LIVRO-FORMAÇÃO-DE-PROFESSORES-CONCEPÇÕES-E-PRÁTICAS-2006.pdf

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Formao de Professores: Concepes e Prticas em Geografa 2006by Lana de Souza CavalcantiDireitos de publicao reservados :Editora VieiraAv. Universitria, 754, sala 9 - Setor UniversitrioCEP: 74605-010 - Goinia - GoisFone/Fax:(62)3218-6292 / 3218-5652E-mail: [email protected]: Lana de Souza CavalcantiProjeto grfco e editorao eletrnica: Diogo Nepomuceno MendesCapa: Anderson Novais deFreitasReviso: Augusto Rodrigues da Silva Junior e Tarsilla Couto de BritoDados Internacionais de Catalogao na Publicao (CIP)Impresso no BrasilPrinted in Brazil2006Formao de professores : concepes e prticas em Geografa / Dalva E. Gonalves Rosa ... [et al.] Goinia : E. V., 2006.151 p.Inclui referncias bibliogrfcas1.Formao profssional Professor - Geografa. 2. Formao de professor - Geografa. 3. Rosa, Dalva E. Gonalves. I. Titulo.CDU 377.8 : 91ndice para catlogo sistemtico1.Formao profssional Professor - Geografa...... 377.8 : 912. Formao de professor - Geografa....................... 377.8 : 91SumrioFormao de Professores: concepes e prticasDalva E. Gonalves Rosa ..................................................... 15Bases Terico-Metodolgicas da Geografa: uma referncia para a formao e a prtica de ensinoLana de Souza Cavalcanti .................................................... 27Estado-nao, Ensino de Geografa, Mundializao: alguns desafos para a formao do professorVnia Rubia Farias Vlach ..................................................... 51Concepes de Prtica de Ensino e Formao de Professores de Geografa Vanilton Camilo de SouzaBeatriz Aparecida Zanatta .................................................... 67Dilemas da Formao do Professor de Geografa no Ensino SuperiorAntonio Carlos Pinheiro ....................................................... 91A Atividade Docente de Egressos da Licenciatura em Geografa: o fazer-se trabalhador-professorEdna Duarte de Souza ....................................................... 109Educao em Valores no Contexto Universitriongela Dantas F. Santos ................................................... 123O Nepeg no Contexto da Produo Sobre o Ensino de GeografaDominga Correia Pedroso MoraesLoandra Borges de Moraes ............................................... 137Sobre os Autoresngela Dantas F SantosMestre em Cincias da educao superior pela Universidade de Ha-vana. Professora do Curso de Geografa da Universidade Catlica de Gois (UCG). E-mail: [email protected] Carlos PinheiroDoutoremGeografapelaUniversidadeEstadualdeCampinas-SP. Professor do Curso de Geografa da Universidade Federal de Gois. E-mail: [email protected] Beatriz Aparecida ZanattaDoutora em Educao pela Universidade Estadual de So Paulo-Marlia. Professora do Curso de Geografa da Universidade Catlica de Gois. E-mail: [email protected] E. Gonalves RosaDoutora em Educao pela Universidade Metodista de Piracicaba, SP. Professora do Curso de Pedagogia da Universidade Federal de Gois. E-mail: [email protected] Correia Pedroso MoraesMestre em Geografa pela Universidade Federal de Gois. Professo-ra do Curso de Geografa da Universidade Estadual de Gois-UEG, Unidade Cora Coralina/Cidade de Gois.E-mail: [email protected] Duarte de SouzaMestre em Cincias da educao superior pela UFG. Professora do Curso de Pedagogia da Universidade Estadual de Gois-UEG, Uni-dade de Anpolis.E-mail: [email protected] de Souza CavalcantiDoutora em Geografa pela Universidade de So Paulo. Professora do Curso de Geografa da Universidade Federal de Gois. Coordenadora do NEPEG. E-mail: [email protected] Borges de Moraes Mestre em Geografa pela Universidade Federal de Gois. Professora dosCursosdeGeografadaUniversidadeEstadualdeGois-UEG, Unidade de Anpolis e da Universidade Catlica de Gois.E-mail: [email protected] Rubia Farias VlachDoutora em Geografa pela Universit Paris VIII, Paris. Professora do Instituto de Geografa da Universidade Federal de Uberlndia-UFU . E-mail: [email protected] Camilo de SouzaMestre em Educao pela Universidade Federal de Minas Gerais. Pro-fessor dos Cursos de Geografa da Universidade Catlica de Gois e da Universidade Estadual de Gois Unidade Cora Coralina/Cidade de Gois. Coordenador Executivo do NEPEG.E-mail: [email protected] de Professores: Concepes e Prticas em Geografa7ApresentaoA grande movimentao dos ltimos tempos em torno da te-mtica da formao de professores, provocada seja pelas polticas pblicas na rea da educao, seja pela grande produo terica so-bre o tema no mbito da pesquisa acadmica, seja pelo debate nos espaos de encontros de pesquisadores, professores e assessores dasinstituiesresponsveispelaformao,evidenciamsuarele-vncia, sua complexidade e, ao mesmo tempo, a urgncia de altera-es necessrias para essa formao. Por um lado, as orientaes traduzidas em diretrizes nacionais e/ou locais e em projetos poltico-pedaggicos dos diferentes cursos de Licenciatura; por outro, as in-dicaes resultantes de estudos sobre a prtica e saberes docentes, sobre a vida de professores e os componentes de sua formao. De toda essa contribuio, parece sobressair o pressuposto dequenosepodemaispensarnaformaodoprofessornos moldestradicionalmenteaceitos,queseparadeformaestanque os processos formativos do bacharel e do licenciado, os processos de ensinar e de produzir conhecimentos, os processos de pensar o conhecimento e os de lev-lo prtica. Falando de outro modo, as orientaes atuais apontam na direo de se tomar como princpios da formao profssional: a integrao ensino e pesquisa, teoria e prtica,tcnicaepoltica;ainterdisciplinaridade;aconsiderao dos diferentes espaos dos processos de aprender a ser professor o espao da vida cotidiana, o espao da formao acadmica inicial e continuada, o espao da escola e de suas relaes. No contexto de produo dessas orientaes de carter mais geral para a formao do professor e das atuais normativas legais especfcassobreoscursosdeLicenciatura,houvesignifcativos debates e avanos no interior das instituies de ensino superior do Pas, que resultaram em reformulaes de projetos poltico-pe-daggicosdoscursos.ParticularmenteemGois,ocorreramnos ltimos anos uma reformulao expressiva dos projetos de forma-o do professor, de Geografa especifcamente, no mbito das se-guintes IES: Universidade Federal de Gois, Universidade Catlica de Gois, Universidade Estadual de Gois. Formao de Professores: Concepes e Prticas em Geografa8Embora se saiba que essa reformulao foi realizada tendo como parmetro a legislao atual, a efetivao de um novo projeto de formao do professor de Geografa depende de sua realizao na prtica, o que extrapola o texto dos projetos e abrange desde a prtica cotidiana dos cursos, passa por discusses e explicitaes de concepes a respeito de aspectos desse texto e se consolida com a realizao de processos de acompanhamento e de avaliao abertos e permanentes desses cursos.Essa realizao esbarra, no meu entender, em algumas difculdades muito srias, e que preci-sam ser tomadas como desafos a serem superados, dentre eles, pode-se citar: a defnio clara de uma poltica de formao de pro-fessores no mbito interno das IES; o enfrentamento da discusso pedaggica por parte dos professores especialistas em diferentes contedos da Geografa; a superao da lgica de disciplina e da reproduo de contedos como base da formao no cotidiano do ensinosuperior;oentendimento dosignifcadodeprticascomo componente curricular e do papel do estgio no percurso da forma-o; a integrao efetiva de Instituies de nvel superior com a Es-cola bsica. H caminhos j tomados para lidar com esses e outros desafos. Um deles a realizao de fruns para a refexo sobre a problemtica levantada e para os encaminhamentos decorrentes. Nesse contexto de reformulao de cursos de Licenciatura em Geografa em Gois, cientes das difculdades a enfrentar para sua realizao, professores de Geografa e estudiosos do tema da forma-o profssional, componentes do Ncleo de Estudos e Pesquisa em Educao Geogrfca NEPEG, realizaram, no perodo de 18 a 20 de agosto de 2005, na cidade de Caldas Novas Gois, o II Frum deFormaodeProfessoresdeGeografa,comotema:teoriase prticas na formao docente. Esse frum teve como pblico alvo professores de Prtica de Ensino em Geografa e coordenadores de cursosdelicenciaturaemGeografadasIESdoEstadodeGois, pesquisadores do ensino de Geografa, bolsistas de iniciao cien-tfca e alunos de ps-graduao, ligados ao tema. Seu objetivo de debateraformaodoprofessordeGeografanasInstituiesde EnsinoSuperiordoEstadodeGoisfoicontemplado,permitindo como resultados: identifcar teorias educacionais e geogrfcas que orientam a formao do professor de Geografa; perceber concep-eseprticasdeensinopresentesnosProjetosPolticosPeda-ggicosnosatuaiscursosdeformaodeprofessoresemGois; promover discusses sobre a trajetria da Geografa Escolar.Formao de Professores: Concepes e Prticas em Geografa9So algumas das refexes e dos resultados de discusses desseFrumquetenhoasatisfaodelevarapblico,atravs deste livro, com a expectativa de contribuir para o debate e de con-seguir com ele subsidiar avanos nas prticas de formao de pro-fessores de Geografa consoantes com as exigncias deste tempo. O primeiro texto do livro, de Dalva E. Gonalves Rosa, inter-roga o papel da educao e da escola, e mais especifcamente do ensino de Geografa, mediante um quadro de mudanas no mundo, nas esferas da economia, da poltica, da cultura, do trabalho, da sociedade,dacincia.Nessecontexto,reforaaconcepode educao voltada para a construo de uma cidadania consciente e ativa, e a concepo de professor como profssional do ensino que tem como principal tarefa cuidar da aprendizagem dos alunos. Sugere,tambm,comopartedasnovastarefasdaescola,arti-cularosobjetivosconvencionaisconstruodoconhecimento, desenvolvimentodopensamentocrticoecriativo,formaode qualidades morais e ticas s exigncias da sociedade comuni-cacional, informatizada e globalizada: maior competncia refexiva, interao crtica com as mdias e conjuno da escola com outros universos culturais, capacidade de dilogo e comunicao, preser-vao ambiental. Novas tarefas, segundo a autora, igualmente se apresentam para os professores, no sentido de mobilizar saberes da experincia, saberes cientfcos, saberes pessoais e saberes pe-daggicos, para, por exemplo, articular teoria e prtica; aproveitar a experincia anterior do aprendiz; promover aprendizagens signi-fcativas.O texto de Lana de S. Cavalcanti trata da problemtica da investigao no campo da Didtica da Geografa, compreendendo Didticacomoumcampodoconhecimentoqueseocupadare-fexosobreoprocessodeensino,quebuscacompreendersua dinmica,seuselementosconstitutivos,suascondiesdereali-zao, seus contextos e sujeitos envolvidos, seus limites e desa-fos. A compreenso mais ampla e crtica da educao em geral e dos fundamentos tericos e metodolgicos da Geografa escolar, realizada pela teoria didtica, um dos subsdios para a atuao docente consciente e autnoma. No texto, desenvolve o tema dis-cutindoaspectosdomundocontemporneoesuaespacialidade; expondoalgumasidiassobreaGeografaesuapropostapara a leitura da espacialidade contempornea, destacando referncias conceituaisrelevantesparaopensamentoespacial;eabordando Formao de Professores: Concepes e Prticas em Geografa10questessobreotrabalhodocentevoltadoparaaaprendizagem geogrfca, como desdobramento dos temas anteriores. Para expli-citar umpouco mais aorientao metodolgica delineada, traa, tambm, mapeamentos conceituais abertos, dinmicos e articula-dos de alguns dos conceitos geogrfcos mais elementares para o ensino de Geografa.O texto apresentado a seguir de autoria de Vnia Rubia F. Vlach. A autora inicia indagando se a educao clssica, de mbito ecarternacionais,quesurgiuesedesenvolveusobagidedo Estado-nao, nos interessa nos dias de hoje, e tambm questio-nando a situao da Geografa na escola. Para ela, a mundializao indissocivel do lugar, ou dos lugares, de sorte que a especifci-dade de cada lugar deve ser objeto do processo de ensino-apren-dizagem. E, assim, o ensino de Geografa ganha nova signifcncia aotrabalharasescalaslocal,regional,nacional,mundial,esuas inter-relaes. Nesse sentido, as relaes entre a idia de territrio e a lgica da rede, entre a poltica e a tecnologia da informao, entre o Estado e o mercado se enfrentam e se complementam. Su-gere uma estruturao em direo a uma nova escola, em torno dos seguintes princpios: a individualizao do ensino, a comunica-o inter-cultural, e a ao democrtica; e afrma que o ensino de Geografapodecontribuiraestabelecendo,emsaladeaula,um dilogo entre os alunos a partir do lugar da vivncia de cada um.O texto de Antnio Carlos Pinheiro busca discutir a forma-o do professor de Geografa refetindo sobre a atuao e o papel do professor universitrio nesse processo. Para realizar sua anli-se, faz um breve retrospecto da Geografa cientfca no mundo e da formao de professores de Geografa no Brasil. Com base em pesquisas realizadas sob a forma de dissertaes e teses sobre for-mao de professores de Geografa, o autor destaca o problema do distanciamento, na formao acadmica, entre os contedos peda-ggicos, contedos especfcos e a realidade do trabalho docente. Alerta,tambm,paraafaltadearticulao dasdiferentesreas, revelando o pouco interesse da Universidade pelas licenciaturas. A partir da, o autor remete ao movimento recente pela reformulao da formao de professores, apontando crticas a esse movimen-to, sua eventual articulao a um projeto neoliberal, e ao modo como se fez a reforma no mbito das legislaes. No entanto, re-conhece que houve avanos signifcativos nessas reformulaes, apontando uma questo que permanece em aberto: o problema da Formao de Professores: Concepes e Prticas em Geografa11identidade profssional em relao funo docente no ensino su-perior. Com base no atual Projeto Poltico Pedaggico de Geografa do Instituto de Estudos Scio Ambientais da Universidade Federal de Gois (PPP/IESA/UFG), o autor fnaliza o texto desenvolvendo algumas refexes para pensar a prtica docente do professor do Ensino Superior. BeatrizA.ZanattaeVaniltonC.deSousaapresentamem seu artigo um estudo que almeja compreender as concepes de Prtica vigentes nos currculos de formao de professores. Para discutirem essas concepes e seu lugar na formao inicial e con-tinuada de professores de Geografa, tomam por base sua experi-nciaprofssional,osresultadosdeestudosepesquisassobreo temaproduzidosnosltimosanos,bemcomoaliteraturaespe-cfcanarea.Essasbasespermitiramaosautoresidentifcaras seguintesconcepesdePrtica:comolugardoEstgioSuper-visionado; como lugar de relato de experincias dos professores; como lugar de fundamentao terica e conceitual; como conjunto de todas as concepes acima citadas. Para ampliar a refexo so-bre prticas, eles abordam, em especial, a noo de habitus e de saber da experincia como categorias importantes para auxiliar a formao do professor e sua prtica pedaggica.O texto de Edna Duarte de Souza parte de questes como: que pensam os egressos dos cursos de licenciatura acerca da pro-fsso para a qual foram preparados e de sua formao nessas ins-tituies? Qual o seu exerccio profssional ps-graduao? Dadas as condies reais, que aspectos evidenciam um determinado perfl de educao nas instituies de ensino superior? Como ocorreu a preparaodocentenoscursosdasinstituiesdeensinosupe-rior? Com base nessas questes, e em pesquisa por ela realizada cujotemafoiaformaoeaprofssionalizaodocentes,com destaqueparaopapeldadidticanesteprocesso,aautorape nfase na pessoa do professor e no seu fazer-se, na sua histria de vida, assim como a referncia sua identidade como um pro-cesso, construdo nessa histria. Ela relata, assim, resultados de uma investigao sintonizada com o contexto de proposta de mu-danasdaescola,deimplementaodereformaseducativas,de redefnies da formao de professores e desvalorizao social da profsso docente. Possibilita, com isso, uma avaliao dos cursos delicenciaturaemGeografadaUniversidadeEstadualdeGois (UEG),atravsdacaracterizaodosegressosedasrepresenta-Formao de Professores: Concepes e Prticas em Geografa12es que eles fazem dos seus cursos. Mais do que comprovao de hipteses, a pesquisa apresenta, segundo a autora, o delineamento de tendncias e o mapeamento de possibilidades nesse campo de estudo.Otextodengelafaladeumapropostadeformaodo professor que saia de um esquema mais restrito de aquisio de conhecimento para uma concepo que coloque o aluno/profes-sor como sujeito de sua constituio intelectual. Trata-se de um projetoqueassegureaeducaodohomemcomosersociale histrico, consciente e responsvel pelos seus atos. A partir de pressupostosparaumprojetocombasenabuscadecriaoe fomento do valor responsabilidade, a autora aborda propostas de formao profssional para o ensino de Geografa. Este artigo tem o propsito de apresentar algumas consideraes acerca da edu-cao em valores na formao acadmica, mais precisamente so-bre o valor responsabilidade. Com esse propsito, destaca alguns princpios da teoria histrico cultural de L.S.Vigotsky, como eixo norteadorparaaefetivaodeprticasdocentes,emparticular do ensino de Geografa, que contribuam para construo do valor responsabilidade. OtextodeDomingaCorreiaP.MoraeseLoandraBorges de Moraes relata a constituio do Ncleo de Ensino e Pesquisa em EducaoGeogrfca(NEPEG),frutodosanseiosdeumgrupode professoresdetrsInstituiesdeEnsinoSuperiordeGois(IES) Universidade Federal de Gois, Universidade Catlica de Gois e Universidade Estadual de Gois , que trabalham com as disciplinas de Didtica, Prtica de Ensino de Geografa e Estgio Supervisiona-do. Com esse propsito, as autoras discutem sobre a produo so-bre o ensino de Geografa no Brasil e no Estado de Gois, com base empesquisadeTesesdeDoutoradoeDissertaesdeMestrado, nos peridicos da rea da Geografa e em outras publicaes, bus-cando demonstrar a persistncia e ampliao, ainda que com pouca representatividade numrica em relao ao conjunto das temticas tratadas, dessa problemtica nos espaos constitudos. A partir da, apresentam dados sobre o NEPEG, sua constituio e suas ativida-des a partir de 2004, quando foi institudo.Parafnalizaressaapresentao,queroagradeceratodos que de algum modo contriburam para a realizao deste livro, des-tacando os autores dos textos e os membros do NEPEG, professo-res e alunos.Formao de Professores: Concepes e Prticas em Geografa13O desejo o de que a leitura deste livro permita alimentar o debate entre professores de Geografa, favorea o intercmbio de idias entre ns, preocupados com a formao de qualidade, e que seja um convite para integrar-se aos diversos fruns possveis de discusso dessa formao, como nos parece ser o NEPEG.Boa LeituraLana de Souza CavalcantiGoinia, abril de 2006Formao de Professores: concepes e prticas15Formao de Professores: concepes e prticasDalva E. Gonalves Rosa lugar comum dizer que o mundo mudou, que os tempos sooutros.BastalerosjornaisouligaraTvparaseconstatar mudanas: Na economia, percebe-se o aumento do poder fnanceiro dos banqueiros; a formao de blocos econmicos; uma nova estrutura industrial (em vrios pases) disperso geogrfca de produo; a tentativa de superao dos modelos taylorista e fordista.Na poltica, observa-se a perda de fora do Estado-Nao e o fortalecimento das leis do mercado (neoliberalismo). Est em curso no Brasil a Reforma do Estado cujo objetivo a adaptao s novas formas impostas pelo capital. O capital no precisa mais do Estado como parceiro e regulador da economia, por isso essa reforma tem por objetivo redefnir as atividades dessa instituio. OfundamentoideolgicodessaReformapauta-senaidia de que todos os problemas e malefcios econmicos, sociais e po-lticos do pas decorrem da presena do Estado. Logo as solues para os problemas esto na presena das empresas privadas. Em outraspalavras,omercadoportadorderacionalidadesciopo-ltica e agente principal do bem estar da Repblica. Isso signifca a sada do Estado no s do setor de produo para o mercado, como tambm do setor de servios pblicos. Dentre eles a sade e a educao.Na cultura verifca-se a produo de novas tecnologias da co-municao grifes novas identidades sociais. A nova cidadania da culturainformatizadarequeraaquisiodehbitosintelectuaisde simbolizao, de formalizao do conhecimento, de manejo de signos e representaes que utilizam equipamentos computacionais. Exem-plos: 1) automao bancria; 2) carto inteligente; 3) proliferao de computadores pessoais; 4) crescimento de usurios na internet.No trabalho presencia-se a substituio do homem pela tec-nologia; a exigncia de novos saberes profssionais. A abertura de Formao de Professores: concepes e prticas16mercadosgeroumaiorcompetitividadeenecessidadedeacesso de empresas mdias e pequenas a novas tecnologias. Essa com-petitividade vem provocando algumas mudanas na natureza das empresas, por exemplo: 1) busca de novos mercados; 2) reduo daburocracia;3)mudanadefocodocapitalfnanceiroparaos recursos humanos; 4) queda de paredes, confgurando novos am-bientes de trabalho autogerenciados; 5) funcionrios encorajados aagircomcriatividade,iniciativaeimaginao;6)ambientesde trabalho que se transformam em ambientes de aprendizagem. Na sociedade constata-se a concentrao de renda e o de-semprego, agravamento da excluso social (de bens e de conhe-cimento).Na cincia a trade revolucionria microeletrnica, micro-biologia, energia nuclear provoca a crise do paradigma cientfco. Exemplos: 1) a bomba atmica 2) avanos na engenharia gentica; 3)avanosnacinciacognitiva,nacompreensodasestruturas mentais e nos processos de conhecimento. Mediante esse quadro, cabe interrogarmos qual o papel da Educao e da escola? Quais so as infuncias dessas transforma-es para o trabalho pedaggico e para a formao de professo-res? E, mais especifcamente, para a formao de professores de Geografa?NolivroOps-moderno,Lyotard(1988)reforaaidiade que o estatuto do saber altera-se com as transformaes na cincia, na tcnica e na forma de transmisso do conhecimento. Cada vez mais, em todo o mundo, a educao escolar passa a ter papel es-sencial no desenvolvimento das pessoas e da sociedade, a servio de um desenvolvimento scio-cultural e ambiental mais harmonioso. A educao tem sido indicada como um dos elementos essenciais para favorecer as transformaes sociais e fazer recuar a pobreza, a excluso, a submisso e, as opresses de todas as ordens.Asituaoqueseconfgura,emrazodoprocessodein-ternacionalizaodaeconomia,detensesentreinteressesde mercado e de capital e interesses sociais, tem contribudo para a predominncia de valores e sentimentos nada construtivos como o individualismo, a intolerncia, a violncia, o preconceito, que pe em pauta questes ticas complexas, sem respostas prontas nem solues fceis e que trazem grandes desafos educao.Nessecontexto,refora-seaconcepodeeducaovol-tada para a construo de uma cidadania consciente e ativa, que Formao de Professores: concepes e prticas17oferea aos alunos as bases culturais que lhes permitam identifcar e posicionar-se frente s transformaes em curso e incorporar-se na vida produtiva e scio-poltica.Refora-se,tambm,aconcepodeprofessorcomopro-fssional do ensino que tem como principal tarefa cuidar da apren-dizagem dos alunos, respeitada a sua diversidade pessoal, social e cultural, buscando a formao plena (cognitiva, afetiva, social).Com efeito, novas tarefas passam a se colocar escola, no porque seja a nica instncia responsvel pela educao, mas por ser a instituio que desenvolve uma prtica educativa planejada e sistemtica durante um perodo contnuo e extenso na vida das pessoas. E, tambm, porque reconhecida pela sociedade como a instituio da aprendizagem e do contato com o que a humanidade pde produzir como conhecimento, tecnologia, cultura.Cabe, ento, escola assegurar a formao cultural e cientfca para a vida pessoal, profssional e cidad de seus alunos, estabelecen-do uma relao autnoma crtica e construtiva com a cultura em suas vrias manifestaes. seu papel formar cidados participantes em todas as instncias da vida social contempornea. Articular os obje-tivos convencionais: construo do conhecimento, desenvolvimento dopensamentocrticoecriativo,formaodequalidadesmoraise ticas s exigncias da sociedade comunicacional informatizada e glo-balizada: maior competncia refexiva, interao crtica com as mdias e conjuno da escola com outros universos culturais, capacidade de dilogo e comunicao, preservao ambiental.Isso se concretiza por meio de uma formao geral consis-tente,quepossibilitaaoalunoacapacidadedepensarecolocar cientifcamenteosproblemashumanos.Eefetiva-setambmpor meio de uma nova postura tica1, que recoloca os valores humanos de justia, solidariedade, honestidade, reconhecimento das diferen-as e diversidades culturais.Penso que respondemos, ao menos parcialmente primeira questo. Passemos para a segunda: Quais so as infuncias des-sas transformaes para o trabalho pedaggico e para a formao de professores?10 tica uma refexo sobre a moral; moral a conduta dos indivduos (Fontanella, 1997, p. 82). A maneira como o homem se refere ao mundo, a maneira como ele o compreende e interpreta, a maneira como ele nele vive e morre (GAUTHIER, 1998, p. 392), compreende o terreno da tica.Formao de Professores: concepes e prticas18Seastransformaessociaisimplicamemmudanasna educao e na escola, novas tarefas, igualmente, se apresentam para os docentes. Por exemplo, articular teoria e prtica; aproveitar a experincia anterior do aprendiz; promover aprendizagens signi-fcativasquetenhamsentidoparaoestudante;desenvolvero pensamento crtico, propor enfoque e atitude interdisciplinar2, reali-zar ensino com pesquisa. Estes aspectos constituem fundamentos das diretrizes curriculares da maioria dos cursos universitrios. Isso exigedosprofessoresamobilizaodealgunssaberesqueso especfcos da profsso Professor:Saberesdaexperinciaadvindosdavivncia escolarcomoalunos.Produzidosnocotidiano docente, mediatizados pela prtica de outros. Saberes cientfcos Domnio dos conhecimentos especfcos, da cincia [geogrfca] e da disciplina [Geografa]queensina,poisconhecersignifca trabalhar com informaes fltrando-as, analisando-as e contextualizando-as.SaberespessoaisRelacionadosao desenvolvimentointraeinterpessoal,saber relacionar-se, saber comunicar, saber partilhar.SaberespedaggicosConstrudosapartirdas necessidadespedaggicaspostaspeloreal. Distinguemtododacinciaemtododeensino quepermiteoperacionalizarosconhecimentos, considerandoosalunos,oscontextos,eos recursos (Pimenta, 1997).Depreende-se da a natureza do trabalho docente. Esse trabalho no uma atividade burocrtica para a qual se adquire conhecimentos e habilidades tcnico-mecnicas. Sua natureza ensinar como con-tribuio ao processo de humanizao de estudantes historicamente situados. Espera-se que a licenciatura desenvolva nos futuros profs-sionais conhecimentos e habilidades, atitudes e valores que os possi-20 Interdisciplinaridade aqui entendida como enfoque cientfco e pedaggico [que] se esfora por estabelecer um dilogo enriquecedor entre especialistas de diversas reas cientfcas sobre uma determinada temtica (Assmann, 1998, p.162).Formao de Professores: concepes e prticas19bilitem ir construindo seu saber-fazer a partir das necessidades e dos desafos colocados pelo ensino entendido como prtica social. Emoutraspalavras,issosignifcaaconstruodeuma identidade profssional dos professores. A profsso de professor, comoasdemais,emergeemdadocontextoemomentoshist-ricos,comorespostasanecessidadesqueestocolocadaspela sociedade, adquirindo estatuto de legalidade. Estas consideraes apontam para o carter dinmico da profsso docente. Discutidosessesaspectosmaisgeraisdainfunciadas transformaes sociais para o trabalho pedaggico e para a forma-o de professores, cientes, contudo, da parcialidade e incomple-tude da discusso, convido-os a refetirem sobre os impactos das transformaes pelas quais o mundo tem passado para a formao de professores de Geografa.Emboraatemticaquemecabeabordarsejaaformaode professores fundamental lembrar que a formao profssional em Ge-ografa abarca tambma formao do planejador, do tcnico e do pes-quisador. Concordo com Cavalcanti (2002, p.101), quando afrma que no se pode discutir separadamente essas questes, ainda quena prtica a formao se realize em momentos e instncias diferentes. Mediante a re-signifcao da noo de trabalho a ambien-tal (relao que o homem estabelece com o meio) e a econmica (relaes que os homens estabelecem entre si no mbito da produ-o), o deslocamento da esfera da produo para a da circulao e as novas exigncias que se colocam para o trabalho evidencia que as atividades profssionais dessa rea foram ampliadas e tornaram-se mais complexas.Esse contexto demanda do profssional formado em Geogra-fa o desempenho de atividades que antes ele no realizava como, por exemplo: gesto e educao ambiental, estudos de impactos ambientais,geoprocessamentos,consultoriastcnicasempoten-cialidades e explorao de diversos campos que envolvem a rela-o sociedade e natureza. Isso redimensiona os objetivos de ensino de Geografa, pois o contexto atual requer uma conscincia espacial3 a ser construda 30 Compreenso de que o espao contribui para a formao do ser humano e de que oserhumano,pormeiodesuainterveno,deseusgestos,desuasatividades, transformaconstantementeoespao,havendoentrehomemelugarumaao implicada, de unidade.Formao de Professores: concepes e prticas20ao longo da formao humana, quer seja para o exerccio da ativi-dade profssional, quer seja para a prtica da cidadania.Como a universidade e, particularmente, a formao de pro-fessores est moralmente comprometida com a qualidade da for-mao humana cabe a ela romper com as correntes da Geografa tradicional, caracterizada pela estruturao mecnica dos fatos, fe-nmenos, pela descrio, pela enumerao de dados e propiciar o desenvolvimento da capacidade de apreenso da realidade geogr-fca nas suas contradies. Formar raciocnios e concepes mais articulados, ajudar os estudantes a pensarem os fatos e aconteci-mentoscomoconstitudosdedeterminantesmltiplos,mediante vrias possibilidades de leitura. Enfm, prover os instrumentos con-ceituaisemetodolgicosparaqueosestudantespossampensar geografcamente de forma mais abrangente e crtica. Essasdemandasquesocomunsaosprofssionaisforma-dos em Geografa, dentre eles os professores, implicam refexes flosfcas, sociais, polticas, ticas inerentes sua interveno na realidade, seja na pesquisa, no planejamento, na docncia.Dessemodo,podemosconcluirqueastransformaesna sociedade atual colocam em questo a racionalidade que orienta a formao de professores.Transformaes na sociedade atual: repercusses na formao de professoresA prtica de formao de professores no ocorre parte da poltica universitria e da poltica estatal. Portanto, as intervenes que visam democratizar as prticas escolares pretendem, tambm, reorientar as estruturas sociais e institucionais, produzindo meca-nismos de resistncia.Neste sentido, os programas de formao de professores cum-prem um importante papel social, podendo contribuir para a insero dos futuros professores na lgica da ordem social ou para promover a anlise crtica da realidade com o objetivo de torn-la melhor.Hmuitastenseseconfitosqueimpedemareformados programas universitrios de formao de professores. Um deles a supervalorizao do conhecimento disciplinar (domnio da matria) e total desprezo pelas cincias da educao (Educao cincia?), re-presentada pela tradio conservadora, correspondente ao plano aca-Formao de Professores: concepes e prticas21dmico de reforma educacional. Na Perspectiva acadmica, o enfoque a formao de um especialista em uma ou vrias disciplinas, sendo o objetivo principal da formao o domnio do contedo a ensinar.Por outro lado, a tradio radical que se vincula ao movimen-to reconstrucionista social sustenta que as investigaes sobre o ensino, para melhorar a formao do professorado, exigem um en-foquedeformaoquerefitaanaturezacomplexaeincertado trabalho docente.A perspectiva da reconstruo social prope a formao de professores que exeram o ensino como atividade crtica, realizado a partir de princpios ticos, democrticos e favorveis justia so-cial (Prez Gmez, 1992, 1998; Liston e Zeichnner, 1993; Garcia, 1999).Essaperspectivanoseopeaorigoracadmiconem competncia tcnica, na medida em que esse rigor e essa compe-tncia ampliem a viso de mundo, pois, objetivam o benefcio da escolarizao compartilhado por todos.Umdosaspectoscentraisdessatradioapreocupao com a melhora das condies educativas das camadas populares. Espera-se que o fracasso escolar e a desesperana das crianas, dosjovensedosadultospossamserminimizadosmediantepro-gramasdeformaodedocenteseformaodeformadoresde professores para trabalhar com alunos pobres. Essa perspectiva defende que a base do conhecimento sobre o ensino e sobre a aprendizagem gerada pela investigao constitua o programa de formao de professores. Trabalha com a idia de formao do professorado como prxis. Seu enfoque orientado pelos fundamentos sociais e seu projeto regido pelos princpios normativos de democracia, igualdade e autonomia, comprometido com o desenvolvimento do juzo prtico. Outro componente bsico dessa perspectiva a unio que se pretende da investigao refe-xiva e da ao prtica dos professores.Almdodesejocomumdeprepararprofessoresquede-senvolvamumaperspectivacrticasobreasrelaesentrea escolarizao, as desigualdades sociais e o compromisso moral, paracorrigiressasdesigualdadespormeiodesuasatividades cotidianas na aula e na escola, existem grandes variaes entre aspropostascontemporneasdosformadoresdeprofessores reconstrucionistas sociais.O contedo das propostas de formao de professores varia de uma sociedade para outra segundo interesses de diversos seg-Formao de Professores: concepes e prticas22mentos sociais, que se projetam em valores, aspiraes, objetivos. Tem como trao caracterstico a intencionalidade, que a dimen-so tica e normativa da prtica educativa.NoBrasil,opontocentraldasdiscussesedaspropostas nessecampotemgiradoemtornodaquestododescompasso entreaformaoacadmicaearealidadedasescolas,ouseja, entre a teoria e a prtica. O problema que se coloca o seguinte: comosuperaratradicionalcisoentreoconhecimentotericoe oprtico?Afnal,amaneiradeentenderarelaoentreteoriae prtica vo resultar diferentes concepes de formao de profes-sores que so determinadas, tambm, por concepes de escola e de ensino, de conhecimento e de sua produo, de transmisso e aprendizagem, de cultura e de sociedade.A tendncia predominante aquela orientada pelo paradig-ma da racionalidade tcnica, com nfase na formao de um tc-nicocapazdeagirconformeregrasderivadasdoconhecimento cientfco. Essa perspectiva de formao traz, na sua organizao curricular, a prtica no fnal dos cursos como aplicao dos funda-mentos das disciplinas tericas. Nas licenciaturas desvaloriza-se o professor como pesquisador, como produtor de saberes. Aseparaoentrebachareladoelicenciaturatemcomo pressuposto que o primeiro forma o pesquisador, entendido como o produtor do conhecimento e o segundo forma o professor, enten-dido como aquele que apenas reproduz o conhecimento. Sob esse prisma, a atitude investigativa no precisaria ser uma caracterstica doprofessor,poissuacompetnciaespecfcaseriaassimilaros conhecimentos produzidos por outros e repass-los de forma facil-mente compreensvel. Pensar a formao de professores crticos e refexivos, capa-zes de elaborar a prpria prtica, de propor mudanas e agir de for-ma autnoma no contexto social onde atuam, pressupe mudanas no modelo atual de formao destes profssionais. A formao de professores no pode continuar produzindo dicotomias entre teoria e prtica, pesquisa e ensino, contedo especfco e pedaggico. Isto implica em modifcar a cultura das instituies formado-ras, dos locais de trabalho do professor, para possibilitar o desen-volvimentodahabilidadederefetir,formarhbitosdepesquisa, deexperimentao,deverifcao,anliseeproblematizaoda prpria prtica.Estaumanovaconcepoparaseentenderaescola,o processodeensino-aprendizagem,aformaodeprofessorese Formao de Professores: concepes e prticas23seu desenvolvimento profssional. Ela supe uma forma mais de-mocrtica,cooperativa,qualitativa,transparenteeefcazdein-vestigareintervirnavidacotidianadasaladeaula,tratandode desvelar a complexidade de seus problemas mediante o dilogo e a colaborao. Ela exige um novo compromisso tico e profssional dos professores, no se baseando mais no domnio de um conjunto de tcnicas ou procedimentos que se utiliza como receita descon-textualizada.Constata-seempesquisarealizadaporAndretal (1999, p.309,) um excesso de discurso sobre o tema formao docente e uma escassez de dados empricos para referenciar prti-cas e polticas educacionais.Destaco e coloco para discusso alguns princpios que cons-tam da legislao brasileira (Constituio, LDB, Diretrizes Curricu-lares Nacionais) e que, do meu ponto de vista, podem orientar a poltica de formao de professores nessa perspectiva.Princpios Orientadores da Poltica de Formao de ProfessoresIdesenvolvimentoplenodoeducando,preparo para o exerccio da cidadania e qualifcao para o trabalho;IIformaoterica,quepermitaaolicenciando compreender,deformacrtica,asociedade,a educao e a cultura;IIIformaocientfcaconsistenteemsuareade conhecimento;IVtrabalho pedaggico como foco formativo;Vformao cultural ampla;VI a pesquisa como meio de produo de conhecimento e interveno na prtica social;VIIorganizao curricular que possibilite o contato do futuro professor com a realidade profssional desde o incio da formao;VIIIcompromisso social e poltico com a docncia;IXdesenvolvimentodaautonomiaintelectuale profssional;Xinterdisciplinaridade;XIformaocontnuaarticuladacomaformao inicial.Formao de Professores: concepes e prticas24Perfl do ProfessorIcompreendacriticamenteasociedadeeopapel doeducadoremseusaspectospolticos,sociais, econmicos e histricos;IICompreenda os processos histricos de formao e desenvolvimento humanos;IIIseja capaz de promover a formao humana integral de seus alunos (tica culturalcientfca);IVapreendaocontextoeducacionalesejacapaz deatuarnagesto,planejamento,execuoe avaliao do processo educativo;Vtenha a pesquisa como uma dimenso da formao e do trabalho docente;VIdesenvolva uma fexibilidade que possibilite criticar einovar,bemcomo,lidarcomadiversidade cultural, social e profssional;VIIentenda as relaes contraditrias que permeiam o mundo do trabalho, articulando-as com a formao acadmicademodoapromoverumainsero crtica na profsso;IXdesenvolva autonomia intelectual e profssional;Xdesenvolva a capacidade de trabalhar interdisciplinar e coletivamente.Referncias BibliogrfcasANDR, M.;SIMES,R; CARVALHO, J.; BRZEZINSKI, I. Estado da arte da formao de professores no Brasil. Educao & Sociedade, ano XX n.68, dez. Campinas: CEDES, 1999.ASSMANN,Hugo.Reencantaraeducao:rumosociedade aprendente. Petrpolis : Vozes, 1998.CAVALCANTI, Lana de Souza. Geografa e prticas de ensino. Goi-nia: Alternativa, 2002.FONTANELLA,FranciscoC.AtividadeCientfcaetica:quem educaroscientistas?Impulso.Piracicaba(SP),(10),outubro, 1997.Formao de Professores: concepes e prticas25GAUTHIER,Clermont;MARTIEAU,Stphane;DESBIENS,Jean-Franois;MALO,Annie;SIMARD,Denis.Porumateoriadape-dagogia:pesquisascontemporneassobreosaberdocente.Iju: UNIJU, 1998. LISTON,D.P.;ZEICHNNER,KM.Formacindelprofesoradoy condiciones sociales de la escolarizacin. Madrid: Morata, 1993.LYOTARD,Jean-Fraois.Ops-moderno.Riodejaneiro:Jos Olympio, 1988.MARCELO,C.Formaodeprofessoresparaumamudana educativa. Porto: Porto Editora,1999.______.Afunoeaformaodoprofessor/anoensinoparaa compreenso: diferentes perspectivas. In: SACRISTN, J. & P-REZ GMES, A. Compreender e transformar o ensino. Traduo de Ernani F. Da Fonseca Rosa. Porto Alegre: Artmed, 1998.PERZ-GMEZ, A. O pensamento prtico do professor: a formao do professor como profssional refexivo. In: NVOA, A. (org.). Os professores e a sua formao. Portugal: Dom Quixote, 1992.PIMENTA, S. (org.). Didtica e formao de professores: percursos e perspectivas no Brasil e em Portugal. So Paulo: Cortez, 1997.Bases terico-metodolgicas da Geografa: uma referncia para a formao e a prtica de ensino27Bases terico-metodolgicas da Geografa: uma referncia para a formao e a prtica de ensinoLana de Souza CavalcantiOsprofessoresquetmhojeatarefadeensinarajovens ecrianascontedosescolaresobservamdifculdadesdeapren-dizageme,emmuitoscasos,faltadeinteressepelasatividades de ensino de Geografa. Essa realidade coloca o desafo constante de desenvolver um trabalho docente que resulte efetivamente em uma aprendizagem signifcativa para os alunos. A prtica de ensi-no,comessasdifculdadesedesafos(almdeoutros),indicam parasuainvestigaoalgunsquestionamentos:quetarefasso exigidas para a prtica docente no mundo contemporneo? Qual o papel da Geografa escolar? Que trabalho docente os professores de Geografa tm realizado? Que concepes terico-prticas tm contribudoparaaconstruodaGeografaescolar?Comotm sido formados os professores de Geografa?So questes que compem o conjunto da problemtica da investigao no campo da Didtica da Geografa, em mbito nacio-nal e internacional. Por Didtica compreende-se, aqui, um campo doconhecimentoqueseocupadarefexosobreoprocessode ensino, prevalecendo o entendimento de ensino como uma prtica social, dinmica e subjetiva, cuja efcincia no est limitada a uma correta aplicao de regras gerais e procedimentos. Nessa perspectiva, o que se busca hoje, na Didtica da Ge-ografa, compreender essa dinmica do ensino, seus elementos constitutivos, suas condies de realizao, seus contextos e su-jeitosenvolvidos,seuslimitesedesafos.Acompreensomais ampla e crtica do ensino em geral e dos fundamentos tericos e metodolgicos da Geografa escolar, realizada pela teoria didtica, um dos subsdios para a atuao docente consciente e autno-ma. Com efeito, no conjunto da produo terica na rea, obser-va-se uma acentuada preocupao quanto a projetos de formao de professores, inseridos na poltica educacional vigente, e a suas possibilidades de fundamentar essa atuao docente.Bases terico-metodolgicas da Geografa: uma referncia para a formao e a prtica de ensino28No Brasil, tem ocorrido, nos ltimos anos, um aumento subs-tancial da produo nesse campo, como demonstra um estudo de Pinheiro (2005). Uma das tarefas mais relevantes nessa produo tem sido a de refetir sobre a cincia geogrfca e sua importncia no mundo atual e de compreender a razo de ser dessa rea do co-nhecimento na escola, suas bases e a histria de sua constituio e o trabalho docente realizado na rea. Algumas das questes que envolvem essa tarefa, sobretudo as referentes a bases terico-metodolgicas da cincia geogrfca paraaprticaescolardaGeografa,tmorientadomeutrabalho de investigao. No mbito deste texto, desenvolvo o tema com a seguinte orientao: inicialmente discuto aspectos do mundo con-temporneoesuaespacialidade;emseguida,explicitoalgumas idias sobre a Geografa e sua proposta para a leitura da espaciali-dade contempornea, destacando referncias conceituais relevan-tes para o pensamento espacial; fnalmente abordo questes sobre o trabalho docente voltado para a aprendizagem geogrfca, como desdobramento dos temas anteriores.1. O mundo atual e elementos de sua dimenso espacial O mundo de hoje possui uma caracterstica que a expres-so de uma dimenso espacial: a globalizao. Entende-se a glo-balizaocomoumfenmenodeeliminaodefronteirasentre os pases de todo o mundo, que afeta mltiplos campos: cultural, tecnolgico, social, econmico etc., e que traz como conseqn-cia a construo de espaos de relaes integradas. Ainda que se saibaqueaglobalizaoumprocessocomplexoediverso,no qual participam efetivamente muitos pases, mas no todos, e que esta participao ocorre de modos diferenciados, pode-se dizer que todos experimentam, de fato, em muitos aspectos, uma integrao e aproximao de espaos. , assim, um fenmeno que obriga a considerar a interdependncia de escalas, j que nele esto profun-damente interrelacionados o local, o regional e o global.A experincia da globalizao acentua dois fenmenos para-doxais: de um lado, a homogeneizao dos espaos e da socieda-de, de outro, a ampliao das desigualdades, com o agravamento de alguns problemas (que se tornaram globais), como a excluso Bases terico-metodolgicas da Geografa: uma referncia para a formao e a prtica de ensino29social, as desigualdades scio-econmicas, a violncia, a fragmen-tao territorial, o desemprego, a contaminao ambiental. ver-dade que alguns pilares da globalizao, como o mercado mundial, podemserconsideradosmitos,conformeVlach(2005),ouso projetos ainda pouco vivenciados, como o de uma nica sociedade. Mas, como afrma a autora: a mundializao, por meio da coexis-tncia entre territrio e rede, evidenciou a complexidade do mundo e exps as suas peculiares inprevisibilidade, incerteza, instantanei-dade e simultaneidade (idem, 34).Uma outra caracterstica importante da atualidade o de-senvolvimentodaschamadastecnologiasdaComunicaoeda Informao. O mundo de hoje caracteriza-se por grandes avanos tecnolgicos, sobretudo nas reas de comunicao e informao. Porumlado,elespermitemasimultaneidade,ouseja,presen-ciar todos os fenmenos e acontecimentos, pois a comunicao ocorre em tempo real. Permitem tambm colocar disposio, para o mundo, o conhecimento acumulado. Mas, por outro lado, acomunicaodemassatemlevadoaumprocessodehomo-geneizao cultural como a universalizao dos gostos, da ali-mentao,doshbitosdeconsumo,dolazer,dosmodelosde vidasocial; democratizao da idia de consumo, do ideal de consumo. Essa realidade tem afetado a percepo espacial a tal ponto que j se questiona a validade de algumas categorias clssicas da Geografa,comoapaisagem,quetemtradicionalmente umforte componente emprico e no entanto atualmente pode ser tambm produzida e percebida virtualmente.Defato,oadventodastecnologiasnasreasapontadas leva as pessoas a vivenciarem a realidade de modo mais prximo, provocandofamiliaridadesantesimpossveisentredeterminados lugares e suas representaes pelos meios de comunicao. Com essas tecnologias tambm possvel impor estilos de vida interna-cionais, globais, atravs da adeso por cidados do mundo inteiro ao consumo de alguns produtos e servios que esto no marco de ummercadointernacional;paraofuncionamentodessemercado aparecem a Internet e todas as redes telemticas como veculo da possibilidade de se estar presente em qualquer ponto do globo a um s tempo. Todos esse eventos fazem com que boa parte dos acontecimentos cotidianos estejam infuenciados por fatos aconte-cimentos que vo alm do seu entorno imediato. Bases terico-metodolgicas da Geografa: uma referncia para a formao e a prtica de ensino30Aurbanizaotambmumacaractersticarelevantedo mundo contemporneo. As cidades so hoje locais complexos que abrigam a maior parte da populao e so expresso da complexi-dade e da diversidade da experincia humana, da histria humana. Comotal,deveserentendidanocontextodaglobalizaoeda informao, trazendo elementos distintos para o cotidiano urbano, para os modos de se viver o dia a dia.As cidades se formam na e pela diversidade dos grupos que nela vivem. Elas vo sendo, com isso, produzidas, confguradas de maneirasvariadasparaqueseushabitantesdiferentesgrupos, culturas, condies sociais possam praticar a vida em comum, compartilhando nesses espaos, desejos, necessidades, problemas cotidianos. A experincia com a diversidade de culturas enriquece a vida cotidiana nas cidades, tornando-as lugares de manifestaes globais, manifestaes universais e lugares de encontros, lugares da diferena. Por isso, destaca-se que a sociedade urbana tem se tornado mais complexa, mais individualizada e mais multi e intercu-lutral; nela os comportamentos urbanos diversifcaram-se, e algu-mas pautas culturais globalizaram-se e homogeneizaram-se.2. A Geografa e a leitura da espacialidade contemporneaAscaractersticasapontadasanteriormente,eoutrasque poderiam ser elencadas, revelam transformaes que so mais que uma simples mudana em fatos e processos econmicos; o con-texto atual , na verdade, o de uma nova cultura, um novo espao, umanovaespacialidade,quebastantecomplexaequerequer anlises amplas. Para essa anlise, necessrio articular conheci-mentos integrados, interdisciplinares, abertos, que consigam aba-lar a tradio moderna de produo cientfca.A Geografa, nesse contexto, tem se desenvolvido, tornan-do-se uma cincia mais plural. Por um lado, ela reafrma seu foco de anlise, que o espao, mas, por outro, torna-se mais conscien-te de que esta uma dimenso da realidade, e no a prpria rea-lidade, complexa e interdisciplinar por si mesma. O espao como objeto da anlise geogrfca no aquele da experincia emprica, no um objeto espacial em si mesmo, mas sim uma abstrao, uma construo terica; o espao geogrfco concebido, cons-trudo intelectualmente como um produto social e histrico, que se Bases terico-metodolgicas da Geografa: uma referncia para a formao e a prtica de ensino31constituiemferramentaquepermiteanalisararealidadeemsua dimenso material e em sua representao. Conforme Ortega Val-crcel (2004), necessrio determinar o objeto da disciplina para que se possa construir a malha de conceitos que permita abordar a realidade a partir de uma dimenso determinada. Para esclarecer seu ponto de vista, explica:Oespaonotangvel,sebemquenouso habitual da linguagem entende-se como sinnimo dascoisasouobjetosmateriaisaosquaisse refere.evidente,noobstante,queoespao no a casa ou a rua, o campo, as rvores ou a rocha. O espao os compreende conceitualmente masnoossubstitui.Converte-os,issosim,em objetosespaciais,porqueformampartedoque seconsideraespao.Oconceitodeespaono seidentifcaanenhumarealidadeempricaou empiricamente descritiva (idem, p. 31).Defniroespaocomocategorianumaperspectivacrti-capermiteanalisararealidade,aindasegundooautor,prestan-do ateno no tanto s coisas, aos objetos, mas aos processos, destacando o valor das mudanas, considerando a realidade mais comoumsistemaderelaesquedecoisas.Emumaformula-oaproximada,MiltonSantosdesenvolveseuentendimentode espaogeogrfcocomoumconjuntoindissocivel,solidrioe tambm contraditrio, de sistemas de objetos e sistemas de aes, no considerados isoladamente, mas como o quadro nico no qual a histria se d (Santos, 1999).Partindo dessa ferramenta intelectual, h, atualmente, uma diversidade de orientaes metodolgicas para a Geografa, basica-mente fundamentadas nas perspectivas fenomenolgica, dialtica esistmica,ouemalgumaformadeintegraoouaproximao entre elas, como a perspectiva da complexidade (ver, por exemplo, ascontribuiesemSilvaeGaleno,2004).Asdiferentespers-pectivas da anlise geogrfca contribuem, cada uma a seu modo, para a compreenso da espacialidade contempornea, mas, a meu ver e concordando com Ortega Valcrcel (idem, ibdem), possuem algumasbasescomuns,como:ofundamentosocial,abuscade um marco terico e conceitual compartilhado e a identifcao de problemas socialmente relevantes. Bases terico-metodolgicas da Geografa: uma referncia para a formao e a prtica de ensino32A Geografa busca, com isso, se estruturar para ter um olhar mais integrador, aberto, ao mesmo tempo, s contribuies de ou-trasreasdacinciaesdiferentesespecialidadesemseuinte-rior, um olhar mais compreensivo, mais sensvel s explicaes do senso comum, ao sentido dado pelas pessoas para suas prticas espaciais.Nomundocontemporneo,asprticascotidianasdas pessoas(quesoprticasespacializadas,eporissointeressa Geografa) so complexas, fragmentadas, desiguais, diferenciadas, multiculturais,interculturais,desterritorializadas,organizadasem fuxos e redes, mediticas e informatizadas. Aeducaogeogrfca,realizadacomosconhecimentos da Geografa escolar, considera que os interesses, as atitudes e as necessidadessociaiseindividuaisdosalunosmudamemfuno dessa nova realidade espacial, sendo assim, no pode fcar alheia s mudanas da Geografa acadmica. Para que os alunos entendam os espaos de sua vida cotidiana, que se tornaram extremamente com-plexos, necessrio que aprendam a olhar, ao mesmo tempo, para um contexto mais amplo e global, do qual todos fazem parte, e para os elementos que caracterizam e distinguem seu contexto local. En-tendo que para atingir os objetivos dessa educao, deve-se levar em considerao, portanto, o local, o lugar do aluno, mas, visando propiciar a construo pelo aluno de um quadro de referncias mais gerais que lhe permita fazer anlises mais crticas desse lugar.3. Referncias conceituais relevantes para o pensamento espacial Partindodalinhaderaciocnioanterior,inicioestetpico comarefexosobrequeGeografaensinarnessecontextode transformaes e de complexidades.Primeiramentepode-seafrmarqueprecisoensinaraos alunososcontedosconsideradosrelevantesparacompreender aespacialidadeatual,talcomocaracterizadaanteriormente.No entanto,maisquelhesensinarcontedos,necessriotambm ensinar-lhes modos de pensamento e ao, ou seja, por meio de atividades proporcionadas nas aulas, por meio do trabalho com os contedos, os professores devem propiciar o desenvolvimento de certas capacidades e habilidades, como:Bases terico-metodolgicas da Geografa: uma referncia para a formao e a prtica de ensino33uma atitude indagadora diante da realidade que se observa e se vive cotidianamente;uma capacidade de anlise da realidade, de fatos e fenmenos, em um contexto socioespacial;a considerao de que os objetos estudados tm diferentesescalas,ouseja,levaremcontasuas inseres locais e globais;aconsideraodequehumamultiplicidadede perspectivas e tipos de conhecimento;umacompreensodequeconhecerconstruir subjetivamente a realidade;umapercepodequehtemascomplexosque devem ser tratados como tais (que as coisas no sosimples,quesemprehvriasperspectivas naconstruodeexplicaessobreumadada realidade);uma compreenso de que os fenmenos, processos e a prpria Geografa so histricos;umaconvicodequeaprendersobreoespao relevante,namedidaemqueumadimenso importante da realidade.AconsideraodaGeografaescolarcomorepresentando umamaneiraespecfcaderaciocinar edeinterpretar arealidade e as relaes espaciais, mais do que uma disciplina que apresenta dados e informaes sobre lugares para que sejam memorizados, aproxima-adeprincpiossocioconstrutivistas.Ouseja,pautaro ensino no desenvolvimento de determinadas capacidades, a se de-senvolver por meio do trabalho com os contedos, requer a escolha de caminhos adequados para levar a cabo o prprio ensino. Dessa forma, a refexo sobre os contedos leva tambm refexo sobre mtodos, pois so elementos integrados no contexto didtico.Para pensar sobre aspectos metodolgicos do ensino deGe-ografa, tendo em vista o que j foi exposto, entendo que o primei-ro ponto o de colocar o aluno como centro e sujeito do processo de ensino, para, a partir da, refetir sobre o papel do professor e da Disciplina, que so elementos igualmente fundamentais no contex-to didtico. Trata-se de um processo dinmico em que todos esses elementos so ativos. O aluno, com sua experincia cotidiana a ser considerada em sua aprendizagem, sujeito ativo de seu processo Bases terico-metodolgicas da Geografa: uma referncia para a formao e a prtica de ensino34de formao e de desenvolvimento intelectual, afetivo e social, sujeito que tem idias em construo, relacionadas com seu con-texto social mais imediato. O docente, com o papel de mediador do processo de formao do aluno, tem o trabalho de favorecer/propi-ciar a inter-relao entre os sujeitos e os objetos de conhecimento. A Geografa escolar, que representa um conjunto de instrumentos simblicos,conceitos,categorias,teorias,dados,informaese procedimentos sobre o espao geogrfco, constitudo em sua his-tria, considerada uma das mediaes importantes para a relao dos alunos com a realidade.Neste ponto cabe reafrmar e explicitar a importncia da Geo-grafa escolar para a formao geral de cidados. Na relao cogniti-va de crianas, jovens e adultos com o mundo, o raciocnio espacial necessrio, pois as prticas sociais cotidianas tm uma dimenso espacial. Os alunos que estudam essa disciplina j possuem conheci-mentos nessa rea oriundos de sua relao direta e cotidiana com o espao vivido. Sendo assim, o trabalho de educao geogrfca o de ajudar os alunos a analisarem esses conhecimentos, a desenvol-verem modos do pensamento geogrfco, a internalizarem mtodos e procedimentos de captar a realidade, a vivida e a apresentada pela Geografa escolar, tendo conscincia de sua espacialidade. Esse modo de pensar geogrfco importante para a realizao de prti-cas sociais variadas, j que essas prticas so sempre prticas so-cioespaciais. A materializao dessas prticas, que se realizam num movimentoentreaspessoaseosespaos,vaisetornandocada vez mais complexa, e sua compreenso cada vez mais difcil, o que requer referncias conceituais sistematizadas, para alm de suas re-ferncias espaciais cotidianas, carregadas de sentidos, de histrias, de imagens, de representaes. Portanto,paraqueoalunoaprendaGeografa,noapenas paraassimilarecompreenderasinformaesgeogrfcasdispo-nveis(quesoimportantesemsimesmas)masparaformarum pensamento espacial, necessrio que forme conceitos geogrfcos abrangentes. A idia que tenho trabalhado a de que esses concei-tos so ferramentas fundamentais para a compreenso dos diversos espaos, para localizar e analisar os signifcados dos distintos luga-res e sua relao com a vida cotidiana. O desenvolvimento do pen-samento conceitual, que permite uma mudana na relao do sujeito com o mundo, que permite ao sujeito generalizar suas experincias, papel da escola e das aulas de Geografa. No entanto, sabe-se que Bases terico-metodolgicas da Geografa: uma referncia para a formao e a prtica de ensino35os conceitos no se formam nos alunos pela transferncia direta de contedos e por sua reproduo, como est suposto em propostas mais tradicionais de ensino. Neste processo h de se considerar os conceitos cotidianos dos sujeitos envolvidos. Neste sentido, relevante a questo formulada por Vygotsky (1993): o que acontece na mente das crianas com os conceitos cientfcos que lhe so ensinados na escola? Orientado por essa preocupao,Vygotskydesenvolveumateoriasobreoprocesso de formao de conceitos, na qual so importantes os conceitos cientfcoseosconceitoscotidianos,quesorelacionadosese infuenciammutuamente(cf.sobreaformaodeconceitosge-ogrfcos nessa linha, Cavalcanti, 1998 e 2005). Essa orientao metodolgicarequerumolharatentoparaageografacotidiana dos alunos. O encontro/confronto desse conhecimento, da dimen-so do espao vivido, com a dimenso da Geografa cientfca, do espaoconcebidoporessacincia,possibilitaareelaboraode conceitos e uma maior compreenso da experincia.O desenvolvimento de um modo de pensar geogrfco mais amplo e abstrato requer, portanto, a formao de conceitos pelos alunos.Otrabalhocomocontedogeogrfco,paraqueelese torne ferramenta do pensamento, implica a busca de signifcados e sentidos dados pelos discentes aos diversos temas trabalhados em sala de aula, considerando a experincia vivida por eles. Implica tambm a busca da generalizao dos conceitos e o entendimento de sistemas conceituais; alm disso, vislumbra trabalhar com ou-tras dimenses da formao humana, como a emocional e a social, e no somente a cognitiva, a racional.Algunsconceitossomaisgeraiseelementaresaoracio-cniogeogrfco,enomeuentendimentosoestruturadoresdo espaogeogrfco,tornando-seimportantescategoriasdeanli-se: natureza, lugar, paisagem, regio, territrio, ambiente. Outros conceitos so tambm relevantes para compor um modo de pen-sar espacial e para analisar espaos especfcos, entre eles esto osdecidade,campo,identidadecultural,degradaoambiental, segregao espacial, e uma infnidade de outros que compem a linguagem geogrfca.Paraexplicitarumpoucomaisaorientaometodolgica aqui delineada, considero til traar, a seguir, um esboo do que poderia ser confgurado como um mapeamento conceitual aberto, dinmicoearticuladodealgunsdosconceitosmaiselementares para o ensino de Geografa.Bases terico-metodolgicas da Geografa: uma referncia para a formao e a prtica de ensino36O conceito de lugarA primeira idia associada a lugar que tem sido trabalhada no ensino e que pode estar associada a uma representao social desse conceito a de um ponto no espao, ou seja, quando se fala em lugar pensamos imediatamente em um local. Este elemento do espao est relacionado a outros mais especfcos da localizao e orientao espacial, como os de distncia, pontos cardeais, latitu-de e longitude, e outros. Mas, a considerao deste elemento do conceito, que se refere a onde est o objeto/fenmeno estudado, levaaoutrosqueserelacionamcomrefernciasmaissubjetivas dos lugares, mais prprias da experincia vivida no cotidiano, como o de familiaridade, de afetividade, de identidade.A identidade , nesse entendimento, um outro elemento im-portante do conceito de lugar. Ela um fenmeno relacional. Seu aparecimento advm de uma interao de elementos, neste caso de indivduos com seus lugares, com formas de vida e com os modos de expresso. Implica um sentimento de pertinncia com o qual um indivduo vai se identifcando, vai construindo familiaridade, afetivi-dade, quer seja com um bairro, com um estado, uma rea.O lugar , portanto, o habitual da vida cotidiana mas, por ou-tro lado, tambm por onde se concretizam relaes e processos globais. O lugar produz-se narelao do mundial com o local, que ao mesmo tempo a possibilidade de manifestao do global e de realizao de resistncias globalizao. A revalorizao que tem, hoje, a experincia no local, como um elemento do global, atribui uma importncia decisiva deste conceito na educao geogrfca. Nestesentido,osfenmenosqueaGeografaestudadevemser consideradoscomoresultadosdeumprocessohistricosituado em um determinado local mas considerado tambm na perspectiva internacional/global. A Geografa sempre se caracterizou por estudar as questes na perspectiva de determinadas escalas de anlise, que pressupe distintos nveis territoriais, no entanto, hoje esto colocadas expli-citamente como categorias de anlise o cotidiano e o local, acresci-do do regional. Ou seja, os nveis local e regional, que so o mundo fsicamentemaisprximodoaluno,sotratadosemarticulao com a perspectiva da mundializao/globalizao.A experincia com alunos, em atividades de ensino, revela inicialmente que os elementos afetivos, como vizinhana, seguran-Bases terico-metodolgicas da Geografa: uma referncia para a formao e a prtica de ensino37a, liberdade, jogos, violncia, perigo, do signifcados aos lugares, e que so, portanto, recortados afetivamente. Mas, necessrio investir na ampliao desses signifcados ligados ao emprico dos alunos e propiciar o conhecimento de elementos da realidade ob-jetiva e global. O conhecimento de outros lugares, a comparao com a prpria referncia, junto com a anlise da diferenciao de condies do global em cada lugar, podem fazer avanar a com-preenso dos lugares vividos. Esse modo de sistematizar o concei-to pode ser visualizado no Grfco I, a seguir:Grfco I: Sistematizao do conceito de LugarO conceito de paisagemO conceito de paisagem no especfco da Geografa, ainda que seja clssico na constituio desta cincia. Tradicionalmente ligadoaaspectosdeumareadedescriopossvel,hojecreio que se pode destacar o fato de ser a paisagem o domnio do vis-vel, a expresso visvel de um espao; o domnio do aparente, de tudoquenossavisoalcana;odomniodoquevividodireta-mente com nosso corpo, com todos os nossos sentidos viso, Bases terico-metodolgicas da Geografa: uma referncia para a formao e a prtica de ensino38audio, tato, olfato, paladar ou seja, a dimenso das formas que expressam o movimento da sociedade. A observao e com-preenso dessas formas servem para dar caminhos de anlises do espao. Neste sentido cabem tanto os aspectos objetivos captados na paisagem quanto os aspectos subjetivos dos sujeitos, que do signifcadosesentidosaoselementosdapaisagem.So,assim, expresses tcnicas, funcionais e estticas da sociedade. As pai-sagens so tambm dinmicas e histricas, j que so expresses de movimentos da sociedade. Pode-se dizer, assim, que pela ob-servao dos objetos da paisagem, observao que subjetiva e seletiva, percebe-se as aes sociais, as contradies sociais, as testemunhas de aes passadas, de distintos tempos. Essa com-preenso pode ser expressa em um mapeamento para o conceito como est esboado no Grfco II:Grfco II: Sistematizao do conceito de PaisagemNo ensino da Geografa, necessria a formao do concei-todepaisagem,quepressupeaconcepodequeosespaos tm uma forma que expressa seu contedo (o movimento social), de que a paisagem revela as relaes de produo da sociedade, Bases terico-metodolgicas da Geografa: uma referncia para a formao e a prtica de ensino39seu imaginrio social, suas crenas, seus valores, seus sentimen-tos. Para os alunos, buscando seus conceitos cotidianos, h que considerar as relaes muito fortes que fazem entre o conceito e beleza; para eles a paisagem uma vista bonita, um lugar pano-rmicobelo,muitasvezesintocadoaindapelohomem.Huma associao entre paisagem e natureza. sempre uma imagem ide-alizadaeesttica.Percebe-se,comisso,umadistnciaentreos conceitos cientfco e cotidiano. Com essa distncia deve contar o professor, pois nela est a relao entre eles, que , em defnitivo, onde se encontra o trabalho de construo de conhecimento a ser desenvolvido no ensino.O conceito de territrioEste um conceito que tem tambm uma larga utilizao na histriadaGeografa,particularmentenaGeografaPoltica.Nas contribuiesatuais,umdoselementosquetmsidoapontados para sua constituio o de poder. O poder do Estado, os mltiplos poderes exercidos na gesto regional e local, os poderes individu-aisedegrupos.Esteconceito,portanto,relaciona-secomuma problemticarelacionaldeindivduoseseuslugaresdeprtica, que resulta em formas espaciais, compostas de tessituras, ns e redes. Sendo assim, a identidade tambm um elemento de sua constituio, assim como o conceito de lugar. Analisar hoje o tema da identidade signifca pens-la dentro do contexto das sociedades multiculturais; isso implica que, ainda que a globalizao tenha suposto uma ruptura da territorializao comasculturas,assiste-se,aindanopresente,enfrentamentos srios entre diversos grupos por posse.Oterritrioconsideradocomocampodefora,deml-tiplasescalas,produzidoapartirdeumaapropriaoedeuma ocupaodeumespaoporumagente,quepodeseroEstado, uma empresa, um grupo social ou um indivduo. Em diversos graus, portanto, em momentos diferentes e em lugares variados, somos todos agentes, e estabelecemos limites entre ns e os outros, en-tre o nosso e o de outros; todos elaboramos estratgias de produ-o que se chocam com outras estratgias de apropriao e uso dos territrios. Alm disso, a constituio do territrio, enquanto relaes sociais projetadas no espao, pode dar-se por longo tem-Bases terico-metodolgicas da Geografa: uma referncia para a formao e a prtica de ensino40po ou por apenas poucos minutos, tornando-o regular ou peridico, estveisouinstveis,fexveisouinfexveis.Nesseprocessode constituio, no se pode desconsiderar um processo simultneo deidentifcao,maioroumenor,degruposouindividual,com aquele lugar que est sendo apropriado.Este conceito composto por elementos mais especfcos, alm dos outros mencionados, que auxiliam na sua estruturao, como est sugerido no Grfco III.Grfco III: Sistematizao do Conceito de TerritrioNo ensino, h de considerar o que pensam os alunos sobre oconceito.Observa-se,pelaexperincia,quemuitascrianase jovens o associam a um espao legalmente constitudo, como os espaos nacionais, como os pases. Mas, por outro lado, quando Bases terico-metodolgicas da Geografa: uma referncia para a formao e a prtica de ensino41eles pensam em seu espao cotidiano apontam territrio como um lugarocupado,noqualalgumtemapropriedade.Porexemplo: este meu territrio, ali o territrio de algum, quando o espao tem um dono. De fato, na prtica cotidiana de jovens e crianas esto muito presentes os territrios; nas brincadeiras, nas ruas, nos espaos pblicos e at mesmo nos privados, suas prti-cas vo tomando uma dinmica que requer defnies territoriais, muitas vezes explcitas. necessrio trabalhar com esse conceito no ensino, dispon-do-se de instrumentos tericos para a refexo e anlise sobre os diferentes territrios dos quais os alunos fazem parte, constrem em seu cotidiano, individualmente ou em grupos, no para afrmar territrios individuais, no para os privilegiar, mas para que os alu-nos possam atuar democraticamente, participando na constituio de territrios da sociedade de que fazem parte, e para que compre-endam os confitos territoriais de pequena e grande escalas (regio-nais, mundiais), que caracterizam a sociedade.O conceito de cidadeEsse um conceito que, embora no seja elementar do ra-ciocniogeogrfcocomoosoutrosanteriormentetratados,tem ganhadomuitaimportncianaeducaogeogrfca,porserde fundamentalimportnciaparaacompreensodaespacialidade contempornea e por ser uma possibilidade de trabalhar concreta-mente com conceitos geogrfcos elementares, como os de paisa-gem, lugar e territrio.Aobservaodomaterialdidticoedotrabalhodocente com esse tema, no ensino de Geografa, demonstra ser esse um tema complexo. A compreenso do tema da cidade pelos alunos exige tratamento interdisciplinar, requer a formao de um sistema amplo de conceitos, a aquisio de muita informao e o desenvol-vimento de uma srie de capacidades e habilidades.Como ponto de partida do conceito, pode-se dizer que cida-de uma aglomerao de pessoas (habitantes, visitantes) e de ob-jetos (edifcios, casas, ruas). Em funo dessas pessoas e desses objetos os espaos e a vida urbana se organizam. Esses elementos vo confgurando uma paisagem urbana, sendo possvel, assim, es-tudar a cidade como uma paisagem. Essa sua forma, o conjunto Bases terico-metodolgicas da Geografa: uma referncia para a formao e a prtica de ensino42formado pelos objetos que a compe, pelos sons, pelos odores, pe-las pessoas e seus movimentos. O estudo desses aspectos oferece pistas para a anlise de outros elementos.Na cidade as pessoas produzem sua vida cotidiana mais ele-mentar,emcasa,emsuaprivacidade,naconvivnciacomseus amigos e familiares, em outros lugares de convivncia, na escola, no trabalho, no lazer; tambm pode-se aqui relacionar esse conceito com elementos do lugar: a familiaridade, a afetividade, a identidade e a construo da diferena, da diversidade, da desigualdade.No entanto, a cidade um lugar bastante complexo, de pro-duo social, no qual a identidade vivida em fronteiras difusas, permeveis, com muitos espaos de contato, de resistncias e de excluso, em que h manifestao de diferentes percepes, usos, culturaseaspiraesdedistintosgrupos,emseusespaosp-blicos e privados. Esse fato leva a se pensar na cidade como um territrio, ou como um espao que expressa uma infnidade deles. A concepo de territrio formulada por Almeida (2005:331/332) ajuda a entender sua dinmica de formao na cidade e de como eles expressam a vida urbana: Comoorganizaodoespao,pode-sedizerque oterritrioresponde,emsuaprimeirainstncia, anecessidadeseconmicas,sociaisepolticas decadasociedadee,porisso,suaproduo estsustentadapelasrelaessociaisqueo atravessam.Suafuno,porm,nosereduza essa dimenso instrumental: o territrio tambm objetodeoperaessimblicasenelequeos atoresprojetamsuasconcepesdemundo,de natureza,concepesestasdecorrentesdeuma cultura ecolgica.Natentativadevisualizaressacompreensodoconceito, seus elementos foram dispostos no Grfco IV:Bases terico-metodolgicas da Geografa: uma referncia para a formao e a prtica de ensino43Grfco IV: Sistematizao do Conceito de Cidade Para que o ensino de Geografa contribua para a formao doconceitodecidadecomoumaferramenta paraaanlisegeo-grfca do mundo pelo aluno, no uma boa orientao estruturar o contedo escolar com base em um conjunto de conceitos com sua defnio pronta, como: o que cidade, o que processo de urbanizao, o que conurbao, o que valorizao/segregao urbana, o que metrpole, o que rede urbana, e tantas outras defnies. Observa-se que muitas vezes, com essa orientao, o aluno aprende (ou reproduz verbalmente) todas essas defnies Bases terico-metodolgicas da Geografa: uma referncia para a formao e a prtica de ensino44quecompemocontedodidtico,acompanhadasdeinmeras informaes sobre diferentes cidades, mas no conseguem utiliz-las para compreender e analisar fatos, fenmenos que presenciam em seu cotidiano.Diferentemente, o ensino que busca a formao de concei-tos aborda esse tema propiciando o encontro/confronto da experi-ncia imediata e cotidiana dos alunos com sua realidade e os con-ceitos cientfcos pertinentes, tais como os que j foram citados. Nesse intuito, d prioridade a temas como: a cidade como arranjo espacial com isto discute-se o que caracteriza a cidade (a vivida pelo aluno e outras que podem ser apresentadas pelo professor) do ponto de vista da organizao da paisagem; a cidade como modo de vida resultado de uma determinada prtica social e ao mesmo tempo uma condio dessa prtica; a cidade como modo de produ-o com esse tema trabalha-se o entendimento de que ela um arranjo espacial histrico e que corresponde a determinadas formas de organizao e da produo social.Acidadeassimabordadanotrabalhadasomentecomo formafsica,mascomomaterializaodemodosdevida,como um espao simblico, e seu estudo pretende desenvolver no aluno acompreensodosmodosdevidadasociedadecontempornea edoseucotidianoemparticular,queresultam(esocondicio-nadas) em espacialidades determinadas. Alm disso, esse estudo contribui para o desenvolvimento de habilidades necessrias para osdeslocamentosdoaluno,sejaemespaosmaisimediatosde seu cotidiano, seja em espaos mais complexos, habilidades que sofundamentais,mesmoquenosufcientes,paraousufruto pleno do direito cidade.Nesseentendimentoimportanteconhecerouconsiderar os conhecimentos que tm os alunos de seus espaos vividos na cidade. Mas, considerando que eles so uma construo constan-te,dinmica,equenessaconstruointerferesuaexperincia, seus deslocamentos cotidianos (a cidade conhecida , em grande medida, a cidade vivida atravs dos deslocamentos), seu contexto familiar e social, mas tambm suas aprendizagens, seus conceitos, que se expressam em seu mapa mental, com referncias espaciais como marcos, rotas, ns, e se expressam tambm em um conjun-tocomplexo,descontnuo,muitasvezesconfuso,muitasvezes inconsciente, de signifcados simblicos.Bases terico-metodolgicas da Geografa: uma referncia para a formao e a prtica de ensino454. O trabalho docente voltado para a aprendizagem geogrfca Propostas de ensino de Geografa pautadas no processo de formao de conceitos geogrfcos pelos alunos j esto presen-tes no conjunto de contribuies recentes no campo da Didtica. Sua retomada neste texto tem o sentido de reafrmar e de tentar explicitar melhor meu entendimento do processo, na busca de ins-trumentalizar o debate e o estudo dessa temtica pelos professores de Geografa no cotidiano da escola. Apremissainicialparaotrabalhodocente,quesedesdo-bradasdiscussesfeitasnessetextosobreasdemandasatuais para o ensino, a de que esse trabalho deve estar voltado para a aprendizagem geogrfca do aluno. Embora essa seja uma afrma-o aparentemente bvia, importante que seja ressaltada para, a partir dela, trazer alguns elementos decorrentes. O trabalho con-siste, pois, em tornar possvel o processo de aprendizagem. Isso signifca que o sujeito central do processo o aluno e seu processo cognitivo, e o papel do professor o de mediao. O ensino um processo de conhecimento pelo aluno, mediado pelo professor. O papel do discente, nessa mediao, encaminhar esse processo de conhecimento a partir de suas concepes tericas e metodolgi-cas a respeito de como esse processo ocorre. O trabalho da media-o didtica , portanto, o de propiciar a atividade cognitiva do discente, a partir de um encaminhamento metodolgico, para que eleconstruaconhecimentoedesenvolvacapacidadesehabilida-des cognitivas. A deciso sobre o caminho metodolgico a seguir envolve uma refexo epistemolgica, entendida como a defnio doqueconhecimento,doqueoconhecimentocientfco,do queconhecer(oudaorigemdoconhecimento),docomoedo que conhecer.A deciso sobre o caminho metodolgico, e de resto as ou-tras decises atinentes ao cotidiano do trabalho docente, deve ser feita pelo professor, individual e coletivamente, de modo conscien-te e com autoria. Ou seja, o professor deve buscar condies para que possa realizar seu trabalho docente apoiado em um projeto pe-daggico-didtico no qual ele acredita, o qual ele defende, projeto a ser construdo coletivamente e resultante da discusso de projetos e propostas concretas individuais. Humaindicaomaisgeralparaainstitucionalizaode umagestocoletivadaescola,naqualestincludaadefnio Bases terico-metodolgicas da Geografa: uma referncia para a formao e a prtica de ensino46de projetos de trabalho docente para cada rea do conhecimento escolar. O exerccio dessa gesto coletiva traz o desafo de romper a barreira estabelecida por uma tradio de isolamento e de indivi-dualismo do trabalho docente, permitindo que se estabelea uma prticaquetemsidodenominada(Shulman,1998apudGarca, 2002:08) de comunidade de prtica, atravs da qual a experi-ncia individual possa converter-se em coletiva.Mais do que o carter coletivo da prtica docente na escola, oquequeroressaltaraquiocarterrefexivodessaprtica.O espaodaescolaumespaodeformao,nosdosalunos mas tambm dos professores. Alm de ser um espao formativo para os professores por veicular conhecimentos e informaes, por induzir, por orientar comportamentos das pessoas que ali esto no cotidiano,elaumespaonoqualaformaoprofssionalmais sistematizada pode ocorrer. Salienta-se hoje a necessidade de formao contnua de todo e qualquer profssional, o que vale, certamente, com muita proprie-dade para o professor, pelas peculiaridades de seu trabalho ao lidar cotidianamente com o conhecimento e a formao humanos. Poisbem,aoseconsiderarcorretaessanecessidade,de-vem-seefetivaraspossibilidadesdeformaoprofssionalcont-nua no interior e no cotidiano da escola. E como fazer isso? Entre outras prticas, considero adequado promover atividades (tempos eespaos)darefexosistemticaecoletivapelosprofessores sobre seu trabalho docente. Essa refexo visa construo de sa-beres docentes, dos quais destaco a construo do conhecimento sobreaGeografaescolar.Porsuavez,aconstruoconsciente de conhecimentos pelo professor, com base na refexo terica e coletiva, uma contribuio do espao institucional para a prtica docente com autoria, demanda j muito apontada para um projeto de educao escolar de qualidade.O espao da escola deve ser uma conquista para o processo de formao contnua do professor de Geografa. Contudo, a cons-cincia da necessidade e o desejo de uma construo continuada devem surgir de valores e convices construdos no processo de formao inicial em cursos universitrios. E, com efeito, algumas orientaes para o processo de for-mao inicial de professores tm sido formuladas nessa perspecti-va. Entre essas orientaes, esto princpios, tais como: articular teoriaeprtica;integrarensinoepesquisa;atentarparaasdife-Bases terico-metodolgicas da Geografa: uma referncia para a formao e a prtica de ensino47rentes capacidades e habilidades requeridas para o trabalho profs-sional, promover a continuidade da profssionalizao; contemplar a diversidade de culturas na formao. Esses princpios foram, no geral, norteadores das diretrizes ofciais vigentes para a formao deprofessoresemnvelfederal(DiretrizesCurriculares Nacionais para a Formao de Professores da Educao Bsica Resoluo CNE/CP, 2002,Diretrizes Curriculares para o Curso de Graduao Geografa Resoluo CES14/2002), e em nvel das Unidades especfcas de formao superior (como as Diretrizes Curriculares dos cursos de Geografa da UFG, da UCG e da UEG, para tomar comoexemploscursosqueformamprofessoresdeGeografano mbito do Estado de Gois e da Regio Centro Oeste). Ressalte-sequedestesprincpiosresultaramaspropostasdeEstgionas Licenciaturas a partir do incio da segunda metade do curso; o que teoricamente permitiria uma maior integrao entre teoria e prti-ca;easpropostasdeincluirhorasdeprticacomocomponente curricular, o que suporia uma penetrao das questes da profs-so no interior das diferentes disciplinas.Almdosprincpiosapontados,tenhoindicadoodeesta-belecer como eixo da formao docente a problematizao da Ge-ografaescolar,orientandotodasasdisciplinasministradas,das diferentes especialidades da Geografa. Trata-se de, no tratamento dos diferentes contedos apresentados aos alunos em formao, contemplarrefexes,buscaraplicaesnaprtica,buscarapro-fundamento na pesquisa, sobre questes como: em que contexto a Geografa se constituiu como cincia? Qual a natureza do conhe-cimento geogrfco ao longo de sua histria? Qual a estrutura do conhecimento geogrfco?Emqueconsisteaparticularidade dos diferentes conhecimentos que essa cincia produz? Quais as dife-rentes possibilidades, na atualidade, de aproximao realidade a partir desse campo cientfco? Qual a contribuio ou contribuies da Geografa, e de suas diferentes temticas e reas, para a for-mao das pessoas? Como esse conhecimento tem se constitudo enquanto conhecimento escolar? Quem tem decidido sobre a cons-tituio desse conhecimento escolar?Defato,essesprincpiossonecessrios,emboranosu-fcientes, para o projeto de formar profssionais autnomos, refe-xivos, conscientes de sua identidade profssional, construtores de seus saberes tericos num processo de dilogo constante com a formao acadmica. Defni-los e inclu-los em propostas especf-Bases terico-metodolgicas da Geografa: uma referncia para a formao e a prtica de ensino48cas de formao de professores de Geografa foi, sem dvida, um grandeavano.Porm,precisomais,precisoacompanhara realizao desses projetos, a efetivao prtica das propostas, ava-liar sua efccia no sentido de garantir a formao desejada, pois, sabe-se que um projeto algo vivo, em permanente construo em direo ao futuro, e que ganha existncia concreta no contexto dos espaos de formao universitria, na realizao de suas diferentes atividades, curriculares, extracurriculares, na prtica cotidiana das disciplinas e dos sujeitos envolvidos. Consideroqueatarefadeacompanhar,analisareavaliaras propostas de formao de professores de Geografa em andamento nos diferentes cursos de nvel superior coletiva, responsabilidade de todos os envolvidos no processo, e dessa tarefa depende a melho-ria das propostas e o avano nas refexes da Didtica da Geografa.Referncias BibliogrfcasALMEIDA, M. Geralda. A captura do cerrado e a precarizao de territrios: um olhar sobre sujeitos excludos. In: ALMEIDA, M. Ge-ralda (org.) Tantos cerrados. Goinia: Editora Vieira, 2005.CAVALCANTI, Lana de Souza. Geografa, escola e construo de conhecimentos. So Paulo: Papirus, 1998. ______. Cotidiano, mediao pedaggica e formao de conceitos: uma contribuio de Vygotsky ao ensino de Geografa. So Paulo: Caderno CEDES, 2005.GARCIA, C.M. 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Goinia: Ano 21, v. 1, n. 24. jan-jun/2005.Estado-nao, Ensino de Geografa, Mundializao: alguns desafos para a formao do professor51Estado-nao, Ensino de Geografa, Mundializao: alguns desafos para a formao do professorVnia Rubia Farias Vlach [...]Oensinotemdedeixardeserapenasuma funo, uma especializao, uma profsso e voltar asetornarumatarefapolticaporexcelncia, umamissodetransmissodeestratgiaspara a vida. A transmisso necessita, evidentemente, dacompetncia,mas,almdisso,requeruma tcnica e uma arte. Exige o que no se encontra emnenhummanual,masquePlatojafrmara comocondioindispensveldetodoensino:o Eros,que,simultaneamente,desejo,prazere amor,desejoeprazerdetransmitir,amorpelo conhecimento e amor pelos alunos. O Eros permite dominar o gozo ligado ao poder, em benefcio do gozo ligado ao dom. Edgar MorinApresentaoA educao pblica e o ensino de Geografa so indissoci-veis do Estado-nao (Lacoste,1976), forma de organizao pol-tica por excelncia da sociedade moderna. No Brasil, no foi dife-rente; mas preciso conhecer as especifcidades desse processo (Vlach, 1988). Assim, indaga-se se a educao clssica, de mbito e carter nacionais, que surgiu e se desenvolveu sob a gide do Es-tado-nao, nos interessa nos dias de hoje, bem como se questio-na a situao da Geografa na escola. O Estado-nao, por sua vez, no est sendo transformado e se transformando drasticamente? Estado-nao, Ensino de Geografa, Mundializao: alguns desafos para a formao do professor52E o ensino de Geografa, ainda tem razo de ser nesse mundo que se organiza e se reorganiza entre o princpio de territorialidade, o fundamento poltico do Estado-nao, e a lgica da rede, o susten-tculo da mundializao (ou globalizao)? Estas so algumas das questes que uma refexo acerca da formao do professor de Geografa difcilmente pode elidir, sobre-tudoporquecertaconcepoopeLicenciaturaeBachareladona universidade, de maneira que o professor e o bacharel no se colo-cam em relao: o ato de ensinar (e aprender) tende a ser reduzido dimenso da transmisso de contedos, como se estes no resultas-sem de pesquisas, cuja dinmica deriva da cincia, que desempenha papelfundamentalemnossasociedadecapitalistaemoderna,so-bretudo desde a Revoluo Industrial (dcada de 1780). O que nos obrigaaconsiderarasrelaes,complementaresecontraditrias, entre a cincia e a sociedade, ainda mais que a primeira, que preten-dia emancipar o homem do jugo da natureza, acabou por dominar a natureza, o homem e a sociedade. Em outras palavras:O que os homens querem aprender da natureza como empreg-la para dominar completamente aelaeaoshomens.Nadamaisimporta.Sem amenorconsideraoconsigomesmo,o esclarecimentoeliminoucomseucautrioo ltimorestodesuaprpriaautoconscincia (Adorno e Horkheimer, 1985, p. 20).A sinonmia cincia poder, que, a partir do sculo XVIII, privilegiouocontrolesocialaserviodeumsistemaprodutivo, explicaporqueainstrumentalizaodarazohumana,restringi-da condio de mercadoria por esse sistema poltico-econmico, eliminou a autoconscincia dos homens. Porm, como o Ser li-berdade, de ao e de pensamento, entendemos que, via uma cr-tica interna dessa instrumentalizao, pode-se resgatar o potencial emancipador da razo e, por conseguinte, da cincia. Vejam-se as proposies de Morin (2000), Santos (2002), Wallerstein (2002), dentreoutros.Entendemosqueaeducaoumdoscaminhos que pode viabilizar tal resgate, luz dos desafos do nosso tempo-espao (que vai muito alm da mundializao da economia), onde a barbrie se faz presente, seja nas favelas brasileiras, seja nos dife-rentes alvos dos terroristas, hoje disseminando-se pelo mundo. Estado-nao, Ensino de Geografa, Mundializao: alguns desafos para a formao do professor53Paralelamente,odilogodosalunoscomacincia,soba mediaodoprofessor,acabariamostrandoocarterpolticoda educao e do ensino de Geografa e, assim, esclareceria que as mudanas necessrias convivncia humana no espao geogrf-co mundial no dependem apenas da educao; a reivindicao de uma redefnio de suas orientaes (e daquelas que dizem respei-to ao ensino de Geografa) da alada da poltica (Arendt, 1998). Afnal, a crescente despolitizao das relaes sociais que des-qualifca a vida no planeta Terra (em todas as suas formas, da a denominada questo ambiental), o Ser (inclui a tica), a democra-cia (o regime poltico construdo no dilogo com o Outro, isto , com a diferena, a alteridade) etc.Impactos da mundializaoPor outro lado, muitas lideranas polticas e econmicas (alm de vrios intelectuais) no hesitaram, durante a dcada de 1980 e a primeira metade da dcada de 1990, a decretar a obsolescncia do Estado-nao, e a anunciar o seu fm, argumentando que o mer-cado, sob a gide de uma mundializao fnanceira inexorvel, teria condiesdesubstitu-lo,senodeelimin-lodaarenapoltica. Porm, se hoje h um mercado fnanceiro certamente mundializado (ou globalizado), isso se deve ao fato de que os Estados Unidos de-cidiram, diante da desorganizao do sistema econmico mundial proposto pelo acordo de Bretton Woods (1944), expandir os mer-cados fnanceiros internacionais para poder reafrmar a supremacia do dlar na dcada de 1970, e, ao faz-lo, o unifcou, graas ao acentuado desenvolvimento tecnolgico da rea de comunicaes. A lgica da rede (relacionada aos fuxos estabelecidos pelas mo-dernas redes de transporte e comunicaes na Europa Ocidental), ento, se fortaleceu ainda mais, aproveitando-se da oportunidade de transformar os materiais que veiculam os seus fuxos em recur-sos imateriais, to dinmicos e fexveis que liberam o tempo e o espao de quase todos os obstculos (naturais e sociais), o que lhe permite atravessar, alegre e impunemente, as fronteiras dos Esta-dos-naes. por isso que a rede, criada pela densidade de certos fuxos, forma ns em alguns lugares do mundo, principalmente nos grandes centros de deciso, como as megalpoles. Observando-se a dinmica da inter-relao entre os seus ns, ou conjunto de ns, Estado-nao, Ensino de Geografa, Mundializao: alguns desafos para a formao do professor54podemos avaliar o impacto mundial de sua atuao, a exemplo das bolsas de valores, dos laboratrios de pesquisa e desenvolvimen-tonossetoresdeponta(comoasbiotecnologias,aengenharia gentica, ou qualquer outra especialidade), ou dos ns das redes clandestinas, como o narcotrfco, praticamente funcionando sem interrupo, ao longo do ano civil. De qualquer maneira, preciso registrar o aparente paradoxo de um mundo conectado pelas redes de informao e o avano da incompreenso humana, nos nveis macro e micro. No primeiro, veja-seairrupodofundamentalismoislmico,umareaoao atual status quo, provocado, entre outros, pelas conseqncias da imposio do Estado-nao como modelo poltico da modernida-de em vrias sociedades organizadas sob a forma de tribos, como na frica (Badie, 1995). No segundo, considere-se a escola, que devetrabalharosmeiosdecomunicaocomoumartefatopara atingir um objetivo maior: a compreenso humana, [...] condio e garantia da solidariedade intelectual e moral da humanidade (Mo-rin, 2000, p. 93). contribuindo para disseminar entre as crianas a compreenso humana, por conseguint