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    Olhar comparativo

    A maior parte dos alunos de Mrcia no tem computador em casa eat a chegada do jornal escola, nunca tinha tido contato com essemeio de comunicao.

    A realidade ajudou Mrcia a valorizar a oportunidade de ter conta-to com um meio de comunicao que os manteria informados sobreos principais acontecimentos do Paran, do Brasil e do mundo e queabriu as portas para o trabalho de leitura crtica da mdia.

    Isso aconteceu naturalmente, ao longo do trabalho, quando os alunospassaram a comparar os contedos do jornal com o meio com o qualeles tm mais contato: a televiso.

    Eles comearam a perceber que na tev os assuntos so apresentadosrapidamente, de forma resumida, e no tm tantos detalhes, mas no

    jornal a notcia mais aprofundada, alm de possibilitar uma releitu-ra toda a vez que isso precisa ser feito.

    Aproveitei que eles mesmos manifestassem esse interesse para fazeruma comparao orientada sobre as principais caractersticas no sdesses dois veculos como tambm dos outros meios de comunicao.Para isso, identi camos um tema que tinha sido divulgado em todasas mdias e analisamos o tratamento e abordagem que recebia emcada veculo.

    Captulo 3 - Prticas de Leitura no Ensino Fundamental

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    Dilogo e criatividade

    No dia de trabalho com jornal a sala ca uma ba-guna, mas, como a professora faz questo de sa-lientar, uma baguna criativa, na qual alunostrabalham em grupo, interagem e querem saber oque os outros grupos esto fazendo.

    baguna mesmo, mas o importante ver queesto aprendendo, exercitando o dilogo, a crticae a criatividade. Sabem que para produzir um bomtrabalho todos precisam conviver e se entender comtodo mundo, diz Mrcia.

    Nesses dias, reclamaes como jornal suja a moou jornal coisa de velho no assustam a profes-sora e so rebatidas na hora. Suja a mo sim, mas

    olha o que voc pode ver aqui dentro de interessante, veja como valioso e quantas notcias atuais ele nostraz todos os dias. A insistncia transformou a tur-ma, e at os alunos tmidos desabrocharam. Com o jornal eles caram mais soltos. Perderam a timidez.

    Apesar do sucesso das suas aulas, na escola poucasoutras professoras se interessam em trabalhar como jornal porque veem a prtica como um trabalhoa mais ou dizem que o salrio no compensa paratanto esforo.

    Para aquelas que abraaram a ideia, Mrcia umaespcie de conselheira. Digo que trabalhar com jor-nal cansa mais do que as aulas tradicionais, mas

    que os resultados so muito mais compensadores.

    A professora semprenos diz que o jornal

    uma ferramenta valio-sa que temos todos osdias em nossas mos

    e que se soubermosaproveitar o jornal va-mos nos tornar verda-deiros leitores. O quemais gosto do jornalso as Cruzadinhase o Sudoku porque

    exigem concentrao.Giovanna de Souza

    Dantas, 9 anos

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    Jornal do Estudante

    Uma das maiores novidades na Escola Municipal Jos EurpedesGonalves em 2010 foi a criao do Jornal do Estudante, que nasceuna turma de Mrcia e chegou ao segundo semestre como o jornalda escola.

    Seguindo o modelo e a estrutura de editorias presentes nos jornaistradicionais, a produo da escola publica assuntos de interesse dos

    alunos, a partir da leitura de notcias, charges e outras reportagenspublicadas na Gazeta do Povo.

    O interesse surge durante as atividades com jornal. Os assuntosque despertam maior curiosidade na turma acabam sendo escolhi-dos para compor oJornal do Estudante. A partir da primeira semanade julho, por exemplo, nosso foco passou a ser as reportagens sobreeleies, presentes em quase todas as edies da Gazeta do Povo.

    Eleito o tema da prxima edio do Jornal do Estudante, alm daturma de Mrcia, outros professores e alunos comearam a ser en- volvidos. Hoje, boa parte da escola participa da produo.

    Ao realizar essa atividade, percebo que consigo ampliar o meu pa-pel como docente. Alm de transmitir informaes, cumpro a tare-

    fa fundamental de promover a conscientizao para o exerccio dacidadania, abro caminhos para os educandos pensarem sozinhos eos impulsiono ao desejo de reconstruir seus prprios conceitos, fa-zendo da escola um lugar de entendimento, anlise e produo deinformao.

    Captulo 3 - Prticas de Leitura no Ensino Fundamental

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    Professora Mrcia e alunas durante a confeco do Jornal do Estudante

    Alunos mostram publicao produzida com assuntos da atualidade escolhidos por eles edistribuda em toda a escola.

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    Captulo 4Literatura Infantil eContao de Histrias na Escola

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    Tendo objetivos diferentes, a leitura deve ser trabalhada de acordocom o gnero textual, e so diversas as maneiras de ler, assim como

    diversos so os textos e os objetivos de leitura. No que diz respeitoao gnero literrio, a escola assume o importante papel no s deapresentar aos alunos um mundo ldico, prazeroso, divertido e emo-cionante, como principalmente o de promover aes pedaggicasestruturadas e planejadas, que os levem a compreender e apreciar ouniverso da leitura e da literatura.

    O captulo que dedicamos Literatura Infantil e Contao de Histrias na Escolaest repleto de ideias e provocaes que estimulam o gostopelo gnero, tornando a escola um local especial para a formao deleitores apaixonados.

    O tema tratado pela pedagoga, especialista em Literatura Infantile doutoranda em EducaoElisa Maria Dalla-Bona, professora doCurso de Pedagogia da Universidade Federal do Paran, onde desde

    1991 ministra disciplinas como Prtica Pedaggica e Metodologia deEnsino da Literatura Infantil.

    O entendimento da importncia da leitura literria para o desenvolvi-mento infanto-juvenil impulsiona as aulas lecionadas pela professoraSuely Rubbo Coelli, que atua na Escola Municipal Frei Tiago Luchese,no municpio de Bituruna. Utilizando a tcnica da Contao de Hist-rias, Suely promove o envolvimento dos alunos. Mesclando emoo,razo e imaginao literatura e contao de histrias se transfor-mam em atividade dinmica e dialgica, que re ete a in nita capaci-dade dos seus alunos para associar experincias e ideias.

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    79/18678 Captulo 4 - Literatura Infantil e Contao de Histrias na Escola

    Leitura literriana escolaElisa Maria Dalla-Bona

    A literatura deveria deixar de ser um apndice da rea de Lngua Por-tuguesa para se constituir como uma disciplina obrigatria no EnsinoFundamental e assim ter de nida a sua lista de saberes e competn-cias espec cas. Como decorrncia, o corpo docente teria de passar adominar as nalidades, os contedos e as estratgias pedaggicasespec cas desta rea do conhecimento. Estas so as questes quepretendemos abordar, ainda que parcialmente, a seguir.

    A literatura infantil ao ser escolarizada tem sofrido um processo dedidatizao que des gura, desvirtua e falseia (SOARES, 1999) o textoliterrio, criando resistncias e averso leitura. Principalmente soapresentados aos alunos apenas fragmentos e adaptaes precriasdo texto literrio que transformado em pretexto para estudar gram-tica, ou para exerccios de interpretao que privilegiam as perguntaslivrescas que se prendem reproduo de palavras que so usadasno texto; no intertextualidade; aos aspectos no relevantes paraa compreenso; execuo de exerccios que solicitam preenchimen-to de lacunas; ao assinalamento de respostas que demandam certo/ errado, falso/verdadeiro e outros semelhantes (RANGEL, 2005, p. 150-151). Agrega-se a esses problemas a limitao do tempo dedicado leitura literria na escola. Di cilmente os alunos tm a oportunidadede ler literatura em sala de aula, e quando o fazem so estimulados passividade. Os professores no provocam a re exo, o raciocnio e a

    troca de ideias entre os alunos.

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    As teorias da resistncia (SNYDERS, 1988; GIROUX, 1997) con rmam aexistncia das foras conservadoras presentes na escola, como as aci-

    ma expostas, ao mesmo tempo em que a rmam que elas podem sercombatidas pela atuao ativa de professores e alunos. Nessas teoriasas escolas so vistas como espaos de lutas contraditrias e entendemque os sujeitos envolvidos no processo educacional so capazes deusar o conhecimento crtico para a tomada de conscincia das condi-es de dominao. Uma das formas de a escola se transformar emespao de contestao, luta e resistncia investir no encontro dosalunos com os conhecimentos cient cos, tcnicos e artsticos. Nesseltimo inclui-se a literatura como importante agente de crtica, de de-nncia e de inquietao, que so ingredientes imprescindveis para acriao de novos modos de vida.

    Pensar na escolarizao da leitura literria para alm dos limites dasforas conservadoras investir na formao do leitor, inserir o alunonuma experincia esttica que pressupe sentir prazer, entender, apre-

    ciar e compreender uma obra, investir no potencial que a literaturatem de: desvelar as arbitrariedades sociais; de provocar a re exo do que se quer ser ou do que precisa mudartanto no nvel pessoal, quanto social; de provocar a afetividade; de emocionar, divertir e dar prazer; de contribuir para a humanizao da pessoa e construo da suasociabilidade; de favorecer o relacionamento do mundo da co com a realidade; de extrapolar espaos por meio da imaginao na construo de in-contveis e in nitos horizontes; de promover a experincia do encontro com o outro (autor, colegas,professor); de promover a capacidade de debate e de confrontao de ideias;

    de dialogar com diferentes culturas e interpretar as ideias e os valo-

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    res que a con guram; de desenvolver a capacidade interpretativa;

    de desfrutar da experincia esttica e singular da linguagem literria; en m, de tornar o mundo mais compreensvel, sensvel e humanizado.

    As situaes escolares, muito comuns, em que o professor prope aleitura de um poema ou de uma histria e em seguida pergunta aosalunos o que o autor quis dizer precisam ser superadas. A leitura li-terria s d satisfao ao leitor quando ele participa da anlise eno se limita a contemplar a soluo j formulada pelo autor, ou peloprofessor.

    Tanto o texto quanto o leitor so ativos (ISER, 1996). O texto literriose apresenta de forma inacabada e descontnua ao leitor, que por sua vez, com o uso de sua imaginao e experincias, completa as lacunasdo texto. Assim, as atividades de interpretao de texto devem ser asde construo de sentido, que por sua vez um efeito experimentado

    pelo leitor e no preexistente leitura.

    O papel do professor o de convidar o leitor para integrar-se no pro-cesso de constituio da obra, contemplando-a, entendendo-a e in-terpretando-a, o que torna a leitura um processo singular e particu-larizado. Entretanto, preciso considerar que, ao interpretar um textoliterrio, o leitor no est completamente livre, mas limitado tantopela viso de mundo que j possui (suas crenas, princpios e ideias),quanto pelas normas contidas na obra de arte literria (JAUSS, 2002).A atividade de interpretao de uma obra literria uma experinciaesttica, ou um ato de prazer que mobiliza o leitor e o impele ao,estimulando-o a re etir sobre seus preceitos ticos e morais. A arteno existe para con rmar o conhecido, e sim para contrariar expecta-tivas, podendo levar o leitor a uma nova percepo de seu universo.A obra literria no um mero re exo das palavras do autor reprodu-

    zidas na mente do leitor, ela o resultado de uma interao (leitor-

    Captulo 4 - Literatura Infantil e Contao de Histrias na Escola

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    texto) que ao mesmo tempo receptiva e criadora. Esta interao profundamente dependente da mediao da escola para auxiliar o lei-

    tor a preencher as lacunas deixadas pelo autor, para auxili-lo a entrarno jogo do texto, a mergulhar no mundo da imaginao e da co,a dominar a linguagem literria para reconstruir o universo simblicocontido nas palavras.

    O professor deve ser um auxiliar do aluno para aproxim-lo do maiornmero possvel de obras de modo a ampliar seu universo cultural,instig-lo a desvendar as pistas deixadas pelo autor, a expressar oscontedos intelectuais, sensoriais e afetivos despertados pela obra.Cabe tambm ao professor aproximar os alunos de obras que superemas suas expectativas, os instiguem, os desa em e para usar um termode Jauss (2002), que os emancipem.

    Preocupadas com as questes prticas enfrentadas pelos professoresao trabalhar com literatura, as autoras Bordini e Aguiar (1993) criaram

    o mtodo recepcional, que recebe esse nome porque fundamentadona teoria da esttica da recepo (JAUSS, 2002; ISER, 1996). O mtodorecepcional busca criar as condies na escola para que se estabeleauma efetiva comunicao do leitor com o texto, mobilizando seu ima-ginrio, num processo sempre ativo.

    O ponto de partida do trabalho com a literatura na escola, a partir domtodo recepcional, o conhecimento literrio anteriormente adqui-rido pelo leitor, que pode t-lo ajudado a de nir algumas prefernciase a iniciar a constituio do seu horizonte de expectativas que for-mado por aspectos sociais (classe social que pertence), intelectuais,ideolgicos (valores), lingusticos (padro expressivo) e afetivos. O pro-fessor o responsvel e o dinamizador do processo de aprendizagem,provocando situaes literrias que propiciem o questionamento des-se horizonte e favorecendo a sua superao pelo domnio de conheci-

    mentos mais complexos.

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    O mtodo recepcional, ao colocar o leitor em contato com obras lite-rrias desa adoras, provoca um esforo salutar para responder aos

    desa os ante o novo, de adotar uma postura de disponibilidade. Asaes pedaggicas propostas tm caractersticas provocativas, pro-blematizadoras e re exivas, gerando impactos no leitor (aluno) e emseu meio social (escolar e familiar), na medida em que, por meio daleitura literria, provoca a reviso de suas crenas, atitudes e valores.

    No que se refere seleo dos textos literrios, no mtodo recepcionalo ideal a coexistncia, no ambiente escolar, dos textos com os quaisos alunos esto mais familiarizados, com os de outras pocas, regiese classes sociais, em diferentes nveis de estilo e abordando temti-cas variadas (BORDINI E AGUIAR, 1993, p. 86) e tambm com aquelesproduzidos pelos prprios alunos. Isso favorece a comparao entre ofamiliar e o novo, entre o prximo e o distante.

    O processo de trabalho proposto pelo mtodo recepcional sugere, ain-

    da, a participao ativa dos alunos no planejamento e na execuodas atividades. A frequncia de oportunidades para a expresso e odebate oral e escrito entre os alunos, destes com o professor e tambmcom os membros da comunidade, favorece a atividade dos alunos eso criadas as condies para que ele aja como sujeito da Histria.

    As estratgias didticas so de natureza ldica e capazes de provocaro desejo de aprender e de superar-se. Este mtodo objetiva o desenvol- vimento das capacidades de observar, descrever, analisar, comparar,interpretar, crticar, extrair concluses e aplicar os conhecimentos oucomportamentos adquiridos a novas situaes.

    A avaliao proposta processual, dinmica e permanente, ocorren-do a cada leitura do aluno. No desenvolver dos trabalhos, esse deveevidenciar capacidade de comparar e contrastar todas as atividades

    realizadas, questionando sua prpria atuao e a de seu grupo. A res-

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    posta nal deve ser uma leitura mais exigente que a inicial em termosestticos e ideolgicos (Idem).

    Assim, ler literatura na escola se inserir num mundo ldico, prazero-so, divertido e emocionante, provocado por aes pedaggicas estru-turadas, organizadas e planejadas, sem serem sisudas e impositivas,mas desencadeadoras da interao do leitor com o texto.

    Cabe escola, como a rmamos de incio, assegurar formalmente otrabalho com a literatura, dando acesso a textos cuja qualidade lite-rria provoque o desejo de ler cada vez mais, a fruio de um prazersuperior, en m o desenvolvimento das competncias leitoras. Trata-sede um ambiente em que professores e alunos deixam-se levar pelafora e a emoo das palavras narradas, em que os alunos sentem odesejo de criar e escrever seus prprios textos literrios, gargalhamcom o humor e se deixam contagiar e proteger por ele e provam doprazer da narrao de uma histria.

    A questo do estmulo leitura, especialmente quando se trata decrianas pequenas, passa tambm pela contao de histrias, pois umanarrao bem feita provoca o desejo de ler o livro. Mas na escola essaatividade comumente improvisada, resultando no tumulto entre ascrianas, que desinteressadas pela atividade se estapeiam, conversame fazem provocaes com os colegas. A leitura do professor passa a serintercalada com gritos para chamar a ateno das crianas.

    bom lembrar que o prazer de ouvir uma histria bem contada nose esgota na infncia. Tomo como referncia a minha prpria experi-ncia recente, provocada pelo encantamento de ouvir histrias nar-radas por Celso Sisto. Ele um contador de histrias que no utilizade outros recursos seno a expresso corporal e a entonao de voz.Ele consegue tocar profundamente seus espectadores sem utilizar

    de materiais de apoio, o que faz com que a ateno se volte para

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    a narrao, para o texto e no para os recursos que eventualmentepossam ser utilizados.

    Celso Sisto nos d pistas importantes sobre o tema, em seu livroTextose pretextos sobre a arte de contar histrias. Ele insiste na necessidadede o professor se preparar para a contao, o que pressupe diversasleituras antecipadas da obra, at que se sinta tomado pelo desejo decont-la. Assim, as palavras vo brotando dos lbios com veemncia,convico, detalhe e emoo (SISTO, 2005).

    O professor no pode ter pressa depois de comear, pois os princpiosda esttica da recepo esto presentes tambm quando os alunosouvem uma histria, na medida em que por meio de sua imagina-o vo preenchendo as lacunas e os vazios do texto. Sisto se refere cumplicidade que o narrador deve criar entre histria e ouvinte, ofe-recendo espaos para o ouvinte se envolver e recriar. Esses espaos delocomoo do ouvinte dentro de uma histria podem ser construdos

    pelas pausas, silncios, aes, gestos e expresses de forma harm-nica (Ibidem). Assim, a narrao expressiva em que a voz provocasuspenses, instiga, encanta, faz rir e se insinua est vida pelo leitor,pela reao criativa no sentido de algum que muito mais do que umespectador um coautor. Uma histria feita, na cabea do ouvinte,pela construo de expectativas, frustraes, reconhecimentos e iden-tidades (Ibidem).

    Ler ou contar uma histria depende de o professor optar por aque-la situao em que ele se sente mais confortvel. Em qualquer delastem de estar presente o cuidado com a expresso da voz, da face, dosmovimentos corporais, emoo, texto, adequao, corpo, voz, pausase silncios, olhar, espontaneidade e naturalidade, ritmo, clima, mem-ria, credibilidade (Ibidem). O importante provocar o espectador paraque construa mentalmente o que est sendo contado e estabelea a

    comunicao com a histria.

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    Ao nal da narrao muito importante que o professor estimule odebate, de forma que os alunos possam falar sobre o que esto sen-

    tindo, sobre as relaes que estabeleceram entre a histria e sua rea-lidade, ou com outros textos que leram. Nesse caso, a lembrana podeser de um texto literrio, mas pode tambm ser de uma notcia do jornal, por exemplo. Os bons textos literrios sempre abordam comprofundidade temas que se relacionam com a vida real, com os sen-timentos humanos, as inseguranas, as di culdades, os con itos, ascuriosidades etc.

    A narrao de um texto literrio pode derivar para o trabalho comdiferentes linguagens (msica, lme, artes plsticas) e tambm comdiversos gneros textuais, como um poema, uma carta, uma receitamdica, uma bula de remdio, uma piada, uma entrevista jornals-tica e um artigo cient co. uma maneira de explorar o potencialpara as intertextualidades que um texto literrio tem, ou para abor-dar o mesmo assunto de forma diversa, descobrindo a riqueza de

    cada uma delas.

    Destaco o potencial que o jornal tem como auxiliar na formao doleitor literrio. Os cadernos direcionados para o pblico jovem e os deatividades culturais so timos recursos para o professor, que podeproporcionar aos alunos a leitura de anlise de obras, a leitura de en-trevistas com autores, conhecer lanamentos, divulgar encontros paraaudio de textos literrios, acesso a artigos de especialistas, a partici-pao em iniciativas de promoo da leitura divulgadas pelo jornal.

    Dentre as inmeras atividades que podem ser desenvolvidas a partirdo jornal, h algumas que interessam muito aos alunos, por exemplo,a criao de um caderno cultural da escola. Inspirados nos cadernosque conhecem nos jornais, os alunos podem escrever comentrios so-bre os livros que leram, que podem ser complementados por outros

    alunos com as anlises de obras similares e com ilustraes dos que

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    Para saber maisBORDINI, Maria da Glria; AGUIAR, Vera Teixeira de.Literatura. A for-mao do leitor: alternativas metodolgicas. 2. ed. Porto Alegre:Mercado Aberto, 1993.

    GIROUX, Henry A.Os professores como intelectuais. Rumo a umapedagogia crtica da aprendizagem. Porto Alegre: Artmed, 1997.

    ISER, Wolfgang.O ato da leitura: uma teoria do efeito esttico. SoPaulo: Editora 34, 1996. 2 v.

    JAUSS, Hans Robert. A esttica da recepo: colocaes gerais. In:LIMA, Luiz Costa. A literatura e o leitor. Textos de esttica da recep-o. 2. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2002.

    RANGEL, Jurema Nogueira Mendes.Leitura na escola. Espao paragostar de ler. Porto Alegre: Editora Mediao, 2005.

    SISTO, Celso.Textos e pretextos sobre a Arte de Contar Histrias.Curitiba: Positivo, 2005.

    SNYDERS, Georges. A alegria na escola. So Paulo: Manole, 1988.

    SOARES, Magda. A escolarizao da literatura infantil e juvenil. In:EVANGELISTA, Aracy et alii. A escolarizao da leitura literria: o jogo do livro infantil e juvenil. Belo Horizonte: Autntica, 1999.

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    Quando o faz de containspira o mundo realProfessora:Suely Goretty Rubbo CoelliInstituio:Escola Municipal FreiTiago LucheseCidade:Bituruna

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    Para a professora Suely Goretty Rubbo Coelli, da Escola Municipal FreiTiago Luchese, do municpio de Bituruna, educar aventurar-se elevar junto os alunos a um mundo de desa os e coisas novas, quefaam sentido para a vida real.

    Ento, nada mais natural para ela que se inspirar no mundo do fazde conta para promover uma das atividades ldicas mais envolventesusando o jornal: a contao de histrias.

    O projeto nasceu como uma estratgia para fugir da rotina e da mes-mice que as aulas acabam se tornando quando ns professores noencontramos caminhos para tornar a escola um ambiente de apren-dizagem atrativo, capaz de instigar o aluno e desa -lo a novas des-cobertas.

    Segundo ela, a busca pelo envolvimento da emoo, da razo e daimaginao, numa atividade dinmica e dialgica, consegue re etira in nita capacidade dos estudantes para a associao e circulaode experincias e ideias, especialmente numa sociedade to seletiva,excludente e altamente competitiva.

    A implantao da proposta no foi fcil. A professora teve de enfren-tar o desa o de superar as limitaes dos alunos, pouco familiariza-dos com textos literrios e, principalmente, nada acostumados com oexerccio do raciocnio dedutivo.

    Mas a partir do momento em que sabemos aonde queremos chegar,todos se envolvem e os resultados so perceptveis em diferentes si-tuaes. Os alunos passam a demonstrar maior interesse pela leitura,

    prestam ateno aos detalhes, fazem inferncias, estimativas, levan-

    A leitura do mundo precede a leitura da palavra.Paulo Freire

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    A prtica

    A partir da leitura de uma histria como Ali Bab e os 40 ladres naqual um homem pobre ca rico ao descobrir um tesouro deixado porladres em uma caverna , lendo um captulo por aulas e instigan-do os alunos a conhecerem a histria, a professora estimula os seusestudantes a buscarem fatos semelhantes publicados no jornal im-presso e na edio da Gazeta do Povo Online. A inteno demons-trar aos alunos que possvel encontrar histrias reais com algo em

    comum com o mundo da fantasia. O trabalho remete re exo eanlise tanto da histria ouvida quanto da notcia, que identi ca-da permite que o aluno transponha para a realidade o contexto eo argumento da narrativa e vice-versa. Depois, as concluses soapresentadas oralmente aos colegas, em duplas, socializando o co-nhecimento adquirido.

    tam hipteses, questionam, criticam. Muito diferente e mais uidoque antes do projeto, quando tudo era muito difcil de acontecer.

    Suely a rma que at mesmo quando a discusso envolve temas po-lmicos, os alunos se posicionam criticamente, inclusive citando refe-rncias e as fontes que consultaram para fundamentar suas opinies.

    Alm disso, tm segurana e se sentem vontade para citar exemplos vivenciados por eles prprios, com a famlia, vizinhos e conhecidos.Isso acontecem porque as aulas ocorrem em clima de harmonia, comdireitos e deveres muito bem estabelecidos e um permanente respeitoao outro.

    Captulo 4 - Literatura Infantil e Contao de Histrias na Escola

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    Heris annimos

    Ainda saboreando o sucesso do projeto de contao de histrias usan-do os textos clssicos e o jornal, a professora Suely j est em buscade novas provocaes e quer substituir a matria-prima principal desuas aulas por histrias de vida.

    Para isso, comeou a identi car pessoas da comunidade que tm tra- jetrias inspiradoras, apesar de enfrentarem as mesmas di culdades

    dos alunos.

    Quero mostrar que os verdadeiros heris so pessoas simples, humil-des, que fazem parte, anonimamente, da comunidade. Pessoas queno pertencem elite, no aparecem na televiso, no fazem partede grupos sociais de destaque. Trabalham no mato ou na roa e tmexperincias de vida fantsticas porque dominam o senso comum e valorizam muito mais o ser do que o ter.

    Ela diz que a maior parte das crianas, ainda que esteja longe dessesmodelos, se identi ca e valoriza referenciais equivocados. Sonhamem ser a garota escultural da tev, o jogador famoso de futebol queganha rios de dinheiro, a atriz famosa que vive um romance de contode fadas... Ou seja, suas referncias so casos raros e modelos prati-camente inacessveis para as pessoas comuns.

    Ouvir relatos de pessoas reais e que vivem num mundo muito pareci-do com o dos alunos pode mostrar a eles que devem viver e lutar pelasua prpria vida e no tentar viver a vida dos outros. Espero que elescompreendam que ter sucesso vencer nossos prprios desa os, de-senvolver nossos talentos e aproveitar as oportunidades que surgemde forma honesta, fazendo o bem para si mesmo e para os outros.

    Captulo 4 - Literatura Infantil e Contao de Histrias na Escola

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    Humano e conectado

    Para Suely, o professor do sculo XXI deve ser des-pojado, aberto, digital e conectado, mas semperder a sensibilidade e o carter humano. Preci-samos inspirar con ana e acreditar no potencialdos alunos. A nal, pelas nossas mos passam osfuturos presidentes, mdicos, cientistas, dentistas,empresrios, jornalistas e outros tantos talentos

    que um dia precisaram ter suas aptides desco-bertas e apoiadas. Tenho certeza de que estou fazendo diferena na vida dos meus alunos e acredito que outros profes-sores tambm podem fazer. Eu mesma sou frutodo esforo e interesse de professores dedicados einteressados que me motivaram a ler e a expressarminhas opinies e ideias, e a ter con ana paralutar pelos meus sonhos.

    E esse um comportamento que exige dedicaoe um plano de interesses voltado ao desenvolvi-mento integral do aluno. No adianta ter todos osmais modernos recursos ao nosso alcance se no

    soubermos usufruir dos benefcios que eles podemnos oferecer. E isso no depende da tecnologia esim de atender s necessidades da turma, valorizaras diferentes habilidades de cada aluno e descobriro melhor processo de ensino-aprendizagem.

    Infelizmente, admite, muitos professores aindaresistem ideia de novas ou inusitadas prticas

    Quando a professo-ra conta histrias a

    gente viaja no mundoda leitura. O jornal muito importante

    para o nosso desenvol-vimento.

    Emanuele Matias,11 anos

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    didticas. Ficam enfurnados entre as quatro paredes da sala de aula elevam os alunos a fazer o mesmo, quando at mesmo a pouca idade

    os impede de aceitar esse modelo. Por isso eles se rebelam, se re- voltam, demonstram indisciplina. L fora, o mundo mais atrativo,dinmico e interessante.

    Cidadania

    Atender, efetivamente, a um dos objetivos da educao, que permitirque o educando adquira conhecimento, descubra e alargue todas assuas potencialidades. Essa a mola que impulsiona a professora Suelyao trabalho permanente com o jornal.

    Vejo no jornal uma ferramenta pedaggica de longo alcance e deduplo signi cado. Com o jornal possvel conhecer o mundo e, aomesmo tempo, contribuir para o desenvolvimento integral dos alu-

    nos como cidados. E ajud-los a exercer sua cidadania plena exigeque trabalhemos questes como valores, carter, crtica, conscinciae atuao social.

    Para atingir tantas necessidades e objetivos, Suely garante que preci-so se despojar de atitudes de poder associadas aos tradicionais papisde professor e alunos e fazer tudo para diminuir a distncia entre osdois lados. Ou seja, o professor no pode se apresentar como dono doconhecimento. Ele deve entender que todos os dias tambm aprendealgo com seus alunos, porque educar um caminho de mo dupla.

    Chegar classe engessada por pr-conceitos no serve mais para ospro ssionais da educao. preciso abrir as janelas e visualizar ummundo aberto a novas possibilidades. O professor deste milnio pre-cisa ensinar e orientar o aluno para atuar e modi car a realidade me-

    lhorando sua vida e a dos outros.

    Captulo 4 - Literatura Infantil e Contao de Histrias na Escola

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    A partir da leitura de uma histria, professora Suely estimula os alunos a buscarem fatossemelhantes no jornal.

    A professora Suely trabalhando, em suas aulas, questes como valores, carter,conscincia e atuao social.

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    Captulo 5Leitura Signi cativae Contextualizada

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    Ler no somente identi car smbolos, juntar letrinhas, relacionar asletras aos seus respectivos sons e repetir frases lidas em cartazes ou

    anncios.Ler, em seu sentido amplo, signi ca saber decifrar um grande nme-ro de informaes e reconhecer seus signi cados e interaes com omundo. En m, entender o que est sendo lido e transformar a leituraem aquisio de conhecimento.

    O ensaio acadmico sobre o temaLeitura signi cativa e contextuali -zada assinado porBenedito da Costa Neto, professor na rea deLngua Portuguesa e de Literatura, consultor, crtico de arte e escritor.Professor de Lngua Portuguesa da Rede Paranaense de Comunicao(RPC), Costa Neto tambm responsvel pelo estilo de linguagemadotado pelos telejornais da rede. Alm disso, ministra aulas em di- versos cursos universitrios.

    J a prtica em sala de aula que destacamos para este captulo o fan-zineproduzido pelos alunos da professora Adriana Margarete Rolimda Silva Gonalves, no contraturno da Unidade de Educao IntegralAbranches, em Curitiba. Com aulas dinmicas e divertidas, Adriana,premiada no Concurso Cultural Ler e Pensar de 2008, usa a leitura de jornal para motivar o aprendizado entre jovens adolescentes e faz dassuas aulas um exemplo de criatividade, interatividade e estmulo aoprotagonismo.

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    Produtores designi cadoBenedito da Costa Neto

    Quando lemos, o que lemos? A leitura est efetivamente no texto lidoou em nossa mente? Ser que o que lemos nos precede, sendo uma voz que fala antes de ns, ou seria uma voz nova, que fala a cada dia eque fala algo novo a cada vez? Ns somos leitores ou somos tambmprodutores de signi cado? E o que seria mais importante no ato da lei-tura: o que vem antes do texto e que tornou possvel este texto; quemo escreveu; ns mesmos?

    A voz de nossa professora de Portugus ecoa em nossa mente indican-do um bom caminho para o texto: no fazer perguntas, pois um tex-

    to deve ser a rmativo, mas eu gostaria de comear este texto (assimcomo comecei a apresentao oral que o antecedeu) justamente comperguntas, para que, a partir delas, seja possvel a rmar o que deverser a rmado.

    Ler, para um erudito livre e independente como Alberto Manguel, um processo complexo, sem dvida, mas um processo extremamentemarcado pela condio cultural. Para ele, a leitura no apenas ados olhos sobre o texto, uma vez que cegos podem ler e uma vez queh outros tipos de leitura, como a da vidente que observa o fogo, opescador que sabe quando h peixe, o amante que passa os dedospelo corpo do amado1, entre tantas outras in ndveis formas de ler. J para autores mais ligados pesquisa acadmica, no seio da Lin-

    1 A obra de Manguel em que ele a rma isso e pesquisa outras formas de ler Umahistria da leitura.

    Captulo 5 - Leitura Signifcativa e Contextualizada

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    gustica, ler um processo, digamos, mais fechado, que admite umataxionomia: haveria uma leitura neuro siolgica, uma leitura cogni-

    tiva, outra afetiva, e ainda leituras como processo argumentativo esimblico, ocorrendo todas ao mesmo tempo e no sendo nenhumasuperior outra. Este tipo de anlise ganhou corpo no sculo XX epode ser encontrado em pesquisadores como Vincent Jouve2. Ainda nomeio acadmico, podemos encontrar outras formas para o ler, comoa do pesquisador luso-americano Antnio Damsio, a partir de cujaspesquisas podemos intuir que o processo de ler est atrelado ideiaque temos de ns mesmos, assim como nossa percepo do mundo3 (memria, um sentido do eu e um sentido do existir).

    De um modo ou de outro, a dvida permanece e talvez o ato de lerseja tudo isso: haveria muitos signi cados para a leitura, que nocaberiam neste texto. Em particular, quero me dedicar a um tipo deleitura em especial, a do jornal. Talvez fosse coerente com a multi-plicidade dos meios jornalsticos frisar, no por excesso de zelo, que

    h uma leitura de jornal escrito, em papel, espec ca, e que difere daleitura em pgina da web, por exemplo. O leitor de jornal aquele querecebe o jornal em casa, pela manh, aquele que para em uma bancapara ler o que est disposio ou ainda aquele que comprou o jor-nal para l-lo na praa, no banco, no aconchego da sala ao retornarpara a casa. H enorme diversidade de jornais e de cadernos: jornaisde bairro, jornais de grande circulao, jornais espec cos e, no inte-rior de cada um, uma diversidade de cadernos, desde uma seo declassi cados, que sustenta muitos jornais nanceiramente, at textosmuitssimo particulares, como os sobre vinhos, moda ou ainda, emcadernos especiais, sobre a velhice ou a violncia urbana.

    Sem saber, o leitor est em consonncia com o que se discute dentro

    2 A obra em questo A leitura.3 Para Damsio, emO mistrio da conscincia, h diferena entre a noo de eu ea noo do existir.

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    do meio acadmico: ora temos um leitor que buscar o tema, o sen-tido, o signi cado, o contedo, o dado que o antecede, sendo muitas

    vezes um dado que ele no conhece e que, por no conhec-lo, nopode duvidar dele, ora teremos um leitor mais passivo, que passa osolhos pelo jornal procura de algo interessante, por lazer, passatem-po ou por mera formalidade dos eventos dirios. Se um jornal traz umdado irregular (como dizer que Abu Dabi ca no Marrocos), o leitornecessitaria ser aquele leitor no ideal imaginado por Umberto Econo sculo passado4, que buscaria cada dado para veri car se ouno verdadeiro. Mas no so todos os dados, por assim dizer, pois osnmeros e informaes sobre uma investigao policial no podemser checados, o que nos faz imaginar que o leitor deve ter com o jor-nal um pacto de aceitao do dado, ou um pacto que o faz aceitardeterminados dados, se pensarmos ainda no mesmo Eco que trata dopacto de leitura.

    Ocorre que o jornal um mltiplo tambm no sentido empregado,

    hoje, pela arte contempornea5

    . O jornal no apenas um emaranha-do de letras, frases, pargrafos, que o leitor deve traduzir. Tal traduo uma falsa ideia da leitura. Ler tambm traduzir algo (uma escrita,principalmente, em nosso caso), mas ler, em sentido mais amplo, de-cifrar um grande nmero de informaes que o jornal carrega consigo:a diagramao, as manchetes e chamadas (que so escritas tambm),as cores, as imagens, as propagandas (misto de imagens e textos), atipogra a etc., ndices pelos quais o leitor reconhece o seu jornal eseu texto. Todas essas caractersticas, juntas, fazem da leitura o queela : uma traduo em mltiplos nveis.

    Porm, se a leitura fosse uma decifrao de textos (escritas em v-rios sentidos de escritas, como Barthes, por exemplo, teria imagi-

    4 Umberto Eco tratou disso em vrios escritos, mas penso agora emLector in fabula.5

    Quanto a esta nomenclatura, penso nos estudos de Nicolas Bourriaud e Anne Cauquelin.

    Captulo 5 - Leitura Signifcativa e Contextualizada

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    nado6 e tantos outros antes dele, depois dele), isso seria uma tarefarazoavelmente simples de resolver. Estudos de gramtica e de escrita

    dariam conta do desa o e ler seria um processo de decifrao ora decores, ora de tipogra a, ora de uma escrita com regras sem as quaisno se pode fazer um jornal: as normas gramaticais vigentes no in-terior de cada redao, certas regras gramaticais aceitas em acordosinternacionais e em certas gramticas normativas. No entanto, exis-te o contedo da escrita, algo que um pensador como Pcheux, seemprestssemos dele certa ideia sobre o discurso, chamariaaconte-cimento. Todo texto tem uma estrutura (frasal, gramatical etc.), mastodo texto tem um contedo ideolgico, poltico, soociocultural, quefaz ou no parte da vida e do mundo do leitor7. Quem escreve paraum jornal, escreve de um ponto social muitas vezes no de nido, mastentaremos um caminho investigativo sobre este ponto. Pensemosprimeiro num lugar fsico de escrita, de onde tudo ui. Antigamente,h no muito tempo, os jornalistas, no interior de cada redao (ecom certeza em alguns lugares do mundo isso ainda deve ocorrer)

    escreviam a partir de mquinas de escrever8

    . Hoje, talvez seja comumem todo o pas a utilizao de computadores, interligados em rede,com acesso internet, en m, que facilitam em parte a escrita emsi, a produo de textos. Mas este pro ssional da escrita escreve deum lugar que no simplesmente este lugar fsico , para alm doespao fsico, no sem importncia, como j mostrado por estudio-sos com certa abordagem fenomenolgica ou por outros a partir deabordagens sociolgicas, um espao cultural, um espao do dizer em

    6Barthes ocupou-se disse grande parte de sua produo, mas penso emO prazer do texto.7 Aqui h uma leitura bastante livre deO discurso estrutura e acontecimento, deMichel Pcheux.8 Em muitas redaes de jornais escritos e falados, a mquina de escrever foi usadaat meados dos anos 1990, por uma questo de custos. Era realmente caro investirem equipamentos eletrnicos para todas as equipes. Valeria lembrar, igualmente,que o uso de computadores em larga escala, no meio empresarial, fato relativa-

    mente recente na Histria.

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    que a voz no apenas gramatical ou espetacularmente estrutural,com erros e acertos. A voz que fala num jornal uma voz social, reple-

    ta de intenes as mais diversas, de interesses, de interpretaes domundo, de vises espec cas. lugar-comum dizer que o jornalismodeve ser a voz da liberdade, mas tal liberdade pode no ter as asasto dilatadas como sonha a verso tpica das edies, que cantam aliberdade de expresso e o teor da verdade de cada matria. E, nessemomento, entra em questo o que h de mais complexo na leitura,que a questo do discurso.

    extremamente comum encontrarmos a palavra interpretaoquando veri camos os textos dos pesquisadores que investigam aleitura. Tal palavra remete a um grande nmero, por sua vez, de pos-sibilidades interpretativas: por vezes, deparamos com a ideia de que possvel resgatar a voz do autor e procuramos num texto esta vozperdida; se a voz nos prxima, por exemplo, a voz de um escritor ou jornalista vivo, ca razoavelmente fcil distinguir o texto de um Luis

    Fernando Verissimo de um texto de Jos Simo, mas se a voz antiga,e se perde na noite dos tempos, ca bastante complicado ouvir esta voz e a interpretao dela no mais do que um desejo. De todomodo, nossa leitura sempre uma leitura do hoje e no do ontem. como se zssemos uma atualizao (no sentido que Pierre Lvy dao termo quando discute a cibercultura9). No Brasil, principalmente,dada a fora da USP e das anlises sociolgicas difundidas pelo estu-dioso Antonio Cndido, comum encontrarmos anlises desse tipo,mescladas a outros discursos: a psicanlise freudiana ou junguiana,a fenomenologia de Bachelard, a nova histria de autores to dspa-res como Natalie Zemon Davis e Carlo Ginzburg etc. Ocorre que taisanlises so possveis, como qualquer outra anlise, mas muitas ve-zes deixam de lado o seguinte: fazemos tambm, ns, uma leitura dohoje, do agora e dos discursos posteriores ao texto, que o atravessam.

    9 Tal pensamento est emO que o virtual?

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    H tambm autores realmente complexos que parecem acenar paraeste tipo de anlises Clarice Lispector, certo Kafka e so justamante

    esses que, por motivos razoavelmente compreensveis, passam a serobjeto de anlises de autor. A ideia central : se entendo um autor,posso entender sua obra. O risco : confundo o autor com a obra.Pode parecer lgico tambm que, se entendemos o universo solitrioe, segundo bigrafos, depressivo de Lispector, entenderemos melhor A paixo segundo G. H., mas isso no ocorre na leitura de um jornal,haja vista que bem comum no conhecermos os jornalistas. Emboravivos, produzindo em nosso tempo, eles no so pessoas prximastampouco analisveis nesse sentido. No obstante, a leitura tam-bm uma busca por uma voz de autor, apontvel ou no.

    Outro tipo de anlise comum, igualmente interpretativa, a anlisedo texto em si. H diversas anlises ao longo do sculo XX preocupa-das com o texto em si a partir do momento em que a textualidade ga-nhou importncia em detrimento das questes gramaticais ou discur-

    sivas, o que seria talvez certo modo positivista de ler e de interpretar otexto. H tanto o modo de anlise do texto com o desejo de encontrarpara ele uma de nio, sem a qual a anlise no seria possvel, assimcomo a anlise das potncias textuais do texto, o que ganhou corpono Brasil a partir dos anos 1980, quando a Lingustica Textual passoua ser estudada em larga escala, o que contaminou no bom senti-do as anlises literrias. Tais anlises so possveis e interessantes,mas desde que no tenham como objetivo maior a classi cao vazia:discutir se um texto ccional novela, romance ou conto, tambmimportante, mas no como m em si. Tambm na leitura do jornalocorre um certo tipo de classi cao. No geral, o jornal (parece bvio,mas mais espinhoso que isso) classi cado justamente como aquelecujo texto jornalstico, como se o texto jornalstico fosse um gnero parte e fechado. No seria mentiroso dizer que o jornal jornalsti-co, mas se isso for importante para uma anlise (separar o que seria

    jornalstico daquilo que no ), h de se pensar tambm que cada jor-

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    nal se diferencia do outro e que em cada jornal h universos textuaise discursivos diferentes. Ao p da letra, cada jornal um veculo de

    informao, mas as informaes podem ser sobre poltica, economiae gastronomia num jornal de grande circulao, privado e podemser informaes sobre aumento salarial, demisses, direitos do traba-lhador num jornal sindical. A questo do texto em si (tanto as an-lises gramaticais quanto textuais) pode ser um grande aliada em salade aula, mas desde que outras anlises no quem de fora. Fariamparte deste grupo algumas anlises ditas estruturalistas, ao modo dePropp, e ainda anlises da Lingustica textual ao modo difundido noBrasil pela professor Ingedore Koch. At mesmo algumas ferramentasda Sociolingustica so usadas nesse tipo de anlise. Quando no somera formalidade classi catria, podem ser teis. Por exemplo, se di-zemos que um texto foi escrito por homem ou mulher, se o texto foiescrito por jovem ou idoso, se o texto foi escrito por pessoa de tal ou talformao, devemos ter em mente que por detrs dessas a rmaes hdiscursos muito poderosos, incluindo a alguns preconceituosos.

    Haveria um terceiro modo de analisar o texto que no veri cando suaorigem tampouco as questes estruturais que fazem um texto ser umtexto. Costumo dizer que as anlises discursivas so um tipo de anlisee de interpretao possvel e diferente das dos outros dois grupos. A seufavor, conta-se com a capacidade de investigar o texto em seu territriode escrita, em seu momento de dizer, seja ele sociocultural ou histrico.Anlises sociolgicas em geral (usos e costumes, gnero, poltica), an-lises histricas, anlises que utilizam ferramentas das reas psi, anli-ses que utilizam discursos do Direito ou da Medicina, so possibilidadesmuito interessantes para a sala de aula. A seu desfavor, tal modalidadede investigao tem l suas obrigaes: a) necessita ser erudita, paraque no se corra o risco de falsas concluses; b) no pode procurar a verdade como um m, pois que a investigao uma procura eternae no um processo com limite nal e estabelecido; c) no pode desviar

    demais a ateno do texto, seja um romance ou um jornal o que se l.

    Captulo 5 - Leitura Signifcativa e Contextualizada

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    Do lado de c do texto (ou seja, nem a leitura do antes, tampoucoa leitura do texto em si), haveria um tipo de leitura no aceita pela

    academia, mas existente e, volta e meia, tentando penetrar o sagradoespao acadmico. Decerto, no existe interpretao que no seja pes-soal, que no seja uma investigao do leitor, nica e intransfervel.Porm, muitas vezes, a leitura torna-se to pessoal que ultrapassa acondio de uma leitura e de uma interpretao. Isso ocorre quando aleitura vai alm dos dados e do discurso do texto lido, o que podera-mos chamar leitura intimista, livre ou ainda impressionista, semrelao com o movimento artstico moderno. Cada leitor l o textoa seu modo e seria um exerccio borgeano ler A ilha do tesourocomoum livro de receitas ou como um orculo. Mas, em sala de aula, taisleituras no so bem-vindas. Do mesmo modo que um romance nodeve ser lido como receita, assim o jornal. De todo modo, a sala deaula um lugar livre para especulaes, mas tambm para orientaosobre os limites da leitura e da interpretao. Quem l Clarice Lispec-tor procurando sadas para a vida pessoal faz decerto um exerccio

    fascinante de leitura, mas no exatamente um exerccio acadmico oude resultados ben cos para a sala de aula.

    Evidentemente, cada uma dessas anlises no pode ser separada sim-plesmente e isolada. Ao lermos um texto e ao avaliarmos um texto, na verdade mesclamos vrios tipos de anlise. Desde que haja a perguntaquem o escreveu?, estamos procurando um sujeito anterior leitura,que pode dizer muito a respeito do texto. Isso mais simples do queimaginamos. A leitura no deixa de lado seu autor, e inclusive utiliza-mos adjetivos espec cos para nos referirmos a um tipo ou a uma mo-dalidade textual: borgiano, rosiano, foucaultiano. Do mesmo modo,enxergamos no jornal uma modalidade, como j citado no comeodeste texto, e continuamos com a utilizao de expresses adjetivas: jornalstico, televisivo, de revista, da web, editorial (como adjetivo ecomo substantivo), de lazer, econmico etc. No caso particular de um

    jornal, valeria lembrar que talvez no conheamos todos os jornalis-

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    tas, mas no to complexo observar que h articulistas, editorialis-tas especiais, colunistas razoavelmente xos, cujos textos ganham em

    sentido quando colocados lado a lado, principalmente se conhecemoso trabalho anterior de quem escreve. Do mesmo modo, se h a pergun-ta quando isso foi escrito?, de algum modo estamos entre o primeiroe o terceiro tipo de anlise, tentando uma xao no arbitrria parao texto, de modo a tentar entender o que /foi escrito numa determi-nada poca, sabendo de antemo que as pocas diferem entre si e quealgo dito numa poca no poderia ser dito em outra, do mesmo modoque, se algo dito exatamente como o foi em outra poca, o resultadodesse discurso s aparentemente igual. Ento, podemos dizer que ainterpretao de um texto tem, sim, a ver com quem o escreveu (seriamelhor sabermos quem o escreveu, mas a fonte em que est j aju-da), da mesma forma que o lugar/tempo de onde o texto fala nos importante, desde que no quemos analisando a vida particular deautores e jornalistas.

    Em paralelo, a leitura de um texto prev certos mecanismos de leiturae de apreciao e ainda de aceitao. Muito se fala sobre o pacto querealizamos com um texto (Umberto Eco, por exemplo, j citado) e docomo separamos mentalmente um gnero textual de outro. Na super-fcie do texto, convivem regras gramaticais, regras de escrita, acordose convenes que, se rompidos, corrompem no apenas a qualidadedo texto como apontam-no como um no texto. O texto de jornal emparticular tem uma lgica, uma sequncia, e as caractersticas conhe-cidas como continuidade e progresso (nomenclatura tpica da Lin-gustica Textual) so importantes aliadas na leitura em sala de aula.Quem trabalha gramtica, por exemplo, pode se servir dos textos de jornais, que invariavelmente utilizam uma linguagem no erudita,mas via de regra em concordncia com a norma culta. At mesmo er-ros e deslizes podem ser questionados em sala, sendo o texto do jornalum bom exerccio de pontuao. Curto e objetivo, ele pode treinar a

    ordem direta do portugus e a dura lida com o ponto e a vrgula. Em

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    resumo, o texto em sua formalidade pode ser usado como mecanis-mo de difuso da norma culta, que o aluno precisa dominar to bem

    quanto as demaislnguasque utiliza em seu dia a dia.Invariavelmente, o mais complexo na leitura de um texto a questodiscursiva: descobrir e explicar o que atravessa o texto ao nvel dosdiscursos. Nenhum texto neutro, nenhum texto vazio ou opaco,pois o texto o resultado (em sentido exposto por Mikhail Bakhtin)de uma interao entre sujeitos. Quem escreve em um jornal, como j dito, escreve de um lugar fsico e de um lugar cultural e o faz emrelao a outrem: o leitor. Este leitor est na imaginao do jornalista(ou do escritor, dramaturgo, publicitrio,designer gr co) e o conte-do da escrita o resultado das referncias de quem escreve sempreem relao a quem l. Para Bakhtin, haveria como que trs sujeitos noato da escrita: a) quem escreve, que uma conscincia em particular;b) quem l, ou seja, para quem direcionada a escrita; c) outras vozes,que esto amalgamadas ao que se escreve, e que existem antes do

    texto. No sendo possvel investigar as intenes verdadeiras, con-cretas, de nitivas e acabadas de quem escreve, podemos investigarpossibilidades. No sendo possvel descrever verdadeiramente asintenes de quem escreve, podemos inferir, tirar concluses, fazer,ento, uma leitura.

    Penso que a leitura em sala de aula possa ser uma aventura acadmi-ca e uma aventura que leve os alunos a lugares no antes visitados,mas desde que a leitura entre como processo que impea a difuso dopreconceito, abra portas para novos mundos, exercite a capacidade deentendimento das coisas do mundo, aumente a capacidade de inves-tigao e faa crescer o interesse por leituras mais profundas e menoscomerciais e vazias.

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    Para saber maisBACHELARD, Gaston. A potica do espao. So Paulo: Martins Fontes,2008.

    BAKHTIN, Mikhail.Marxismo e loso a da linguagem . Traduo deMichel Lahud e Yara Frateschi Vieira. So Paulo: Hucitec, 1999.

    BARTHES, Roland.O prazer do texto. Traduo de J. Guinsburg. SoPaulo: Perspectiva, 1996.

    BOURRIAUD, Nicolas.Ps-produo como a arte reprograma omundo contemporneo. Traduo de Denise Bottmann. So Paulo:Martins Fontes, 2009.

    CALVET, Louis-Jean.Sociolingustica uma introduo crtica. Tra-

    duo de Marcos Marciolino. So Paulo: Parbola, 2002.

    CAUQUELIN, Anne. Arte contempornea uma introduo. Tradu-o de Rejane Janowitzer. So Paulo: Martins Fontes, 2005.

    DAMSIO, Antnio.O mistrio da conscincia. Traduo de Laura Tei-xeira Motta. So Paulo: Companhia das Letras, 2000.

    ECO, Umberto.Lector in fabula a cooperao interpretativa nostextos narrativos. Traduo de Atlio Cancian. So Paulo: Perspetiva,1986.

    _____.Seis passeios pelos bosques da co . Traduo de HildegardFeist. So Paulo: Companhia das Letras, 1994.

    FOUCAULT, Michel. A arqueologia do saber. Traduo de Luiz FelipeBaeta Neves. Rio de Janeiro: Forense, 2000.

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    _____. A ordem do discurso. Traduo de Laura Fraga de AlmeidaSampaio. So Paulo, Loyola, 1996.

    _____.O que um autor?Traduo de Antnio Fernando Cascais eEduardo Cordeiro. Alpiara: Passagens, 2000.

    JOUVE, Vincent. A leitura. Traduo de Brigitte Hervot. So Paulo:UNESP, 2002.

    LVY, Pierre.O que o virtual?Traduo de Paulo Neves. So Paulo:Ed. 34, 2004.

    MANGUEL, Alberto.Uma histria da leitura. Traduo de Pedro MaiaSoares. So Paulo: Companhia das Letras, 1997.

    VAL, Maria da Graa Costa.Redao e textualidade. So Paulo: Mar-tins Fontes, 1999.

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    Adolescentes Editoresde JornalProfessora:Adriana MargareteRolim da Silva GonalvesInstituio:Unidade de EducaoIntegral AbranchesCidade:Curitiba

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    Apresentar o conhecimento de maneira diferenciada e divertida aomesmo tempo que mantm a coeso e a disciplina necessrias emuma classe. com essa preocupao que a professora Adriana Mar-garete Rolim da Silva Gonalves, que atua no contraturno da Unidadede Educao Integral Abranches (antigo Pi), prepara suas aulas. Umexerccio que a leva, por consequncia, a repensar constantemente asua didtica e ainda exercitar a criatividade. E tudo isso para conse-guir traduzir os contedos para a linguagem dos alunos, tornando-osatraentes ao ponto de favorecer a apropriao da informao e a cons-truo do conhecimento.

    A proposta arrojada e faz com que Adriana exera mltiplas funessimultaneamente. Alm de professora, ela tambm vira um pouco me,psicloga e amiga... Trabalho que vai muito alm do contrato para daraulas, mas nada que assuste tanto que a faa desistir, porque quantomais se aproxima dos alunos mais consegue ateno e respeito deles,obtendo melhores resultados nas atividades que desenvolve.

    Nesse processo em constante evoluo, o uso do jornal em sala deaula teve um importante papel. Segundo Adriana, leituras e pesquisascom jornal oferecem ao professor uma excelente oportunidade de pro-

    mover aulas diferentes, instigantes e interativas. Aulas que aceleramo processo cognitivo, favorecem a apropriao dos conhecimentos es-colares e a comunicao transversal.

    Na experincia que vem realizando, Adriana a rma que o destaqueca para a proposta de elaborao de um fanzine(publicao feitacom recortes, colagens e jornalismo instintivo). Segundo ela, essa pro-duo a levou a aproximar-se ainda mais os seus alunos, entendendo

    os interesses e universos pessoais deles.

    O trabalho escolar um equilbrio entre o esforoe o prazer, instruo e diverso, educao e vida.

    Paulo Almeida

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    A proposta exige uma maior aproximao com o grupo e, enquanto issoocorre, Adriana ouve relatos, dvidas, crticas e o que os estudantes pen-sam sobre cada assunto. Isso me permite dialogar com o aluno, conhe-c-lo melhor. Aos poucos vou descobrindo que um adolescente, que sesente incompreendido e margem da sociedade, pode se tornar um su- jeito que reconhece suas capacidades intelectuais, afetivas e cognitivas,consciente de sua responsabilidade para consigo e com seus pares.

    Mas, segundo ela, para conseguir tais resultados o professor precisa es-tar disposto a ser um aprendiz em tempo integral. No d para repetir

    velhas frmulas. preciso conhecer a linguagem e as expectativas dos jovens para poder conquist-los e deles conseguir o melhor.

    A receita tem dado certo. Orgulhosa, Adriana todos os anos v seus alunossendo premiados em feiras de redao, concursos de frases e de poesias.

    A prtica

    O fanzineQuem Somos, nome escolhido pelos alunos, mostra omundo da adolescncia de forma divertida e em linguagem ade-quada percepo do grupo.

    Publicao semanal coletiva de baixo custo, o fanzinefavorece aintegrao e motiva os alunos prtica de leitura e pesquisa.

    Seu contedo re ete o universo adolescente, com seus questiona-mentos e certezas, seus gostos musicais e literrios, alm de publi-car depoimentos sobre o cotidiano e ainda um apanhado retrospec-tivo sobre o que ocorreu na semana anterior.

    A publicao tambm prev a edio de reportagem relacionada disciplina de Histria Mundial, com comentrios dos jovens sobreaquilo que entenderam, suas pesquisas e consideraes.

    Captulo 5 - Leitura Signifcativa e Contextualizada

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    Ler chique

    Um resultado social do projeto com jornal a va-lorizao dos alunos, pois muitos deles no tmnenhuma outra condio de acesso ao meio de co-municao.

    Por ser um veculo que precisa ser comprado, osalunos acham chique ler jornal, e isso aumenta

    sua autoestima. Alm disso, como tm oportuni-dade de ler mais aprofundadamente sobre deter-minadas notcias, passam a levar as informaespara casa, ampliando e quali cando o dilogo coma famlia. Estar por dentro os faz sentir importan-tes e aptos a dialogar com outras pessoas.

    A prtica de ler ajuda principalmente a vencer oobstculo da leitura super cial ou ine caz, na qualo aluno decodi ca as letras e frases, mas no com-preende o contedo daquilo que est lendo.

    Segundo Adriana, o jornal facilita a transposiodessa di culdade e favorece a aquisio de com-petncias importantes, como escrever melhor, usar

    o dicionrio como fonte de pesquisa, para no re-petir palavras, e para a substituio de expressesinformais, tpicas dos jovens, por frases elaboradas. grati cante ver os alunos passarem a trocar ex-presses como Eu acho que... por Eu penso que....Percebe-se, Entende-se e expresses como Tipoassim por Semelhante a.

    Eu achei divertidotrabalhar com jornal

    porque, alm de pensar e montar matrias, nosdivertimos e aprende-

    mos coisas que ns nosabamos. As coisas mais

    legais foram: montar um jornal nosso, traba-lhar e pesquisar sobre avida do adolescente, ler

    sobre poltica e desenhar um logotipo para nosso

    fanzine. Allan Bento Ribeiro,12 anos

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    Quebra de paradigmas

    Promover atividades que levem o estudante a pesquisar, questionare a criticar pressupostos e paradigmas , segundo Adriana, o grandesegredo do sucesso de suas aulas com adolescentes, pois nessa faixaetria todos querem ser ouvidos e desa ar modelos preestabelecidos.

    Jovem normalmente fala pouco, escreve pouco, mas pensa muito.Nesse universo, o fanzinesurge como uma vlvula de escape. ado-

    lescente escrevendo para adolescente, sem medo de expressar-se. Eisso tem impacto na atitude de todos.

    Segundo a professora, alunos que tinham medo de falar porque acha- vam que no tinham assunto mudaram o comportamento a partirdo fanzine. Agora eles dialogam e se posicionam de outra maneira,at porque precisam de nir e pesquisar sobre o que vai ser publicadono jornal. Outra evoluo percebida a qualidade textual dos alu-nos, que cam mais exigentes e percebem quando falta pontuao, vrgulas e existe repetio de termos. En m, demonstram empenhoconstante em fazer um bom jornal e em transpor para o papel o queentenderam sobre o assunto a m de serem compreendidos pelosleitores.

    Captulo 5 - Leitura Signifcativa e Contextualizada

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    De olho no futuro

    Adriana no descuida da aprendizagem formale de exigir o uso da linguagem padro. Escla-reo que embora o que mais eles usem sejam ainternet e o telefone celular onde as palavras eexpresses podem ser cortadas esses meios noso referncias no uso da linguagem formal. E sequiserem vencer na vida, vo precisar continuar

    estudando e aprender a gostar de ler, expressar-se e escrever corretamente. Falo sempre que a lin-guagem padro muito importante em situaescomo uma entrevista de emprego, no vestibularou concursos.

    Para estimular o aprendizado da linguagem pa-dro, Adriana promove o acesso no s leiturade jornal como tambm a dos livros. O interesseaumentou tanto que a classe ganhou uma mini-biblioteca. Quando terminamos uma atividade, comum o aluno pedir um livro para ler e ainda temaqueles que passam o recreio lendo algum livro.

    A leitura literria alimenta o crculo virtuoso de

    relacionamento entre a professora e os alunos.Muitos tidos como machistas pedem para ler li- vros de poesia. Eles me surpreendem o tempo todoe isso muito grati cante.

    Trabalhar com jornal fantstico, voc criaa sua prpria matria,com as suas palavras.Conhece novas coisas e

    a linguagem melhoramuito. Utilizar o jornal foi uma experinciamuito boa no meu

    desempenho escolar tambm. Com umaconversa mais culta

    eu posso conseguir um futuro melhor, uma

    carreira melhor. Jssica Teleginski de

    Oliveira, 12 anos

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    tica e cidadania

    Melhor entendimento sobre cidadania, tica, trabalho em equipe erespeito opinio alheia tambm so resultados importantes regis-trado pelo projeto fanzine.

    De acordo com a professora Adriana, trabalhar temas como direitos edeveres, juzo de valor ou limites usando como referncia os conte-dos a serem publicados no jornal faz com que os alunos exercitem a

    democracia e construam referncias importantes. A nal, nem tudo oque os alunos pensam ou querem pode ser publicado at por umaquesto de espao fsico do jornal.

    A discusso dos temas no est explcita no desenho nem faz partedos resultados tangveis do projeto, mas vai aparecendo aos poucos,ao longo do processo, porque os alunos passam a exigir mais de simesmos antes de emitir opinies, debater e defender ideias sobre as-suntos que pretendem publicar.

    Um bom exemplo ocorreu durante a produo do fanzinesobre modae comportamento. A edio exigiu que todos pesquisassem acercade estilos, moda e tribos que se identi cam por determinado tipo deroupa. A partir da, os alunos conseguiram respeitar a diversidade ereduzir seus preconceitos.

    Captulo 5 - Leitura Signifcativa e Contextualizada

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    Professora Adriana e alunos decidem juntos os temas que faro parte do fanzine.

    Produo dos fanzines melhorou a qualidade textual dos alunos e do dilogo em salade aula.

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    Captulo 6Prticas de Leitura naComunicao e na Educao

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    Novas refernciaspara o saberMarlei Gomes da Silva Malinoski

    Os discursos o ciais escolares reforam a ideia de que ler umaquesto de hbito ou gosto, adquirido por vontade individual, inde-pendentemente dos vnculos sociais estabelecidos pelo sujeito. O quedemonstra uma interpretao equivocada, pois no h como inter-pretar uma informao ignorando a forma como essa se processa noindivduo e nas suas relaes com a cultura.

    So as prticas de leitura que favorecero a comunicao e a apro-

    priao de recursos cada vez maiores de compreenso e reelaboraode textos, mas no somente a prtica de ler o escrito e sim expor-sea diversas formas de leituras, prticas reais e delas extrair contextosrelacionados sua forma de comunicao social.

    Se pensarmos na leitura como um fenmeno social por sua vez representado de forma simblica compreenderemos que o hbito deleitura no existe e sim ohabitus do leitor . Esta no uma caractersti-ca inata do indivduo, uma determinao de trocas signi cativas decultura entre pares sociais que, naturalmente, determinaro a percep-o, aceitao ou refutao do lido.

    Para melhor compreender a possibilidade de se realizar trocas signi ca-tivas de cultura no ato de ler, exempli caremos com a leitura do jornal,no pressupondo apenas o carter informacional do mesmo e sim abor-

    dando a potencialidade de troca cultural encontrada em suas pginas.

    Captulo 6 - Prticas de Leitura na Comunicao e na Educao

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    No jornal observamos que a leitura se torna um processo de apropria-o do conhecimento, pois obedece s mesmas leis de outras prticas

    culturais, ou seja, organizao, seleo, critrio, associao cultural einformao.

    A organizao parte do conhecimento do indivduo sobre a estruturaapresentada no texto lido e assim dela extrair a informao. Assim,comunicao de um conto e de uma crnica, ou de uma notcia e deum classi cado se dar quanto melhor o indivduo puder interagircom sua estrutura e assim perceber a organizao da informaocomunicada.

    A seleo est diretamente relacionada organizao, uma vez conhe-cendo a organizao do veculo comunicativo o leitor poder buscar ainformao desejada e comprovar ou refutar ideias, relacionando-ascom outras informaes selecionadas.

    A capacidade de relacionar informaes confere ao leitor possibili-dade de estabelecer um critrio de con abilidade da informao, uma vez que poder checar a articulao da informao selecionada.

    Mas ser a capacidade de associar a informao com o universo cul-tural do leitor, que possibilitar a efetivao da comunicao entre ainteno do produtor da informao, o lido e o leitor. Pois no h como

    interpretar uma informao, ignorando a forma como essa se proces-sa no indivduo e nas suas relaes sociais. O veculo de comunicao jornal organiza prticas sociais de elaboraes culturais, que partemdesde a seleo por cadernos, sesso e notcia at a construo de re-laes da informao com o universo social do leitor. Ler uma formade pensar o mundo com base nas nossas escolhas e descortinada pelanossa forma de atribuir cultura e informao ao carter comunicativada mensagem.

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    O carter comunicativo da mensagem sugere, assim, um repensar so-bre a leitura. Enfatizando um olhar sobre a cultura presente no ato de

    ler, ser que o dito fracasso escolar nas prticas de leitura e escrita noestaria justamente nas formas de representao do sentido da leituradado pelas prticas educacionais e a didatizao do lido?

    Ao se considerar que a ideia principal, o resumo e a sntese se constro-em no processo da leitura e so produtos da interao entre os pro-psitos que causam, o conhecimento prvio do leitor e a informaoaportada pelo texto, consideraremos que a leitura se realiza, ento, naconvergncia do texto com o leitor. O discurso escrito tem, forosa-mente, um carter virtual e poltico, pois no pode ser reduzido nem realidade do texto, nem s disposies caracterizadoras do leitor.Poltico, sim, pois o ato de ler s se efetiva quando houver um encon-tro entre leitor e texto. E as ideologias que os perpassam na busca dosigni cado, que se edi cam nas formas simblicas estruturadas pelassociedades em tempos e contextos delineados possibilitaro o ler e o

    compreender.

    Ler e compreender so palavras que podem se relacionar a vrias acep-es semnticas, diretamente relacionadas ao pensamento daqueleque as produzir. So palavras, e, antes mesmo de de ni-las, torna-seimportante ressaltar sua implicao como tal. A forma como se pensauma palavra que constri o seu signi cado. No simplesmente ocontedo de uma palavra que se altera diante de um novo signi cado,mas o modo pelo qual a realidade generalizada e re etida em umapalavra.

    Assim, as implicaes do ato de ler, para uma sociedade, esto relacio-nadas s implicaes polticas e compreenso crtica do ato, que nose esgota na decodi cao pura da palavra escrita ou da linguagemescrita, mas que se antecipam e se alongam na inteligncia do mun-

    do. A leitura do mundo precede a leitura da palavra, como j enun-

    Captulo 6 - Prticas de Leitura na Comunicao e na Educao

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    ciado por Paulo Freire: (...) a leitura crtica da realidade, dando-se,num processo de alfabetizao ou no e associada, sobretudo a certas

    prticas, claramente polticas de mobilizao e de organizao, podeconstituir-se num instrumento para o que Gramsci chamaria de aocontra-hegemnica. (FREIRE, 2003).

    De ni-se, ento, uma perspectiva interativa para o ensino da leitura,pautada nas experincias prvias do leitor sobre o lido, que envolve-ro sua compreenso semntica da palavra, abarcando signi cao,decodi cao e estruturas textuais.

    Nossas experincias, como leitores, antecipam nossa leitura, visto queconforme a tipologia textual, nossa familiaridade com o texto e o re-conhecimento do universo discursivo que estabeleceremos relaesleitoras maiores. So nossas familiaridades com textos diversos emmltiplos gneros, que quanto maiores mais ampliaro nossas repre-sentaes sobre o lido.

    Ler passa a ser o processo pelo qual se compreende a lngua escrita.Pois envolve a decodi cao quanto mais signi cativa e familiariza-da, melhor; a inferncia determinada pela proximidade conceitualentre o texto e o leitor e as suposies promovidas por ambas a respei-to do texto. Assim, o leitor quanto mais familiarizado com o texto sercapaz de prever fatos ou at mesmo impor inferncias na ordem quese dar a estrutura textual.

    Para Bourdieu, a leitura pode ser substituda por uma srie de palavrasque designa uma espcie de consumo cultural ou pr-saberes. So es-ses pr-saberes que auxiliam o processo de letramento do indivduo.

    O autor v a linguagem de modo privilegiado na comunicao da so-ciedade. Os grupos sociais se comunicam pela parte comum de seus

    cdigos que ser mais aclarada quanto mais relaes possam fazer.

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    Ou seja, quanto mais suas agncias de letramento se entrecruzem emum momento de signi cao e interveno.

    Os pr-saberes so importantes porque, conforme Bakhtin (2001) nose pode observar apenas a natureza do enunciado lingustico, uma vez que observar-se-ia mero formalismo e no o vnculo forte entrelngua e vida. Existe a necessidade de interao com o verbal, e a com-preenso leitora deve privilegiar a natureza do ato leitor.

    A palavra torna-se, segundo Iser (1996) e Bakhtin (2000), o cdigo co-mum que assegura a recepo de uma determinada mensagem. Po-rm, o cdigo s constitui o texto quando se estabelece, em potencialcognitivo, o sentido da obra. Ento, o ato de ler se relaciona com aconscincia sobre o lido e a conscincia estabelecida ao se escrever. o encontro de duas necessidades, a de conhecer e a de se registrar.H tambm o encontro ideolgico, pois a inferncia de uma palavradentro de uma mensagem depende da caracterizao da mensagem

    no contexto qual pertence, em que inferir signi ca concluir um sig-ni cado pertinente a um conceito.

    Com base em um ensino de leitura descendente, em que se privilegieo universo cultural do aluno, Colomer e Camps (2002) sugerem algu-mas condies para o ensino produtivo e signi cativo.

    Primeiro fundamental partir do que os alunos sabeme ter conscinciade que a escolarizao permite ampliar experincias sobre o mundo eno reduzi-las. Lembrar que a escrita uma modalidade de comuni-cao (abstrata) que deve ser interpretada como tal, no substitui amodalidade oral, mas se agrega a conhecimentos prvios. Dessa for-ma, no o texto que tem sentido e sim as inferncias do leitor sobre otexto. No o que o texto quis dizer, pois esse mudo, e sim o que oleitor depreende de informao, relacionada ao seu contexto, do texto.

    o que o leitor tem a dizer sobre o texto.

    Captulo 6 - Prticas de Leitura na Comunicao e na Educao

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    Em um segundo momento, deve-se favorecer a comunicao multir-referencial. A linguagem escrita deve ser descortinada em sua poten-

    cialidade simblica. Por isso as produes devem apresentar um uni- verso mltiplo de possibilidades, sejam reais ou imaginativas, ideriosconstrudos apenas pela possibilidade da linguagem. Lembrando quea linguagem uma construo social e sua interpretao comunicati- va depender das interpretaes do leitor.

    No terceiro momento, familiarizar os alunos com a escrita e criar umarelao positiva com o escrito: no representamos a escrita reduzidaa um universo apenas de gnero ou tipo. No lemos um texto jorna-lstico da mesma forma que lemos um romance e nem como lemosum poema. A leitura de cada um exige uma estratgia e requer doleitor um nmero de estruturas e processos diferenciados. A crianadeve estabelecer uma relao afetiva com o texto escrito e de formaa reconhec-lo em diversos gneros e veculos. Alm de reconhec-lo,deve experiment-lo em situaes de publicao (compreender a pa-

    lavra publicao como tornar pblico social integrado a prticasde comunicao).

    Em um quarto momento fomentar a conscincia metalingustica, noesquecendo que o ato de ler se trata de um processo, que inicia nacompreenso do cdigo e suas regras e estruturas, ento ler com-preender regras e estruturas, que tambm so acordos sociais paraestabelecer a melhor forma de comunicabilidade. A criana deve reco-nhecer as micro e as macroestruturas de um texto, ou seja, da slaba frase, e como essa se contextualiza e signi ca em um universo estru-turado de texto.

    O quinto momento est em utilizar textos concebidos para a sua leitu-ra e no montados para aferir capacidade de decodi cao e locali-zao de ideias desconexas. Lembrar que ler uma prtica social, por

    isso no devemos simular ambientes ou veculos de leitura. A leitura

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    se distancia de prticas orais medida que se estrutura como uma for-ma simblica e complexa. Adaptar textos restringir a potencialidade

    leitora do indivduo.No sexto momento oferecer experincias com textos e leituras diver-sos, independentes da idade e sim relacionados maturidade do leitor.O cialmente aprendemos a ler da mesma maneira, porm o ato de lerrequer conhecimentos e prticas lingusticas diversos. No lemos umromance da mesma forma que um poema, ou da mesma forma quebuscamos uma palavra em um dicionrio, como j foi dito, mas nos-sas experincias em simples aes como essas dependero do quantoessas prticas se relacionaram em nosso cotidiano.

    O stimo momento est mais para um alerta, pois devemos compre-ender que ler no signi ca oralizar e sim interagir e agir. A leitura no um ato isolado ou uma tcnica de avaliao qualitativa ou quanti-tativa da aprendizagem do ler. Ler pode e deve ser uma forma de apro-

    priar-se de um determinado conhecimento, que no signi ca oraliz-lo literalmente. Mas agir sobre ele em um contexto de comunicao,que pode ser at a compreenso de outras leituras. Por isso, a leituraem voz alta deve ir alm da capacidade decodi cadora do leitor; deveexpor sua compreenso leitora, que ser percebida na interao dessecom o texto, ao se presenciar as pontuaes expressivas como elemen-to de compreenso e indagao sobre o lido.

    Assim, a escolarizao deve fornecer aos alunos um mbito de alfa-betizao para o letramento con gurado por contextos signi cativosde aprendizagem, funcionais e relevantes, que ofeream experinciasorganizadas que fundamentem a vivncia da leitura.

    A informao, trazida pela leitura, deve estar relacionada contex-tualizao, o que requer uma seletividade do leitor, que est baseada

    na qualidade e na utilidade do material apresentado como elemento

    Captulo 6 - Prticas de Leitura na Comunicao e na Educao

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    passvel de comunicabilidade. O ensino deve inserir elementos novos forma de linguagem que o aluno j possui, acomodando e expandindo

    seu conhecimento a respeito da sua forma de percepo das varianteslingusticas e discursivas apresentadas pelo texto.

    O ensino da leitura e da compreenso busca desenvolver a autonomiado sujeito, para que ele seja capaz de construir conceitos pertinentesao texto lido e assim tornar-se capaz de elaborar a crtica. Dentro deuma possibilidade abrangente do dilogo, capaz de inferir mensa-gem conhecimento, habilidades, valores e atitudes diante da mensa-gem decodi cada e do contexto da linguagem, possibilitando a efeti- vao da comunicao entre os sujeitos e a emancipao da cultura edo compreender o escrito.

    Ao compreender o escrito o homem consegue ordenar sua histria,que se torna linear e cronolgica. O conhecimento passa a poder sersistematizado, racionalizado. O ato de compreender o lido passa a ser

    uma tecnologia intelectual que teria um papel fundamental no esta-belecimento de novas referncias para a constituio do saber.

    A leitura na escola deve ser percebida como um meio de realizao daaprendizagem e no como um objeto do conhecimento. O texto, e neleo literrio, passa a ser uma forma de ser do homem no mundo, umposicionamento leitor. Retomando o termo utilizado por Jouve (2002),a relao do leitor com o texto no um epifenmeno. No h mgicaou divindade, o que existe um trabalho de signi cao.

    Ler est relacionado s inferncias que o texto produz para e no leitor;identi car apenas um dos processos da leitura, que no abrangeo seu todo, caracteriza-se como ferramenta inicial, que sozinha, des- vinculada do contexto social e das inferncias produzidas pelo leitor,torna-se um ato vazio.

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    Para saber maisBAGNO, Marcos.Lngua Materna: Letramento, variao e ensino / Marcos Bagno, Gilles Gagn, Michael Stubbs. So Paulo: Parbola Edi-torial, 2002.

    BAKHTIN, Mikhail (Volochinov).Marxismo e Filoso a da Linguagem .So Paulo: HUCITEC, 2002.

    BAKHTIN, Mikhail.Esttica da criao verbal. 2. ed. So Paulo: Mar-tins Fontes, 2001.

    BAKHTIN, Mikhail.Questes de literatura e de esttica: a teoria doromance. 5. ed. So Paulo: Annablume, 2002.

    BOURDIEU, Pierre.Economia das trocas simblicas: introduo

    organizao e seleoSergio Miceli. 5. ed. So Paulo: Perspectiva,2007.

    BOURDIEU, Pierre; PAIRE, Alain; CHARTIER, Roger.Prticas da leitura.2. ed. So Paulo: Estao Liberdade, 2001.

    BRITTO, Luiz Percival Leme.A Sombra do Caos: Ensino de Lngua X Tradio Gramatical. Campinas. Mercado das Letras. Associao de

    Leitura do Brasil. Coleo Leituras no Brasil. 2004.COLOMER, Teresa; CAMPS, Anna. Ensinar a ler, ensinar a compreen-der. Porto Alegre: Artmed, 2002.

    FREIRE, Paulo. A Importncia do Ato de Ler: em trs artigos que secompletam. So Paulo. Cortez, 2003 a.

    Captulo 6 - Prticas de Leitura na Comunicao e na Educao

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    GERALDI, Joo Wanderley (org.).O Texto na Sala de Aula. So Paulo:tica, 2002.

    GERALDI, Joo Wanderley.Portos de Passagem. So Paulo: MartinsFontes, 2000.

    ISER, Wolfgang.O ato da Leitura: uma teoria do efeito esttico.Trad. Joannes Kretschmer So Paulo: Ed. 34, 1996.

    JOUVE, Vincente.A leitura. So Paulo: UNESP, 2002.

    KLEIMAN, ngela B. (org.).Os Signi cados do Letramento . So Paulo:Mercado das Letras, 2001.

    MAGNANI, Maria do Rosrio.Leitura, Literatura e Escola. So Paulo:Martins Fontes, 1989.

    MESERANI, S.O intertexto Escolar: sobre leitura, aula e redao.So Paulo: Cortez, 1998.

    SOL, Isabel.Estratgias de leitura. 6. ed. Porto Alegre: Artmed,1998. VYGOTSKY, Lev Semenovich.Pensamento e Linguagem. So Paulo:Martins Fontes, 2000.

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    Por um mundomenos desigualProfessora:Mary Lucia MedeirosBaldanaInstituio:Unidade de EducaoIntegral Dr. Osvaldo CruzCidade:Curitiba

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    Formar cidados crticos e contribuir para um mundo menos desigual o desa o que Mary Lucia Medeiros Baldana criou para si mesma e,embora seja gigante, ela garante que registra resultados efetivos.

    Professora e coordenadora da Unidade de Educao Integral Contratur-

    no Dr. Osvaldo Cruz, em Curitiba, Mary Lucia explica e justi ca o desa ono per l de seus alunos. Oriundos, em sua grande maioria, de famliasde baixa renda e escolaridade, que residem em reas de ocupao irre-gular e tm renda proveniente do trabalho na construo civil ou nareciclagem de materiais, as crianas apresentam di culdade de apren-dizagem e so acompanhadas por programas sociais do governo.

    Consciente da necessidade de oferecer apoio pedaggico e social aosalunos da sua turma, desde 2009 a professora Mary Lucia vem incor-porando o jornal no planejamento de suas aulas, mas a atividade no novidade na escola, que recebe e trabalha com o jornal desde 2003.

    Uma das iniciativas que mais deram resultado na classe foi a produ-o de um jornal gigante, que levou os alunos a apresentarem umagrande evoluo quanto ao apreo pela leitura, ampliao do vocabu-lrio, melhora na produo escrita, interpretao de textos e, claro,comportamento cidado. Eles aprendem a posicionar-se, exercitama re exo, problematizam as questes da sociedade e demonstrammuito interesse em melhorar de vida. E sabem que para isso tero decontinuar estudando, diz a orgulhosa professora.

    Tantos avanos transformaram Mary Lucia numa apaixonada por jor-

    nal. Atualmente na funo de coordenadora, ela mobiliza e organiza

    Num tempo em que a esperana parece cadavez mais escassa, fundamental reavivar nossa

    con ana em dias melhores.

    Gabriel Chalita

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    Abrir a sala para o mundo

    Educar para cidadania contribuir para a construo de um mundomelhor. E a professora Mary Lucia destaca os trs principais impac-tos percebidos ao longo do desenvolvimento do projeto com jornal:maior autonomia, maior criticidade e melhoria na linguagem oral eescrita. A autonomia das crianas, explica ela, adquirida durante asatividades, que normalmente exigem deciso sobre o qu e quandoler. J a criticidade vai sendo construda aos poucos, medida que

    a criana se familiariza com a leitura e discute com os colegas. Aospoucos eles vo descobrindo a funo social do jornal, que contribuirefetivamente para a formao de sujeitos que re itam e proponhamencaminhamentos para as problemticas locais e do mundo. Atuandoresponsavelmente na realidade em que vive.

    J os impactos sobre a linguagem oral e escrita aparecem como conse-quncia direta da leitura. Tanto a hemeroteca quanto o Jornal Gigantee outras atividades com o jornal que realizamos podem e devem serrepetidos, para que os alunos possam avanar em todos os aspectos eobjetivos do projeto: autonomia, criticidade e crescimento na lingua-gem oral e escrita.

    Captulo 6 - Prticas de Leitura na Comunicao e na Educao

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    Uma nova realidade

    A professora lembra que, assim como o jornal,outros meios de comunicao atendem hoje necessidade de criar novas formas de organizar etransmitir o conhecimento. A nal, lembra ela, osalunos diariamente esto sendo impactados pelosmeios de comunicao e tecnologias. Eles, porexemplo, vivem recebendo e enviando textos pelo

    celular. O celular os conecta com o mundo. Diantede coisas como essas, no d para dar aulas exa-tamente como antes da revoluo tecnolgica.

    Mary Lucia acredita que os professores que estohoje exercendo o magistrio precisam car atentos evoluo do modelo, comportamentos e estrutu-ra social, porque s assim vo garantir a efetivida-de do seu trabalho. E isso exige leitura, aprendertodo o dia, investir na formao continuada, e terhumildade para avaliar seu trabalho e mudar sem-pre que necessrio.

    Em todas as pro sses, as pessoas so perma-nentemente exigidas em aperfeioamento e