. Vocumbicho,Baleia. Vivia longe dos homens, s se dava bem com animais. Os seus ps duros quebravam espinhos e no sentiam a quentura da terra. Montado, confundiase comocavalo,grudavaseaele.Efalavaumalinguagemcantada,monossilbicae guturalqueocompanheiroentendia.6

OparaleloentreFabianoeacachorrajsuficienteparademonstrara sua condio subhumana, mais ainda, esse fragmento revela o con traste entre o homem bruto e o carinho do animal lamberlhe as mos grossas e cabeludas . A linguagem monossilbica outro fator queocomparaaosanimais

Jorge Amado (1912-2001)AproduoliterriadeJorgeAmadomuitoamplaecobreumpero do muito extenso de nossa literatura, iniciando com a publicao de Pasdocarnaval,em1931,eestendendoseatOcompadredeOgum,em 1995.Detodooconjuntodesuaobra,importanteparaonossopro psitoostextosquepublicousobainflunciadoromancedetrinta.O incio de sua produo literria est marcado pelo compromisso de conduzir o leitor reflexo sobre os grandes dramas sociais, posicio namento moda de intelectual militante marxista com que Jorge Amadoseidentificou.Cacau,publicadoem1933,umtextocomtra osautobiogrficos,poisdiscuteavidadostrabalhadoresdasgrandes fazendasdecacauaosuldaBahia.

33Dentre as obras de Jorge Amado, destacase o conjunto conhecido comoCICLODOCACAU,queformadopelasobrasCacau,Terrasdo semfimeSoJorgedosIlhus.Essatrilogiaabordatemascomoaexpan sodalavouracacaueirapelaforaeoimpactodapresenadascoope rativasnaintermediaodonegcio.Soobrasdedennciaerevolu cionrias na medida em que revelam os posicionamentos poltico ideolgicosdoautor.OutrocicloimportantenaobradeJorgeAmado relativosmulheres,noqualoerotismotempapeldestacado,masno osuficienteparaembaarobrilhodalutadeGabriela(Gabriela,cravoe canela),DonaFlor(DonaFloreseusdoismaridos)eTeresaBatista(Teresa Batistacansadadeguerra).Nessecicloofocoprincipalacrticaaofalso moralismovigentenastradicionaisfamliasbaianas. TerrasdosemfimumdosmaisimportantestextosdeJorgeAmadoe narraalutadeduasfamliaspelapossedeterranaregiodeItabuna, no sul da Bahia. A violncia entre os Badar e Coronel Horcio da Silveira se expressa, em especial, pelo emprego da tocaia. As terras nessaregiosocobiadasemfunodoaltopreoqueocacauatinge no mercado, levando regio uma disputa por terras e mercado. Os conflitos cessam medida que o Estado intervm e o triunfo de uma nova ordem econmica permite aos habitantes de Sequeiro Grande relegar ao passado as lutas pela posse de terras, fazendo com que a barbriecedalugaraodesenvolvimentoeolucrodocacaurestabelea apaz. Aepgrafedoromance,queserepeteaolongodotexto,alertaoleitor paraoinusitadodahistria:Euvoucontarumahistria,umahistria de espantar (romanceiro popular). Na apresentao da obra, Jorge Amadoexpeaoleitor:constatocomimensaalegriaqueumalinhade unidadejamaisquebradaliganostodaaminhaobrarealizadanes sesdezanoscomoavidaqueduranteelesvivi:aesperanamaisque a esperana a certeza de que o dia de amanh ser melhor e mais belo7. Essas duas passagens justificam o estranhamento que o texto causou,poiseletraz,aofinal,umaperspectivadeesperanaeconcilia o.Ilustrativodesteposicionamentooltimopargrafodoromance: Nasciam frutos enormes, as rvores carregadas desde os troncos at os mais latos galhos, cocos de tamanho nunca visto antes, a melhor terra do mundo para o plantio do cacau, aquela terra adubada com sangue8. O senso crtico do autor nodeixa de registrar nesse pequeno trecho, de forma irnica, a decepo pelo fim das lutas de forma conciliat ria, marcando o texto com a expresso final adubada desangue.O

34

sanguedolutadornodeixadeseradubopararealimentarnovaslutas sociaisqueoautorexploraremoutrasobras.

Erico Verissimo (1905-1975)O autor de O tempo e o vento foi sempre um escritor profundamente comprometido com uma perspectiva humanstica, fazendo de seus textosumdiscursoemdefesadacivilizaoedalutacontraabarbrie. Erico Verissimo compartilha com Jorge Amado o ttulo de escritor maislidodoBrasil.OmodonarrativosimplesediretofazdeEricoum contador de histrias, como ele mesmo se intitulava. A conexo de Ericocomoromancedetrintased,inicialmente,atravsdoromance Clarissa,de1933,mascomatrilogiaOtempoeoventoqueoautorse projetanocenrionacional. Otempoeoventocompostoporsetevolumesdivididosemtrspar tes:Ocontinente,OretratoeOarquiplago.Algunsepisdiosadquiriram autonomia e passaram a ser editados de forma independente, como AnaTerra,UmcertoCapitoRodrigoeCartasdeSlvia.Soduzentosanos de histria da formao do Rio Grande do Sul, abrangendo desde a pocamissioneiraatofimdoperodogetulista.Abravuraeohero smodepersonagenscomoCapitoRodrigosoanalisadoseavaliados porpersonagensmaiscrticasecivilizadascomoFloriano. Em um dilogo do Capito Rodrigo com o padre Lara, o religioso defende uma sociedade hierarquizada, contrariando o sentimento de igualdadequemoveocapito.Dizopadre:Mastemdehavercate goriasparahaverordemerespeito.Logoocapitocontraargumenta:quenogostodeverhomemrebaixadoporhomem.NsosCambarstemosuma lei: nunca batemos em mulher nem em homem fraco; nem nunca usamos arma contra homem desarmado, mesmo que ele seja forte. Quando vejo um negro que baixa a cabea quando gritam com ele, ou quando vejo um escravo surrado, o sanguemeferve.9

OhumanismodeEricoosentidodesolidariedadehumana,decon denao dos abusos de autoridade, de explorao do homem pelo homem. Se ao longo de toda sua obra ele condena essas atitudes de arrognciaeexplorao,emSolodeclarinetaelereafirmaseuspropsi tosdeumhumanismocentradonoindivduoeno nosgrandesgru possociais.

Ponto finalO regionalismo de trinta um dos perodos mais ricos da literatura brasileiraesuasobrascontinuamacativarumpblicocadavezmaior

35emaisfiel.Podemosveroregionalismo,mesmoantesde1930e,tam bm,temposdepoiscomGuimaresRosa,jplenamenterenovado. O que distingue o regionalismo de trinta de outros movimentos com contedoregionaloforteapelosocialqueteveduranteasuainflun cia. Isso, alm de expressar um posicionamento dos escritores, foi capazdeformarumpblicoleitorque,athoje,prestigiaautorescomo LuizAntnioAssisBrasileMiltonHatoum,quevalorizamoambiente local, Rio Grande do Sul e Amazonas, respectivamente. Assim, o ro mance de trinta ultrapassa as fronteiras temporais para se posicionar comoumavertenteperenenaliteraturabrasileira.

Atividades1) AssinaleaalternativaqueoautorNOromancistaregionalista detrinta. a) GracilianoRamos. b) JorgeAmado. c) JosLinsdoRego. d) JosdeAlencar. Assinaleaalternativaemqueoautorcorrespondeobra: a) GracilianoRamosOsratos. b) EricoVerissimoVidassecas. c) JorgeAmadoCacau. d) JosLinsdoRegoInsnia. FabianoeacachorrinhaBaleiasopersonagensdaobra: a) MeninodeengenhoJosLinsdoRego. b) VidassecasGracilianoRamos. c) CaminhoscruzadosEricoVerissimo. d) MarmortoJorgeAmado. Fatohistricopertencenteaoperododoromancedetrinta: a) InauguraodeBraslia. b) Tenentismo. c) RevoluoGetulista. d) RevoluoFarroupilha. umacaractersticadoromancedetrinta: a) Contrasteentreclaroeescuro. b) Usodemitologiagrecolatina. c) Verossimilhana. d) Criaodoversolivre.

2)

3)

4)

5)

3Luana Soares de Souza

A RENOVAO DO MODERNISMO

Passado o primeiro momento modernista, repleto de contestaes, a poesiabrasileirainiciaumpercursoprprioemtermosestticos.Este captulo estuda a passagem do primeiro momento modernista para o segundoae,logoaps,examinaogrupodepoetasqueficouconhecido comoGERAODEQUARENTAECINCO.Essefoiummomentode ressurgimentodeumaestticaformale,muitasvezes,retomouapoe siaconfessionalereflexiva.

3.1 A poesia brasileira aps a Semana de Arte ModernaA Semana de Arte Moderna de 1922 foi um ponto de partida para discussesqueseprolongaramatofinaldadcadade1930.Ogrupo deescritoresligadosaelafoiaospoucostomandoposiesdiferencia das e at conflitantes. Em alguns momentos, ela parece ter sido um movimento coeso e com propsitos claros, porm essa impresso se desfazlogoqueprestamosatenoaalgunsdetalhescomoasdatasde publicaesdosMANIFESTOS. Seguindoatrajetriadosmanifestoserevistaspublicadosnessapoca, temosKlaxon,em1922,noinciodomovimentomodernista,agregan doMriodeAndradeeOswalddeAndradesobummesmopropsito. Logoemseguida,podemosobservarquedoisdirecionamentosideol gicos foram se definindo. De um lado, Oswald de Andrade com o Manifesto antropofgico, em 1928, posicionouse mais esquerda, ao mesmo tempo que o grupo de Plnio Salgado culminou a sua cami nhada em direo direita com a publicao de Nhengau verde amarelo,em1929. Umtantodistanciadosdosextremos,encontramosnoRiodeJaneiroo grupoFesta,de1927,formadoporpoetasque,lideradosporTassoda tradicionaldividiromodernismoemtrsfases:1fase(19221930);2fase(19301945)eumaterceira faseumtantoindefinida,masiniciandoem1945etalvezalcanandoadcadade1950ou1960.a

37Silveira e Andrade Muricy, com a colaborao de Ceclia Meireles, produztrabalhosindependentesevoltadosparaolirismopuroerefle xivo. A trajetria da literatura brasileira, durante os anos 1930, representa uma luta entre foras que vo, aos poucos, deixando a polmica e a efervescnciadosanos1920paraacomodarsenorastroautoritrioda Revoluo Getulista, de 1930. Paralelo aos movimentos polticos e sociaisaproduopoticabrasileira,esseperodoapresentatrsdire cionamentos importantes: LIRISMO, RADICALISMO FORMAL e ENGAJAMENTOSOCIAL.Nosotendnciassimultneas,maspar tilhamdomesmoambientecultural. Aprimeiratendncia,oriundadogrupoFesta,primavapelapresena dolirismoedasubjetividade.CecliaMeirelespodeserapontadacomo umavozcaractersticadessegrupo.Sopoetasquemesclamasinova es modernistas com temas universais e clssicos, buscando atingir uma concepo potica comprometida com a subjetividade. Outros nomes podem ser acrescentados como Manuel Bandeira, Vincius de MoraeseMrioQuintana. O poema Motivo, de Ceclia Meireles, pode ilustrar essa perspectiva intimistadapoesiabrasileiranessemomento.DizCeclia10:Eucantoporqueoinstanteexiste Eaminhavidaestcompleta. Nosoualegrenemsoutriste Soupoeta.

Serpoeta,segundoCeclia,estaracimadaspercepesdealegriaou tristezastudoadquiresentidonavivnciadomomento,noinstante. Asegundatendnciaestcentradanaposturadeoposioaosubjeti vismo e na valorizao do real, desprezando a inspirao como fonte poticae,emseulugar,privilegiandootrabalhocomalinguagemea tcnicaapurada.Apoesiadeixaadiscursividadeepassaavalorizara palavra como elemento central do texto. Dois grandes nomes podem ser ligados essa tendncia: Carlos Drummond de Andrade e Joo CabraldeMeloNeto. JooCabralestabeleceumparaleloentreaproduopoticaeotraba lhometdicodoengenheiro.H,nopoemaOengenheiro,umadefesa doracionalismonapoesiaque,evidentemente,opeseaolirismoeao

38

subjetivismo de outras tendncias poticas. O modo de perceber a poesiacomoumobjetoconstrudopelalinguagemeisentadesubjeti vidade e adjetivaes uma tendncia que abrange muitos poetas da poca de Joo Cabral e se prolonga como uma forte tendncia entre outrospoetascomoCarlosDrummond11,queparticipadessaperspec tivapoticaeproclama:Nosereiopoetadeummundocaduco. Tambmnocantareiomundofuturo. Estoupresovidaeolhomeuscompanheiros [...]

Oterceirodirecionamentodapoesiabrasileira,apsaSemanadeArte Moderna,atendnciadeengajamentosocial.Sopoetasquevivenci am a poesia como um instrumento de ao dentro da sociedade, dei xamdeladoasubjetividadeparaassumiremumaposturacrtica.Nem sempre uma tendncia permanente do poeta, mas se manifesta em uma determinada fase da sua produo. Isso ocorre porque, de uma forma ou outra, o poeta sempre assume um compromisso com seus contemporneos.Emtermosdelinguagem, essespoetasbuscamuma comunicao mais direta com o leitor e, por isso, passam a usar um estilomaistradicionalemuitasvezesdiscursivo. Praticamente, todo poeta tem, em determinado momento de sua pro duopotica,ummomento maisvoltadoparaosocial.Nosepode rotular um ou outro como pertencente a esse grupo. Carlos Drum mond de Andrade tambm participa dessa tendncia, principalmente naobraArosadopovo,de1945.Essaobra,lanadanosmomentosfinais daSegundaGuerraMundial,umcantodesolidariedadeedefesada humanidade to sofrida durante aquele trgico evento. Tratase de umarespostadopoetaaoclimadeopressoqueahumanidadeviven ciava durante a Segunda Guerra Mundial. Nela, o poeta questiona a situaodopoetanomundoconturbadopelaguerraeestabelecevn culocomosofrimentoalheio.OpoemaNossotempo,presentenaobra citada,umbalanodomomentodeaflioporquepassavaahuma nidade,nosanosfinaisdaguerra.Estetempodepartido, Tempodehomenspartidos. [...] Estetempodedivisas,

39Tempodegentecortada. Demosviajandosembraos, Obscenosgestosavulsos.12

Opoetatranspeparaalinguagemasimagensdocampodebatalha, asmutilaeseaselvageria.Noltimoverso,otermoobscenostraz paraoleitorareflexosobreaquestodamoralidade,poisclassificaa guerra como uma obscenidade, e assim desloca o termo da moral convencionalparaaquestopoltica. Apoesiabastanterebeldeparaserenquadradaemumatendnciaou outra, no geral o poeta mantm uma posio de independncia em relaoaosmodismos,frequentandooraumgrupo,oraoutro.Assim, umpoetaque emummomentodesuaatividadepoticacompartilha com um grupo mais intimista, em outro momento passa a conviver comtendnciasmaisengajadas.Opoetaumsersensvelaoseumeio easeutempo,partilhandodasangstiaseesperanasdeseuscontem porneos. Apsessemomentodeflutuao,apoesiabrasileiraencontra,nogru po da GERAO DE QUARENTA E CINCO, um ponto de conver gncia. Dois fatos literrios so significantes para esse momento: a morte de Mrio de Andrade e o lanamento da obra O engenheiro, de JooCabraldeMeloNeto,ambosem1945.Simbolicamente,oprimeiro significaoencerramentodainflunciadaSemanadeArteModernaeo segundoainauguraodeumanovaeraparaapoesiabrasileira.

3.2 A periodizaoEstabelecerparmetrosparaconceituaraliteraturaproduzidanoBra sil nos anos 1940 uma tarefa muito complexa, pois nem sempre h concordncia entre os crticos para estabelecer os limites do moder nismo e mesmo para identificar obras representativas capazes de im por novos padres estticos. Mesmo apontada por alguns como uma terceirafasedomodernismo,aliteraturaqueseproduznessapoca marcada por uma srie de eventos que a caracterizam como uma grande renovao. No momento em que o modernismo paulistano comea a perder fora, surgem em diversas regies do Brasil movi mentosquejpronunciamumarenovao. Algunsmovimentosanteciparamaspublicaesde1945,consideradas promotoras da nova moda. J em 1941, no Recife, foi organizado um congresso de poesia no qual surgiram nomes como Joo Cabral de

40

MeloNetoePedroIvo.Noanoseguinte,emFortaleza,realizouseoI CONGRESSODEPOESIADOCEAR,comaparticipaodenomes de diversos campos artsticos, destacandose Aldemir Martins, que mais tarde foi o grande ilustrador da obra de Jorge Amado. No Rio GrandedoSul,olanamentodaRevistadeSoPedro,em1945,dirigida por Moyss Vellinho (19021980), inaugurou uma nova fase da litera tura gacha. Participam desse empreendimento editorial, alm de Moyss Vellinho, nomes como Joo Simes Lopes Neto (18651916), Manoelito dOrnelas (19031969) e Mrio Quintana (19061994), entre outros. Outros movimentos e revistas surgiram em torno de 1945, como a Joaquim,em1946,nacidadedeCuritiba,sobadireodeDaltonTrevi san.EmBeloHorizonte,arevistaEdifcio,lanadaem1946,reuniuum grupo de escritores, poetas e prosadores muito expressivo como Au tranDourado,FernandoSabino,PauloMendesCamposeHlioPelle grino e outros. importante que se registre que esses movimentos iniciais no se restringem poesia, mas contam com a colaborao tambmdeprosadores. AatuaodegruposdepoetasdoRiodeJaneiroeSoPaulodirecio naram o movimento para o campo da poesia ao se autoproclamarem GERAODEQUARENTAECINCO,agregandopoetasemtornoda Revista Brasileira de Poesia, lanada em 1947, fato determinante para queagrandemaioriadecrticosserefirageraode45comorestrita poesia. Esse no o posicionamento enunciado por Jos Aderaldo Castello, que reconhece a convivncia da prosa com a poesia dentro dessemesmomovimento.SentenciaCastello:Preferimos ampliar a viso da dcada de 40 de maneira a considerar conjuntamentepoesiaeprosaficocrnica,memria,ensaiocomoexpressode umprocessogeralderenovaoemcontinuidade.Lembrandoqueaprimeirafase da renovao modernista preenche os anos 20, e a segunda, a dcada de 30, admitimosqueapartirdosanos40sedescortinaaterceirafase.13

A adoo do posicionamento desse renomado estudioso permite a incluso de poetas e prosadores neste mesmo captulo. Selecionamos Joo Cabral de Melo Neto e Ledo Ivo como os mais expressivos no campodapoesiaeJooGuimaresRosaeClariceLispectornocampo daprosa.Muitosoutrosautoresestrearamnadcadade1940,masso essesquatroosverdadeirosrenovadoresdaliteraturabrasileiranaque lapoca.

41

3.3 Contexto histrico e culturalO ano de 1945 assinalou o final da Segunda Guerra Mundial, com o lanamento de bombas atmicas em Hiroshima, em 6 de agosto, e Nagasaki,em9deagosto.Esseseventosmarcarammaisdoqueofim daguerra:elesapontaramparaumfuturodivididoemnovosposicio namentos polticos e geogrficos. O mundo passou a conviver com a presenadedoisblocos,umcomunistaeoutrocapitalista.Essadiviso ideolgicanorteouapolticaocidentalatadcadade1980,quandoo blococomunistapassouaruir,tendoaQuedadoMurodeBerlim,em 9denovembrode1989,comosmbolodessadecadncia. NoBrasil,oanode1945marcouofimdaditaduradeGetlioVargas, quepermaneceunopoderpor15anos.Porm,opaidospobresre tornouaocomandodanaoem1950,permanecendoat1954,quando se suicidou em 24 de agosto. Findo o ciclo getulista, o Brasil iniciou umaeradegrandesesperanas,tantopeloclimaderedemocratizao, quanto pelas grandes obras do governo Juscelino Kubitschek (1956 1960).Oesforopolticoemdireoaodesenvolvimentofoisustentado pelo PLANO DE METAS de Juscelino, que permitiu desenvolver a indstrianacionaleresultounaconstruodeBraslia,ograndesm bolodamodernidadenacional. No plano cultural, um dos fatores determinantes foi o incentivo in dstria editorial, o que permitiu um incremento de publicaes e o surgimento de novas editoras. Outro componente importante foi a entradamassivadeprodutosestadunidensescomoaCocaCola,orock and roll e os eletrodomsticos. O brasileiro mdio, encantado com o americanwayoflife,incorporouessasnovidades. Em termos de movimentos sociais, os estudantes, principalmente, promoveram grandes manifestaes e marcaram o incio de uma era deprotestoselutascoletivas.Oclimadeintelectualizaotomouconta dopaseresultounacriaodeentidadesquesetornarambandeiras deresistnciapolticaevalorizaodaculturapopular,comooTeatro de Arena, os Centros Populares de Cultura e a Unio Nacional de Estudantes(UNE).Todoesseesforodasociedadebrasileirasedesfez diantedaviolnciadoGolpeMilitarde1964. Essachamadageraodequarentaecincopromoveuumarenovao daartebrasileiraepassouaserconhecidatambmcomoneomodernis ta.Difcilestabelecerlimitesparaasuainfluncia,masacertezaque essegrupodepoetas,mesmodepoisdediludosospostuladostericos dogrupo,permaneceuatuanteepassouainfluiremmovimentospos teriores.PoetascomoJooCabraldeMeloNeto,queestavamligados

42

aomovimentode1945,adquiriramautonomiaepassaramapercorrer umcaminhoprprionapoesiabrasileira.

3.4 A poesia em renovaoOqueuneogrupodepoetasligadosgeraodequarentaecinco, indiscutivelmente, uma preocupao com a construo potica. So escritores com grande apuro formal, pois a valorizao da palavra fundamental para eles, o que os aproxima dos ideais parnasianos e simbolistas,pormmuitolongedosprincpiosdaartepelaarte,pro postosporaquelespoetas.Omodernismode1922semantevenohori zonte de suas produes, o que impediu uma aproximao mais nti macomapoesiadofinaldosculoXIX.Podeseafirmarqueagerao dequarentaecincoconseguiuumequilbrioentreaformapolidados poetasanterioreseocompromissosocialdomodernismo. Em termos formais, esses escritores retomaram estruturas poticas clssicascomoaodeeosonetoepromoveramumesforodevaloriza o da linguagem. Aliando esses dois princpios, eles lideraram uma renovao potica que se encaminha para uma radicalizao do fazer potico.Asubjetividadeeolirismoperderamespaonessemomentoe cederam caminho para o desenvolvimento de temas existenciais e sociais. Por seu turno, a prosa caminhou em duas direes principais: o inti mismo,deClariceLispectorqueveremoscomdetalhesnocaptulo6, e o retorno do regionalismo, agora mais universal, na produo de GuimaresRosa.Essemomento,naopiniodeSlvioCastro,umdos mais fecundos da prosa brasileira, pois ser na prosa, mais que na poesia,queseencontraromaiornmerodeexemplosdebonsprodu tos literrios no necessariamente modernistas, condicionados pela atmosferademodernidadeagoraconquistadaeafirmada14. A seguir, passamos a examinar alguns autores fundamentais desse momento e seus textos mais representativos. So escritores que influ enciaram nesse momento de transio da literatura brasileira e que, mais tarde, tomaram outros direcionamentos. Para o propsito deste estudo,sopertinentesasobraspublicadasnadcadade1940,mesmo que o autor d continuidade sua produo literria com obras mais representativasemperodosposteriores.

43

Joo Cabral de Melo Neto (1920-1999)Joo Cabral o mestre do verso trabalhado e livre de adjetivao, de uma poesia centrada no vocbulo, que muitas vezes se aproxima da prosa. A poesia cabralina , acima de tudo, icnica. Outro trao fun damentaldapoesiadeJooCabralaimpessoalidadequeserestringe evocaodelugares,principalmenteoNordestedoBrasil.Apresen a da regio na poesia dele no se caracteriza por qualquer forma de regionalismo;muitopelocontrrio,suapoesiapartedolocalparauma perspectivauniversal. A vasta produo potica do autor teve incio com a publicao de Pedradosono,em1942,seguidadeOengenheiro,em1945.Cosemplu mas,de1950,consideradootrabalhomaisengajadonaquestosocial, retratandoavidasubhumanadapopulaoribeirinhadoRioCapiba ribe.Em1956,publicouMorteevidaseverina,umtextopotico,inicial mentepropostoparaoteatro,masquerecebeu,almdeencenaes,a produocinematogrfica.Outrotextofundamentalparaacompreen sodaobradeJooCabralEducaopelapedra,de1966,conjuntode poemasbastantehermticos,mascomexemplarconstruo. Morteevidaseverina,asuamaispopularproduopotica.Otexto umrelatodatrajetriadosertanejorumocidadegrande,ondeencon traamisriatointensacomonointerioremquevivia.Atrajetriade Severino, o retirante, comparvel de Fabiano em Vidas secas. Nos doistextos,amisria,adegradaoeabuscaconstantepormelhores dias so presentes. O longo poema encerra com uma mensagem de amorvidaatravsdasseguintespalavrasdecarpina:Severino,retirante, Deixaagoraquelhediga: Eunoseibemaresposta Daperguntaquefazia, Senovalemaissaltar Foradaponteedavida: Nemconheoessaresposta, Sequermesmoquelhediga. difcildefender,

44

Scompalavras,avida, Aindamaisquandoela Estaquev,Severina; Masserespondernopude perguntaquefazia, Ela,avida,arespondeu Comsuapresenaviva. Enohmelhorresposta Queoespetculodavida.15

Avidaseverinaamisria,adesilusocomavida,afaltadealterna tiva,mastudosetransformacomapresenadanovavidaquesurge, poisonascersuficienteparajustificaravida.Onascimentoumato emuitomaisfortequeaspalavras,poisestasnososuficientesparaa defesadavida.

Carlos Drummond de Andrade (1902-1987)CarlosDrummonddeAndradedeItabira,nointeriordeMinasGe rais,quepermaneceuemsuaobra,mesmoapsterassumidooRiode Janeirocomosuacidade.EstreounaliteraturacomAlgumapoesia,em 1930, uma obra fortemente influenciada pela sua vivncia mineira. ComaobraSentimentodomundo,de1940,oautoradquireumatem ticamaisuniversal.Teveatuaoimportantenomovimentomodernis tamineiro,sendoumdoseditoresdeARevista,lanadaem1925,prin cipalrgodivulgadordasideiasdomodernismopaulistaemMinas. AobradeDrummondultrapassaasclassificaesdeescolas,porisso difcilestabelecerumvnculomuitoforteentreeleeospoetasdagera odequarentaecinco.Duranteessemovimentoopoetaesteveatento snovidadeseparticipantenocenrioliterriobrasileiro,oqueoliga aos poetas dessa gerao. Porm, como aconteceu com Melo Neto, Drummond logo se tornou independente para se transformar em um dosmaiorespoetasbrasileirosdetodosostempos. Dentre a sua vasta produo potica, duas obras despontam como mais ligadas gerao de quarenta e cinco: A rosa do povo, publicada em 1945, e Claro enigma,em1951. Nessas obras o autor tem uma ten dnciaparaaexploraodetemasligadosrealidadehumana,dentro

45de uma viso crtica da realidade social. H tambm em sua obra o desencantocomavida,queseexpressaemumcertopessimismo.Esse trao de sua personalidade ele atribui sua vivncia na terra natal: Itabira. Opoetaitabiranotambmsededicaprosaeproduzumaaprecivel quantidadedecontosecrnicas.Suaobraemprosamaisdespojada, direta e versa sobre o cotidiano, est muito ligada s experincias de vida.Nessafase,elepublicouumlivrodecontosintituladoContosde aprendiz,em1951.

Ponto finalEssemomentodaliteraturabrasileirafoiumdosmaisfecundoseino vadores.AcontarpelapresenadeautorescomoJooCabraldeMelo NetoeCarlosDrummonddeAndrade,foinotriaagranderenovao que se processou. Ao se esgotar, o modernismo brasileiro produziu uma renovao que permitiu que a nossa literatura atingisse o plano internacional como uma produo consistente e universal. Esse foi o momento em que samos de um plano regional, recluso aos temas locais, para que atingssemos a universalidade de autores como Gui maresRosa.

Atividades1) Indique um manifesto modernista publicado por Oswald de An drade: a) Manifestoantropofgico. b) Verdeamarelo. c) Planopilotodapoesiaconcretista. d) Festa. AssinaleoautorNOpertencenteSemanadeArteModerna: a) MriodeAndrade. b) OswalddeAndrade. c) CassianoRicardo. d) GregriodeMatos. CarlosDrummonddeAndradeestreianaliteraturabrasileiracom aobra: a) Algumapoesia. b) Claroenigma. c) Rosadopovo. d) Contosdeaprendiz.

2)

3)

46

AssinaleaalternativaverdadeiraemrelaoaCarlosDrummond: a) Considerado um dos maiores poetas brasileiros, nasceu em Itabira/MG. b) Mudouse para o Rio de Janeiro e sua terra natal perdeu re presentaonasuaobra. c) Poeta puro, dedicouse exclusivamente poesia, no produ zindoprosa. d) Drummond,alheioaosproblemassociais,produziuumalite raturaintimista. ObradeJooCabraldeMeloNetoqueabordaotemadavidados retirantes: a) Cosemplumas. b) Oengenheiro. c) Morteevidaseverina. d) Educaopelapedra.

4)

5)

4Maria Alice da Silva Braga

A RENOVAO DA POESIA

Aliteratura,arigor,aartedapalavra,pormapoesiasempreman teveumarelaomaisestreitacomasoutrasartes.Asonoridadealiga msicadesdesuaorigeme,porsuavez,ossignificanteslingusticos em muitos momentos da histria da poesia apontaram na direo de umrelacionamentocomasartesplsticas. Este captulo explora essas relaes da literatura com a semitica,em especialapoesia,evidenciandoumatrajetriaquecomprovaasexpe rincias intersemiticas muito antes dos avanos da tecnologia con tempornea. E, porm, no presente que o experimentalismo potico temexploradorelaesmaisconsistentesentreoverbaleonoverbal notextopotico.Comoresultadodoesforodeaproximaodapoesia com as artes plsticas, surgem movimentos como o concretismo, o neoconcretismoeopoemaprocesso. nomodernismoqueseintensificaaexploraodadimensoespacial dapoesia,resultandoemumanovaconcepodepoticacentradana intersemitica. Entretanto, em perodos literrios anteriores, j encon tramos algumas experincias como no ROMANTISMO, quando a liberaoformalpermitiuaospoetasmuitasinovaesnocampovisu al. A aceitao por parte de poetas tradicionais nem sempre foi pacfica, poisentendemalgunsqueapoesiaserestringeaoclssicoconceitode queLITERATURAAARTEDAPALAVRA.Essasresistnciasforam maioresoumenoresdeacordocomograudevisualizaodotexto.A verdadequeaescritadopoemasempreumelementogrfico,oque deveserlevadoemcontaqueotextoescritopodeter,ounoapelo visualsignificativo.

48

4.1 Aspectos tericosEmbora o movimento concretista seja da dcada de 1950, no raro encontramos em perodos anteriores consistentes textos que aliam os elementos verbais do verso a elementos icnicos. Todos os exemplos levantados como antecedentes tm em comum o fato de que lingua gemeimagemocorremaomesmotempo,isto,soexperimentosque no dispensam o constituinte verbal, como acontece em alguns casos nacontemporaneidade. Aevoluodavalorizaodoaspectogrficodapoesia,emboapar te, decorrente da evoluo que a imprensa atingiu no ltimo sculo. Tantos os modos de produo da escrita da pena ao computador , quanto dos suportes da escrita do pergaminho projeo a laser , foram avanos determinantes para que o elemento grfico adquirisse cadavezmaissignificado. Combinandorecursosgrficoscomsuportesinovadores,apoesialeva aexperimentaoaoextremo.Oslimitesqueapginaimpeaopoeta revelam a luta pela diagramao, que determina o rompimento dos limitesdafolhadepapel.OsculoXXpresenciouumatendnciacres centeemdireoaumasemiotizaodomundonossavoltae,con sequentemente,umanovaposturaemrelaopoesia.Comosenten ciaLciaSantaella,apartirpraticamentedeinciosdosculoXXque, noOcidente,avisualidadeveioflordapeledapoesia16. Ainclusodeelementosgrficosnopoemaprovocaumadiscussoem termos de distino dos limites entre poesia e artes grficas. Antnio Pietrofortetrazesclarecimentosobreessadelimitaodeterritriosao afirmar que fazer poesia com palavras coloca o concretismo entre os movimentos literrios; por outro lado, fazer poesia com imagens o coloca entre as artes plsticas17. Essa discusso parece superada no momento em que se percebe a tendncia de conexo entre as artes, o que significa uma interdependncia que supera as divises tradicio nais. EzraPound,emsuaobraPersonae,publicadaem1926,peemprtica a relao poema e visualidade atravs da apresentao de trs traos principais presentes no texto potico: a melopeia, a fanopeia e a lo gopeia. A MELOPEIA diz respeito ao aspecto sonoro do texto, j ex plorado desde as origens da poesia lrica. A musicalidade o trao fundamentaldopoema,pormopredomniodosonorosobreoverbal uma caracterstica bem mais recente.Entre os autoressimbolistas j encontramosaexploraodesseaspecto.

49VejamosoclssicoexemplodeCruzeSouza18:[...] Vozesveladas,veludosasvozes, Volpiasdosvioles,vozesveladas, Vagamnosvelhosvrticesvelozes Dosventos,vivas,vs,vulcanizadas [...]

Como se pode observar, a sonoridade toma espao maior do que a questo verbal, e o poema constri o sentido pela presena reiterada do fonema /v/. com esse som que o plano simblico do poema se estrutura. Em outro momento, Manuel Bandeira se serve do mesmo recursoparaconstruiroseupoemaBerimbau. AFANOPEIAoencontrodotextocomaimagemplsticaqueevoca. JooCabraldeMeloNeto,mesmoantecedendoomovimentoconcre tista, j deu ao texto uma perspectiva visual importante. A palavra deixadeserumsignificantedesmotivadoparaadquirirumvalorsim blicoquedaotextoasignificao. O ltimo elemento, a LOGOPEIA, a predominncia do elemento lgico do texto, agora o fator central da construo a presena da linguagemquearticulaopensamentoparaformaropoemanomundo dasideias. Esses trs elementos so indissociveis e a harmonia entre eles que possibilitaacriaodeumgrandetextopotico.Porisso,lerumpoe mapercebertodasaspossibilidadesdeconstruoqueeleoferecee, comisso,atingirasuasignificao.Apoesiacontemporneaapelade formavariadaparaumououtrodesseselementos. Otermopoesiavisualsetornaumtantoinadequadoparaadesignao dasexperinciasconcretistasquesurgemnasegundametadedosculo XX, pois a explorao do visual j estava presente na poesia desde o sculo XIX. Os tericos passaram a utilizar o termo concretismo como sendo mais adequado para designar o modo particular da poesia se aproximardasartesplsticas,nosculoXX. AgranderevoluoiniciadaporMallarm(18421898)comaobraUn coup de ds, de 1897, e ampliada por Pound (18851972), Joyce (1882 1941), Stein (18741946), Cummings (18941962), Apollinaire (1880

50

1918) e os movimentos de vanguarda das primeiras dcadas so fun damentos tericos que sustentam a renovao concretista. Tratavase de prosseguir na desmontagem das estruturas verbais do discurso tradicional,quejseapresentavadesgastadoeineficazparaabarcara totalidadedaimaginaoeasensibilidadedapoca. GrandeimportnciaatribudainflunciadeMallarm,poisogran de poeta francs atribuiu significao tanto aos aspectos grficos do textocomoaoespaobrancodapgina.ComMallarm,adiagramao passou a ser parte integrante do texto. At ento, a linearidade do verso era o nico elemento valorizado. Pelo lado da pintura, artistas como Pablo Picasso (18811973) e Georges Braque (18821963) passa ramavalorizaroverbalemsuaspinturas.Essedilogo,aindaincipi ente, que permitiu o desenvolvimento de formulaes posteriores maisintegradasentretextoliterrioeartesvisuais. Oquemaiscaracterizaesseesforoconcretistaocarterexperimental que tomou conta dos poetas na poca. Essa experimentao fez com que, tambm, o movimento adquirisse uma heterogeneidade maior, com perspectivas de criao muitas vezes contraditrias. Em alguns momentos, exacerbaramse as experimentaes a ponto de o texto passarmaisparaasartesplsticasdoqueparaaartedapalavra. A poesia, hoje, transita pordiversos meios,inclusive os eletrnicos, o que lhe abre espaosimportantes para que se integre nacomunidade deleitoresepossacircularnamdiacomdesenvoltura.Aaproximao dapoesiacomaimagemfazcomqueoilustrativocedalugaraopr prio contedo. A imagem, como elemento significante, passa a domi naroespaodotexto. No Brasil, o movimento concretista tem origem na EXPOSIO NA CIONAL DE ARTE CONCRETA de 1956, em So Paulo, com as pre senasdeDcioPignatari,HaroldodeCamposeAugustodeCampos. Ocenriopoticobrasileiroaindaeradominadopelospoetasdagera o de quarenta e cinco e contra eles que o movimento concretista dirige seus ataques. Os poetas da gerao anterior so considerados verbalistas, subjetivos e inexpressivos pelos novos poetas concretistas paulistas. O concretismo teve uma recepo polmica na intelectualidade brasi leira. Alguns viram no movimento uma grande renovao, enquanto outros no reconheceram nele qualquer valor esttico como poesia. DcioPignatari,HaroldodeCamposeAugustodeCampossemanti veram fiis ao concretismo e continuaram a aprofundar pesquisas. Outros poetas logo abandonaram o experimento e passaram a buscar

51novos caminhos, principalmente atravs de um retorno tradio. Alm da explorao e inveno, a poesia concreta uma crtica ao pensamento discursivo, predominante na literatura tradicional e por issoumacrticanossacivilizao. AobraTeoriadapoesiaconcreta,publicadaem1965porDcioPignata ri, considerada o texto fundador do movimento concretista, porm Haroldo de Campos reconhece em Octavio Paz, escritor mexicano, o precursor terico do movimento, principalmente atravs da obra Transblanco:emtornodeBlancodeOctavioPaz,publicadaem1985.Esses fundamentos tericos deram sustentao ao Planopiloto para a poesia concreta,de1958,queexpeasdiretrizesgeraisdatendnciaconcretis ta. Osconcretistasderamcontinuidadesexperimentaesefetuadaspor Joo Cabral de Melo Neto e Murilo Mendes, bem como retomaram algunsprincpiosdocubismoedofuturismo.Comoessespredecesso res, pregaram o fim do intimismo e o predomnio da visualizao da poesia.Osconcretistassoimportantesnospelaproduopotica, masprincipalmentepelainflunciaquecausaramnapoesiabrasileira, mesmodepoisdeesgotadoomomentodemaiorrepercusso.Alguns elementos podem ser apontados como fundamentais na esttica con cretistaequecaracterizamaproduodessesautores:

Rompimentocomadiscursividadedoverso.Paraapoesiaconcre tista,oversoperdesentidocomoumaestruturalinear.Oquevale aglobalidadedopoema. Socorremse de materiais grficos. As artes plsticas fornecem elementosparaacomposiodoverso. Doprefernciaatemticaurbana. Aproximamsedapublicidade,valorizandoanncioseoutdoors. A apresentao VERBIVOCOVISUAL, ou seja, a organizao do textosegundocritriosqueenfatizemosvaloresgrficosefnicos relacionaisdaspalavras. A eliminao ou rarefao dos laos da sintaxe lgicodiscursiva emproldeumaconexodiretaentreaspalavras,orientadaprin cipalmenteporassociaesparonomsticas.

A poesia ligada visualidade toma alguns direcionamentos como concretismo, poesiaprxis, poemaprocesso ou neoconcretismo. Cada

52

umumarespostaaogrupoconcretistadeSoPaulo.NoRiodeJanei ro,umgrupolideradoporFerreiraGullarfundouem1959omovimen to denominado NEOCONCRETISMO. Pertencem a essegrupo outros artistascomoLgiaClarkeAmlcardeCastro. Mrio Chamie liderou o grupo de poetas em torno do movimento denominadoPOEMAPROCESSO,fundadoem1967,noRiodeJanei ro.Temcomofocoprincipalaexploraodacadeiadesignos,valori zandoaleituradopoema.Comessepropsito,intensificaseapartici pao do leitor como elemento na criao e por isso ao poeta cabe o papeldeproporleiturasdotexto,ouseja,elesetornaprovocadorde experinciasdesignificao.Natendnciadopoemaprocessooleitor deixadeserumelementoreceptordopoemaparasetransformarem umpartcipedacriao.

4.2 Principais autoresO movimento concretista e suas tendncias apresentam poetas que estiveramligadosaomovimento,atuanteseoutrosquesofreramuma certa influncia, mas se mantiveram independentes. Alm dos funda dores paulistas Dcio Pignatari, Augusto de Campos e Haroldo de Campos,soautoresligadosaomovimentotambmFerreiraGullar, LgiaClarck,MrioChamieelvaroS,porexemplo. Nessas tendncias, a crtica esttica, centrada em valores lingusticos, cede lugar leitura semitica que valoriza a matriaprima utilizada notexto,imagenseelementossimblicos.Omovimentoconcretistaeo poemaprocessoseesgotaramnadcadade1960,massuasinfluncias sopermanentes,poismuitospoetas,hoje,apelamparaavisualidade dotextoafimdeconstruremsuasprodues.

Dcio PignatariNascidoem1927,DcioPignatarinasceuemJundia,SoPaulo.Estre ounaliteraturaem1949,comospoemas NoviciadoeUnhaecarne,na REVISTA BRASILEIRA DE POESIA. Em 1950, publicou Carrossel. NessapocaparticipoudoClubedePoesia,emSoPaulo,integrado geraodequarentaecinco. Dcio conviveu com um ambiente de plena agitao ainda durante o tempodeacadmiconaFaculdadedeDireitodaUniversidadedeSo Paulo (USP), entre 1950 e 1953, quando se graduou. Foi nessa poca que iniciou sua amizade com os irmos Augusto e Haroldo de Cam pos, que mais tarde se tornaram parceiros na promoo da POESIA

53CONCRETA.Tal evento marcou o ingresso do Brasil na liderana do movimentopoticouniversal. Em1952,fundouogrupoNOIGANDRES,comHaroldoeAugustode Campos,iniciandoumaparceriaduradoura,oqueresultoutambmna criaodarevistademesmonome,naqualpublicoupoemasconcretis tas Rumo a Nausicaa, no mesmo ano, quando tambm participou das atividades do grupo de arte abstrata denominado RUPTURA. Entre 1956 e 1957 participou do lanamento oficial da Poesia Concreta na I Exposio Nacional de Arte Concreta, no MAM/SP e no saguo do MEC/RJ. No ano de 1958, publicou o PlanoPiloto para Poesia Concreta, emcoautoriacomAugustodeCamposeHaroldodeCampos,naRe vistaNoigandresn4.FoiumdosfundadoresdaeditoraInveno,em 1962,responsvelpelapublicaodaRevistadeArtedeVanguarda,que serviu de portavoz da poesia concreta. Nas dcadas de 1980 e 1990 colaborou em vrios peridicos, entre os quais a Folha de S. Paulo, e foiprofessordesemiticaecomunicaonaUSP.professordaPs GraduaoemComunicaonaUniversidadeTuiutidoParan. Sua produo considerada a mais expressiva potica concretista. Atualmente,participadepalestrasedebateseaindasemantmfielaos princpiosconcretistas.

Haroldo de Campos (1929-2003)Haroldo Eurico Browne de Campos natural de So Paulo, capital. Alm de poeta, foi tradutor e esteve ligado ao grupo de poetas da geraodequarentaecinco.Nestafasepublicouseuprimeirolivrode poemasintituladoOautodoprocesso,em1950.GraduouseemDireito pelaUniversidadedeSoPaulo(USP),em1952,eassumiuocargode procuradordaprpriauniversidadeataaposentadoria.Entre1973e 1989, foi professor titular de semitica da literatura no Programa de EstudosdePsGraduaoemComunicaoeSemiticadaPontifcia UniversidadeCatlicadeSoPaulo(PUCSP),obtendoottulodepro fessoremritoem1990.consideradoumdosintrodutoresdasemi ticanoBrasil.Em1992,ganhouoPrmioJabutidepersonalidadelite rriadoanoeem1999,oPrmioJabutidepoesiaporseulivroCrisan tempo:noespaocurvonasceum,publicadoem1998.Apsofalecimento, recebeu homenagem in memoriam da Presidncia da Repblica, em Braslia,sendoadmitidonaOrdemdoMritoCultural. A obra Haroldo de Campos considerada a mais barroca entre os poetasconcretistas,poisacrenaemumacrisenoversoofezexpe rimentarnovasformasdeestruturao,sejaempoemascurtos,sejaem poemassobformadeprosa.

54

4.3 A poesia na mdiaApoesiaestemtodaparte.Opoticoressurgeacadamomentoeem todos os lugares, por isso ela se transforma com facilidade a fim de acompanhar os avanos tecnolgicos da modernidade. A poesia se adapta muito bem a todos os meios de comunicao moderna e por isso est sempre presente nos mais modernos meios de comunicao demassa.Hdeselevaremcontaquenosopoema,comoobjeto, estpresentenonossodiaadia.Opoticocomocategoriasepresenti ficaemtodososespaoseabrecaminhoparaumavalorizaodotexto potico. H muito os jornais so espaos privilegiados para a circulao da poesia.Aperiodicidadediriapermitequeapoesiaestejamaispresen tenostemasdocotidiano,oquereforaaligaoentrepoetaesocie dade.Esseumfatormuitointeressante,poisafastaofazerpoticoda esferadasubjetividadeinconsequente. Atelevisoabreespaoparaaassociaoslidadotextopoticocoma imagem. Acrescentese ao fato de que a televiso acrescenta o movi mento.Opoema,noespaodateleviso,adquiredinamicidadeeatin geoleitordeumaformamaisabrangente.Essemeiodecomunicao, porserumveculocomunitrio,possibilitaumacirculaomaisrpida dotextoeumadivulgaomassivadoautor. Ainternetmaisumespaoqueapoesiaconquistou.Nolevemosem consideraoainfinidadedecasosdecomunidadesdedicadaspubli caodetextosque,namaioriadasvezes,sodeduvidosaqualidade. O que interessa o emprego dos recursos que a internet oferece ao produtordepoesiaque,quandosabeempregloscompropriedade, explora o texto potico com recursos de intertextualidade que outro veculo jamais pode oferecer. Na internet, o poeta dispe de recursos como imagens, sons e movimentos que permitem explorar os limites dalinguagementreoverbaleonoverbal. Porpartedoleitor,ainternetpermiteumafruiomaiscompleta,pois cabe a eleselecionar caminhos alternativos, tanto para a leitura como paraainterpretao.Liberadodasequncialineardotextoimpresso,o internautapodeestabelecerligaesentretextosepossibilitarleituras diferenciadas. O poemaprocesso convocou o leitor para ser coautor, masainternetforneceuferramentascapazesdetransformloemele mentocentraldoprocessod